as cem melhores crônicas brasileiras_011

Upload: gelavieira

Post on 03-Apr-2018

220 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    1/18

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    2/18

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    3/18

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    4/18

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    5/18

    Dialogando com o pblico leitor

    Discutir o prefcio? Eu... Agora est na hora de uma cervejinha. D c seu copo a, que euvou mandar lavar, que agora a gente vai numa lourinha estupidamentegelada que eu... Olhe aqui, meu amigo, eu no vou fazer prefcio nenhum, noquero discutir nada com o senhor, no suporto mesa atulhada de carangue-jo , folha de banana, farelo de acaraj, resto de vatap e essa tralha toda a e,mais do que tudo, no quero nem vou tomar cerveja nenhuma, largue meucopo a, por favor. Mas minha inteno... O senhor vai me dar licena, eu vou embora. E o endereo? Ojie endereo, rapaz, eu vou l lhe dar endereo nenhum? isso que acontece, Madalena, o sujeito tem um sucessozinho,vira medalho e a pisa nos outros! Pode ir, pode ir, eu saberei vencer sozi-nho! Voc j viu que indelicadeza, Madalena, ele age como se tivesse o reina barriga, no sei o que ele est pensando que , ainda se fosse um escritorimportante mesmo, agora um cara desses que ningum sabe quem e...

    260 As Cem Melhores Crnicas Brasileiras

    Os anos 1990A vida privada virou umacomdia

    O sculo fecha a tampa e vai encontrar a crnica, nem melhor, nempior, nem mais revolucionria, mas com o mesmo esprito de levezaousada que tinha no incio, comJoo do Rio e Bilac. O avano verbal evidente. Mrio Prata empurra mais um pouco os limites do que permitido e coloca uma palavra no muito convencional, para o pero-do, no ttulo de um de seus trabalhos. um dos propsitos tradicio-nais da crnica. Experimentar novos formatos, ousar nas palavras re-primidas, provocar assuntos com uma liberdade que no resto daspginas, por uma questo de objetividade e parmetros jornalsticos,no possvel. Luis Fernando Verissimo consagra o estudo das novasrelaes afetivas. Usa humor e sabedoria para falar de sexo, traio etudo mais que vibrasse perplexidade na vida privada dos casais, ummundo que ficou de cabea para baixo no balano dos anos 1990.

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    6/18

    O pastel e a criseOtto Lara Resende

    Qando a crise convida ao pessimismo ou ameaa descambar na depres-;o, est na hora de ler. Poesia ou prosa, tanto faz. A partir de certaaltura, bom mesm o reler. Reler sob retud o o que nunca se leu, como repe-ti outro dia a um amigo que no chegado leitura. Ele mergulhou noProust sem escafandro e se sente mal quando vem tona e respira o arpoludo aqui de fora.Verdadeiro sbio era o Rubem Braga. Tinha com a vida uma relaodireta, sem intermediao intelectual. Houvesse o que houvesse, trazia nocorao uma medida de equilbrio que era um dom de nascena, mas eratambm fruto do aprendizado que s a experincia d. No pequeno mun-do do cotidiano, sabia como ningum identificar as boas coisas da vida. Eassim viveu at o ltimo instante.Certa vez, no auge de uma crise, crivada de discursos e de diagnsti-cos, o Ru bem estava de olho nas frutas da estao. Madrugador, cedinho jsabia das coisas. Quando o largo horizonte nacional andava borrascoso, elese punha a par das nuvens negras, mas no mantinha o olhar fixo no p-direito alto da crise. Baixava o olhar ao rodap, pois o sabor do Brasil esttambm no rs-do-cho. Num dia de greve geral, inquietaes no ar, tudofechado, o Rubem me telefonou: Vamos ao bar Lus, na rua da Carioca?Vamos ver a crise de perto.E l fomos. O bar estava aberto e o chope, esplndido. Comeamospor um preto duplo, que a sede era forte. Depois mais um, agora louro. E

    As Ce m Melhores Crnicas Brasileiras 263

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    7/18

    O posio/ e o crise

    outro . Claro que no faltou o salsicho com bastante mostarda. Calados,mas vorazes, cum pramos um rito. Algum po r pe rto disse que a Vila Mili-tar tinha descido com os tanques. Samos dali e fomos a um sebo. O Ru-bem comprou Xan, do Carlos Lacerda, com dedicatria. Depois pegamoso carro e voltamos pelo Aterro, onde se pode exercer o direito da livreeructao. Tinha sido um perfeito programa cultural. E sem nenhum in-centivo do governo.

