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Uso racional de DVA em terapia intensiva.

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  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 2012 1

    REVISTA DA SOCIEDADE PORTUGUESA DE

    ANESTESIOLOGIA

    Vol. 21 | n3 | 2012 - ISSN 0871-6099Revista da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 20122

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  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 2012 3

    REVISTA DA SOCIEDADE PORTUGUESA DE

    ANESTESIOLOGIA

    Vol. 21 | n3 | 2012 - ISSN 0871-6099Revista da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 20124

    Curto e Conciso

    Exmo/a Colega

    O conhecimento de um documento emanado pela ERS sobre a reorganizao hospitalar em que so colocados em causa os servios de anestesiologia, vem colocar questes muito graves sobre quem protagonista de determinadas opinies. Consideram-se peritos indivduos reconhecidos pelo conhecimento dos assuntos em causa, capacidade de reflexo sobre os mesmos e de emisso de juzos bem sustentados na evidncia cientfica ou no mnimo de uma experincia consolidada com substncia intelectual.

    A frase gratuita que surge no documento, e que levantou onda de repulsa por parte dos anestesiologistas e de outros sectores que tambm estranharam esta individualizao, perfeitamente descontextualizada e parecendo um favor prestado a algum, ensombra de forma grave tcnica e tica o mesmo. Pe em causa a organizao dos servios de anestesiologia na estrutura hospitalar, mostrando uma ignorncia profunda sobre organizao hospitalar e pondo em causa a validade sobre muitas outras afirmaes emanadas pelo documento.No procurando aqui pormenorizar a discusso, pois a mesma est a ser desenvolvida a todos os nveis possveis, colocando em causa a dita opinio, consciencializemos a nossa cidadania enquanto portugueses, tcnicos de sade e eventuais usufruturios de cuidados mdicos.

    No existe lugar para medos esperando que tudo passe, e que isto tudo no passe de um pesadelo recuperando-se ideias da idade mdia. Existe sim a obrigao de cada um de ns saber em que mundo queremos viver e de assumir as suas responsabilidades.

    Lucindo OrmondePresidente da SPA

    Editorial

    Lucindo OrmondePresidente da SPA

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 2012 5

    O presente nmero da Revista da SPA inicia a sua escrita segundo o Acordo Ortogrfico da Lngua Portuguesa. Este acordo entrou em vigor em 13 de Maio de 2009 com um perodo de transio de seis anos para Portugal. Esta deciso prende-se com duas ordens fatores: a necessidade de implementar o que est em lei e o envio de trabalhos para submisso redigidos, quase exclusivamente, em sintonia com o Acordo.

    A edio deste nmero continua a reviso sobre Farmacologia Cardiovascular (2 parte) na vertente dos diurticos e vasodilatadores.Apresentam-se duas revises adicionais:- Uma, sobre o potencial teraputico dos canabinides sintticos e o reconhecimento de recetores especficos no sistema endocanabinide com aplicabilidade clnica na teraputica da dor aguda e crnica.- Outra, sobre as mucopolissacaridoses. Um grupo heterogneo de doenas hereditrias por deficincia de enzimas do metabolismo dos glicosaminoglicanos com evoluo crnica e sistmica prevalente na idade peditrica.A anestesiologia peditrica revista num contexto histrico em Portugal. Esta temtica histrica vai ter continuidade em prximos nmeros e deseja-se que constituam registos da nossa memria anestesiolgica. Este assunto ter um tratamento mais desenvolvido no prximo nmero.No programa do Congresso Anual da SPA decorreu em regime de pr-congresso a Reunio de Formao & Ensino. Neste nmero da Revista damos a conhecer os resultados desta reunio cujo resumo foi elaborado pelos seus promotores.Este tema de Formao & Ensino , particularmente, importante para a nossa especialidade.A aplicao do Decreto de Lei aprovado no Dirio da Repblica de Janeiro de 2011 (1 srie, n 18-26 de Janeiro de 2011, portaria 49/2011) vem equiparar, em durao da formao, a especialidade de Anestesiologia ao que se verifica na maioria dos pases europeus. Este projeto de alterao e reviso do programa de formao em Anestesiologia foi enviado ao CNE em Junho de 2004. Desde ento foi alterado e revisto sucessivamente, pela persistncia e esforo das sucessivas direes do Colgio da Especialidade, que culminou no documento atual.

    Importa pois refletir sobre a qualidade da formao ministrada e os novos desafios ou complementaridades a que a especialidade tem de estar atenta. Algumas das reflexes inseridas no referido texto esto em linha com as preocupaes atuais relativas relevncia dos fatores humanos no desempenho das equipas, na preveno do erro mdico e segurana do doente. A anlise destes fatores (ex. liderana, comunicao e trabalho de equipa) que poderemos designar como competncias no-tcnicas tem sido estudada desde o final dos anos 80 do sculo passado 1. O seu treino tem sido implementado em programa estruturados a nvel europeu de forma compulsiva (Dinamarca) 2 ou opcional atravs de programas de simulao mdica. Trata-se de uma ferramenta pedaggica particularmente interessante e cuja evidncia cientfica tem vindo a emergir em estudos de evoluo clnica 3.A Anestesiologia tem sido, provavelmente, a especialidade com maiores preocupaes na rea da segurana do doente. Somos, desta forma, lderes naturais na rea da segurana e estes aspetos devem merecer a ateno necessria nos programas formativos. Para prosseguir este caminho vital o investimento continuado na formao em competncias tcnicas e no-tcnicas (estas ltimas no contempladas no ensino designado por clssico ou tradicional).

    Os Servios de Anestesiologia como entidades autnomas, dentro de uma estrutura hospitalar, tm um papel fulcral nos programas formativos dentro e para fora da especialidade. A inadmissibilidade de recentes desenvolvimentos, leia-se Estudo para a Carta Hospitalar da ERS de 18 de Abril de 2012, vm colocar em causa o trabalho empenhado de geraes de anestesiologistas na dignificao e elevada qualificao dos profissionais. No est s em causa a independncia da especialidade relativamente a outras, mas igualmente a preservao de aspectos relacionados com a formao mdica e uma cultura de segurana, parmetro indispensvel na qualidade dos cuidados de sade em Portugal.

    Os meus melhores cumprimentos,

    Bibliografia

    1. Gaba DM. Anaesthesiology as a model for patient safety in health care. BMJ 2000; 18: 785788.2. stergaard D, Lippert A and Dieckmann P. Integration of simulation based-training in compulsory specialist programs for physicians - The Danish experience. Revista SPA Supl 2010:21-25.3. Draycott T, Sibanda T, Owen L. Does training in obstetric emergencies improve neonatal outcome? BJOG 2006; 113:17782.

    Editorial

    Antnio Augusto MartinsEditor da Revista da SPA

    Antnio Augusto MartinsEditor da Revista da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 20126

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 2012 7

    Revista_SPA_1_curvas

    quinta-feira, 29 de Dezembro de 2011 18:14:56

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 20128

    Farmacologia clnica cardiovascular em anestesiologia Farmacologia da proteo miocrdica - 2 ParteCristina amaral, assistente Hospitalar Graduada, servio de anestesioloGia do Hospital de s.Joo epe, porto

    ResumoO progressivo envelhecimento da populao nos pases desenvolvidos originou uma elevada prevalncia de doentes medicados com frmacos de ao cardiovascular. Os anestesiologistas devem conhecer as indicaes e interaes teraputicas entre estes frmacos e os da anestesia. A evidncia disponvel permite falar de farmacologia da proteo miocrdica. As guidelines atuais seguem os estudos que apresentam melhores resultados relativamente aos frmacos a introduzir, manter ou suspender no perioperatrio.

    Palavras-chave: - Farmacologia da proteo miocrdica - Diurticos- Vasodilatadores- Agonistas- Adrenrgicos alfa 2- Amiodarona

    Clinical cardiovascular pharmacology in anesthesiologyPharmacology of myocardial protection - Part 2Cristina amaral, Assistente HospitAlAr GrADuADA, serVio De AnestesioloGiA Do HospitAl De s.Joo epe, porto

    AbstractAn increasingly older population in developed countries originated a high prevalence of patients taking cardiovascular medication. Anesthesiologists must know indications and therapeutic interactions between this drugs and anesthetic agents. Available evidence lets talk about the pharmacology of myocardial protection. The current guidelines seem to follow positive outcome studies concerning what drugs should be introduced, continued or suspended throughout the perioperative period.

    Keywords: - pharmacology of myocardial protection- Diuretics- Vasodilators- Adrenergic alpha 2 - receptor agonist - Amiodarone.

    IntroduoAs doenas cardiovasculares so a causa mais frequente de

    morte no mundo e em Portugal so responsveis por cerca de 40 % dos bitos 1.

    O desenvolvimento de novos frmacos para o tratamento e preveno das doenas cardacas e do sistema circulatrio tem sido prioritrio para a indstria farmacutica. Porm, alguns dos mais antigos agentes cardiovasculares conservam as suas indicaes teraputicas, quer pelo seu cmodo regime posolgico, quer pela baixa toxicidade, quer ainda pelo custo competitivo. Por serem dos mais prescritos, estes ltimos merecem especial ateno pela frequncia com que podem interferir com a anestesia e pela possibilidade de interferncia desta nos seus efeitos.

    A farmacologia da proteo miocrdica comea na preveno do miocrdio doente. No perioperatrio o objectivo da preveno engloba a optimizao funcional e o controlo dos desvios homeostticos.

    Alguns dos frmacos de ao cardiovascular podem estar indicados em situaes relacionadas necessidade cirrgica per-operatria e no patologia associada. So exemplos o controle do edema cerebral associado patologia tumoral e a hipotenso controlada na cirurgia do ouvido mdio.

    DiurticosOs diurticos so utilizados no tratamento da HTA e

    insuficincia cardaca, algumas vezes coexistentes.

    Aspetos farmacolgicos e clnicos

    No rim normal, 99 % da gua que entra no nefrnio reabsorvida nos tbulos proximal e distal e no duto coletor.

    Do sdio filtrado, o rim excreta menos de 1 %, sendo que 7/8 so reabsorvidos no tbulo proximal e apenas 1/8 na ansa de Henle e no tbulo distal. A urina representa, em volume, 1 % do ultra-filtrado glomerular, isto cerca de 1,5 L/dia. A reabsoro do ultra-filtrado d-se em 50 a 75 % na poro proximal do tbulo renal, em 25 a 40 % na ansa de Henle e em 2 a 5 % no tbulo distal 2.

