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As Constituições dos Países de Língua Portuguesa Comentadas Volume 91 Senado Federal Edições do . . . . . . . . . Organizadores: • Fernando Augusto Albuquerque Mourão • Walter Costa Porto • Thelmer Mário Mantovanini S F ENADO EDERAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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  • As Constituiesdos Pases de

    Lngua PortuguesaComentadas

    Volume 91

    Senado FederalEdies do

    As Constituies dos Pasesde Lngua Portuguesa

    Comentadas

    Volume 91

    Senado FederalEdies do

    . . . . . . .

    . . . . . . . . .

    Edies do Senado Federal

    1 O Rio de Janeiro do Meu Tempo, Lus Edmundo.2 Canudos e Outros Temas, Euclides da Cunha.

    Apresentao Cyl Gallindo.3 Memrias do Meu Tempo, Pereira da Silva.4 O Ensino Pblico no Brasil, A. de Almeida

    Oliveira. Prefcio Professor David Gueiros.5 A Campanha de Canudos, Aristides A. Milton.6 Dirio da Assemblia Geral Constituinte e Le-

    gislativa do Imprio do Brasil 1823 Vols.I, II e III.

    7 O Abolicionismo, Joaquim Nabuco.8 Misso Rondon. Apontamentos de autoria de

    Cndido Mariano de Silva Rondon.9 Ensaios e Estudos, Capistrano de Abreu.10 Luiz Carlos Prestes, o Constituinte, o Senador

    (1946 1948). Organizador: Srgio Braga.11 A Iluso Americana, Eduardo Prado.12 Os Deputados Brasileiros nas Cortes Gerais de

    1821, Gomes de Carvalho.13 Dois Anos no Brasil, F. Biard.14 Balmaceda, Joaquim Nabuco.15 Conselhos aos Governantes (reimpresso).

    Autores diversos.16 Narrativa de Servios no Libertar-se o Brasil

    da Dominao Portuguesa, Lorde Cochrane.17 Viagens pelo Amazonas e Rio Negro, Alfred

    Russel Wallace.18 A Independncia e o Imprio do Brasil, A. J. de

    Melo Morais.19 Histria do Imprio, Tobias Monteiro.20 Histria da Independncia do Brasil, Francisco

    Adolfo Varnhagen (Visconde de Porto Seguro).21 A Interveno Estrangeira Durante a Revolta

    de 1893, Joaquim Nabuco.22 Relatrio da Comisso Exploradora do Planalto

    Central do Brasil Relatrio Cruls, Lus Cruls.23 Histria da Cidade de So Paulo, Afonso de

    E. Taunay.24 Na Capitania de So Vicente, Washington Lus.25 Histria da Capitania de So Vicente, Pedro

    Taques de Almeida Pais Leme.26 O Ocaso do Imprio, Oliveira Viana.27 Populaes Meridionais do Brasil, Oliveira Viana.28 Jornal de Timon, Joo Francisco de Lisboa.29 Notas para a Histria do Cear, Guilherme

    Studart.30 Ensaio Corogrfi co sobre a Provncia do Par,

    Antnio Ladislau Monteiro Baena.31 Fundao de Belm do Par, Ribeiro do Amaral.32 Os Muckers Episdio Histrico Extrado da

    Vida Contempornea nas Colnias Alems no Rio Grande do Sul, Padre Ambrsio Schupp.

    33 Dirio da Minha Viagem para Filadlfi a,Hiplito da Costa Pereira.

    34 Histria Econmica do Brasil, Roberto C.Simonsen.

    35 Amap, a Terra onde o Brasil Comea, JosSarney e Pedro Costa.

    36 Dom Pedro e Dom Miguel A Querela daSucesso, Oliveira Lima.

    37 O Velho Senado, Machado de Assis.38 Cdigo Filipino. Vols. I, II, III, IV.39 A Abolio, Osrio Duque Estrada.40 O Presidente Campos Sales na Europa, Tobias

    Monteiro.41 Memrias da Rua do Ouvidor, Joaquim

    Manuel de Macedo.42 Um passeio pela cidade do Rio de Janeiro,

    Joaquim Manuel de Macedo.43 O Brasil Holands sob o Conde Joo Maurcio

    de Nassau, Gaspar Barlu.44 As Aventuras de Nh-Quim e Z Caipora,

    ngelo Agostini.45 A Casa de Cunha, Lus da Cmara Cascudo.46 As obras dos engenheiros militares Galluzzi e

    Sambuceti e do arquiteto Landi no Brasil Col-nia do sc. XVIII, Ricardo Fontana.

    47 Histria dos Smbolos Nacionais, Milton Luz.48 Histria do Positivismo no Brasil, Ivan Mon-

    teiro de Barros Lins.49 A Amaznia na Era Pombalina, Marcos Car-

    neiro de Mendona. Tomos I, II e III.50 Inventrio de Documentos Histricos Brasileiros,

    Ivoncsio Meira de Medeiros.51 A Verdade como Regra das Aes, Farias Brito.52 O Mundo Interior, Farias Brito.53 A Base Fsica do Esprito, Farias Brito.54 Inditos e Dispersos Notas e Variaes sobre

    Assuntos Diversos, Farias Brito.55 Finalidade do Mundo, Farias Brito. Vols. I,

    II e III.56 O Estado Independente do Acre e J. Plcido de

    Castro Excertos Histricos, Genesco de Castro.57 500 Anos de Histria do Brasil, Olavo Leonel

    Ferreira.58 A Vida de Luiz Viana Filho, Joo Justiniano

    da Fonseca.59 Campanha Abolicionista no Recife Eleies

    de 1884, Joaquim Nabuco.60 O Meio Circulante no Brasil, Julius Meili.61 Viagem ao Rio Prata e ao Rio Grande do Sul,

    Arsene Isabelle.62 ABC das Alagoas Dicionrio Bibliogrfi co,

    Histrico e Geogrfi co de Alagoas, Francisco Reinaldo Amorim de Barros Tomos I e II.

    63 Batalha de Caiboat Episdio Culminanteda Guerra das Misses, General Ptolomeu de Assis Brasil.

    Organizadores: Fernando Augusto Albuquerque Mouro Walter Costa Porto Thelmer Mrio Mantovanini

    Organizadores: Fernando Augusto Albuquerque Mouro Walter Costa Porto Thelmer Mrio Mantovanini

    A evoluo poltico-constitucional registada nos pases da Comunidade de Lngua Portuguesa nos ltimos trinta anos espelha avanos polticos fundamentais no que tange conquista pelos seus povos de direitos polticos, sociais e econmicos que, consagrados em normas constitucionais avanadas, colocam os textos fundamen-tais vigentes nos Estados membros da nossa Comunidade em linha com os mais altos padres de prtica poltica e social. A iniciativa do Senado Federal do Brasil e dos distintos Professores Fernando Augusto Albuquerque Mouro e Walter Costa Porto de coligir e publicar os textos das Constituies dos Pases de Lngua Portuguesa, incluindo na colectnea o texto dos Estatutos da CPLP, representa uma contribuio substancial ao conhecimen-to abrangente do universo constitucional da CPLP, indispensvel cooperao em todos os domnios e consolidao institucional da Comunidade. A incluso de comentrios de ilustres especialistas do Di-reito Constitucional de cada pas enriquece a obra que agora se d estampa, concorrendo, deste modo, para o aprofundamento dos de-bates volta das instituies que determinaro, em ltima instncia, o ritmo e a consistncia dessa consolidao.

    L FS E CPLP

    SF

    E N A D O

    E D E R A L......................

    ......................

    SF

    E N A D O

    E D E R A L......................

    ......................

  • Bandeiras dos pases membros da CPLP Comunidade dosPases de Lngua Portuguesa.

    Angola

    Brasil

    So Tom e Prncipe

    Moambique

    Cabo Verde

    Guin-Bissau

    Portugual

    Timor-Leste

  • . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

    As Constituies dos Pases da Comunidade de Lngua Portuguesa

    comentadas

  • Senador Garibaldi Alves Filho Presidente

    Senador Tio Viana 1 Vice-Presidente

    Senador Alvaro Dias 2 Vice-Presidente

    Senador Efraim Morais 1 Secretrio

    Senador Gerson Camata 2 Secretrio

    Senador Csar Borges 3 Secretrio

    Senador Magno Malta 4 Secretrio

    Suplentes de Secretrio

    Senador Papalo Paes Senador Antnio Carlos Valadares

    Senador Joo Vicente Claudino Senador Flexa Ribeiro

    Conselho Editorial

    Senador Jos Sarney Presidente

    Joaquim Campelo Marques Vice-Presidente

    Conselheiros

    Carlos Henrique Cardim Carlyle Coutinho Madruga

    Raimundo Pontes Cunha Neto

    Mesa DiretoraBinio 2007/2008

  • . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

    Edies do Senado Federal Vol. 91

    As Constituies dos Pases da Comunidade de Lngua Portuguesa

    comentadas

    Organizadores:

    Fernando Augusto Albuquerque Mouro, Walter Costa Porto

    e Thelmer Mrio Mantovanini

    Braslia 2008

  • EDIES DO SENADO FEDERAL

    Vol. 91O Conselho Editorial do Senado Federal, criado pela Mesa Diretora em 31 de janeiro de 1997, buscar editar, sempre, obras de valor histrico

    e cultural e de importncia relevante para a compreenso da histria poltica, econmica e social do Brasil e reflexo sobre os destinos do Pas.

    Projeto grfico: Achilles Milan Neto Senado Federal, 2008Congresso NacionalPraa dos Trs Poderes s/n CEP 70165-900 [email protected]://www.senado.gov.br/web/conselho/conselho.htmTodos os direitos reservados.

    . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

    As constituies dos pases da comunidade de lngua portuguesa : comentadas / organizadores: Fernando Augusto Albuquerque Mouro, Walter Costa Porto e Thelmer Mrio Mantovanini. Braslia : Senado Federal, Conselho editorial, 2007.

    928 p. (Edies do Senado Federal ; v. 91)

    1. Constituio, pases da lngua portuguesa. 2. Angola. [Constitui-o (1975)]. 3. Brasil. [Constituio (1988)]. 4. Cabo Verde. [Constituio (1991)]. 5. Guin-Bissau. [Constituio (1996)]. 6. Moambique. [Consti-tuio (1975)]. 7. Portugal. [Constituio (1976)]. 8. So Tom e Prncipe. [Constituio (1975)]. 9. Timor-Leste. [Constituio (2002)]. I. Comunida-de dos Pases de Lngua Portuguesa, estatuto. II. Mouro, Fernando Augusto Albuquerque. III. Couto, Walter Costa. IV. Mantovanini, Thelmer Mrio. V. Srie.

