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Rev Bras Med Fam e Com Rio de Janeiro out / dez 2006 nº 7 p. 160-247 v.2 EDITORIAL Os Títulos de Especialista João Werner Falk ................................................................................................................................................. 162 ARTIGOS Dificuldades de adesão ao tratamento na hipertensão arterial sistêmica: considerações a partir de um estudo qualitativo em uma unidade de Atenção Primária à Saúde Angélica Manfroi e Francisco Arsego de Oliveira ................................................................................................ 165 Suicídio em jovens: fatores de risco e análise quantitativa espaço-temporal (Brasil, 1991-2001) Regina S. Rodrigues, Ana Claudia F. M. Nogueira, Jorge Antolini, Victor Berbara e Cátia Oliveira .................. 177 Avaliação do estresse ocupacional em Agentes Comunitários de Saúde da região metropolitana de Belo Horizonte - MG Lidiane Cristina Custódio, Fabrício Silva Prata, Gabriel Sanábio, Janaína Félix Braga, Laura Amaral e Silva, Priscilla das Graças Morreale e Ricardo Costa-Val ................................................................................ 189 Fortalecendo a Atenção Primária à Saúde no Brasil com a Medicina de Família e Comunidade Cynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson ............................................................................ 196 As origens históricas da Clínica e suas implicações sobre a abordagem dos problemas psicológicos na prática médica Fernando Antônio Mourão Flora .......................................................................................................................... 203 Impacto do tratamento de sobrepeso/obesidade sobre os níveis de pressão arterial na Atenção Primária à Saúde Daniel Victor Arantes ............................................................................................................................................ 217 RELATO DE CASO Leishmaniose Tegumentar Americana: terapêutica com Fluconazol Vicente Lopes Monte Neto e Mirella Maia Soares Véras ..................................................................................... 228 RESUMOS DE TESE Avaliação da Implementação do Programa Saúde da Família no Município do Rio de Janeiro Carla Moura Cazelli ............................................................................................................................................. 235 Atividade física no Programa Saúde da Família em municípios da 5ª Regional de Saúde do Estado do Paraná - Brasil Silvano da Silva Coutinho .................................................................................................................................... 236 Ação comunicativa no cuidado à Saúde da Família: encontros e desencontros entre profissionais de saúde e usuários Priscila Frederico Craco ....................................................................................................................................... 238 Sumário RBMFC

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Page 1: artigos 2 a 4 - SBMFC...Fortalecendo a Atenção Primária à Saúde no Brasil com a Medicina de Família e Comunidade Cynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson.....196

Rev Bras Med Fam e Com Rio de Janeiro out / dez 2006nº 7 p. 160-247v.2

EDITORIALOs Títulos de EspecialistaJoão Werner Falk ................................................................................................................................................. 162

ARTIGOSDificuldades de adesão ao tratamento na hipertensão arterial sistêmica: consideraçõesa partir de um estudo qualitativo em uma unidade de Atenção Primária à SaúdeAngélica Manfroi e Francisco Arsego de Oliveira ................................................................................................ 165

Suicídio em jovens: fatores de risco e análise quantitativa espaço-temporal(Brasil, 1991-2001)Regina S. Rodrigues, Ana Claudia F. M. Nogueira, Jorge Antolini, Victor Berbara e Cátia Oliveira .................. 177

Avaliação do estresse ocupacional em Agentes Comunitários de Saúde da regiãometropolitana de Belo Horizonte - MGLidiane Cristina Custódio, Fabrício Silva Prata, Gabriel Sanábio, Janaína Félix Braga, Laura Amarale Silva, Priscilla das Graças Morreale e Ricardo Costa-Val ................................................................................ 189

Fortalecendo a Atenção Primária à Saúde no Brasil com a Medicina de Família eComunidadeCynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson ............................................................................ 196

As origens históricas da Clínica e suas implicações sobre a abordagem dos problemaspsicológicos na prática médicaFernando Antônio Mourão Flora .......................................................................................................................... 203

Impacto do tratamento de sobrepeso/obesidade sobre os níveis de pressão arterial naAtenção Primária à SaúdeDaniel Victor Arantes ............................................................................................................................................ 217

RELATO DE CASOLeishmaniose Tegumentar Americana: terapêutica com FluconazolVicente Lopes Monte Neto e Mirella Maia Soares Véras ..................................................................................... 228

RESUMOS DE TESEAvaliação da Implementação do Programa Saúde da Família no Município doRio de JaneiroCarla Moura Cazelli ............................................................................................................................................. 235

Atividade física no Programa Saúde da Família em municípios da 5ª Regionalde Saúde do Estado do Paraná - BrasilSilvano da Silva Coutinho .................................................................................................................................... 236

Ação comunicativa no cuidado à Saúde da Família: encontrose desencontros entre profissionais de saúde e usuáriosPriscila Frederico Craco ....................................................................................................................................... 238

SumárioRBMFC

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Summary

Rev Bras Med Fam e Com Rio de Janeiro oct / dec 2006nº 7 p. 160-247v.2

EDITORIALThe Especialist TitlesJoão Werner Falk .................................................................................................................... 162

ARTICLES

Difficulties in high blood pressure treatment compliance: considerations based on aqualitative study in a primary health care unitAngélica Manfroi e Francisco Arsego de Oliveira ..............................................................................................165

Suicide in young people: risk factors and quantitaive space-time analysisRegina S. Rodrigues, Ana Claudia F. M. Nogueira, Jorge Antolini, Victor Berbara e Cátia Oliveira ................ 177

Assessment of occupational stress in Community Health Agents of the metropolitanregion of Belo Horizonte - MGLidiane Cristina Custódio, Fabrício Silva Prata, Gabriel Sanábio, Janaína Félix Braga, Laura Amarale Silva, Priscilla das Graças Morreale e Ricardo Costa-Val ..............................................................................189

Strengthening Primary Health Care with Family and Community Medicine in BrazilCynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson ..........................................................................196

The historical development of modern medicine: implications for an approach topsychological problems in the medical practiceFernando Antônio Mourão Flora ........................................................................................................................203

The impact of weight reduction therapy on blood pressure levels in primary careDaniel Victor Arantes ..........................................................................................................................................217

CASE RELATEAmerican Tegumentary Leishmaniasis: Fluconazole therapyVicente Lopes Monte Neto e Mirella Maia Soares Véras ...................................................................................228

THESE ABSTRACTSImplementation Assessment of the Family Health Program in the city ofRio de JaneiroCarla Moura Cazelli ...........................................................................................................................................235

Physical Activity in the Health Family Program, in cities of 5th Regionalof Health in Paraná State - BrazilSilvano da Silva Coutinho .................................................................................................................................. 236

Communicative Action Toward The Health care of the Family:Meetings and failure in meetings among professionals of health and usersPriscila Frederico Craco .....................................................................................................................................238

RBMFC

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Editorial

Os Títulos de Especialista

The Specialist Titles

João Werner Falk*

Cada vez mais, e nos diversos campos de atuação da Medicina, os Títulos de

Especialista passam a ser valorizados, inclusive com melhor remuneração e como pré-

requisito necessário para inscrição em concursos ou seleções públicas. Recentemente,

isso passou a ser mais evidente na Medicina de Família e Comunidade (MFC) do que na

maioria das outras especialidades médicas, uma vez que não há mercado de trabalho

na área de saúde que venha crescendo mais no Brasil do que o da Atenção Primária à

Saúde (APS), principalmente na Estratégia Saúde da Família.

Para qualquer uma das 53 especialidades médicas reconhecidas no Brasil, o

Conselho Federal de Medicina, por meio dos seus Conselhos Regionais (CRM), só pode

registrar como especialistas (concedendo o Certificado de Registro de Qualificação de

Especialista) os médicos que apresentarem pelo menos um destes dois documentos:

Certificado de Conclusão de Residência Médica credenciada pela Comissão Nacional

de Residência Médica (CNRM); Título de Especialista concedido por Associação ou

Sociedade Brasileira da respectiva especialidade, que seja filiada à Associação Médica

Brasileira (AMB) e cujo edital do concurso para Título de Especialista siga as normas da

AMB e seja aprovado pela mesma1. Esse é o caso da SBMFC e dos Editais de Concurso

para Título de Especialista em Medicina de Família e Comunidade (TEMFC).

Residência e Título de Especialista são certificados de natureza diferente, sendo

independentes. Um médico pode ter um ou ambos, mas um ou outro dá direito ao

especialista registrar-se como tal em um CRM. Por determinação da AMB, não é mais

permitido ser concedido Título de Especialista somente por excelente currículo ou por

comprovação de conclusão de Residência Médica. Atualmente, é sempre necessário no

mínimo uma prova escrita, além da análise de currículo2.

Já os Certificados de Conclusão de Cursos de Especialização têm seu

reconhecimento na Academia, bem como grau de importância no mercado de trabalho e

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RBMFC

*Diretor de Titulação e Certificação SBMFC.

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Sociedade Brasileira de Medicina de Família Editorial

nos currículos, inclusive na etapa de análise de currículos nos Concursos para Títulos de Especialista. Mas

estes certificados não são suficientes para registro do médico como especialista nos Conselhos de Medicina.

É bom lembrar que o Código de Ética Médica e as normas do Conselho Federal de Medicina (CFM)

proíbem o médico de divulgar ser especialista, por meio de cartões de visita, receituários, placas de consultório,

convênios etc, sem que ele tenha o Registro de Qualificação de Especialista expedido por um CRM3.

Os Títulos de Especialista valorizam o trabalho do profissional, aumentando o seu prestígio e o de

sua especialidade perante os demais médicos e frente à sociedade como um todo. Isto é particularmente

relevante na MFC. Passou a época em que era freqüente alguém defender que todo médico, mesmo o

recém-formado, estaria em plenas condições de trabalhar em Atenção Primária à Saúde. Hoje, em todo o

mundo, a exigência é de especialistas em Medicina de Família e Comunidade, ou nomes equivalentes,

conforme o país. Isso vem qualificando a APS, aumentando a resolutividade e ajudando a reorganizar os

sistemas de saúde.

A Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade (SBMFC) vem dando prioridade à

organização de Concursos para Título de Especialista em MFC, tendo realizado seis concursos em pouco

mais de três anos, dois dos quais policêntricos, com a aplicação de suas provas escritas, respectivamente,

em dez e oito capitais, simultaneamente. Contudo, após cinco concursos concluídos, somente 1.442 médicos

inscreveram-se e compareceram às provas e 605 conseguiram conquistar o TEMFC. Isso é muito pouco,

se comparado aos mais de 30 mil médicos atuando em APS no Brasil na atualidade. Mas é parcialmente

explicado pela baixa permanência, em média, dos profissionais na Saúde da Família, o que faz com que a

grande maioria destes raramente alcance o pré-requisito mais freqüente para se inscrever no TEMFC: três

anos completos de prática profissional em APS, trabalhando como Médico de Família e Comunidade. O

outro pré-requisito possível também é raro, Residência credenciada em MFC, e boa parte dos ex-residentes

já conseguiu o TEMFC.

Este ainda relativamente pequeno número de titulados em MFC restringe a possibilidade da maioria

das cidades exigir o registro de especialista em MFC para ingresso de médicos na APS, como alguns

municípios já fazem, e como deverá ser no futuro para todos, pois haverá poucos candidatos disponíveis

com esse pré-requisito. Assim, é muito importante aumentar o número de titulados, sem reduzir as exigências

de qualidade para aprovação no TEMFC, mas por meio do aumento do número de inscritos nos próximos

concursos. Nesse sentido, a SBMFC realiza o seu sexto concurso, e o Ministério da Saúde decidiu apoiar a

SBMFC, tanto na divulgação da importância do TEMFC, quanto financeiramente, no sétimo Concurso, de

forma que ele possa ter inscrições gratuitas e que sua prova objetiva, em dezembro de 2007, possa ser

aplicada simultaneamente em um número ainda maior de cidades que nas duas experiências policêntricas

anteriores.

Uma nova exigência refere-se a recertificação, a cada cinco anos, para os Títulos de Especialista de

todas as especialidades médicas, obrigatório para quem se titulou a partir de janeiro de 2006 e opcional para

os demais. É o chamado Certificado de Atualização Profissional, que somente precisará de provas para os

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Sociedade Brasileira de Medicina de Família Editorial

médicos que não conseguirem um número de pontos de participação em eventos ou outras formas

comprovadas de atualização profissional. Essa pontuação não é difícil de ser obtida e estimula a educação

médica continuada, além da qualificação dos médicos de todas as especialidades4.

Pesquisa com base nos primeiros três concursos para TEMFC, relacionando as características de

formação e de experiência profissional dos candidatos com seus desempenhos nesses concursos, mostrou

a grande importância da Residência Médica em MFC para a formação desse especialista e a pouca efetividade

de Cursos de Especialização Multiprofissionais em Saúde da Família; além disso, evidenciou piora do

desempenho no concurso de médicos com mais idade e mais tempo transcorrido desde a graduação,

evidenciando a necessidade de programas de educação médica continuada, incluindo estratégias de ensino

à distância, que ajudem a superar a dificuldade das grandes distâncias em nosso país de dimensão

continental5.

O estímulo ao estudo e à atualização dos profissionais em MFC, tanto pela preparação para os

mesmos conquistarem o TEMFC, como para suas recertificações de especialistas, é uma das formas que

a SBMFC tem utilizado como contribuição para uma melhor atenção à saúde da população brasileira.

Referências:

1. Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM nº. 1785/2006. D.O.U. 22 de junho de 2006, Seção

I, p.127. Disponível em: http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/2006/1785_2006.htm Acesso em:

28 jun. 2007.

2. Associação Médica Brasileira. Normativa de Regulamentação para Obtenção de Título de

Especialista ou Certificado de Área de Atuação. São Paulo: AMB; 2004.

3. Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM nº. 1246/1988. D.O.U. 26 de janeiro de 1988.

Disponível em: http://www.portalmedico.org.br/index.asp?opcao=codigoetica&portal= Acesso em 28 jun. 2007.

4. Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM nº. 1.772/2005. D.O.U. 12 de agosto de 2005,

Seção I , p. 141-142. Disponível em: http://www.cna-cap.org.br/resolucao.php4 Acesso em: 28 jun. 2007.

5. Falk JW. A Especialidade Medicina de Família e Comunidade no Brasil: aspectos conceituais,

históricos e de avaliação da titulação dos profissionais. 194f. [Tese]. Universidade Federal do Rio Grande do

Sul, Porto Alegre (RS), 2005.

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RESUMO

A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é uma doença crônica, cujo controle é essencial para a prevenção

de complicações, em longo prazo, relacionadas à morbidade e à mortalidade cardiovascular e cerebral,

dentre outras. O tratamento da HAS baseia-se em medidas não-farmacológicas e farmacológicas. Considera-

se adesão a um tratamento o grau de coincidência entre a orientação médica e o comportamento do paciente.

Na Unidade de Saúde Parque dos Maias, observa-se a dificuldade na manutenção da pressão arterial dos

hipertensos, de forma continuada, que pode estar relacionada à falta de adesão destes pacientes ao tratamento.

O objetivo do estudo é avaliar os fatores envolvidos na dificuldade de adesão ao tratamento anti-hipertensivo

sob o ponto de vista do paciente. Para isso, partimos da pesquisa qualitativa, com entrevistas abertas e

semi-estruturadas, individuais, com 13 pacientes adultos hipertensos, inscritos no Programa de Hipertensos

da Unidade de Saúde Parque dos Maias. Como resultado, verificamos questões que dificultam a adesão ao

tratamento: a) fase inicial assintomática; b) uso de medicamento somente quando pensam que a pressão

está elevada (relacionam o aumento a sintomas que crêem ser ligados à HAS, como cefaléia, náuseas, ou

quando “ficam nervosos”); c) impressão de cura com conseqüente abandono dos fármacos, quando, na

realidade, a pressão está controlada; d) desgosto de ter de tomar remédios continuamente, de ser

“dependentes” deles; e) sintomas adversos dos fármacos como disfunção erétil e tosse; f) dieta hipossódica

é difícil de ser seguida, principalmente pelo fato de os familiares terem de se habituar a ela; g) necessidade

de consultas médicas mensais para fornecimento de prescrições para a retirada do medicamento na unidade

de saúde; h) falta de medicamento gratuito na unidade de saúde, em algumas instâncias; i) alguns pacientes

ficam “escravos” dos horários da ministração de medicamentos, o que dificulta sua rotina diária. A conclusão

Dificuldades de adesão ao tratamento na hipertensão arterialsistêmica: considerações a partir de um estudo qualitativo emuma unidade de Atenção Primária à Saúde

Difficulties in high blood pressure treatment compliance:considerations based on a qualitative study in a primary health care unit

Angélica Manfroi1

Francisco Arsego de Oliveira2

RBMFC

PALAVRAS-CHAVE:- Hipertensão;- Atenção Primária à Saúde;- Pesquisa Qualitativa.

1 Médica de Família e Comunidade, Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis, SC, Brasil.2 Médico de Família e Comunidade, Serviço de Saúde Comunitária - Grupo Hospitalar Conceição, Departamento de Medicina Social, Faculdadede Medicina, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil.

KEY-WORDS:- Hypertension;- Primary Health Care;- Qualitative research.

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Angélica Manfroi e Francisco A. de Oliveira Dificuldades de adesão ao tratamento na hipertensão arterial sistêmica

é que é muito importante a equipe de saúde conhecer

as dificuldades dos pacientes em aderir ao tratamen-

to anti-hipertensivo com o objetivo de tentar corrigi-

las, juntamente com o paciente, para melhor controle

da HAS. Enfatiza-se, principalmente, a importância

da comunicação no relacionamento médico/equipe-

paciente, o que envolve a confiança e, por conseguin-

te, possibilidades de maior adesão ao tratamento.

ABSTRACT

Introduction: High blood pressure (HBP) is a

chronic disease whose control is essential for

preventing long-term complications related to

cardiovascular mortality and morbidity. The treatment

for HBP is based on non-pharmacological and

pharmacological measures. Treatment compliance is

characterized by the degree of coincidence between

medical orientation and patient behavior. On Primary

Health Care level there are often difficulties in

maintaining a systematic control over the blood

pressure of hypertensive patients, probably due to

the lack of treatment compliance of these patients.

Objective: Assess the factors involved in the difficulty

of compliance with anti-hypertensive treatment from

the patients’ point of view. Methodology: Qualitative

research, with open and semi structured individual

interviews with 13 hypertensive adults, enrolled in the

Program for Hypertensive Patients of a Primary

Health Care Unit in Porto Alegre, Brazil. Results:

Factors hampering treatment compliance were: a)

initial asymptomatic phase; b) use of medication only

when patients think their blood pressure is high (the

increase is associated with symptoms patients

believe to be a consequence of HBP such as

headache, nausea, or when they “get nervous”); c)

the idea of cure and abandonment of treatment while,

in fact, their blood pressure is but under control; d)

resistance in taking the medication in a systematic

way, making them “dependent”; e) side effects of the

drugs, such as erectile dysfunction and coughing ; f)

difficulty in following a hyposodic diet, besides the fact

that the relatives have to get used to it as well; g) the

need for monthly appointments in order to obtain a

refill of the medication at the health care unit: h) lack

of free medication at the health care unit; i) some

patients feel they are “slaves” of the schedule they

have to follow because it is interfering with their daily

routine. Conclusion: It is important that the health care

professionals know the patients’ difficulties to be

compliant with anti-hypertensive treatment so they

can try correcting the problems together with the

patient for a better control of HBP. It has to be pointed

out that the trust resulting from a good doctor/patient

relationship contributes greatly to a better treatment

compliance of the patient.

I. Introdução

Não há dúvidas de que, atualmente, a hiper-

tensão arterial sistêmica (HAS) constitui um sério pro-

blema de saúde pública em todo o mundo. A HAS é

comprovadamente um fator de risco para uma série

de outras doenças e agravos à saúde, sendo, por-

tanto, considerada a origem das doenças crônico-

degenerativas1. Em relação a dados brasileiros, sua

prevalência oscila entre 15 e 20% na população

adulta2. Em Porto Alegre (RS), a prevalência de HAS

atinge a cifra de 19,2%3.

A HAS é considerada uma doença crônica,

com longo curso assintomático, evolução clínica

lenta, prolongada e permanente, podendo evoluir para

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Angélica Manfroi e Francisco A. de Oliveira Dificuldades de adesão ao tratamento na hipertensão arterial sistêmica

situações de complicação, sendo um dos principais

fatores de morbidade e mortalidade cardiovascular e

cerebrovascular4.

Dessa forma, a HAS é um problema de saúde

pública cujo controle, de forma continuada, é

essencial e visa à prevenção de alterações irrever-

síveis no organismo e relacionadas à morbimorta-

lidade associadas à doença, exigindo, portanto,

ações nos níveis individual e coletivo.

O tratamento da HAS baseia-se em medidas

não-farmacológicas e farmacológicas. Em relação

aos cuidados não-farmacológicos, os objetivos refe-

rem-se a mudanças no estilo de vida, incluindo os

cuidados com dieta com restrição de sal, redução

de peso, atividade física regular, abandono do taba-

gismo e do álcool. Dentre as medidas farmacológicas,

há inúmeras classes de anti-hipertensivos disponí-

veis, variando o seu mecanismo de ação, a sua potên-

cia, posologia e efeitos adversos5.

Em que pese o grande avanço científico e

tecnológico no manejo da hipertensão arterial ocorrido

nos últimos anos, uma das grandes dificuldades

atuais refere-se à adesão dos pacientes aos

tratamentos instituídos, ou seja, até que ponto o

paciente segue as recomendações dadas pelo

médico ou outro profissional de saúde para o controle

do seu problema de saúde. Considera-se adesão a

um tratamento o grau de coincidência entre a pres-

crição médica – o que inclui as orientações não-

farmacológicas – e o comportamento adotado con-

cretamente pelo paciente. No caso da HAS, envolve

a extensão em que o comportamento do indivíduo

(em termos de uso efetivo do medicamento, reali-

zação de mudanças no estilo de vida e compare-

cimento às consultas médicas) coincide com o

conselho médico6. Assim, o controle inadequado da

pressão arterial pode estar relacionado à falta de

adesão do paciente hipertenso ao tratamento indi-

cado.

A adesão do paciente a uma determinada

terapia depende de vários fatores que incluem, dentre

outros, os relativos à relação médico-paciente, às

questões subjetivas do paciente, às questões refe-

rentes ao tratamento, à doença, ao acesso ao serviço

de saúde, à obtenção do medicamento prescrito e à

continuidade do tratamento7. Neste sentido, é de

fundamental importância que o médico esclareça,

continuadamente e em linguagem acessível ao nível

de compreensão do paciente, conceitos básicos

quanto ao significado da HAS, sua etiologia, evolução,

conseqüências, cuidados necessários, fármacos

utilizados e seus potenciais efeitos colaterais. Além

disso, é importante que haja vínculo suficiente entre

médico e paciente, para que este se sinta engajado

no seu tratamento. Uma vez que o paciente se sinta

esclarecido sobre sua doença, e que se estabeleça

o elo médico-paciente, o paciente tende a assumir

responsabilidade pelos cuidados com sua saúde, jun-

tamente com o médico8.

Além da relação médico-paciente, deve-se

considerar, também como fator importante, que os

pacientes hipertensos experimentam a influência de

variados determinantes de adaptação às doenças

crônicas que dependem da característica de perso-

nalidade do indivíduo, dos seus mecanismos de

enfrentamento de problemas, do seu autoconceito,

da sua auto-imagem e da sua auto-estima, da

experiência prévia com a doença e/ou doenças e,

ainda, das atitudes dos cuidadores da área de saúde.

As respostas emocionais dos pacientes devem ser

consideradas, já que, muitas vezes, está presente o

mecanismo de regressão, em que o paciente mani-

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festa um comportamento infantilizado, apresentando-

se emocionalmente dependente na realização de

suas atividades, nas quais se incluem, principalmente,

os cuidados com sua saúde9.

Sendo a HAS uma doença sem manifesta-

ções clínicas, pelo menos precocemente, os paci-

entes também podem apresentar sentimentos

naturais de negação frente à doença, com uma

conseqüente não-adesão ao tratamento anti-

hipertensivo. Isto é, torna-se perfeitamente com-

preensível que um paciente que não se sente “doen-

te”, sob o ponto de vista estritamente biomédico, evite

o uso de medicamentos9.

Neste mesmo sentido, como a HAS é uma

doença assintomática até que as complicações

evidenciem-se em longo prazo, os pacientes podem

não perceber a importância de manter um tratamento

continuado. Além disso, as mudanças de estilo de

vida requerem dedicação e persistência. Muitos

fármacos, por sua vez, apresentam efeitos adversos,

exigem horários especiais para as ingestões diárias,

significam custo adicional no orçamento doméstico,

dentre outros inúmeros fatores que podem dificultar

o seguimento do tratamento da HAS por qualquer

pessoa.

Pelo fato de a HAS ser uma doença crônica

que exige cuidado continuado, dependendo desse

somatório de fatores e da relação entre eles, a terapia

proposta pode ter êxito completo ao que se propõe

ou fracassar parcial ou completamente.

Buscando explorar de forma mais apro-

fundada essas questões no âmbito da Atenção

Primária à Saúde (APS), foi realizada uma pesquisa

de caráter qualitativo junto à Unidade de Saúde

Parque dos Maias, em Porto Alegre (RS). A Unidade

de Saúde Parque dos Maias integra o Serviço de

Saúde Comunitária (SSC) do Grupo Hospitalar Con-

ceição (GHC), um complexo de saúde vinculado ao

Ministério da Saúde, que oferece atenção à saúde

nos níveis primário, secundário e terciário. Em relação

à APS, o Serviço de Saúde Comunitária é composto

de 12 Unidades Básicas de Saúde, situadas na zona

norte da cidade de Porto Alegre, cobrindo uma popu-

lação de mais de 120 mil habitantes. A Unidade de

Saúde Parque dos Maias presta atendimento, desde

1992, a uma população composta por 2.137 famílias

cadastradas, perfazendo 8.482 pessoas. Deste total,

a população adulta compreende 4.535 pacientes, ten-

do 327 hipertensos cadastrados.

É freqüente, nessa unidade de saúde, o relato

da equipe sobre a dificuldade de se manter a pressão

arterial dos pacientes hipertensos em níveis aceitá-

veis, de forma continuada, até mesmo entre os paci-

entes que se consultam regularmente. Uma das ex-

plicações para esse problema pode ser a falta de ade-

são dos pacientes ao tratamento proposto.

Dessa forma, este trabalho teve como objeti-

vo avaliar os fatores envolvidos na dificuldade de ade-

são ao tratamento anti-hipertensivo (medidas não far-

macológicas) sob o ponto de vista do paciente. Assim,

buscou-se entender os fatores que dificultam o segui-

mento adequado das orientações fornecidas pelo mé-

dico e demais integrantes da equipe de saúde.

II. Metodologia

Realizou-se uma pesquisa qualitativa, cujos

focos principais eram as entrevistas com os pacientes

moradores do bairro Rubem Berta, Vila Parque dos

Maias I, pertencentes à área de atendimento da

Unidade de Saúde Parque dos Maias e inscritos no

Programa de Hipertensos do SSC/GHC.

O Programa de Hipertensos desenvolvido na

Angélica Manfroi e Francisco A. de Oliveira Dificuldades de adesão ao tratamento na hipertensão arterial sistêmica

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unidade tem como objetivo o acompanhamento

sistematizado dos pacientes hipertensos, visando ao

manejo adequado da HAS. As atividades previstas

no programa são: o cadastro dos pacientes, a distri-

buição de medicamentos e o atendimento individual

ou em grupo mensal. Nesse Programa, estão incluí-

dos pacientes adultos hipertensos de ambos os se-

xos, de diferentes raças e variados níveis de formação

educacional, crenças religiosas e situação conjugal.

No presente estudo, não foram incluídos pacientes

pediátricos, pacientes com hipertensão secundária

nem gestantes com doença hipertensiva específica

da gestação. Também foram desconsiderados paci-

entes com outras doenças crônicas que requeiram

modificações no estilo de vida e uso de fármacos de

forma continuada. O estudo foi divulgado para todos

os pacientes hipertensos da Unidade. A participação

dos mesmos ocorreu de forma espontânea, com assi-

natura de termo livre-esclarecido.

Para a coleta das informações foram feitas

entrevistas individuais pela autora a pacientes

específicos, com duração média de 30 minutos, na

própria Unidade de Saúde. Ao final do estudo, foram

entrevistados 13 pacientes. A técnica utilizada nas

entrevistas foi a de entrevista aberta, conforme

metodologia de Minayo9, somada a um roteiro semi-

estruturado, a partir de um modelo citado na lite-

ratura10.

