as crianças aprendem o que vivenciam

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As crianças aprendem o que vivenciam O poder do exemplo dos pais na educação dos filhos Dorothy Law Nolte Rachel Harris

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As criançasaprendem

o quevivenciam

O poder do exemplo dos pais naeducação dos filhos

Dorothy Law Nolte

Rachel Harris

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As cr ianças aprendem o que v ivenc iam

Se as crianças vivem ouvindo críticas, aprendem a condenar.

Se convivem com a hostilidade, aprendem a brigar.

Se as crianças vivem com medo, aprendem a ser medrosas.

Se as crianças convivem com a pena, apren dem a ter pena de si mesmas.

Se vivem sendo ridicularizadas, aprendem a ser tímidas.

Se convivem com a inveja, aprendem a invejar.

Se vivem com vergonha, aprendem a sentir culpa.

Se vivem sendo incentivadas, aprendem a ter con fian ça em si mesmas.

Se as crianças vivenciam a tolerância, aprendem a ser pa cientes.

Se vivenciam os elogios, aprendem a apreciar.

Se vivenciam a aceitação, aprendem a amar.

Se vivenciam a aprovação, aprendem a gostar de si mesmas.

Se vivenciam o reconhecimento, aprendem que é bom ter um objetivo.

Se as crianças vivem partilhando, aprendem o que é generosidade.

Se convivem com a sinceridade, aprendem a veracidade.

Se convivem com a equidade, aprendem o que é justiça.

Se convivem com a bondade e a consideração, apren dem o que érespeito.

Se as crianças vivem com segurança, aprendem a ter con fian ça em simesmas e naqueles que as cercam.

Se as crianças convivem com a afabilidade e a amizade, aprendem queo mundo é um bom lugar para se viver.

– Dorothy Law Nolte

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Dedico este livro a todas

as crianças da vida.

– Dorothy Law Nolte

Para minha filha, Ashley,

que me ensinou sobre o amor

e cuidados maternos.

– Rachel Harris

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Prefác io

de Jack Canfield, coautor de Histórias para aquecer o coração

Descobri o poema “As crianças aprendem o que vivenciam” no prin-cípio da década de 1970, quando estava escrevendo um livro sobre comodesenvolver a autoestima das crianças na sala de aula. Apai xonei-mena mesma hora pelo texto e fiz cópias dele para todos os professoresda escola em que ensinava. Cada uma das frases parecia conter umaafirmação que eu instintivamente sabia ser verdadeira. Fiquei impres-sionado ao ver tanta sabedoria contida em tão poucas palavras.

Nunca me ocorreu que um dia fosse encontrar a autora do poe ma,porém, anos mais tarde, conheci Dorothy e seu marido, Clau de, emuma conferência sobre psicologia. Eles me trataram com toda a acei-tação, bondade, incentivo e amabilidade – os valo res aos quais Dorothyse refere em seu poema. Foi uma noite que jamais esqueci. Duvido quefizessem ideia de quanto seu afeto e carinho influenciariam um jovemeducador que, na ocasião, lutava para gostar de si mesmo e ensinar seusalunos a também gos ta rem de si mesmos e se aceitarem.

“As crianças aprendem o que vivenciam” serviu como um conjuntode princípios orientadores para minha interação com meus alunos e,mais tarde, com meus três filhos. Como todos os outros prin cípios paraa vida e o cuidado com os filhos, eles são mais fá ceis de se falar ouescrever a respeito do que se pôr em prática.

Em meus 30 anos como educador e coordenador de seminá riossobre educação, cheguei à conclusão de que, em geral, todos os paisdesejam genuinamente ser mais amorosos, bondosos, compassivos,tolerantes, honestos e justos com seus filhos. O problema é que amaioria nunca fez um curso sobre os métodos e técnicas específicos deinteração, comunicação e disciplina que produ zem pais compassivos,amorosos, honestos e justos.

