apostila excelente de alfabetizacao

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1 FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

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Page 1: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Page 2: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Este material é parte integrante da disciplina “Fundamentos da Alfabetização”

oferecido pela UNINOVE. O acesso às atividades, as leituras interativas, os

exercícios, chats, fóruns de discussão e a comunicação com o professor devem ser

feitos diretamente no ambiente de aprendizagem on­line.

Page 3: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Sumário

AULA 01 • COMO APARECEU A ESCRITA?..................................................................................6 O pictograma...............................................................................................................................6 O logograma (ou ideograma).......................................................................................................7 O silabário ...................................................................................................................................8 O alfabeto....................................................................................................................................9 Exercícios..................................................................................................................................10

AULA 02 • IDÉIAS E PROPOSTAS PEDAGÓGICAS DE AUTORES DOS SÉCULOS XV, XVI E XVII ...............................................................................................................................................11 François Rabelais (1495 – 1553)...............................................................................................11 Histórico ................................................................................................................................11 Idéias/ propostas pedagógicas ..............................................................................................11

Michel Eyquem de Montaigne (1553 – 1592).............................................................................12 Histórico ................................................................................................................................12 Idéias/ propostas pedagógicas ..............................................................................................12

Jan Amos Comenius (1592 – 1670)...........................................................................................13 Histórico ................................................................................................................................13 Idéias/ propostas pedagógicas ..............................................................................................13

John Locke (1632 – 1704) .........................................................................................................14 Histórico ................................................................................................................................14 Idéias/ propostas pedagógicas ..............................................................................................15

Exercícios..................................................................................................................................15 AULA 03 • AS IDÉIAS DE ROUSSEAU NA PRÁTICA DE PEDAGOGOS DOS SÉCULOS XVIII E XIX ................................................................................................................................................16 Johann Bernhard Basedow (1723 – 1790).................................................................................16 Histórico ................................................................................................................................16 Idéias/ propostas pedagógicas ..............................................................................................16

Johann Heinrich Pestalozzi (1746­1827) ...................................................................................17 Histórico ................................................................................................................................17 Idéias/ propostas pedagógicas ..............................................................................................17

Friedrich Fröbel (1782­1852) .....................................................................................................18 Histórico ................................................................................................................................18 Idéias/ propostas pedagógicas ..............................................................................................18 Meios educativos:..................................................................................................................19

John Dewey (1859­1952) ..........................................................................................................19 Histórico ................................................................................................................................19 Idéias/ propostas pedagógicas ..............................................................................................20 Sistema didático: ...................................................................................................................20

Maria Montessori (1870­1952)...................................................................................................21 Histórico ................................................................................................................................21 Idéias/ propostas pedagógicas ..............................................................................................21

Exercícios..................................................................................................................................21 AULA 04 • OVIDE DECROLY (1871 – 1932).................................................................................23 Programas de Ensino: busca da unidade do saber....................................................................23 Associação................................................................................................................................23 Método Global ...........................................................................................................................24 A leitura .....................................................................................................................................24 A escrita ....................................................................................................................................25

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Etapas da aquisição da escrita ..................................................................................................25 Exercícios..................................................................................................................................27

AULA 05 • CÉLESTIN FREINET (1896­1966) ...............................................................................28 Proposta pedagógica de Freinet................................................................................................28 A livre expressão.......................................................................................................................29 Motivação: a vida da criança .....................................................................................................29 A sensibilidade do educador......................................................................................................30 As fases da escrita ....................................................................................................................31 Escrita pessoal e livre................................................................................................................32 Exercícios..................................................................................................................................34

AULA 06 • A PROPOSTA PEDAGÓGICA DE EMILIA FERREIRO ...............................................35 Exercícios..................................................................................................................................38

AULA 07 • MEMÓRIA DA ALFABETIZAÇÃO................................................................................39 Exercícios..................................................................................................................................41

AULA 08 • REVENDO A PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA.................................................42 Exercícios..................................................................................................................................46

AULA 09 • DO DESENHO À PALAVRA: OS NÍVEIS CONCEPTUAIS LINGÜÍSTICOS ................47 Nível 1: pré­silábico ...................................................................................................................47 Nível 2: intermediário I...............................................................................................................48 Nível 3: silábico .........................................................................................................................49 Nível 4: intermediário II ou silábico­alfabético............................................................................50 Nível 5: alfabético ......................................................................................................................50 Exercícios..................................................................................................................................51

AULA 10 • AS CONCEPÇÕES SOBRE A LÍNGUA SUBJACENTES À PRÁTICA DOCENTE.......52 Exercícios..................................................................................................................................56

AULA 11 • TEMPO DE APRENDER A LER – TEMPO DE ENSINAR A LER ................................57 Tempo de aprender a ler ...........................................................................................................57 Tempo de ensinar a ler..............................................................................................................58 Exercícios..................................................................................................................................60

AULA 12 • SONS E LETRAS.........................................................................................................61 Aquisição do valor sonoro convencional....................................................................................61 Realizando uma sondagem.......................................................................................................62 Para que se lê? .........................................................................................................................63 Exercícios..................................................................................................................................64

AULA 13 • RECEITA DE ALFABETIZAÇÃO E ALFABETIZAÇÃO SEM RECEITA........................65 Quem se responsabiliza pelas crianças que estão na escola e não estão aprendendo?...........65 Receita de alfabetização ...........................................................................................................66 Alfabetização sem receita..........................................................................................................67 Exercício....................................................................................................................................68

AULA 14 • ALFABETIZAÇÃO E ETRAMENTO .............................................................................69 As dimensões do aprender a ler e a escrever............................................................................70 O desafio de ensinar a ler e a escrever .....................................................................................71 1) O embate conceitual..........................................................................................................71 2) O embate ideológico..........................................................................................................71

O significado do aprender a ler..................................................................................................72 O quadro da sociedade leitora no Brasil ....................................................................................72 Os motivos pelos quais tantos deixam de aprender a ler e a escrever ......................................72 Perspectivas das pesquisas sobre letramento...........................................................................73 Exercícios..................................................................................................................................74

AULA 15 • MÉTODOS SINTÉTICOS: DA SOLETRAÇÃO À CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA .......75 Juntando as letras: soletração...................................................................................................75 Ba­be­bi­bo­bu: silabação..........................................................................................................75

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Métodos fônicos ........................................................................................................................76 Cuidados a considerar na aplicação dos métodos fônicos.........................................................77 Exercícios..................................................................................................................................78

AULA 16 • AS CARTILHAS E A ALFABETIZAÇÃO.......................................................................79 Métodos globais: aprender a ler a partir de histórias ou orações...............................................79 Método de contos......................................................................................................................79 Método ideovisual de Decroly....................................................................................................80 Método Natural Freinet..............................................................................................................80 A metodologia de base lingüística ou psicolingüística ...............................................................81 Alfabetização a partir de palavras­chave ...................................................................................82 Método Natural de Heloísa Marinho ..........................................................................................82 Método Paulo Freire ..................................................................................................................82 Exercícios..................................................................................................................................83

AULA 17 • PRODUÇÃO DE TEXTO..............................................................................................85 Sugestões para produção..........................................................................................................87 Exercícios..................................................................................................................................89

AULA 18 • PRODUÇÃO DE TEXTO..............................................................................................91 Sugestões para efetuar a correção............................................................................................92 Exercícios..................................................................................................................................95

AULA 19 • A APRENDIZAGEM DA LEITURA ...............................................................................96 Sugestões para leitura...............................................................................................................97 A escolha dos textos .................................................................................................................98 Que textos escolher para as crianças?..................................................................................98 Deve­se trabalhar com os textos das próprias crianças?.......................................................98 Como começar a estudar o texto? .........................................................................................98 Como fazer para mostrar os sons das letras?........................................................................99 Quando é que elas vão começar a ler realmente?.................................................................99 Sugestões didáticas para melhorar a competência textual e a expressão oral ......................99

Exercícios................................................................................................................................100 AULA 20 • AVALIAÇÃO NA ALFABETIZAÇÃO...........................................................................101 Exercícios................................................................................................................................103

BIBLIOGRAFIA ...........................................................................................................................104

Page 6: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 01 • COMO APARECEU A ESCRITA?

O pictograma

O homem tem inerentemente uma necessidade individual de se expressar e uma

necessidade social de se comunicar. Para Gelb (A study of writing), essas duas necessidades

estão tão relacionadas que ele se pergunta se não seria melhor dizer que o homem se expressa

comunicando, ou que a base de sua comunicação é sua expressão individual.

O desenho do homem primitivo criado sobre a superfície de algum objeto tinha para ele, de

início, a função de expressar suas idéias visualmente, enquanto a fala era sua expressão auditiva.

Com o passar do tempo, a expressão visual desenvolve­se em duas direções distintas: o desenho

como arte, e o sistema pictográfico na comunicação.

Esse sistema pictográfico não apresenta inicialmente uma relação direta com a fala;

porém, encaminha­se, posteriormente, em direção à representação da fala, passando a ser um

simbolismo de segunda ordem. Assim, a fala representa idéias e a escrita representa a fala. Além

do sistema pictográfico, outro precursor da escrita são os recursos de identificação mnemônicos,

como os símbolos heráldicos e os símbolos usados por indígenas para registrar tempo.

Gelb faz um estudo minucioso e profundo do desenvolvimento da escrita através da

História, focalizando, principalmente, as modificações internas nos sistemas mais do que os

fatores externos. Faremos aqui um breve resumo dos pontos mais relevantes, com o objetivo de

compreender melhor a natureza dos diversos sistemas.

Podemos apontar as seguintes etapas evolutivas da história da escrita:

• Inexistência da escrita

• Precursores da escrita: fase semasiográfica

• sistema pictográfico

• recursos de identificação mnemônica

• Escrita plena: fase fonográfica

• lexical­silábica

• silábica

• alfabética

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

O logograma (ou ideograma)

A etapa lexical­silábica inicia­se por volta de 3 100 a.C., com o sistema pictográfico, cujas

formas sofrem um processo de estilização, para facilitar o traçado e cujo uso é gradativamente

convencionalizado. Os logogramas (ou ideogramas, como são mais conhecidos entre nós) são o

resultado dessa estilização e convencionalização. A princípio, a estilização consistiu em retificar

as linhas arredondadas dos pictogramas, de modo que, no início, os ideogramas eram “letras de

fôrma”. A escrita cursiva aparece bem depois e concorre para a estilização, principalmente por

sua tendência de simplificar os traços. O sistema ao mesmo tempo deixa de ser icônico para ser

simbólico.

Para ilustrar esse fato, podemos recorrer à escrita cuneiforme dos sumérios, cujos traços

em forma de cunha são resultado da estilização dos pictogramas.

O logograma, como o próprio nome indica, já tem estatuto lingüístico de palavra e,

portanto, tem também sua representação fonética. Para Gelb, a foneticização da escrita começa

com o logograma. Em alguns sistemas, para desfazer ambigüidades de logogramas mais

complexos, acrescentam­se elementos com valor exclusivamente de sílaba ao símbolo inicial.

Além disso, nomes próprios são compostos por ideogramas no seu valor estritamente fonético.

Durante o processo de convencionalização, os logogramas passaram a representar

também as idéias associadas aos objetos primitivamente representados pelos pictogramas.

Assim, se um logograma representava inicialmente o conceito “sol”, pode depois ter passado a

representar o conceito de “brilhar”. Embora não mencionada por Gelb, essa metaforização ocorreu

também no uso de mais de um símbolo, no interior de um mesmo logograma, para designar,

metaforicamente, um terceiro conceito. Por exemplo, a estilização de um pictograma em que uma

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

pessoa aparece embaixo de uma árvore resulta no logograma que significa “descansar”, em

escrita chinesa.

Há ainda logogramas que não se originam de pictogramas, mas sim de formas

geométricas, a que Gelb chama “diagramáticos”. Os números são exemplos desse tipo de

logograma. Gelb acha que alguns desses logogramas originaram­se da representação gestual,

como, por exemplo, o círculo, representando o conceito “tudo”.

Foi ainda nessa fase da escrita que sinais auxiliares, como a pontuação e determinantes,

foram introduzidos.

Embora na fase logográfico­silábica os logogramas já fossem usados com valor de sílaba,

é somente depois dessa fase de função híbrida do logograma que o sistema silábico se

desenvolveu plenamente.

Os sistemas pictográficos que se desenvolveram em escritas logográfico­silábicas são: o

sumério (escrita cuneiforme), o egípcio e o hitita (hieróglifos) e o chinês. Como é na escrita

egípcia que está a base da escrita alfabética, é ela que nos interessará mais de perto.

O silabário

Para se entender de que forma passamos do sistema logográfico­silábico para o sistema

silábico, é importante examinar antes o fenômeno conhecido como rébus, que é a representação

de palavras ou sílabas por pictogramas, utilizando­se apenas os sons dos nomes dos objetos

representados. Usa­se muito da técnica do rébus em jogos de palavras. Tomemos, por exemplo,

o pictograma para representar “cara” e o pictograma para representar “vela”. Se compusermos

com eles a palavra caravela, estaremos usando apenas as propriedades fonéticas e não as

semânticas. O mesmo pode ser feito com ideogramas, que são assim esvaziados de sua

semântica. Não é fácil tentar representar palavras dessa maneira. Mas foi esse o caminho

encontrado pelo homem para descobrir a escrita silábica.

Page 9: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Mas a sílaba foi ainda por muito tempo encarada como um expediente. Os ideogramas

continuaram a ter mais prestígio em todas as escritas, com exceção da cuneiforme, que se

constituiu, desde o início, de uma porcentagem mais alta de elementos de natureza silábica do

que de logogramas.

Foram os fenícios, com seu espírito prático de comerciantes, que se apossaram da

complicada escrita lexical­silábica dos egípcios, derivada dos hieróglifos, e dela extraíram 24

símbolos, os mais simples, para formar o silabário. Esse silabário era constituído apenas de

consoantes, sendo que esporadicamente as semiconsoantes correspondentes aos fonemas /w/ e

/y/ serviam para representar as vogais /u/ e /i/. Um mesmo símbolo podia ser lido, por exemplo,

como /ma, me, mi, mo/ ou /m/.

Atualmente, entre as línguas mais conhecidas, uma que ainda mantém o sistema silábico é

o japonês, que tem, na verdade, dois sistemas: o hiragana, para as flexões, e o katakana, para

os empréstimos. Os radicais das palavras ficam por conta dos ideogramas de origem chinesa.

O alfabeto

Foi o silabário fenício que os gregos tomaram emprestado para a base de sua escrita. Mas

o que era feito apenas esporadicamente pelos fenícios, isto é, a colocação da vogal depois da

consoante, firmou­se entre os gregos como norma. Passou­se assim a escrita silábica para a

escrita alfabética. A descoberta do alfabeto ocorre no século X a.C., e Gelb mostra que, embora

os sistemas orientais de escrita tivessem tido o mesmo tipo de desenvolvimento do sistema que

evoluiu para o alfabeto grego, apenas esse segundo sistema chegou ao alfabeto. Depois da

descoberta desse sistema, segundo Gelb, nenhuma inovação significativa ocorreu na história da

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

escrita. Embora haja inúmeras variedades de alfabeto no mundo, que apresentam diferenças

formais externas, todas ainda usam os mesmos princípios estabelecidos pela escrita grega. Como

diz Sven Ohman (Introduction to language), na verdade, a invenção da escrita alfabética é uma

“descoberta”, pois, quando o homem começou a usar um símbolo para cada som, ele apenas

operou conscientemente com o seu conhecimento da organização fonológica de sua língua. Com

relação a isso, é interessante ressaltar o que afirma Vygotsky (The prehistory of written

language), a partir dos trabalhos que realizou com crianças: para aprender a escrever, a criança

precisa fazer uma descoberta básica: que ela pode desenhar não apenas coisas, mas também a

própria fala.

Exercícios

1. As etapas evolutivas da história da escrita foram as seguintes: a) fase semasiográfica, fase mnemônica, fase fonográfica. b) fase lexical­silábica, fase silábica, fase alfabética. c) fase semasiográfica, sistema pictográfico, escrita plena. d) Inexistência da escrita, fase semasiográfica (precursora da escrita), fase fonográfica (escrita

plena).

2. Qual foi o povo que formou o silabário a partir da escrita lexical­silábica dos egípcios? a) Sumérios b) Fenícios c) Chineses d) Gregos

Respostas dos Exercícios

1. As etapas evolutivas da história da escrita foram as seguintes: RESPOSTA CORRETA: D

2. Qual foi o povo que formou o silabário a partir da escrita lexical­silábica dos egípcios? RESPOSTA CORRETA: B

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 02 • IDÉIAS E PROPOSTAS PEDAGÓGICAS DE AUTORES DOS SÉCULOS XV, XVI E XVII

François Rabelais (1495 – 1553)

Histórico

Crítico da escola do seu tempo, ridiculariza a educação escolástica e formalista da época,

baseada na aprendizagem das palavras e submissão às regras.

Suas idéias pedagógicas estão em Pantagruel e Gargântua, obra monumental, pitoresca

no vocabulário e no estilo, que satiriza a educação formalista.

Foi o precursor do realismo e do naturalismo na pedagogia, demonstrando grande amor

pela humanidade, paixão pela justiça e culto à verdadeira ciência.

Idéias/ propostas pedagógicas

Método de ensino atraente, voltado para a formação do homem integral.

Educação alegre, risonha, em ambiente de liberdade: primazia ao desenvolvimento do

corpo, vida ao ar livre e prática de exercícios físicos.

Conhecimento tirado da natureza e não dos livros. Gargântua escreve a seu filho:

“Quero que te dediques a teu estudo cuidadosamente; que não fique mar, rio ou fontes

cujos peixes não conheças; todos os pássaros do ar, todas as árvores, arbustos e árvores dos

bosques; todas as ervas da terra, todos os metais ocultos em seu seio, as pedrarias do Oriente do

Meio­Dia, tudo te seja conhecido... Com freqüentes anatomias adquirir o conhecimento perfeito do

outro mundo que é o homem”.

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Michel Eyquem de Montaigne (1553 – 1592)

Histórico

Escritor e moralista, é o maior representante do humanismo francês. Seus Ensaios trazem

algumas das páginas mais brilhantes sobre a educação da época. Embora não tivesse

experiência direta de ensino, as lembranças pessoais lhe serviam de orientação para suas críticas

e propostas.

Critica o abuso dos livros, polemizando contra as escolas da verbosidade, as quais exigem

que o livro do aluno seja o vasto mundo. Daí a frase: “Mais vale um espírito bem formado do que

uma cabeça bem cheia”. Segundo ele, os educadores nunca deveriam esquecer­se de que “não

há nada melhor que despertar o prazer e o amor pelo estudo; caso contrário, só se formam bons

carregadores de livros”.

Afirmava: “A ciência começa nos sentidos e neles se resolve”; e, sobre os limites de tal

ciência: “A natureza humana [...] não conhece de si senão uma aparência obscura e sombria, uma

visão incerta e insegura”.

Elogiou a grandeza da condição humana. Suas opiniões e princípios nascem de idéias

bem definidas sobre o homem; interessou­se principalmente em saber como ele é: “Outros

formam o homem, eu o descrevo”.

É considerado o precursor das modernas tendências pedagógicas. Suas teorias foram

ampliadas por Locke.

Idéias/ propostas pedagógicas

• Aprender não consiste em amontoar conhecimentos, mas em assimilá­los.

• O ensino das coisas é bem mais vantajoso que o das palavras.

• Na instrução, deve­se atentar para a formação do juízo, às ações mais que às palavras.

“Que nosso discípulo esteja bem apercebido de coisas; virão depois as palavras, por

acréscimo”.

• A instrução deve ser adquirida pela experiência, o mestre deve mostrar aos discípulos “o

exterior das coisas; fazendo­os experimentar, escolher e discernir por si mesmos,

preparando­lhes o caminho, deixando­lhes liberdade de buscá­lo”.

Page 13: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

• A educação pode ser ocasional, “tudo o que se nos mostra à vista é suficientemente livre:

a malícia de um pajem, a tolice de um criado, uma discussão de sobremesa são outros

métodos de ensino”.

• O conhecimento é apenas um instrumento na formação do juízo, fim último a que se deve

dedicar a educação.

Jan Amos Comenius (1592 – 1670)

Histórico

Um dos mais notáveis pedagogos do século XVII e um dos maiores da história.

Influenciado pelas idéias de Bacon e de Ratke, contribuiu para a reforma da educação em vários

países.

Trabalhou nas escolas de Lissa (Polônia), em 1654, e Patak (Hungria), em 1651. Nessa

época, escreveu algumas de suas obras principais, como Janua linguarum (“Pórtico das línguas”),

a famosa Didatica magna e Orbis pictus.

Seus trabalhos chamaram a atenção do mundo contemporâneo. Foi o fundador da Didática

e, em parte, da pedagogia moderna. Suas teorias são profundamente atuais, sendo o pioneiro em

aplicar um método que desperta crescente interesse no aluno. É conhecido como Mentor das

Nações, por ter contribuído para a reforma da educação em vários países.

Sua obra sintetiza o velho e o novo da pedagogia: “A reelaboração de toda a enciclopédia

do saber e a sua sistemática adequação às capacidades infantis são o grande tema da pedagogia

de Comenius [...]; propõe uma escola para a vida toda (desde o seio materno até a morte), que,

dividida em oito graus, ensino tudo a todos totalmente”. Isso pressupunha uma nova

sistematização de todo o saber, que tentou de vários modos. No plano da prática didática,

Comenius propunha a pesquisa e a valorização de todas as metodologias que hoje chamaríamos

de ativas, experimentadas desde o humanismo: a reforma escolar da cultura, da política e da

moral.

Idéias/ propostas pedagógicas

São fins da vida e da educação: o saber, que compreende o conhecimento de todas as

coisas, artes e línguas; a virtude, ou bons costumes, que inclui não só as boas maneiras como o

Page 14: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

domínio das paixões; e a piedade, ou religião, isto é, a veneração pela qual a alma do homem se

une ao Ser supremo.

A educação deve atingir a todos, ricos e pobres, meninos e meninas, todos os educados

conjuntamente nos mesmos estabelecimentos (antecipa a idéia de escola democrática). É

necessário buscar a unidade do conhecimento por meio de:

• método natural, conforme o desenvolvimento do homem;

• escola única, uma escola para todos;

• gradação e continuidade da educação, da escola maternal à universidade.

A escola maternal é fundamental e deve cuidar principalmente do exercício dos sentidos

externos, com base na observação e na experiência.

A escola comum deve cultivar os sentidos internos, a imaginação, a intuição e a memória –

com seus órgãos executivos ­, a mão e a língua, escrevendo, lendo, pintando, cantando, medindo,

pesando, etc. “Nada há no intelecto que não tenha antes passado pelos sentidos”.

No ginásio deve­se trabalhar o entendimento e o juízo, por meio de dialética, gramática e

demais ciências e artes de utilidade prática. As universidades destinam­se ao cultivo da alma pela

teologia, da inteligência pela filosofia, do corpo pela medicina e dos bens externos pela

jurisprudência.

John Locke (1632 – 1704)

Histórico

Grande filósofo e não menor psicólogo, humanista, médico e professor, dotou­o a natureza

de um fino espírito de observação que de muito lhe serviu para adquirir a experiência pedagógica

revelada nos seus escritos e para formar idéias que tiveram larga repercussão, sobretudo no

pensamento inglês.

Escreveu Ensaio sobre a mente humana, teoria empírica do conhecimento, cujo conteúdo

muito contribuiu no campo educacional, e Alguns pensamentos sobre educação, título modesto de

uma das mais célebres e originais obras educativas, cuja influência é notória nos escritores que o

sucederam, incluindo o próprio Rousseau.

Page 15: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Idéias/ propostas pedagógicas

Na educação, três são os aspectos a ser considerados: o físico, o moral e o intelectual, aos

quais devem corresponder três objetivos: vigor do corpo, virtude e saber. Formulou a teoria

empírica do conhecimento, ou filosofia baconiana: todo conhecimento vem dos sentidos e do

intelecto, isto é, da experiência.

Princípio epistemológico: a educação tem grande poder. “É ela que produz as diferenças

entre os homens [...] E isso, de acordo com a natureza racional do homem”. O educador deve

estar consciente de que “sua tarefa não é tanto ensinar aos jovens tudo o que os homens podem

saber, mas despertar neles amor e respeito pela ciência e colocá­los no caminho certo, onde

podem conseguir conhecimentos e aperfeiçoar­se, se quiserem”.

Inverteu todas as idéias e princípios educacionais da época: saúde e disciplina corporal

têm primazia sobre o saber e a eloqüência; não se consegue educar os jovens com castigos

duros, mas por meio de jogos adequados pode­se ajudá­los a aprender a viver, etc.

