apostila 3 - 2013

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- 2 - Coordenação Geral Comissão Organizadora André Bedendo de Souza Marcus Vinicius Costa Alves Professores Responsáveis Profa. Dra. Isabel Marian Hartmann de Quadros Prof. Dr. Jair Ribeiro Chagas Coordenadores de Módulo Módulo Introdutório – Marina Rezende e Guilherme Julian Módulo de Modelos Experimentais – César Augusto de Oliveira Coelho Módulo de Memória – Vanessa Manchim Favaro Módulo de Neuropsicologia – Larissa Botelho Gaça Módulo de Transtornos Psiquiátricos – Mayra Machado e Luiz Dieckmann Módulo de Plantas e SNC – João Vitor Pildervasser Módulo de Drogas de Abuso – Juçara Zaparoli Módulo de Estresse – Mariella Bodemeier Loayza Careaga Módulo de Cronobiologia – Bruno Jacson Martynhak Módulo de Sono – Flávia de Mattos Egydio Módulo de Exercício Físico – Valdir Aquino Coordenador da Tutoria Científica Gabriel Natan Pires

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Page 1: Apostila 3 - 2013

- 2 -

Coordenação Geral

Comissão Organizadora

André Bedendo de Souza

Marcus Vinicius Costa Alves

Professores Responsáveis

Profa. Dra. Isabel Marian Hartmann de Quadros

Prof. Dr. Jair Ribeiro Chagas

Coordenadores de Módulo

Módulo Introdutório – Marina Rezende e Guilherme Julian

Módulo de Modelos Experimentais – César Augusto de Oliveira Coelho

Módulo de Memória – Vanessa Manchim Favaro

Módulo de Neuropsicologia – Larissa Botelho Gaça

Módulo de Transtornos Psiquiátricos – Mayra Machado e Luiz Dieckmann

Módulo de Plantas e SNC – João Vitor Pildervasser

Módulo de Drogas de Abuso – Juçara Zaparoli

Módulo de Estresse – Mariella Bodemeier Loayza Careaga

Módulo de Cronobiologia – Bruno Jacson Martynhak

Módulo de Sono – Flávia de Mattos Egydio

Módulo de Exercício Físico – Valdir Aquino

Coordenador da Tutoria Científica

Gabriel Natan Pires

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Patrocinadores

Apoio

Page 3: Apostila 3 - 2013

- 4 -

Drogas de Abuso................................................................................................................5

Estresse..............................................................................................................................44

Sono...................................................................................................................................63

Exercício Físico................................................................................................................105

Page 4: Apostila 3 - 2013

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1. CONCEITO DE DROGA E HISTÓRIA DO CONSUMO

De acordo com o “Glossário de álcool e drogas” da Organização Mundial de Saúde

(OMS), droga é um termo de uso variado. Em medicina, droga refere-se a qualquer substância

com o potencial de prevenir ou curar doenças ou aumentar o bem estar físico ou mental. Por

outro lado, em farmacologia refere-se a qualquer agente químico que altera os processos

bioquímicos e fisiológicos de tecidos ou organismos. Ainda, na linguagem comum, o termo se

refere especificamente as “drogas de abuso” e em geral ainda mais especificamente às drogas

ilícitas. Na linguagem mais comum “drogas” significam substâncias psicotrópicas ilícitas

(maconha, cocaína, crack, heroína, LSD, ecstasy, etc), cujo uso é tido necessariamente como

abusivo e que são alvos dos regimes de controle e proibição.

Farmacologicamente, as substâncias podem ser classificadas em psicoativas e em

psicotrópicas. As substâncias psicoativas são aquelas que agem no Sistema Nervoso Central (SNC)

com capacidade de modificar o curso do pensamento ou estados da consciência, podendo

causar efeitos estimulantes, euforizantes e/ou tranqüilizantes. Segundo a OMS são aquelas que

“alteram comportamento, humor e cognição”, isto é, agem alterando o funcionamento da nossa

rede neuronal. Na categoria das drogas psicoativas entram tanto as drogas lícitas e ilícitas quanto

medicamentos psiquiátricos, que não apresentam potencial de abuso, como os antidepressivos.

As drogas psicotrópicas são substâncias psicoativas (com capacidade de alterar humor,

comportamento e cognição), com capacidade reforçadora e passíveis de serem auto-

administradas, isto é, com potencial de serem abusadas por humanos e resultar em dependência.

1.1 USOS NA CULTURA

A etimologia do termo “droga” é das mais controversas. Entre as várias hipóteses

levantadas, a derivação do termo holandês droog é uma das mais aceitas. Droog se referia a

produtos secos e servia para designar, dos séculos XVI ao XVIII, um conjunto de substâncias

naturais utilizadas tanto na alimentação quanto na medicina. De acordo com o Diccionário da

Lingua Portugueza Recopilada, de Antonio de Moraes Silva, de 1813, droga seria: “todo gênero de

especiaria aromática; tintas, óleos, raízes oficiais de tinturaria, e botica; mercadorias ligeiras de lã,

ou de seda”.

Page 5: Apostila 3 - 2013

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O consumo de substâncias psicotrópicas é um fenômeno recorrente e disseminado em

diversas sociedades e em diferentes momentos da história. Há uma imensa rede de significados

culturais, ritos e práticas de socialização associadas ao consumo de drogas ilícitas, drogas lícitas

incluindo tabaco (nicotina), alcoóis, café e chá (cafeína) e de outras substâncias de uso regional.

Assim, os múltiplos modos pelos quais essa existência e esses usos são concebidos e vivenciados

variam histórica e culturalmente.

“Drogas não são somente compostos dotados de propriedades

farmacológicas determinadas, que possam ser natural e

definitivamente classificadas como boas ou más. Sua existência e

seus usos envolvem questões complexas de liberdade e disciplina,

sofrimento e prazer, devoção e aventura, transcendência e

conhecimento, sociabilidade e crime, moralidade e violência,

comércio e guerra” (Goulart et al., 2008).

A vida da humanidade sempre esteve ligada ao uso de plantas, em particular com

aquelas que “alimentam o espírito”, (ou seja, com ação psicoativa). Em todas as religiões e

culturas antigas observa-se a atribuição de um caráter sagrado a uma bebida ou outra

substância com potencial de intoxicação. As bebidas alcoólicas merecem destaque por terem

tido uma importante e variada inserção na vida do homem. Quase todas as civilizações de que

temos notícia conheceram o álcool. Trata-se de uma droga consumida em múltiplas

circunstâncias e com várias motivações. Seu uso tem ocorrido no tempo de acordo com as

diferenças culturais, podendo variar inclusive dentro de uma mesma cultura.

A ciência desempenha um papel importante no estudo dos efeitos e composição das

drogas. Atualmente é comum se dizer que uma abordagem exclusivamente farmacológica da

questão não é suficiente, e que os efeitos tanto individuais e subjetivos, quanto os sociais do uso

de substâncias psicoativas só podem ser entendidos a partir de uma perspectiva biopsicossocial.

O objetivo deste capítulo é fornecer de forma sucinta informações sobre os principais

temas relacionados com Drogas de Abuso, sendo alguns deles dados epidemiológicos, as bases

neurobiológicas do circuito de recompensa, os mecanismos de ação farmacológica das drogas e

algumas estratégias de tratamento disponíveis.

1.2 GLOSSÁRIO

Segue abaixo uma definição breve de alguns termos-chave bastante recorrentes no

assunto. Eles podem ser úteis em um primeiro contato com o assunto. Muitos deles serão

retomados ao longo das seções com explicações mais extensas.

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Abuso: de acordo com o critério de diagnóstico do DSM-IV trata-se de um padrão mal-

adaptativo do uso/auto-administração de substâncias psicoativas. Manifesta-se por

conseqüências clínicas adversas recorrentes e significativas relacionadas ao uso da(s)

substância(s);

Abstinência: conjunto de sintomas psicológicos e fisiológicos de configuração e gravidade

variáveis que ocorrem após a redução, cessação ou interrupção do uso de substâncias

psicoativas;

Binge: consumo de doses altas e repetidas de substâncias psicoativas, em geral de

estimulantes (cocaína e anfetamina, mas álcool também), em geral em ocasiões isoladas

(por exemplo, em festas);

Craving (“Fissura”): fenômeno subjetivo que corresponde a uma necessidade intensa de

consumir a droga com o intuito de reduzir ou controlar os efeitos desagradáveis da retirada

de uma substância psicoativa;

Dependência: de acordo com o critério de diagnóstico DSM-IV é um conjunto de

fenômenos fisiológicos, comportamentais e cognitivos decorrentes da neuroadaptação

produzida pela administração repetida da droga. O uso da substância alcança alta

prioridade em relação às demais atividades do indivíduo. Caracterizada, dentre outros

fatores, com um desejo muitas vezes incontrolável de consumir a substância;

Rush: efeito agradável intenso, acompanhado de sentimento de competência e amor-

próprio, com desaparecimento de sensações desagradáveis seguida do consumo de uma

substância psicoativa;

Tolerância: adaptação decorrente do uso repetido de substâncias psicoativas na qual

doses maiores de uma substância devem ser administradas para se atingir um efeito inicial;

Uso disfuncional: uso de substâncias psicoativas que causa prejuízos em funções

psicológicas ou sociais, como perda de emprego por exemplo.

Uso nocivo: ocorre quando um padrão de uso está causando danos, físicos ou mentais, à

saúde do indivíduo.

2. EPIDEMIOLOGIA

Estudar epidemiologia significa estudar o que acontece com as populações. Aplicando

estes conceitos na área de drogas de abuso, é através da epidemiologia que saberemos quantas

pessoas consomem drogas, quais são os tipos de drogas mais usadas, em quais contextos elas são

consumidas, qual o perfil da população que está mais vulnerável ao consumo, qual seu impacto

na saúde e suas consequências sociais, entre outras questões. A investigação da epidemiologia

sobre o uso de drogas psicotrópicas e de seus problemas fornecem a base científica para um

melhor planejamento de políticas públicas a este respeito.

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No Brasil e na maioria dos outros países, o álcool é a droga mais consumida. De acordo

com o II Levantamento Domiciliar sobre o Uso de Drogas Psicotrópicas no Brasil (2007), cerca de

70% da população relatou já ter consumido bebida alcoólica pelo menos uma vez na vida

(Carlini, Galduróz et al. 2007), sendo que o primeiro consumo ocorre por volta dos 12 anos de

idade (Galduróz, Noto et al. 2004). No Brasil, a estimativa de dependentes de álcool foi de 12,3% e

de tabaco 10,1%, o que corresponde a populações de 5.799.005 e 4.700.635 de pessoas,

respectivamente (Carlini, Galduróz et al. 2007).

Com amplo consumo e início precoce, o impacto social gerado pelo álcool é muito maior

do que o impacto das outras drogas. O que chama mais a atenção é que não é só a

dependência do álcool que produz esses efeitos. O consumo de bebidas é responsável por 85%

das internações decorrentes do uso de substâncias psicoativas; 20% das internações em clínica

geral e 50% das internações masculinas psiquiátricas.

Segundo dados do UNODC (United Nations Office on Drugs and Crime - 2010) cerca de 210

milhões de pessoas no mundo usam drogas ilícitas a cada ano, e quase 200 mil destas morrem em

consequência do uso das drogas. Em 2009, entre 149 e 272 milhões (3,3% a 6,1%) da população

mundial entre 15 e 64 anos usaram drogas ilícitas pelo menos uma vez no ano anterior e estima-se

que metade destes podem ter se tornado usuários atualmente.

Considerando as consequências para a saúde, a prevalência global de HIV entre jovens

usuários de drogas injetáveis é de 17,9%, enquanto para hepatite C é de 50%. Mortes associadas

com o uso de drogas ilícitas são estimadas entre 104.000 e 263.000 pessoas entre 15-64 anos por

ano, e mais da metade destas mortes são decorrência de overdose fatal.

Dados da UNODC (2010) mostram que a maconha é a droga ilícita mais usada na

população geral, tendo sido consumida por 125 a 203 milhões de pessoas no mundo em 2001. Em

segundo lugar ficam os estimulantes como anfetamina, metanfetamina e ecstasy, em seguida

cocaína e opióides (ópio, heroína e opióides prescritos) (Figura – 1). De acordo com dados do II

Levantamento Domiciliar sobre o Uso de Drogas Psicotrópicas no Brasil, o uso na vida de maconha

também aparece em primeiro lugar entre as drogas ilícitas, com 8,8% dos entrevistados (Para

maiores detalhes consulte Figura – 2 e Tabela - 1). Comparando-se estes dados com os de outros

países pode-se verificar que a prevalência de maconha é bem menor que o de países como os

EUA (40,2%), Reino Unido (30,8%), Dinamarca (24,3%), Espanha (22,2%) e Chile (22,4%). Porém,

superior à Bélgica (5,8%) e à Colombia (5,4%).

Vale ressaltar que, apesar da maconha ser a droga mais consumida na população geral

depois do álcool e tabaco, isso não é válido para algumas populações específicas, como os

adolescentes por exemplo. Esse “posto” é ocupado pelos inalantes (ex: loló, lança perfume, cola

de sapateiro), cujo consumo foi relatado por 15,5% dos estudantes brasileiros no V Levantamento

Nacional sobre o Consumo de Drogas Psicotrópicas entre Estudantes de Ensino Fundamental e

Médio (Galduróz, Noto et al. 2004). Esses dados nos mostram que em populações específicas a

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prevalência de consumo (porcentagem de pessoas que usam a droga) muda, assim como a

ordem das drogas mais consumidas. Se procurarmos informações sobre populações que vivem

nas ruas ou que frequentam ambulatórios, podemos nos surpreender com o quanto eles são

diferentes da maioria da população em relação ao uso de drogas.

FIGURA 1 – PREVALÊNCIA ANUAL DO USO DE DROGAS ILÍCITAS ENTRE OS ANOS DE 2009-2010. FONTE: UNODC.

Figura 2 - PREVALÊNCIA SOBRE (PORCENTAGEM) USO NA VIDA DE DIFERENTES DROGAS PSICOTRÓPICAS (EXCETO

ÁLCOOL E TABACO), NAS 108 CIDADES DO BRASIL COM MAIS DE 200 MIL HABITANTES (Carlini, Galduróz et al. 2007).

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Tabela 1. Distribuição dos 7.939 entrevistados*, segundo dependência de drogas, nas 108

cidades brasileiras com mais de 200 mil habitantes (Fonte: *Carlini, Galduróz et. al. 2007).

DEPENDÊNCIA

% de dependentes

DROGAS 2005

Álcool 12,3

Tabaco 10,1

Maconha 1,2

Benzodiazepínicos 0,5

Solventes 0,2

Estimulantes 0,2

2.1 OS PADRÕES DE CONSUMO DE DROGAS

A dependência de drogas preocupa a maior parcela da população, mas existem outras

formas de consumo que também merecem nossa atenção por serem mais prevalentes e por

também apresentarem impacto social e na saúde. Por exemplo, segundo a OMS, os malefícios

do consumo de álcool dependem da quantidade e frequência que ele é consumido. Esses

parâmetros nos remetem a padrões de consumo diferentes.

Os padrões de consumo são nomeados de acordo com o risco que eles oferecem. Dessa

forma, temos o usuário recreacional ou de baixo risco, que são aqueles que experimentaram ou

que usam drogas raramente e em quantidades menores. Já o uso de risco é caracterizado por

um padrão que gera vulnerabilidade às consequências do uso de drogas. Um exemplo é o

consumo exagerado aos finais de semana. O uso nocivo ou abuso é marcado por continuidade

do uso apesar das consequências experimentadas pelo usuário e a dependência é um transtorno

mental que merece avaliação mais detalhada, e será melhor abordado no próximo tópico.

2.2 CONCEITOS DE DEPENDÊNCIA

De acordo com o DSM-IV (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – 4ª

edição), a dependência de drogas faz parte de um espectro denominado “Transtornos por uso

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de substâncias”. A dependência caracteriza-se pela presença de um conjunto de sintomas

cognitivos, comportamentais e fisiológicos, indicando que o indivíduo continua utilizando uma

substância mesmo diante de problemas significativos relacionados com ela. Dentro deste

espectro também se ressalta o abuso de drogas, que consiste em um padrão de uso que acarreta

conseqüências adversas significativas e recorrentes relacionados ao uso repetido de determinada

substância.

A seguir, serão apresentados quadros com os critérios para dependência (Quadro 1) e

abuso de substâncias (Quadro 2). Embora no Brasil o Sistema Único de Saúde (SUS) adote os

critérios da Classificação Internacional de Doenças (CID-10) para o diagnóstico da dependência,

o DSM-IV é mais freqüentemente utilizado e mais amplamente aceito nas pesquisas da área.

Quadro 1 – Lista dos critérios diagnósticos para dependência de substância segundo o DSM-IV.

CRITÉRIOS PARA DEPENDÊNCIA DE SUBSTÂNCIA

Trata-se de um padrão mal adaptativo de uso de substância, levando a comprometimento ou

sofrimento clinicamente significativo, manifestado por três (ou mais) dos seguintes critérios,

ocorrendo em qualquer momento no mesmo período de 12 meses:

(1) Tolerância, definida por qualquer um dos seguintes aspectos:

(a) Necessidade de quantidades progressivamente maiores da substância, para obter

intoxicação ou o efeito desejado;

(b) Acentuada redução do efeito com o uso continuado da mesma quantidade de

substância.

(2) Abstinência, manifestada por qualquer dos seguintes aspectos:

(a) Síndrome de abstinência característica da substância;

(b) A mesma substância (ou uma substância estreitamente relacionada) é consumida

para aliviar ou evitar sintomas de abstinência.

(3) A substância é frequentemente consumida em maiores quantidades ou por um período

mais longo de tempo do que o pretendido;

(4) Existe um desejo persistente ou esforços mal-sucedidos no sentido de reduzir ou controlar

o uso da substância;

(5) Muito tempo é gasto em atividades necessárias para a obtenção da substância (p. ex.,

consultas a vários médicos ou longas viagens de automóvel), na utilização da

substância (p. ex. fumar em grupo) ou na recuperação de seus efeitos;

(6) Importantes atividades sociais, ocupacionais ou recreativas são abandonadas ou

reduzidas em virtude do uso da substância;

(7) O uso da substância continua, apesar da consciência de ter-se um problema físico ou

psicológico persistente ou recorrente que tende a ser causado ou exacerbado pela

substância (p. ex. uso atual de cocaína, embora o indivíduo a reconheça como

indutora de sua depressão, ou consumo continuado de bebidas alcoólicas, embora o

indivíduo reconheça que uma úlcera piorou devido ao consumo de álcool).

Especificar se:

Com Dependência Fisiológica: evidências de tolerância ou abstinência (i. é, presença do Item

1 ou 2)

Sem dependência fisiológica: não existem evidências de tolerância ou abstinência (i. é, nem

item 1 nem item 2 estão presentes)

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Quadro 2 – Lista dos critérios diagnósticos para abuso de substância segundo o

DSM-IV.

CRITÉRIOS PARA ABUSO DE SUBSTÂNCIA

A. Trata-se de um padrão mal-adaptativo relativo ao uso de uma substância

que acarreta em prejuízo ou sofrimento clinicamente significativo,

manifestado por um (ou mais) dos seguintes aspectos, ocorrendo dentro de

um período de 12 meses:

(1) Uso recorrente da substância resultando em fracasso em cumprir

obrigações importantes no trabalho, na escola ou em casa (p.

ex, repetido ou fraco desempenho ocupacional relacionados ao

uso de substância; faltas, suspensões ou expulsões da escola

relacionadas à utilização de substância; negligência dos filhos ou

dos afazeres domésticos);

(2) Uso recorrente da substância em situações nas quais isto

representa perigo para a integridade física (p. ex., dirigir veículo

ou operar máquina quando prejudicado pelo uso da

substância);

(3) Problemas legais recorrentes relacionados à substância (p. ex.

detenções por conduta relacionada à substância);

(4) Uso continuado da substância, apesar de problemas sociais ou

interpessoais persistentes ou recorrentes causados ou

exacerbados pelos efeitos desta (p. ex., discussões com o

cônjuge acerca das conseqüências da intoxicação, lutas

corporais).

B. Os sintomas não satisfizeram os critérios para Dependência relativos a esta

classe de substância.

3. NEUROBIOLOGIA DA DEPENDÊNCIA DE DROGAS

3.1 ESTRUTURA E NEUROTRANSMISSORES ENVOLVIDOS

As substâncias psicotrópicas desempenham seu efeito reforçador por ativarem a via

dopaminérgica mesolímbica do cérebro, via esta proposta como sendo o “centro do prazer”. Esta

via origina-se na área tegmental ventral (VTA) do mesencéfalo e inerva o estriado ventral, inclusive

o nucleus accumbens (NAc) e outras estruturas límbicas como amígdala.

O NAc é uma estrutura altamente relacionada com o centro do prazer. A ativação de

neurônios dopaminérgicos, cujos corpos celulares estão localizados na VTA, resulta na liberação

de dopamina (DA) no NAc. Este processo é responsável pela sensação de prazer e bem estar.

A ativação dopaminérgica do NAc ocorre tanto frente a estímulos “naturais” como

recompensas intelectuais, conquistas atléticas, comida, sexo, etc. quanto em resposta às

substâncias psicotrópicas. A particularidade da ação via drogas de abuso é que a ativação

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dopaminérgica é muito mais intensa do que na ativação fisiológica, desencadeando alterações

neuroadaptativas que culminam com o desejo, muitas vezes impulsivo e irrepreensível, de

consumir a droga, dando início a um ciclo vicioso de abuso, dependência e abstinência.

A maioria das drogas de abuso, independente de seu mecanismo de ação específico,

partilham o fato de resultarem na ativação dopaminérgica do NAc. Cada uma das drogas possui

mecanismo de ação específico que alteram a fisiologia dos neurotransmissores, podendo estes ser

por meio da interferência na síntese e/ou armazenamento ou ainda atuando diretamente nos

receptores e/ou transportadores. Os efeitos resultantes podem ir desde uma estimulação suave

causada por uma xícara de café ou chá até aos efeitos profundamente modificadores

produzidos por alucinógenos. Para maiores detalhes consulte a Figura-3.

FIGURA 3 - ESQUEMA SIMPLIFICADO DAS AÇÕES AGUDAS DAS DROGAS DE ABUSO NA VIA VTA-NAC. PPT/LDT: TEGUMENTO

PEDÚNCULO PONTÍNUO / TEGUMENTO DORSO LATERAL; PCP: FENCICLIDINA; DA: DOPAMINA; VTA: ÁREA TEGMENTAL VENTRAL; OPIOID

PEPTIDES: PEPTÍDEOS OPIÓIDES; NAC: NÚCLEO ACCUMBENS (ADAPTADO DE NESTLER, 2005).

3.2 IMPORTÂNCIA DE OUTROS SISTEMAS

De forma simplificada o neurotransmissor relacionado com o prazer e dependência de

drogas é a DA, mas é importante ressaltar o papel de outros neurotransmissores neste

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comportamento, como a serotonina, noradrenalina, glutamato e GABA. Estes neurotransmissores

atuam em etapas e estruturas diferentes, porém todos desempenham papel modulador do

consumo/dependência de drogas.

Um exemplo da ação destes outros neurotransmissores neste complexo processo é a

participação do glutamato. As projeções glutamatérgicas do Córtex Pré Frontal (PFC) para o NAc

estão relacionadas com o controle do abuso/dependência: regulação da impulsividade,

emoções e ocorrência da ação.

3.3 CONFLUÊNCIA DE DIVERSOS FATORES

É importante salientar que o uso único ou esporádico não caracteriza dependência. A

liberação constante de DA, e consequente ativação do NAc ocasiona alterações

neurobiológicas as quais causam o quadro de dependência. Além da influência das bases

biológicas, a auto-administração de drogas se relaciona de forma complexa com outros fatores,

como as influências sociais, culturais e ainda individuais.

3.4 FATORES BIOLÓGICOS NA DEPENDÊNCIA

Dentro dos fatores biológicos, o quadro de desenvolvimento da dependência envolve a

participação de mecanismos de condicionamento, no qual há o estabelecimento da relação

entre a ação operante (administração da droga) e o reforço, e de mecanismos de formação de

hábito. No primeiro mecanismo descrito há diversos fatores influenciadores, mas o efeito

reforçador das substâncias (efeito euforizante da droga) desempenha papel de importância. Da

mesma forma, no segundo mecanismo há influência das associações estabelecidas.

DROGAS DE ABUSO COMO REFORÇADORES

Segundo a teoria do reforço proposta por Wise e Bozart (1982), o poder reforçador de

algumas drogas psicoativas é um dos fatores mais importantes no seu potencial de abuso. Muitos

comportamentos se perpetuam por serem reforçados positivamente ou negativamente.

REFORÇO POSITIVO: Drogas de abuso possuem a capacidade de serem reforçadoras, ou seja,

são capazes de manter, sustentar e aumentar a chance de ocorrência de

comportamentos relacionados ao consumo da droga. Os efeitos “reforçadores” das

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drogas de abuso são resultado da ativação dopaminérgica do NAc. A ativação das vias

dopaminérgicas mesolímbica e mesocortical parece ser essencial para a ocorrência do

reforço, principalmente o reforço positivo. Considera-se que a droga tem efeitos de

reforço positivo quando ela provoca uma sensação prazerosa como a euforia observada

após o consumo de cocaína ou baixa dose de álcool. O estabelecimento da relação com

o reforço positivo sofre influência de fatores como rapidez de ação da substância (quanto

mais rápido, maior a relação temporal entre resposta e reforço) e duração da ação

(administrações repetidas fortalecem o condicionamento);

REFORÇO NEGATIVO: Embora o poder reforçador positivo de uma droga seja fundamental

para caracterizá-la como droga de abuso, elas podem ser consumidas por reduzirem

sensações desconfortáveis, estados de disforia ou como consequência da retirada ou da

redução de um estímulo reforçador (como no caso da síndrome de abstinência). Este tipo

de reforço é denominado negativo, pois tem como objetivo contornar ou atenuar um

estado aversivo. Um exemplo desse uso pode ocorrer, por exemplo, quando a pessoa

ingere álcool para aliviar sintomas de ansiedade.

Desta forma, dependendo do contexto e do estado do organismo do indivíduo que a

consome, uma mesma substância pode ora ser considerada um reforçador positivo, ora negativo.

A influência do condicionamento pode ser estudada por meio de estudos experimentais

em modelos animais de auto-administração. Para maiores detalhes no assunto leia a seção

Modelos Animais ou o Capítulo de Psicologia Experimental.

DROGAS DE ABUSO E O CONDICIONAMENTO AO CONTEXTO

Sabe-se que em sujeitos dependentes de drogas diversos fatores podem desencadear ou

manter um padrão de recaída. As pistas ambientais têm um importante papel neste mecanismo,

tendo o potencial de eliciar o “craving” (ou fissura; definido como um intenso desejo pela droga)

e, conseqüentemente, reinstalar comportamentos de procura e consumo. Os estímulos ambientais

pareados com a droga, além de desencadear respostas subjetivas e autonômicas nos

dependentes, parecem produzir mudanças na ativação neural de determinadas estruturas

cerebrais.

A associação entre o contexto ambiental e os efeitos reforçadores podem ser estudados

em modelos experimentais animais através da técnica de preferência condicionada ao lugar

(CPP). Para maiores detalhes no assunto leia a seção Modelos Animais ou o Capítulo de Psicologia

Experimental.

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- 16 -

3.5 TOLERÂNCIA, SÍNDROME DE RETIRADA E SENSIBILIZAÇÃO

Um dos processos que parece contribuir de maneira importante na transição do consumo

moderado de drogas para o consumo abusivo são as alterações geradas no SNC pelo uso

repetido e crônico dessas substâncias. Essas alterações, ou adaptações, seriam geradas no

organismo como um mecanismo compensatório à presença constante da droga, de forma a

adaptar o funcionamento do organismo à situação “com droga”. É como se o organismo

estabelecesse um novo estado basal de funcionamento (que seria o estado com droga). Essas

adaptações não são decorrentes apenas dos efeitos psicofarmacológicos das drogas, mas

também dependem de fatores ambientais relacionados à droga e ao próprio estado psíquico do

indivíduo. Algumas dessas adaptações são a tolerância, síndrome de retirada e a sensibilização.

TOLERÂNCIA: é a necessidade de doses maiores para produzir um mesmo efeito inicial, ou o

inverso, uma mesma dose resultar em efeito inferior ao inicial. Por exemplo, para o efeito

analgésico da morfina ocorre uma forte tolerância após diversas administrações. Usada

como potente analgésico, a morfina sabidamente “perdia” seu efeito analgésico após o

uso prolongado, sendo necessárias doses cada vez maiores da droga para obter o mesmo

efeito inicial. Atualmente sabe-se que ao menos parte das adaptações responsáveis por

essa alteração de efeito ocorre no próprio SNC. É importante ressaltar que a “tolerância” é

um fenômeno que ocorre a um determinado efeito da droga e não à droga como um

todo. Por exemplo: os benzodiazepínicos produzem agudamente certo nível de sedação e

a este efeito sedativo ocorre tolerância com o uso repetido da droga. Já em relação aos

efeitos ansiolíticos dos benzodiazepínicos, não se observa tolerância (o que

terapeuticamente é vantajoso para essas drogas);

SÍNDROME DE RETIRADA: também denominada como síndrome de abstinência. É um conjunto

de sinais e sintomas psicológicos e fisiológicos decorrentes da retirada súbita da droga ou

administração de antagonistas dos receptores relacionados com as substâncias. Uma vez

retirada à droga, tem-se o início a ocorrência de uma série de sintomas, uma vez que o

organismo encontra-se em estado de desequilíbrio (já que estava acostumado à presença

da droga). Vale ressaltar que muitas das manifestações de retida são opostas aos efeitos

da droga;

SENSIBILIZAÇÃO: também denominada tolerância reversa, refere-se não a uma diminuição,

mas sim a uma potencialização de efeitos depois de repetidas exposições à droga, isto é,

doses menores passam a produzir efeitos relacionados com concentrações mais altas da

substância. Supõe-se que a potencialização do efeito euforizante das drogas ocorra em

paralelo a um aumento da sensibilidade do sistema de recompensa cerebral, ou seja,

como se os efeitos reforçadores da droga se tornassem cada vez mais salientes.