    CDDir 341.24

    . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

  • . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

    Sumrio

    I

    APRESENTAO

    Lus Fonseca

    pg. 11

    AS CONSTITUIES DE LNGUA PORTUGUESA por Fernando Augusto Albuquerque Mouro

    e Walter Costa Porto pg. 13

    A CONSTITUIO DE ANGOLA: UMA

    ANLISE HISTRICO-JURDICA

    por Fernando Jos de Frana Dias Van-Dnem pg. 21

    LEI CONSTITUCIONAL DA REPBLICA DE ANGOLA DE 1992

    pg. 51

    A CONSTITUIO DA REPBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988

    por Walter Costa Porto pg. 101

    CONSTITUIO DA REPBLICA FEDERATIVA DO BRASIL

    pg. 123

  • A CONSTITUIO CABO-VERDIANA DE 1991, REVISTA PELA

    LEI CONSTITUCIONAL No 1/V/99

    por Jos Andr Leito da Graa pg. 355

    CONSTITUIO DA REPBLICA DE CABO VERDE

    pg. 359

    O CONSTITUCIONALISMO DA GUIN-BISSAU

    por Antnio E. Duarte Silva pg. 477

    CONSTITUIO DA REPBLICA DE GUIN-BISSAU

    pg. 493

    COMENTRIO JURDICO DA CONSTITUIO DE 1990,

    DA REPBLICA DE MOAMBIQUE

    por Jos Miguel Nunes Jnior pg. 531

    CONSTITUIO DA REPBLICA DE MOAMBIQUE

    pg. 557

    APRESENTAO DA CONSTITUIO DA REPBLICA

    PORTUGUESA DE 1976

    por Jos Joaquim Gomes Canotilho pg. 645

    CONSTITUIO DA REPBLICA PORTUGUESA

    pg. 653

  • COMENTRIO CONSTITUIO POLTICA SANTOMENSE

    por Jos Paquete dAlva Teixeira pg. 773

    CONSTITUIO DA REPBLICA DEMOCRTICA DE SO

    TOM E PRNCIPE

    pg. 793

    A NOVSSIMA CONSTITUIO DE TIMOR-LESTE

    por Jorge Bacelar Gouveia pg. 843

    CONSTITUIO DA REPBLICA DEMOCRTICA

    DE TIMOR-LESTE DE 2002

    pg. 859

    II

    BREVE AVALIAO CRTICA DA CPLP

    O PROJETO, OS ESTATUTOS, SEUS MECANISMOS

    por Fernando Augusto Albuquerque Mouro

    pg. 915

    ESTATUTOS DA COMUNIDADE DOS PASES DE LNGUA

    PORTUGUESA (COM REVISES DE SO TOM/2001 E BRASLIA/2002)

    pg. 920

  • . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

    Apresentao

    LUS FONSECASecretrio Executivo da CPLP

    A EVOLUO poltico-constitucional registada nos pases da Comu-nidade de Lngua Portuguesa nos ltimos trinta anos espelha avanos polticos fundamentais no que tange conquista pelos seus povos de direitos polticos, sociais e econmicos que, consagrados em normas constitucionais avanadas, colocam os textos fundamentais vigentes nos Estados membros da nossa Comu-nidade em linha com os mais altos padres de prtica poltica e social.

    Na dcada de setenta do sculo passado, deu-se incio viragem decisiva que nos conduziu ao presente estdio. Um processo de longa durao, marcado pelo fim de regimes autoritrios, em Portugal e no Brasil; pelo fim do colonialismo portugus em frica e pela evoluo para sistemas pluripartid-rios, em substituio dos de partido nico, criados com a conquista da inde-pendncia das antigas colnias africanas; e pelo fim da ocupao estrangeira de Timor-Leste.

    Estes foram marcos fundamentais do ciclo histrico dos pases da Comunidade de Lngua Portuguesa, agora concludo pela pacificao de todos os nossos pases e com o incio de um processo sustentado de desenvolvimento econmico e social, em consonncia com as importantes conquistas polticas consagradas nos textos constitucionais vigentes.

  • 12 Fernando A. A. Mouro, Walter C. Porto, Thelmer M. Mantovanini

    Os direitos fundamentais neles estabelecidos, reflectindo concepes avanadas de natureza social e democrtica, so conquistas fundamentais dos povos dos pases de lngua portuguesa; para alm dos direitos polticos, as Cons-tituies abrem-se, como imperativo, prestao pelo Estado de direitos sociais e econmicos, disposies que no podem ser ignoradas pelas modernas consti-tuies.

    Traos distintivos comuns aos textos constitucionais dos nossos pases, quer de normas, quer de institutos, contribuem para sua aproximao e tendero para a construo de uma famlia de direito constitucional de lngua portuguesa.

    A iniciativa do Senado Federal do Brasil e dos distintos Professores Fernando Augusto Albuquerque Mouro e Walter Costa Porto de coligir e pu-blicar os textos das Constituies dos Pases de Lngua Portuguesa, incluindo na colectnea o texto dos Estatutos da CPLP, representa uma contribuio substancial ao conhecimento abrangente do universo constitucional da CPLP, indispensvel cooperao em todos os domnios e consolidao institucional da Comunidade.

    A incluso de comentrios de ilustres especialistas do Direito Consti-tucional de cada pas enriquece a obra que agora se d estampa, concorrendo, deste modo, para o aprofundamento dos debates volta das instituies que de-terminaro, em ltima instncia, o ritmo e a consistncia dessa consolidao.

  • . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

    As Constituies de Lngua Portuguesa

    FERNANDO AUGUSTO ALBUQUERQUE MOURO

    WALTER COSTA PORTO

    EM uma pgina bastante amarga, o grande historiador Oliveira Mar-tins tratou da viagem-fuga para o Brasil, em novembro de 1807, da corte portuguesa. Trs sculos antes, dizia ele,

    Portugal embarcava, cheio de esperanas e cobia, para a ndia; em 1807 (novembro, 29) embarcava um prstito fnebre para o Brasil.

    Desabava tudo a pedaos; e s agora, finalmente, o terremoto co-meado pela natureza, continuado pelo marqus de Pombal, se tor-nava um fato consumado.

    O sol baixava, a esquadra perdia-se no mar, ia-se toda a esperana, ficava um desespero, uma solido.

    Mas a histria tem desses contrastes curiosos: para o Brasil tudo foi gratificao e festa, como um Waterloo visto pelos ingleses. Por fora da invaso pelas tropas napolenicas, dera-se a transferncia, para nosso pas, como disse um analista, dos elementos essenciais de um estado soberano, numa expe-rincia nunca repetida em todo o mundo: Toda a mquina do Estado, sem

  • 14 Fernando A. A. Mouro, Walter C. Porto, Thelmer M. Mantovanini

    faltar nada, estava sendo transportada para um novo local no ultramar, onde deitaria razes e prosseguiria em sua rotina.

    2. O Brasil se torna a sede de um reino, deixando a posio de mera colnia, de mais um Algarves. Daqui sairiam os textos legais que, a partir de 1808, regulariam todo o reino portugus.

    Mas a permanncia, to demorada, no Brasil, do D. Joo VI - que chegara a nosso pas, no incio de 1808, como Prncipe Regente e, com a morte da me, em 1816, se investira como o chefe da Nao - desesperava Portugal, a lamentar que seu rei se tornara brasiliano e que, agora, o dinheiro ia para o Brasil, inversamente ao que acontecia no passado.

    Em novembro de 1820, militares em Portugal exigiram que se ju-rasse a Constituio, to liberal, de Cadiz, aprovada em 1812, na Espanha, aps anos de domnio napolenico.

    O Brasil seguiria Portugal: por decreto real de 21 de abril de 1821, D. Joo VI ordenou que de hoje em diante se fique estrita e literalmente obser-vando neste Reino do Brasil a mencionada Constituio at que se estabelea o que for deliberado e decidido pelas Cortes de Lisboa. No dia seguinte, a deciso foi tornada sem efeito.

    3. Mas com a independncia, com a outorga da Constituio mo-nrquica de 1824, seria a vez do Brasil influenciar Portugal. Com a morte de D. Joo VI a coroa portuguesa vem para nosso Pedro I que outorga Portugal, em 1826, uma cpia da nossa Carta. E, nela, a to peculiar criao de um poder moderador.

    Esse poder, dizia-se no art. 98, de nossa Constituio,

    a chave da organizao poltica, e delegado privativamente ao Imperador, como Chefe Supremo da Nao e seu primeiro repre-sentante, para que, incessantemente, vele sobra a manuteno da independncia, equilbrio e harmonia dos mais poderes polticos.

    A idia vinha de Benjamim Constant, muito lido ao tempo. Cons-tant escrevera:

    O Poder Executivo, o Poder Legislativo e o Poder Judicirio so trs engrenagens que devem cooperar, cada um por sua parte, para o movimento geral; mas quando essas engrenagens desarranjadas se

  • As Constituies dos Pases de Lngua Portuguesa Comentadas 15

    cruzam, se entrechocam e se entravam, preciso que uma fora as coloque no lugar. Essa fora no pode estar em uma das engrenagens porque ela serviria para destruir as outras; preciso que ela esteja fora, que seja neutra, de qualquer modo para que sua ao se apli-que por toda a parte onde se necessite que seja aplicada, e para que seja preservadora, reparadora, sem ser hostil.

    Essa fora, insistia Constant, deveria ser neutra:

    O vcio de quase todas as Constituies foi de no ter criado um Poder Neutro, mas de ter colocado a soma total de autoridade da qual ele deve ser investido em um dos poderes ativos. Quando essa soma de autoridade se encontra reunido no Poder Legislativo, a lei, que no deveria se estender seno sobre objetos determinados, se estende a tudo... Quando a mesma soma de autoridade se acha reunido no Poder Executivo, houve despotismo.

    Mas, no Brasil, a aplicao da idia de Constant foi, de incio, equivocada, pois se juntaram o Poder Moderador e o Executivo, ambos caben-do ao Monarca, perdendo-se, assim, a neutralidade pretendida.

    E, no art. 98, mais uma traduo imperfeita: Constant dissera que a chave (ele escreve clef) de toda a organizao poltica era a separao entre os poderes. Em nossa Constituio se disse: O Poder Moderador a chave de toda a organizao poltica.

    E acrescendo mais um equvoco em nossa apropriao da sugesto de Constant, lembrava Afonso Arinos que a palavra clef, do texto francs, no deveria ser traduzida, em portugus, por chave, mas, sim, por fecho, no sentido de fecho de uma abboda. A distino, para Arinos, no era bizantina, pois que, como explicava, a traduo que no nos parece certa d muito mais a idia de apoio e coordenao do que de interveno e imposio, como a idia de chave, que abre qualquer porta.

    4. Em uma curiosa referncia Constituio francesa de 1958, Duverger classifica seu regime parlamentar como orleanista, a recordar aque-le de Louis Philippe, baseado no princpio de que o trono - ou a Presidncia - no uma cadeira vazia. Para Duverger, o orleanismo implica

  • 16 Fernando A. A. Mouro, Walter C. Porto, Thelmer M. Mantovanini

    uma influncia direta do Chefe de Estado, pela necessidade de um acordo entre ele o Governo: o Gabinete deve ter tambm a dupla confiana, isto , a confiana do Parlamento e aquela do Chefe de Estado.

    A Constituio francesa de 1958 no estabelecera, expressamente essa dupla confiana. Entretanto,

    pelos meios de presso que ela d ao Presidente da Repblica - no-tadamente a assinatura dos decretos e a dissoluo que permite renovar uma Assemblia para tentar mudar a maioria se aquela que sustenta o Governo em exerccio no agrada ao Presidente - a Constituio torna difcil que um Governo se mantenha no poder se ele est em oposio ao Presidente da Rep-blica.

    E Duverger completa: a Constituio imperial do Brasil, que ti-nha, sob a influncia de Constant, estabelecido um parlamentarismo or-leanista, chamava a funo de arbitragem do Chefe de Estado, de Poder Moderador.

    E incorria, tambm, em erro, o mestre francs. Em sua redao, a Constituio de 1824 no previa um parlamentarismo, trazendo, sim, uma separao efetiva entre Executivo e Legislativo. S no Segundo Reinado, que se inicia, em 1840, comeam as prticas parlamentaristas. que o menino Pedro - deixado aqui, com menos de cinco anos, pelo pai, que fora lutar pelo trono da filha, na Europa - se acostumara, no perodo regencial, a ver o governo exercido pelos mais velhos. Natural, ento, que, com menos de 15 anos, ao receber a Coroa, continuasse a admitir essa diviso de tarefas, que teve, em 1847, sua formalizao com a criao do cargo de Presidente do Conselho de Ministros.