    Mecanismos eficientes de auto-regulao mantm o fluxo sanguneo renal e a taxa de filtrao glomerular relativamente constante para largas margens de presso de perfuso. Neste processo esto envolvidos: presso hidrosttica e onctica, distribuio intra-renal do fluxo sanguneo, resposta de feed-back tbulo-glomerular, sistema renina-angiotensina-aldosterona (SRAA), prostaglandinas, vasopressina, peptdeo natriurtico auricular e peptdeo natriurtico cerebral.

    Por interferncia nestes mecanismos, os diurticos podem originar alteraes cardiovasculares e do equilbrio cido-base e hidro-eletroltico.

    So dos anti-hipertensores mais prescritos, por serem baratos, pouco txicos e fceis de manusear, pelo que frequente fazerem parte da medicao do doente proposto para cirurgia.

    Consoante o tipo, os diurticos provocam diferentes magnitudes de natriurese e diurese, com eventual contrao do volume intravascular, por bloqueio do transporte de ies ao longo de vrios locais do tbulo renal (Figura 1). Adicionalmente surge diminuio do fluido extra-celular, do dbito cardaco e da presso arterial.

    Estes frmacos so classificados com base no mecanismo de ao, local do nefrnio onde atuam e tipo de diurese que provocam em: osmticos, inibidores da andrase carbnica, diurticos da ansa, tiazidas, poupadores de potssio e inibidores da hormona anti-diurtica 2.

    Artigo de Reviso

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 2012 9

    Fig 1 - Esquema das diferentes pores do nefrnio

    Diurticos osmticos

    O manitol um lcool, diurtico osmtico, cuja nica via de excreo pelo rim, praticamente inalterado e sem sofrer reabsoro. Aps administrao intravenosa atua numa primeira fase como expansor, em resultado do aumento da osmolaridade plasmtica e chamada de lquidos para o compartimento intravascular, podendo precipitar insuficincia cardaca e edema pulmonar, sobretudo em doentes com m funo cardaca prvia. Na segunda fase, passa do compartimento intravascular para o extracelular e pode causar hipotenso. Aumenta o fluxo sanguneo renal, reduzindo a reabsoro de sdio e gua, principalmente no tbulo proximal, mas tambm no distal. O efeito natriurtico modesto comparativamente ao diurtico, que elevado. Diminui a produo de renina e a capacidade de concentrao da urina. Provoca hipocalemia e pode originar hiponatremia e acidose de expanso, esta devida diluio do bicarbonato circulante 3.

    Est indicado na insuficincia renal refratria a outros diurticos, na reduo do edema peri-tumoral associado a neoplasias cerebrais ou com a finalidade de reduzir a presso intracraniana como nos TCE. tambm utilizado na profilaxia da insuficincia renal aguda em cirurgia cardiopulmonar, aneurismetomia da aorta a nvel supra-renal e quadros de choque secundrios a hemoterapia ou mioglobinria.

    A dose varia com o objetivo teraputico. No tratamento do edema cerebral e do glaucoma a dose habitual de 1,5 a 2 g.Kg (manitol a 20 %), administrada em 30 a 60 minutos. Perante situaes de oligria, est aconselhada uma dose-teste de 0.2 g.Kg a perfundir em 5 minutos, seguida de uma perfuso de 5 a 20 g/dia, consoante a resposta diurtica 2.

    Alm da insuficincia cardaca, a insuficincia renal severa, a hiponatremia e a histria de hipersensibilidade so contra-indicaes sua administrao.

    Diurticos inibidores da andrase carbnica

    Estes frmacos impedem o cido carbnico de se dissociar

    em ies de bicarbonato e hidrognio na clula tubular proximal, reduzindo a habitual reabsoro de 80 % do bicarbonato a este nvel. A reduo da captao de bicarbonato alcaliniza a urina e em consequncia surge acidose metablica. Dado que a absoro de sdio precisa do co-transporte com o bicarbonato, resulta aumento de sdio na urina, que condiciona aumento da excreo de potssio por troca no tbulo distal.

    A acetazolamida um derivado das sulfonamidas, de fraca ao diurtica, que d origem a taquifilaxia, pois a sua eficcia decresce com o desenvolvimento de acidose metablica. A principal indicao teraputica o tratamento do glaucoma. til no tratamento da alcalemia provocada por outros diurticos e na nefrolitase associada ao cido rico ou cistina. Outras indicaes so o tratamento de quadros de edema acompanhados de alcalose metablica, como acontece nos doentes com DPOC acompanhada de cor pulmonale e na doena aguda das montanhas 3.

    Diurticos da ansa

    Bloqueiam a reabsoro de sdio no ramo ascendente da ansa de Henle de forma dose-dependente, podendo a excreo deste io chegar a 31 % do filtrado, contra o 1 % fisiolgico. Por este motivo so dos frmacos mais eficazes na insuficincia renal. Impedem a reabsoro ativa de cloro, estimulando a produo de renina. Aumentam o fluxo sanguneo renal e promovem a redistribuio. Causam hipocalemia, hipomagnesemia e alcalose hiperclormica. Desidratao e hiperuricemia so outros dos seus efeitos laterais. A indacrinona no est contra-indicada na gota, porque tem efeito uricosrico 2.

    A furosemida um derivado do cido antranlico similar s tiazidas. Tem uma forte ligao s protenas plasmticas, incio de ao em 20-30 minutos p.o., durao de efeito de 4 a 6 horas e excretada pelo rim em 50 %. Na presena de insuficincia renal e nos recm-nascidos a t1/2 pode estar prolongada at mais de 10 horas. Pode causar ototoxicidade. Tambm lhe tem sido atribuda intolerncia glicose e mesmo coma hiperosmolar, especialmente em doentes com fatores de risco. A sua associao persistncia do duto arterial, limita a administrao em grvidas 2.

    A bumetanida 40 vezes mais potente que a furosemida, tem uma t1/2 menor (cerca de 90 minutos) e no afetada pela insuficincia renal.

    Por ter uma resposta inferior furosemida e maior risco de ototoxidade, o cido etacrnico praticamente no utilizado.

    Tanto a HTA como a insuficincia renal crnica so indicaes frequentes para estes frmacos. Tm tambm um efeito benfico na insuficincia cardaca congestiva, pois ao diurtica juntam a diminuio da presso de encravamento capilar pulmonar e aumento da capacitncia venosa. A furosemida est indicada no edema agudo do pulmo. Os diurticos da ansa esto ainda indicados na intoxicao pela gua, na hipercalcemia grave e em situaes de presso intracraniana elevada no dependente do edema cerebral. Na hiponatremia grave, a furosemida est indicada em associao a solues salinas hipertnicas. A correo da natremia deve ser lenta, 1 a 2 mEq.h-1, para evitar complicaes neurolgicas decorrentes da hialinose mielopontnica 2.

    Deslocam a varfarina da albumina plasmtica, aumentando a sua disponibilidade 3.

    Estes diurticos apresentam um largo leque posolgico, de que exemplo a furosemida, cujas doses teraputicas so de 20 a 80 mg p.o./dia na insuficincia renal crnica, at 10 vezes esta dose na insuficincia renal aguda.

    Farmacologia clnica cardiovascular em anestesiologia

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 201210

    Diurticos tiazdicos

    Promovem diurese de sdio e cloro e diminuem a excreo de clcio, por ao predominante no tbulo distal.

    A via de administrao oral e atingem o pico plasmtico em meia a uma hora. So eliminadas no tbulo proximal, onde diminuem a reabsoro de sdio, podendo causar toxicidade pelo ltio por aumentarem indiretamente a sua reabsoro nesta parte do nefrnio.

    Dos efeitos laterais destacam-se: desidratao, hiperuricemia, hipocalemia, hipomagnesemia, hiperlipidemia, hipercalcemia, hiperglicemia, hiponatremia e raramente azotemia. As tiazidas podem provocar pancreatite e reaes de hipersensibilidade com prpura, dermatite e vasculite.

    Esto indicadas na teraputica dos estados edematosos como ICC, cirrose e sndrome nefrtico; HTA; diabetes inspida nefrognica e litase das vias urinrias (oxalato de clcio).

    A indapamida na dose de 0.04 mg.Kg apresenta efeito exclusivamente anti-hipertensor.

    A metolazona permite ultrapassar o fenmeno de resistncia a estes diurticos, porque em adio ao efeito que lhes comum, inibe a reabsoro proximal de sdio.

    So diurticos menos eficazes em doentes geritricos e praticamente ineficazes na insuficincia renal grave (depurao de creatinina

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 2012 11

    Resistncia aos diurticos

    Na insuficincia cardaca e renal a capacidade de auto-regular a taxa de filtrao glomerular altera- -se com qualquer medicamento que reduza a presso arterial. A eficcia dos diurticos, mesmo os da ansa, diminui com o agravamento da patologia subjacente apesar de doses entricas progressivamente mais altas. Este efeito de resistncia ao diurtico, traduz-se pelo desvio para a direita da curva sigmide, que descreve a relao entre o logaritmo da concentrao do diurtico na luz tubular e o seu efeito natriurtico 2.

    A etiologia da resistncia aos diurticos parece ser multifatorial. Pode dever-se a diminuio da resposta renal ou/e a diminuio da concentrao de frmaco ativo no local de ao. Por um lado existe um fenmeno de adaptao ao diurtico, que se atribui a hipertrofia do epitlio tubular e que condiciona aumento da capacidade de reabsoro de sdio e de gua. A retroalimentao tbulo-glomerular e uma atividade nervosa simptica excessiva contribuem para provocar reteno renal de sdio. O aumento da atividade do SRAA tambm responsvel pelo aumento da secreo de hormona anti-diurtica. Por outro lado, para alm da deteriorao sbita das funes cardaca e renal, a causa mais frequente de resistncia aos diurticos a administrao simultnea de outros frmacos de que so exemplo os anti-inflamatrios no esteroides (AINES) e os vasodilatadores. Por interferncia com as prostaglandinas, os AINES podem inibir a resposta saliurtica furosemida e levar mesmo a insuficincia renal aguda. A restrio da ingesto salina importante para protelar o desenvolvimento de resistncia. Outras causas de resistncia aos diurticos na administrao por via oral so: falta de adeso teraputica; dose insuficiente; m absoro, como acontece na insuficincia cardaca; diminuio do fluxo sanguneo renal, como nos estados edematosos de ICC, IRA, IRC e cirrose heptica; e proteinria de que exemplo o sndrome nefrtico 2.

