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Movimento entre os compartimentos 2010 1 Iuri Marques de Oliveira & Renato Moreira Rosa Nos organismos vivos existe um constante fluxo de soluto e solvente (água) entre os compartimentos intra e extracelular. Dessa forma é possível que os nutrientes (açúcares, aminoácidos, lipídios, nucleotídeos, água, íons) oriundos da dieta possam ser absorvidos no trato gastrintestinal, viajar pela circulação sendo por fim distribuídos a todas células do organismo, desde as mais superficiais até as localizadas no interior dos tecidos, através da rede capilar. Da mesma maneira, o oxigênio é conduzido a todas células e os catabólitos (resíduos) do metabolismo são excretados da célula, recolhidos pelo sistema circulatório e eliminados pelo corpo, seja na urina (uréia, potássio, ácido úrico, corpos cetônicos...), no ar expirado (gás carbônico, corpos cetônicos). No entanto, para o entendimento a respeito da manutenção da perfeita homeostase (equilíbrio fisiológico) desses sistemas é necessário compreender alguns princípios e mecanismos envolvidos no transporte celular e entre zonas compartimentalizadas. Dentre esses mecanismos, estudaremos a difusão e a osmose. 1. Difusão Difusão é o movimento aleatório individual das moléculas (movimento browniano) (Figura 1) componentes de uma mistura qualquer provocados por forças eletrostática e internucleares que repelem as moléculas transferindo energia cinética, e com esta movimentação acaba-se atingindo a uniformidade de distribuição das moléculas em toda extensão disponível, o que confere um estado de maior energia e portanto, maior estabilidade. Ocorre em gases, líquidos e sólidos. Na prática, é a movimentação de um soluto de uma região de maior concentração para uma de menor concentração em um meio. Por exemplo, a dissolução de açúcar em água promove a difusão do açúcar em todas as direções com finalidade de se obter a mesma concentração do soluto em toda extensão do líquido.

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Movimento entre os compartimentos 2010

1

Iuri Marques de Oliveira & Renato Moreira Rosa

Nos organismos vivos existe um constante fluxo de soluto e solvente (água)

entre os compartimentos intra e extracelular. Dessa forma é possível que os nutrientes

(açúcares, aminoácidos, lipídios, nucleotídeos, água, íons) oriundos da dieta possam ser

absorvidos no trato gastrintestinal, viajar pela circulação sendo por fim distribuídos a

todas células do organismo, desde as mais superficiais até as localizadas no interior dos

tecidos, através da rede capilar. Da mesma maneira, o oxigênio é conduzido a todas

células e os catabólitos (resíduos) do metabolismo são excretados da célula, recolhidos

pelo sistema circulatório e eliminados pelo corpo, seja na urina (uréia, potássio, ácido

úrico, corpos cetônicos...), no ar expirado (gás carbônico, corpos cetônicos). No entanto,

para o entendimento a respeito da manutenção da perfeita homeostase (equilíbrio

fisiológico) desses sistemas é necessário compreender alguns princípios e mecanismos

envolvidos no transporte celular e entre zonas compartimentalizadas. Dentre esses

mecanismos, estudaremos a difusão e a osmose.

1. Difusão

Difusão é o movimento aleatório individual das moléculas (movimento

browniano) (Figura 1) componentes de uma mistura qualquer provocados por forças

eletrostática e internucleares que repelem as moléculas transferindo energia cinética, e

com esta movimentação acaba-se atingindo a uniformidade de distribuição das

moléculas em toda extensão disponível, o que confere um estado de maior energia e

portanto, maior estabilidade. Ocorre em gases, líquidos e sólidos. Na prática, é a

movimentação de um soluto de uma região de maior concentração para uma de menor

concentração em um meio. Por exemplo, a dissolução de açúcar em água promove a

difusão do açúcar em todas as direções com finalidade de se obter a mesma

concentração do soluto em toda extensão do líquido.

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A migração do soluto de uma região

mais concentrada para uma região menos

concentrada ocorre por uma questão de

probabilidade, pois a chance de uma molécula

ir de onde ela esta em maior número para

onde ela esta em menor número é maior

(sempre é mais fácil e mais provável um corpo

migrar de onde ele esstá para onde ele não

está). Uma anlogia útil é pensar em um

elevador cheio de pessoas e fora do elevador

com uma pessoa só, se elas estiverem

vendadas e se movimentando sem saber para onde ir é mais provável que saia uma

pessoa do elevador que está mais cheio do que entre uma pessoa dentro (Figura 2).

Desta maneira, se pingarmos uma gota de tinta em um recipiente com água logo depois

as partículas da tinta estarão espalhadas pela solução (Figura 3)

Figura 1: Movimento aleatório das moléculas (movimento browniano)

Figura 2: Figura mostrando um

elevador com maior concentração de

pessoas do que do lado de fora

Figura 3: Figura mostrando a

difusão de partículas de tinta em

uma solução

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É importante salientar que quando atinge o equilíbrio de concentrações, não há

uma parada de movimento dos solutos, pois sempre há um movimento constante das

moléculas, mas a diferença é que elas se movimentam na mesma velocidade em ambas

direções, então macroscópicamente parece que não há mais movimento de difusão.

Podemos também expandir a definição de difusão para a movimentação de um

determinado soluto através de uma membrana que separa duas zonas

compartimentalizadas na direção da zona em que este soluto encontra-se em maior

concentração para a zona de concentração menor. Esse movimento visa atingir o

equilíbrio de concentração do soluto entre as duas zonas. Isso ocorre na movimentação

de solutos entre os compartimentos, como na passagem de solutos dos vasos sangüíneos

para o interstício e deste para o interior celular, seguindo seu gradiente de concentração

e passando pelas membranas biológicas (Figura 4).

Outro ponto muito importante de ser entendido é que o movimento de difusão é

individual para cada soluto e poderá existir somente quando houver um gradiente

(diferença) de concentração desse soluto entre as duas zonas. Vamos então imaginar a

seguinte situação:

Figura 4: Difusão de solutos entre os

compartimentos

Movimento entre os compartimentos 2010

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Observe dois compartimentos separados por uma membrana. Em ambos lados

existe uma solução dos solutos “bolinhas e quadradinhos”. Admita que ambos

compartimentos apresentam o mesmo volume (lembrar: solução = soluto + solvente).

Ora, se o volume de solvente é o mesmo, obviamente o compartimento A está mais

concentrado de “bolinhas” que o compartimento B. Considerando que a membrana que

separa os dois compartimentos seja permeável ao soluto “bolinhas”, existirá um fluxo

de bolinhas da zona A para zona B com intuito de igualar a concentração de bolinhas

em ambos compartimentos. Esse movimento denomina-se difusão (ou difusão simples).

Por que isso ocorre ? Porque existe uma diferença de concentração de bolinhas entre os

compartimentos (ou seja, temos um gradiente de concentração).

Entretanto, como a concentração de quadradinhos é a mesma em ambos lados,

não ocorre difusão desse soluto. Cada soluto movimenta-se a favor do seu gradiente de

concentração, não importando-se com as outras substâncias presentes. Na verdade, a

movimentação de soluto ocorre mas com mesma velocidade em ambos sentidos pois o

equilíbrio químico é um estado dinâmico.

Adequando nossa explicação aos sistemas biológicos podemos imaginar que

bolinhas podem representar o oxigênio; o compartimento A é o ar inspirado e B, o

interior dos alvéolos. A membrana representa a membrana alveolar. Bolinhas podem ser

um nutriente; A pode ser a luz do intestino e B, as células intestinais responsáveis pela

absorção. A membrana representa então a membrana celular dos enterócitos. Bolinhas

podem ser glicose, A pode representar a circulação capilar e B, as células do interstício

que estão necessitando de glicose. Nesse caso, a membrana simula a parede do capilar.

Bolinhas podem representar o sódio, A pode ser a luz do túbulo convolto proximal do

rim, B pode ser a célula do tubo proximal e novamente a membrana seria a membrana

celular.

1.1 Fatores que afetam a difusão

Uma observação importantíssima deve ser feita: o movimento de difusão

somente ocorrerá se a membrana for permeável ao soluto. A permeabilidade de uma

membrana é uma característica inerente à sua estrutura e composição, variando entre os

tipos celulares e as espécies. No caso da membrana celular é preciso conhecer sua

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estrutura para poder determinar se um soluto poderia atravessá-la por simples difusão.

