apresentaÇÃo do caso

1
Durante o 3º mês de gravidez, a mãe do menor, B.M.U.O, masculino, apresentou intenso sangramento, se fazendo necessário a administração de medicamentos. Em exames rotineiros do pré-natal, na ultrassonografia (US) fetal na 21ª semana de gestação, foram identificadas múltiplas malformações fetais. Foi realizada amniocentese que não identificou qualquer trissomia e por conseguinte, foi recomendado aos pais da criança esperar seu nascimento para mais investigações e estabelecimento do diagnóstico, considerando as chances de não sobrevivência até o final da gestação. A criança então nasceu prematura (32 6/7) em um parto cesáreo de emergência, sendo encaminhada diretamente para a incubadora, onde passou 53 dias na UTI neonatal. Exames físicos e complementares evidenciaram uma fissura labiopalatal completa, persistência do canal arterial, agenesia do corpo caloso, hemorragia grau I periventricular, pulmão úmido, incoordenação sucção-deglutição, pé torto e mão fletida (mão de lagosta). Seu array genômico era normal. A criança saiu da UTI do hospital sem um diagnóstico. Aos 10 meses de idade apresentava plagiocefalia, cabelos com implantação alta, hipertelorismo ocular, estrabismo convergente, nariz aplainado, fenda do palato duro, sem erupção dentária, orelhas posteriorizadas, pescoço curto, sindactilia e hidrocefalia. Com 1 ano e 6 meses, foi feita uma coleta de DNA extraído do sangue periférico coletado no CEGH-CEL a fim de realizar um estudo molecular para alterações craniofaciais, onde identificamos duas mutações genéticas provavelmente patogênica/patogênica: 1. (p.Lys418Argfs*14) no gene PTCH1 causadora da síndrome de Gorlin Goltz e também de holoprosencefalia 2. (p.Ser291Phe) no gene TGIF1, associado a holoprosencefalia. No entanto, essa segunda mutação específica foi descrita em paciente com esta malformação cerebral, mas também esteve presente no pai da criança, que é normal. Ao observar populações controle, é visto que a mutação por si só não é suficiente para causar o fenótipo observado. Ademais, a associação com a mutação em TGIF1 também não prediz tal fenótipo, uma vez que esta combinação não foi descrita na literatura médica e não há modelos para predizer o efeito somatório neste caso. A síndrome de Gorlin- Goltz é uma doença rara, produzida por uma mutação, sobretudo no gene supressor de tumor "Patched" (PTCH). As condições hereditárias de transmissão são indicadas pelo acometimento do o gene PTCH1, mapeado no braço longo do cromossomo 9q22.3-q31. Já quando acometidos outros genes, como o Patched 2 (PTCH 2), Smmothened (SMO) e o Sonic Hedgehog (SHH), já relatados na literatura, indicam um caráter de mutação espontânea para a síndrome. Nosso paciente apresenta essa mutação característica, entretanto, encontraram outra mutação genética no gene TGIF1. Tal combinação não foi descrita na literatura, portanto não é possível afirmar que essa associação pode causar o fenótipo apresentado. Indivíduos portadores dessa síndrome podem apresentar manifestações clínicas diversas, dentre elas, os carcinomas basocelulares (CBC) que podem surgir ainda na infância, as depressões e ceratoses palmo-plantares, múltiplos ceratocistos odontogênicos, macrocefalia, sindactilismo (mão-de-lagosta), hipertelorismo, protuberância frontal, fenda palatina, lábio leporino, risco aumentado de alguns tumores (retinoblastoma, meduloblastoma), além de anormalidades oculares. O diagnóstico pode ser realizado tanto na vida intrauterina quanto após o nascimento. No período pré-natal, é realizado com ultrassom e análises de DNA extraídos de células fetais obtidas por uma amostragem da vilosidade coriônica ou por uma amniocentese. Já após o nascimento, este pode ser feito por testes genéticos, pelo teste de Ellswoth Howard ou a partir de achados clínicos. Síndrome de Gorlin Goltz associada a mutação nunca relatada na literatura médica desde a vida intrauterina: RELATO DE CASO Gorlin Goltz syndrome associated with a mutation never reported in the medical literature since intrauterine life: CASE REPORT ROBERTA DE LIMA CORTINA, MANUELA GONÇALVES PEDRONI, IZADORA GAMA REIS DE CARVALHO, RAFAELA MACHADO DE SOUZA, THAÍS ROCHA HERNANDEZ GOMES INTRODUÇÃO A síndrome de Gorlin Goltz, ou síndrome do nevo basocelular antigamente era caracterizada por alguns poucos sinais clínicos como a presença de epiteliomas múltiplos basocelulares, ceratocistos na gengiva e costela bífida. Esta tríade posteriormente sofrou modificações até que Kimonis et al. em 1997, estabeleceu que o diagnóstico poderia ser realizado por 2 critérios maiores ou 1 maior e 2 menores. Estudos indicam que uma mutação no gene Patched (PTCH), localizado no cromossomo 9 (q22.3) e um gene supressor de tumor é o responsável pela etiologia dessa anomalia descrita. Apresenta herança autossômica dominante e a sua manifestação é ampla, tendo alta penetrância e expressividade variável, mesmo em familiares. Portadores desta síndrome devem ter absoluta proteção contra os raios solares, pois os riscos de carcinoma basocelular podem ser grandes, sobretudo por terem risco de apresentar um curso mais agressivo. Portanto, um diagnóstico precoce é fundamental uma vez que permite a obtenção de um melhor prognóstico, tanto na evolução do quadro quanto na forma de tratamento, sendo necessário monitorar a presença do gene. APRESENTAÇÃO DO CASO DISCUSSÃO CONCLUSÃO Os portadores da alteração no gene PTCH1, principal causador da síndrome do nevo basocelular, apresentam cognitivo normal, sistema motor normal, sem tantas malformações e consequências, sendo contrário ao apresentado pelo paciente. Características como o lábio leporino, o pé torto, entre outras apresentadas pela criança, não são comuns nessa síndrome, sendo apresentadas por menos de 2% dos indivíduos portadores desta anomalia, quando apresentadas, são únicas, e não todas simultaneamente, como no paciente. Em decorrência disso, não se sabe se as características por ele apresentadas são decorrentes da outra mutação, ou se a Síndrome de Gorlin- Goltz foi intensificada e influenciada por essa mutação. Na investigação genética do paciente estudado, foram encontradas duas mutações no gene PTCH1 e outra no TGIF1, sendo a associação com a mutação TGIF1 que não foi descrita na literatura médica, então não há modelo para predizer o efeito somatório nesse caso. Legenda imagem 1: RN com fenda palatina bilateral Legenda imagem 2: criança com 4 anos de idade após cirurgias de correção no pé esquerdo e na mão direita Imagem 1 Imagem 2 REFERÊNCIAS L Namdeoraoji Bahadure R, Surendraji Jain E, P Badole G. Gorlin and goltz syndrome: a case report with surgical review. Int J Clin Pediatr Dent. maio de 2013;6(2):104–8. 2. Kiran NK, Raj TT, Mukunda KS, Reddy VR. Nevoid basal cell carcinoma syndrome (Gorlin-Goltz syndrome). Contemp Clin Dent. 10 de janeiro de 2012;3(4):514