    Vi agora na televiso que o m aracuj est em baixa e me lembrei dovelho Braga. Nem tudo est perdido. Fui feira e comprei tambm doissuculentos abacaxis. Caem bem nesta hora de atribulao nacional. S faltaagora descobrir um bom pastel de palmito na Zona Norte. Se o Rubemestivesse a, l iramos ns atrs da deleitosa descoberta. Depois, de cabeaerguida, enfrentaram os a crise e at o caos.

    264 As Cem Melhores Crnicas Brasileiras

    Um idoso na fila do DetranZuenir Ventura

    senhor aqui idoso", gritava a senhora para o guarda, no meio daconfuso na porta do Detran daAvenida Presidente Vargas, apon-tando com o dedo o tal "senhor". Como ningum protestasse, o policialabriu caminho para que o velhinho enfim passasse frente de todo mundopara buscar a sua carteira.Olhei em volta e procurei com os olhos o velhinho, mas nada. Derepente, percebi que o "idoso" que a dama solidria queria proteger doemp urra-empu rra no era outro seno eu.At hoje no me refiz do choque, eu que j tinha me acostumado avrios e traum ticos ritos de passagem para a maturidade: dos 40, quandoem crise se entra pela primeira vez nos "enta"; dos 50, quando, deprimido,se sente que jamais vai se fazer outros 50 (a gente acha que pode chegar aos80, mas aos 100?); e dos 60, quando um eufem ismo diz que a gente entrouna "terceira idade". Nunca passou pela minha cabea que houvesse umaoutra passagem, um outro marco, aos 65 anos. E, muito menos, nuncaachei que viesse a ser chamado, to cedo, de "idoso", ainda mais numa filado Detran.Na hora, tive vontade de pedir tal senhora que falasse mais baixo.Na verdade, tive vontade mesmo foi de lhe dizer: "idoso o senhor seupai". O que mais irritava era a ausncia total de hesitao ou dvida. Como que ela tinha tanta certeza? Que ousadia! Quem lhe garantia que eu t inha65 anos, se nem pediu pra ver minha identidade? E o guarda paspalho,

    As Cem Melhores Crnicas Brasileiras 265

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    8/18

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    9/18

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    10/18

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    11/18

    Ali/o

    chorando. Talvez ela tenha compreendido. Bem maior do que minha mo,bem maior do que o meu peito, levei-a at o fim.

    Eu me considerava um profissional decente. At semana passada, hou-vesse o que houvesse, procurava cumprir o dever dentro de minhas limita-es. No foi possvel chegar ao gabinete onde, quietinha, deitada a meusps, esperava que eu acabasse a crnica para ficar com ela.

    At o ltimo momento, olhou para mim, me escolhendo e me acei-tando. Levei-a, em meus braos, apoiada em meu peito. Apertei-a comfora, sabendo que ela seria maior do que a saudade.

    272 As Cem Melhores Crnicas Brasileiras

    Calcinhas secretasIgncio de Loyola Brando

    Caminhando pelas caladas congestionadas por camelos que pagam pro-pinas aos vereadores e, portanto, esto autorizadosa montar suas bar-racas, ele hesitava diante da quantidade de bancas vendendo calcinhas esutis. Desde que a Tiazinha comeara a ter sucesso, as bancas exibiammodelos os mais diferentes, procurando excitar as mulheres na conquistados amados. Percebeu que parte dos compradores eram homens e ficou nadvida. Para eles mesmos ou para as mulheres? Parou diante de uma nor-destina de rosto marcado por sulcos profundos e escolheu uma calcinhavermelha, uma preta aberta na frente e duas de renda. "Se levar meia dzia,ganha uma de brinde", disse a vendedora, com os olhos iluminados pelaesperana. Como na feira, pensou ele. Quem compra quatro pastis levaum de brinde. Por toda parte, promoes para segurar fregus.Em lugar de calcinhas, pediu dois sutis e a vendedora mostrou-seagradecida. "Tomara que faam sucesso, que ela goste e o senhor volte."Ela goste! A vendedora no podia, nem de longe, prever as intenesdele. Era uma ideia que tinha ocorrido de repente, ali, diante do marcolorido de peas ntimas. Foi almoar no Ponto Chie, tomou doischopinhos, um antes do Bauru, outro depois, consultou o relgio e se-guiu para o cinema. J havia uma fila, Mel Gibson tem um f-clube nocentro da cidade. A sala estava fresca. Escolheu uma fileira central, espec-tadores vieram sentar-se perto, ele trocou de lugar. Foi mudando at lo-calizar-se em um canto deserto.

    As Cem Melhores Crnicas Brasileiras 273

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    12/18

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    13/18

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    14/18

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    15/18

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    16/18

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    17/18

  • 7/28/2019 As cem melhores crnicas brasileiras_011

    18/18