(artigo) argemiro procópio filho - terrorismo e relações internacionais
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5/28/2018 (Artigo) Argemiro Procpio Filho - Terrorismo e relaes internacionais
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Terrorismo e relaes internacionais
ARGEMIRO PROCPIO*
Introduo
O terrorismo das perseguies, das injustias e das intolerncias jamaisconstituiu problema menor para a sociedade humana. Apesar disto, a quasetotalidade dos Estados, salvo rarssimas excees, sempre pretendeu consider-locomo patologia marginal. Bem recentemente, a luta contra o terrorismo internacional
pontuava-se na busca de altas tecnologias, criao de complexos contra ataquesde msseis, armas nucleares, agentes qumicos, biolgicos etc.
As estratgias dos Estados na cruzada contra o terror, principalmente nospases centrais, desde a queda do muro de Berlim, transformaram-se em apticase desacreditadas indstrias antiterror. Envolvidos por interesses financeiros daindstria de informao e produo de msseis, os servios de inteligncia confiaramdemais na alta sofisticao tecnolgica. Esqueceram-se que alm da aparentevitria dos computadores contra o terror, coisas outras existem por detrs dosbiombos da mundializao; que a terra feita de interesses. Noutras palavras,ignoraram a Histria e suas velhas lies, inclusive a Guerra de Tria.
Todo o aparato defensivo de altssima tecnologia, no qual o contribuinte domundo inteiro tanto dinheiro enterra, acabou burlado por mtodos simples atreladosao sofisticado terrorismo financeiro, engendrados por redes humanas dentro doterritrio do pas considerado inexpugnvel e locomotiva da economia mundial.
O cavalo de Tria do terror, exibido bem no corao dos Estados Unidos,pela dramaticidade de sua simbologia, pelo anonimato de seus autores, pelosensacionalismo da mdia na explorao das imagens da destruio, acabou maior
que o presente de grego. Espalhou o medo e o pnico em escala jamais concebida.Seus amargos frutos esto por ser colhidos em qualquer lugar. Da o esforo analticopara apresentar ao leitor daRevista Brasileira de Poltica Internacionalo presenteesboo do complexo mapeamento terico em busca das tendncias e causasestruturais da violncia do terror na comunidade das naes.
Novo teste da hegemonia poltica
A demonstrao do poderio blico dos Estados Unidos de seus
gigantescos porta-avies, de sua portentosa fora area, de suas divises com
Rev. Bras. Polt . Int. 44 (2): 62-81 [2001]* Professor Titular em Relaes Internacionais da Universidade de Braslia.
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guerreiros fantasiados de invencibilidade to enaltecido aps a II Guerra Mundial,continua penetrando diuturnamente nos lares estadunidenses e nos pases sob suarbita de influncia. Por meio da televiso e da eficientssima engrenagem do
aparato cultural chamadoHollywood, inclusive a derrota no Vietn lembradacomo acidente casual de passado remoto.
Nos pases comunistas, o aparato de poder era exposto maisparcimoniosamente, ou seja, no primeiro de maio e nas suas respectivas datasnacionais. Toda esta fora conhecida, incapaz de enfrentar o terrorismo que atingiuem cheio os smbolos da segurana e da prosperidade do capitalismo norte-americano, ou seja, o Pentgono e as duas torres em Nova Iorque, ter contra si asiras da manipulada opinio pblica estadunidense.
O sacrifcio dos limites impostos pelo estado de direito e pelo estadodemocrtico na luta contra o terror fere o que h de nobre, precioso e sagrado naalma da democracia americana, ou seja, o respeito s liberdades individuais. Opor-se ao terror consoante a filosofia democrtica e a tica crist, respeitar os valoresque se procura salvar e deix-los fora do alcance dos terroristas elogivel. Masreagir com violncia semelhante, ou seja, converter a campanha contra o terrorismoem uma espcie de outra guerra santa, que faz vtimas inocentes com osbombardeios ao Afeganisto, desvenda as ambigidades e a hipocrisia da pax
americana.
O colapso da moralidade
O colapso da moralidade convencional e o colapso dos princpios dasegurana humana em que tambm se assentam os pilares do Estado-nao levama crer que, de todas as deficincias da poltica antiterror dos Estados Unidos nasrelaes internacionais, a mais grave a desconsiderao das desigualdades. Valedizer as desigualdades como causas estruturais, fomentadoras do terrorismo
internacional.A forma pouco sofisticada, nada tcnica politicamente falando, como
comeou a ser implementada a caa aos terroristas, revela que o mundo permanecevtima de cenas repetidas, de aes que nunca deram certo no passado. Por exemplo,em 20 de agosto de 1998, avies dos Estados Unidos invadiram o espao areoafego acreditando eliminar Osama bin Laden, apontado como responsvel pelosatentados contra representaes diplomticas estadunidenses em Dar es-Salam eNairobi, perpetrados treze dias antes.
Est sendo levado a cabo no combate ao terror, sem paralelo na histria dahumanidade, um novo teste da fora da hegemonia poltica nas relaesinternacionais. O terror um fenmeno global e seu combate h de levar emconsiderao amplo espectro de posturas, longe do unilateralismo praticado pela
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maior potncia mundial. Pede trabalho conjunto, solidariedade e acentuadaaproximao respeitosa com outras culturas e sociedades. A luta contra o terrorexige preenchimento do dficit da human intelligencenos servios de informao;
verdadeiros exerccios com humildade para aprender lies com outros povos,inclusive saber falar, entender suas lnguas e outras manifestaes culturais1 .
A revanche armada como resposta transnacionalidade do terror semeiainseguranas. Faz temer pelo futuro das fronteiras nacionais: corta a confiana noethosda responsabilidade compartida e no princpio do respeito mtuo. Tudo istotonifica a quase secular doutrina intervencionista dos Estados Unidos. Em resumo,a violncia da fora militar at hoje quase nada fez para cortar as razes doterrorismo mundial.
Com ou sem o poderio de vigilncia dos Estados Unidos, a porosidade dasfronteiras nacionais sempre foi fato. Tambm no de agora que so tecidas pelohedonismo consumista as frustraes entre os povos com baixo poder aquisitivo.A violncia e o desperdcio ensinados nos filmes, e em outros canais da culturadominante, fortalecem as redes sustentadoras do terror. Infelizmente quase nuncalevam-se em conta as inconsistncias das aes contra o dio tnico, de classe oureligioso.