Quando existe um gradiente de concentração para um determinado soluto e as

membranas celulares são permeáveis a esse soluto por simples difusão, ocorre passagem

de soluto da zona de maior concentração molar para a de menor. O movimento de

simples difusão não requer gasto de energia pois ocorre a favor do gradiente de

concentração.

Aqui é importante ver o que faz

uma molécula ser permeável nas

membranas biológicas por simples difusão.

Mesmo que a molécula esteja a favor do

gradiente de concentração, é necessário ter

em vista dois aspectos as características da

membrana plasmática e as características

da molécula. A membrana é uma estrutura

que possui uma bicamada de fosfolipídeos

tendo faces hidrofílicas e um interior

hidrofóbico, também é um estrutura

relativamente compacta possuindo

pequenos espaços entre os fosfolipídeos.

Portanto, as moléculas serão selecionadas

pelo tamanho e pela polaridade, ou seja,

moléculas pequenas que consigam passar

entre os fosfolipídeos poderão passar a

membrana somando ao fato de serem

apolares ou sem carga, já que devem passar

o interior hidrofóbico. Concluindo, as moléculas pequenas apolares ou polares sem

carga conseguem atravessar a membrana por simples difusão, ou seja, a favor do seu

gradiente de concentração. Já moléculas grandes, polares e/ou carregadas não

conseguem atravessar a membrana por simples difusão obedecendo seu gradiente

(Figura 5).

Dessa maneira, as substâncias que atingem a circulação sanguínea distribuem-

se por todo volume de plasma disponível e assim viajam a todos pontos do organismo,

Figura 5: figura mostrando os tipos de

moléculas que podem passar a

membrana e aquelas que não podem

passar livremente

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difundindo-se no sangue, posteriormente ao espaço intersticial e por fim aos tecidos e

no interior celular.

Olhando agora em termos de organismo, as substâncias de caráter menos polar

(lipofílicas – amigas da gordura) tem uma passagem pelas membranas por simples

difusão mais fácil que as substâncias de caráter mais polar (hidrofílicas - amigas da

água). No entanto, como os compartimentos do organismo são montados em meio

aquoso e interconectados, as substâncias que se dissolvem mais facilmente em água tem

uma distribuição mais favorecida pelo organismo. Dessa forma, as substâncias devem

possuir uma polaridade intermediária, ou seja, um caráter lipofílico e hidrofílico para o

uso terapêutico. A medida do caráter de polaridade de uma determinada molécula é

realizada pela determinação do seu coeficiente de partição óleo/água. As substâncias

mais lipofílicas possuem uma absorção mais fácil e eliminação mais demorada, pois a

excreção pela urina ou outros meios necessita de solubilização em água. No organismo,

o fígado metaboliza as substâncias lipofílicas tornando-as hidrofílicas. As substâncias

hidrofílicas possuem uma absorção menos facilitada, mas distribuição e eliminação

fáceis. A questão do caráter da substância e sua correlação com o perfil de absorção é

muitas vezes a etapa limitante no desenvolvimento de novos medicamentos; algumas

vezes, para eliminar a necessidade da absorção ao longo de tubo digestivo, outras vias

(como a endovenosa ou uma injeção localizada no tecido alvo) são utilizadas.

O grau de ionização também é importante, pois os grupamento ionizados

atraem água para hidratação, tornando-se maiores em tamanho que a molécula original.

O grau de ionização, ou seja as porcentagens de uma molécula que encontram-se na

forma ionizada e forma não ionizada dos seus grupamentos é determinada pelo pH do

meio. As substâncias de natureza ácida encontram-se menos ionizadas em pH ácido;

consequentemente sua absorção é favorecida no estômago ao invés do intestino delgado,

por exemplo. A equação de Handerson Hasselbach modificada permite determinar a

porcentagem de ionização de uma substância em função do pH. As passagens de um

soluto entre os compartimentos depende do grau de ionização, pois os compartimentos

tem valores diferentes de pH. Por exemplo, na mucosa gástrica temos pH em torno de

1,0, no plasma pH 7,4 enquanto um tecido inflamado tem um pH em torno de 5,0.

Por exemplo, os anestésicos locais são administrados na proximidade do tecido

a ser anestesiado, em espaços aquosos do organismo ou superfície da pele. Quando a

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injeção é realizada na proximidade do tecido, a molécula anestésica deverá transitar do

liquído intersticial para o axônio do nervo sensor, atravessando o perineuro por simples

difusão. Dessa forma, os anestésicos que apresentarem a maior parte de suas moléculas

na forma não ionizada no pH do líquido intersticial (7,4) atravessarão a membrana mais

facilmente. Quando o tecido está inflamado, o seu pH está mais ácido, propriciando que

mais moléculas do anestésico fiquem na forma ionizada, diminuindo a quantidade de

substância para o tecido e reduzindo o efeito anestésico.

Todos esses parâmetros devem ser levados em conta quando queremos que

uma certa substância penetre no sistema nervoso central, por exemplo, pois esse é

protegido por uma camada gordurosa denominada barreira hematoencefálica, que inibe

a passagem de uma série de substâncias do sangue para o sistema nervoso central. É

exatamente por isso que várias moléculas possuem ação em diversos tecidos do

organismo, mas não possuem ação ou efeito colateral em nível de SNC.

1.2 Velocidade de difusão (Fluxo)

Considerando então os solutos que conseguem atravessar a membrana por

simples difusão, podemos verificar que existem vários fatores que influenciam na

velocidade dessa difusão através da membrana. Esses fatores são tratados

matematicamente pela equação da 1ª Lei de Fick (Adolf Fick, 1855). Portanto, a

Primeira Lei de Fick determina a velocidade de difusão dos solutos. Seguindo a

expressão:

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A velocidade é dada pelo número de partículas que se movimentam pelo tempo

e vários fatores influenciam nessa difusão, afetando a velocidade, logo é levado em

consideração fatores como o gradiente de concentração (C), a espessura da membrana

(X) e a área transversal (A) (Figura 6). Também o meio que a difusão ocorre e as

características moleculares do soluto devem ser considerados.

Quanto maior a área de superfície disponível, mais rápido o processo acontece.

Da mesma forma, quanto menor a espessura da membrana, maior a velocidade de fluxo.

Isso ocorre pois as moléculas possuem mais espaço para passar, o que se torna óbvio

quando se pensa por exemplo em um cano de água, vai passar um volume maior de

água por um cano mais largo do que um cano mais fino. Esses fatores explicam as

razões do intestino constitutir o principal sítio absortivo do trato gastrintestinal (em

razão de sua grande área). Além disso, a estrutura dos alvéolos possibilita uma área

grande, favorecendo a difusão do oxigênio, o que é muito importante em animais de

sangue quente com elevada taxa metabólica. Em contrapartida, os anfíbios (animais de

sangue frio) possuem um pulmão em forma de saco único, o que é compensado pela

respiração cutânea. Os túbulos renais são longos e finos, o que faz com que a taxa de

reabsorção de solutos por simples difusão nunca torne-se um fator limitante para o

processo.

O gradiente de concentração também influencia no processo. Quanto maior o

gradiente de concentração, maior será a velocidade de fluxo, pois o gradiente é a força

que impulsiona o processo, já que maior número de moléculas vão se movimentar a

Figura 6: Figura mostrando os fatores que influenciam na difusão

Movimento entre os compartimentos 2010

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favor do gradiente, pois há um número mais elevado de moléculas em uma região da

solução do que na outra, havendo mais moléculas disponíveis para migrar para onde

estão em menor número.

A espessura da membrana influencia, já que quanto mais fina mais veloz será a

difusão, pois é um trajeto menor para o soluto percorrer. Os vasos sanguíneos da região

sublingual são numerosos e finos, o que faz com que os fármacos administrados por

essa via, como a nitroglicerina, nifedipina, isosorbida, vitamina B12, algumas vacinas,

tenham efeito praticamente imediato. Os capilares alveolares também são finos, fazendo

com que as substâncias administradas em aerosol (e congêneres) tenham efeito rápido

no organismo.

A composição do meio influencia no processo. A expressão da influência do

meio faz-se através de uma constante, a qual varia para cada ambiente. Por exemplo, a

difusão do oxigênio no ar não ocorre na mesma velocidade de difusão do oxigênio do

sangue para os tecidos.

