arquivo como fonte de difusão cultural e educativa (1)

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Acervo, Rio de Janeiro, v. 25, n. 1, p. 35-44, jan./jun. 2012 - pág. 35 Rosimere Mendes Cabral Professora do Departamento de Ciência da Informação da Universidade Federal Fluminense. Arquivo como Fonte de Difusão Cultural e Educativa A função dos arquivos públicos como instituição é o recolhi- mento, a preservação e a orga- nização dos fundos documentais produzi- dos pelo governo nos âmbitos municipal, estadual e federal, de forma a servir como fonte de informação para o administrador, o historiador e o cidadão. Outra função de cunho mais social, embora pouco explo- rada no Brasil, diz respeito ao papel edu- cativo e de difusão cultural dos arquivos. No que se refere à função social, sabe-se que algumas instituições arquivísticas bra- sileiras promovem palestras, seminários, exposições, debates, lançamentos de obras, entre outras atividades. Contudo, quando se pensa o arquivo como um espa- ço de difusão e ação cultural, pretende-se que sejam realizados não apenas eventos circunstanciais, mas implementado um programa sistemático visando aproximar o público em geral, com o intuito de dar

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  • R V O

    Acervo, Rio de Janeiro, v. 25, n. 1, p. 35-44, jan./jun. 2012 - pg. 35

    Rosimere Mendes CabralProfessora do Departamento de Cincia

    da Informao da Universidade Federal Fluminense.

    Arquivo como Fonte de Difuso Cultural e Educativa

    A funo dos arquivos pblicos como instituio o recolhi-mento, a preservao e a orga-nizao dos fundos documentais produzi-

    dos pelo governo nos mbitos municipal,

    estadual e federal, de forma a servir como

    fonte de informao para o administrador,

    o historiador e o cidado. Outra funo de

    cunho mais social, embora pouco explo-

    rada no Brasil, diz respeito ao papel edu-

    cativo e de difuso cultural dos arquivos.

    No que se refere funo social, sabe-se

    que algumas instituies arquivsticas bra-

    sileiras promovem palestras, seminrios,

    exposies, debates, lanamentos de

    obras, entre outras atividades. Contudo,

    quando se pensa o arquivo como um espa-

    o de difuso e ao cultural, pretende-se

    que sejam realizados no apenas eventos

    circunstanciais, mas implementado um

    programa sistemtico visando aproximar

    o pblico em geral, com o intuito de dar

  • A C E

    pg. 36, jan./jun. 2012

    acesso informao e fomentar a criao

    de conhecimentos.

    A ideia de pensar o arquivo como um

    espao de difuso cultural permite duas

    vias de ao, que, de acordo com Bellotto

    (1991, p. 228), seriam o lanamento de

    elementos de dentro do arquivo para

    fora, buscando atingir um maior cam-

    po de abrangncia, e o retorno dessa

    mesma poltica, acenando com atrativos

    no recinto do arquivo. Esse caminho da

    difuso cultural, conforme citado, j

    trilhado por algumas instituies arquivs-

    ticas brasileiras, ao promoverem eventos

    como congressos, seminrios, reunies.

    Em instituies de outros pases obser-

    va-se uma prtica que vai alm dessas

    atividades, ao proporcionar ao pblico

    novas experincias, como a que ocorre no

    Museu de Histria da Frana, chamada de

    Le quart dheure de culture, em que um

    comentrio sobre um grupo documental

    de interesse mais popular produzido

    pelos arquivistas, na hora do almoo,

    atraindo trabalhadores das redondezas.

    Trata-se de uma forma de aproximar um

    pblico diversificado, expandindo assim

    as categorias mais comuns de pesquisa-

    dores, como os historiadores e estudantes

    de graduao, de forma que percebam

    a importncia do arquivo enquanto ins-

    tituio que, alm de suas funes de

    custdia, preservao, recolhimento e or-

    ganizao, tambm participa ativamente

    da vida cultural da cidade.

    Bellotto (1991, p. 228) apresenta exem-

    plos de outros pases, como Estados Uni-

    dos, Rssia, Alemanha e Espanha, onde o

    uso da transmisso radiofnica de apre-

    sentao comentada tem alcanado bons

    resultados ao ser usada concomitante-

    mente exposio, no saguo do arquivo,

    do documento do ms, selecionado de

    acordo com uma efemride ou evento.