    A administrao intravenosa permite ultrapassar este inconveniente nas insuficincias renal e cardaca, pelo aumento sucessivo da dose at encontrar o limiar teraputico adequado. Porm a estratgia ideal consiste na teraputica intravenosa contnua, de forma a assegurar uma diurese sustentada pela presena ininterrupta de concentraes altas de diurtico no tbulo renal. Desta forma evita-se tambm uma reduo demasiado rpida do volume intravascular e de hipotenso, assim com o risco de ototoxidade no caso dos diurticos da ansa de Henle.

    Toxicidade

    A ototoxicidade relacionada furosemida refere-se a concentraes i.v. superiores a 100 g.mL-1 ou a velocidades de administrao superiores a 4 mg.min-1 ou, ainda, associao com aminoglicosdeos.

    A toxicidade renal dos aminoglicosdeos e de algumas cefalosporinas de 1gerao, como a cefaloridina, potenciada pelo uso concomitante de diurticos da ansa.

    Recomendaes peri-operatrias para os diurticos

    Os diurticos so, habitualmente, descontinuados na manh da cirurgia 4. recomendado que os pacientes hipertensos, descontinuem os diurticos em baixa dose no dia da cirurgia e

    que os reinstituam oralmente logo que possvel (classe I, nvel C) 6.Em presena de insuficincia cardaca, os diurticos devem ser

    mantidos no dia da cirurgia e reinstitudos p.o. logo que possvel. No per-operatrio pode haver necessidade de os suplementar com diurticos da ansa via endovenosa (Classe I, nvel C) 6.

    Por interferncia nos mecanismos de autoregulao renal, os diurticos podem originar alteraes cardiovasculares e do equilbrio cido-base e hidroeletroltico. A sua ao deve ser controlada por ionograma plasmtico e em alguns casos pH, sobretudo na administrao aguda. Os doentes propostos para cirurgia sob teraputica com diurticos e principalmente aqueles com histria de arritmia, devem ter ionograma pr-operatrio 6.

    recomendado que os distrbios eletrolticos sejam corrigidos antes da cirurgia (Classe I, nvel B) 6.

    VasodilatadoresO aparecimento e disponibilidade de analgsicos

    simultaneamente hipotensores, como o remifentanil e de bloqueadores adrenrgicos beta cmodos na administrao endovenosa aguda e em perfuso, como o labetalol e o esmolol, retiraram aos vasodilatadores, interesse per-operatrio na obteno de hipotenso controlada. Alm disso, os seus efeitos laterais reflexos condicionam aumento da atividade simptica e da renina plasmtica e reteno de sdio. O risco de toxicidade do nitroprussiato afastou-o dos protocolos anestsicos e intensivistas.

    O mecanismo de ao dos vasodilatadores exgenos, baseia-se na produo direta de xido ntrico. Este atua como fator relaxante do endotlio, ativa a cclase do guanilato e leva desforilao da miosina com consequente relaxamento do msculo liso vascular.

    A hidralazina, que tem ao vasodilatadora arteriolar, classicamente usada em obstetrcia, est contra-indicada em doentes com coronariopatia, por condicionar aumento reflexo do dbito cardaco e do consumo de O2.

    A adenosina para alm de provocar vasodilatao arteriolar, atrasa a conduo atravs do n auriculo-ventricular e baixa a frequncia cardaca, sendo til no tratamento da taquicardia supra-ventricular. Faz parte do algoritmo das arritmias peri-paragem (6+12+12 mg).

    Embora seja um potente vasodilatador arteriolar, a nitroglicerina tem efeitos mais marcados nos vasos de capacitncia, condicionando diminuio acentuada no retorno venoso e nas presses auricular direita e capilar pulmonar. Os volumes ventriculares sistlicos e diastlicos so reduzidos bem como a tenso da parede do miocrdio, com consequente reduo do consumo de O2. A remoo pr-sistmica pela elevada extrao heptica a que est sujeita, quando administrada por via oral, pode ser contornada pela administrao sublingual. Atravs desta, o alvio da dor anginosa d-se em 1 a 2 minutos e a sua t1/2 de cerca de 2,8 minutos. A perfuso de nitroglicerina tem sido utilizada na cirurgia de revascularizao coronria. A velocidade de perfuso varia entre 0.5 a 1.5 g.Kg.min-1.

    A nitroglicerina tem sido reconhecida por reverter a isquemia miocrdica. Um pequeno estudo controlado, em doentes com angina estvel sob nitroglicerina i.v., durante cirurgia no cardaca, demonstrou diminuio da isquemia miocrdica peri-operatria, sem efeito na incidncia de enfarte de miocrdio e morte cardaca 7.

    Recomendaes peri-operatrias

    A ESC defende que pode ser considerado o uso perioperatrio de nitroglicerina para a preveno de eventos isqumicos adversos (Classe IIb, nvel b). Adverte que no perioperatrio o seu uso pode acarretar risco hemodinmico significativo. A

    Farmacologia clnica cardiovascular em anestesiologia

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 201212

    disso dada a farmacocintica do frmaco, no faz sentido suspend-lo no perioperatrio em doentes com arritmias potencialmente fatais. A t1/2 de eliminao da amiodarona de cerca de 2 meses. Acresce a cada vez mais frequente indicao per e ps-operatria de amiodarona, como acontece na preveno da fibrilhao auricular em pacientes sujeitos a cirurgia de revascularizao coronria.

    Pode haver importantes interaes medicamentosas decorrentes do uso de amiodarona. Aumenta os nveis plasmticos de fentanil, digoxina, quinidina, proacanamida, fenitona e teofilina 4. Tambm potencia os efeitos da varfarina, dos bloqueadores dos receptores adrenrgicos beta e dos bloqueadores dos canais de clcio. Est implicada no desenvolvimento de alveolite pulmonar, pneumonia intersticial, insuficincia heptica e disfuno tiroideia 5.

    Na sequncia da reviso da farmacologia clnica cardiovascular publicada em duas partes, podemos concluir as recomendaes para continuao ou suspenso de frmacos no perioperatrio

    Recomendaes atuais para continuao/suspenso de frmacos no perioperatrio

    Os seguintes frmacos devem manter-se no perodo per-operatrio:- Beta bloqueadores- Estatinas- Bloqueadores dos canais de clcio- Agonistas adregnicos alfa 2- Amiodarona

    Os seguintes frmacos devem ser descontinuados na manh da cirurgia e reinstitudos logo que possvel:

    - Inibidores da enzima de converso da angiotensina- Bloqueadores dos receptores da angiotensina II- Diurticos

    Agradecimentos

    A autora agradece ao Professor Doutor Jorge Tavares o estmulo para a escrita deste trabalho, bem como a sua aprovao e reviso.

    sua administrao endovenosa contnua no deve dispensar monitorizao direta da presso arterial.

    Agonistas dos recetores adrenrgicos alfa 2Os agonistas dos adrenorreceptores alfa 2 diminuem a sada

    ps-ganglionar de noradrenalina, podendo controlar a libertao de catecolaminas no per-operatrio.

    O Perioperative Cardiac Risk Reduction Protocol (PCRRT) 8, implementado no San Francisco Veterans Affairs Medical Center usa a clonidina em vez de bloqueador adrenrgico beta, quando este est contra-indicado em doentes de cirurgia vascular, desde a dcada de 90 do sculo passado. A dose administrada no protocolo de 0.2 mg de clonidina p.o. na noite anterior cirurgia, seguida de patch transdrmico de clonidina de 0.2 mg/24 horas, para manter presso arterial sistlica

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 2012 13

    O potencial analgsico dos canabinides Clia duarte, assistente Hospitalar, anestesioloGista do Centro Hospitalar de lisboa Central, epe

    ResumoA canbis tem sido utilizada como droga de abuso. As suas consequncias so parcialmente compreendidas (ex. dependncia, esquizofrenia, patologias da vias areas e infertilidade masculina). Na dcada de 90, foi iniciada a investigao sobre o seu potencial teraputico. O sistema endocanabinide foi descoberto e foram identificados recetores especficos: CB1, CB2,TRP e recetores atpicos. A investigao em animais e em humanos, mostra que os canabinides sintticos podero ser muito teis na teraputica da dor aguda e da dor crnica.

    Palavras-chave: - canbis- sistema endocanabinide- canabinides sintticos- analgesia

    The analgesic potential of cannabinoids

    Clia duarte, assistente Hospitalar, anestesioloGista do Centro Hospitalar de lisboa Central, epe

    AbstractCannabis as been used as an addict drug. Its consequences are not completely known (ex. dependence, schizophrenia, airway diseases and male infertility). The investigation around its therapeutic potential as began in the 90s. The endocannabinoid system and specific receptors were discovered: CB1, CB2, TRP and atypical receptors. Animal and human investigation shows that synthetic cannabinoids may prove to become very useful in acute and chronic pain treatment.

    Keywords: - cannabis- endocannabinoid- cannabinoids- analgesia.

    Artigo de Reviso

    IntroduoA canbis tem tido significado medicinal e social durante

    milnios. obtida da Cannabis sativa, nome que resulta da juno de palavras do snscrito, hebreu e latim e que significa cana perfumada cultivada. A marijuana corresponde s flores e folhas de canbis secas, que so fumadas, enquanto haxixe refere-se aos blocos de resina de canbis que podem ser mastigados. 1

    O principal canabinide psicotrpico 9 tetra-hidrocanabinol foi isolado pela primeira vez em 1964. No final dos anos 90, vrios testemunhos sobre o alvio sintomtico que provocava em vrias patologias, chamaram a ateno para o seu valor teraputico. Em 1998, a Royal Pharmaceutical Society enviou provas da eficcia clinica da canbis para a House of the Lords, o que encorajou a investigao do uso dos canabinides na esclerose mltipla e noutras situaes clnicas, incluindo a dor crnica1.

    Efeitos na sade, em psiquiatria e dependncia

    A cannabis a droga de abuso mais consumida no mundo, com uma estimativa global de 166 milhes de utilizadores. Cerca de 9-15 % dos consumidores ficam dependentes de canbis2.