A massa molecular do soluto também exerce certa influência: quanto menor o

tamanho da molécula, maior sua energia cinética e movimentação (movimento

Browniano). Isso torna mais rápido o processo. Nesse sentido, quanto maior a

temperatura maior será o fluxo, pois a energia térmica influencia a energia cinética das

moléculas. Em relação ao estado físico, a difusão é sempre mais rápida em fase gasosa

> líquida > sólida. Quanto maior o tempo de contato, maior é a eficiência do processo.

Assim permite-se a conclusão da movimentação e estabelecimento do equilíbrio.

Ainda pode-se deduzir o coeficiente de permeabilidade da membrana, pela

expressão:

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2. Osmose

Observe a situação anterior:

Considerando que a membrana seja livremente permeável aos solutos, com o

passar do tempo, cada soluto se difundiu a favor de seu gradiente e ao final do processo

como cada soluto atingiu seu equilíbrio químico, o que faz com que os compartimentos

estão com a mesma quantidade total de partículas.

No entanto, considere que a membrana que separa os compartimentos não seja

permeável a solutos mas seja livremente permeável a solvente. Como poderia atingir-se

o equilíbrio nesse sistema, ou seja, como os compartimentos poderiam atingir a mesma

concentração total de partículas em ambos lados sem a existência de difusão dos

solutos?

Uma membrana permeável a solvente mas impermeável a solutos recebe a

denominação de membrana semipermeável. As membranas celulares, na realidade, são

seletivamente permeáveis, deixando passar livremente moléculas com o tamanho e

polaridade adequada e seletivamente alguns solutos por transporte controlado. Enfim,

independente das características da membrana, o sistema precisa atingir o estado de

equilíbrio, caracterizado pela mesma quantidade de partículas em ambos

Movimento entre os compartimentos 2010

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compartimentos. Uma vez que o soluto esteja impedido de se difundir, uma alternativa é

utilizar um fluxo de solvente para equilibrar concentrações. Esse fluxo de solvente

denomina-se fluxo osmótico de água e esse processo chama-se osmose (na prática é a

difusão do solvente). O solvente ou a água no caso também se movimenta a favor de seu

gradiente indo para onde tem menos água igualmente por movimentos aelatórios das

moléculas.

O solvente sempre movimenta-se livremente através de membranas

semipermeáveis sempre da zona de menor quantidade de partículas de soluto (menor

osmolaridade) para a zona de maior quantidade de partículas de soluto (maior

osmolaridade) consequentemente atingindo o equilíbrio de concentrações por meio de

diluição.

Observe que no momento inicial, ambas soluções estão com o mesmo volume

líquido total. Ao final do processo de osmose, a água passou de B para A com objetivo

de diluir A. Assim o nível de solvente em B reduziu e em A aumentou. Ora, com essa

variação de volume de solvente, a concentração (concentração = soluto / solvente) de

todos solutos igualou-se e consequentemente a concentração total de partículas

(osmolaridade) também, atingindo o equilíbrio. Portanto, osmose é o nome dado ao

Osmolaridade é a expressão do número total de partículas de soluto de uma solução

ou meio. Sendo uma propriedade coligativa das soluções, não depende da natureza

química do soluto, mas exclusivamente da quantidade. Para expressar osmolaridade

utiliza-se a unidade osmol/L (osm).

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processo de trânsito de solvente através de duas zonas compartimentalizadas separadas

por uma membrana semipermeável, a qual é permeável a solvente, mas não é permeável

a solutos por simples difusão. Podemos então dizer que ambos compartimentos

apresentam agora a mesma concentração total de partículas no meio ou seja a mesma

osmolaridade.

Uma solução 1 osm/L (1 osmol/L ou 1 osmolar) é uma solução que contém 1

mol de partículas em 1 litro de solução. Percebe-se que osmolaridade é a expressão

molar de uma quantidade de partículas. Uma solução 2 osmolar contém 2 mol de

partículas por Litro de solução. Independendo das partículas serem glicose, frutose,

sódio, cálcio, cloreto, ou uma mistura desses solutos.

E por que o solvente vai de onde tem uma osmolaridade menor para onde tem

uma osmolaridade maior, ou seja, de onte tem menos partículas de soluto para onde tem

mais partícula de soluto? Podemos pensar que uma solução com osmolaridade menor do

que outra, ou seja, com menor número de partículas de soluto do que outra possui as

moléculas de soluto mais livres para se movimentarem do que uma solução com mais

moléculas de soluto para interagirem e prenderem mais as moléculas de solvente. Tendo

então uma mobilidade maior elas podem se movimentar mais com movimentos

aleatórios e ir para onde estão menos móveis e em menor número. Portanto, é o mesmo

processo de difusão visto nos solutos, mas agora aplicado ao solvente. Mas ainda uma

pergunta: Por que o volume da solução varia na osmose e não na difusão? Pois o

solvente é o que está em maior quantidade, existindo um número bem maior de

moléculas de solvente do que de soluto, portanto qualquer movimento deste causa

variação macroscópica de volume o que não é observado macroscopicamente pela

movimentação de soluto.

Quando há a movimentação do solvente para onde há maior osmolaridade

dizemos que está ocorrendo um fluxo osmótico. Mas por que esse fluxo osmótico cessa

em determinado momento? Quando há o fluxo osmótico, o solvente vai para onde está

mais concentrado e aumenta o volume dessa solução, se aumenta o volume por

aumentar o número de moléculas de solvente vai originar uma pressão hidrostática que

vai ser oposta ao fluxo osmótico, de maneira a fazer com que o fluxo cesse (Figura 7).

Pressão hidrostática: pressão exercida pelas moléculas de solvente na solução

Movimento entre os compartimentos 2010

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2.1 Cálculo da osmolaridade de soluções de composição conhecida

Para as soluções de composição conhecida podemos calcular a osmolaridade a

partir do conhecimento da molaridade dos componentes. Primeiramente é necessário

determinar a molaridade de cada componente. Após devemos determinar a

osmolaridade de cada componente e por fim, proceder a soma de todas as osmolaridades

individuais. Para determinação da osmolaridade multiplica-se a molaridade de cada

substância pelo seu fator de dissociação.

O que é o fator de dissociação?

Algumas substâncias como os sais, ácidos e bases inorgânicos dissociam-se

em meio aquoso, gerando um maior número de mol de partículas. Isso deve ser levado

em consideração já que a osmolaridade é o número de partículas de soluto que tem na

solução, então quando eletrólitos se dissociam geram maior número de partículas de

maneira a alterar a osmolaridade quando dissociados. Observe os exemplos da Tabela 1:

Figura 7: Figura mostrando o sentido do fluxo osmótico e a pressão hidrostática

se opondo

Movimento entre os compartimentos 2010

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Tabela mostrando o fator de dissociação de algumas substâncias

- Como calcular a osmolaridade de uma solução de cloreto de sódio 0,9 %?

É necessário determinar primeiramente a molaridade. Uma solução de

concentração 0.9 g% possui 0.9 g de NaCl dissolvidos em 100 mL de solução.

Uma solução 1 M de NaCl possui, por definição, a massa molar do soluto

dissolvida em 1 litro de solução. Ou seja, 58,5 g ( Na=23 + Cl = 35,5) em 1000 mL.

Nossa solução de NaCl possui 0,9 g dissolvidos em 100 mL. Logo, em 1000 mL seriam

9 g. Então:

Se tivéssemos 58,5 g -------------- 1 mol/L (1M)

Como temos 9 g -------------- x mol/L

X= 0,15 M

Osmolaridade = Molaridade x fator de dissociação

Logo, nossa solução 0,15 M é 0,3 osm.

O que isso significa ? Em 1 litro dessa solução existe 0,15 mol de íons e 0,15

mol de íons sódio. E também, em 1 litro dessa solução existe 0,3 mols de partículas (no

casos os íons Na e Cl).

Substância Dissociação Fator de dissociação

NaCl 1 NaCl 1 Na+ + 1 Cl

-

2

CaCl2 1 CaCl2 1 Ca+2

+ 2 Cl-

3

AlBr3 1AlBr3 1 Al+3

+ 3 Br –

4

Glicose

(C6H12O6)

1 Glicose 1 Glicose

( moléculas não dissociam)

1

Etanol

(C2H6O)

1 Etanol 1 Etanol 1

Movimento entre os compartimentos 2010

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- Qual a osmolaridade de uma mistura contendo 0,5 M de frutose e 0,1 M de

cloreto de cálcio?

