arte-educaÇÃo - sucesso escolar [sd]

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    MINISTRIO DA EDUCAOSecretaria de Educao de Guarulhos

    ORGANIZAO DOS ESTADOS AMERICANOS

    (Sub-regio MERCOSUL)

    Narrativas educativas.

    Arte-Educaona escola: em busca do Sucesso Escolar

    Mitsuko Aparecida Makino Antunes

    Coordenadora Pedaggica do Projeto: Patricia Maddonni

    Responsvel Pedaggica da Documentao: Adriana Serulnikov

    Responsvel Editorial: Fernanda Bentez Liberali

    PROJETO HEMISFRICOElaborao de Polticas para a Preveno do Fracaso Escolar

    Documentao de experincias escolares no contexto de programas nacionais deincluso para o ensino fundamental

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    NDICE

    Arte-educao na escola: em busca do sucesso escolar

    Apresentao 3A escola 5

    O trabalho pedaggico da escola 8

    Uma experincia de arte-educao: Casa de Brinquedos 15

    Casa de Brinquedos: Aprendizagem, enfrentamento do fracasso

    escolar e incluso

    22

    O caso da aluna Y 25

    O caso da aluna A 27

    A arte-educao no projeto poltico-pedaggico da rede municipal deeducao de Guarulhos

    29

    O Projeto Poltico-pedaggico, o Programa de Formao deEducadores e os Projetos de Arte-educao

    31

    Os Projetos de Arte-educao 32

    guisa de concluso: uma escola inclusiva 43

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    Arte-educao na escola: em busca do sucesso escolar1

    Apresentao

    Esta uma narrativa que conta a experincia de uma escola que consegue enfrentaro fracasso escolar com aes compartilhadas por todos os seus protagonistas (alunos,professores, gestores, pais, funcionrios, arte-educadores e profissionais da SecretariaMunicipal de Educao de Guarulhos), tendo a arte-educao como eixo do trabalhopedaggico.

    Vamos contar uma experincia desenvolvida por essa escola, a montagem da peateatral Casa de Brinquedos, por duas professoras e seus alunos. Ao longo da narrativa,procuraremos mostrar como se desenvolveu esse trabalho e as condies que foram dadase criadas para que se tornasse um sucesso e, principalmente, o envolvimento dos alunos eas conseqncias para a aprendizagem e o desenvolvimento deles.

    Nossa primeira deciso, ao receber o convite para elaborar essa narrativa, foiconhecer melhor os muitos projetos de arte-educao desenvolvidos pelas escolas, para

    escolher aquele que seria aqui relatado. Para isso, conversamos inicialmente com algunsarte-educadores e com profissionais da Secretaria Municipal de Educao SME deGuarulhos.

    No foi fcil escolher, entre tantas, a experincia em foco nesta narrativa.Encontramos experincias muito ricas, que trabalhavam com msica, teatro, artes plsticase dana; todas elas com resultados positivos para os alunos. Mas eram muitas escolas,com experincias igualmente interessantes, e no poderamos trabalhar com todas, sequisssemos fazer um relato mais extenso, acompanhando e ouvindo os protagonistas doprojeto.

    Escolhemos a Escola Municipal Evanira Vieira Romo por vrios motivos. Essaescola foi citada por todos os arte-educadores e profissionais da Secretaria de Educaocom quem conversamos, por ser considerada uma das experincias mais completas e com

    resultados pedaggicos muito interessantes.Os arte-educadores referiam-se pea teatral Casa de Brinquedos como um

    excelente trabalho, que havia sido apresentado em vrios eventos e muito elogiado portodos que o assistiram. Embora seja uma pea teatral, tambm a msica, a dana e asartes plsticas foram incorporadas ao trabalho, mostrando a possibilidade de unir vriaslinguagens e expresses artsticas numa nica atividade. Outra razo para essa escolha foio fato de que esse projeto nasceu da iniciativa das educadoras da escola, aproveitando oscursos oferecidos pela Secretaria de Educao, mas criando uma experincia prpria eoriginal.

    A coordenadora2 e a assessora do Ncleo de Educao Fundamental3 tambmapontam essas mesmas razes para considerar a experincia dessa escola como algo quedeve ser compartilhado com outros educadores, mas acrescentam outro motivo, denatureza pedaggica, que a participao de toda a equipe escolar nos projetosdesenvolvidos pela escola e pela Secretaria de Educao.

    Escolhida a escola, a tarefa seguinte foi a de formar uma equipe de trabalho e comela decidir a estratgia de investigao para compor esta narrativa.

    1Participaram desta pesquisa alunas do Programa de Estudos Ps-graduados em Educao: Psicologia da Educao (PED)

    e do Curso de Pedagogia da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo PUC-SP e uma psicloga escolar da SecretariaMunicipal de Educao de Guarulhos, a saber: Andra Wuo e Delcimar Cunha (doutorandas); Daniela Leal, Edna Tanaka,Ftima Oliveira de Carvalho Arajo (mestrandas); Helena Borges (graduanda em Pedagogia); Zilma Nascimento (psiclogaescolar; assesssora da SME de Guarulhos); Mitsuko Aparecida Makino Antunes (professora do PED-PUCSP; coordenadorada psequisa).2Professora Neri da Silveira e Professora Maria Aparecida Contim, respectivamente.3A Secretaria Municipal de Educao de Guarulhos organizada por diretorias, sendo uma delas a Diretoria de OrientaesEducacionais e Pedaggicas DOEP, que composta pelos Ncleos de Educao Infantil, Educao Fundamental,Educao Inclusiva, Educao de Jovens e Adultos e Superviso.

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    Era necessrio que a equipe fosse formada por educadores que tivessemexperincia em pesquisa e interesse pela escola pblica. Para compor a narrativa, serianecessrio visitar a escola e realizar observaes e entrevistas com os vrios participantesdo projeto, da a importncia da experincia em pesquisa. Tambm seria importante queesses pesquisadores fossem educadores, com experincia escolar e compromisso com aeducao de crianas das classes populares.

    A estratgia adotada para compor esta narrativa envolveu vrios passos, que podemser assim resumidos: (1) obter informaes gerais sobre o municpio e especificamentesobre a Rede Municipal de Educao; (2) conhecer o Projeto Poltico-pedaggico daSecretaria de Educao; (3) conhecer os Projetos de Arte-educao da Secretaria Municipalde Educao; (4) entrar em contato com a escola, apresentar o projeto de investigao eobter autorizao para a realizao do trabalho; (5) conhecer a escola, as pessoas que delafazem parte, seu Projeto Pedaggico, recursos humanos e materiais, atividadesdesenvolvidas; (5) conhecer os projetos desenvolvidos; (6) observar as atividades da escolaem diferentes momentos e em diferentes atividades; (7) entrevistar gestores, professores,alunos e pais, tendo como foco os projetos de arte-educao e, em especial, a pea Casade Brinquedos; (8) entrevistar arte-educadores; (9) elaborar relatrios de observao e

    transcrever entrevistas, organizar os dados e sintetizar a experincia; (10) elaborar o textoda narrativa.Para obter informaes sobre o municpio de Guarulhos foi consultado o site da

    Prefeitura4, no qual foram obtidos dados histricos e demogrficos.Sobre a Rede Municipal de Educao e seu Projeto Poltico-pedaggico foram

    pesquisados documentos5 e realizadas entrevistas. Foram entrevistados a secretria deEducao, assessores e profissionais do Ncleo de Educao Fundamental. Com estesforam discutidas as diretrizes da educao municipal e principalmente o Projeto Poltico-pedaggico, com nfase nos Projetos de Arte-educao e sua articulao com osProgramas de Formao de Professores.

    Para melhor conhecer os Projetos de Arte-educao foram consultados registros,fotos e vdeos desses projetos6 e realizadas entrevistas com arte-educadores; tambm

    assistimos a eventos em que ocorreram apresentaes artsticas de alunos e professores,como a apresentao da Orquestra Pimentinhas, Coral Educano e peas teatrais.Com as informaes mais gerais sobre a Rede de Educao e os Projetos de Arte-

    educao, entramos em contato com a escola escolhida para apresentar o ProyectoElaboracin de polticas para la prevencin del fracasso escolar OEA Sub-reginMercosur e entregar os documentos relativos ao referido Programa, para que os gestoresda escola tivessem todas as informaes sobre o trabalho que seria realizado. Nessemomento foram explicados os motivos da escolha daquela escola e foram apresentadas asestratgias de investigao para a elaborao da narrativa pela equipe de educadores-pesquisadores. Em seguida foi solicitada autorizao da equipe escolar para a realizaodo trabalho.

    Fomos recebidos de maneira muito calorosa pelas gestoras7, que estavam muito

    felizes por ter sido a Escola Evanira Vieira Romo selecionada para este relato. Para elas,essa escolha significava um reconhecimento pelo trabalho desenvolvido por todos naescola. Ainda que nosso foco fosse sobre a realizao da pea Casa de Brinquedos, elasafirmavam que, naquela escola, todos participavam de todas as atividades e tudo o que l realizado fruto da participao de alunos, professores, gestores, pais, funcionrios, arte-educadores e outros profissionais da Secretaria de Educao. Assim sendo, a escolhadesse trabalho para a narrativa era motivo de orgulho para toda a comunidade escolar.

    Nossa primeira iniciativa foi conhecer mais a escola, seus espaos, as pessoas quedela fazem parte, seu Projeto Pedaggico e as atividades desenvolvidas. Houve total

    4Ver: www.guarulhos.sp.gov.br.5Ver documentos anexos.6Ver documentos, fotos e vdeos anexos.7A gesto escolar formada por diretora, professora coordenadora (responsvel pela coordenao pedaggica) e professorareferncia de ciclo (responsvel pela integrao dos projetos pedaggicos da escola entre os diferentes professores e alunos).

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    disponibilidade da equipe escolar para nos mostrar a escola, seus projetos documentados eregistrados em fotos e vdeos, nos apresentar crianas e seus pais, professores efuncionrios. Por todos fomos muito bem recebidos.

    Em seguida, os documentos em que so registrados os projetos da escola, as fotose vdeos foram vistos por todos os membros da equipe de pesquisa e iniciou-se o processode sistematizao desses dados, que sero apresentados no relato.

    Um dos momentos mais importantes para elaborao desse relato foi a observaodas atividades da escola em diferentes momentos e em diferentes atividades. Inicialmenteforam escola a coordenadora da pesquisa e a psicloga escolar da Secretaria deEducao, para apresentar o projeto, estabelecer os primeiros contatos e propor arealizao da narrativa. Obtida a aprovao pela escola, foi marcado um dia para que todaa equipe de pesquisadores visitasse a escola, o que foi feito num dia e horrio em que lestavam os professores, os pais e os alunos, para que o projeto fosse apresentado a todos.Nesse encontro, percebemos que todos os membros da escola no apenas aprovaram arealizao do projeto, como tambm sentiram-se felizes e reconhecidos por terem sidoescolhidos. Houve, portanto, um excelente acolhimento e pudemos contar com acolaborao de todos para a realizao do trabalho. Entrevistamos os gestores, os

    professores, alguns alunos e pais, em vrias situaes. importante destacar que algumasprofessoras nos receberam em suas prprias casas para nos ceder entrevistas, algumasdelas por vrias horas. Um fato relevante que, alm dessas pessoas cederem seusdepoimentos e nos dedicarem seu tempo de descanso, todas elas nos agradeciam pelaoportunidade de poder contar sobre seus trabalhos. Muitas entrevistas foram sobre amontagem de Casa de Brinquedos, mas em geral outras questes relativas escola e educao em geral eram abordadas.