Nunca conheci um pai ou mãe que acordasse de manhã, vi ras se para

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a mulher ou o marido a seu lado e dissesse: “Acabei de descobrir qua-tro maneiras excelentes de destruir a autoestima do nos so pequeno Billy.Podemos criticá-lo, ridicularizá-lo, envergo nhá-lo e mentir para ele.”Ninguém se propõe a magoar seus fi lhos de propósito e, no entanto, éisso o que os pais fazem com frequência. Não é intencional. Costumaser por inconsciência ou me do que eles transmitem suas crenças limi-tadas e suas dificuldades emocionais para os filhos.

É necessário ter coragem e percepção para romper com os pa drõesnegativos e destrutivos que podem tomar conta de nosso re la ciona -mento com nossas crianças. Precisamos optar por viver, de forma cons-ciente e deliberada, com o propósito de criar filhos sau dá veis, felizes ebem ajustados.

Neste livro, Dorothy Law Nolte tomou cada verso de seu clássi copoema e ensinou a todos nós – por meio de casos e exemplos es pe -cíficos – como pôr em prática os valiosos preceitos ali contidos. Elaconsegue transmitir de maneira magistral, em uma linguagem simplese de fácil compreensão, como ser menos crítico e mais tolerante, menosautoritário e mais inclinado à aceitação, me nos intimidador e maisincentivador, menos hostil e mais ami gável com as crianças.

Você também ganha um bônus quando lê este livro: além de apren-der como ser um pai ou mãe melhor, descobre o que fazer para se tor-nar um bom marido, uma boa esposa, um bom professor ou um bomgerente. Os princípios e métodos aqui apresentados são universais eservem para desenvolver um relacionamento amoroso, respeitoso, afir-mativo e capacitante com qualquer pessoa. Acredito que, se todos pra-ticassem esses princípios em seus relacionamentos pessoais, haveriamenos violência e menos guerras, menos greves e mais produtividadenos ambientes de trabalho, menos encena ção e mais tempo de apren-dizado na sala de aula. Teríamos me nos pessoas nas prisões, menosgente vivendo nas ruas ou em cen tros de reabilitação para drogados.Peço que levem em conta que a maioria dos problemas do mundocomeça em casa e, tornando-se um pai ou mãe melhor, você estarácontribuindo da ma neira mais sólida e concreta para a solução dosimensos e apa ren temente insolúveis dilemas que enfrentamos nomundo de hoje.

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Mesmo que você já se considere um ótimo pai ou mãe, está prestesa descobrir que pode ir além, pode embarcar numa aventura quasemágica. O que poderia ser mais recompensador do que ser capaz decriar filhos seguros de si mesmos, positivos, pacien tes, compreensivos,amorosos, determinados, generosos, verdadei ros, justos, respeitosos eamigáveis? Imagine um mundo em que todas as crianças cresçam parase tornar adultos com essas qualidades. Se rá que você consegue imagi-nar o governo de um país em que todos os políticos manifestem essasqualidades? Eu consigo. Sei que Do rothy também. Nossa motivação é“criar” pessoas para conti nuarem nosso trabalho.

Sua tarefa é nobre – ser pai ou mãe. Nunca subestime o seu po derde ajudar a criar um futuro melhor, não apenas para seus fi lhos maspara todos. Este livro pode ser um instrumento para trans formá-lo nopai ou mãe que sempre quis ser, para educar os fi lhos de quem semprese orgulhará, além de contribuir para a evo lução de uma consciênciaque vai construir o mundo em que to dos nós sonhamos viver.

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Introdução

Dorothy Law Nolte

Escrevi “As crianças aprendem o que vivenciam” em 1954 para aminha coluna semanal sobre vida familiar criativa em um pequeno jor-nal do sul da Califórnia. Na ocasião, minha filha tinha 12 anos e meufilho, 9. Eu dava aulas sobre vida familiar num programa de educaçãode adultos e trabalhava como diretora de educação de pais numa escolamaternal. Não imaginava que o poema fosse se tornar um clássico.