Como osmolaridade é uma propriedade coligativa, o importante é apenas

quantidade, não identidade.

Osmolaridade da frutose 0.5 M = 0,5 x 1 = 0,5 osm

Osmolaridade do cloreto de cálcio 0,1 M = 0,1 x 3 = 0,3 osm

Logo a osmolaridade da mistura é 0,8 osm. Isso significativa que existem 0,8

mols de partículas em 1 litro dessa mistura. Desses 0,8 mols, 0,5 são de frutose e 0,3 de

íons cloreto e cálcio.

Uma observação importante: no caso de osmolaridade de ácidos, o número de

mols de prótons formados durante a dissociação não deve ser incluído no cálculo, pois

esse próton não permanece livre em meio aquoso como partícula, mas associado so

solvente formando íon hidrônio. No caso de misturas que envolvam substâncias

apolares como os lipídios, também não deve-se considerar sua concentração no cálculo,

pois embora estejam organizados em meio aquoso, esses não estão dissolvidos no meio.

2.2 Determinação da osmolaridade de misturas complexas (nas quais não se

conhece a quantidade de cada componente)

Nesse caso, a determinação é realizada experimentalmente através da

determinação da pressão osmótica da solução.

Pressão osmótica e osmolaridade são simplesmente formas diferentes para

expressar a mesma entidade, que é o número total de partículas de uma solução. No

entanto, a melhor maneira de compreender a natureza da pressão osmótica é imaginar

um dispositivo montado da seguinte maneira: um tubo de vidro contendo uma solução

Pressão osmótica: é a pressão exercida pelas partículas componentes umas contra as

outras e todas contra o ambiente que as contém. É uma propriedade coligativa: quanto

maior o número de partículas, maior será a pressão osmótica.

Movimento entre os compartimentos 2010

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concentrada (em termos de soluto e portanto, de partículas) imerso em um recipiente

contendo apenas solvente e na interface entre esses dispositivos, uma membrana

sintética que seja permeável a solvente e impermeável a soluto. Nessa situação, o

solvente irá entrar no duto de vidro por osmose. Ocorre então uma entrada de solvente,

o que eleva o volume de líquido no interior do duto de vidro. A elevação de um volume

líquido aumenta a pressão hidrostática do sistema. Quando ocorre a parada da entrada

de líquido no interior do duto, o volume líquido do tubo exerce uma pressão hidrostática

que é numericamente igual à pressão osmótica da solução. Pois quanto maior o número

de partículas de soluto ou seja maior osmolaridade e maior pressão osmótica, vai haver

fluxo osmótico aumentando o número de particulas de solvente e consequentemente

aumentado a pressão hidrostática sendo esta proporcionalao número de partículas de

soluto e igual a pressão exercida por essas partículas, ou seja, igual à pressão osmótica.

Se um pistão fosse acoplado ao duto de vidro: quando esse pistão exercesse uma

força tal que impeça o movimento osmótico de solvente, essa pressão mecânica (força

por área) exercida será numericamente igual a pressão exercida por todas partículas da

solução (pressão osmótica) (Figura 8).

Figura 8: Figura mostrando como medir a pressão osmótica

Movimento entre os compartimentos 2010

17

A abordagem do osmômetro demonstra facilmente como utilizar a pressão

osmótica para calcular osmolaridade. Esse artifício da variação de volume líquido após

o movimento osmótico de solvente permite determinar a osmolaridade de misturas

complexas, como os fluidos biológicos (sangue, líquor, leite materno,...), utilizando

dispositivos denominados osmômetros.

Imagine um saco constituído por uma

membrana impermeável a solutos e livremente

permeável ao solvente. A esse saco adapta-se um

tubo de vidro e todo conjunto é imerso em um

recipiente com solvente. No tempo zero temos um

certo nível de líquido no tubo de vidro.Para atingir o

equilíbrio, o solvente entrará no saco por osmose até

a diluição do compartimento. Como o saco está em

comunicação com o duto de vidro, ao final do

processo um aumento de líquido no interior do

compartimento irá refletir em um aumento do nível da

coluna de líquido no tubo. Essa coluna de líquido

exerce uma pressão e essa pressão hidrostática (pressão exercida por uma carga líquida)

é numericamente igual a pressão osmótica da solução.

- Pressão hidrostática = elevação da coluna de líquido (Δh) x d (densidade do líquido) x

g (aceleração da gravidade)

- Pressão osmótica = n x R(constante dos gases) x T(temperatura) / V(volume)

Medindo-se a altura de líquido e igualando-se as expressões é possível calcular

n/V, o que significa número total de partículas por unidade de volume, ou seja,

determinar a osmolaridade. Há muitas décadas, essa abrodagem também permitia a

estimativa da massa molecular de proteínas, com base na concentração osmolar e

densidade da solução.

Dessa forma determinou-se a osmolaridade dos líquidos biológicos, incluindo o

plasma humano. A osmolaridade dos fluidos biológicos é 0,3 osm (300 mOsm ou ainda

300 mOsm/L). Portanto, o plasma humano contém inúmeros componentes (proteínas,

enzimas, íons, aminoácidos, hormônios, etc) de forma a possuir 0,3 mol de partículas

Figura 9: Figura mostrando

um osmômetro

Movimento entre os compartimentos 2010

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por litro de plasma. Perceba que a concentração molar de cada um dos diversos

componentes do plasma é pequena, mas a soma de todos gera 0,3 mol de partícula por

litro.

No laboratório clínico a osmolaridade plasmática pode ser estimada por uma

fórmula simples: 2 x [Na] + [uréia em mmol/L] + [glicose em mmol/L].

2.3 Pressão oncótica, pressão osmótica e pressão vascular

Os íons e pequenas moléculas do plasma exercem uma pressão osmótica, pois

contam como partículas, e atraem água para sua hidratação, sendo responsáveis por

manter a água no interior dos vasos sanguíneos. O principal íon envolvido na

manutenção do volume do líquido extracelular é o sódio, o qual está 30 a 35 vezes mais

concentrado no meio extracelular que intracelular e ainda existe um aumento discreto de

sódio no vaso sanguíneo em relação ao interstício. Além dessa ação, a albumina

também contribui para a constância da carga hídrica do vaso.

A albumina, principal proteína sérica, responsável pela manuteção da pressão

oncótica no vaso e pelo transporte de ácidos graxos e outras substâncias. A albumina

além de constar como partícula no vaso, contribuindo para a osmolaridade plasmática,

ainda atrai muita água para hidratação de seus aminoácidos, o que faz com que uma

grande carga líquida exista no plasma em função da hidratação da albumina. A pressão

exercida pela albumina e sua carga líquida é a pressão oncótica ou coloidosmótica.

A pressão oncótica ou coloidosmótica é uma denominação especial para a pressão

osmótica exercida pelas proteínas em meio aquoso, as proteínas comportam-se como

soluções coloidais e a pressão osmótica exercida pelas soluções coloidais é sempre

maior que a pressão osmótica exercida pelas soluções verdadeiras, pois atraem muita

água, desta forma possuem uma pressão osmótica e uma pressão de embebição,

exatamente por “segurarem” muita água exercendo uma pressão extra (Figura 10).

Movimento entre os compartimentos 2010

19

2.4 Tônus celular

O termo tônus celular refere-se às condições de forma e volume de um tipo

celular. Dessa forma, soluções que são mais concentradas do que o interior da célula,

ou seja, que possuem osmolaridade mais elevada são chamadas de hipertônicas. Logo

quando se coloca a célula em uma solução hipertônica, esta vai perder água para

solução ficando crenada (murcha). Se a solução for menos concentrada, tendo uma

osmolaridade menor do que o interior da célula, esta é chamada de hipotônica. Se a

célula for colocada em uma solução hipotônica, esta vai ganhar água da solução e ficar

inchada, podendo até ser rompida dependendo de quanto hipotônica for a solução.

Sempre é necessário lembrar qual a solução quer possui mais água disponível para se

Pressão vascular é o somatório da pressão hidrostática, que é a pressão das moléculas

de água contra as paredes do vaso sanguíneo e também um reflexo da força de

bombeamento cardíaco, da pressão osmótica e da pressão oncótica.