    Mas, de qualquer modo, a precedncia do Brasil nesse parlamen-tarismo orleanista, mitigado, pois, na Frana, Louis Philippe comea a reinar em 1850.

    5. Depois, em 1911, o Brasil influenciaria a constituio portu-guesa republicana, de 1911; a fonte desta, reconhecidamente, foi a primeira constituio brasileira, de 1891.

    6. Mais recentemente, caberia a Portugal influenciar a atual Cons-tituio brasileira, de 5 de outubro de 1988. Como exemplo, basta que se indiquem dois itens: o primeiro, o da reviso constitucional, que se espelhou na Constituio portuguesa de 1976. Mas, ao contrrio do modelo portugus,

  • As Constituies dos Pases de Lngua Portuguesa Comentadas 17

    instituiu-se, no Brasil, uma nica reviso, obrigatria, com um quorum de apenas a maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional. Desejou o constituinte brasileiro, com essa reforma imperiosa, ver se seriam confirmadas, no tempo, suas idias e propsitos, se a evoluo do pas e o concerto interna-cional ratificariam os enfoques novos que permearam sua obra. O segundo, a modos do art. 283 da Constituio portuguesa, a hiptese da insconstituciona-lidade por omisso das medidas legislativas necessrias para tornar exeqveis as normas constitucionais.

    7. Iniciador desse sistema, catalogado, agora, o mais das vezes, como semi-presidencialismo, o Brasil no perseverou nele: com a Repblica, com a Constituio de 1891, procedeu-se cpia do modelo norte-americano, de separao de poderes Montesquieu, j exercitado nas suas 13 colnias, sob o jugo ingls.

    Mas, curiosamente, o que iria prevalecer na chamada famlia de Direito Constitucional Lusfona. A partir de Portugal, todos os novos pases africanos - Angola, Guin Bissau, Moambique, So Tom e Prncipe e, no sudeste da sia, o Timor Leste, uniram, para usar palavras de Canotilho, dimenses parlamentares e dimenses presidencialistas em suas organizaes polticas.

    8. Bem que se tentou, no Brasil, a volta a uma das dimenses parlamentares, pelo plebiscito de 21 de abril de 1993. Mas se manteve a repblica presidencialista e a deciso plebiscitria e a vedao, na Constitui-o, a emendas que visem abolir a separao dos poderes, afastam, agora, qualquer tentativa de seguir a famlia de textos constitucionais de matriz portuguesa.

    9. Ponto fundamental, ento, desses textos, diz respeito s atribui-es e poderes do Presidente da Repblica e do Primeiro Ministro, estampadas nas constituies dos pases africanos de lngua oficial portuguesa, o que foi devidamente posto em evidncia pelos ilustres comentaristas.

    Alteraes, nessa relao e repartio de poderes podem ser verifica-das, por exemplo, em vrias dessas constituies, mormente nas emendas cons-titucionais, em relao s cartas originrias, por exemplo, nas constituies de So Tom e Prncipe, Guin-Bissau, etc. Nesse mesmo sentido encontram-se em tramitao alteraes constituio de Angola. De tempos em tempos surgem tenses entre o Presidente da Repblica e o Primeiro ministro.

  • 18 Fernando A. A. Mouro, Walter C. Porto, Thelmer M. Mantovanini

    O problema , nitidamente, de origem poltica. Podemos at encon-trar alguma similitude com a histria constitucional brasileira, no que toca diviso de poderes entre o Imperador e o Primeiro Ministro, mormente o exer-ccio do poder moderador por parte do imperador.

    Em alguns pases africanos, como no caso de Angola, o Presidente da Repblica obrigado, a bem da boa governao, a exercer o poder mo-derador, quer no campo das instituies previstas na constituio, quer em relao ao exrcito e sociedade civil. H que entender essas constituies como resultados de um longo processo poltico, que nasce com as lutas de libertao, com a independncia, com a passagem do partido nico que conduziu a luta pela independncia ao multipartidarismo, tudo isto em um clima de tenses internas, maiores ou menores, consoante o pas, ao que se acresce uma certa instabilidade regional. Com a adoo de mecanismos de segurana militar no campo regional, este problema comea a encontrar soluo, afastando as incertezas decorrentes das intervenes externas. O processo poltico destes pases mostra que as mudanas constitucionais tm carter gradual.

    O processo evolutivo dos atos legislativos em Angola, por exemplo, mostra claramente o tratamento adotado.

    Vejamos: a lei constitucional de 11 de novembro de 1975 (inde-pendncia nacional), colocou o MPLA como elemento estruturante do poder poltico o que comeou a ser alterado pela reviso constitucional de 07 de fevereiro de 1978, com as alteraes introduzidas em setembro de 1980, quando o governo perdeu a funo legislativa, a qual passou, em exclusivo, para a Assemblia do Povo, hoje Parlamento (atualmente a funo legis-lativa , em alguns casos compartilhada pelo governo), citando-se ainda a Lei no 12/91, de 6 de maio e a Lei no 23/92, de 16 de setembro, criando condies constitucionais para a emergncia do pluripartidarismo e, dentro do mesmo quadro, as alteraes, agora em estudo, visando alteraes na constituio do pas.

    Sem uma anlise profunda e cuidadosa do processo poltico na primeira fase da independncia, do processo evolutivo da fase do partido nico para o pluripartidarismo, do quadro regional em que cada um desses paises se insere, alm das alteraes da relao entre o Governo e o poder local - veja-se, por exemplo, a criao de um Estatuto Especial para a Pro-

  • As Constituies dos Pases de Lngua Portuguesa Comentadas 19

    vncia de Cabinda (resultante do memorando de entendimento para a paz e reconciliao na Provncia de Cabinda - agosto de 2006) - no poss-vel proceder anlise dessas constituies, no cabendo proceder a estudos comparativos, entre estas e de pases mais antigos, mais formalsticas do que substantivas.

  • . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

    A Constituio de Angola: Uma Anlise Histrico-Jurdica

    FERNANDO JOS DE FRANA DIAS VAN-DNEM 1

    CASO nico na histria dos povos colonizados de frica, Angola ace-deu independncia a 11 de Novembro de 1975 na sequncia da declarao de independncia proclamada pelo Movimento Popular de Libertao de An-gola (MPLA), um dos trs movimentos de libertao reconhecidos pela ONU e pela OUA, fracassadas que foram as tentativas feitas pela potncia colonial Portugal no sentido de pr em prtica um processo de transio para a independncia.

    A frmula, gizada pelos Acordos de Alvor de 15 de Janeiro de 1975, preconizava a criao de um governo transitrio englobando os trs movimen-tos de libertao e aprazada a data para a proclamao da independncia a 11 de Novembro de 1975. Infelizmente, a frmula no vingou porque, quase logo a seguir, deflagrou a guerra entre os movimentos de libertao, facto exa-cerbado pelos ingredientes da guerra fria: a FNLA, que j recebia ajuda secreta dos Estados Unidos, viu essa assistncia aumentar desde finais de Janeiro de 1975.2 Meses mais tarde, esse mesmo Movimento recebe ajuda multiforme e

    1 Membro da Comisso Constitucional.2 Cf. Anstee, Margareth Joan, rfos da Guerra Fria, Porto: Campo das Letras, 1977,

    p. 34.

    1. Antecedentes histricos

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    sobretudo militar por parte do Governo do Zaire, sob a direco do Presidente Mobutu, da frica do Sul que se juntam ajuda generosa j prodigada pelos Estados Unidos da Amrica. A UNITA, por sua vez, recebe ajuda destes dois ltimos pases. O MPLA, que desde os tempos da luta armada recebera ajuda em armamento da Unio Sovitica, vai ver essa ajuda incrementada com a assistncia tcnica militar fornecida por Cuba.

    Num esforo concertado pelos aliados da FNLA e da UNITA, An-gola invadida, em Outubro de 1975 pelas foras sul africanas provenientes da Nambia e, ao Norte, pelas foras do exrcito zairense. As primeiras avan-aram sobre a capital, e quedaram-se a 100 quilmetros a sul de Luanda, enquanto que as ltimas se encontravam a escassos 60 km. a norte de Luanda. Nesse contexto, foi decisiva a interveno das foras cubanas., cujos primeiros contigentes comeavam a chegar Angola.

    Vivia-se pois em Angola, nas vsperas da data fixada para a inde-pendncia, um estado de guerra civil generalizado.

    Os representantes das autoridades coloniais, impotentes para pr cobro a tal estado de coisas, abandonaram o pas no dia 10 de Novembro de 1975.O MPLA proclama, em Luanda, s 0 horas do dia 11, pela voz do Dr. Agostinho Neto, seu Presidente, a Repblica Popular de Angola, enquanto que a UNITA e a FNLA proclamam, na mesma data, a Repblica Democrtica de Angola, com sede no Huambo, cuja existncia foi efmera. Por isso dissemos acima que o caso de Angola era nico nos anais da ascenso independncia: ela no derivou da transferncia de poderes da potncia colonial para o povo colonizado. Foi um dos movimentos de libertao, o MPLA, que proclamou a independncia.

    O processo constitucional angolano que se inicia nessa altura3 re-flecte, pois, ainda que indirectamente, a conjuntura poltica interna e externa reinante em Angola.

    3 O primeiro texto constitucional angolano designado Lei Constitucional da Rep-blica Popular de Angola foi aprovado, por aclamao, s 24 horas do dia 10 de Novembro de 1975, pelo Comit Central do MPLA. Para o texto, consultar Dirio da Repblica, I srie, de 11 de Novembro. Inclui rectificaes publicadas no dia 12 de Novembro de 1975.

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    A actual Lei Constitucional Angolana foi aprovada pela lei n. 23/92 de 16 de Setembro (Lei de reviso constitucional) e dispe, no seu artigo 14., que a Lei Constitucional da Repblica de Angola vigorar at entrada em vigor da Constituio de Angola, aprovada pela Assembleia Nacional nos termos previstos pelo artigo 158. e seguintes da Lei Constitucional.4

    A Assembleia Nacional deveria ser o rgo legislativo que sairia das eleies de 29 e 30 de Setembro de 1992 e a ela competiria elaborar, em conformidade com as disposies acima citadas, o texto da nova Constituio. Isto significa dizer que o legislador de 1992, quis, com a lei de reviso consti-tucional impor ao Parlamento, limites ao seu poder de iniciativa em matria de reviso da lei fundamental.5 A nova lei fundamental ter que ter a forma de Constituio, com tudo o que esse conceito implica em matria de direito. Assim, alm de fixar a forma de organizao poltica do Estado, o novo figu-rino da lei fundamental deve ter um processo prprio de alterao. O rgo legislativo tem que ter, nesta ptica poderes constituintes. Passar-se- ento, de uma constituio flexvel, como o caso com as leis constitucionais, para uma constituio rgida.

    Infelizmente, a Assembleia Nacional, embora possuindo poderes constituintes, ainda no deu por terminada a tarefa de elaborao de uma Constituio, acometida uma Comisso Constitucional eleita no seu seio em 1998.

    4 Esta era a nova designao do Parlamento que, at a, se designara Assembleia do Povo. Atente-se ao prembulo da lei n. 23/92 de 16 de Setembro e aos artigos 3., 12. e da mesma lei.