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- 17 -

4. MECANISMO DE AÇÃO FARMACOLÓGICA

As substâncias psicoativas podem ser classificadas didaticamente de diferentes formas.

Usualmente as mais utilizadas são: a Classificação dos Modificadores da Atividade Psíquica,

proposta por Lewin, a Classificação Geral das Substâncias Psicoativas, proposta por Delay e

Deniker, e a Classificação segundo Chaloult.

De forma resumida, de acordo com a Classificação dos Modificadores da Atividade

Psíquica, as substâncias são alocadas nos seguintes grupos: calmantes da vida psíquica, agentes

alucinógenos, substâncias embriagantes, hypnotica e estimulantes psíquicos. Já de acordo com a

Classificação Geral das Substâncias Psicoativas (revisada em 1980), a classificação é da seguinte

forma: psicolépticos (inclui os hipnóticos, tranqüilizantes, neurolépticos e timorreguladores),

psicoanalépticos (estimulantes do tônus mental, como estimulantes do humor e da vigilância),

psicodislépticos (“perturbadoras” do tônus).

Nesta apostila a classificação adotada baseia-se no modelo proposto por Chaloult em

1971. Esta classificação relaciona-se com os efeitos das substâncias, sendo a divisão em:

estimulantes, depressoras e alucinógenas. Nas próximas seções segue uma abordagem mais

detalhada quanto ao mecanismo de ação das principais drogas pertencentes a estas classes.

4.1 ESTIMULANTES

São drogas que de maneira geral aumentam a atividade do SNC, aumentando estado de

alerta, causando insônia, hiperexcitabilidade, redução do apetite, entre outros efeitos.

NICOTINA: princípio ativo com ação central e periférica derivada da planta Nicotiniana

tabacum. Esta planta é originária das Américas, sendo que sua administração pode ocorrer por

diferentes formas como: rapé (inalado), mascado, charutos e mais comumente, o cigarro.

FARMACOCINÉTICA: A queima do tabaco libera nicotina, a qual é facilmente absorvida por

via pulmonar ou por via mucosas da cavidade oral (charuto e cigarro). Ao tragar a fumaça, a

nicotina é absorvida pela circulação sanguínea, através do fluxo sanguíneo pulmonar, e com

extrema rapidez atinge o SNC. Um cigarro contém entre 1 e 6mg de nicotina, 20% disso é

absorvido pelo organismo. Um charuto contém de 15 a 40mg, porém como sua fumaça é em

geral retida na boca, em vez de tragada, a taxa de absorção é bem menor. A administração

aguda por via endovenosa de 60mg de nicotina pode causar a morte.

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- 18 -

EFEITOS NO ORGANISMO: A nicotina em baixas concentrações no SNC pode facilitar a atenção

e a memória. Porém, os efeitos estimulantes da nicotina são menos acentuados que os da

cocaína e da anfetamina, mas mais intensos do que os da cafeína. A nicotina produz

relaxamento da musculatura estriada, além de efeitos autonômicos resultantes da estimulação

inicial, seguida de bloqueio dos gânglios simpáticos e parassimpáticos. Pode também causar

náusea e vômito, por estimulação bulbar. Além disso, a nicotina produz efeitos sobre: ritmo

cardíaco, nível plasmático de ácidos graxos, coagulação, broncoconstrição, e menor saturação

de oxigênio. A exposição crônica às substâncias do cigarro pode favorecer a irritação e

inflamação das vias aéreas, enfisema e diferentes tipos de câncer.

MECANISMOS ESPECÍFICOS DE AÇÃO: A nicotina é um agonista total de receptores colinérgicos

nicotínicos. No SNC, os receptores nicotínicos relacionados com a liberação de DA na via de

recompensa parecem ser principalmente os pré-sinápticos. A ativação dos receptores nicotínicos

pela nicotina aumenta a liberação de DA no NAc. Esta ação parece estar relacionada com a

ativação dos receptores nicotínicos α4β2 e α7. Ao se fumar um cigarro, há uma liberação pulsátil

de nicotina no organismo. Inicialmente, os receptores nicotínicos em repouso são abertos pela

nicotina, o que leva à liberação de DA no NAc. Quando o cigarro termina, esses receptores ficam

dessensibilizados (deixam de funcionar por algum tempo) e ao retornarem novamente ao seu

estado de repouso, desencadeia-se a fissura e a síndrome de abstinência, uma vez que os níveis

de nicotina naturais no organismo não são suficientes para estimular a via dopaminérgica de

recompensa.

COCAÍNA: Em 1859, o cientista alemão Albert Niemann extraiu o alcalóide cocaína das

folhas de Erythroxylon coca. Este arbusto é natural das encostas andinas e regiões da Amazônia.

O conteúdo de alcalóide na planta varia de acordo com a espécie e da altitude em que é

cultivada; estas concentrações variam de 0,1% a 1,2%. A cocaína possui propriedades

estimulantes e chega ao usuário basicamente em três formas: o pó (cloridrato de cocaína), o

crack (cocaína + água + substância básica, ex.: bicarbonato de sódio ou soda caustica) e a

pasta ou merla (resíduo das primeiras fases da separação do pó). É bem absorvida pelas

membranas mucosas nasal, oral, intestinal e pelos pulmões. Também pode ser administrada por

via intravenosa (as concentrações no plasma sanguíneo são similares às do uso inalado). A

extração da cocaína é realizada em vários passos. O crack pode tanto ser originado diretamente

da folha da coca como do sulfato de cocaína (pasta de coca) ou do cloridrato de cocaína (pó).

Assim sendo, o crack nada mais é do que a cocaína na forma de base livre, sendo ele fumado,

enquanto o cloridrato é aspirado devido a diferenças intrínsecas da temperatura de sublimação

das substâncias.

FARMACOCINÉTICA: Na utilização intranasal a absorção da cocaína ocorre pelas membranas

nasofaríngeas, mas, por se tratar de uma substância vasoconstritora, limita sua própria absorção.

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A concentração máxima encontrada no plasma ocorre de 35 a 120 minutos após a

administração. Na administração pulmonar (crack e merla fumados) a velocidade de absorção

pode ser comparada com a via intravenosa, levando alguns minutos para atingir a circulação

sistêmica e o cérebro. O pico máximo de absorção é observado 6 a 8 minutos após a tragada. A

via intravenosa é uma rota mais longa para atingir o SNC, quando comparada a pulmonar. Esta

via demora porque a substância inicialmente faz o retorno venoso para, somente então atingir o

SNC.

EFEITOS NO ORGANISMO: Os efeitos agudos da cocaína podem ser compreendidos pelos itens

a seguir: euforia que frequentemente evolui para disforia, sensação de energia aumentada,

sensação de melhor funcionamento, aumento das percepções sensoriais, diminuição do apetite,

aumento da ansiedade, diminuição da necessidade de sono, diminuição do cansaço e fadiga,

aumento da autoconfiança, egocentrismo, delírios de cunho persecutório e sintomas gerais de

descarga simpática. No caso de uma overdose a cocaína pode matar seu usuário por exagero

dos efeitos fisiológicos produzidos pela droga. Estes efeitos letais seriam: infarto agudo de

miocárdio, arritmia cardíaca, hemorragia cerebral (AVC ou rompimento de aneurismas),

hiperpirexia (temperaturas acima de 42ºC), convulsões e parada respiratória. Durante o consumo

crônico de cocaína, ou mesmo após um binge, sintomas depressivos, desmotivação, sonolência,

paranóia e irritabilidade costumam ocorrer. Também podem ocorrer estados de psicose tóxica e

ataques severos de pânico. O desejo intenso de repetir o uso (fissura) devido aos aspectos

prazerosos da experiência do consumo de cocaína (crash), juntamente com os sintomas

depressivos de abstinência da droga, pode levar ao uso crônico compulsivo da cocaína.

MECANISMOS ESPECÍFICOS DE AÇÃO: É um inibidor dos transportadores de monoaminas (DA, NOR

e 5HT), com maior afinidade pelo transportador de DA (DAT). Agindo diretamente sobre o

transporte, ou recaptação, da DA liberada na fenda sináptica, a cocaína aumenta a

concentração sináptica deste neurotransmissor no NAc e em outras regiões, justificando o efeito

reforçador da droga. A inibição do DAT ocorre pela ligação da cocaína num sítio alostérico do

transportador (diferente do sítio de ligação da própria DA), o que leva a alterações

conformacionais no mesmo que impedem a ligação da DA. O mecanismo de ação das

anfetaminas é muito parecido com o da cocaína.

MDMA (ECSTASY): A MDMA (3,4-metilenodioximetanfetamina) é um derivado anfetamínico

com estrutura do tipo feniletilamina, que apresenta algumas propriedades farmacológicas

semelhantes aos estimulantes do SNC. Sua estrutura química também se assemelha à mescalina, o

que lhe confere efeitos que envolvem alterações de percepção sensorial (visual, tátil e auditiva).

FARMACOCINÉTICA: A principal via de administração do ecstasy é a oral, sendo os mais

comuns os comprimidos, tabletes e cápsulas. A MDMA sofre ampla distribuição pelos tecidos,

atravessando a barreira hematoencefálica. A meia-vida plasmática é de 6,7 horas, sendo

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necessárias de 6 a 8 meias-vidas para se obter a depuração completa da substância no

organismo. O metabolismo da droga é principalmente hepático e aproximadamente 65% da

droga é eliminada intacta pelos rins em 72h, mas a excreção dependerá do pH urinário.

EFEITOS NO ORGANISMO: Dentre os efeitos temos a alteração da percepção sensorial, euforia,

aumento da energia física, sensação de bem estar e sensação de proximidade e intimidade com

as pessoas. O uso frequente pode desencadear complicações como a neurodegeneração de

vias serotoninérgicas, perdas cognitivas e alguns transtornos psiquiátricos, como depressão e

transtorno de pânico. Em doses elevadas os efeitos incluem vômitos, ataxia, aumento da

acuidade para cores, alucinação visual, aumento de sensibilidade ao frio, dormência e

formigamento nas extremidades e hepatite tóxica. Em casos de overdose, reações como arritmia

cardíaca, taquicardia, palpitação, hipertermia, aumento do tônus muscular, insuficiência renal

aguda, hepatotoxicidade e morte podem ocorrer. Após repetidas doses pode-se apresentar

ataques de ansiedade e pânico, raiva, insônia persistente, psicoses e perda de peso.

MECANISMOS ESPECÍFICOS DE AÇÃO As principais vias de atuação do ecstasy são através da

influência sob as vias serotoninérgicas, noradrenérgicas e dopaminérgicas, incluindo uma

diminuição da recaptação destes neurotransmissores, consequente aumento dos níveis de 5-HT e

do ácido hidroxindolacético (5-HIAA) e uma redução na atividade da enzima

triptofanohidroxilase.

ANFETAMINAS: existem diversos tipos de anfetaminas, não havendo uma substância única

que as caracterize, no entanto, todas as substâncias sob este escopo são do grupo das

fenetilaminas. A primeira foi sintetizada em 1887 e estudada em relação a seus efeitos periféricos,

até que no início da década de 30, os primeiros efeitos no sistema nervoso central foram

relatados, sendo sua primeira versão comercial lançada na França. Seu uso é comumente

associado à diminuição da fadiga, aumento da vigília e diminuição do apetite. No Brasil, algumas

drogas deste grupo podem ser encontradas para uso terapêutico para tratamento do transtorno

do déficit de atenção e hiperatividade e narcolepsia, como o caso do metilfenidato (Ritalina®).

Desde 2011 a venda de anfepramona, femproporex e mazindol, ambos fármacos anorexígenos

feitos a base de anfetaminas, tiveram suas vendas proibidas pela Agência Nacional de Vigilância

Sanitária (ANVISA) uma vez que os benefícios de seus usos não serem superiores a seus riscos

(como os problemas cardíacos).

O abuso de anfetaminas é feito geralmente através da via oral (fumado), inalado ou

injetado. Por outro lado, o uso terapêutico é comumente feito por via oral (comprimidos). As

diferentes formas de administração estão diretamente relacionadas com a rapidez com que os

efeitos da substância são alcançados e de seu potencial reforçador. No uso oral, a

disponibilidade da droga é mais lenta, diminuindo seus efeitos reforçadores, porém no uso fumado

ou injetado, a anfetamina atinge picos de efeito muito mais rápidos, favorecendo os efeitos

reforçadores e consequentemente seu potencial de abuso.

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A metanfetamina, uma modificação da molécula de anfetamina, é utilizada como droga

de abuso, normalmente fumada, mas pode também ser aspirada ou injetada por via intravenosa.

Seu uso é mais comum em algumas regiões dos Estados Unidos e países asiáticos. Algum dos

nomes que identificam esta droga são ice, crystal ou meth.

Devido às diferentes substâncias enquadradas no escopo de anfetaminas, além das

versões ilícitas, que contêm misturas diversas, comumente utilizadas como droga de abuso, torna-

se difícil a definição do metabolismo e excreção exata das mesmas. A anfetamina possui uma

meia vida de 7 a 32 horas, mas esta depende do pH urinário. Sua excreção é renal e o

metabolismo é em grande hepático. A anfetamina é metabolizada em p-hidroxianfetamina e em

seguida a p-hidroxinorepinefrina. A duração dos efeitos decorrentes do uso de uma única dose

podem durar de 2 a 4 horas, sendo os efeitos residuais observados após períodos bem mais longos.

De maneira geral, a detecção do uso de anfetaminas pode se dar até dois dias através de

exames de urina.

Para fins facilitadores de explicação esta apostila optou por exemplificar a

farmacocinética e os efeitos no organismo a partir da substância metanfetamina. Porém, sempre

que cabível as diferenças serão ressaltadas.

FARMACOCINÉTICA: A metanfetamina é metabolizada no organismo para anfetamina, seu

principal metabólito ativo. Sua metabolização é hepática e a excreção renal, sendo esta

altamente influenciada pelo pH urinário. Sua biodisponibilidade varia de acordo com via de

administração: 90% quando fumada, 79% ao ser cheirada e 100% no uso intravenoso. Após

administração oral, o pico da concentração de metanfetamina ocorre entre 2,6 e 3,6 horas,

sendo sua meia vida de 10,1 horas, mas com considerável influência da variabilidade individual. A

partir do uso intravenoso sua meia vida se dá tardiamente (12,2 horas).

EFEITOS NO ORGANISMO: o uso de anfetaminas proporciona quadros de euforia, vigília

aumentada, diminuição do sono, taquicardia, midríase, elevação da pressão arterial, agitação

psicomotora, redução do apetite e aumento da atividade autonômica. Doses intoxicantes

podem causar efeitos como tremores, labilidade emocional, inquietação, irritabilidade, paranoia

e pânico. O uso de anfetaminas pode também causar quadros de hipertermia seguida de morte.

MECANISMOS ESPECÍFICOS DE AÇÃO: a anfetamina age basicamente de duas maneiras: a) ação

competitiva com a DA em seus transportadores (inibindo a recaptação); b) competindo com a

DA por seu transportador vesicular. No primeiro caso (a), a anfetamina ocupa sitio de ligação da

DA no seu transportador fazendo com que ela mesma seja transportada para o neurônio pré-

sináptico (aumentando a disponibilidade de DA na fenda). No segundo caso (b), a anfetamina

age sobre o transportador vesicular de DA. Consequentemente, a anfetamina ocupa o lugar

deste neurotransmissor dentro das vesículas sinápticas, favorecendo o aumento da concentração

intracelular de dopamina no neurônio pré-sináptico; resultando por fim na liberação de DA na

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fenda sináptica. Outro efeito como a inibição da enzima monoamina oxidase (responsável pela

degradação/metabolização) também pode ser observado em altas concentrações.

4.2 DEPRESSORAS

São as drogas que diminuem a atividade do SNC. Os principais efeitos destas drogas

envolvem a lentificação psicomotora e sonolência.

ETANOL: Todos os alcoóis possuem uma estrutura similar: um grupo hidroxila (−OH) ligado a

um carbono saturado. Existem inúmeros tipos de alcoóis, mas para fins de estudo do abuso de

álcool, nos deteremos no álcool etílico ou etanol, o princípio ativo das bebidas destiladas e

fermentadas.

FARMACOCINÉTICA: A forma de administração mais utilizada é a oral, visto que a principal via

de absorção é a gastrointestinal. Mas o etanol também pode ser absorvido pela pele ou pulmões.

Em alguns casos ele é injetado na circulação sangüínea ou ainda absorvido pela mucosa retal,

em casos de dependentes de etanol com problemas gastrointestinais, que os impossibilitem de

utilizar a via oral. A absorção do etanol ocorre com rapidez pelo estômago (local onde ocorre

20% da absorção) e intestino delgado (80%). Após a ingestão, a concentração plasmática

máxima é atingida entre 30 e 90 minutos.

EFEITOS NO ORGANISMO: O SNC é o órgão mais rapidamente afetado pelo etanol quando

comparado a qualquer outro órgão ou sistema. O etanol causa sedação, diminui ansiedade,

torna a fala pastosa, causa ataxia, diminuição da capacidade de julgamento e desinibição do

comportamento. O etanol, em pequenas doses ou nas doses iniciais, pode causar estimulação do

SNC através da liberação de catecolaminas. Podemos dividir em três fases gerais o uso nocivo do

etanol: período inicial - excitação e euforia, período médico-legal - turbulência e agressividade, e

período comatoso - “apagamento” do campo da consciência. Cronicamente, o etanol prejudica

todos os sistemas do organismo. No sistema hematológico, por exemplo, ocorre elevação do

volume corpuscular médio devido à deficiência de ácido fólico, podendo ocasionar anemia

megaloblástica, plaquetopenia e leucopenia, afetando o sistema imunológico. No sistema

gastrointestinal, pode provocar câncer, gastrite, úlceras (que podem gerar quadros de má

absorção), hepatite e cirrose. O câncer pode ocorrer na cavidade oral, esôfago, fígado,

pâncreas, cólon, reto e estômago. No sistema cardiovascular ocasiona miocardiopatia e

hipertensão. Além disso, temos as alterações no sistema endócrino/reprodutivo como a

diminuição do nível de ADH (hormônio anti-diurético), hipoglicemia, feminilização em homens,

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diminuição da libido e infertilidade. Além de carências nutricionais, lesões musculares e

dermatológicas.

MECANISMOS ESPECÍFICOS DE AÇÃO: Diferentemente da maioria das outras drogas, o etanol não

apresenta um único e claro mecanismo de ação. Ele pode agir simultaneamente e, dependendo

da dose utilizada, sobre diversos sistemas de neurotransmissão. Alguns dos efeitos conhecidos do

etanol são: potencialização da transmissão GABAérgica mediada pelos receptores GABAA

(haveria um sítio de ligação para o etanol no complexo-receptor GABAA); inibição da transmissão

glutamatérgica mediada pelos receptores NMDA; aumento da liberação de dopamina,

serotonina e peptídeos opióides na via mesolímbica. O aumento da liberação de dopamina pelo

etanol poderia ocorrer de maneira indireta, modulada pelos efeitos do etanol sobre os receptores

GABAA e NMDA (que modulam o funcionamento de neurônios dopaminérgicos mesolímbicos).

Contudo, há relatos de que o etanol seria capaz de estimular diretamente neurônios

dopaminérgicos da VTA.

OPIÁCEOS: De origem grega, a palavra ópio quer dizer suco. O ópio é o suco extraído da

papoula, Papaver somniferum. Ele é formado por uma série de substâncias químicas dotadas de

potentes efeitos farmacológicos. De todas estas substâncias, a mais conhecida e utilizada na

terapêutica é a morfina, cujo nome é derivado de Morfeu, o deus dos sonhos na mitologia grega.

São opióides naturais a codeína e a morfina; semi-sintéicos: a heroína; sintéticos: metadona,

propoxifeno fentanil e outros. São substâncias que produzem analgesia e induzem o sono. A dupla

ação farmacológica - analgésico e hipnótico - fez com que recebessem também a

denominação de hipnoanalgésicos ou narcóticos. A heroína é o opióide mais associado aos

casos de dependência. É considerada a droga mais euforizante da classe dos hipnoanalgésicos.

FARMACOCINÉTICA: São rapidamente absorvidos nas vias oral, pulmonar e mucosa nasal. As

vias intravenosa, intramuscular e subcutânea são usadas principalmente para potencializar e

acelerar os efeitos.

EFEITOS NO ORGANISMO: Os opióides são altamente geradores de reforço, principalmente

quando administrados por via intravenosa. Minutos após a administração da droga, uma série de

sensações que lembram um orgasmo, seguidos de sensação de flutuação, euforia e bem-estar

podem ser observados. Fisicamente podem ocorrer: rubor da pele, diminuição do ritmo

respiratório, analgesia, vômitos, constipação, constrição da pupila, perda do apetite, fala

arrastada, hipotensão ortostática e mucosas secas. Com o uso crônico, pode-se desenvolver

acentuada tolerância (ver seção de Neurobiologia) e doses cada vez maiores são necessárias

para conseguir a euforia. A tolerância é seletiva, sendo que os efeitos de miose e constipação se

alteram pouco durante o uso continuado, enquanto os demais efeitos (analgésico, euforizante e

depressor respiratório) apresentam acentuado grau de tolerância. Em poucos meses a

interrupção de um uso contínuo pode desencadear a síndrome de abstinência, que pode ser

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muito intensa: vômitos, diarréias, cólicas e piloereção. Além disso, o usuário pode apresentar um

quadro de prisão de ventre crônica, má digestão e visão prejudicada (devido à miose).

MECANISMOS ESPECÍFICOS DE AÇÃO: A morfina e outras drogas opiáceas atuam como agonistas

de receptores opióides, especialmente dos receptores µ (“mi”). A ativação de receptores µ leva à

inibição de neurônios GABAérgicos (inibitórios) que estariam inibindo os neurônios dopaminérgicos

mesolímbicos, causando assim uma “desinibição” dopaminérgica, levando à maior liberação de

dopamina na via mesolímbica.

BENZODIAZEPÍNICOS (BZD)/ BARBITÚRICOS (BBT): Utilizados na prática médica há muitos anos no

tratamento de transtornos de ansiedade e sono, essas duas classes de medicamentos muitas

vezes tem sua função médica desviada para o uso recreativo e abuso. Essas drogas apresentam

uma segurança comprovada quando utilizadas segundo a prescrição, porém a utilização de

maneira errônea ou associada a outras drogas de abuso elevam seus riscos de causar

dependência. Dentre os remédios dessas classes mais abusados são o Diazepan (Valium),

Alprazolan (Xanax) e Gardenal (Fenobarbital). A grande problemática envolvida com esses

medicamentos se dá pela falta de controle de uso e administração. Uso de medicamentos de

outras pessoas, uso de doses maiores ou de maneira diferente da prescrita e uso para outros

propósitos além do prescrito representam algumas das maneiras de como esses medicamentos

são abusados.

FARMACOCINÉTICA: BZD são administrados por via oral e BBT pela via oral, injeções

intramusculares ou intravenosas, e retalmente. Por apresentarem uma alta lipossolubilidade se

difundem para o SNC rapidamente exercendo seus efeitos fisiológicos. Estas duas classes de

medicamentos apresentam diferentes períodos de meia-vida e são classificados por essa

característica em: curto (inferior a 5 horas), intermediário (entre 6 e 12 horas) e longo (mais de 12

horas).

EFEITOS NO ORGANISMO: Dentre os principais efeitos dos BZD destacam-se a redução da

ansiedade, relaxamento muscular, redução do estado de alerta e indução de sono. Os BBT

induzem depressão do SNC podendo causar efeitos sedativo, anestésico e indução de sono. O

uso crônico desses medicamentos pode causar sonolência, vertigem, problemas de sono, dor de

cabeça e tolerância. Quando associados a outras drogas depressoras como álcool ou opiáceos

podem induzir a overdose e morte.

MECANISMOS ESPECÍFICOS DE AÇÃO: Tanto os BZD quanto os BBT atuam sobre o sistema

GABAérgico (receptores GABA). Eles modulam alostericamente este receptor de maneiras

específicas, mas que resultam em um aumento do influxo de cloro para o neurônio. Os BZD

aumentam a afinidade do receptor pelo GABA e a frequência (probabilidade) de abertura dos

receptores e os BBT aumentam o tempo de abertura desses canais.

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INALANTES: Muitos inalantes são solventes, mas nem todo solvente é inalante e vice-versa.

Solventes são substâncias capazes de dissolver outras e inalantes são todas as que podem ser

inaladas. Assim sendo, óxido nitroso é inalante, mas não é solvente. Em termos gerais, os inalantes

são substâncias que contêm em sua formulação hidrocarbonetos alifáticos, halogenados e

aromáticos como: benzeno, acetona, butano, hexano, querosene, éter, cloreto de etila, entre

outros. Os solventes são substâncias altamente voláteis que possuem a capacidade de promover

uma depressão não seletiva do SNC. No Brasil, as principais substâncias do grupo dos solventes

são: loló (mistura de clorofórmio e éter etílico); tiner (hexano); cola de sapateiro (tolueno) e

gasolina.

FARMACOCINÉTICA: São inaladas, ou seja, introduzidos no organismo através do nariz ou da

boca. Os efeitos produzidos pelos inalantes ocorrem segundos ou minutos após sua inalação. Eles

são rapidamente absorvidos através da parede alveolar do pulmão e distribuídos pela corrente

sanguínea. Atravessam facilmente a barreira hematoencefálica devido à sua natureza lipofílica,

tendendo, por esta razão, a acumular-se no tecido cerebral.

EFEITOS NO ORGANISMO: A inalação destas drogas altera a percepção, induzindo estados

hilariantes, vertigens, tonturas e alucinações. Como efeitos somáticos agudos destacam-se o

aumento da sensibilidade do coração à adrenalina, fotofobia, espirros, tosse, vômito e diarréia.

Cronicamente pode provocar lesões na medula óssea, nos rins, no fígado e nos nervos periféricos

(perda da força muscular).

MECANISMOS ESPECÍFICOS DE AÇÃO: Os solventes agem, de maneira geral, potencializando a

transmissão GABAérgica mediada pelos receptores GABAA.

4.3 PERTURBADORAS

Também conhecidas como drogas psicodislépticas ou alucinógenos, as drogas

perturbadoras são as que afetam o pensamento, a percepção e o humor. Os efeitos principais

ocorrem devido a alterações no funcionamento cerebral que resultam em vários fenômenos

psíquicos anormais. Esses fenômenos são parecidos aos que ocorrem em doenças mentais como

as psicoses (daí o motivo de se chamarem psicoticomiméticas). Esses perturbadores induzem

alucinações, delírios e ilusões.

MACONHA: A Cannabis sativa, também conhecida como cânhamo ou maconha, é uma

planta dióica que cresce em quase todos os tipos de solo. É nas inflorescências da planta feminina

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- 26 -

que se concentra o principio ativo. Os efeitos centrais da maconha são originados pelos

canabinóides, dos quais o mais importante é o Δ9 – tetraidrocanabinol (ou Δ9-THC). O Δ9-THC

atua principalmente no SNC, produzindo uma série de efeitos, além de vários outros efeitos

periféricos.

FARMACOCINÉTICA: A maconha pode ser administrada por via oral (alimentos e bebidas) ou

pulmonar (cigarro de maconha - “baseado”, “bongs” e vaporizadores). A absorção pulmonar de

Δ9-THC é muito rápida e minutos após a primeira tragada já é possível se detectar a presença de

THC no sangue e percepção dos efeitos subjetivos.

EFEITOS NO ORGANISMO: Muitos dos efeitos da maconha são subjetivos, ou seja, dependem,

além da dose, do indivíduo, de experiências anteriores, das pessoas que formam o grupo e seus

comportamentos, do ambiente, da expectativa e objetivos da reunião na qual ocorre o consumo

da substância. Quando usada individualmente, ou seja, o usuário estando sozinho, a maconha

produz sensação de sonolência, introspecção e apatia. Já em grupos, reuniões, os primeiros

sintomas constam de sensação de bem-estar, euforia, hilaridade, loquacidade e estados oníricos.

São observados os seguintes efeitos psicológicos agudos de maneira geral: período inicial de

euforia seguido de relaxamento e sonolência; perda da discriminação de tempo e espaço;

coordenação motora diminuída; prejuízo da memória recente; falha nas funções intelectuais e

cognitivas; retardo na capacidade de percepção sensorial, intensificando as sensações, os

sentidos e exagerando a sensibilidade; reações psicóticas com idéias paranóicas (altas doses).

Observam-se relatos de náusea, redução da produção de saliva, diminuição da força muscular,

taquicardia, hipotermia, hiperemia das conjuntivas, aumento do apetite e da gustação. Efeitos

crônicos refletem alterações de aprendizagem e memória, podendo estar associados a um

estado de amotivação conhecido como “Síndrome Amotivacional”. Em termos físicos, o uso

crônico da maconha pode acarretar bronquite e maior incidência de câncer de pulmão.