“As crianças aprendem o que vivenciam” foi a maneira que en -contrei para responder às perguntas dos pais em minhas aulas de vidafamiliar e explicar o que significa ser pai ou mãe. Na década de 1950,os pais educavam os filhos dizendo-lhes o que fazer e o que não fazer.O conceito de orientar as crianças não era amplamente conhecido. Aoescrever o poema, tentei mostrar que a maior influência que os paisexercem sobre os filhos é pelo exemplo que dão em sua vida diária.

Com o passar dos anos, “As crianças aprendem o que vivenciam” foitraduzido para 10 línguas e publicado no mundo inteiro, sendo usadoem cursos de educação de pais e treinamento de professores. Ondequer que o poema apareça, espero sempre que sir va de guia e inspira-ção para os pais enfrentarem a tarefa mais importante de suas vidas:educar os filhos.

“As crianças aprendem o que vivenciam” parece ter vida pró pria.Desde o seu lançamento, ele já foi modificado, cortado e adap tadomuitas e muitas vezes – em geral sem meu conhecimento. Não meincomodei com a maior parte das modificações, mas algumas entraramem conflito com minhas opiniões.

A certa altura, alguém mudou o último verso para “Se as crian çasconvivem com a aceitação e a amizade, aprendem a encontrar amor nomundo”. Não acho que seja correto garantir a existência do amor ouincentivar a busca do amor no mundo. O amor vem de dentro. A pes-soa amorosa gera amor, e o sentimento flui de uma pessoa para outra.

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O amor não é um tesouro nem um bem consumível a ser encontrado. Oúltimo verso que escrevi para o poema diz que “Se as crianças convi-vem com a afabilidade e a amizade, aprendem que o mundo é um bomlugar para se viver”. Isso cria uma expectativa otimista e positiva paraas crianças quan do exploram o mundo à sua volta.

As palavras nos unem

Certa vez uma jovem mãe me disse: “Você pode não gostar de saberdisso, mas guardo seu poema no meu banheiro.” Era o único lugar emque ela podia ter privacidade. Refugiava-se lá quando sentia que esta-va precisando de um pouco de calma para lembrar de dar valor a siprópria como mãe. Este é apenas um exemplo de como “As criançasaprendem o que vivenciam” serve como um meio para os pais reco-nhecerem que precisam de um intervalo de tempo para se refazerem erecuperarem a perspectiva.

Uma avó recentemente me contou que recorre ao poema para seorientar no relacionamento com os netos. Disse que ele foi a sua bíbliaquando criou os próprios filhos e agora ela o está usando com a gera-ção seguinte. Outra senhora escreveu-me contando que o poema foisua “primeira aula de como ser mãe”. Tantas pessoas partilharamcomigo seu relacionamento pessoal com esses ensinamentos que aca-bei achando que o poema poderia servir de modelo para o tipo de paisque as pessoas desejam ser.

A mensagem deste livro é clara e simples: as crianças aprendem otempo todo com os pais. Seus filhos estão prestando atenção em vocês.Talvez não ao que vocês lhes dizem para fazer, mas certamente ao quede fato veem vocês fazerem. Vocês são o primeiro e mais importanteexemplo a seguir. Os pais podem tentar ensinar certos valores, mas ascrianças inevitavelmente absorverão aquilo que é transmitido atravésdo comportamento, dos sentimentos e ati tudes dos pais na vida diária.A maneira como vocês expressam e administram os próprios sentimen-tos torna-se um modelo que será lembrado por seus filhos durantetoda a vida deles.

Acredito que cada criança seja única e tenha um centro de criativi-

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dade e sabedoria que só pertence a ela própria. O privilégio dos pais éassistir ao desdobramento da personalidade dos filhos e permitir quesua beleza brilhe no mundo.

Lembrem-se de apreciar e cultivar os recursos e a autoexpres sãopróprios e únicos de seus filhos à medida que eles aprendem como par -ticipar da vida familiar e contribuir para ela. Dessa for ma, vocês estabe -lecerão uma parceria com seus filhos que servirá de estímulo e apoio paraque todos cresçam, partilhem e aprendam juntos como uma família.

