artigo adubação do milho safrinha - revista a granja

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38 | MARÇO 2013 ADUBAÇÃO Cada milho com o manejo que MERECE Visto as particularidades das muitas regiões produtoras de milho safrinha no país, principalmente em relação à disponibilidade de água no solo e dos métodos de aplicação dos fertilizantes, são distintas as estratégias de manejo da adubação Aildson Pereira Duarte, Programa Milho e Sorgo IAC/APTA, Instituto Agronômico, Campinas/SP, [email protected] O cultivo do milho na segunda safra sob sequeiro, em suces- são de culturas, denominado milho safrinha, expandiu rapidamen- te no Brasil nas duas últimas déca- das. Neste período, a área evoluiu de inexpressiva para mais de 7 milhões Fotos: Leandro M. Mittmann de hectares e a produtividade média dobrou para aproximadamente cinco toneladas por hectare, devido, prin- cipalmente, à consolidação do siste- ma plantio direto, à antecipação da época de semeadura e ao lançamento de híbridos adaptados. O emprego de insumos e práticas culturais típicos de sistemas de alta tecnologia é crescente no milho sa- frinha, embora ainda predomine mé- dio investimento em tecnologia. A adu- bação tem acompanhado esta tendên- cia, mas é necessário melhorá-la para

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38 | MARÇO 2013

ADUBAÇÃO

Cada milho como manejo que MERECEVisto as particularidades das muitas regiões produtoras de milho safrinha

no país, principalmente em relação à disponibilidade de água no solo edos métodos de aplicação dos fertilizantes, são distintas as estratégias de

manejo da adubaçãoAildson Pereira Duarte, Programa Milho e Sorgo IAC/APTA, Instituto Agronômico, Campinas/SP, [email protected]

O cultivo do milho na segundasafra sob sequeiro, em suces-são de culturas, denominado

milho safrinha, expandiu rapidamen-te no Brasil nas duas últimas déca-das. Neste período, a área evoluiu deinexpressiva para mais de 7 milhões

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de hectares e a produtividade médiadobrou para aproximadamente cincotoneladas por hectare, devido, prin-cipalmente, à consolidação do siste-ma plantio direto, à antecipação daépoca de semeadura e ao lançamentode híbridos adaptados.

O emprego de insumos e práticasculturais típicos de sistemas de altatecnologia é crescente no milho sa-frinha, embora ainda predomine mé-dio investimento em tecnologia. A adu-bação tem acompanhado esta tendên-cia, mas é necessário melhorá-la para

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suplantar os níveis atuais de produti-vidade na cultura. Neste artigo, se-rão apresentadas as principais pecu-liaridades e os pontos que requeremmaior atenção no manejo da aduba-ção do milho safrinha.

A diversidade de ambientes de pro-dução do milho safrinha, principal-mente quanto à disponibilidade deágua no solo e dos métodos de apli-cação dos fertilizantes, condicionamdiferentes estratégias de manejo daadubação ao cereal. As regiões pro-dutoras de milho safrinha podem serdivididas nas seguintes: cultivo tra-dicional, desde o início da década de1990 em substituição ao trigo (Para-ná, sudoeste de São Paulo e parte doMato Grosso do Sul); chapadões doCentro-Oeste (Goiás, Mato Grosso eMato Grosso do Sul), ocupando áre-as que ficavam ociosas após a co-lheita da soja; e a nova fronteira agrí-cola do Mapito (Maranhão, Piauí eTocantins).

A região de cultivo tradicional éde baixa altitude, baixas temperatu-ras e risco de geadas, predominando

pequenas propriedades, adubação nosulco de semeadura e diversos espa-çamentos entre linhas (de 45 a 90 cen-tímetros). Nos chapadões do Centro-Oeste e do Mapito as temperaturassão mais elevadas e ocorre deficiên-cia hídrica no final do desenvolvimen-to da cultura (inverno seco), predo-minando grandes propriedades, espa-çamento reduzido (45 e 50 centíme-tros) e aplicação de todo adubo a lan-ço para facilitar a parte operacional.

Importância do nitrogênio — Onitrogênio (N) é o nutriente requeri-do e exportado em maior quantidadepelo milho (figuras 1 e 2). Comoaproximadamente 1,5% do grão écomposto por nitrogênio, são expor-tados 15 quilos de N por tonelada demilho, que corresponde a 75 kg/hec-tare de N quando se produz 5 tonela-das/ha de grãos. A maior parte do ni-trogênio (60% a 70%) é acumuladana planta antes do florescimento e opotencial produtivo máximo é defini-do nos estádios iniciais (figura 3).Como o sistema radicular é pouco de-senvolvido em plantas jovens, explo-

rando pouco volume de solo, é ne-cessário o fornecimento de N na se-meadura para suprir esta grande de-manda inicial do nutriente.