MECANISMOS ESPECÍFICOS DE AÇÃO: Seu princípio ativo, Δ9-THC, age sobre receptores

canabinóides no SNC e perifericamente. A ativação dos receptores canabinóides (principalmente

os CB1) nas regiões do sistema mesocorticolímbico pode levar a um aumento na liberação de DA

no NAc.

LSD25: A dietilamida do ácido lisérgico (LSD25) é uma substância sintética, porém originada

do fungo Claviceps purpurea. Trata-se de um líquido incolor, colocado em algum material para

ser ingerido (selos, doces, bebidas). Os efeitos do LSD25 são imprevisíveis. Dependem da

quantidade ingerida, personalidade do usuário, humor e expectativas.

FARMACOCINÉTICA: A absorção se dá por via oral e é rápida. Os efeitos aparecem cerca de

30 minutos após a ingestão e duram aproximadamente 6 horas.

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EFEITOS NO ORGANISMO: O LSD25 produz fenômenos alucinatórios. As sensações, apesar de

ilusórias, são "reais" para o usuário, provocando dor, prazer, medo, ansiedade, entre outras. Além

disso, o LSD25 provoca uma modificação na percepção de tempo, espaço, sensações do próprio

corpo e despersonalização (a pessoa não sabe mais quem ou o que é). O usuário pode ter "uma

viagem boa" (good trip) e ver formas coloridas ou uma “viagem ruim" (bad trip) com crises

depressivas e sentimentos de perda de controle. Pode ocorrer também sinestesia, provocando

sensações como ouvir uma cor, ver um som, ou seja, as sensações auditivas se traduzem em

imagens e as imagens se traduzem em sons. Seus efeitos incluem pupilas dilatadas, alteração da

temperatura corporal, aumento dos batimentos cardíacos e da pressão arterial, sudorese, perda

de apetite, falta de sono, boca seca e tremores. Mesmo doses muito altas de LSD25 não chegam a

intoxicar seriamente uma pessoa, do ponto de vista físico. Mas, o uso crônico de LSD25 pode levar

ao aparecimento de flashbacks. Este fenômeno ocorre após algum tempo (semanas, meses ou

anos) depois do uso de LSD25. É um fato de causa desconhecida que leva a pessoa,

repentinamente, a ter todos os sintomas psíquicos da experiência anterior, sem ter tomado de

novo a droga. O flashback pode ainda ser desencadeado por cansaço, intoxicação alcoólica ou

pelo uso abusivo de maconha.

MECANISMOS ESPECÍFICOS DE AÇÃO: O LSD25 é um alucinógeno indólico que age como agonista

de alguns receptores de monoaminas, especialmente os receptores serotonérgicos do tipo 5-HT2.

Esses receptores serotonérgicos também parecem de alguma forma regular a liberação de

dopamina mesolímbica.

5. TRATAMENTOS

O tratamento da dependência de drogas de abuso pode levar em consideração diversas

abordagens. A escolha do tratamento depende de diversos fatores, sendo alguns deles: o perfil

do dependente, a substância e o tempo de uso. As estratégias de tratamento devem ser bem

avaliadas, uma vez que a ocorrência de comorbidades (doenças correlacionadas) compromete

a eficácia das diferentes modalidades de intervenção. A apostila irá abordar de forma separada

as formas de intervenção.

5.1 TRATAMENTOS FARMACOLÓGICOS

De maneira geral, há medicamentos que podem auxiliar no tratamento da dependência

de drogas, atuando nos seguintes processos: supressão da fissura (craving); alívio dos sintomas de

retirada e das comorbidades (síndrome de abstinência), e por fim na redução do comportamento

de procura da droga, diminuindo o risco de recaída e reinstalação do consumo regular de

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- 28 -

drogas. Infelizmente, as medicações estudadas até o momento não preenchem simultaneamente

todas essas características. A seguir segue a descrição de alguns dos tratamentos farmacológicos

mais utilizados.

5.1.1 ÁLCOOL

O tratamento da síndrome de dependência do álcool envolve diferentes abordagens

farmacológicas. A primeira delas é chamada medicação de suporte e preventivos. Nela inclui-se

o uso de: multivitamínicos (com a finalidade de tratar a desnutrição grave resultante do uso

crônico do álcool), neurolépticos (para casos de alucinações), antieméticos (na ocorrência de

náusea e vômitos) e sulfato de magnésio (para histórico de convulsões). Alguns outros fármacos

são utilizados com a finalidade de tratar a síndrome de abstinência como os benzodiazepínicos,

anticonvulsivantes e β bloqueadores (para minimizar efeitos simpáticos).

Outra abordagem utilizada são os tratamentos aversivos. O mais difundido é através do

uso de dissulfiram. Esta droga inativa irreversivelmente a enzima (álcool-desidrogenase)

responsável pela degradação do acetaldeído (tóxico para o organismo). Com isso ocorre o

acúmulo deste composto, sendo os sintomas associados: rubor facial (progressivo para o corpo

todo), cefaléia latejante, dificuldades respiratórias, náuseas, vômitos, sudorese, etc. O efeito pode

durar de minutos a várias horas e, em casos de ingestão de grande quantidade de álcool, podem

ocorrer confusão mental e síncope. O tratamento se baseia em uma associação aversiva do

consumo do álcool com os sintomas provocados pelo dissulfiram, o que poderia levar o

dependente a uma redução no consumo. Este tratamento é bastante criticado atualmente,

principalmente quando utilizado sem o acompanhamento de profissionais.

Por fim, há tratamentos com o foco na redução da compulsão pelo álcool, sendo um

exemplo o Naltrexone. Este fármaco é um antagonista de receptores opióides. Os estudos com

esta droga demonstram que, quando associado à psicoterapia, ele pode ser efetivo no

tratamento de dependentes de álcool para a redução de dias bebidos, doses e frequência de

recaídas. Há fatores, principalmente genéticos, que parecem aumentar a eficácia deste

medicamento.

5.1.2 OPIÓIDES

A droga de uso clássico no tratamento da dependência de opióides é a metadona, um

analgésico sintético. Esta droga tem sido mais utilizada como terapia de manutenção no

Page 28: Apostila 3 - 2013

- 29 -

tratamento da dependência de opióides. Esta intervenção consiste em uma abordagem

ambulatorial, na qual o paciente, já estabilizado, comparece à unidade de tratamento em dada

freqüência para tomar a medicação e obter acompanhamento do quadro de dependência.

A administrada nas doses recomendadas de metadona resulta em redução do craving e

dos sintomas de abstinência. Estes efeitos duraram cerca de 24 e 36h com ausência de euforia,

sedação ou analgesia.

Outra abordagem farmacológica baseia-se no uso do agonista opióide parcial

buprenorfina. Esta medicação oferece uma alternativa ao tratamento clássico com metadona,

por apresentar uma meia-vida mais prolongada (entre 46 e 48h) e um perfil farmacológico mais

seguro.

5.1.3 NICOTINA

O tratamento para a dependência de nicotina pode ser feito através do uso de três

classes diferentes de medicamentos, cada um com um objetivo/mecanismo de ação específico.

A primeira intervenção é terapia de reposição de nicotina (NRT), a qual tem como objetivo

fornecer nicotina de uma forma segura ao organismo para contornar os sintomas da síndrome de

abstinência. A nicotina pode ser disponibilizada por meio de adesivos transdérmicos, gomas de

mascar e spray nasal. Sua efetividade muitas vezes é comprometida devido ao mau uso/uso

inadequado dos medicamentos.

Um segundo medicamento utilizado é a bupropiona, um antidepressivo inibidor da

recaptação de NOR e DA. Com o aumento da concentração desses neurotransmissores ocorre

melhora dos sintomas relacionados com a retirada da droga e redução do craving.

Por fim, utiliza-se também a terapia com a vareniclina, um agonísta parcial dos receptores

nicotínicos α4β2. Este medicamento ao ativar os receptores nicotínicos reduz os sintomas de

abstinência, porém compete com a nicotina (agonísta total) impedindo seu efeito total. A terapia

com vareniclina mostra-se eficaz para a redução da fissura, mas seu uso tem sido relacionado

com efeitos adversos neuropsicológicos, como depressão e ideação suicida.

Page 29: Apostila 3 - 2013

- 30 -

5.2 TRATAMENTO NÃO FARMACOLÓGICO

5.2.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS

O abuso de drogas quanto a sua dependência são multidimensionais, interferindo em

diversas áreas da vida, tais como familiar, social, física, emocional, financeira e espiritual, que

comprometem o processo de recuperação do paciente. Por isso, o tratamento deve incluir um

conjunto de técnicas e abordagens que favoreçam a redução ou abstinência do consumo, a

reinserção social, melhora da qualidade de vida e do funcionamento ocupacional em qualquer

uma das áreas afetadas. Importante enfatizar que, devido à complexidade da doença, não há

um único modelo eficaz, e, em geral, os melhores resultados são obtidos através da combinação

entre eles. Dessa forma, tratamentos que utilizem abordagens transdisciplinares são indicadas.

Para que o tratamento seja efetivo, o National Institute on Drug Abuse (NIDA) estabeleceu

13 princípios que devem ser seguidos:

1) Nenhum tratamento é efetivo para todos os pacientes;

2) O tratamento necessita ser facilmente disponível;

3) O tratamento deve atender às várias necessidades e não somente ao uso de drogas;

4) O tratamento necessita ser constantemente avaliado e modificado de acordo com as

necessidades do paciente;

5) Permanecer em tratamento por período adequado é fundamental para a efetividade;

6) Aconselhamento e outras técnicas comportamentais são fundamentais para o

tratamento;

7) Medicamentos são importantes, principalmente quando combinados com terapia;

8) A comorbidade deveria ser tratada de forma integrada;

9) Desintoxicação é só o começo do tratamento;

10) O tratamento não necessita ser voluntário para ser efetivo;

11) A possibilidade de uso de drogas deve ser monitorada;

12) Avaliação sobre HIV, hepatites B e C e aconselhamento para evitar esses riscos;

13) Recuperação é um processo longo e que muitas vezes necessita de vários episódios de

tratamento;

5.2.2 AVALIAÇÃO

A avaliação deve considerar todos os aspectos biopsicossociais do indivíduo e tem como

objetivo: estabelecer aliança terapêutica que favoreça a adesão ao tratamento; compreender o

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- 31 -

contexto em que a dependência se instalou bem como identificar os fatores que levaram a este

quadro; identificar fatores que mantém a dependência e também os que favoreçam a

abstinência; além de reunir condições para estabelecer a hipótese diagnóstica.

Para a elaboração do plano de tratamento, o diagnóstico deve ser clínico, motivacional,

psiquiátrico, neuropsicológico, entre outras próprias de cada área profissional (enfermagem,

assistente social, terapeuta ocupacional, psicólogo, etc.).

5.2.3 MOTIVAÇÃO

Para se estabelecer metas terapêuticas, é importante identificar qual a disponibilidade e a

prontidão do indivíduo para a mudança e, consequentemente, para o tratamento. De maneira

didática, a motivação foi descrita em estágios (Quadro 3/drogas) por Prochaska e DiClemente, e

diferentes tipos de abordagens e de postura do profissional deverão ser utilizadas em cada

estágio.

Entretanto, esses estágios não são rígidos, e a motivação do indivíduo pode transitar entre

as diferentes fases de maneira mais rápida ou mais lenta, conforme sua evolução e episódios de

lapsos (retorno do consumo após período de abstinência é pontual) ou recaídas (retorno ao

consumo e padrões de comportamento associado).

QUADRO 3: Estágios de Motivação para a Mudança

Pré-Contemplação: A mudança não é cogitada pelo indivíduo e ele não vê seu

comportamento como sendo problemático. Bastante resistente à qualquer orientação.

Ausência de ambivalência

Contemplação: Começa a estabelecer uma conexão entre seus problemas e os

comportamentos e começa a refletir sobre a necessidade de mudar, avaliam custo X

benefício de maneira mais realista. Ambivalência bastante presente.

Preparação: Reconhecimento do problema e compromisso com a mudança. Formulação

de plano a curto prazo, tais como pedir ajuda e iniciar desintoxicação. Ambivalência

menos presente.

Ação: Início efetivo das estratégias para mudança, há interrupção do consumo, mais

aberto e disposto para orientações terapêuticas. Ambivalência menos presente.

Manutenção: Pacientes que tiverem sucesso na fase de “ação” passam para a fase de

manutenção, caracterizada pela abstinência e reconstrução de um estilo de vida

saudável.

Page 31: Apostila 3 - 2013

- 32 -

5.2.4 TÉCNICAS E ABORDAGENS PSICOTERAPÊUTICAS MAIS UTILIZADAS

INTERVENÇÃO BREVE (IB): Prática bem estruturada, focal, objetiva e de tempo limitado

(variado de 5 a 30 minutos), cujo foco é a mudança de comportamento do paciente ao

ajudar no desenvolvimento de sua autonomia e fornecer capacidade de assumir iniciativa

e responsabilidade pelas escolhas. Pode ser feita por profissionais de diversas áreas de

formação, e está mais relacionada com os níveis de prevenção primária e secundária,

sendo mais direcionada para uso abusivo ou de risco. Por não contemplar muitos aspectos

envolvidos nos casos de dependência, para esses casos indica-se encaminhamento para

serviços especializados. Objetiva a identificação da presença de um problema, sugerir

estratégias para favorecer a mudança, e pode ser utilizada para prevenir ou reduzir o

consumo de drogas e os problemas associados. Metas são estabelecidas individualmente.

Possui 6 elementos como princípios, que podem ser identificados como FRAMES: Feedback

(devolutiva); Responsabilidade; Aconselhamento; Menu de opções; Empatia e Self-Efficacy

(auto-eficácia).

TERAPIA COGNITIVO COMPORTAMENTAL (TCC): Integra técnicas e conceitos derivados das teorias

cognitiva e comportamental de maneira semiestruturada, objetiva e orientada para

metas. Parte do pressuposto que cognição, pensamentos e emoções são responsáveis por

fatores precipitadores ou mantenedores do comportamento, focando principalmente em

crenças negativas sobre o eu, pensamentos automáticos e crenças facilitadoras

relacionadas ao consumo de substâncias. Busca identificar e corrigir estas distorções

cognitivas e auxiliar no desenvolvimento de estratégias de enfrentamento das situações de

risco para os objetivos determinados no plano terapêutico. Também trabalha com a

motivação do paciente para a mudança, auxiliando-o a trabalhar sua ambivalência.

Dentre as técnicas aplicadas incluem-se os registro de pensamentos automáticos, análise

de vantagens e desvantagens, diário de auto-monitoramento, relaxamento, ensaio

comportamental, manejo de contingências, desenvolvimento de planos de

enfrentamento, técnicas para manejo da fissura e de emoções, desenvolvimento da

assertividade e resolução de problemas.

TERAPIA MOTIVACIONAL: É uma abordagem centrada no indivíduo. Sofre influência das

abordagens de aconselhamento centrado no paciente, terapia cognitivo-comportantal,

teoria sistêmica e psicologia social. Promove aconselhamentos fundamentados em

conceitos de motivação, ambivalência e prontidão para mudança, buscando aumentar

a motivação para a mudança do comportamento, resolução e exploração da

ambivalência, supressão de comportamentos disfuncionais e desenvolvimento de padrões

mais adaptativos. Tem como enfoque a postura do profissional, que deve ter como

atitudes preponderantes a colaboração, evocação e respeito pela autonomia do cliente,

através de um diálogo colaborativo.

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- 33 -

Possui 3 estilos de comunicação com o paciente (acompanhar, direcionar e orientar) e 4

princípios norteadores, sendo estes últimos:

o Resistir ao impulso natural do profissional de dissuadir o paciente a abandonar seu

comportamento em decorrência das consequências negativas, pois devem partir

do mesmo;

o Entender e explorar as razões intrínsecas para mudança do paciente;

o Escutar com empatia;

o Fortalecer o indivíduo, auxiliando-o a estabelecer estratégias de mudanças

significativas em sua vida.

Além disso, sua metodologia envolve fazer perguntas abertas, favorecer a reflexão, reforço

positivo e resumo dos assuntos discutidos para auxiliar sua compreensão.

PREVENÇÃO DE RECAÍDA: A incidência de recaída é alta durante o processo de tratamento, e

o profissional não deve traduzir como fracasso de tratamento, mas sim como um processo

natural que pode ser direcionado para revisão, aprendizado, fortalecimento das

estratégias terapêuticas e prevenção de futuras recaídas.

O modelo de prevenção de recaída foi construído a partir do referencial cognitivo-

comportamental e nos princípios de aprendizado social. Envolve um conjunto de técnicas

e estratégias de enfrentamento que ensinem o paciente a lidar com as situações de risco

e estados emocionais que possam resultar em uma recaída, e tais como conscientização

do problema, treinamento de habilidades de enfrentamento e modificação do estilo de

vida.

Figura 4: Modelo cognitivo-comportamental do processo de recaída. Fonte: livro dependência química –

prevenção, tratamento e políticas públicas

Page 33: Apostila 3 - 2013

- 34 -

5.2.5 OUTRAS TÉCNICAS E ABORDAGEM TRANSDISCIPLINAR

Além das técnicas mencionadas acima, existem outras que podem ser empregadas no

tratamento de dependência química. São elas: abordagem grupal, terapia familiar, terapia de

rede social e de 12 passos, e redução de danos.

Conforme a complexidade da doença, diversas áreas profissionais devem se integrar para

alcançar o sucesso no tratamento. Assim, a equipe profissional, que em sua maioria pode ser

formada por médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, terapeutas ocupacionais,

nutricionistas, educadores físicos e pedagogos, deve ter uma boa interação e comunicação,

somando suas práticas para lidar com as demandas do dependente. Podem ser realizadas ainda

oficinas terapêuticas e profissionalizantes, orientações voltadas às diferentes áreas ocupacionais,

grupos psicoeducacionais, orientação social, desenvolvimento da cidadania, estabelecimento de

rede de suporte, prática de atividade física, orientação judicial, entre diversos outros, para assim

alcançar os objetivos determinados no plano terapêutico de cada paciente.

6. POLÍTICAS PÚBLICAS

Política pública pode ser definida como uma série ou um conjunto de ações desenvolvidas

ou fomentadas pelo Estado em seus diversos níveis (federal, estadual e municipal). Através de

uma política pública, busca-se o alcance de objetivos específicos relacionados a problemas ou

demandas dos indivíduos ou de determinados setores da sociedade. Funciona como norte,

ditando diretrizes e prioridades que devem ser seguidas pelas organizações governamentais e não

governamentais (privadas). Uma política pública sobre drogas deverá contemplar às diversas e

complexas questões da área, com especial atenção aos indivíduos inclusos em sua sociedade.

6.1 POLÍTICAS PÚBLICAS SOBRE DROGAS NO BRASIL

No Brasil, a primeira regulamentação sobre o tema Drogas ocorreu em 1938, através do

Decreto-Lei nº 891/38, conceituando o uso por uma concepção criminalizadora. No curso da

história, alterações legislativas culminaram na Lei 6368/76, estabelecida durante a ditadura militar,

que criminalizava o porte de drogas, sem diferenciar usuário de traficante.

Em 1993, foi criada a Secretaria Nacional de Entorpecentes, seguida da criação dos

Conselhos de Entorpecentes (Nacional, Estaduais e Municipais). Mais tarde, em junho de 1998,

Page 34: Apostila 3 - 2013

- 35 -

seria então criada a Secretaria Nacional Antidrogas – SENAD, órgão este vinculado ao Gabinete

de Segurança Institucional da Presidência da República. Posteriormente, a SENAD teve seu nome

modificado para Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas.

A SENAD se torna assim o órgão responsável por articular, coordenar e integrar as ações

intersetoriais do governo nesta área. Após a realização do I Fórum organizado pela referida

entidade, a Política Nacional Antidrogas foi instituída em agosto de 2002. Em 2005, após

alterações de conteúdo e nomenclatura, aprovou-se a Política Nacional sobre Drogas (PNAD).

Entre os pressupostos da PNAD, destacam-se a busca pelo reconhecimento das diferenças

entre o usuário, a pessoa em uso indevido, o dependente e o traficante de drogas e,

consequentemente, tratamento diferenciado; priorização da prevenção do uso indevido de

drogas, por sua eficácia e menor custo social; garantia do tratamento adequado a toda pessoa

com problemas decorrente do uso de drogas; e o incentivo para a pesquisa, experimentação e

implementação de novos programas, projetos e ações em seus principais eixos.

A PNAD conta com alguns eixos principais que pautam seus objetivos e ações, sendo estes:

(1) prevenção; (2) tratamento, recuperação e reinserção social; (3) redução de danos

sociais e à saúde; (4) redução da oferta; (5) estudos, pesquisas e avaliações.

6.2 LEGISLAÇÃO

As políticas públicas sobre drogas influenciam a elaboração de leis e regulamentos sobre o

tema. Um exemplo desta influência é a Lei nº 11.343/2006 que traz como mudanças às Leis

anteriores: a exclusão da pena restritiva de liberdade para usuários e dependentes de drogas,

diferenciação do tratamento entre usuário/dependente de drogas e o traficante; porte da droga

continua caracterizado como crime, mas usuários não estarão mais sujeitos à pena restritiva de

liberdade, mas sim a medidas sócio-educativas aplicadas pelos juizados especiais criminais. Ficou

estabelecido também o fim do tratamento obrigatório para os dependentes, existente na

legislação anterior.

Importante frisar a existência do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) desde 1990,

que proíbe vender, fornecer ou entregar, à criança ou ao adolescente, produtos cujos

componentes possam causar dependência física ou psíquica. Dessa forma, tem-se como ilegal a

venda de bebidas alcoólicas e cigarros para menores de 18 anos. Recentemente, seguindo

princípio da Política Nacional sobre o Álcool, o Estado de São Paulo estabeleceu política de maior

controle dos estabelecimentos para que estes não vendam bebidas para menores, incluindo a

elaboração de penas mais severas a tais locais.

Page 35: Apostila 3 - 2013

- 36 -

6.3 POLÍTICAS ESPECÍFICAS SOBRE CADA DROGA

ÁLCOOL: a Política Nacional sobre o Álcool (2007) dispõe sobre as medidas para redução

do uso indevido de álcool e sua associação com a violência e criminalidade. Um exemplo é a

difusão da alteração promovida no Código de Trânsito Brasileiro. A Lei 11.705 (19 de junho de

2008) tem a finalidade de estabelecer nível de alcoolemia e impor penalidades mais severas para

o condutor que dirigir sob a influência do álcool. A direção sob a influência de álcool ou de

qualquer substância psicoativa que determine dependência resultará em infração gravíssima,

multa e suspensão do direito de dirigir por 12 meses, bem como retenção do veículo até a

apresentação de condutor habilitado e recolhimento do documento de habilitação. Para casos

de teste de alcoolemia cuja concentração de álcool por litro de sangue seja igual ou superior a 6

(seis) decigramas, estará tipificado um crime de trânsito e o motorista infrator estará sujeito à

prisão. Tal fato tem gerado constantes recusas por parte dos motoristas que se encontram sob

efeito do álcool a realizarem o teste. Ao recusar, o motorista estará sujeito apenas às penalidades

administrativas e não criminais.

TABACO: um dos marcos de restrição ocorre no ano de 2000, através da Lei n.º 10.167 que

restringe a publicidade de produtos derivados de tabaco, proibindo a veiculação em revistas,

jornais, televisão, rádio e outdoors. A partir de então, novas restrições começam a ocorrer e, em

2009, o governo do Estado de São Paulo institui a Política Estadual para o Controle do Fumo, que

proíbe o consumo em ambientes de uso coletivo, total ou parcialmente fechados. Outros Estados,

como o Rio de Janeiro e o Paraná, adotaram o mesmo modelo restritivo.

CRACK: Em maio de 2010, através de Decreto, o governo Federal institui o Plano Integrado

de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas, com vistas à prevenção do uso, ao tratamento e à

reinserção social de usuários, e ao enfrentamento do tráfico de crack e outras drogas ilícitas.

AYHUASCA: Também em 2010, através de Resolução, o Governo Federal respeita as

decisões do CONAD (Conselho Nacional de Política sobre Drogas) sobre normas e procedimentos

compatíveis com o uso religioso da Ayahuasca e dos princípios deontológicos que o informam,

possibilitando assim o seu uso dentro do contexto religioso.

6.4 ELABORAÇÃO E AVALIAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA SOBRE DROGAS

A elaboração de uma política pública sofre interferência de diversos setores sociais, entre

eles a mídia, os poderes executivos, legislativos, judiciários e a opinião pública. E neste jogo de

forças, as opiniões e interesses são muitas vezes antagônicos. Desta forma, torna-se claro que

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- 37 -

algumas decisões e diretrizes acabam por privilegiar determinados setores, nem sempre voltados

à maioria da população ou a determinados grupos em maior vulnerabilidade.

Analisar e avaliar as ações e as intervenções possibilita a identificação da efetividade da

política. Portanto, as avaliações são necessárias para pautar novas ações e diretrizes, podendo

permitir uma melhor utilização do recurso público. Em alguns países, a cultura de avaliação das

políticas públicas já possui história. No Brasil, muito se tem a avançar neste campo.

7. METODOLOGIA DE PESQUISA EM DROGAS DE ABUSO

O método científico escolhido para responder às perguntas e hipóteses levantadas nos

objetivos de uma pesquisa é de suma importância para a correta investigação de um

determinado fenômeno. A pesquisa científica pode ser dividida sob diversas classificações. Esta

apostila fará a classificação de duas formas: os estudos experimentais e os não-experimentais, e a

partir das metodologias quantitativas e qualitativas.

Os estudos experimentais são aqueles que consistem em intervenção sobre os sujeitos

pesquisados e observação dos efeitos desta intervenção para se testarem hipóteses. Por exemplo,

estudo em animais com a aplicação de uma determinada droga e a observação dos seus efeitos

ou um ensaio clínico com seres humanos para se investigar os efeitos de uma determinada

substância/medicamento.

Os estudos não experimentais ou observacionais se restringem em observar os fenômenos,

sem manipular variáveis ou realizar intervenções. Embora seu principal objetivo seja diagnosticar

eventos, também se propõem a testar hipóteses, porém com vieses mais expressivos que nos

estudos experimentais.

A abordagem quantitativa baseia-se na descrição e na formulação de hipóteses prévias a

partir de técnicas de verificação sistemática, buscando por explicações causais e objetivas. O

modelo qualitativo preza pelo subjetivo, dando importância aos valores, crenças, hábitos, atitudes

e opiniões. Seu objetivo é compreender não só o fenômeno em si, mas todo o seu contexto.

Na seção abaixo, segue uma breve descrição das metodologias utilizadas na pesquisa

sobre o consumo de drogas.

Page 37: Apostila 3 - 2013

- 38 -

7.1 OBSERVACIONAIS

Estudos observacionais baseiam-se na simples observação, a qual não há modificação da

realidade. Podem ser:

TRANSVERSAIS: estudos de uma população em um único momento; úteis para descrever a

prevalência de um fenômeno, sua freqüência instantânea e fatores de risco. Esta forma de

estudo é muito útil no norteamento da formulação de hipóteses. Tem como vantagens a

rapidez e a facilidade de execução e como desvantagem a impossibilidade de testar

hipóteses e formulações. Sua fonte de dados pode ser de estudos populacionais ou ainda

de indicadores epidemiológicos.

o Estudos populacionais: a população propriamente dita irá fornecer os dados. A

obtenção dos dados pode ser por métodos laboratoriais (maior fidedignidade e

custo) ou através da pergunta direta, por meio de aplicação de testes ou escalas

(menor fidedignidade e custo);

o Indicadores epidemiológicos: os dados serão coletados de forma indireta. A coleta

pode ser realizada em prontuários médicos, receitas, controle de internações

hospitalares, órgãos públicos (por exemplo: informação de apreensão de drogas

ilícitas com a Polícia).

ECOLÓGICOS: tem como objetivo determinar a prevalência de uma doença ou um fator de

risco em uma determinada área regional ou geográfica. O foco é uma parcela da

população ou um grupo específico. Úteis para descrever a prevalência de relações

ambientais associadas a uma população e para o desenvolvimento de hipóteses.

COORTE: trata-se de um estudo prospectivo, no qual ocorre o acompanhamento de um

indivíduo ou grupo ao longo do tempo. Tem como um de seus objetivos a descrição da

incidência de certa patologia. Por ter grande parte dos fatores associados controlados, é

um dos únicos modelos que permite o estabelecimento de relação de causa. São estudos

caros e com tempo de execução prolongado, que por muitas vezes resultam em perdas

de seguimento.

CASO-CONTROLE: o método tem como tema central o pareamento do seu grupo de escolha

com um grupo que não apresente o fator investigado. Os grupos devem ser compostos

por indivíduos semelhantes e comparáveis. Úteis para testar hipóteses elaboradas, assim

como o método de coorte.

7.2 EXPERIMENTAIS

Os estudos experimentais têm como objetivo testar por meio de um experimento ou

intervenção uma hipótese. Podem ser desenvolvidos em humanos ou animais de experimentação.

Page 38: Apostila 3 - 2013

- 39 -

Os modelos de experimentação animal serão abordados mais especificamente na seção de

Modelos animais.

ESTUDO DE CAMPO: é aquela na qual o pesquisador vai ao local de interesse e desenvolve sua

atuação no ambiente comum ao fenômeno de interesse.