No decorrer das entrevistas, procurava-se

abordar questões relativas ao entendimento do

paciente a respeito da HAS, sua experiência prévia

com a doença, as formas de controle, a noção da

cronicidade da doença e a potencial lesão em órgãos-

alvo. Discutia-se, além disso, o seu conhecimento

acerca dos tipos de tratamento existentes, a sua

utilização, bem como as dificuldades encontradas no

tratamento anti-hipertensivo como um todo. As entre-

vistas foram gravadas em fita cassete, após ter sido

obtido o consentimento pós-informação do paciente

para participação na pesquisa. O projeto de pesquisa

foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do

Grupo Hospitalar Conceição.

III. Resultados

Do total de 13 entrevistados, dez eram do sexo

feminino e três do sexo masculino. As idades variaram

de 34 a 70 anos. Grande parte desses informantes

não possuia o ensino fundamental completo, não ha-

vendo pacientes analfabetos. A maioria dos pacientes

não exercia atividade remunerada atualmente, rece-

bendo auxílio previdenciário em torno de um salário

mínimo. Uma única paciente não reclamou da sua

situação financeira atual, pois recebia de três a quatro

salários mínimos mensais, somando-se o auxílio pre-

videnciário à atividade de cozinheira em um restau-

rante. Apenas dois pacientes moravam sozinhos. Dos

13 entrevistados, cinco participaram, pelo menos

uma vez, da atividade em grupo do Programa de Hi-

pertensos, sendo uma delas freqüentadora assídua

dessa atividade.

Em uma perspectiva inicial, chamou atenção

o fato de que os pacientes entrevistados demons-

traram desconhecimento sobre o que significa “ter

hipertensão”. Muitos não sabiam tratar-se de uma

doença. Mesmo assim, pareciam estar cientes da

importância de realizar algum tipo de cuidado para

manter a pressão arterial controlada, como neste

depoimento de uma paciente de 70 anos:

“Eu não sei o que é [HAS], não sei se é

doença. Às vezes, eu penso que é até um senti-

mento, uma coisa que se altera com os problemas

da pessoa, assim, um mal-estar, acho que não chega

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a ser doença.”

É importante comentar a questão da ausência

de sintomas da HAS, por longo período, até que, se

não tratada adequadamente, comecem a surgir as

complicações decorrentes da doença. Devido à au-

sência de sintomas, vários pacientes entrevistados

referiram que abandonaram o tratamento. Retomaram-

no após uma crise hipertensiva, alguma complicação

decorrente da HAS ou devido a outro problema de saú-

de em que o monitoramento da pressão se fez pre-

sente. Outros informantes, mesmo assintomáticos

e sem apresentar nenhuma complicação decorrente

da HAS, acreditam ser importante manter o tratamen-

to adequado, principalmente como prevenção de

complicações a longo prazo. Esses pacientes assin-

tomáticos informaram que “não se sentem doentes”,

por mais que tenham de tomar os medicamentos de

forma continuada. Há, por outro lado, os casos em

que os pacientes sentem-se doentes justamente de-

pois de iniciado o tratamento anti-hipertensivo. Isso se

explica pelo fato de que, antes de se saberem hiper-

tensos, esses pacientes tinham suas vidas livres de

cuidados e do uso de medicamentos. A partir do diag-

nóstico de HAS, entretanto, necessitaram usar medi-

camentos de forma contínua e buscar um estilo de

vida mais saudável. O fato de terem de usar medica-

mentos é que os fez se sentirem doentes, como é

exemplificado pelo comentário de um paciente de 63

anos:

“Antes de ficar hipertenso, eu não tinha

nenhum problema de saúde. Foi saber que minha

pressão é alta, que tudo começou a complicar. Tenho

que tomar remédio, sempre, todos os dias. Isso me

lembra, todo dia, que sou doente.”

Também há os que eram assintomáticos até

o diagnóstico de HAS feito pelo médico. Quando

iniciaram o uso de medicamentos, passaram a apre-

sentar efeitos adversos, o que fez esses pacientes

sentirem-se, a partir de então, “doentes”. Na reali-

dade, os sintomas do “sentir-se doente”, neste caso,

são os relativos aos efeitos colaterais dos medica-

mentos e não à HAS em si. Nessa situação, o fato de

estarem usando remédio devido à HAS significa que,

se há sintomas, estes são devidos à doença recém-

diagnosticada.

“Logo [após o diagnóstico de HAS] comecei a

usar remédio. Depois, eu parei uns quatro meses.

Não sentia nada antes, para que tomar, se me sentia

fraca tomando? Achava que iria dar certo, assim, sem

remédio, mas não adiantou, vim aqui, estava com a

pressão alta de novo... Voltei a tratar.”

Uma questão recorrente em alguns relatos foi

o que podemos chamar de “sonho de cura da HAS”.

Este desejo, na realidade, apareceu de forma um

tanto contraditória, em algumas respostas. Mesmo

os pacientes que referiram saber ter de usar medica-

mentos continuamente, cientes de não haver cura

da HAS, em algum momento da entrevista demons-

traram vontade de “um dia não precisar mais usar

medicamentos” para a HAS, devido justamente à sua

cura:

“Ah, mas eu imagino... Estou com essa idade,

mas imagino que um dia vou parar de tomar remédio

para a pressão. Imagino o médico me dizendo que

fiquei curada.”

Há também os que acreditam que “curaram”

a doença no momento em que atingem o controle

adequado dos níveis de pressão arterial com o uso

do tratamento prescrito. Assim, muitos pacientes

abandonam o tratamento farmacológico nesse

momento, ao invés de mantê-lo e seguir com o suces-

so no controle da HAS. Soma-se a isso o fato de esses

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pacientes, muitas vezes, estarem previamente assin-

tomáticos:

“Eu estava com a pressão boa, não sentia

nada, parei de tomar os remédios. Para que tomar

se não tinha nada?”

Alguns pacientes referem sintomas especí-

ficos, como dor de cabeça e tonturas, quando julgam

estar com a pressão arterial elevada. É importante

ressaltar que os pacientes que referiram algum sinto-

ma, relacionando-o como conseqüência de pressão

arterial elevada, não a mediram para conferir se, de

fato, estava alterada, na vigência dos sintomas refe-

ridos. Além de relacionarem seus sintomas com au-

mento da pressão, não questionam que estes pos-

sam estar relacionados a outras causas, dentre elas

os efeitos colaterais dos fármacos utilizados para

tratamento da pressão arterial. Neste sentido, a partir

do momento em que o diagnóstico está consolidado,

parece haver uma ênfase em atribuir à pressão alta

qualquer sintoma apresentado pelo paciente.

Por outro lado, os pacientes demonstraram

ter uma boa noção das complicações cardiovascula-

res e cerebrovasculares relacionadas à HAS. Uma das

motivações para seguir o tratamento é o medo de ter

um acidente vascular cerebral (AVC) ou infarto agudo

do miocárdio, as complicações cardiovasculares mais

temidas pelos pacientes e atribuídas à HAS.

“Se eu não tratasse, eu já teria morrido, teria

sofrido alguma coisa. Acho que a pessoa tem um

limite. Quando fui parar no hospital, eu cheguei ao

meu limite. A pressão estava altíssima, e se a pessoa

não faz tratamento, assim, certinho, acho que não

tem como agüentar, o coração começa a disparar,

parece que a gente está subindo nas nuvens, pode

dar derrame, enfarte.”

Há alguns fatores que os pacientes relaciona-

ram ao controle/descontrole da pressão arterial e

dificuldades ou não em seguir o que consideram

correto fazer. Na grande maioria dos relatos, apare-

ceu o “problema de nervos” como sendo o respon-

sável pelo aumento da pressão arterial. Apesar de

não ter sido explicitado exatamente nestes termos

em nossa pesquisa, há relatos na literatura que rela-

cionam a própria expressão “hipertensão” a um estado

emocional em que o indivíduo estaria “muito tenso” 11.

Além disso, os informantes também referem

o uso inadequado dos medicamentos, a dieta com

muito sal (relacionam a dieta rica em gorduras como

responsável por alterar a pressão arterial), o taba-

gismo, a ingestão de bebidas alcoólicas e as dores

em geral. Aparece aqui o sentimento de “missão cum-

prida” quando se sentem cumprindo aquilo que julgam

ser “o correto” e, juntamente, a sensação de controle

da pressão arterial, bem como dos sintomas

atribuídos ao aumento da pressão arterial. Por outro

lado, o contrário também ocorre, ou seja, o sentimen-

to de culpa caso não sigam as recomendações médi-

cas.

“Antes [do diagnóstico], era liberado tudo

assim. Não tinha preocupação em ter que ficar me

cuidando. Depois, é tomar remédio para cuidar da

pressão, é parar com sal, cafezinho, cigarro, coisas

que eu estava sempre fazendo. Agora é tentar

diminuir. Assim, os remédios ajudam a cuidar e lutam

contra as outras coisas que fazem mal, entende? Só

que as coisas que fazem mal eu estava acostumada,

gosto de fazer, então complica, né?”

Foi interessante notar que, mesmo quando

seguiam as orientações médicas, tais como

modificações no estilo de vida, uso correto de medi-

camentos, consultas e aferições da pressão arterial

freqüentes, alguns pacientes demonstraram insatis-

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fação com o descontrole dos seus níveis tensionais.

Esse sentimento pode ser melhor exemplificado com

o depoimento de uma informante de 70 anos:

“Meu Deus, eu faço tudo tão direitinho, então

por que tem dia que ela está 13 por 7, hoje está 15

por 8. Então é com isso aí que eu me irrito, e às vez

parece que quanto mais se mede a pressão, mais

sobe, mais fica sem aquele controle. Então eu fico

irritada com isso aí.”

Outra questão que chamou atenção é a per-

cepção de que há uma pressão certa para cada

paciente: “o meu normal” de pressão arterial. Os

pacientes se acostumam com certos valores que se

repetem e acreditam ser este o seu padrão normal

de pressão arterial, mesmo conhecendo os valores

ideais. Fica, então, a questão do papel dos profis-

sionais de saúde, principalmente o do médico, na

educação do paciente e no ajuste adequado dos

medicamentos, visando ao melhor controle da pres-

são arterial desses pacientes. É comum observar que

muitos médicos deixam-se influenciar por este padrão

próprio estabelecido pelos pacientes, tolerando níveis

mais elevados da tensão arterial.

Mesmo tendo a consciência da importância

do uso do medicamento para controle da HAS, alguns

pacientes demonstraram inconformidade em ter de

“depender do remédio”. O fato de terem de tomar um

remédio continuamente, como em qualquer trata-

mento de longo prazo, visando à manutenção da

saúde, gera insatisfação. Melhor seria, segundo

esses pacientes, “não ter de tomar nenhum medica-

mento”. Soma-se a isso, mais uma vez, a questão

da ausência de sintomas. Isto é, parece realmente

incompreensível ficar dependente de medicamentos

para tratar uma “doença” que não apresenta nenhum

sintoma. Em um estudo qualitativo com o objetivo de

avaliar a decisão dos pacientes hipertensos em tomar

ou não os medicamentos, Benson e Britten apontam

esta questão como importante, na qual se enfatiza a

resistência ao uso de medicamentos de uma maneira

geral, o que se reflete, também, no uso dos anti-hiper-

tensivos12. A fala de uma informante de 64 anos nos

ajuda a entender essa questão:

“Eu gostaria de não depender do remédio,

mas fazer o quê? E, na minha idade, a tendência é a

gente ir tomando cada vez mais remédios. Com a

idade, as coisas começam a aparecer. Por tudo isso,

estou me cuidando agora, para não ficar uma velha

cheia de coisas.”

Quando nos referimos a tratamentos de uso

contínuo, não podemos esquecer a questão dos efei-

tos adversos dos medicamentos como um motivo

importante para o abandono do tratamento. Dois en-

trevistados relataram que quase abandonaram o

tratamento devido a efeitos indesejáveis provocados

pelos fármacos. Porém, após a troca destes, os pa-

cientes sentiram-se motivados a seguir o tratamen-

to, uma vez que os sintomas adversos foram supri-

midos.

Uma vez que o esquecimento de tomar a

medicação pode ser um fator importante na dificulda-

de de adesão ao tratamento, tentou-se abordar esta

questão durante as entrevistas. Contrariamente à nos-

sa idéia inicial, os informantes não pareceram ter difi-

culdades em lembrar de tomar os remédios. Quando

percebem a importância de se tratar, os medicamen-

tos passam a ser parte de sua rotina. Também é im-

portante ressaltar os horários prescritos pelos médi-

cos, o que, em algumas situações, pode dificultar o

dia-a-dia dos pacientes, principalmente se estes não

sabem como adaptar os horários de uma forma ade-

quada e cômoda.

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“Eu não esqueço não. Só que antes tomava

de manhã, e agora mudou para de 8 em 8 horas, e

isso ficou ruim, eu quase esqueci de tomar o da tarde,

esses dias. Teve outro dia que eu estava cansada,

queria tirar uma sesta, mas estava preocupada com

o horário do remédio, dormi olhando para o relógio

para não esquecer.”

Em se tratando de uma população de baixa

renda, é importante que os medicamentos sejam

fornecidos gratuitamente, uma vez que a necessidade

de compra destes pode interferir negativamente no

orçamento doméstico e, assim, ser um fator de não-

adesão ao tratamento. Alguns pacientes também

relacionam à baixa renda a dificuldade de manter uma

“dieta saudável” conforme prescrição médica. Além

disso, surgiu o problema da chamada “peregrinação”

a outras unidades de saúde para se tentar conseguir

um determinado medicamento, quando este estava

em falta na unidade de origem. Percebe-se, então,

que tal “peregrinação” é uma constante na vida

desses pacientes, em sua busca por medicamento

gratuito, considerado um direito, que em princípio

deveria ser disponibilizado pelo município, para todas

as unidades de saúde; porém, na prática, muitas

vezes, isso não ocorre.

“Quando a gente vai à farmácia [da unidade

de saúde] pegar e não tem. Aí, vai à outra [unidade

de saúde] e também não tem. Semana passada eu

consultei, não tinha o remédio, o rapaz disse para vir

na segunda-feira, não tinha chegado. Daí, tive de

comprar duas vezes o captopril, isso não pode ser

assim.”

Na Unidade de Saúde Parque dos Maias, a

prescrição dos medicamentos anti-hipertensivos, na

sua maioria, tem validade mensal. Dessa forma, os

pacientes consultam mensalmente para revisão com

os médicos e para renovação das prescrições. Nos

casos em que o paciente está com sua pressão sob

controle, alguns médicos fazem prescrições para

dois ou três meses. Percebemos que essa sistemá-

tica gera satisfação para o paciente, que se sente

adequadamente atendido. Porém, há casos em que

o paciente necessita de consulta mensal para obter

as receitas, ou porque o médico assim o prefere,

mesmo sendo o caso de um paciente com pressão

sob controle, ou porque a pressão está continuamente

“descontrolada”. Nessa situação, há certa insatisfa-

ção por parte do paciente, pois é ele que tem de

marcar consulta sempre que os fármacos estão por

acabar, mesmo havendo facilidade na marcação de

consultas para as pessoas vinculadas ao grupo de

hipertensos. Em muitos casos, os pacientes saem

de uma consulta com o seu retorno no mês seguinte

agendado. Mesmo havendo a facilidade de acesso

para esses pacientes, o fato de terem de se consultar

mensalmente com o médico, simplesmente para re-

ceberem a prescrição, não seria uma forma desesti-

mulante à adesão, muito pelo fato de o paciente ser

lembrado, a cada mês, de que “está doente”: esse é,

na verdade, o motivo da consulta com o médico.

Assim, cabe o seguinte questionamento: os pacientes

cuja pressão encontra-se sob controle e que necessi-

tam apenas dos medicamentos para a manutenção

de sua saúde não deveriam ter mais liberdade “em

cuidar-se sem tanta dependência do médico?”

“O problema é que para ti pegar remédio tem

que ter receita. Então, eu queria que se agilizasse a

receita. Lá no Postão [unidade de referência], dão um

tipo de receita que dura seis meses, mas eles dão o

primeiro mês, depois tenho que pegar no posto

próximo de casa, que é aqui. Por que tem que con-

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sultar todo o mês para contar a mesma coisa, só

porque tem que ter receita? Eu acho muita coisa vir

todo mês. Minha mãe vai ao grupo de hipertensos

do posto onde mora e não precisa nem de receita,

eles deram uma ficha para ela, e ela vai sempre ao

grupo, eles anotam na ficha os remédios que ela

pega.”

Acredita-se que a relação médico-paciente é

um fator importante, se não fundamental, para a

manutenção do tratamento. Nessa relação, faz-se

necessário que o médico esteja disponível para o paci-

ente na compreensão de seu processo saúde/

doença, com o objetivo de auxiliá-lo nos cuidados com

a sua saúde. Resolvemos expandir esse conceito,

aqui, para a relação com a equipe de saúde como

um todo e percebemos que os pacientes sentem-se

bem atendidos pela equipe da Unidade de Saúde. Fica

uma dúvida, no entanto: o sentir-se bem atendido

significa ser, de fato, bem orientado pela equipe sobre

sua doença e os cuidados necessários para o seu

tratamento, ou os pacientes referem-se ao fato de

serem tratados com respeito e cordialidade enquanto

usuários da Unidade de Saúde? Além disso, pelo fato

de muitos pacientes considerarem os médicos (ou a

equipe) os detentores do conhecimento, por mais que

a saúde seja sua, e por mais que deva haver uma

aliança com objetivos comuns estabelecidos entre

ambos para o sucesso terapêutico, parece estabele-

cer-se uma relação em que o paciente assume uma

atitude passiva. Muitos profissionais, obviamente,

assumem uma atitude paternalista, de “donos da ver-

dade”, direcionando as condutas a serem desempe-

nhadas pelos pacientes. Dessa forma, este tipo de

relação médico-paciente faz com que esse último

não se sinta responsável por sua saúde, pois essa

responsabilidade é transferida para o médico ou a

equipe. Tal tipo de relacionamento deve ser enfatiza-

do, pois é muito comum em nosso país, com conse-

qüências desastrosas no seguimento desses indiví-

duos. A seguir, um bom exemplo de como a paciente

expressa a sua culpa por não ter seguido as orienta-

ções do médico:

“Eu sei que fui bem orientada pelos médicos,

entendeu? As falhas que aconteceram, no caso,

foram minhas mesmo, sabe? Porque eu fui rebelde,

não quis fazer [o tratamento]. Aqui no posto, todos

são bons para a gente.”

Por fim, outra questão que consideramos rele-

vante valorizar foi o acesso aos serviços prestados

pela Unidade de Saúde. Como os pacientes atendi-

dos pertencem à sua área de atuação, a maioria deles

mora muito perto, o que facilita o acesso, sendo um

aspecto facilitador para a adesão ao tratamento anti-

hipertensivo.

IV. Considerações Finais

Em se tratando da adesão a um tratamento,

percebemos que há inúmeras questões envolvidas

no sucesso ou no fracasso em obtê-la. Neste trabalho,

abordamos algumas das questões que surgiram em

entrevistas com alguns pacientes. Evidentemente, a

HAS e o seu tratamento adequado envolvem uma

multiplicidade de fatores extremamente complexos,

que exigem de todos os envolvidos o emprego de

estratégias combinadas que dêem conta dessa

complexidade13. De qualquer forma, ao falarmos de

adesão, devemos sempre considerar a subjetividade

que faz com que cada indivíduo, de acordo com as

suas vivências, conhecimentos, crenças e valores,

tenha um comportamento muito próprio em relação

ao significado de “sentir-se doente”. Isso reflete na

forma como esse indivíduo manifesta-se quando

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abordamos essas questões. Da mesma maneira,

também não podemos desconsiderar as crenças do

médico, ou da equipe de saúde, as quais, muitas

vezes, podem não coincidir com as crenças e os

interesses do paciente.

Um dos aspectos principais neste tema diz

respeito, então, às percepções diferentes em relação

à saúde e à doença por parte do médico – e da equipe

de saúde – e dos pacientes. Esse é um dos fatores

determinantes sobre a “aceitação” ou não do “diag-

nóstico” de HAS dado pelo médico e o tratamento a

ser seguido.

Nesse sentido, como afirma Chockalingam e

cols., a educação dos pacientes hipertensos é

essencial, mas, em determinadas situações, não

será suficiente para fazer com que o paciente siga

as recomendações estabelecidas como corretas à

luz do conhecimento científico atual14.

O que a experiência desta pesquisa aponta é

o caminho inverso: não somente educar o paciente,

mas iniciar uma abordagem terapêutica que inclua

uma negociação sobre o tratamento e o seu segui-

mento partindo das concepções que o paciente tem

a respeito da sua doença. É bom ressaltar que, com

isso, não se está negando o conhecimento técnico

ou se abandonando as convicções profissionais. O

que se propõe é o estabelecimento de uma parceria

entre pacientes e médicos, cujo objetivo maior é o

controle adequado da HAS e uma redução nas suas

complicações.

Isso pode parecer óbvio à primeira vista, mas

acreditamos que os médicos possam estar falhando

nesta área. De pouco adianta saber de forma

aprofundada a fisiopatologia da HAS e os tratamentos

mais modernos disponíveis se não se consegue uma

comunicação adequada com os pacientes. E um

Angélica Manfroi e Francisco A. de Oliveira Dificuldades de adesão ao tratamento na hipertensão arterial sistêmica

paciente que não se comunica com o seu médico é

um candidato muito forte a abandonar o seu trata-

mento. Ao longo do tempo, nós, médicos, deixamos

de nos comunicar com eles e, sem dúvida, uma co-

municação adequada entre médico e paciente melho-

ra o desfecho clínico15.

É, portanto, fundamental enfatizar que o foco

passa, conforme esta visão, do seguimento ade-

quado para a comunicação adequada. E essa é

uma mudança radical no sentido de que a respon-

sabilidade do tratamento volta a ser dividida entre

médico e paciente. Não bastará, por exemplo, simples-

mente prescrever um determinado tratamento e es-

perar que o paciente “educado” o siga. O médico e

toda a equipe de saúde terão mais uma atribuição: a

arte da comunicação, pois esta será fundamental no

caminho para o sucesso terapêutico, no que diz res-

peito a toda a sua complexidade, tanto individual como

coletivamente.

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Endereço para correspondência:

Angélica Manfroi

Rua Antônio Dias Carneiro, 557

Florianópolis – SC

CEP: 88051-200

Endereço eletrônico:

[email protected]

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RESUMO

O suicídio representa atualmente um sério problema de Saúde Coletiva, sendo a segunda causa de

morte em jovens na Itália, na França e no Reino Unido e a terceira nos EUA. Este trabalho objetiva estudar a

mortalidade por suicídio em adolescentes residentes nas cinco regiões do Brasil, comparativamente, no

período de 1991 a 2001, revendo também os principais fatores de risco (FR) descritos na literatura. Metodologia:

trata-se de um estudo epidemiológico, com enfoque sobre a Saúde Mental Juvenil. Foram utilizados os

dados do Sistema de Informação de Mortalidade do Ministério da Saúde. Realizou-se a revisão da literatura

por meio dos Sistemas Lilacs e Medline, além de livros temáticos. A discussão, de forma contextualizada,

teve por base o Pensamento da Complexidade proposto por Edgar Morin. Resultados: foram registrados

69.811 óbitos por suicídio no período estudado, sendo 6.985 casos no grupo dos adolescentes. Os maiores

Coeficientes de Mortalidade/100 mil habitantes ocorreram preponderantemente na região sul (1992 a 1994;

1996 a 1998; 2001), seguida pela região centro-oeste. Os principais FR descritos foram história de tentativas

anteriores, ideação suicida, maus tratos, condições socioeconômicas precárias, doenças crônicas severas,

impulsividade, depressão e esquizofrenia. O suicídio reflete características e valores relevantes de uma

sociedade. Representa um sistema complexo e deve ser sempre analisado no contexto individual, social e

coletivo. A atuação do profissional de Atenção Primária à Saúde (APS) é fundamental para a prevenção, por

meio da identificação dos fatores e situações de risco, no contexto individual, familiar e comunitário.

Suicídio em jovens: fatores de risco e análisequantitativa espaço-temporal (Brasil, 1991-2001)

Suicide in young people: risk factors andquantitaive space-time analysis

Regina S. Rodrigues*Ana Claudia F. M. Nogueira**

Jorge Antolini***Victor Berbara****Cátia Oliveira*****

RBMFC

PALAVRAS-CHAVE:- Suicídio;- Saúde do Adolescente;- Epidemiologia;

KEY-WORDS:- Suicide;- Adolescent Health;- Epidemiology;

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

177

* Médica, especialista pela Sociedade Brasileira de Pediatria e especialista em Epidemiologia aplicada à Saúde Mental, Universidade Federal do Riode Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil.** Médica Clínica Geral, Secretaria Municipal de Saúde e Ministério da Saúde, Rio de Janeiro, Brasil.*** Médico Clínico Geral, Hospital Universitário Gaffré Guinle, UNIRIO, Rio de Janeiro, Brasil.**** Médico Epidemiologista, Secretaria Municipal de Saúde, Ministério da Saúde, Rio de Janeiro, Brasil.***** Sanitarista, Mestre em Saúde Pública, Secretaria Municipal de Saúde e Secretaria de Estado de Saúde, Rio de Janeiro, Brasil.

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Regina S Rodrigues, Ana Claudia F M Nogueira,Jorge Antolini, Victor Berbara e Cátia Oliveira

Suicídio em jovens:fatores de risco e análise quantitativa espaço-temporal

ABSTRACT

Suicide is today a huge public health problem

(OMS, 2000). It is the second leading cause of death

among young people in Italy, France and the United

Kingdom and the third in the United States. The aim

of this paper was to develop a comparative study of

mortality from suicide in adolescents living in the five

regions of Brazil during the period 1991-2001, and to

review the risk factors (RF) described in the literature.

Methodology: this is an epidemiological study

focusing on juvenile mental health using the data of

the Mortality Information System of the Ministry of

Health. The review of the literature was performed

using the data- bases Lilacs and Medline as well as

books dealing with the issue. The discussion is based

on Edgar Morin’s concept of “complexity” in a

contextualized form. Results: 69.811 deaths from

suicide were registered during the period under study,

6.985 from these in the group of adolescents. The

highest mortality coefficients/100 thousand

inhabitants occurred in the south of the country (1992

to 1994; 1996 to 1998; 2001), followed by the central-

west. The principal risk factors described in the

literature were history of previous attempts, suicidal

ideas, ill treatment, precarious socio-economic

conditions, severe chronic disease, impulsivity,

depression and schizophrenia. Suicide reflects

characteristics and relevant values of a society. It

represents a complex system that should always be

analyzed in the context of the individual, the society

and the community. The acting of the primary health

care professional in the sense of identifying the risk

factors in the individual, familiar and community

context is fundamental in the prevention of suicide.

I. Introdução

A adolescência é um dos períodos de

desenvolvimento caracteristicamente marcado por

intensas transformações biológicas, sociais e psico-

lógicas, sendo vulnerável a diversos agravos, inclusi-

ve relativos à saúde mental.

O suicídio representa atualmente um grave

problema de Saúde Coletiva. Segundo a Organização

Mundial de Saúde (OMS-2000)1, as estimativas rea-

lizadas indicam que, em 2020, as vitimas poderão

ascender a 1,5 milhões. Estima-se ainda que um nú-

mero de 10 a 20 vezes superior tentará o suicídio2. Os

jovens representam um grupo de elevada vulnerabi-

lidade em diversos países: o suicídio representa a

segunda causa de morte de jovens na Itália, na França

e no Reino Unido e a terceira causa nos EUA, tendo

dobrado a taxa de mortalidade entre 1960-20013.

O suicídio é a principal causa de morte na

Suíça, na faixa dos 14 aos 25 anos, correspondendo

a um suicídio a cada três dias e 15 a 20 mil tentativas/

ano4.

No Brasil, os Coeficientes de Mortalidade por

suicídio entre 1980 e 2000 foram considerados relati-

vamente baixos quando comparados a outros países,

ocupando o 71º lugar na classificação mundial, segun-

do a OMS1. Em jovens residentes em capitais brasilei-

ras, estudo realizado por Souza et. al.5 apontou para

uma certa elevação das taxas de suicídio entre 1979

e 1998, e, entre as causas externas, o suicídio ocupa

a sexta posição.

Deve-se considerar, contudo, a baixa qualida-

de dos dados registrados no boletim de óbito como

possível fator de subestimativas dos óbitos por suicí-

dio no Brasil.