    A disponibilidade dos arte-educadores tambm merece destaque. Todos osentrevistados atenderam aos nossos pedidos, cedendo seus depoimentos e seu tempo.Merece destaque tambm o fato de que vrios foram universidade ou prpria casa doseducadores-pesquisadores para cederem suas entrevistas, dedicando vrias horas paranosso trabalho.

    O passo seguinte foi a sistematizao dos relatrios de observao, escritos duranteou imediatamente aps as visitas escola ou outros espaos da Secretaria de Educao(principalmente os locais onde ocorreram eventos com apresentaes artsticas de alunos eprofessores, como o Teatro Adamastor). Esses relatrios foram importantes para ofereceruma descrio da escola, de suas atividades e das apresentaes, assim como socializarcom todos os membros da equipe de educadores-pesquisadores os dados obtidos por cadaum dos participantes. Da mesma maneira foram transcritas e sistematizadas as entrevistasrealizadas com os diversos protagonistas da escola.

    A partir disso, os dados foram organizados e analisados com a finalidade deidentificar os vrios aspectos que constituam a experincia, direta e indiretamente. A partirda, foi elaborada a primeira verso da narrativa, de cunho mais descritivo e analtico. Emseguida, a partir das sugestes da coordenao do Proyeto Elaboracin de polticas para la

    prevencin del fracasso escolar, foi redigida a segunda verso da narrativa, com a inclusode imagens da escola e dos projetos de arte-educao por ela desenvolvidos.

    Esta narrativa tem incio com a apresentao da escola, de seu Projeto Pedaggico,da experincia da montagem de Casa de Brinquedos e a dinmica dessa escola quepermite o desenvolvimento de projetos deste tipo. Em seguida, so apresentados o ProjetoPoltico-pedaggico da Rede de Educao em Guarulhos, seu Programa de FormaoPermanente de Educadores e o lugar que neste ocupam os Projetos de Arte-educao.

    A escola

    A Escola Municipal Evanira Vieira Romo uma escola antiga de Guarulhos, ummunicpio fundado em 1560, como ncleo indgena Nossa Senhora da Conceio deGuarulhos, e seu nome tem origem na lngua Tupi. Hoje, com quase 1.300.000 habitantes,

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    esse municpio situa-se na Regio Metropolitana de So Paulo, a mais rica do pas. Amaioria de sua populao, no entanto, pertence s classes populares, em geraltrabalhadores com baixa remunerao, vivendo em condies precrias. Um fatointeressante que so muitas as famlias que tm a mulher como chefe e provedora do lar.A populao da cidade, por suas condies, revela a desigualdade que h sculoscaracteriza a sociedade brasileira, fruto de polticas scio-econmicas comprometidas comas classes dominantes, o que identifica a cidade e o pas com a sociedade latino-americanacomo um todo. Desde 2001, no entanto, a cidade conta com uma gesto municipal que temrealizado um intenso trabalho de incluso social.

    A escola est situada na Vila Augusta, um dos mais antigos bairros do municpio deGuarulhos, muito perto de onde ficava uma das estaes da linha frrea que ligava a cidade capital, e que incentivou o crescimento do bairro. Est construda num amplo espao queabrigava a residncia de uma antiga famlia de Guarulhos, que d nome ao ParqueFracalanza, um espao de lazer para os moradores das redondezas e um dos Centros deFormao de Professores, alm da Escola Evanira Vieira Romo.

    O bairro residencial, arborizado, possui todas as benfeitorias prprias das regiesurbanas e habitado principalmente por pessoas das camadas mdias, com muitos idosos.

    Entretanto, a escola atende muitas crianas das classes populares, moradoras de algunsncleos de favelas prximos. No se notam diferenas sociais entre as crianas, pois todosusam uniformes escolares, novos e coloridos, cedidos gratuitamente pela Prefeitura. Noperodo noturno, oferecida a Educao de Jovens e Adultos, para alunos das classespopulares, que no completaram ou realizaram a escolarizao bsica. Assim, embora noesteja situada na periferia da cidade, essa escola atende alunos tpicos da Rede de Ensinocomo um todo.

    Embora diferente das novas escolas construdas nos ltimos sete anos, comarquitetura adequada s necessidades pedaggicas, amplas, coloridas e ajardinadas ,essa escola foi reformada e ampliada, e se apresenta, logo primeira vista, como umespao bonito e adequado s atividades pedaggicas, bem cuidado e acolhedor. H salasde aula amplas, claras e arejadas; um ptio situado no centro da escola, integrando os

    espaos, com um palco que possibilita sua utilizao como um teatro; h uma horta atrs doprdio, onde so cultivadas plantas comestveis; o entorno da escola cercado por umamplo arvoredo, que tem rvores altas, provavelmente muito antigas, pertencentes aobosque que est at hoje preservado em todo o parque, dando sombra e frescor a toda aescola.

    Chama a ateno, logo entrada da escola, num longo declive, uma escadaria todadecorada por um mosaico colorido. Esse mosaico foi feito pelos alunos e educadores, juntocom os arte-educadores de Artes Plsticas.

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    A escola tem 6 salas (5 salas de aula e uma de informtica), funciona das 7h s 23h,totalizando 16 turmas, totalizando 449 alunos. Atende Educao Infantil (alunos de 3 a 5anos de idade); Ano Inicial da Educao Fundamental (6 anos); Educao Fundamental (7a 10 anos) e Educao de Jovens e Adultos (no perodo noturno). A equipe de gestores formada por: diretora, professora coordenadora e professora referncia de ciclo; so 18professoras; 2 formadores de Arte-educao; um funcionrio administrativo; 10 funcionrios,

    responsveis pela alimentao escolar (3), limpeza e manuteno (3) e controle de acesso escola (4).H um Conselho Escolar, composto por pais ou avs de alunos; professores (eleitos

    por seus pares) e diretora. Nessa escola, o Conselho Escolar muito atuante; pais eprofessores participam das decises e atividades realizadas na escola. Muitas crianas socuidadas pelos avs, da a grande participao destes na escola.

    O que mais chama a ateno, no entanto, o clima alegre e receptivo das pessoas;o som de vozes e cantos de crianas; a circulao de gestores, professores, funcionrios,mes e alunos pela escola. H movimento, atividade, liberdade e, principalmente, alegria,que convivem harmoniosamente com um espao organizado e bem arrumado.

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    nesse espao que a escola realiza seu trabalho pedaggico, que envolve toda acomunidade escolar, criando condies para a aprendizagem e o desenvolvimento integralde seus alunos, com um trabalho criativo, participativo e inclusivo. Uma das razes para osucesso desse trabalho que a escola tem um Projeto Pedaggico vinculado ao ProjetoPoltico-pedaggico da Secretaria de Educao, e este tem nos Programas de Arte-educao uma das bases do currculo e da formao de educadores.

    O trabalho pedaggico da escola

    Nas muitas conversas com os educadores, alunos e pais, todos falam da qualidadedo trabalho pedaggico da escola e do envolvimento de todos nas atividades realizadas.Todos parecem ter conscincia de que naquela escola oferecida uma educao dequalidade e tm orgulho disso. Por esse motivo, talvez, todos querem falar e mostrar o que realizado. Ao falarem, jamais o relato sobre o prprio trabalho, mas sempre sobre osresultados da participao do grupo, utilizando todos os recursos, humanos e materiais,disponveis na escola, na SME e no municpio. So muitos os exemplos que mostram que

    esses recursos so utilizados com criatividade e originalidade, tendo sempre em vista a vidaescolar de seus alunos.

    O xito dessa escola resultado de muitos fatores. uma escola que tem umProjeto Pedaggico voltado para a aprendizagem do aluno; professoras, gestoras e paisenvolvidos com a escola; participao dos educadores nos programas de formao eeventos oferecidos pela Secretaria de Educao; atividades participativas e coletivas;incluso da Arte-educao no trabalho pedaggico; e, sobretudo, relaes de cooperao,respeito e solidariedade entre educadores, alunos e pais.

    A gesto da escola realizada por um grupo composto por diretora, professora-coordenadora e professora referncia de ciclo8. A primeira impresso que se tem aoadentrar o espao da escola a integrao entre as gestoras, que trabalham juntas, cadaqual exercendo sua funo especfica, mas tendo como foco as atividades pedaggicas da

    8A gesto escolar formada por diretora, professora coordenadora (responsvel pela coordenao pedaggica) e professorareferncia de ciclo (responsvel pela integrao dos projetos pedaggicos da escola entre os professores e os alunos).

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    escola como um todo. Percebe-se que o compromisso com a aprendizagem dos educandos a diretriz do trabalho desenvolvido, baseado na troca de experincias, discusso, reflexoe tomada de decises com base no consenso. As relaes entre as gestoras e entre estas ea comunidade escolar baseada no respeito mtuo e tem como foco a construo de umaescola que oferea um ensino de boa qualidade, que busca garantir a aprendizagem e odesenvolvimento de todos: alunos, educadores, funcionrios e famlias.

    A diretora, Zenaide Evangelista Clemente Cobucci, uma pessoa muitocomprometida com a educao e com a comunidade escolar, ativa, organizada, alegre,gentil e sensvel. A professora referncia de ciclo9, Miriam Augusto da Silva, algum queconsegue articular com muita eficincia sua formao em educao fsica, artes cnicas epedagogia com o Projeto Pedaggico da escola e, principalmente, com os Projetos de Arte-educao, com competncia e sensibilidade. A elas soma-se o trabalho da professoracoordenadora, Antonieta de Melo, que se ocupa da integrao entre os professores pelatroca de experincias, reflexo e busca de solues para os problemas pedaggicos docotidiano escolar. Cada uma delas tem sua funo especfica, mas suas aes socompartilhadas e h participao delas em todas as atividades desenvolvidas. Para falar daatuao de cada uma delas necessrio contar um pouco sobre essas educadoras.

    Trabalhando h muito tempo na SME, Zenaide Evangelista Clemente Cobucciocupou vrios cargos na administrao e assumiu a direo dessa escola h um ano. uma pessoa participativa e muito comprometida com a educao e com a escola, sobretudoem fazer dela uma escola de boa qualidade, com a participao de toda a comunidade.Chama a nossa ateno seu entusiasmo e a maneira apaixonada de falar sobre os alunos,os projetos, o trabalho coletivo da escola.