Figura 10: Gráfico mostrando que a pressão oncótica é formada pela pressão

osmótica e mais uma pressão de embebição, já que as proteinas acumulam muita

água

Movimento entre os compartimentos 2010

20

movimentar, deste modo sempre irá para onde tem menos água, ou seja para onde tem

menos partículas de água e mais partículas de soluto (mais concentrada e com

osmolaridade maior). As soluções que não alteram o tônus celular, ou seja soluções

isotônicas, são recomendadas para uso endovenoso. Essas soluções possuem a mesma

osmolaridade do plasma não causando maior movimentação de água em algum sentido

(para dentro ou fora da célula) (Figura 11). Para uma solução ser isotônica é necessário

que possua a mesma osmolaridade do plasma ou seja 0,3 osm. No entanto, possuir a

mesma osmolaridade do plasma (ser isosmolar ao plasma) não é suficiente para uma

solução ser isotônica.

Mas por que nem sempre uma solução com a mesma osmolaridade da

célula, ou seja, isosmolar é uma solução isotônica (que não altera a forma da

célula)??? O raciocínio mais lógico é pensar que se há a mesma osmolaridade dentro da

célula e na solução não haverá maior migração de solvente e não afetará a forma e

volume celular e de fato um requisito para uma solução ser isotônica é também ser

isosmolar. Mas a osmolaridade esta relacionada apenas com o número de partículas e

não com o tipo de partícula, mas para ser isotônica o tipo de partícula também deve ser

considerado e mais uma característica deve ser levada em conta que é a permeabilidade

que a partícula possui. Para explicar vamos tomar como exemplo duas soluções: uma

solução isosmolar de NaCl e uma solução isosmolar de uréia.

Figura 11: Figura mostrando as alterações na forma da célula

Movimento entre os compartimentos 2010

21

Colocando-se a célula na solução isosmolar de NaCl o que acontece? Não vai

ocorrer alterações na célula, ou seja, é uma solução isotônica e isosmolar (Figura 12).

E o que ocorre agora se colocarmos a célula em uma solução isosmolar de

uréia? Vamos observar que a célula vai romper em pouco tempo (Figura 13). Por que

isto ocorre? Pois o soluto, no caso a uréia, se deslocará aumentando a concentração

intracelula, ou seja, aumentando a osmolaridade do interior da célula, o que causa o

deslocamento da água para dentro da célula. Podemos concluir que a solução de uréia é

isosmolar mas não é isotônica, pois alterou a forma da célula, inchando esta até romper,

ou seja, se comporta como uma solução hipotônica.

Figura 12: Figura mostrando que não há alterações na célula em uma

solução isosmolar de NaCl, mostrando que também é uma solução isotônica

Figura 13: Figura mostrando as alterações na célula em uma solução

isosmolar de uréia, mostrando que é uma solução isosmolar mas não é

isotônica

Movimento entre os compartimentos 2010

22

Mas ainda fica uma pergunta, por que a solução isosmolar de NaCl é isotônica

e a solução isosmolar de ureía não é? Aqui vai a outra condição para uma solução ser

isotônica, ela deve ser isosmolar mas não pode entrar na célula por simples difusão, não

pode ter entrada livre na célula. Os íons Na+ e Cl

- e qualquer íon de modo geral ou

moléculas com carga, e substâncias grandes e polares como a glicose, frutose... não

passam livremente a membrana, tendo um transporte controlado. Já moléculas polares

pequenas como a uréia passam livremente a membrana da célula pode simples difusão

seguindo seu gradiente de concentração (aqui não confundir, osmolaridade quer dizer o

número de partículas qualquer que sejam elas, então em número tem o mesmo número

de partículas na solução de uréia e dentro da célula, entretanto, a uréia esta mais

concentrada na solução do que dentro da célula, existe mais ureía na solução do que no

interior celular, logo, esta segue o seu gradiente de concentração para o interior da

célula, já que tem livre entrada). A livre entrada de uréia dentro da célula aumenta a

osmolaridade do interior, ficando mais água livre na solução e esta vai também entrar

dentro da célula alterado o formato desta, inchando a célula. Como o NaCl possui

transporte controlado, não há essa entrada grande de íons para dentro da célula somado

ao fato que há dentro da célula esses íons não sendo o gradiente tão grande como no

caso da uréia.

2.4 Osmolaridade e volume dos compartimentos

TODOS COMPARTIMENTOS DO ORGANISMO POSSUEM A

MESMA OSMOLARIDADE, 0,3 osm. Deve ser lembrado que a composição de

solutos dos compartimentos é diferente. Dessa forma, para alcançar a mesma

concentração osmolar com diferentes quantidades de solutos, é lógico que os

compartimentos deverão possuir diferentes volumes.

A água movimenta-se livremente entre os compartimentos, pois todos são

montados em meio aquoso e interconectados. Mesmo assim, o volume dessas regiões é

regulado de maneira homeostática e permanece constante, para manter a mesma

osmolaridade em todos. A razão pela qual o volume é mantido constante é a existência

da mesma concentração osmolar em todos compartimentos. Torna-se importante

Movimento entre os compartimentos 2010

23

perceber que qualquer alteração na osmolaridade de um compartimento, irá gerar um

deslocamento maior de uma quantidade de água entre esses compartimentos, alterando o

volume dos mesmo. Ou seja, a água se desloca em resposta a alterações da

osmolaridade.

Quando ocorre um aumento ou redução da concentração osmolar de uma

região, a água desloca-se da zona de menor osmolaridade para a zona de maior

osmolaridade, com objetivo de igualar as concentrações por diluição. Assim sendo, um

compartimento reduz de volume e um aumenta. A maioria dos solutos não possui livre

passagem pelo organismo, de maneira que as variações de volume acabam por acarretar

outras variações em seqüência. Portanto, há constante variação na osmolaridade dos

compartimentos pelo fluxo de solutos e solventes, mas são transitórias, protamente

reestabelecidas pelo fluxo de água e de solutos. A seguir serão citados alguns exemplos

patológicos.

Na doença conhecida como intolerância a lactose, a criança recém nascida não

possui a enzima lactase em condições funcionais no intestino. Dessa maneira, a lactose,

o principal açúcar do leite, não pode ser clivada em seus monossacarídeos, os quais

podem ser absorvidos pelas células intestinais. Quando um paciente com esse distúrbio

ingere lactose, esse dissacarídeo acumula-se na luz intestinal, aumentando a quantidade

de partículas na região e portanto elevando a osmolaridade. Quando essa osmolaridade

aumenta, a vizinhança, ou seja, o interstício, doa água para a luz intestinal (Lembrando

sempre que a água migra da zona de menor osmolaridade para a de maior osmolariade).

Na luz do intestino, essa água distente as alças e causa uma diarréia abundante. Estima-

se que a pessoa possa perder 1 Litro de água a cada copo de leite contendo 9 g de

lactose. A situação agrava-se mais, pois a lactose acumulada no intestino é convertida

em ácido lático pelas bactérias intestinais, atraindo ainda mais água para hidratar a sua

caga elétrica. O diagnóstico é clínico e o exame laboratorial revela fezes com pH ácido

e presença de abundante de açúcares.

Na infecção por Vibrio cholera, a toxina secretada pelo vibrião colérico

bloqueia a absorção de sódio pelos enterócitos e ainda causa uma secreção de íons

cloreto para a luz intestinal. Dessa maneira, aumentando-se a concentração de sódio e

cloreto na luz do intestino, a osmolaridade aumenta. Novamente, o intestino doa água

em grande quantidade para a luz, causando a diarréia. A cólera é umas das epidemias

Movimento entre os compartimentos 2010

24

mais antigas da humanidade, possuindo relatos em 500 a.C. Em infecções graves, o

paciente pode perder 1 Litro de líquido por hora em uma diarréia abundante e aguada.

Os estados de desidratação podem ser caracterizados por diferentes alterações

na osmolaridade plasmática, devido a perda maior de solvente, solutos ou equivalente

de ambos.

É importante entender que a perda de água por qualquer compartimento irá

sempre refletir-se em variações da osmolaridade plasmática. Quando perdemos água do

interstício por uma diarréia violenta, por exemplo, o intertíscio perde água mas seus

solutos permanecem, pois esses não tem passagem livre pelos compartimentos. Assim, a

osmolaridade do interstício acaba se elevando e o plasma doa água para o interstício,

ficando então com sua osmolaridade elevada. O plasma é o grande doador de líquido

nas perdas de volume dos compartimentos e receptor de líquido nas situações de

aumento de volume. Dessa forma, independente da via de perda de líquido, quando

realizamos a reposição hídrica pela via endovenosa, a osmolaridade plasmática

normaliza e com isso o volume dos compartimentos também, pois estes estão

interligados e a água flui livremente entre eles, permitindo que o volume dos

compartimentos se autoequilibre.