As debilidades estruturais fomentadas pela corrupo domstica e pela
injustia externa so argumentos a favor da luta de classes. So reforadas comonunca pelas disparidades do sistema internacional, pelos juros da dvida externa einclusive pelo dlar, papel transformado em dinheiro sem lastro ouro, fincado nomundo inteiro. As elites, tanto dos pases pobres quanto dos pases ricos, precisamsomar esforos na luta contra as diferenas entre classes sociais, atenuando apatologia do consumismo capitalista, antes que o terror se espalhe em versesainda mais assassinas que as at agora conhecidas.
A tica antiterror sabe que a paz igualmente fruto da justia. Que onovo nome da paz deveria ser desenvolvimento sustentvel, emprego e comida
para todos. A problemtica vista por este ngulo encara o terrorismo como fenmenopoltico por excelncia e, como tal, precisa ser combatido. Suas assimetrias,igualmente atacadas com remdios polticos amargos, se necessrio.
O terror possui capacidades, vrios flegos. Cogitar em abat-lo com aao nica da guerra um equvoco. As tenses sociais, o dio tnico, adiscriminao racial, a excluso das maiorias das benesses do capitalismo, o fascismo,o anti-semitismo, a xenofobia, o nacionalismo doentio, os fundamentalismos religiososjudeus e islmicos, entre outros, so como sangue nas veias do terror da
contempornea histria humana. Ao se desejar a paz, para que ela permanea efaa parte desta mesma histria, no h como deixar a mobilizao contra o terrorser conduzida por mentores da guerra.
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O TIAR e a generalizao do conflito
Face ousadia dos brbaros gestos do terrorismo internacional, pouco
adianta retirar da cova, como fez a reativa diplomacia brasileira, o TratadoInteramericano de Assistncia Recproca (TIAR). A Organizao dos EstadosAmericanos (OEA), jamais se desfez das cicatrizes do Destino Manifesto. Ocomportamento poltico da Organizao, tradicional aclito do mandonismo dosEstados Unidos, em sesso convocada pela diplomacia presidencial de FernandoHenrique Cardoso, aprovou como esperado, a aplicao do TIAR como troco sinvestidas do terror em Washington e Nova Iorque. Assinado em 1947 na ex-capital brasileira, desmoralizou-se quando do conflito argentino com o Reino Unido.
Na Guerra das Malvinas, em 1982, o TIAR no pde ser invocado porqueo agressor era a Argentina. Entretanto, na luta contra o terror, a lgica do TIAR,se ressuscitada, favorecer a generalizao do conflito. O risco que se corre dev-lo ser invocado na cruzada contra o internacionalizado narcoterrorismo naAmaznia ou na trplice fronteira entre Brasil, Paraguai e Argentina2 . No novocontexto da luta antiterrorista, atentado destruidor como o ocorrido anos atrscontra a Associao Judaica em Buenos Aires, se repetido dentro de qualquerpas signatrio, tambm servir de argumento para a invocao do TIAR.
Como se no bastasse a subalternidade ocorrida com a Base de Alcntara,
a postura do Itamaraty em relao instalao do escritrio do US Secret Servicena capital paulista sem o consentimento do Congresso Nacional espelha debilidadesno servio exterior. Mais uma vez o Brasil sofre nas relaes internacionais ascontradies e deficincias causadas pelos equvocos dos formuladores de suapoltica externa.
A recomposio do esqueleto do TIAR e seu anacrnico renascimentoproposto como agrado aos Estados Unidos da Amrica pela diplomacia brasileiraterminaram sendo vistos, externamente, como barganha comprometida pela maioria
dos latino-americanos dentro da Doutrina Monroe, agora revigorada pelamultilateralizao. Internamente, como nova demonstrao do velho alinhamentoincondicional. Tantos gestos de dependncia ameaam a tradio pacifista brasileirade ir para os ares. A luta antidrogas para ingls ver do governo tampouco consegueestancar o crescente nmero de vtimas do narcoterrorismo. Assim as coisascaminham: democracia e segurana, apesar de anos como temas fundamentais daagenda da poltica externa desgraadamente no representaram progresso a favordo fortalecimento do estado de direito em canto algum do continente. Nem mesmodepois do discurso Sculo das Amricas, do Presidente Bush em Miami, em
agosto de 2000.Os defensores da ressurreio do TIAR esqueceram-se que h anos existe
contra o terrorismo continental a Resoluo 1080. Aprovada na quinta sessoplenria da Organizao dos Estados Americanos (OEA), realizada em Washington,
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em 5 de junho de 1991, a Resoluo pretende resolver, por meio de decises queforem consideradas apropriadas tudo que ameace a estabilidade da democraciarepresentativa regional. Apesar de sua existncia, o narcoterrorismo no pra de
flagelar a sociedade das Amricas3 .
A economia das redes do terror
A falta do clculo poltico racional na luta contra as diversas modalidadesdo terror, h dcadas, obriga a sociedade latino-americana a carregar enormepeso. O narcoterrorismo de quotidiana presena no continente ceifa vidas. Corrompedescaradamente o legislativo, o judicirio e o executivo. Suas operaes no palco
interno e externo, sofisticadas e rudimentares, difusas e, s vezes, muitoconcentradas, criaram redes de apoio ao terror da corrupo espalhadas pelasAmricas, pela Europa e por partes do Oriente Mdio. Segmento considerveldestas redes estende-se para dentro do territrio dos Estados Unidos, o maiorconsumidor de drogas e, tambm, o maior receptador dos dividendos dos bilionriosnegcios da corrupo e do narcotrfico. Tais redes, de dificlima penetrao,ligadas lavagem do dinheiro sujo, podem servir tambm ao dio tnico, racial ereligioso, entre outros. Neste caso, a culpa no s do fundamentalismo islmico,transformado, depois do fatdico 11 de setembro, em bode expiatrio de quase
todas as desgraas mundiais.A impostura dos centros bancrios funcionando nos parasos fiscais desafia
a propalada tica antiterror que se quer implantar nas relaes internacionais. Noso desmantelados porque Wall Street e centros financeiros como os de Frankfurt,Londres, Paris, Zurique e Milo, entre outros, necessitam da convivncia em refgiosda ilegalidade presentes nos parasos fiscais e nos interesses que abrigam.Protegidas de regulamentao e impostos, as melhores praas de proteo aocapital financiador do crime organizado esto no Panam, Belice, Costa Rica,
Antilhas Holandesas, Bermudas, Bahamas, Ilhas Turks e Caicos, Ilhas Virgens,Anguilla, So Vicente, Santa Lcia, Kitts-Nevis, Libria, Madeira, Sua,Luxemburgo, Ilhas Cayman, Andorra, Mnaco, Sark e Jersey, Irlanda,Lienchtenstein, Chipre, Lbano, Dubai, Barhein, Uruguai, Maurcio, Malta, Singapura,Hong Kong, Macau, Samoa Ocidental, Vanuatu, Ilhas Cook, Ilhas Marshal e IlhasMariana4 .