    Antonieta de Melo uma professora que assumiu a coordenao pedaggica daescola recentemente, afirmando que esse o tempo de conhecimento que tenho do projetopor meio dos relatos das professoras e direo, que sempre falam com grande entusiasmosobre o que a escola faz, relacionado Arte-educao. Ela traz uma grande experinciaem Educao de Jovens e Adultos, o que lhe d uma sensibilidade especial para pensar aescola como um espao de incluso de todos os educandos, rompendo com preconceitos e

    estigmas. Apesar do pouco tempo, ela apia os Projetos de Arte-educao, vendo nelesuma possibilidade efetiva de promover uma educao realmente inclusiva.Miriam Augusto da Silva est h 3 anos nessa escola e uma das responsveis

    pelo desenvolvimento dos Projetos de Arte-educao, uma grande incentivadora eentusiasta do trabalho realizado, exercendo um papel fundamental na criao edesenvolvimento das atividades. Sua histria pessoal e profissional est muito ligada aotrabalho que ela desenvolve na escola.

    Conversando com elas, chama a ateno o uso recorrente do pronome ns. Opronome eu s utilizado quando elas se referem a fatores pessoais. Isso revela,sutilmente, o padro das relaes entre elas e as atividades desenvolvidas na escola.

    Essas caractersticas tambm se revelam nas relaes entre elas e as professoras,funcionrios, alunos e seus familiares. Atitudes de cooperao, respeito e considerao

    parecem caracterizar as relaes estabelecidas entre toda a comunidade escolar. Miriamfala da participao dos pais e das mudanas que essa participao provoca neles e nosalunos:

    H uma das mes que participam, colaboradora, tudo o que pede elabusca. No comeo era uma me muito distante; hoje fica dois perodos naescola, um como me e um perodo como aluna da EJA [Educao deJovens e Adultos]. Seu filho est satisfeito, demorou a se alfabetizar, hojeescreve texto, se expressa quando tem oportunidade.

    9 A SME adota o sistema de ciclos, com base nos Tempos da Vida, que, segundo Arroyo (1996), permite ao aluno um tempomais longo e flexvel para sua formao do que o sistema de seriao, respeitando a individualidade de cada educando emseu processo de desenvolvimento. O professor referncia de ciclo faz parte da equipe gestora da escola e tem a tarefa deintegrar as atividades pedaggicas entre os alunos dos diversos estgios e os professores.

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    Todos os educadores dessa escola fazem ou j fizeram todos os cursos oferecidospela Secretaria de Educao10. Os professores so incentivados a fazer os cursos esocializar depois suas aprendizagens com os outros docentes da escola, o que ocorre nosencontros coletivos, realizados nas horas-atividade11. Alm dos cursos de Arte-educao(Teatro, Dana, Artes Plsticas, Canto Coral e Contar Histrias), os professores dessaescola participam dos cursos de lnguas (espanhol, italiano, francs, ingls e Libras),Informtica, Pr-letramento (sobre alfabetizao; quase todos os professores da escolaparticipam desse curso), Educao Infantil, Ano Inicial (formao pedaggica para ainsero de crianas de 6 anos em sua transio para o Ensino Fundamental), Cincia Hoje(curso que visa divulgar os conhecimentos cientficos e incentivar a atitude investigativa),Estrada para a Cidadania e outros.

    Alm dos cursos, a Secretaria de Educao promove vrios eventos ao longo doano, como as Semanas da Educao; Semana da Conscincia Negra; Festa das Naes;Semana da Ptria; Semana de Artes, Cincia e Tecnologia; Semana do Livro e do ContarHistrias e muitas outras, cuja finalidade oferecer a oportunidade de ouvir e debater temasde interesse educacional, cultural e cientfico com especialistas; expor os trabalhosrealizados nas escolas por alunos e professores; incentivar a troca de experincias entreeducadores e divulgar os trabalhos realizados para a comunidade em geral. Todos os

    educadores dessa escola participam dos eventos realizados pela Secretaria, no apenascomo ouvintes, mas tambm como expositores. marcante o fato de que todos os eventosda Secretaria de Educao tm em sua programao a apresentao de atividadesculturais realizadas por alunos; a Escola Municipal Evanira Vieira Romo uma das escolasque sempre apresentam suas produes artsticas, reconhecida por todos pela qualidade ecriatividade de suas apresentaes.

    10 Os cursos que compem o Programa de Formao Permanente, oferecidos pela SME, so criados, organizados eadministrados pelo Departamento de Orientaes Educacionais e Pedaggicas. Esses cursos so oferecidos a todos oseducadores da Rede de Ensino, gratuitamente, de livre escolha pelo educador, no sendo, portanto, obrigatrios. A freqnciaaos cursos contada para ascenso no Plano Carreira Docente.11Todos os professores tm uma jornada semanal de 25 horas, das quais 20 horas so dedicadas ao trabalho direto com osalunos e 5 horas-atividade, para encontros de discusso, reflexo e aprofundamento pedaggico, sob a coordenao daprofessora coordenadora.

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    A diretora da escola acredita que os educadores devem aproveitar ao mximo esses

    cursos e eventos; para isso, ela os incentiva e cria condies para que todos possam delesparticipar. Ela diz que essas atividades so muito importantes para a melhoria do trabalhopedaggico, pois alm de contribuir diretamente para a aprendizagem dos alunos, contribuitambm para o professor como pessoa, pois eles se transformam nos cursos; o professor,como aluno desses cursos, participa como sujeito ativo, como quem capaz de fruir eproduzir arte. Nessa escola, h professores que fazem parte do Coral Educano, formadoapenas por professores, de peas de teatro e outras atividades artsticas da Secretaria.Como afirma a diretora, todos participam de tudo.

    Os saberes adquiridos por cada professor nos cursos so compartilhados notrabalho cotidiano. Cada professora tem sob sua responsabilidade uma classe, umagrupamento de alunos; entretanto, elas no trabalham apenas com seus alunos, mas comos alunos de outras professoras, compartilhando com eles os saberes que elas dominam

    mais, que tm maior afinidade e facilidade para trabalhar. Os alunos tm contato com vriosprofessores, assim como os professores conhecem e se relacionam com um grupo maior dealunos, permitindo um maior entrosamento entre todos. Com isso, cria-se para o conjuntode alunos a experincia comunitria e para os professores a importncia do trabalho emequipe.

    O que percebemos nas visitas escola que ela funciona como uma comunidadereal. Isso se mostra de vrias maneiras, at em coisas muito simples. Logo na entrada daescola h um grande painel de fotografias que retrata as atividades desenvolvidas pelaescola; aparecem nessas fotos alunos de todas as turmas, em atividades diversas, em salade aula, no ptio, em passeios e em apresentaes pblicas; aparecem professores,gestoras e funcionrios e, muito significativo, o fato de que em vrias fotos aparecem pais,avs e irmos dos alunos na escola, ora assistindo apresentaes dos alunos, oraparticipando das atividades da escola.

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    interessante notar que, alm do uso constante do ns, nas falas das educadorasuma palavra o tempo todo repetida: todos. Elas falam de todos os alunos, todos osprofessores, toda a escola, assim como falam de todos os cursos, todos os eventos... Comodiz a diretora:

    (...) na verdade um movimento de todos da escola. a escola comoum todo, so todas as crianas, todos os educadores, incluindo desde oagente de portaria, a cozinheira, a menina da limpeza, todos. Quando voctrabalha Arte-educao na escola, voc movimenta a escola. Tem o pai quetraz o filho em horrio diferente para uma apresentao. Vem para assistir aoensaio. (...) Todos se movimentam, desde o pessoal da limpeza que sepreocupa com a limpeza do ptio, o pessoal da merenda colabora, pois podeocorrer atraso para o horrio do almoo. A escola tem que acreditar. togostoso quando voc v o pessoal parando o servio para assistir... Sintoque eles tambm acreditam e comeam a fazer parte, por isso a Arte-educao um movimento da escola. Todos trabalham e colaboram.

    O projeto mudou a cara da escola, ele movimenta a escola, desde o

    agente de portaria at o diretor. Quando h ensaio, a escola toda semovimenta naturalmente. Todas as pessoas se soltam mais, no s ascrianas, mas todos os funcionrios da escola. As pessoas estoacreditando mais na arte, no s os pais, mas os alunos, funcionrios.

    Uma foto estampada na tela do computador da sala das gestoras revela a fora davida comunitria na escola. Nessa foto esto todas as educadoras da escola, em pose quedemonstra satisfao e camaradagem, num passeio por elas realizado a um espao depreservao ambiental. Percebe-se que h entre elas laos de companheirismo queultrapassam as relaes de trabalho.

    muito interessante que as educadoras, ao falarem sobre os projetos realizados,contam que alguns alunos revelaram desempenho excepcional em alguma atividade,

    principalmente em alguma expresso artstica. Falam de crianas que revelaram um jeitoespecial para o teatro, uma habilidade para a msica e outros tantos casos muitointeressantes. Mas, elas tambm falam, com muito orgulho, de educandos que tinhamalgum tipo de dificuldade e que, por sua participao nesses projetos, passaram pormudanas importantes, demonstrando melhoria no processo de aprendizagem edesenvolvimento, inclusive superando muitos problemas.

    Nessa escola, para participar dos projetos de arte, os alunos no so escolhidospor suas habilidades, para produzir um resultado de alto nvel tcnico-artstico. Aocontrrio, nessa escola, todos os alunos so incentivados e estimulados a participar detodas as atividades, mas a escolha feita pela criana. O que interessa a participao dacriana numa atividade prazerosa e produtiva, para que ela possa revelar, desenvolver eaperfeioar suas potencialidades, que podem ser desconhecidas at por ela prpria e,

    sobretudo, por professores e famlia. Essa atitude, ainda que parea simples e bvia, muito importante para uma educao realmente inclusiva, como diz Antonieta de Melo, aprofessora coordenadora:

    Quando vejo o projeto acontecendo na rede, penso na incluso. AArte-educao um grande leque que possibilita a participao de todos,independente de crena, de condio social, independente da leitura e daescrita. Ele [o aluno] comea a se apropriar da fala, do conhecimento dooutro e toma liberdade para se expor por meio da arte. Ao se apropriar daarte, percebe que tem capacidade para aprender o que parece toimpossvel: a leitura e a escrita; e descobre que por meio da escrita quepode registrar o que acontece na sua vida cotidiana. Ao trabalhar em grupo,no qual todos tm a oportunidade de participar pela fala, canto, dana, ele

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    percebe que diferente e que para ser aceito preciso respeitar a diferenado outro.

    O resultado dessa atitude pode ser comprovado na aprendizagem e no expressivodesenvolvimento observado nos educandos, principalmente naquelas crianas quepoderiam vir a ser vtimas do processo de produo do fracasso escolar.

    Os projetos de Arte-educao tm papel privilegiado no Projeto Pedaggico dessaescola e permitem concretizar uma efetiva educao inclusiva. Eles esto incorporados atodas as atividades dessa escola. A Construo do Bom Cidado foi o tema-gerador doProjeto Pedaggico da escola em 2007; em torno dele todas as atividades da escola foramdesenvolvidas. Segue abaixo um quadro com os projetos desenvolvidos pela escola em2007.