    Os endocanabinides parecem facilitar a auto-administrao de vrias drogas de abuso. O bloqueio dos receptores CB1 diminui os consumos de herona e outras drogas. Em alguns casos, a auto-administrao destas mesmas drogas altera os nveis de endocanabinides regionais cerebrais. O aumento do canabinide cerebral induzido por drogas de abuso parece modelar seletivamente a motivao para o consumo de drogas, e assim as consequncias neurotxicas a longo prazo

    destes qumicos. Pope et al. realizaram vrias experincias para caracterizar os mecanismos neuroqumicos subjacentes modulao endocanabinide provocada pelas drogas de abuso 3. Os efeitos da maioria das drogas de abuso so mediadas, em parte, pelo aumento dos nveis de dopamina no ncleo acumbens, e os autores descobriram que o antagonismo do recetor CB1 atenua o aumento dos nveis de dopamina neste ncleo, induzidos pelo etanol ou pela nicotina. Os recetores CB1 parecem influenciar o efeito das drogas de abuso derivadas do pio pela reduo da modelao exercida pela droga na libertao de GABA pelo globo plido ventral.

    A relao entre os canabinides e a psicose conhecida h quase mil anos. Em 1235, Ib Beitar relacionou o consumo de cannabis com a insanidade, e em 1845 Moreau de Tours escreveu que a canbis podia precipitar reaes psicticas agudas, geralmente com a durao de algumas horas, mas ocasionalmente at uma semana 4.

    Linhas de evidncia sugerem que os canabinides podem produzir todos os sintomas caractersticos da esquizofrenia, positivos (desconfiana, paranoia, mania, desorganizao conceptual, fragmentao do pensamento e alteraes da perceo), negativas (falta de reatividade emocional, prejuzo da capacidade de relacionamento, falta de espontaneidade, atraso psicomotor) e cognitivos (dfices na aprendizagem, memria, execuo de tarefas, capacidade de abstrao, tomada de decises e ateno) 4.

    Segundo Sewell RA et al., nos ensaios clnicos randomizados que compararam os efeitos anti-emticos dos canabinides sintticos com placebo e com outros anti-emticos, verificaram-se alucinaes em 6 % e parania em 5 % no grupo dos canabinides4. Estes efeitos foram dose dependentes e tambm aumentavam com a repetio das administraes.

    Diversos estudos indicam que a canbis, provavelmente, tem

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    O potencial analgsico dos canabinides

    papel causal na etiologia e recada da esquizofrenia 5. Moore et al. detetaram um aumento de 40 % no risco de psicose em indivduos que sempre tinham utilizado canbis, sendo maior quanto maior a dose de exposio 6. Metanlises sugerem que a canbis poder ser responsvel por 8 a 14 % dos casos de esquizofrenia ainda que o aumento do consumo em 5 vezes durante uma perodo de 5 anos, no tenha sido equiparado a aumento da prevalncia da esquizofrenia (40 a 70 %) 4.

    Estudos animais sugerem que a exposio crnica aos canabinides est associada neurotoxicidade no hipocampo 4. Yucel et al. relataram que consumidores crnicos de canbis apresentaram redues nos volumes do hipocampo e da amgdala. Alm disso, o volume do hipocampo esquerdo esteve inversamente associado a sintomas psicticos positivos sublimiares 7. Arendt relatou que indivduos que desenvolveram psicose aguda aps a exposio canbis tinham uma probabilidade dez vezes mais alta de terem uma histria familiar de esquizofrenia do que os pacientes que tinham nunca tinham usado de canbis 8. A relao entre a exposio canbis e esquizofrenia preenche alguns, mas no todos os critrios de causalidade. A maior parte dos consumidores no desenvolve esquizofrenia e muitas pessoas diagnosticadas com esquizofrenia nunca utilizaram canbis. Provavelmente existe uma interao com outros fatores para a gnese da doena 4.

    Di Forti et al. verificaram que o risco de desenvolver psicose maior naqueles que tm um consumo dirio de cannabis e naqueles que fumaram esta droga de abuso durante mais de 5 anos 9.

    Existe evidncia pequena, mas crescente relativamente a efeitos na memria, processamento da informao e funes de execuo subtis, mas permanentes, em recm-nascidos de mulheres que consumiram cannabis durante a gravidez 5.

    Nos fumadores de canbis foram encontradas alteraes inflamatrias crnicas e pr-cancergenas nas vias areas 5. Lee et al. referem que existem estudos consistentes de que a canbis fumada est associada com inflamao das grandes vias areas, sintomas de bronquite, aumento da resistncia das vias areas e hiperinsuflao pulmonar. No est provado que exista uma relao direta com o desenvolvimento de DPOC mas existem vrios casos clnicos referindo bolhas de enfisema nos fumadores de canbis. Segundo estes autores no existe a certeza relativamente propenso para neoplasia das vias areas 10.

    Os recetores endocanabinides encontram-se em vrias clulas incluindo neurnios, clulas imunitrias, clulas do endotlio e msculo vascular, assim como nos testculos e na cabea e poro mdia dos espermatozides. Estudos em humanos concluram que o tetra-hidrocanabinol afecta a fisiologia da reproduo masculina. Observaram-se ruturas no eixo hipotlamo-hipfise-testculo, com diminuio dos nveis de hormona luteinizante nos consumidores de marijuana. Os nveis de testosterona tambm so mais baixos nesta populao. Verificou-se que um tero dos consumidores de marijuana tem oligospermia 11.

    Fisiologia dos endocanabinidesO sistema endocanabinide foi descoberto apenas no

    fim dos anos 80, incio dos anos 90, enquanto os sistemas de neurotransmissores major, colinrgico, adrenrgico e dopaminrgico, foram descobertos na dcada de 30. A funo bsica do sistema canabinide pode ser protectora. No sistema nervoso central, a transmisso de sinal dos endocanabinides mediada sobretudo pelo receptor CB1, um transportador transmembranar de endocanabinides, e enzimas hidrolticas

    envolvidas tanto na sntese (lpase diacilglicerol, DAGL, a fosfolipase D especfica N-acylphosphatidyl-ethanolamina), e inactivao (hidrolase amida dos cidos gordos e lipase monoacilglicerol) dos endocanabinides. Os endocanabinides so sintetizados medida que so necessrios a partir do cido araquidnico dos fosfolpidos da membrana. A despolarizao neuronal ps-sinptica leva libertao de endocanabinides, estes difundem-se ao longo da sinapse e activam os receptores CB1 na terminao pr-sinptica. A sntese de endocanabinides tambm pode ser estimulada pela activao dos receptores de glutamato metabotrpicos acoplados protena G e receptores muscarnicos M1 e M3. Os endocanabinides participam numa variedade de processos incluindo a termorregulao, apetite, funo imunitria, percepo (audio, viso e paladar), cognio (potenciao a longo prazo e memria a curto prazo) e funo motora (locomoo, propriocepo e tnus muscular) 3. Outros autores referem tambm a modulao da dor, regulao do apetite, alteraes do humor e funes patolgicas: resposta inflamatria, doena oncolgica, comportamento aditivo e epilepsia12,13.

    Os endocanabinides partilham a mesma estrutura que o 9 tetra-hidrocanabinol (THC), o principal componente psico-activo da canbis 12.

    A anandamida (AEA) e o 2- araquidonoilglicerol (2-AG) so os dois endocanabinides cuja aco no sistema modulador da dor est melhor caracterizada, sendo derivados do cido araquidnico. Inibem o processamento do estimulo nociceptivo atravs da ativao de receptores acoplados protena G, os receptores metabotrpicos CB1 e CB2, descobertos em 1990 e 1993, respectivamente 1,12. A activao do receptor CB1 tambm inibe os canais de clcio tipo N, L e P/Q e activa os canais de potssio e as MAP (mitogen activated protein) cinases 14.

    Os receptores canabinides e os seus ligandos endgenos esto presentes a nvel supra-espinhal, espinhal e perifrico 12. Os receptores CB1 encontram-se sobretudo no SNC mas tambm em tecidos perifricos como: glndula suprarrenal, tecido adiposo, corao, fgado, pulmo, prstata, tero, ovrio, testculo, medula ssea, amgdalas e terminaes nervosas pr-sinpticas. No crebro encontram-se no crtex cerebral, hipocampo, corpo caloso, amgdala, gnglios da base (substncia nigra pars reticularis e segmentos interno e externo do globo plido) e cerebelo 12, 14. A activao destes receptores CB1 inibe a libertao de neurotransmissores pela depresso da excitabilidade neuronal, diminuio da condutncia do clcio e aumento da condutncia do potssio para dentro das clulas pr-sinpticas 1,12.

    Os receptores CB2 localizam-se sobretudo nos orgos responsveis pela produo e regulao das clulas do sistema imunitrio: bao, amgdalas, timo e medula ssea 12, 14. Estudos recentes sugerem que tambm se encontram no crebro, gnglios das razes dorsais, na medula espinhal lombar, nos neurnios sensitivos, nas clulas da micrglia e na pele 12.

    Os endocanabinides so libertados pelos neurnios ps-sinpticos despolarizados e dirigem-se para os terminais pr-sinpticos onde activam os receptores CB1, atravs dum mecanismo de sinalizao retrgrada. O efeito geral uma diminuio na libertao de neurotransmissores excitatrios como o glutamato. Os nveis de endocanabinides aumentam aps leso nervosa, em regies especficas do crebro, como a PAG (substncia cinzenta peri-aquedutal) e RVM (medula ventromediana rostral), estruturas implicadas na modulao descendente da dor 12.

    As enzimas intracelulares que hidrolizam/degradam os canabinides so: hidrolase amida dos cidos gordos (FAAH) e

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    O potencial analgsico dos canabinides

    lipase monoacilglicerol (MGL). FAAH hidroliza AEA e compostos relacionados, enquanto MGL metaboliza 2-AG 12,13. A MGL tem localizao pr-sinptica e a FAAH ps-sinptica 12. Os endocanabinides tambm sofrem metabolismo oxidativo pela ciclo-oxigenase, lipoxigenase e enzimas do sistema P450 12,14.

    A administrao sistmica de inibidores do uptake de endocanabinides (UDM-11, OMDM-2, UCM-707 e LY2318912) aumentam os nveis cerebrais de AEA e 2-AG. A inibio de FAAH por N-araquidonoil-serotonina (AA-5-HT) tambm provoca o mesmo aumento. Estes estudos sugerem que os inibidores do uptake e desactivao de endocanabinides tm potencial teraputico para aumentar o nvel de endocanabinides 12.

    Estudos mais recentes conduziram descoberta de uma famlia de cinco receptores canabinides ionotrpicos os canais de potencial receptor transitrio (TRP) e que incluem TRPV1, TRPV2, TRPV4, TRPM8 e TRPA1 15. Os canabinides geram entrada lenta de clcio para as clulas, atravs da estimulao dos receptores TRPV1 e TRPA1. Tambm existe evidncia crescente da aco dos canabinides sobre os receptores de activao da proliferao dos peroxissomas (PPAR) 13,14.