    Esse trabalho conjunto de exposio e

    transmisso radiofnica alcana um p-

    blico diversificado e pode ser planejado

    de forma sistemtica. Poderia ser imple-

    mentado no Brasil com alguma facilidade,

    visto que se tem prtica neste tipo de

    atividade (exposio) em bibliotecas, ar-

    quivos e museus, faltando, assim, aliar a

    transmisso via rdio. A aproximao com

    as bibliotecas e os museus facilitaria a

    maior comunicao entre os profissionais

    destas instituies, como bibliotecrios e

    muselogos, com os arquivistas e histo-

    riadores, possibilitando assim uma troca

    de experincias e informaes de forma a

    suscitar uma gama de reflexes acerca do

    papel social dos profissionais e das insti-

    tuies. Esta rede de contatos permitiria,

    ento, repensar a prtica diria e, princi-

    palmente, rever as metas, planejamentos

    e poltica insitucional, que se poderia

    ampliar a fim de aumentar o pblico visi-

    tante de exposies, seminrios, para algo

    alm, incluindo um programa sistemtico

    voltado para a difuso e a ao cultural,

    com atividades na quais o pblico se

    tornaria agente ativo no processo e no

    mero espectador.

    H vrias atividades possveis de difuso

    cultural em instituies arquivsticas,

  • R V O

    Acervo, Rio de Janeiro, v. 25, n. 1, p. 35-44, jan./jun. 2012 - pg. 37

    conforme Bellotto (1991), e este trabalho

    ressaltar duas: o arquivo como fonte

    educativa e o arquivo orientado para ao

    cultural.

    Arquivistas alemes trabalham em conjun-

    to com agncias de turismo contribuindo

    para a criao de textos, correo de

    notcias histricas em seus folhetos pu-

    blicitrios, cartazes, mapas, ou para a si-

    nalizao de monumentos, como mostra

    Bellotto (1991, p. 229). Tais exemplos

    mostram a variedade das atividades a se-

    rem exercidas por arquivistas de forma a

    participarem mais ativamente da movimen-

    tao cultural e turstica das cidades, indo

    alm do papel tecnicista. As contribuies

    advindas desses profissionais da informa-

    o abrem espao para uma atuao mais

    voltada para o lado ldico, ao proporcionar

    aes no mbito educacional, cultural e

    turstico. necessrio um bom planeja-

    mento das atividades a serem desenvol-

    vidas, de modo que sejam sistematizadas

    e avaliadas constantemente e se faam

    ajustes e correes ao longo dos projetos,

    assim como adequaes em relao aos

    objetivos que devem ser alcanados.

    Vale ressaltar que, quando se fala de uma

    prtica que vai alm da tecnicista, em

    momento algum se pretende diminuir a

    importncia dessa dimenso, visto que

    sem ela no seria possvel uma recupe-

    rao satisfatria dos documentos. O

    que est em pauta algo mais, ou seja,

    uma prtica que conjugue o lado tcnico

    com o cunho social da instituio arqui-

    vstica, por meio de uma poltica voltada

    para o pblico, atraindo-o de forma que

    compreenda o arquivo como espao de

    coleta, preservao, mas tambm como

    lugar de criao de conhecimentos, de

    lazer cultural. Uma pesquisa informal

    realizada com alunos de graduao em

    arquivologia mostrou que um pequeno

    percentual deles pensa o arquivo como

    espao de lazer cultural. A maioria acre-

    dita que seus familiares e amigos no

    tm interesse em visitar e frequentar um

    arquivo. Ora, se os graduandos da rea

    no veem seus espaos de trabalho como

    lugares de difuso cultural, e no pensam

    que poderiam s-lo, a mudana de viso

    tende a se comprometer.

    Reitera-se que uma boa comunicao, um

    alinhamento com outros profissionais,

    em especial bibliotecrios e muselogos,

    poderia facilitar a criao de um programa

    sistemtico de atuao dos arquivos volta-

    do a uma prtica direcionada aos campos

    educacional, cultural e turstico. A respeito

    da ligao entre arquivo e educao,

    necessrio que se atente para as experin-

    cias de outros pases, para ento verificar

    como adequ-las realidade brasileira, e,

    ainda, que se avalie a validade de orientar

    os arquivos para a prtica educativa, em

    consonncia com a estrutura funcional da

    prpria instituio. Payne (apud Bellotto,

    1991, p. 231) apresenta uma orientao

    a respeito:

    O desenvolvimento de laos entre os ar-

    quivos e a educao no depende s da

    compreenso do papel que a educao

    deve exercer no mundo contemporneo;

  • A C E

    pg. 38, jan./jun. 2012

    so igualmente importantes o reconheci-

    mento do verdadeiro valor dos arquivos

    como fonte educativa e a vontade de

    transformar o valor educativo potencial

    dos arquivos em programas positivos e

    realistas.