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179

II. Objetivos

Este trabalho objetiva estudar os Coeficientes

de Mortalidade (CM) por suicídio em jovens no Brasil,

no período de 1991 a 2001, nas diversas regiões do

país, além de analisar os principais fatores e compor-

tamentos de risco neste grupo etário, incluindo a

ideação suicida e as tentativas, em uma abordagem

reflexiva e transdisciplinar.

III. Material e Método

Trata-se de um estudo epidemiológico

descritivo aplicado à Saúde Mental de Adolescentes.

Para os cálculos de CM, foram utilizados os dados

do Sistema de Informação de Mortalidade (SIM)

referentes ao período de 1991 a 2001. As taxas foram

calculadas por 100 mil habitantes. Foram analisadas

as variáveis sexo e faixa etária em cada região do

país, de forma comparativa, na construção desta

série histórica.

Para a avaliação dos fatores e comporta-

mentos de risco, realizou-se a revisão da literatura

por meio dos Sistemas Lilacs e Medline, além de con-

sulta de livros temáticos.

Considerando o suicídio resultante da intera-

ção de múltiplos fatores, optou-se, a nível reflexivo

na discussão, pela Abordagem do Paradigma da Com-

plexidade proposto por Edgar Morin.

IV. Resultados

Segundo Friedrich, citado por Feijó, o “suicídio

é cometido quando o indivíduo sente-se incapaz de

dominar uma situação insuportável, tem a convicção

de que não pode sair dela, desespera-se pela perda

de controle sobre o ambiente; enfim, quando todas

as maneiras de agir fracassaram”6.

Segundo a OMS1, a maioria dos indivíduos que

cometeram suicídio apresentavam algum dos seguin-

tes transtornos, em ordem decrescente de risco: de-

pressão (todas as formas), transtornos de personali-

dade (anti-social e border-line com traços de impulsi-

vidade, agressividade e freqüentes alterações de hu-

mor, alcoolismo e especialmente para adolescentes,

abuso de substância, esquizofrenia e problemas afeti-

vos).

- Epidemiologia:

Foi analisada a série histórica de suicídios em

adolescentes nas regiões brasileiras entre 1991 e

2001.

No período de 1991 a 2001 foram registrados

69.811 óbitos por suicídios no Brasil. Destes, 6.985

(10,05%) ocorreram em adolescentes (entre 10 e 19

anos de idade).

Os Coeficientes de Mortalidade (CM)/100 mil

habitantes para a população geral brasileira oscilaram

entre 3,51, em 1991 e 1992 (menores índices), e 4,47,

em 2001 (maior índice).

Em adolescentes, o menor CM foi registrado

em 1992 (1,49) e o maior, em 2001 (2,26).

Quando são analisadas as cinco regiões

brasileiras, para a população geral o maior CM ocor-

reu no sul em todos os anos da série, variando de

6,63, em 1993, a 8,86, em 1998. Em 2001, o CM desta

região representou 1,89 vezes a taxa nacional (8,47

e 4,47, respectivamente).

A região centro-oeste ocupou o segundo lugar

em CM em todo o período. Em 2001, último ano da

série histórica, o CM foi de 5,78 (gráfico 1).

Para os adolescentes, o sul apresentou os

maiores CM nos anos de 1992 a 1994, 1996 a 1998 e

2001, seguido pelo centro-oeste, o qual ocupou o

primeiro lugar nos demais anos da série (gráfico 2).

Os menores CM, tanto para a população geral

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180

quanto para os adolescentes, ocorreram na região

nordeste em todo o período estudado. Para a faixa

Coeficiente de Mortalidade por Suicídio/100.000 habitantes no Brasile Regiões - População Geral 1991-2001

Fonte: Sistema de Informação de Mortalidade do Ministério da Saúde.

de 10 a 19 anos, os CM variaram de 0,65 (1992) a

1,46 (2001), representando um aumento de 2,24 vezes

Coeficiente de Mortalidade por Suicídio por 100.000 habitantesno Brasil e Regiões - Adolescentes 1991-2001

Fonte: Sistema de Informação de Mortalidade do Ministério da Saúde.

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nas taxas entre estes anos.

A região norte apresentou-se em terceiro lugar

em relação aos CM mais baixos (exceto em 1994)

para os adolescentes.

A região sudeste apresentou desenho da

tendência próxima à curva nacional. Ocupou o terceiro

lugar para os menores CM dentre as regiões para a

população geral e o segundo para os adolescentes.

V. Discussão

O diagnóstico precoce do risco para suicídio

é fundamental para a prevenção, sendo o profissional

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181

da APS o mais capacitado para perceber e atuar em

tempo hábil: estudos realizados por Le Heuzey7

indicaram que 70% dos adolescentes haviam procu-

rado um médico generalista ou da área de Saúde

Escolar dias antes da concretização do ato.

A OMS sumariza os principais itens para

avaliação e manejo de pacientes com risco para suicídio1.

Fatores de risco (FR) para o suicídio em jovens

Le Heuzey3 cita a seguinte classificação para

avaliação de jovens com risco de suicídio:

- “Suicidé”: é um indivíduo que alcançou a morte por

Risco de suicídio: identificação, manejo e plano de ação.

Risco de Sintoma Avaliação AçãoSuicídio

0 Nenhum - -

1 Com problemas Perguntar sobre pensamentos Escutar com empatiaemocionais suicidas

2 Idéias vagas de morte Perguntar sobre pensamentos Escutar com empatiasuicidas

3 Ideação suicida vaga Avaliar a intencionalidade Explorar as(plano e método) possibilidades

Identificar apoio

4 Idéias suicidas Avaliar a intencionalidade Explorar assem transtornos (plano e método) possibilidadespsiquiátricos Identificar suporte

5 Idéias suicidas e Avaliar a intencionalidade Encaminhar para umtranstornos (plano e método) psiquiatrapsiquiátricos ou fatores Estabelecer um contratoestressores graves

6 Idéias suicidas e Ficar com o paciente Hospitalizartranstornos (para prevenir o acesso aospsiquiátricos ou fatores meios letais)estressores graves ouagitação e tentativasprévias

Fonte: OMS, 2000.

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suicídio.

- “Suicidant”: é o indivíduo que realizou pelo menos

uma tentativa de suicídio.

- “Suicidaire”: possui idéias de suicídio ou expressa

desejos de suicidar-se.

Tentativas

Histórias de tentativas anteriores são um dos

principais fatores de risco para o suicídio em qualquer

grupo etário.

As tentativas são de 30 a 60 vezes mais

freqüentes que o suicídio, sendo mais comuns em

jovens que em idosos e ocorrendo principalmente no

sexo feminino. A taxa de recidivas entre jovens é de

30 a 40%, ocorrendo principalmente nos seis primei-

ros meses após a tentativa7.

Estudos apontaram que 56% dos suicidas

morrem na primeira tentativa, especialmente os ho-

mens, com 62% de mortalidade comparados com

38% das mulheres. Dentre os sobreviventes, até 12%

acabam se suicidando, representando um risco 38

vezes maior que a população em geral7.

Ideação

Estudos realizados por Rey Gex e analisados

por Le Heuzey3 indicaram que entre 9.268 adoles-

centes, 26% apresentavam idéias suicidas. Estudos

realizados por Miotto citado por Santos, Anelli e

Sermous8, em 2003, em adolescentes italianos de

15 a 19 anos, revelaram presença de ideação suicida

em 30,8% das jovens e 25,3% dos rapazes.

Kandel, ao avaliar o risco para suicídio em 597

adolescentes, encontrou forte associação entre

ideação suicida e uso de drogas. Em muitos casos

houve relação entre o uso de drogas e sentimentos

depressivos, principalmente em mulheres9.

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182

Maus-tratos na infância

A violência durante a infância ou, às vezes,

na própria adolescência representa considerável fator

de risco (FR) para o suicídio. Estes jovens apresentam

um risco três vezes superior de suicídio quando com-

parados a adolescentes sem história de violência fí-

sica, sexual ou psíquica. Situações de abandono e

frieza afetiva, principalmente por parte dos pais,

também representam FR para o suicídio de jovens10.

Condições socioeconômicas precárias

Marx aponta as injustiças sociais e a opressão

como causa de suicídio em mulheres jovens, citando

diversos casos, representando um dos diversos

sintomas das desigualdades sociais11. Estudos re-

centes corroboram esta análise7,12 : elevadas taxas

de condições socioeconômicas precárias (p<0,0001)

estão associadas a doenças psiquiátricas (p<0,0001)13.

Doenças crônicas

Doenças crônicas estigmatizantes, dolorosas

e/ou incapacitantes também representam FR para o

suicídio entre jovens. Dentre estas, destacam-se o

diabetes mellitus, a insuficiência renal crônica, a

asma, a obesidade e a mucoviscidose. Estudos reali-

zados por Marcelli (1995) apontam para um processo

de ódio contra o corpo-sede da doença e responsável

pelos sofrimentos do adolescente7,11,14.

A AIDS representa importante fator de risco

para o suicídio, o qual deve ser sempre investigado

nestes pacientes8.

Impulsividade

Determinadas características comuns aos

adolescentes, como a natural impulsividade que os

leva a “atuar em um curto-circuito de pensamento

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transformado em ação”, podem ser consideradas fa-

tores suicidas10.

Antecedentes familiares

Estudos apontaram para 40% de estresse pós-

traumático e 31% de idéias suicidas em adolescentes

após o suicídio realizado por familiar15.

Suicídio de amigos e colegas

Já foram relatadas “epidemias” de suicídio

entre adolescentes após o suicídio de um amigo ou

colega de escola, conhecido como “efeito Werther”,

em alusão ao clássico romance de Goethe, principal-

mente nos primeiros seis meses após o óbito. Nos

dois anos seguintes, há um risco elevado de depres-

são, porém sem ideação suicida4,15.

Drogas e álcool

Um estudo realizado por Garfinkel et al. em

1982, em um hospital de emergências pediátricas,

com 505 crianças e adolescentes internados por

tentativa de suicídio, apontou uma elevada prevalên-

cia de uso abusivo de drogas e/ou álcool pelos famili-

ares e/ou pelos próprios pacientes. A maior parte das

tentativas ocorreu à noite, após a escola, na própria

residência e devido à overdose de drogas16.

Alcoolismo é menos freqüente em adolescen-

tes do que em adultos jovens, porém mais da metade

das tentativas de suicídio envolveram ingestões

prévias de álcool, que parece funcionar como fator

de desinibição e impulsividade3.

A autópsia psicológica realizada por Shafü et

al., em 20 crianças e adolescentes entre 12 e 19 anos

que haviam cometido suicídio, revelou que 85%

haviam manifestado ideação suicida, 40% já haviam

cometido pelo menos uma tentativa, 70% abusavam

de álcool e/ou drogas e 70% tinham comportamento

anti-social17.

Usuários de heroína apresentaram uma taxa

14 vezes maior para suicídio, segundo Darke et al.18.

Estudos realizados por Sher & Zalsman

apontaram para a elevada associação entre abuso

de álcool e depressão em adolescentes suicidas17,19.

Fleischmann et al. observaram também que

o abuso de substâncias estava presente em 40,8%

dos suicídios em jovens20.

O uso de drogas aumenta consideravelmente

o risco de depressão, idéias, tentativas e suicídio

consumado entre os jovens.

Segundo pesquisa coordenada pelo Centro

para o Avanço da Ciência com 19 mil adolescentes

de 132 escolas, os profissionais de saúde devem

pensar seriamente no risco de suicídio em adolescen-

tes que relatem episódios de uso de drogas21.

Outros transtornos mentais – Patologias psiquiá-

tricas

Há uma elevada prevalência dos seguintes

transtornos psiquiátricos em jovens suicidas, tais

como a depressão, a ansiedade e o abuso de subs-

tâncias. A esquizofrenia e os transtornos alimentares

também representam fatores de risco, segundo os

estudos de Evans et al., em 200522.

Depressão e suicídio em adolescentes

Estudos epidemiológicos verificaram que

8,3% dos adolescentes nos EUA apresentaram

transtorno depressivo23, sendo que 4,9% podem

apresentar a forma “major” da doença24.

Determinados transtornos do sono, como

insônia e pesadelos, têm sido associados a um risco

aumentado de suicídio. Contudo, parece que o link

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entre insônia e suicídio passa pela presença de

transtornos depressivos25. O gesto suicida em jovens

pode revelar uma esquizofrenia ou outro transtorno

mental severo que até então encontrava-se silenci-

oso26.

V. Conclusão

“O suicídio não é apenas um problema mé-

dico, mas de toda a sociedade”3.

Abordagens simplistas não possibilitam per-

cepções profundas. A complexidade, enquanto teoria

científica, inspira-se nos Sistemas Complexos. Para-

digmas com base em visões unilaterais e certezas

absolutas e simples não oferecem base segura à

análise de situações tão complexas quanto o suicídio

de jovens. Segundo Edgar Morin, “quando o simples

já não basta, é preciso passar ao elo, à espiral, inte-

grando a velha lógica ao jogo complexo”. O todo é

mais que a soma das partes: a abordagem do suicídio

enquanto problema coletivo, dadas as cifras mundiais,

requer a visão da parte (o indivíduo) na rede do todo

(a família, a comunidade, a sociedade pós-moderna):

as relações funcionam de forma complexa, ultrapas-

sando a linearidade parte/todo, uno/diverso27.

Alguns fatores podem ser levantados como

hipóteses explicativas para a diferença observada na

mortalidade por suicídio entre os adolescentes resi-

dentes nas diversas regiões.

São relevantes as diferenças entre os Coe-

ficientes de Mortalidade entre as regiões. Além dos

fatores relativos à qualidade dos dados nos boletins

de óbito, outros fatores podem, ao menos em parte,

explicar as altas taxas na região sul: fatores de ordem

afetivo-culturais e antropológicos, como explica

Durkheim, citado por Silva, 2005. “Cada sociedade

tem portanto, em cada momento de sua história, uma

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

184

aptidão definida para o suicídio”28, além das baixas

temperaturas (invernos mais rigorosos), fato ampla-

mente estudado como “Depressão do Inverno” e/ou

“Suicídio Sazonal”29,30,31.

As taxas relativamente baixas observadas nas

regiões mais quentes, sob o ponto de vista climático

(nordeste, norte e sudeste), poderiam corroborar a

hipótese do efeito climático. Além disso, estas regiões

são compostas na maioria dos estados, de clima

afetivo mais caloroso, informal, cordial e predisposto

ao lazer: fatores que podem ser considerados bené-

ficos para um psiquismo resiliente12,32. Nos Estados

Unidos da América, foram observadas baixas taxas

de suicídio em adolescentes de origem hispânica

quando comparados aos de origem anglo-saxônica,

os quais apresentam taxas elevadas, apesar do

melhor padrão aquisitivo e menor risco de discrimi-

nação social deste segundo grupo. Fatores proteto-

res, como maior afetividade, ternura e apoio, são

utilizados para justificar esta diferença, reforçando a

importância do território familiar e comunitário para a

saúde mental, principalmente em faixas etárias mais

vulneráveis como a adolescência33. Estudos mais

aprofundados, do tipo qualitativo, de base antropoló-

gica-cultural, psicossocial e psicológicas são neces-

sários para compreender melhor estas diferenças

entre os Coeficientes de Mortalidade entre as regiões.

Dessa forma, a abordagem inter e trans-

disciplinar, por meio do diálogo de respeito e abertura

entre os diferentes olhares e distintos saberes (mé-

dico, psicológico, psicossocial, sociológico, antropoló-

gico etc.), torna-se fundamental para a compreensão

e intervenção sobre o suicídio e tentativas a nível

individual, familiar e comunitário. Como nos ensina

Morin: “Hoje, a nossa necessidade histórica é encon-

trar um método capaz de detectar, e não ocultar, as

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ligações, as articulações, as solidariedades, as inter-

dependências e as complexidades34,35,36,37,38,39.

A fragmentação do indivíduo dificulta a

abordagem do mesmo como ser-de-relações: com

sua família, com seu grupo social, com sua comu-

nidade. A formação atual das Universidades das áreas

Biomédicas não prepara os estudantes para serem

profissionais capazes de abordar seus futuros paci-

entes de forma não-especializada. Fenômenos com-

plexos, quando se transformam em epidêmicos1 a

nível mental, exigem uma avaliação profunda, sem

separar indivíduo e sociedade. E aí se encontra a

questão do suicídio.

Na atual sociedade pós-moderna, na qual a

produtividade e o progresso são valores essenciais,

a morte prematura de jovens, que significa a opção

voluntária pelo auto-extermínio, traduz questiona-

mentos silenciosos e constitui um dos fenômenos

mais intrigantes para os profissionais das áreas da

saúde e sociais. O problema crucial é saber quando

e de que forma indivíduos com potencial suicida

transformarão suas fantasias ou ideações em atos

concretos27.

A intencionalidade revela o papel consciente

do jovem para o auto-extermínio, a motivação revela

as razões psíquicas para o desejo da morte, os

precipitadores são os agentes, fatos ou circuns-

tâncias, que, de maneira aguda ou crônica, conside-

rando-se também o tipo de personalidade da vítima,

“justificariam” o ato, e os métodos escolhidos indicam

uma trajetória entre ideação, tentativas e morte

opcional que deve ser percebida durante a avaliação

do profissional de saúde responsável pelo paciente a

fim de que medidas intervencionistas sejam instituídas

em tempo hábil17,40,41.

Este estudo revelou que os maiores CM no

sul e os menores no nordeste podem indicar caracte-

rísticas socioculturais distintas, ocorrendo maior risco

para o suicídio em adolescentes em culturas euro-

peizadas. Contudo, deve-se atentar para a possibi-

lidade de uma melhor qualidade dos dados nos esta-

dos do sul42.

Segundo Minayo et al., o diálogo entre os

diferentes saberes, na busca da compreensão das

interfaces entre os campos subjetivo e objetivo,

possibilita uma abordagem mais profunda desse

fenômeno43.

Os questionamentos sobre o auto-extermínio,

principalmente em jovens, segundo Hillman,

proporcionam a análise da intensa situação de sofri-

mento humano, tornando-se, assim, um “Paradigma

de Vida”43.

Diversas especificidades situacionais, de

cunho orgânico, familiar, antropológico-culturais e

psicossociais podem associar-se como possíveis

fatores desencadeantes da concretização do desejo

de auto-extermínio, culminando no ato suicida. Este

estudo não pode estabelecer qualquer relação por

não dispor de dados relativos às questões subjetivas

dos jovens que se mataram. “Para mensurar o

desespero humano e medir as potencialidades para

o suicídio, individuais e grupais”14, abordagens qualita-

tivas são necessárias.

Além disso, não se pode deixar de mencionar

que óbitos por suicídio, devido ao tabu que cerca este

evento, podem ser notificados no boletim de óbito

como causa externa do tipo ignorado, induzindo à

subnotificação do agravo, fato esse que pode ocorrer

em qualquer região, mas principalmente naquelas de

organização religiosa mais rigorosa.

Nosso estudo busca constituir um alerta para

os profissionais de saúde que atendem crianças e

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Suicídio em jovens:fatores de risco e análise quantitativa espaço-temporal

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adolescentes, na tentativa de diagnosticar precoce-

mente situações de risco para o suicídio.

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Endereço para correspondência:

Ana Claudia F. M. Nogueira

Rua Conde de Bonfim, n° 370/815

Rio de Janeiro – RJ

CEP: 20520-054

Endereço Eletrônico:

[email protected]

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RESUMO

Estudo de revisão que buscou justificar a importância de se avaliar o estresse dos Agentes Comunitários de

Saúde e a correlação deles com a atividade ocupacional, uma vez que as situações vivenciadas pelos

mesmos, nas diferentes áreas de risco, bem como o contato direto com a comunidade, representam agentes

estressantes de relevante magnitude. Sabe-se que a presença de trabalhadores estressados na equipe

resulta em insatisfação, diminuição da produtividade e má assistência de saúde à comunidade. Portanto,

especial atenção deve ser dada aos profissionais propensos a reações mais intensas aos agentes geradores

de estresse, o que resulta em benefícios tanto para a equipe de Saúde da Família quanto para a comunidade

assistida.

ABSTRACT

This review aims at showing the importance of assessing stress in Community Health Agents and the

correlation of this stress with their activity, given that the situations they face in the different risk areas and the

direct contact with the community are considered highly stressing factors. It is known that the presence of

stressed agents in a team leads to discontent, reduced productivity and low-quality health assistance for the

community. Special attention should thus be paid to professionals with an inclination to react intensely to

stress factors, not only in benefit of the Family Health team but also of the assisted community.

Avaliação do estresse ocupacional em AgentesComunitários de Saúde da região metropolitanade Belo Horizonte - MG

Assessment of occupational stress in CommunityHealth Agents of the metropolitan region of Belo Horizonte - MG

Lidiane Cristina Custódio*Fabrício Silva Prata**

Gabriel Sanábio**Janaína Félix Braga**

Laura Amaral e Silva**Priscilla das Graças Morreale**

Ricardo Costa-Val***

RBMFC

PALAVRAS-CHAVE:- Estresse;- Auxiliares da Saúde Comunitária;- Saúde do Trabalhador.

KEY-WORDS:- Stress;- Community Health Aides;- Occupational Health.

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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*Mestranda em Ciências da Saúde pela Universidade Vale do Rio Verde, Professora do curso de Fisioterapia do Centro Universitáriode Belo Horizonte, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.**Graduandos doCurso de Fisioterapia do Centro Universitário de Belo Horizonte, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.***Mestre, Doutor em Medicina pela Universidade Federal de Minas Gerais, Professor do Curso de Pós-graduação em Ciências daSaúde da Universidade Vale do Rio Verde, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.

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I. Introdução

O interesse pelo estudo do estresse no

trabalho tem-se destacado nos últimos anos devido

ao impacto negativo que ele é capaz de proporcionar

na saúde e no bem-estar dos empregados e,

conseqüentemente, no funcionamento e na efetivi-

dade das organizações. Sabe-se que trabalhadores

estressados possuem capacidade produtiva dimi-

nuída, abstém mais do serviço, causam maior número

de acidentes de trabalho e aumentam os custos finan-

ceiros das empresas e organizações, investidos em

seus problemas de saúde1.

Miyamoto e Selye definem o estresse como o

resultado inespecífico de qualquer demanda capaz

de resultar em um efeito negativo na esfera mental,

física ou emocional do ser humano, provocado por

um agente estressante2,3. Seus estudos revelaram

que a exposição prolongada ao agente estressante

resulta em reações de defesa e adaptação, designada

à síndrome geral de adaptação. Essa síndrome

caracteriza-se por três fases, assim designadas3:

- Fase de alarme: reação do organismo à excitação

de agressão ou de fuga ao estressor, podendo ser

manifestada clinicamente por taquicardia, tensão

crônica, dor de cabeça, sensação de esgotamento,

hipocloremia, pressão no peito, extremidades frias,

dentre outros.

- Fase de resistência: fase de alerta, acrescida de

reações orgânicas direcionadas a um determinado

órgão-alvo, desencadeando a Síndrome de Adapta-

ção Local (SAL), na qual predominam sintomas

psicossociais como ansiedade, medo, isolamento

social, oscilação de apetite, impotência sexual, dentre

outros.

- Fase de exaustão: fase avançada na qual se obser-

va extenuação do organismo pelo excesso de ativi-

dade e pelo alto consumo de energia despendido nas

fases anteriores, com falência do órgão mobilizado

na SAL e manifestação de doenças orgânicas.

Estresse ocupacional é determinado pela

percepção que o trabalhador tem das demandas

existentes no ambiente de trabalho e por sua habili-

dade para enfrentá-las4. Segundo Jex5, as definições

de estresse ocupacional são determinadas pelos

agentes estressantes.

Os eventos são considerados estressantes

quando são percebidos desta forma pelo indivíduo.

Os fatores cognitivos têm um papel central no pro-

cesso que ocorre entre estímulos potencialmente es-

tressantes e as respostas do individuo a eles6. Carac-

terísticas situacionais e pessoais podem, assim, inter-

ferir no julgamento do indivíduo.

De acordo com Glowinkowski e Cooper7,8, es-

tes agentes constituem-se em fatores intrínsecos ao

trabalho, como repetição de tarefas, pressões de

tempo e sobrecarga. Este último pode ser dividido

em dois níveis: quantitativo e qualitativo. A sobrecarga

quantitativa diz respeito ao número excessivo de tare-

fas a serem realizadas. Já a sobrecarga qualitativa

refere-se à dificuldade do trabalho, ou seja, as deman-

das que estão além das habilidades ou aptidões do

trabalhador.

Inúmeras variáveis de natureza pessoal e

situacional também influenciam o estresse ocupacio-

nal. Em relação às variáveis situacionais, destaca-

se o suporte social encontrado pelo trabalhador, o

qual pode ser recebido do supervisor, dos colegas

de trabalho ou mesmo de pessoas fora do trabalho.

Quanto às variáveis pessoais que influenciam o

estresse ocupacional, o estilo de enfrentamento

(coping) do empregado frente aos eventos geradores

de estresse consiste na principal variável individual,

Lidiane C Custódio, Fabrício S Prata, Gabriel Sanábio, Janaína F Braga,Laura Amaral e Silva, Priscilla das Graças Morreale e Ricardo Costa-Val

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foco central de muitos estudos1.

II. Avaliação do estresse

A avaliação do estresse e sua relação com a

atividade ocupacional nos profissionais que compõem

a equipe de Saúde da Família, especialmente nos

Agentes Comunitários de Saúde, possibilitam a

compreensão e a correlação do estresse com a

complexa atividade ocupacional desenvolvida por

estes.

Essa avaliação pode ser realizada utilizando-

se instrumentos elaborados pelos próprios

profissionais do programa de saúde ou pelos gerentes

das unidades, executores de políticas organizacio-

nais. Outros instrumentos específicos, validados e

auto-aplicados podem também ser utilizados, como

o Inventário de Sintomas de Stress (ISSL) e a Job

Stress Scale.

O Inventário de Sintomas de Stress para

Adultos de Lipp – ISSL foi validado em 1994 por Lipp

e Guevara com base nos conceitos de Selye9,10. O

instrumento é composto de três quadros, cada um

se referindo a uma das fases do estresse, segundo

o modelo trifásico de Selye (alerta, resistência e

exaustão). Permite avaliar os sintomas de estresse

tanto a nível cognitivo quanto somático e possibilita

ainda identificar a fase de estresse em que o indivíduo

se encontra. O respondente aponta o sintoma de es-

tresse que tem apresentado, especificado em cada

quadro, em 24 horas, uma semana ou um mês. Os

dois primeiros quadros referentes às fases de alarme

e resistência, respectivamente, contam com 15 itens

cada e o terceiro quadro, que permite o diagnóstico

do estresse já em fase de exaustão, possui 23 itens.

A avaliação é feita em termos percentuais do teste.

O Job Stress Scale11, foi validado para o

português e tem como objetivo correlacionar o

estresse com a atividade ocupacional realizada pelo

trabalhador. Uma versão reduzida desse questionário,

originalmente elaborado por Karasek (49 perguntas),

foi elaborada na Suécia por Tores Theorell em 1988,

contendo 17 questões que avaliam: a demanda (5

questões), que é caracterizada por tempo e veloci-

dade na realização do trabalho e presença de tarefas

contraditórias; controle (6 questões), que é definido

como a possibilidade do trabalhador utilizar suas

habilidades intelectuais para a realização de seu tra-

balho, bem como possuir autoridade suficiente para

tomar decisões sobre a forma de realizá-lo, e apoio

social (6 questões), que são os níveis de interação

social, existentes no trabalho, tanto com os colegas

quanto com os chefes. Para ambas as dimensões,

as opções de resposta são apresentadas em escala

tipo Likert (1-4), variando entre freqüentemente, nun-

ca/quase nunca e concordo totalmente e discordo

totalmente.

Esses instrumentos permitem a exploração

de algumas dimensões do estresse no ambiente de

trabalho que pode ser complementada com a utili-

zação de outros métodos qualitativos contribuindo

assim para a elaboração de medidas mais efetivas

de controle e combate aos agentes estressantes rela-

cionados à atividade ocupacional.

III. O profissional da saúde e o estresse

A área de saúde é sabidamente caracterizada

por uma atividade profissional estressante. É comum

a queixa de estresse por parte dos profissionais deste

setor, sejam eles médicos, enfermeiros, psicólogos,

dentre outros. Espera-se, entretanto, que o estresse

apresentado por esses profissionais venha acompa-

nhado por esforços de enfrentamento capazes de

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gerenciar as conseqüências das fontes de estresse

e retornar o indivíduo a um nível estável de funciona-

mento homeostático12.