    Achados recentes sugerem que alguns canabinides ligam-se a recetores atpicos. Schuelert et al. investigaram se o agonista sinttico GPR55 O-1602 podia alterar a nocicepo articular num modelo animal (rato) de inflamao articular aguda. Foi induzida dor aguda articular pela administrao intra-articular de kaolin 2 % e carrageenan 2 %. Foram realizados registos dos aferentes articulares com artrite em resposta a rotao do joelho. A administrao perifrica de O-1602 reduziu significativamente os disparos das fibras C desencadeadas pelo movimento e este efeito foi bloqueado pelo antagonista o-1918 do recetor GPR55. A administrao simultnea de antagonistas CB1 e CB2 no teve efeito nas respostas O-1602. Este estudo mostra que existem recetores canabinides envolvidos na nocicepo articular e estes novos alvos podem ser vantajosos para o tratamento da dor inflamatria 16.

    Mecanismos envolvidos na analgesia mediada pelos canabinides

    Os canabinides so substncias muito lipoflicas, que atravessam facilmente a barreira hemato-enceflica, o que explica os principais efeitos adversos: disforia, perturbaes da memria, diminuio da capacidade de concentrao, desorientao e descoordenao motora 1. A densidade dos receptores CB1 diminuta nos centros do tronco cerebral responsveis pelo controlo da frequncia cardaca e da respirao, o que explica a baixa toxicidade e a ausncia de mortalidade aps intoxicao por marijuana 17.

    Os canabinides administrados por via endovenosa suprimem a actividade dos neurnios nociceptivos no corno dorsal da medula e no ncleo latero ventral posterior talmico 1,12. Observa-se um fenmeno de upregulation espinhal dos receptores CB1 aps leso nervosa medular, o que pode enfatizar o efeito teraputico dos canabinides na dor neuroptica. Os efeitos anti-nociceptivos dos canabinides administrados por via intraventricular esto diminudos aps ablao cirrgica ou farmacolgica da medula espinhal. A destruio selectiva das projeces descendentes noradrenrgicas da medula espinhal reduz a eficcia analgsica dos canabinides sistmicos, o que sugere tambm o envolvimento dos sistemas supra-espinhais descendentes noradrenrgicos na analgesia mediada pelos canabinides 1.

    Ao longo do tempo, foram desenvolvidos vrios modelos experimentais de leso nervosa, que permitiram estudar a

    aco dos canabinides. O antagonista especfico de CB1 (rimonabanto) SR141716, administrado de forma crnica, suprime a hiperalgesia mecnica e trmica. O agonista misto dos receptores CB1/CB2 (WIN55212-2) inibe a actividade espontnea dos neurnios wide dynamic range (WDR), atravs de um mecanismo dependente de CB1, contribuindo esses neurnios para a hipersensibilidade e sensibilizao neuronal na dor neuroptica. O WIN55212-2 tambm normaliza os nveis de prostaglandina E e a atividade do xido ntrico, dois mediadores da dor neuroptica que esto aumentados aps leso isqumica crnica. No se verificou tolerncia com a administrao repetida de um agonista especfico dos receptores CB2, o que indicia um potencial teraputico na dor neuroptica com a vantagem de no desenvolver tolerncia 17.

    Atravs do modelo Seltzer (compresso parcial do nervo citico) foram identificados trs mecanismos de modulao: o inibidor de transporte AM404, administrado sistemicamente suprime a alodinia mecnica de modo dependente de CB1, sem efeitos motores; o inibidor FAAH URB597, administrado localmente na pata da cobaia, mas no sistemicamente, suprimiu a hiperalgesia trmica e a alodinia mecnica por um mecanismo CB1; o inibidor MGL URB602, administrado localmente, aboliu a dor neuroptica por ativao dos recetores CB1 e CB217. Os canabinides aboliram a dor neuroptica num modelo animal de nevralgia ps-herptica. Vrios estudos revelam eficcia dos agonistas mistos CB1/CB2 mas a dose teraputica coincide com a dose que provoca efeitos secundrios. O cido ajulmico (CT-3), um anlogo canabinide restrito periferia tem dose anti-hiperalgsica menor que a dose que desencadeia efeitos adversos 17.

    Em geral, a estimulao dos receptores canabinides tipo 1 e tipo 2 acoplados proteina G resulta na inibio das vias de transmisso de sinal nociceptivas. Os agonistas dos receptores CB1 e CB2 derivados de plantas e sintticos produzem efeitos analgsicos bem descritos, mas os canabinides endgenos tambm ganharam protagonismo pela sua capacidade de modular as vias da dor. Os dois endocanabinides principais, anandamida (AEA) e 2-araquidonoilglicerol (2-AG), inibem a nocicepo aps administrao exgena. Os inibidores do reuptake endocanabinide ou da sua degradao tambm produzem efeitos analgsicos. Alkaitis et al. 18 colocaram a hiptese de que a transmisso de sinal endocanabinide necessria para prevenir a perpetuao da dor aguda no ps-operatrio. Para testar esta hiptese, usaram um modelo de dor no ps-operatrio em ratos que consistiu numa pequena inciso na superfcie plantar duma pata. Depois disto, os animais demonstravam alodinia mecnica significativa e, em associao, um aumento na expresso de marcadores gliais, com resoluo espontnea de ambos ao longo de aproximadamente uma semana. Com base nos seus achados prvios de que a administrao intratecal de um agonista do recetor CB2 reverte tanto a hipersensibilidade comportamental e a sobre-expresso associada de marcadores gliais resultants da inciso na pata, colocaram ainda a hiptese de que os endocanabinides contribuem para a resoluo da dor no ps-operatrio ao limitar as respostas pro-inflamatrias nas clulas gliais da medula espinhal. Os resultados obtidos sugerem que nveis baixos de AEA na medula espinhal podem contribuir para alodinia na pata induzida pela inciso, e que a normalizao das concentraes de AEA espinhais, conjuntamente com elevao de 2-AG, pode contribuir resoluo espontnea da hipersensibilidade. Esta concluso apoiada pelo achado de que a administrao crnica dos agonistas inversos/antagonistas dos recetores CB1 e CB2 resulta em alodinia mecnica persistente. A abordagem feita no consegue excluir o envolvimento de outros sistemas, mas os achados sugerem fortemente que a transmisso de sinal atravs dos recetores

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    canabinides necessria para a resoluo espontnea da dor no ps-operatrio. O aumento da expresso de marcadores gliais e a fosforilao glial p38 evidente nos modelos de roedores para dor aguda no ps-operatrio e dor neuroptica. No primeiro caso, os aumentos na expresso de marcadores gliais e fosforilao p38 retorna espontaneamente aos valores basais em associao com a resoluo da alodinia aguda. Pelo contrrio, a persistncia inadequada do aumento da expresso dos marcadores gliais e fosforilao p38 est associada com a ocorrncia e manuteno de dor crnica. Neste estudo, a alodinia persistente no ps-operatrio induzida pelo bloqueio duplo dos recetores CB1/CB2 esteve acoplada com a expresso excessiva persistente de GFAP e fosfo-p38 dos astrocitos, sugerindo que:

    1) Alteraes nos astrocitos persistentes podem tambm contribuir para estados de dor crnica persistente no ps-operatrio,

    2) Sob condies normais, a transmisso de sinal endocanabinide pode levar resoluo da dor no ps-operatrio por limitar, direta ou indiretamente a transmisso de sinal pr-inflamatria nos astrocitos.

    Os autores identificaram a transmisso de sinal endocanabinide mediada pelos receptores CB1 and CB2 como um novo mecanismo subjacente resoluo espontnea da dor aguda no ps-operatrio. Os seus dados sugerem ainda que a transmisso de sinal endocanabinide pode contribuir para a resoluo da dor no ps-operatrio ao limitar a fosforilao p38, e assim inibindo a transmisso de sinal pr-inflamatria nos astrocitos da medula espinhal. Os achados tambm sugerem que a desregulao da transmisso de sinal endocanabinide pode contribuir para a evoluo da dor aguda para crnica 18.

    Robles et al. caracterizaram o efeito de agonistas canabinides selectivos e no selectivos atravs de administrao sistmica e local, em dois modelos musculares de dor, masster e gmeos, induzida pela administrao de cloreto de sdio hipertnico 19. Os frmacos utilizados foram o agonista no seletivo WIN 55,212-2 e dois agonistas seletivos, ACEA (CB1) e JWH 015 (CB2); foram tambm usados dois antagonistas selectivos [AM 251 - CB (1) e AM 630 - CB (2)]. No modelo de dor do masster, tanto a administrao sistmica (intraperitoneal) como a administrao local (intramuscular) dos agonistas CB1 e CB2 reduziram o comportamento doloroso induzido pelo soro hipertnico, enquanto no modelo dos gmeos a administrao local foi mais eficaz que a sistmica. Estes resultados mostram que a administrao local de canabinides pode constituir uma estratgia farmacolgica til no tratamento da dor muscular, evitando os efeitos adversos induzidos pela administrao sistmica.

    Clapper et al. estudaram o composto URB937, um inibidor potente de FAAH (hidrolase amida dos cidos gordos) que no entra no SNC e interrompe a desativao da anandamida apenas nos tecidos perifricos 20. Nos modelos de dor aguda e de dor crnica com roedores, este composto causa efeitos analgsicos pelo bloqueio dos recetores CB1. Estes achados sugerem que a inibio da actividade de FAAH perifrico potencia o mecanismo analgsico endgeno, mediado pela anandamida, que regula a transmisso da dor para a medula espinhal e para o crebro. Os receptores canabinides perifricos exercem um controlo inibitrio potente sobre o incio da dor, mas a transmisso de sinal endocanabinide que desencadeia este mecanismo analgsico intrnseco desconhecido. Para responder a esta questo, estes investigadores desenvolveram um inibidor restrito periferia para a FAAH, a enzima responsvel pela degradao do endocanabinide anandamida. O composto, chamado URB937, suprime a atividade FAAH e aumenta os

    nveis de anandamida fora do SNC. Apesar de ser incapaz de chegar ao crebro e medula espinhal, URB937 atenua as respostas comportamentais indicadoras de dor persistente nos modelos de roedores de leso nervosa perifrica e inflamao e impede a ativao neuronal evocada pelo estmulo nas regies da medula espinhal responsveis pelo processamento nociceptivo. O bloqueio dos recetores canabinides CB1 impede estes efeitos. Os resultados sugerem que a transmisso de sinal mediada pela anandamida nos recetores perifricos CB1 controla o acesso dos inputs relacionados com a dor no SNC. Os inibidores FAAH que no atravessam a barreira hemato-enceflica, que potenciam este mecanismo gatilho, podem constituir uma nova arma analgsica. Os autores testaram tambm se URB937 podia influenciar a dor persistente causada por leso nervosa ou inflamao. Para isso provocaram leso nervosa perifrica no rato por compresso do nervo citico esquerdo. Uma nica dose administrada uma semana depois da cirurgia, atenuou a hiperalgesia trmica e impediu a hiperalgesia e alodinia mecnicas no lado operado. Esta resposta no se fez acompanhar de alterao na resposta aos estmulos cutneos aplicados no lado no operado, indicando que URB937 normalizou os limiares mecnico e trmico, alterados pela leso nervosa, em vez de exercer uma ao analgsica generalizada 20.