    5 Sobre a distino entre os conceitos de Constituio e de leis constitucionais e os seus respectivos processos de reviso, consulte-se, entre outros, Caetano, Marcello, Manual de Cincia Poltica e Direito Constitucional, 6. Coimbra: Almedina, tomo I (reimpresso), 1996, p. 342/344; Duverger, Maurice; Institutions Politiques et Droit Constitutionnel, Paris: P.U.F., Paris, 1968, p.2; Favoreu, Louis Gaa, Patrick Ghevon-tian, Richard Mestre, Jean-Louis Pfersmann, Otto Roux e Andr Scoffonni. Droit Constitutionnel, Paris: Prcis Dalloz, 2 edio, 1999, p. 92 e seguintes; Gonzales Casanova, J.A., Teora del Estado y Derecho Constitucional, 2 edicin revisada, Bar-celona: Vicens Universidad, 1982, p. 194 e seguintes.

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    A anlise que iremos fazer da lei fundamental de Angola, basear-se-, por conseguinte, na Lei Constitucional aprovada pela lei n. 23/92 de 16 de Setembro.

    2. Estrutura da Lei Constitucional

    A Lei Constitucional angolana conta 166 artigos, divididos por 7 ttulos, cada um subdividido em captulos, com excepo dos dois primeiros, e os captulos, por sua vez, em seces.

    Ao contrrio do que se passa com muitos textos fundamentais, a Lei Constitucional angolana no tem prembulo propriamente dito, devendo consi-derar-se como tal, o prprio texto da lei n. 23/92 que a aprova.

    Nela se encontram explicadas as razes que motivaram a aprovao da nova lei constitucional, mas tambm as principais alteraes que ela intro-duz, a data de entrada em vigor alm de resolver um certo nmero de aspectos que careciam de tratamento e que visavam evitar rupturas no ordenamento constitucional.

    Assim, l-se no prembulo da lei n. 23/92 que as alteraes Lei Constitucional introduzidas atravs da Lei n. 12/91 destinaram-se princi-palmente criao das premissas constitucionais necessrias implantao da democracia pluripartidria, a ampliao do reconhecimento e garantias dos direitos e liberdades fundamentais dos cidados, assim como a consagrao constitucional dos princpios basilares da economia de mercado.

    Reconhecendo que a lei 12/91 de Maro de 1991 no tinha esgota-do o tratamento das questes que o novo quadro poltico exigia e tendo em con-siderao o facto que, nesse entretanto haviam sido assinados, a 31 de Maio de 1991, os Acordos de Paz para Angola preconizando as primeiras eleies gerais multipartidrias para a eleio dos deputados e do Presidente da Republica, por sufrgio universal directo e secreto, o legislador estimou imprescindvel a realizao de uma nova lei de reviso constitucional virada essencialmente para a clarificao do sistema poltico, separao de funes e interdependncia dos rgos de soberania bem como para a explicitao do estatuto e garantias da Constituio, em conformidade com os princpios j consagrados de edificao em Angola dum Estado democrtico de direito.

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    Alm disso, a aprovao da lei n. 23/92 (lei de reviso constitucional) tinha por objectivo, oferecer Nao em geral e aos membros da nova Assembleia e ao Presidente da Repblica assim como aos outros rgos de soberania, um texto constitucional que pudesse colmatar as lacunas que pudessem surgir na aplicao das normas constitucionais vigentes, at aprovao da Constituio preconizada pela lei n. 23/92 de 16 de Setembro, contribuindo assim para uma transio suave do antigo para o novo regime, a estabilidade do pas e a consolidao da paz e da democracia em Angola.

    nessa lei preambular que o legislador nos d conta igualmente da passagem da designao do Estado, de Repblica Popular de Angola para Repblica de Angola e da supresso do qualificativo Popular da denominao dos Tribunais.

    O ttulo referente aos direitos e deveres fundamentais sofre tam-bm alteraes no sentido do reforo do reconhecimento e garantias dos direitos e liberdades fundamentais, com base nos principais tratados sobre os direitos humanos a que Angola j aderiu.

    O ttulo relativo aos rgos do Estado sofre profundas alteraes de maneira a pr-se em realce a clara definio de Angola como um Estado democrtico, de direito, assente num modelo de organizao do Estado baseado na separao de funes e interdependncia dos rgos de soberania e num sis-tema poltico semi-presidencialista que reserva ao Presidente da Repblica um papel activo e actuante.

    Tambm no mesmo ttulo, alteraes so introduzidas no sentido de uma melhor organizao e um mais crescente protagonismo dos rgos da administrao da justia, e uma cada vez maior dignificao dos seus magis-trados e membros.

    Alm disso, a criao de um Tribunal Constitucional, encarregue da fiscalizao da Constituio constitui um dos elementos inovadores da ac-tual Lei Constitucional, assim como se regula o processo, competncia e limites da reviso constitucional.

    3. Princpios fundamentais

    Tal como acontece com outras constituies, a Lei Constitucional angolana escalpeliza nos seus 17 primeiros artigos, os princpios fundamentais

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    que servem de trave mestra ao edifcio constitucional angolano. Definem e caracterizam o Estado angolano e enumeram as suas principais opes poltico-constitucionais.

    Nesse contexto, definem as grandes decises polticas que os ango-lanos adoptam para a sua convivncia poltico- social dentro do quadro do Estado-Nao, em primeiro lugar e, em segundo lugar definem a partir de que realidades sociais se forma o Estado e, finalmente nos indicam quais os objectivos principais e ltimos a alcanar pela comunidade estatal, luz dos princpios declaratrios includos no prembulo. (lei preambular).

    Estes princpios formam, como escrevem Canotilho e Vital Morei-ra6, nas suas mltiplas dimenses e desenvolvimentos, o cerne da Constituio e consubstanciam a sua identidade intrnseca.

    Na medida em que se encontram em filigrana, em quase todo o corpo da Lei Constitucional fornecendo por vezes as orientaes, por outras os limites de actuao dos rgos do Estado, os princpios fundamentais fornecem, ao mesmo tempo limites materiais de reviso da lei constitucional. As matrias que integram esses princpios so, a maior parte das vezes, matrias indispon-veis, embora nem todos gozem do mesmo grau de proteco.

    Assim, por exemplo, o artigo 159. da Lei Constitucional estipula que: As alteraes lei Constitucional e a aprovao da Constituio de An-gola tm de respeitar o seguinte:

    a) a independncia, a integridade territorial e unidade nacional; b) os direitos e liberdades fundamentais e as garantias dos cidados, c) o estado de direito e a democracia multipartidria;d) o sufrgio universal, directo secreto e peridico na designao dos titulares electivos dos rgos de soberania e do poder popular;e) a laicidade do Estado e o princpio da separao entre o Estado e as igrejas;

    6 Gomes Canotilho, J.J., Vital Moreira, Fundamentos da Constituio, Coimbra: Coimbra Editora, 1991, p. 71.

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    f ) a separao e interdependncia dos rgos de soberania e a independncia dos tribunais.

    Trata-se por conseguinte de limites reviso constitucional em razo das matrias. Nesse contexto, dever-se-ia incluir expressamente, como matria no disponvel para reviso constitucional, a forma republicana do Estado.

    Por outro lado, a prpria Lei Constitucional reconhece todavia, no seu artigo 160., limites de reviso constitucional, em razo do momento: du-rante a vigncia do estado de stio ou do estado de emergncia, no pode ser realizada qualquer alterao Lei constitucional.

    3.1. A nomenclatura dos princpios fundamentais -

    O princpio da independncia

    O artigo 1. da lei Constitucional estipula que a Repblica de Angola uma Nao soberana e independente...

    Tal como redigido, esta disposio d a entender que o legislador quis resolver, liminarmente, de maneira inequvoca, o problema da caracteri-zao do Estado angolano.

    Em primeiro lugar, define a forma de regime poltico: o Estado de Angola uma Repblica. A forma republicana , como se disse atrs, neste contexto, um dos limites de reviso constitucional.

    Em segundo lugar, Angola , do ponto de vista jurdico, um Estado-Nao, o que posterga, sem rodeios, quaisquer consideraes de ordem sociol-gica que o termo Nao possa implicar. O pas, sendo um mosaico de etnias e culturas diversas, quis o legislador afastar, demble qualquer tendncia de aproveitamento oportunstico de tais elementos e isto, com o objectivo de preservar a unidade e melhor cimentar o tecido nacional. O legislador consti-tucional no exclui nem desvaloriza tais elementos, antes pelo contrrio. Reala o seu papel na promoo e intensificao da solidariedade econmica social e cultural entre todas as regies da Repblica de Angola, no sentido do desenvol-vimento comum de toda a Nao angolana (artigo 7. da L.C.).

    Em terceiro lugar, o Estado define-se como sendo um Estado so-berano e independente. Ora, estes dois elementos no passam de dois aspectos complementares de uma mesma realidade jurdica. O moderno conceito de soberania significa que, do ponto de vista jurdico, no h autoridade alguma

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    que lhe possa suplantar. Isto quer dizer, que, no interior das suas fronteiras, o Estado tem o monoplio do exerccio do poder, com a excluso de qualquer outro que lho queira disputar. Encarado todavia, sob o ponto de vista das suas relaes com outros Estados membros da comunidade internacional, essa sobe-rania significa independncia porque numa sociedade onde reina o princpio da igualdade soberana, essa qualidade s pode significar que, nesse quadro, a soberania sinnimo de independncia. Todavia, como nenhum Estado vive isolado, infere-se que, independncia implica necessariamente cooperao. Da que alguns autores considerem a sociedade internacional como uma sociedade de cooperao ao contrrio da sociedade interna que uma sociedade de su-bordinao. A soberania ou independncia nacional constitui assim o primeiro princpio fundamental da Lei Constitucional.

    Mas a anlise do princpio de independncia no se queda na caracterizao do Estado angolano. Fixa-lhe ao mesmo tempo, um objectivo fundamental que o da construo de uma sociedade livre, democrtica, de paz, de justia e progresso social. Por isso dissemos acima que os princpios fundamentais nos indicavam tambm quais os objectivos principais e ltimos a alcanar, luz dos princpios declaratrios enunciados no prembulo.

    O Princpio Democrtico. O Estado democrtico de Direito

    A L.C. consagra no seu artigo 2., o princpio democrtico, na me-dida em que estipula que: A Repblica de Angola um Estado democrtico de direito, etc.

    Ora, esta expresso contempla dois aspectos essenciais.O primeiro diz respeito democracia como sistema de governo,

    quer dizer, refere-se ao sistema de governo exercido pelo povo atravs dos seus representantes.Esta ideia consolidada com o que vem estipulado no artigo 3., n1. que preconiza o princpio da soberania popular, cuja redaco a seguinte: A soberania reside no povo, que a exerce segundo as formas pre-vistas na presente Lei. Como tal, o princpio democrtico no s sinnimo de estrutura ou organizao do poder poltico em Angola, mas serve tambm de modo de aferio da legitimidade do poder. O segundo aspecto refere-se expresso Estado de direito.