    PROJETOS 2007 TEMA GERADOR: CONSTRUO DO BOM CIDADO

    . Alfabetizao Significativa

    . Construo da histria

    . O cidado conhecendo o mundo, descobrindo seus espaos e direitos (visita ao Poupatempo RG, visita aoCorreio carta social)

    . Danas Folclricas (culminncia na Festa Junina)

    . Casa de brinquedos - dana, teatro, canto coral e artes plsticas

    . Projeto Tamar (preservao de tartarugas marinhas)

    . Cincia Hoje

    . Estrada para a Cidadania

    . Movimento: resgate de brincadeiras, cantigas, jogos e danas

    . Canto Coral

    . Ciranda da leitura Proposta de leitura em casa com a participao dos pais

    . Leitura de fruio

    . Leitura (Visteon): cidadania e folclore

    . Jogo do bom cidado

    . Trazendo o teatro para a escola - como a reciclagem pode gerar frutos

    . Histria do bairro

    . Informtica Educativa

    . Compartilhando a leitura ensinando a ler livros mais extensos, por partes, com questionamento, interpretao ecrtica (parceria com o Lions Clube de Guarulhos)

    . Correspondncia intercmbio com alunos da Escola Municipal Manuel de Paiva

    . Paulo Freire Pesquisa, elaborao de palestras feitas pelos educandos, confeco de cartazes e adereos dodesfile de sete de setembro - culminncia na escola e na avenida (participao de toda a comunidade escolar)

    . Projeto Itinerante de Educao para o Trnsito Cidade Mirim

    . Campanha de combate aos roedores (com a Secretaria de Sade - Diviso Tcnica de Zoonoses)

    . Implantao do Self-Service: valorizando o espao da alimentao

    . Projeto Histria do Bairro

    . Feira de Arte e Cultura

    PROJETOS DESENVOLVIDOS EM RODZIOS DE PROFESSORES E ALUNOS. Espanhol/Literatura. Contar Histrias/Brincadeiras. Contar Histrias/Msica. Ingls/Artes. Jogos Matemticos/Contar Literatura

    PARTICIPAO EM EVENTOS DA SECRETARIA DE EDUCAO. Encontro de Corais. Dia do Desafio. Semana da Educao (com a apresentao de Casa de Brinquedos, no Teatro do Centro Municipal de Educao

    Adamastor e Praa Getlio Vargas). Apresentao de Casa de Brinquedos, no Encontro com Entidades Conveniadas, no Teatro do Centro Municipal

    de Educao Adamastor. Desfile de 7 de setembro. Mostra EJA (educao de Jovens e Adultos), no Teatro do Centro Municipal de Educao Adamastor. Encontro de Corais II. Semana da Conscincia Negra

    ATIVIDADES DESENVOLVIDAS EM HORRIO EXTRA-AULA. Iniciao musical e flauta aulas de flauta (o professor um pai, voluntrio, participante do Conselho Escolar,

    Militar, msico da Banda do Exrcito)

    . Iniciao Musical com Maestro Marcio Demazo Teatro do Centro Municipal de Educao Adamastor, aossbados

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    PALESTRAS. Pediculose e Verminose com pediatra voluntria. Cdigo do Consumidor Procon- DST/AIDS Secretaria da Sade

    Este quadro mostra a riqueza das atividades desenvolvidas pela escola; os muitostemas trabalhados; a articulao entre eles; a preocupao com questes afins ao processode escolarizao, como sade e trnsito por exemplo; temas de natureza social; tendo, noentanto, como prioridade a garantia do ensino efetivo das matrias escolares. Percebe-se anfase na alfabetizao envolvendo leitura e escrita e na matemtica, chamandoateno a maneira como os contedos so tratados, a partir de atividades prazerosas esensveis, tornando-se efetivamente significativas tanto para educandos como paraeducadores.

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    Uma experincia de arte-educao: Casa de Brinquedos

    A montagem da pea teatral Casa de Brinquedos uma das atividadesdesenvolvidas na Escola Municipal Evanira Vieira Romo. Essa experincia nasceu dainiciativa de duas professoras, Maria Regina Mendona de Alvarenga Dini e Maria CliaMendona de Alvarenga12, e do apoio da professora Miriam, com a participao de toda acomunidade escolar. Esse trabalho faz parte do Projeto Pedaggico da escola, articuladoao Projeto Poltico-pedaggico da Secretaria de Educao, incluindo os Programas deFormao de Professores e, dentro destes, os Programas de Arte-educao. Esse trabalhofoi escolhido para ser aqui narrado, pois revela as possibilidades de um trabalho

    pedaggico que pode ser, alm de um importante meio para o enfrentamento do fracassoescolar, uma experincia de aprendizagem para todos.O Projeto Casa de Brinquedos13 foi desenvolvido em 2007. O primeiro projeto do

    grupo foi a montagem de Os Saltimbancos14, em 2005; depois, em 2006, Panos eLendas15. As educadoras consideram que o trabalho realizado um processo deconstruo que vem sendo realizado ao longo desses trs anos, que vai se somando,crescendo e melhorando no s a qualidade da apresentao, mas o envolvimento e aaprendizagem das crianas que, nesse processo, se desenvolvem significativamente.Acreditam que esse processo de construo que leva, a cada ano, as crianas a sedesenvolverem e participarem cada vez mais das atividades dos Projetos de Arte-Educao.

    12Maria Regina Mendona de Alvarenga Dini e Maria Clia Mendona de Alvarenga so irms gmeas, tm muito em comumem suas trajetrias profissionais, concepes de educao e prticas pedaggicas. Elas trabalham na mesma escola e soparceiras no Projeto Casa de Brinquedos e em outros que foram realizados, assim como participam do Coral Educano. Asduas professoras tm formao em Magistrio (nvel mdio), cursaram Pedagogia e so ps-graduadas em EducaoEspecial. Elas sero chamadas, respectivamente, de Regina e Clia daqui por diante.13Pea teatral infantil, de gnero musical, com trilha sonora desenvolvida pelo cantor e compositor Toquinho, estreada em1999.14Pea teatral infantil, de gnero musical, com texto de Sergio Bardotti, msica de Luiz Enriquez e traduo e adaptao deChico Buarque, inspirada em Os msicos de Bremen, dos Irmos Grimm.15 Essa pea conta a histria entre o comeo e o fim do mundo, com mestres de cerimnia e contadores de histrias,abordando costumes, crendices, cantos e brincadeiras do folclore brasileiro, utilizando-se de canto e dana, tendo comofinalidade mostrar nossa cultura e razes. So utilizados panos (tecidos) variados que so manipulados pelos atores, criandono palco cenrios e personagens.

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    A professora Miriam narra a origem e o desenvolvimento do Projeto Casa deBrinquedos como atividade pedaggica construda coletivamente. Diz ela sobre a origem

    do projeto:O projeto Casa de Brinquedos continuidade de um projeto que

    fizemos h trs anos atrs, em uma parceria com a professora Regina;fizemos uma adaptao dos Saltimbancos. Ela trabalhou canto-coral e eutrabalhei artes-cnicas (quando adaptei os textos), pois percebi que era umaforma de as crianas conhecerem os textos da dramaturgia. Essas crianas[j] estiveram comigo [antes].

    A professora Regina, h 18 anos havia levado seus filhos para assistirCasa de Brinquedos, ela gostava muito do texto, da montagem, mas eu noconhecia a montagem, foi quando encaminhamos um e-mail para oToquinho. Seu irmo nos respondeu e enviou uma fita sobre a montagem da

    Casa de Brinquedos. Fiz adaptao textual, selecionamos as msicas, asprofessoras Regina e Clia trabalharam o coral. O marido de uma delas fez oarranjo, ns montamos o CD.

    O maestro Vanderlei Banci, responsvel pela formao em Canto Coral, para alunose professores, conta como iniciou o Projeto Casa de Brinquedos:

    Na Escola Evanira, ns temos duas professoras; o marido de umadelas toca violo. E eles comearam a fazer um trabalho com a escola,montando a pea do Toquinho [Casa de Brinquedos]. uma pea queenvolve vrios aspectos: musical, cnico, artes plsticas e dana.

    Foi um trabalho associado, porque as professoras trabalharam bem a

    parte musical da pea, e o marido de uma delas, que toca violo,acompanhou, dando apoio. E a [a idia] casou com os outros projetos eficou super bacana. Eles escolheram duas peas com as quais as crianasse identificaram muito; eles criaram um vnculo com a msica. Fizeram antesSaltimbancos e neste ano Casa de Brinquedos.

    A Professora Regina relata que, para a Casa de Brinquedos, especificamente, tevetodo um trabalho antes [da apresentao]. Segundo ela, ambas conheciam as msicas deToquinho, autor da pea, mas no conheciam o enredo, embora ela j tivesse assistido comos filhos. Para ter acesso ao texto da pea, ela conta:

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    (...) eu, muita atrevida, mandeium e-mail para o site do Toquinho,perguntando aonde poderia encontrar oenredo da pea. Mandei [o email]achando que no ia ter resposta, quandoveio a surpresa: o irmo do Toquinho,que empresrio dele, respondeu quetinha uma fita em VHS, de umamontagem caseira da pea, e que eupoderia ir casa dele, em So Paulo,buscar a fita.

    Elas foram buscar a fita, a professora Miriam fez o enredo e a montagem da pea, eas duas professoras se ocuparam do desenvolvimento da parte musical. Como no dariapara fazer a montagem da pea inteira, pois ficaria muito extensa, delegaram aos alunos adeciso de escolher as msicas que iriam ser includas para a apresentao; assim, os

    alunos foram envolvidos desde o comeo! Conheceram [a vida] do Toquinho, assistiram aofilme que [eles] mandaram, para depois realizarem as escolhas. Em outras palavras, essetrabalho no foi algo desenvolvido pelas professoras e imposto aos alunos; a presenadestes foi ativa desde o incio, implicando escolhas e participao.

    Esse projeto incorpora vrias expresses artsticas: artes cnicas, msica, dana eartes plsticas, envolvendo um complexo trabalho de pesquisa, adaptao, articulao dasvrias expresses artsticas num todo coerente, produo, sensibilizao das crianas e deseus pais para o projeto, ensaios, mudanas no cotidiano da escola para preparao eorganizao do trabalho e apresentaes na escola e em outros espaos pblicos. AProfessora Regina conta que o trabalho com o coral na escola j vem sendo desenvolvidoh trs anos, em uma parceria com o teatro, que trabalhado pela professora Miriam. Dizela:

    Tudo comeou h trs anos atrs. Na verdade, ns falamos ProjetoCasa de Brinquedos, mas no o projeto Casa de Brinquedos! um projetode unio entre teatro, msica e, esse ano, ns colocamos a dana e as artesplsticas tambm!.

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    A realizao de um projeto desse tipo envolve planejamento e organizao de vriasaes, o que exige disponibilidade e compromisso de todos, alm de uma atitude decoletivismo. As professoras contam as vrias providncias que foram tomadas antes doincio do trabalho com os alunos e todo o processo de criao e preparao para osensaios.

    Para a diretora Zenaide, os professores, principais mediadores entre os alunos e asatividades de arte-educao, so considerados por ela como pessoas que no apenascontribuem para o desenvolvimento dos alunos, mas tambm eles se transformam.Segundo ela, todos crescem, todos aprendem e se transformam. Diz ela:

    Temos um grupo de educadores otimistas e quando paramos paraavaliar o trabalho com arte sempre nos surpreendemos com o progresso dascrianas, elas foram alm das nossas expectativas. Todos crescemos,comeamos a falar a mesma linguagem.