As soluções destinadas a administração endovenosa ou ocular devem ser

preparadas atendendo alguns critérios referentes a sua osmolaridade. Quando as células

que estão no vaso sanguíneo e os compartimentos do organismo entram em contato com

uma solução de osmolaridade elevada (rica em solutos), ocorrem alterações de volume.

Nessa situação, a água migra do interstício em direção ao vaso e também dos eritrócitos

em direção ao plasma, causando a redução do volume dos eritrócitos (um fenômeno

denominado crenação; a célula murcha). Como o interstício perdeu água mas não

perdeu solutos, a sua osmolaridade também elevou-se e por isso, o tecido adjacente ao

interstício doa água e as células reduzem de volume. As soluções de osmolaridade

maior que a do plasma capazes de reduzir o volume de um morfotipo celular são

denominadas soluções hipertônicas.

Quando realiza-se uma injeção de uma solução com osmolaridade menor que a

dos plasma humano (pobre em solutos), o plasma sofre uma diluição. Nesse momento, a

osmolaridade plasmática reduz e causa movimentação de água em direção ao interstício

e ao interior das células sanguíneas, as quais aumentam de volume. Quando o interstício

Movimento entre os compartimentos 2010

25

recebe essa carga líquida, a sua osmolaridade reduz, causando entrada do excesso de

líquido nas células do tecido periférico.

Em resumo, se admistrarmos uma solução que tenha a mesma osmolaridade do

plasma, ou seja, uma solução isosmolar e/ou isotônica não haverá alteração na

movimentação de água entre os compartimentos já que não foi alterada a osmolaridade.

Já se for injetada no vaso uma solução mais concentrada e conseqüentemente com

osmolaridade maior do que 0,3 osmolar, ou seja, hiperosmolar ou hipertônica, o plasma

ficará com a osmolaridade elevada então haverá migração de água do interstício para o

vaso, com o objetivo de compensar essa elevação na osmolaridade, entretanto, como o

interstício perdeu água vai aumentar sua osmolaridade também então o tecido periférico

vai perder água para o interstício. Também haverá redução do volume das hemáceas, ja

que vão perder água para o plasma que esta hipertônico. Se colocar uma solução com

osmolaridade menor, ou seja, hipotônica ou hiposmolar no vaso o plasma será diluído

ficando com osmolaridade reduzida então vai perder água para o interstício para

compensar e tentar aumentar a osmolaridade novamente, como o interstício ganhou

água também ficará com osmolaridade reduzida e conseqüentemente migrará água deste

para o tecido periférico. Também haverá um aumento do volume das hemáceas,

podendo haver até rompimento delas, dependendo de qunto hipotônica for a solução.

(por isso é muito perigo injetar água pura na corrente sangüínea, pois é extremanten

hipotônica e vai levar ao rompimento das hemáceas)

É importante ressaltar que sempre um compartimentos tende a compensar

alterações na osmolaridade do outro compartimento e sempre a água migra da onde sua

pressão hidrostática é maior (onde tem mais água disponível para poder migrar, pois

tem menos soluto para interagir) para onde sua pressão hidrostática é menor (onde tem

mais partículas de soluto e menos de água).

Em doenças degenerativas renais, que causam perda albumina na urina

(albuminúria) ou pessoas desnutridas, que não são capazes de sintetizar a proteína (a

qual é renovada periodicamente na circulação), a pressão oncótica está reduzida. Dessa

forma, reduz-se também a osmolaridade do vaso e a pressão osmótica do ambiente.

Dessa forma existirá uma migração de água do vaso para o interstício (por ora mais

concentrado que o vaso). Lembre-se que a água que estava ocupada com a hidratação

da albumina agora encontra-se livre no plasma. Esse aumento do conteúdo de água livre

Movimento entre os compartimentos 2010

26

no plasma promove a saída de grande quantidade de líquido da circulação, repercutindo

na queda de pressão vascular. O acúmulo de água no interstício denomina-se edema e é

por essa razão que as pessoas com problemas renais ou desnutridas apresentam um

aspecto inchado. Além do edema, a pressão oncótica reduz, causando uma redução na

pressão vascular.

2.5 Soluções para uso endovenoso

Então, se qualquer alteração de osmolaridade leva a uma alteração de volume

entre compartimentos, que tipo de soluções podem ser usadas diretamente no vaso

sanguíneo?

Aqui entram as soluções fisiológicas e o que seriam estas soluções? As

soluções fisiológicas devem ser:

- isosmolares

- isotônicas

- não tóxicas

As soluções fisiológicas mais comuns são a solução de NaCl 0,9% (0,3 M ou

0,3 osmolar) e de glicose 5,4% (0,3 osmolar). Notem que são substâncias não tóxicas,

que tem a mesma osmolaridade dos líquidos biológicos e são isotônicas, não alteram a

forma e volume celular (pois possuem a mesma osmolaridade e não entrar livremente na

célula por simples difusão, posssuem transporte controlado).

3. Diálise

A diálise consiste em ter um gradiente de concentração e uma membrana

seletivamente permeável, ou seja, consiste de uma membrana que possui poros e só

passará por esses poros as partículas que tiverem tamanho adequado, se foram menores

que os poros da membrana, a partícula passa e se for maior ficará retida não passando a

membrana e essa movimentação é provocada pelo gradiente de concentração. Na prática

a membrana dializadora é impermeável a macromoléculas, mas permeável a íon e

moléculas do soluto que tiverem tamanho menor do que os poros e partículas do

Movimento entre os compartimentos 2010

27

solvente, mas retém as partículas coloidais, pois são muito grandes, deixando passar as

demais substâncias. Membranas de colódio e celofane são exemplo de membranas

dializadoras. Na diálise os princípios da difusão e osmose ocorrem concomitantemente

dependendo das características de cada soluto.

O método básico consiste em colocar dentro do saco de diálise a solução,

fechá-lo o colocar em uma outra solução. É necessário que a solução externa ao saco

não contenha os solutos que existam dentro do saco, ou pelo menos não aqueles que

queremos retirar de dentro do saco de diálise. Então a separação se dará por tamanho

passará as particulas que possuem dimensões adequadas para passar os pelos poros da

mebrana dialisante e a movimentação para o líquido externo se dará a favor do gradiente

de concentração.

Para explicar melhor, vamos considerar o exemplo da Figura 14. Há bolinhas

azuis e vermelhas. As bolinhas azuis são maiores e as bolinhas vermelhas menores e

estão em uma solução dentro do saco fechado. Esse saco é constituído pela membrana

dialisante, que possui poros. Então esse saco contendo no seu interior a solução com

Figura 14: Diálise. (a) Uma solução concentrada é separada de um grande volume de

solvente por uma membrana de diálise (mostrada como um tubo com nós nas duas

extremidades). Apenas as moléculas pequenas podem difundir-se através dos poros na

membrana. (b) Em equilíbrio, as concentrações das pequenas moléculas são

aproximadamente iguais em ambos os lados da membrana, ao passo que as

macromoléculas permanecem dentro do saco de diálise.

Movimento entre os compartimentos 2010

28

bolinhas azuis e vermelhas é colocado em um recipiente com água ou alguma solução

que não contenha bolinhas azuis e vermelhas. Logo estas bolinhas estão mais

concentradas dentro do saco do que na solução exterior, então vão se movimentar

seguindo seu gradiente de concentração, entratanto as bolinhas azuis são maiores que os

poros da membrana então ficam retidas dentro do saco, enquanto as bolinhas vermelhas

que são menores consequem passar pelos poros da membrana seguindo seu gradiente de

concentração e vão ir para solução externa até igualar as concentrações dentro e fora do

saco. Esse procedimento de diálise pode ser utilizado para fazer a separação das

bolinhas vermelhas e azuis, no caso as bolinhas azuis poderiam ser uma proteína e as

bolinhas vermelhas sais e poderiamos querer separar esta proteina (bolinhas azuis) dos

sais (bolinhas vermelhas). Outra possibilidade poderia ser essa solução dentro do saco

representar o sangue a água externa uma solução dialisante e as bolinhas azuis

representarem proteinas no plasma e as bolinhas vermelhas toxinas a serem removidas.