    Arvidsson et al. verificaram que os canabinides, atuando atravs de um mecanismo dependente de CB1, tm efeitos analgsicos num modelo com roedores de dor visceral induzida mecanicamente 21. Observaes derivadas do uso de SR141716 indicam que os canabinides endgenos podem ter um papel ativo inibindo a atividade das vias da dor. Estas observaes sugerem que os agonistas CB1 ativos perifericamente tm um interesse potencial para o tratamento da dor visceral, como na sndrome do clon irritvel, evitando manifestaes indesejveis relacionadas com o uso de canabinides de ao central.

    O potencial analgsico atual dos agonistas canabinides, em humanos, est limitado pela psico-actividade indesejada mediada pelos receptores CB1. Foram ento desenvolvidos vrios agonistas dos receptores CB2 (HU308, AM 1241 e JWH- 133) com propriedades anti-inflamatrias e anti-hiperalgsicas a nvel perifrico e com reduzidos efeitos secundrios psico-activos 1. A expresso de CB2, em nveis elevados, geralmente no acontece nos tecidos saudveis mas est aumentada no tecido nervosa lesado ou doente, em humanos 22. No que diz respeito dor, o mecanismo especfico de aco pelo qual CB2 modela a nociceo no bem compreendido. Quer a ligao ao receptor CB2 afete os nociceptores perifricos ou os sistemas supra-espinhais, a evidncia atual aponta para um papel na modulao inflamatria que, indiretamente, afeta a nocicepo. O estudo de Razdan et al. apoia a ideia de que o recetor CB2 um alvo vivel para o desenvolvimento de agonistas altamente seletivos com ao anti-inflamatria, que no tm efeitos comportamentais indesejveis 22. Os dados deste estudo indicam que o novo anlogo do tetrahidrocanabinol-etil sulfonamida, O-3223, tem ao anti-inflamatria significativa e efeito analgsico in vivo, mas no causa qualquer dos efeitos comportamentais especficos do recetor CB1 observado com o agonista canabinide global, CP55,940.

    Xu et al. caracterizaram o desempenho farmacolgico de um novo agonista CB2, N-[(3Z)-1-(1-hexil)-2-oxo-1,2-dihidro-3H-indol-3-ilideno]benzohidrazida (MDA19) 23. Os efeitos do MDA19 na reverso da dor neuroptica foram avaliados em vrios modelos com ratos e em ratos CB2(+/+) e CB2(-/-). Os autores descobriram que MDA19 tinha um comportamento funcional in vitro nos receptores CB2 do rato e comportava-se como um agonista CB1/CB2 in vivo. Nos humanos MDA19 demonstrou uma afinidade quatro vezes maior para CB2 do que para CB1. O MDA19 tem potencial para aliviar a dor neuroptica sem produzir efeitos adversos no sistema nervoso central.

    O potencial analgsico dos canabinides

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    Estudos em humanos

    No que diz respeito ao controlo da dor aguda, foi realizado um ensaio clnico com cinquenta e seis pacientes com dor intensa no ps-operatrio ou vtimas de trauma, no qual a administrao intramuscular de levonantradol (canabinide sinttico, trinta vezes mais potente que o tetrahidrocanabinol, anti-emtico e analgsico por activao de CB1 e CB2) teve benefcio relativamente ao placebo, mas sem relao dose-resposta 1.

    Na neuropatia sensitiva associada ao vrus da imunodeficincia humana (VIH) ou ao tratamento com zalcitabina, a administrao crnica de WIN55212-2 reverteu a alodinia mecnica. Dois estudos examinaram o efeito da canbis fumada no tratamento da neuropatia sensitiva associada ao VIH e ao tratamento anti-retroviral e tiveram resultados positivos 17. Um questionrio revelou que cerca de 1/3 dos pacientes com VIH usaram canbis para aliviar os seus sintomas, tendo melhoria da dor em 94 % dos casos, reduo das nuseas e da ansiedade e aumento do apetite.

    Num estudo envolvendo 24 pacientes com esclerose mltipla e que apresentavam dor neuroptica, a administrao de 10mg/dia de dronabinol reduziu a dor em cerca de 21 % e o NNT (number needed to treat) foi de 3,5 24. 1 Num ensaio randomizado e duplamente cego com spray sublingual de tetrahidrocanabinol (9-THC) e canabidiol houve melhoria da dor e da qualidade do sono, com resultados estatisticamente significativos 25.

    Actualmente j se utilizam na clinica frmacos que activam os receptores canabinides CB1 e CB2: Cesamet (nabilone), Marinol (dronabinol e 9- THC), Cannador (canabidiol) e Sativex (spray nasal de 9- THC e canabidiol) 26. Os dois primeiros reduzem as nuseas e os vmitos induzidos pela quimioterapia, o Marinol estimula o apetite, enquanto o Sativex utilizado no alvio sintomtico da dor neuroptica em adultos com esclerose mltipla ou com neoplasias em fase avanada 1, 26.

    Farmacocintica

    Os metabolitos dos canabinides podem ser detectados mais de cinco dias aps a sua administrao, sendo 65 % eliminados pelas fezes e 20 % por excreo renal 1.

    A disposio do 1-(8-(2-clorofenil)-9-(4-clorofenil)-9(4-clorofenil)-9H-purina-6il)-4-(etilamino)-piperidina-4-carboxamida (CP-945,598), um antagonista do recetor CB1 ativo por via oral estudado em humanos saudveis, na dose nica de 25mg 27. Depois de 672 horas foram colhidas amostras de sangue, urina e fezes. Menos de 2 % da dose foi recuperada inalterada nas 2 formas de excreo, sugerindo que o CP-945,598 extensamente metabolizado. A principal via metablica envolveu a N- desetilao para formar um metabolito N-desetil (M1), que foi posteriormente metabolizado por hidrlise amida (M2) e N-hidroxilao (M3), hidroxilao do anel piperidina (M6), e conjugao ribose(M9). M3 foi posteriormente metabolizado a metabolitos oxime (M4) e ceto (M5). M1, M4, e M5 foram os metabolitos circulantes principais. Os resultados das experincias in vitro com isoformas recombinantes sugeriu que o metabolismo oxidativo de CP-945,598 para M1 catalizado sobretudo pelo CYP3A4/3A5. Conjuntamente, estes dados sugerem que CP-945,598 bem absorvido e eliminado na sua quase totalidade pelo metabolismo catalizado pelo CYP3A4/3A5.

    Paudel et al. avaliaram e comprovaram o sucesso da administrao intranasal e transdrmica do canabidiol (um canabinide no psico-activo) 28. Para isso foram realizados estudos in vivo com ratos e porquinhos-da-ndia para avaliar a permeabilidade nasal e transdrmica. O canabidiol teve absoro intranasal em 10 minutos com biodisponibilidade de

    34-46 %, que no aumentou com a adio de adjuvantes da absoro. A concentrao plasmtica steady-state de canabidiol nos porquinhos-da-ndia aps aplicao de gel transdrmico foi de 6,32,1ng/ml, obtido s 15,511,7h. A obteno de uma concentrao plasmtica steady-state significativa indica que o canabidiol til para o tratamento da dor crnica atravs desta via de administrao. A concentrao steady-state aumentou 3,7 vezes na presena de um adjuvante.

    Interao farmacolgica dos canabinides com os opiides

    H um sinergismo entre os receptores canabinides e os receptores opiides no sistema antinociceptivo. A co-administrao de 9- THC e de um opiide, ambos em doses subanalgsica, permite obter uma analgesia marcada 26. A co-administrao transdrmica de fentanil, ou buprenorfina, e 9- THC aumenta a capacidade analgsica daqueles opiides. Verificou-se que a administrao intratecal de uma dose subteraputica de WIN55212 potencia, de forma marcada, o efeito analgsico da morfina transdrmica. Outro achado relevante que, uma dose baixa de 9- THC consegue restaurar a eficcia da codena e da morfina, aps desenvolvimento de tolerncia. A associao daquele canabinide a um opiide previne o desenvolvimento de tolerncia. Em cobaias, a co-administrao de WIN55212 e de morfina induz analgesia mais eficaz e duradoura, que a administrao de qualquer um deles isoladamente.

    ConclusesO sistema endocanabinide est envolvido em diversos processos

    fisiolgicos e fisiopatolgicos: termorregulao, apetite, imunidade, perceo, cognio, motricidade, humor, modulao da dor, resposta inflamatria, doena oncolgica, comportamento aditivo e epilepsia.

    A interferncia com o sistema canabinide pode ser conseguida tanto a nvel perifrico, como ao nvel do sistema nervoso central. Esta pode acontecer tanto ao nvel da sua sntese, dos seus recetores e das enzimas que os hidrolisam. Os canabinides sintticos tm a vantagem de no apresentar os efeitos psico-activos mediados pelos recetores CB1.

    As vias de administrao testadas com sucesso foram sistmica, intratecal, intranasal e local (muscular). Estudos de farmacocintica demonstram a aplicabilidade dos canabinides sintticos tanto para o tratamento da dor aguda como da dor crnica. Existe um efeito sinrgico entre canabinides e opiides.

    Em virtude dos resultados obtidos com a investigao desenvolvida at data actual, a futura incluso dos canabinides na prtica clnica, nomeadamente no tratamento da dor parece promissora.

    Curiosidades

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    Agradecimentos Um muito obrigado Dra. Elsa Verdasca (Anestesiologista

    da Unidade de Dor do Hospital Garcia de Orta) pela ajuda na estruturao da primeira verso deste artigo, escrita em 2010.

