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APRENDIZAGENS DA DOCÊNCIA: Múltiplos saberes. Betania Leite Ramalho/ UFRN DEPED - COMPERVE UFRN PROGRAD/Curso PAP Natal, 2009

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APRENDIZAGENS DA DOCÊNCIA:

Múltiplos saberes.

Betania Leite Ramalho/ UFRN

DEPED - COMPERVE

UFRN – PROGRAD/Curso PAP

Natal, 2009

O que acontece quando o professor (universitário) ensina?

Que recursos os professores mobilizam para instruir e ensinar?

O que é preciso saber o docente para ensinar nos contextos atuais?

Quais são os saberes, conhecimentos, competências, habilidades, estratégias de ensino-aprendizagem e maneiras de atuar que os professores precisam mobilizar em suas salas de aula?

Questões Provocativas:

A relação entre quem ensina e quem

aprende e os inúmeros fatores que

envolvem essa complexa relação

parecem estar sempre obscuros ou

mesmo pouco revelados;

Esse é um tema ainda muito silenciado.

Pouco se investiu nessa discussão e

mesmo na formação didático-pedagógica

dos docentes iniciantes ou veteranos.

No contexto do ensino Universitário....temos a

seguinte Problemática:

A UFRN, inicia uma política para romper esse silêncio: (PDI (1999-2008) e do Plano de Ação do período 2003-2007);

No entanto, a dimensão do ENSINO continua com baixo reconhecimento acadêmico: ganha a menor pontuação em termos do esforço docente/discente quando comparado com a pesquisa, a publicação científica...

O Ensino na Graduação também conta com menor prestígio ao se comparar com a Pós-Graduação.

Considerando que para o exercício da docência não basta conhecer o conteúdo, ter talento, ter bom senso, ter cultura, seguir a intuição, ter experiência, (Gauthier, 1988).... ou passar num concurso para uma vaga de professor, assinar um contrato e aí permanecer até que chegue a aposentadoria....

Concebendo a formação docente como o processo permanente de aquisição, estruturação e reestruturação de conhecimentos, habilidades e valores para o desempenho da função docente...

Podemos concordar que o trabalho do ensino, como as demais profissões, exige uma Base de Conhecimentos e Saberes Profissionais...

Portanto...

...o trabalho do ensino é uma atividade que exige do docente relacionar-se bem com os Saberes da Profissão, implicando-o numa revelação de sí mesmo e dos outros, numa complicada exploração do intelecto, da personalidade, das circunstância e da interpretação social. Assim, o recurso mais importante do professor é ele mesmo.

Daí a importância da formação permanente e ações formalizadas por meio de Programas de Inciação à Docência, Monitorias, por exemplo, no âmbito da Universidade.!

Pelo exposto, fica evidente que o tema da Aprendizagem para a Docência é amplo, complexo e envolve diferentes perspectivas;

Costuma-se tratar desse assunto de uma maneira “clássica” abordando o referencial que dá conta das questões aqui colocadas.

A partir do que foi colocado, até o momento, abordarei o tema desse seminário numa outra perspectiva....menos “clássica”, mais “ousada”.... e bastante pertinente porque situa a pessoa do docente no foco da questão e o leva a confrontar-se com uma complexa problemática: Aprender a Aprender a Docência!

IMAGINEMOS A SEGUINTE

NOTÍCIA DIVULGADA NA

IMPRENSA:

Professores da UFRN

fazem uso da SEDUÇÃO na sala de

aula!

SEDUÇÃO: possíveis reações

Deixa as pessoas sem graça, por ser considerada

um assunto que desperta nos demais simpatia, desejo,

paixão, amor, interesse, magnetismo, fascínio...

Relaciona-se com a capacidade de persuasão,

processo de atrair alguém de modo capcioso ou através

do estímulo à sua esperança ou desejo; capacidade ou

processo de corromper, de perverter; ato ou processo de

atrair ao contato sexual , ….

Deixa as pessoas reagindo ou oscilando entre o que pode

ser do bem ou do mal, por tudo que seu conceito, seu

sentido assume, de um certo modo: o engodo, o mal, a

imoralidade, a culpa...

QUESTÕES:

• É possível imaginar a sedução como uma

estratégia profissional no interior da relação

pedagógica?

• Haverá, de forma consciente, o jogo da

sedução no ensino?

• Que lições podemos tirar desse suposto

“saber”?

Alguns Pressupostos:

ENSINAR É JOGAR!