    Para a diretora, os pais tambm so chamados a participar, so informados esensibilizados para cooperar e fruir dos resultados:

    Fazemos uma reunio e apresentamos o projeto aos pais, que soinformados sobre o que est acontecendo. Nos ensaios e apresentaescontamos com a participao [deles].

    H uma preocupao em fazer da atividade algo significativo para a criana e esse um dos traos marcantes do projeto, assim como a preocupao com a construo coletivada pea, o que se percebe no trabalho de desenvolvimento dos personagens. Uma dasatividades bsicas a elaborao do texto pelos professores e a leitura pelo aluno. AProfessora Miriam conta como ocorre o processo de criao e produo da atividadeartstica:

    A partir do texto fazemos a adaptao, montamos o dilogo e osalunos realizam a leitura. Quando iniciamos a parte cnica, os alunos j novo com o texto; cada criana d o prprio significado para as falas, que vose modificando de acordo com o que cada criana assimilou. Dasbrincadeiras de improviso so retiradas as marcas e a construo dospersonagens. Interfiro nos gestos, expresses dos sentimentos; brincandoconstrumos. O interessante que tem uma criana que faz um personagem,mas todos os outros sabem sobre esse personagem. Quando uma crianafalta, os outros podem assumir o seu papel.

    So trabalhados a expresso corporal, o movimento e a musicalidade e, ao mesmotempo, os alunos se divertem e aprendem. Assim, promove-se o desenvolvimento e a

    melhoria da auto-estima, autonomia e confiana da criana; isso contribui no apenas parao desempenho escolar, mas se estende para a vida como um todo. A professora fala sobreisso ao descrever a maneira como se trabalha a dana no projeto:

    Na dana cada um faz um gesto, depois imitamos os movimentos unsdos outros e da surgem os gestos que iro para a coreografia. Eles ficamfelizes, sentem prazer porque o projeto sai deles. O projeto trabalha adesenvoltura, auto-estima, prazer em estar na escola, auto-confiana. Elesno demonstram insegurana em participar. Crianas que no incio noqueriam participar hoje participam.

    Ao se referir aos Projetos de Arte-educao, associa-os sempre s idias decoletividade e movimento, diz Miriam: (...) na verdade um movimento de todos da escola. a escola como um todo.

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    A sensibilizao para a participao das crianas faz parte do trabalho daseducadoras, mas elas tambm consideram e respeitam a escolha de cada um. Assim, exercido na prtica um dos princpios da educao inclusiva: o reconhecimento, respeito eacolhimento das diferenas individuais, que implica no s a aceitao de quem no querparticipar, como o reconhecimento das habilidades individuais das crianas e a criao deoportunidades para que seus potenciais sejam desenvolvidos, como diz Miriam:

    Na primeira montagem poucas crianas queriam participar; teve umque comeou e depois desistiu, outro que no queria no primeiro momento edepois quis participar. H crianas que querem sempre. Sempre deixo queeles decidam entre participar ou no. H os talentos; por exemplo, a An.16tem um talento artstico: em todas as montagens ela aparece, tem muitapropriedade de fala e colabora muito com o processo. Temos que olhar osdois lados, no podemos desprezar os talentos e nem os que tmdificuldade. Tinha uma criana que no falava e quis participar do sorteio deum personagem com muita fala. Ser que essa menina vai agentar apresso? Hoje em dia ela canta. Voc olha e pensa que ela no faz, ela

    tmida, mas se prope e faz.O trabalho desenvolvido ao longo de todo o ano e envolve muitas atividades,

    ligadas entre si e com outras que tm tambm outros objetivos, promovendo uma efetivaintegrao de saberes e fazeres, que de forma ldica e prazerosa vo envolvendo os alunose contribuindo para seu processo de escolarizao. A professora Regina relata como se desse processo:

    Para finalizar [o projeto], ns trabalhamos o ano inteiro. Voc vaitrabalhar um texto, voc pega uma msica... [Assim, os alunos] nopercebem que eles tm a obrigao de fazer, de aprender. uma coisa tolivre, to natural, que o contedo flui naturalmente. [Por exemplo], demos

    uma atividade com gneros textuais, com base em uma fbula; elespoderiam utilizar qualquer gnero textual para contar aquela fbula, e muitosutilizaram a msica. Uns criaram a msica, outros pegaram uma msica daCaixa de Brinquedos e colocaram a fbula em cima da msica, [ou seja],uso do mesmo ritmo como suporte de criao.

    As crianas apresentaram o projeto Casa de Brinquedos pela primeira vez noEncontro de Corais, a convite do Maestro Vanderlei Banci17, e isso teve um forte impactosobre elas, como conta a Professora Regina:

    A primeira participao nossa foi no Encontro de Corais, que oprofessor Vanderlei nos convidou. Esse Encontro de Corais , na verdade, a

    apresentao [dos projetos] montados pelas professoras que fazem parte doEducano18em suas escolas, e que levam para o Encontro de Corais. Sque ns no fomos s com o coral, ns fomos com o coral e o teatro juntos![Levamos] um trecho da Casa de Brinquedos, que estava bem no comeo(...). A, quando ns voltamos, fomos a nica escola com teatro e coral; asoutras s tiveram coral. O A., [um aluno, dizia] assim: Arrasamos!Arrasamos!

    16Todas as crianas sero aqui identificadas com iniciais, para que no sejam identificadas, respeitando aos critrios da tica em pesquisa,j que algumas delas sero retratadas a partir de problemas se escolarizao ou sade que a acometeram.17Arte-educador que ser apresentado adiante.18Educano um coral formado pelas professoras que esto no estgio mais avanado da formao em Canto Coral, sob acoordenao do Maestro Vanderlei Banci.

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    O maestro Vanderlei Banci, falando do trabalho da Escola Evanira Vieira Romo,lembra que so promovidos os Encontros de Corais, eventos nos quais os professorestrazem seus alunos para se apresentarem para pblicos externos escola; nessesencontros h uma inverso de papis, pois o professor passa a ser o maestro e as crianasos cantores. Esse um momento importante para se verificar a extenso do trabalhodesenvolvido por ele nos cursos oferecidos aos professores, pois neste ele o maestro e osprofessores so os cantores; na escola, os professores tornam-se maestros e os alunosassumem a funo de cantores. Dessa maneira, o trabalho se amplia, de maneira que cadaprofessor que faz o curso pode multiplicar as atividades desenvolvidas e, principalmente,criar novas atividades com os alunos da escola. Esse foi um fenmeno demonstrado nessaescola, pois as professoras trouxeram o que aprenderam no curso, mas ampliaram criarampara muito alm do que o curso em si oferecia.

    A Professora Clia recorda a fala de um aluno, que disse: Professora, toda vez queeu escutar a msica Aquarela, eu vou me lembrar de voc. Segundo ela, porqueAquarela foi a msica que eles mais gostaram de cantar. Conta a Professora Regina quetoda vez que havia um evento na escola e a diretora pedia uma msica para eles cantarem,eles sempre escolhiam Aquarela. O gosto por essa msica foi ainda mais longe, como

    conta a Professora Clia, pois na festa do final de ano, na confraternizao entre alunos eprofessores, para a surpresa delas, dois alunos apareceram com violo:

    Durante nossas apresentaes, o marido da Regina tocava violo. Nstnhamos alguns alunos que estavam aprendendo violo e que ficavamperguntando para ele que nota ele fazia [ao tocar a msica]. Noencerramento, no tinha nada marcado, mas eles tocaram Aquarela nopalco. Eles comearam a tocar Aquarela e a crianada toda comeou acantar.

    A Professora Regina relata que, muitas vezes, durante os ensaios, em vez decantar, os alunos perguntavam as notas da msica e as anotavam, o que era incentivado

    por elas e pelo msico, Ismar Dini19

    .Ainda em relao s atitudes e comentrios dos alunos, a Professora Regina lembraoutro episdio interessante, relacionado s vivncias proporcionadas pelos projetos:

    Alm desse trabalho, eles danaram a Ciranda, na Semana daConscincia Negra e na Festa Junina. A ciranda foi trabalhada, a dana, oritmo... e quando ns fomos assistir o encontro de corais, no final do ano,uma escola apresentou uma ciranda, mas no era a mesma ciranda, erauma outra ciranda. Eu e ela, a bem da verdade, no tnhamos percebido queera uma ciranda, e veio um aluno nosso, dizendo: Professora, olha esseritmo! uma ciranda!. Quer dizer, ele transportou a aprendizagem que eleteve para um outro momento, para uma outra msica, que ele lembrou que

    era a mesma batida, o mesmo ritmo, de uma ciranda.

    A Professora Clia completa os dizeres do aluno: D at para fazer a dana igual anossa. Foi nesse momento que elas notaram que era bastante apropriado e estavarealmente correto o que dizia o aluno: Isso para ns muito gratificante!

    Deve-se destacar o trabalho realizado pelas educadoras com os pais, pois elasconsideram que importante que eles conheam o projeto, compreendam o significado daexperincia para a aprendizagem e o desenvolvimento de seus filhos e que, tambm,participem e contribuam com as atividades. Durante toda a montagem de Casa deBrinquedos, a escola manteve suas portas abertas para que os pais pudessem assistir aos

    19Ismar Dini, msico, marido da professora Regina e contribui voluntariamente com o desenvolvimento do projeto Casa deBrinquedos, fazendo os arranjos musicais e o acompanhamento da apresentao com violo.

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    ensaios das crianas, chamados de ensaio aberto. Os ensaios so realizados dessamaneira para que as crianas sintam-se mais vontade, que percebam o carter ldico daatividade, e no como algo obrigatrio, como historicamente tm sido sentidas pelascrianas as atividades rotineiras da escola. Para as crianas isso foi muito importante,segundo a Professora Regina, pois, dessa forma, tinha que sair tudo certinho, porque tinhagente assistindo. Mas se tivesse que parar, parava; ns corrigamos, e eles ficavamcontentes.

    Para ambas as professoras, o projeto algo que saiu dos muros da escola, pois ascrianas levam para casa e os pais acabam se envolvendo tambm. Um outro fatorimportante para o sucesso desse projeto que as msicas da pea so conhecidas pelospais; como diz Clia:

    [Como] o Toquinho mais da gerao dos pais dos alunos, ento foi

    um projeto que, alm de envolver os alunos, envolveu os pais! Issocontribuiu para que os pais se recordassem dos tempos de infncia. [Elaouviu] algumas falas, como: Eu adorei [o projeto]! Porque meu filho, agora,s quer escutar Toquinho e eu adoro o Toquinho!.