ESTUDO CLÍNICO: pode também receber a denominação de pesquisa clínica. São estudos

que envolvem a participação direta de um paciente/sujeito de pesquisa ou parte do

mesmo (amostras de sangue, cabelo, urina, etc.). Eles podem ser classificados em abertos

(ambos os envolvidos sabem da intervenção), simples (apenas o sujeito de pesquisa

desconhece a intervenção) ou duplo-cegos (voluntário e investigador desconhecem a

intervenção). Estes estudos podem ser simples, com um único grupo de tratamento, ou

com mais de um grupo de intervenção.

7.3 ABORDAGEM QUANTITATIVA

Como exposto nas seções anteriores, este método tem como objetivo a busca de

explicações causais e objetivas por meio da mensuração de parâmetros. Algumas de suas

características são: uso de técnicas estatísticas, emprego de uma grande quantidade de dados,

estudo de uma grande população, etc.

Estudos epidemiológicos

Em relação às drogas, o foco da epidemiologia é estudar a distribuição do uso das drogas

e acontecimentos relacionados a esse uso em uma determinada população e em um

determinado período de tempo. O objetivo é fazer um diagnóstico do uso de drogas com o

intuito de implementar programas preventivos e de intervenção, adequados à situação

identificada. A fonte de dados pode proceder de uma população geral, ou específica, ou

também de indicadores epidemiológicos, que fornecem dados indiretos do consumo, como

internações hospitalares, dados da mídia, apreensão de drogas pela polícia e laudos médicos.

7.4 ABORDAGEM QUALITATIVA

Este método visa compreender os fenômenos de forma mais ampla e sistêmica,

descrevendo e analisando culturas e comportamentos. Este método caracteriza-se pela

produção de dados descritivos, fornecidos de diversas formas lingüísticas como discursos, textos,

Page 39: Apostila 3 - 2013

- 40 -

documentos, fotografias e registros históricos fornecidos tanto pela população estudada quanto

pela observação que o pesquisador faz dentro do grupo em estudo. Permite essencialmente a

investigação de sentimentos e opiniões da população pesquisada, que é observada como um

todo e não como uma variável dentro de um conjunto. O foco principal é a vivência que o

indivíduo ou grupo estudado têm do fenômeno buscado, ou seja, a visão do próprio investigado

sobre o que se busca investigar.

A amostra em geral é bem menor que a de um estudo quantitativo, uma vez que cada

indivíduo fornece dado substancial para análise do fenômeno, dispensando grandes volumes de

discursos. Entretanto, é importante destacar que a seleção da amostra é feita seguindo métodos

específicos, que, embora não obedeçam a cálculos estatísticos, são rigorosamente descritos

como influenciadores da compreensão do fenômeno e por isso devem ser elaborados da mesma

forma cuidadosa que a pesquisa quantitativa.

As técnicas para coleta de dados em um estudo qualitativo são diversas, sendo a escolha

baseada nos objetivos da pesquisa. O ideal é utilizar mais de uma técnica para maximizar a fonte

dos dados obtidos e com isso melhorar a compreensão do fenômeno estudado. As principais são:

OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE: visa familiarizar o pesquisador com o local onde ocorre a prática a

ser estudada. Ocorre através de visitas e observações do ambiente registradas em um

“diário de campo”, contendo informações preciosas sobre o setting investigado com

reflexões do próprio pesquisador. Em geral, busca-se também encontrar informantes-

chave, pessoas que estudam ou participam do fenômeno de forma mais externa do que

os investigados, por exemplo, profissionais de uma unidade básica de saúde. Os

informantes-chave também servem para indicar indivíduos para a composição da

amostra.

ETNOGRAFIA: método utilizado na antropologia cultural, no qual o pesquisador faz uma

imersão na cultura do grupo investigado e passa a conviver neste ambiente, conhecendo

e analisando as relações, experiências e dinâmicas que ocorrem dentro do grupo.

ENTREVISTA EM PROFUNDIDADE: Principal meio de se coletar dados da pesquisa qualitativa,

consiste na entrevista individual seguindo questionamentos básicos que partiram de

hipóteses e teorias do pesquisador, mas deixando o investigado à vontade para falar

livremente do tema estudado e principalmente, com o cuidado de não induzir as

respostas.

GRUPO FOCAL: esta técnica permite que sejam entrevistadas simultaneamente pessoas com

vivências semelhantes de um mesmo fenômeno, possibilitando o surgimento de um grande

número de idéias individuais que sofrem interação das opiniões comuns, através de

argumentos de concordância e discordância dos entrevistados. Cada participante é

estimulado a discutir com o grupo muito mais do que a responder especificamente às

questões do pesquisador.

Page 40: Apostila 3 - 2013

- 41 -

7.5 MODELOS ANIMAIS

Algumas das características comportamentais da dependência, como uso, abuso, busca

e recaída, assim como as neuroadaptações que refletem em mudanças de comportamento,

como tolerância e sensibilização comportamental, podem ser estudadas em modelos animais de

laboratório.

A seguir estão exemplificados alguns modelos animais utilizados para o estudo de

fenômenos envolvidos na dependência de drogas.

AUTO-ADMINISTRAÇÃO: A característica fundamental deste modelo é que após um

procedimento de treino o animal adquire a capacidade de auto-administrar drogas. O

animal desempenha uma tarefa e obtém como recompensa a oferta da droga. Este

modelo possui alta correspondência com o potencial de abuso de determinada droga em

humanos. Tem sido considerada uma ferramenta muito útil na investigação da

neurobiologia do reforço positivo das drogas.

PREFERÊNCIA CONDICIONADA AO LUGAR: avalia os efeitos reforçadores condicionados de drogas

através de pareamentos sucessivos entre os efeitos da droga e um ambiente específico.

Ao final do pareamento o animal vai preferir o ambiente em que recebeu as doses da

droga com efeitos reforçadores.

SENSIBILIZAÇÃO COMPORTAMENTAL: no contexto de drogas de abuso, trata-se de um fenômeno

estudado a partir da sensibilização motora, isto é, há um aumento da locomoção do

animal após administração aguda de uma droga psicoativa, quando este animal é

exposto repetidamente à droga.

Para maiores informações sobre os procedimentos experimentais em modelos animais consulte

a apostila no capítulo de Psicologia Experimental.

Page 41: Apostila 3 - 2013

- 42 -

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Outros materiais didáticos:

Intervenção Breve para casos de uso de risco de substâncias psicoativas: módulo 4. Coordenação do

módulo: Denise De Michelli e Maria Lucia Oliveira de Souza Formigoni, 4. Ed, 2011.

Page 43: Apostila 3 - 2013

- 44 -

Durante a vida, todos os organismos necessitam se adaptar dinamicamente às alterações

do meio interno para manter o equilíbrio dinâmico, também conhecido como homeostase, e às

alterações ambientais. Este equilíbrio interno e externo são constantemente ameaçados por

eventos genericamente denominadas estressores. O estresse ocorre quando o organismo está sob

ameaça real ou percebida. Buscando restabelecer o equilíbrio, o organismo lança mão de um

conjunto de respostas fisiológicas e comportamentais, que constituem os principais elementos da

resposta ao estresse. Pela relevância que apresenta para a sobrevivência, o estudo dos

mecanismos que compõem esse sistema de resposta se torna muito importante. É isto que

veremos agora.

1. HISTÓRICO

O termo estresse, originalmente utilizado na área da engenharia para descrever a força

que exerce tensão física em um corpo, representa para os sistemas biológicos qualquer condição

que perturba a homeostase (estabilidade dos sistemas fisiológicos que garantem a manutenção

da vida) fisiológica/psicológica do organismo. As consequências fisiológicas do estresse foram

estudadas pela primeira vez, em 1936, pelo endocrinologista Hans Selye. Ele definiu estresse como

a “resposta não específica do organismo a qualquer demanda” e para chegar a essa conclusão,

o endocrinologista observou que diferentes organismos apresentavam um padrão semelhante de

resposta fisiológica para estímulos sensoriais ou físicos. Posteriormente sugeriu a expressão

Síndrome de Adaptação Geral (SAG) que consistia em um conjunto de reações não específicas

desencadeadas quando o organismo era exposto a um estímulo que ameaça a manutenção da

homeostase. Esta resposta, de acordo com Selye, seria composta por três estágios:

• Fase de alarme: Promoção das respostas imediatas ao estresse, com a liberação de adrenalina,

levando à dilatação da pupila, aumento da frequência cardíaca e respiratória, sudorese;

• Fase de resistência: o organismo, neste estágio, realiza modificações para se adaptar ao

estressor, buscando resistir a ele – liberação de glicocorticóides. Caso o estímulo seja retirado, o

organismo volta às condições basais. Do contrário, a fase permanece, podendo levar à falência

dos mecanismos de defesa;

Page 44: Apostila 3 - 2013

- 45 -

• Fase de exaustão: O organismo não consegue se adequar ao estressor, o que gera um

desequilíbrio interno. As reações presentes na primeira fase podem retornar mais acentuadas. É

neste momento que o estresse pode desencadear doenças ou levar até mesmo à morte.

Como dito anteriormente, os fatores que ameaçam a manutenção da homeostase são

genericamente denominados estressores. Eles podem ser tanto de natureza emocional quanto

física. Por serem de natureza diversa, os estressores requerem diferentes respostas e este fato

influencia tanto os sistemas que percebem esse estímulo quanto os mediadores que conduzem à

resposta adaptativa do organismo. Outro fator importante que regula a forma como o estressor

atingirá o organismo é sua duração. Estressores agudos como, por exemplo, um carro em alta

velocidade se aproximando, necessitam de uma resposta mediada de maneira rápida e de um

retorno à condição basal logo em seguida. Já estressores presentes de forma mais duradoura

(crônica) podem levar a alterações mais prolongadas e progressivas no organismo que, se

persistirem, podem modificar estruturas e sistemas. Outros fatores como a idade, gênero e

background genético também influenciam a maneira como o organismo irá lidar com o estímulo

apresentado.

2. A RESPOSTA DE ESTRESSE: SISTEMAS E MEDIADORES

Em uma situação estressante vemos a ativação de três sistemas principais que regulam as

funções corpóreas. O primeiro é o sistema nervoso voluntário, que recruta os músculos do nosso

organismo possibilitando que eles respondam às informações sensoriais. Como exemplo, pensem

em um banhista avistando um tubarão na praia. Quando o banhista perceber o perigo iminente,

ele sairá o mais rápido possível da água, sendo que, para isso, necessitará que seus músculos

Figura 1: Imagem do endocrinologista

Hans Selye. Retirada do site:

http://www1.umn.edu

Page 45: Apostila 3 - 2013

- 46 -

estejam preparados. O segundo sistema é o sistema nervoso autônomo. Este é composto pelos

ramos simpático e parassimpático. O sistema nervoso simpático, em uma situação de risco,

encarrega-se de nos manter em alerta, enquanto que o parassimpático mantém os sistemas de

manutenção do corpo em funcionamento e atenua as respostas do ramo simpático. Por último,

temos o sistema neuroendócrino, que também auxilia a manutenção do funcionamento interno

do organismo. Os hormônios presentes nesse sistema são sintetizados tanto no sistema nervoso

central (SNC) quanto na periferia, e são responsáveis por estimular tecidos periféricos a liberarem

outros mediadores que afetam diversos processos fisiológicos.

Assim, a resposta fisiológica ao estresse envolve uma interação de sistemas que buscam

zelar pela manutenção da integridade do organismo. Dentro do componente neuroendócrino, o

sistema simpatoadrenal e o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HPA) representam ramos

importantes na reposta ao estresse. São estes que veremos com mais detalhes a seguir.

2.1. Sistema Simpatoadrenal

As células secretoras cromafins são componentes da medula das glândulas adrenais e

também são consideradas parte do sistema nervoso simpático. Axônios de neurônios pré-

ganglionares simpáticos, oriundos da raiz ventral da medula espinhal, formam sinapses

colinérgicas com essas células. Quando estimuladas, estas secretam catecolaminas, como

adrenalina (predominante) e noradrenalina. A adrenalina e a noradrenalina se ligam aos seus

receptores, denominados adrenoceptores, presentes em diversos órgãos, e exercem múltiplas

funções na resposta ao estresse, como: aumento da frequência e do volume cardíaco,

vasodilatação nos músculos e vasoconstrição na pele e intestinos. Essas alterações buscam

assegurar o suprimento de sangue para o cérebro e músculos, componentes essenciais para uma

resposta adequada à ameaça apresentada. Além disso, a adrenalina também estimula a

glicogenólise no fígado, que resulta em aumento na disponibilidade de glicose no sangue,

proporcionando “energia” para as respostas defensivas.

Embora a adrenalina e a noradrenalina não atravessem a barreira hematoencefálica, suas

ações periféricas encontram paralelo no cérebro pela noradrenalina sintetizada no locus

coeruleus. O locus coeruleus, considerado o principal núcleo noradrenérgico do sistema nervoso

central, participa da resposta comportamental frente à ameaça, aumentando a vigília, o alerta e

o foco da atenção, além de reduzir funções que não são essenciais em momentos de ameaça,

como o sono e a alimentação. Esse núcleo também participa da ativação do eixo HPA.

Page 46: Apostila 3 - 2013

- 47 -

2.2. Eixo Hipotálamo Pituitária Adrenal (Hpa)

Um marco adaptativo fundamental do organismo para uma resposta adequada a uma

situação que ameace sua homeostase corresponde à ativação do eixo Hipotálamo – Pituitária –

Adrenal (Eixo HPA). Os produtos deste eixo desempenham importantes funções no organismo que

são mais marcantes durante uma situação de estresse. Estressores físicos ou psicológicos estimulam

a secreção do hormônio liberador de corticotrofina (CRH) por neurônios localizados na região

parvocelular do núcleo paraventricular do hipotálamo, que secretam o CRH no sistema porta

hipofisário. Na adeno - hipófise, o CRH e a vasopressina, produzida na porção magnocelular do

núcleo paraventricular do hipotálamo, atuam como estimuladores da secreção do hormônio

adrenocorticotrófico (ACTH) que, pela circulação sistêmica, atinge o córtex das glândulas

adrenais, estimulando a síntese e secreção dos glicocorticoides. Os glicocorticoides são

hormônios esteroides derivados do colesterol e secretados pela zona fasciculada do córtex da

adrenal. Eles são essenciais para o balanço das funções imunológicas, para a reação

inflamatória, e para a manutenção da homeostase neuroendócrina. Além disso, são os principais

promotores da retroalimentação (feedback) negativa sobre o eixo HPA, que visa controlar e

reduzir a liberação de CRH e ACTH. Os glicocorticoides estão sempre presentes no sangue, sendo

que sua secreção apresenta um ritmo circadiano bem definido, com um aumento em sua

concentração antes de períodos de atividade e sua diminuição no período de repouso.

Os glicocorticoides apresentam diversos efeitos que incluem a redução da captação e

utilização da glicose e aumento da gliconeogênese, resultando em aumento da disponibilidade

de glicose no sangue (hiperglicemia); aumento da quebra e redução da síntese de proteínas,

Figura 2: Esquema da glândula adrenal. Adaptado de http://pt-

br.infomedica.wikia.com.

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- 48 -

fornecendo assim mais um substrato para geração de energia, fato muito importante em uma

situação de alta

demanda.

Em primatas, o principal glicocorticoide é o cortisol, enquanto que em roedores é a

corticosterona. Vale ressaltar que algumas das ações dos glicocorticoides ajudam a mediar a

resposta de estresse, enquanto que outras compensam a resposta primária ao estresse e ajudam

a restabelecer a homeostase.

3. RECEPTORES DE GLICOCORTICÓIDES

Os glicocorticoides exercem suas funções, tanto no sistema nervoso central quanto na

periferia, através de sua ligação com seus receptores intracelulares. Essa é uma superfamília de

receptores, da qual também fazem parte os receptores de hormônios esteroides sexuais,

tireoidianos, de vitamina D3 e do acido retinoico. Os receptores de glicocorticoides, dentro da

célula, fazem parte de um complexo citoplasmático de diversas proteínas, composto,

essencialmente, por um receptor, várias proteínas de choque térmico (heat shock proteins) e uma

molécula de imunofilina. A ligação do hormônio aos seus receptores leva à dissociação das hsp e

da imunofilina, a diversos estágios de fosforilação e a um aumento da afinidade do complexo

receptor – ligante pelos seus domínios nucleares.

Figura 3: Esquema da ativação do ramo neuroendócrino. Esquema adaptado e

retirado do site: www4.bordeaux-aquitaine.inra.fr

Page 48: Apostila 3 - 2013

- 49 -

O efeito dos glicocorticoides depende de qual subtipo do receptor é ativado, sendo que

há dois: os mineralocorticoides (MR) e os glicocorticoides (GR). Em concentrações basais de

glicocorticoides, há uma elevada ocupação de MRs, uma vez que este receptor apresenta uma

maior afinidade pelo seu ligante, quando comparado ao outro subtipo. Já os GRs, por

apresentarem uma menor afinidade pelo seu ligante, são ocupados no pico do ritmo circadiano

ou quando estressores estimulam a elevação dos

glicocorticoides.

Quando ativados, os dois subtipos de

receptores exercem seus efeitos através da

regulação da transcrição de genes, processo que

pode acontecer de maneiras distintas. A primeira

envolve a ativação ou repressão da expressão

gênica pela ligação do receptor ativo a um ou

mais elementos de resposta a glicocorticoides

(GRE) presentes na região promotora de um gene

alvo (via indicada pelo número 1 no esquema

abaixo). A segunda maneira envolve a repressão

da transcrição gênica que foi iniciada por outros

fatores de transcrição, como NFκβ, CREB e AP – 1

(via indicada pelo número 2 no esquema abaixo).

Somado a esses efeitos nucleares,

atualmente tornou-se evidente que esses

receptores também podem disparar os eventos da

tradução de sinal quando ainda estão no

citoplasma da célula. O significado dessas ações “não genômicas” é que podem ser mais

rápidas, uma vez que não requerem alterações na síntese de RNAm/proteínas que tomam um

tempo maior.

Quando consideramos a distribuição desses receptores, tanto MRs quanto GRs estão

presentes nos tecidos periféricos e no sistema nervoso central. No cérebro, os GRs são

amplamente expressos, sendo abundantes no córtex pré-frontal, na amígdala, em neurônios

hipotalâmicos que expressam CRH, no hipocampo e nos corticotropos (células produtores de

ACTH) da hipófise. Os MRs por sua vez estão presentes no hipotálamo e em estruturas que

compõem o sistema límbico, como o hipocampo, na amígdala central e no septo lateral. Vale

ressaltar que há coexpressão desses receptores no hipocampo, giro denteado, núcleo

amigdaloide, septo lateral e em algumas áreas corticais.

A ativação tanto de MRs e GRs em situações de baixas e elevadas concentrações de

glicocorticoide respectivamente leva a alterações na integridade e função neuronal que se

Figura 4: Esquema das ações dos receptores de

glicocorticóides na transcrição de genes. Adaptado

de Carmen Sandi. Stress, cognitive impairment and

cell adhesion molecules. Nature Reviews

Neuroscience. 2004.

Page 49: Apostila 3 - 2013

- 50 -

associam com alterações na regulação neuroendócrina e no comportamento. Em geral, os GRs

medeiam a maioria dos efeitos na resposta ao estresse, enquanto que os MRs medeiam a maioria

dos efeitos basais. Também vale ressaltar que o balanço dos efeitos mediados pelos dois subtipos

de receptores no sistema de estresse é de extrema importância para a regulação da atividade do

eixo HPA.

Quando observamos a relação entre a ocupação de receptores do tipo MR e GR,

percebemos que esta razão de ocupação é importante para a mediação dos efeitos dos

glicocorticoides em sistemas, como o imunológico, e processos, como os de aprendizagem e

memória. Um efeito muito mencionado e relacionado a isso é o perfil em curva em “U” invertido

que é observado quando se avalia o desempenho, por exemplo, da memória pela concentração

de glicocorticoides disponível, Assim, é visto que há, de maneira geral, um prejuízo no

desempenho quando temos concentrações muito baixas ou elevadas de glicocorticoides, e um

desempenho considerado ótimo quando estas concentrações estão em níveis intermediários. Este

efeito está corelacionado com a ocupação diferencial dos receptores do tipo MR e GR.

Figura 5: Representação esquemática da curva em “U invertido”, na qual o desempenho da memória varia em função da

ocupação dos receptores de glicocorticoides. Adaptado de Sonia J. Lupien. The Effects of stress and stress hormones on

human cognition: implication for the field of brain and cognition. 2007.

4. O CONCEITO DE ALOSTASE

Uma proposta mais recente para definir o processo de adaptação aos desafios que o

organismo é exposto é a alostase, que denota um processo de manutenção de algumas variáveis

fisiológicas dentro de certos limites, ou seja, manutenção da estabilidade através da mudança.

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- 51 -

Existem diversos mediadores da alostase, sendo que os principais são as catecolaminas, o eixo

HPA e as citocinas.

Outro conceito complementar à ideia trazida pela alostase é o de estado alostático, que

se refere à alteração e manutenção da atividade dos mediadores da alostase em situações de

mudanças ambientais ou desafio. Assim, o estado alostático seria resultante de um desequilíbrio

dos mediadores, seja por excesso ou pela inadequada produção dos mesmos. Alguns exemplos

desse processo podem ser a hipertensão, o desequilíbrio do ritmo de secreção de cortisol após

privação de sono crônica e a elevação crônica de citocinas inflamatórias. O resultado

acumulado do estado alostático é conhecido como carga alostática. Se a resposta alostática é

inadequada, prolongada e a liberação dos mediadores não é corretamente finalizada, o

resultado para o organismo pode ser danoso, o que ficou conhecido com sobrecarga alostática.

O estresse pode, portanto, tanto “ajudar” como “prejudicar” o organismo. Quando

confrontado com um desafio físico crucial, as respostas de estresse devidamente controladas

garantem as condições necessárias para um enfrentamento das situações adversas. Além disso, a

resposta fisiológica aguda ao estresse protege o corpo e o ajuda a restabelecer ou manter a

homeostase. Contudo, se esse estresse continuar por um período prolongado, as respostas de

estresse podem falhar ou não ser finalizadas quando não são mais necessárias, fato que pode

contribuir para o desenvolvimento de doenças.

5. EFEITO DO ESTRESSE NOS DIFERENTES SISTEMAS

5.1. Sistema Cardiovascular

Em situações de estresse o organismo precisa de mais oxigênio e glicose (energia). Para

isso, o coração aumenta seu bombeamento sanguíneo, através de um incremento na sua

frequência e contratilidade. O principal mediador desses efeitos é a adrenalina, hormônio

Figura 6: Representação do processo de alostase e carga alostática.

Adaptado de vollediguithethart.webs.com

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presente no início da resposta de estresse. Além desses efeitos no coração, a adrenalina também

provoca vasoconstrição no trato gastrointestinal e vasodilatação na musculatura esquelética.

Essas modificações visam disponibilizar a energia necessária para efetuar todas as ações que

rantam a sobrevivência do organismo.

Contudo, se o estressor persistir, diversas alterações no sistema cardiovascular podem

ocorrer e desencadear doenças, como a hipertensão arterial.

A hipertensão arterial resulta da interação de diversos fatores, entre eles o estresse crônico.

Esta condição favorece a hipertrofia do coração, além de produzir fissuras nas paredes internas

das artérias, fato que, combinado com um processo pró-inflamatório induzido pela ativação

simpática, leva ao aparecimento de placas ateroscleróticas nos locais danificados desses vasos.

Além da aterosclerose, o rompimento dessas placas pode levar ao entupimento de vasos

de menor calibre presentes na periferia ou no sistema nervoso central.

A resposta de estresse também aumenta a concentração de fibrinogênio, uma proteína

importante para a cascata de coagulação. Assim, o organismo estará apto para o combate,

uma vez que ele terá mecanismos preparados para evitar o sangramento excessivo caso venha a

se ferir. Contudo, a hipertensão arterial está também associada a altas concentrações de

fibrinogênio e seu excesso, por sua vez, é um fator de risco para a formação de coágulos no

sangue, e um possível infarto e acidente vascular encefálico (AVE).

Outra importante relação é com a alimentação. Quando o corpo precisa de mais energia

para a reação de luta ou fuga (reação tipicamente relacionada com a resposta ao estresse), a

adrenalina e o cortisol trabalham juntos para manter o suprimento de energia balanceado. A

adrenalina aumenta a liberação de glicose do fígado e de ácidos graxos das reservas de

Figura 7: Adaptado de Glenn Dranoff. Cytokines in cancer pathogenesis and

cancer therapy. Nature Reviews Cancer. 2004.

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- 53 -

gordura, enquanto que o cortisol repõe essas reservas. Quando as concentrações de cortisol

estão cronicamente elevadas (por causa de um estressor, por exemplo), muita gordura é

armazenada no abdome e principalmente na parede dos vasos sanguíneos, aumentando o risco

de aterosclerose.

5.2. Sistema Imunológico

O sistema imunológico, o sistema nervoso central e o sistema endócrino interagem

amplamente entre si e este fato pode ser notado pela influência que diversos estressores exercem

sobre o sistema de defesa do organismo (sistema imunológico) tanto na sua resposta inata

(primeira linha de defesa do organismo, composta em geral por fagócitos) quanto na resposta

adquirida (aquela que surge perante uma infecção; apresenta uma alta especificidade

molecular contra o patógeno; composta por linfócitos), o que pode levar a alterações na nossa

saúde.

De maneira geral, diferentes estressores podem aumentar a susceptibilidade a agentes

infecciosos e a gravidade a doença causada por eles; podem reduzir a intensidade da resposta

imunológica a vacinas; podem retardar o processo de cicatrização e levar à reativação de vírus

latentes.

O eixo HPA e o sistema simpatoadrenal representam os dois principais mediadores desses

efeitos. Assim, a partir da ativação desses eixos, ocorre a liberação de hormônios como

catecolaminas, ACTH, cortisol, que podem conduzir as alterações quantitativas e/ou qualitativas

nas funções imunológicas. É interessante ressaltar que quase todas as células imunológicas

apresentam receptores para um ou mais desses hormônios, e a modulação feita por eles pode

ocorrer de maneira direta (ligação do hormônio ao seu receptor na superfície da célula) ou

indireta, pela sua interferência na produção de citocinas, como interferon γ (IFN – γ), fator de

necrose tumoral (TNF) e interleucinas 1, 2 e 6 (IL – 1, IL – 2 e IL – 6).

Os glicocorticoides atuam especificamente inibindo a migração/quimiotaxia de eosinófilos

e neutrófilos, além de suprimir a secreção de citocinas pró-inflamatórias (TNF, IL-1, IL-6, IL-8 e IL-12).

Além disso, os glicocorticoides, em conjunto com as catecolaminas, produzem uma alteração no

perfil dos linfócitos, levando ao predomínio da diferenciação dos linfócitos para um perfil TH2

(resposta mais humoral; composta por anticorpos), ao invés de um perfil TH1 (resposta mais

celular). O aumento da susceptibilidade a infecções pode ser entendido a partir dessa alteração

de perfil de linfócitos, uma vez que o organismo “estressado” se encontraria em uma situação

imunológica inadequada para combater um agente patogênico.

A imunossupressão e o efeito anti-inflamatório são os processos mais associados às ações

de hormônios da resposta ao estresse (em especial dos glicocorticoides). Por esse motivo, os

glicocorticoides são considerados anti-inflamatórios por excelência. Eles inibem tanto

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manifestações precoces (rubor, edemas, dor), quanto tardias (cicatrização, reparo da lesão e

reações proliferativas) da inflamação. São capazes de reverter praticamente todos os tipos de

reações inflamatórias causadas tanto por patógenos invasores, estímulos físicos ou químicos, ou

por respostas imunológicas desencadeadas inadequadamente, como ocorre na doença

autoimune ou na hipersensibilidade. Atualmente, os estudos da relação entre o estresse e as

doenças alérgicas e autoimunes têm sido um campo de muito interesse.

O sistema imunológico, pela ação das citocinas pró-inflamatórias, também estimula o

sistema de resposta ao estresse em diversos níveis, tais como o hipotálamo, o sistema central

noradrenérgico, a hipófise e as glândulas adrenais. Estas últimas, perante o estímulo, aumentam a

secreção de glicocorticoides o que consequentemente leva a uma supressão na reação

inflamatória. A reação descrita acima demonstra mais uma alça de controle do organismo para

impedir uma resposta inflamatória exacerbada.

É também interessante destacar que a interação do estresse com o sistema imunológico

apresenta um padrão de curva em “U” invertido. Dessa forma, em uma situação de ameaça, na

qual o organismo pode sofrer lesões, há uma estimulação imunológica, caracterizada pelo

aumento da migração de leucócitos (do sangue para o tecido lesado) e pelo aumento da

resposta imunológica humoral. Contudo, em situações em que o estressor se apresenta por mais

tempo é observada uma imunossupressão, muito relacionada com o aumento de glicocorticoides

no organismo.

5.3. Sistema Nervoso Central

As ações dos glicocorticoides no sistema nervoso central são diversas, dependendo, entre

outros fatores, da área analisada, da disponibilidade do hormônio e de seus receptores. De

maneira geral, as ações destes hormônios envolvem a inibição de funções vegetativas

(reprodução, alimentação e crescimento), a ativação das alças de regulação através da

retroalimentação (“feedback”) e a facilitação de processos cognitivos, de atenção, alerta e

vigília.

A seguir, estudaremos um pouco os efeitos dos glicocorticoides em algumas áreas do

cérebro.

5.3.1. Hipocampo

O hipocampo, estrutura situada no lobo temporal medial, além de ser classicamente

relacionada com os processos de aprendizagem e memória também exerce um papel

importante na regulação do eixo HPA. Esta área atua, geralmente, como um “freio” do eixo,

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- 55 -

inibindo neurônios produtores de CRH do hipotálamo e, consecutivamente, levando a uma

redução na secreção de ACTH e glicocorticoides.