• Para jogar é necessário envolver o outro

no jogo, ou seja, é necessário seduzir!

• A sedução se traduz de diferentes formas

positivas e negativas.

• A sedução pode ser uma importante

estratégia profissional no ensino. Pode

tornar-se até indispensável.

O JOGO DO ENSINO:

POSSUI REGRAS!

São os condicionantes da situação pedagógica

que impõem uma organização do trabalho

docente.

Ex.: os objetivos do sistema educacional e dos

níveis de ensino definidos por documentos

oficiais, do Projeto Político pedagógico, além

dos programas, das disciplinas, etc.

O JOGO DO ENSINO:

POSSUI PROTAGONISTAS!

Alunos e professores, nesse contexto

entram numa espécie de jogo

chamado “trabalho interativo na sala

de aula” ou em outros ambientes de

formação e de aprendizagens.

O JOGO DO ENSINO

POSSUI DESAFIOS DE ORDENS E DIFICULDADES

DIVERSAS:

a) Para o professor, em razão do mandato que

lhe é conferido pela sociedade, o que está em

jogo é interagir de maneira tal que possa levar

conhecimento, “modelar” e (Incluir no jogo)

os alunos que estão sob sua

responsabilidade.

Só vencendo essa dificuldade é que ele poderá

ganhar o páreo da formação, da educação e

da aprendizagem.

O JOGO DO ENSINO:

b) Para os alunos o desafio pode ser diferente. Sendo

obrigados (estudantes de 7 a 14 anos) ou exigidos

(pressão familiar, social, do mercado de trabalho) a

freqüentar escolas, universidades, é compreensível que

algumas (e não poucas) vezes eles tenham muito mais

vontade de fazer outra coisa (mesmo no ambiente

escolar).

Muitas vezes estão obrigados a se submeter ao seu grupo

de colegas, e pouca atenção dão às aulas e aos

professores. Assim que, ganhar para eles, nesse contexto,

significa outra coisa: simpatia dos colegas, liderança, um

certo espaço conquistado.

Eles podem dar ao professor – e é o que

fazem com freqüência – a ilusão de que

ele está com a vitória nas mãos, quando

na realidade eles procuram salvar as

aparências fazendo de conta que

estudam ou estudam só pela nota;

trapaceiam ou fingem que prestam

atenção, que participam ou tentam

passar despercebidos, etc.

• Que fazer para que o jogo continue a ser

jogado?

• E se um dos lados investe mais que o outro?

• Podemos considerar que haja o jogo do

ensino-aprendizagem nessas circunstâncias?

QUESTÕES:

Premissa:

Ao se reconhecer que só haverá jogo quando houver interação entre as partes

e que é o professor quem deve “dar as

cartas”, pergunta-se:

Que recursos mobilizam os professores para

que o jogo do ensino-aprendizagem aconteça?

Que deve saber o professor para “melhor

jogar”?

• Que saberes da profissão devem ser mobilizados?

•Que estratégias didático-pedagógicas devem

ser acionadas nos diferentes momentos e para

cada aluno ou grupo de alunos?

No jogo do ensino é preciso

lançar mão de artifícios,

ou seja, é preciso

seduzir.

Retomando o tema central da

conversa:

SEIS GRANDES

SEDUTORES DA

HISTÓRIA

Foi um filósofo ateniense e um dos mais importantes ícones da tradição filosófica ocidental.

Acredita-se que tenha sido o fundador da atual FilosofiaOcidental.

Os diálogos de Platão retratam Sócrates como professor que se recusa a ter discípulos, como um homem de razão que obedece a voz divina e um homem piedoso que foi executado por causa da conveniência de seu próprio Estado.

Dedicava-se à educação dos cidadãos de Atenas.

Sócrates

(470 a.C. - 399 a.C.)

SÓCRATES

QUEM SEDUZ?

POR QUÊ?

ESTRATÉGIA UTILIZADA

EFEITO

A juventude ateniense.

Fecundar as almas, virtude e experiência.

Diálogo, maiêutica.

Alcebíades é seduzido e liberado.

Giacomo Girolamo Casanova(Veneza, 2 de abril de 1725)

Foi um escritor e aventureiro italiano.

Interrompeu as duas carreiras

profissionais que iniciou - a militar e a

eclesiástica - e levou uma vida

acidentada.