O incondicional amparo governamental a interesses financeiros levou osEstados Unidos a rejeitar o acordo sobre a lavagem de dinheiro proposto pelaOrganizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico (OCDE). O lucro
dos negcios envolvendo narcticos e contrabando de armas d passos gigantescos:aproveita do poder dos interesses que favorece a rede bancria e os fundos dehedgenos parasos fiscais. Poder que igualmente usufrui da abordagem unilateralistada poltica externa dos Estados Unidos.
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O dinheiro dos corruptos roubado da sociedade brasileira tanto que fogedo imaginrio. A ttulo de comparao, as somas desviadas do INSS por Georginade Freitas e seus comparsas, somadas ao que roubou dos cofres pblicos o bando
do juiz Nicolau dos Santos Neves, so superiores fortuna de Osama bin Ladenestimada em trezentos milhes de dlares. O monumental ganho obtido com trficode material blico e de drogas ilcitas depositado em bancos dos Estados Unidos eem dezenas de parasos fiscais j nominados neste texto movimentam mltiplasengrenagens da economia dos Estados Unidos. O terror organizado abastece esupre suas necessidades aproveitando-se das rachaduras da crise tica e moralemersas nas debilidades do tempo da unipolaridade. Rachaduras que, de formadireta ou indireta, amparam a desgraa responsvel pelo soterramento de tantas e
tantas pessoas inocentes sob os escombros das duas torres smbolos da prosperidadecapitalista.Caso a prometida luta contra a lavagem de dinheiro circunscreva-
se apenas aos momentos da febre de indignao contra aes terroristas perpetradasnos Estados Unidos, o terror organizado desfrutar de enormes facilidades paraobteno do dinheiro ilegal, lavado ou no. Com fartura de capital possvel sustentarquaisquer estruturas corruptoras e cooptadoras, presentes dentro e fora dasfronteiras estadunidenses. Tal fartura tem se transformado em presente de mobeijada da globalizao aos grupos terroristas.
Na reconfigurao hodierna das formas de luta pela segurana humanacontra o terrorismo urge mostrar a ineficcia das velhas receitas da repressomovida por golpes militares, tortura e desrespeito aos direitos humanos. Oxal, apoltica de conteno ao comunismo inspirada na Doutrina Truman, gerada naGuerra Fria, no reencarne na poltica internacional de conteno ao terrorismo.Pouco importa se sob o nome de operao justia infinita, liberdade duradoura ououtros!
Em face dos tantos insucessos do combate ao dio, inclusive ao terror da
fome, ao terror da corrupo, ao terror das desigualdades, a anlise do generalizadoaumento dos conflitos nas relaes internacionais necessita ir alm dasconvenincias dos paradigmas aplicados pelas diplomacias das grandes potnciase das que giram em sua rbita.
A imprensa internacional, tanto a falada quanto a escrita, geralmente captao que julga valer aos seus interesses. Raramente sugere polticas pblicas emfavor da pacfica soluo das controvrsias. Controvrsias igualmente sopradorasdo terror. Falta educao para os marginalizados e preo justo aos produtos agrcolaspara que a populao rural da periferia mundial no continue na tentao da produo
da papoula sustentadora da economia dos talibs, como ocorre no Afeganisto.Na luta contra a produo de cocana nos pases amaznicos, preveno e repressodeveriam significar a aplicao da justia. Justia a nica sada capaz de atenuara patologia da violncia sustentculo do terror.
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Obig stick no combate ao terror
A reao do executivo estadunidense em face dos recentes atentados
terroristas merece ser aquilatada luz de recursos histricos. Nada custa relembrara Emenda Plate, de 1901, dando poderes aos Estados Unidos para invadir Cuba.Referida emenda, impregnada de conceitos da Doutrina Monroe, aplainou terrenopara o aparecimento, em 1904, do Corolrio Roosevelt acompanhado do odiadoGrande Porrete. Em substncia, quase todo igual ao modelo do porrete agoraexibido pelo texano George W. Bush, na selvagem cruzada contra o terrorismo.
Passado um sculo e pouco, oBig Stickreaparece no novoFar West, emverso modernizada, fortalecido com armas nucleares, porm imprestveis na defesa
da segurana interna. Confessadamente pouco eficazes para o sucesso da polticaantiterror estadunidense. Poltica desta vez dirigida no s para a surrada AmricaLatina, vtima do narcoterrorismo, mas para toda a terra.
Infelizmente, so relativamente poucas as vozes clamando contra o uso dafora militar no combate ao terror. A militarizao do combate violncia doterrorismo fundamentalista e do narcoterrorismo questionvel. At hoje nosolucionou problema nenhum, porque a paz dos cemitrios no a paz que sealmeja nas relaes internacionais.
A derrubada do muro de Berlim em 1989, smbolo do fim do poder bipolar
significou a autodecomposio do comunismo burocrtico. Abriu imediatamenteas portas do mundo s insuficincias do poder unipolar. Quase sem barreiras, astransnacionais da violncia atiam contradies a favor do terror. A violncia nutre-se da degradao dos valores cristos presentes na extremamente hedonistademocracia estadunidense. Por tal razo, a luta contra as causas do terrorismohodierno promete novas interpretaes, no apenas s relacionadas fora militar,mas tambm s relacionadas dominao econmico-cultural pelos pases centrais,vale dizer, pelo senhorio das novas Romas com seus novos brbaros.
A violncia nas relaes internacionais pressagia outro captulo no velholivro conhecido como Destino Manifesto, h dcadas estigmatizado por seu cartertanto expansionista como intervencionista presente na tica capitalista dos EstadosUnidos da Amrica. O Destino Manifesto historicamente repleto de violaes naAmrica Latina dominou, pouco a pouco, o cenrio internacional. Cobre de sombraso prestgio da moral estadunidense que, depois de dcadas e dcadas semeandoinfluncias, comea no novo milnio a colher reaes polticas e ideolgicasadversas.