Em 1994, o Ministério da Saúde definiu a Es-

tratégia Saúde da Família como o eixo de reorgani-

zação da Atenção Básica à Saúde com o objetivo

geral de melhorar o estado de saúde da população

por meio da construção de um modelo assistencial

de atenção fundamentado na promoção, proteção,

diagnóstico precoce, tratamento e recuperação da

saúde, em conformidade com os princípios e as

diretrizes do Sistema Único de Saúde13. Atenção es-

pecial deve ser dada aos agentes comunitários de

saúde, que representam o elo entre a equipe de Saúde

da Família e a comunidade. Dentre as suas atribui-

ções profissionais, destaca-se o mapeamento da

comunidade com a identificação de microáreas de

risco, bem como o cadastramento das famílias por

meio de visitas domiciliares13.

Estudos sobre a realidade da Estratégia de

Saúde da Família no Brasil apontam para a existência

de pontos positivos na proposta, principalmente no

que diz respeito à ruptura com a lógica taylorista de

organização e gestão do trabalho, e também para

problemas em relação às condições de trabalho14.

IV. O trabalho dos Agentes Comunitários de Saúde

O trabalho desenvolvido pelos Agentes

Comunitários de Saúde mostra algumas situações

na relação trabalhador-usuário, que demandam certo

gasto de energia e adaptação em virtude do contato

direto com a realidade. O fato de residirem na área

de abrangência de trabalho somado às caracterís-

ticas individuais de cada trabalhador podem desen-

cadear o processo de estresse9,12. O estresse repre-

senta uma situação de risco, e, dependendo da inten-

sidade, as reações orgânicas direcionadas a um de-

terminado órgão-alvo com sintomas psicossociais,

características da fase de resistência, podem levar à

extenuação do organismo na fase de exaustão3.

Se, durante as atividades, a equipe de saúde

se depara com situações conflituosas ou de difícil

resolução, os profissionais da saúde poderão apre-

sentar alterações psicofisiológicas, as quais são

capazes de causar reações no organismo com

componentes físicos e/ou psicológicos causando o

estresse15.

Os Agentes Comunitários de Saúde consti-

tuem o primeiro contato entre a unidade e a população

de seu território de abrangência. Assim, atenção deve

ser dispensada aos mesmos, uma vez que repre-

sentam um elo entre a equipe de saúde e a comu-

nidade, sendo essencial capacitá-los para terem um

discernimento em relação a quais informações

poderão ser compartilhadas com o restante da equipe

e se tais informações são ainda potencialmente

benéficas à comunidade10,13. Associado a esse fato,

algumas atividades exercidas pelos Agentes Comuni-

tários de Saúde exigem certo conhecimento sobre

patologias e noções do processo saúde-doença,

exigindo maior conhecimento dos mesmos sobre

quais os cuidados devem ser providenciados e

tomados nos enfermos em consonância com os de-

mais profissionais do Programa de Saúde da Famí-

lia16.

Freqüentemente, o trabalho da equipe de

Saúde da Família e especialmente dos Agentes

Comunitários de Saúde exige a necessidade de se

produzir muito em pouco tempo, bem como a repe-

tição de tarefas. Segundo Glina17, os trabalhadores

recebem sobrecargas tanto qualitativas, quanto

quantitativas, representando alto volume de trabalho

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mental por unidade de tempo e complexidade do

trabalho frente a capacidades e experiências do

trabalhador.

Essas sobrecargas representam fatores

estressantes em um ambiente ocupacional represen-

tando uma preocupante situação, potencialmente

causadora de doenças nos trabalhadores, já que a

combinação entre altas demandas e baixos controles

sobre o trabalho é sabidamente situação de estresse

ocupacional.

Glina18 et. al. avaliaram a correlação entre a

saúde mental e o trabalho, concluindo que, de manei-

ra geral, quanto menor a autonomia do trabalhador

na organização de suas atividades, maiores as

possibilidades destas gerarem transtornos na esfera

mental. Além disso, o excesso de trabalho e a pres-

são por maior produtividade estão presentes em todos

os degraus da hierarquia profissional.

Quanto ao suporte social, a existência de um

ambiente calmo e agradável de trabalho e um bom

relacionamento entre os profissionais constituem fato-

res determinantes para a efetividade do trabalho em

equipe. Segundo Tamayo19, variáveis de suporte or-

ganizacional que envolvem processos de gestão e

gerenciamento podem diminuir a exaustão emocional.

Esses processos devem ser executados de forma

participativa e colaboradora, tendo ainda a caracte-

rística de tornarem elementos incentivadores do sen-

timento de valorização profissional nos subordinados.

Ações que melhoram as relações sociais dentro do

ambiente de trabalho e a presença de políticas claras

de divulgação de informação, atualização e planeja-

mento são também medidas sabidamente redutoras

do estresse ocupacional18.

Siqueira20 sugeriu que os gerentes devem

conscientizar-se da importância de seus papéis como

executores de políticas organizacionais, visto que, no

esquema mental de reciprocidade dos trabalhadores,

a noção de organização doadora é estruturada a partir

de atos gerenciais, sendo essas ações o início da

troca social que, por sua vez, levam os empregados

a se posicionarem como beneficiários e a acredita-

rem no suporte organizacional. O resultado final des-

sa atitude é a criação de vínculos afetivos entre

trabalhadores e a estrutura organizacional na qual

estão inseridos, o que leva a um maior comprometi-

mento dos mesmos.

V. Conclusão

A avaliação da incidência de sintomas psico-

lógicos, a determinação das fases de estresse apre-

sentadas pelos agentes comunitários de saúde e sua

correlação com as situações vivenciadas pelos

mesmos, nas diferentes áreas de risco, justificam-

se, uma vez que o contato direto com a comunidade

é um agente estressante de relevante magnitude.

Além disso, sabe-se que, dentre os profissionais da

área da saúde, aqueles que atuam na comunidade

têm maior dificuldade adaptativa aos fatores estres-

santes, uma vez que não só se expõem continua-

mente a problemas de naturezas diversas, mas são

frequentemente surpreendidos por eles9,12.

Em relação ao contexto organizacional, a pre-

sença de trabalhadores estressados na equipe é ca-

paz ainda de provocar o desenvolvimento de ativida-

des ineficientes, desorganizadas e com comunicação

deficitária, o que leva a uma insatisfação e diminuição

da produtividade, resultando em uma má assistência

de saúde à comunidade9,12. A presença do estresse

e a incapacidade para enfrentá-lo podem resultar ainda

em enfermidades físicas e mentais.

A avaliação do estresse ocupacional dos Agen-

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tes Comunitários de Saúde se justifica, visto que o

baixo controle e as altas demandas exigidas pelo tra-

balho podem contribuir para o desenvolvimento do

estresse em relação à atividade ocupacional.

Especial atenção deve ser dada aos profis-

sionais propensos a reações mais intensas aos estí-

mulos estressantes, o que resulta em benefícios tanto

para a equipe de Saúde da Família quanto para a co-

munidade assistida.

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Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

194

Lidiane C Custódio, Fabrício S Prata, Gabriel Sanábio, Janaína F Braga,Laura Amaral e Silva, Priscilla das Graças Morreale e Ricardo Costa-Val

Avaliação do estresse ocupacional em Agentes Comunitáriosde Saúde da região metropolitana de Belo Horizonte - MG

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Endereço para correspondência:

Lidiane Cristina Custódio

Centro Universitário de Belo Horizonte-UNIBH

Depto. de Fisioterapia

Av. Professor Mário Werneck, 1685

Belo Horizonte – MG – Cep: 30455-610

Endereço eletrônico :

[email protected]

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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Lidiane C Custódio, Fabrício S Prata, Gabriel Sanábio, Janaína F Braga,Laura Amaral e Silva, Priscilla das Graças Morreale e Ricardo Costa-Val

Avaliação do estresse ocupacional em Agentes Comunitáriosde Saúde da região metropolitana de Belo Horizonte - MG

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ABSTRACT

This paper reviews the development of the specialty of family medicine with attention to strategies that

may be used to strengthen Brazilian health care with appropriately trained family doctors. These strategies

include establishing academic departments of family and community medicine in all Brazilian medical schools,

ensuring a common core curriculum in training programs, and defining standards for the evaluation and

certification of family doctors. These strategies could enhance the quality, scope and effectiveness of the

Brazilian Family Healthcare Program.

RESUMO

O presente artigo resgata o desenvolvimento da Medicina de Família e Comunidade como

especialidade, com enfoque nas estratégias capazes de fortalecer o sistema de saúde brasileiro com médicos

de família adequadamente capacitados. Tais estratégias envolvem o estabelecimento de departamentos de

Medicina de Família e Comunidade em todas as escolas médicas brasileiras, a garantia de um currículo

básico comum para os programas de treinamento e a definição de padrões para a avaliação e a certificação

de médicos de família. A implementação destas estratégias pode contribuir para um aumento da qualidade,

abrangência e eficácia do Programa Saúde Família Brasileiro.

Atenção Primária; Medicina de Família e Comunidade; Avaliação Profissional.

Strengthening Primary Health Care withFamily and Community Medicine in Brazil

Fortalecendo a Atenção Primária à Saúde no Brasilcom a Medicina de Família e Comunidade

Cynthia Haq*Gustavo Gusso**

Maria Inez Padula Anderson***

RBMFC

KEY WORDS:- Family Practice;- Employee Performance Appraisal;- Primary Health Care;

PALAVRAS CHAVE:- Medicina de Família e Comunidade;- Avaliação de Desempenho;- Atenção Primária à Saúde.

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

196

*Professor of Family Medicine and Community Health Sciences, University of Wisconsin School of Medicine and Public Health, USA**Family and Community Doctor, Director of Brazilian Society of Family and Community Medicine and Consultant of Department of Primary HealthCare of Ministry of Health.***Professor of Family and Community Medicine, Head of Department of Family and Community Medicine, Rio de Janeiro State University andPresident of Brazilian Society of Family and Community Medicine

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Cynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson Strengthening Primary Health Care with Family and Community Medicine in Brazil

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

197

I. The development of family medicine

Since the beginning of western medical

science most physicians have been generalists who

could provide care for patients of all ages and for most

problems. The exponential rise of medical information

and technology that began after WW II resulted in rapid

developments in medical therapies and specialization

among doctors. Specialists offered new therapies to

improve the quality and duration of life for many

patients. Yet, most people still desired personal

relationships with health professionals who could

provide comprehensive care for common problems,

who could care for all members of the family and who

could coordinate referrals to specialists as needed.

The growth of medical information and

therapies in the last century resulted in the need for

physicians to master a greater body of knowledge for

providing high-quality comprehensive primary health

care. Specialty training and certification after medical

school can ensure that family doctors demonstrate

required competencies. Family medicine training

programs are a manifestation of the response of health

systems and academic medical centers to provide

comprehensive health services to meet the needs of

individuals, families and communities1.

As early as 1963, a World Health Organization

Expert Committee on Professional and Technical

Education of Medical and Auxiliary Personnel defined

family physicians as “practicing physicians that have

the essential characteristic of offering to all members

of the families they serve direct and continuing access

to their services… These doctors accept responsibility

for total care either personally or by arranging for the

use of specialized clinical or social resources.” The

committee noted that “in every country of the world

there appears to be a dearth of family physicians, this

applies to all countries irrespective of their stage of

development”. It recommended that every medical

school provide opportunities for students to train in

family practice settings and that, in order to raise the

standards of family medicine, all graduates choosing

family practice should undergo a period of postgraduate

training specifically designed to meet their needs in

this field of medicine2. This concern was again

reflected in the 1995 World Health Assembly Resolution

WHA 48.8 that urged all member countries to support

reform of basic medical education “to take account of

the contribution made by general practitioners to primary

health care-oriented services” 3.

While medical school training introduces

students to the basics of primary health care,

postgraduate training for family medicine was

developed to provide opportunities for medical school

graduates to become ‘specialists in primary health

care’, to ensure delivery of comprehensive high-quality

health care services across the life span. Family

medicine postgraduate training evolved at different

rates in different areas of the world. In 1966, the United

Kingdom started a general practice vocational training

program. During the same decade Canada, the United

States and several other countries initiated programs

specifically designed to train family doctors. By 1995,

at least 56 countries had developed family medicine

training programs4. Family medicine training programs

have been established through a variety of

mechanisms, most often in partnerships with medical

schools, in community hospitals and/or with practicing

community physicians5,6 .

Family medicine postgraduate or residency

training programs engage students and faculty in

providing comprehensive care for patients of all ages

as well as orientation to the care of families and

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communities. In this process, family doctors become

familiar with the problems, resources and special

needs of the people they serve, and are able to adapt

education, research and service programs to respond

to these needs. Numerous studies have confirmed that

well-trained family physicians provide high-quality, cost-

effective health care services to patients of all ages.

Health outcomes of individuals and populations can be

improved through access to family doctors and

comprehensive primary health care services7.

Despite the demonstrated value of family

doctors, family medicine is not yet recognized or

established as a distinct medical specialty in many

nations. However this situation is rapidly changing as

many countries are working to establish formal

programs to train and certify family doctors. Family

medicine training programs have been established in

most Latin American countries and are in various stages

of development in many African and Asian nations.

II. The Development of Family and Community

Medicine in Brazil

In Brazil, although programs to train generalist

physicians started in the 1980s, family medicine is still

not considered an attractive specialty and the field has

not been able to attract a sufficient number of trainees

to meet the needs of the population.

The Brazilian National Committee of Medical

Residency recognized the specialty of General

Community Medicine in 1981. For many years this

discipline was restricted to a few places and educational

institutions such as UERJ in Rio de Janeiro, Murialdo

and GHC in Porto Alegre among others. Some family

doctors worked in the private sector in locations such

as Fundação Rubem Berta (RS), Cassi (diverse

states) and Firjan (RJ). One reason why these

programs were not popular was that there weren´t

places to work as “General Community Doctors”.

Health centers were organized based on policlinic

model:one internist, one pediatrician and one gynecologist.

But other reasons could be appointed as well like the

current distrust in the specialty by medical students

because of lack of contact during medical school. In

2001, the name of General Community Medicine was

changed to Family and Community Medicine but the

program reminded the same. Today, Family and

Community Medicine is one of the 52 specialties

recognized by the Brazilian Medical Association, the

Federal Medical Council and the National Committee

of Medical Residency (Comissão Nacional de

Residência Médica-CNRM), a committee of the Ministry

of Education, which regulates all Medical Residency

programs in Brazil.

In 1994 the Brazilian government launched the

Family Health Program (FHP) and in 1998 the FHP

was adopted as a strategy for reorganizing primary

care (Brazil, Ministry of Health 1994 and 1998). The

FHP provided employment opportunities for family

doctors in the public sector so the specialty could expand

to other cities and institutions.

Despite the advent of the FHP and incentives

provided by the Federal Government (National

Directives for the Curriculum of the Graduate Course

in Medicine - Diretrizes Nacionais do Curso de

Graduação em Medicina - RESOLUÇÃO CNE/CES Nº

4, de 7 de novembro de 2001) to teach undergraduate

medical students primary health care (PHC), few

students choose the specialty of Family and Community

Medicine. Factors that discourage student selection

include unattractive work places, insufficient information

about the specialty and shortage of teachers. There

are only few departments and teachers of family

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medicine in the medical schools. Many students and

faculty do not understand that family medicine is a

comprehensive discipline nor do they realize that

postgraduate training is required. Many young

physicians opt for established specialties such as

pediatrics or internal medicine and then seek employment

in the FHP.

III. Establishing Departments of Family and

Community Medicine

Many actions are needed for promoting family

and community medicine among medical students.

The first priority is to develop academic departments

in order to recruit and prepare highly qualified family

physicians. Universities are in urgent need of family

and community medicine faculty. Family and community

medicine faculty who understand and can demonstrate

comprehensive primary health care will be able to show

that this specialty is much more than an amalgam of

internal medicine, gynecology, pediatrics and surgery.

Family and community medicine includes a defined

body of knowledge. Family and community medicine

faculty are able to practice and teach more effectively

when supported in academic environments.

Departments or units of family and community

medicine provide leadership for establishing the

discipline in academic settings and for organizing

resources to conduct teaching, patient care, and

research programs that address the health needs of

the community. Departments of family and community

medicine require participation of leaders who

understand and support the important principles,

functions and roles of family medicine. These leaders

may include government authorities, medical association

representatives, practicing family doctors in the

community, staff from medical schools and teaching

hospitals, public health officials and private insurers.

Departments of family and community medicine

require human and physical resources to deliver the

full spectrum of family medicine education, services

and research programs. Human resources include

faculty, physicians and staff with time available to teach

and adequately supervise trainees, develop curricula,

and conduct research. Practicing community family

doctors may be recruited as part-time clinical supervisors

or tutors. Physical resources include centers that

integrate teaching and clinical services. In these

centers, patient care may be provided by teams that

include practicing physicians, residents or students

in training, nurses, social workers, and other health

professionals. Family medicine teaching centers, which

may be incorporated into community physicians’ practices

or community health centers, may also serve as

important sites for primary care research.

Departments of family and community medicine

often require governmental and institutional financial

support. Once established, clinical revenues, research

grants and hospitals often finance a substantial

proportion of services. Departments usually begin with

a small number of faculty and staff members. As

teaching, clinical and research programs grow and

resources increase, additional members may be

recruited. Specialists in other fields and those with

PhD degrees can be valuable teachers of family

medicine, however community-based family physicians

that understand the practice and who have interest in

teaching are essential. Community or district hospitals

are often important partners in the development and

support of departments of family and community

medicine. Faculty physicians and residents in training

provide important clinical services for these institutions.

A partnership approach ensures mutual benefits for

Cynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson Strengthening Primary Health Care with Family and Community Medicine in Brazil

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the community, the hospital and the department.

In some countries, departments of family and

community medicine are well established and enjoy

a reputation similar to that of any other department in

their respective academic institutions. In other

countries, where family medicine is not fully recognized

as a discipline and a specialty, the establishment of a

department may contribute to creating the momentum

that will lead to full recognition and development of the

profession.

IV. How to attract students to family and

community medicine careers

Academic departments of family and

community medicine can provide opportunities for

students to interact with family physicians during

medical school. When interacting with family physicians

in classroom and clinical settings and perceiving

family doctors as valued members of health teams,

students are more likely to consider family practice

careers8.Enthusiastic family doctors who demonstrate

humanistic values, provide high-quality patient care

and excellent teaching can serve as positive role

models that many students will wish to emulate. On

the other hand, if students are not put in contact with

family medicine during their education they may be

unaware of the content and challenges associated

with family practice and will be less likely to select this

as a career.

In some countries, government policies

regulate the number of specialty training positions for

family medicine and other medical disciplines through

financial incentives or legislation. If these policies are

based on sound information regarding projected health

workforce needs, incentives can be provided for attracting

students to select careers that match the care needed

by the population. Strategies to attract students to

careers in family medicine are summarized below:

• Recruit and admit students interested in primary care

and community service.

• Emphasize primary care in the required curriculum.

• Offer high-quality rotations in health centers with

family doctors.

• Provide opportunities for students to work one on

one with family doctors.

• Ensure sufficient family and community medicine

specialty training programs.

• Provide incentives to encourage selection of careers

in family practice.

• Offer a variety of career opportunities in family

medicine.

• Support family medicine graduates with competitive

salaries and career paths.

V. Establishing associations, standards for training,

quality and certification

Family practice associations provide a rich

array of expertise and resources to assist in the

development of the specialty. They provide opportunities

to locate colleagues with shared interests and to

collaborate on joint projects. Providing appropriate

continuing medical education for family doctors is an

important service of national associations. This

includes conducting educational programs, sponsoring

educational journals, and certifying that educational

activities are well designed and appropriate for

improving the skills of family doctors. Family medicine

networks at the local, regional, national and international

levels allow colleagues to develop specific aspects

of the specialty such as teaching, research or quality

improvement in greater depth.

Another important activity of professional

Cynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson Strengthening Primary Health Care with Family and Community Medicine in Brazil

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organizations is training new doctors in their chosen

discipline and certifying that they are properly trained.

Currently, in Brazil, there are wide variations in the

curriculum and qualifications of those identifying

themselves as family doctors. Until standards are

established, disseminated and enforced, there will be

wide variations in the skills and confusion as to the

identity and even the value of family doctors. National

organizations can exert considerable influence on

training programs by establishing minimum training

requirements and core competencies for certification9.

The process of certification can be supervised

by professional family medicine associations or

certifying bodies can be organized independently.

There are a variety of approaches to certification10.

Certification can be obtained through two separate

pathways in Brazil: 1) studying in a residency training

program recognized by the ministry of education; or

2) meeting defined standards of professional

performance in the setting of the practice and passing

an examination. The Certification of Family and

Community Medicine (TEMFC) examination given by

the Brazilian Society of Family and Community

Medicine is the only exam authorized by the Brazilian

Medical Association. This certification includes two stages:

1) analysis of the curriculum, which requires at least

3 years of medical practice; and 2) passing an exam.

Completion of a medical residency recognized by the

Ministry of Education and the TEMFC have the same legal

value in Brazil. Legally, only a residency recognized by

the National Committee of Medical Residency can be

called “medical residency” (Art 1° § 2.º It is forbidden

to use the term “Medical Residency” for any medical

training program that has not been approved by the

National Committee of Medical Residency, Law Nr.

6.932, of July 7, 1981). Those activities not recognized

as legal residency must be called Continuing Medical

Education.

Another option for family and community medicine

physicians to achieve standards is through Continuing

Medical Education. The Royal New Zealand College of

General Practitioners, for example, provides options

for candidates to qualify for specialty certification

through clinical training and examinations or through

practice eligibility routes. In some countries, the standards

for training and re-certification of family doctors are

more stringent than for other specialties. The

certification process for family doctors may include

assessments of consultation and communication

skills, practice management skills, ethical standards,

patient satisfaction and medical chart audits. In many

countries, family doctors are required to complete a

minimum number of hours of continuing medical

education annually in order to maintain their certification.

In the United States, the American Board of Family

Practice was the first specialty society to require

members to pass a re-certification examination every

seven years. In Brazil, this process started in 2006;

from this year forward all specialists must achieve

100 points every 5 years through distance education

courses, attending meetings or engaging in other

activities approved by the Brazilian Medical Association.

VI. Summary:

During the last 12 years, the Brazilian Ministry

of Health has been developing the “Programa de

Saúde da Família” (Family Health Program) to provide

high-quality health care for the Brazilian population.

Today there are more than 27,000 physicians engaged

with this program although less than 2.000 are family

physicians. Family and community medicine is already

strengthening primary health care and improving the

quality of the Brazilian Family Health Program.

Cynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson Strengthening Primary Health Care with Family and Community Medicine in Brazil

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However, many more family and community medicine

physicians need to be trained, certified and recruited

to fully address the primary health care needs of the

country. Family and community medicine faculty,

departments, certification and continuing medical

education programs are essential to enhance the

growth and quality of this specialty.

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by assessment. London, Royal College of General

Practitioners, 1995 (Occasional Paper 50, 2nd ed.).

Address:

Cynthia Haq

University of Wisconsin School of Medicine and Public

Health 4235 Health Sciences Learning Center

750 Highland Avenue - Madison, WI 53705 - EUA

E-mail:

[email protected]

Cynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson Strengthening Primary Health Care with Family and Community Medicine in Brazil

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RESUMO

Os problemas psicológicos são muito comuns nos consultórios dos médicos generalistas. Incluem,

pela incidência, os transtornos somatomorfos e os episódios depressivos com sintomas somáticos. Esses

distúrbios não apresentam nenhuma patologia orgânica. A Clínica foi, em seus primórdios, classificadora. A

doença recebeu uma organização hierarquizada em famílias, gêneros e espécies. O papel do médico era o

de descobrir a doença no doente. A doença se apresentava segundo os sintomas e os sinais. A Clínica

baseava-se na anatomia patológica e na fisiopatologia. Devido a esta longa tradição secular, que o condicionou

a investigar o “orgânico”, o médico não está preparado para cuidar de pacientes com problemas psicológicos.

Isso porque não encontra o substrato anátomo e fisiopatológico a que foi exercitado a descobrir. Uma proposta

para capacitar o médico generalista a lidar com as emoções na prática médica é o “grupo Balint”. Trata-se

de um método de capacitação em seminários de grupo, com sessões semanais e duração de dois anos,

fundamentado em apresentação de casos. O objetivo é obter uma mudança de personalidade do generalista,

limitada, porém significativa, de maneira a habilitá-lo a cuidar de seus pacientes com problemas psicológicos.

ABSTRACT

Patients with psychological problems are very common in the offices of general practitioners. Grouped

according to their incidence these problems include somatoform disorders and episodes of depression with

somatic symptoms. These disorders have no organic basis or known physiological cause. In its early

beginnings, medicine and medical regard were classificatory. Disease was organized hierachically into families,

As origens históricas da Clínica e suas implicaçõessobre a abordagem dos problemas psicológicos naprática médica

The historical development of modern medicine: implicationsfor an approach to psychological problems in the medical practice

Fernando Antônio Mourão Flora*

RBMFC

PALAVRAS-CHAVE:- Medicina Clínica;- Relação Médico-Paciente;- Somatização;

PALAVRAS CHAVE:- Clinical Medicine;- Physician-Patient Relations;- Somatoform disorders.

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

203

*Médico, Mestre em Saúde Pública, SMS Belo Horizonte, MG, Brasil.

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genera and species. The role of the physician was to

discover the patient’s disease. The disease presented

itself through symptoms and signs. Medical practice was

based on anatomical pathology and physiopathology.

Due to this secular tradition during which he was

conditioned to investigate the “organic”, the physician

is not prepared for providing care to patients whose

problems are of psychological nature. The anatomical

and physiopathological substrate he was trained to

discover is lacking.

The “Balint group” represents a proposal for

capacitating the general practitioner for dealing with

the emotional in his medical practice. This is done in

two-weekly seminars during a two-years’ period, based

on case reports. The objective of this initiative is to

provoke a limited but significant change in the personality

of the general practitioner for enabling him to provide

care to his patients presenting with psychological

problems.

I. Introdução

Um paciente chega à consulta do generalista

com o problema de distúrbios neurovegetativos que

o impedem de adormecer; outro se queixa de

fraqueza, perda de peso e de apetite. Em um aten-

dimento de urgência, uma cliente apresenta uma “dra-

mática” dispnéia, simulando uma crise de asma. Os

exemplos poderiam multiplicar-se indefinidamente.

Esse é o cotidiano do médico: uma parte de seus

pacientes apresenta uma sintomatologia em que não

é detectada nenhuma patologia orgânica. Muitas

vezes, o médico considera que esses pacientes “não

têm nada”1 ou que são pessoas “nervosas”, cujas

doenças estão “em suas cabeças”2. A peça teatral O

doente imaginário, de Molière, é uma sátira deste tipo

de patologia.

Nos exemplos citados acima, o paciente com

distúrbio neurovegetativo é um homem de meia-idade

com problemas financeiros, a senhora emagrecida

perdeu seus sobrinhos, assassinados, e a cliente

dispnéica está em uma crise conjugal devido à infi-

delidade do marido. Portanto, são pacientes que se

consideram doentes fisicamente, mas que, inconsci-

entemente, apresentam problemas psicológicos co-

mo causa de seus sintomas.

As estimativas variam; todavia, calcula-se que

entre um quarto e um terço dos pacientes que re-

correm ao generalista estão em uma condição de

estresse psicossocial3. O que se constata é que o

médico não está preparado para atender a estes

casos nem sabe qual conduta adotar2,4.

Procuremos, inicialmente, delimitar este

contingente de pacientes. Pode-se entender por

“problemas psicológicos” na prática médica uma

ampla rede de patologias, que abarca, pela incidência,

os transtornos somatomorfos e os episódios depres-

sivos com sintomas somáticos5,6. Trata-se de uma

série significativa de patologias atribuídas à influência

exercida sobre o corpo pelas emoções7.

Um expressivo número de indivíduos rotulados

como nervosos, neurastênicos, psicastênicos, histé-

ricos, neuróticos e psicopatas, doentes funcionais,

doentes psicógenos, doentes psicossomáticos pode

apresentar distúrbios funcionais8.

Detenhamo-nos aos transtornos somato-

morfos pelo seu mimetismo com as doenças físicas5.

Incluem o transtorno de somatização, o transtorno

conversivo, o transtorno doloroso, a hipocondria e o

transtorno dismórfico corporal7,9.

Segundo H. J. Weitbrecht8, os transtornos

somatomorfos (ou funcionais) do organismo com-

põem um grupo heterogêneo de distúrbios que não

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apresenta nenhuma patologia orgânica. O primário

nestes pacientes é uma atitude ou desenvolvimento

psíquico anormais, que secundariamente dão lugar

a disfunções vegetativas, vasculares ou neuroendó-

crinas.