Quando os pais leem meu poema pela primeira vez, costumamdizer: “Eu já sei isso tudo.” E é verdade – provavelmente vocês já sabemmesmo. O poema é uma ligação com o que você já conhece em suasabedoria interior. Minha intenção neste livro é expandir o significadode cada verso de “As crianças aprendem o que vivenciam”. Gosto deimaginar todos nós sentados juntos falando sobre o que é viver comcrianças. Espero que sintam como se estivéssemos trocando experiên-cias. Espero também que meu poema se tor ne vivo e real para vocês.As crianças aprendem mesmo o que vivem. E depois crescem para vivero que aprenderam.

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S e a s cr ianças v ivem ouv indo cr í t icas,

a prendem a condenar

As crianças são como esponjas. Absorvem tudo o que fazemos, tu -do o que dizemos. Aprendem conosco o tempo todo, mesmo quan donão nos damos conta de que estamos ensinando. Assim, quando ado-tamos um comportamento crítico – reclamando delas, dos outros e domundo em torno de nós –, estamos lhes mostrando como condenar ecriticar os outros. Estamos ensinando a ver o que está errado nomundo, e não o que está certo.

A noção de crítica pode ser transmitida de várias maneiras – pe laspalavras, pelo tom de voz e até por um olhar. Todos sabemos co moolhar alguém de modo reprovador ou dar uma conotação de crí ti ca àsnossas palavras. As crianças pequenas mostram-se parti cu lar mente sen -síveis à ma neira como dizemos as coisas e são mui to afe ta das por ela.Um pai ou mãe pode falar “Está na hora de ir embo ra” sem quererdizer nada além disso. Um outro, movido pela pressa ou im paciência,pode dizer as mesmas palavras de uma forma que dê a entender: “Éerrado você demorar tanto.” Embora não se pos sa ga rantir que qual-quer uma das duas formas vá fazer efeito, a crian ça ouvirá essas duasmensagens de modo muito diferente, e a se gun da talvez deixe nela umsentimento desagradável sobre si mesma.

É claro que todos nós temos nossas irritações e todo mundo faz umacrítica ou outra de vez em quando, ainda que os filhos estejam ouvin-do. Mas não é o mesmo que viver achando defeito em tu do. A críticafrequente – não importa a que se dirija – tem um efei to cumulativo,criando uma atmosfera negativa para a vida fa miliar. Como pais, temosdiante de nós duas alternativas: criar um clima emocional crítico ereprovador ou um ambiente estimulante e encorajador.

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No calor do momento

Abby tem 6 anos e está na cozinha arrumando as flores que ela co lheuem uma jarra plástica cheia de água. De repente, a jarra tomba, es pa -lhan do água, folhas e flores por toda parte. Abby fica no meio daquelabagunça, toda molhada e chorando. A mãe dela aparece em um instante.

– Ah, não é possível! Como você consegue ser tão estabanada? – diz,exasperada.

Todos já dissemos algo assim em algum momento. Reagimos sempensar. As palavras saem tão depressa de nossa boca que até nos espan-tamos. Talvez seja cansaço. Talvez seja preocupação com outra coisaque não tem nada a ver com aquilo. Mesmo as sim, ainda há tempopara mudar o tom e evitar que esse pequeno contratempo assuma pro-porções exageradas, afetando a noção de valor pessoal da criança. Se amãe de Abby para, se acalma e pede desculpas por brigar com ela, a situação se desanuvia. A menina talvez fique aborrecida com o inci-dente, mas não com ela própria. Por outro lado, se a mãe de Abby con-tinuar a fazer críticas, a filha pode começar a se achar incompetente e desajeitada.