Uma aura mágica envolve toda a sua vida de debochado, libertino,

coleccionador de mulheres, escroque e conquistador empedernido que

percorria os bordéis de Londres para ter relações com mais de 60

meretrizes. Conseguiu fugir das masmorras do Palácio Ducal de Veneza,

com uma fuga rocambolesca pelos telhados do palácio, depois de estar

prisioneiro durante 16 meses.

QUEM SEDUZ?

POR QUÊ?

ESTRATÉGIA

UTILIZADA

EFEITO

Todas as mulheres.

Pelo prazer.

Sempre disponível, ao

acaso, sem premeditar

As mulheres o

adoravam e o

recomendavam.

Casanova

É um lendário libertino

fictício, cuja história foi

contada muitas vezes

por autores diferentes.

O seu nome às vezes é

figurativamente usado

como um sinônimo para

sedutor (ou "playboy").

A história termina

dramaticamente, com a

descida de Don Juan ao

Inferno.

Don Juan

QUEM SEDUZ?

POR QUÊ?

Todas as mulheres,

sobretudo as que

representam um certo

desafio.

Para vencer/dominar,

conquistar as mulheres, o

que o tornava um

verdadeiro caçador!

Promessas não realizadas.

Dona Elvira vive a cólera,

o ódio ao sexo masculino.

Don Juan

ESTRATÉGIA UTILIZADA

EFEITO

As Ligações Perigosas, romance epistolar do século XVIII, da autoria de Choderlos de Laclos, publicado em 1782.

A obra retrata as relações de um grupo de aristocratas através das cartas trocadas entre si, na época imediatamente anterior à Revolução Francesa, —os nobres ociosos e sem escrúpulos dedicam-se prazerosamente a destruir as reputações de seus pares.

O enredo tem como foco o Visconde de Valmont e da Marquesa de Merteuil, que manipulam e humilham as restantes personagens através de intrigas e jogos de sedução.

Visconde de Valmont

VALMONT

QUEM SEDUZ?

POR QUÊ?

Todas as mulheres, sobretudo asque representam um certodesafio.

Manter a reputação de um grandesedutor.

O cálculo frio. Trocacorrespondência com Madamede Merteuil que o incentiva. Usaa carta (12) para conquistar sua“vítima”.

Desespero da Madame de Tourvel,que prefere a morte.

•ESTRATÉGIA

UTILIZADA

•EFEITO

Personagem da obra "O Diário de um Sedutor”, um livro escrito pelo filósofo dinamarquês Søren Kierkegaard, em 1843,

Johannes, o diarista desta obra, conta o modo como seduziu a inocente e pura Cordélia, os ardis de que se serviu para se insinuar na sua esfera social, o modo como lhe foi captando a atenção e as manobras usadas para atingir seus objetivos.

Soren Aabye Kierkegaard,

nasceu na capital

dinamarquesa, Copenhague,

em 1813.

Johannes

JOHANNES

QUEM SEDUZ?

POR QUÊ?

ESTRATÉGIA

UTILIZADA

EFEITO

A diferença que existe emcada mulher.

Sente o prazer com amulher de maneiraestética e elegante.

Maquiavelismo implacável.

Violação da alma deCordélia. Ela se senteculpada pela ruptura.

XERAZADE

As Mil e Uma Noites é uma obra clássica

da literatura árabe. São contos orientais

compilados provavelmente entre os

séculos XIII e XVI.

O rei persa Xariyar, vitimado pela

infidelidade de sua mulher, mandou matá-

la e resolveu passar cada noite com uma

esposa diferente, que mandava degolar na

manhã seguinte.

Recebendo como mulher a Sherazade,

esta iniciou um conto que despertou o

interesse do rei em ouvir-lhe a

continuação na noite seguinte. Sherazade,

por artificiosa ligação dos seus contos,

conseguiu encantar o monarca por mil e

uma noites e foi poupada da morte.

Metáfora: a liberdade se

conquista com o exercício

da criatividade.

XERAZADE

QUEM SEDUZ?

POR QUÊ?

ESTRATÉGIA

UTILIZADA

EFEITO

O réu Xariyar.

Salvar sua própria pele e adas moças do reinado.

Contando todas as noitesuma nova história.

O rei descobre o amor.

Que lições podemos

tirar das histórias

desses sedutores?

LIÇÃO 1: Seduzir para participar

do jogo ou aproveitar-se do jogo?