    Os constitucionalistas modernos estimam que o Estado de direito aquele que repousa sobre trs pilares fundamentais: o enquadramento

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    jurdico do poder, isto , a existncia de uma Constituio que sirva de pirmide ao edifcio normativo do Estado; o controlo do poder, o que pres-supe que o sistema normativo preveja meios de controlo do exerccio do poder pelos cidados, que extravasem o estreito quadro do controlo eleitoral peridico, tais como a existncia de jurisdies constitucionais. Em Angola, embora a L.C. o preveja, ainda no foi institudo o Tribunal Constitucio-nal (artigo 134. e 135.), esta funo sendo exercida ainda pelo Tribunal Supremo (art. 6. da lei n. 23/92 de 16 de Setembro, a lei de reviso constitucional ou lei preambular); finalmente, o Estado de direito ser aquele onde se encontre institudo o princpio da separao de poderes, quer a nvel horizontal, i.e. entre os vrios rgos do Estado, quer a nvel vertical, i.e. entre os rgos centrais e os seus representantes na periferia do poder central. (autoridades desconcentradas).

    Outros princpios estruturantes

    Alm destes princpios fundamentais que so, por assim dizer, os que mais contribuem para a caracterizao do Estado angolano, outros h no me-nos importantes e que acabam por dar uma ideia mais correcta da verdadeira estrutura do Estado angolano. So eles:

    o princpio da soberania popular (art. 3.); o princpio da participao dos partidos polticos na vida poltica

    servindo de veculos da expresso da vontade dos cidados na vida poltica e na expresso do sufrgio universal (artigo 4.);

    o princpio da unidade territorial do Estado (artigo 5.);o princpio da soberania do Estado sobre o territrio e os espaos

    jurdicos assimilados (artigo 6.);o princpio da lacidade do Estado (artigo 8.);a forma de organizao econmica do Estado (art.s 10., 11. e

    12.) o princpio do respeito pelas disposies da Carta das Naes Unidas,

    da OUA, do Movimento dos No Alinhados e do estabelecimento de relaes de cooperao com base nos princpios do Panch Sila (artigo 16.) e, finalmente, o princpio da no adeso aos pactos e organizaes militares (artigo 17.).

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    4. Os direitos e deveres fundamentais

    A actual Lei Constitucional angolana inclui no seu articulado, uma srie de disposies que lidam com os direitos e deveres fundamentais. So, ao todo, 34 artigos (do 18. ao 52.) insertos no ttulo II, o que representa um pouco mais do que um quinto do nmero total das suas disposies (166 artigos).

    Comparados com os 20 artigos da L.C. de 1991 (Lei 12/91) e com os 13 da L.C. anterior, pode afirmar-se que o legislador constitucional quis romper com o modelo constitucional da I Repblica no que diz respeito ao cardpio dos direitos e deveres fundamentais.

    H na Constituio angolana, as cinco categorias de direitos fun-damentais hoje reconhecidas: os direitos-liberdades, os direitos de participa-o, os direitos de crdito, os direitos garantia e o direito igualdade.

    Dentre os direitos-liberdade, h em primeiro lugar, verbi gratia, o consignado no artigo 20. que estipula que: o Estado protege e respeita a pessoa e dignidade humanas. Alm disso, h a assinalar o artigo 22. , n. 1. que probe a pena de morte, o artigo 23. que dispe que nenhum cidado pode ser submetido a tortura nem a outros tratamentos ou posies cruis, desumanos ou degradantes, o artigo 32. que garante a liberdade de expresso, de reunio, de manifestao, de associao e todas as demais formas de expresso, o artigo 33. que garante o direito organizao profissional e sindical, o artigo 36. sobre a liberdade de imprensa, o artigo 45,. que reconhece a liberdade de conscincia e de crena, etc., etc..

    Um exemplo dos direitos de participao fornecido pelo artigo 28., n. 1. da L.C. que estipula que: Todos os cidados, maiores de dezoito anos, com excepo dos legalmente privados dos direitos polticos e civis, tm o direito e o dever de participar na vida pblica...

    Entre os direitos de crdito reconhecidos pela L.C. angolana figu-ram, entre outros, o direito de assistncia mdica e medicamentosa (artigo 47.), o direito instruo, cultura e ao desporto (artigo 49.), o direito ao emprego (artigo 46.).

    A quarta categoria de direitos e deveres fundamentais, i.e., no captu-lo dos direitos garantia, temos: - o direito a ser apresentado perante o juiz (arti-go 38.); o direito de defesa (artigos 36., 38., 39., 40. 41. 42. e 43.).

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    Finalmente, o direito igualdade reconhecido, entre outros, nos artigos 18. e 29., n. 2. da L.C.

    5. Os rgos do Estado

    95 artigos compem o ttulo III da L.C., dedicado aos rgos de soberania.

    De acordo com o nmero 1. do artigo 53., so rgos de soberania, o Presidente da Repblica, a Assembleia Nacional, o Governo e os Tribunais.

    Entre os princpios que norteiam a organizao e o funcionamento dos rgos do Estado, figuram os seguintes (artigo 54. L.C):

    a submisso de todos os rgos do Estado lei (alnea a);separao e interdependncia de funes (alnea b);os titulares de cargos polticos respondem civil e criminalmente pelas

    aces e omisses que pratiquem no exerccio das suas funes, nos termos da lei.Por conseguinte, a relao entre os rgos de soberania norteada

    pelos princpios da separao de poderes e o da interdependncia funcional.

    5.1. O Presidente da Repblica

    rgo individual de soberania, o Presidente da Repblica exerce, no quadro da actual L.C., um determinado nmero de competncias que fa-zem dele o rgo central do Estado.

    Nesse contexto, ele o Chefe de Estado, simboliza a unidade da Nao, representa a Nao no plano interno e internacional, assegura o cum-primento da Lei Constitucional e o Comandante-em-Chefe das Foras Ar-madas Angolanas (artigo 56., n.1).

    Alm disso, a ele compete definir a orientao poltica do pas, assegurar o funcionamento regular dos rgos do Estado e garantir a indepen-dncia nacional e a integridade territorial do pas. (artigo 57., 2.)

    5.2. Mandato e modo de designao

    O Presidente da Repblica eleito, por sufrgio universal directo e secreto pelos cidados residentes em territrio nacional, para um mandato de 5 anos. A eleio desenrola-se, num processo a duas voltas. No obtendo nenhum

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    dos candidatos a maioria dos votos vlidos na primeira, o processo continua na segunda com os dois mais votados, vencendo aquele que obtiver o maior nme-ro de votos. (artigo 57.). O Presidente da Repblica pode ser reeleito para mais dois mandatos consecutivos ou interpolados.

    O mandato do Presidente da Repblica comea aps a sua tomada de posse perante o Tribunal Supremo e termina com a tomada de posse do novo Presidente.

    5.3. Condies de elegibilidade

    O candidato ao cargo de Presidente da Repblica deve preencher os requisitos seguintes:

    Ser maior de 35 anos, ter a nacionalidade angolana de origem e gozar plenamente dos seus direitos civis e polticos. (artigo 58.)

    Ter sido proposto por um partido poltico ou coligao de partidos legalmente constitudos ou beneficiar do apoio de um mnimo de cinco mil ou um mximo de dez mil cidados eleitores.(artigo 60.).

    5.4. Competncias

    As competncias do Presidente da Repblica devem ser vistas sob trs ngulos. O primeiro, na sua qualidade de Chefe de Estado, o segundo, na sua qualidade de Presidente do Conselho de Ministros e o terceiro na sua capacida-de de Comandante- em- Chefe das Foras Armadas Angolanas.

    O Presidente da Repblica tem um rol de competncias, algumas prprias e outras que ele tem que exercer em colaborao com os outros rgos de soberania ou pelo menos auscult-los.

    5.4.1. As competncias do Presidente da Repblica na sua

    qualidade de Chefe de Estado

    Como Chefe de Estado, o Presidente da Repblica tem as competn-cias que normalmente so reconhecidas aos outros chefes de Estado em regime semi-presidencial. Elas consistem, no essencial no seguinte:

    nomear o Primeiro Ministro, ouvidos os Partidos polticos represen-tados na Assembleia Nacional (art. 66., a);

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    nomear e exonerar os demais membros do Governo e o Governador do Banco Nacional de Angola, sob proposta do Primeiro Ministro (art. 66., b);

    pr termo s funes do Primeiro Ministro e demitir o Governo aps consulta ao Conselho da Repblica (art. 66., c);

    presidir ao Conselho de Ministros (art. 66., d);decretar a dissoluo da Assembleia Nacional aps consulta ao Pri-

    meiro Ministro, ao Presidente da Assembleia Nacional e ao Conselho da Rep-blica (art. 66., e);

    presidir ao Conselho da Repblica (art. 66., f );nomear e exonerar os embaixadores e aceitar as cartas credenciais

    dos representantes diplomticos estrangeiros (art. 66., g);convocar os referendos, nos termos previstos no art. 73. da L.C.

    (art. 66. o);declarar a guerra e fazer a paz, ouvido o Governo e aps autoriza-

    o da Assembleia Nacional (art. 66. , p);indultar e comutar penas (art. 66., q);declarar o estado de stio ou de emergncia (r);assinar e promulgar as leis aprovadas pela Assembleia Nacional e os

    decretos-lei aprovados pelo Governo (art. 66., s);dirigir mensagens Assembleia Nacional e convoc-la extraordina-

    riamente (art. 66., t);conferir condecoraes (art. 66., v);ratificar os tratados internacionais depois de devidamente aprova-

    dos pela Assembleia Nacional (art. 66., x); requerer ao Tribunal Constitucional a apreciao preventiva ou a

    declarao da inconstitucionalidade de normas jurdicas (art. 66., y).

    5.4.2. As competncias do Presidente da Repblica como

    chefe do Governo

    O Presidente da Repblica, no exerccio das funes de Presidente do Conselho de Ministros tem a competncia de convocar este rgo, fixar a sua agenda e dirigir e orientar as suas reunies e sesses (art. 68. a) e b)).

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    Neste contexto, convm desde j assinalar que a L.C. angolana faz uma distino entre o Governo (art.105. e seguintes), constitudo pelo Primei-ro Ministro, pelos Ministros, pelos Secretrios de Estado e pelos Vice- Ministros e o Conselho de Ministros, que no inclui os Vice-Ministros, podendo estes no entanto serem convocados a nele participar (art. 108. n. 3).A presidncia do Governo tambm deferida ao Presidente da Repblica.

    5.4.3. As competncias do Presidente da Repblica como

    Comandanteem-Chefe das Foras Armadas Angolanas

    O Presidente da Repblica como Comandanteem-Chefe das For-as Armadas Angolanas tem competncia para presidir ao Conselho de Defesa Nacional (art. 66. alnea l) e para nomear o Chefe do Estado Maior Gene-ral das Foras Armadas e seus adjuntos, assim como os Chefes do Estado Maior dos diferentes ramos (art. 66, alnea m).

    Compete ainda ao Presidente da Repblica, na sua qualidade de Chefe de Estado, nomear os oficiais generais das Foras Armadas, ouvido o Conselho de Defesa Nacional.

    5.4.4. Outras competncias do Chefe de Estado

    O Chefe de Estado angolano tem ainda a competncia de nomear os juizes do Tribunal Supremo, nomear e exonerar o Procurador Geral da Repu-blica e os seus adjuntos e nomear os membros do Conselho Superior da Magis-tratura Judicial e do Ministrio Pblico (artigo 66., alneas h, i, j).

    5.5. Os poderes excepcionais do Presidente da Repblica

    A L. C. angolana confia ao Presidente da Repblica poderes excep-cionais no sentido de lhe permitir tomar as medidas que julgar convenientes, em perodo de crise grave, nomeadamente, sempre que as instituies da Re-pblica, a independncia da Nao, a integridade territorial ou a execuo dos seus compromissos internacionais forem ameaados por forma grave e imediata e o funcionamento dos poderes polticos constitucionais forem interrompidos . (artigo 67., 1.).