    Da a necessidade de uma avaliao, por

    parte da instituio arquivstica, da ado-

    o de uma prtica que pense o arquivo

    como fonte educativa, ao aproximar, por

    exemplo, estudantes de ensino mdio

    ou crianas por meio de um programa

    sistemtico de trabalho conjunto com as

    escolas.

    Um belo trabalho que vem sendo desen-

    volvido pelo Arquivo Nacional da Torre

    do Tombo (ANTT), em Portugal, foi apre-

    sentado no VII Seminrio Internacional de

    Arquivos de Tradio Ibrica, no Rio de

    Janeiro, em 2011, pela arquivista Maria

    de Lurdes Henriques. O servio educativo

    do ANTT possui duas vertentes de atua-

    o: a implementao de uma estrutura

    organizacional com foco nas visitas esco-

    lares, de forma a atender diversas faixas

    etrias e de ensino, com temas variados

    e integrados aos planos curriculares; e

    a concepo, planejamento, organiza-

    o e implementao de exposies e/

    ou mostras documentais permanentes,

    direcionadas para fins didcticos pe-

    daggicos, mediando-as para diferentes

    pblicos-alvo, investindo nesses pblicos,

    por forma a aproxim-los do Arquivo,

    dando-lhes a conhecer o seu patrimnio

    e promovendo simultaneamente lies

    de cidadania.

    A experincia do ANTT mostra o trabalho

    conjunto do arquivo com as escolas por

    meio de um programa sistemtico que

    orienta o planejamento de aes reali-

    zadas com base nos planos curriculares,

    como forma de promover aulas fora das

    escolas, com atividades que envolvem

    outros modos de leitura, diferentes dos

    livros, o que permite o enriquecimento

    com a descoberta de diversas escritas.

    Esse trabalho promove a aproximao dos

    estudantes com a instituio e a prtica

    arquivstica, ao mostrar um lugar de des-

    cobertas, de busca de novos conhecimen-

    tos, melhorando a compreenso sobre a

    importncia daquele espao no contexto

    histrico-cultural da cidade, do pas. Pos-

    sibilita, ainda, o interesse dos alunos em

    aprender de maneiras diferentes daquelas

    apresentadas nas salas de aula, comple-

    mentando a prxis docente com outros

    tipos de material, como documentos his-

    tricos relevantes para a histria do pas,

    que so mostrados na ntegra com seu

    vocabulrio e tipos de letra especficos.

    Os documentos podem vir acompanhados

    de uma traduo preparada por arqui-

    vistas, e pode ser proposto aos alunos

    que recriem documentos histricos com

    outros formatos, como vdeos, desenhos,

    pinturas, estimulando assim a criatividade

    e a passagem de sujeitos passivos para

    ativos no processo de gerao de novos

    conhecimentos.

    A fonte educativa propiciada pelo arquivo

    pode ser uma grande aliada no processo

    pedaggico das escolas, auxiliando no

    ensino de matrias como histria, portu-

  • R V O

    Acervo, Rio de Janeiro, v. 25, n. 1, p. 35-44, jan./jun. 2012 - pg. 39

    gus, cincias, ao oferecer uma gama de

    documentos que fazem parte dos fundos

    dos arquivos. Trabalhar com os planos

    curriculares permite que tanto professores

    como arquivistas planejem as atividades,

    ao longo do ano letivo, com exposies,

    aulas, oficinas e debates que visem apro-

    fundar as informaes recebidas pelos

    alunos. Assim, por meio destas atividades,

    eles podem participar como sujeitos ativos

    no processo de criao de conhecimentos.