PERSONAGEM PARTICIPAR DO

JOGO

APROVEITAR-

SE DO JOGO

CASANOVA X

XERAZADE X

SÓCRATES X

DON JUAN X

JOHANNES X

VALMONT X

LIÇÃO 2: Seduzir para durar ou

por um instante?

PERSONAGEM SEDUZIR PARA

DURAR

SEDUZIR POR

UM INSTANTE

CASANOVA X

XERAZADE X

SÓCRATES X

DON JUAN X

JOHANNES X

VALMONT X

LIÇÃO 3: Seduzir para excluir ou

incluir o outro no jogo?

PERSONAGEM MANTER O

OUTRO

EXCLUIR O

OUTRO

CASANOVA X

XERAZADE X

SÓCRATES X

DON JUAN X

JOHANNES X

VALMONT X

Tese em Questão:

A sedução pode ser um recurso

didático-pedagógico e uma estratégia

profissional do professor no “jogo”

do ensino

(Lafon, 1992).

-É possível pensar a sedução como estratégia

profissional na relação pedagógica?

- Quais são as condições que possibilitam um

uso positivo da sedução?

Portanto, é essencial lembrar das seguintes

perguntas:

Retomando as lições que tiramos da análise

dos seis sedutores, aplicando-as desta feita

à relação pedagógica professor-aluno,

podemos concluir o seguinte:

1. O jogo pedagógico é em parte

determinado pelos limites e regras do

sistema de ensino, assim: o professor

não pode jogar qualquer jogo.

2. Nesse contexto, “jogar o jogo” significa

“cumprir com a promessa” de formar e

educar o aluno incluído no jogo do

processo ensino-aprendizagem.

3.Como Sócrates, Casanova e Xerazade, o professor aplica

seus artifícios e estratégias de sedução não para enganar

o outro, mas para comprometê-lo a jogar com ele.

4. Não cumprir com sua promessa é fazer como Dom

Juan, Valmont e Johannes, ou seja, jogar o jogo duplo, o

que, no caso do professor significa descomprometer-se

do seu trabalho, dos alunos, fingir que ensina quando os

alunos fingem que aprendem.

5 Jogar o jogo em termos pedagógicos é responder às

exigências da instituição educativa, contribuir para o

alcance de suas finalidades, metas, estabelecer com os

alunos uma relação em que cada um, de acordo com as

regras, joga o mesmo jogo da sedução pelo conhecimento.

6. A sedução pedagógica bem sucedida seria aquela

cujo efeito é manter os alunos no jogo, ou seja, aquela

que consegue alimentar o compromisso deles com

suas próprias aprendizagens.

7. Contrariamente às vítimas de Dom Juan, de Valmont e

de Johannes, que partilham o triste destino de serem

excluídas do jogo, os alunos, tais como os discípulos de

Sócrates, as mulheres de Casanova e o sultão Xariyar,

não somente adquirem o prazer do jogo, mas se

desenvolvem jogando, acreditam no jogo do ensino e em

todos os benefícios que ele possa trazer para a vida.

8. Os sedutores utilizam estratégias, um método, têm objetivos claros, não usam ações improvisadas.

Muito pelo contrário: estudam suas “vítimas” e elegem os recursos a serem acionados....oportunamente para atingir seus objetivos: envolvê-las no jogo da sedução!

Do ponte de vista do trabalho docente, cada vez mais se defende a formação inicial e continuada como a condição para se profissionalizar o trabalho do ensino.

9. Sabemos que os professores não são os únicos atores dos quais dependem o sucesso ou o fracasso dos processos de ensino e aprendizagem. Os professores são, reconhecidamente, essenciais nesses processos como produtores de saberes.

10. Seja em que perspectiva teórica ou modelo

didático o docente se apoie ou represente,

ele tem que fazer a diferença no ato de

ensinar, educar e formar as gerações.

Portanto, as APRENDIZAGENS DA DOCÊNCIA

e o exercício do ensino depende,

indiscutivelmente da pessoa do

professor e dos Múltiplos Saberes da

profissão!

Referências

-Texto inspirado no estudo de LAFON, J. “De la séduction dans la transmision de savoir. Vers une gestion de la seditión dans la relation pédagogique. Tese de doutorado. Bourdeaux: Université de Bordeaux, 1992.

- Imagens de sedução na pedagogia. “A sedução como estratégia profissional”. Clermont Gauthier e Stéphane Martineau. Revista Educação e Sociedade. Editora CEDES, Campinas., Ano XX. Abril, 1999.