  • As Constituies dos Pases de Lngua Portuguesa Comentadas 35

    Atravs de mensagem, o Presidente da Repblica informar de todos esses factores Nao. (artigo 67., 2.).

    5.6. Impedimento e vagatura

    No caso do Presidente da Repblica se encontrar impedido, tempo-rariamente, de exercer as suas funes, substitui-o, nas suas ausncias e impe-dimentos, o Presidente da Assembleia Nacional. Este, obrigado a suspender o seu mandato de Presidente e de Deputado e, encontrando-se este tambm impedido, pelo seu substituto, i. e., o Vice-Presidente da Assembleia Nacional. (artigo 64., 1. e 2.).

    Caso o impedimento seja definitivo, declarar-se- a vagatura do cargo e o Presidente interino dever organizar eleies nos noventa dias poste-riores data da vagatura (artigo 61.,2.).

    5.7. Irresponsabilidade poltica do Presidente da Repblica

    Nos termos do n. 1. do artigo 65. da L.C., o Presidente da Rep-blica no responsvel pelos actos praticados no exerccio das suas funes, salvo em caso de suborno ou de traio Ptria.

    Neste ltimo caso, a Assembleia Nacional exerce a iniciativa do processo de acusao, mediante proposta de um quinto e deliberao aprovada por maioria de dois teros dos deputados. O Tribunal Supremo realizar o respectivo julgamento. (artigo 65. n.2.). A sano de tais actos, em caso de condenao ser a destituio do cargo e impossibilidade de candidatura para um outro mandato.

    5.8. rgos de consulta do Presidente da Repblica

    No domnio da aco poltica, o Presidente da Repblica dispe de um rgo de consulta que o Conselho da Repblica. Composto pelo Presidente da Assembleia Nacional, pelo Primeiro Ministro, pelo Presidente do Tribunal Constitucional, pelo Procurador Geral da Repblica, pelos antigos Presidentes da Repblica, pelos Presidentes dos Partidos Polticos com assento no Parla-mento e por dez cidados designados pelo prprio Presidente da Repblica, este rgo pronuncia-se sobre assuntos importantes da vida da Nao, tais como a

  • 36 Fernando A. A. Mouro, Walter C. Porto, Thelmer M. Mantovanini

    dissoluo da Assembleia Nacional, a demisso do Governo e sobre os actos do Presidente da Repblica interino, etc, etc. (artigo 75. L.C.)

    5.9. Relaes do Presidente da Repblica com os outros

    rgos de soberania

    Apesar da separao de poderes consagrada pela Lei Constitucional, o Presidente da Repblica mantm relaes de interdependncia funcional com os outros rgos de soberania, nomeadamente com o Governo e com a Assem-bleia Nacional. (artigo 54. alnea c)).

    5.10. Relaes do Presidente da Repblica com o Governo

    O Presidente da Repblica o verdadeiro motor do Executivo, na medida em que a ele compete definir a orientao poltica do pas e ao Go-verno conduzir a poltica geral do pas.Este, o rgo superior da adminis-trao pblica.

    Alm disso, o Presidente da Repblica preside tanto s reunies do Conselho de Ministros, como as do Governo, assim como fixa as respectivas ordens de trabalho e orienta os trabalhos destes respectivos rgos.

    Em conformidade com o artigo 106. da L.C., a composio do Go-verno fixada por decreto-lei. O nmero e a designao dos Ministros, Secret-rios de Estado e Vice-Ministros sero determinados pelos respectivos decretos de nomeao dos respectivos titulares.

    Por conseguinte, o Governo compreende todos os titulares de cargos polticos incluindo o Primeiro Ministro, os Ministros, os Secretrios de Estado e os Vice-Ministros. Estes ltimos, embora faam parte do Governo, no so to-davia membros do Conselho de Ministros, no tm funes prprias, exercendo somente aquelas que lhes forem delegadas pelos titulares das respectivas pastas.

    Embora a L.C. no o defina expressamente, na prtica, reconhece-se ao Presidente da Repblica, uma espcie de domnio reservado no que toca algumas actividades do Executivo: Defesa e Relaes Exteriores.

    Esta concluso decorre da leitura combinada das disposies do ar-tigo 56., n s 1. e 2., do artigo 66. alneas a, c, d, g, l, m, n, e p, assim como do artigo 68. e 70., todos da L.C.

  • As Constituies dos Pases de Lngua Portuguesa Comentadas 37

    5.11. Relaes do Presidente da Repblica com a Assembleia Nacional

    Do facto mesmo da sua eleio por sufrgio universal, directo e se-creto, tal como a Assembleia Nacional, o Presidente da Repblica tem, todavia, um certo ascendente sobre esta ltima.

    Em primeiro lugar, porque a L.C. reconhece ao P.R. o direito de dirigir mensagens Assembleia Nacional e convoc-la extraordinariamente. (artigo 66. alnea f ).

    Em segundo lugar, o Presidente da Repblica tem o poder de dis-soluo da Assembleia Nacional, embora a L.C. lhe imponha a obrigao de consultar o Primeiro Ministro, o Presidente da Assembleia Nacional e o Conse-lho da Repblica. Todavia, esses pareceres no so de modo algum vinculativos na medida em que o Presidente da Repblica o garante do normal funciona-mento das instituies do pas.

    Em terceiro lugar, existe uma cooperao necessria entre os dois rgos de soberania, no processo de aprovao das leis. Compete com efeito ao Presidente da Repblica, assinar e promulgar as leis aprovadas pelo Par-lamento.

    Em quarto lugar, o Presidente da Repblica quem ratifica os tra-tados internacionais aprovados pelo Parlamento, procedimento que contrrio ao da L.C. anterior em que essa competncia pertencia Assembleia do Povo. Neste contexto, vale lembrar que a antiga Assembleia do Povo que vigorou at introduo do multipartidarismo em Angola, era presidida pelo prprio Presidente da Repblica.

    Finalmente, o Presidente da Repblica pode, sob proposta do Go-verno ou da Assembleia Nacional, submeter a referendo projectos de lei ou de ratificao de tratados internacionais que, desde que no sejam contrrios Lei Constitucional, possam ter incidncias sobre a organizao dos poderes pblicos e o funcionamento das instituies. (artigo 73., 1.).

    6. A Assembleia Nacional

    rgo colectivo de soberania, a Assembleia Nacional a assem-bleia representativa de todos os angolanos e exprime a vontade soberana do povo angolano.(artigo 76.,1.).

  • 38 Fernando A. A. Mouro, Walter C. Porto, Thelmer M. Mantovanini

    6.1.Composio, modo de eleio e elegibilidade

    Composto por 223 deputados, dos quais 90 so eleitos pelos 18 cr-culos eleitorais provinciais, razo de 5 por cada um deles independente-mente da extenso do seu territrio e da sua populao -, 130 deputados so eleitos pelo crculo eleitoral nacional, e 3 representando as comunidades ango-lanas no exterior do pas, o Parlamento angolano - a Assembleia Nacional - monocamaral. (artigo 79.,1. e 2. .

    Apesar da maneira diversa como uns e outros so designados pelo povo, os deputados so eleitos, segundo um sistema de representao proporcio-nal, por sufrgio universal, igual, directo e secreto, por proposta dos partidos polticos ou coligao de partidos e tm, no dizer da prpria Lei Constitucio-nal, um mandato de carcter nacional.

    So inelegveis para o mandato de deputados (artigo 82. 2., a, e b)., os Magistrados judiciais e do Ministrio Pblico e os militares e os mem-bros das foras militarizadas em servio activo.

    6.2. Mandato, exerccio do cargo e incompatibilidades dos deputados

    O mandato dos deputados de quatro anos.Os deputados so considerados como profissionais, exercendo a sua

    actividade em tempo integral, podendo no entanto exercer funes de docncia e actividades de investigao cientfica.

    Alm disso, o cargo de deputado incompatvel com o exerccio de alguns cargos como os de membro do governo, ou empregados remunerados por empresas estrangeiras ou por organizaes internacionais. O cargo de de-putado ainda incompatvel com o exerccio do cargo de Presidente do Con-selho de Administrao de sociedades annimas, scio gerente de sociedades por quotas, Director Geral e Director Geral adjunto de empresas pblicas.

    6.3. Atribuies da Assembleia Nacional

    O Parlamento a assembleia representativa de todos os angolanos e exprime a vontade soberana do povo angolano. (artigo 78.,1.). um rgo colectivo de soberania e, nesse contexto, exerce essencialmente duas funes dis-

  • As Constituies dos Pases de Lngua Portuguesa Comentadas 39

    tintas: por um lado, o rgo legislativo por excelncia e, por outro, exerce uma aco fiscalizadora sobre as actividades do Governo.

    No que diz respeito a primeira funo, i.e., a actividade legislativa, embora o Parlamento a exera quase que exclusivamente, uma janela no entanto deixada aberta ao Governo para que este possa legislar, motu proprio, atravs de decretos-lei, sobre assuntos relativos sua prpria organizao e funcionamento internos (artigo 88. b) e artigo 111. a)).

    Este poder legislativo do Governo no deve no entanto ser confun-dido com um outro que a Lei Constitucional tambm lhe reconhece e que o resultado de um poder delegado pelo Parlamento, para legislar, sobre matrias que, sem ser da sua competncia, so por ele tratadas, na forma de decretos-lei, aps uma autorizao da Assembleia Nacional sobre matrias da competncia legislativa relativa desta.

    No que diz respeito segunda funo do Parlamento, i.e. a de fis-calizao da aco do Governo, ela exerce-se de vrias maneiras: perguntas e pedidos de esclarecimentos dos deputados, moes de confiana ou de censura, a anlise e a aprovao dos Programas do Governo e do Oramento Geral do Estado, a anlise e a aprovao dos respectivos relatrios de execuo, a consti-tuio de comisses eventuais de inqurito, entre outros assuntos.

    6.4. As competncias legislativas da Assembleia Nacional

    A Lei Constitucional angolana estabelece, no domnio legislativo, para a Assembleia Nacional, uma competncia genrica para alterar a actual Lei Constitucional e aprovar a Constituio da Repblica de Angola, e apro-var leis sobre todas as matrias, salvo as reservadas pela Lei Constitucional ao Governo. (artigo 88. b)).

    A iniciativa legislativa pertence aos Deputados, aos grupos parla-mentares e ao Governo. (artigo 93. da L.C.).

    Apesar da competncia genrica em matria legislativa que se reco-nhece Assembleia Nacional, a prpria Lei Constitucional faz uma distino entre as matrias que fazem parte da reserva absoluta de competncia legisla-tiva da Assembleia (artigo 89.) e aquelas que relevam da sua reserva relativa de competncia legislativa. (artigo 90.).

  • 40 Fernando A. A. Mouro, Walter C. Porto, Thelmer M. Mantovanini

    Neste ltimo caso, tais matrias podem, quando o Governo assim o solicitar, fazer objecto de uma autorizao legislativa emitida por tempo determinado, fixado no prprio diploma de delegao de poderes legislativos, caducando no termo de tal prazo se tal prerrogativa no tiver sido utilizada. Essa prerrogativa, que exercida atravs de decretos-lei, no escapa no entanto ao poder fiscalizador do Parlamento na medida em que este pode, seguindo um processo que a prpria Lei Constitucional estabelece, apreciar a posteriori , a conformao do seu texto, com a autorizao legislativa que lhe foi concedida.