Dentro deste exemplo, podemos passar a falar sobre a hemodiálise.

3.1 Hemodiálise

Os rins exercem diferentes e vitais funções para o organismo, tais como:

a) realizar a filtração glomerular: o plasma é continuamente filtrado durante o dia no

interior dos túbulos renais, onde as substâncias que necessitam permanecer no

organismo são então reabsorvidas pelas células tubulares e aquelas que permanecem no

interior dos túbulos renais (ou seja, no filtrado glomerular) são encaminhadas para

formação da urina. De tal maneira, os rins eliminam as toxinas do plasma, como por

exemplo a uréia (produto final do catabolismo dos compostos nitrogenados), a

creatinina e o ácido úrico (produto final do metabolismo nitrogenado).

b) manter a homeostase hídrica e metálica: os rins regulam a absorção e excreção dos

íons no organismo, mantendo o seu perfeito equilíbrio no organismo. Uma vez que a

regulação da concentração dos íons, notadamente do sódio, altera a osmolaridade do

líquido extracelular, os rins também regulam o volume do líquido extracelular.

c) regulação da pressão arterial: se os rins regulam a concentração de íons e solutos e

também o volume do líquido extracelular, esses órgãos alteram a pressão osmótica e

Movimento entre os compartimentos 2010

29

hidrostática vascular, regulando assim a pressão arterial. Além disso, os rins atuam na

produção de algumas substâncias com ação nos vasos sanguíneos.

d) os rins possuem uma função importante para o metabolismo ósseo pois atuam na

homeostase do cálcio e do fósforo

e) os rins possuem função hormonal, por exemplo, secretando a eritropoetina, um

hormônio envolvido na maturação da série vermelha do sangue na medula óssea.

Em pacientes que não possuem os rins funcionais, as funções de filtração

glomerular, manutenção da homeostase metálica e hídrica e consequentemente auxílio

na manutenção da pressão arterial pode ser obtida por meio das terapias de substituição

renal ou terapias dialíticas. Os procedimentos de hemodiálise e diálise peritoneal podem

suprir essas funções, temporariamente ou a longo prazo. No entanto, em casos de

insuficiência renal crônica, os procedimentos de diálise são utilizados até que o paciente

realize transplante renal.

Uma série de doenças pode conduzir a quadros de falência renal aguda ou

crônica. A falência renal aguda tem início súbito e geralmente é transitória, enquanto a

forma crônica dura por muitos anos. Na falência renal aguda o paciente encontra-se

apático, com câimbras (em função da perturbação na homeostase do potássio), com

edemas periféricos (especialmente nos pés e tornozelos), fragilidade nos ossos,

alterações na pressão arterial e hálito com odor de urina (hálito urêmico). A doença

renal crônica tem sintomas mais silenciosos e é causada por uma série de patologias,

como por exemplo, a nefropatia diabética, glomerulonefrites, pielonefrites, doença

hipertensiva por muitos anos, nefropatia intersticial, doença do colágeno e algumas

patologias genéticas.

Quando a falência dos rins é total, as toxinas, especialmente a uréia,

acumulam-se no plasma e os altos níveis plasmáticos de uréia (o que chamamos de

uremia) podem gerar um quadro grave conhecido como síndrome urêmica. Os

principais sintomas da síndrome urêmica são náuseas, vômitos, insônia, falta de apetite,

confusão mental, pele amarelada, hálito urêmico. A função dos rins pode ser avaliada

por meio de alguns exames laboratoriais; os mais comuns são a determinação da uréia e

da creatinina no sangue do paciente (ver doenças renais).

A hemodiálise é o procedimento terapêutico no qual as toxinas são removidas

diretamente do sangue do paciente através de uma diálise em um equipamento de

Movimento entre os compartimentos 2010

30

circuito fechado (Figura 15). Essa terapia tem um custo bastante elevado, pois requer

equipamentos, grande volume de solução dialisante, unidade dialisadora descartável e

uma equipe de profissionais, como médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e

farmacêuticos. Em um primeiro momento, o profissional da enfermagem seleciona um

acesso venoso no paciente, o qual pode ser temporário ou permanente. Os acessos

temporários utilizam vasos profundos, selecionados e acessados pelo médico com

técnica cirúrgica, como a jugular ou subclávia. Esses acessos destinam-se a situações de

emergência ou a pacientes em estado grave. Os acessos menores, com vasos do membro

superior, podem ser permanentes (como no caso das fístulas arterio-venosas) e nesse

caso, o enfermeiro instrui uma série de cuidados ao paciente.

O procedimento de hemodiálise deve ser realizado 3 a 4 vezes por semana e

pode durar de 3 a 6 horas, o que reduz muito a qualidade de vida do paciente. O sangue

do paciente entra no equipamento por meio do acesso venoso e é então heparinizado,

para evitar a formação de coágulos dentro da máquina. A seguir o sangue alcança a

unidade dialisadora, que é formada pela membrana dialisante e é o local em que

ocorrem as trocas entre o sangue e a solução dialisante. Após a diálise, o sangue passa

Figura 15: Figura mostrando o procedimento da diálise

Movimento entre os compartimentos 2010

31

por uma armadilha que remove eventuais bolhas de ar (para evitar uma embolia no

paciente) e retorna ao organismo. A mesma porção de sangue passa várias vezes na

unidade dialisadora, pois a passagem acontece de forma bastante rápida. Embora seja

rápida, ocorre muitas vezes, garantindo a eficiência do processo. A passagem ocorre de

forma lenta para evitar variações bruscas na osmolaridade do plasma e assim prevenir a

ocorrência da síndrome do desequilíbrio (Figura 15 e ver hemodiálise).

Na hemodiálise a membrana dialisante é uma membrana de natureza sintética

formada por uma material de natureza polimérica. Os materiais mais utilizados hoje em

dia são as polisulfonas, polimetacrilato e poliacrilonitrila. Antigamente usavam-se

membranas de celulose, mas esse material foi abandonado em função de sua natureza

trombogênica. Existe uma série de requisitos para os materiais que serão utilizados na

confecção de membranas dialisantes:

a) possuir um poro de tamanho adequado para filtração e uma densidade de poros

adequados.

b) não adsorver drogas ou substâncias do plasma em sua superfície

c) não disparar a formação de trombos ou seja, não interagir com os fatores de

coagulação do plasma

d) não interagir com nenhum dos componentes do plasma

e) possuir uma resistência hidráulica adequada ao processo

As membranas dialisantes podem ser organizadas em dois tipos de unidades

dialisadoras: o módulo de membranas paralelas e o módulo de fibras ocas. O módulo de

fibras ocas é um tubo composto por milhares de tubos capilares em que a membrana

dialisante é o material utilizado para confeccionar esses capilares. Uma vez que o

módulo de fibras ocas oferece maior área de superfície ao processo, a velocidade de

remoção de solutos do plasma torna-se maior, segundo a primeira lei de Fick. Os

módulos de membranas paralelas não são utilizados hoje em dia, mas eram bandejas

compostas pela membrana dialisante, separando um compartimento contendo o sangue

e o outro, contendo a solução dialisante. Nos módulos de fibras ocas, o sangue percorre

o interior dos tubos capilares e a solução dialisante circula no exterior desses capilares

em sentido contrário. A solução dialisante passa uma única vez na máquina e é então

desprezada.

Movimento entre os compartimentos 2010

32

A renovação da solução dialisante é importante para manter elevado o

gradiente de concentração dos solutos entre o plasma do paciente e a solução

dialisante, considerando que segundo a primeira Lei de Fick, quanto maior o

gradiente de concentração de um soluto, maior será a sua velocidade de fluxo por

uma membrana por simples difusão.

A diálise é um processo de difusão seletiva em que utiliza-se uma solução

dialisante que cria um gradiente de concentração para as substâncias que queremos

movimentar por simples difusão. Ou seja, na solução dialisante da hemodiálise não

deverá haver nem uréia, nem creatinina, nem ácido úrico... toxinas do plasma. Dessa

maneira, haverá um gradiente de concentração e essas substâncias passarão por simples

difusão, da circulação do paciente para a solução dialisante e serão descartadas

juntamente com a solução dialisante. No entanto, na circulação existe uma série de

substâncias que não podem deixar o plasma; para essas substâncias deveremos ter,

na solução dialisante, a mesma concentração molar do plasma humano (Figura 16).