Upload: others

Post on 09-Feb-2022

4 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Durante o 3º mês de gravidez, a mãe do menor, B.M.U.O,masculino, apresentou intenso sangramento, se fazendonecessário a administração de medicamentos. Em exames rotineiros do pré-natal, na ultrassonografia(US) fetal na 21ª semana de gestação, foram identificadasmúltiplas malformações fetais. Foi realizada amniocenteseque não identificou qualquer trissomia e por conseguinte, foirecomendado aos pais da criança esperar seu nascimentopara mais investigações e estabelecimento do diagnóstico,considerando as chances de não sobrevivência até o final dagestação. A criança então nasceu prematura (32 6/7) em um partocesáreo de emergência, sendo encaminhada diretamentepara a incubadora, onde passou 53 dias na UTI neonatal.Exames físicos e complementares evidenciaram uma fissuralabiopalatal completa, persistência do canal arterial, agenesiado corpo caloso, hemorragia grau I periventricular, pulmãoúmido, incoordenação sucção-deglutição, pé torto e mãofletida (mão de lagosta). Seu array genômico era normal. A criança saiu da UTI dohospital sem um diagnóstico. Aos 10 meses de idade apresentava plagiocefalia, cabeloscom implantação alta, hipertelorismo ocular, estrabismoconvergente, nariz aplainado, fenda do palato duro, semerupção dentária, orelhas posteriorizadas, pescoço curto,sindactilia e hidrocefalia. Com 1 ano e 6 meses, foi feita umacoleta de DNA extraído do sangue periférico coletado noCEGH-CEL a fim de realizar um estudo molecular paraalterações craniofaciais, onde identificamos duas mutaçõesgenéticas provavelmente patogênica/patogênica: 1. (p.Lys418Argfs*14) no gene PTCH1 causadora da síndromede Gorlin Goltz e também de holoprosencefalia 2. (p.Ser291Phe) no gene TGIF1, associado a holoprosencefalia.No entanto, essa segunda mutação específica foi descrita empaciente com esta malformação cerebral, mas também estevepresente no pai da criança, que é normal. Ao observar populações controle, é visto que a mutaçãopor si só não é suficiente para causar o fenótipo observado.Ademais, a associação com a mutação em TGIF1 também nãoprediz tal fenótipo, uma vez que esta combinação não foidescrita na literatura médica e não há modelos para predizero efeito somatório neste caso.