O hipocampo apresenta alta densidade dos dois tipos de receptores para glicocorticoides

e, aparentemente, os efeitos prejudiciais causados por estes hormônios, nesta região, são

mediados majoritariamente pelos receptores glicocorticoides (GR). No hipocampo de ratos foi

demonstrado que a ligação dos glicocorticoides aos seus receptores de baixa afinidade se

relaciona a efeitos adversos no metabolismo, sobrevivência celular e morfologia neuronal. Outros

estudos, com animais expostos a situações de estresse crônico (imobilização prolongada,

separação materna), mostram que nestes modelos há um remodelamento dos neurônios

hipocampais (encurtamento dos dendritos, perda de espinhas sinápticas e supressão da

neurogênese), especialmente na região do giro denteado. Vale ressaltar que este fenômeno não

é apenas mediado pelos glicocorticoides circulantes, mas também conta com a influência de

aminoácidos excitatórios, como o glutamato, e de outros mediadores e moduladores.

Devido a sua importância tanto para os processos mnemônicos quanto para a regulação

do eixo HPA, o mau funcionamento do hipocampo pode produzir prejuízo em memórias espaciais,

declarativas e episódicas, além de prejudicar a regulação do eixo HPA, levando à elevação de

sua atividade e exacerbação dos efeitos dos glicocorticoides.

Diversos estudos de neuroimagem estrutural em humanos também reforçam a existência

de uma relação entre o estresse e alterações morfológicas do hipocampo. Um deles relata que

indivíduos com distúrbios psiquiátricos relacionados com estresse, como transtorno de estresse pós-

traumático e depressão maior, apresentam redução no volume do hipocampo, fato também

encontrado em indivíduos portadores da síndrome de Cushing, os quais apresentam

hipercortisolemia (excesso de glicocorticoides na circulação sanguínea). A correção cirúrgica da

hipercortisolemia reverte parcialmente a redução de volume hipocampal, além de melhorar o

humor e a memória desses indivíduos.

Vale ressaltar que os efeitos dos glicocorticoides no hipocampo podem ser tanto

prejudiciais, como os citados acima, quanto benéficos, como os relatados em estudos de

consolidação de memória em animais e humanos que mostram um efeito facilitador desses

hormônios. O efeito dicotômico associado a esses hormônios está relacionado, de maneira geral,

com suas concentrações circulantes e, consequentemente, com a ocupação de seus receptores.

5.3.2. Amígdala

A amígdala, estrutura presente no lobo temporal e adjacente ao hipocampo, é associada

à função de atribuir saliência emocional e comportamental a eventos do ambiente. Tanto a

Page 55: Apostila 3 - 2013

- 56 -

lesão quanto a supressão farmacológica desta área previne o comportamento do tipo ansioso e

o efeito modulador de drogas na memória dependente de hipocampo, área com a qual a

amígdala se conecta direta e indiretamente.

Ainda sobre a relação da amígdala, do estresse e da memória, diversos estudos

demonstram que os hormônios de resposta ao estresse e os neurotransmissores liberados por esse

estímulo facilitam a consolidação e posterior retenção de informações presentes nos momentos

de alta carga emocional, sendo que esse efeito facilitador contaria com a ativação da

amígdala. Entretanto, os principais mediadores da resposta ao estresse também são associados

com um prejuízo na evocação da memória e da memória de trabalho (working memory), efeito

este que também parece contar com uma participação de certas regiões da amígdala.

Quando consideramos a duração do estressor, percebemos que protocolos de estresse

crônico, como o de imobilização crônica, que causa retração dos dendritos em certas regiões do

hipocampo, leva ao crescimento dos dendritos em neurônios da amígdala, em especial na sua

porção basolateral. O estresse crônico também está associado a um aumento do

comportamento agressivo entre animais que compartilham o mesmo ambiente, sendo este efeito

um reflexo da hiperatividade desta região.

Estudos em humanos reforçam os achados em animais os quais atribuem importância a

esta região para a emoção e o estresse relacionados a processos fisiológicos e comportamentais.

EFEITOS DO ESTRESSE CRÔNICO

HIPOCAMPO AMÍGDALA

Redução do volume Formação de espinhas sinápticas

Atrofia dos dendritos (reversível) Crescimento dos dendritos

Redução da neurogênese Hiperresponsividade

5.3.3. Córtex Pré – Frontal

O córtex pré – frontal região situada na porção anterior do lobo frontal está intimamente

relacionada com a regulação de funções cognitivas complexas, como o controle executivo e a

working memory, além de integrar informações provenientes de regiões corticais e subcorticais.

Outra função relevante associada a esta área é a do controle de cima para baixo (top – down

regulation) das respostas associadas a situações de estresse e ameaça e o da regulação de

Tabela 1: Sintetiza os efeitos do estresse crônico no hipocampo e na amígdala. Adaptada de Benno

Roozendaal, Bruce S. McEwen & Sumantra Chattarji. Reviews Neuroscience. 2009.

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- 57 -

processos associados à maneira de lidar com estas situações, os quais são mediados por áreas

que incluem o hipocampo, a amígdala e o hipotálamo.

Quando pensamos nos efeitos do estresse nessa região, estudos em animais mostram que

o estresse crônico gera modificações estruturais e funcionais no córtex pré – frontal medial, em

especial na região do cingulado anterior, na área pré – límbica, infralímbica e orbitofrontal. Estas

modificações podem envolver tanto o encurtamento de dendritos, como ocorre no córtex pré –

frontal medial quanto o seu crescimento, como ocorre no córtex orbitofrontal (efeitos vistos após a

imobilização crônica dos animais).

Assim como outras regiões do cérebro, o córtex pré – frontal também apresenta receptores

para glicocorticoides. Já foi verificado que esses hormônios produzem modificações nessa região,

fato demonstrado através do tratamento crônico por três semanas com corticosterona que leva a

uma retração dos dendritos no córtex pré – frontal medial. Outro estudo em que foi realizado

tratamento crônico por quatro semanas com dexametasona (esteroide sintético) mostrou que

houve um prejuízo da memória de trabalho avaliada na tarefa do labirinto aquático de Morris.

6. MODELOS ANIMAIS PARA O ESTUDO DO ESTRESSE

Modelos experimentais ou animais têm sido extensivamente utilizados na pesquisa como

ferramentas que auxiliam na compreensão de fenômenos biológicos, progressão de doenças,

além do seu uso na elaboração de novos tratamentos para as doenças existentes. Quando

pensamos no estudo da resposta ao estresse e de suas implicações, percebemos que um bom

modelo experimental deveria ser capaz de reproduzir os aspectos presentes na resposta ao

estresse. Os modelos existentes hoje conseguem avaliar alguns dos parâmetros bioquímicos ou

fisiológicos presentes na resposta de estresse, mas ainda são incapazes de mimetizar

completamente as alterações fisiológicas, ou até mesmo patológicas, causadas pelo estresse.

Iremos rever a partir de agora alguns dos modelos utilizados no estudo do estresse. Para

facilitar a compreensão deste tópico, dividiremos os modelos experimentais a partir da natureza

da fonte estressora, ou seja, se o estressor é de natureza física ou psicológica.

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- 58 -

6.1. Modelos Experimentais De Natureza Física Para O Estudo Do Estresse

6.1.1. Estresse Induzido Pelo Nado Forçado

Neste método, os animais são colocados em tanques cilíndricos contendo água, que pode

estar morna (20 °C) ou fria (4 °C), esperando – se que nadem. Em protocolos de estresse agudo, os

animais são mantidos nesta condição de minutos até horas (há protocolos que permitem que o

animal nade por até 2h00). Já nos protocolos de estresse crônico, os animais são colocados nessa

condição por alguns dias, em geral cinco, em sessões que duram até 2h00. Mesmo que

represente um método de indução de estresse, o nado forçado, em especial quando realizado

cronicamente, pode não ser tão efetivo, uma vez que os animais se habituam a situação.

6.1.2. Estresse Por Imobilização

A imobilização tem sido muito utilizada como um estressor para o estudo das alterações

biológicas, bioquímicas e fisiológicas nos animais. Este método pode ser realizado de duas formas

distintas. Na primeira, o animal é imobilizado dentro de um tubo cilíndrico de acrílico que possui

orifícios para entrada de ar. Na segunda forma, os membros (patas) do animal são fixados em

uma mesa com fita adesiva, imobilizando-o. Para protocolos de estresse agudo, os animais

podem ser mantidos nesta condição por aproximadamente 2h50. Já em protocolos de estresse

crônico, os animais podem ser imobilizados por até 10 dias. A vantagem presente nesta

metodologia é que ela produz uma condição de estresse físico inescapável na qual raramente há

adaptação.

6.1.3 Estresse Induzido Por Choque Nas Patas

Choque elétrico nas patas de intensidade moderada tem sido utilizado extensivamente

como estressor. Roedores em geral são susceptíveis a este procedimento e manifestam após sua

realização uma rápida resposta de estresse. O choque elétrico nas patas é realizado em uma

câmara que apresenta seu chão eletrificado (geralmente são pequenas barras paralelas). Para

protocolos de estresse agudo, os animais são expostos aos choques apenas uma vez. Já em

protocolos prolongados, animais podem ser expostos a este procedimento por alguns dias. A

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vantagem presente neste método é que produz uma resposta de estresse notável nos animais. A

maior desvantagem é que os animais podem se machucar durante a aplicação dos choques.

6.2. Modelos Experimentais De Natureza Psicológica Para O Estudo Do Estresse

6.2.1. Estresse Induzido Pela Presença Ou Cheiro De Predador

O encontro de um animal com seu predador natural representa uma condição muito

estressante e ansiogênica. Dessa forma, a exposição de um roedor a seu predador natural (um

gato) ou ao odor do mesmo elicia a resposta de estresse. Esse tipo de paradigma tem sido

efetivamente utilizado na avaliação das alterações bioquímicas e fisiológicas induzidas por essa

situação estressante. Alterações em diversos comportamentos, como locomoção, e em

parâmetros endócrinos após a realização deste protocolo são observados. Esta metodologia é

empregada principalmente em procedimentos de estresse agudo, não sendo utilizada em

procedimentos crônicos, uma vez que o animal pode se habituar a presença/odor do predador.

6.2.2. Estresse Por Derrota Social

O paradigma de derrota social

representa um modelo ecológico de

estresse que é constituído por interações

agressivas que são inescapáveis,

imprevisíveis e intensas. O paradigma de

derrota social é considerado um modelo de

estresse psicossocial relevante, pois produz

alterações duradouras tanto

comportamentais quando fisiológicas nos

indivíduos derrotados. Neste modelo, há o

confronto entre um animal intruso (que não

habita o local) e um residente (que mora

no local). O animal intruso é colocado na

Figura 8: Caixa de condicionamento de medo ao

contexto também utilizada para aplicar os choques nas

patas. Imagem retirada do site: www.insightltda.com.br

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- 60 -

gaiola moradia do animal residente e lá permanece por alguns minutos. O comportamento de

derrota social é caracterizado por um conjunto de posturas exibidas pelo animal derrota, sendo

algumas destas: imobilidade, reações de escape, postura ereta defensiva.

6.2.3. Estresse Induzido Pelo Isolamento Neonatal

O paradigma de estresse neonatal em roedores produz alterações comportamentais e

fisiológicas duradouras. Estudos já demonstraram que roedores privados de contato social

apresentam alterações comportamentais, como um aumento na locomoção quando expostos a

um ambiente novo e um prejuízo no comportamento exploratório. O isolamento individual dos

filhotes mostra ser um método efetivo de estimulação do eixo HPA. Neste paradigma, o filhote é

removido da ninhada no segundo dias após o nascimento e mantido isolado da mãe e irmãos em

uma caixa aquecida por uma manta térmica. Este procedimento pode ter duração de 1h00 ou

mais e pode ser realizado por vários dias. Após o tempo de isolamento ter terminado, o filhote

retorna para sua ninhada.

6.3. Estresse Crônico Moderado

Quando pensamos em modelos animais para o estudo do estresse, um ponto crítico tanto

para os modelos de estresse físico quanto psicológico, é a adaptação que os animais podem

desenvolver principalmente em exposições prolongadas (estudos de estresse crônico). Dessa

forma, quando um mesmo estressor é apresentado repetidas vezes, a resposta do eixo HPA pode

se tornar estável. Por outro lado, quando utilizamos um paradigma constituído por diversos

estressores verifica-se uma elevação da corticosterona (importante mediador do eixo HPA)

quando esses animais são desafios com uma imobilização aguda. Assim, levando isso em

consideração, foi desenvolvido o modelo de estresse crônico moderado, que é constituído por

diversos estressores físicos e psicológicos que são apresentados ao animal de forma imprevisível,

buscando assim evitar a adaptação. Diferentes protocolos de estresse crônico moderado já foram

desenvolvidos, sendo que estes variam a duração de cada estressor e o período que o animal

será exposto a eles (de 10 a 40 dias).

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- 61 -

7. A IMPORTÂNCIA DE TUDO ISSO

O estudo da resposta ao estresse se coloca como um vasto campo de investigação na

atualidade. Por ser um fenômeno que apresenta alto valor adaptativo para os seres vivos, a

compreensão dos mecanismos e mediadores envolvidos nesse processo e como seus efeitos

impactam nossas funções fisiológicas é algo extremamente valioso.

Tabela 2: Representação de um protocolo de 40 dias de estresse crônico moderado

Page 61: Apostila 3 - 2013

- 62 -

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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RANG & DALE. (2007). Farmacologia. Tradução da 6ª Ed.

Page 62: Apostila 3 - 2013

- 63 -

1. CRONOBIOLOGIA

A Cronobiologia é a ciência que estuda as qualidades temporais dos organismos vivos. Ela

inclui o estudo dos ritmos biológicos caracterizados pela recorrência, a intervalos regulares, de

eventos bioquímicos, fisiológicos e comportamentais.

As variações que acontecem nesses intervalos correspondem às respostas adaptativas à

alternância dos dias e noites, estações do ano, fases da lua e outros ciclos ambientais. A

incorporação desses ciclos ambientais concede aos organismos a possibilidade de anteciparem

mudanças ambientais. Por exemplo: comportamentos de hibernação, migração ou reprodução

em certas épocas do ano. No caso dos seres humanos, o ciclo vigília-sono é considerado uma

adaptação ao ciclo claro-escuro.

Diz-se que os ritmos biológicos têm um caráter endógeno, já que ele persiste em ambientes

artificiais, constantes ou até mesmo na ausência de pistas ambientais. Isso quer dizer que esses

ritmos são determinados por fatores internos ao organismo. A demonstração desse caráter

endógeno advém de experimentos com plantas e animais que eram isolados de estímulos

ambientais, os quais agiam como dicas temporais.

No século XVIII, De Marian colocou uma planta chamada Mimosa pudica – “planta

dormideira” dentro de um baú em condição de escuro constante. Ele notou que as folhas

continuavam abrindo e fechando. Assim, concluiu que o ritmo não estava sendo determinado

pela oscilação luminosa ambiental, e propôs que esse ritmo endógeno fosse entendido como

uma propriedade intrínseca da planta. Experimentos semelhantes foram realizados com ratos de

laboratório, em que o ciclo de iluminação é 12:12 (12 horas claro e 12 horas escuro). Os ratos têm

hábitos noturnos, ou seja, o ritmo atividade-repouso deles é caracterizado pelo predomínio de

maior atividade no período de escuro. Quando submetidos a escuro contínuo, eles mantiveram

seu ritmo, porém, com uma duração um pouco diferente das 24 horas do período endógeno e,

nesse caso, o ciclo atividade-repouso estava em livre-curso. Do mesmo modo, seres humanos

mantidos em situações de isolamento temporal passavam a dormir e acordar com uma

periodicidade superior a 24 horas.

De modo geral, o período endógeno é diferente do ciclo ambiental a que se está

sincronizado, sendo um pouco maior ou menor. Sendo assim, surgiram alguns termos para

caracterizar a periodicidade dos ritmos:

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circadianos – oscilam em torno de um dia – entre 20 e 28 horas. Ex.: ciclo vigília-sono,

temperatura corporal, liberação da melatonina.

infradianos – ritmos de baixa frequência, com períodos maiores que 28 horas. Ex.: ciclo

mentrual (28 dias), produção de plaquetas no sangue (7 dias);

ultradianos – ritmos de alta frequência, com períodos menores que 20 horas. Ex.: disparo de

neurônios (milissegundos), batimentos cardíacos (minutos).

1.1 Ritmos Circadianos

Os ritmos circadianos são oscilações que ocorrem ao longo de 24 horas e que afetam as

funções do cérebro e do corpo, como temperatura corporal central, liberação de hormônios e

ciclo vigília-sono. É o principal marcapasso que regula esses ritmos está localizado no hipotálamo,

e situado no Sistema Nervoso Central (SNC), mais precisamente no núcleo supraquiasmático. O

SNC recebe a informação sobre a luminosidade ambiental, ciclo vigília-sono, e condição de

atividade. Em resposta a esses estímulos, produz sinais para regular o tempo de atividade e

comportamento.

Evidências recentes indicam que o ritmo circadiano é controlado intracelularmente por

mecanismos genéticos. Os mecanismos moleculares provenientes desta habilidade de “relógio

biológico” estão ainda sendo elucidados, mas parecem ser providos por meio de alças de

retroalimentação de transcrição e tradução associadas a eventos sinalizadores. Nesse sentido,

distúrbios do ritmo circadiano e fenótipos do sono começam a se correlacionarem com

anormalidades na regulação gênica dos ritmos circadianos. Cada célula do organismo possui seu

próprio ritmo e os núcleos supraquiasmáticos têm como função sincronizar estes ritmos para que

haja harmonia entre o meio interno e externo. O mecanismo molecular intrínseco de cada célula

é composto por diversos genes, chamados genes-relógio, dentre os quais estão: Bmal1, Clock,

Period1, Period2, Period3, Crypthochrome1, Crypthchrome2, Casein Kinase1 épsilon, Rev-erb e

Rora. Alterações nesses genes, como mutações ou polimorfismos, são capazes de atrasar ou

adiantar a fase dos ritmos endógenos, o que pode causar diferenças individuais na sincronização

com o meio ambiente.

Essas diferenças individuais decorrem tanto da preferência pelos horários de vigília e sono

quanto da quantidade de horas de sono consideradas necessárias. No que diz respeito aos

horários de vigília e sono, os indivíduos se classificam em matutinos, intermediários e vespertinos. Os

indivíduos matutinos são aqueles que preferem realizar suas atividades pela manhã, enquanto os

vespertinos preferem realizar suas atividades à tarde ou à noite. Os indivíduos intermediários (ou

indiferentes) são os que têm facilidade em se adaptar a qualquer um destes horários, e é neste

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grupo que a maior parte da população está inserida. Existem ferramentas que classificam os

indivíduos quanto a sua preferência pelos horários de vigília e sono, como o questionário descrito

por Horne e Ostberg em 1976 e o questionário de Munique, descrito por Wittmann e

colaboradores em 2006. Quanto às horas de sono consideradas necessárias, existem os pequenos

dormidores, que precisam de, no máximo, 6h e 30min de sono; e os grandes dormidores, que

necessitam de, no mínimo, 8h de sono.

A temperatura corporal é um forte marcador do ritmo circadiano nos animais. A

diminuição da temperatura à noite coincide com níveis altos de melatonina, de modo que ocorre

uma relação inversa entre a temperatura e a melatonina. É importante lembrar que tanto o ritmo

da temperatura quanto da melatonina estão relacionados ao ciclo claro-escuro. Dentre as

diversas funções da melatonina, sugere-se que ela regule o declínio da temperatura, ou seja, ela

também teria um papel hipotérmico. E já que a melatonina controla, entre outros reguladores, a

temperatura corporal, quem controlaria a melatonina? Sugere-se que a luz. A luz desempenha um

papel fundamental na secreção dessa substância pela glândula pineal. Na ausência de luz,

durante a noite, há aumento da síntese dessa substância.

Outra ferramenta também utilizada no estudo dos ritmos circadianos a fim de se investigar

o ciclo vigília-sono é a actigrafia. Ela consiste em um instrumento – o actígrafo – em formato de

relógio de pulso que possui um sensor interno que registra os períodos de atividade e repouso. Os

dados registrados são transferidos para o computador, onde um software de análise fornece

informações a respeito do tempo de sono, tempo da vigília, latência para início do sono, além do

actograma, que permite visualizar o ciclo atividade-repouso de uma pessoa.

1.2 Modelo Regulatório Dos Dois Processos

Um dos modelos usados para explicar como ocorre a regulação do sono é o Modelo de

Borbély. Nesse modelo, o sono é visto como um processo de recuperação da fadiga, decorrente

de vigília anterior, a fim de que se mantenha o equilíbrio homestático do organismo – o Processo S.

O Processo S corresponde a um acúmulo de fadiga ou de um fator neuroquímico, que ocorre

durante o período de vigília promovendo o sono. Desse modo, quando o indivíduo dorme,

“desaparecem” a fadiga e essas substâncias acumuladas. Paralelamente, existe um componente

circadiano da regulação do sono – o Processo C. Esse processo funcionaria como um oscilador,

em que se observam valores mínimos de propensão ao sono ao final da fase clara, e valores

máximos de propensão ao sono no meio-período de sono, que ocorre algumas horas antes do

início da fase clara. Pode parecer meio contraditório, mas pense qual situação seria mais

desconfortável: ir dormir mais tarde, ou ser acordado às 4h da madrugada? Esse modelo prediz

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de modo qualitativo a relação entre a duração do sono e a fase circadiana do início do sono, ou

seja, esse modelo ajuda-nos a entender a regulação do sono, mas não a da vigília.

Os ritmos circadianos, principalmente entre os seres humanos, são sincronizados por pistas

ambientais como a luz, os fatores sociais, a alimentação, entre outros. Um desbalanço nessa

sincronização toda frequentemente traz consequências maléficas ao organismo. Certamente,

muitas pessoas gostariam de dormir mais, ou até mais tarde, mas as expectativas e cobranças da

sociedade (que ainda funciona muito mais durante o dia do que durante a noite) impedem que

as pessoas respeitem o curso natural de seus “relógios biológicos”. Nesse sentido, o

desenvolvimento de estudos na área da cronobiologia pode ajudar no entendimento e

tratamento dos transtornos do ritmo circadiano, bem como, na prevenção de riscos para saúde

causados, por exemplo, por trabalhos com horários irregulares.

1.3 Distúrbios De Ritmos

A melatonina possui receptores expressos na maioria dos órgãos, glândulas e tecidos, e,

desse modo, regula o padrão de secreção circadiano dos hormônios, o ciclo atividade-repouso e

a temperatura corporal central. Quando há uma ruptura da ritmicidade circadiana induzida por

fatores endógenos ou ambientais, o resultado será uma alteração nos padrões de secreção da

melatonina levando, frequentemente, a sintomas clínicos.

Dentre os distúrbios associados a causas exógenas (ambientais), estão:

1.3.1 Distúrbios de sono devido ao trabalho em turno ou noturno (shift work), é a principal

causa de dessincronização dos ritmos biológicos. É definido por: sonolência excessiva durante o

trabalho noturno, com insônia no período de sono diurno; perda do alerta durante as horas do

trabalho, principalmente no primeiro período da manhã. Consequências clínicas: alterações

comportamentais, distúrbios do sono, problemas de segurança no trabalho, regulação

metabólica e hormonal alterada, e susceptibilidade a câncer. Atinge de 5 a 10% dos

trabalhadores noturnos ou de turnos irregulares.

1.3.2 Distúrbio devido a vôos transmeridianos e jet lag – ocorre pela passagem rápida por

múltiplos fusos horários em longas distâncias de viagens aéreas transmeridianas, e resulta na

dessincronização do ritmo circadiano. Consequências clínicas: insônia, despertar precoce,

sonolência diurna, e perda da eficiência conhecida como “distúrbio de jet lag”. A intensidade

varia de acordo com a duração e intensidade do vôo, número de fusos atravessados e tolerância

individual.

Os distúrbios do ritmo circadiano de origem endógena são caracterizados por queixas de

insônia ou sonolência diária que primariamente resultam de alterações no sistema de timing

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circadiano interno ou desequilíbrio entre o horário de sono normal e o ambiente físico e social de

24h. Dentre os distúrbios associados a causas endógenas, estão:

1.3.3 Distúrbio do avanço de fase do sono – a maioria da atividade vespertina é

antecipada por uma obrigatoriedade precoce em ir para cama, com o despertar às 3h, ou antes.

Esse padrão é frequentemente observado em pessoas mais velhas. Em paralelo, ocorre um

avanço da temperatura central do corpo e do pico de secreção de melatonina, resultando em

uma alteração endógena do relógio biológico. Também pode ocorrer uma fotorrecepção

reduzida.

1.3.4 Distúrbio do atraso de fase do sono – é definida por uma anormalidade no tempo

de sono e vigília que são atrasados, resultando em dificuldade para despertar pela manhã a

tempo de realizar seus compromissos matutinos. Parece haver uma relativa contribuição dos

fatores endógenos e exógenos subjacentes a esse fenômeno. Este padrão é mais frequentemente

observado em jovens com pouca rigidez de horários e também em pessoas com preferência pela

noite. Em casos primários este distúrbio, em que não há fatores externos interferindo, o pico de

secreção de melatonina é espontaneamente atrasado.

1.3.5 Cegueira – pessoas que são totalmente privadas de percepção à luz apresentam

dessincronização de seu ritmo biológico e livre-curso.

1.3.6 Idade – o envelhecimento é associado com alterações do ciclo vigília-sono,

temperatura central corporal, ritmo cardíaco, pressão sanguínea, secreção hormonal e maior

incidência de diabetes do tipo II e câncer. Muitas causas podem estar envolvidas, incluindo

distúrbios de sono primários, depressão ou uso de medicação. Entretanto, alterações do relógio

biológico e regulações circadianas idade-dependentes parecem estar entre as principais causas

de desregulações do ciclo atividade-repouso associadas com insônia em sujeitos idosos.

2. HISTÓRICO DO SONO

Acreditava-se que o sono resultasse da evaporação dos alimentos no organismo. Segundo

essa hipótese, assim como o ar quente sobe, o alimento evaporado também subiria, provocando

sonolência. Curiosa é a explicação ligada a esse conceito da relação entre o sono na criança e o

tamanho da cabeça: as crianças, que dormem muito, têm a cabeça proporcionalmente maior

do que a do adulto porque muito mais alimento se evapora e nela penetra, dilatando-a! E quem

desenvolveu essa teoria foi ninguém menos que Aristóteles!

O sono, que já foi denominado como “o estado intermediário entre a vigília e a morte”, foi

por muito tempo considerado como um estado passivo do organismo. O sono era visto apenas

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como um estado inativo do cérebro, resultante da diminuição da percepção sensorial. Hoje se

sabe que o sono é um comportamento dinâmico, e que ele não é simplesmente a ausência da

vigília, mas sim uma atividade especial do cérebro, controlada por mecanismos elaborados e

precisos.

2.1 As Primeiras Descobertas

Vale citar alguns fatos que alteraram de modo significativo as abordagens e as

perspectivas relativas ao sono:

a- Os antigos fisiologistas e neurologistas não dispunham de instrumentos que

permitissem avaliar de forma mais precisa do que simplesmente observar indivíduos e animais

dormirem. Em meados do século XIX, o fisiologista alemão Ernst Kohlschütter decidiu medir a

profundidade do sono determinando o limiar de estímulo auditivo que despertava aqueles que

dormiam. Ele notou que esse limiar era muito alto durante a primeira hora de sono e depois

diminuia regularmente até o momento de acordar. Na verdade, ele encontrou quatro ou cinco

picos mais elevados durante a noite, mas considerou como artefato, sem perceber que havia

descoberto a ciclagem do sono. Um outro fisiologista alemão, Eduard Michelson, repetiu os

experimentos de Ernst com técnica mais apurada – estímulos de pressão sobre a pele – e

acreditou em seus dados, determinando as oscilações do limiar em função do tempo. Essa curva

é muito semelhante às determinadas na atualidade.

b- Entre 1920 e 1930, a invenção da eletroencefalografia mudou radicalmente a

abordagem experimental do sono. Depois de muita experimentação com animais de várias

espécies, usando um dos primeiros registradores eletrônicos construídos pela Siemens, em 1928, o

neuropsiquiatra alemão Hans Berger, conhecedor das pesquisas anteriores relativas ao sono,

registrou pela primeira vez a atividade elétrica do cérebro humano, e claramente demonstrou

diferenças nos padrões observados quando os sujeitos estavam acordados ou dormindo. Berger

nomeou os sinais registrados de “eletroencefalograma” (EEG). Foi neste momento que o

verdadeiro interesse científico sobre o sono começou: pela primeira vez, a presença do sono

podia ser estabelecida sem perturbar a pessoa que estava dormindo, e, mais importante, o sono

poderia ser continuamente e quantitativamente mensurado. Com o advento desta técnica, os

pesquisadores observaram que durante o sono humano a atividade elétrica continuava presente,

e a idéia do cérebro completamente “desligado” durante o sono mudou a partir de então.

c- Nos anos de 1937, 1938 e 1939, os fisiologistas americanos Loomis, Harvey e Hobart

descreveram as fases do que chamamos sono sincronizado (ou também, sono de ondas lentas).

d- Anos depois, Kleitman e Aserinsky, em 1953, descreveram a existência de uma fase

de dessincronização do sono. Kleitman e Dement deram o nome de sono REM devido à presença

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de movimentos rápidos dos olhos (Rapid Eye Movements). O estágio de ondas lentas, em

oposição, foi nomeado como NREM (Non Rapid Eye Movements). A descoberta do sono REM se

deu pelos estudos que eles desenvolviam sobre os ciclos de atividade e inatividade de crianças.