    Estas matrias, dizem normalmente respeito a assuntos que, em princpio, tm a ver com a organizao dos poderes pblicos e o funcionamento do Executivo na concretizao das polticas do Estado, questes cujo trata-mento, muitas vezes no se compadecem com o moroso processo de anlise e aprovao pelo Plenrio e pelas diferentes Comisses de trabalho permanentes do Parlamento.

    Quanto s matrias da competncia de reserva legislativa absoluta da Assembleia nacional, elas vm escalpelizadas no artigo 89. da Lei Consti-tucional e dizem respeito entre outras, a matrias sobre:

    a) aquisio perda e reaquisio de nacionalidade;b) direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidados;c) eleies e estatuto dos titulares dos rgos de soberania;d) formas de organizao e funcionamento dos rgos do poder local;e) regime do referendo; f ) organizao, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional; g) organizao da defesa nacional e bases gerais da organizao, do funcionamento e da disciplina das Foras Armadas Angolanas; h) regimes do estado de stio e do estado de emergncia; i) associaes e Partidos polticos;j) organizao judiciria e estatuto dos Magistrados Judiciais e do Ministrio Pblico;k) sistema monetrio e padro de pesos e medidas;l) definio dos limites das guas territoriais, da zona econmica

  • As Constituies dos Pases de Lngua Portuguesa Comentadas 41

    exclusiva, e dos m) direitos de Angola e dos direitos de Angola aos fundos marinhos contguos; n) definio dos sectores da reserva do Estado no domnio da economia, bem como o) das bases de concesso de explorao dos recursos naturais e da alienao do p) patrimnio do Estado;q) definio do regime e dos smbolos nacionais.

    6.5. Competncia de fiscalizao da Assembleia

    Compete Assembleia Nacional, no exerccio de funes de fiscali-zao:

    vigiar pelo cumprimento da Lei Constitucional e das leis;apreciar a declarao do estado de stio e de emergncia; verificar a conformidade dos decretos-lei emitidos pelo Governo,

    com a autorizao legislativa que lhe foi dada;verificar os relatrios e as contas dos exerccios passados; apreciar os relatrios de execuo dos planos nacionais.

    6.6. Os rgos da Assembleia Nacional

    De acordo com o Regimento Interno da Assembleia Nacional so seus rgos: a Mesa da Assembleia, a Comisso Permanente, as Comisses de Trabalho, as comisses eventuais e o Conselho de Administrao.

    6.6.1. A Mesa da Assembleia

    A mesa da Assembleia composta pelo Presidente da Assembleia Nacional, por quatro Vice-Presidentes e por quatro Secretrios, todos eleitos por legislatura. (artigo 10., 1. do Regimento).

    O Presidente da Assembleia Nacional eleito por maioria simples, por proposta dos partidos ou coligaes de partidos, com assento no Parlamento. (artigo 11.). Os Vice-Presidentes e os Secretrios so eleitos sob proposta dos

  • 42 Fernando A. A. Mouro, Walter C. Porto, Thelmer M. Mantovanini

    partidos ou coligao de partidos, proporcionalmente ao nmero de assentos que mantenham na Assembleia.

    6.6.2. A Comisso Permanente

    A Comisso permanente o rgo que substitui a Assembleia Nacio-nal fora do perodo de funcionamento efectivo desta, durante o perodo em que estiver dissolvida e composto pelo Presidente da Assembleia Nacional que a preside, por dois Vice-Presidentes e doze deputados. (artigo 102., 1. e 2. da Lei Constitucional e os artigos 12. e 13. do Regimento).

    As atribuies da Comisso Permanente esto descritas no n. 3. do artigo 102. da Lei Constitucional.

    Compete-lhe, entre outros: a) acompanhar a actividade do Go-verno; b) convocar extraordinariamente a Assembleia Nacional; c) exercer os poderes da Assembleia relativamente ao mandato dos deputados; d) au-torizar o Presidente da Repblica a declarar o estado de stio ou o estado de emergncia; e) autorizar excepcionalmente o Presidente da Repblica a declarar a guerra e a fazer a paz, quando a Assembleia Nacional no se encontre em perodo normal de funcionamento e seja, em face da urgncia, invivel a sua convocao extraordinria; f ) preparar a abertura da sesso legislativa.

    6.6.3. As Comisses de Trabalho Permanentes

    So 9 as Comisses de Trabalho da Assembleia Nacional (artigo 17. do Regimento Interno).

    H, alm disso, as comisses eventuais para um fim determinado e as Comisses parlamentares de inqurito (artigo 16. do Regimento Interno).

    6.6.4. Os grupos parlamentares

    Os deputados eleitos por cada partido ou coligao de partidos podem constituir-se em grupos parlamentares. (artigo 103., 1. da L.C.). Todavia, em conformidade com as disposies pertinentes do Estatuto dos Deputados, cada grupo parlamentar integra, no mnimo, trs deputados. (artigo 124.)

  • As Constituies dos Pases de Lngua Portuguesa Comentadas 43

    7. O Governo

    O Governo da Repblica de Angola um rgo colectivo de sobera-nia que compreende o Primeiro Ministro, os Ministros, os Secretrios de Estado e os Vice-Ministros. So todos nomeados pelo Presidente da Repblica.

    O Governo conduz a poltica geral do pas e o rgo superior da administrao.

    O Governo exerce funes polticas, funes legislativas e funes administrativas.

    7.1. Das funes polticas

    No quadro das suas funes polticas, o Governo exerce as seguintes: (artigo 110. da L.C.).

    referendar os actos do Presidente da Repblica nos termos do artigo 70. da L.C;

    definir as linhas gerais da poltica do governo, bem como da sua execuo;

    negociar e concluir tratados internacionais e aprovar os tratados que no sejam da competncia absoluta da Assembleia nacional e que a esta no tenham sido submetidos;

    apresentar projectos de lei Assembleia Nacional; deliberar sobre o pedido de confiana ao Parlamento; pronunciar-se sobre a declarao do estado de stio ou do estado de

    emergncia; propor ao Presidente da Repblica a declarao de guerra ou a fei-

    tura da paz; praticar outros actos que lhe sejam cometidos pela Lei Constitucio-

    nal ou pela lei.

    7.2. Das funes legislativas (artigo 111. L.C.)

    No exerccio de funes legislativas compete ao Governo:fixar por decreto-lei a composio, organizao e funcionamento do

    Governo;

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    elaborar e aprovar o decreto-lei em matria de reserva legislativa relativa da Assembleia Nacional, de acordo com a correspondente autorizao legislativa.

    7.3. Das funes administrativas. (artigo 112. L.C.)

    No exerccio de funes administrativas, o Governo pratica um cer-to nmero de actos necessrios boa gesto dos assuntos do pas.

    Assim, elabora o plano de desenvolvimento econmico e social, o Oramento Geral de Estado, aprova os actos de governo que envolvem aumento de receitas e diminuio de despesas, dirige os servios e a actividade da admi-nistrao do Estado, etc, etc.

    8. O Primeiro-Ministro

    No quadro do exerccio do poder poltico em Angola e atento aos prprios termos da Lei Constitucional, o Primeiro Ministro, no o Chefe do Governo. Ele um verdadeiro Primus inter Pares, na medida em que ele s dirige, conduz e coordena a aco geral do Governo. (artigo 114.,1. da L.C.).

    Por outro lado, diz o n. 2., alnea a) do mesmo artigo que ao Primeiro Ministro compete coordenar e orientar a actividade de todos os Mi-nistros e Secretrios de Estado, no se fazendo alguma referncia aos Vice-Mi-nistros porque, segundo se disse atrs, eles no tm competncias prprias.

    Estas disposies devem ser lidas em confronto com o que estabele-cem os artigos 66. d), 68., a) e b), reconhecendo ao Presidente da Repblica a competncia para convocar e presidir s reunies do Conselho de Ministros cuja agenda ele tambm fixa. O Conselho de Ministros, a nica formao governamental com poder colectivo de deciso.

    Alm disso, ao Presidente da Repblica que compete definir a orientao poltica do pas.

    Daqui se infere que o Presidente da Repblica , no actual estado de coisas em Angola, o verdadeiro Chefe de Governo. O Primeiro Ministro to somente aquele que se ocupa da direco, coordenao e conduo da aco do Governo. Tem pois um papel subalterno em relao ao Presidente da Repbli-

  • As Constituies dos Pases de Lngua Portuguesa Comentadas 45

    ca, perante quem ele responsvel politicamente e a quem informa directa e regularmente acerca dos assuntos respeitantes conduo da poltica do pas.

    Na actual concepo do poder poltico em Angola, o Primeiro Ministro um mero executante da poltica definida pelo Presidente da Repblica. Alis esse carcter subalterno ainda mais vincado quando se l o que vem disposto no artigo 114., 1. e 2. da L.C., quanto s suas competncias.

    8.1. Responsabilidade do Governo

    O Primeiro Ministro representa o Governo perante a Assembleia Nacional e engaja a responsabilidade poltica do Governo perante a Assembleia Nacional (artigo 117., 2.).

    Isto uma consequncia lgica do seu papel na orgnica do Governo e uma decorrncia do princpio da irresponsabilidade do Presidente da Rep-blica que a Lei Constitucional angolana consagra.

    8.2. O termo do mandato do Primeiro Ministro

    O pedido de demisso do Primeiro Ministro arrasta consigo a queda do prprio governo. Todavia, outras razes podem pr um termo ao mandato do Primeiro Ministro e, por conseguinte do Governo.

    Assim, o artigo 118. da L.C. estipula que d lugar demisso do Governo: a) O termo de legislatura; b) a eleio de um novo Presidente da Re-pblica; c) a demisso do Primeiro Ministro; d) a aceitao pelo Presidente da Repblica do pedido de demisso do Primeiro Ministro; e) a morte ou impossibi-lidade fsica duradoura do Primeiro Ministro; f ) A aprovao de uma moo de censura ao Governo; g) a no aprovao de um voto de confiana ao Governo.

    9. Os Tribunais

    Em conformidade com os artigos 53.,1 e 120., 1, ambos da L.C., os tribunais so rgos de soberania, ao mesmo ttulo que o Presidente da Repblica e a Assembleia Nacional e o Governo.

    9.1. Competncia, composio e hierarquizao

    Os tribunais em cujo vrtice da pirmide se encontra o Tribunal Supremo, tm como atribuio principal, a administrao da justia em nome

  • 46 Fernando A. A. Mouro, Walter C. Porto, Thelmer M. Mantovanini

    do povo . mais uma afirmao do princpio da soberania popular consagra-do pelo artigo 3. da L.C.

    Uma das caractersticas dos tribunais angolanos a colegialidade. H, ao lado dos juizes profissionais, assessores populares com os mesmos direitos e deveres quanto ao julgamento da causa. (artigo 122. L.C.) Esta prtica um resqucio da poca vivida logo aps a acesso do pas independncia em que se estimava que a justia at ento praticada no era rendida a favor do povo.

    A introduo dos assessores populares visava pois dar um maior acesso das camadas populares aos tribunais que rendiam a justia, justia essa que era feita em seu nome.

    Alis, um outro sinal da mesma mentalidade foi a abolio, duran-te alguns anos, do exerccio da advocacia privada, e a sua substituio pelos chamados colectivos de advogado e a introduo da classe dos advogados popu-lares. A situao voltou hoje normalidade, com a liberalizao do exerccio do patrocnio judicirio e a consequente criao da Ordem dos Advogados pelo Decreto n. 23/96 de 13 de Setembro.