Dessa forma, não haverá ganho nem perda desses solutos do plasma durante o

processo.

Figura 16: Quadro comparando a composição do plasma com a solução

dialisante, notem que as concentrações de eletrólitos e partículas que podem

passar a membrana é relativamente igual entretanto a solução dialisante não

possui as toxinhas que devem ser removidas do sangue, mantendo assim um

gradiente de concentração elevado

Movimento entre os compartimentos 2010

33

Se caso fosse colocado soro fisiológico ao invés da solução dialisadora o que

poderia ocorrer? Iria formar um gradiente de concentração com os eletrólitos, a glicose,

e outras moléculas pequenas do plasma que não devem ser removidas, então o paciente

iria perder essas moléculas para solução por difusão.

Na hemodiálise a separação ocorre apenas por tamanho do soluto; aqueles que

são menores que o poro da membrana dialisante conseguem transitar pela membrana

por simples difusão. Por sorte, os catabólitos do plasma são moléculas pequenas, assim

como os íons e outros solutos importantes que não podemos perder (Uréia:60 dáltons;

creatinina 113 dáltons). As proteínas, sendo macromoléculas, não conseguem passar

pela membrana dialisante. Existe uma proteína que acumula-se em pacientes com os

rins não funcionais: a -2-microglobulina, a qual não pode ser removida durante a

hemodiálise e acumula-se a vida toda no organismo. Com o passar do tempo, essa

proteína acaba cristalizando nas articulações, levando a problemas na movimentação.

É importante salientar que a medida que o tamanho de um soluto diminui,

maior é a sua agitação no espaço (movimento Browniano) e portanto, esse soluto colide

um número muito maior de vezes com a membrana dialisante, acabando por ter uma

alta velocidade de fluxo pela membrana por simples difusão.

A hemodiálise também remove o excesso de líquido acumulado na circulação

de pacientes renais crônicos. No passado essa remoção de excesso de líquido da

circulação era realizada com uso de uma solução dialisante levemente hipertônica

(preparada com um excesso de glicose), removendo a água por pressão osmótica.

Atualmente, a solução dialisante é obrigatoriamente isotônica ao plasma humano, para

impedir variações na volemia do paciente, e o excesso de líquido é removido por meio

da aplicação de uma pressão mecânica controlada pelo equipamento no compartimento

do sangue, forçando assim um extravasamento de água para fora desse compartimento.

Nos procedimentos mais antigos de hemodiálise, ocorria uma saída muito

rápida das toxinas do plasma, de maneira que a osmolaridade plasmática do paciente

decrescia rapidamente. Nessa situação, a água migraria do plasma para o interstício, que

tornou-se uma região com osmolaridade relativamente maior que a do plasma. Esse

acúmulo de líquido na região do crânio comprime o tecido nervoso contra a caixa

craniana, causando dor de cabeça, convulsões e arritmias. Esse quadro é denominado

Movimento entre os compartimentos 2010

34

Síndrome do desequilíbrio. Atualmente, a remoção das toxinas ocorre de forma lenta e

gradual, razão pela qual os procedimentos de hemodiálise duram de 4 a 6 horas.

3.2 Diálise Peritoneal

A diálise peritoneal é um procedimento dialítico que utiliza o peritônio como

membrana filtrante. É mais barato que a hemodiálise, mas recomendado somente para

casos menos graves. Esse procedimento permite uma maior qualidade de vida ao

paciente, mas só pode ser aplicado a pacientes com um rigoroso nível de higiene e grau

de instrução.

Na diálise peritonial o paciente recebe um cateter plástico, flexível e indolor

posicionado na região da cavidade peritoneal e com uma abertura controlada para o

meio externo. A função desse cateter é permitir a entrada e saída da solução dialisante.

O paciente conecta uma bolsa contendo a solução dialisante no cateter e por diferença

de gravidade, a solução penetra na cavidade peritoneal. Após isso, o paciente

desconecta a bolsa e realiza suas tarefas cotidianas. Após algumas horas, geralmente 4 a

6, o paciente conecta uma bolsa vazia no cateter e, novamente, por diferença de

gravidade, a solução sai da cavidade peritoneal, carregando consigo as toxinas do

plasma. A diálise acontece enquanto a solução está presente na cavidade abdominal e a

membrana dialisante é o peritônio (Figura 17, ver diálise peritoneal).

Figura 17: Figura representando a diálise peritoneal

Movimento entre os compartimentos 2010

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É importante considerar que o peritônio é uma membrana dialisante de

natureza biológica, ou seja, a separação de solutos ocorre por tamanho, polaridade e

presença de carga, como na membrana plasmática. Uma vez que as membranas

dialisantes são diferentes na hemodiálise e na diálise peritonial, as soluções dialisantes

também apresentam requisições diferenciadas. Na solução dialisante para diálise

peritonial não há necessidade de existir todos componentes importantes do plasma na

mesma concentração molar, pois os íons, açúcares e aminoácidos não atravessam as

membranas biológicas por simples difusão, mesmo havendo gradiente de concentração.

E as toxinas do plasma, por sorte, atravessam as membranas biológicas por simples

difusão. A diálise peritoneal pode ser realizada com soro fisiológico ou soro glicosado

inclusive, enquanto essas alternativas são impossíveis para a hemodiálise. Na

hemodiálise, o farmacêutico prepara a solução dialisante no momento do uso,

misturando 2 pré-soluções.

Também devemos considerar o fato que o volume de solução dialisante que

pode ser infundido varia de acordo com o tamanho e massa do paciente. Antes da

infusão recomenda-se aquecer a solução no microondas ou sob luz para propiciar mais

conforto ao organismo (que está a 37ºC).

A principal desvantagem e grande risco da diálise peritoneal é a infecção de

toda cavidade peritoneal, um quadro grave conhecido como peritonite. Essa infecção

pode acontecer se a higiene e cuidado não forem extremamente rigorosos, de maneira

que o paciente deve sempre manusear o cateter com cuidado e assepsia. Além disso, o

paciente deve observar a solução dialisante após sua saída para verificar a presença de

sangue, de fibrina, e principalmente a coloração e turvação, os quais são sinais do início

de infecção.

A diálise peritonial também pode remover o excesso de líquido do organismo

com o emprego de solução dialisante levemente hipertônica. Nesse caso, a remoção

ocorrerá por diferença de pressão osmótica. Quando o paciente encontra-se desidratado,

a administração de uma solução hipotônica pode ajudar a restaurar o volume hídrico

corporal.

Existem inúmeras vantagens para essa terapia diálitica: maior qualidade de

vida para o paciente; maior eficácia na regulação da pressão arterial, pois o excesso de

líquido é removido diariamente; menor incidência de anemia, pois permite uma dieta

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mais flexível e não existe exposição de sangue, pois a diálise ocorre internamente; não

necessita de punções.

Os procedimentos de diálise peritonial podem ser classificados em dois tipos: a

diálise peritonial ambulatorial contínua e a diálise peritonial automatizada. No primeiro

tipo, o paciente manipula as bolsas; no segundo tipo, um equipamento faz a infusão e a

drenagem da solução dialisante. No tipo automatizado o risco de infecções é menor,

pois o paciente tem menor contato com o cateter; o controle do volume infundido e

drenado é mais rigoroso, assim como do tempo de contato; permite a infusão de

pequenos e grandes volumes, o que é importante na pediatria e em pacientes com

distúrbios da cavidade abdominal. Em pacientes que realizam o processo por muitas

horas sem parada, o equipamento permanece continuamente em uso.

A água para preparo das soluções dialisantes é purificada por um processo

denominado osmose reversa, o qual produz água ultrapura, estéril e apirogênica.

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Referências:

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Porto Alegre, 2008. (NRB 653812)

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Koogan, 2008. (NRB 653521)

GARCIA, E. A. C. Biofísica. São Paulo, Sarvier, 1998. (NRB 231085)

GUYTON, A . C. Tratado de Fisiologia Médica. 11a Edição, Rio de Janeiro, Elsevier

2006. (NRB 546567)

HENEINE, I. F. Biofísica Básica. 2a edição, Atheneu, Rio de Janeiro, 1999. (NRB

277346)

NELSON, D. L. & COX, M. Lehninger – Princípios de Bioquímica. São Paulo: Sarvier,

4ª Edição, 2006. (NRB 603380)