Exercícios

1. Assinale a incorreta. Segundo Montaigne: a) aprender consiste em amontoar conhecimentos, e não em assimilá­los. b) o ensino das coisas é bem mais vantajoso que o das palavras. c) na instrução, deve­se atentar para a formação do juízo, às ações mais que às palavras. d) a instrução deve ser adquirida pela experiência.

2. Segundo Comenius, são fins da vida e da educação: a) o saber e a virtude. b) a virtude e a piedade. c) o saber, a virtude e a piedade. d) o saber e a piedade.

Resposta dos Exercícios

1. Assinale a incorreta RESPOSTA CORRETA: A

2. Segundo Comenius, são fins da vida e da educação: RESPOSTA CORRETA: C

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 03 • AS IDÉIAS DE ROUSSEAU NA PRÁTICA DE PEDAGOGOS DOS SÉCULOS XVIII E XIX

Johann Bernhard Basedow (1723 – 1790)

Histórico

Notável educador alemão, tentou reformar a educação, ampliando as idéias de Rousseau.

Fundou em Dessávia o Insitutto Philantropium, bem diferente das escolas do século XIX, para

formar professores. Em 1775, montou um curso de pedagogia tão completo que permitiu

dispensar até os estudos na universidade.

Lutou pela reforma completa nos métodos de ensino e no preparo de professores, na

Alemanha. Seus Princípios elementares (1774) constituíram­se num sistema completo de

educação primária, destinado ao desenvolvimento da inteligência dos alunos e influenciaram

largamente os métodos de educação da época.

Considerava a instrução menos valiosa que a educação. A filosofia de seu Instituto era a

dedicação ao próximo, com total desprendimento pessoal, tornando­se a mais importante

experiência pedagógica na Europa (1774­1785).

Seu filantropismo influenciou e sugeriu a pedagogia de Pestalozzi.

Idéias/ propostas pedagógicas

A pedagogia de Basedow propõe oferecer:

• educação nacional e independente das religiões;

• cultura utilitária;

• método intuitivo e recreativo.

Dos 8 aos 12 anos apenas lições de coisas, conhecimento da vida prática: fatos e não

palavras. Era seu aforismo predileto: “Aprender pouco – e esse pouco, sempre brincando”.

Preocupação central: noções de vida real, com visitas freqüentes às oficinas e fábricas.

Page 17: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Valoriza a educação física, trabalhos manuais e artes (desenho, pintura, música, dança e

até acrobatismo); ciências e línguas sem teorias, só em aplicações e na natureza; aboliu a

gramática e a retórica; a história é despojada de datas e de tudo que se refere à erudição; a

geografia vai do quarto à casa, à cidade, ao país todo e depois às várias partes do globo. Na

moral: dar bons exemplos e resguardar o educando da prática de maus hábitos.

Johann Heinrich Pestalozzi (1746­1827)

Histórico

Pedagogo por índole, o paciente educador suíço alcançou reputação universal pelos

esforços dedicados a melhorar a educação e a instrução das crianças pobres, com conseqüente

melhoria de sua situação econômica. Foi, em princípio, um revolucionário cheio de entusiasmo

não só pelas obras de Rousseau como pelas de todos os demolidores sociais e políticos. Em

plena Revolução Francesa, vivenciou as discrepâncias entre as idéias e a realidade dos

problemas sociais. Preferia um caminho mais lento, porém mais promissor, para uma sociedade

mais justa e humana, pela educação. Soube perceber a situação política do seu tempo, julgá­la

corretamente e apontar caminhos educacionais que, dois séculos após a sua morte, ainda são

válidos.

Idéias/ propostas pedagógicas

Seu método dá ênfase à atividade do aluno, iniciando­o pelo conhecimento de objetos

simples até chegar aos mais complexos, partindo do conhecido para o desconhecido, do concreto

para o abstrato, do particular para o geral.

Entre os princípios do método pestalozziano, destacam­se:

• A intuição: base de todo conhecimento. Seu princípio é a observação; habituemos,

portanto, a criança a observar, porque a “intuição” é tanto mais clara quanto maior

número de sentidos a percebem.

• O saber e o saber­fazer: Destaca a importância da formação e não da mera instrução.

Considera que qualquer conhecimento deve ser aplicado a outras situações.

• O poder: É preciso aliar ao saber o poder, às noções teóricas a habilidade prática.

Page 18: Apostila Excelente de Alfabetizacao

18

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

• O amor: As relações entre professores e discípulos devem ser amorosas. A missão do

educador é ajudar o indivíduo a desenvolver de maneira mais completa sua natureza.

Todos devem ter direito à educação, que deve desenvolver a sensibilidade, a mentalidade

e a capacidade física. Com os estudos, alternar os trabalhos manuais e as excursões às

montanhas. Os exercícios de ginástica devem ser freqüentes e variados.

O ensino da leitura e da escrita era feito por meio do método sintético, começando pelo

estudo das vogais. Mas, antes de saber ler e escrever, achava indispensável saber falar. Para a

leitura, empregava letras móveis, colocadas num cartão, de modo que, aproximadas umas das

outras, formavam as sílabas. Em geral, os métodos de nossas cartilhas eram, até bem pouco

tempo, resultado direto, embora não imediato, dos esforços de Pestaçlozzi em analisar a matéria

em seus elementos mais simples e, depois, por aumento gradual de complexidade do material,

levar à criança à compreensão simétrica e ordenada de toda a matéria.

Friedrich Fröbel (1782­1852)

Histórico

Educador alemão, desenvolveu sua pedagogia inspirado nas idéias de atividade e

liberdade. Embora influenciado pelas teorias de Rousseau e Pestalozzi, foi totalmente

independente e crítico. Ao individualismo do primeiro propôs a doutrina da unidade, ou “parte­

todo”, elaborada por Pestalozzi, que reformulou e ampliou.

Foi um dos primeiros educadores a buscar um método para a educação da criança

pequena e nunca deixou de pregar a necessidade de respeitá­la.

Apesar da fragilidade e obscuridade de suas idéias, algumas merecem atenção. O

educador que considera a humanidade no homem como sujeita a um contínuo desenvolvimento

está sempre aberto a novas perspectivas. Ao considerar que “toda vida é unidade e o homem, um

criador”, delineou os rumos da pedagogia contemporânea.

Idéias/ propostas pedagógicas

Princípios gerais:

Cada criança tem a sua individualidade e índole, dignas de respeito.

Page 19: Apostila Excelente de Alfabetizacao

19

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

A criança gosta de observação e de movimento, quer apalpar tudo o que vê. É preciso que

exerça seus sentidos com liberdade.

Só as atividades manuais satisfazem as crianças, porque são um jogo. As atividades

manuais e a aplicação adequada de objetos concretos, do cotidiano infantil, são o melhor caminho

para a criança desenvolver­se de modo sadio e natural.

A educação deve começar antes dos seis anos, principalmente para as crianças das

classes menos privilegiadas.

Meios educativos:

1) jogos e ginástica, acompanhados por cantos que representem cenas da vida cotidiana;

2) palestras, poesias e contos;

3) cultura de jardinzinhos;

4) prendas, brinquedos e instrumentos de trabalho (tudo muito colorido, para educar a

atenção e orientar os sentidos);

5) ocupações. Partindo do concreto para o abstrato, Fröbel decompõe o sólido em

superfícies, linhas e pontos, propondo as atividades: caixa quadrangular; dobradura,

recorte e colagem; tecedura; emprego de sucatas (ervilhas, pauzinhos, cartões,

argolas, etc.); modelagem com argila; caixas de areia, etc.

John Dewey (1859­1952)

Histórico

Educador, filósofo e psicólogo norte­americano, criou uma escola experimental famosa na

Universidade de Chicago (1894­1904). Suas obras Democracia e educação, Interesse e

esforço na educação, A criança e o programa escolar, A escola e a sociedade e outras

serviram de base ao movimento chamado Escola Nova, que se propagou por todo o mundo a

partir da primeira metade do século XX.

É o criador do chamado Método dos Projetos, que propõe substituir a ação dos

professores pela ação dos alunos.

Page 20: Apostila Excelente de Alfabetizacao

20

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Sintetiza a história passada e futura da escola, definindo o sistema de instrução tradicional

como a escola dos três erres: reading, (w)riting, (a)rithmetic (ler, escrever e contar), no qual

predominava a separação das matérias e dominava a discriminação e a seletividade.

Suas teorias e práticas pedagógicas, muito coerentes, exerceram influência universal.

É considerado um dos mais geniais observadores das relações entre educação, produção

e sociedade.

Idéias/ propostas pedagógicas

Princípios gerais:

• Não deve haver nenhuma separação entre vida e educação. As crianças devem ser

preparadas para a vida. “Vida, em condições integrais, e educação são o mesmo”.

• A educação deve ser “uma contínua reconstrução da experiência”. Deve permitir

compreender, projetar, experimentar e conferir os resultados das aprendizagens.

• A escola deve assumir a feição de uma comunidade em miniatura, ensinando em

situações de comunicação e cooperação entre as pessoas, visando a propósitos

comuns.

• Como sistema social, a escola deve estar conectada com a vida social e com o trabalho

de todas as outras instituições.

Sistema didático:

Estabelece oposição entre dois conceitos: o de que educar é promover o desenvolvimento

“de dentro” e não a formação por elementos “de fora”, ou, entre a idéias de que educar é fazer

expandir as inclinações naturais e não levar o aluno a vencer essas inclinações, substituindo­as

por hábitos, transmitidos por pressões externas. A fórmula de sua pedagogia – aprender fazendo

– resume a adequação dinâmica que propôs a fim de que a escola estivesse voltada para a

mudança.

Page 21: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Maria Montessori (1870­1952)

Histórico

Médica e pedagoga italiana, é uma das maiores representantes da pedagogia científica

moderna.

Dedicou­se à pedagogia terapêutica e à educação das crianças anormais. Observando os

defeitos das escolas comuns, propõe às crianças de inteligência normal os mesmos processos

empregados na educação das anormais.

O trabalho faz parte de sua pedagogia, o que confirma a unidade indispensável entre

conhecimento teórico e prático.

Idéias/ propostas pedagógicas

Princípios educativos:

Observação científica do comportamento infantil e realização dos direitos da criança:

direito à vida própria, à liberdade e à autonomia. A concretização desses direitos conduz aos dois

princípios básicos do seu método: despertar a criatividade infantil por meio do estímulo e

promover a auto­educação da criança, fornecendo­lhe meios adequados de trabalho.

A concepção de sua didática é analítica. As matérias e as lições comportam uma extrema

discriminação. O ensino é individual e os estímulos para o desenvolvimento psíquico são

externos, ou seja, predomina um ambiente favorável à educação, em que o educador mantém­se

em segundo plano, não atuando diretamente por meio do diálogo pedagógico, mas da oferta de

meios adequados para a auto­formação da criança.

Exercícios

1. Qual das alternativas não representa uma proposta pedagógica de John Dewey? a) Deve haver separação entre vida e educação. As crianças devem ser preparadas para a

escola. b) A educação deve permitir compreender, projetar, experimentar e conferir os resultados das

aprendizagens. c) A escola deve assumir a feição de uma comunidade em miniatura.

Page 22: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

d) A escola deve estar conectada com a vida social e com o trabalho de todas as outras instituições.

2. Os dois princípios básicos do método de Maria Montessori são: a) promover a educação da criança através de exercícios dirigidos. b) despertar a criatividade através de tarefas diárias. c) fornecer trabalhos manuais e na agricultura. d) despertar a criatividade por meio do estímulo e promover a auto­educação, fornecendo­lhe

meios adequados de trabalho.

Respostas dos Exercícios

1. Qual das alternativas não representa uma proposta pedagógica de John Dewey? RESPOSTA CORRETA: A

2. Os dois princípios básicos do método de Maria Montessori são: RESPOSTA CORRETA: D

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 04 • OVIDE DECROLY (1871 – 1932)

Acreditamos poder respeitar a lógica até o fim e fazer da leitura e da escrita instrumentos, como é o seu papel na vida real.

Ovide Decroly

Ovide Decroly devotou­se ao estudo da educação, combatendo o adestramento paciente e

contínuo ao qual era submetida a criança na escola. Propõe coordenar as diferentes atividades

escolares, readaptar os estudos às crianças, fazer da escola um meio onde elas pudessem

exercer uma atividade pessoal: a escola para a vida pela vida.

Programas de Ensino: busca da unidade do saber

O Programa deve buscar na vida real o conteúdo a ser trabalhado, visando a quatro

objetivos:

1) Buscar a unidade do saber, a interdisciplinaridade, ou seja, a atitude de quem vê a

ciência, o cálculo, a história na sua totalidade, sem divisões.

2) Atingir o maior número possível de educandos.

3) Permitir a aquisição de um mínimo de conhecimentos, os indispensáveis.

4) Favorecer o desenvolvimento integral de todas as faculdades e a adaptação ao meio

natural e social no qual a criança passa sua existência.

Associação

Nem sempre a observação é possível e necessária, por existir um conhecimento prévio do

objeto. Os exercícios de associação ajudam a criança a buscar, com o auxílio de recordações de

experiências passadas, as noções transmitidas por via oral ou iconográfica, os motivos para

reelaborar seus conhecimentos. Decroly divide esses exercícios em quatro grupos principais:

1) Objeto e fatos da atualidade, o espaço, planos e mapas – geografia.

Page 24: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

2) Tempo presente e tempo passado – exercícios de associação por meio de documentos,

visitas a museus, teatros e bastante intuição.

3) Exercícios tecnológicos – exame dos materiais brutos e seus derivados e sua aplicação

industrial.

4) Relações de causa e efeito, desenvolvidas pelas crianças graças às noções adquiridas

nos exercícios anteriores – representam o porquê e o como de os fenômenos se

tornarem conscientes.

Método Global

O método decrolyano global ou visual­ideográfico foi adotado durante muito tempo no

Brasil. Com ele, Decroly recupera a questão da globalidade, que dá enorme importância à

percepção visual no processo de leitura. “A alfabetização ou o ensino da leitura deve partir do

todo, para posteriormente passar à decomposição”. O “todo” era a palavra, proposta para ser

trabalhada como centro da aprendizagem. Decroly também utiliza a palavra, porém estabelece

uma diferença: as palavras de que faz uso são retiradas do vocabulário de cada centro de

interesse. O processo de alfabetização, para ter sucesso, deve partir do vocabulário da criança, a

fim de que esta possa opinar, sintetizar e compreender as idéias. O primeiro contato da criança

com o símbolo gráfico deve estar associado à imagem visual.

Para Decroly, a leitura e a escrita são o resultado de um processo de representação de

linguagem.

A criança aprende a falar e a entender o que lhe dizem desde muito cedo, no primeiro ano

de vida, quando exposta ao mundo lingüístico que a rodeia. No entanto, durante muito tempo,

nossa escola não considerou a fala, utilizando a leitura e a escrita como critérios de correção da

fala.

A leitura

Decroly dizia que, quanto mais estímulo e contato a criança tiver com o meio e as coisas

que a rodeiam, melhor será a sua expressão. O mesmo processo se dá com a leitura: quando

exposta a atos de leitura significativos, a criança vai querer aprender a ler.

Page 25: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Não é natural obrigar a criança a memorizar sílabas e letras, a pretexto de que é preciso

começar do simples para o composto, do concreto para o abstrato. “O que se constata é que se

empregam esses termos de maneira totalmente equivocada, confundindo­se o simples com o

mais curto, com a parte das letras dos sons ou das sílabas”. O todo – texto, frase ou palavra

significativa – é o concreto para a criança, que adquire a noção de “cadeira” (síntese), antes das

noções de “cor”, “encosto”, “assento” (análise). As sílabas, as letras ou os sons constituem o

abstrato para ela, uma vez que são partes do todo, a última expressão da análise. Por isso

Decroly propõe o método global, ou visual­ideográfico, para o ensino da leitura.

A escrita

O mesmo procedimento global deve ser utilizado na escrita. Uma possibilidade é que a

criança elabore seu próprio livro de leitura em vez de utilizar a cartilha ou um modelo – isso

representaria um grande avanço.

A representação da linguagem não depende do domínio de atividades motoras, mas de um

processo histórico e individual de estruturação de todo um sistema de representação simbólico.

A escrita passa a ser um processo de descoberta para a criança, como a busca do saber

científico. A palavra cachorro, por exemplo, deve evocar a imagem e a idéia de cachorro, como

nos adultos, isto é, não uma simples imagem auditiva associada a uma imagem motora.

Para Decroly, a representação gráfica dos sons da fala segue as mesmas etapas pelas

quais a humanidade passou até dominar esse instrumental para comunicar­se.

Etapas da aquisição da escrita

Na primeira etapa, pictórica, a escrita se assemelha a desenhos abstratos dos objetos

representados e ainda não é associada ao som, mas à imagem do que se quer representar.

Da primeira para a segunda etapa: uma tentativa de produzir uma escrita com traços bem

próximos à escrita cursiva, com grafismos já bem definidos. Na segunda etapa, observa­se certo

crescimento no processo de escrita: uma escrita que busca auxiliar a memória, reconhece que ela

demonstra, nitidamente, um esforço da criança em aproximar sua escrita (que continua cursiva)

da escrita­modelo do adulto.

Page 26: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Parece claro que, nas duas etapas, as escritas não apresentam relação alguma (diferença

ou semelhança) com os significantes sonoros.

O ingresso na terceira etapa da evolução da escrita é marcado por maior preocupação

com o traçado da letra e as propriedades sonoras do significante. A escrita, antes ligada, separa­

se em pedaços, cortando cadeia. Aparecem números e palavras isoladas. A criança já elabora

uma produção gráfica definida, ou seja, o número ou a quantidade do referencial e a natureza do

conteúdo começam a diferenciar­se: o símbolo adquire significado funcional e começa,

graficamente, a refletir o conteúdo que a criança deve anotar. Nesse estágio, a criança já conhece

letras isoladas, como elas se unem para registrar um conteúdo, e chega à palavra.

Na quarta e quinta etapas de evolução da escrita, a criança já escreve de forma original,

porém sem ainda dominar toda a complexidade da relação fonema/ grafema. É o momento no

qual a criança começa a escrever e ler o que escreve.

A escrita da quarta etapa é considerada intermediária. A individualidade infantil se destaca

desde os primeiros ensaios. Além do mais, alguns alunos apresentam uma evolução mais rápida

ou mais lenta que o normal. Há, pois, a necessidade de uma quinta etapa. Só depois de dominada

a escrita, deverá vir a preocupação com o aperfeiçoamento ortográfico.

Bem próximas, às vezes contraditórias, as pesquisas fazem parte da história da pedagogia

e precisam ser resgatadas. Emilia Ferreiro afirma: “Em alguns momentos da história faz falta uma

revolução conceitual. Acreditamos ter chegado o momento de fazê­la a respeito da alfabetização”

(1986: 41).

Nenhuma revolução conceitual pode ser feita sem que se resgate o passado. Decroly é

parte importante do passado da alfabetização. Seu programa e método, aplicados por seus

discípulos, mostram que não se pode privilegiar apenas o atual, mas deve­se ir à fonte primeira,

resgatar contribuições valiosíssimas sobre práticas de introdução da criança na língua escrita que

fugiram à rotina tradicional, o que nos levou a considerá­las inovadoras.

Qualquer método por si só não resolve os problemas do ensino. Todos os métodos

dependem da atividade criadora e reflexiva do professor, exigem observação e conhecimento

profundo do aluno. Recuperar de escritos o que têm de positivo contribui para aperfeiçoar o nosso

trabalho em sala de aula. Decroly postulou uma visão globalizante das questões ligadas ao

processo de ensino­aprendizagem.

Para Decroly, a escola deve fornecer educação geral, preparando a criança para as

exigências sociais por meio do conhecimento que tem de si mesma – suas necessidades,

aspirações e ideais – e do conhecimento do ambiente, do qual depende e no qual vai agir.

Page 27: Apostila Excelente de Alfabetizacao

27

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Exercícios

1. Das alternativas abaixo, assinale qual não é objetivo do Programa de Ensino de Decroly: a) Buscar a unidade do saber, a interdisciplinaridade, ou seja, a atitude de quem vê a ciência, o

cálculo, a história na sua totalidade, sem divisões. b) Atingir o menor número possível de educandos, ou seja, atingir uma educação elitista. c) Permitir a aquisição de um mínimo de conhecimentos, os indispensáveis. d) Favorecer o desenvolvimento integral de todas as faculdades e a adaptação ao meio natural

e social no qual a criança passa sua existência.

2. Decroly divide os exercícios de associação em quais grupos principais? I. Objetos e fatos da atualidade, o espaço, planos e mapas. II. Tempo presente e tempo passado – exercícios por meio de documentos, visitas a museus, teatros e bastante intuição. III. Exercícios tecnológicos – exame dos materiais brutos e seus derivados e sua aplicação industrial. IV. Relações de causa e efeito, desenvolvidas pelas crianças graças às noções adquiridas nos exercícios anteriores – representam o porquê e o como de os fenômenos se tornarem conscientes. a) I e II estão corretas. b) II e III estão corretas. c) II, III e IV estão corretas. d) Todas estão corretas.

Respostas dos Exercícios

1. Das alternativas abaixo, assinale qual não é objetivo do Programa de Ensino de Decroly: RESPOSTA CORRETA: B

2. Decroly divide os exercícios de associação em quais grupos principais? RESPOSTA CORRETA: D

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 05 • CÉLESTIN FREINET (1896­1966)

Celéstin Freinet foi exemplo de luta pela transformação da escola, que considerava

desligada da vida, distante da família, teórica e dogmática.

Apesar das dificuldades e limitações do período que mediou as duas guerras mundiais,

Freinet procurou fazer da escola um centro de atividades e a tudo recorreu para transformar a

situação social que não aprovava.

Para Freinet, a criança que a todo instante dá provas de suas aptidões criadoras, que

imagina, inventa e cria, só pode ser compreendida e orientada mediante uma pedagogia e uma

psicologia da construção e do movimento.

Freinet propõe uma metodologia da ação totalmente diferente da utilizada na época, uma

metodologia que não se acomodava com os velhos instrumentos, deixando de lado os manuais

escolares, símbolo da pedagogia opressiva. “Está falseada toda pedagogia que não se apóie em

primeiro lugar no educador, nas suas necessidades, nos seus sentimentos e nas suas aspirações

mais íntimas”.

Proposta pedagógica de Freinet

Freinet chama seu método de natural porque procura aproveitar o meio natural, a terra, a

água, as plantas e os animais, isto é, toda a natureza. Qualquer criança, mesmo as de periferia e

da classe trabalhadora, pode tirar dela seus ensinamentos.

Os conhecimentos das crianças, relacionados uns aos outros nas trocas e cooperação

mútua, eram considerados por Freinet como pilares na construção de uma escola viva: a escola

moderna.

Dependendo dos procedimentos que utiliza, o professor pode gerar desprazer e

desatenção nas crianças; é o caso das longas exposições orais, do uso intensivo dos manuais e

das composições, do exagero das tarefas e exames. Se o aluno não aprende é porque o ensino

de alguma maneira não lhe interessa.

Na prática, procura seguir o empenho dos alunos e transformá­los pela livre expressão,

pela vivência coletiva permeada pelo meio ambiente, pela ação. Freinet começa por anotar, diária

Page 29: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

e minuciosamente, os progressos dos alunos, os pontos positivos e negativos do seu

desenvolvimento.

Freinet tinha a obstinação de honrar a profissão que escolhera e de buscar, entre os seus

pares, caminhos para melhorar a qualidade do ensino.

Sua pedagogia preconiza uma escola viva, feliz, onde se trabalha e constrói, dando

significação social ao trabalho. Considera que a concentração necessária para qualquer

aprendizagem deve significar, antes, um esforço normal, a busca de determinado objetivo que

está naturalmente na linha da vida, o que não pode ser conseguido num meio escolar diferente do

meio vital da criança.

A livre expressão

Há dois conceitos­chave na proposta de Freinet: trabalho e livre expressão. Não há

preocupação com a quantidade de conhecimentos, mas com o processo, com a sua construção.

Praticar a livre expressão significa inverter o método que a escola utilizava para produzir a

aprendizagem, para ensinar.

Motivação: a vida da criança

Uma das críticas mais comuns à escola é a excessiva importância dada ao aspecto

intelectual. Freinet também a faz, propondo a desintelectualização dos processos de

aprendizagem: coloca na base a ação, o trabalho e todas as formas de exploração, exigindo

atividades vivas ou relacionadas com a vida da criança. Ela deve trabalhar com prazer; é o

interesse que a faz avançar. O controle e a autoridade do adulto devem reduzir­se, fornecer os

meios, despertar o interesse e orientar a criança, que, por si só, vai querer criar, agir e realizar.

Com freqüência, Freinet fugia às regras pré­estabelecidas pela escola. De temperamento

audacioso e não se conformando com a passividade que a escola do seu tempo impunha à

criança, compreendia que precisava colher, na própria vida das crianças, os novos elementos

para o seu trabalho pedagógico. A solução encontrada foram as aulas­passeio, em que levava os alunos para onde se sentiam felizes, fora das quatro paredes da sala de aula.