A síndrome de Gorlin- Goltz é uma doença rara, produzidapor uma mutação, sobretudo no gene supressor de tumor"Patched" (PTCH). As condições hereditárias de transmissãosão indicadas pelo acometimento do o gene PTCH1, mapeadono braço longo do cromossomo 9q22.3-q31. Já quandoacometidos outros genes, como o Patched 2 (PTCH 2),Smmothened (SMO) e o Sonic Hedgehog (SHH), já relatadosna literatura, indicam um caráter de mutação espontâneapara a síndrome. Nosso paciente apresenta essa mutaçãocaracterística, entretanto, encontraram outra mutaçãogenética no gene TGIF1. Tal combinação não foi descrita naliteratura, portanto não é possível afirmar que essaassociação pode causar o fenótipo apresentado. Indivíduos portadores dessa síndrome podem apresentarmanifestações clínicas diversas, dentre elas, os carcinomasbasocelulares (CBC) que podem surgir ainda na infância, asdepressões e ceratoses palmo-plantares, múltiplosceratocistos odontogênicos, macrocefalia, sindactilismo(mão-de-lagosta), hipertelorismo, protuberância frontal,fenda palatina, lábio leporino, risco aumentado de algunstumores (retinoblastoma, meduloblastoma), além deanormalidades oculares. O diagnóstico pode ser realizado tanto na vida intrauterinaquanto após o nascimento. No período pré-natal, é realizadocom ultrassom e análises de DNA extraídos de células fetaisobtidas por uma amostragem da vilosidade coriônica ou poruma amniocentese. Já após o nascimento, este pode ser feitopor testes genéticos, pelo teste de Ellswoth Howard ou apartir de achados clínicos.

Síndrome de Gorlin Goltz associada a mutaçãonunca relatada na literatura médica desde a vida

intrauterina: RELATO DE CASOGorlin Goltz syndrome associated with a mutation never reported in the

medical literature since intrauterine life: CASE REPORTROBERTA DE LIMA CORTINA, MANUELA GONÇALVES PEDRONI, IZADORA GAMA REIS DE CARVALHO, RAFAELA

MACHADO DE SOUZA, THAÍS ROCHA HERNANDEZ GOMES

INTRODUÇÃO A síndrome de Gorlin Goltz, ou síndrome do nevobasocelular antigamente era caracterizada por alguns poucossinais clínicos como a presença de epiteliomas múltiplosbasocelulares, ceratocistos na gengiva e costela bífida. Estatríade posteriormente sofrou modificações até que Kimoniset al. em 1997, estabeleceu que o diagnóstico poderia serrealizado por 2 critérios maiores ou 1 maior e 2 menores. Estudos indicam que uma mutação no gene Patched(PTCH), localizado no cromossomo 9 (q22.3) e um genesupressor de tumor é o responsável pela etiologia dessaanomalia descrita. Apresenta herança autossômicadominante e a sua manifestação é ampla, tendo altapenetrância e expressividade variável, mesmo em familiares. Portadores desta síndrome devem ter absoluta proteçãocontra os raios solares, pois os riscos de carcinomabasocelular podem ser grandes, sobretudo por terem risco deapresentar um curso mais agressivo. Portanto, umdiagnóstico precoce é fundamental uma vez que permite aobtenção de um melhor prognóstico, tanto na evolução doquadro quanto na forma de tratamento, sendo necessáriomonitorar a presença do gene.

APRESENTAÇÃO DO CASO

DISCUSSÃO

CONCLUSÃO Os portadores da alteração no gene PTCH1, principalcausador da síndrome do nevo basocelular, apresentamcognitivo normal, sistema motor normal, sem tantasmalformações e consequências, sendo contrário aoapresentado pelo paciente. Características como o lábioleporino, o pé torto, entre outras apresentadas pela criança,não são comuns nessa síndrome, sendo apresentadas pormenos de 2% dos indivíduos portadores desta anomalia,quando apresentadas, são únicas, e não todassimultaneamente, como no paciente. Em decorrência disso,não se sabe se as características por ele apresentadas sãodecorrentes da outra mutação, ou se a Síndrome de Gorlin-Goltz foi intensificada e influenciada por essa mutação. Na investigação genética do paciente estudado, foramencontradas duas mutações no gene PTCH1 e outra no TGIF1,sendo a associação com a mutação TGIF1 que não foi descritana literatura médica, então não há modelo para predizer oefeito somatório nesse caso.

Legenda imagem 1: RN com fenda palatina bilateralLegenda imagem 2: criança com 4 anos de idade apóscirurgias de correção no pé esquerdo e na mão direita

Imagem 1

Imagem 2

REFERÊNCIASL Namdeoraoji Bahadure R, Surendraji Jain E, P Badole G. Gorlin and goltz syndrome: a case report with surgical review. Int JClin Pediatr Dent. maio de 2013;6(2):104–8. 2. Kiran NK, Raj TT, Mukunda KS, Reddy VR. Nevoid basal cell carcinoma syndrome (Gorlin-Goltz syndrome). Contemp ClinDent. 10 de janeiro de 2012;3(4):514