A histria promete ser dura, caso a presente diabolizao do terror continue
desacompanhada de aes para eliminar suas causas, se os conflitos submersosnas relaes internacionais no forem igualmente atacados. S que a sociedadedos pases centrais no permanecer como dantes, apenas como telespectadora:agora tambm vtima. Suprimir as liberdades civis bsicas, desrespeitar os direitos
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humanos na luta contra o terror equivaler a colocar mais lenha na fogueira dascontradies.
Convenes antiterror e falhas no trato diplomtico
O narcoterrorismo e o terrorismo poltico provaram andar de mos dadas.Em seu combate, somas bilionrias se consomem, pagas pelo contribuinte. Todavia,ao invs de polticas pblicas para superao das contradies que geram conflitos,cuja manifestao maior tem sido a violncia, se faz esquecer a paz!
Com a guerra, o narcoterrorismo cresce. Suas fortes ramificaes h anosminaram, em vrias naes, as bases da democracia. O terror dos negcios das
drogas mostra-se prspero. A prometida investida contra a lavagem do dinheirofica s nas intenes. A luta contra o terror, capaz de soterrar o Afeganisto combombas, incapaz de reverter atitudes que dificultam o combate lavagem dedinheiro e produo da herona.
As clulas ou grupos sustentadores de planos em categorias operacionaisobtiveram, com a dita globalizao, facilidades para execuo de suas atividadescriminosas. Depreende-se ento, que o carter transnacional do terrorismo pedepolticas pblicas de mbito mundial contra o terror e no indstrias antiterroresque fabricam o terror. Polticas pblicas a favor da paz implementadas
preferencialmente sob a gide das Naes Unidas. Em todos os pases, ricos epobres diminuiriam ento as cruamente expostas chagas das debilidades do tratodiplomtico internacional no combate ao terror.
A incompetncia no mbito das relaes internacionais na construo depolticas para a paz e a no-violncia abre portas para o uso da fora na luta contrao terrorismo. Por exemplo, as conferncias de Tquio, em 1963, Haia, em 1970,Montreal, em 1971, a Conveno de Nova Iorque, em 1977, a Conveno Europiapara a Supresso do Terrorismo, na cidade francesa de Estrasburgo e a Conveno
de Genebra, ambas realizadas em 1977, mais a primeira Conveno rabe deLuta Contra o Terrorismo no Cairo em 1998, todas quase nada aportaram emtermos de iniciativas contra o terror internacional.
O Direito Penal Internacional, tal qual as convenes, no estado de naturezadas relaes internacionais hodiernas, letra morta e assim continuar at quealgo aparea para defender o mais fraco da lei do mais forte. Tomara que taliniciativa no seja o prprio terror.
Limitadas e sem viso, preocupadas quase que exclusivamente com aproteo de autoridades diplomticas, as mencionadas convenes apresentaram
poucos resultados positivos para o mundo. O carter cosmtico dessas iniciativasda diplomacia reservou s citadas convenes medocre espao na arenainternacional. Alm de no terem conseguido nmero suficiente de adeses,enfrentaram a falta de ratificaes.
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Questes bsicas como soberania nacional, direito sem fronteira, razo deEstado, critrios para extradio e jurisdicionalidade permaneceram na estaca zero.A discusso do uso da fora bruta utilizando aes unilaterais de combate ao
terror ainda soava, nos tempos da bipolaridade e imediatamente aps o seu fim,como verdadeira heresia a desfavor do outrora sagrado princpio da inviolabilidadeterritorial.
Apropriao do nome de Deus
A negligncia dos pases desenvolvidos com relao ao terrorismo dasdesigualdades nas relaes internacionais precisa ser combatida, porque tal batalha
manter acesa a chama da indignao contra atos terroristas, contra suas causas.Ajudar na busca do consenso acerca da necessidade da eliminao do dio.Sabendo ser pouco demais o que a Organizao das Naes Unidas realiza
contra o terror, inclusive a desfavor das desigualdades por causa do seu obcecadotemor diplomtico de ferir susceptibilidades nacionais, a ONU, ao qualificar oterrorismo como crime internacional, chove no molhado. Variadssimasinterpretaes podem ser dadas ao Artigo 51 da sua prpria Carta, em que sereserva aos pases o direito da autodefesa. O Iraque e a Lbia, por exemplo, estoroucos de tanto invoc-lo.
A domesticao do terror da violncia com a banalizao do valor davida, em flagrante desrespeito ao prximo e aos direitos humanos, mais a apropriaodo nome de Deus no combate ao terror entre as partes conflitantes vejam-se,por exemplo, os discursos de George W. Bush e Osama bin Laden complicamenormemente a arena da tica antiterrorista. A invocao do nome de Deus deveriapreocupar as diferentes confisses religiosas. Sobre isso no se ouviu quase nadadas lideranas eclesisticas ocidentais, inclusive por parte do Vaticano. Relativamentepoucas vozes nas igrejas checam a moralidade dos bombardeios lanados pela
nao mais poderosa contra provavelmente uma das menos favorecidas. Apelarpara a tica crist lembrar a onipresena divina manifestada tanto em Washingtonquanto em Cabul ou em Braslia.
O sentido espiritual da Jihad, Guerra Santa, precisa ser respeitado econhecido no Ocidente.Jihadsignifica igualmente empenho em busca do equilbrioa servio do Criador; empenho traduzido como esforo de defesa dos valores daf islmica. A tradio maometana prega caminhar daJihadmenor para aJihadmaior. AJihadmaior o empenho da f e do exemplo. Tambm implica ascesetestemunhal por meio de usos e costumes (suna) ensinados pelo Profeta, em
Medina5 .Diferentes leituras aplicam-se bblia e ao coro. Fundamentalistas
encontram-se tanto no islamismo, no judasmo e no cristianismo, quanto no budismo.Misturar islamismo com terrorismo equivale a esquecimento da essncia do radical
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monotesmo abranico presente no judasmo, no islamismo e no cristianismo.Entender esta trilogia como se fossem civilizaes em choque e de outro mundo,como pretende Samuel Huntington6 , com suas cortinas de ferro, de bambu e de
veludo, s refora equvocos e preconceitos histricos transmitidos por ideologiascompromissadas. Existe choque sim, mas de poder. Luta de classes, no decivilizaes!