Os transtornos somatomorfos situam-se na

fronteira da Medicina e da Psiquiatria. Possuem os

atributos seguintes: (a) a tendência do paciente a “ex-

perienciar” e a comunicar sintomas somáticos; (b) os

sintomas não são sustentados por achados patoló-

gicos; (c) o paciente atribui suas queixas a uma doen-

ça física; (d) o paciente procura ajuda médica para

os sintomas; (e) o estresse psicossocial, assim como

a vulnerabilidade da personalidade ao estresse, pode

ser uma característica associada (embora o paciente

não reconheça e até mesmo negue qualquer ligação

entre os sintomas e causas psicológicas). O denomi-

nador comum desses distúrbios é que tendem a se

manifestar como se a anatomia não existisse4.

A maioria destes pacientes é vista e tratada

sintomaticamente por médicos generalistas, por es-

pecialistas (não-psiquiatras) ou por adeptos da medi-

cina alternativa. São muito comuns nos consultórios

dos médicos generalistas. Calcula-se em um terço

o número de consultas em Atenção Primária à Saúde

em que nenhuma patologia orgânica é identificada

(na experiência de consultório do médico de família

de Waco, Texas, em uma amostra de 1.073 pacientes

foram identificados 120 com transtornos somatomor-

fos)3.

Existe o risco de diagnosticar erroneamente

um transtorno funcional neurótico onde na realidade

existe uma doença orgânica. Não é fácil fazer o diag-

nóstico de transtorno somatomorfo. É evocado pelo

generalista quando o paciente apresenta, repetida-

mente, queixas vagas e variadas, sem uma etiologia

estabelecida. Esses pacientes requerem mais tempo

de consulta e são considerados “difíceis”, ou no termo

em inglês, doctor shoppers 1.

Esses problemas clínicos, pois, são freqüen-

tes e associados com altos custos diretos e indiretos.

Os pacientes com transtornos somatomorfos são

submetidos a uma enorme bateria de exames com-

plementares e procedimentos diagnósticos inúteis.

Os resultados falso-positivos podem levar a trata-

mentos equivocados, complicações, morbidade des-

necessária e desperdícios7.

Por se situarem na fronteira entre disciplinas,

existe pouca pesquisa sobre o diagnóstico e o

tratamento dos transtornos somatomorfos. A avalia-

ção de seu tratamento pelo generalista pode ser

considerada como insatisfatória3. Os médicos cen-

tram-se no alívio dos sintomas, por meio da prescri-

ção de medicamentos, como é o procedimento pa-

drão. Várias tentativas terapêuticas acabam não dan-

do resultado, frustrando o médico e o paciente10,11.

A questão a ser elucidada neste artigo refere-

se à abordagem dos problemas psicológicos (em

sentido genérico) na prática médica e a falta de pre-

paro dos generalistas para abordá-los. Assim, a pri-

meira pergunta a ser respondida é explicar por que o

generalista está despreparado para lidar com estas

patologias de fundo emocional, tão freqüentes em sua

prática. O meio para decifrar este paradoxo será a

análise de discurso do ensaio O Nascimento da Clíni-

ca, do filósofo estruturalista Michel Foucault.

Uma vez explicado o paradoxo, o ponto é

como capacitá-lo para cuidar dos clientes com esses

distúrbios. Por fim analisa-se o método Balint como

estratégia para habilitar os generalistas no manejo

dos problemas psicológicos de seus clientes.

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II. O Nascimento da Clínica

O médico, condicionado a se ocupar do

“orgânico” por uma longa tradição secular, não está

preparado na sua prática cotidiana para lidar com os

problemas psicológicos de seus pacientes. Isso

porque não encontra o substrato anátomo e fisio-

patológico a que foi exercitado a descobrir. É costume,

então, emitir o seguinte juízo, eivado de conseqüên-

cias: “O doente não tem nada”. Somente é possível

entender esta postura à luz da história da estruturação

da Clínica através do tempo.

O Nascimento da Clínica é o título do livro do

filósofo Michel Foucault12 que faz um estudo arqueo-

lógico do saber médico ocidental, por meio de uma

análise estrutural de seus textos. Procedemos a um

sumário de sua obra, apresentada a seguir.

Desde a Renascença, ocorreu uma mudança

na tradição médica, que vinha desde o século V, na

Grécia, com a longa história dos sistemas, ou seja,

da influência da metafísica. Pode-se situar o nasci-

mento da medicina moderna no final do século XVIII.

Passou-se a privilegiar o empírico (a percepção) e a

razão, com o abandono das teorias, dos velhos sis-

temas e de suas especulações imaginárias. A experi-

ência clínica pôs por terra o dogma aristotélico e ini-

ciou o discurso científico.

Nos seus primórdios, esta medicina era clas-

sificatória. A experiência médica do século XVIII ocu-

pou-se, constitucionalmente, de organizar um campo

nosológico. Estudava-se “a maneira como a natureza

produz e entretém as diferentes formas de doenças”,

no dizer de Sydenham13. A doença recebeu uma orga-

nização hierarquizada em famílias, gêneros e espé-

cies. Frier14 ensinava: “O conhecimento das doenças

é a bússola do médico; o sucesso da cura depende

de um conhecimento exato da doença”.

A medicina das espécies patológicas consi-

derava o hospital um lugar artificial, onde a doença

alojada incidia no risco de perder suas características

originais. Ela podia sofrer toda forma de complicação,

que os médicos chamavam de “febre” dos hospitais

ou das prisões. O lugar natural da doença era o da

vida: a família. Diferente do internista, que lidava com

doenças desfiguradas, o médico que tratava em

domicílio “adquire em pouco tempo uma verdadeira

experiência, fundada sobre os fenômenos naturais

de todas as espécies de doenças”15. O papel do mé-

dico era o de descobrir a doença no doente, escondida

nele como um criptograma. A doença possuía uma

organização que lhe era própria. O doente era um

“acidente” da doença, o objeto transitório do qual ela

se apossava. Segundo Cabanis16: “as diferentes do-

enças servem de texto”. O doente era o veículo por

meio do qual este texto se exprimia, às vezes de

forma complicada e embaralhada. Girbal descrevia

o domínio clínico17:

“Esclarecer o princípio e a causa de uma do-

ença através da confusão e da obscuridade dos sin-

tomas; conhecer sua natureza, suas formas, suas

complicações; distinguir na primeira olhada todas as

suas características e todas as diferenças [...]”.

O exame clínico procurava estabelecer a

relação entre os fenômenos, os antecedentes e os

distúrbios constatados, de forma a poder pronunciar

um nome: o da doença. Uma vez feita essa desig-

nação, deduzia-se facilmente as causas, o prognós-

tico, as indicações. Tratava-se, portanto, da desco-

berta de uma “verdade”, escondida, já presente no

corpo do doente: o nome da doença.

A clínica consistia na arte de “demonstrar

mostrando”. Cabanis18 assim explicava o ensino mé-

dico: “O professor indica a seus alunos a ordem pela

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qual os objetos devem ser observados, para serem

melhores percebidos e gravados na memória”.

Acompanhe-se a descrição das aulas de clínica cirúr-

gica de Desault, em 1781, no Hôtel-Dieu:

“Sob os olhos de seus expectadores, fazia

trazer os doentes mais graves, classificava suas

doenças, analisava as características, definia a conduta

a ser adotada, praticava as cirurgias necessárias,

prestava conta dos seus procedimentos e de seus

motivos, mostrava as mudanças diárias e apresentava

o estado das partes após a cura... ou demonstrava

sobre o corpo privado de vida as alterações que

haviam tornado a arte inútil” 19.

Desde a Renascença, a Clínica foi, provavel-

mente, a primeira tentativa para fundar uma ciência

fundamentada unicamente no campo perceptivo e

uma prática guiada pelo exercício do olhar. Segundo

Petit20: “É preciso, tanto quanto possível, tornar a

ciência ocular”. Na tradição médica do século XVIII, a

doença se apresentava ao observador segundo os

sintomas e sinais.

O sintoma ocupava um lugar especial porque

era a forma sob a qual se apresentava a doença. De

tudo o que era visível, era o mais próximo do essencial

e era a primeira transcrição da natureza inacessível

da doença. Os sintomas deixavam transparecer a fi-

gura invariável, retraída, visível e invisível da doença.

Para Broussonnet21:

“Nós entendemos por fenômeno, toda mudan-

ça notável do corpo sadio ou doente; daí a divisão

entre aqueles que pertencem à saúde e os que

designam a doença: estes últimos confundem-se

facilmente com os sintomas ou aparências sensíveis

da doença”.

Por essa simples oposição às formas da saú-

de, o sintoma deixava de ser um fenômeno natural

passivo e tornava-se representação da doença.

A clínica supunha a visibilidade da doença, o

olhar e o objeto entrelaçados pela natureza e pela

origem. Era o olhar médico que abria o segredo da

doença e era essa visibilidade que a tornava penetrá-

vel à percepção. O olhar que observava evitava intervir:

era mudo e sem gesto. A pureza do olhar do clínico

estava ligada a certo silêncio que permitia escutar:

“Toda teoria silencia ou sempre some ao pé do leito

do doente”, na expressão de Corvisart22. Também de-

via ser contido o imaginário, que antecipava sobre o

que se percebia, descobria relações ilusórias e fazia

falar o que era inacessível aos sentidos. O olhar clí-

nico tinha esta propriedade paradoxal de ler a nature-

za no momento em que percebia um espetáculo. Pinel23

assim o descrevia:

“Os sinais exteriores pegos do estado do pul-

so, do calor, da respiração, das funções de raciocínio,

de alteração dos traços do rosto, das afecções ner-

vosas ou espasmódicas, da lesão dos apetites natu-

rais, formam, por suas diversas combinações, qua-

dros diversos, mais ou menos distintos ou claramente

delimitados [...]. A doença deve ser considerada como

um todo indivisível, desde o seu início até o seu tér-

mino, um conjunto regular de sintomas característicos

e uma sucessão de períodos”.

O exercício da observação clínica abria um

novo espaço: o espaço concreto do corpo, massa

opaca onde se escondiam segredos, lesões invisíveis

e o mistério mesmo da vida. A medicina dos sintomas

engendrou aquela dos órgãos e das causas, uma

clínica com base na anatomia patológica, a idade de

Bichat.

A Medicina só podia ter acesso ao que a fun-

dava cientificamente, contornando, com lentidão, os

obstáculos da religião, da moral e dos preconceitos.

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Isso até se admitir que o cadáver fazia parte, sem

contestação religiosa ou moral, do campo da Medici-

na. Morgagni, na metade do século XVIII, não teve

dificuldades para fazer suas autópsias. Como o

Sepulchretum (Bonet, 1700), o tratado de Morgagni

(De sedibus, 1760) procurava estabelecer que a ana-

tomia patológica fundava a Clínica, que as lesões ex-

plicavam os sintomas. A concepção era de que a ana-

tomia definia a forma fundamental da espacialização

local e, por uma relação de contigüidade, as vias da

comunicação fisiológica ou patológica.

A maior descoberta de Bichat foi um princípio

para decifrar o espaço corporal, que era ao mesmo

tempo intra, inter e trans-orgânico. O elemento

anatômico foi deslocado de sua condição primeira

na espacialização, que passou a ser o tecido. Bichat24

comparava a sua descoberta com a de Lavoisier:

“A química tem seus corpos simples que

formam compostos pelas combinações diversas

possíveis [...]. Igualmente, a anatomia tem seus te-

cidos simples que [...] por suas combinações formam

os órgãos”.

Os diferentes tecidos eram as matérias-

primas dos órgãos, mas os ultrapassavam, formando

vastos sistemas nos quais o corpo humano encon-

trava sua unidade concreta. A análise tecidual de

Bichat tornava possível estabelecer formas patoló-

gicas gerais, para além das repartições geográficas

de Morgagni. A anatomia patológica tinha construído

um fundamento sólido: a análise real segundo super-

fícies perceptíveis. Desenhavam-se, por meio de uma

leitura diagonal do corpo, grandes famílias de doen-

ças, tendo os mesmos sintomas maiores e o mesmo

tipo de evolução. Alcançava-se, enfim, um funda-

mento objetivo, real e indiscutível, de uma descrição

das doenças: “Uma nosografia baseada na alteração

dos órgãos será necessariamente invariável” 25. Da

mesma forma que as nosologias tradicionais come-

çavam por uma definição das classes mais gerais, a

anatomia patológica lançava as bases de uma história

das alterações comuns a cada sistema, quaisquer

que fossem os órgãos ou as regiões afetadas.

A questão era como ajustar a percepção ana-

tômica à leitura dos sintomas. Corvisart buscava a

confirmação da nosologia pela autópsia: era preciso

“comparar sempre os fenômenos sensíveis e pró-

prios da vida saudável de cada órgão, com as alte-

rações que cada um deles apresenta na sua lesão”22.

Laënnec26 seguia a direção inversa:

“A anatomia patológica é uma ciência que tem

por objetivo o conhecimento das alterações visíveis

que o estado doentio produz sobre os órgãos do corpo

humano. A abertura de cadáveres é o meio de adquirir

este conhecimento; mas para que tenha uma utili-

dade direta [...] é preciso juntar a observação dos

sintomas ou as alterações de funções que coincidem

com cada espécie de alterações de órgãos”.

Com a anatomia patológica, a relação médico-

paciente tornou-se uma experiência na qual o olhar

do médico era o elemento decisivo do espaço pato-

lógico e de sua armação interna. O contato não era

possível senão sobre o fundo de uma estrutura, na

qual o medical e o patológico se entrelaçavam, do

interior, na plenitude do organismo. A medicina e a

cirurgia não eram mais que uma só e mesma coisa,

na medida em que o deciframento dos sintomas se

ajustava à leitura das lesões.

O olhar médico passou por uma verdadeira

“revolução” (a medicina das reações patológicas)

com o tratado de Broussais, em 1816, Examen de la

doctrine27. Nele foi exposto um método clínico aplicado

ao agravo orgânico, que propunha “extrair da fisiologia

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os traços característicos das doenças e discernir, por

uma análise cuidadosa, os apelos muitas vezes con-

fusos dos órgãos doentes”. Esta medicina de órgãos

afetados comportava três momentos: 1) determinar

qual órgão estava em sofrimento, o que se faz a partir

dos sintomas manifestos; 2) “Explicar como um órgão

entra em sofrimento” e 3) “Indicar o que é preciso

fazer para que deixe de sofrer”. Broussais tinha fixado

o último elemento da “maneira de ver” do clínico.

A evolução histórica e concreta do olhar mé-

dico moderno havia acabado a sua estruturação.

III. A tradição clínica e os seus efeitos

Vamos revisitar o texto de Foucault e procurar

extrair, a partir da proto-clínica do século XVIII, os

efeitos sob o conhecimento, as habilidades e as atitu-

des do médico nos dias de hoje.

Vimos que, na Renascença, ocorreu uma ver-

dadeira mutação do saber médico, com a recusa das

teorias, o abandono dos velhos sistemas e da meta-

física da Idade Média. Em seu lugar, passou-se a

valorizar o empírico, a experiência clínica. Era o início

da Ciência moderna, que nos dias atuais tem sua

expressão mais estruturada na chamada Medicina

Baseada em Evidência. O termo evidência expressa

o que é comprovado cientificamente, o que é demons-

trado experimentalmente.

Essa é a habilidade essencial que foi trans-

mitida desde os primórdios da Clínica: observar as

evidências, o que pode ser percebido. A advertência

subtendida nesta instrução é de que devem ser conti-

dos: o imaginário, a teoria, o que é inacessível aos

sentidos. A prática deve ter base no exercício do “olhar”.

Isso está emblematicamente expresso na

chamada “Observação clínica”, o roteiro de sistema-

tização das informações sobre o paciente, por meio

de seu depoimento a respeito de seu estado interior,

o interrogatório de seus antecedentes patológicos e

familiares, de seu perfil pessoal, dos diversos apare-

lhos do organismo, o exame físico e os exames com-

plementares. Nas palavras de Sournia28:

“Para poder propor a cada um de nossos do-

entes um tratamento perfeitamente adaptado à sua

doença e a ele mesmo, nós procuramos ter uma idéia

objetiva e completa de seu caso, reunimos num pron-

tuário que lhe é pessoal (sua “observação”) a tota-

lidade de informações que dispomos sobre ele. Nós

o “observamos” da mesma maneira que nós observa-

mos os astros ou uma experiência de laboratório”.

O olhar clínico, além de herdar uma “ordem

pela qual os objetos devem ser observados para

serem melhor percebidos e gravados na memória”,

prossegue com o hábito de recolher os sinais e os

sintomas da doença. O doente é a fonte primária das

informações, que são processadas pelo observador.

Seu discurso dá acesso à percepção que possui do

próprio corpo e de suas alterações. O exame “físico”

(em inglês, médico é physician), método de investi-

gação do espaço concreto do corpo, guarda toda sua

centralidade enquanto exercício da habilidade do

clínico na identificação dos sinais patológicos, mesmo

com todos os avanços científicos dos exames com-

plementares. É uma etapa indispensável da experiên-

cia clínica, usando praticamente os mesmos meios

que a invenção de Laënnec29.

No plano do conhecimento, a influência da me-

dicina classificadora, calcada no modelo botânico,

perpetuou-se até hoje. O conhecimento das doenças,

apesar do acúmulo de informações, é um saber indis-

pensável para o clínico. O trabalho investigativo, desde

o primeiro olhar sobre a aparência do paciente, de-

sencadeia o raciocínio clínico e constitui um “vai e vem”

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entre as informações colhidas e a memória do apren-

dido pelo médico. Cada caso é a montagem de um

quebra-cabeças e, com o auxílio de um raciocínio hi-

potético-dedutivo, o clínico vai estabelecendo a rela-

ção entre os fenômenos, comparando com o que sabe,

até descobrir a doença, nomear o diagnóstico e esta-

belecer a terapêutica30.

A atitude do médico foi se cristalizando até

chegar ao papel social de um observador neutro, com

a atenção voltada para a doença e os seus múltiplos

disfarces. Este investigador das pistas que o levam

a identificar o mal que acomete o doente, incorre, por

vezes, no erro de “esquecer” a pessoa por trás da

doença. Tal é o risco a que o expõe o personagem que

encarna, e que foi moldado através de, pelo menos,

três séculos.

Então, o médico adquiriu uma segunda natu-

reza que o condicionou a aceitar somente o que pas-

sa pelo crível do empírico, da percepção. Uma das

mais poderosas influências que herdou foi a valori-

zação do conhecimento extraído da morte e consubs-

tanciado na anatomia patológica. A autópsia permitiu

que o olhar clínico penetrasse no espaço interno do

corpo, para assim constatar as lesões nos órgãos.

Chegamos, pois, ao comentário de Foucault:

“o cadáver aberto e exteriorizado é a verdade interior

da doença, é a profundidade exposta da relação

médico-paciente”12. Nele estão sintetizados os princi-

pais efeitos da tradição clínica sob o médico de hoje:

a habilidade aguçada da percepção (o olhar clínico),

o conhecimento racional do “espetáculo” da doença,

em toda a sua crueza concreta (“orgânico”), e a atitu-

de neutra de observador/investigador dos fenômenos

patológicos do corpo humano.

IV. O doutor, o seu paciente e a doença

Os médicos foram habilitados para lidar com

os distúrbios orgânicos; quando se deparam com as

dificuldades emocionais de seus pacientes, encon-

tram-se despreparados para abordá-las. Esta é a

necessidade que levou aos seminários sobre “proble-

mas psicológicos em Medicina Clínica”, organizados

pelo pioneiro, Dr. Michael Balint, psiquiatra e psicana-

lista.

Vejamos os resultados da investigação sobre

este tema, efetuada por Balint e compilada em sua

obra: O Doutor, o seu Paciente e a Doença31. Esta

pesquisa levou mais de cinco anos, iniciando-se em

1952, na Tavistock Clinic (Londres), e realizada com

14 generalistas.

A constatação inicial foi a mesma que já tinha

sido feita nos primórdios da Clínica: existe uma

clivagem entre a ciência médica tal como é exercida

nos hospitais e a prática geral que se faz no consultó-

rio do generalista.

Os especialistas-professores dos generalis-

tas nas escolas de Medicina inclinam-se a diagnosti-

car patologias no âmbito de suas especialidades, até

porque não atendem longitudinalmente. As doenças

descritas pelos “rótulos” da medicina hospitalar,

nestes casos, não ajudam o generalista a compreen-

der os verdadeiros problemas com os quais se defron-

ta.

Nos consultórios dos generalistas, os proble-

mas dos pacientes apresentam-se, muitas vezes,

sob a forma de “uma doença da pessoa inteira”. Os

casos analisados revelam que algumas pessoas não

conseguem enfrentar as dificuldades de suas vidas

e “fogem” ficando doentes.

A estimativa é de que pelo menos um quarto

dos pacientes consultados sejam casos psicológicos.

Se o médico tem a oportunidade de vê-los no início

do processo patológico, pode perceber que tais pa-

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cientes “oferecem” ou propõem diversas doenças,

até que se fixam a uma doença precisa e “organiza-

da”. No entanto, os generalistas, influenciados pelos

especialistas, evocam preliminarmente um diagnósti-

co “orgânico”, mesmo quando as evidências apontam

para um problema psicológico. Os médicos conside-

ram que a doença física é mais séria e perigosa que

uma doença funcional. Conhecem mais as patologias

orgânicas e, então, sentem-se seguros, em um terre-

no mais firme do que quando se deparam com altera-

ções funcionais ou psíquicas. As doenças são catalo-

gadas em uma sorte de classificação hierárquica, cor-

respondendo à gravidade das lesões anatomopato-

lógicas.

Cada médico tem um modelo ideal do com-

portamento que deve adotar uma pessoa quando está

doente. Esta missão ou “função apostólica” se ex-

pressa em sua conduta. Trata-se da tendência do

médico de alimentar expectativas ilusórias sobre o

paciente, com base em seus próprios valores. Espera

enquadrá-lo em um diagnóstico e “convertê-lo” às

virtudes da medicalização.

O roteiro habitual seguido pelo generalista é

dominado pelo medo de deixar passar alguma doença

física. O receio é o de fazer um diagnóstico de trans-

torno funcional neurótico onde possa existir uma do-

ença orgânica. Utiliza-se de duas estratégias securi-

zantes: os exames complementares e a referência a

especialistas.

A “eliminação por exames físicos apropriados”

constitui uma rotina obrigatória na prática diária. O

método de escolha é pedir exames complementares

à exaustão, até que um sinal físico acidental, e muitas

vezes sem significação, possa ser responsabilizado

pela sintomatologia. Esta “resposta” do médico tem

a conseqüência iatrogênica de induzir, levar, o paci-

ente a “organizar” a sua doença em torno do desvio

encontrado. O passo seguinte será convencer o pa-

ciente da utilidade da prescrição para os seus sin-

tomas, embora precise de algo diferente.

O outro recurso utilizado pelo generalista

diante de um “caso difícil” é o de encaminhar o

paciente ao(s) especialista(s) para um diagnóstico

mais preciso (“perpetuação da relação professor-

aluno”). Em toda situação deste tipo, em que o doente

“oferece” uma doença “atípica” ao generalista, le-

vando-o a pedir ajuda ao especialista, ocorre uma

“colusão no anonimato” ou de “diluição de responsa-

bilidades”. O sentido desta expressão é a de que o

paciente pode ser referenciado a diferentes especia-

listas, sem que ninguém assuma a responsabilidade

por ele enquanto pessoa. O doente vira um prontuário

impessoal, freqüentemente circulando entre diferen-

tes especialistas, que também se confundem diante

de um quadro rebelde a se encaixar nos rótulos ou

esquemas. O generalista, que não deveria deixar de

conhecer as conseqüências das condutas dos espe-

cialistas, acaba por delegar suas responsabilidades.

Assim, podem ser tomadas decisões vitais – às ve-

zes após terem sido consultados diferentes especia-

listas –, sem que ninguém se sinta plenamente res-

ponsável.

Os doentes cujos distúrbios possam ser

atribuídos a prováveis alterações anatômicas e fisio-

lógicas são de uma categoria superior, enquanto os

neuróticos engrossam o contingente do que sobrou,

uma vez realizado o diagnóstico diferencial. O genera-

lista orgulha-se de ter despistado uma doença física,

mas incomoda-o defrontar-se com uma neurose. Está

despreparado para lidar com os problemas psicoló-

gicos. Diante da angústia e da pressão crescente do

paciente, pode mesmo se sentir culpado: seus exa-

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mes mais criteriosos não esclareceram a “doença”

e o tratamento atualizado que instituiu, não trouxe o

alívio esperado. O paciente, por sua parte, quer saber

o nome da sua doença, o diagnóstico, a razão da

medicação não ter funcionado. Diante desta deman-

da, recebe como resposta que “nada tem”, o que equi-

vale a ter a sua “oferta” rejeitada e a ficar com o seu

problema não resolvido.

A solução de Balint já estava contida em sua

tese inicial, exposta acima: “Nós pensamos que cer-

tas pessoas que, por uma razão ou por outra, não

podem enfrentar os problemas de suas vidas se li-

vram ficando doentes” 31.

O generalista deve ter discernimento para

saber quais são os casos em que é essencial tratar

uma doença física e em quais ele precisa ajudar o

paciente a assumir os seus problemas pessoais.

Para chegar ao nível de desvelar o que está

oculto, é preciso que o generalista proceda a um diag-

nóstico “aprofundado”, isto é, que contemple os pro-

blemas da personalidade global. A metodologia a

seguir, “a entrevista prolongada”, implica na habilidade

da “escuta” por parte do médico.

É necessário ampliar os limites da anamnese

padrão, sem deixar de reconhecer o valor das infor-

mações pertinentes assim obtidas, porque “aquele

que faz perguntas obtém respostas, mas nada além

disso”.

O generalista responsável pelo paciente deve

estar em condições de acompanhar o curso de sua

história de vida, de forma a poder contextualizar uma

eventual doença psicológica. Só assim pode alcançar

uma ampla compreensão das “ofertas” de seus

pacientes, ou seja, fazer um diagnóstico “aprofun-

dado”. Trata-se de bem “administrar” o “fundo mútuo

de investimento”, isto é, todas as experiências e a

confiança compartilhadas entre o médico e o pacien-

te, que foram acumuladas, às vezes, durante anos

de convívio.

O “remédio médico”, sendo o doutor em si

mesmo uma poderosa “medicação”, é o “medica-

mento” mais usado na prática, mas pode ser decisivo

para a cura naqueles episódios em fases precoces

“desorganizadas”. Muitos casos poderão ser solucio-

nados nesses estágios, tornando desnecessário o

encaminhamento para psicoterapia com um psicote-

rapeuta. Trata-se, de fato, de uma psicoterapia breve,

em que o médico aprende a se servir de si mesmo

como instrumento terapêutico, assim como um cirur-

gião usa um bisturi.

Resta abordar a questão de como os genera-

listas podem adquirir o mínimo de aptidões para lidar

com as emoções de seus clientes.

Comecemos por compreender por que, psico-

logicamente, evitam explorá-las. Deixemos de lado a

questão de sua formação voltada para o “orgânico”

ou a sua falta de preparo para lidar com as emoções.

A explicação do autor é que, quando uma pessoa está

doente fisicamente, o clínico está em uma situação

diferente e distante de sua condição, embora se soli-

darize com ela. Mas, quando o paciente está infeliz

em sua relação com o mundo, o médico pode sentir-

se pessoalmente implicado, devido a seus próprios

problemas. Procura, a partir daí, evitar situações que

poderiam levá-lo a examinar os seus conflitos pesso-

ais.

Segue-se que o generalista tem a necessida-

de de “uma mudança de personalidade considerável,

ainda que limitada”. Como obtê-la?

Balint propõe como método seminários de

grupo, de oito generalistas coordenados por um

psiquiatra/psicanalista, em encontros semanais. O

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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número foi fixado para proporcionar uma participação

intensa e um material suficientemente diversificado.

Isso porque se trata de provocar uma nova atitude no

médico, o que implica em expô-lo à situação real e

levá-lo a reconhecer os problemas e as formas que

podem ser empregadas para tratá-los. As discussões

semanais de casos são as matérias-primas para a

da relação de cada generalista com os seus clientes.

É possibilitado ao generalista, sob demanda, uma su-

pervisão individual de seus casos, ou seja, uma hora

por semana de “entrevista particular”.