    A experincia apresentada pela arquivista

    Maria de Lurdes Henriques, do ANTT, mos-

    tra que o programa educativo faz parte

    da poltica institucional, num trabalho

    conjunto com a rea de educao, como

    estratgia de auxlio aos professores, e,

    principalmente, de poltica educacional,

    como chave para a melhoria da qualidade

    do ensino e a difuso cultural propiciada

    pela instituio arquivstica. Esta aproxi-

    mao permite ainda maior visibilidade do

    profissional arquivista junto sociedade,

    numa postura que vai alm do tecnicismo,

    proporcionando outras experincias, mais

    ldicas. E no se pode deixar de mencio-

    nar a possibilidade de abranger um pbli-

    co maior, assim como a necessidade de

    ampliao de atendimento, aumentando

    o horrio de abertura, inclusive nos fins

    de semana, algo incomum nas instituies

    brasileiras.

    O caso portugus mostra como o arqui-

    vo, orientado para uma poltica educati-

    va, pode contribuir para a melhoria da

    qualidade do ensino na rede escolar, ao

    estimular uma cidadania mais ativa e par-

    ticipante, buscando formas variadas para

    o processo de gerao de conhecimentos,

    e, como diz Paulo Freire, educar para a

    liberdade.

    Por exemplo, o ANTT oferece aos escolares

    documentos numa calota esfrica com tela

    sensvel ao toque, num projeto que ensina

    astronomia. O programa educativo deve

    ainda abranger outros pblicos, como

    os idosos, em atividades orientadas no

    sentido de propiciar experincias ldicas,

    dilogo intercultural, alm de promover o

    acesso ao conhecimento e a valorizao

    do profissional arquivista.

    Retorna-se, assim, proposta inicial de

    pensar o arquivo como fonte educativa e

    orientada para a ao cultural.

    Em se tratando de ao cultural, ainda incipiente essa prtica em unidades de informao como bibliotecas e arquivos, mas o tema

    vem sendo debatido desde o incio da

    dcada de oitenta, aps a apresentao

    de Flusser no XI Congresso Brasileiro de

    Documentao, em Joo Pessoa, Paraba,

    em 1982.

    Flusser (1983, p. 148) trouxe a ideia da

    biblioteca como instrumento de ao

    cultural, sendo esta basicamente me-

    diao e criao de acervo, inserido em

    contexto cultural bem definido. Ora, so

    conhecidas as diferenas entre arquivos e

    bibliotecas quanto s suas funes, e no

    se pretende a transposio de prticas

    biblioteconmicas, todavia so espaos

    que, como dissemos, podem e devem ser

  • A C E

    pg. 40, jan./jun. 2012

    usados para trocar experincias de forma

    a contribuir para novas perspectivas de

    trabalho. Assim, pensa-se que a prtica

    da ao cultural pode ser desenvolvida

    dentro das instituies arquivsticas como

    mostra o trabalho realizado no ANTT,

    por meio de sua participao efetiva na

    inovao curricular, com a aproximao

    entre bibliotecrio escolar, professores

    e arquivistas.

    Este processo de interao baseado em

    vises mltiplas sobre os fundos do-

    cumentais propicia novas experincias

    a serem vividas pelo pblico, leituras

    codificadas para facilitar a compreen-

    so de documentos e maior conscincia

    acerca dos documentos arquivsticos e

    de sua importncia, alm de contribuir

    para a formao da cidadania do pblico

    escolar.

    Outro trabalho vem sendo desen-volvido pelos arquivos franceses desde 1950, apesar da ideia de se criar servios educativos ter tido incio

    aps a Segunda Guerra Mundial, com sua

    abertura a um novo pblico embora o

    contato arquivo-escola j se processasse

    desde 1912 atravs de circular do di-

    retor dos Archives nationales, tornando

    obrigatria a realizao de conferncias

    peridicas, feitas por arquivistas, para os

    alunos das escolas normais, segundo rela-

    tos de Bellotto (1991, p. 234), que elenca

    as atividades dos servios educativos

    que os arquivos franceses desenvolvem.

    Dentre elas est uma prtica que chama a

    ateno pelo seu potencial de aproximar

    os alunos e de ampliar o pblico para a

    comunidade do entorno das instituies

    arquivsticas. Na atividade em questo, so

    realizadas campanhas junto aos alunos

    para a coleta de documentos familiares

    ou de estabelecimentos comerciais, indus-

    triais, esportivos, sindicais ou polticos aos

    quais seus familiares ou amigos estejam

    ligados. O material recolhido engloba

    lembranas orais e escritas, material de

    valia para a histria local contempornea

    (Bellotto, 1991, p. 237).