As elites dominantes ocidentais, convictas da morte e sepultamento domarxismo, acordam atnitas com o explodir das reaes em cadeia s respostasfratricidas perpetradas pelo sofisticado aparato blico industrial dos Estados Unidos.Destas aes, por condenveis que sejam, ingente mrito no se pode negar:ressuscitaram a utopia marxista soprando vigorosamente o esprito da teologia da
libertao.Em nome de interesses toma-se o santo nome de Deus em vo. O abusode Deus, seja pelos movimentos terroristas, seja pela represso mundial ao seuencalo, certamente traduz convices mais profundas que as estudadas at opresente na sociologia das relaes internacionais. Por exemplo, oMiutzan Elohim(Ira de Deus) vingava o brutal assassinato de atletas israelenses nos Jogos Olmpicosde Munique em 1972, observando o dente por dente, olho por olho do ensinamentobblico. Respondia com terror o terror do Setembro Negro de Yasser Arafat que,anos mais tarde, dividiria, com Shimon Perez o Prmio Nobel da Paz.
ORuhollah (Sopro Divino) dos xiitas iranianos, o Porto do Cu californiano,o Templo do Povo, causador de centenas de mortes por envenenamento, na Guiana,aJihadIslmica do Egito, oHezbollah(Partido de Deus) no Lbano e oHamas(Fervor) constituem modelos de manipulao do messinico no desespero do terror.Fosse vivo, Antnio Conselheiro e seu bando de fanticos sertanejos famintostalvez se confundissem com os talibs afegos integrando a lista da histria terroristados presentes dias7 .
Direito de interveno e terrorismo
Direito de interveno, soberania limitada e as novas, tais quais as antigascruzadas assassinas de muulmanos e de judeus, alteraram a fisionomia e expuserama heterogeneidade da interpretao do significado da liberdade. A guerra comsangue de inocentes contra as redes do terrorismo organizado transformou princpios,notadamente os do centro mundial de poder, quase em ultrapassados smbolosticos e morais.
Tomara que autoridades polticas nos Estados Unidos da Amrica faam
sua mea culpapelos pecados no passado e no presente; redimam-se lutando afavor da soluo estrutural dos problemas da segurana humana. A Amrica Latina,dopada dcadas e dcadas nos conceitos e nos mitos da segurana hemisfrica,ter dificuldades em levar suas elites dirigentes a ver que a distribuio da renda e
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a justia social so, at agora, os realmente seguros instrumentos de superaodas contradies sociais e o melhor antdoto contra a hodierna luta de classes, quepoder ter no terror seu brao forte.
Na lei da selva das relaes internacionais, em que conflitos integram oseu quotidiano, h tempos deveriam estar prontos os arranjos para o pacto social afavor do entendimento contra o terrorismo internacional em suas variadasmanifestaes. Todavia, impossvel criar o pacto social na vigncia do estado denatureza, na desordem das relaes internacionais em que um pas apoiado pelafora de seus exrcitos julga sem ser julgado, condena sem ser condenado; tem acoragem de proclamar cada nao tem uma deciso a tomar. Ou est conosco oucom os terroristas8 . Tal contexto repete a velha poltica maniquesta do bem e do
mal. Os formuladores da poltica antiterror estadunidense, com certeza, nofazem distino entre seus bens e os dos outros. Thomas Hobbes tem razo. Pontuouno existir propriedade, nem imprio sobre coisa nenhuma. Nem distino entre oque teu e meu. Pertence ao homem s aquilo que ele consegue manter e tosomente durante o tempo em que pode defender9 . Seu realismo e a viso filosficade John Locke consideravam a violncia como espcie contrria de justia.
Na conjuntura internacional da violncia, falta a proveitosa presena doLeviat, monstro protetor dos pequenos contra o grande e poderoso predador. A
metfora hobbesiana aplaude a necessidade da ordem justa na desordem injustapresente no relacionamento internacional. Um estado de sociedade universal comjustia, seja ele o sonhado por Kant, Hegel, Marx ou Rousseau, com certeza minariaa fora do terror. Poria a sociedade das naes nos trilhos da ordem justa. Restasaber qual Leviat possuir clarividncia e ideal suficientes para mostrar sociedadedas naes os caminhos da paz e da prosperidade.
Terror como continuao da poltica por outros meios
A sociedade humana dispondo de uma Organizao das Naes Unidasmanietada, sequer lembrada nos discursos a favor da luta contra o terrorismointernacional, num contexto poltico em que Estado algum abre mo de suasprerrogativas a favor do governo universal, deveria recorrer ao realismo deClausewitz10 . Pode em brados afirmar que, na atualidade, ao invs da luta de umanao contra outra, o terrorismo a continuao da poltica por outros meios.
Observa-se ento que no relacionamento internacional, pouco importa porparte de quem os equvocos da luta contra o terror pelo terror aportaro tempos de
intolerncia e irracionalidade. Contra tal poltica relembremos os to consagradosPrincpios da Filosofia do Direito, em que seu autor, o filsofo Hegel, mostraque Estado algum, povo algum pode atribuir-se, invocando sua pretensarepresentatividade, qualquer supremacia sobre outros povos11 .
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Com a globalizao da insegurana, a intolerncia arma suas emboscadas:escuta apenas a voz daquele que grita mais alto. Em face das tantas vtimas dosdiversos tipos de terror, que se lembre de Tertuliano. Transformemos sua afirmativa
em objeto de reflexo nestes conturbados dias sem endereo dos refgios da razo.Sanguis martirum est semen cristianorum, sangue de mrtir semente decristo. Esta mxima no se aplica apenas civilizao ocidental. O fundamentalismoislmico consegue, dentro de sua viso de mundo, incontvel enormidade de fiisprontos para morrer em nome da defesa de sua f e de seus princpios religiosos.Da o equvoco do combate do terror pela violncia semeadora de terror.
Tipologias do terror
Os tupamaros uruguaios, o peruano Sendero Luminoso, a salvadorenhaFrente Farabundo Marti de Libertao Nacional (FMLN), o filipino Novo ExrcitoPopular e o malaio Partido Comunista, por dcadas, foram rotulados de terroristascom inspirao maosta. Tambm os sandinistas eram vistos como sinnimo deterror. Em seu combate, os Estados Unidos financiaram os contras. Usaram avelha ttica do terror contra terror sem nenhum respeito soberania. Por seusatos, foram condenados pela Corte Internacional de Justia da Haia e tudo continuana mesma.