Sei que nem sempre é fácil refrear nosso descontentamento, mesmosabendo que isso é melhor para nossos filhos. A maioria de nós tem defazer um grande esforço para compreender e controlar nossas reaçõesemocionais. Por isso, é bom pensar de antemão no que poderíamosfazer numa situação como essa. Uma boa alterna tiva seria perguntar:“Como foi que isso aconteceu?” Ao enfatizar o incidente e não a crian-ça, os pais evitam que ela tenha a sensa ção de fracasso e inadequação,dando margem ao aprendizado construtivo. Estimulando seu filho afalar durante a sequência de acontecimentos, vocês podem ver juntoscomo uma coisa levou à outra e talvez até descobrir o que pode serfeito de modo diferente no futuro.

Alguns acidentes podem ser evitados estabelecendo-se alguns limi-tes e fazendo um pequeno planejamento antes de iniciar uma brinca-deira ou alguma outra atividade. Na maioria das vezes, nossos filhosquerem nos agradar, e nós podemos facilitar as coisas pa ra eles dizen-do claramente o que desejamos antes de co me çarem. Nossas sugestões

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têm de ser bem definidas e estar de acordo com a idade da criança.Precisamos dar informações concretas que ela possa usar para orientarseu comportamento.

Em uma tarde de chuva, Ben, de 4 anos, disse à mãe que ele e seuamigo queriam fazer bichinhos de massa de modelar. A mãe estavaocupa da organizando os pagamentos da casa e ficou ten tada a apenasresponder “tudo bem”, deixando os garotos brin carem sozinhos. Em vezdisso, levantou-se e foi buscar uma velha cortina de chuveiro que guar-dara para essas ocasiões. Es ten deu-a no chão e explicou aos meninos:

– Sentem-se aqui no meio e vamos esticá-la. Assim, vocês vão terbastante espaço para fazer todos os bichinhos da fazenda.

Enquanto amontoava a massa de modelar no plástico, Ben pergun-tou à mãe:

– Podemos pegar umas facas na cozinha?– Facas, não. Facas não são para brincar. Que tal uns moldes de bis-

coitos? – respondeu ela.– Tudo bem. E também umas colheres de madeira? – propôs o menino. – Claro – disse a mãe, pegando os utensílios na cozinha. – E, não

esqueçam, depois vocês vão ajudar a limpar tudo.Os poucos minutos gastos no início da brincadeira foram uma in -

terrupção para a mãe de Ben, mas é possível que a tenham pou pado demais tarde raspar a massinha de modelar agarrada no ta pe te, enquantotentava se controlar para não brigar com as crian ças. Seu envolvimentoprévio também deu a Ben a oportunidade de negociar os utensílios decozinha que ele queria usar. Embora essa abordagem tome algum tempo,permite que surjam opções e proporciona às crianças um bom treinono processo de tomar decisões. Ter voz ativa em decisões cotidianastambém contribui para que construam uma autoimagem positiva.

Sendo bastante realistas, nem sempre temos tempo para lidar com ascoisas com todo o cuidado de que gostaríamos e outras vezes simples-mente não conseguimos antecipar o que pode sair errado. Um dia, umaamiga minha estava apressando a filha de 5 anos, Katie, porque tinhahora marcada no cabeleireiro para aparar o cabelo da menina.

– Ande depressa, querida. Nós vamos cortar seu cabelo e não querochegar atrasada.

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De repente, sem mais nem menos, Katie fez uma cena alegando quenão queria cortar o cabelo. Contrariada, a mãe disse que ela era “volun-tariosa”, o que fez a filha ficar tão alterada que lite ral mente mal podiafalar. Para um adulto, a observação da mãe de Ka tie não parece tão ter-rível assim, mas a menina escutou uma men sagem completamente dife-rente: “Você é má porque é voluntariosa.”

Quando Katie finalmente se acalmou, conseguiu explicar que ti nhavontade de deixar a franja crescer, não queria cortá-la. A mãe, ao perce-ber que aquela era a razão de tanto estardalhaço, olhou para ela espantada.

– Está bem, querida, é só explicar isso ao cabeleireiro. Não vamosdeixar que ele corte sua franja – ela disse.