Em seus experimentos, Kleitman observava os movimentos oculares das crianças, pois ele

acreditava que estes seriam uma possível medida da profundidade do sono. Em 1951, Kleitman e

seu aluno Eugene Aserinsky descreveram um aparente ritmo na motilidade ocular de crianças, e a

seguir decidiram estudar o mesmo fenômeno em adultos. Porém, desta vez, ao invés de utilizar a

observação direta como método, os autores utilizaram a eletrooculografia (EOG). Às vezes, no

registro do EOG durante o sono, eram vistas mudanças bruscas no potencial elétrico, associadas

com a movimentação rápida dos olhos. A seguir, motivados pela descoberta dos movimentos

rápidos dos olhos durante o sono, e pelo desejo de expandir e quantificar este fenômeno, William

Dement e Kleitman realizaram um total de 126 noites de registro de EEG de 33 sujeitos. Após

analisar todos os registros, os pesquisadores descobriram que existia uma sequência previsível de

padrões durante o curso do sono, que se repetia a cada 90 a 100 minutos. Na época destas

observações, o sono era considerado como um estado único. Porém, de acordo com as

observações destes experimentos, Dement e Kleitman dividiram os padrões de EEG durante o

sono em dois estágios distintos:

um estágio com ondas sincronizadas (ondas lentas),

e o outro com ondas dessincronizadas (ondas rápidas).

O sono em humanos desenvolveu-se muito nas últimas décadas. A invenção de técnicas

de registro simultâneo de várias funções (eletrooscilograma, pressão arterial, frequência cardíaca,

respiração, saturação de hemoglobina, etc.) propicia o avanço no entendimento e no

tratamento dos distúrbios de sono, que atingem uma parcela significativa da população mundial.

3. FILOGENIA DO SONO

Filogenia é a história dos seres vivos seguindo a teoria evolucionária, ou seja, em termos de

ascendentes, descendentes e incorporação sucessiva de modificações. A história evolutiva do

sono pode ser estudada com dois objetivos diferentes. Primeiro, para se compreender a própria

evolução e seus processos; segundo, para se compreender o próprio sono. Nesta última

abordagem, as características do sono de um grupo animal adaptado a um modo de vida

podem, por exemplo, revelar a função do sono nesse grupo.

Mas quais animais dormem? Com relação aos organismos unicelulares, não houve até o

momento nenhuma declaração da ocorrência de sono. Porém, existe ampla evidência de que

algumas cianobactérias, protistas, euglenozoas e dinoflagelados apresentam ritmo circadiano de

atividade.

Page 69: Apostila 3 - 2013

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Em invertebrados, a identificação de estados equivalentes ao sono depende

principalmente de análises comportamentais (como a quiescência). Já foram constatados

estados equivalentes ao sono em abelhas, vespas, moscas, gafanhotos, borboletas, mariposas e

libélulas, inclusive com adoção de postura específica. Contudo, o invertebrado mais estudado

nesta área é a Drosophila melanogaster.

O sono comportamental já foi constatado em várias espécies de peixes, existindo desde os

peixes que nunca param de nadar (ex: alguns tubarões e atuns), até espécies que “dormem”

profundamente a ponto de poderem ser capturadas manualmente.

Os estudos de sono em anfíbios e répteis são muito importantes do ponto de vista

evolucionário. Nos anfíbios, o sono comportamental é geralmente associado com uma postura

específica (deitados ventralmente), olhos fechados, e aumento do limiar para a indução da

reação de alerta. Já com relação aos répteis, os dados indicam que ocorrem períodos de

quiescência nos quais os critérios comportamentais de sono são constatados. As pesquisas com

répteis atuais não produziram evidências convincentes da presença de sono REM ou de uma

organização do sono que possa sugerir um ciclo. De acordo com estas evidências, pode-se sugerir

que o sono REM não existiu em espécies reptilianas, entretanto evoluiu rapidamente com o

advento da endotermia.

O sono das aves é similar ao da maioria dos mamíferos. Todas as aves estudadas até o

momento mostraram ter sono de ondas lentas e sono paradoxal do ponto de vista eletrográfico. O

sono paradoxal das aves é acompanhado de movimentos oculares rápidos, e muitas delas

apresentam atonia muscular restrita a alguns músculos.

O sono já foi estudado em pelo menos uma espécie de cada ordem atual de mamíferos.

Dentre estes animais estudados sabe-se que todos dormem apresentando um estado de

imobilidade relativa, em geral com adoção de postura específica, necessidade de estímulos

sensoriais mais intensos para a indução de respostas e reversibilidade espontânea ou induzida

para a vigília.

4. O SONO EM ROEDORES

O rato é um animal noturno, isto é, a vigília predomina à noite e o sono durante o dia.

Durante o período escuro estes animais também dormem, porém, em menor proporção quando

comparado com o período claro. Os ratos dormem aproximadamente 13 horas por dia e

apresentam o sono estruturado de uma forma muito semelhante ao sono de humanos.

Page 70: Apostila 3 - 2013

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Como ocorrem no EEG em humanos, no rato também se manifestam oscilações rápidas

(dessincronizadas) e lentas (sincronizadas). Em decorrência dessa distinção básica quanto à

frequência e amplitude das ondas, costuma-se dividir o sono em dois estados fundamentais que

são o sono de ondas lentas, ou sono sincronizado, e sono dessincronizado, ou sono paradoxal.

Assim, atualmente é aceito que no ciclo vigília-sono do rato pode-se detectar os seguintes

estágios:

• Vigília atenta ou ativa

• Sono sincronizado ou sono de ondas lentas

• Sono paradoxal

A vigília atenta é caracterizada por ondas ou ritmo teta, com alta frequência e baixa

amplitude no eletrocorticograma (ECoG) e tônus muscular elevado. Com a progressão do ciclo,

ocorre o aparecimento de ondas delta de alta voltagem e baixa frequência. No início do sono

surgem ondas delta, acopladas ou não aos fusos do sono. Esta fase do sono do rato é chamada

de sono sincronizado ou sono de ondas lentas, nessa fase o sono é mais profundo do que na

anterior, uma vez que o limiar para despertar o animal se eleva. A seguir, o sono evolui para o

sono paradoxal, e aparecem no ECoG ondas dessincronizadas. Assim como em humanos, os ratos

também apresentam atonia muscular e movimentos rápidos dos olhos nesta fase do sono, porém,

os movimentos do rostro e vibrissas são mais acentuados por serem albinos.

5. A ESTRUTURA DO SONO EM HUMANOS

O primeiro manual de estagiamento do sono de humanos adultos foi publicado em 1968.

Esta publicação foi realizada por um comitê formado por experientes pesquisadores em fisiologia

e distúrbios de sono, junto ao Brain Information Service. Em 2007, a Academia Americana de

Medicina do Sono publicou um novo manual para estagiamento do sono e eventos associados,

na tentativa de padronizar as regras, terminologia e especificações técnicas relacionadas à

polissonografia (PSG).

Basicamente, a descrição do sono humano normal compreende em 2 estados: o sono

NREM (convencionalmente dividido nos estágios N1, N2 e N3) e o sono REM, que se alternam

ciclicamente no decorrer do sono em intervalos que variam de 70 a 110 minutos. Cada sequência

NREM-REM forma um ciclo de sono que se repete de 4 a 6 vezes por noite, dependendo do

período total de sono.

Cada estado possui características bem definidas. O sono NREM apresenta EEG com

ondas sincronizadas e alguns grafoelementos característicos associados com tônus muscular

reduzido e atividade psicológica mínima. Já no sono REM, o EEG é dessincronizado, há a atonia

muscular, episódios de movimentos rápidos dos olhos, e os sonhos são típicos.

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Em um adulto normal, é comum observar o início do sono com a presença do estágio N1

do sono NREM com prevalência de ondas teta e ondas agudas do vértex, além de movimentos

oculares lentos. Indivíduos sonolentos podem iniciar em outras fases do sono como N2, por

exemplo. Quando se inicia no estágio N1, a seguir, o sono progride para o estágio N2, que é

caracterizado pela presença de fusos do sono e/ou complexos K. Com a progressão do estágio

N2, há o aparecimento gradual de ondas delta no EEG, caracterizando a entrada no estágio N3.

Após cerca de 90 minutos do início do sono, surge o primeiro episódio de sono REM (EEG

dessincronizado, atonia muscular, episódios de movimentos rápidos dos olhos), e que delimita o

final do primeiro ciclo do sono. Apesar da semelhança, os ciclos do sono apresentam algumas

características específicas no decorrer da noite. Geralmente, o estágio N3 ocorre em grandes

quantidades nos primeiros ciclos, diminuindo gradativamente, até a completa ausência no último

terço da noite. Em contraste, observa-se um aumento progressivo do sono REM.

6. BASES NEURAIS DO CICLO VIGÍLIA-SONO

A descoberta do sono como um estado ativo, com ciclos que apresentam alternância na

atividade elétrica cerebral, despertou na comunidade científica o interesse pelo estudo das bases

neurais responsáveis pelo ciclo vigília-sono. Atualmente, sabe-se que a alternância de um estado

ativo (vigília) para o sono deve-se devido à integração de diferentes sistemas neurais, e

neurotransmissores distintos, que influenciam a atividade elétrica cerebral e o estado

comportamental.

Os estudos pioneiros utilizando técnicas de transecções e lesões demonstraram que grupos

neuronais localizados no tronco encefálico poderiam ser responsáveis pelo estado de ativação

semelhante à vigília. Baseado nestes estudos, Moruzzi e Magoun (1949) descreveram a presença

de um sistema central promotor de vigília: o sistema de ativação reticular ascendente (SARA). O

SARA seria composto por grupos neuronais que se estendiam ao longo do tronco encefálico

gerando ativação prosencefálica, e consequente despertar comportamental. Entretanto, o

conceito do SARA vem sendo substituído pelos achados atuais de que o despertar não é

facilitado por um único sistema localizado no tronco encefálico, mas por diversos grupos neurais

presentes no tronco encefálico e prosencéfalo (telencéfalo e diencéfalo). Estes grupos celulares

são compostos por células noradrenérgicas no locus coeruleus, neurônios serotoninérgicos nos

núcleos da rafe, células que sintetizam acetilcolina localizadas no tegmento pedúnculo pontino e

no tegmento laterodorsal, neurônios glutamatérgicos no mesencéfalo, e grupos celulares na

substância negra e área tegmental ventral que sintetizam dopamina. Estruturas presentes no

prosencéfalo também participavam da vigília e ativação cortical. Neurônios que contêm

histamina presentes no núcleo tuberomamilar do hipotálamo posterior, células hipocretinérgicas

(também conhecidas como orexinérgicas) no hipotálamo posterior, neurônios colinérgicos no

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prosencéfalo basal, células que sintetizam neuropeptídeo Y no núcleo supraquiasmático e células

glutamatérgicas no córtex pré-frontal ventro-medial, contribuem para promover a vigília. Os

múltiplos sistemas neuronais responsáveis pela geração e manutenção da vigília utilizam diferentes

neurotransmissores que interagem entre si contribuindo de maneira única para o despertar

comportamental.

O início do sono ocorre em resposta aos processos homeostáticos e circadianos, ocorrendo

a inibição dos sistemas ativadores do tronco encefálico, hipotálamo e prosencéfalo basal

principalmente por meio de neurônios GABAérgicos. O sono sincronizado ou NREM está associado

ao aumento da atividade de células presentes no núcleo pré-óptico ventrolateral. Esta região

contém células GABAérgicas que projetam para os núcleos monoaminérgicos presentes no

tronco encefálico e neurônios no hipotálamo posterior, tendo uma ação inibitória sobre os

geradores da vigília e da ativação cortical. O sono REM apresenta diferenças fisiológicas e

comportamentais quando comparado com o sono NREM. A presença de movimentos rápidos dos

olhos, padrão de ativação cortical semelhante à vigília e a ausência de tônus muscular são as

características mais destacadas. Uma das características do sono REM mais estudadas é a

presença de atividade cortical semelhante à vigília associada a um estado comportamental de

sono (atonia muscular e redução da resposta a estímulos externos). Estudos demonstraram que

núcleos colinérgicos presentes na região pontomesencefálica, no tegmento pedúnculo pontino e

no tegmento laterodorsal, parecem ser essenciais para a ativação cortical durante o sono REM.

Neurônios GABAérgicos presentes no tronco encefálico projetam-se para o locus coeruleus e

núcleo dorsal da rafe cessando a atividade dessas células monoaminérgicas. Ainda, há projeções

GABAérgicas, com modulação da glicina, para motoneurônios presentes na medula espinhal,

atuando na atonia muscular.

Diversos estudos analisaram a ação de neurotransmissores específicos no ciclo vigília-sono.

Estes sistemas de neurotransmissão atuam de forma integrada e recíproca para gerar os

fenômenos fisiológicos e comportamentais que compõem esse ciclo.

Durante a vigília, principalmente durante a vigília ativa, os neurônios noradrenérgicos

presentes no locus coeruleus apresentam padrão elevado de ativação e redução durante o sono

de ondas lentas e praticamente cessam o disparo neuronal no sono REM. A manutenção da

ativação cortical e do tônus muscular parece ocorrer devido a um balanço na atividade

colinérgica e noradrenérgica. Porém, os neurônios colinérgicos presentes no prosencéfalo basal

também apresentam importante função na estimulação cortical durante o sono REM. Esses

neurônios apresentam elevada atividade durante a vigília e o sono REM, cessando a atividade

durante o sono NREM. Estudos conduzidos nas últimas décadas propõem que a serotonina teria

papel fundamental na promoção da vigília e inibição do sono REM. Entretanto, recentemente

propõe-se que a serotonina não deveria ser considerada nem um promotor da vigília e nem

promotor de sono, uma vez que o seu efeito no ciclo vigília-sono depende do grau de ativação

do sistema serotoninérgico, ação nos receptores específicos e momento circadiano desta

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ativação. Os neurônios glutamatérgicos representam o suporte principal para os sistemas de

ativação cortical e comportamental presentes na vigília. Contudo, o glutamato parece também

estar relacionado com a geração do sono REM, influenciando a ativação dos grupos neuronais

presentes no tronco encefálico. Neurônios histaminérgicos e hipocretinérgicos presentes no

hipotálamo posterior estimulam a ativação cortical por meio de projeções diretas ao córtex

cerebral e projeções excitatórias para outros sistemas de ativação. Estudos experimentais

demonstram que neurônios dopaminérgicos apresentam-se ativos durante a vigília, indicando

relação com estado de ativação cortical, mas não necessariamente com despertar

comportamental. A participação desse neurotransmissor também é descrita no sono REM. Tufik foi

o pioneiro em descrever uma supersensibilidade dos receptores dopaminérgicos D2 após um

período de privação de sono paradoxal em ratos. Além disso, lesão seletiva de vias

dopaminérgicas inibe a geração do sono paradoxal. Dados farmacológicos indicam que a ação

de drogas agonistas e antagonistas dos receptores dopaminérgicos podem tanto aumentar ou

diminuir sono NREM e sono REM. O GABA, principal neurotransmissor hipnogênico, modula os

sistemas de ativação por meio da inibição da ação dos neurotransmissores promotores de vigília

ou, ainda, inibindo a liberação destes neurotransmissores. Ainda, muitas vias neurais que regulam

o ciclo vigília-sono podem ser influenciadas por fatores que modulam a atividade dos sistemas de

neurotransmissão. Essas substâncias são compostos endógenos reconhecidos como sinalizadores

ou promotores de sono. Adenosina, prostaglandinas, citocinas e alguns hormônios apresentam

interação fundamental com os sistemas neuroquímicos reguladores do ciclo vigília-sono.

Figura 1. Representação do encéfalo do rato demonstrando os principais núcleos, regiões e

neurotransmissores que atuam no ciclo vigília-sono. As setas vermelhas indicam ativação (grupos

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neuronais que estão ativos durante a vigília), as setas azuis e verdes ação inibitória (neurônios

ativos na geração e manutenção do sono). ACh: neurônios colinérgicos; GABA: neurônios

gabaérgicos; Glu: neurônios glutamatérgicos; H: células histaminérgicas; NA: neurônios

noradrenérgicos; Orx: neurônios orexinérgicos (hipocretinérgicos); Cpu: caudato-putamen

(estriado); Cx: córtex; Gi, GiA e GiV: núcleo gigantocelular da rafe; GP: globo pálido; Hi:

hipocampo; LDTg: tegmento látero dorsal; Mes RF: região mesencefálica; opt: PH: hipotálamo

posterior; PnC e PnO: núcleos pontino; POA: área pré-optica; PPTg: tegmento pendúculo pontino;

Rt: núcleo reticular do tálamo; SN: substância negra; Th: tálamo; TM: núcleo tuberomamilar; VTA:

área tegmental ventral. Modificado de Jones, 2005.

7. FISIOLOGIA DO SONO

O sono é um fenômeno de grande importância para a manutenção da saúde e

qualidade de vida, sendo considerado um processo restaurativo que modula a regulação

homeostática dos sistemas autonômico, neuroendócrino e imunológico. Durante o sono, o SNC é

sede de intensa atividade, a qual é responsável pela quietude, pela inibição de várias funções e

pela ativação de outras. Alternando-se ritmicamente com o estado de vigília, o sono se apresenta

em diversas fases consecutivas que se repetem ciclicamente. No decorrer de uma noite de sono,

os sistemas e as funções fisiológicas sofrem alterações que acompanham os ciclos de sono. A

cada ciclo NREM-REM as respostas do organismo são diferentes. A seguir serão abordadas as

principais alterações fisiológicas relacionadas com os estágios do sono.

7.1 Sistema Cardiovascular

Analisada de maneira geral, a atividade cardiovascular basal é maior durante a vigília e

diminui ao longo do período de sono. Porém, apesar de reduzida durante a maior parte do sono,

em determinados momentos, essa atividade pode aumentar e atingir níveis até mesmo superiores

aos observados durante a vigília. É comum a pressão arterial sistêmica (PAS) e a frequência

cardíaca (FC) atingirem valores inferiores ao basal durante o estágio N3 e níveis significativamente

superiores aos da vigília na fase fásica do sono REM. Fisiologicamente, vários fatores podem

modificar a atividade do sistema cardiovascular durante o sono. Dentre esses, ressaltamos:

estágios de sono (REM e NREM), profundidade do sono durante os estágios do sono NREM

(estágios N1 a N3) e tempo de sono. Se analisarmos a curva pressórica durante o sono NREM,

veremos que, principalmente no estágio N3, há uma redução significativa da PAS. Essa diminuição

acontece de maneira lenta e gradual, de forma paralela à queda da atividade física e

metabólica, caracterizando o chamado descenso pressórico fisiológico noturno. É considerado

normal o descenso noturno que seja igual ou superior a 10% dos valores basais da vigília.

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A avaliação da atividade autonômica das pupilas revela que durante o sono de ondas

lentas elas estão mais contraídas, levando a um predomínio de atividade parassimpática sobre a

simpática. O débito cardíaco também diminui durante o sono normal, porém, outros parâmetros

cardiovasculares, como, por exemplo, a pressão arterial pulmonar e a fração de ejeção

ventricular (FEV), não se modificam de maneira significativa. Assim, a redução do débito cardíaco

que ocorre no estágio N3 parece estar mais correlacionada com a redução da FC do que com

as variações da FEV. Durante o sono REM, principalmente durante os episódios de movimentação

ocular rápida (fase fásica), observamos intensas flutuações tanto da PAS quanto da FC. Essas

oscilações podem ocorrer de um extremo a outro e não guardam relação com o grau de

atividade física ou metabólica do indivíduo.

Há uma grande dessincronização entre diversos parâmetros durante o sono REM, pois

nesse período a atividade cerebral é intensa (semelhante à vigília), a temperatura corporal é

baixa e a atividade muscular atinge seu menor grau. A PAS e a FC também estão diminuídas, mas

de tempos em tempos sofrem elevações bruscas durante o sono REM. Durante esses episódios

ocorrem descargas adrenérgicas intensas que resultam em elevação da PAS, da FC e da

dilatação pupilar. O tempo de sono é outro fator que modifica a atividade do sistema

cardiovascular. Ao longo do sono, o indivíduo perde líquido, reduz o volume intravascular e fica

sujeito a maior variação hemodinâmica. Além disso, os reflexos cardiovasculares são alterados

pelo estágio de sono, propiciando um mecanismo de defesa da PAS durante o sono REM.

7.2 Sistema Respiratório

Durante a vigília a respiração é controlada pelos comandos ventilatórios voluntário ou

comportamental (córtex cerebral) e involuntário ou metabólico (vias aferentes, controlador

central localizado no tronco cerebral e vias eferentes) que respondem à hipoxemia, hipercapnia

e acidose, além de terem influência mecânica da caixa torácica e do parênquima pulmonar.

Durante o sono há uma perda do controle voluntário e diminuição da resposta ventilatória de

controle involuntário, além de hipotonia dos músculos respiratórios (das vias aérea superior,

intercostais e acessórios). Essas alterações durante o sono levam ao estado fisiológico de

hipoventilação. Considerando a respiração apenas durante o sono, torna-se mais adequado

didaticamente descrevê-la separadamente pelas fases de sono NREM instável, NREM estável e

sono REM. O sono NREM instável inclui o estágio N1, início de N2 e os diversos despertares desse

período. O sono NREM estável inclui o estágio N2 estável e o estágio N3.

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7.2.1 Sono NREM instável

Durante esse período é comum observar um padrão respiratório de aumento

(hiperventilação) e diminuição (hipoventilação) da amplitude da ventilação, acompanhado de

curtas apneias centrais. Esse padrão é chamado de respiração periódica e ocorre em 40 a 80%

dos indivíduos normais, variando de acordo com a sensibilidade individual do controle da

ventilação e idade. Os períodos de hiperventilação coincidem com a vigília e os de

hipoventilação com o sono. Esse padrão dura em média 10 a 20 minutos e desaparece com o

aprofundamento e estabilização do sono (a partir do estágio N2 estável). Os fatores que

contribuem para esse tipo de padrão respiratório são: 1) diferença de sensibilidade ao dióxido de

carbono (CO2) entre vigília e sono e; 2) instabilidade entre os estágios iniciais do sono e

ocorrência de despertares.

7.2.2 Sono NREM estável

Durante esse período a ventilação se torna regular no que diz respeito à frequência e

amplitude respiratória. Ocorre uma redução na ventilação de 0,4 a 1,5 L/min (13 a 15% do valor

da vigília). Essa diminuição é progressiva com o decorrer dos estágios N1 ao N3. Os mecanismos

responsáveis por esse estado fisiológico de hipoventilação são: o aumento da contribuição da

caixa torácica na ventilação (apesar da baixa eficiência muscular) e o aumento da resistência

das vias aéreas superiores.

7.2.3 Sono REM

No sono REM ocorre um padrão respiratório imprevisível e irregular caracterizado por

súbitas alterações (aumento e diminuição) da frequência e amplitude da respiração,

interrompidos por apneias centrais de 10 a 30 segundos. Os períodos de hiperventilação

coincidem com os surtos de movimentos oculares rápidos. O resultado desse padrão de

respiração comparado com a vigília pode ser uma ventilação por minuto aumentada, diminuída

ou inalterada. A hipoventilação do sono REM se deve à redução da contribuição muscular da

caixa torácica e à resistência de vias aéreas inalteradas em comparação à vigília.

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7.3 Sistema Renal

A função dos rins é filtrar grandes quantidades de líquido do plasma, reabsorvendo os

constituintes necessários, sem, no entanto, reabsorver aqueles que são desnecessários.

Aproximadamente 1% do filtrado glomerular é eliminado como urina. Apesar do volume pequeno,

ele contém a maior parte dos produtos finais do metabolismo, altamente concentrados. Alguns

desses produtos são: uréia, ácido úrico, creatinina, fosfatos, sulfatos e excesso de ácidos. Em

relação ao sono, sabe-se que o fluxo de urina e a excreção de eletrólitos são maiores durante o

dia em comparação à noite, ainda que esta variação reflita parcialmente a modulação

circadiana. Além desse ritmo de 24 horas, o fluxo de urina e a osmolaridade oscila com o ciclo

NREM-REM. O sono REM é associado com a diminuição do fluxo de urina e aumento da sua

osmolaridade.

7.4 Sistema Digestório

Durante o sono ocorrem modificações no funcionamento do aparelho digestório

decorrentes da diminuição da influência do SNC. O estudo das alterações do sistema digestório

durante o sono possui algumas limitações, uma vez que os métodos de estudo são, em sua

maioria, muito invasivos e dificultam o sono do indivíduo. De modo geral, o sono provoca

diminuição da atividade do aparelho digestório. O fluxo de saliva é inibido (fato que prejudica a

neutralização do ácido intraesofágico quando ocorre refluxo gastroesofágico). Associada à

diminuição da secreção salivar, há uma redução na frequência de deglutição. Essa diminuição

no número de deglutições diminui também o número de contrações primárias. A associação

entre diminuição do volume de saliva e menor número de contrações primárias é particularmente

importante quando há ocorrência de refluxo gastroesofágico, situação em que a retirada e

neutralização do material refluído estão prejudicadas. A secreção gástrica apresenta maior

produção de secreção ácida entre 22 e 2 horas, independente do indivíduo estar dormindo ou

não. A motilidade intestinal é mais regular durante a noite do que durante o dia. Alguns estudos

têm demonstrado que a atividade do cólon (cólon transverso, descendente e sigmóide), tanto do

tônus como das contrações, está diminuída durante o sono e aumentada ao acordar. Durante o

despertar, há um aumento espontâneo da atividade do cólon. Entretanto, esta atividade difere

de acordo com o despertar, sendo caracterizada por contrações peristálticas de grande

amplitude mediante um despertar espontâneo e por contrações segmentares mediante um

despertar abrupto.

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- 79 -

Quando a pessoa dorme após a refeição, a atividade do intestino diminui e o padrão

motor interdigestivo retorna mais precocemente, ou seja, a duração dos movimentos do intestino,

característicos do período pós-prandial, está diminuída. Estudos realizados em humanos e em

animais confirmaram a relação entre a distensão do intestino e o sono. A hipótese que explica

esta observação é a diminuição do tônus vagal no intestino durante o sono. Embora o mecanismo

que explica essa condição ainda não esteja completamente desvendado, há possibilidades de

que seja consequência da liberação de hormônios gastrintestinais, como a colecistoquinina, ou

da estimulação do SNC pela distensão do intestino.

7.5 Sistema Endócrino

O sistema endócrino é bastante heterogêneo. Por ser um sistema formado por glândulas

distintas, sem relação funcional ou anatômica condicional entre si, os efeitos do sono sobre esse

sistema são variados. De fato, a relação entre sono e sistema endócrino não é global, mas sim

direcionada a cada órgão e, mais especificamente, à produção e secreção de cada hormônio.

A seguir serão discutidos alguns dos hormônios com relação mais bem estabelecida com o sono.

7.5.1 Hormônio Adrenocorticotrófico E Cortisol

O sono apresenta relações bastante conhecidas com o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal

(HPA), tanto em situações normais quanto em condições de estresse. Dentre os hormônios deste

eixo, dois destacam-se por sua relação com o sono: hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) e

cortisol.

O cortisol, hormônio secretado frente o estímulo de ACTH, é classicamente tido como

responsivo à variação circadiana, com valores máximos atingidos no início da manhã e valores

mínimos ao adormecer. Além disso, a atividade de ACTH e a consequente secreção de cortisol

aumenta abruptamente próximo ao horário de acordar. Ainda que se possam associar os níveis

de cortisol a variações circadianas, sabe-se que o sono e sua privação exercem grande controle

sobre os níveis plasmáticos desse hormônio. Nesse sentido, observa-se que despertares durante o

sono noturno acarretam em pulsos de liberação de cortisol e que a privação de sono em

roedores leva a aumentos significativos nas concentrações plasmáticas desse hormônio. Além

disso, nota-se que mediante a privação de sono o nadir da secreção de cortisol torna-se menos

pronunciado e ocorre previamente ao esperado em condições de sono normal.

Page 79: Apostila 3 - 2013

- 80 -

7.5.2 Aldosterona

Assim como o cortisol, a aldosterona apresenta ritmicidade circadiana, com picos e

nadires de secreção coincidentes. Contudo, ao contrário do observado com o cortisol, a

secreção de aldosterona é alterada pela manipulação do tempo de sono e possui relações mais

bem delimitadas com a estrutura de sono. Nesse sentido, salienta-se a concomitância do pico de

secreção de aldosterona com o sono REM e a alteração da funcionalidade da aldosterona

mediante inversão de turno. Além disso, nota-se que a privação de sono é capaz de inibir a

ascensão noturna dos níveis plasmáticos desse hormônio.