    O potencial analgsico dos canabinides

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 201218

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    O potencial analgsico dos canabinides

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 2012 19

    Abordagem anestsica das mucopolissacaridosesMargarida Marcelino, interna no internato coMpleMentar de anestesiologia, servio de anestesiologia instituto portugus de oncologia de lisboa, FranCisCo Gentil

    lusa oliM Marote, assistente Hospitalar de anestesiologia servio de anestesiologia Hospital de santa Maria (HsM), centro Hospitalar lisboa norte (cHln)

    Maria doMingas patuleia, assistente Hospitalar graduada de anestesiologia, servio de anestesiologia Hospital de santa Maria (HsM), centro Hospitalar lisboa norte (cHln)

    ResumoAs mucopolissacaridoses (MPS) so um grupo de doenas hereditrias causadas por deficincia de enzimas do metabolismo dos glicosaminoglicanos (GAG), com consequente degradao incompleta dos GAG, que se depositam nos rgos. So doenas crnicas, progressivas e multissistmicas. O envolvimento cardaco e respiratrio progressivo d origem s principais causas de morte. As MPS condicionam uma srie de processos fisiopatolgicos que muitas vezes requerem intervenes cirrgicas. Atualmente, com o aumento da esperana mdia de vida destes doentes, a preocupao com as implicaes anestsicas desta doena estende-se a todos os anestesistas. Apesar de todos os progressos na abordagem anestsico-cirrgica, a mortalidade perioperatria , ainda, elevada. Na avaliao pr-operatria procura-se identificar todas as manifestaes da doena, teraputicas realizadas e antecedentes anestsico-cirrgicos. A avaliao da via area deve incluir exames de imagem com os quais se pretende identificar situaes como a subluxao de C1-C2 e a hipoplasia da apfise odontide.Sempre que possvel deve escolher-se uma tcnica anestsica loco-regional de forma a evitar a abordagem da via area, no entanto isso condicionado pela idade peditrica, pelas co-morbilidades e pela cirurgia. A abordagem da via area pode ser feita com intubao orotraqueal, por laringoscopia ou por fibroscopia, com mscara larngea ou com traqueostomia. O ps-operatrio destes doentes deve ser realizado numa Unidade de Cuidados Intensivos.

    Palavras-chave: - Mucopolissacaridoses- Anestesia geral- perodo peri-operatrio- Manuseamento da via area

    Anesthetic approach of mucopolysaccharidosesMargarida Marcelino, interna no internato coMpleMentar de anestesiologia, servio de anestesiologia instituto portugus de oncologia de lisboa, FranCisCo Gentil,

    lusa oliM Marote, assistente Hospitalar de anestesiologia servio de anestesiologia Hospital de santa Maria (HsM), centro Hospitalar lisboa norte (cHln)

    Maria doMingas patuleia, assistente Hospitalar graduada de anestesiologia, servio de anestesiologia Hospital de santa Maria (HsM), centro Hospitalar lisboa norte (cHln)

    AbstractMucopolysaccharidoses (MPS) are a group of hereditary disorders caused by a deficiency of glycosaminoglycan (GAG) metabolism enzymes, with subsequent incomplete breakdown of GAG, which accumulate in organs. They are chronic and progressive disorders. Cardiac and respiratory involvements are the principal causes of mortality. Patients with MPS are frequently submitted to surgical procedures. Nowadays, these patients increase in life expectancy causes their perioperative management to be a concern for all anaesthetists. Despite breakthroughs in the anaesthetic and surgical approach, perioperative mortality is still high among patients.Preoperative evaluation includes a thorough clinical history and note of prior surgical procedures or anaesthesias. Airway evaluation should include diagnostic imaging to identify odontoid dysplasia or atlantoaxial subluxation.Locoregional techniques should be chosen whenever possible, in order to avoid airway management. However, this may not always be possible due to the patients age, comorbidities and surgical procedure.Airway management may be achieved with orotracheal intubation, either by laryngoscopy or fiberoptic techniques, laryngeal mask or tracheostomy.In these patients postoperative management should take place in an Intensive Care Unit.

    Keywords: - Mucopolysaccharidoses- General anaesthesia- perioperative period- Airway management

    Artigo de Reviso

    Introduo

    As mucopolissacaridoses (MPS) so um grupo heterogneo de doenas hereditrias por deficincia de enzimas do metabolismo dos glicosaminoglicanos (GAG)1-4, com consequente degradao incompleta dos GAG, os quais

    se depositam nos rgos e tecidos. So doenas crnicas, progressivas e multissistmicas, na maioria dos casos de transmisso autossmica recessiva, com exceo da MPS tipo II, de transmisso ligada ao cromossoma X. A incidncia das MPS baixa; 1:30000 nascimentos vivos2,5,6.

    Os GAG so hidratos de carbono complexos, de cadeia longa,

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 201220

    associados a protenas no tecido conjuntivo2,7. Estes distribuem-se por vrios tecidos onde desempenham importantes funes.

    Os rgos e sistemas mais afetados por este grupo de doenas so o sistema msculo-esqueltico, o sistema nervoso central, o corao e o sistema respiratrio8, 9.

    O metabolismo dos GAG feito por etapas, nas quais esto envolvidas diversas enzimas lisossmicas. A deficincia de uma enzima origina uma doena especfica pela acumulao de um determinado substrato nos lisossomas7.

    Manifestaes clnicas

    As MPS so doenas multissistmicas. Na maioria dos casos os doentes tm um fentipo normal nascena e medida que os GAG se depositam nos tecidos originam alteraes histolgicas especficas, que depois daro origem s manifestaes clnicas 8, 10.

    As alteraes mais frequentes so as deformidades esquelticas, articulares e craniofaciais. O envolvimento cardaco e respiratrio progressivo d origem s principais causas de morte, por infees ou insuficincia respiratria, ou por insuficincia cardaca 2.

    Relativamente ao sistema cardiovascular, a deposio de GAG nos folhetos valvulares origina valvulopatias, nomeadamente insuficincia mitra1,3; a deposio no miocrdio pode originar hipertrofia ventricular com alterao da funo; tambm as artrias coronrias so afetadas com estenose do lmen. Todas estas alteraes podem condicionar insuficincia cardaca1.

    O sistema msculo-esqueltico frequentemente afetado com alteraes craniofaciais e alteraes da coluna vertebral, como a cifoescoliose e a hipoplasia da apfise odontide, que condiciona instabilidade atlanto-occipital3. Outras manifestaes msculo-esquelticas descritas incluem baixa estatura e rigidez articular.

    Em relao via area podem-se encontrar: secrees abundantes e espessas, hipertrofia das amgdalas e adenides, fragilidade vascular da mucosa, macroglossia, epiglote longa, laringe anterior, diminuio do calibre da traqueia, rigidez da articulao temporo-mandibular, pescoo curto e instabilidade cervical 1, 3,9 ,10.

    Somando a estas alteraes a doena pulmonar restritiva condicionada pelas alteraes esquelticas, torna-se comum a obstruo da via area alta, a sndrome de apneia obstrutiva do sono e as infees respiratrias de repetio. As complicaes respiratrias constituem a principal causa de morte nestes doentes.

    O envolvimento do sistema nervoso central comum, com manifestaes como o atraso do desenvolvimento, alteraes do comportamento e hidrocefalia com hipertenso intracraniana 1, 3, 9. A deposio de GAG pode originar compresso de nervos perifricos, como a sndrome do tnel crpico.

    Vrios fatores como a hiperlaxido ligamentar, a hipoplasia odontide, a instabilidade atlanto-occipital e a subluxao das vrtebras cervicais C1-C2 contribuem para a compresso da medula cervical3.

    Dentro das manifestaes gastrointestinais encontram-se a hepato-esplenomeglia1 e as hrnias umbilicais e inguinais1 ,9 .

    Como manifestaes oftalmolgicas salientam-se o glaucoma1 e a diminuio da acuidade visual.

    Estes doentes podem ter surdez por defeitos de conduo e habitualmente tm hipertrofia das amgdalas e adenides10.

    Classificao das mucopolissacaridosesAs mucopolissacaridoses so classificadas em 11 tipos,

    caracterizadas por sinais e sintomas prprios, tm diferentes

    idades de apresentao e representam deficincia de diferentes enzimas ou diferentes graus de atividade enzimtica.

    Para facilitar a abordagem, as MPS so agrupadas em 4 categorias, segundo as caractersticas clnicas predominantes7 (Quadro I).

    Quadro I Classificao das Mucopolissacaridoses

    Adaptado de Kakkis E, Wraith E. Clinical features and diagnosis of the mucopolysaccharidoses In: D B, ed. UpToDate. Waltham, MA: UpToDate; 20117.

    Diagnstico e tratamento

    O diagnstico clnico e confirmado pelo doseamento de GAG na urina e pela pesquisa de deficincia enzimtica em leuccitos7.

    O diagnstico pr-natal pode ser realizado para qualquer MPS, por amniocentese e/ou bipsia das vilosidades corinicas7.

    O tratamento baseia-se na teraputica sintomtica, no

    Tipo Nome comum

    Deficincia enzimtica

    Substrato acumulado

    Idade Caracters-ticas

    Doena esqueltica, dos tecidos moles e envolvimento do SNC varivel

    MPS I

    Hurler

    -L-iduronidase

    Sulfato de heparano

    Sulfato de dermatano

    1-2 anos Atraso mentalMicrognatiaAlt. FaciaisCardiomio-

    patia Hepato-meglia

    Hurler-Scheie 1-5 anos

    Sheie 3-15 anos

    MPS II HunterIduronato sul-

    fatase 1-5 anos MPS I

    Ligado ao X

    MPS VII

    Hidrpsia fetalB -

    glucoronidase

    In tero Hidrpsia fetal

    Sly 0-5 anos MPS I

    Moderado 12-15 anos

    Doena esqueltica e dos tecidos moles

    MPS VI

    Maroteaux-Lamy grave

    N-acetil-galactosamina-

    4-sulfatoSulfato de dermatano

    1-5 anosDisplasia

    esquelticaDisfuno

    motoraBaixa estatura

    Defeitos cardacos

    Maroteaux-La-my moderado 3-12

    anos

    Doena do esqueleto, cartilagem e ligamentos

    MPS IVA Morquio tipo AN-acetil-

    galactosaina-6-sulfatase

    Sulfato de queratano

    1-5 anos, se doena grave

    Displasia esquelticaDisfuno

    motora Baixa estatura

    MPS IVBMorquio tipo B

    MPS IX S. Natowicz Hialuronidasecido

    hialurnicoApenas 1 caso

    Envolvimento primrio do SNC, manifestaes esquelticas e tecidos moles menos evidentes

    MPS IIIA Sanfilippo A Sulfamidase

    Sulfato de heparano

    2-6 anos Alteraes do comporta-

    mentoAtraso mental

    MPS IIIB Sanfilippo B -N-acetil-glucosaminidase

    MPS IIIC Sanfilippo C GAC-acetilase

    MPS IIID Sanfilippo D N- acetil-glucosa-mina-6-sulfatase

    Abordagem Anestsica das Mucopolissacaridoses

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 2012 21

    suplemento especfico de enzimas e no transplante de clulas estaminais hematopoiticas. Os ltimos dois so actualmente realizados para a MPS tipo I, II e VI 3,7.