O milho safrinha se beneficia donitrogênio presente nos restos cultu-rais da soja, mas não se conhece bemquanto do nutriente fica disponívelpara este cereal, o que dificulta o cál-culo do crédito de nitrogênio na adu-bação nitrogenada do milho. Existemvariações na própria eficiência doprocesso simbiótico e na proporçãode grãos na massa total da parte aé-rea da soja, bem como nas condiçõespara a mineralização da matéria or-gânica e liberação do N no solo. Es-tima-se que ficam para o milho emsucessão cerca de 20 kg de N paracada tonelada de soja, ou seja, 60 kg/ha de N quando se produz três tone-ladas/ha de soja, o que não é sufici-ente para suprir a exportação destenutriente na maioria das lavouras demilho safrinha.

Quanto e quando aplicar nitro-gênio — Em condições tropicais nãoé possível prever a resposta das cul-

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turas ao nitrogênio apartir da análise desolo. A recomenda-ção de adubação éfeita considerando-seo histórico de cultu-ras na área - que nocaso do milho safri-nha é quase sempre a soja -, a de-manda de nutrientes pelas plantas, aestimada a partir da produtividade eos resultados de experimentos de res-posta da cultura aos fertilizantes.

Os primeiros experimentos emrede sobre adubação do milho safri-nha foram conduzidos pelo InstitutoAgronômico (IAC), na região paulis-ta do Médio Paranapanema, no perí-odo 1993 a 1995. Verificou-se que oparcelamento do N com 10 kg/ha deN na semeadura e o restante em co-bertura, antiga adubação padrão, po-deria ser aumentada para 30 kg/ha nasemeadura. A aplicação de apenas 30kg/ha no sulco de semeadura era su-ficiente para produzir de maneira eco-nômica até 4 t/ha de milho em grãos.

O uso de 30 kg/ha na semeadura,juntamente com o fósforo e o potás-

sio no sulco de semeadura (exemplos:fórmulas NPK 13-13-13, 16-16-16 e16-18-14+S), passou a ser ampla-mente adotado nas regiões tradicio-nais de milho safrinha para evitar asincertezas de haver ou não umidadeno solo no momento em que deveriaser feita a cobertura, o que poderia

levar à deficiência nasplantas pelo fato de nãofazê-la ou pela sua bai-xa eficiência.

Com o aumento daprodutividade e a ampli-ação da área de cultivodo milho safrinha, im-plantou-se nova rede deexperimentos em dife-rentes regiões produto-ras, para atualizar as in-formações sobre o ma-nejo da adubação. Veri-f icou-se, ao apl icaraproximadamente 27 kg/ha de N no sulco de se-meadura, em sucessão asoja e solos argilosos,que a frequência de res-posta ao N em cobertu-ra é muito baixa até pro-dutividades de 6 t/ha(Figura 4). No entanto,para suplantar este pa-tamar produtivo é fun-damental complementara adubação de semeadu-ra com N em coberturaem doses compatíveis

Quando se emprega pouconitrogênio e a produtividade

do milho é elevada, podehaver resposta da soja

cultivada em sucessão àadubação nitrogenada

com o regime hídrico regional e a pro-dutividade esperada.

Modos de aplicação — Um dospontos críticos da adubação de co-bertura é o modo de aplicação e o tipode fertilizante nitrogenado. Com aadoção do espaçamento reduzido, es-pecialmente em Goiás e Mato Gros-so, é frequente a aplicação do nitro-gênio a lanço na superfície do solosob sistema plantio direto. Nestascondições, a ureia pode ter grandesperdas de N por volatilização e reque-rer o aumento da dose ou o uso demistura com inibidores químicospara minimizar as perdas. Embora aureia seja preferida devido a maior

Figura 2

Figura 1

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Produção de grãos de safrinha à época de aplicação deN. Resultados de 13 ensaios (1993 a 1995). Valores entre

parênteses se referem ao número de ensaios usados paracalcular a resposta média

Dose de N N aplicado Rendimento de grãosSemeadura Cobertura 1993-94 (8) 1995 (5)

— kg/ha de N — — kg/ha (grãos) —30 10 20 3.110 4.47030 30 0 3.080(ns) 4.570(ns)

60 10 50 3.130 4.44060 30 30 3.120(ns) 4.550(ns)

Fonte: Cantarella e Duarte, 1995

disponibilidade, menor preço e faci-lidade de aplicação, o nitrato de amô-nio também tem sido utilizado por nãoapresentar perdas de N quando apli-cado na superfície sem enterrar.