Não era mais o professor que ensinava, mas o aluno que procurava aprender, explorando

os arredores da escola. Esta se abrira ávida pela cooperação, pela organização regular do

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

trabalho e pelo estabelecimento de relações mais humanas entre professores e alunos, num meio

pedagogicamente favorável. Ela não tinha mais só a preocupação de formar o homem de

amanhã, consciente de seus direitos e capaz de cumprir seus deveres no mundo, mas também a

de transmitir­lhe a verdadeira cultura, integrada na vida dos homens.

A sensibilidade do educador

Uma metodologia voltada para o rendimento escolar pode ter boas intenções, porém o

rigor do controle e a excessiva preocupação com a disciplina exterior atropelam e inibem a

espontaneidade da criança, não permitindo avaliar suas reais possibilidades. Toda aprendizagem

deve permitir o conhecimento das próprias regras que lhe formam a base.

Embora a alfabetização, ainda que mecânica, possa levar a pessoa a ler e escrever sem

erro, ela dificilmente estará harmonizada com os pensamentos, fatos ou acontecimentos

expressivos.

Leitura e/ ou escrita e compreensão são dois momentos distintos da mesma operação. Há

o mecanismo da leitura ou da escrita, e a compreensão do sentido. A criança pode chegar a

decifrar sem saber, no entanto, traduzir as palavras em pensamento. É necessário deixar a

acriança falar e/ ou escrever livremente e a sua maneira as palavras do próprio vocabulário, sem

esquecer­se de motivá­la a buscar o próprio aperfeiçoamento. Pela pedagogia tradicional, a

criança aprende as vogais – a, e, i, o, u, depois as combina com p, t, r, s, para formar sílabas e

sons mais complexos, que dão origem às palavras. Na vida, o processo ocorre de forma diferente:

a criança ainda muito nova faz­se compreender muito antes de dominar a técnica da fala, da

leitura ou da escrita. Mesmo conhecendo apenas quatro ou cinco sílabas e/ ou palavras, ela as

modula com habilidade, de forma a construir palavras e frases que chegam a surpreender os

adultos.

O desafio é o professor ser formado para entender que a criança chega à escola já

interage ou tenta compreender que espécies de sinais são aqueles que se utilizam para ler e

escrever. Portanto, a questão que se coloca, e que não deveria existir, é a da dependência entre

mecanização e processo inteligente.

Era preciso conseguir, pois, abstrair o objetivo da alfabetização, que é favorecer o

desenvolvimento da comunicação e expressão com ênfase no processo de produção e utilização

de textos. Mas a questão continua: qual o caminho para diminuir a defasagem entre aquilo que o

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

professor conhece/ aprendeu sobre a alfabetização e o modo como desenvolve essa

alfabetização em sala de aula?

Talvez a filosofia que ainda falta ao nosso educador e que Freinet recupera de Rousseau

seja a paciência da espera. Quando dá uma lição ou trabalho ao aluno, quer imediatamente

verificar o resultado. Grita, assusta, castiga porque acredita que suas palavras, suas

demonstrações e seus raciocínios devem proporcionar uma modificação imediata no pensamento

e na ação dos educandos.

O verdadeiro educador deve ser sensível para acompanhar a construção do conhecimento

por parte da criança.

O professor que dá apoio a seus alunos, desempenhando o papel de catalisador e de

confidente, ajuda­os a vencer obstáculos, conservar a iniciativa e o entusiasmo, proporcionando­

lhes maiores possibilidades de triunfo na vida.

As fases da escrita

O método natural, a livre expressão e a pesquisa experimental são o prolongamento da

experiência pessoal; respondem a todas as exigências do indivíduo e favorecem as

aprendizagens.

Freinet divide em cinco as fases da aquisição da escrita:

1ª fase – fase do grafismo simples ou não­diferenciado. A criança utiliza­se de garatujas,

grafismos separados ou ligados por linhas curvas e quebradas.

2ª fase – fase do grafismo diferenciado e/ ou justaposto. Os grafismos começam a se

aproximar das formas das letras e dos numerais. Nessa fase, a criança já começa a

diferenciar desenho e escrita.

3ª fase – fase da imitação da escrita: utilização de letras do próprio nome ou nomes

conhecidos com repetição e automatização do grafismo conseguido. Pelo método natural,

a criança procura interpretar seus desenhos e sua escrita.

4ª fase – fase da utilização dos sinais convencionais (letras e números), com ou sem valor

sonoro. A criança já percebe que há regras e formas fixas a imitar. Começa a interpretar e

reproduzir texto e a solicitar referências aos adultos.

Page 32: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

5ª fase – fase da escrita alfabética. A criança domina e identifica um número razoável de

palavras e sabe se comunicar por escrito. É o começo da escrita consciente, da qual a

criança não se separará mais.

Quanto à questão do tempo, cada criança tem seu próprio ritmo; umas conseguem mais

rapidamente apoderar­se de uma experiência e automatizá­la, enquanto outras demoram mais,

precisam de vários estímulos.

O educador não deve apressar, mas estimular o processo. Embora algumas crianças

possam levar dois ou três anos para dominar a escrita, ele deve saber esperar.

É possível, por um processo autoritário, ensinar uma criança a ler e a escrever mais

rapidamente, tal como se ensina um papagaio a falar. Mas isso prejudica o seu equilíbrio. O tempo que o educador julga ganhar com essa iniciação será perdido, pois a criança não

conseguirá realizar as ligações íntimas que fazem da leitura/ escrita uma expressão e não uma

eterna e desesperante tarefa, cuja gênese se desconhece.

Escrita pessoal e livre

A criança marcada por um ensino autoritário, atrelada à lição e à cópia, é como uma

chama que, depois de acesa, vacila e apaga­se, uma flor prestes a desabrochar que murcha e

seca. Ao vir para a escola, a criança tem conhecimentos que devemos ajudar a ampliar. Se os

alunos não sabem desenhar nem pintar, se não têm idéias e esperam passivamente que o

professor ou o livro as forneça, é porque foram marcados por um método que lhes tirou essa

espontaneidade para a criação, o que é muito triste.

De acordo com Freinet, não há idade definida para introduzir a criança na escrita. Desde a

escola maternal, devemos valorizar os textos infantis. Nessa fase, o professor é o escriba e

precisa ser fiel ao pensamento da criança, que é convidada a copiar o seu texto ou o do

coleguinha ou, mesmo, produzir a própria escrita. Começa o trabalho de composição e de criação.

A escrita deve traduzir o mais exatamente possível o que se pretende dizer, e o leitor,

mesmo não iniciado, deve compreender com clareza a maior parte do que se quis exprimir. O

trabalho de ajustamento da forma escrita ao pensamento e à sua expressão só pode começar a

partir do momento em que a criança for autônoma na escrita.

Deve­se ajudar a criança a aperfeiçoar o próprio texto, trabalhar a gramática pelo método

natural, seguindo os passos de Freinet:

Page 33: Apostila Excelente de Alfabetizacao

33

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

1) Aperfeiçoado o texto, ele procedia, todos os dias, a um rápido exercício de

reconhecimento das palavras: substantivos, adjetivos, verbos, pronomes, etc., sem

regra especial, mas por meio de um exercício inteligente.

2) Nesse exercício de reconhecimento, juntamente com as crianças, detectava as

dificuldades (“erros”), que utilizava para exercícios de aperfeiçoamento (correção): os

plurais, os femininos, a concordância, o uso dos adjetivos e dos pronomes

demonstrativos e, principalmente, o uso dos verbos.

3) Quanto ao sentido das frases, trabalhava a análise lógica de forma contextualizada.

4) A cópia só era feita dos textos já aperfeiçoados (corrigidos) no quadro. Os alunos

copiavam textos vivos, construídos por eles mesmos, porém corretos. Faziam a

composição de textos e frases na tipografia, letra por letra, até a linha tornar­se

impecável. Não era um exercício passivo, sem finalidade, mas um trabalho motivado.

5) O ditado era usado para as crianças avaliarem a si mesmas e aos outros.

6) Propunha exercícios de caça de palavras. As crianças procuravam num texto de seu

interesse palavras que ajudariam, posteriormente, o estudo ortográfico ou gramatical;

palavras com oi, ur, mp, mb, br, bl, pr, ar, es , s, ss, ç, famílias de palavras, sinônimos, homônimos, etc.

No emprego do método global para iniciar a criança na leitura, devem­se utilizar palavras já

conhecidas. As palavras desconhecidas ou desligadas do cotidiano conduzem a uma técnica falsa

e à deformação do próprio sentido da leitura. A precisão e a riqueza da leitura dependem

unicamente da prática e da compreensão global das palavras desconhecidas do texto. Freinet

valoriza a leitura, as descobertas e as pesquisas das crianças. A leitura representa uma etapa

intermediária indispensável no processo de relações entra a criança e o meio. Quando nascida da

compreensão, gera a compreensão. Longe de negligenciá­la, a escola deveria contribuir para o

seu aprimoramento constante.

Os métodos naturais possibilitam ao mestre acompanhar os processos de tentativa de

cada criança, descobrindo os patamares pelos quais o ato conseguido se mecaniza e estrutura

em técnica.

Quem observar o espetáculo de uma aula viva, entusiasta, perceberá a diferença radical

da prática metodológica do educador Freinet.

Page 34: Apostila Excelente de Alfabetizacao

34

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Exercícios

1. Segundo Freinet, o prolongamento da experiência pessoal são: a) o método natural, o método artificial e a pesquisa científica. b) o método artificial, a livre expressão e a pesquisa acadêmica. c) o método natural, a livre expressão e a pesquisa experimental.

2. De acordo com Freinet, a idade para introduzir a criança na escrita deve ser: a) 5 anos b) 6 anos c) 7 anos d) Não há idade definida

Respostas dos Exercícios

1. Segundo Freinet, o prolongamento da experiência pessoal são: RESPOSTA CORRETA: C

2. De acordo com Freinet, a idade para introduzir a criança na escrita deve ser: RESPOSTA CORRETA: D

Page 35: Apostila Excelente de Alfabetizacao

35

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 06 • A PROPOSTA PEDAGÓGICA DE EMILIA FERREIRO

Utilizando a abordagem clínica ou método de exploração crítica, amplamente desenvolvido

na escola de Genebra, Emilia Ferreiro pesquisou os conhecimentos da criança no que se referia

às atividades de leitura e escrita. Doutora em psicologia pela Universidade de Genebra, foi

orientanda e colaboradora de Jean Piaget. Argentina de nascimento, realizou suas primeiras

pesquisas em seu país de origem. É professora do Centro de Investigação de estudos Avançados

do Instituto Politécnico Nacional do México, onde investiga o desenvolvimento da leitura e da

escrita do ponto de vista do sujeito que aprende.

Em mais de um decênio de pesquisa para descobrir qual era o processo de construção da

escrita, planejando e divulgando as situações experimentais em que a criança evidencia a escrita

tal qual a vê, a leitura tal como a entende e os problemas tal como os propõe para si, Emilia

Ferreiro tem entusiasmado pesquisadores de várias partes do mundo; interessados na temática,

muitos tornaram­se seus colaboradores, desenvolvendo pesquisas semelhantes em seus países.

A primeira e mais conhecida entre esses pesquisadores é Ana Teberosky. Psicóloga e

pesquisadora do Instituto Municipal de educação de Barcelona, desde 1974 dedica­se à aplicação

da teoria psicogenética diretamente na sala de aula, enfocando o impacto da colaboração de

ambientes bilíngües (catalão e espanhol) sobre a alfabetização de crianças.

Os contatos com pesquisadores de todo o mundo, em especial os latino­americanos,

permitiram que Emilia Ferreiro concluísse ser possível encarar de maneira diferente a

aprendizagem da leitura e da escrita, conseguindo, assim, uma alfabetização de melhor

qualidade.

Alguns aspectos apontados como necessários para entender os objetivos dessa

alfabetização são aqui apresentados de forma esquemática:

1) A escola (como instituição) deve apresentar a língua escrita para a criança, como um

objeto sobre o qual pode atuar, sem a preocupação inicial com detalhes.

2) O importante é a criança saber que as letras, como unidades da língua, não possuem

forma fixa, cada uma se define em função das outras, com diferentes objetivos e

variações para sua identificação; a escrita, tal como a língua oral, evolui; as normas

ortográficas são convenções necessárias para uma comunicação a distância, entre

falantes da mesma língua.

Page 36: Apostila Excelente de Alfabetizacao

36

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

3) A escrita deve ser apresentada à criança como o produto de uma prática histórica, um

poderoso instrumento nas ações sociais, e não como um objeto em si, importante dentro

da escola, quase sacralizado.

4) Deve ser feita a distinção (não apenas terminológica) entre sistema de codificação e de

representação, uma vez que, ao pensar sobre a escrita, a criança procura compreender

a natureza desse sistema simbólico de representação e levanta hipóteses sobre ele,

buscando, basicamente, entender “o que a escrita representa e como se estrutura esta

forma de representação. A invenção da escrita foi um processo histórico de construção

de um sistema de representação, não um processo de codificação”.

5) Deve­se considerar que muitas crianças chegam à escola sabendo para que serve a

escrita, pois tiveram oportunidades de interagir com ela, e terminam sua alfabetização

inicial com sucesso. Outras, porém, justamente as que mais necessitam da escola para

se apropriar da escrita ou de informações sobre suas funções na sociedade, são vítimas

de métodos, manuais ou programas ainda apegados à concepção de que só se aprende

algo por meio de repetição, memorização, cópia de modelos de escrita ou mecanização.

6) Interpretar as escritas infantis é um longo aprendizado, que requer uma atitude teórica

definida. “Se pensarmos que as crianças são seres que ignoram que devem pedir

permissão para começar a aprender, talvez comecemos a aceitar que podem saber,

embora não tenha sido dada a elas a autorização institucional para tanto”.

7) Para entender o processo construtivo da criança, o educador precisa “cotejar uma série

de produções escritas e conhecer as condições de produção, o processo de produção e

a interpretação final dada pelo sujeito”.

8) Restituindo à língua escrita seu caráter de objeto social, estaremos ajudando a criança a

descobrir a importância da leitura em sua sociedade, a obter e ampliar seus

conhecimentos sobre a língua escrita, considerada como poder, e também estimulando

seu raciocínio próprio e sua criatividade.

9) Na visão construtivista, o que interessa do erro (ou desvio) é a sua lógica.

Para entender essas descobertas, ou o modo de representação da linguagem e sua

correspondência com o sistema alfabético da escrita, Emilia Ferreiro esclarece, ainda, outras

questões importantes:

• A compreensão das funções sociais da escrita pela criança determina diferenças na sua

organização da língua escrita e, portanto, gera diferentes expectativas a respeito de o

Page 37: Apostila Excelente de Alfabetizacao

37

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

que se pode encontrar nos múltiplos objetos sociais que são portadores de escrita (livros,

jornais, cartas, embalagens de produtos comestíveis ou de medicamentos, cartazes na

rua, etc.);

• A leitura compreensiva de textos fundamenta a percepção dos diferentes registros de

língua escrita (textos narrativos, informativos, jornalísticos, instruções, cartas, recados,

listas, etc.) e para sua realização contribui mais a leitura silenciosa do que a oralidade

convencional;

• A produção de textos respeita os modos de organização da língua escrita;

• É preciso estimular na criança uma atitude de curiosidade e coragem diante da língua

escrita;

• A escrita representa a língua e não a fala. Qualquer tentativa de justificar a ortografia com

base na pronúncia despreza ou ignora as variantes de fala das populações socialmente

marginalizadas e dificulta a aprendizagem dessas crianças;

É preciso permitir:

• explorações ativas dos vários tipos de objetos materiais que são portadores de escrita (e,

além disso, conhecê­los por seus nomes específicos: jornais, revistas, dicionários,

calendários, agendas, livros ilustrados, livros sem ilustração, livros de poesias, livros de

canções, enciclopédias, cartas, receitas, recibos, telegramas, etc.);

• o acesso à leitura em voz alta, ou oral, dos diferentes registros da língua escrita que

aparecem nesses distintos materiais;

• escrever com diferentes propósitos e sem medo de cometer erros, em contextos em que

as escritas serão aceitas, analisadas e comparadas sem ser sancionadas;

• antecipar o conteúdo de um texto escrito, utilizando inteligentemente os dados

contextuais e, à medida do possível, os dados textuais;

• participar de atos sociais de utilização funcional da escrita; perguntar e ser atendido;

perguntar e obter resposta;

• interagir com a língua escrita para copiar formas, para saber o que se diz, para julgar,

para descobrir, para inventar.

Page 38: Apostila Excelente de Alfabetizacao

38

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Exercícios

1. Assinale a alternativa correta, segundo alguns aspectos apontados como necessários para entender os objetivos da alfabetização, de acordo com a proposta pedagógica de Emilia Ferreiro: a) A criança deve saber que as letras possuem forma fixa. b) A escrita não evolui. c) O educador já conhece o processo construtivo de cada criança. d) As normas ortográficas não são necessárias entre falantes da mesma língua. e) Na visão construtivista, o que interessa do erro é a sua lógica. f) Muitas crianças chegam à escola sem saber para que serve a escrita.

2. Emilia Ferreiro esclarece questões importantes sobre o modo de representação da linguagem e sua correspondência com sistema alfabético de escrita. Assinale a alternativa incorreta. a) É preciso estimular na criança uma atitude de curiosidade e coragem diante da língua

escrita. b) Não deve ser permitido perguntar para não atrapalhar a aula. c) A escrita representa a língua e não a fala.

Respostas dos Exercícios

1. Assinale a alternativa correta, segundo alguns aspectos apontados como necessários para entender os objetivos da alfabetização, de acordo com a proposta pedagógica de Emilia Ferreiro: RESPOSTA CORRETA: E

2. Emilia Ferreiro esclarece questões importantes sobre o modo de representação da linguagem e sua correspondência com sistema alfabético de escrita. Assinale a alternativa incorreta. RESPOSTA CORRETA: B

Page 39: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 07 • MEMÓRIA DA ALFABETIZAÇÃO

Justino Magalhães, apud Zacharias (2005: 90) coloca a hipótese de que a alfabetização,

por si só, não sendo suficiente para deflagrar movimentos globais de mudança, surge, no entanto,

como um meio facilitador. Se entre o oral e o escrito existem zonas de dicotomia e de ruptura, há,

sobretudo, uma interação e passagens sucessivas, o que levou a escrita a reduzir a capacidade

de representação da palavra, substituir a memória e permitir um distanciamento entre sujeito e

objeto; ou seja, a escrita apela à intelectualização e à oralidade, ao sensorial.

Um dos eixos mais significativos para o entendimento da evolução da história da

alfabetização pode ser analisado na perspectiva da evolução dos meios de comunicação: das

formas não­verbais à verbalização e à escrita, da evolução do nível simbólico ao gráfico e das

formas de organização da escrita, passando pelo livro e pela imprensa tipográfica, até os avanços

produzidos pelas novas tecnologias da comunicação e informação.

Outro eixo que se põe para a análise é fazê­lo sob a forma de dicotomias, como aponta o

autor, refletidas nas seguintes relações/ oposições: urbano/ rural, desenvolvido/ subdesenvolvido,

centro/ periferia, controle/ autonomia, papel/ função sócio­religiosa, papel/ função, papel/ função

sociopolítica, etc.

Referências ao processo de alfabetização têm como conseqüência a necessidade de situar

o próprio conceito envolvido, pois as práticas pedagógicas são culturais e evoluem em função de

circunstâncias políticas, sociais e econômicas. Dessa maneira, as metodologias de alfabetização

foram se modificando no decorrer do tempo, de acordo com as necessidades sociais que em

determinados momentos exigem um novo tipo de pessoa letrada e, ao mesmo tempo, em função

do avanço do conhecimento acumulado na área de leitura, produção de escrita e seus processos

de aquisição.

É importante ressaltar que a maioria dos autores concorda que somente se pode observar

a constituição do moderno conceito de infância a partir do século XVII, mesmo que ainda não tão

bem delimitado com os atributos próprios constitutivos da infância moderna.

Um exemplo pode ser encontrado na Didática magna de Jan Amos Comenius, obra que

se reveste de fundamental importância por defender o “ensinar tudo a todos”, mas que apreende a

infância como mais um fator para encontrar a ordem no funcionamento da instituição escolar, sem

dedicar­lhe qualquer primazia específica na delimitação de categorias pedagógicas.

Page 40: Apostila Excelente de Alfabetizacao

40

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

No século XVIII, Rousseau foi a inspiração de métodos pedagógicos universais que

caminham para a pedagogia moderna a partir do século XIX, começando com Pestalozzi, de

modo que se passa a apreender a criança como um ser heterônomo em sua essência, que

necessita da ação adulta para transformá­la – por meio da educação – num ser autônomo.

Partindo do pressuposto de que a educação só pode ser compreendida em determinado

contexto histórico, esboçamos até aqui em algumas linhas superficiais os contextos históricos,

partindo da invenção da escrita, o que talvez nos ajude na compreensão sobre as questões dos

métodos de alfabetização e a forma em que se apresentam durante um longo período.

Como já o dissemos, é necessário ressaltar que toda proposta pedagógica deve ser

sempre orientada por pressupostos teóricos que explicitem as concepções de criança, de

educação e de sociedade. Nesse sentido, é conveniente apontar os principais métodos de

alfabetização utilizados historicamente para ensinar a ler e escrever.

De acordo com Gilda Rizzo, apud Zacharias (2005: 91), “os métodos e processos de

alfabetização evoluíram apenas superficialmente no que concerne ao ensino da leitura

propriamente dita, pois estes continuaram, por todos esses anos, centrados exclusivamente na

preocupação do ensino e memorização do código alfabético­fonético da língua”.

Até o início do século XX, a falta de bases científicas sobre a comunicação verbal, o quase

desconhecimento sobre a linguagem, o pensamento e a construção do conhecimento foram em

grande parte responsáveis pelo fato de os métodos de ensino da leitura e da escrita abrangerem

apenas o ensino do alfabeto, suas combinações e produção de sons, seguindo­se o ensino da

gramática como algo pronto e acabado.

A língua é um sistema de signos cujas partes devem ser consideradas em relação ao todo,

de maneira simultânea. A palavra não é um simples aglomerado de sons isolados; ela representa

uma idéia, através de um enunciado sonoro, original e preciso.

Alfabetização já foi sinônimo de aquisição de uma técnica de codificação e decodificação,

numa visão que revela o modelo tradicional de educação e se desenvolve apenas em nível

individual, desvinculada de seus usos sociais, ou seja, um processo em que a linguagem escrita é

o mero espelho da linguagem oral. A verdadeira importância estaria centrada no processo

mecânico de decifração e domínio do código.

A crença na necessidade da existência de pré­requisitos relacionados à discriminação

visual, memória auditiva, lateralidade, coordenação visomotora, ritmo e tantas outras habilidades,

que deveriam ser desenvolvidas para que as crianças pudessem aprender a ler e a escrever,

Page 41: Apostila Excelente de Alfabetizacao

41

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

também indicam uma visão do processo de alfabetização como codificação e decodificação de

formas gráficas.

Essas concepções tradicionais pressupõem “que não se pode permitir à criança que entre

em contato com um objeto antes de ter as condições necessárias de ‘maturidade’. A maturidade

em questão não pode ser exclusivamente biológica, porque neste caso não haveria povos ágrafos

nem adultos analfabetos”, coloca Emilia Ferreiro (apud Zacharias, 2005: 92).

Historicamente, as discussões sobre a alfabetização se organizaram em torno da eficácia

dos processos (sintético, analítico, analítico­sintético) e dos métodos (silábico, fônico, global).

Posteriormente, com a divulgação dos estudos sobre a psicogênese da alfabetização, assistiu­se

a um abandono da discussão sobre a eficácia dos processos e métodos.

Conhecer essa história tem como objetivo principal permitir que o professor se situe nas

discussões metodológicas e compreenda que as mudanças de rumo no pensamento sobre

alfabetização alteram os modos de alfabetizar.

No contexto em que se foi construindo o processo de alfabetização, era preciso que as

pessoas fossem socializadas nas convenções do sistema de escrita desenvolvido.