    Para Miriam, os projetos da escola atraem os pais; que passam a freqentar oespao escolar como pessoas que a ele pertencem, que so acolhidas, respeitadas echamadas participao. comum as escolas queixarem-se da pouca participao dafamlia; entretanto, quando a famlia acolhida como parte integrante da vida escolar e,principalmente, para participar e ver as possibilidades de desenvolvimento de seus filhos,sua presena passa a ser rotineira. muito interessante o depoimento da professora, queconta como uma me tornou-se, tambm ela, aluna da prpria escola:

    H uma das mes que participam, colaboradora, tudo o que pede elabusca. No comeo era uma me muito distante; hoje fica dois perodos naescola, um como me e um perodo como aluna da EJA [Educao deJovens e Adultos]. No desfile, ajudou muito. Seu filho est satisfeito,demorou a se alfabetizar, hoje escreve texto, se expressa quando temoportunidade.

    A Professora Clia conta outra passagem que a surpreendeu, dessa vez relacionadas mes dos alunos:

    Algumas mes ensaiaram um coral, com as crianas, para elescantarem para ns, professoras, diretora e coordenadora! A me falava: Euno sei se assim, mas foi assim que a gente ensaiou. A me foi l na

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    frente, regeu o coral de alunos para ns. Uma homenagem que elas fizerampara ns! Isso mostra o quanto elas estavam envolvidas, participando dasatividades. Foi um trabalho do qual ns colhemos muitos frutos! Ficoumesmo marcado! Emocionada, uma aluna falou: Professora, ns fomosaplaudidos de p, professora!

    Esse trabalho, seja por proporcionar s crianas o acesso arte, seja pela maneiracomo foi realizado, com a participao ativa de educadores, alunos e pais, trouxe muitosfrutos. Entretanto, no mbito da aprendizagem que podemos perceber o quanto essaatividade foi importante principalmente para os alunos, inclusive permitindo a transfernciados contedos aprendidos para outras situaes de ensino.

    Embora a relao do projeto de arte-educao com a aprendizagem no seja anica dimenso e o nico motivo para o desenvolvimento desse trabalho pela escola, porsua importncia e pelo tema dessa narrativa, ser esta mais aprofundada a seguir.

    Casa de Brinquedos: Aprendizagem, enfrentamento do fracasso escolar e incluso

    Esse projeto mostra como o trabalho pedaggico pode ser enriquecido com a arte-educao. O acesso arte um direito de todos e faz parte do processo de humanizao.O trabalho com a expresso artstica propicia uma atividade prazerosa s crianas, fazendoda escola um lugar agradvel. Mas, alm disso, a arte pode ser um poderoso instrumentopara o trabalho pedaggico, contribuindo para a aprendizagem das matrias escolares. Aarte-educao incorporada s atividades escolares um facilitador da aprendizagem e, poresse motivo, um meio para o enfrentamento do fracasso escolar e, portanto, um instrumentopara evitar a excluso de milhares de alunos da escola. Em outras palavras, a arte-educao uma grande parceira para a realizao de uma escola verdadeiramenteinclusiva.

    Muitos so os relatos das educadoras da Escola Municipal Evanira Vieira Romo

    que mostram como a atividade de montagem da pea Casa de Brinquedos contribuiu para aaprendizagem dos contedos escolares pelos alunos, inclusive para muitos que estavamtendo problemas em seu processo de escolarizao.

    Segundo as professoras, a realizao das atividades dos Projetos de Arte-educaopermite demonstrar o quanto a msica, por exemplo, contribui para o processo dealfabetizao. Todos os alunos que participaram do projeto esto alfabetizados, comexceo apenas de dois que, no entanto, caminham para lograr essa condio. Com osalunos mais novos tambm se observa um significativo avano no processo dealfabetizao. Diz a Professora Clia:

    No ano passado, quando trabalhamos Panos e Lendas com oprimeiro e segundo estgios, no primeiro eles no esto alfabticos e no

    segundo ainda alguns no conseguem. [Mas] percebe-se o quanto elescrescem com a msica. A msica ajuda na alfabetizao! [No comeo],apesar deles lerem apenas alguns trechos que ficaram gravados da msica,no final do ano eles chegam lendo e escrevendo a msica [toda].

    Contam as professoras que, alm de canto, teatro, dana e artes plsticas, o ProjetoCasa de Brinquedos foi alm, pois foi levado ao trabalho de informtica. Elas relatam queos alunos estavam na sala de informtica, desenvolvendo um trabalho sobre histria emquadrinhos, quando uma das alunas (...) pegou uma das msicas da Casa de Brinquedose a transformou em histria em quadrinhos. Olha o que ela fez! No era essa a proposta; otema era livre. Segundo elas, isso fugiu das nossas expectativas e do nossoplanejamento. Partiu da aluna!. Vemos, nesse caso, o que se denomina transferncia deaprendizagem, isto , a criana aprende um determinado contedo ou habilidade e o aplicaa uma situao inteiramente nova.

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    Vrios casos so relatados pelas professoras, mostrando como esse trabalhoprovocou uma melhora real no desempenho escolar de muitos alunos. Miriam conta o casode vrias crianas que, com esse projeto, romperam com o ciclo vicioso da produo dofracasso escolar. Isso significa que projetos como esse podem reverter a situao deescolas que, pela maneira como organizam as atividades pedaggicas e tratam a crianadas classes populares, acabam por produzir o fracasso escolar. A criana passa a ser vistacomo portadora de dificuldades para aprender e se desenvolver, porque a escoladesconsidera seus saberes e suas necessidades. Nesse projeto, a escola que criasituaes e contribui efetivamente para que crianas que esto sob o risco do fracassoescolar possam superar suas dificuldades e desenvolver-se. Sobre isso, conta a professora:

    Na terceira montagem, tivemos outras surpresas que quero citar: Am.,C., D. e R. eram crianas com dificuldades de aprendizagem. Am. e C.vieram para a 2 srie e no estavam alfabetizadas. O projeto colaboroupara que se alfabetizassem. C. fez trs, quatro participaes diferentes; hojeela l e escreve.

    A grande surpresa neste ano foi a Ac., ela veio no primeiro estgio, no

    lia e no escrevia, no gostava da escola. No 2 ano j se sentiu integrantedaquele grupo, at perguntei se ela queria ficar comigo no 2 ano, mas elaquis ir com o grupo; o grupo passou a ter muita importncia na vida da Ac.Ela j fez montagem, fez vrias participaes, tivemos mais dois projetosque contriburam para a alfabetizao da Ac., um que o PAS Programade Alfabetizao Significativa, e outro que o Projeto Paulo Freire, no qualela se props a ser palestrante. Ela tinha uma relao difcil com alinguagem, mas soube falar a data e local de nascimento do Paulo Freire,falou do jeito dela, mas falou. Hoje est alfabtica, l, conhece todos os tiposde letras. A Ac. minha paixo, muito satisfatrio ver o resultado e avontade dela de vencer. Ela, muitas vezes, ficava dois perodos na escola.Aqui h vrias fotos dela como faxineira, estudante, bailarina, fazendo e

    vencendo.Jc. uma criana tmida, que hoje quis falar. G., que hoje se props afazer personagem com fala, venceu a timidez, seus prprios limites, pelanecessidade de fazer. A me deu um depoimento sobre a satisfao em vera superao dos seus prprios limites pela vontade do fazer.

    Temos crianas que sentem prazer em vir para a escola; socampees, porque se sentem capazes, querem dar idias, interferembastante no processo, fica uma aula bem agitada.

    Complementando, a diretora Zenaide diz que a arte-educao trata a todos de formaigualitria ao considerar e valorizar o potencial de cada aluno e isso tem um efeitoimportante sobre a aprendizagem, alm de tambm mostrar aos pais as possibilidades dos

    filhos. Diz ela:

    A arte-educao trata a todos igualmente, isso reflete tambm na salade aula. O aluno pensa que no vai conseguir e de repente ele pega omicrofone e comea a falar. At o mesmo o pai que no acreditava nopotencial do filho, se surpreende. Quando vemos as fotos dasapresentaes, constatamos que so vrios casos de crianas que tinhamdificuldade na leitura, na escrita, na matemtica e eles comearam a dar umretorno positivo depois que comearam a participar do projeto de arte-educao. A escola trabalha arte-educao o ano inteiro e o tempo todojunto s atividades curriculares normais.

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    A prpria professora Miriam, ao falar do projeto e da importncia do movimento e docorpo, lembra-se de problemas que tambm vivenciou em sua vida escolar e como a arte foiimportante para super-los:

    Sou formada em Educao Fsica. Acredito muito no movimento paraevoluo no aprendizado. Acredito muito na relao corporal com aaprendizagem. Fiz Artes Cnicas. Fui uma criana muito tmida e sei queessas tm poucas oportunidades. O que passei na minha vida escolarprocurei mudar na minha sala de aula. Voc no pode deixar de acreditar nacriana s por que ela no fala ou no consegue levantar a mo na hora quetodo mundo levanta. Por isso, tenho um olhar para a criana tmida, que temvontade e no consegue se colocar. Quando comecei a fazer teatro, comeceia falar, graas a Deus! Quando tinha 10 anos, uma pessoa foi fazer arte-educao na escola e acabei me interessando. Quando minha me me viufalando, ela chorou, pois achava que eu no era capaz de falar. O teatro, naminha adolescncia, me trouxe muitos benefcios como, por exemplo, ler efalar em pblico. Fui uma criana mal alfabetizada, apresentava troca de

    letras. O teatro me possibilitou superar a timidez. Agora mesmo ministreiuma palestra e eu no gosto de falar ao microfone, gosto de falar mais solta,mas hoje pensei: vou falar ao microfone, questo de pensar que voc vaivencer. As crianas passam pelo mesmo que eu passei.

    Entre as vrias experincias e casos contados pelas educadoras, vale a penadestacar a maneira como crianas com diferentes tipos de deficincia so includas nasatividades, participando delas ativamente, integrando-se coletividade escolar, contribuindocom suas participaes e, principalmente, vivenciando situaes que promovem suaaprendizagem e seu desenvolvimento. muito interessante que, sendo a msica umaexpresso que percebida pela audio, as professoras contam como incluem uma crianasurda nas atividades que, primeira vista, estaria fora do alcance dela, como conta Clia:

    Ns tnhamos uma aluna que tinha deficincia auditiva e ela participoutanto do coral como da dana (...). Ela chegou a puxar a fila! Ela era muitoobservadora; no ouvia, mas observava muito (...). Ningum percebeu adeficincia dela! Ento, quer dizer, a incluso... A leitura, a escrita dela, noano passado ainda no estava firme, mas naquele momento no era isso oimportante! Ela participou de todas as atividades (...), no deixando nada adesejar.

    A Professora Regina completa o relato, lembrando-se tambm de uma outra aluna,que tinha comprometimentos fsicos e intelectuais significativos, que s se locomovia emcadeira de rodas:

    (...) era uma menina muito difcil de se lidar! Muito revoltada com asituao (...), mas ela participou, justamente em uma parte que o anjo [umpersonagem] subia na cadeira dela. Se ela no estivesse presente, isso noseria possvel.