Se tivesse conversado com Katie sobre o corte de cabelo na ho ra do caféda manhã, por exemplo, teria poupado a ambas o aborrecimento de pas-sar por uma crise. É claro que, mesmo sendo fle xíveis, pacientes e previ-dentes, sempre discordaremos de nossos filhos em algum mo mento. Aquestão será resolver o conflito com um mínimo de danos. Ninguémganha em um impasse. A mãe de Katie respeitou o direito da filha de deci-dir de que modo queria cortar o cabelo. Dividir a responsabilidade empequenas questões aju da as crianças a se prepararem para tomar decisõesimportan tes no futuro. Se nossos filhos crescem sabendo que os escuta-mos e consideramos suas ideias com respeito, vão se mostrar mais dispos-tos a falar conosco e a trabalhar em conjunto para resolver os problemas.

A maneira como dizemos as coisas

Muitas vezes, quando criticamos nossos filhos, nossa intenção éincentivá-los a fazer melhor, a serem melhores. Talvez nossos pais secomunicassem assim conosco quando éramos pequenos. Ou, quemsabe, fazemos críticas porque estamos estressados ou can sados. Mas ascrianças não sentem a crítica como incentivo. Pa ra elas, é mais comoum ataque e, em geral, as torna mais de fensivas do que cooperativas.Além disso, ao serem recriminadas por determinado comportamento,as crianças pequenas acham difícil compreender que a atitude é que éinaceitável, não elas próprias.

Ainda assim podemos dizer aos nossos filhos que o que eles es tão fa -

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zendo não nos agrada. Se pararmos para refletir sobre o im pacto de nos-sas palavras, podemos dizer o que é preciso sem abalar a noção que acriança tem de si mesma. Não importa o que te nha acontecido, podemosfazê-la saber que ela é apreciada, mes mo tendo feito algo que não é.

Logo que ouviu o barulho, o pai de William soube imediatamentede que se tratava. Foi correndo da cozinha para a sala de es tar e encon-trou o lustre quebrado e cacos de vidro espalhados pelo chão. Seu filhode 8 anos olhava para ele com uma ex pressão de susto e medo no rosto.A bola de vôlei estava caída per to dele, no chão da sala.

– Agora você sabe por que a regra aqui é “nunca jogue bola dentrode casa”? – perguntou o pai.

William baixou a cabeça.– Sei, papai. Mas eu estava tomando cuidado.– Não, Will, a regra não é sobre cuidado – disse o pai com fir meza.

– A regra é sobre o lugar apropriado.– Desculpe – disse William, esperando que com isso a discus são

acabasse.O pai olhou para ele com seriedade.– Bem, vamos procurar saber quanto vai custar o lustre, depois cal-

cular quanto tempo você vai levar economizando a sua mesada parapagar o conserto.

As palavras calaram fundo e William se deu conta das consequên-cias de sua falta. O pai viu os ombros do filho curvarem-se sob o pesoda responsabilidade.

– Sabe, o vovô certa vez me fez pagar uma janela que quebrei quan -do tinha mais ou menos a sua idade – confessou ele para o fi lho, queagora o escutava com atenção redobrada.

– É mesmo?– Também levei um tempão para pagar – disse o pai. – E, vou con tar

uma coisa para você, nunca mais quebrei nada em casa. Ago ra, vá bus-car uma vassoura e uma pá de lixo para tirarmos esses cacos de vidro daí.

O excesso de ênfase em culpa e punição gera separação, não apro -ximação. A verdade é que todos nós cometemos erros, e acidentes acon-tecem. Reagir com mensagens proveitosas nessas oca siões torna maisfácil para a criança aprender através da expe riência, estabelecer a ligação

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entre o que ela fez e o que “aconteceu” e determinar o que precisa fazerem seguida para reparar a situação.

Advertir, reclamar, ralhar

Nem sempre percebemos, mas as advertências e reclamações crônicassão formas sutis de crítica. A mensagem que está por trás delas é: “Nãoconfio que você se lembre de fazer alguma coisa ou que se comporte demodo apropriado.” Esperar o pior de nossos filhos não os ajuda nem éprodutivo para nós. Toda criança muito pequena logo aprende a se des-ligar de frases muito repetidas, e os adolescentes são famosos por suacapacidade para “ficarem surdos”, com ou sem fones de ouvido.