Um dos objetivos é o de desenvolver nos mé-

dicos a sensibilidade diante dos problemas emocio-

nais de seus pacientes, de modo que possam com-

preendê-los melhor e com maior profundidade. Um

outro é ajudá-los a aprender a empregar esta com-

preensão de forma a obter um efeito terapêutico. Para

alcançar esses fins, é indispensável modificar a perso-

nalidade do médico, particularmente quando atua no

exercício profissional. Deve aprender a perceber e a

tolerar os fatores emocionais de seus pacientes, que

antes rejeitava ou ignorava, além de aceitá-los como

dignos de sua atenção. Balint chamou a totalidade

deste processo como “mudança de personalidade limi-

tada, todavia significativa”.

A essência do método de capacitação, o “grupo

Balint”32

, é fazer com que o médico tome consciên-

cia de toda sua responsabilidade terapêutica, cerce-

ando-lhe qualquer rota de fuga; comparar sua manei-

ra de tratar a seus pacientes com a de outros colegas

do seminário; utilizar o grupo para demonstrar que

toda terapia necessariamente implica um tipo especí-

fico de interação entre o paciente e o médico.

O foco está centrado no subjetivo e pessoal,

muitas vezes fora do controle consciente. O mais

importante nos seminários de grupo é a análise da

relação médico-paciente, das emoções na interação.

É a chamada “contratransferência”, isto é, a forma

como o generalista utiliza sua personalidade, suas

crenças, seu saber, seus modos habituais de reação

etc. As discussões dos seminários fornecem o motor

da “mudança de personalidade considerável, ainda

que limitada”. O que se produz durante os seminários

é que o generalista toma consciência de seu envolvi-

mento pessoal e de suas resistências em suas rela-

ções com o paciente e com o resto do grupo.

Esses seminários duram dois anos, em ses-

sões semanais, capacitando o generalista a tratar

uma grande parte dos seus pacientes com problemas

psicológicos. Habilitam-no a impedir, com uma inter-

venção precoce, o paciente de “organizar” sua doen-

ça em torno de qualquer sinal físico de pouca impor-

tância. A profundidade da penetração do generalista

no conflito do paciente depende de sua própria

personalidade, isto é, de sua função apostólica.

Assim, pode chegar a identificar o “conflito” que levou

o paciente a se queixar, descobrindo o verdadeiro pro-

blema em sua vida. Em outras palavras, o generalista

é capaz de manejar com competência o “remédio

médico”, o “medicamento” mais freqüente da prática

geral.

Por fim, conheçamos a avaliação do método

dos seminários de discussão em grupo para os gene-

ralistas32. Dentre os chamados “desertores”, aqueles

que abandonavam os seminários após certo tempo,

podem ser descritos os seguintes grupos: os médi-

cos que padeciam de uma patologia mental grave

(neurose severa ou borderline; os “superiores”, médi-

cos prestigiosos, de profundo “fervor apostólico”, co-

mo possível defesa contra a insegurança; os médicos

escrupulosos e sensitivos, que necessitavam de

“receitas” para as situações; os médicos com uma

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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ansiedade neurótica diante da mudança; os médicos

com defesas sólidas e eficazes, que preferiam evitar

uma série de temas.

Na avaliação de Balint, os generalistas que

acompanharam até o fim os seminários eram médi-

cos “natos” ou muito talentosos, que “experienciavam”

uma satisfação “profunda” no exercício profissional.

Citemos dois depoimentos de generalistas

que participaram dos grupos Balint: “O maior benefí-

cio veio de escutar as estórias das relações médico-

paciente contadas pelos outros participantes do

grupo”33. E ainda: “Acredito que os seminários torna-

ram-me melhor em meu trabalho [...]. Posso afirmar

que certamente me ajudaram a lidar com menos

ansiedade com pessoas diferentes ou difíceis” 34. Os

seminários permitiram aos médicos perceber que as

pessoas “difíceis” eram suas semelhantes, que esta-

vam pedindo ajuda, e não tentando criar situações

sem saída.

Todavia, o generalista precisa de pelo menos

dois anos de capacitação para se beneficiar de um

grupo Balint.

V. Conclusões

A moderna concepção sobre a etiologia das

doenças é a de que muitos fatores interagem para

produzi-las35. De acordo com este modelo de Engels,

os fatores biopsicossociais estão envolvidos nas

causas, manifestações, curso e evolução da saúde

e das doenças. Os papéis relativos dos fatores bio-

lógicos, psicológicos ou sociais podem variar entre

os indivíduos ou entre os períodos da duração da vida.

Procuramos demonstrar, ao longo deste tra-

balho, que os médicos possuem “pontos cegos” em

relação aos fatores psicológicos e sociais, privile-

giando os biológicos, devido à sua formação36.

Mostramos que os fatores estressantes psico-

lógicos e sociais podem se “metamorfosear” em

distúrbios somatomorfos ou outros, camuflando-se

atrás dos sintomas, e que os esforços terapêuticos

são de utilidade duvidosa se as verdadeiras causas

não forem abordadas.“Uma doença ‘funcional’ signi-

fica que o paciente teve um problema que tentou

resolver com uma doença”31.

Os fatores estressantes psicológicos e soci-

ais mais comuns na vida adulta abarcam a ruptura

de relações afetivas íntimas, a morte de um familiar

ou amigo próximo, as dificuldades econômicas, a sa-

úde física precária e os acidentes e a violência que

atingem a integridade física. Esses fatores desenca-

deiam distúrbios em pessoas vulneráveis, isto é, com

maior risco de adoecer.

Propusemos o grupo Balint como um método

que capacita o médico generalista a lidar com as

emoções na prática médica, por meio de uma “peque-

na“, mas significativa mudança de personalidade”32.

O objetivo é que saiba se servir do “remédio médico”,

ou seja, de si mesmo, na relação com o paciente.

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Ministério da Saúde, Unesco; 2002. p.291-312.

Este artigo foi adaptado da Monografia apresentada

pelo autor ao Curso de Especialização em Saúde da

Família da Universidade Federal de Minas Gerais –

UFMG.

Orientadora: Profa. Ocirema T. Rothe-Neves

Endereço para correspondência:

Fernando A. M. Flora

Rua Santa Rita Durão, 466/1702

Belo Horizonte–MG

CEP 30140-110

Endereço eletrônico:

[email protected]

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RESUMO

A prevalência de sobrepeso/obesidade cresce em ritmo acelerado nas últimas décadas em todo o

mundo.Dados recentes do IBGE mostram que no Brasil 41,1% dos homens e 40,0% das mulheres apresentam

excesso de peso, sendo os índices para obesidade respectivamente 8,9 e 13,1% de toda a população brasileira.

A situação é ainda mais crítica em pessoas de baixa renda e escolaridade, onde os índices cresceram mais

expressivamente. A obesidade figura como um dos principais fatores de risco para doenças cardiovasculares

e há vasta evidência científica de que pequenas reduções ponderais promovem benefícios clínicos

significativos. Fica evidente então que oferecer tratamento adequado para sobrepeso/obesidade na Atenção

Primária à Saúde pode ter grande impacto na saúde e qualidade de vida da população e nos custos finais

com saúde. O objetivo deste estudo é avaliar o impacto e a replicabilidade de um programa de redução do

sobrepeso/obesidade nos níveis de pressão arterial de um grupo de pacientes da Estratégia de Saúde da

Família (ESF). Realizou-se um estudo retrospectivo analítico dos dados clínicos de pacientes submetidos a

tratamento para a redução ponderal da USF Bandeiras, em Anápolis/GO. O consentimento livre e informado

foi obtido dos pacientes. Os critérios de inclusão/exclusão foram aplicados para corrigir desvios, resultando

numa amostra homogênea de 28 pacientes. Foram obtidos os níveis de pressão arterial e peso antes e após

o tratamento. Foram calculadas as médias aritméticas de peso, altura e pressão arterial e comparadas

entre o início e seis meses de acompanhamento. Houve redução média de 8,42kg no período de seis meses

na população avaliada e dos níveis de Pressão Arterial Sistólica (PAS) em 0,64mmHg e Pressão Arterial

Diastólica (PAD) em 0,84mmHg para cada redução de 1kg. Os dados do estudo corroboram com os

encontrados na literatura, onde para cada 1kg de perda ponderal há redução de 0,88 e 0,72 mmHg nas PAS

e PAD, respectivamente. O tratamento da obesidade engloba mudanças de hábitos de vida que em conjunto

com a redução ponderal promovem benefícios clínicos significativos já observáveis em reduções inferiores

Impacto do tratamento de sobrepeso/obesidade sobreos níveis de pressão arterial na Atenção Primária à Saúde

The impact of weight reduction therapy onblood pressure levels in Primary Care

Daniel Victor Arantes*

RBMFC

PALAVRAS-CHAVE:- Sobrepeso;- Obesidade;- Hipertensão;

PALAVRAS CHAVE:- Overweight;- Obesity;- Hipertension;

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

217

*Médico de Família e Comunidade, Secretaria Municipal de Saúde de Anápolis, Anápolis, Goiás, Brasil.

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a 10% do peso inicial, em especial naqueles que

apresentam comorbidades. O diagnóstico é simples

e o acompanhamento de baixo custo, principalmente

se for estruturado com atividades educativas em

grupo e motivação para mudanças de hábitos de

vida. A farmacoterapia pode ser útil e segura, desde

que figure como coadjuvante no tratamento. Este

estudo mostra como pode ser simples executar um

programa estruturado, de baixo custo e efetivo, com

replicabilidade dos benefícios descritos na literatura

científica.

ABSTRACT

In the last decades the incidence and prevalence

of overweight and obesity are increasing drastically

over the world. It is estimated that in Brazil 32% of adults

are overweight and 8% obese, totalizing 40% of adults

over the weight levels recommended for a healthy life.

The situation is even more critical in the low-income

population with poor educational level, where the problem

is advancing even faster. Obesity figures among the

most important risk factors for cardio-vascular diseases

and there is strong scientific evidence that even modest

weight reduction leads to significant clinical benefits.

Thus, offering treatment for overweight and obesity in

primary care can evidently improve the health and

quality of life of the population and reduce the final

public health expenditures. The purpose of this study

is to evaluate the applicability and impact of a weight

reduction program on the blood pressure levels of a

group of patients assisted in a public primary care

program called ‘Estratégia de Saúde da Família’ (Family

Health Strategy) and to propose ways for standardizing

this program. A retrospective analytic study was

conducted for comparing the clinical data of patients

submitted to weight reduction therapy in a public

primary care unit called ‘Unidade de Saúde da Família

Bandeiras’ in Anápolis, State of Goiás, Brazil. Informed

consent from the patients was obtained. Exclusion and

inclusion criteria were applied to correct deviations,

resulting in a homogeneous sample of 28 patients.

Blood pressure and weight levels were obtained before

and after the treatment. The arithmetic means of

weight, height and blood pressure at the beginning of

the treatment were compared with those obtained six

months after the treatment was started. There was a

mean reduction of 0,64mmHg in the systolic blood

pressure (SBP) levels and of 0,84mmHg in the

diastolic blood pressure (DBP) levels for each 1kg of

weight loss. These data confirm those found in the

literature, indicating for each weight loss of 1kg a

reduction of 0,88 and 0,72mmHg in SBP and DBP

respectively. Weight reduction of at least 10%

provides significant clinical benefit, especially in

patients with metabolic syndrome and/or cardiovascular

disease. The diagnosis is simple and the treatment

cost effective, especially if provided by means of a

standardized program including educational group

activities motivating the patients to change their life

habits. Pharmacotherapy may be useful and secure

in primary care if offered as adjunctive treatment. This

study shows that a standardized primary care-based

weight reduction program can be inexpensive and

effective for promoting the clinical benefits well

described in the scientific literature.

I. Introdução

A prevalência de obesidade vem crescendo

nas ultimas décadas em ritmo acelerado, inclusive

no Brasil. A Organização Mundial de Saúde estima

que 1 bilhão de pessoas esteja acima do peso em

Daniel Victor Arantes Impacto do tratamento de sobrepeso/obesidade sobreos níveis de pressão arterial na Atenção Primária à Saúde

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todo o mundo, sendo que destes 310 milhões já fi-

guram nos índices que caracterizam obesidade (IMC

= 30 kg/m²)1. Os países desenvolvidos já apresentam

índices alarmantes, como 65% da população nos

Estados Unidos com sobrepeso/obesidade, sendo

31% já obesos2,3,4. No Brasil os índices estão em

expansão nas últimas décadas. Cerca de 40% da

população adulta esta acima do peso, sendo os índices

de obesidade 8,9 e 13,1% da população adulta de

homens e mulheres, respectivamente1. Há crescente

magnitude da obesidade em crianças, adolescentes

e adultos. Os índices crescem mais entre mulheres

em idade reprodutiva e nas classes menos favorecidas.

Estudos nacionais alertam para a importância de

ações de iniciativa pública e privada que abordem o

problema de forma mais ampla5,6,7.

A obesidade tem sido ainda apontada como o

maior componente da síndrome metabólica8, que

originalmente foi descrita por Reaven9, composta por

obesidade, resistência insulínica, hipertensão, diabetes

ou intolerância a glicose, hiperinsulinemia e dislipidemia,

esta caracterizada por elevação dos triglicérides e

baixos índices de HDL colesterol. Todos são fatores de

risco para a aterosclerose, comprometimento vascular

freqüentemente associado aos maiores índices de

mortalidade no Brasil e no Mundo10. Descobertas re-

centes identificaram mecanismos envolvidos no de-

senvolvimento de obesidade, dentre eles a leptina,

um potente anorexígeno endógeno secretado pelo

tecido adiposo. Assim como a insulina, a leptina

freqüentemente encontra-se aumentada no indivíduo

obeso, caracterizando o processo denominado resis-

tência leptínica. Seu mecanismo regulatório é comple-

xo e ainda não foi elucidado, mas promete revolu-

cionar o tratamento da obesidade assim como ocor-

reu com o tratamento da hipertensão com o desen-

volvimento dos anti-hipertensivos. Os principais me-

canismos envolvidos na associação entre obesidade

e hipertensão parecem ser o aumento do tônus do

Sistema Nervoso Simpático decorrente de maiores

concentrações de leptina, insulina, ácidos graxos li-

vres, aldosterona e também maior atividade do Sis-

tema Renina-Angiotensina-Aldosterona, aumento de

endotelina-1 e diminuição de óxido nítrico. Todos es-

ses processos em interação promovem maior reten-

ção de água e sódio e vasoconstricção, desencade-

ando a hipertensão arterial11.

Programas de redução ponderal são efetivos

tanto em subgrupos populacionais com hipertensão

quanto na população geral, embora os resultados

sejam mais animadores em pacientes obesos hiper-

tensos em uso de medicações, com efeito aditivo aos

anti-hipertensivos12,13. Estruturar então um programa

com prioridade de atendimento ao nível de saúde

pública para pacientes que já apresentem comorbi-

dades, como hipertensão arterial, pode ser estratégia

válida tanto pela maior necessidade quanto pela pos-

sibilidade de melhores benefícios nestes pacientes.

O estilo de vida contemporâneo tem sido

implicado como grande responsável pela ocorrência

da epidemia. A urbanização, a proliferação de cargos

sedentários, a tecnologia, a maior oferta de alimentos

densamente energéticos, promovem um balanço

calórico positivo que, em interação com fatores ge-

néticos, leva ao fenótipo obesidade2,3,4,14. No Brasil a

obesidade tem crescido principalmente em classes

de baixa renda e escolaridade5,6,7. Supõe-se então

que atividades educativas constituem instrumento

muito válido no combate à obesidade. Devem ser

esclarecidos os benefícios de mudanças de compor-

tamento, com incentivo à prática regular de exercícios

e a hábitos alimentares saudáveis, não só por meio

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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Daniel Victor Arantes Impacto do tratamento de sobrepeso/obesidade sobreos níveis de pressão arterial na Atenção Primária à Saúde

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de campanhas educativas de divulgação na grande

mídia, mas também pela orientação individualizada

oferecida a pacientes selecionados. Políticas públicas

que visem à educação e à adequação de áreas para

lazer podem ser de baixo custo e ter grande impacto

nos custos finais com saúde.

O tratamento da obesidade engloba mudan-

ças de hábitos de vida que, em conjunto com modes-

ta redução ponderal (10% do peso inicial), promovem

benefícios clínicos significativos, em especial para

aqueles que já apresentam comorbidades15,16,17,18. O

diagnóstico é simples e o acompanhamento pode ser

de baixo custo, principalmente se for estruturado com

atividades educativas em grupo e motivação para

mudanças de hábitos de vida, com incentivo à prática

de atividade física regular. A farmacoterapia pode ser

útil e segura, desde que figure como coadjuvante no

tratamento19. O objetivo deste estudo é implantar um

programa piloto de tratamento de sobrepeso/

obesidade em pacientes do Programa de Saúde da

Família e, a partir dos resultados e da experiência,

abrir discussão e propor caminhos para intervir de

forma efetiva neste quadro alarmante.

II. Material e métodos

Foi realizado um estudo prospectivo e analítico

com base na implantação de ambulatório piloto para

tratamento de sobrepeso/obesidade na Unidade

Bandeiras do Programa Saúde da Família (ESF) de

Anápolis/GO, no ano de 2004. Sessenta pacientes

com indicação de redução ponderal, hipertensos ou

não, com pressão arterial sistêmica (PAS) compensa-

da, foram acompanhados ambulatorialmente em pro-

tocolo de tratamento para sobrepeso/obesidade. O

ambulatório foi estruturado da seguinte forma: os 60

pacientes foram subdivididos em quatro grupos de

15 pacientes e o atendimento de cada grupo foi rea-

lizado em período de quatro horas/semana; cada gru-

po se reunia então mensalmente (45 minutos), para

discutir a necessidade e os benefícios de práticas re-

gulares de atividade física (30 a 60 min de caminhada

por dia) e alimentação (dieta hipocalórica balanceada

de 1200 a 1500 kcal/dia). Após a reunião, cada paci-

ente era atendido individualmente em triagem de enfer-

magem, que coletava dados sobre pressão arterial e

peso, além da consulta médica, onde era realizada

avaliação clínica. O suporte medicamentoso era ofe-

recido quando indicado, de acordo com consenso vi-

gente20. Para uma avaliação objetiva dos resultados,

foram propostas comparações clínicas e laboratoriais

antes e após o tratamento. Devido à limitação de re-

cursos, apenas os valores diretamente obtidos na uni-

dade de saúde foram escolhidos para comparação,

como os níveis de PAS e peso dos pacientes antes e

após os seis meses de acompanhamento. Agentes

Comunitários de Saúde realizaram a pesagem dos

pacientes em uma única balança, calibrada mensal-

mente. Os níveis de PAS foram aferidos pela única

técnica de enfermagem da unidade por meio de esfig-

momanômetro, calibrado mensalmente. Todos os da-

dos foram coletados imediatamente antes de cada

consulta e registrados nos prontuários médicos. As

atividades educativas foram conduzidas pelo médico

e pela enfermeira da unidade com os pacientes

reunidos antes das consultas individualizadas. Foram

abordados temas como causas da obesidade e seus

riscos, doenças relacionadas, benefícios da redução

ponderal, necessidade de reeducação alimentar e ati-

vidade física regular, indicações, contra-indicações,

vantagens e desvantagens da farmacoterapia. Na fa-

se final do estudo, foram analisados os prontuários

dos pacientes e os dados coletados em ficha individual

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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que continha código identificador do paciente, sexo,

altura, peso e pressão arterial da primeira (pré-

tratamento) e última consulta (após seis meses de

tratamento). Os seguintes critérios de inclusão/ex-

clusão foram aplicados na análise de dados: foram

incluídos nos resultados apenas os pacientes que

obtiveram alguma redução de peso ao final dos seis

meses; foram excluídos os pacientes do sexo mas-

culino por sua pequena expressão na amostra inicial;

foram excluídos os que apresentavam alguma altera-

ção na prescrição dos medicamentos anti-hiper-

tensivos no período do estudo; foram excluídos do

estudo os pacientes que não cumpriram pelo menos

cinco das seis consultas ou que abandonaram o

tratamento. Foram consideradas na discussão as

principais estratégias para um tratamento efetivo e

as potencialidades e vantagens de um programa efe-

tivo de tratamento de sobrepeso/obesidade na APS.

V. Resultados e discussão

Vinte e oito pacientes dos 60 inclusos no

programa preencheram os critérios de inclusão/

exclusão, e seus dados foram selecionados para

compor os resultados. A amostra final foi composta

por pacientes do sexo feminino, com idades entre 34

e 60 anos. Não foram obtidos dados de escolaridade

e renda. A altura média do grupo selecionado foi

1,59m. Os pesos médios, inicial e final, do grupo foram

84,26 e 75,84kg. Houve redução média de 8,420kg

no período de seis meses. O IMC variou de 33,2 para

29,9kg/m². Os níveis de PAS no início e fim dos seis

meses foram, respectivamente, 125x85 e 112x75mmHg.

Houve redução dos níveis de pressão PAS em

0,64mmHg e PAD em 0,84mmHg para cada 1kg de

redução ponderal na população estudada. Os dados

foram avaliados por meio do teste de diferença entre

médias populacionais para dados pareados através

do teste t de Student, que a 1% de significância

concluiu que há significância estatística nos resulta-

dos obtidos.

Os resultados obtidos no ambulatório piloto

de sobrepeso/obesidade estruturado na Unidade de

Saúde da Família Bandeiras, descritos neste estudo,

como a redução de 0,64/0,84mmHg na PA para cada

1kg de peso perdido, corroboram com os dados da

literatura, onde para cada 1kg de peso há redução de

0,88 e 0,72mmHg nas pressões sistólica e diastólica,

respectivamente12,13. Há inequívoca evidência na

literatura de que a perda de peso é uma importante

contribuição para o tratamento de hipertensão, em

especial em pacientes que já utilizam anti-hiperten-

sivos. Os resultados encontrados neste estudo mos-

tram que benefícios clínicos podem ser alcançados

em programas de redução ponderal em uma unidade

pública de APS.

O tratamento de sobrepeso/obesidade exige

uma equipe bem capacitada para que os resultados

sejam obtidos, o que seria mais bem alcançado em

programas estruturados especificamente para aten-

ção à redução ponderal ou com treinamento adequa-

do das equipes de Saúde da Família, nos moldes do

que já é feito para hipertensão e diabetes. O diagnós-

tico é simples e de baixo custo, exigindo apenas

medidas simples como a medida do peso, altura e

da circunferência abdominal. Há melhora clínica com

modestas reduções ponderais, inclusive de doenças

correlacionadas, como hipertensão arterial, diabetes

e dislipidemias15,16,17,18. A ênfase na importância de

educação quanto aos hábitos de vida e de acompa-

nhamento contínuo do paciente são regra nos estudos

internacionais que se referem ao tratamento de sobre-

peso/obesidade17,18,19,20,21.

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

221

Daniel Victor Arantes Impacto do tratamento de sobrepeso/obesidade sobreos níveis de pressão arterial na Atenção Primária à Saúde

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A prática regular de atividade física deve ser

extensivamente encorajada, incluindo-se atividades

domésticas, pequenas caminhadas e atividades de

lazer em geral 22. Caminhadas regulares ou exercício

equivalente são imprescindíveis para adequada perda

e manutenção do peso. Devem ser iniciadas aos pou-

cos, de acordo com a tolerabilidade e avaliação indivi-

dualizada de cada paciente, sendo o nível aumenta-

do gradativamente até um ritmo entre o caminhar e o

correr cerca de uma hora, todos os dias23,24,25. Mesmo

pacientes idosos com insuficiência cardíaca e/ou pós-

infarto do miocárdio se beneficiam do treinamento fí-

sico, incluso em programas de reabilitação cardiores-

piratória26,27,28,29.

Ainda há muitos mitos acerca do tipo ideal de

alimentação para perda e controle do peso, o que fa-

vorece proliferação de dietas da moda que, em sua

maioria, não promovem perda significativa em longo

prazo. De uma forma geral deve-se incentivar redução

gradativa de alimentos ricos em carboidratos simples

(açúcar em geral), gorduras (principalmente satura-

das) e aumento da ingestão de frutas e verduras. É

recomendado seguir dieta regular e balanceada,

contendo pelo menos um representante de cada gru-

po alimentar em cada refeição (carboidrato, proteína

e gorduras insaturadas), sempre em pequena

quantidade e rica em vitaminas, sais minerais e fi-

bras, além de ingerir leite e seus derivados, de prefe-

rência desnatados, no mínimo duas vezes ao dia.

Deve-se realizar pelo menos cinco refeições ao dia

com intervalos de três horas30,31,32,33.

Atualmente já estão disponíveis medicações

eficazes e seguras para o tratamento de obesidade.

Sibutramina e orlistat são as mais estudadas e já foram

aprovadas para uso em longo prazo pelo FDA 20,34.

Um aumento discreto da pressão arterial pode ser

observado com o uso de sibutramina, com redução

posterior, de acordo com a redução ponderal, prática

de atividade física e dieta balanceada hipossódica.

Orlistat não é absorvido pelo lume intestinal e impede

a absorção de gorduras quando ingerido às refeições.

Eventos adversos como flatulência, cólica abdominal

e esteatorréia têm sido observadas principalmente

se utilizado com dietas ricas em gorduras, no entanto

constitui medicação extremamente segura e útil.

Atenção deve ser dada à redução de absorção de vi-

taminas lipossolúveis20,34. Outros medicamentos, como

dietilpropiona e femproporex, encontram-se disponí-

veis em nosso meio, mas carecem de estudos de efi-

cácia e segurança a longo prazo20,35,36,37. Podem ser

utilizados em doses baixas em monoterapia, em pa-

cientes bem selecionados, evitando-se uso abusivo,

desenvolvimento de tolerância e ocorrência de

eventos adversos sérios. As famosas “fórmulas para

emagrecer”, difundidas em nosso meio, não devem

ser utilizadas. Estas, freqüentemente, contém benzo-

diazepínicos, hormônios tireoidianos, preparações her-

bais, laxativos e diuréticos, não indicados para perda

de peso. São utilizados para controle de efeitos cola-

terais de anorexígenos em altas doses e para poten-

cializar a perda de peso. Levam a iatrogenia, como

supressão do hormônio tireotrópico (TSH), com hipo-

tireoidismo após descontinuação (triac, tiratricol), inte-

rações medicamentosas, dano hepático grave (kawa

kawa), síndrome serotoninérgica (fluoxetina), colite

(laxativos, como cáscara sagrada), taquiarritimias e

infarto do miocárdio (efedrina), acidentes, lapsos de

memória, dependência, ansiedade de rebote, insônia

crônica (benzodiazepínicos)38,39,40,41,42.

Essas estratégias podem ser utilizadas em

obesos com comorbidades nos quais determinadas

medicações sabidamente promovem perda de peso.

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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Daniel Victor Arantes Impacto do tratamento de sobrepeso/obesidade sobreos níveis de pressão arterial na Atenção Primária à Saúde

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Bupropiona, sertralina e fluoxetina podem ser de es-

colha em pacientes obesos com transtorno depres-

sivo, sendo as duas últimas também indicadas em

transtornos de ansiedade (transtorno obsessivo com-

pulsivo, estresse pós traumático, pânico, ansiedade

generalizada, fobia social generalizada) e transtornos

alimentares (bulimia nervosa, transtorno de compul-

são alimentar periódica). Deve haver cuidado com

polifarmácia pela possibilidade de graves interações

medicamentosas20,42. Metformina constitui boa opção

em diabéticos tipo 243,44,45,46 e topiramato em pacien-

tes com epilepsia ou com necessidade de prevenção

de crises de enxaqueca47. Hormônios tireoidianos,

freqüentemente incorporados em ‘fórmulas para

emagrecer’, somente estão indicados no caso de

disfunções tireoidianas como o hipotireoidismo clínico

e subclínico48. Novos medicamentos em breve devem

ser lançados, como rimonabant, um antagonista cana-

binóide com resultados promissores nos estudos pré-

comerciais realizados até o momento49.

É ainda importante frisar que todas as estra-

tégias acima descritas, em especial se associadas,

conduzem a redução ponderal de cerca de 10% do

peso inicial em seis meses a um ano com conseqüen-

te redução dos níveis de pressão arterial em longo

prazo. O tratamento é considerado efetivo se há ma-

nutenção do peso ao longo dos anos.