Ao mesmo tempo, cresceu a adu-bação exclusiva de nitrogênio, fósfo-ro e potássio na superfície, pois a se-meadura é realizada com máquinassem mecanismo de adubação, visan-do alto rendimento operacional. É pri-orizada a adubação de cobertura epouco ou nenhum fertilizante nitro-genado é aplicado imediatamente apósa semeadura. Geralmente, a aplica-ção é feita em área total e, como asraízes ainda são pequenas e não ocu-pam a área da entrelinha, parte do N

fica longe das raízes do milho e nãoé aproveitado imediatamente. Nestascondições, a eficiência do uso do fer-tilizante é reduzida e pode haver defi-ciência nos estádios iniciais.

Quando se emprega pouco N e aprodutividade do milho é elevada,pode haver resposta da soja cultiva-da em sucessão à adubação nitroge-nada, pois aumenta a exportação dosnutrientes e a imobilização de N e Sno solo para a decomposição dos res-tos culturais do milho (palha com ele-vadas relações C/N e C/S). Equivo-cadamente, em vez de adubar adequa-damente o milho, alguns agricultoresestão utilizando fertilizantes com ni-trogênio na cultura da soja.

Adubação de sistema: P, K, S emicronutrientes — A análise perió-dica do solo é fundamental para a re-comendação de N, P, S e micronutri-entes nos fertilizantes. No planejamen-to da adubação não se deve conside-rar apenas o milho, mas a sucessãode culturas de milho e soja (adubaçãode sistema). Os teores de fósforo nacamada 0-20 centímetros do solo de-vem ser médios ou altos para o culti-vo do milho safrinha. Em solos combaixo teor de fósforo, o cultivo é qua-se sempre antieconômico pela neces-sidade de altas doses de fertilizantesfosfatados. O fósforo deve ser apli-cado preferencialmente no sulco desemeadura, podendo-se optar pelaaplicação a lanço nos solos de alta fer-tilidade para reposição dos nutrientesexportados nas colheitas.

Deve-se evitar o parcelamento daadubação com potássio para a cultu-ra do milho safrinha. Geralmente, asquantidades recomendadas nesta épo-ca são menores do que as do milhoverão, reduzindo os riscos de injúri-as do sistema radicular devido ao efei-to salino do potássio e do nitrogênioaplicados no sulco de semeadura (asoma de N e K

2O não deve ultrapas-

sar 70-80 kg/ha). Como o potássio éo nutriente acumulado em maiorquantidade nos estádios iniciais de de-senvolvimento das plantas de milho(figura 1), a sua aplicação a lanço demaneira isolada ou em fórmulas NPK

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Cresceu a adubação exclusiva denitrogênio, fósforo e potássio na

superfície, pois a semeadura érealizada com máquinas sem

mecanismo de adubação, visandoao alto rendimento operacional

como 20-00-20 deve ser feita o maiscedo possível. Como frequentementenão há umidade adequada no solo paraque imediatamente parte do potássioaplicado na superfície movimente eseja absorvido pelas raízes, o efeitodesta adubação sobre a produtividadeda cultura pode ser pouco expressivoou nulo. Uma das opções é priorizar a

aplicação do potássio na cultura dasoja e reduzir as doses no milho safri-nha.

No caso do enxofre (S), deve-sepriorizar sua suplementação quando oteor de S-SO

42- for inferior a 5 mg/

dm3. O enxofre pode ser suprido nomilho tanto na adubação de semeadu-ra como em cobertura do milho, emdoses entre 20 a 40 kg/ha, ou apenasna soja. Sugere-se amostrar tambéma camada subsuperficial (20-40 cm e40-60 cm), pois as análises realizadascom amostras de solo da camada de0-20 cm tendem a subestimar a dis-ponibilidade de S no solo. É sabido queo S geralmente não se acumula nascamadas superficiais de solos que re-cebem calcário e adubo fosfatado, porcausa da predominância de cargasnegativas devido aos maiores valoresde pH e do deslocamento do sulfatodos sítios de adsorção, provocado peloP (ao contrário do S, o P diminui emprofundidade).

Teores baixos de micronutrientesno solo indicam a necessidade da suainclusão na adubação no solo e/ou viafoliar. Porém, em função de inúme-ras interações na absorção dos nutri-

Figura 4Figura 3

entes, o teor adequado no solo nãoassegura ausência de deficiência nasplantas. Por isso, é fundamental aamostragem periódica de folhas nasculturas em sucessão, mesmo na au-sência de sintoma(s) visual(ais) dedeficiência, visando conhecer o es-tado nutricional das plantas e plane-jar as próximas adubações.