Exercícios

1. A constituição do moderno conceito de infância só ocorre a partir do: a) século XVI b) século XVII c) século XVIII

2. O autor da obra Didática magna é a) Jean­Jacques Rousseau b) Jan Amos Comenius c) Johann Heinrich Pestalozzi

Respostas dos Exercícios

1. A constituição do moderno conceito de infância só ocorre a partir do: RESPOSTA CORRETA: B

2. O autor da obra Didática magna é RESPOSTA CORRETA: B

Page 42: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 08 • REVENDO A PSICOGÊNESE DA LÍNGUA ESCRITA

No século XVIII, Rousseau já percebera o erro das filosofias da época, que analisavam

apenas, na constituição do conhecimento, o papel do sujeito (no caso do racionalismo) ou do

objeto (no caso do empirismo). Em seu tratado sobre a educação, deixa claro que não concorda

com nenhum dos dois reducionismos (que consideram o conhecimento em função de um dos

elementos da relação sujeito/ objeto). Incorporando a proposta de educação para Emílio, antecipa

Piaget, quando afirma que o conhecimento deve­se dar na relação entre o sujeito e o objeto e por

meio dela. Se retrocedermos no tempo para acompanhar um pouco mais da discussão sobre a

construção do conhecimento (o que é fundamental para entender o construtivismo), veremos que

as idéias de Rousseau de que o sujeito recebe as impressões do mundo exterior (sensações) e

deve trabalhá­las para chegar aos conceitos (que dão forma aos objetos) foram retiradas de Kant.

Este, por sua vez, tentou casar as duas visões díspares do conhecimento: a visão de que a

análise lógica das ações e objetos conduz ao aumento do conhecimento. e a visão de que a

experiência individual de alguém gera novo conhecimento.

Ao considerarmos a interação entre sujeito e objeto uma estrutura bifásica, vemos que

esses elementos são inseparáveis quando se trata da construção do conhecimento. Não há

sujeito sem objeto e não há objeto sem sujeito que o construa. O sujeito não está simplesmente

situado no mundo, mas o meio (o objeto) entra como parte integrante do próprio sujeito, como

matéria e conteúdo cognitivo e histórico.

As contribuições de Vygotsky, Wallon, Luria, Leontiev, Nuttin e outros vieram imprimir

dimensão cultural ao objeto e histórica ao sujeito. Todo objeto é cultural e se apresenta na

sociedade. E a maneira de captá­lo ou assimilá­lo é pelo diálogo. Segundo Jiron Matui, apud Elias

(2000: 177), construtivismo é “um sistema epistemológico que fundamenta a construção da

mente e do conhecimento sobre bases anteriores, num processo extremamente dinâmico e

reversível de equilíbrio majorante”.

Logo, a principal questão levantada pelos teóricos é a de que o construtivismo é, antes de

tudo, uma nova visão de mundo e da natureza humana – embora ainda seja considerada por

muitos educadores um método de ensino (talvez pela própria necessidade de encontrar uma

forma ou caminho para melhorar o rendimento escolar). Foi, no entanto, a epistemologia genética,

de Jean Piaget, pela ótica de como se origina o conhecimento científico na criança, que nos deu a

conhecer essa nova visão sobre o processo de interação entre sujeito e objeto da aprendizagem.

Page 43: Apostila Excelente de Alfabetizacao

43

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Se considerarmos o desenvolvimento cognitivo um processo interativo e construtivo, com

base em conhecimentos anteriores que são reestruturados a cada nova informação recebida,

concluiremos que se trata de um processo dinâmico e dialético. O sujeito não nasce com o

pensamento ou os conhecimentos; estes têm sua gênese (origem) no ser humano por

internalização e reconstrução. Sendo histórico e social, o homem os constrói, reconstrói e

internaliza, durante toda a vida, de acordo com os seus esquemas, nível de desenvolvimento e

participação na sociedade.

O ser vivo interage com o meio físico e social, e por força de sua ação constrói

conhecimento. Daí a afirmação de Becker (apud Elias 2000: 178) de que o construtivismo significa

que “nada, a rigor, está pronto, acabado, e de que, especificamente, o conhecimento não é dado,

em nenhuma instância, como algo terminado”.

É, pois, participando da prática social de sua comunidade, da cultura a que pertence,

juntamente com outras pessoas, em situação de dialogicidade, vivenciando as funções sociais da

leitura e da escrita, que a criança aprende sobre esse objeto de conhecimento.

A ação da práxis humana como a que se deve realizar num ambiente escolar, recriada de

forma didática, deve possibilitar a produção dos conhecimentos. Freinet situa no tateio

experimental o patamar inicial dessa construção, constituído – como para Piaget – pelos primeiros

contatos dos sentidos (visão, audição, tato, paladar, olfato) e dos sentimentos com o objeto do

saber.

As escritas ainda não são verdadeiras construções, para as quais faltam os nexos lógicos

de explicação que ocorrerão em outro plano, patamar da reflexão e abstração lógico­matemático.

Os conhecimentos construídos nesse segundo plano chamam­se “conhecimentos físicos” e são

formados de características e propriedades do objeto, descobertas mediante ação direta do sujeito

sobre o objeto. Daí a importância de proporcionar o contato com símbolos (figuras, fotos, filmes,

etc.) quando for impossível o contato direto com o objeto. No caso da alfabetização, recomenda­

se que as funções sociais da linguagem e da escrita sejam vivenciadas interindividualmente, em

situação de aprendizagem.

Inicialmente, a criança formará imagens mentais (mas não conceitos) dos objetos,

fenômenos e acontecimentos (representações simbólicas). Ao vivenciá­los em grupo (por meio do

diálogo), a ação é internalizada. É quando ocorre a elaboração interna, em nível mental, ação

sobre ação ou experiência lógico­matemática (Piaget), ou experiência de experiência, pensar a

palavra, discurso interior (Vygotsky).

Page 44: Apostila Excelente de Alfabetizacao

44

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

A escrita também é um objeto simbólico, um significante que mantém relações muito

estritas com o desenho e com a linguagem – embora não seja transcrição desta nem derivada

daquele. Ao ler as imagens, as crianças aprendem muitas coisas que as cercam. Os textos que

contêm imagens estão distribuídos de forma diferenciada pelas páginas que o compõem,

acompanhados ou não por ilustrações (desenhos, fotografias, gráficos) e estão impressos em

diferentes tipos de letras. As crianças também se deparam, durante o período, com outros textos

que não o livro didático: jornais, panfletos, cartazes, cartas, bilhetes, livros de história,

enciclopédias, etc. São elementos novos que podem contribuir para a organização do trabalho em

sala de aula, desenvolver leitores comprometidos, capazes de ampliar, para si, os significados

traduzidos em linguagem escrita.

Um fato observado por Emilia Ferreiro durante suas pesquisas sobre as hipóteses das

crianças com respeito à escrita, quando esta viesse acompanhada de imagem, e que lhe causou

preocupação, foi como conciliá­las em função da imagem e a realidade das propriedades do texto.

Percebeu­se que as crianças de 4 anos esperam encontrar no texto o nome do objeto desenhado,

por acreditarem que este representa o nome do objeto total presente no desenho.

Ferreiro afirma que o interesse pela escrita não começa quando a criança atinge

determinada idade cronológica, e é possível que essa preocupação comece muito antes, em

função dos sujeitos e das condições ambientais. Ao contrário do que educador e criança esperam

quando esta inicia sua escolaridade, o aprendizado da escrita requer tempo, paciência e

maturidade.

O educador precisa ter claro que a criança primeiro aprende a escrever para só depois

dominar a ortografia. As incorreções que comete, portanto, não significam que não tenha

aprendido. É preciso compreender as causas do erro para levá­la a superá­lo com base em um

trabalho de conhecimento da forma ortográfica correta. O conhecimento de uma pesquisa sobre a

história da escrita, feita com os alunos, pode ajudá­los a encontrar respostas para questões que,

certamente, eles se fazem quando precisam realizar tarefas impostas pelos professores e para as

quais nem sempre encontram sentido, tais como: por que todos devem escrever com a mesma

ortografia? Por que é preciso caprichar na letra? Por que a língua escrita tem regras de

acentuação? Por que a gramática da língua escrita nem sempre corresponde à língua oral?

Outra tarefa louvável é transmitir aos alunos a idéia de que a escrita é um instrumento

fascinante que a humanidade levou séculos para criar.

O ato de ler, antes restrito a ambientes fechados, hoje acontece em todos os lugares. Lê­

se em casa, mas se lê também nos bancos das praças, nas ruas, no ônibus, no metrô, na fila, nos

Page 45: Apostila Excelente de Alfabetizacao

45

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

aviões. E além de textos nas mãos, o indivíduo recebe outras mensagens escritas: placas, avisos,

luminosos, outdoors. Todas as formas de leitura são importantes e devem ser valorizadas. A

escola não pode, portanto, desconsiderar as informações que a criança domina e exigir dela o que

não tem. Precisa, sobretudo, conhecer o momento do processo de compreensão da língua escrita

em que está a criança e resgatar com ela esse objeto de conhecimento, colocando­o à sua

disposição para que, por meio de experiências significativas, ela possa interagir com ele e

compreender seu significado e uso.

A vida do homem, principalmente nos últimos dois séculos, está marcada por documentos

escritos, aos quais a leitura está intimamente associada. Cabe à escola estabelecer relações entre

leitura e escrita, e criança e adulto, aprofundando e ampliando o domínio dos níveis de leitura e

escrita, bem como orientar a escolha dos materiais de leitura.

A condição primeira para que isso aconteça é que o professor também goste de ler, tenha

preparo teórico e metodológico para selecionar textos interessantes, leia para e com seus alunos,

seja paciente para ouvir as leituras que fazem dos textos estudados e/ ou que venham a produzir.

Com a expressão “preparo teórico e metodológico”, estamos nos referindo às questões do ensinar

e aprender, no âmbito da escola, como processo específico e intencional de organizar e propor

situações para que ocorra determinada aprendizagem. Todo professor precisa ter um bom

preparo profissional que garanta, entre outros requisitos, o domínio do saber e do saber­fazer, isto

é, da metodologia do processo de ensino­aprendizagem entendido como prática social

transformadora e democrática.

Ciente de que conhecimento, desenvolvimento e aprendizagem são processos

relacionados entre si, que acontecem por construção e interação; o professor vinculará os

conteúdos de ensino à realidade, prevendo interações com os alunos, deles entre si e deles com

o conhecimento, baseando­se em procedimentos que assegurem uma aprendizagem significativa

e prazerosa. A aprendizagem é provocada mediante um problema que toque realmente cada

aluno. O professor só pode trabalhar se os alunos e seus desejos estiverem presentes: é o prazer

de dar significação às coisas e ao universo que move o ensino­aprendizagem.

Isso mostra a importância de conhecer o nível de desenvolvimento de cada aluno para

poder orientar sua aprendizagem, uma vez que a psicogênese é evolucionista ou um ramo do

evolucionismo. Categorias ou estruturas mentais surgem e se desenvolvem durante toda a vida do

indivíduo. Cada desenvolvimento corresponde a uma possibilidade de aprendizagem nova,

embora apoiada nas já existentes. Essas aprendizagens são o ponto de partida para a conclusão

de um ciclo de desenvolvimento ou amadurecimento das estruturas mentais.

Page 46: Apostila Excelente de Alfabetizacao

46

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Exercícios

1. Durante suas pesquisas, Emilia Ferreiro percebeu que as crianças de uma certa idade esperam encontrar no texto o nome do objeto desenhado, por acreditar que este representa o nome do objeto total presente no desenho. A qual idade ela se refere? a) 6 anos b) 5 anos c) 4 anos

2. Cabe à escola estabelecer relações entre leitura/ escrita e criança/ adulto. Para que isto aconteça, é necessário: a) que o professor também goste de ler. bque o professor tenha preparo teórico e metodológico para selecionar textos interessantes. c) que o professor seja paciente para ouvir as leituras. d) que o professor leia para e com seus alunos. e) todas as alternativas estão corretas.

Respostas dos Exercícios

1. Durante suas pesquisas, Emilia Ferreiro percebeu que as crianças de uma certa idade esperam encontrar no texto o nome do objeto desenhado, por acreditar que este representa o nome do objeto total presente no desenho. RESPOSTA CORRETA: C

2. Cabe à escola estabelecer relações entre leitura/ escrita e criança/ adulto. Para que isto aconteça, é necessário: RESPOSTA CORRETA: E

Page 47: Apostila Excelente de Alfabetizacao

47

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 09 • DO DESENHO À PALAVRA: OS NÍVEIS CONCEPTUAIS LINGÜÍSTICOS

No trabalho com os cinco níveis conceptuais, utilizamos a nomenclatura considerada a

mais conhecida entre os professores:

O nível intermediário I foi introduzido por se tratar de um momento de conflito fundamental

para a organização do trabalho do professor.

Nível 1: pré­silábico

Fase pictórica: A criança registra garatujas, desenhos sem figuração e, mais tarde,

desenhos com figuração. Normalmente, a criança que vive num ambiente urbano, com

estimulação lingüística e disponibilidade de material gráfico (papel e lápis), começa a rabiscar e

experimentar símbolos muito cedo (por volta dos 2 anos). Muitas vezes, ela já usa a linearidade,

mostrando uma consciência sobre as características da escrita.

Fase gráfica primitiva. A criança registra símbolos e pseudoletras, misturadas com letras

e números. Já demonstra linearidade e utiliza o que conhece do meio ambiente para escrever

(bolinhas, riscos, pedaços de letras). Nesse momento, há um questionamento sobre os sinais

escritos. Ela pergunta muito ao adulto sobre a representação que vê em sua comunidade.

Fase pré­silábica. Na fase pré­silábica propriamente dita, a criança começa a diferenciar

letras de números, desenhos ou símbolos e reconhece o papel das letras na escrita. Percebe que

as letras servem para escrever, mas não sabe como isso ocorre.

Nesse momento, a criança apresenta as seguintes concepções:

• Falta de consciência da correspondência entre pensamento e palavra escrita.

Nível 1 – pré­silábico (fase pictórica, gráfica primitiva e pré­silábica propriamente dita)

Nível 2 – intermediário I

Nível 3 – silábico

Nível 4 – intermediário II ou silábico­alfabético

Nível 5 – alfabético

Page 48: Apostila Excelente de Alfabetizacao

48

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

• Falta de correspondência entre fonema e grafema. Não há reconhecimento do valor

sonoro convencional, isto é, não é observada a relação existente entre o som A e a letra

A.

• Impressão de que a ordem das letras não é importante. Podem ser quaisquer letras, em

qualquer ordem, pois a escrita não é estável. A mesma letra pode mudar de significado

em um lugar diferente, porque ela corresponde ao que o sujeito desejou escrever. Uma

criança pode escrever girafa assim: LTUXTOAVEMOXOAT.

• Impressão de que só existe a possibilidade de escrever substantivos, pois eles têm

significado. Geralmente a criança não escreve verbos e artigos.

• Idéia de que a leitura e a escrita só são possíveis se houver muitas letras (sempre mais

de três ou quatro) e letras diferentes e variadas.

Na fase pré­silábica, a criança acredita que as letras ou sílabas não se repetem na mesma

palavra. Pode­se imaginar, então, o que se passa na cabeça da criança pré­silábica quando se

inicia o processo de alfabetização pelo A, E, I, O, U (sem significado) e quando se usa e abusa de

sílabas dobradas (lalá, lelé, li, fafá, fifi, zazá, etc.).

Quando questionada se a palavra sol pode ser lida, a criança diz que não, porque tem poucas letras. O mesmo ocorre quando se mostra a seqüência lá­lá­lá­lá. Nessa fase, é comum a

criança dizer que para escrever elefante ela precisa de muitas letras porque elefante é grande e

para escrever formiguinha ela precisa de poucas letras, porque formiga é pequena.

Observe a escrita de uma criança pré­silábica:

AIUNOÁXF abacaxi

BXUNAF maçã

AXUNB banana

OXNBAUXA O menino come pêra.

Nível 2: intermediário I

A fase intermediária I caracteriza­se por um conflito. A criança foi provocada a repensar a

certeza do nível pré­silábico e fica sem saída, pois não consegue ainda entender a organização

do sistema lingüístico. Geralmente há a negação da escrita, pois o aluno diz que “não sabe

Page 49: Apostila Excelente de Alfabetizacao

49

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

escrever”. A postura do alfabetizador, bem como a estimulação lingüística presente no meio, irá

determinar se a criança dará continuidade à sua busca ou se desanimará.

As características desse nível são:

• Ligação difusa entre pronúncia e escrita. A criança já conhece e usa alguns valores

sonoros convencionais, além de alguns trechos da palavra. Ao ser solicitada a escrever

elefante, por exemplo, ela escreve EXTATEUXE. Já é capaz de justificar: a palavra

começa com E e termina com E.

• Início de uma certa estabilidade exterior das palavras, dependendo da autoridade de

alguém que especifica as letras e a sua ordem. A criança sabe, por exemplo, que a

palavra Rodrigo tem dois R, mas não sabe onde colocá­los.

Nível 3: silábico

Quando a criança chega ao nível silábico, sente­se confiante porque descobre que pode

escrever com lógica. Ela conta os “pedaços sonoros”, isto é, as sílabas, e coloca um símbolo

(letra) para cada pedaço. Essa noção de que cada sílaba corresponde a uma letra pode acontecer

com ou sem valor sonoro convencional. A criança pode, por exemplo, escrever fita assim: IA ou LX. Aqui, o aluno acredita que resolveu o problema da escrita, mas a leitura ainda continua

problemática, porque os adultos não conseguem ler o que ele escreveu.

As características do nível silábico são:

• Aceitação de palavras com uma ou duas letras, mas ainda com uma certa hesitação.

Algumas vezes, depois de escrever a palavra, coloca mais letras só para ficar “mais

bonito”. Exemplo: UALXTO ([uva].

• Possibilidade de convivência com a hipótese de quantidade mínima de letras por um bom

tempo.

• Utilização de uma letra para cada palavra ao escrever uma frase.

• Falta de definição das categorias lingüísticas (artigo, substantivo, verbo etc.).

• Maior precisão na correspondência som/ letra, o que não ocorre necessariamente

sempre. É freqüente que numa frase algumas palavras sejam registradas com recorte

silábico. O essencial da hipótese silábica é a sonorização ou fonetização da escrita,

inexistente em fases anteriores.

Page 50: Apostila Excelente de Alfabetizacao

50

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

EEUO elefante VK vaca CMUO camelo OUI boi AVKVUQ A vaca dá leite

Nível 4: intermediário II ou silábico­alfabético

Por se tratar de um nível intermediário, é mais uma vez um momento conflitante, pois a

criança precisa negar a lógica do nível silábico. Ninguém consegue ler o que ela escreve e, nesse

momento, ela se vê sem saída. Isso acontece principalmente quando ela usa só vogais, porque a

mesma combinação de letras serve para escrever uma porção de palavras. É justamente isso que

pode indicar o caminho para o professor: propor atividades que levem a criança a observar a

distância entre sua escrita e a escrita do adulto (respectivamente, por exemplo, ao e sapo).

É o momento em que o valor sonoro torna­se imperioso e a criança começa a acrescentar

letras principalmente na primeira sílaba. Exemplos:

TOAT tomate

TIAO Tiago

KVAQ cavalo

No nível silábico­alfabético, a criança está a um passo da escrita alfabética. Ao professor

cabe o trabalho de refletir com ela sobre o sistema lingüístico a partir da observação da escrita

alfabética e da reconstrução do código.

Nível 5: alfabético

Quando a criança reconstrói o sistema lingüístico e compreende a sua organização, ela

transpõe a porta do mundo e das coisas escritas, conseguindo ler e expressar graficamente o que

pensa ou fala. Ela representa as seguintes características:

• Compreensão da logicidade da base alfabética da escrita. Exemplo: a criança sabe que

os sons G e A são grafados ga e que T e O são grafados to e que, juntos, significam gato.

• Conhecimento do valor sonoro convencional de todas ou de grande parte das letras,

juntando­as para que formem sílabas e palavras.

Page 51: Apostila Excelente de Alfabetizacao

51

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

• Distinção de letra, sílaba, palavra e frase. Às vezes, contudo, a criança ainda não divide a

frase convencionalmente (gramaticalmente), e sim de acordo com o ritmo frasal.

Exemplos:

omininu comeum doci O menino comeu um doce

BISILTA bicicleta

PTECA peteca

UVDA bola

LUSIA OO PT EC Lúcia joga peteca

É importante destacar que nesse momento a criança escreve foneticamente (faz a relação

entre som e letra), mas não ortograficamente. O desafio agora é caminhar em direção à

convencionalidade, em direção à correção ortográfica e gramatical.

Exercícios

1. Quais são as fases que pertencem ao Nível I, o pré­silábico? a) fase pictórica e pré­silábica propriamente dita. b) fase gráfica primitiva e pré­silábica propriamente dita. c) fase pictórica, fase gráfica primitiva e fase pré­silábica propriamente dita.

2. O nível silábico caracteriza­se: a) pela utilização de uma letra para cada palavra ao escrever uma frase. b) pela falta de consciência da correspondência entre pensamento e palavra escrita. c) pela distinção entre letra, sílaba, palavra e frase. d) pela falta de correspondência entre fonema e grafema.

Respostas dos Exercícios

1. Quais são as fases que pertencem ao Nível I, o pré­silábico? RESPOSTA CORRETA: C

2. O nível silábico caracteriza­se: RESPOSTA CORRETA: A

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 10 • AS CONCEPÇÕES SOBRE A LÍNGUA SUBJACENTES À PRÁTICA DOCENTE.

Tradicionalmente, as discussões sobre a prática alfabetizadora têm se centrado na

polêmica sobre os métodos utilizados: métodos analíticos versus métodos sintéticos; fonético

versus global, etc. Nenhuma dessas discussões levou em conta o que agora conhecemos: as

concepções das crianças sobre o sistema de escrita. Daí a necessidade imperiosa de recolocar a

discussão sobre novas bases.

Se aceitarmos que a criança não é uma tábua rasa onde se inscrevem as letras e as

palavras segundo determinado método; se aceitarmos que o “fácil” e o “difícil” não podem ser

definidos a partir da perspectiva do adulto, mas da de quem aprende; se aceitarmos que qualquer

informação deve ser assimilada (e portanto transformada) para ser operante, então deveríamos

também aceitar que os métodos (como seqüência de passos ordenados para chegar a um fim)

não oferecem mais do que sugestões, incitações, quando não práticas rituais ou conjunto de

proibições. O método não pode criar conhecimento.

A nossa compreensão dos problemas tal como as crianças os colocam, e da seqüência de

soluções que elas consideram aceitáveis (e que dão origem a novos problemas) é, sem dúvida,

essencial para poder ao menos imaginar um tipo de intervenção adequada à natureza do

processo real de aprendizagem. Mas reduzir esta intervenção ao que tradicionalmente

denominou­se “o método utilizado” é limitar demais nossa indagação.

É útil se perguntar através de que tipo de práticas a criança é introduzida na língua escrita,

e como se apresenta este objeto no contexto escolar. Há práticas que levam a criança à

convicção de que o conhecimento é algo que os outros possuem e que só se pode obter da boca

dos outros, sem nunca ser participante na construção do conhecimento. Há práticas que levam a

pensar que “o que existe para se conhecer” já foi estabelecido, como um conjunto de coisas

fechado, sagrado, imutável e não­modificável. Há práticas que levam a que o sujeito (a criança

neste caso) fique de “fora” do conhecimento, como espectador passivo ou receptor mecânico, sem

nunca encontrar respostas aos “porquês” e aos “para quês” que já nem sequer se atreve a

formular em voz alta.

Nenhuma prática pedagógica é neutra. Todas estão apoiadas em certo modo de conceber

o processo de aprendizagem e o objeto dessa aprendizagem. São provavelmente essas práticas

(mais do que os métodos em si) que têm efeitos mais duráveis em longo prazo, no domínio da

Page 53: Apostila Excelente de Alfabetizacao

53

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

língua escrita como em todos os outros. Conforme se coloque a relação entre sujeito e o objeto de

conhecimento, e conforme se caracterize a ambos, certas práticas aparecerão como “normais” ou

como “aberrantes”. É aqui que a reflexão psicopedagógica necessita se apoiar em uma reflexão

epistemológica.

Em diferentes experiências que tivemos com profissionais de ensino apareceram três

dificuldades principais que precisam ser inicialmente colocadas: em primeiro lugar, a visão que um

adulto, já alfabetizado, tem do sistema de escrita; em segundo lugar, a confusão entre escrever e

desenhar letras; finalmente, a redução do conhecimento do leitor ao conhecimento das letras e

seu valor sonoro convencional. Mencionaremos brevemente as duas primeiras e iremos nos

deter mais na terceira.

Não há forma de recuperar por introspecção a visão do sistema de escrita que tivemos

quando éramos analfabetos (porque todos fomos analfabetos em algum momento). Somente o

conhecimento da evolução psicogenética pode nos obrigar a abandonar uma visão adultocêntrica

do processo.

Por outro lado, a confusão entre escrever e desenhar letras é relativamente difícil de se

esclarecer, porque se apóia em uma visão do processo de aprendizagem segundo a qual a cópia

e a repetição dos modelos apresentados são os procedimentos principais para se obter bons

resultados. A análise detalhada de algumas das muitas crianças que são “copistas” experientes

mas que não compreendem o modo de construção do que copiam é o melhor recurso para

problematizar a origem desta confusão entre escrever e desenhar letras.