A rebeldia curda na ex-Unio das Repblicas Socialistas Soviticas, noIr, no Iraque e principalmente na Turquia considera-se como o que existe de piorno terrorismo. A perseguio implacvel ao PKK, por razes geopolticas, ajudadapor muitos e combatida por poucos. No Mxico, o subcomandante Marcos nofoge da rotulagem de terrorista apesar de suas aes radicais em favor dasliberdades e dos direitos da maioria indgena em Chiapas. A Organizao MilitarNacional (Irgun Zvai Leumi) ao explodir, em 1946, o quartel general das forasarmadas imperialistas britnicas em Jerusalm com dezenas e dezenas de mortos,
indignou os sditos da coroa e encheu de jbilo os judeus na reconquista de suaTerra Prometida. A maioria deles sobreviventes do terror do nacional-socialismo,vtimas do terrorismo dos campos de concentrao, em que imperava o lema: otrabalho liberta.
O Exrcito Revolucionrio Irlands (IRA) mais o ETA (Ptria Basca eLiberdade), colocados nos pores da tortura pela represso do Reino Unido e daEspanha, fazem da resistncia sua razo de vida. Pior de tudo, recebem o mesmortulo de movimento terrorista aplicado Fora Voluntria do Ulster (UVF) e aoUlster Freedom Fighters, os dois ltimos assassinos inclementes de catlicos
militantes.A desintegrao da Iugoslvia tampouco processou-se fora do alcance do
terror, do processo chamado de limpeza tnica. O curioso na histria do terrorismo que suas extenses domsticas so to potentes quanto seu formidvel impacto
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externo. Suas manifestaes, quer se queira ou no, influenciam as relaesinternacionais.
O Movimento de Resistncia Afriknder, grande caador e matador de
negros no apartheid, nunca foi considerado como movimento terrorista pelos racistasbrancos da frica do Sul e da antiga Rodsia. Para a elite dominante sul-africana,terrorista era o Congresso Nacional Africano.
Outro fato histrico a ser lembrado o terrorismo das ditaduras militaresde direita espalhadas entre 1960 e 1980 por toda a Amrica Latina. No Brasil, porexemplo, o terror do regime militar contou com a ajuda de muitas burocracias naimplementao da represso. Inclusive a diplomacia brasileira no negou prstimos ditadura a que to lealmente serviu rastreando e denunciando as vtimas do golpe
militar em exlio no exterior.Outros exemplos atuantes: o Grupo Islmico Armado (GIA) na Arglia, oExrcito Vermelho Japons e a Frente Nacional Islmica Muhamad Gailani para aLibertao do Afeganisto, que serviu de escola para a atual militncia talib. AAum Shirinkyo, no Japo, a Jihad Islmica Palestina, o Grupo Abu Nidal, a Al-Fatah, a PLOTE (Organizao Popular para a Libertao do Tamil), os TigresTamil no Sri Lanka, os Sikhs na ndia, a Frente de Libertao da Crsega e aFrente de Libertao do Quebec. Todos os grupos e movimentos citados ilustramo balaio de gatos ideolgico da violncia e da anarquia do terror nas relaes
internacionais12 .O narcoterrorismo presente na maioria dos pases amaznicos mais parece
um ninho de cobras. Envenena a sociedade por meio de assaltos a mo armada,bancos, estabelecimentos comerciais, seqestros, roubo de carros e de cargasdemonstrando incansvel vitalidade. Pelas autoridades responsveis, geralmentereprimido com insuficiente rigor, o fenmeno do narcoterror, verdugo das frgeisdemocracias latino-americanas, possui nas Autodefesas Unidas da Colmbia(AUC)13 parte da sua sustentao. Tambm as FARC (Foras Armadas
Revolucionrias Colombianas) e o ELN (Exrcito de Libertao Nacional), porsuas aes extremamente prximas s fronteiras com o Brasil, transformaram-seem perigoso instrumento de instabilidade poltica na regio amaznica, notadamenteentre colombianos, brasileiros e venezuelanos.
Definir tanto a natureza quanto as caractersticas do terrorismo, diferenciaros velhos dos novos atos de terror tarefa complexa porque complexas so asdiversas causas e origens do terrorismo. Na geopoltica internacional, os olharessobre o terrorismo tampouco continuam os mesmos. Por exemplo, os freedomfighters antes considerados como heris da resistncia afeg em luta contra os
soviticos so, hoje, vistos como concentrao de barbrie.Nem sempre foram as mesmas as reaes da sociedade internacional em
face das aes do terror contra o poder e tambm do terror contra os mais fracos.Nem a Ku Klux Klan e nem a Milcia de Michigan, com suas mortes enterradas no
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esquecimento da opinio pblica, conseguem ser menos lembradas que o virulentoterror congols. Paradoxalmente o mais esquecido de todos, o terrorismo no Congomata por dia aproximadamente duas mil e quinhentas pessoas, bem prximo do
correspondente ao nmero de mortos ocorrido numa das torres do World TradeCenter.
O terror da omisso
Nesta reflexo, acrescente-se que, nas relaes internacionais, tambmse vive o terrorismo da omisso, aproveitando-se da assimetria e da capacidadeacrtica da desordem mundial. A conscincia adormecida do processo civilizatrio
em pleno incio do sculo XXI, cala em face de atos terroristas perpetrados porrebeldes apoiados por Angola, Zimbbue e Nambia contra o igualmente terroristaexrcito do Congo, escorado por tropas de Ruanda e Uganda.
As cinzas, ainda quentes, dos conflitos tnicos em Biafra, Ruanda e Burundi,de htus contra tutsis e vice-versa, ardem. Apesar disso, no se conhece nenhumgesto de abrangncia mundial contra o terror que nos ltimos trs anos ceifou doismilhes e quinhentas mil vidas na parte oriental do Congo.
A opinio pblica mundial e a mdia propositadamente deslembram a
realidade do mundo de ser de todos para todos; que o sentimento no exclusividadedos pases de primeira classe. O nmero de vtimas nos pases excludos maiornas mos do terror. Triste esquecer que fazer mrtires, no importa onde e nemem favor de que causas, s serve para aumentar o sacrifcio dos martrios.