7.5.3 Hormônio Luteinizante (LH) e Hormônio Folículo Estimulante (FSH)

Dentre os hormônios gonadotrópicos, o FSH é responsável pelo início da espermatogênese,

enquanto que o LH é o estímulo primordial para a secreção da testosterona. Ainda não estão

completamente elucidados os mecanismos exatos entre esses dois hormônios e o sono, fato este

atribuído a limitações na sensibilidade dos ensaios de mensuração e o padrão secretório pulsátil

da gonadotrofina circulante. Alguns estudos, porém, têm descrito um aumento das

concentrações gonadotrópicas durante o sono em adolescentes de ambos os gêneros. Tanto LH

como o FSH apresentam atividades pulsáteis durante a noite sem nenhuma relação com a

secreção de testosterona. Durante o sono nos primeiros estágios da adolescência, no entanto, há

um aumento marcante da concentração plasmática de LH em contraste com a testosterona e

prolactina. LH e FSH não apresentam um ritmo circadiano distinto, e em homens adultos, pode

não haver variações entre o dia e a noite. Há uma escassez de estudos relacionados a esse tema,

no entanto sabe-se que esses hormônios podem variar de acordo com o tipo e intensidade dos

agentes estressores. Em humanos, períodos de estresse que incluem restrição de sono (ex:

treinamento militar), induzem aumento da concentração de LH, enquanto que o FSH mantém-se

inalterado.

7.5.4 Testosterona

A testosterona é um hormônio andrógeno que apresenta um papel importante no

desenvolvimento dos tecidos reprodutivos masculinos como testículos e próstata, além de

promover o desenvolvimento das características sexuais secundárias masculinas. Grande parte da

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- 81 -

testosterona (>95%) é produzida pelos testículos nos homens. Pequenas quantidades também são

encontradas em mulheres, sendo produzida pelas células tecais dos ovários, pela placenta e pela

zona reticular do córtex da adrenal. Nos testículos, a testosterona é sintetizada pelas células de

Leydig, além de ser necessária para as células de Sertoli no processo da espermatogênese. A

liberação de testosterona pelos testículos é episódica e ocorre em resposta ao estímulo pulsátil de

gonadotropina. Além disso, há um ritmo diurno na sua liberação, com pico por volta das 8 horas

da manhã e mínimas concentrações por volta das 20 horas. Alguns estudos demonstram que o

ritmo noturno da testosterona está relacionado aos ciclos de sono NREM-REM. Schiavi e

colaboradores demonstraram que em homens idosos saudáveis havia associações positivas entre

a eficiência de sono, a latência para sono REM, número de episódios REM e níveis de testosterona

plasmática. Inversamente, baixa eficiência de sono e redução no número de episódios de sono

REM foram associados com níveis atenuados de testosterona. Somado a isso, Luboshitzky e

colaboradores demonstraram que o aumento na testosterona noturna em homens jovens

saudáveis durante o sono ocorre no início do sono e atinge um platô após 90 minutos,

aproximadamente no primeiro episódio de sono REM. Os níveis de LH, no entanto, não diferiram

entre a vigília, sono REM e NREM. Estes dados revelam que o aumento da testosterona pode estar

causalmente relacionado ao primeiro episódio de sono REM, sendo que ambos o aumento de

testosterona e a latência do sono REM refletem um ritmo circadiano comum.

A liberação de testosterona exibe um acentuado ritmo diurno em jovens saudáveis. As suas

concentrações plasmáticas são baixas no início do sono e apresentam níveis máximos nas

primeiras horas da manhã, sugerindo que outros fatores, além do hormônio LH, controlam o ritmo

de secreção da testosterona. Um estudo envolvendo a fragmentação de sono em homens jovens

(dormiam 7 minutos a cada 20 minutos) demonstrou uma atenuação do aumento noturno de

testosterona, principalmente naqueles indivíduos que não tiveram sono REM durante a noite de

experimento. Somado a isso, estudos experimentais com ratos privados de sono por 96 horas

demonstraram uma redução consistente nas concentrações de testosterona, as quais não

retornaram aos seus níveis basais em 96 horas de rebote de sono.

7.5.5 Progesterona

Este hormônio pode influenciar diversos comportamentos, como por exemplo, reprodução,

humor, apetite, aprendizagem, memória, atividade sexual e ainda, a qualidade do sono e a

respiração. A progesterona produz um efeito hipnótico/indutor de sono e é um potente

estimulante para a atividade respiratória em homens. Por esse motivo, tem sido associada a uma

diminuição do número de episódios de apneias centrais e obstrutivas do sono.

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- 82 -

Considerando que a ereção é um fenômeno característico do sono paradoxal/REM, a

modulação exercida pela progesterona nos reflexos genitais poderia ser atribuída aos seus efeitos

sobre o sono paradoxal. Estudo recente mostrou que a mifepristona, antagonista de receptor de

progesterona, diminuiu a duração dos episódios de sono paradoxal, além de diminuir reflexos

genitais. Assim, esse achado sugere que a progesterona deva estar envolvida na regulação do

sono paradoxal.

7.5.6 Hormônio do crescimento (GH)

As concentrações plasmáticas do GH são estáveis e baixas durante toda vigília, sendo

abruptamente permeadas por pulsos de secreção. Dentre esses pulsos, o maior é observado em

associação ao início de sono. Além disso, há uma relação importante entre a secreção de GH e o

aparecimento de ondas delta no EEG, com forte correlação positiva entre a quantidade de

hormônio secretado e o tempo de sono de ondas lentas. Confirmando essa relação, a indução

farmacológica de sono de ondas lentas resulta em aumento na secreção de GH.

Os mecanismos pelos quais o GH é relacionado à latência de sono não estão

completamente elucidados. Nesse ponto, questiona-se se essa associação é devida a uma ação

direta sobre a secreção de GH ou se ela depende da relação do sono com hormônios

reguladores de sua liberação, como o hormônio liberador de hormônio do crescimento (GHRH), a

somatostatina e a grelina. Nota-se que a secreção de GH é claramente controlada pelas

condições de sono, ao passo que o controle circadiano é baixo. Este fato é constatado mediante

a privação de sono, quando observa-se que a secreção de GH é associada ao próximo episódio

de sono.

7.5.7 Prolactina

A prolactina é um hormônio diretamente ligado ao sono, com concentrações plasmáticas

bastante aumentadas nesse período em relação à vigília. Sabe-se que sua secreção inicia-se

entre 60 a 90 minutos após o início do sono, devido à diminuída inibição dopaminérgica. Contudo,

esse hormônio apresenta seu pico de concentrações plasmáticas nas primeiras horas (4 às 7

horas) da manhã. O controle sobre a secreção da prolactina parece responder principalmente à

variação circadiana. Todavia, nota-se que, independente do horário, a latência de sono tem

efeito estimulatório sobre a secreção desse hormônio, embora se observe menor amplitude de

liberação. Em linhas gerais, a prolactina modula o sono REM por meio de uma ação central. A

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- 83 -

injeção intracerebral de prolactina ou anticorpos anti-prolactina estimula ou inibe o sono REM,

respectivamente. É provável que a prolactina intracerebreal module o sono REM sob condições

fisiológicas, enquanto a prolactina da pituitária forneça estímulo adicional quando a secreção de

prolactina é alta, isto é, em situações de estresse. Estudos em humanos examinando os efeitos da

prolactina no sono são raros, entretanto, em pacientes com prolactinoma, o sono de ondas lentas

está seletivamente aumentado quando comparado aos controles, mostrando que a prolactina

também é capaz de modular o sono de ondas lentas.

Interessantemente, estudos em pacientes depressivos demonstraram redução nos níveis de

prolactina durante a privação de sono total. Além disso, em indivíduos jovens saudáveis restritos

de sono por 6 dias (4 horas de oportunidade de sono), a elevação noturna nos níveis de

prolactina mostrou-se abrupta, mas de curta duração, resultando em uma redução geral na

média dos níveis de prolactina das 24 horas. Outro estudo, porém, revela que homens jovens

saudáveis privados de sono por uma noite apresentaram aumento nos níveis de prolactina após a

privação de sono. Em idosos privados de sono, o mesmo efeito é observado, com aumento

marcante nos níveis de prolactina. Somado a isso, ratos privados de sono paradoxal por 96 horas

também apresentaram aumento significativo nos níveis de prolactina circulante, o qual foi

associado com o rebote aumentado de sono paradoxal.

7.5.8 Hormônio tireoestimulante (TSH)

A secreção de TSH é dada sob forte influência circadiana. São observados valores

aumentados durante a noite, pico concomitante ao início do sono e subsequente declínio, com

valores mínimos nas primeiras horas da manhã. Além da influência circadiana, nota-se uma

relação de inibição promovida pelo sono sobre a secreção do TSH. Em condições de restrição de

sono, a secreção de TSH pode estar aumentada em até 200%. Apesar disso, recentemente foi

descrita uma diminuição nos níveis plasmáticos desse hormônio após 14 dias de restrição de sono.

7.6 Sistema Imunológico

Diversos estudos levantam a hipótese de que o sono desempenha função essencial nos

processos imunológicos. Nesse sentido, a diminuição do tempo dedicado ao sono e os diversos

distúrbios têm sido associados a prejuízos nos mecanismos envolvidos na imunocompetência,

especialmente no que diz respeito ao aumento da susceptibilidade a patógenos como vírus e

bactérias. Em especial, as citocinas que estão diretamente envolvidas com ativação da resposta

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- 84 -

imunológica e resposta efetora da imunidade inata e adquirida apresentam uma função

essencial nos mecanismos de regulação do ciclo vigília-sono, uma vez que o sono e o sistema

imunológico compartilham várias moléculas regulatórias. Esses mediadores estão envolvidos tanto

na fisiologia do sono como no envolvimento do sono na resposta de fase aguda decorrente de

infecções. É sabido que a maioria das doenças infecciosas e distúrbios inflamatórios crônicos

afetam o sono. Muitos tipos de infecções como, por exemplo, viral, bacteriana, fúngica ou por

parasitas, afetam a quantidade de sono de ondas lentas e sono REM. Além disso, excesso de

sonolência é reportado em pacientes com mononucleose infecciosa, HIV-1 e resfriado comum

induzido por Rhinovírus.

7.7 Temperatura Corporal

A temperatura corporal é controlada pelo equilíbrio entre a intensidade da perda de calor

e a intensidade da produção de calor. Centros nervosos no hipotálamo, denominados de

termostato hipotalâmico, controlam a temperatura corporal pela regulação tanto da perda

como da produção de calor. Diversos estudos têm demonstrado a relação entre o ciclo vigília-

sono, ritmo circadiano e termorregulação. O hipotálamo, além de exercer o controle

termorregulatório, está envolvido com mecanismos regulatórios do sono. A temperatura corporal

reduz-se no início do sono, e os menores valores são observados no terceiro ciclo de sono. O

menor nível de regulação da temperatura corporal ocorre durante o sono NREM em comparação

a vigília, e a termorregulação está inibida durante o sono REM. De fato, no sono REM tanto o

sistema hipotalâmico quanto o cortical estão inativados fazendo com que a temperatura

corporal nos últimos estágios do sono seja baixa. Embora existam vários estudos sobre a

diminuição da temperatura durante o sono REM, ressalta-se que ocorrem simultaneamente

alterações na pressão sanguínea, fluxo sanguíneo e tônus vasomotor periférico, que estão sob

influência de diversos sistemas, interagindo independentemente dos controles termorregulatórios.

Em ratos, quando a temperatura ambiente é mantida abaixo de 24ºC o animal dorme

enrodilhado. Acima dessa temperatura ele tende a estirar-se, completando o estiramento em

torno de 30ºC. Entretanto, quantificando-se o tempo de sono verifica-se que abaixo de 24ºC e

acima de 30ºC o animal tende a dormir menos, aumentando os períodos de alerta; a redução do

sono ocorre à custa do sono paradoxal, mantendo-se o tempo de sono de ondas lentas

razoavelmente constante. Com isso, pode-se dizer que o sono paradoxal (diminui em função de

temperaturas muito baixas e muito altas. A Figura 2 mostra a variação circadiana da temperatura,

assim como sua variação ao longo de um ciclo de sono. Aclimatando ratos a temperaturas baixas

(14ºC) e posteriormente, fazendo-os dormir a temperaturas mais altas (24ºC) verificou-se que o

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- 85 -

sono paradoxal continua parcialmente suprimido, demonstrando um possível mecanismo

relacionado com a termorregulação intervindo na programação do sono paradoxal.

7.8 Controle da glicemia

Em geral, os níveis glicêmicos durante a noite permanecem estáveis ou apresentam

quedas discretas, mesmo considerando esse como um período de jejum que varia em média de 7

a 9 horas. Em contrapartida, períodos de jejum em tempos semelhantes, mas conduzidos com

indivíduos acordados implicam em queda marcante da glicemia. Essas constatações sugerem

que os mecanismos responsáveis pela manutenção da glicemia são de algum modo modulados

pelo sono. Em condições experimentais de infusão contínua de glicose, na qual a glicemia reflete

basicamente o uso deste metabólito, uma vez que sua produção endógena é suprimida, observa-

se diminuição na tolerância à glicose. Assim, nota-se um pico de glicemia na porção média da

noite, com valores 20 a 30% maiores que os valores basais. Após esse pico, a tolerância à glicose

volta a aumentar até os valores matutinos.

Estima-se que dois terços do decréscimo no uso de glicose durante o sono sejam devido à

queda do metabolismo cerebral, ao passo que o terço restante se justifica por diminuição do

metabolismo periférico. Mesmo durante o sono o uso de glicose não é constante, sendo mais

proeminente no sono REM do que durante o sono NREM. Os mecanismos de manutenção de

glicemia bem como o controle do uso da glicose durante o sono não são completamente

elucidados. A essas funções atribuem-se ação da insulina (cujos níveis atingem pico no meio da

noite e decaem em seguida), GH e melatonina.

7.9 Controle do apetite

Figura 2. Relação entre temperatura corporal

e sono. Em A, observa-se a variação

hipotética de temperatura em 24 horas. Pode-

se notar que as menores temperaturas

corporais são registradas no período noturno.

Em B observa-se, a relação dos estágios de

sono com a temperatura corporal. Nota-se

que a temperatura reduz com o

aprofundamento do sono, chegando aos seus

menores valores no sono REM, quando a

função termorregulatória está inibida. Em

ambos os gráficos, a barra cinza representa o

período de sono.

Page 85: Apostila 3 - 2013

- 86 -

A regulação entre sono e controle do apetite é claramente bidirecional. Sabe-se que

roedores privados de comida apresentam menor tempo total de sono. Já a privação de sono

pode acarretar em hiperfagia em humanos. A relação entre sono e alimentação é diretamente

ligada às hipocretinas ou orexinas. Esses neuropeptídeos, situados em neurônios do hipotálamo

lateral promovem tanto estimulação à vigília quanto à ingestão alimentar.

A atividade das orexinas depende basicamente de dois hormônios: leptina, secretado

principalmente pelas células adiposas e relacionada à saciedade; e grelina, secretada por

células do fundo do estômago e por células épsilon no pâncreas e relacionada à fome. Tanto

grelina quanto leptina são hormônios ligados ao sono e responsivos à sua privação. Assim, pode-se

afirmar que, ainda que as orexinas estejam intimamente ligadas ao controle do sono e da

ingestão alimentar, boa parte da relação entre esse dois fatores depende desses hormônios. A

leptina apresenta um aumento marcante de concentração plasmática noturna, parcialmente

dependente da ingestão alimentar prévia e é responsável pela supressão da fome durante a

noite. A curva normal de secreção desse hormônio, com seu característico pico noturno, é

mantida mesmo em condições de nutrição parenteral contínua, explicitando controle circadiano.

Contudo, a privação de sono diminui a amplitude da variação de secreção de leptina. Já a

secreção de grelina é mais responsiva à rotina alimentar, apresentando picos referentes às

refeições. Esse hormônio também apresenta pico de secreção noturno, sendo discretamente

posterior ao pico de leptina. Para esse hormônio, os efeitos da privação de sono são pequenos,

com discreta diminuição da amplitude do pico noturno de secreção. A Figura 3 apresenta um

esquema teórico relacionando o perfil de secreção de grelina e leptina.

Figura 3. Secreção de leptina e grelina durante 24 horas. A barra cinza representa o período de

sono e as linhas pontilhadas verticais representam as refeições. A linha mais escura representa

teoricamente a secreção de leptina, ao passo que a linha mais clara representa a secreção de

grelina.

8. PRIVAÇÃO DE SONO

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- 87 -

Nas últimas décadas, a população mundial tem vivido em uma situação evidente de

débito de sono. De modo geral, estudos recentes têm demonstrado que tanto a qualidade

quanto a quantidade de sono têm diminuído nas sociedades modernas. Em caráter de

exemplo, nota-se que nas últimas cinco décadas a média de sono por noite diminuiu em cerca

de duas horas. Com isso pode-se aplicar o termo privação de sono ou déficit de sono.

De modo geral, a privação de sono diz respeito a três condições distintas, todas

relacionadas a prejuízos ao tempo de sono: privação de sono per se, restrição de sono e

fragmentação de sono. Essas três condições podem ainda ser classificadas como agudas ou

crônicas e como totais ou parciais (Tabela 1). Por fim, a privação de sono observada

atualmente pode ser explicada por dois motivos principais: causas extrínsecas ou ambientais,

nas quais se enquadram o débito de sono devido a imposições da rotina de vida moderna, e

causas intrínsecas, referentes principalmente aos distúrbios de sono.

Tabela 1. Conceitos relacionados ao débito de sono.

Privação Restrição Fragmentação

Supressão total do sono ou de

um estágio específico

Diminuição do tempo total

de sono

Constantes superficializações e

despertares permeando o sono

Ex.: Trabalhadores em turno Ex.: Insônia Ex.: Apneia obstrutiva do sono

Crônico Agudo

Débito de sono por tempo prolongado Débito de sono pontual

Ex.: Profissionais de saúde em regime de

plantão Ex.: Uma noite passada em claro

Total* Parcial*

Referente ao sono de modo geral, sem

distinção de estágios Referente a algum estágio específico

Ex.: Trabalhadores em turno Ex.: Privação de sono REM

*conceitos mais usualmente relacionados à privação de sono. Para revisão, consulte

Rynolds e Banks (2010).

8.1 CAUSAS EXTRÍNSECAS

Page 87: Apostila 3 - 2013

- 88 -

Pode-se atribuir pontualmente o débito de sono atualmente observado na população a

dois importantes fatores: o advento da luz elétrica e o início da revolução industrial. Assim, a

condição de débito de sono é genericamente melhor aplicada às populações residentes em

países industrializados, como é o caso do Brasil. Nessas sociedades, o débito de sono gerado

pode ser atribuído a diversas causas ambientais, sendo elas diretamente relacionadas ao estilo

de vida moderno. Dentre essas causas pode-se citar o aumento das responsabilidades sociais

sem decréscimo concomitante de responsabilidades domésticas, atendimento às demandas

financeiras e profissionais, e adequação do estilo de vida atual ao conceito da sociedade 24/7,

ou seja, uma sociedade ativa e dinâmica 24 horas por dia, sete dias por semana. Nessas

condições a população é impedida de ter acesso tanto a sono de qualidade quanto de

quantidade adequada, sendo sujeita diversos distúrbios de sono.

Embora imposta pelo estilo de vida atual, a restrição ou privação de sono causada por

fatores ambientais é muitas vezes uma condição voluntária. Como exemplo disso, cita-se além

dos trabalhadores em turno, o fato de boa parte das opções de lazer e entretenimento

disponíveis atualmente serem oferecidas no período noturno. Em geral, as consequências da

restrição de sono por causas extrínsecas podem ser revertidas por medidas comportamentais,

que visam adequar o padrão de sono apresentado ao adequado.

8.2 CAUSAS INTRÍNSECAS

As causas intrínsecas ao débito de sono (incluindo fragmentação ou privação) dizem

respeito primordialmente aos distúrbios de sono. Como exemplo, o caso da síndrome da apneia

obstrutiva do sono (SAOS) e da síndrome das pernas inquietas, as quais causam a fragmentação

crônica do sono e sonolência excessiva diurna; ou da insônia, que leva à restrição de sono pela

diminuição de horas dormidas e a demais consequências durante o dia.

Os distúrbios de sono também são responsivos a fatores ambientais, ainda que em menor

grau. É o caso, por exemplo, da SAOS, uma síndrome cujos sintomas podem ser diretamente

relacionados à obesidade, que por sua vez tem sido tratada como uma consequência dos

hábitos de vida modernos. A ligação dos distúrbios de sono com causas ambientais tem

recebido cada vez mais atenção, uma vez que pode explicar as altas e crescentes prevalências

dessas condições.

Ainda que úteis em grande parte dos casos, medidas de higiene do sono e outras

medidas comportamentais não são tão efetivas às causas intrínsecas de débito de sono quanto

são as extrínsecas. Por esse motivo, tornam-se necessárias outras terapias que sejam diretamente

direcionadas ao distúrbio de sono em questão, para que de modo consequente o débito de

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- 89 -

sono seja sanado. Dentre as opções terapêuticas citam-se o uso de medicamentos, como

hipnóticos e antidepressivos; cirurgias, especialmente no caso de distúrbios respiratórios de sono

e também o uso do CPAP (Continuous Positive Air Pressure) e de aparelhos intraorais.

8.3 MÉTODOS DE PRIVAÇÃO DE SONO EM ANIMAIS

A função do sono é um tema ainda debatido e inconclusivo. Logo, estudos com a

privação e fragmentação de sono visam o melhor entendimento dos danos causados e por

consequência uma justificativa para a necessidade de dormir. Sendo assim, diversas

metodologias são empregadas para o estudo da privação de sono em animais, os quais são

excelentes modelos. Abaixo seguem breves resumos sobre os principais métodos de pesquisa

para roedores.

8.3.1 Método das plataformas

A privação de sono pelo método das plataformas é uma técnica utilizada para a

supressão exclusiva do sono paradoxal. Nesse método, o animal é colocado sobre uma

pequena plataforma circundada por água. Sobre essa plataforma, o animal é capaz de dormir,

apresentando a maior parte dos estágios do sono. Contudo, durante o sono paradoxal, em

função da perda do tônus muscular, o animal toca a água e acorda. Dessa maneira, valendo-

se da diminuição do tônus muscular, é possível privar seletivamente de sono paradoxal. O

primeiro uso da técnica da plataforma para privação de sono paradoxal foi feito por Jouvet em

1960, utilizando-a em gatos. Contudo, atualmente seu maior uso é em roedores.

Primeiramente, a privação de sono paradoxal em roedores era feito pelo método da

plataforma única, no qual um único rato era colocado sobre uma única plataforma. Contudo,

mediante essa metodologia notou-se que o isolamento e a restrição de movimento eram fatores

estressores e somavam-se ao estresse inerente à falta de sono. Assim, buscou-se atenuar o

estresse dispondo mais plataformas em um tanque. Mesmo nesse caso, notou-se que o

isolamento social também era um fator estressor importante.

Atualmente, o principal uso da técnica em questão é o método das plataformas

múltiplas modificado (Figura 4). Nesse caso, um grupo de animais é colocado em um ambiente

com diversas plataformas, proporcionando tanto a locomoção quanto a interação social dos

animais.

Page 89: Apostila 3 - 2013

- 90 -

8.3.2 Gentle handling

O gentle handling consiste em manusear delicadamente o animal assim que este

apresenta indícios de sono. Um dos primeiros experimentos com esta metodologia foi feito por

Crile, em coelhos, em 1921. Este método, pela exigência da interferência constante do

experimentador, não permite períodos prolongados de privação de sono.

Ao contrário do observado no método das plataformas, que priva parcialmente de sono

paradoxal, o gentle handling é uma metodologia desenvolvida para a privação total de sono.

8.3.3 Disco giratório

O método do disco giratório consiste em conectar o animal a um polígrafo para

avaliação e estagiamento do sono e colocá-lo sobre um disco motorizado que, por sua vez,

está sobre um recipiente com água. Quando o animal inicia o sono, ou manifesta alguma fase

específica deste, um sistema automático aciona um motor que faz o disco girar e, para não ser

lançado para fora dele, o rato desperta e é obrigado a caminhar em sentido contrário ao da

rotação do disco. O animal controle para este método também se encontra no mesmo disco,

só que é despertado em fases não determinadas do seu ciclo vigília-sono. Essa metodologia

vem sendo alvo de críticas por dois motivos principais: 1) os animais são sujeitos à locomoção

forçada, de modo que a atividade física pode ser tomada como uma variável adicional, e 2)

falta de um controle adequado, uma vez que o animal controle pode ser também parcialmente

privado de sono.

8.3.4 Fragmentação de sono

Page 90: Apostila 3 - 2013

- 91 -

O método é recente e foi desenvolvido pelo grupo de um renomado professor e

pesquisador na área de sono (Dr. David Gozal). O dispositivo é desenhado para fragmentar o

sono e emprega estimulação tátil intermitente utilizando um dispositivo mecânico silencioso.

Uma barra de metal um pouco acima da superfície do chão da gaiola é coordenada em

intervalos de 2 minutos “varrendo” a gaiola de um lado ao outro por 9 segundos. Quando se

atinge o fim da gaiola, um relê

dispara a barra para ir na direção oposta. O método propoe o mínimo de interferência humana,

uma vez que os animais são mais sensíveis ao barulho do experimentador.

8.3.5 Privação de sono em drosófilas

Em geral, os métodos de privação restringem-se aos roedores. Todavia cada vez mais

novos modelos são propostos e têm demonstrado muito sucesso.

As drosófilas (Drosophila melanogaster) são muito utilizadas em experimentos envolvendo

sono e ritmo circadiano, uma vez que as mesmas possuem ciclos de vigília-sono parecidos com

os dos mamíferos. As moscas podem ser monitoradas utilizando diversos métodos: observação

visual, ultrassom, sistema de movimento por infravermelho e ainda métodos de vídeo-

monitoramento (Figura 5). O sono é determinado ao se observar que a mosca encontra-se em

repouso por mais de 5 minutos sem nenhum movimento. As drosófilas também apresentam o

processo S homeostático e o processo C, circadiano. Evidentemente, há limitações nos estudos

em virtude da não possibilidade de execução do EEG, todavia, o modelo é bastante importante

em estudos de genética e privação de sono com alterações moleculares.

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- 92 -

Figura 5. Circuito de vídeo que monitora o movimento e repouso de drosófilas em um período

de tempo. Imagem cedida pelo grupo de Centro de pesquisa em sono da Universidade da

Pennsylvania.

8.4 IMPACTO DA PRIVAÇÃO DE SONO

A privação de sono leva a diversos efeitos danosos aos seres humanos, sendo que esses

efeitos podem ser observados sobre parâmetros fisiológicos (principalmente sobre a secreção

hormonal, conforme previamente discutidos na seção de Fisiologia do Sono) além de alterações

do comportamento e cognição.

De um modo geral, o débito de sono e a consequente baixa qualidade do sono

influencia diretamente a rotina dos indivíduos. Uma noite mal dormida pode trazer

consequências indesejáveis e até mesmo provocar acidentes. A falta de sono pode provocar

alguns riscos sendo eles: cansaço e sonolência durante o dia, irritabilidade, alterações

repentinas de humor, perda da memória de fatos recentes, comprometimento da criatividade,

redução da capacidade de planejar e executar, lentidão do raciocínio, desatenção e

dificuldade de concentração. Já os riscos provocados pela falta de sono em longo prazo são:

falta de vigor físico, envelhecimento precoce, diminuição do tônus muscular, comprometimento

do sistema imunológico, tendência a desenvolver obesidade, diabetes, doenças

cardiovasculares e gastrointestinais e perda crônica da memória.

Page 92: Apostila 3 - 2013

- 93 -

Alterações moleculares também estão presentes, bem como a mudança de perfil de

expressão gênica após a privação de sono e após o rebote. Os genes são expressos de acordo

com a necessidade da célula, tecido de um organismo. A privação gênica pode ser alterada

simplesmente em SNC, como estudado maciçamente em roedores e drosófilas. Todavia,

estudos em humanos, mesmo que limitados, utilizando sangue periférico, podem ajudar a

entender os efeitos da privação em tecidos periféricos, não restritos ao SNC. Esses estudos

demonstraram uma significante queda da expressão de genes ligados ao sistema imune e

aumento de genes envolvidos em divisão celular, muito deles considerados genes de

progressão tumoral.

Dados do grupo do Sono da UNIFESP têm demonstrado ainda uma mudança no perfil

imunológico com alterações marcantes nas contagens de leucócitos em voluntários sadios

humanos. É importante ressaltar que muitos genes e moléculas do sistema imune, por exemplo,

não retornam aos níveis basais após um período de rebote, o que reflete danos ao organismo.

8.4.1 Efeitos Psicocomportamentais Da Privação De Sono

A privação de sono é capaz de alterar características comportamentais e modular

problemas psicológicos de maneira bastante ubíqua. Estes conhecimentos derivam de estudos

clássicos da década de 50, no qual indivíduos privados de sono REM apresentavam queixas de

irritabilidade, ansiedade e dificuldade de concentração. De fato, diversos são os

comportamentos influenciados pela privação de sono.

Um dos primeiros comportamentos cuja alteração foi observada mediante privação de

sono foi o comportamento agressivo. Desde a década de 60 reconhece-se que tanto a

privação total de sono quanto a privação seletiva de sono REM é capaz de potencializar

comportamentos agressivos tanto em animais de experimentação, mensurados através de

testes comportamentais específicos, quanto em humanos, observados pela manifestação de

comportamentos anti-sociais. De modo semelhante, o comportamento sexual apresenta

alterações mediante a privação de sono, com dados obtidos em roedores e extrapoláveis a

humanos. Sabe-se que a privação de sono é responsável pelo aumento da motivação, porém

relacionada à diminuição do desempenho sexual.

O comportamento alimentar, diferentemente dos comportamentos apresentados acima,

apresenta dados discrepantes entre estudos em animais (sobretudo roedores) e seres humanos.

Ao passo que em roedores a privação de sono acarreta em diminuição de peso corporal,

embora haja aumento do comportamento estereotipado de roer, em humanos há aumento do

comportamento alimentar, com concomitante ganho de peso e preferência por alimentos de

Page 93: Apostila 3 - 2013

- 94 -

elevada taxa calórica.