    A reunio deste material composto por

    documentos familiares, como fotografias,

    relatos orais e escritos, aproxima-se do

    uso da histria oral como metodologia

    cuja finalidade a criao de fontes his-

    tricas, de acordo com Freitas (2006, p.

    19), sendo a histria oral dividida em trs

    gneros distintos: tradio oral, histria

    de vida, histria temtica. O primeiro

    gnero pode ser definido como um tes-

    temunho transmitido verbalmente de uma

    gerao para outra (Vansina, 1982, p.

    157 apud Freitas, 2006, p. 19). A histria

    de vida, segundo gnero, pode ser con-

    siderada um relato autobiogrfico, mas

    do qual a escrita [...] est ausente, por

    meio de uma reconstituio do passado

    pelo prprio indivduo.

    J na histria oral temtica, a entrevista

    realizada por um grupo de pessoas, sobre

    um assunto especfico, como explicitado

    por Freitas (2006, p. 21-22). Um projeto de

    histria oral pode ser desenvolvido como

    iniciativa individual ou trabalho coletivo:

    em pr-escolas, nos primeiro e segundo

  • R V O

    Acervo, Rio de Janeiro, v. 25, n. 1, p. 35-44, jan./jun. 2012 - pg. 41

    graus, nas universidades, na educao

    de adultos, por centros comunitrios, por

    museus convencionais, museus itineran-

    tes ou por museus de rua e por outras

    instituies.

    Como vimos no caso da Frana, esse mo-

    delo tambm pode ser desenvolvido por

    instituies arquivsticas pblicas, e aqui

    se abre uma possibilidade para os arqui-

    vos de empresas privadas, que poderiam

    estabelecer um programa sistemtico de

    coleta de material por seus funcionrios,

    sob coordenao do arquivista. Fotogra-

    fias, convites de eventos, inauguraes,

    vdeos, enfim, diversos materiais podem

    ser colhidos para uma exposio que con-

    tasse a evoluo histrica da empresa com

    base no material recolhido. Esse trabalho

    desenvolvido pelo arquivista visaria envol-

    ver o corpo de trabalhadores na formao

    de um espao dinmico, onde se pudesse

    trocar ideias, relatos, experincias, refle-

    xes, e criar novos conhecimentos por

    meio da prtica da ao cultural. Esta seria

    vista como um processo que engloba ati-

    vidades que propiciem condies para o

    encontro de indivduos e para o estmulo

    da atividade cognitiva, conforme Flusser

    (1983, p. 159).

    Dessa forma, podem-se ampliar as possi-

    bilidades de se pensar a instituio arqui-

    vstica, com a promoo de uma prtica

    que propicie aos indivduos serem sujeitos

    ativos no processo de gerao de conheci-

    mentos, a partir dos fundos documentais

    dessas instituies e da criao de novos

    fundos por meio da coleta de materiais,

    seja de grupos familiares, idosos, comer-

    ciais, polticos, ligados, como no caso dos

    arquivos franceses, aos alunos envolvidos

    em atividades dos servios educativos.

    Isto se daria tambm por meio das narra-

    tivas orais, como orienta Freitas (2006),

    enquanto possibilidade de aproximao do

    pblico, que, ao se sentir sujeito ativo no

    processo de construo de conhecimentos

    e novos fundos atravs das histrias de

    vida, forma um importante material para

    a histria local e contempornea.

    A prtica da ao cultural possui um ca-

    rter transformador da realidade social e

    pressupe que os indivduos sejam sujei-

    tos ativos num processo sistemtico de

    criao de novos bens culturais e conheci-

    mentos, e no em atividades espordicas,

    ou seja, que eles participem ativamente no

    sentido de opinar, formular e criar (Rosa,

    2009, p. 373), como sujeitos da cultura,

    por meio de trocas de experincias, de-

    bates que permitam aos indivduos uma

    viso mais reflexiva e crtica do mundo

    onde se vive.

    O uso da histria oral como metodologia

    aliada a um servio educativo bem plane-

    jado, como nos exemplos apresentados,

    em consonncia com uma poltica ins-

    titucional orientada para algo alm das

    funes primordiais de um arquivo, pode

    propiciar uma mudana de imagem junto

    sociedade e, principalmente, contribuir

    na formao de cidados crticos e cons-

    cientes de seu papel, assim como da his-

    tria, do passado no qual esto inseridos

    enquanto indivduos.