Uma estratégia melhor do que advertir é estabelecer rotinas pre vi sí -veis com expectativas razoáveis. Por exemplo, costumo di zer aos pais queum jeito simples mas eficaz de evitar o hábito do “não esqueça” consis-te em parar de dar ênfase ao esquecer e co meçar a enfatizar o lem brar.Digam a seus filhos o que desejam que eles lembrem: “Lembre-se depôr as meias no cesto de roupa su ja”, “Lembre-se, essa boneca ficadentro de casa, não no jardim”. Essa atitude possui um tom de incen-tivo que é importante em qualquer idade e pode fazer toda a diferença.É particularmente útil para a criança pequena, que está começando aaprender como funciona a vida familiar. Acima de tudo, reconheçasempre o esforço de seu filho: “Como você me ajudou lembrando deguar dar seu brinquedo!” Com observações positivas, você deixa claro oque espera dele e ao mesmo tempo o incentiva.

Como as advertências, as reclamações são uma forma ineficaz depromover mudanças e não servem de bom exemplo para nossos fi lhos.A reclamação salienta as dificuldades, deficiências e de sa pon tamentos,não as soluções. Não queremos que nossas crian ças apren dam a ver omundo através de uma perspectiva passiva, nega ti va, ou a pensar que amaneira de reagir aos problemas é reclaman do deles. Evite fazer dareclamação um substituto para a ação e, em vez disso, tente imaginartantas soluções criativas quanto pos sível, estimulando também ascrianças a contribuírem com algumas.

Procure refletir sobre as reclamações que faz no dia a dia: você po de

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se surpreender ao perceber o quanto reclama, seja sobre a sua situaçãono trabalho, sobre outras pessoas e até sobre o tem po. Todos nós preci-samos resmungar um pouco de vez em quando, mas, lembre-se, o lema“Nada de choro” também se aplica aos pais.

Reclamar do marido ou da mulher é uma atitude especialmentedestrutiva. Pode fazer os filhos sentirem que devem tomar o partido deum ou de outro, colocando-os no meio de uma disputa conjugal. Estaé uma posição impossível para uma criança, que se sente dividida nasua lealdade por ambos os pais. Da mesma ma neira, reclamar dos avósda criança também vai deixá-la em uma situação insustentável. Nossasqueixas sobre pais ou sogros têm de ser discutidas em particular e man -tidas à parte do relacionamento mágico entre netos e avós.

Nossos filhos vão perceber em pouco tempo os defeitos de nossosparentes, mas não devemos sobrecarregá-los com quei xas an tes da hora.Além disso, é importante que as crianças ve jam os adultos da famíliatratarem-se com respeito, tanto em palavras quanto em ações.

Deleitando-se com a vivacidade de seus filhos

Assim como nossos filhos aprendem o tempo todo conosco, nós tam -bém podemos aprender com eles a cada momento. Ao chegar em casa,depois de um programa familiar noturno, um casal de amigos meus sópensava em colocar os dois meninos, de 7 e 8 anos, na cama o mais rápi-do possível. Nenhum dos dois queria ir dormir, como sempre.

– Podemos apreciar as estrelas? – o menor pe diu.Os pais se detiveram. Tinham de escolher. Poderiam ter dito: “Vo cês fa -

zem de tudo para não ir dormir. Não teimem, já é tarde, es tá na hora de irpara a cama.” Mas não disseram. Naquela noite, passaram alguns minutosadmirando o céu estrelado e o brilho que se refletia no rosto dos filhos.

“Apreciar as estrelas” é qualitativamente diferente de “olhar as estre-las”. Os adultos olham, veem e voltam-se depressa para o que “tem deser feito”. As crianças contemplam as estrelas cheias de encanto eexpectativas. Permitir que nossas crianças nos ensinem novas maneirasde enxergar o mundo cria uma experiência fami liar dinâmica em quetodos aprendem e crescem juntos.

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