Os adultos já alfabetizados têm tendência a reduzir o conhecimento do leitor ao

conhecimento das letras e seu valor sonoro convencional. Para problematizar tal redução

utilizamos, reiteradas vezes, uma situação que favorece uma tomada de consciência quase

imediata: formamos pequenos grupos e entregamos materiais impressos em escritas

desconhecidas para eles (árabe, hebraico, chinês, etc.) com a orientação de tratar de lê­los.

A primeira reação – obviamente – é de rejeição: como ler se não conhecemos essas

letras? Insistimos em que tratassem de ler. Quando afinal decidem explorar os materiais

impressos começam, de imediato, os intercâmbios nos grupos. Primeiro, a respeito da

categorização do objeto que têm entre as mãos: isso é um livro, um jornal, uma revista, um

folheto, etc. Conforme a categorização combinada, apresenta­se de imediato a antecipação sobre

a organização do seu conteúdo: se é um jornal, tem de ter seções; se é um livro tem de ter o título

no início, o nome do autor, a editora, o índice no início ou no final, etc. Em todos os casos se

supõe que as páginas estão numeradas, o que permite encontrar a diferença gráfica entre

Page 54: Apostila Excelente de Alfabetizacao

54

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

números e letras. Em alguns casos, a orientação da escrita não está clara (vai da esquerda à

direita ou da direita à esquerda?) e se buscam indicadores para poder decidir.

Supõe­se que haja letras maiúsculas e minúsculas e sinais de pontuação. Supõe­se que

no jornal apareça a data completa, enquanto que num livro se busca apenas o ano de impressão.

Se há fotografias ou desenhos, antecipa­se que o texto mais próximo tem a ver com o desenhado

ou fotografado e, em se tratando de uma personagem pública, pressupõe­se que seu nome esteja

escrito. Se a mesma personagem aprece em duas fotografias procura­se de imediato, nos textos

que se supõem ser legendas das fotografias, alguma parte em comum: caso seja encontrada, se

supõe que aí está escrito o nome da personagem em questão. Todos conseguiram chegar a

conclusões do tipo “aqui deve dizer...”, “pensamos que aqui diz... porque...”. Os que mais

avançaram nas suas tentativas de interpretação são os que encontraram fotos, desenhos ou

diagramas sobre os quais apoiar a interpretação dos textos. Foi explicado a eles que as crianças

pequenas fazem a mesma coisa. Todos se sentiram muito desorientados ao explorar esses

caracteres desconhecidos, e, em particular, descobriram como pode ser difícil encontrar dois

caracteres iguais quando não se conhece quais são as variações irrelevantes e quais as variações

importantes. Explicamos a eles, então, que as crianças também se sentem assim no início da

aprendizagem. Mas todos puderam fazer antecipação sobre o significado porque sabem que é um

livro, como está organizado e que tipo de coisa pode estar escrito nele. Esse tipo de

conhecimento geralmente as crianças não têm. Descobriram que construir antecipações sobre o

significado e tratar depois de encontrar indicações que permitam justificar ou rejeitar a

antecipação é uma atividade intelectual complexa, bem diferente da pura adivinhação ou da

imaginação não controlada. Assim descobrem que o conhecimento da língua escrita que eles

possuem, por serem leitores, não se reduz ao conhecimento das letras.

Uma vez esclarecidas estas dificuldade conceituais iniciais, é possível analisar a prática

docente em termos diferentes do metodológico. A título de exemplo realizaremos a seguir a

análise das concepções sobre a língua escrita subjacentes a algumas dessas práticas.

a) Existe uma polêmica tradicional sobre a ordem em que devem ser introduzidas as

atividades de leitura e as de escrita. Na tradição pedagógica norte­americana, a leitura

precede regularmente a escrita. Na América Latina, a tradição tende a utilizar uma

introdução conjunta das duas atividades. No entanto, espera­se habitualmente que a

criança possa ler antes de saber escrever por si mesma (sem copiar). A inquietação

dos professores subsiste: esta é uma das perguntas que formulam freqüentemente. Se

pensarmos que o ensino da língua escrita tem por objetivo o aprendizado de um código

Page 55: Apostila Excelente de Alfabetizacao

55

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

de transcrição, é possível dissociar o ensino da leitura e da escrita enquanto

aprendizagem de duas técnicas diferentes, embora complementares?

b) Nas decisões metodológicas, a forma de apresentar as letras individuais ocupa um lugar

importante, bem como a ordem de apresentação tanto das letras quanto de palavras, o

que implica uma seqüência do “fácil” ao “difícil”. A língua escrita é um objeto de uso

social, com uma existência social. Quando as crianças vivem em um ambiente urbano,

encontram escritas por toda parte. No mundo circundante estão todas as letras, não em

uma ordem preestabelecida, mas com a freqüência que cada uma delas tem na escrita

da língua. Todas as letras em uma grande quantidade de estilos e tipos gráficos.

Ninguém pode impedir a criança de vê­las e se ocupar delas. Como também ninguém

pode honestamente pedir à criança que apenas peça informação à sua professora, sem

jamais pedir informação a outras pessoas alfabetizadas que possam ter à sua volta.

Quando no âmbito escolar se toma alguma decisão sobre o modo de apresentação das

letras costuma­se tentar – simultaneamente – controlar o comportamento dos pais a respeito

disso, e é totalmente impossível controlar a presença do material escrito no ambiente urbano.

A criança vê mais letras fora do que dentro da escola: a criança pode produzir textos fora

da escola, enquanto na escola só é autorizada a copiar, mas nunca a produzir de forma pessoal.

A criança recebe informação dentro, mas também fora da escola, e essa informação extra­escolar

se parece à informação lingüística geral que utilizou quando aprendeu a falar.

Por trás das discussões sobre a ordem de apresentação das letras e das seqüências de

letras, reaparece a concepção da escrita como técnica de transcrição de sons, mas também algo

mais sério e carregado de conseqüências: a transformação da escrita em um objeto escolar e, por

conseqüência, a conversão do professor no único informante autorizado.

A transformação destas práticas é que é realmente difícil, já que obriga a redefinir o papel

do professor e a dinâmica das relações sociais dentro e fora da sala de aula.

As mudanças necessárias para enfrentar sobre bases novas a alfabetização inicial não se

resolvem com um novo método de ensino, nem com novos testes de prontidão nem com novos

materiais didáticos. É preciso mudar os pontos por onde nós fazemos passar o eixo central das

nossas discussões.

Page 56: Apostila Excelente de Alfabetizacao

56

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Exercícios

1. Segundo Emilia Ferreiro (2001: 30), o método: a) oferece mais que sugestões. b) não pode criar conhecimentos. c) aceita que o “fácil” e o “difícil” não podem ser definidos.

2. De acordo com as experiências de Emilia Ferreiro (2001: 32), quais foram as principais dificuldades encontradas com os profissionais de ensino? a) A visão que um adulto já alfabetizado tem do sistema de escrita. b) A confusão entre escrever e desenhar letras. c) A redução do conhecimento do leitor ao conhecimento das letras e seu valor sonoro

convencional. d) Todas as alternativas estão corretas.

Respostas dos Exercícios

1. Segundo Emilia Ferreiro (2001: 30), o método: RESPOSTA CORRETA: B

2. De acordo com as experiências de Emilia Ferreiro (2001: 32), quais foram as principais dificuldades encontradas com os profissionais de ensino? RESPOSTA CORRETA: D

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 11 • TEMPO DE APRENDER A LER – TEMPO DE ENSINAR A LER

Tempo de aprender a ler

Ana Maria Machado aprendeu a ler muito cedo, decifrando jornais, com a ajuda esporádica

de alguém, que vez por outra lhe ensinava os sons das letras, nada muito sistemático. A futura

escritora ia juntando retalhos de informação e finalmente se descobriu lendo, para espanto da

professora do jardim­de­infância, que pediu satisfações à família pela audácia de alfabetizar uma

criança tão pequena. Interrogada, a mãe de Ana Maria negou o crime.

No livro Infância, as recordações amargas de Graciliano Ramos (1953) começam pela

figura temível do pai, que tentou ensiná­lo a ler à força de ameaças, gritos e pancadas de vara. A

cartilha feia e mal impressa era um folheto de papel ordinário, que se desmanchava entre os

dedos do menino, molhados de suor nervoso. Quando conseguiu aprender as primeiras letras

descobriu que o sofrimento não tinha acabado:

"Enfim consegui familiarizar­me com as letras quase todas. Aí me exibiram outras vinte e

cinco, diferentes das primeiras e com os mesmos nomes delas. Atordoamento, preguiça,

desespero, vontade de acabar­me. Veio terceiro alfabeto, veio quarto, e a confusão se

estabeleceu, um horror de quiproquós. Quatro sinais com uma só denominação. Se me

habituassem às maiúsculas, deixando as minúsculas para mais tarde, talvez não me

embrutecesse. Jogaram­me simultaneamente maldades grandes e pequenas, impressas e

manuscritas. Um inferno...” (Ramos, 1953: 102)

Finalmente, o pai desistiu e entregou a tarefa à filha Mocinha, que ensinou Graciliano a

soletrar. Depois de gaguejar sílabas durante um mês, o menino encontrou, no fim do livro, frases

que soletrava mas era incapaz de compreender.

“A preguiça é a chave da pobreza.

“Fala pouco e bem: ter­te­ão por alguém.”

Graciliano embatucava: que chave seria aquela? Quem era Terteão? Julgava que fosse

um homem. Mocinha também não compreendia.

Semi­alfabetizado, entrou na escola, onde encontrou uma mestra paciente e boa, que

cheirava bem, e até conversava com as crianças.

Page 58: Apostila Excelente de Alfabetizacao

58

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

A escritora e psicanalista francesa Françoise Dolto conta que tinha muita curiosidade por

um determinado livro infantil, por isso se lançou com entusiasmo à tarefa de aprender a ler. Logo

se desencantou, porém, com os exercícios de soletração que a governanta lhe propunha.

Absolutamente não entendia como tais atividades poderiam levá­la a ler a história desejada. Ao

fim de três ou quatro meses, foi capaz de soletrar, mas ficou muito desapontada: achou tudo

horrivelmente longo e idiota.

"Eu ia balbuciando com uma voz tensa, os olhos fixos no texto para juntar as letras. E,

naturalmente, um texto não quer dizer nada quando é declamado sílaba por sílaba. Então ela (a

governanta) me dizia: “escute o que está lendo”! Está muito bem, muito bem, você lê

perfeitamente, mas escute o que está lendo!" E aí, um dia consegui escutar: eram sílabas

separadas, mas que queriam dizer alguma coisa se fossem agrupadas ao serem ouvidas. Agora,

eu sabia ler e não queria mais largar o texto. Queria continuar.” (Dolto, 1990: 72)

O relato de Dolto fornece pistas sobre o que se passa com algumas crianças – o menino

Graciliano e outras – que ficam perplexas diante desses símbolos miúdos, impressos em preto

sobre a página branca, marcas incompreensíveis que os adultos dizem conter palavras e histórias.

Como é possível? Como funciona? Nada faz sentido para as crianças, mas os pais, a professora,

a escola exigem que elas aprendam a ler. E lá se vão, repetindo, copiando, soletrando,

adivinhando, pensando, até que aprendem a ler. Ou não.

Diferentes teorias de aprendizagem se propõem a explicar como a criança aprende – por

associação (estímulo­resposta), pela ação do sujeito sobre o objeto do conhecimento

(construtivismo), pela interação do aprendiz com o objeto do conhecimento intermediado por

outros sujeitos (sociointeracionismo). Essas teorias, que assumiram a dianteira na formação de

professores em diferentes momentos históricos, embasam (ou condenam) certos métodos e

técnicas de alfabetização. Mas nem sempre explicam por que alguns alunos aprendem

rapidamente e outros não.

Tempo de ensinar a ler

Para a professora, a primeira turma de alfabetização é uma responsabilidade que

preocupa e assusta. Colegas de trabalho e famílias dos alunos estão atentos aos resultados.

Quem tem êxito constrói uma reputação valiosa. Quem fracassa, recebe no ano seguinte uma

turma mais fraca, de crianças mais pobres, repetentes, que não têm quem olhe por elas.

Por que muitas professoras consideram difícil ensinar a ler? Temos algumas hipóteses.

Page 59: Apostila Excelente de Alfabetizacao

59

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Alfabetizar uma turma de 28, 30 ou mais alunos é muito diferente de alfabetizar uma única

pessoa, em particular. Os ritmos de aprendizagem variam, as experiências anteriores dos alunos

com a leitura e a escrita também.

Crianças pequenas, especialmente as que não freqüentaram o jardim­de­infância, devem

assimilar normas escolares de conduta e aprender a viver em grupo. A turma tem vida social

intensa, alianças se formam e se desfazem, surgem afinidades e antipatias. Há conflitos e

disputas, a professora é ao mesmo tempo mediadora, juíza, apaziguadora, estimuladora,

autoridade responsável pela segurança física, animadora da aprendizagem, ombro amigo e, às

vezes, mãe substituta. Além disso, tem que ensinar a ler e escrever.

Do ponto de vista de quem está com a mão na massa, as relações interpessoais que se

estabelecem na classe – de harmonia e cooperação, ou de conflito – constituem uma

preocupação séria. Paralelamente, no mesmo nível de importância, há as questões didáticas:

Como alfabetizar? Como selecionar, organizar e transmitir os conteúdos?

As teorias educacionais e os métodos de alfabetização, ensinados nos cursos normais e

nas faculdades de educação, nem sempre respondem às questões cruciais da prática. O senso­

comum das professoras e a necessidade imediata de resolver os problemas do cotidiano levam­

nas a desconfiar da palavra dos teóricos e a valorizar a experiência de ensino. Mas quem ainda

não a tem, faz o quê?

A partir da década de 80, a divulgação do construtivismo tem ocupado lugar de destaque

nos cursos de formação inicial e continuada, e a questão metodológica tem sido erradamente

relegada a segundo plano.

Baseados no construtivismo de Jean Piaget, Emilia Ferreiro e seus colaboradores

forneceram uma excelente base teórica para a compreensão da maneira pela qual as crianças

aprendem a língua escrita (psicogênese da língua escrita), mas de fato não propuseram quaisquer

recomendações metodológicas, deixando esse assunto a cargo da didática da alfabetização.

Desse modo, os professores tiveram que se familiarizar com os fundamentos teóricos do

construtivismo e ao mesmo tempo tentar torná­los vivos e úteis para a prática. Muitos estão

perplexos diante desse desafio, pois o conhecimento do construtivismo como teoria exige tempo

de estudo, aprofundamento e reflexão, condições que faltam à maioria dos professores. Quanto à

transposição do construtivismo para a prática da sala de aula, tem sido geralmente limitada a três

ou quatro pontos: trabalhar com os nomes das crianças, ensinar o alfabeto associado a esses

nomes, ser mais tolerante com os erros dos aprendizes e classificar as crianças em fases:

silábica, silábico­alfabética ou alfabética. Isso é pouco para dar conta da tarefa da alfabetização.

Page 60: Apostila Excelente de Alfabetizacao

60

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Claro que a metodologia não é mais a questão central ou a mais importante na área da

alfabetização, mas quem se propõe a alfabetizar, baseado ou não no construtivismo, deve ter um

conhecimento básico sobre princípios teórico­metodológicos da alfabetização, para não ter que

inventar a roda. Já não se espera que um método milagroso seja plenamente eficaz para todos.

Tal receita não existe. A maioria das professoras experientes cria seu próprio caminho: a partir de

um método tradicional, adapta, cria recursos e inova a prática. Há lugar para invenção e a

criatividade, pois não são apenas as crianças que constroem conhecimento.

Destacamos a importância do domínio da prática, por meio da qual as professoras

modificam, enriquecem o que aprenderam no estudo teórico, valendo­se da experiência e da

observação.

Exercícios

1. Algumas teorias assumiram a dianteira na formação de professores em diferentes momentos históricos, quais são elas? a) Aprendizagem pela ação do sujeito sobre o objeto do conhecimento e aprendizagem por

associação. b) Aprendizagem pela interação do aprendiz com o objeto do conhecimento intermediado por

outros sujeitos e aprendizagem por associação. c) Aprendizagem por associação, aprendizagem pela ação do sujeito sobre o objeto do

conhecimento e aprendizagem pela interação do aprendiz com o objeto do conhecimento intermediado por outros sujeitos.

2. Assinale a falsa. Um conjunto de fatores escolares e extra­escolares são responsáveis pelo fracasso escolar, entre eles: a) turmas numerosas. b) jornada escolar insuficiente. c) despreparo dos (as) professores (as). d) métodos adequados e bem aplicados. e) material didático desinteressante; f) falta de bibliotecas e salas de leitura.

Respostas dos Exercícios

1. Algumas teorias assumiram a dianteira na formação de professores em diferentes momentos históricos, quais são elas? RESPOSTA CORRETA: C

2. Assinale a falsa. Um conjunto de fatores escolares e extra­escolares são responsáveis pelo fracasso escolar, entre eles: RESPOSTA CORRETA: D

Page 61: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 12 • SONS E LETRAS

Aquisição do valor sonoro convencional

Adquirir os valores sonoros convencionais é perceber a correspondência entre grafema e

fonema, isto é, apropriar­se do conhecimento de que existe uma relação entre o som /A/ e a letra

A, o som /B/ e a letra B, e assim por diante, com todas as letras, que naturalmente estão inseridas

em palavras, frases e textos.

Um dos pontos fundamentais em relação à aquisição dos valores sonoros convencionais é

a ordem de complexidade. Ela é crescente, não­linear, é parcial e com diversos ramos. Isso quer

dizer que a aquisição pode ocorrer em diferentes ordens e até simultaneamente, e não há

possibilidade de se controlar esse processo.

O fato de se organizar um processo apresentando as letras numa determinada ordem não

garante a aprendizagem nessa ordem. O professor pode ficar desenvolvendo durante um mês a

“família” ba­be­bi­bo­bu e as crianças podem estar adquirindo várias letras, inclusive o B com

outras letras, exceto o B propriamente.

A compreensão desse fato leva a uma mudança em relação à prática pedagógica. Se o

professor sabe que a organização e a seqüenciação do processo não levam à aprendizagem

nessa ordem, por que organizar e levar seis meses ou mais para regular a apresentação de todas

as letras para as crianças? Mais real é apresentar o alfabeto (campo de trabalho) e permitir que as

crianças adquiram na sua ordem natural e em muito menos tempo! Quando se desenvolve essa

prática, há a “liberação” da criança para reconstruir o sistema lingüístico no seu tempo e, na

maioria das vezes, esse tempo é pequeno em comparação com o método tradicional organizado.

Interessante ainda ressaltar é o fato de que, apesar do método tradicional organizado pelo

professor, grande parte dos alunos reorganiza e reconstroi o sistema lingüístico, mas não se

manifesta até ser liberados por seu professor. Um exemplo disso é um garoto que, diante de um

pote de geléia, leu “Cica”. Em seguida, disse: “Só que eu não posso ler, porque minha professora

disse que o “ci” eu ainda não aprendi”.

Page 62: Apostila Excelente de Alfabetizacao

62

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Realizando uma sondagem

As investigações sobre a psicogênese da língua escrita permitem ao professor atuar como

mediador no processo ensino­aprendizagem e fornecer pistas para o aprendiz tornar­se alfabético.

Atividade essencial, nesse processo, é a sondagem diagnóstica, que capacita o educador a

conhecer as hipóteses das crianças envolvidas no processo de alfabetização (pré­silábico,

intermediário I, silábico, silábico­alfabético e alfabético).

Para realizar a sondagem escolhem­se quatro palavras (uma polissílaba, uma trissílaba,

uma dissílaba e uma monossílaba, nessa ordem) e uma frase de um mesmo campo semântico

(mesmo assunto). Por exemplo: dinossauro, jacaré, gato e boi. O gato dormiu na sala. Pede­se,

então, para que as crianças escrevam do jeito que souberem.

O professor pode pedir às crianças que ao lado da palavra façam o desenho, que servirá

como índice para a leitura. Quando o professor encontra dificuldade para realizar a leitura da

escrita da criança, é importante pedir para que ela leia, apontando as letras e sinais

correspondentes à fala. Outro elemento importante que pode servir como sondagem é a escrita de

textos espontâneos (escrever uma história, como souber). Nesse caso, a análise da escrita pode

ser feita a partir dos seguintes parâmetros: não­alfabético, nível intermediário II e alfabético)

A partir do material investigado em uma sondagem, pode­se refletir sobre o pensamento

da criança e perceber sua hipótese lingüística. Isso permite a formação de grupos de trabalho

heterogêneos e propostas de atividades diversificadas, que objetivem a desestruturação da

hipótese que a criança tem a respeito da linguagem escrita, bem como a construção de uma nova

hipótese, culminando na reconstrução do código lingüístico.

Uma das formas de contribuir para esse trabalho é utilizar jogos. Jogando se aprende a

fazer de conta, representar uma coisa por outra, criar códigos, perceber as letras. Apreende­se o

valor sonoro convencional e reconstrói o código lingüístico.

Page 63: Apostila Excelente de Alfabetizacao

63

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Para que se lê?

A leitura e a escrita de textos funcionais, científicos e literários, a partir do conhecimento e

do domínio das propriedades específicas de cada um; a busca de coerência, interna e externa, de

coesão, de harmonia, de movimento e de estabelecimento de paralelos e de ligações, entre o real

e o imaginário, possível ou não, em suas produções escritas, são alguns pontos a ser construídos.

Viver em sociedade exige conhecer e utilizar­se de diferentes materiais impressos que

circulam ou que atropelam, visualmente, as pessoas: outdoor, propagandas, cartazes, panfletos, jornais, revistas, receituário médico, placas, anúncios, bilhetes, catálogo telefônico, circulares,

ofícios, requerimentos, cheques e muitos outros.

Permitir a exploração destes materiais (leitura e produção) significa partir da realidade dos

educandos, isto é, do que é cotidiano; significa, ainda, propiciar­lhes a oportunidade de ampliar e

aprimorar a sua competência lingüística, de se adaptar à sociedade.

As crianças, que vivem num ambiente estimulador, constantemente estão recebendo

informações sobre a função social da escrita.

• ampliar a memória; recordar aspectos e coisas que possam ser esquecidos (lista de

compras, agenda).

• encontrar informações urgentes (endereços, telefones...);

• comunicar­se à distância (bilhete, recado, carta...).

O texto técnico­informativo exige escritor e leitor interessados em determinado tema.

Permite o crescimento do indivíduo enquanto ser social e de cultura. Os textos científicos/

informativos possibilitam novas formas de pensamento; trazem novos conhecimentos, permitem

avanços científicos e a busca de soluções alternativas. São textos relacionados com o

conhecimento sistematizado já produzido pelo homem nos diferentes campos da ciência. Permite

acrescentar coisas ao que se sabe.

• Para sentir o texto, dialogar com seu autor ou, simplesmente, para usufruí­lo: sem

perguntas, sem questionamentos. É a leitura­prazer.

• Para buscar informações, coletar dados. É a leitura­pesquisa.

• Para ampliação dos conhecimentos – apossar­se do que já foi construído pela

humanidade.

• Para esclarecer dúvidas, buscar respostas. Pergunta­se ao texto.

Page 64: Apostila Excelente de Alfabetizacao

64

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

O terceiro tipo de texto inclui um outro aspecto do letramento, que é o prazeroso, o belo, o

estético da língua – a literatura.

Envolver­se com literatura é permitir­se conhecer outros padrões lingüísticos, enxergar o

mundo através de outros olhos e de pensamentos, os mais diversos. É apresentar estilos, o como

se utilizar da língua escrita, de forma viva, com muito movimento e harmonia. Permite viagens no

tempo – passado e futuro – envolvimento em idéias e acontecimentos de nossa própria escolha.

Buscam­se, em um texto, informações, reflexões, pretextos e prazer.

Exercícios

1. Para realizar uma sondagem, devemos escolher: a) quatro palavras e uma frase. b) seis palavras e duas frases. c) dez palavras.

2. Uma grande contribuição para o trabalho com a alfabetização é utilizar jogos. Jogando se aprende: a) a fazer de conta. b) a representar uma coisa por outra. c) a criar códigos. d) a perceber as letras. e) Todas estão corretas.

Respostas dos Exercícios

1. Para realizar uma sondagem, devemos escolher: RESPOSTA CORRETA: A

2. Uma grande contribuição para o trabalho com a alfabetização é utilizar jogos. Jogando se aprende: RESPOSTA CORRETA: E

Page 65: Apostila Excelente de Alfabetizacao

65

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 13 • RECEITA DE ALFABETIZAÇÃO E ALFABETIZAÇÃO SEM RECEITA

Quem se responsabiliza pelas crianças que estão na escola e não estão

aprendendo?