  • A C E

    pg. 42, jan./jun. 2012

    Percebe-se que uma poltica institucional

    que trabalhe com servio educativo bem

    estruturado com as escolas e seus curr-

    culos, aes culturais voltadas a pblicos

    variados, com base nos fundos documen-

    tais das instituies arquivsticas e dos que

    podem ser criados pelas atividades desen-

    volvidas, proporcionariam uma guinada

    na visibilidade dos arquivos e arquivistas

    junto ao pblico em geral, aumentando a

    visitao.

    A mudana de viso sobre a capacidade

    dos arquivos, como dissemos, passa por

    uma mudana da poltica institucional e

    tambm da viso que os arquivistas pos-

    suem da prpria profisso, que engloba

    as funes tcnicas essenciais prtica,

    como recolhimento, custdia, preservao

    e organizao de fundos documentais,

    alm de uma dimenso mais educativa,

    social e cultural.

    Vale mencionar, ainda, a falta de recur-

    sos humanos e financeiros, que implica

    a dificuldade de se implementar uma

    prtica direcionada para o servio edu-

    cativo e a ao cultural, uma vez que os

    profissionais esto muito ocupados com

    a funo tcnica diria. De fato, sabe-se

    das precrias condies de trabalho em

    arquivos pblicos Brasil afora e das limi-

    taes encontradas pelos profissionais

    que neles atuam, como falta de material

    bsico de trabalho, espao adequado ao

    armazenamento de fundos documentais

    e sobrecarga devido ao pequeno nmero

    de funcionrios. Contudo, a experincia

    do ANTT mostra que uma poltica institu-

    cional consolidada no sentido de priorizar

    uma prtica voltada para a oferta proativa

    de divulgao de acervo, buscando novos

    pblicos, inclusive a partir das escolas,

    possvel com uma equipe reduzida que

    atua na organizao e planejamento do

    marketing cultural e de projetos.

    essencial boa articulao e comunicao

    entre todos os funcionrios do arquivo

    para gerir os projetos, a fim de atingir

    qualidade e sucesso na implantao,

    manuteno e avaliao permanente do

    servio educativo e das aes culturais.

    Referncias Bibliogrficas

    BELLOTTO, Heloisa Liberalli. Arquivos permanentes: tratamento documental. So Paulo:

    T. A. Queiroz, 1991.

    FLUSSER, Victor. A biblioteca como instrumento de ao cultural. Revista Brasileira de

    Biblioteconomia e Documentao, So Paulo, v. 12, n. 3, p. 145-169, set. 1983.

  • R V O

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    FREITAS, Snia Maria de. Histria oral: possibilidades e procedimentos. 2. ed. So Paulo:

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    VANSINA, Jan. A tradio oral e sua metodologia. In: ______. Histria geral da frica. So

    Paulo: tica; Paris: Unesco, 1982, v.1.

    R E S U M O

    O artigo apresenta uma possibilidade de pensar o arquivo enquanto fonte educativa

    e de ao cultural, para alm da sua funo primordial de recolhimento, preservao

    e organizao de fundos documentais. Discute a funo social das instituies arqui-

    vsticas por meio de uma poltica institucional voltada para a capacidade educativa,

    social e cultural.

    Palavras-chave: instituio arquivstiva; fonte educativa; ao cultural.

  • A B S T R A C T

    This article presents a possibility of thinking of archive as a source of education and

    cultural action, to beyond its primordial function of collecting, preserving and organizing

    documentary collections. Discusses the social role of archival institutions through institu-

    tional policy aimed towards the educational, social and cultural capacity.

    Keywords: archival institution; educational source; cultural action.

    R E S U M N

    Este artculo presenta una posibilidad de pensar en el archivo como una fuente de accin

    educativa y cultural, adems de su funcin primordial de reunir, conservar y organizar los

    fondos documentales. Analiza el papel social de las instituciones de archivo a travs de

    la poltica institucional respecto a la capacidad educativa, social y cultural.

    Palabras clave: institucin de archivo; fuente educativa; accin cultural.

    Recebido em 12/9/2012

    Aprovado em 13/9/2012