O terrorismo usado tradicionalmente nas guerras fenomenologia antigana histria da humanidade, anterior ao aparecimento dos Estados nacionais nossculos XV e XVI. Na falta da ordem e do estado de justia, a Antigidade viu oterror como instrumento de barganha e at de esperanas. No atual contexto dedesordenamento internacional, com a globalizao selvagem debilitando os Estados
nacionais, a histria parece repetir a intrnseca natureza transnacional das diversasformas de terror em ao. Tanto o narcoterrorismo quanto o terrorismo religiosoencontram na unipolaridade globalizadora do poder mundial campo frtil para suaextenso vertical e horizontal no seio das naes.
O terrorismo da violncia espalhado pelas casas e ruas das cidades latino-americanas, assim como o terrorismo da corrupo, profundamente enraizado nasinstituies nacionais, criam aqui e em outros pases globalizados sentimentos deimpotncia e passividade. A violncia interna, somada a outras patologias do terror
presentes na periferia mundial, to amoral quanto a marca do terror nos pasescentrais, deixa de assustar por no despertar o clamor da mdia e nem da opiniopblica. Isto porque o terror perifrico geralmente sacrifica, na maioria das vezes,pobres, excludos e miserveis.
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Os imolados pelo extremamente letal terror do subdesenvolvimentoencontram-se em nmero incomparavelmente superior ao das vtimas do terror nomundo desenvolvido. A diferena que este oprbrio, que tambm o terrorismo
da fome e da explorao do homem pelo homem, est propositadamente esquecidopela hipocrisia do sistema internacional, hipocrisia destruidora do que ainda restada coragem civil pelos cantos da terra.
Do anarquismo ao terrorismo
A descrio das construes interparadigmticas tricotada em torno dofenmeno do terror exerccio explicativo sujeito a equvocos. Mesmo assim,
valeria a pena tecer algumas consideraes a respeito. Acontecimentos histricospara subsidiar tal anlise no faltam. Por exemplo, durante o sculo XIX at meadosda segunda parte do sculo XX, o Ocidente confundia anarquismo com terrorismo.Possivelmente porque os anarquistas, de forma menos condescendente que osmarxistas, sempre lutaram pela radical eliminao do Estado nacional, coisa queagora a globalizao impiedosamente executa sem perseguio alguma contra ela.
A utopia anarquista, dentre as utopias, talvez tenha sido a mais reprimida.O suicdio montado na priso alem de Stammheim contra a liderana da Facodo Exrcito Vermelho, somado ao fim dado s Brigadas Vermelhas, na Itlia, deu
provas de aes nada democrticas contra o anarquismo em nome da razo deEstado.
O cenrio do terror da guerra dos pases centrais na periferia mundial,apesar de todas as vantagens da tecnologia, recomenda lembrar que na guerra osnmeros por si s no conferem vantagem alguma. No avances confiando nomero poderio militar14 . A advertncia proclamada por Sun Tzu cerca de meiomilnio antes da era crist pode ser aplicada nos momentos atuais, em que a noodo valor heurstico passa por rpidas mutaes. O mesmo ocorre com a sociedade
e as ideologias revolucionrias. A relao com os valores, a idia que se faz, porexemplo, de uma poca ou de uma doutrina sob a forma do idealtipo, a fim decaptar sua significao, no corresponde forosamente idia que oscontemporneos daquela poca ou os militantes daquela doutrina faziam delas15 .Assim, nada impede que a perseguio movida na caa a Osama bin Laden opromova a mrtir, se ele for morto e em heri se continuar vivo. Em ambos oscasos, no dolo que o terror fundamentalista islmico tanto anseia. Tal qual ocorreuna brbara represso levada a cabo pelas ditaduras militares latino-americanas,responsveis pela transformao de Ernesto Che Guevara em heri e mrtir para
milhares de latino-americanos e europeus , entre outros.Com a contribuio da anlise por meio de reflexes formuladas entre
outros por pensadores como Michail Bakunin, Peter Kropotkin, Pierre J. Proudhon,William Godwin, Elise Reclus, Leo Tolstoi, Errico Malatesta, John Most, Emma
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Goldman, Gustav Landauer, Erich Mhsan e Rudolf Rocker, a substncia tericado anarquismo brotou em mananciais nos quais movimentos terroristas,principalmente europeus, saciaram sua sede terico-explicativa16 .
O lema do grupo Baader Meinhof, destrua o que vos destri reapresenta-se, agora, despojado ou no da ideologia do materialismo dialtico, renovado emverses messinicas, como por exemplo, a morte em nome da f, o sacrifcio davida em nome da salvao etc. A audcia dos terroristas de hoje, mutatis mutandis,parece imbuda de coragem, sem dvida diferente, porm no menos audaciosaque a dos cristos mortos no Coliseu contra a ordem pag e o hedonismo doImprio Romano.
Dos anarquistas nasceram idias, sonhos, quase todos transformados em
pesadelo por causa da represso. Por exemplo, o mencionado macht kaputt waseuch kaputt macht, destrua o que vos destri, bandeira da Faco do ExrcitoVermelho, fez tremer as bases de democracias criadas no ps-guerra sobre osescombros da derrota nazista. Significou o grito de expressivo segmento dajuventude ocidental rica e hedonista impressionada com a desnecessria carnificinadas guerras. Paralelamente a isto, a angstia existencial dos anos dourados bipartiaa juventude entre alienados e revolucionrios.
Na alienao buscou-se o consolo nas drogas e na despolitizao o silncio
dos injustiados. Alienao e despolitizao versusmilitncia sadia, como aconhecida na expanso mundial dos protestos estudantis nascidos na Frana em1968, por paradoxal que paream, transformaram-se em sementes para posteriorgerminao do terror, inclusive em pases onde no se negam condies mocidadede expressar com certa liberdade suas reivindicaes.
Concluso
No basta qualificar vertentes do terror, entre outras de narcocriminal,
ciberntica, pluralista, financeira, igualitria, repressiva, religiosa, separatista erevolucionria. Proceder rotulao como a aplicada ao bioterrorismo manipuladordoBacillus Anthracis, ou formular novas tipologias bsicas do terrorismo no cenriointernacional, separadamente da explicao estrutural da fenomenologia dadominao e da luta de classes, mostrar ineficcia no trato analtico. Seguramente,alm da observao da mquina do terror, a viso analtica das estruturas hodiernasda indstria da violncia nas relaes internacionais, longe de pura ponderaometafsica, contribuir para o diagnstico dos porqus do to precoce agravamento
da degenerescncia da democracia no trato do terror gerado em suas entranhas.A civilizao ocidental crist, ao no aplicar os princpios de sua moral e sua tica,tolera a injustia. Tolerando injustias, transforma-se em hospedeira nata do vrusda delinqncia.