Vivemos um momento importante na educação brasileira, porque de mudança, e não sem

tempo. Hoje, os esforços de todos os bem­intencionados organizam­se da maneira que podem

para combater uma cultura que no último meio século dizimou milhões de crianças brasileiras: a

cultura da repetência. Mas enfrentamos, como em todos os grandes movimentos de mudança,

armadilhas que, se não forem percebidas, atrasarão o avanço que estamos tentando fazer em

direção a uma educação eficiente e de boa qualidade para todos.

Uma dessas armadilhas consiste em acreditar que, engajados na nova e boa palavra de

ordem – “o aluno não deve ser reprovado”, os professores passarão a aprová­lo, enviando­o para

a série seguinte munido de todas as competências necessárias para cursá­la com sucesso. Como

se até então não o fizessem simplesmente por descaso com seu próprio trabalho, ou por

acreditarem que professor bom é o que reprova.

Essa situação costuma ser mais dramática no contexto das primeiras séries do Ensino

Fundamental, que é quando são tomadas decisões de importância vital: se o aluno aprende a ler

e a escrever nos dois primeiros anos e será promovido, ou se ficará retido ali, ano após ano, até

desistir da escola; se, mesmo sem aprender, será promovido e engrossará o número dos que,

cada vez mais, chegam analfabetos à 4ª série; se, mesmo precariamente alfabetizados e sem

nenhuma competência para compreender textos mais complexos, classes inteiras de 4ª série

iniciarão o segmento da 5ª à 8ª séries para fracassar diante da necessidade de aprender por meio

da leitura.

Vemos, hoje, a enorme dificuldade que os professores têm de verificar o que os alunos já

sabem e o que não sabem. Há alunos que produzem escritas silábico­alfabéticas e alfabéticas na

1ª série, no início do ano, e que poderiam perfeitamente acompanhar uma 2ª série, pois podem ler

e escrever, ainda que com precariedade, mas ficam retidos porque os professores não tiveram

condições de avaliá­los adequadamente e acabaram utilizando indicadores como “letra bonita” ou

“caderno bem­feito”. Quando o professor trabalha com esse tipo de indicador, até mesmo avanços

na aprendizagem acabam prejudicando o aluno. Por exemplo, quando o aluno aprende a ler, é

comum que ele comece a “errar” na cópia. Isto é, deixa de copiar letra por letra e começa a ler e a

Page 66: Apostila Excelente de Alfabetizacao

66

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

escrever grandes blocos de palavras, em geral unidades de sentido, o que faz com que cometa

erros de ortografia ou escreva palavras grudadas. Tal fato, que é na verdade indicador de

progresso, acaba sendo interpretado como regressão, pois o professor não tem clara a diferença

entre copiar e escrever. Na nossa cultura, a produção de multirepetentes em massa decorre da

visão de que o aluno é sempre responsável por sua aprendizagem. Essa maneira de olhar para a

questão do fracasso escolar, embora não produza diretamente a repetência maciça, é certamente

responsável pela aceitação institucional do fenômeno, por sua naturalização. Tanto que, quando

se trata de crianças de apenas sete anos, consideradas jovens demais para tanta

responsabilidade, a suposta falta de empenho é transferida para a família.

A despeito de todas as boas intenções, o atual esforço de transformação da educação

brasileira será sugado pelo buraco negro da nossa incapacidade de alfabetizar os alunos no início

da escolaridade obrigatória (na verdade, o processo de alfabetização começa bem antes e

deveria estar presente na Educação Infantil, como costuma acontecer com os filhos da elite).

Prova disso é que, para desespero dos que sabem para onde isso sempre nos tem levado,

estamos assistindo à transformação da generosa idéia de progressão continuada nessa perversão

que está tornando­se conhecida como “promoção automática”.

Atualmente, com a progressão continuada, as classes continuam divididas entre “os que

vão” e “os que não vão”, mas com uma pequena diferença: antes eram os que “vão aprender e

passar de ano e os que não vão aprender nem passar de ano” e agora todos “passam de ano”,

porém só alguns “vão” aprender.

Receita de alfabetização

Pegue uma criança de 6 anos e lave­a bem. Enxágüe­a com cuidado, enrole­a num

uniforme e coloque­a sentadinha na sala de aula. Nas oito primeiras semanas, alimente­a com

exercícios de prontidão. Na 9ª semana ponha uma cartilha nas mãos da criança. Tome cuidado

para que ela não se contamine no contato com livros, jornais, revistas e outros perigosos materiais

impressos.

Abra a boca da criança e faça com que engula as vogais. Quando tiver digerido as vogais,

mande­a mastigar, uma a uma, as palavras da cartilha. Cada palavra deve ser mastigada, no

mínimo, 60 vezes, como na alimentação macrobiótica. Se houver dificuldade para engolir, separe

as palavras em pedacinhos.

Page 67: Apostila Excelente de Alfabetizacao

67

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Mantenha a criança em banho­maria durante quatro meses, fazendo exercícios de cópia.

Em seguida, faça com que a criança engula algumas frases inteiras. Mexa com cuidado para não

embolar.

Ao fim do oitavo mês, espete a criança com um palito, ou melhor, aplique uma prova de

leitura e verifique se ela devolve pelo menos 70% das palavras e frases engolidas. Se isso

acontecer, considere a criança alfabetizada. Enrole­a num bonito papel de presente e despache­a

para a série seguinte.

Se a criança não devolver o que lhe foi dado para engolir, recomece a receita desde o

início, isto é, volte aos exercícios de prontidão. Repita a receita tantas vezes forem necessárias.

Ao fim de três anos, embrulhe a criança em papel pardo e coloque um rótulo: aluno renitente.

Alfabetização sem receita

Pegue uma criança de 6 anos ou mais, no estado em que estiver, suja ou limpa, e coloque­

a numa sala de aula onde existam muitas coisas escritas para olhar e examinar. Servem jornais,

livros, revistas, embalagens, propaganda eleitoral, latas vazias, caixas de sabão, sacolas de

supermercado, enfim, vários tipos de materiais que estiverem ao seu alcance.

Converse com a turma, troque idéias sobre quem são vocês e as coisas de que gostam e

não gostam. Escreva no quadro algumas frases que foram ditas e leia­as em voz alta. Peça às

crianças que olhem os escritos que existem por aí, nas lojas, nos ônibus, nas ruas, na televisão.

Escreva algumas dessas coisas no quadro e leia­as para a turma.

Deixe as crianças cortarem letras, palavras e frases dos jornais velhos e não esqueça de

mandá­las limpar o chão depois, para não criar problema na escola.

Todos os dias leia em voz alta alguma coisa interessante: historinha, poesia, notícia de

jornal, anedota, letra de música, adivinhações.

Mostre alguns tipos de coisas escritas que elas talvez não conheçam: um catálogo

telefônico, um dicionário, um telegrama, uma carta, um bilhete, um livro de receitas de cozinha.

Desafie as crianças a pensar sobre a escrita e pense você também. Quando elas

estiverem escrevendo, deixe­as perguntar ou pedir ajuda ao colega. Não se apavore se uma

criança estiver comendo letra: até hoje não houve caso de indigestão alfabética. Acalme a diretora

se ela estiver alarmada.

Page 68: Apostila Excelente de Alfabetizacao

68

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Invente sua própria cartilha. Use sua capacidade de observação para verificar o que

funciona, qual o modo de ensinar que dá certo na sua turma. Leia e estude você também.

Obs.: Os textos “Receita de Alfabetização” e “Alfabetização sem receita” têm circulado em

cursos para professores, às vezes, sem indicação da autoria. Foram publicados: no Boletim

Informativo n.1, da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, jul/1989; pelo Boletim

Carpe Diem, Centro de Aperfeiçoamento dos Profissionais de Educação, Prefeitura de Belo

Horizonte, ano IV, n.4, jan­fev/1994.

Leia texto complementar disponível no ambiente de estudo.

Exercício

1. Segundo o texto “Alfabetização sem receita”, visto na aula, devemos: a) evitar que as crianças pensem sobre a escrita. b) evitar que as crianças perguntem ou peçam ajuda ao colega. c) como professores, também pensar sobre a escrita.

Resposta do Exercício

1. Segundo o texto “Alfabetização sem receita”, visto na aula, devemos: RESPOSTA CORRETA: C

Page 69: Apostila Excelente de Alfabetizacao

69

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 14 • ALFABETIZAÇÃO E ETRAMENTO

No início da década de 1980, os estudos acerca da psicogênese da língua escrita

trouxeram aos educadores o entendimento de que a alfabetização, longe de ser a apropriação de

um código, envolve um complexo processo de elaboração de hipóteses a respeito da

representação lingüística; os anos que seguiram, com a emergência dos estudos sobre o

letramento, foram igualmente férteis na compreensão da dimensão sociocultural da língua escrita

e seu aprendizado. Em estreita sintonia, ambos os movimentos, nas suas vertentes teórico­

conceituais, romperam definitivamente com a segregação dicotômica entre o sujeito que aprende

e o professor que ensina. Romperam também com o reducionismo que delimitava a sala de aula

como o único espaço de aprendizagem.

Reforçando os princípios antes propalados por Vygotsky e Piaget, a aprendizagem se

processa em uma relação interativa entre o sujeito e a cultura em que vive. Isso quer dizer que, ao

lado dos processos cognitivos de elaboração absolutamente pessoal (ninguém aprende pelo

outro), há um contexto que não só fornece informações específicas ao aprendiz, como também

motiva, dá sentido e “concretude” ao aprendizado, e ainda condiciona suas possibilidades efetivas

de aplicação e uso nas situações vividas. Entre o homem e os saberes próprios de sua cultura, há

que se valorizar os inúmeros agentes mediadores da aprendizagem (não só o professor, nem só a

escola, embora estes sejam agentes privilegiados pela sistemática pedagogicamente planejada,

objetivos e intencionalidade assumida).

A concepção de letramento contribuiu para redimensionar a compreensão que hoje temos

sobre:

a) as dimensões do aprender a ler e a escrever;

b) o desafio de ensinar a ler e a escrever;

c) o significado do aprender a ler e a escrever;

d) o quadro da sociedade leitora no Brasil;

e) as próprias perspectivas das pesquisas sobre letramento.

Page 70: Apostila Excelente de Alfabetizacao

70

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

As dimensões do aprender a ler e a escrever

Durante muito tempo a alfabetização foi entendida como mera sistematização do B+A =

BA, isto é, como a aquisição de um código fundado na relação entre fonemas e grafemas. Em

uma sociedade constituída em grande parte por analfabetos e marcada por reduzidas práticas de

leitura e escrita, a simples consciência fonológica que permitia aos sujeitos associar sons e letras

para produzir/ interpretar palavras (ou frases curtas) parecia ser suficiente para diferenciar o

alfabetizado do analfabeto.

Com o tempo, a superação do analfabetismo em massa e a crescente complexidade de

nossas sociedades fazem surgir maiores e mais variadas práticas de uso da língua escrita. Tão

fortes são os apelos que o mundo letrado exerce sobre as pessoas, que já não lhes basta a

capacidade de desenhar letras ou decifrar o código da leitura. Seguindo a mesma trajetória dos

países desenvolvidos, o final do século XX impôs a praticamente todos os povos a exigência da

língua escrita não mais como meta de conhecimento desejável, mas como verdadeira condição

para a sobrevivência e a conquista da cidadania. Foi no contexto das grandes transformações

culturais, sociais, políticas, econômicas e tecnológicas que o termo letramento surgiu, ampliando o sentido do que tradicionalmente se conhecia por “alfabetização”.

Hoje, tão importante quanto conhecer o funcionamento do sistema de escrita é poder se

engajar em práticas sociais letradas, respondendo aos inevitáveis apelos de uma cultura

grafocêntrica.

Mais do que expor a oposição entre os conceitos de “alfabetização” e “letramento”, Magda

Soares (In: Colello, 2004: 109­10) valoriza o impacto qualitativo que este conjunto de práticas

sociais representa para o sujeito, extrapolando a dimensão técnica e instrumental do puro domínio

do sistema de escrita: “alfabetização é o processo pelo qual se adquire o domínio de um código e

das habilidades de utilizá­lo para ler e escrever, ou seja: o domínio da tecnologia – do conjunto de

técnicas – para exercer a arte e ciência da escrita. Ao exercício efetivo e competente da

tecnologia da escrita denomina­se letramento, que implica habilidades várias, tais como:

capacidade de ler ou escrever para atingir diferentes objetivos.”

Por isso, aprender a ler e a escrever implica não apenas o conhecimento das letras e do

modo de decodificá­las (ou de associá­las), mas a possibilidade de usar esse conhecimento em

benefício de formas de expressão e comunicação, possíveis, reconhecidas, necessárias e

legítimas em um determinado contexto cultural.

Page 71: Apostila Excelente de Alfabetizacao

71

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

O desafio de ensinar a ler e a escrever

Na análise da questão em como conciliar duas vertentes da língua em um único sistema

de ensino, destacaremos dois embates: o conceitual e o ideológico.

1) O embate conceitual

Tendo em vista a independência e a interdependência entre alfabetização e letramento

(processos paralelos, simultâneos ou não, mas que indiscutivelmente se complementam), alguns

autores contestam a distinção de ambos os conceitos, defendendo um único e indissociável

processo de aprendizagem. Em uma concepção progressista de “alfabetização”, o processo de

alfabetização incorpora a experiência do letramento e este não passa de uma redundância em

função de como o ensino da língua escrita já é concebido.

É preciso conhecer o mérito teórico e conceitual de ambos os termos. Balizando o

movimento pendular das propostas pedagógicas (não raro transformadas em modismos banais e

mal assimiladas), a compreensão que hoje temos do fenômeno do letramento presta­se tanto para

banir definitivamente as práticas mecânicas de ensino instrumental, como para se repensar na

especificidade da alfabetização. Na ambivalência dessa revolução conceitual, encontra­se o

desafio dos educadores em face do ensino da língua escrita: o alfabetizar letrando.

2) O embate ideológico

Contagiada pela concepção de que o uso da escrita só é legítimo se atrelada ao padrão

elitista da “norma culta” e que esta, por sua vez, pressupõe a compreensão de um inflexível

funcionamento lingüístico, a escola tradicional sempre pautou o ensino pela progressão ordenada

de conhecimento: aprender a falar a língua dominante, assimilar as normas do sistema de escrita

para, um dia (talvez nunca), fazer uso desse sistema em formas de manifestação previsíveis e

valorizadas pela sociedade. Em síntese, uma prática reducionista pelo viés lingüístico, e

autoritária pelo significado político; uma metodologia etnocêntrica que, pela desconsideração do

aluno, mais se presta a alimentar o quadro do fracasso escolar.

Page 72: Apostila Excelente de Alfabetizacao

72

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

O significado do aprender a ler

Ao permitir que as pessoas cultivem os hábitos de leitura e escrita e respondam aos apelos

da cultura grafocêntrica, podendo inserir­se criticamente na sociedade, a aprendizagem da língua

escrita deixa de ser uma questão estritamente pedagógica para alçar­se à esfera política,

evidentemente pelo que representa o investimento na formação humana.

A história do ensino no Brasil, a despeito de eventuais boas intenções e das “ilhas de

excelência”, tem deixado rastros de um índice sempre inaceitável de analfabetismo agravado pelo

quadro nacional de baixo letramento.

O quadro da sociedade leitora no Brasil

Do mesmo modo como transformaram as concepções de língua escrita, redimensionaram

as diretrizes para a alfabetização e ampliaram a reflexão sobre o significado dessa aprendizagem,

os estudos sobre o letramento obrigam­nos a reconfigurar o quadro da sociedade leitora no Brasil.

Ao lado do índice nacional de 16.295.000 analfabetos no país (IBGE, 2003), importa considerar

um contingente de indivíduos que, embora formalmente alfabetizados, são incapazes de ler textos

longos, localizar ou relacionar suas informações.

Os motivos pelos quais tantos deixam de aprender a ler e a escrever

Se descartássemos as explicações mais simplistas que culpam o aluno pelo fracasso

escolar; se admitíssemos que os chamados “problemas de aprendizagem” se explicam muito mais

pelas relações estabelecidas na dinâmica da vida estudantil; se o desafio do ensino pudesse ser

enfrentado a partir da necessidade de compreender o aluno para com ele estabelecer uma

relação dialógica, significativa e compromissada com a construção do conhecimento; se as

práticas pedagógicas pudessem transformar as iniciativas meramente instrucionais em

intervenções educativas; se tudo isso ocorresse, talvez fosse possível compreender melhor o

significado e a verdadeira extensão da não aprendizagem e do quadro de analfabetismo no Brasil.

Do ponto de vista dos alunos, o repúdio à tarefa, à escola e muito provavelmente à escrita

foi uma reação contra a implícita proposta de fazer parte de um mundo ao qual nem todos podem

ter livre acesso: o mundo da medicina, da possibilidade de ser acompanhado por um médico e da

compra de remédios.

Page 73: Apostila Excelente de Alfabetizacao

73

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

A desconsideração dos significados implícitos do processo de alfabetização – o longo e

difícil caminho que o sujeito pouco letrado tem a percorrer, a reação dele em face da artificialidade

das práticas pedagógicas e a negação do mundo letrado – acaba por expulsar o aluno da escola,

um destino cruel, mas evitável se o professor souber instituir em classe uma interação capaz de

mediar as tensões, negociar significados e construir novos contextos de inserção social.

Perspectivas das pesquisas sobre letramento

Embora o termo letramento remeta a uma dimensão complexa e plural das práticas

sociais de uso da escrita, a apreensão de uma dada realidade, seja ela de um determinado grupo

social ou de um campo específico de conhecimento motivou a emergência de inúmeros estudos a

respeito de suas especificidades. É por isso que, nos meios educacionais e acadêmicos, vemos

surgir a referência no plural “letramentos”.

Embora ainda não dicionarizado, o termo “letramento” foi usado pela 1ª vez por Mary

Kato, em 1986, na obra No mundo da escrita: uma perspectiva psicolingüística

(São Paulo, Ática). Dois anos depois, passa a representar um referencial no discurso da

educação, ao ser definido por Tfouni em Adultos não alfabetizados: o avesso do

avesso (São Paulo, Pontes) e retomado em publicações posteriores.

No embate conceitual, a evidência desse paralelismo, é possível porque podemos ter

casos de pessoas letradas e não alfabetizadas (indivíduos que, mesmo incapazes de ler

e escrever, compreendem os papéis sociais da escrita, distinguem gêneros ou

reconhecem as diferenças entre a língua escrita e a oralidade) ou pessoas alfabetizadas

e pouco letradas (aqueles que, mesmo dominando o sistema da escrita, pouco

vislumbram suas possibilidades de uso).

Em uma sociedade como a nossa, o mais comum é que a alfabetização seja

desencadeada por eventos de letramento, tais como ouvir histórias, observar cartazes,

conviver com práticas de troca de correspondência, etc. No entanto, é possível que

indivíduos com baixo nível de letramento (não raro membros de comunidades

analfabetas ou provenientes de meios com reduzidas práticas de leitura e escrita) só

tenham a oportunidade de vivenciar tais eventos na ocasião de ingresso na escola, com

o início do processo formal de alfabetização.

Page 74: Apostila Excelente de Alfabetizacao

74

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Exercícios

1. Assinale a incorreta. Alfabetização é: a) um processo ilimitado no tempo, no conteúdo e nos objetivos. b) a ação de ensinar o código alfabético. c) as relações entre letras e sons.

2. Assinale a incorreta: A chegada da palavra “letramento” surgiu para: a) nomear um novo fenômeno. b) designar uma nova percepção. c) designar uma nova compreensão de um processo.

Respostas dos Exercícios

1. Segundo o texto “Alfabetização sem receita”, visto na aula, devemos: RESPOSTA CORRETA: A

2. Assinale a incorreta: RESPOSTA CORRETA: A

Page 75: Apostila Excelente de Alfabetizacao

75

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 15 • MÉTODOS SINTÉTICOS: DA SOLETRAÇÃO À CONSCIÊNCIA FONOLÓGICA

Juntando as letras: soletração

A Carta do ABC (sem indicação de autor ou data): o livrinho apresenta primeiro os

alfabetos de letras maiúsculas e minúsculas de imprensa e de letras cursivas. A idéia é ensinar os

três tipos mais comuns de sílabas existentes em português, como consoante­vogal (ba, na, ma), vogal­consoante (al, ar, na), consoante­consoante­vogal (fla, bla, tra).

O objetivo maior da soletração é ensinar a combinatória de letras e sons, partindo de

unidades simples, as letras, o professor tenta mostrar que essas, quando se juntam, representam

sons, as sílabas, que por sua vez formam palavras.

O método baseia­se na associação de estímulos visuais e auditivos, valendo­se apenas da

memorização como recurso didático – o nome da letra é associado à forma visual, as sílabas são

aprendidas de cor, e com elas se formam palavras isoladas fora do contexto.

Quanto daria por um daqueles duros bancos onde me sentava, nas mãos a Carta do ABC, a cartilha de soletrar, separar vogais e consoantes. Repassar folha por folha, gaguejando as lições num aprendizado demorado e tardio. Afinal vencer e mudar de livro.

Excerto do poema Voltei de Cora Coralina (2001), poeta goiana, nascida em 1889.

Ba­be­bi­bo­bu: silabação

O método tem os mesmos defeitos da soletração: ênfase excessiva nos mecanismos de

codificação e decodificação, apelo excessivo à memória e não à compreensão, pouca capacidade

de motivar os alunos para a leitura e a escrita.

Cartilha da Infância (Thomaz Galhardo, 1979): depois de mostrar as vogais e os ditongos,

apresenta as sílabas va­ve­vi­vo­vu, embaralhando­as nas duas linhas seguintes. Seguem­se palavras formadas de três letras (vai­viu­vou) e finalmente onze vocábulos contendo as sílabas

estudadas; cada lição se completa com algumas frases sem ligação entre si, escritas sem a

Page 76: Apostila Excelente de Alfabetizacao

76

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

maiúscula na palavra inicial e sem pontuação: “vo­vó viu a a­ve”, “a a­ve vi­ve e vo­a”, “vo­vô vê o

o­vo” e outras do gênero.

A ordem de apresentação: primeiro, as cinco letras que representam as vogais, depois os

ditongos, em seguida as sílabas formadas com as letras v, p, b, f, d, t, l, j, m, n. As chamadas “dificuldades ortográficas” aparecem do meio para o fim da cartilha, incluindo os dígrafos, as

sílabas travadas (terminadas por consoantes), as letras g, c, z, s, e x.

Métodos fônicos

Ensina­se o aluno a produzir oralmente os sons representados pelas letras e a uni­los para

formar as palavras. Parte­se de palavras curtas, formadas por apenas dois sons representados

por duas letras, para depois estudar de três letras ou mais. A ênfase é ensinar a decodificar os

sons da língua, na leitura, e a codificá­la, na escrita.

Atualmente, os métodos fônicos tendem a apresentar pequenas frases, a partir da 2ª ou 3ª

folha, para que os alunos desenvolvam gradativamente habilidades de leitura mais complexas.

Este recurso visa a habituar o aluno a extrair o conteúdo significativo da palavra lida e superar

uma deficiência ainda comum no método (Rizzo apud Carvalho, 2005: 25).

Método da Abelhinha (Alzira S. Brasil, Lúcia Marques Pinheiro e Risoleta Ferreira

Cardoso criaram o método em 1965): apresenta o método misto do tipo fonético.

Os sons são apresentados como "barulhos" que ocorrem, o mesmo acontecendo com a

reunião de dois sons em sílabas. Da reunião de dois sons, a criança passa a três, e vai lendo

palavras cada vez mais extensas; depois expressões, sentenças e historinhas.

Duas recomendações das autoras: não dizer o nome das letras, pois seria cair na

soletração; e não fazer a união de fonemas com todas as vogais, pois seria a silabação,

prejudicando a leitura mais tarde.

A personagem abelhinha, que dá nome ao método, tem o corpo em forma de um a (em letra cursiva) e apresenta o som /aaaaaaa/ (a vogal é prolongada para facilitar o reconhecimento);

a letra i é representada pelo tronco de um índio, outro personagem de histórias e assim por diante. Os personagens são desenhados para sugerir o todo ou partes das formas estilizadas das letras.

Há portanto uma associação de três elementos – personagem – forma da letra – som da letra

(fonema). A alfabetização se faz por síntese ou fusão dos sons para formar a palavra.

Page 77: Apostila Excelente de Alfabetizacao

77

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

A Casinha Feliz (criado pela pedagoga Iracema Meireles na década de 1950): acredita na

aprendizagem por meio do jogo, propondo que a sala de aula fosse um espaço para a criatividade

e a livre expressão das crianças.

Método: associar a forma da letra a um personagem, o qual, por sua vez, representava

determinado som. O essencial é que conduza à figura­fonema capaz de fazer sempre, se for

consoante, o imprescindível barulhinho. Tudo mais é jogo, é dramatização, atividade criadora.