    Os tribunais encontram-se escalonados em trs nveis, corresponden-tes s principais divises territoriais do pas. Comeando pela diviso territorial mais baixa, - os municpios -, h os tribunais municipais, os tribunais pro-vinciais existindo nas Provncias e, finalmente, a nvel da Nao, o Tribunal Supremo. Os juizes so independentes e inamovveis como em qualquer outro sistema judicirio do mundo e no so responsveis pelas decises que proferem no exerccio das suas funes, salvo as restries impostas por lei.

    9.2. O Tribunal Constitucional

    O sistema judicirio angolano contempla tambm a existncia de um Tribunal Constitucional (artigo 125., 1. da L.C.) cujas competncias vm escalpelizadas nos artigos 134. e 135. da mesma lei.

    Esta instituio jurisdiccional ainda no foi estabelecida, o seu pa-pel sendo desempenhado, por enquanto, pelo Tribunal Supremo, como alis prescreve o artigo 6. da lei preambular n.23/ 92 de 16 de Setembro que esta-belece que: enquanto o Tribunal Constitucional no for institudo, competir

  • As Constituies dos Pases de Lngua Portuguesa Comentadas 47

    ao Tribunal Supremo exercer os poderes previstos nos artigos 134. e 135. da mesma Lei Constitucional.

    O Tribunal Constitucional ter a seguinte composio: 3 juizes in-dicados pelo Presidente da Repblica, incluindo o Presidente, trs outros eleitos pela Assembleia Nacional, por uma maioria de dois teros dos deputados em efectividade de funes e, finalmente, um juiz eleito pelo Plenrio do Tribunal Supremo.

    Existe ainda, no quadro das instncias jurisdicionais angolanas, um Tribunal de Contas que foi institudo por uma lei ordinria de 1993 mas que s no ano de 2001, comeou a funcionar. No faz parte da nomenclatura de tribunais previstos pela Lei Constitucional mas as circunstncias tornaram necessria a sua criao e estabelecimento.

    9.3. A Procuradoria Geral da Repblica. (artigos 136. a 141. da L.C.)

    Fazendo parte dos rgos da administrao da justia, Procurado-ria Geral da Justia compete a defesa da legalidade democrtica e em especial representar o Estado a exercer a aco penal e defender os interesses que lhe forem determinados por lei.

    Embora concorrendo nas tarefas de administrao da justia, a Procuradoria Geral da Repblica, tem estatuto prprio e goza de autonomia. Isto quer dizer que, ao contrrio do que sucedia no incio, a PGR no uma unidade orgnica afecta ao Ministrio da Justia, embora mantenha com os tribunais uma relao de trabalho muito ntima.

    A carreira dos magistrados do Ministrio Pblico est separada da carreira dos magistrados judiciais. Os magistrados da PGR no podem passar livremente para a carreira judicial e vice-versa. Existe um Conselho Superior da Magistratura do Ministrio Pblico e um Conselho Superior da Magistra-tura Judicial separados tambm, embora com funes idnticas em relao aos respectivos magistrados.

    10. O Provedor de Justia. (artigo 142. da L.C.)

    A Lei Constitucional angolana actual prev a criao de um rgo pblico independente cujo objecto a defesa dos direitos, liberdades e garantias

  • 48 Fernando A. A. Mouro, Walter C. Porto, Thelmer M. Mantovanini

    dos cidados devendo assegurar, atravs de meios informais, a justia e a lega-lidade da Administrao pblica.

    10.1. Modo de designao

    O Provedor de Justia designado por deliberao de dois teros dos deputados em efectividade de funes e toma posse perante o Presidente da Repblica. O seu mandato de quatro anos, podendo ser reconduzido por mais um mandato. (artigo 143. da L.C.).

    10.2. Modo de acesso dos particulares ao Provedor de Justia

    Os cidados podem apresentar queixas ao Provedor de Justia, por aces ou omisses dos poderes pblicos, no podendo todavia sobre elas, tomar alguma deciso, devendo no entanto dirigi-las aos rgos competentes do Esta-do, com o fim de reparao das injustias.

    A actividade do Provedor independente dos meios graciosos e con-tenciosos previstos na Lei Constitucional e nas demais leis.

    11. O Poder Local. (artigo 145. a 148.)

    O captulo VII da Lei Constitucional consagrado aos princpios gerais da organizao local em Angola que compreende, por um lado as au-tarquias locais e por outro, os rgos administrativos locais que so os rgos desconcentrados do poder central.

    12. Da Defesa Nacional. (artigo 149. a 152.)

    A Defesa Nacional tratada nos artigos 149. a 152. e as suas caractersticas principais so as seguintes:

    a) a defesa nacional uma tarefa do Estado que tem por objectivo garantir a soberania, a integridade territorial e a segurana das populaes;

    b) as Foras armadas so permanentes, regulares e apartidrias;c) o servio militar obrigatrio.

    13. Da Reviso Constitucional (artigo 158.-160.)

    O captulo II do Ttulo V da Lei Constitucional contem as disposi-es referentes matria da reviso constitucional.

  • As Constituies dos Pases de Lngua Portuguesa Comentadas 49

    O princpios norteadores de tal matria so os seguintes:

    A iniciativa da reviso constitucional pertence aos deputados (dez no mnimo) e ao Presidente da Repblica; (art. 158.,2.);

    A competncia para a aprovao da reviso constitucional pertence Assembleia Nacional, por deciso aprovada por dois teros dos deputados em efectividade de funes; (art. 158., 1.);

    A reviso Constitucional pode ser feita a todo o momento; (art. 158., 3.);

    O Presidente da Repblica no pode recusar a promulgao da Lei de reviso constitucional e da Constituio da Repblica aprovada nos termos do n. 1. deste artigo);

    O artigo 159. da Lei Constitucional estabelece a lista das matrias que constituem limites reviso constitucional;

    No pode haver reviso da Lei Constitucional durante os perodos de estado de stio ou de emergncia.

    14. Dos Smbolos da Repblica e das disposies finais e transitrias

    Os artigos 161. a 164. tratam dos smbolos da Repblica enquan-to que os artigos 165. e 166. tratam das disposies finais e transitrias.

    O primeiro destes artigos estabelece que as leis e os regulamentos em vigor na Repblica de Angola (sobretudo as leis do tempo colonial) so apli-cveis enquanto no forem revogados e desde que no contrariem o esprito da actual Lei Constitucional.

    O artigo 166. estabelece que sero revistos os tratados, acordos e alianas em que Portugal tenha comprometido Angola e que sejam atentrios dos interesses do povo angolano.

    Feito em Luanda, aos 15 de Maro de 2002.

  • . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

    Lei Constitucional da Repblica de Angola de 1992

    LEI CONSTITUCIONAL

    TTULO I - PRINCPIOS FUNDAMENTAIS

    ARTIGO 1.

    A Repblica de Angola uma Nao soberana e independente que tem como objectivo fundamental a construo de uma sociedade livre, democrtica, de paz, justia e progresso social.

    ARTIGO 2.

    A Repblica de Angola um Estado Democrtico de Direito que tem como fundamentos a unidade nacional, a dignidade da pessoa humana, o pluralismo de expresso e de organizao poltica e o respeito e garantia dos direitos e liberdades fundamentais do homem, quer como indivduo, quer como membro de grupos sociais organizados.

    ARTIGO 3.

    1. A soberania reside no povo, que a exerce segundo as formas previstas na presente Lei.

    2. O povo angolano exerce o poder poltico atravs do sufrgio universal peridico para a escolha dos seus representantes, atravs do re-ferendo e por outras formas de participao democrtica dos cidados na vida da Nao.

    3. Leis especficas regulam o processo de eleies gerais.

    ARTIGO 4.

    1. Os partidos polticos, no quadro da presente Lei e das leis ordinrias, concorrem, em torno de um projecto de sociedade e de um programa poltico, para a organizao e para a expresso da vontade dos ci-

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    dados, participando na vida poltica e na expresso do sufrgio universal, por meios democrticos e pacficos.

    2. Os partidos polticos devem, nos seus objectivos, programa e prtica, contribuir para:

    a) A consolidao da Nao angolana, da independncia nacio-nal e o reforo da unidade nacional;

    b) A salvaguarda da integridade territorial;c) A defesa da soberania nacional e da democracia;d) A proteco das liberdades fundamentais e dos direitos da

    pessoa humana;e) A defesa da forma republicana e do carcter unitrio e laico

    do Estado.3. Os partidos polticos tm o direito a igualdade de tratamento

    por parte das entidades que exercem o poder pblico, assim como a um tratamento de igualdade pela imprensa, nas condies fixadas pela lei.

    4. A constituio e o funcionamento dos partidos devem, nos termos da lei, respeitar os seguintes princpios fundamentais:

    a) Carcter e mbito nacionais;b) Livre constituio;c) Prossecuo pblica dos fins;d) Liberdade de filiao e filiao nica;e) Utilizao exclusiva de meios pacficos na prossecuo dos

    seus fins e interdio da criao ou utilizao de organizao militar, para-militar ou militarizada;

    f) Organizao e funcionamento democrtico;g) Proibio de recebimento de contribuies de valor pecuni-

    rio e econmico provenientes de governos e instituies governamentais estrangeiras.

    ARTIGO 5.

    A Repblica de Angola um Estado unitrio e indivisvel, cujo territrio, inviolvel e inalienvel, o definido pelos actuais limites ge-ogrficos de Angola, sendo combatida energicamente qualquer tentativa separatista de desmembramento do seu territrio.

  • As Constituies dos Pases de Lngua Portuguesa Comentadas 53

    ARTIGO 6.

    O Estado exerce a sua soberania sobre o territrio, as guas inte-riores e o mar territorial, bem como sobre o espao areo, o solo e subsolo correspondentes.

    ARTIGO 7.

    Ser promovida e intensificada a solidariedade econmica, so-cial e cultural entre todas as regies da Repblica de Angola, no sentido do desenvolvimento comum de toda a Nao angolana.

    ARTIGO 8.

    1. A Repblica de Angola um Estado laico, havendo separao entre o Estado e as igrejas.

    2. As religies so respeitadas e o Estado d proteco s igrejas, lugares e objectos de culto, desde que se conformem com as leis do Estado.

    ARTIGO 9.

    O Estado orienta o desenvolvimento da economia nacional, com vista a garantir o crescimento harmonioso e equilibrado de todos os sectores e regies do Pas, a utilizao racional e eficiente de todas as capa-cidades produtivas e recursos nacionais, bem como a elevao do bem-estar e da qualidade de vida dos cidados.

    ARTIGO 10.

    O sistema econmico assenta na coexistncia de diversos tipos de propriedade, pblica, privada, mista, cooperativa e familiar, gozando todos de igual proteco. O Estado estimula a participao, no proces-so econmico, de todos os agentes e de todas as formas de propriedade, criando as condies para o seu funcionamento eficaz no interesse do de-senvolvimento econmico nacional e da satisfao das necessidades dos cidados.

    ARTIGO 11.

    1. A lei determina os sectores e actividades que constituem re-serva do Estado.

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    2. Na utilizao e explorao da propriedade pblica, o Estado deve garantir a sua eficincia e rentabilidade, de acordo com os fins e ob-jectivos que se prope.

    3. O Estado incentiva o desenvolvimento da iniciativa e da ac-tividade privada, mista, cooperativa e familiar, criando as condies que permitam o seu funcionamento, e apoia especialmente a pequena e mdia actividade econmica, nos termos da lei.

    4. O Estado protege o investimento estrangeiro e a propriedade de estrangeiros, nos termos da lei.

    ARTIGO 12.

    1. Todos os recursos naturais existentes no solo e no subsolo, nas guas interiores, no mar territorial, na plataforma continent