Com base nesses dados, quando se pensa

em estruturar um programa de tratamento de obesi-

dade ao nível de saúde pública, algumas reflexões

são imprescindíveis para o melhor gerenciamento de

recursos. A maior demanda consiste em pacientes

com sobrepeso/obesidade com IMC entre 28 e 40mg/

kg2, onde o tratamento clínico é pelo menos a primeira

escolha. Coincidentemente estes são os pacientes

que mais se beneficiariam de modestas reduções

ponderais. Uma equipe composta por médico, enfer-

meiro, auxiliar de enfermagem e agentes comunitários

de saúde, todos devidamente capacitados para o

acompanhamento do paciente obeso, pode ser o sufi-

ciente para oferecer atendimento adequado à maior

parte da população. Uma equipe adicional, responsá-

vel pela assistência a várias unidades de saúde, com-

posta por educador físico, fisioterapeuta e nutricionis-

ta, poderia oferecer grandes benefícios ao acompa-

nhamento de pacientes especiais, portadores de dis-

túrbios que dificultem a dieta e exercícios, como osteo-

artrose avançada, associação de vários distúrbios me-

tabólicos ou obesidade refratária. Um programa es-

truturado com meta de redução de 10% do peso inicial

já traria benefícios clínicos significativos com impacto

na saúde e qualidade de vida da população e redução

subseqüente dos custos com saúde. Seis meses nor-

malmente são o suficiente para alcançar esta meta,

tempo durante o qual o paciente deve ser assistido

mensalmente para verificar aderência e monitorar o

tratamento. Desta forma, um programa nos moldes

do avaliado por este estudo atenderia efetivamente

1.200 pacientes por ano. Como infra-estrutura mínima

é exigida balança, fita métrica, esfigmomanômetro e

estetoscópio, além de dois ou três consultórios e um

pequeno auditório para atividades educativas em gru-

po. Pacientes com obesidade mórbida são ainda mi-

noria e exigem maior infra-estrutura e conseqüen-

temente maiores custos, devendo ser referenciados

para centros de atendimento secundário e terciário.

VI. Comentários finais

A obesidade vem crescendo em níveis alar-

mantes e está relacionada a maior mortalidade e a

piora da qualidade de vida. O diagnóstico é simples e

de baixo custo, exigindo apenas medidas como peso,

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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altura e da circunferência abdominal. Há melhora

clínica com modestas reduções ponderais (5 a 15%

do peso inicial), inclusive de doenças relacionadas,

como hipertensão arterial, diabetes e dislipidemias.

Vários estudos apontam para a necessidade de pro-

gramas efetivos no controle de peso da população.

Os profissionais de saúde precisam assumir seu

papel na construção de um plano de atividades, jun-

tamente com os usuários dos serviços de saúde e

organizações do primeiro ao terceiro setor. Devem

ser propostos e implementados projetos e programas

intersetoriais que tenham metas bem definidas, que

levem a uma redução na velocidade do crescimento

da prevalência do sobrepeso/obesidade no Brasil, por

meio da conjugação de ações individuais e coletivas

na efetivação de uma vida mais saudável para toda a

população. O estudo mostra como pode ser simples

executar um programa estruturado, de baixo custo e

efetivo, com replicabilidade dos benefícios descritos

na literatura científica. Também não restam dúvidas

de que o sucesso no controle da obesidade terá gran-

de impacto na ocupação dos serviços médicos, cus-

tos com a saúde, pensões e auxílios doença e na

qualidade de vida da população.

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Agradecimentos

À Equipe de Saúde da Família da Unidade

Jaiara e à acadêmica de enfermagem Karina Valle,

pelo auxílio na condução do estudo.

Endereço para correspondência:

Daniel Victor Arantes

Praça James Fanstone,10, Ed. D. Dayse

(Plamheg), 2º Andar, Centro.

Anápolis, GO - CEP 75020-330

Endereço eletrônico:

[email protected]

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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Daniel Victor Arantes Impacto do tratamento de sobrepeso/obesidade sobreos níveis de pressão arterial na Atenção Primária à Saúde

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RESUMO

O tratamento da Leishmaniose Tegumentar Americana (LTA) se constitui em um desafio à saúde

pública, devido a diversos fatores, dentre eles: a dificuldade de acesso às regiões florestais, a via de

administração da droga de primeira escolha ser exclusivamente parenteral e a necessidade de monitoramento

de seus efeitos adversos. Este estudo relata três casos de LTA tratados com Fluconazol. Utilizou-se esse

medicamento pelos seguintes motivos: existência de alguma contra-indicação, efeitos adversos e resposta

parcial ou inexistente ao uso do Antimoniato. Verificou-se a completa reepitelização da lesão nos três casos.

Sabe-se, no entanto, da necessidade de estudos clínicos posteriores mais abrangentes, tendo um grupo

controle, para confirmação dos resultados aqui obtidos.

ABSTRACT

The treatment of American Tegumentary Leishmaniasis (ATL) constitutes a challenge for public health.

This is due to a series of factors, amongst them: difficult access to the forest regions, the exclusively parenteral

route of administration of the first-choice drug and the need of monitoring adverse effects. This study describes

three cases of ATL treated with Fluconazole. This drug was used for the following reasons: existence of some

contraindication, adverse effects and only partial or inexistent response to Antimony treatment. Complete

reepitheliazation of skin wounds was verified in all three cases. However, further and more extensive clinical

studies including control groups will be necessary for confirming the results obtained in the present study.

Leishmaniose Tegumentar Americana:terapêutica com Fluconazol

American Tegumentary Leishmaniasis:Fluconazole therapy

Vicente Lopes Monte Neto*Mirella Maia Soares Véras**

RBMFC

PALAVRAS-CHAVE:- Leishmaniose Americana;- Fluconazol / uso terapêutico.

PALAVRAS CHAVE:- Leishmaniasis Cutaneos;- Fluconazole / Therapeutic Use.

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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*Médico de Família e Comunidade, especialista em MFC – Conselho Federal de Medicina e Conselho Regional de Medicina do Ceará.**Fisioterapeuta, mestre em Saúde Pública, especialista em Saúde da Família, professora da Universidade Federal do Ceará – UFC.

Relato de Caso

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I. Introdução

Não obstante o grande avanço da civilização,

lamentavelmente a humanidade ainda padece sob o

julgo de algumas moléstias infecto-parasitárias com

idade milenar. É o caso da Leishmaniose Tegumentar

Americana (LTA), enfermidade polimórfica da pele e

das mucosas, não-contagiosa, de evolução crônica,

caracterizada pela presença de lesões ulcerosas,

únicas ou múltiplas, localizadas ou difusas, causadas

por parasitos protozoários do gênero Leishmania1.

Estima-se que, no mundo, 90% dos casos de

Leishmaniose Cutânea ocorram no Brasil, Afeganis-

tão, Irã, Peru, na Arábia Saudita e na Síria e 90% dos

casos de Leishmaniose Cutâneo-Mucosa ocorram

no Brasil, na Bolívia e no Peru2.

No Brasil, onde a LTA distribui-se em todos

os estados federativos, no período entre 1980 e 2005,

foram confirmados, em valores absolutos, 610.256

casos – dos quais 24.291 em 2005. No Ceará, nesse

mesmo período, registraram-se 54.379 casos – dos

quais 1.666 em 20053. No município de Meruoca, local

onde foi realizado este trabalho, notificaram-se 65

casos de LTA em 20054.

Não é difícil suspeitar que esses números

reflitam a inexistência de um sistema de saúde efici-

ente e eficaz capaz de atuar em medidas preventivas

e de educação, a fim de contribuir para um controle

epidemiológico rigoroso, atuando na cadeia de trans-

missão, no diagnóstico e na condução clínica efetiva

dos casos de LTA.

Outro fator que contribui para alta prevalência

de LTA e como um dos obstáculos para o controle

dessa enfermidade é a terapêutica ora existente. Isso

devido a alguns aspectos peculiares como: o difícil

acesso às regiões florestais, lugares de maior inci-

dência de LTA; a via de administração da droga de

primeira escolha – no caso o Antimoniato pentavalente

– ser exclusivamente parenteral e a necessidade de

monitoramento dos efeitos adversos desse medica-

mento5.

Neste contexto, o presente trabalho objetiva

descrever três casos de pacientes com Leishmaniose

Tegumentar Americana, no município de Meruoca

(CE), período de julho a dezembro de 2005, tratados

com Fluconazol, medicamento de fácil posologia e,

provavelmente, com menos efeitos adversos do que

o Antimoniato pentavalente.

II. Material e Método

Trata-se de um estudo do tipo exploratório e

descritivo com abordagem qualitativa realizado, no

período de julho a dezembro de 2005, em Meruoca,

cidade localizada na zona fisiográfica do sertão

centro-norte do Ceará, região serrana, fazendo divisa

com Coreaú, Massapê, Alcântaras e Sobral. Sua

população, de 11.340 habitantes, divide-se na mes-

ma proporção entre urbana e rural6. Possui três

equipes de Saúde da Família, criadas em 2001, e

um Hospital Municipal.

A coleta das informações foi realizada por

meio de análise dos prontuários dos pacientes

constantes em arquivos do Hospital Municipal e das

três equipes de PSF daquela cidade. Utilizou-se,

ainda, o serviço de informática da secretaria de saúde

do município para obtenção de outros dados neces-

sários para a realização desta pesquisa.

O estudo foi realizado, tendo como base a evo-

lução clínica de três casos de pacientes acometidos por

LTA, escolhidos para serem tratados com Fluconazol,

tendo em vista apresentarem algum tipo de contra-

indicação, reações adversas, resistência ou resposta

parcial ao Glucantime®.

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Vicente Lopes Monte Neto e Mirella Maia Soares Véras Leishmaniose Tegumentar Americana: terapêutica com Fluconazol

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Os critérios utilizados para definição dos

casos de LTA foram: diagnóstico clínico-epidemio-

lógico e o resultado positivo na pesquisa direta de

parasitas em material de raspado ou punção aspi-

rativa da lesão corado pelo método de Giemsa7.

O estudo foi conduzido de acordo com os

preceitos éticos constantes na Resolução 196/96 das

diretrizes e normas reguladoras de pesquisa envol-

vendo seres humanos, incorporando sob a ótica do

indivíduo e das coletividades os quatro referenciais

básicos da bioética: autonomia, beneficência, justiça

e não-maleficência, visando a assegurar os direitos

e deveres que dizem respeito à comunidade científica,

aos sujeitos da pesquisa e ao Estado8.

III. Descrição dos casos

Caso 1

Paciente de 59 anos, masculino, pardo,

casado, agricultor, natural de Meruoca (CE). Compa-

receu à Unidade referindo ferida única, em região de

coxa direita, coincidindo com surgimento de

linfadenopatia inguinal, há 30 dias, negando febre e a

presença de outros ferimentos. Residia em casa de

sítio, feita de tijolos, dentro de zona florestal e apre-

sentava nível socioeconômico baixo. Em seu exame

físico, tinha bom estado geral, eutrófico, hipertenso,

deambulação normal, apresentando lesão única,

úlcero-crostosa, em região látero-proximal de coxa

direita, drenando secreção seropurulenta, indolor,

associada à linfadenopatia inguinal direita, de pequeno

volume, móvel e de consistência elástica. Devido ao

fator clínico-epidemiológico sugestivo, solicitou-se

pesquisa direta de leishmanias, tendo resultado

positivo. Visto isso, a fim de se iniciar o tratamento

convencional para LTA, foram solicitados: eletrocar-

eletrocardiograma (ECG), hemograma completo e

função hepática e renal. Em seu ECG foi observada

alguma alteração e, por conseguinte, contra-indicação

expressa pelo cardiologista a fazer uso de Glucantime®.

Decidiu-se, assim, iniciar o tratamento com Fluconazol,

via oral, na dose de 300mg/dia, instituído em oito

semanas e retorno programado para 15 dias. Passa-

dos esses dias, o paciente voltou apresentando feri-

mento já com sinais evidentes de melhora e foi agen-

dada nova consulta em 20 dias. Após esse período,

o paciente retornou com lesão evoluindo progres-

sivamente para reepitelização e, no final de oito sema-

nas de terapia, verificou-se a cicatrização total da

lesão.

Caso 2

Paciente de 54 anos, parda, feminina, casada,

agricultora, natural de Meruoca, compareceu à Unida-

de referindo surgimento de três lesões ulceradas,

dolorosas e edema em membro inferior esquerdo,

associada à linfadenopatia inguinal, há três meses,

que não melhorava com o uso de medicamentos

tópicos. Negou a presença de febre ou episódio de

trauma em região da perna. Residia em casa de

tijolos, próxima à zona de florestas, e tinha condição

socioeconômica razoável. Seu exame físico apresen-

tava bom estado geral, eutrófica, normotensa,

apresentando três lesões úlcero-crostosas, doloro-

sas, em região de maléolo medial de membro inferior

esquerdo, com drenagem de secreção seropurulenta,

associada à linfadenopatia indolor, móvel, consistên-

cia elástica, de moderado volume em região inguinal

esquerda, com deambulação levemente claudicante.

Solicitou-se, então, pesquisa direta de leishmanias,

com resultado positivo. Visto isso, a fim de se iniciar

o tratamento convencional, foram solicitados: hemo-

grama completo, função renal, função hepática e

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Vicente Lopes Monte Neto e Mirella Maia Soares Véras Leishmaniose Tegumentar Americana: terapêutica com Fluconazol

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ECG, com respectivos resultados sem quaisquer

alterações. Iniciou-se um ciclo de 20 dias com

Glucantime®, com uma aplicação diária, endovenosa,

na dosagem de 15mg/kg peso. No decorrer do pri-

meiro ciclo, a paciente começou a referir intensa mial-

gia, sendo-lhe prescritos analgésicos e antiinflama-

tórios, com melhora de quadro álgico. Ao término de

20 dias, não se verificou resposta ao tratamento. Fez-

se uma pausa de 15 dias para posterior reavaliação

da lesão. Terminado esse tempo, a paciente compa-

receu com quadro inalterado. Um novo ciclo de 30

dias foi iniciado, com a paciente voltando a referir

intensa mialgia, não obstante uso de analgésicos e

antiinflamatórios. Mesmo assim, prolongou-se o trata-

mento até os 40 dias, associando-se a antibiotico-

terapia oral, tendo em vista a suposta existência de

infecção secundária. Concluído esse último ciclo, não

se verificou resposta favorável, e a paciente estava

bastante sintomática, queixando-se de fortes dores

musculares e artralgia, relatando, ainda, que um outro

médico sugerira seu internamento para realização de

terapêutica com Anfotercina B. Decidiu-se fazer uso

de Fluconazol na dosagem de 300mg/dia, via oral,

uma tomada diária, durante seis semanas, programan-

do-se seu retorno em 15 dias. Conforme agendamen-

to, paciente retornou apresentando melhora conside-

rável – a lesão mostrava sinais evidentes de reepiteli-

zação. Ao final da sexta semana, verificou-se a cicratri-

zação completa da lesão e a paciente assintomática.

Foi dada alta após três meses de cicatrização da lesão.

Caso 3

Criança de oito anos, parda, sexo masculino,

natural de Meruoca, acompanhada da mãe, compare-

ceu à Unidade referindo duas lesões ulceradas,

profundas e dolorosas, há 30 dias. A mãe relatava

que três membros da família, inclusive ela, estavam

em tratamento para LTA. Também referiu que a crian-

ça estava inapetente e astênica. Negou, porém, a

presença de febre ou linfadenopatia. Residia em casa

de tijolos de estrutura ruim, dentro de zona florestal e

apresentava condições socioeconômicas precárias.

Segundo o exame físico, tinha bom estado geral,

mucosas hipocoradas (++/4+), emagrecida, presen-

ça de duas lesões em membro superior esquerdo,

úlcero-crostosas, com discreta drenagem de secre-

ção seropurulenta, odor fétido e sinais de infecção

secundária. Solicitou-se, então, considerando o fator

clínico-epidemiológico bastante sugestivo, pesquisa

direta de leishmanias, hemograma completo, função

renal, hepática e ECG; com resultado positivo para

formas de leishmanias. Os demais exames solicita-

dos não tiveram alterações, exceto uma leve anemia,

condição já esperada, conforme exame físico. Iniciou-

se, portanto, um ciclo de 20 dias de Glucantime® na

dose de 15mg/kg/peso/dia, endove- nosa, com uma

aplicação diária, e, simultaneamente, introduziu-se

antibioticoterapia oral e tópica, devido à coexistência

de infecção secundária. No final do ciclo, não se veri-

ficou grande resposta à terapêutica instituída, decidin-

do-se prolongar o tratamento por mais dez dias,

sendo, na ocasião, solicitados novos exames, para

monitoramento. Ao término de 30 dias, observou-se

pouca resposta. A mãe foi orientada a voltar com a

criança, após 15 dias, para reavaliação. No período

programado, a criança retornou com as lesões evolu-

indo com pouca melhora. Optou-se por um novo ciclo

de 20 dias, com a mesma posologia aplicada anterior-

mente. Ao término de 20 dias, observou-se apenas

resposta parcial, quando, enfim, decidiu-se pelo uso

de Fluconazol na dose 50mg/kg/peso/dia, uma toma-

da, durante seis semanas e programado retorno em

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15 dias. Mais uma vez, percebeu-se reposta favorá-

vel, com o processo de reepitelização das lesões

evoluindo progressivamente. No final de seis sema-

nas, verificou-se cicatrização total das lesões.

IV. Discussão

É oportuno iniciar esta discussão mencio-

nando que várias podem ser as causas de falhas te-

rapêuticas quanto ao uso de Glucantime® na LTA.

As variações da eficácia terapêutica dessa droga na

LTA podem ser conseqüências de diferentes es-

quemas posológicos, podendo apresentar falha na

forma de Leshmaniose Cutânea e, principalmente,

na forma mucosa9.

Embora os estudos não possam ser absolu-

tamente comparáveis, devido a diferentes esquemas

posológicos utilizados, o insucesso terapêutico pode

ocorrer com estes medicamentos na LTA10.

Sobre os três casos, aqui estudados, vale

relatar algumas características: a semelhança na

história epidemiológica, pois a residência desses

pacientes era localizada próxima ou dentro da zona

florestal; as condições socioeconômicas precárias

– exceto a paciente do caso 2 –; a existência de ex-

tremo de idade – no caso 3, uma criança –, fato que

poderia favorecer a falha terapêutica com o

Glucantime® pela baixa imunidade comumente

encontrada nesses hospedeiros11.

No caso 2, a paciente apresentava três lesões

em maléolo de membro inferior esquerdo, o que

facilitaria surgimento de infecções bacterianas

secundárias. As lesões localizadas abaixo dos joe-

lhos são as mais freqüentemente infectadas, porém

sem nenhuma influência no processo de cura da LTA12.

Observou-se, contudo, em inúmeras vezes,

a inegável resposta positiva à terapêutica instituída,

fosse com Glucantime, fosse com Fluconazol, após

se debelar o processo infeccioso bacteriano com

antibioticoterapia oral e/ou tópica, diferentemente da-

quilo que supõe Merchan-Hamann12.

Considerando as semelhanças e diferenças

dos casos relatados e as possíveis falhas terapêu-

ticas, porventura existentes na condução da LTA,

verificou-se, neste estudo, que o Fluconazol agiu de

forma muito positiva, quando usado posteriormente

ao Glucantime® ou isoladamente, constituindo-se em

uma valiosa alternativa de tratamento nos casos

escolhidos para tal terapêutica, porque apresentavam

alguma contra-indicação e/ou efeitos adversos ao uso

do Antimoniato pentavalente - Glucantime® ou porque

respondiam parcialmente ou eram resistentes a essa

droga.

Observou-se, ainda, uma eficácia de 100%,

nos três casos tratados com essa droga, percentual

esse superior ao encontrado por Alrajhi, em seu

estudo preliminar13, o qual indicou uma eficácia de

79% no tratamento de Leishmaniose causada por L.

major, quando comparado ao placebo (34%).

V. Considerações Finais

Verificou-se uma excelente resposta, ao se

prescrever Fluconazol, de forma isolada, em paciente

com cardiopatia, cujo uso de Glucantime® é contra-

indicado. Percebeu-se, também, a efetividade do

Fluconazol, após uso do Antimoniato, em pacientes

com resposta parcial ou provavelmente resistentes

a essa droga.

Em vista disso, sugere-se, que o Fluconazol

constitui em uma valiosa alternativa de terapêutica,

podendo ser usado isoladamente ou como coadjuvan-

te no tratamento de pacientes portadores de

Leishmaniose Tegumentar Americana – LTA –, os

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quais apresentem alguma contra-indicação para o

uso do Antimoniato pentavalente, na existência de

resposta parcial ou de resistência a essa droga.

Apesar disso, sabe-se da necessidade da

realização de estudos clínicos mais aprofundados,

com grupo-controle para confirmação dessa hipótese.

Ressalta-se, ainda, a necessidade de se in-

vestir na descoberta de novas drogas que facilitem o

tratamento da LTA, devido às dificuldades que se

enfrenta na terapêutica, ora existente, conforme fato-

res já mencionados. Porém, qualquer esforço na bus-

ca de tratamento ideal não terá muito valor se não

houver um sistema de saúde eficiente e eficaz no

diagnóstico e na condução clínica dos casos de LTA,

capaz de promover um controle epidemiológico

rigoroso que atue na cadeia de transmissão, bem co-

mo estimulando medidas educativas e, quiçá, a des-

coberta de uma vacina eficaz.

VI. Referências

1.Genaro O. Leishmaniose Tegumentar Americana.

In: Neves Davi P et al. Parasitologia Humana. 9 ed.

São Paulo: Atheneu; 1998. 41p.

2.Paraguassu-Chaves CA. Geografia Médica ou da

Saúde (Espaço e doença na Amazônia Ocidental).

Rondônia: Edufro; 2001.

3.Brasil. Ministério da Saúde. Agência Nacional de

Vigilância Sanitária. Disponível em: [http/

www.portal.saúde.gov.br]. Acesso em: 05.09.2006.

4.Ceará. Secretaria de Saúde do Estado. Indicadores

e Dados Básicos para a Saúde no Ceará. Fortaleza

(CE): SSE; 2005. p 104.

5. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância

em Saúde. Programa Nacional de DST e Aids. Manual

de recomendações para diagnóstico, tratamento e

acompanhamento da co-infecção Leishmania-HIV.

Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2004.

6. Brasil. Ministério do Planejamento, Orçamento e

Gestão. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

Disponível em: [http//www.Ibge.gov/censo] Acesso

em: 20.06.2006.

7. Brasil. Ministério da saúde. Fundação Nacional de

Saúde. In: Guia de Vigilância Epidemiológica. 2002.

p. 501-524.

8.Guathier JHM et al. Pesquisa em enfermagem:

novas metodologias aplicadas. Rio de Janeiro:

Guanabara Koogan, 1998.

9.Romero GA, Guerra MV, Paes MG, Macedo VO.

Comparison of cutaneous leishmaniasis due to

Leishmania (Viannia) braziliensis and L. (V.) guyanensis

in Brazil: therapeutic response to meglumine

antimoniate. The American Journal of Tropical Medicine

and Hygiene. 2001. p.456-465.

10.Oliveira MRF, Macêdo VO, Carvalho M, Barral A,

Marotti JG, Bittencourt A, Abreu MVA, Orge MGO, Lessa

HA, Marsden PD. Estudo evolutivo da leishmaniose

mucosa causada por Leishmania (Viannia) braziliensis

em Três Braços, Bahia. Revista da Sociedade

Brasileira de Medicina Tropical. 1995.

11.Dietze R, Araújo RC, Lima MLR, Venexat JÁ,

Marsden PD, Barreto AC. Ensaio terapêutico com

Glucantime em sagüis (Callithrox jacchus) infectados

com uma cepa de Leishmania donovani aparentemente

resistente ao tratamento. Revista da Sociedade

Brasileira de Medicina Tropical. 1985. p.39-42.

12.Merchan-Hamann E. Ensaio terapêutico com

quatro esquemas de antimonial no tratamento da

leishmaniose cutânea causada por Leishmania (Viannia)

braziliensis. [Dissertação], Universidade de Brasília.

Brasília (DF), 1989.

13.Alrajhi AA, Ibrahim EA, De Vol EB, Khairat M, Faris

RM, Maguire JH. Fluconazol for the treatment of

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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Vicente Lopes Monte Neto e Mirella Maia Soares Véras Leishmaniose Tegumentar Americana: terapêutica com Fluconazol

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cutaneous leishmaniasis caused by Leishmania major.

N Engl J Med. 2002. p.891-895.

Endereço eletrônico:

[email protected]

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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Vicente Lopes Monte Neto e Mirella Maia Soares Véras Leishmaniose Tegumentar Americana: terapêutica com Fluconazol

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RESUMO

O Programa de Saúde da Família (PSF) do Município do Rio de Janeiro teve o seu primeiro projeto

implantado em 1995, na Ilha de Paquetá, sofrendo sua efetiva expansão em 1999, para as comunidades do

Borel (Tijuca), Parque Royal (Ilha do Governador), Canal do Anil (Jacarepaguá), Vilas Canoas (São Conrado)

e Vilar Carioca (Campo Grande). O objetivo deste trabalho é avaliar o processo de implementação do Programa

nessas comunidades, com vistas à identificar aspectos problemáticos e estratégias de melhoria para a sua

efetiva atuação. Além disso, ainda que sem perspectiva de generalização dos seus achados, ele pretende

prover elementos a serem considerados na expansão do Programa, especialmente no contexto de um

grande centro urbano como o Rio de Janeiro.

A pesquisa realizada constitui-se em um estudo de casos múltiplos, focado em um grande

centro urbano. Envolveu investigação documental, a análise de indicadores de desempenho do Sistema de

Informações da Atenção Básica (SIAB), e a análise de entrevistas com o Gerente Central do PSF na Secretaria

Municipal de Saúde do Rio de Janeiro bem como profissionais das Equipes de Saúde da Família (ESF) e

moradores das comunidades selecionadas. Entre os aspectos cobertos destacam-se: condições físicas do

Programa, composição, forma de seleção, contratação e acompanhamento das equipes de profissionais,

mecanismos de educação continuada para as equipes, participação do PSF na referências de pacientes

para especialistas ou outros níveis de atenção e o papel da violência urbana.

Os resultados obtidos permitiram a sistematização de fatores facilitadores e limitantes da

implementação do PSF nas comunidades estudadas, incluindo perspectivas da gestão central, das equipes

e dos usuários.

Dissertação de mestrado. Disponível em:

Orientadora: Margareth Crisóstomo Portela http://teses.cict.fiocruz.br/cgi-

Escola Nacional de Saúde Pública-Fiocruz bin/wxis1660.exe/lildbi/iah/

Rio de Janeiro, 2003.

Avaliação da Implementação do Programa Saúde daFamília no Município do Rio de Janeiro

Carla Moura Cazelli

RBMFC

PALAVRAS-CHAVE:- Programa de Saúde da Família;- Avaliação de Programas;

- Serviços Básicos de Saúde;- Serviços de Saúde Comunitária.

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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Resumo de Tese

Implementation Assessment of the Family HealthProgram in the city of Rio de Janeiro

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RESUMO

Atividade física no Programa Saúde da Família em municípiosda 5ª Regional de Saúde do Estado do Paraná - Brasil

Silvano da Silva Coutinho

RBMFC

PALAVRAS-CHAVE:- Atividade física;- prevenção de doenças;

- Programa Saúde da Família;- promoção da saúde.