    As professoras fazem referncia, tambm, ao caso de A. (que ser abordadoadiante), que possui uma doena que deforma toda a pele da pessoa. Elas contam quehouve muitos progressos no comportamento e no desempenho escolar da aluna comoconseqncia de sua participao nos projetos de arte-educao realizados na escola,como conta Clia:

    Como ela cresceu! A auto-estima dela foi l em cima! Era uma meninaquietinha, fechada, o aprendizado era muito problemtico. Com a montagem

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    de Caixa de Brinquedos, a A. foi sorteada para ser a Mulher Maravilha. Eratudo o que ela precisava: ser a Mulher Maravilha! Ela era uma menina queno falava conosco; agora ela vem, cumprimenta, beija, elogia. Nsdevolvemos isso para ela, tambm.

    Apesar de A. j ser aluna da escola, ela ainda no havia conseguido umaaproximao com os colegas, por causa da aparncia causada pela doena de pele. Almdisso, o dilogo com a me era muito difcil, por ela ser muito fechada e super-protetora.Aps a apresentao da pea, tanto A. como a me mudaram suas atitudes com a escola.

    engraado que ns nos questionamos quanto a nossa sensibilidadecomo professor! Porque no ano passado, ela participou do nosso projeto,mas ns no percebemos. Por mais que convivamos todos os dias com ascrianas, alguma coisa passa! Voc no consegue observar tudo. Observar[a mudana em A.] foi muito bom!.

    As professoras acreditam que daqui em diante o trabalho com A. ir se desenvolver,

    ela conseguir aprender e se desenvolver muito mais, pois com sua auto-estima elevada, oaprendizado ser uma conseqncia.Outra aluna, M., no foi aluna delas, mas elas acompanharam parte do trabalho com

    ela. Conta Miriam:

    Como ns temos um projeto em que fazemos a reorganizao dosespaos, [M. ficou] um pouco com a Clia. Ns conhecemos a aluna,sabemos das dificuldades... ela tem uma dificuldade muito grande. Mas foiuma aluna que ns vimos nela muito crescimento durante esse ano, emtermos de socializao, participao. Porque ela uma aluna que temvontade de fazer, ela quer fazer, ela quer aparecer. Diferente da A., ela nose inibe com as dificuldades dela (...); parece que ela nem percebe as

    dificuldades. Ela demonstra esse querer fazer, o que j muito importante.

    Dentre os muitos casos contados pelas educadoras, todos muito ricos e quedemonstram os efeitos do projeto de arte-educao para a superao de muitos escolares,apresentaremos, a seguir, os casos de duas alunas que participaram do projeto; nessesdois casos, era iminente o risco de fracasso escolar e, no entanto, os relatos mostram comoessas crianas esto superando seus problemas, ficando evidente como foi possvel fazercom que elas aprendessem e se desenvolvessem.

    O caso da aluna Y.

    Y. uma aluna de 7 anos e freqenta o ano Inicial da Educao Fundamental.Entrou na escola aos 4 anos de idade e, desde ento, logo se percebeu que ela no falava.Foi encaminhada, pela escola, para o Ncleo de Apoio Aprendizagem e aoDesenvolvimento NAAD, uma das unidades que compem a Rede de Apoio EducaoInclusiva da Secretaria de Educao, iniciando o atendimento com uma psicloga, no qualpermanece at hoje.

    sua me quem conta como ela era e as mudanas por que passou na escola e,especialmente, seu envolvimento nos Projetos de Arte-educao. A me iniciou sua falacontando um pouco sobre a histria de vida de Y.:

    Com a Y. foi um pouco diferente... Eu tive dois filhos que no foramiguais a ela. Ela nasceu normal e eu a levava para o meu servio... Foisomente a partir dos 2, 3 anos que eles ficaram impressionados porque elano falava.

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    Naquele momento, a me consultou uma fonoaudiloga, que lhe falou que quandoY. comeasse a freqentar a escola, ela iria se desenvolver e, conseqentemente, falarbem. Apesar de Y. ter entrado na escola com 4 anos, a me relata que ela apresentavamuitas dificuldades:

    Tinha muito medo (...). Ela tinha dificuldades para relacionar-se comas demais crianas. No falava... Ento, tudo o que ela precisava se apoiavaem um amiguinho para apresentar um trabalho, para falar na frente da salade aula (...). O que foi dificultando cada vez mais sua vida escolar.

    Segundo a me, o atendimento com a psicloga tem sido importante, pois temcontribudo para sua melhora:

    (...) tem auxiliado bastante no seu desenvolvimento, principalmenteaqui na escola, [pois] ela est indo muito bem. At no meu servio (...) todomundo est abismado! s vezes, eu tenho que frear, [pois] ela extrapola um

    pouquinho.A me acredita que Y. est se desenvolvendo muito bem, pois desde que entrou na

    escola passou por uma grande transformao. Ela acredita que os projetos realizados naescola contribuem muito para o desenvolvimento e o aprendizado de Y. No primeiromomento, ao saber do projeto e da apresentao em um espao pblico, teve a seguintereao, expressa em palavras: Tenho certeza que ela no vai, que no vai conseguir!.

    Mas Y participou dos ensaios e, no dia agendado, foi ao Teatro Adamastor, com osdemais alunos da escola. Conta a me que, quando chegaram ao teatro, a professora acolocou separada de seus familiares e Y. ficou sentada na escada, dizendo que no iria. Noentanto, para sua surpresa, ela subiu ao palco e participou da apresentao com todos oscolegas; mais do que isso, ficou totalmente desinibida no palco, mandando beijos e tchaus

    para todos que estavam no auditrio. A primeira reao da me foi dizer: No a Y. queest ali na frente!.Depois da apresentao de Y., a me contou que, ao assistir as apresentaes de

    outras escolas, Y. manifestou o desejo de voltar ao palco, com as crianas de outras turmase escolas, para se apresentar novamente; o que causou espanto e satisfao com osresultados do projeto: Como ela era muito tmida, os projetos que esto sendo realizados,essa apresentao ao pblico, esto sendo muito bons para ela!.

    A me relatou que a psicloga ficou surpresa ao ouvir seu relato e o de Y. noencontro seguinte apresentao. Para a me, Com o trabalho dela [psicloga] e com otrabalho da escola, noto que os dois esto sendo bons para a Y.

    Apesar de Y. ainda falar pouco, para a me essa atividade [apresentao no TeatroAdamastor] marcou-a tanto que, at hoje, ela conta o que aconteceu, como foi, e que

    gostaria de ir novamente. Alm da apresentao em si, que ajudou bastante Y. a sedesinibir em pblico, a me relata que os projetos incentivam Y.; pois sempre que faloalguma coisa, ela relaciona com o que fez na escola.

    Sua aprovao aos projetos desenvolvidos na escola se revela na afirmao de quedeveriam existir mais projetos e atividades, pois segundo ela: No somente para Y., mastambm para as demais crianas, o projeto tem beneficiado bastante. Ainda mais passear,ter uma atividade fora, mostrar o que eles sabem, fora [da escola]... timo! Mas eu queriaque fosse um pouco mais: mais atividades, mais apresentaes, pois para eles isso muitobom.

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    O caso da aluna A.

    Desde os primeiros contatos com a escola, a aluna A. citada como um exemplo docarter inclusivo dos projetos de Arte-educao. Essa aluna tem uma doena que produzgraves leses na pele, que acometem todo seu corpo e rosto; so leses visveis que, emmomentos mais crticos, apresentam purulncias, de maneira que sua aparncia no passadespercebida pelas pessoas. Como sabido, afeces dermatolgicas desse tipoprovocam o distanciamento das pessoas, o que sem dvida articula-se ao preconceito e satitudes a ele relacionadas. O retraimento e o afastamento do convvio social so algunsdos efeitos sobre o sujeito que vtima de preconceitos, o que contribui, entre muitas outrasconseqncias negativas, para uma auto-imagem negativa, um dos fatores determinantesda produo do fracasso escolar. Familiares e professores tendem a protegerexcessivamente a criana, dificultando seu desenvolvimento autnomo e pleno, o quetambm se constitui em fator que contribui para a produo do fracasso escolar. Essa era asituao vivida por A., como contada por sua me.

    A doena comeou a se manifestar antes de A. completar 2 anos, mas no foidiagnosticada, agravou-se, e s quando encaminhada para atendimento mdico-hospitalar

    de ponta, o diagnstico foi dado e o tratamento adequado iniciado, como conta a me:Ela comeou a ter esse probleminha desde um ano e sete meses,

    mais ou menos, mas a gente no sabia [o que era]; passava como alergia. Agente tinha convnio [mdico], passava com dermatologista, pediatra... eeles s passavam aquela pomadinha. Chegou num ponto em que essaalergia comeou a aumentar; ela ficou bem ruim nessa idade de 3 para 4anos. Ela estava aqui na escola... e ela se afastou daqui da escola.

    A. est na escola desde a recreao [antiga denominao da educaoinfantil para a criana de zero a 3 anos]. Quando comeou [a pr-escola] elateve uma alergia muito forte; ela quase morreu. No comeo do ano ela ficouinternada uns doze dias na Santa Casa, depois ela ficou na recuperao e

    foi encaminhada para o Hospital das Clnicas, e faz tratamento at hoje, comvrios mdicos, psiclogos, nutricionistas e outros mdicos que fazem partede l.

    Nessa Rede de Ensino, todas as crianas recebem duas refeies no perodo emque esto na escola, com base num Programa de Alimentao Escolar, que tem afinalidade de oferecer os nutrientes necessrios para promover a sade do aluno.Entretanto, o tratamento de A. exige uma severa restrio alimentar, como relata a me:

    Tem [restrio] de leite, conservante, ovo, chocolate, bicho... temmuitas coisas. tudo controlado.

    Ela traz caf com leite de soja, que ela pode comer, e tem que ficar

    olhando se ela no est comendo o que no pode; s vezes difcil. A gentetem controle, explica, mas difcil!

    Segundo a me, a escola foi informada sobre as restries alimentares de A. econtribui para que ela seja mantida, preocupando-se, inclusive, em buscar informaes paraalgumas situaes especiais:

    Nas reunies de pais eu falo para as professoras o que ela podecomer. Eu trago de casa as coisas que ela pode comer; s vezes perguntose tem alguma coisa do dia que ela pode comer, ou o que vai ter no passeio[para comer].

    Eu trouxe uma lista de coisas que ela no pode comer. Eles atendem bem; svezes ligam para avisar quando esto assistindo filme, [para perguntar] se ela podecomer pipoca, essas coisas... E eu achei muito legal da parte delas fazer isso.

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    A escola tem algumas pessoas na cozinha que so demais, nossa! Cuidamdela; na hora do recreio abrem a sacolinha do lanche e pem na mo dela para elacomer. Antes, o horrio dela [na escola] no era esse, era [o horrio] do almoo; elatinha que trazer marmitinha e elas colocavam para esquentar, para ela comer acomida quentinha, com uma frutinha.

    Muito marcante na fala da me so os comprometimentos psicolgicos provocadospela manifestao da doena de A. Percebe-se, em sua fala, carregada de emoo, queno apenas a criana, mas tambm ela foi muito afetada no s pela doena, mas pelotemor da rejeio e do preconceito. Diz a me de A.:

    Foi um perodo muito difcil, que ela no se aceitava, que no gostavaque ningum olhasse pra ela, s usava manga comprida. E foi muito difcil aparte emocional. Ela no aceitava, no se olhava no espelho, no seaceitava.