Cuidados a considerar na aplicação dos métodos fônicos

Os dois métodos apresentados propõem associações visuais e auditivas com a forma e os

sons das letras e têm o mérito de recomendar a utilização e recursos expressivos de voz,

gesticulação, desenho, teatro, etc. para despertar o interesse infantil. Ambos giram em torno de

histórias contadas oralmente e o material escrito é rigorosamente controlado para apresentar

apenas as palavras cuja decodificação já foi, ou está sendo, ensinada.

Um aspecto discutível dos métodos é que as histórias dos manuais, criadas com o objetivo

de apresentar as relações letra­som numa determinada seqüência, são muito artificiais. É preciso

professores experientes, com bons recursos narrativos, para dar vida a histórias didáticas, em que

os sons ora são associados à forma das letras, ora aos nomes dos personagens, ora a um

“barulhinho” produzido por eles.

Na aplicação dos métodos fônicos, a maior dificuldade técnica é tentar articular os sons

das consoantes isoladas, pois de fato elas só ganham sons quando estão acompanhadas de uma

vogal. Existem algumas consoantes, como o /f/ e o /v/, que podem ser prolongadas com certa

facilidade, dando a impressão que se fundem com as vogais que as acompanham. Mas não é o

caso da maioria das outras que só são ouvidas claramente quando acompanhadas das vogais.

Consciência fonológica: é a capacidade de distinguir e manipular os sons constitutivos

da língua e consiste na capacidade para focalizar os sons da fala, independentemente do sentido.

Para reconhecer o grau de consciência fonológica da criança, alguns indicadores são a habilidade

de identificar o número de sílabas das palavras e de reconhecer rimas e aliterações (sílabas que

se repetem no início de uma série de palavras). Cada palavra falada é formada por uma série de

fonemas, representados na escrita pelas letras do alfabeto e a percepção destes é desenvolvida

no processo de alfabetização.

Page 78: Apostila Excelente de Alfabetizacao

78

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Exercícios

1. O método utilizado na Cartilha da Infância (GALHARDO, 1979), tem os mesmos defeitos da soletração porque: a) dá ênfase excessiva nos mecanismos de codificação e decodificação. b) traz um apelo excessivo à memória e não à compreensão. c) há pouca capacidade de motivar os alunos para a leitura e para a escrita. d) todas estão corretas.

2. O Método da Abelhinha (SILVA, PINHEIRO e CARDOSO, 1965) apresenta uma série de histórias cujos personagens estão associados a letras e sons. Portanto, uma associação de três elementos: a) sílabas – palavras – frases b) personagem – palavras – frases c) personagem – forma da letra – som da letra

Respostas dos Exercícios

1. O método utilizado na Cartilha da Infância (GALHARDO, 1979), tem os mesmos defeitos da soletração porque: RESPOSTA CORRETA: D

2. O Método da Abelhinha (SILVA, PINHEIRO e CARDOSO, 1965) apresenta uma série de histórias cujos personagens estão associados a letras e sons. Portanto, uma associação de três elementos: RESPOSTA CORRETA: C

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 16 • AS CARTILHAS E A ALFABETIZAÇÃO

Métodos globais: aprender a ler a partir de histórias ou orações

Conhecer e respeitar as necessidades e interesses da criança; partir da realidade do aluno

e estabelecer relações entre a escola e a vida social são diretrizes do pensamento escolanovista.

Métodos ativos – aprender fazendo –, liberdade para criar e participação da criança no

planejamento do ensino são algumas das estratégias recomendadas.

A Escola Nova valorizava a leitura, as bibliotecas, o gosto pelos livros, e trouxe uma

inovação importante para os alfabetizadores: a defesa dos métodos globais com a fundamentação

teórica da crença segundo a qual a criança tem uma visão sincrética (ou globalizada) da

realidade, ou seja, tende a perceber o todo, o conjunto, antes de captar os detalhes.

Decroly (1929) enfatizava a compreensão do significado desde a etapa inicial da

alfabetização e não a capacidade de decodificar ou de dizer o texto em voz alta. A alfabetização

deveria começar por unidades amplas, como histórias ou frases, para chegar em nível de letra e

de som, mas sem perder de vista o texto original e seu significado.

Método de contos

Um dos métodos mais antigos – o de contos – começou a ser aplicado nos Estados Unidos

no fim do século XIX. Consiste em iniciar o ensino da leitura a partir de pequenas histórias,

adaptadas ou especialmente criadas pelo professor. Apresentada a história completa, o texto é

desmembrado em frases ou orações, que a criança aprende a reconhecer globalmente e a repetir,

numa espécie de pré­leitura. A seguir, vem a etapa de reconhecimento das palavras. Depois disso

é que se alcança a etapa de divisão das palavras em sílabas e finalmente a composição de novas

palavras com as sílabas estudadas.

O processo envolve análise das partes maiores (o texto, as frases) para chegar às partes

menores (palavras, sílabas), por isso o método global é também chamado analítico.

A professora Lúcia Casasanta (apud Carvalho, 2005) assim descreveu as etapas do

método:

1) fase do conto;

Page 80: Apostila Excelente de Alfabetizacao

80

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

2) fase da sentenciação;

3) fase das porções de sentido;

4) fase da palavração;

5) fase da silabação ou dos elementos fônicos.

O método não previa a utilização de livro didático, o que constituía uma dificuldade para os

professores, que deviam criar textos e preparar materiais didáticos.

Método ideovisual de Decroly

Um dos mais conhecidos métodos globais, o ideovisual, foi criado no início do século XX

por Ovide Decroly (1871­1932). As bases de sua filosofia de educação eram: respeito à

personalidade da criança, a seus interesses, a seu ritmo natural e modos peculiares de ver o

mundo. Pregava a importância da atividade, da ação e da cooperação.

Decroly propôs que o ensino se desenvolvesse por centros de interesse e, em princípio, o

programa escolar deveria incluir conhecimentos imediatamente ligados à criança: suas

necessidades básicas no meio em que vive.

Experimentou um método de aprendizagem de leitura que punha em jogo o que chamava

“função de globalização”. Função que explicava a capacidade da criança de captar as formas

globalmente, justificaria começar a aprendizagem por frases (unidades de sentido) em lugar de

letras (elementos gráficos isolados sem significação).

Seu método: o aluno reconhecia a forma, o desenho total, a imagem gráfica da frase. Em

seguida, aprendia a distinguir as palavras, por meio da observação de semelhanças e diferenças

entre elas; em seguida as sílabas, depois as letras.

Método Natural Freinet

Célestin Freinet (1896­1966) acreditava que a inteligência, o gesto, a sensibilidade

desenvolvem­se através da livre expressão, do trabalho manual, da experimentação. Sua

pedagogia consiste em estimular a reflexão, a criatividade, o trabalho, a cooperação e a

solidariedade.

Page 81: Apostila Excelente de Alfabetizacao

81

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Seu Método Natural de aprendizagem da língua parte do pressuposto que: a criança lerá e

escreverá com interesse textos relacionados com suas experiências. Dessa forma, seu método

natural não comporta fases ou etapas, como acontece com outras propostas, a criança aprende a

ler lendo, a escrever, escrevendo.

Para ele a escrita e a leitura têm um significado social, existem para servir ao homem em

suas lutas, no seu trabalho, na expressão de suas idéias. Em lugar de atividades puramente

formais, propunha que os alunos, desde tenra idade, escrevessem e lessem para ser

compreendidos e para entrar em relação com os outros.

A metodologia de base lingüística ou psicolingüística

A chamada Metodologia de base lingüística propõe ensinar a ler a partir de orações. Foi

elaborado na década de 1970 por um grupo de professores coordenado pela professora Helena

Gryner.

As premissas do método são: respeitar a fase de desenvolvimento cognitivo e afetivo em

que a criança se encontra e tornar o aluno sujeito do processo, cabendo sempre a ele a iniciativa

e a descoberta. O processo de alfabetização deve começar pela produção e reconhecimento de

frases sugeridas pelas próprias crianças.

Para dar início à alfabetização propriamente dita, a professora escolhe uma ou duas

orações produzidas pelas crianças, que devem conter palavras cuidadosamente escolhidas para

atender a três critérios:

1) Critério de dificuldade: começar pelo mais fácil em matéria de relações letra­som e de

padrões silábicos. As primeiras palavras­chave apresentadas devem ser formadas de

fonemas como /b/, /p/, /d/, /v/ e /f/, representados pelas letras b, p, d, v e f, que têm o

mesmo som, independentemente da posição na palavra. São os casos em que há uma

relação biunívoca entre os fonemas e os grafemas. Quanto ao tipo de sílaba, o mais

fácil é o mais comum, ou seja, consoante­vogal (como em pa, da, va, etc.); padrões silábicos mais complexos virão pouco a pouco.

2) Critério de alternância entre o fácil e o difícil: o método recomenda que não se deixe

para a etapa final do processo de alfabetização as chamadas dificuldades ortográficas.

As letras que podem representar mais um som, conforme o contexto – como s, m, l, x e outras – devem ser alternadas com aquelas consideradas mais fáceis.

Page 82: Apostila Excelente de Alfabetizacao

82

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

3) Critério de produtividade: selecionar palavras­chave que depois de desmembradas em

sílabas permitam formar um bom número de palavras novas.

Alfabetização a partir de palavras­chave

O método da palavração propõe o ensino das primeiras letras a partir de palavras­chave,

destacadas de uma frase ou texto mais extenso. As palavras destacadas são desmembradas em

sílabas, as quais, recombinadas entre si, formam novos vocábulos.

Método Natural de Heloísa Marinho

Apóia­se em Jonh Dewey, Decroly e outros escolanovistas que ressaltam a importância da

atividade da criança no processo de ensino­aprendizagem. Os passos de aplicação são os

seguintes:

1) A professora usa abundantemente a escrita. Registra, à vista dos alunos, fatos ocorridos

na sala de aula, ou algo dito pelas crianças. Escreve bilhetes, convites, avisos

destinados aos pais.

2) Estimula a percepção dos sons iniciais e finais de palavras ditas oralmente, utilizando

técnicas e materiais que permitam descobrir semelhanças e diferenças entre sons,

através da comparação.

3) Forma um vocabulário básico de 35 a 40 palavras (apenas substantivos e verbos) que a

criança deve aprender a reconhecer globalmente, em sentenças e pequenos textos,

qualquer que seja sua posição nos textos.

4) Leva a criança a descobrir o som dentro da palavra e a associar o som à letra.

5) Estimula a criança a ler e a escrever palavras novas com compreensão e rapidez,

incentiva a leitura como fonte de informação e de prazer, e a escrita como instrumento

de registro de idéias e de comunicação.

Método Paulo Freire

A metodologia proposta por Paulo Freire também se classifica como palavração, com a

importante diferença de que as palavras geradoras (palavras­chave) apresentadas aos adultos

Page 83: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

analfabetos são pesquisadas no universo vocabular deles próprios. Os procedimentos técnicos do

método são:

1) Ao planejar um trabalho de alfabetização em determinada área, deve­se fazer um

levantamento do universo vocabular da população, selecionando um grupo de 17 a 20

palavras de uso freqüente, relevantes para a população e que apresentam as

combinações básicas dos fonemas e padrões silábicos. São estas as palavras

geradoras, que constituirão pontos de partida dos debates entre os participantes dos

círculos de cultura.

2) Para dar início à alfabetização, o coordenador do círculo de cultura deve apresentar

algumas imagens (em slides ou cartazes) que propiciem o debate sobre as noções de

cultura e de trabalho. Estas imagens representam o produto do trabalho dos homens

sobre a matéria da natureza: suas ferramentas, utensílios de uso diário, suas moradias.

O objetivo é fazer com que os alunos reconheçam a si próprios como criadores de

cultura.

3) Para ensinar as relações entre letras e sons, o ponto de partida é a palavra geradora,

que é decomposta em sílabas. Em seguida, apresenta­se a ficha descoberta, em que

aparecem as famílias silábicas correspondentes.

Para a professora, seja qual for o método escolhido, o conhecimento das suas bases

teóricas é condição essencial, importantíssima, mas não suficiente. A boa aplicação técnica de um

método exige prática, tempo e atenção para observar as reações das crianças, registrar os

resultados, ver o que acontece no dia­a­dia e procurar solução para os problemas dos alunos que

não acompanham.

Além de conhecer o método em si, é preciso que o professor se pergunte:

• O que realmente tenho em vista ao ensinar a ler? O que estou buscando? Que usos da

leitura e da escrita pretendo que o aluno venha a praticar? De que materiais disponho ou

estou disposto a criar? Como as crianças se relacionam com a escrita, o que sabem

sobre o assunto? Como eu próprio me relaciono com a leitura, a escrita e o método?

Exercícios

1. Assinale a falsa sobre os passos de aplicação do Método Natural de Heloísa Marinho. a) A professora usa muito pouco a escrita.

Page 84: Apostila Excelente de Alfabetizacao

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

b) Estimular a percepção dos sons iniciais e finais das palavras. c) Formar um vocabulário básico de 35 a 40 palavras. d) Levar a criança a descobrir o som dentro da palavra e a associar o som à letra. e) Estimular a criança a ler e a escrever palavras novas.

2. A metodologia proposta por Paulo Freire se classifica como: a) soletração. b) silabação. c) Palavração. d) Setenciação.

Respostas dos Exercícios

1. Assinale a falsa sobre os passos de aplicação do Método Natural de Heloísa Marinho. RESPOSTA CORRETA: A

2. A metodologia proposta por Paulo Freire se classifica como: RESPOSTA CORRETA: C

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 17 • PRODUÇÃO DE TEXTO

Produzir é realizar, criar, fabricar; texto é um desenho, uma palavra, uma frase ou um

conjunto delas que, dentro de um contexto, transmite um significado ou uma idéia. Produzir textos

é inerente à criança. Antes mesmo de conhecer letras, ela conta um fato, descreve um passeio,

dita regras de uma brincadeira, entre outras coisas. Em sua rotina diária, ela produz texto oral.

Seu mundo é um emaranhado de palavras que aqueles que a cercam conseguem

entender apenas porque “ela se faz entender”. Existe um diálogo natural que se manifesta, por

exemplo, quando a mãe, por não entender o que a criança diz, pede que ela repita ou mostre,

tendo em vista auxiliar o filho.

Entretanto, na escola, a criança precisa obedecer a regras de espaço, seqüência e lógica,

aliadas às regras ortográficas e gramaticais não definidas para ela. Algumas vezes, o aluno não

escreve porque não sabe o quê ou sobre o quê quer escrever, ou porque não está motivado,

independentemente de saber escrever ou não; outras vezes, ele escreve apenas para satisfazer

uma exigência do professor. Assim, a criança se nega a produzir ou não se esforça muito para

isso. E, então, começa o bloqueio: escreve pouco ou não escreve.

A criança passa por fases na produção, todas igualmente importantes para ela, e o

professor deve requerer essas produções de maneira gradativa no que se refere à dificuldade de

execução, ou seja, para chegar a elaborar um texto individualmente, com forma e conteúdo

próprios, a criança precisa, antes, trabalhar textos coletivamente ou em pequenos grupos, sob a

orientação do professor, com base em modelos de escrita corretos e variados quanto à forma

(poesia, contos, música, trava­língua, etc.).

Sem dúvida, é muito mais gratificante ler um texto que se desenvolve dentro dos padrões

convencionais da ortografia, mas isso não deve ser a primeira e a principal preocupação, porque a

escrita considerada correta, nos padrões da norma culta, não está pautada na oralidade, e apenas

com o “exercício” o aluno poderá perceber isso e se corrigir.

A criança precisa ser incentivada a soltar­se para escrever, a revelar seu interior, a

transcrever suas experiências, a relatar fatos do seu mundo sem ter que se preocupar com

correções, riscos vermelhos e notas baixas: simplesmente escrever o que lhe dá maior prazer e

saber que, com isso, está se comunicando.

Page 86: Apostila Excelente de Alfabetizacao

86

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Seja qual for a reação do professor ao ler um texto, o importante é que ele tente “traduzir”

o que o aluno quis transmitir. Se não conseguir entender, o professor deve pedir que a criança

faça a “leitura”.

Atualmente, existe uma preocupação maior com a produção de textos desde os primeiros

anos de escolaridade e, depois de observar nossos alunos, podemos concluir que a criança pode

escrever um texto desde o primeiro dia de aula. Em geral, não é muito fácil o entendimento

desses textos iniciais por parte do professor, e para que isso não aconteça, para que o aluno

tenha retorno do seu trabalho, é preciso conversar com a criança sobre o que ela escreveu.

Não é preciso fechar famílias silábicas nem desenvolver regras gramaticais antes da

produção. A criança deve escrever da maneira como entende que seja a escrita e, aos poucos, ao

ser desenvolvidos os conteúdos, ela mesma se corrigirá ou, se um determinado erro persistir,

deverá ser direcionado à correção.

Os alunos se interessam mais por uma informação e a retêm melhor se ela fizer parte de

um todo: eles vivem o momento tão intensamente que tudo o que é retirado de um assunto

central, com significado para eles, fará parte deste momento tão bem vivenciado.

Portanto, não têm sentido atividades como trabalhar com listas infindáveis de palavras com

mesma dificuldade gramatical, trabalhar páginas inteiras de treinos ortográficos, separar sílabas

de dezenas de palavras com dígrafos e fazer cópias quilométricas. Uma atividade muito longa e

repetitiva cansa, desanima, desestimula e desinteressa. Palavras soltas, sem significado e sem

adequação imediata perdem­se no espaço do papel, desaparecem sob a vista com a mesma

rapidez com que foram escritas.

É comum ouvir de professores que certo aluno, depois de tanto treino e exercício, ainda

escreveu errado determinada palavra. Treinou como? Para quê?

Todo e qualquer conteúdo sobre questões gramaticais deve ser extraído de um contexto,

de um assunto de interesse comum para que se torne significativo, interessante e objetivo, e o

aluno tem, no mínimo, os oito anos do Nível I para entender essas questões de maneira ampla.

Tratando­se de produção de texto, o mecanismo é mais ou menos o mesmo. Diante da

proposta do professor é imprescindível que o aluno entenda os objetivos e queira participar da

atividade. Ele se coloca perguntas do tipo: O que escrever? Como? Para quê? Para quem?

Vários assuntos que podem dar margem à produção aparecem, simplesmente, na rotina

diária: um aluno que se machucou, um dente de leite que caiu, alguém que fez uma visita à

classe, uma excursão ou um passeio que os alunos fizeram no fim­de­semana, um capítulo de

Page 87: Apostila Excelente de Alfabetizacao

87

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

novela que alguém assistiu, etc. Mas, apesar da variedade dos temas, às vezes estes não se

aproximam da expectativa do professor e os alunos não atingem o objetivo específico que ele

queria atingir.

Nessas ocasiões, as crianças precisam de um estímulo, envolvendo­as de tal maneira que

o registro, a produção escrita e/ ou a manifestação gráfica sobre determinado assunto da

expectativa do professor sejam considerados importantes, cabendo ao professor direcionar a

expressão oral.

Com jogos, músicas, adivinhações, brincadeiras de roda, trabalhos artísticos, história,

parlendas, poesias, etc. o professor pode, e na maioria das vezes consegue, levar as crianças à

escolha do tema.

Sugestões para produção

A produção de texto não deve ser trabalhada isoladamente; pelo contrário, devem­se

aproveitar o assunto, o tema ou a palavra que estão sendo trabalhados para intercalar a

produção. Sob esse ponto de vista, a produção de texto é apenas mais uma atividade a ser

executada pelos alunos.

A seguir, algumas idéias de atividades de produção de texto para ser desenvolvidas com

os alunos. Como todas as outras sugestões, essas também não são rígidas: fica a critério do

professor adaptá­las, de acordo com o nível em que se encontram os alunos. Sugerimos, também,

que as produções sejam arquivadas em um caderno específico, de maneira que o progresso do

aluno possa ser percebido e avaliado com maior segurança pelo professor.

• Escrever seu nome e desenhar você mesmo.

• Desenhar o pai ou a mãe e escrever “meu Pai” ou “minha Mãe”, de acordo com o

desenho.

• Desenhar sua casa, sua família e escrever os nomes.

• Desenhar seus amigos e escrever seus nomes.

• Desenhar seus brinquedos e escrever seus nomes.

• Escrever a respeito do brinquedo ou da brincadeira de que mais gosta.

• Escrever sobre seu animal preferido e depois fazer o desenho.

• Fazer o desenho de um animal de que tem medo e escrever sobre ele.

Page 88: Apostila Excelente de Alfabetizacao

88

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

• Desenhar sua classe e seus colegas e escrever sobre eles.

• Fazer um desenho com base numa história contada e copiar o título.

• Depois de ouvir uma história, fazer o desenho e escrever o que quiser sobre ela.

• Escrever o que quiser sobre uma data comemorativa.

• Montar personagens com material de sucata e, em grupo, produzir uma história oral.

Desenhar os personagens utilizando sucata e transcrever a história.

• Fazer uma história tomando por base um Banco de Palavras. A classe decide sobre o

que vai escrever e sugere as palavras que entrarão na história; o professor escreve­as

num papel manilha ou na lousa para que as crianças possam recorrer a elas durante a

produção.

• Recortar letras de jornais e revistas; montar seu nome e escrever uma frase ou texto.

• Recortar letras e formar palavras. Em seguida, fazer um desenho e escrever uma frase

ou um texto que se refira à palavra formada.

• Escrever sobre um fato da atualidade (ecológico, social, político, policial, etc.). O

professor pode aproveitar uma notícia de jornal ou uma pergunta de um aluno para

propor o tema.

• Depois de assistir a um filme em vídeo, escrever a história.

• Escrever sobre “o que gostaria de ser quando crescer” e desenhar.

• Escolher uma figura, recortar e colar em uma folha. Em seguida, escrever sobre ela.

• Fazer uma montagem e escrever sobre ela.

• Escrever sobre uma figura: o professor recorta uma parte de uma figura de objeto,

animal, alimento ou brinquedo e cola em folha de linguagem. O aluno deve identificar a

figura (distinção parte/todo) e escrever sobre a parte ou sobre o todo.

• Escrever sobre um assunto de Ciências e Saúde e montar um livrinho. O professor

promove e coordena uma discussão sobre o tema. Em seguida, as crianças fazem um

texto coletivo e o transcrevem para o livro, onde fazem as ilustrações. Ao terminar, cada

criança terá o seu livro.

• Fazer um livro sobre o arco­íris: cada folha terá uma cor pintada ou um recorte colorido

de tecido, papel, plástico, etc. O aluno escreve o nome da cor e o que ela significa para

ele.

Page 89: Apostila Excelente de Alfabetizacao

89

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

• Fazer o Jornal da Classe. Cada aluno faz um trabalho que pode ser produção,

cruzadinha, adivinhações, receita, desenho para ser pintado, desenho para ligar os

pontos, etc. Sob a orientação do professor, eles selecionam os trabalhos e montam o

jornalzinho. Cada aluno transcreve seu trabalho para a folha de estêncil e assina. O

professor também pode contribuir com alguma atividade. Com o tempo, o jornal poderá

ser feito em nível de ano, período ou escola.

• Escrever um livro. O professor dobra as folhas de papel sulfite no meio, formando o livro

e grampeia. Cada aluno escreve uma história e transcreve cada frase em uma página,

faz os desenhos, elabora a capa, escreve o título e assina.

• Fazer um desenho com bolinhas de papel de seda e escrever sobre ele.

• Contar um sonho que teve e escrever sobre ele.

• Escrever sobre uma experiência vivenciada. Por exemplo, um passeio à feira, ao

zoológico, etc.

• Escrever sobre um animal que foi trazido para a classe. Um aluno, ou alguém da escola,

traz, escondido, um animal (ou foto dele) e não diz qual é. As crianças conversam com o

dono para saber os hábitos, a alimentação, a utilidade, etc. do bicho e, pelas

características, tentam descobrir qual é o animal. As informações são completadas pelo

professor como conteúdo de Ciências e saúde e, em seguida, as crianças fazem um

Banco de Palavras.

Exercícios

1. A exploração de textos diversificados proporciona o desenvolvimento: a) da reprodução de textos modelares. b) de textos com regras fixas. c) de textos com reflexão sobre o mundo. d) de textos distantes da realidade.

2. Que tipo de texto contribui para uma melhor comunicação entre as pessoas e facilitam as atividades do dia­a­dia? a) Textos práticos. b) Textos informativos. c) Textos literários. d) Textos extraverbais.

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Respostas dos Exercícios

1. A exploração de textos diversificados proporciona o desenvolvimento: RESPOSTA CORRETA: C

2. Que tipo de texto contribui para uma melhor comunicação entre as pessoas e facilitam as atividades do dia­a­dia? RESPOSTA CORRETA: A

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91

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 18 • PRODUÇÃO DE TEXTO

A produção de texto é o principal elemento de avaliação do professor. Quando o aluno

consegue se comunicar dentro dos padrões da escrita, fica fácil para o professor fazer uma

avaliação, mas quando só o aluno “sabe” o que escreveu ou o que “pensa” que escreveu, o

professor precisa procurar entender o texto, pedindo que o aluno faça a leitura, apontando para a

escrita.