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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Resumo de Tese

Physical Activity in the Health Family Program, in citiesof 5th Regional of Health in Paraná State - Brazil

O objetivo geral desta pesquisa foi identificar e analisar as percepções dos Secretários Municipais de

Saúde da 5ª Regional de Saúde do Estado do Paraná acerca da realização de atividades físicas no Programa

Saúde da Família (PSF). Como objetivos específicos elegemos caracterizar e analisar a prática da atividade

física nos PSFs dos referidos municípios, bem como, verificar a inserção de profissionais de educação

física nessas equipes do PSF. Tomamos como pressuposto teórico as discussões sobre promoção da

saúde presentes nas Conferências Internacionais de Promoção da Saúde, buscando articulá-las à teoria e a

prática da atividade física. Trata-se de um estudo descritivo exploratório (TRIVIÑOS, 1992), com abordagem

qualitativa, sendo os sujeitos constituídos de onze secretários de saúde dos municípios da regional citada, e

também nove profissionais da área da saúde que são responsáveis pelas atividades físicas realizadas no PSF

destes municípios. Os dados empíricos foram coletados através de entrevistas semi-estruturadas realizadas

com os secretários de saúde, e também dos questionários aplicados com os profissionais de saúde responsáveis

pela realização das atividades físicas. A organização dos dados foi feita conforme ferramenta metodológica do

Discurso do Sujeito Coletivo - DSC (LEFÈVRE, 2000). Após construirmos os DSCs, elegemos três unidades

temáticas, a partir dos conteúdos: Processo de Educação em Saúde, Atividades Físicas no PSF, Prevenção e

Promoção da Saúde. Como considerações finais, ressaltamos: o processo de educação em saúde demonstra

ter um caráter mais modelador que emancipatório. O entendimento de promoção da saúde está mais ligado à

uma visão limitada do processo saúde-doença, pautado no conceito de saúde como ausência de doenças, com

alguns apontamentos para uma visão mais ampliada, abarcando aspectos sociais e psicológicos. Verificamos

de forma incipiente a realização de atividades físicas em nove equipes de PSF nos municípios participantes

da pesquisa, principalmente a caminhada, sob a iniciativa e responsabilidade de profissionais da saúde

(quatro enfermeiras, três fisioterapeutas e dois profissionais de Educação Física). Sobre a prática da atividade

física no PSF, os gestores a identificam como uma estratégia na prevenção de doenças crônicas, em especial,

obesidade, diabetes e hipertensão. Na perspectiva de se aproximar à um conceito mais ampliado de promoção da

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Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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Silvano da Silva Coutinho Atividade física no Programa Saúde da Família em municípiosda 5ª Regional de Saúde do Estado do Paraná - Brasil

saúde, os gestores ressaltaram que a atividade física

inserida na estratégia do PSF pode trazer outros

benefícios além dos biológicos, tais como: desenvol-

vimento da autonomia para realização dos afazeres

do dia-a-dia, melhoria do convívio social, interferência

em situações de risco social, educação em saúde e

como opção de lazer, no entanto, ainda de forma inci-

piente. Para tanto, sugerimos que é preciso se (re)

pensar a formação dos profissionais da saúde, em

especial, a do profissional de Educação Física,

buscando uma visão de promoção da saúde, que

abarque todas as suas possibilidades, potenciali-

dades, bem como, sua complexidade. Também é pre-

ciso vislumbrar outras estratégias que ampliem as

possibilidades da atividade física ser incorporada de

forma mais sistematizada e ampliada, na atenção à

saúde, valorizando o conhecimento da área de Edu-

cação Física na construção do SUS.

Dissertação de Mestrado

Orientadora: Pereira, Maria José Bistafa Pereira

Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP)

Ribeirão Preto, 2005

Disponível em:

http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/22/22133/

tde-03122005-102018/

Page 79: artigos 2 a 4 - SBMFC...Fortalecendo a Atenção Primária à Saúde no Brasil com a Medicina de Família e Comunidade Cynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson.....196

RESUMO

Ação comunicativa no cuidado à Saúde da Família: encontrose desencontros entre profissionais de saúde e usuários

Priscila Frederico Craco

RBMFC

PALAVRAS-CHAVE:- Comunicação;- Cuidado;- Saúde da Família

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

238

Resumo de Tese

Communicative Action Toward The Health care of the Family: Meetingsand failure in meetings among professionals of health and users

Na atualidade vivenciamos, nacional e internacionalmente, uma crescente revalorização do tema

família com priorização e expansão de serviços de Atenção Primária à Saúde, como estratégia de

reorganização do setor saúde e de mudança do modelo assistencial. Novas propostas em discussão e

aplicação têm ocupado um lugar de destaque na reconstrução das práticas de saúde no Brasil. Neste cenário,

ressalta-se a dimensão comunicacional do encontro entre profissionais de saúde e usuários, como um

processo de diálogo, que garanta e estimule uma crescente integração entre as finalidades técnicas do

trabalho e os projetos de vida dos usuários. Este estudo teve por objetivo compreender as comunicações e

ações dos sujeitos (profissionais de saúde e usuários) envolvidos no cuidado à saúde da família e interpretar

as possibilidades e dificuldades da ação comunicativa neste cuidado. A Teoria da Ação Comunicativa defendida

por Habermas (1987) é a referência teórica fundamental. A esta foram acrescidas a conceituação de Dialógica

do Cuidado proposta por Ayres (2002) e a categoria do trabalho vivo em ato proposta por Merhy (2000).

Utilizamos a abordagem qualitativa de pesquisa, com a observação participante e a entrevista semi-

estruturada como métodos de coleta de dados. A pesquisa foi desenvolvida em uma Unidade de Atenção à

Saúde da Família do município de Ribeirão Preto, Estado de São Paulo. A interpretação dos dados teve

como eixo norteador os horizontes normativos dos profissionais de saúde e dos usuários, basicamente com

relação aos ideais de: vida, saúde, trabalho, família, assistência à saúde (cuidado) e relacionamento. A

discussão da temática teve como preocupação central a necessidade de reorganização das práticas de

saúde, apostando no cuidado como categoria central e na comunicação como elemento transformador na

construção de novos modos de cuidar, mais humanos e acolhedores, na saúde e na enfermagem e em

especial na saúde da família. Destacamos as dimensões da ação comunicativa e da linguagem nos

movimentos ora de aproximações (encontros), ora de distanciamentos (desencontros) entre os profissionais

de saúde e os usuários. Uma categoria empírica central que emergiu do material empírico foi os encontros

e desencontros dos sujeitos em interação. Foi possível identificar que os desencontros entre o saber popular

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Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

239

Priscila Frederico Craco Ação comunicativa no cuidado à Saúde da Família: encontrose desencontros entre profissionais de saúde e usuários

e o saber técnico-científico geraram importantes

assimetrias comunicacionais. A linguagem codificada,

as invasões, controles e cobranças no espaço das

visitas domiciliares e os diferentes horizontes

normativos, onde o “campo da amizade” e o “campo

do tratamento” presentes no ato de cuidar, muitas

vezes se mesclam e se confundem, revelaram-se

como barreiras na comunicação, que clamam por

cuidados. A hierarquia e a falta de solidariedade entre

os profissionais da equipe de saúde geraram,

também, significativos entraves no diálogo e “esbar-

rões” de espaços, tempos, ritmos e saberes. A

classificação das famílias em vermelha, amarela e

verde, mostrou-se como um veio que questionava

se estávamos ainda sob o paradigma do risco ou se

deslocamos os horizontes normativos para o conceito

de vulnerabilidade. Já, a atitude cuidadora de “escutar/

ouvir” e estar sensível aos sofrimentos e dores do

outro surgiu como um valor importante compartilhado

por ambos os sujeitos em interação. Entre os encon-

tros visualizados na comunicação destacamos o en-

contro de sentimentos e a emergência do “Cuidado

Afetuoso/Amoroso”, onde o afeto e a espiritualidade

foram valorizados no ato de cuidar. O encontro de

valores humanos e éticos, onde o alfabeto do bom

cuidado foi composto por quatro atitudes: calor hu-

mano, respeito, confiança e envolvimento. O encontro

de sujeitos, onde o grupo de artesanato surgiu como

uma opção por uma melhor qualidade de vida e de

saúde. E o encontro de alegrias e risos, onde o ritual

festivo e a descontração surgiram deslizando para o

espaço do cuidado. Concluímos que o amadureci-

mento do diálogo entre os sujeitos transita pela

construção de pontes lingüísticas e pelo compartilha-

mento de horizontes normativos entre os técnicos

(profissionais de saúde, os que querem ser cuida-

dores) e os não-técnicos (usuários, famílias, as que

necessitam de cuidados).

Dissertação de Mestrado

Unidade Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto

(EERP)

Orientadora:, Maria Cecilia Puntel de Ayres Almeida,

Ribeirão Preto, 2006

Disponível em:

http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/22/22133/

tde-27112006-155728/

Page 81: artigos 2 a 4 - SBMFC...Fortalecendo a Atenção Primária à Saúde no Brasil com a Medicina de Família e Comunidade Cynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson.....196

Instrução aos autores da Revista Brasileira

de Medicina de Família e Comunidade

A Revista Brasileira de Medicina de Família e

Comunidade (RBMFC) é uma publicação trimestral da

Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comu-

nidade, que tem por finalidades: sensibilizar profissio-

nais e autoridades da área de saúde sobre a área de

interesse da Medicina de Família e Comunidade; esti-

mular e divulgar temas e pesquisas em Atenção Pri-

mária à Saúde (APS); possibilitar o intercâmbio entre

academia, serviço e movimentos sociais organizados;

promover a divulgação da abordagem interdisciplinar

e servir como veículo de educação continuada e per-

manente no campo da Medicina de Família e Comuni-

dade, tendo como eixo temático a APS.

Os trabalhos serão avaliados por editores do

Con- selho Científico e Editorial, como também por

pareceristas convidados ad hoc. O processo de ava-

liação por pares preserva a identidade dos autores e

suas afiliações, sendo estas informadas ao Conselho

Editorial somente na fase final de avaliação.

Todos os trabalhos deverão ser escritos em

português, com exceção dos redigidos por autores es-

trangeiros não-residentes no Brasil, que poderão fazê-

lo em inglês ou espanhol.

Tipos de Trabalho

A revista está estruturada com as seguintes

seções:

Editorial

Artigos Originais

Artigos de Revisão

Diretrizes em Medicina de Família e Comunidade En-

saios

Relatos de Experiência

Resumos de Tese

Cartas ao Editor

O Editorial é de responsabilidade do editor da

revista, podendo ser redigido por terceiros por solici-

tação dele.

A seção Artigos Originais é composta por arti-

gos resultantes de pesquisa científica, apresentando

dados originais de descobertas com relação a aspec-

tos experimentais ou de observação, voltados para

investigações qualitativas ou quantitativas em áreas

de interesse da APS. Artigos originais são trabalhos

que desenvolvem crítica e criação sobre a ciência,

tecnologia e arte das ciências da saúde que contribu-

em para a evolução do conhecimento sobre o homem,

a natureza e a inserção social e cultural. O texto –

contendo introdução, material ou casuística, métodos,

resultados, discussão e conclusão – deve ter até 25

laudas.

A seção Artigos de Revisão é composta por arti-

gos nas áreas de Gerência, Clínica, Educação em

Saúde. Os artigos de revisão são trabalhos que apre-

sentam síntese atualizada do conhecimento disponí-

vel sobre matérias das ciências da saúde, buscando

esclarecer, organizar, normalizar e simplificar aborda-

gens dos vários problemas que afetam o conhecimento

humano sobre o homem e a natureza e sua inserção

social e cultural. Têm por objetivo resumir, analisar,

avaliar ou sintetizar trabalhos de investigação já publi-

cados em revistas científicas e devem ter até 20

laudas, contendo introdução, desenvolvimento e con-

clusão.

A seção Diretrizes em MFC é composta por

artigos estruturados dentro das normas da Associa-

ção Médica Brasileira para diretrizes clínicas, valida-

dos pela SBMFC. Sua confecção, sob orientação da

Diretoria Científica da SBMFC, é uma proposta de or-

ganizar e referendar o trabalho dos MFC no Brasil.

RBMFC Instrução aos autores

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

240

Page 82: artigos 2 a 4 - SBMFC...Fortalecendo a Atenção Primária à Saúde no Brasil com a Medicina de Família e Comunidade Cynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson.....196

A seção Ensaios visa à divulgação de artigos

com as análise crítica sobre um tema específico rela-

cionado à Medicina de Família e Comunidade e deve

ser apresentada em uma média de 5 a 10 laudas.

A seção Relatos de Experiência é composta

de artigos que relatam casos ou experiências os quais

explorem um método ou problema por meio do exem-

plo. Os relatos de caso apresentam as característi-

cas do indivíduo estudado – com indicação de sexo e

idade, podendo este ser humano ou animal –, ressal-

tam sua importância na atuação prática e mostram

caminhos, condutas e comportamentos para a solu-

ção do problema. Essa parte deve ocupar até 8 laudas,

com a seguinte estrutura: introdução, desenvolvimen-

to e conclusão.

A seção Resumos de Tese, que deve ter ape-

nas 1 lauda, tem como proposta a divulgação da pro-

dução científica na temática do periódico. Nela, de-

vem ser expostos resumos de dissertações de

mestrado ou teses de doutoramento/livre-docência

defendidas e aprovadas em universidades brasileiras

ou não. Os resumos deverão ser encaminhados com

o título oficial da Tese, informando o título conquistado,

o dia e o local da defesa. Devem ser informados, igual-

mente, o nome do Orientador e o local onde a tese

está disponível para consulta.

Em Cartas ao Editor, opiniões de leitores e su-

gestões sobre a revista são bem recebidas. As car-

tas, contendo comentários sobre material publicado,

devem ter no máximo 2 laudas.

Os trabalhos a serem submetidos à aprecia-

ção do Conselho Científico deverão ser encaminhados

por e-mail para a Secretaria da Sociedade Brasileira de

Medicina de Família e Comunidade ou ao Editor da re-

vista. O padrão de formatação exigido é Word for

Windows – versão 6.0 ou superior -, página padrão A4,

letra Arial (tamanho 11), espaçamento entre linhas 1,5 e

numeração seqüencial em todas as páginas. As notas

de rodapé devem ser limitadas ao máximo possível,

assim como as tabelas e os quadros – que devem ser

de compreensão independente do texto.

Os autores deverão informar seus nomes e

ende- reços completos e quais organizações de fomen-

to à pesquisa apoiaram os seus trabalhos, fornecendo

inclusive o número de cadastro do projeto.

Os trabalhos que envolverem pesquisas com

seres humanos deverão vir acompanhados da devida

autorização do Comitê de Ética da Instituição.

Os trabalhos devem obedecer à seguinte se-

qüência de apresentação:

1. Título em português e também em inglês(*).

2. Nome completo – nome(s) seguido(s) do(s)

sobrenome(s) do(s) autor(es) – e, no rodapé, a indi-

cação da Instituição a qual está vinculado, cargo e

titulação.

3. Resumo do trabalho em português, no qual

fiquem claros a síntese dos propósitos, os métodos

empregados e as principais conclusões do trabalho.

4. Palavras-chave – mínimo de 3 e máximo

de 5 palavras-chave ou descritores do conteúdo do

trabalho, apresentados em português de acordo com

o DeCS – Descritores em Ciências da Saúde da

BIREME - Centro Latino Americano e do Caribe de

Informação em Ciências da Saúde – URL: <http://

decs.bvs.br/>.

5. Abstract – versão do resumo em inglês(*).

6. Key words – palavras-chave em inglês, de

acordo com DeCS(*).

7. Artigo propriamente dito, de acordo com a

estrutura recomendada para cada tipo de artigo, ci-

tada no item 2.

RBMFC Instrução aos autores

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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Page 83: artigos 2 a 4 - SBMFC...Fortalecendo a Atenção Primária à Saúde no Brasil com a Medicina de Família e Comunidade Cynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson.....196

8. Figuras (gráficos, desenhos e tabelas) de-

vem ser enviadas à parte, com indicação na mar-

gem do local de inserção no texto; as fotografias em

preto e branco devem ser apresentadas em papel

brilhante.

9. Referências: são de responsabilidade dos

autores e deverão ser limitadas às citações do texto,

além de numeradas segundo a ordem de referência,

de acordo com as regras propostas pelo Comitê In-

ternacional de Revistas Médicas (International

Committee of Medical Journal Editors). Requisitos uni-

formes para manuscritos apresentados a periódicos

biomédicos. Disponível em: <http://www.icmje.org>.

(*) A versão do título do trabalho, do resumo e das

palavras-chave para o idioma inglês ficará a cargo

da própria revista, salvo eventual decisão ao contrá-

rio em época futura que, se vier ao caso, será

comunicada no Editorial da revista.

Exemplos:

Periódico

Valla VV. Educação popular e saúde diante das

formas de se lidar com a saúde. Revista APS. 2000;

(5): 46-53.

Livro

Birman J. Pensamento freudiano. Rio de Ja-

neiro: Jorge Zahar; 1994. 204p.

Capítulo de livro

Vasconcelos EM. Atividades coletivas dentro

do Centro de Saúde. In: ________. Educação popu-

lar nos serviços de saúde. 3. ed. São Paulo:

HUCITEC; 1997. p. 65-69.

Dissertação

Caldas CP. Memória dos velhos trabalhado-

res. [Dissertação]. Rio de Janeiro, Instituto de Medi-

cina Social, Universidade do Estado do Rio de Janei-

ro; 1993.

Evento

Mauad NM, Campos EM. Avaliação da implan-

tação das ações de assistência integral à saúde da mu-

lher no PIES/UFJF; 6º Congresso Brasileiro de Saúde

Coletiva; 2000, Salvador. Salvador: Associação Brasi-

leira de Pós-graduação em Saúde Coletiva; 2000. p.328.

Documento eletrônico

Civitas. Coordenação de Simão Pedro P. Mari-

nho. Desenvolvido pela Pontifícia Universidade Católi-

ca de Minas Gerais, 1995-1998.

Apresenta textos sobre urbanismo e desenvol-

vimento de cidades. Disponível em:

www.gcsnet.com.br/oamis/civitas.

Acesso em: 27 nov. 1998.

Fluxo dos trabalhos submetidos à publicação.

Os artigos são de total e exclusiva responsa-

bilidade dos autores.

Avaliação por pares: os artigos recebidos são

protocolados na secretaria da revista e encaminha-

dos tanto ao editor geral quanto aos editores associ-

ados, para a triagem, a avaliação preliminar e a pos-

terior distribuição ao Conselho Editorial e Científico,

em conformidade com as áreas de atuação e espe-

cialização dos membros, bem como o assunto tra-

tado no artigo. Todos os textos são submetidos à

avaliação de dois consultores – provenientes de ins-

tituição diferente daquela do(s) autor(es) –, em um

processo duplo cego, que os analisam em relação

aos seguintes aspectos: adequação do título ao con-

teúdo; estrutura da publicação; clareza e pertinência

RBMFC Instrução aos autores

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

242

Page 84: artigos 2 a 4 - SBMFC...Fortalecendo a Atenção Primária à Saúde no Brasil com a Medicina de Família e Comunidade Cynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson.....196

dos objetivos; metodologia; informações inteligíveis;

citações e referências adequadas às normas técni-

cas adotadas pela revista e pertinência à linha edito-

rial da publicação. Os consultores preenchem o for-

mulário de parecer, aceitando, recusando ou reco-

mendando correções e/ou adequações necessárias.

Nestes casos, os artigos serão devolvidos ao(s)

autor(es), para os ajustes e reenvio, e aos consulto-

res para nova avaliação. O resultado é comunicado

ao(s) autor(es), e os artigos aprovados ficam dispo-

níveis para publicação em ordem de protocolo. Não

serão admitidos acréscimos ou modificações após

a aprovação.

Declaração de responsabilidade dos autores

Todas as pessoas responsáveis como auto-

res devem responder pela autoria dos trabalhos, ten-

do como justificada a sua participação de forma sig-

nificativa no trabalho para assumir responsabilidade

pública pelo seu conteúdo. Deverão, portanto, assi-

nar a seguinte declaração de autoria e de responsa-

bilidade:

“Declaro que participei de forma significativa

na construção e formação deste estudo ou da análi-

se e interpretação dos dados, como também na re-

dação deste texto, tendo, enquanto autor, responsa-

bilidade pública pelo conteúdo deste. Revi a versão

final deste trabalho e aprovo para ser submetido à

publicação. Declaro que nem o presente trabalho nem

outro com conteúdo semelhante de minha autoria foi

publicado ou submetido à apreciação do Conselho

Editorial de outra publicação.”

Artigos com mais de um autor deverão con-

ter uma exposição sobre a contribuição específica

de cada um no trabalho. Os autores de cada artigo

receberão, após a publicação de seu trabalho, três

exemplares da revista em que o seu estudo foi publi-

cado.

Ética em pesquisa

Com relação às pesquisas iniciadas após ja-

neiro de 1997, nas quais exista a participação de se-

res humanos nos termos do inciso II.2 da Resolução

196/ 96 do Conselho Nacional de Saúde (“pesquisa

que, individual ou coletivamente, envolva o ser hu-

mano de forma direta ou indireta, em sua totalidade

ou partes dele, incluindo o manejo de informações

ou materiais”), sempre que pertinente, deve ser de-

clarado no texto que o trabalho foi aprovado pelo Co-

mitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos.

Os trabalhos devem ser enviados para:

Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Co-

munidade - SBMFC

Correspondência

Rua 28 de Setembro, 44 sala 804

Rio de Janeiro - RJ

Cep: 20551-031

Tel/fax: 21 2264-5117

Endereço eletrônico:

[email protected]

RBMFC Instrução aos autores

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

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Instructions to authors of the Brazilian Journal

of Family and Community Medicine

The Brazilian Journal of Family and Community

Medicine (BJFCM) is a three-monthly publication of

the Brazilian Society of Family and Community

Medicine, aimed at sensitizing professionals and

health authorities to this field of interest, stimulating

and disseminating Primary Health Care (PHC) issues

and investigations, and facilitating interchange between

academic institutions, health care services and

organized social movements. The periodical also

aims to promote an interdisciplinary approach to this

area and to serve as a vehicle for continued and

permanent education in the field of Family and

Community Health, with emphasis to the central

subject PHC.

Manuscripts will be reviewed by members of

the Scientific and Editorial Board as well as by outside

referees. This peer-review process safeguards the

identity of authors and their institutions of origin, which

only will be revealed to the Editorial Board in the end

of the evaluation process.

All manuscripts should be prepared in

Portuguese language. Foreign authors, not living in

Brazil, can submit their papers in English or Spanish.

Categories and formats of papers

The journal is divided into the following

sections:

Editorial

Original articles

Review articles

Directives in Family and Community Medicine

Essays

Case reports

These Abstracts

Letters to the Editor

The Editorial is responsibility of the editor of

the journal, but can be prepared by third persons on

his request.

The section Original Articles is dedicated to

reports on scientific investigations, presenting origi-

nal data on findings from experiments or observation

with emphasis to qualitative or quantitative studies in

fields of interest for PHC. Original articles are

criticisms or creations on science, technology and

the art of health sciences, contributing to the evolution

of knowledge about Man, nature and social and cultu-

ral inclusion. The papers - including introduction,

material or rationale, methods, results, discussion and

conclusion – should not exceed 25 pages.

The section Reviews is composed by articles

about Health Management, Clinics and Health

Education. Review articles are papers presenting an

up-to-date synthesis of available knowledge on health

science subjects, with the intent to elucidate, organi-

ze, normalize and simplify approaches to the different

problems affecting human knowledge about Man and

nature and social and cultural inclusion. These papers

are aimed at summarizing, analyzing, evaluating and

synthesizing investigations already published in

scientific journals and should not exceed 20 pages,

including introduction, rationale and conclusion.

The section Directives in FCM receives articles

prepared according to the norms for Clinical Directives

of the Brazilian Association of Physicians, validated

by the BSFCM. The purpose of these articles -

prepared under the guidance of the Scientific Board

of the BSFCM – is to organize and reference the work

RBMFC Instructions to authors

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

244

Page 86: artigos 2 a 4 - SBMFC...Fortalecendo a Atenção Primária à Saúde no Brasil com a Medicina de Família e Comunidade Cynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson.....196

of physicians involved in FMC in Brazil.

The section Essays publishes critical analyses

regarding specific topics related to Family and

Community Medicine. Articles should have 5 to 10

pages.

Case Reports are articles addressing cases

or experiences by exploring a method or problem

based on an example. These articles indicate details

such as sex and age of the studied individual – human

or animal – emphasize their importance in practice

and indicate ways, procedures and conducts for

solving the problem. Articles for this section should

not exceed 8 pages and include introduction, rationale

and conclusion.

The section Abstracts of Theses is aimed at

publishing scientific production in the field covered by

the journal in form of abstracts of master’s and

doctor ’s dissertations defended in Brazilian

universities or abroad. Abstracts should not exceed

one page, state the official title of the dissertation, the

academic degree achieved, date and place where the

thesis was defended and indicate the name of the

supervisor and where the dissertation is available for

consultation.

In the section Letters to the Editor, readers are

invited to express their opinion and make suggestions

to the journal.

Articles should be submitted by electronic mail,

directed to the Secretariat of the Brazilian Society of

Family and Community Health or to the Editor. Papers

should be typed in word processor Word for Windows

– version 0.6 or superior – paper size ISO A4, font

Arial, size 11, space between lines 1,5, and all pages

should be numbered sequentially. References should

be kept to the necessary minimum. The same refers

to tables and figures, which should be understandable

independently from the text. Corresponding authors

should inform their full names and addresses. The

funding sources by which the work was supported

should be stated.

Articles describing investigations on human

subjects must include a statement referring institutional

ethics committee clearance.

Manuscripts should be structured as below:

1. Title

2. Complete names – first name(s) followed

by family name(s) of the author(s)

3. Abstract giving a clear synthesis of the

purpose, describing the methods used and main

conclusions of the study.

4. Key words – a minimum of 3 and a

maximum of 5 key words or describers of the contents

of the work, following the norms of DeCS, available at

http://decs.bvs.br/

5. Text of the article, according to the

recommendations for each category given above.

6. Figures (graphs, diagrams and tables)

according to the recommendations given above.

7. References: are responsibility of the authors

and should be arranged numerically according to the

order in which they appear in the text, according to

the rules of the International Committee of Medical

Journal Editors, Uniform Requirements for

Manuscripts Submitted to Biomedical Journals,

available at http://www.icmje.org

Examples:

Periodical

Valla VV. Educação popular e saúde diante das

formas de se lidar com a saúde. APS Journal. 2000;

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

245

RBMFC Instructions to authors

Page 87: artigos 2 a 4 - SBMFC...Fortalecendo a Atenção Primária à Saúde no Brasil com a Medicina de Família e Comunidade Cynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson.....196

(5): 46-53.

Book

Birman J. Pensamento freudiano. Rio de Ja-

neiro: Jorge Zahar; 1994. 204p.

Book chapter

Vasconcelos EM. Atividades coletivas dentro

do Centro de Saúde. In: ________. Educação popu-

lar nos serviços de saúde. 3rd. ed. São Paulo:

HUCITEC; 1997. p. 65-69.

Dissertation

Caldas CP. Memória dos velhos trabalhado-

res. [Dissertation]. Rio de Janeiro, Instituto de Medi-

cina Social, Universidade do Estado do Rio de Janei-

ro; 1993.

Event

Mauad NM, Campos EM. Avaliação da implan-

tação das ações de assistência integral à saúde da

mulher no PIES/UFJF; 6th Brazilian Congress on

Collectyive Health; 2000, Salvador. Salvador: Associ-

ação Brasileira de Pós-graduação em Saúde Coleti-

va; 2000. p.328.

References from the internet

Civitas. Coordinated by: Simão Pedro P. Ma-

rinho. Developed by: Pontifícia Universidade Católi-

ca de Minas Gerais, 1995-1998. Presents texts on

urbanism and city development. Available at: <http//

www.gcsnet.com.br/oamis/civitas>. Accessed: Nov

27. 1998.

Review procedures and publication of

submitted manuscripts.

The articles are of the full and exclusive

responsibility of the authors.

Peer-review procedure: received articles are

registered by the Secretariat of the journal and

submitted to the Scientific and Editorial Board for

screening, preliminary evaluation and posterior

distribution to ad hoc referees with specific expertise

in the subject addressed by the article. All

manuscripts are submitted to two referees, coming

from institutions different from those of the author(s)

who, in a double-blind review process, assess them

with respect to the following aspects: pertinence of

the title in relation to the content, structure of the

manuscript, pertinence and clearness of objectives,

methodology, intelligible information, conformity of

citations and references with the technical norms

and alignment with the editorial line of the journal.

The referees fill in the review form accepting or

rejecting the manuscript or suggesting

improvements and/or necessary corrections. In this

case, the manuscript is returned to the author(s) for

revision and resubmission, followed by a new

evaluation. The result is communicated to the

author(s) and accepted articles will be published

following the order of registry. No additions or

modifications in manuscripts already accepted for

publication will be admitted.

Responsibility Statement

All individuals named as authors for having

participated substantially in the submitted study have

to take public responsibility for the integrity of their

work and consequently sign the following

Responsibility Statement:

“I hereby declare to have participated

substantially in the conception and design of the

present work and in the writing of the manuscript,

Rev Bras Med Fam e ComRio de Janeiro, v.2, n° 7, out / dez 2006

246

RBMFC Instructions to authors

Page 88: artigos 2 a 4 - SBMFC...Fortalecendo a Atenção Primária à Saúde no Brasil com a Medicina de Família e Comunidade Cynthia Haq, Gustavo Gusso e Maria Inez Padula Anderson.....196

taking public responsibility for its integrity. I have read

the final version of this work and agreed to its

submission for publication. The work in its present or

a similar form has not been published elsewhere, nor

is it currently under consideration for publication in

another periodical.”

Articles prepared by more than one author

should state the specific contribution of each of them.

The authors of each article will receive three

exemplars of the edition in which their study was

published.

Ethics in experimentation

Articles based on investigations involving

human subjects should declare in the text that the

investigation has beencleared by the responsible

Ethics Committee on Human Experimentation.

Manuscripts should be submitted electronically to:

Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Co-

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