    Essa condio psicolgica refletia-se nas atividades escolares de A., que

    apresentava vrias dificuldades, tendo sido inclusive encaminhada, pela escola, paraatendimento psicolgico, no j citado NAAD.

    Era muita dificuldade! At o ano passado, at o meio do ano passado,ela ainda tinha aquela dificuldade. Foi encaminhada [para o NAAD], mas nodeu para ir.

    Tem coisa que ela melhorou bastante. Coisa que ela no conseguia lerat o ano passado. Ela estava com uma dificuldade enorme.

    Ela no conseguia terminar a lio. Ela melhorou da metade do anopassado para c. Acho que a cabea dela comeou a abrir, fazendoatividade fsica, ginstica, essas coisas que eles fazem a [os Projetos deArte-educao]. Eu vi que j mudou muito. Ela participa. O desempenho dela

    est bem melhor que antes, mesmo que ela [ainda] tenha dificuldade hoje,mas como antes no.

    muito interessante que a me detm-se pouco no relato das dificuldades de A. elogo comea a narrar as mudanas que ocorreram a partir do trabalho realizado na escola.

    Ela comeou a ir bem, comeou a fazer uns trabalhos aqui daescola. A parte do teatro mudou bastante o jeito dela de lidar com o pblico.Ela fez esse trabalho no Adamastor, uma pea de teatro que estoensaiando desde o ano passado e se apresentando; esse ano fizeram denovo, no sei se a mesma pea, mas [havia] mais pessoas, e eu vi que elaj estava 100% na parte de se comunicar com muitas pessoas. Eu at

    brincava com ela: olha, A., a me tem mais vergonha que voc... no meio detanta gente assim. Quando eles se apresentaram l no Adamastor tinhaaquele pblico enorme e ela l no meio de todo mundo... eu vi que ela noficou com vergonha; no meio de tanta gente, ela l assim vontade, noficou com vergonha, se entrosando com os outros amiguinhos dela, elafazendo a parte dela que tinha que fazer no palco... eu achei que foi muitobom.

    Quando solicitada a falar sobre as dificuldades e as mudanas de A., a me poucoenfatiza os aspectos relacionados ao processo de escolarizao, mas refere-se muito maiss interaes entre a menina e as outras pessoas, revelando estar nesse aspecto sua maiorpreocupao, o que j havia sido evidenciado anteriormente quando expressava suaangstia frente possibilidade de A. ser alvo de discriminao e preconceito. Assim, a

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    escola vista pela me como um lugar de amigos e as apresentaes como um espao desociabilidade, que rene inclusive a famlia:

    O que importante para ela a amizade; ela pe muito a amizadeem primeiro lugar. Ela sentiu muita falta [dos amigos] nesse perodo que elaficou em casa; ela se sentia muito s, achava que ela no ia ter mais amigos;e agora ela tem os amigos.

    [Para a apresentao] do Adamastor, eu chamei as tias para verem,para incentivar, para dar essa alegria para ela; para ela estar l seapresentando e estar vendo todo mundo que ela gosta assistindo, todomundo que ela ama assistindo. Ela ficou toda contente! Ela gosta departicipar das coisas da escola, ela gosta muito. E eu fiquei contente, muitofeliz, quando ela foi se apresentar; at falei: nossa, A., daqui a pouco vocvai estar na Globo, vai ser atriz!

    Ainda que sua preocupao seja com as interaes sociais de A., mais do que comseu processo de escolarizao, a me aponta para um fator que tem extrema importncia

    para a aprendizagem, pois permite que a criana no se sinta excluda, sentindo-se aceita,acolhida, o que fortalece sua auto-estima, sua autonomia, seu prazer em fazer parte de umdeterminado grupo. Esses fatores so indubitavelmente fundamentais para que o educandoalcance o sucesso escolar e, portanto, necessrios para a construo de uma escola queseja capaz de promover a aprendizagem e o desenvolvimento integral de todos,reconhecendo e respeitando as diferenas de cada um.

    O relato da me indica que a melhora de A. confirmada pelo encaminhamentodado pela psicloga [do hospital]:

    A psicloga falou que ela est bem nessa parte emocional. Apsicloga diminuiu [a freqncia das] consultas e a gente vai [agora] uma veza cada quinze dias ou uma vez ao ms; mas no incio era uma vez por

    semana, at mais um pouco, era at difcil; eu falava Meu Deus! Duas, trsvezes na semana para ir at l era difcil.

    Em um breve dilogo com A., esta disse que gostaria de ser professora e que gostamuito de participar do teatro na escola. Indagada sobre seu futuro, sua fisionomia cobriu-se de tristeza por ter que mudar de escola, pois ela concluir agora o 4. Estgio daEducao Fundamental, ltimo ano oferecido pela Rede Municipal, quando ento oseducandos passam para a Rede Estadual de Ensino. O apoio da escola e os projetosoferecidos foram de suma importncia para que A. pudesse expressar seus desejos esentir-se aceita sem restries. Essa nova situao traz um novo desafio a ela, pois aomudar de escola ter que enfrentar todo um processo de adaptao. Entretanto, pode-seconstatar que A. sente-se fortalecida, sua auto-imagem bastante positiva, desenvolveu

    sua autonomia e auto-confiana, tem um bom domnio dos saberes escolares e esse ultimoano na escola poder solidificar-se ainda mais e torn-la mais segura, condies essasnecessrias para que ela possa enfrentar novas situaes com sucesso.

    Alm disso, a Secretaria Municipal de Educao tem possibilitado a continuidade daparticipao de ex-alunos em Projetos Especiais de Arte-educao, criados justamente paraque no sejam interrompidos processos de desenvolvimento como esse observado naaluna A., o que ser abordado tambm na apresentao dos relatos dos arte-educadores.

    A arte-educao no projeto poltico-pedaggico da rede municipal de educao deGuarulhos

    O trabalho desenvolvido na Escola Municipal Evanira Vieira Romo fruto dotrabalho coletivo, competente e comprometido de suas educadoras, da participao dos

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    pais e de toda a equipe de funcionrios da escola e, principalmente, do envolvimento dosalunos, da alegria e da maneira como eles recriam, cada qual com suas potencialidades eparticularidades, o desenvolvimento das atividades de arte-educao.

    Entretanto, preciso considerar tambm o Projeto Poltico Pedaggico da RedeMunicipal de Educao, que d base a esse trabalho, para se compreender as condiesdadas para que o projeto se desenvolva.

    So as prprias professoras que destacam a importncia dos cursos oferecidos pelaSecretaria de Educao, a qualidade e o custo deles. Elas tm conscincia das condiesque so dadas, mas consideram que necessria tambm a boa vontade dos professoresem realiz-los e lev-los para as escolas, como diz Regina:

    (...) ns no pagamos por eles, so cursos caros. O que mais nosangustia ver [que h] professores que no esto aproveitando tudo isso.[Com isso], voc oferece oportunidades para uns e outros no esto tendoessa oportunidade [referindo-se aos alunos], por causa do professor que noest indo atrs, no est procurando. Isso uma questo de conscincia decada um. Ns estamos fazendo, s no fazemos mais porque somos mes

    de famlia, temos casa, mas se pudssemos... estvamos l fazendo [mais]cursos.

    muito interessante notar a conscincia e o compromisso dessas professoras.Mesmo realizando um trabalho de tanta qualidade e com todos esses resultados, elas aindaavaliam que deveriam fazer mais. Elas ressaltam que nem todos os cursos so excelentes,mas que em todos existe aproveitamento, como diz Regina: Tentamos aproveitar o quecada curso teve de bom, de legal, para levarmos para a sala de aula. Contudo, afirma que,muitas vezes, o professor faz o curso, mas no aplica, no leva para a sala de aula o queaprendeu: No sei se ele no se sente preparado... Acho que voc tem que ser arrojadomesmo! Tem que abusar para ver o que que d. Se no est dando certo aqui, vamos porali. As professoras acreditam que os projetos devem continuar e sentem que o

    compromisso delas cada vez maior:

    Parece que a cada ano o nosso compromisso cada vez maior,porque a gente no pode fazer menos! Tem que fazer igual ou mais! Ento,no pode deixar de ser feito. Ns temos uma cobrana, at da prpriacomunidade. Agora, [at] do pessoal da Secretaria [de Educao]. umcompromisso que ns estamos assumindo e ele vai aumentando cada vezmais.

    O relato dessas professoras fundamental para se compreender os principaisdeterminantes do xito desse projeto para a aprendizagem e o desenvolvimento de todosalunos e, em especial, para o enfrentamento do fracasso escolar. O mais correto seria dizer

    que esse projeto tem como finalidade a promoo do sucesso escolar para todos. E importante dizer que, num trabalho como esse, a ao do professor no o nico fator, mas sem dvida o mais importante.

    Sabe-se que as condies oferecidas para que se realize a contento o processoensino-aprendizagem so fundamentais para a transformao da escola. O rompimento dotrgico ciclo da produo do fracasso escolar das crianas das classes populares dependede polticas pblicas comprometidas com essa finalidade, estabelecendo um ProjetoPoltico-pedaggico coerente e conseqente; depende dos recursos materiais oferecidos;de uma gesto escolar democrtica, comprometida e articuladora do Projeto Pedaggico daescola com o Projeto Poltico-pedaggico da Rede de Ensino; depende, enfim, decondies vrias e de muito compromisso poltico e educacional. Assim, na ao diretacom o educando que essa tarefa se concretiza e seu principal protagonista o professor.

    O relato dessas professoras demonstra que h coerncia entre o Projeto Poltico-pedaggico da Rede e o Projeto Pedaggico da escola. Para se concretizar no dia-a-dia

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    dos alunos, as gestoras incentivam e apiam o trabalho coletivo dos professores. Sooferecidas condies para a realizao do trabalho, desde a existncia de espao fsico aoincentivo para a produo e divulgao dos trabalhos realizados na escola.

    Entretanto, uma condio de fundamental importncia o Programa de FormaoPermanente e, neste, os Projetos de Arte-educao. So condies necessrias para arealizao do trabalho, embora a responsabilidade do trabalho cotidiano, que produz essesresultados, est nas mos de professores comprometidos com a tarefa educativa, com aescola e, sobretudo, com seus alunos. Deve-se destacar, inclusive, que a participao dospais no condio para que o trabalho se realize, mas tambm conseqncia dotrabalho realizado pelas professoras e pela escola como um todo.

    Para que se compreenda o contexto em que esse trabalho se desenvolveu, ascondies oferecidas e a poltica educacional que d base a esse trabalho, seroapresentados a seguir o Projeto Poltico-pedaggico da Rede de Educao do municpio eo lugar que ocupa a Arte-educao no Programa de Formao de Professores. Para isso,sero trazidas as vozes de arte-educadores que conta, a partir de suas perspectivas, otrabalho desenvolvido com os professores e com os alunos.

    O Projeto Poltico-pedaggico, o Programa de Formao de Educadores e os Projetosde Arte-educao

    A educao brasileira foi construda, ao longo da histria, para as classesdominantes e para garantir seus privilgios. H cerca de meio sculo, vem se ampliando o

    a