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A natureza indiscriminada do terror hodierno atacando alvos, com e semespecificidades, semeia o medo propagando o mal como a papoula entre o trigo. Omedo provou ser a droga nociva das relaes internacionais sob a unipolaridade,
porque acovarda a sociedade. Mais penoso do que isso, o desiderato de cadanao em salvar a si prpria leva falta de solidariedade e fertiliza a mtuaincompreenso entre os povos na luta contra o terror. No menos grave o renascerda crena na mensagem do homo homini lupus, homem lobo do homem. D afalsa idia de que o construdo por mos humanas negativo e sujo e de que aviso kantiana da paz perptua no passa de sonho.
Na sociedade das naes conhece-se cada vez mais a histria das coisase dos fatos. Em contrapartida, menor o espao para o exerccio da cidadania do
homem que quotidianamente torna-se menos sujeito da sua prpria histria. Talvezpor isso os valores e os ideais avanam movidos por cobia e dominao colocandoem risco as esperanas no futuro da segurana humana. Desgraadamente, taisfatos reforam os individualismos nacionais. Tornam remota a certeza da vitriana luta contra o terror no caminho repleto de armadilhas das relaes internacionaissob o signo da lei do mais forte.Outubro de 2001
Notas
1 Procpio, Argemiro. O Terrorismo e a Segurana..Correio Braziliense. Braslia, 23.09.2001,p.10.
2 Procpio Argemiro. LAmazonie et la mondialisation - Essai dcologie politique. Paris:Ed. LHarmattan, 2000.
3 Procpio, Argemiro (org.) Narcotrfico e Segurana Humana.So Paulo: Ed. LTR., 1999,p. 86.
4 Procpio, Argemiro. O Brasil no mundo das drogas. Petrpolis: Ed. Vozes., 1999, p.199.5 Ver: Bartholo Jr., Roberto S. e Campos, A. E. (orgs.),Isl. O credo a conduta. Rio de Janeiro:
Editora Imago,1990.6 Ver: Huntington, Samuel. O Choque das Civilizaes. Editora Objetiva.7 Ver: Cunha, Euclides: Os Sertes. Editora Record..8 Discurso do Presidente George W. Bush, no Congresso dos Estados Unidos da Amrica, em
20 de setembro de 2001.9 Hobbes de Malmesburry, Thomas: Leviat ou Matria, Forma e Poder de um Estado Eclesistico
e Civil. So Paulo: Ed. Abril Cultural, 1983.10 Ver: Clausewitz, Carl von.Penser la guerre. Paris: Gallimart, 1976.11 Hegel, Georg Wilhelm Friedrich.Princpios da Filosofia do Direito. Editora Martins Fontes.12 Ver Degaut Pontes, Marcos Rosa. Terrorismo: Crticas, Tipologia e Presena nas Relaes
Internacionais. Dissertao de Mestrado em Relaes Internacionais, Braslia, Fevereiro de1999, p. 37 a 88.
13 Procpio, Argemiro. Estado, Soberania e o Plano Colmbia. Tempo e Presena., n. 318, Rio deJaneiro, Ano 23, Julho/Agosto de2001, p 15.
14 Tzu, Sun.A Arte da Guerra. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1997, p.99.
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15 Freund, Julien. Sociologia de Max Weber. Rio de Janeiro: Companhia Editora Forense, 1970,p.52.
16 Bakunin, Michail.Freiheit und Sozialismus. Impressum/ Liberdad-Verlag. Anarchistischer Bund
Berlin. 1978; Kropotkin, Peter. Gesetz und Autoritt.Impressum/ Liberdad-Verlag. AnarchistischerBund Berlin. 1978; Proudhon, Pierre J.Eigentum ist Diebstahl.Impressum/ Liberdad-Verlag.Anarchistischer Bund Berlin. 1978; Godwin, William. ber die Politische Gerechtigkeit.Impressum/ Liberdad-Verlag. Anarchistischer Bund Berlin. 1978; Reclus, Elise.Evolution und
Revolution.Impressum/ Liberdad-Verlag. Anarchistischer Bund Berlin. 1978; Tolstoi, Leo.Patriotismus und Regierung. Impressum/ Liberdad-Verlag. Anarchistischer Bund Berlin. 1978;Malatesta, Errico.Anarchismus-Syndikalismus. Impressum/ Liberdad-Verlag. AnarchistischerBund Berlin. 1978; Most, John.Kommunistischer Anarchismus.Impressum/ Liberdad-Verlag.Anarchistischer Bund Berlin. 1978; Goldman Emma.Anarchismus Seine Wirkliche Bedeutung.Impressum/ Liberdad-Verlag. Anarchistischer Bund Berlin. 1978; Landauer, Gustav.Staat und
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Abreviaturas
AUC Autodefesas Unidas da ColmbiaELN Exrcito de Libertao NacionalETA Ptria Basca e Liberdade
Estados Unidos Estados Unidos da AmricaFARC Foras Armadas Revolucionrias Colombianas
FMLN Frente Farabundo Marti de Libertao NacionalGIA Grupo Islmico ArmadoIRA Exrcito Revolucionrio Irlands
OCDE Organizao para a Cooperao e DesenvolvimentoEconmico
OEA Organizao dos Estados AmericanosONU Organizao das Naes Unidas
PLOTE Organizao Popular para a Libertao do Tamil
PKK Partido dos Trabalhadores do KurdistoTIAR Tratado Interamericano de Assistncia RecprocaUVF Fora Voluntria do Ulster
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Resumo
Anlise do terrorismo como varivel das relaes internacionais. Refere-se o fenmeno aos atentados sofridos pelos Estados Unidos em 11 de setembro de2001. Considera-se a reao norte-americana e os bombardeios do Afeganistocomo estratgia inadequada de combate ao terrorismo, por desconsiderar suascausas, que repousam nas desigualdades entre as naes e nos descontentamentossociais.
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Abstract
Analysis of the terrorism as a variable of international relations. It refers
the phenomenon of the attacks suffered by United States on the 11thof Septemberof 2001. It considers the North American reaction and the attacks to Afghanistana inadequate strategy to combat terrorism, for disrespect its causes, that rest in theinequalities among the nations and the social dissatisfactions.
Palavras-chave: Terrorismo. Ordem Internacional. Relaes Internacionais.Key Words: Terrorism. International Order. International Relations.