    Abordagem anestsica das mucopolissacaridoses

    As MPS condicionam uma srie de processos fisiopatolgicos que muitas vezes requerem mltiplas intervenes cirrgicas8,9.

    Alm disso, se em tempos estas doenas preocupavam apenas os anestesistas que se dedicavam anestesia peditrica, hoje, com o aumento da esperana mdia de vida pelo desenvolvimento de novas teraputicas, essa preocupao deve estender-se a todos os anestesistas11.

    Apesar de todos os progressos na abordagem anestsico-cirrgica, a morbi-mortalidade peri-operatria destes doentes elevada; um estudo de 1984 relatou uma mortalidade de 20 %12. As principais causas de morte no perodo peri-operatrio so: impossibilidade de manter a via area permevel, mesmo com traqueostomia12, e paragem respiratria no ps-operatrio13.

    Os procedimentos cirrgicos para os quais estes doentes so frequentemente anestesiados esto descritos no Quadro II1. Estes doentes so tambm frequentemente anestesiados para a realizao de exames complementares de diagnstico9.

    Quadro II Principais indicaes cirrgicas nos doentes com Mucopolissacaridoses.

    Especialidade cirrgica Procedimentos

    Cirurgia Geral Correo cirrgica de hrnia umbilical/inguinal

    ORLAmigdalectomia,

    adenoidectomia e colocao de tubos transtimpnicos

    Neurocirurgia Shunts ventrculo-peritoneais

    Cirurgia de descompresso da medula espinhal

    Cirurgia de fuso da coluna cervical

    Ortopedia Correo de escoliose

    Avaliao pr-operatria

    A avaliao pr-operatria deve, como em todos os doentes, basear-se numa histria clnica detalhada e num exame objetivo rigoroso. Procuram identificar-se todas as possveis manifestaes anteriormente descritas, teraputicas realizadas e antecedentes cirrgicos.

    Alm da avaliao da via area habitualmente realizada, devem ser pedidos exames complementares como as radiografias da coluna cervical, nas suas incidncias laterais e em extenso-flexo e uma tomografia computorizada, onde se pretende identificar situaes como a subluxao de C1-C2 e a hipoplasia odontide1. Estes exames permitem tambm avaliar o dimetro da traqueia subgltica, que tem influncia na escolha do tubo orotraqueal. Assim, pretende-se avaliar se existe contraindicao para a manobra de hiperextenso da cabea.

    A avaliao respiratria deve incluir radiografia de trax, gasometria arterial e, se necessrio, provas de funo respiratria, como por exemplo a presena de deformaes da caixa torcica que condicionem alteraes respiratrias restritivas2. Na presena de cifoescoliose ou de infees respiratrias de repetio est indicada a avaliao laboratorial com protena-C-reativa1.

    Salienta-se a importncia do tratamento de infees, da

    cinesioterapia1 e da ventilao no-invasiva no pr-operatrio 3,10.Alm da realizao do eletrocardiograma pode estar

    indicada a realizao de um ecocardiograma na presena de sinais e sintomas cardacos2.

    Relativamente avaliao neurolgica deve-se excluir a existncia de hipertenso intracraniana, uma vez que esta tem influncia na escolha de frmacos para a induo anestsica.

    Na avaliao do sistema esqueltico devem-se procurar alteraes que condicionem doena pulmonar restritiva. Pelas deformaes sseas e articulares, a colocao de acessos venosos ou da linha arterial pode estar dificultada11.

    Medicao pr-anestsica

    Em relao medicao pr-anestsica os frmacos sedativos devem ser evitados, pelo risco de obstruo da via area e depresso respiratria2. Para diminuio das secrees podem ser administrados anticolinrgicos2.

    Tcnica anestsica

    Relativamente escolha da tcnica anestsica existem duas opes: a anestesia geral ou a anestesia loco-regional; sempre que possvel deve escolher-se uma tcnica loco-regional de forma a evitar a abordagem da via area; no entanto isso condicionado pela idade peditrica, pelas co-morbilidades, pela cirurgia e pelo posicionamento3.

    As vrias alteraes anatmicas, j descritas, predispem estes doentes para obstruo das vias areas superiores, apneia do sono e intubao difcil3,14. Se o doente j tiver sido anestesiado importante obter dados relativos abordagem da via area e se a intubao foi difcil.

    Plano anestsico

    O posicionamento deve ter em ateno as limitaes do doente; o posicionamento em decbito dorsal pode ser impossvel pela cifoescoliose1.

    Relativamente induo anestsica existem vrias abordagens, mas em todas elas determinados princpios so aplicados, como a pr-oxigenao, a manuteno da ventilao espontnea e a administrao de relaxantes musculares apenas aps estar assegurada a via area2.

    A ventilao com mscara facial pode revelar-se difcil9, pelo que devem estar disponveis mscaras com diferentes formatos e tamanhos. Os tubos nasofarngeos e os tubos orofarngeos devem estar disponveis mas devem ser evitados: os primeiros porque podem levar a hemorragia dos adenides, e os segundos porque por contacto com uma epiglote longa podem causar laringospasmo. No entanto, na necessidade de utilizar algum adjuvante, a melhor opo a utilizao de tubos nasofarngeos maleveis e lubrificados1.

    A manobra de hiperextenso da cabea deve ser evitada em doentes com displasia do processo odontide, mais comum nas MPS tipo I e IV, pois pode ocorrer subluxao atlanto-axial com possvel compresso do tronco cerebral e da medula. importante a colaborao de um segundo anestesista para a estabilizao da coluna cervical1.

    A intubao nasotraqueal no est recomendada pela hipertrofia dos adenides e das amgdalas, distoro da anatomia e a fragilidade vascular das mucosas12. A cricotirotomia, um procedimento life-saving e teoricamente de fcil realizao, pode nestes doentes revelar-se extremamente

    Abordagem Anestsica das Mucopolissacaridoses

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 201222

    difcil pelas alteraes anatmicas1. Assim, relativamente abordagem da via area existem

    quatro opes: Laringoscopia directa com intubao orotraqueal

    relativamente linear; Laringoscopia auxiliada por videolaringoscpio9; Manter a via area atravs da colocao de uma mscara

    larngea9,15,16; Intubao com fibroscopia. Num doente colaborante, o que

    raro nesta doena, pode ser feita intubao com o doente acordado; ou a intubao feita com o doente em ventilao espontnea6;

    Traqueostomia1 (alternativa de recurso).

    Induo anestsica

    De seguida, apresentam-se as formas de induo mais consensuais da literatura:

    Induo endovenosa na ausncia de hipertenso intracraniana, com quetamina a que se associa a atropina; na

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    presena de hipertenso intracraniana utiliza-se tiopental1,17. Induo inalatria com sevoflurano.

    Manuteno da anestesia

    Em relao manuteno no h condicionantes, uma vez que esta doena no influencia a farmacocintica ou farmacodinmica e no contraindica qualquer tcnica. Deve ser monitorizado o bloqueio neuromuscular.

    Recuperao anestsica e ps-operatrio

    So de esperar complicaes respiratrias no ps-operatrio1,18, pelo que se preconiza adiar a extubao, para que o edema das vias areas diminua.

    Aps a extubao de salientar a importncia da cinesioterapia respiratria e, eventualmente, da ventilao no invasiva11.

    O ps-operatrio destes doentes deve ser realizado numa Unidade de Cuidados Intensivos.

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    Abordagem Anestsica das Mucopolissacaridoses

  • Revista SPA | Vol. 21 - n3 | 2012 23

    A Anestesia Peditrica Fernanda barros. direo da seCo da anestesia peditriCa da spa

    Artigo Histrico

    1. Histria

    Provavelmente um dos maiores e mais espectaculares avanos tecnolgicos e cientficos na prtica mdica dos ltimos anos, verificou-se no diagnstico e tratamento de patologias do recm-nascido e crianas gravemente doentes.

    A Anestesia Peditrica moderna o resultado dos avanos conseguidos tanto na rea da pediatria (neonatologia, cardiologia, cuidados intensivos, etc.), como no campo da anestesiologia, na sua tripla vertente: a anestesia para fins cirrgicos, a reanimao e o tratamento da dor 1.

    No primeiro livro sobre anestesia peditrica (Anaesthesia in Children) que surge em 1923, escrito por um Anestesiologista do Hospital St. Bartholomew em Londres, referido que apesar da inequvoca impresso de que as crianas adormecem com muita facilidade, estas apresentam problemas difceis e requerem a mesma, seno mais habilidade para anestesiar, que os adultos.

    Se a introduo do curare em 1942, foi um avano indiscutvel na anestesia, o agente farmacolgico que revolucionou a anestesia peditrica foi sem dvida o halotano. Foi estudado em Manchester por Jaume Ravents, sendo introduzido na prtica clnica em 1956. A sua boa tolerncia e a ausncia de irritabilidade das vias areas facilitou de forma extraordinria a prtica da induo e manuteno da anestesia por via inalatria, oferecendo ainda um despertar rpido e sem os efeitos desagradveis do ter e clorofrmio. Durante muitos anos foi o anestsico insubstituvel para adormecer as crianas 2.

    No entanto, devido aos avanos da cirurgia Maxilo-facial e necessidade da manter a face livre de uma mscara, Philip Ayre desenhou em 1937, o seu sistema com uma pea em T (posteriormente modificado por Gordon Jackson-Rees) permitindo a ventilao, com intubao endotraqueal.

    Tambm a bibliografia se enriqueceu com a publicao dos livros que se converteram nos clssicos; desde o Pediatric Anesthesia de Digby Leigh & Kathleen Belton em 1949, o Anesthesia for Infants and Children de Robert M. Smith em 1959 at 1 edio do Paediatric Anaesthesia de H.T. Davenport e Harold R. Griffith em 1967, constatamos um progresso evidente, ao qual no alheio o desenvolvimento paralelo da cirurgia peditrica e a utilizao de tcnicas diagnsticas na criana, exactamente iguais s dos adultos. E no entanto,