De acordo com a relação que o aluno fizer entre a leitura e a escrita na hora do relato, o

professor conseguirá avaliar, primeiro, a hipótese em que o aluno se encontra em relação à

aprendizagem e, depois, a produção quanto à criatividade, à seqüência lógica dos fatos, à

coerência, à conclusão da história e aos conceitos referentes à ortografia. É neste momento,

também, que o professor sentirá se o aluno está bloqueado, ou não, para escrever.

A correção da produção não deve inibir a criação, mas deve, sim, ser feita de maneira

gradativa para que o aluno tenha tempo de elaborar novas hipóteses para os eventuais “erros” e

continue escrevendo. Por isso, a correção deve ser coerente com a etapa do processo em que o

aluno se encontra e o professor deve procurar respeitar essa etapa, adequando sua correção.

Não faz sentido, por exemplo, fixar­se em erros ortográficos se os alunos ainda estão passando

pela hipótese silábica.

Quando o aluno não consegue estabelecer uma seqüência lógica na escrita, quando não

expressa suas idéias com coerência e clareza, é preciso que o professor trabalhe no sentido de

desenvolver tais capacidades. A expressão das idéias é muito importante para o desenvolvimento

integral da criança e deve anteceder à preocupação com a escrita correta das palavras.

No que se refere aos elementos a ser corrigidos, devem­se levar em consideração duas

questões distintas: a da macroestrutura e a da microestrutura. A primeira envolve a coerência no

sentido do texto e a segunda trata da coesão na forma, na estrutura “física”. Portanto, o trabalho

com a macro deve anteceder aquele com a microestrutura.

Os erros constantes demonstram a “lógica” com que a criança está lidando naquele

momento e são indicadores do campo de ação do professor. Enquanto ela não superar ou

adequar sua hipótese, não adianta insistir na correção repetitiva, que acabará criando dúvidas

(uma vez que ela não compreende, ainda, a explicação), e conseqüentemente uma atitude

retraída diante do texto.

Page 92: Apostila Excelente de Alfabetizacao

92

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Cada hipótese dos níveis de aprendizagem apresenta uma pequena série de erros­padrão

que são resolvidos quando a criança se coloca novas possibilidades. Por exemplo: muitas

palavras sofrem, além da influência regional, “vícios” da fala que a criança procura transcrever

com exatidão, como falá (falar), bolu (bolo), pexi (peixe), papéu (papel), etc., e tais “erros” só

serão sanados quando a criança puder diferenciar a língua escrita da oral.

Outro exemplo: quando a criança, ao escrever, emenda palavras ou separa letras de uma

mesma palavra, ela demonstra ter compreendido que a escrita é a representação da fala e, do

mesmo modo que não separamos todas as palavras quando falamos, ela procura representar a

segmentação tal qual ela acontece na fala, transferindo isso para a escrita. Com o tempo, a

própria criança sente que precisa escrever de maneira que todos entendam (de acordo com a

norma culta­padrão) e, neste momento, ela intensifica a compreensão de que a escrita tem um

valor social muito importante: a comunicação.

A partir do momento em que o aluno se torna alfabético, é oportuno fazer um trabalho

ortográfico e sintático. Sabemos muito bem que as regras de ortografia são muitas e não é fácil

para a criança assimilá­las: até mesmo nós, adultos ortográficos, sentimos a necessidade de

recorrer ao dicionários em várias ocasiões. Sabemos também que as palavras com as quais a

criança tem maior aproximação, ou mais familiaridade, são assimiladas com mais facilidade.

Sugestões para efetuar a correção

Para trabalhar a macroestrutura, o professor pode desenvolver atividades que envolvam

seqüência e ordenação de objetos, fatos e números. Esse trabalho envolve a organização do dia­

a­dia, das atividades e também a organização do raciocínio lógico.

No momento da correção sistematizada, o professor pode trabalhar tanto com o aluno

individualmente, quanto com a classe, isto é, pode trabalhar cada produção com seu “escritor” ou

trabalhar, com a classe toda, uma produção escolhida pelas crianças.

Corrigir um texto sozinho é tarefa muito difícil para o aluno, e até ele chegar a melhorar

conscientemente um texto, deve ser feito um trabalho oral. Para chegar à autocorreção, o

professor precisa trabalhar primeiro com a classe, depois com grupos menores e, finalmente, com

cada aluno individualmente, para que, relendo seu texto, a criança possa fazer uma autocrítica

consciente de seu trabalho, ter conhecimento da expectativa do professor e conseguir a

autocorreção.

Page 93: Apostila Excelente de Alfabetizacao

93

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Para corrigir erros ortográficos numa produção o professor pode optar por circular palavras

erradas e listá­las corretamente no final; fazer uma marca na margem da linha em que houver erro

para que o aluno o descubra; listar na lousa as palavras que aparecem erradas muitas vezes e

pedir que os alunos as registrem em ordem alfabética; incentivar e facilitar o uso do dicionário; e,

sempre, requerer que o aluno leia o texto e faça a correção. Além disso, pode reunir os alunos em

pequenos grupos e levá­los a descobrir qual seria a maneira certa de escrever as palavras

erradas, anteriormente sublinhadas. A sistematização das regras deve ser desenvolvida com base

no texto produzido, e não o contrário, isto é, pedir produção de texto baseada em regras pré­

concebidas.

Outra técnica de correção que pode ser usada com alunos alfabéticos é a reescrita. O

professor pode trabalhar a correção de um texto na lousa, em cartolina, em papel manilha, ou

mesmo numa folha de linguagem, se a correção for individual; se for coletiva, o texto deve ser

fixado na metade da lousa.

O “escritor” do texto interage com seus colegas e com o professor, trocando experiências e

ponderando hipóteses até chegar a conclusões mais “corretas”, sem que, com isso, precise mudar

a idéia original. As dificuldades variam de criança para criança e é com base nessas diferenças

que a interação acontece: a dúvida de um aluno pode ser a certeza de outro. Normalmente, a

classe estabelece com este aluno, o autor, uma relação positiva e enriquecedora: a socialização

do saber.

O professor deve ser o desafiante e o mediador quando as discussões se perdem ou

quando o assunto foge do conceito das crianças, equilibrando a participação e orientando as

correções já discutidas. Aos poucos, na outra metade da lousa, o texto vai sendo reescrito pelo

professor ou por um aluno.

O objetivo da reescrita é fazer o aluno perceber que conseguiu se comunicar; que, se

necessário, seu texto pode ser escrito de outra maneira a fim de que outras pessoas o entendam

melhor; e que pode ter um modelo corrigido de sua criação, sem a necessidade de ver seu original

rabiscado. A constância desse trabalho ajuda a despertar autocrítica da criança na hora de

escrever.

Enfim, é muito importante que a criança não se iniba ao escrever, transcreva suas idéias,

ponha em conflito suas hipóteses, sinta­se respeitada na maneira como se comunica e seja

corrigida quando necessário. Ela precisa chegar a escrever ortograficamente de maneira

satisfatória, mas não será nos primeiros anos de escolaridade que ela atingirá este nível.

Precisamos dar­lhe tempo e proporcionar condições para que o aperfeiçoamento ocorra.

Page 94: Apostila Excelente de Alfabetizacao

94

FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

A ortografia é uma parte da gramática que apresenta aspectos regrados (M antes de P e B,

por exemplo) e não­regrados (palavras escritas com S, Z, CH, X). Os regrados podem ser

reconstruídos pelo aluno, porque fazem parte de um conhecimento lógico­matemático; já os não­

regrados se referem a um conhecimento social­arbitrário formando a imagem mental da palavra,

ou seja, constituindo o repertório das palavras mais utilizadas e tendo consciência de como são

escritas, independentemente da maneira como são faladas. Compreendendo a questão da

imagem mental, é possível entender por que a maioria das crianças passa anos fazendo cópias e

ditados e ainda assim escreve “errado”.

Autocorreção é um procedimento de transformação da “imagem mental” que as crianças

têm das palavras no que se refere à ortografia. Consiste na comparação da palavra escrita

incorretamente pelo aluno com a forma ortograficamente correta, na observação dos contrastes e

na correção do que estiver diferente.

Uma forma de preparar a autocorreção é sublinhar e/ ou numerar as palavras que

necessitam de correção e escrevê­las no final da página. Em seguida, devolver o texto à criança

para que ela faça a comparação, o contraste e a correção. Em turmas mais adiantadas, podem­se

assinalar as palavras e pedir que o aluno procure no dicionário.

Junto com os alunos, o professor estabelece um código para ser usado durante a leitura

avaliatória. Assim, em vez de “corrigir” o texto, o professor apenas indica, com esse código, os

locais em que o aluno fará a autocorreção. Vejamos alguns exemplos de códigos que podem ser

adotados:

Falta parágrafo [triângulo vazio]

Falta ponto final [círculo vazio]

Falta vírgula [quadrado vazio]

Falta travessão [triângulo cheio]

Faltam dois pontos [meio círculo cheio]

Falta ponto de exclamação [losango cheio]

Falta ponto de interrogação [um xis]

Faltam reticências [um sinal de +]

É interessante que, numa escola, todos os professores adotem o mesmo código em todas

as séries, a fim de facilitar o trabalho nos anos posteriores.

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Exercícios

1. Um trabalho de aprofundamento da alfabetização ocorre com: a) a cópia das palavras escritas erradas ortograficamente. b) o ditado das palavras que o aluno errou. c) a reconstrução e a refacção de um texto.

2. É uma forma de ampliar e consolidar o processo de alfabetização: a) a cópia e o ditado. b) a autocorreção. c) a separação de sílabas em exercícios sistemáticos.

Respostas dos Exercícios

1. Um trabalho de aprofundamento da alfabetização ocorre com: RESPOSTA CORRETA: C

2. É uma forma de ampliar e consolidar o processo de alfabetização: RESPOSTA CORRETA: B

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 19 • A APRENDIZAGEM DA LEITURA

Ler não deve se resumir a decifrar caracteres, distinguir símbolos e sinais, unir letras e

emitir sons correspondentes: isso é muito mais um trabalho de discriminação visual e auditiva que

antecede a leitura propriamente dita. Ler, além de decifrar, é interpretar a mensagem, atribuir a ela

uma vivência pessoal e interiorizá­la.

A leitura faz parte da rotina diária da criança e ela não espera receber instruções de outra

pessoa para iniciá­la. Placas, letreiros, programas de TV, embalagens, marcas, títulos e todos os

objetos constantes no seu dia­a­dia transmitem uma significação própria e se tornam tão

familiares que sua leitura é espontânea, podendo ocorrer muito antes da decifração dos códigos.

Por exemplo, a maioria das crianças lê a palavra Coca­Cola, decifrando, ou não, sua escrita.

No entanto, na escola, algumas crianças ficam bloqueadas para a leitura, principalmente

quando são apresentados textos pouco significativos para elas. A sala de aula deve dar

continuidade à leitura prazerosa, aquela que estimula a criança, que aguça sua curiosidade,

sensibilizando­a de alguma maneira. As crianças demonstram ser leitores atentos, curiosos e

observadores, desde que o material a ser lido seja interessante e desafie sua inteligência.

Bilhetes e comunicados dirigidos aos pais devem ser lidos junto com as crianças, sempre

que possível. Material escrito, como livros de histórias, revistas, jornais, folhetos, gibis, artigos,

livros didáticos de diferentes anos escolares precisam estar presentes na classe, não importando

se a criança está “pronta” para lê­los. Intuitivamente, ela escolhe o material escrito de acordo com

suas necessidades e opta por livros com maior ou menor número de desenhos, páginas e letras.

Muitas vezes, a criança escolhe um livro e troca­o logo em seguida sem ter feito um bom

uso dele porque, certamente, aquele material ainda não parecia ser suficientemente interessante

ou não era adequado ao seu “estágio” de leitor. Ainda assim, o aluno precisa ter liberdade de

escolher e de usar diferentes modelos de escrita e isso deve ser feito de modo que ele não sinta,

desde o início, que a finalidade da leitura é a aquisição de habilidades de decodificação.

O professor precisa incentivar o gosto pela leitura porque ela é a base da escrita,

procurando desenvolver, no aluno, a leitura crítica, para que possa questionar e opinar sobre o

conteúdo implícito e explícito do texto.

A interpretação não deve se resumir a, simplesmente, completar frases transcritas

diretamente do texto ou a responder perguntas que, visivelmente, possibilitam (ou direcionam

para) uma única resposta, mas deve, sim, estar baseada no que o texto transmite ao aluno

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

enquanto indivíduo, para que, depois, ele possa externar suas opiniões. Ao fazer a leitura, o

professor precisa respeitar as interferências do aluno e garantir que, de alguma forma, ele

“participe” do texto que está sendo lido.

Leituras de letras de música, receitas de culinária, contos de fada, regras de jogos,

histórias vivenciadas pela classe, manchetes de jornal, embalagens e avisos são elementos que

oferecem uma base interessante para se fazer, além da interpretação, as atividades de gramática,

ou mesmo quaisquer outros trabalhos ligados às diferentes áreas de estudo.

Discute­se o uso de textos literários, como se fossem didáticos, em atividades ligadas ao

exercício da língua. No entanto, após trabalhar a leitura de várias maneiras, não vimos nem

percebemos qualquer impedimento na utilização de qualquer texto, desde que seja agradável ao

aluno, em diferentes situações. Ao contrário, os resultados foram surpreendentes bons, visto que,

quando o texto não é do interesse do aluno, todo o trabalho fica prejudicado, tanto em nível

teórico quanto prático.

Sugestões para leitura

• Leituras individual ou coletiva.

• Leituras silenciosa ou em voz alta.

• Ler o que está fixado nas paredes: ler e interpretar o material que faz parte do ambiente

alfabetizador.

• Ler textos que a criança tem na memória (pseudoleitura).

• Ler palavras ou frases que formam o Banco de Palavras.

• Ler textos produzidos pelos próprios alunos e fazer a interpretação oral ou escrita.

• Recortar de jornais e revistas somente as palavras ou frases que saiba ler e fazer a

leitura para o professor.

• Ler um texto e reduzir (resumir) as informações.

• Ler frases fora de ordem e organizá­las, tornando o texto coerente.

• Com o professor, fazer a leitura dialogada: o professor lê um texto e incentiva o diálogo,

lançando perguntas e desafiando os alunos a sugerir uma continuidade para a história.

• Antecipar uma história com base no título e/ ou na capa do livro.

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

A escolha dos textos

Que textos escolher para as crianças?

No momento de começar o ensino sistemático da leitura, o tema e os significados do texto

escolhido são decisivos.

Para crianças de 6 anos, que estão iniciando o processo de alfabetização, cheias de

curiosidade e disposição para aprender, há muitas escolhas: histórias, poemas, trava­línguas,

canções de roda.

Em se tratando de crianças grandes, repetentes, que já passaram por vários métodos e

cartilhas, deve­se conversar sobre a vida deles, o que fazem fora da escola, se trabalham, do que

gostam, etc. Nesse caso, talvez uma notícia sobre futebol, uma letra de rap ou de uma canção,

uma piada, um anúncio ou um bilhete sejam mais atraentes. Trata­se de dar a essas crianças a

certeza de que estão avançando, aprendendo coisas novas, até porque a maioria já passou por

muitas experiências frustrantes e já conhece os nomes das letras, além de algumas palavras

simples ou sílabas. Deve ser aflitivo para essas crianças ter sempre a sensação de começar do

zero, portanto é bom escolher um texto diferente, usado na vida social, que seja uma novidade

para elas.

Deve­se trabalhar com os textos das próprias crianças?

Seja qual for o tipo de turma, textos orais produzidos pelas crianças e escritos pelo

professor também podem servir de ponto de partida para o trabalho de alfabetização.

Como começar a estudar o texto?

Escreva o texto na lousa, numa cartolina grande ou em papel manilha. Faça uma leitura

normal, fluente e converse com a turma sobre o texto. Em seguida, faça a leitura didática,

apontando as palavras com o dedo ou com a régua, mostrando os espaços em branco entre as

palavras. Mostre aos alunos que quando falamos as palavras parecem emendadas umas nas

outras. Assim, a separação entre as palavras, os espaços existentes entre elas no papel são uma

das características da língua escrita.

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

Como fazer para mostrar os sons das letras?

Aprender a ler envolve aprender que as letras representam sons, que a mesma letra pode

representar mais de um som de acordo com o contexto e o mesmo som pode ser representado

por mais de uma letra. Não é uma questão de adivinhação da criança, é conhecimento

sistemático, que tem que ser passado por uma pessoa que conheça o código alfabético.

Quando é que elas vão começar a ler realmente?

As crianças estarão lendo quando forem capazes de perceber como as letras funcionam

para representar os sons da língua e ao mesmo tempo possam entender o que diz o texto. Para

isso, pode­se sistematizar o ensino da leitura e da escrita, começando pelo texto natural,

significativo (e não por um texto acartilhado) e caminhar gradativamente na direção do

conhecimento de palavras, sílabas, letras e regras ortográficas.

Sugestões didáticas para melhorar a competência textual e a expressão oral

Paráfrase: pedir ao aluno que diga a mesma coisa lida de um outro jeito, que conte uma

história, narrada pela professora, com suas próprias palavras.

Resumo: propor resumos orais de uma história, um capítulo de novela ou uma notícia.

Ensinar que no resumo destacamos aquilo que consideramos mais importante, o que realmente

não pode faltar.

Produção de um texto a partir de um título dado: títulos de histórias conhecidas como

histórias de fadas, lendas, fábulas, etc. podem ser usados para iniciar a atividade.

Classificação dos diversos tipos de textos: cada vez que apresentar um texto, explicar

de que tipo de texto se trata: uma narrativa, uma poesia, um texto didático, uma notícia

jornalística, um anúncio, uma receita.

Brincadeiras com palavras: pedir a dois alunos que digam cada qual uma palavra e a

partir daí deixar a turma criar uma história.

Reprodução de histórias: No exemplo abaixo, há muitas repetições e modos de dizer

típicos da língua oral. Histórias assim podem ser retrabalhadas para ficar de acordo com as

convenções da escrita.

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

A bruxa tava fazendo comida. Ela botou o dedo no fogão, ela queimou. Aí foi passear na água, viu o jacaré. O jacaré comeu ela, aí ele levou pro mar, aí, ela caiu lá dentro e foi embora. (Teixeira apud Carvalho, 2005: 56)

Exercícios

1. Ler, além de decifrar caracteres, é: a) distinguir símbolos e sinais. b) unir letras e emitir sons correspondentes. c) interpretar a mensagem, atribuir a ela uma vivência pessoal e interiorizá­la.

2. O ensino da leitura e da escrita deve começar por um: a) texto acartilhado. b) texto natural e significativo. c) texto de gramática.

Respostas dos Exercícios

1. Ler, além de decifrar caracteres, é: RESPOSTA CORRETA: C

2. O ensino da leitura e da escrita deve começar por um: RESPOSTA CORRETA: B

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

AULA 20 • AVALIAÇÃO NA ALFABETIZAÇÃO

Na medida em que for possível, o professor deve observar o trabalho diário de seus

alunos, circulando pela classe, conversando e discutindo a respeito das atividades.

A observação atenta indica ao professor fatores importantíssimos, como: adequação do

assunto, tempo de execução, interesse individual e da classe, conclusão das atividades. Assim, a

observação por parte do professor serve para avaliar não só o seu trabalho, mas também o de

seus alunos; é um indicador para a continuidade, ou não, de sua prática pedagógica.

De maneira geral, avaliar a qualidade dos trabalhos executados é mais coerente do que

atribuir valores numéricos a eles, visto que, muitas vezes, esse procedimento não é suficiente

para representar a realidade dos alunos no que se refere à apreensão de conceitos e conteúdos.

Infelizmente, nosso ano escolar é interrompido por férias no mês de dezembro, o que

pressupõe que uma etapa de aprendizagem foi cumprida, e nem sempre isso é real. No decorrer

do ano, temos que avaliar o aluno quantitativa, numérica e estatisticamente.

O processo de avaliação é muito delicado, porque dele depende, inclusive, a postura do

aluno: aceitação ou revolta. É importante que o aluno tenha conhecimento dos tipos e dos modos

de avaliação (contínua e diversificada) do professor e saiba por que lhe foram atribuídos

determinados conceitos ou determinada média.

Antes de efetuar a avaliação, precisamos nos colocar algumas perguntas e pré­determinar

as respostas para que os alunos não se sintam prejudicados:

• O que queremos avaliar? Memória, atenção, raciocínio, interpretação, leitura,

sistematização, criatividade, assimilação do conteúdo.

• Como queremos avaliar? Objetiva ou subjetivamente, de modo parcial ou imparcial,

quantitativa ou qualitativamente, visando aos conteúdos ou às fases de desenvolvimento.

• Por que avaliar? Para determinar nossa prática ou para saber os resultados dessa prática

com relação aos nossos alunos, para completar tarjetas e boletins, para colaborar com a

estatística da Educação, para detectar nossas dificuldades e/ ou as de nossos alunos,

para buscar uma nova orientação nas mudanças teóricas e práticas, para confirmar a

eficiência da nossa prática de ensino.

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

• Vamos avaliar o indivíduo separadamente ou um aluno em relação à classe? Devo

considerá­lo independentemente ou devo compará­lo com o grupo ou com os alunos de

outra classe?

Avaliar não pressupõe erros, falhas, defeitos, mas sim envolve determinar o valor da ação

educadora e o desenvolvimento individual de cada um. Avaliar significa descobrir o aluno em

relação a ele mesmo.

A coerência da avaliação no que se refere ao modo de sentir e de ser da criança fortalece

a relação professor­aluno: o professor colabora com o desenvolvimento do aluno e se sente feliz

com o progresso do trabalho dele; o aluno aceita com satisfação as intervenções do professor e

se sente produtivo e confiante.

Invariavelmente, o processo de avaliação está relacionado com a maneira como o

professor vê o mundo e com o modelo didático que utiliza. Em geral, quando se fala em avaliação,

pensa­se imediatamente no processo de avaliação tradicional, em que a escola assume o papel

autoritário, fechado, cíclico, e o professor manda, ensina e julga.

Quando se pensa no processo de avaliação, é impossível deixar de refletir sobre o erro. O

erro torna as pessoas vulneráveis e é uma questão desconfortante, que cria culpas e pecados.

Para compensar a culpa, normalmente há uma complacência em relação a ele, ao mesmo tempo

que há uma preocupação em não cometê­lo. O erro opõe­se ao acerto, que é considerado

verdadeiro e bom.

Do ponto de vista piagetiano, os conceitos são construídos num processo de auto­

regulação. Regulação é o conjunto de aspectos do processo segundo os quais precisamos corrigir

as coisas. Há um objetivo a ser alcançado e algumas ações levam a esse objetivo; outras ações,

aquelas que não levam ao objetivo, devem ser repensadas e corrigidas. Assim, a preocupação

maior não deve ser o erro; o que importa é a ação e o feedback que o erro desencadeia no processo.

A criança que erra está convivendo com uma hipótese de trabalho não­adequada. Nem por

isso deixa de estar num momento evolutivo no processo de aquisição de conhecimento.

Ao educador cabe diagnosticar o erro e, por meio dele, observar com transparência o

desenvolvimento de seu aluno. A partir dessa observação ele pode criar conflitos para

desestabilizar as certezas e hipóteses não­adequadas que a criança tem sobre determinado

assunto, e assim permitir seu desenvolvimento cognitivo.

Em outras palavras:

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

• O processo de avaliação está relacionado à maneira como professor e aluno vêem o

mundo, com o modelo didático que utilizam. Assim, temos: avaliação diagnóstica,

formativa e somativa.

• Além de diagnosticar o erro, cabe ao professor ajudar o aluno a reformular suas

hipóteses lingüísticas.

• O aluno constrói o conhecimento num contínuo processo de auto­regulação.

Exercícios

1. Avaliar, segundo Russo e Vian (2001: 244), pressupõe: a) detectar erros e falhas. b) indicar defeitos na memorização. c) determinar o valor da ação educadora.

2. De acordo com Cócco e Hailer (1996: 97), o processo de avaliação: I está relacionado à maneira como professor e aluno vêem o mundo. II está relacionado à maneira como o professor pode ajudar o aluno a reformular suas hipóteses lingüísticas. III está relacionado à maneira como o aluno constrói o conhecimento. a) I e II estão corretas. b) I, II e III estão corretas. c) II e III estão corretas.

Respostas dos Exercícios

1. Avaliar, segundo Russo e Vian (2001: 244), pressupõe: RESPOSTA CORRETA: C

2. De acordo com Cócco e Hailer (1996: 97), o processo de avaliação: RESPOSTA CORRETA: B

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FUNDAMENTOS DA ALFABETIZAÇÃO

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