Por fim, o comportamento materno e a relação materno-infantil têm sido abordados

exclusivamente em humanos, sobretudo de maneira teórica. Especula-se que a privação de

sono durante o período da gravidez associada aos padrões de sono característicos deste

período pode predispor a déficits na interação entre mãe e filho.

Em relação a variáveis cognitivas, diversas associações podem ser feitas em relação à

privação de sono. Um dos efeitos cognitivos mais bem conhecidos da restrição de sono é o

déficit de atenção e concentração, diretamente ligado a maior incidência de acidentes de

trabalho mediante débito de sono. Quanto à memória, diversos relatos apontam para prejuízos

na aquisição, consolidação e evocação de novas informações. Contudo, embora estudos

recentes pareçam direcionar o conhecimento para o prejuízo global da memória mediante a

privação de sono, dados recentes têm questionado essas afirmações. Desse modo, os efeitos da

privação de sono parecem depender do tipo de memória analisada e do método e tempo de

privação de sono utilizada.

8.4.2 Trabalho por turno

Trabalhadores noturnos ou indivíduos cujo regime de trabalho não segue turno fixo são

cronicamente sujeitos à privação de sono. Incluem-se nesses casos motoristas de veículos a

motor, maquinistas de trens, pilotos de aeronaves, vigilantes, entre outros.

Para esses indivíduos, os efeitos da privação de sono e os consequentes déficits de

desempenho, vigilância alerta podem trazer diversos efeitos danosos. Nessa população, a

prevalência da excessiva sonolência diurna é altíssima e suas consequências podem ser

significativas, incluindo acidentes, resultados econômicos e públicos negativos, problemas para

a saúde, redução do desempenho profissional e acadêmico e comprometimento das funções

psicossociais. Por exemplo, grandes desastres industriais, como os de Chernobyl, Three Mile Island

e Bhopal, bem como acidentes graves, como os envolvendo a Exxon Valdez e a Challenger,

têm sido oficialmente atribuídos a erros de julgamento causados por sonolência no local de

trabalho.

A restrição crônica de sono pode ser observada em uma situação cada vez mais

frequente na população: o trabalho em turno. Esses trabalhadores são submetidos a um

desalinhamento entre o horário disponível para o sono e os ritmos endógenos do organismo,

como a temperatura e vigília, e também ritmos ambientais, como o ciclo claro-escuro e o ritmo

de atividades sociais. Assim, estes trabalhadores apresentam algum grau de restrição crônica de

sono.

Page 94: Apostila 3 - 2013

- 95 -

Quanto à organização do trabalho em turnos, a Cronobiologia interpreta os prejuízos

causados como decorrentes de um distúrbio temporal do organismo. É unânime a constatação

de que o trabalho noturno seja ele fixo ou alternante com o trabalho diurno é prejudicial à

saúde. Afirma-se que um trabalhador em turnos alternados e/ou em turnos fixos noturnos está

sempre mudando seu horário de dormir e acordar, de se alimentar e de lazer em função da

mudança de seus horários de trabalho e isto pode levá-lo a ter agravos à sua saúde. Para esses

trabalhadores o desenvolvimento das atividades, muitas vezes, acontece na contramão da

sociedade, impulsionando-os a abdicar de momentos com a família, a trabalhar em momentos

que seriam de repouso e a expor-se a situações de alta demanda física e mental. As

consequências do trabalho em turnos vão desde a fadiga crônica, distúrbios gástricos, distúrbios

de sono até desordens psíquicas. Essas consequências variam de indivíduo para indivíduo, pois

há aqueles que pouco ou nada sofrem e não se queixam de nenhum tipo de dificuldade, até

aqueles situados no extremo oposto relatando queixas diversas.

O aumento mundial na utilização de sistemas de trabalho em turnos que envolvam

semanas reduzidas de trabalho explica o crescimento no número de estudos que enfocam os

reflexos na saúde dos trabalhadores expostos. A fadiga é um dos aspectos mais frequentemente

estudados com referência a trabalhos em turnos em semana reduzida de atividade (com turnos

diários superiores às oito horas, menos de 5 dias de trabalho e mais de dois dias de folga).

A literatura tem demonstrado que as pessoas que não dormem bem, tanto em termos

quantitativos como qualitativos, apresentam respostas mais lenta aos estímulos externos e

dificuldade de concentração. As repercussões no desempenho cognitivo observadas nesses

pacientes podem ser resultantes da hipoxemia que ocorre durante o sono, das alterações do

fluxo sanguíneo cerebral durante o período de vigília ou da sonolência excessiva diurna. Não

obstante a causa, esse déficit cognitivo pode comprometer a habilidade para desempenhar

uma série de atividades, dentre elas a capacidade de dirigir, além de alterar a sua percepção

crítica sobre a habilidade de dirigir naquela condição.

9. MEDICINA DO SONO E OS DISTÚRBIOS DE SONO

Os diversos estudos realizados em relação à função e efeitos fisiológicos do sono levaram à

caracterização de algumas alterações que aparecem com frequência na população. Esses

fenômenos, chamados de Distúrbios de Sono, são condições médicas caracterizadas pela

alteração na normalidade do padrão de sono de um indivíduo. O espectro de distúrbios de sono

é extremamente numeroso e complexo, englobando desde queixas leves até dramáticos casos

de morte súbita em recém-nascidos, insônia familiar fatal ou acidentes automobilísticos

decorrentes de sonolência excessiva diurna. Assim, torna-se claro que os distúrbios de sono podem

ter consequências graves, uma vez que interferem nas funções físicas, mentais e emocionais.

Page 95: Apostila 3 - 2013

- 96 -

Vários fatores contribuem para o surgimento de distúrbios de sono específicos. Dentre estes

fatores, a ansiedade, a dor, o abuso de drogas, as mudanças nos hábitos de sono e a obesidade

estão entre os mais importantes e influentes. Visto que esses fatores estão cada vez mais presentes

na sociedade, as queixas relacionadas à qualidade de sono vêm se tornando cada vez mais

prevalentes. Nesse sentido, um estudo epidemiológico realizado em 2007 na cidade de São Paulo

(Estudo EPISONO) mostrou que 55% da população gostariam de mudar o seu padrão de sono,

seja no horário de dormir ou no tempo total de sono. Além disso, 29% dessa população

apresentam sonolência excessiva diurna e aproximadamente metade dessas pessoas queixa-se

de que sente a sonolência pelo menos três vezes por semana.

9.1 OS DISTÚRBIOS DE SONO

Em razão dos inúmeros distúrbios de sono descritos foi implantada a Classificação

Internacional de Distúrbios de Sono (International Classification of Sleep Disorders - ICSD) (AASM,

2005). Em 2005 esta classificação sofreu uma alteração com o objetivo de descrever os distúrbios

de sono baseando-se em evidências científicas e clínicas. Ainda, essa classificação estruturou de

maneira organizada, clinicamente razoável e cientificamente válida os distúrbios do sono e dos

despertares. A ICSD fornece a descrição detalhada de 88 distúrbios de sono e apresenta oito

categorias principais: Insônias; Distúrbios Respiratórios relacionados ao sono; Hipersonias de

origem central, não causadas pelos distúrbios do ritmo circadiano do sono, distúrbios respiratórios

relacionados ao sono, ou outras causas de sono noturno interrompido; Distúrbios do ritmo

circadiano do sono; Parassonias; Distúrbios do movimento relacionados ao sono; Sintomas

isolados, variantes aparentemente normais e de importância não resolvida e Outros distúrbios de

sono.

Dentre os principais distúrbios de sono que afetam a população destacam-se a insônia, a

síndrome da apneia obstrutiva do sono, a síndrome dos movimentos periódicos de pernas, a

narcolepsia e as parassonias. Para o diagnóstico dos distúrbios de sono, alguns métodos de

investigação precisam ser utilizados em conjunto com os achados clínicos e o histórico do

paciente. Dentre os métodos usados para estes diagnósticos, temos a Polissonografia, o Teste

Múltiplo das Latências do Sono, o Teste de Manutenção da Vigília e a Actigrafia, que serão

abordadas em seções posteriores. As seções abaixo mostram as principais características dos

distúrbios mais importantes.

Page 96: Apostila 3 - 2013

- 97 -

9.1.1 Insônia

A insônia pode ser definida como dificuldade para obter o sono, ou sensação de sono não

restaurador, após o episódio habitual de sono (ICSD, 1990). Os mecanismos pelos quais a insônia

se estabelece não foram totalmente estabelecidos. A insônia psicofisiológica ou comportamental

é a mais comum e tem como característica principal uma tensão somatizada com agitação e

aumento do tônus muscular. Esse distúrbio de sono atinge atualmente 13,5% da população de

São Paulo (critérios DSM-IV – Estudo EPISONO). Entretanto, 34,5% dessa população se queixam de

insônia (dificuldades para iniciar ou manter o sono, ou despertar precoce pelo menos 3x/semana).

Também conhecida como pseudoinsônia, a percepção inadequada do sono caracteriza-

se pela queixa de insônia sem alterações objetivas no sono. O diagnóstico deve ser de exclusão,

sendo a polissonografia um exame importante nesse caso. A insônia idiopática é uma inabilidade

de dormir que pode prolongar-se desde a infância. É associada às alterações do controle

neurológico do sistema de vigília-sono e pode se manifestar de três modos distintos: insônia de

início de sono, quando a latência de sono é aumentada; insônia de manutenção, quando

ocorrem despertares prolongados durante a noite com dificuldade de retomar o sono; e insônia

de final de noite, quando o corre um despertar precoce sem incapacidade de retomar o sono. A

insônia pode também estar associada a mudanças de fuso horário, mudança ambiental, barulho,

altitude, uso de estimulantes e ainda ao uso crônico de hipnóticos. As doenças médicas,

psiquiátricas, quadros musculares dolorosos ou doenças reumáticas também podem apresentar

insônia secundária.

9.1.2 Síndrome Da Apneia Obstrutiva Do Sono

Abrange um amplo espectro de sintomas e sinais, variando desde o ronco até os casos

mais graves de apneias com acentuada dessaturação da oxiemoglobina (queda de 4% do valor

basal) e despertares breves, que muitas vezes não são percebidos pelo paciente. A apneia é

observada, sobretudo em homens, tendo atualmente uma prevalência de 32,9% na população

de São Paulo (Estudo EPISONO). Esse distúrbio é caracterizado pela ocorrência de interrupção do

fluxo aéreo (redução de 80%) por mais de 10 segundos. De diagnóstico mais complexo, a

hipopneia é uma redução de 50% a 80% do fluxo respiratório em relação à linha de base do fluxo

respiratório basal, com duração maior do que 10 segundos.

As apneias podem ser obstrutivas, centrais ou mistas. As apneias obstrutivas são aquelas

nas quais as paradas respiratórias se devem à obstrução das vias aéreas superiores. Já as apneias

centrais se devem à distúrbios neurológicos nos quais áreas relacionadas ao controle ventilatório

estão inibidas. Por fim, as apneias mistas são compostas por um episódio de apneia central

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- 98 -

seguida de um episódio de apneia obstrutiva. As consequências da apneia do sono obstrutiva são

o ronco alto e descontínuo, os episódios de ronco, a movimentação brusca do corpo para

restabelecer a respiração, sudorese profusa, sonolência diurna excessiva, cansaço crônico e

modificações da personalidade com redução do desempenho motor e intelectual. Esses

episódios vão também ocasionar fragmentação do sono com despertares frequentes para

vencer a obstrução e redução das quantidades do estágio N3 do sono NREM (sono delta) do

estágio de sono REM, uma vez que os eventos acontecem com mais frequência neste estágio.

9.1.3 Síndrome Dos Movimentos Periódicos Das Pernas

Na cidade de São Paulo, atualmente 2,5% da população apresenta índice de movimentos

periódicos de pernas maiores que 15 por hora de sono. As pessoas acometidas relatam

movimentos de membros inferiores acompanhado de sensações de "arrastamento" das pernas. A

maioria dos pacientes também apresenta movimentos estereotipados de membros inferiores

durante o sono, que correspondem aos movimentos periódicos de pernas. Os movimentos duram

em média de 0,5 a 5 segundos ocorrendo com frequência de um a cada 20 a 40 segundos. Cada

episódio de movimentos periódicos de pernas pode ter duração de alguns minutos a horas e, em

geral, os episódios causam despertares e diminuição da qualidade e eficiência do sono,

ocorrendo com maior incidência no terço inicial da noite.

9.1.4 Narcolepsia

A narcolepsia é considerada um distúrbio relacionado ao sono REM, e caracterizado por

sonolência excessiva diurna, ataques de sono irreversíveis e incontroláveis, cataplexia (perda

repentina do tônus muscular), alucinações hipnagógicas (que acontecem quando o indivíduo vai

dormir) e paralisia do sono. Esse distúrbio se manifesta de forma variável entre seus portadores em

relação aos sintomas e sua intensidade e somente 10% dos pacientes apresentam todos os

sintomas acima descritos. Estudos recentes têm investigado a etiologia desta doença e

identificaram que a hipocretina, um peptídeo importante na regulação do ciclo vigília-sono,

estava ausente ou em concentrações muito baixas em pacientes que apresentavam narcolepsia

com cataplexia. Além disso, estudos genéticos vêm sendo realizados e investigam a hipótese de

que a narcolepsia tenha uma base autoimune.

Page 98: Apostila 3 - 2013

- 99 -

9.1.5 Parassonias

Parassonias são comportamentos peculiares e inconscientes que ocorrem durante o sono.

Esse tipo de distúrbio de sono em geral não prejudica o desempenho das atividades diárias dos

pacientes, uma vez que não são caracterizadas por acarretar sonolência excessiva diurna ou por

afetar a consolidação do sono. As parassônias podem ocorrer tanto no decorrer do sono de

ondas lentas (sonambulismo, terror noturno e enurese), quanto durante o sono REM (distúrbio

comportamental do sono REM).

9.2 METODOLOGIAS DE AVALIAÇÃO DO SONO EM HUMANOS

Em geral, a avaliação do sono é realizada por medidas subjetivas, que são obtidas com

instrumentos como as escalas de avaliação da qualidade do sono diário; e por medidas objetivas

como a polissonografia, que fornece informações objetivas como a latência de sono e eficiência

de sono. A utilização concomitante de métodos objetivos e subjetivos é comum e recomendável,

pois nem sempre a estrutura e parâmetros polissonográficos normais correspondem a relatos de

sono reparador.

9.2.1 Avaliação Subjetiva

A avaliação subjetiva do sono é uma ferramenta importante na triagem e suspeita de

algum distúrbio de sono. A avaliação é realizada sob a forma de questionários variados, validados

para identificar algumas características dos distúrbios de sono mais importantes. A Escala de

Sonolência de Epworth é frequentemente utilizada para triagem de sonolência excessiva diurna e

pode ser útil em suspeitas de narcolepsia e síndrome da apneia obstrutiva do sono. O Questionário

de Berlim é utilizado para identificação de risco para apneia obstrutiva do sono. O Questionário

de Pittsburgh é a principal ferramenta subjetiva para avaliação da qualidade de sono. Outros

questionários sobre movimentos periódicos de pernas e bruxismo do sono podem ser úteis para a

melhor caracterização clínica da situação do paciente. Além disso, a aplicação de questionários

com perguntas gerais sobre o sono (ex: hora que normalmente dorme e acorda, frequência de

acontecimentos diversos durante o sono) e sobre situações que ocorreram no dia anterior ao

exame da polissonografia (uso de medicamentos, cafeína, etc.) também são importantes para

caracterizar uma eventual alteração que possa vir aparecer no exame.

Page 99: Apostila 3 - 2013

- 100 -

9.2.2 Polissonografia

A polissonografia foi introduzida na década de 50 e é o principal método para diagnóstico

de distúrbios de sono. O exame é realizado no laboratório de sono durante uma noite inteira, sob

as condições mais naturais possíveis. A polissonografia consiste do registro de várias funções e

fenômenos que ocorrem durante o sono como o eletroencefalograma (EEG), eletrooculograma

(EOG), eletromiografia (EMG) superfiiciais do mento e dos músculos tibiais anteriores, fluxo aéreo

nasal e bucal, movimentos respiratórios, saturação de oxiemoglobina e eletrocardiograma (ECG).

Dentre os diversos parâmetros que podem ser extraídos deste exame estão o tempo total de sono,

a eficiência de sono, a porcentagem de cada estágio do sono em relação ao tempo total de

sono, o índice de apneia/hipopneia (utilizado para o diagnóstico da síndrome da apneia

obstrutiva do sono), o índice de movimentos periódicos de pernas, o número de despertares por

hora e os níveis de saturação da oxiemoglobina.

9.2.3 Polissonografia “Split-night”

A polissonografia “split-night”, ou seja, “noite partida”, é uma adaptação da

polissonografia comum frequentemente utilizada em pacientes com características clínicas

indicativas para o uso do CPAP (Continuous Positive Airway Pressure), um aparelho para o

tratamento da síndrome da apneia obstrutiva do sono. Este aparelho gera um fluxo contínuo de

pressão positiva nas vias aéreas do paciente, fazendo com que o espaço das vias aéreas

superiores se torne maior, evitando o estreitamento e o colabamento dessas vias. Assim, o

procedimento reduz o número de apneias realizadas pelo paciente e é considerado o padrão

ouro para o tratamento da síndrome. O tratamento com CPAP, de forma geral é iniciado após

duas noites em que o paciente precisa realizar polissonografia: a primeira para diagnosticar a

síndrome; e a segunda para utilizar e realizar a titulação do CPAP, ou seja, determinar a pressão

ideal para obter os melhores resultados do tratamento. No entanto, para os pacientes cujas

características clínicas são sugestivas de apneia obstrutiva do sono, a polissonografia “split-night”

é indicada. Nesta modalidade de polissonografia, a primeira metade da noite é utilizada para

diagnosticar a síndrome. Uma vez estabelecido o diagnóstico, o paciente passa a colocar o

aparelho CPAP e, na segunda metade da noite, é realizada a titulação e determinação da

pressão ideal. Desta forma, o paciente não precisa realizar duas visitas ao laboratório do sono e já

pode começar o tratamento com antecedência.

Page 100: Apostila 3 - 2013

- 101 -

9.2.4 Teste múltiplo das latências de sono

É o principal exame utilizado para o diagnóstico de sonolência diurna, sendo a narcolepsia

e a síndrome da apneia obstrutiva do sono as duas enfermidades mais importantes que

ocasionam sonolência excessiva. O procedimento consiste em cinco exames de polissonografia

durante o período diurno (mas em um ambiente com ausência de luz, com o indivíduo deitado na

cama) com duração de 20 minutos cada e com intervalos de duas horas. A média da latência

para o início do sono deve situar-se entre 10 e 20 minutos. As latências menores do que 10 minutos

podem ser indicativas de sonolência excessiva diurna. O registro de dois ou mais períodos de sono

REM é sugestivo de narcolepsia.

9.2.5 Teste de manutenção da vigília

Diferentemente do teste múltiplo das latências de sono, que mede a tendência do

indivíduo de iniciar o sono, a teste de manutenção da vigília mede a capacidade do paciente de

ficar acordado sob uma situação que promoveria sono. O protocolo para realização deste teste é

similar ao do teste múltiplo, no entanto, ao invés do indivíduo ficar deitado na ausência de luz, ele

fica sentado numa condição de “meia luz”, de forma que não seja um ambiente estimulante.

Neste caso, uma latência de sono menor que 11 minutos pode ser considerada patológica.

9.2.6 Actigrafia

O actígrafo é um aparelho do tamanho de um relógio de pulso que mede a atividade

motora, registrando a frequência e a duração do movimento. Na actigrafia são observadas as

fases de atividade e de repouso prolongado correspondentes à vigília e ao sono,

respectivamente. O actígrafo apresenta inúmeras vantagens sobre os outros instrumentos

utilizados, como baixo custo, fácil operação e pouca manutenção, além de registrar o ciclo

vigília-sono durante as 24 horas do dia. Além disso, outras variáveis podem ser acopladas ao

actígrafo, como a mensuração da temperatura corporal.

Page 101: Apostila 3 - 2013

- 102 -

11. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Foram abordados nesta seção aspectos importantes a respeito da Biologia e da Medicina

do Sono, um campo de estudo em crescente expansão e responsável por uma grande parcela

das discussões científicas na área da saúde atualmente. Foi possível descrever as funções e

alterações que o sono e sua falta podem acarretar ao organismo e os impactos que podem levar

à sociedade. Além disso, pesquisas na área básica têm relevância e aplicação direta tanto para

a clínica quanto para a população em geral, o que torna a ciência do sono um campo

multidisciplinar e translacional que desperta curiosidade em todos que se envolvem em sua

pesquisa.

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- 103 -

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1. CONCEITOS BÁSICOS SOBRE EXERCÍCIO FÍSICO E ASPECTOS PSICOBIOLÓGICOS

Muitas pessoas tendem a pensar em Exercício Físico e Atividade Física como sinônimos.

Entrentando o estas duas condições são distintas ao passo que o Exercício Físico é definido como

uma sequência de movimentos realizados pela musculatura estriada esquelética de forma

planejada, estruturada e intencionada sub a orientação de um profissional qualificado, podendo,

esta, melhorar ou manter um ou mais componentes da aptidão física. Diferentemente do

Exercício Físico, a Atividade Física pode ser definida como qualquer movimento corporal,

produzido pelos músculos esqueléticos, que resulta em gasto energético maior do que os níveis de

repouso (Caspersen et al.,1985).

Além disso, existem outros conceitos que são utilizados tanto no meio esportivo quanto na

pesquisa científica e que são importantes para melhor compreensão das atividades realizadas

seja por praticantes recreacionais ou atletas de alto nível. Dentre eestes conceitos destaca-se a

aptidão física, que corresponde ao estado de funcionamento corporal caracterizado pela

capacidade de tolerar o estresse do exercício físico, e compreende alguns componentes como: a

força muscular - entendida como a capacidade de superar ou de se opor a uma resistência por

meio da atividade muscular - ; a capacidade aeróbia - conceituada como sendo a capacidade

de captar, transportar e utilizar o O2 - ; a flexibilidade - definida como a capacidade de

movimentar uma articulação através da sua amplitude de movimento disponível, sem atingir

demasiado estresse músculotendíneo - ; e a composição corporal - Composição corporal refere-

se às quantidades absolutas e relativas do que constitui o corpo - dentre outros. (Platnov 2004;

Astrand, 1952; Alter, 1996 e Wang et al.,1992)

Outro conceito que vem complementar o entendimento básico das atividades

desenvolvidas com o exercício físico é o treinamento físico, que se caracteriza como uma

intervenção na condição física do indivíduo com o objetivo de modificar as condições iniciais de

aptidão física com o uso repetido do exercício físico (McArdle et al., 1998; Robergs e Roberts,

2002).

Dessa forma, tal intervenção pode desencadear, em especial, dois efeitossobre o

organismo - as adaptações agudas: correspondem as respostas estruturais e funcionais

“imediatas” a prática do exercício físico, que funcionam para atender a demanda que o estímulo

dado exige do organismo no momento do exercício físico; e as adaptações crônicas: mudanças

Page 105: Apostila 3 - 2013

- 106 -

estruturais e funcionais que são mantidas depois de repetidas sessões de exercício físico (Robergs

e Roberts, 2002).

Sabe-se que essas mudanças obtidas com a prática regular de atividade física ou de

exercício físico podem colaborar na melhora da qualidade de vida e aumento da longevidade

(ACSM, 2006), sendo essas atividades empregadas como intervenção não farmacológica

importante no tratamento de algumas doenças crônicas não-transmissíveis como: obesidade,

hipertensão arterial, diabetes, doenças cardiovasculares, entre outras (De Mello et al., 2010;

Dâmaso et al., 2006; Penedo e Dahn, 2005) Também atua no tratamento de distúrbios do sono (De

Mello et al., 2005; Passos et al., 2008; Esteves et al., 2009)e na melhora das funções cognitivas

(Cassilhas et al., 2007).

Ao elaborar um programa de exercício físico seja em protocolos de pesquisa científica ou

prescrição de treinamento em clubes e academias é necessário avaliar primeiramente “onde”

queremos chegar pra depois traçarmos a estratégia de “como” chegar. Nesse momento é

importante levar-se em consideração as características dos indivíduos (idade, gênero, nível de

aptidão física, possíveis limitações), o tipo de exercício físico (aeróbio ou resistido), o volume e a

intensidade, além de alguns princípios do treinamento físico tais como: princípio da

individualidade biológica, princípio da adaptação, princípio da sucessão das cargas e princípio

da especificidade (ACSM, 2006; Bompa e Cornacchia, 2000).

Um programa de exercício físico varia no decorrer do ano e o cronograma das atividades

a serem realizadas é conhecido como periodização, ou seja, como será dividido o programa de

exercício físico dentro de um dado período de tempo (Bompa e Cornacchia, 2000), contendo

microciclos, mesociclos e macrociclos.

Ao longo do tempo é possível observar a influência do exercício físico por intermédio de

avaliações sistemáticas, como por exemplo: avaliações antropométricas, de marcadores

bioquímicos ou testes de esforço máximo, realizadas no início do treinamento e periodicamente

após algum tempo dependendo das variáveis que se deseja observar, assim auxiliando a análise

dos resultados (Pompeu, 2004).

É importante ressaltar que da mesma forma que a falta de exercício físico pode ser

deletéria ao organismo, o excesso também tem mostrado conseqüências indesejáveis à saúde

(Thompson, 2009). Então, a prescrição de um programa de exercício físico realizada de forma

planejada proporciona maior segurança e amplia as possibilidades de se alcançar resultados

positivos.

Page 106: Apostila 3 - 2013

- 107 -

1.1 Modelos Animais Para Exercício Físico

Os benefícios da prática de exercício físico ou mesmo de atividade física já foram

discutidos e são inquestionáveis, mas deve-se pensar a forma que essas respostas foram obtidas.

Existem muitas limitações experimentais quando se utilizam seres humanos, não se possibilitando,

na maioria das vezes, uma investigação mais aprofundada acerca do funcionamento ou do

mecanismo daquele efeito. Protocolos experimentais que utilizam animais como sujeitos, são

desenvolvidos quando não seria apropriado usar seres humanos para estudos do impacto do

exercício físico. Pesquisas mais experimentais envolvendo os efeitos do exercício físico e seus

impactos sobre organismos intactos são mais efetivamente realizados com seres humanos. No

entanto, para outros estudos, o uso de seres humanos é inviável nem desejável, pois envolveria

observações desses sujeitos ao longo de suas vidas, que é impraticável, ou a realização de

procedimentos invasivos, o que é antiético.

Com o intuito de mimetizar os efeitos fisiológicos do exercício físico em humanos, diversos

modelos animais foram propostos (Gonyea and Ericson, 1976; Roy and Sarkar, 1982; Wong and

Booth, 1988; Tamaki et al., 1992; Carson et al., 1995; Cutlip et al., 1997; Hornberger and Farrar, 2004).

A similaridade entre a microarquitetura de tecidos de humanos e ratos, além da possibilidade de

controlar os parâmetros biomecânicos, condições ambientais, nutricionais e genéticos, torna o

estudo com modelos animais bastante atrativos (Matsakas & Patel, 2009).

Alguns cuidados devem ser levados em consideração ao utilizar modelos animais que envolvam o

exercício físico, tais como:

- o quão relevante é a pergunta do estudo;

- qual o tipo de exercício físico mais adequado para observar os efeitos desejados;

- qual a melhor espécie animal a ser utilizada;

- utilizar o menor número de animais necessário para responder a pergunta;

- qual o melhor modelo de exercício físico para observar os efeitos desejados;

- o quão estressante é esse modelo;

- qual volume, intensidade e frequência de exercício físico serão utilizados;

- como será a adaptação dos animais ao modelo;

- qual o melhor horário para a realização do exercício físico, levando em consideração o

ritmo biológico da espécie a ser utilizada,

- cuidados com o laboratório.

Page 107: Apostila 3 - 2013

- 108 -

Representação gráfica do número de trabalhos publicados sobre exercício físico em modelos animais no pubmed

2. RITMOS CIRCADIANOS E EXERCÍCIO FÍSICO

Atualmente diversos estudos têm observado ritmicidade circadiana para as variáveis

relacionadas ao desempenho esportivo. Sendo assim, qualquer planejamento, prática ou

avaliação de exercício físico deve levar em consideração o efeito da hora do dia.

As primeiras investigações relacionadas ao desempenho esportivo iniciaram com a

observação dos resultados de atletas em campeonatos realizados em diferenciados momentos

do dia. De maneira geral, foi observado que os recordes apresentaram uma tendência em

ocorrer no início da noite quando comparados a outras horas do dia. Estes estudos, talvez tenham

sido os primeiros indícios científicos que comprovaram a existência de uma variação circadiana

no desempenho esportivo. Entretanto, este tipo de pesquisa recebe muitas críticas uma vez que

não há rigor científico no controle de fatores externos, a exemplo do controle da temperatura

ambiental, a estação do ano, a direção do vento, entre outros, podendo mascarar o que de fato

representa tal informação.

A partir da idéia de que as variáveis esportivas estão suscetíveis ao efeito da hora do dia,

bem como da dificuldade em controlar fatores externos, as pesquisas científicas realizadas em

laboratório ganharam notoriedade. Com o intuito de provar a existência de ritmo circadiano no

desempenho esportivo, algumas habilidades ou componentes do desempenho físico passaram a

ser analisados isoladamente.

Page 108: Apostila 3 - 2013

- 109 -

Alguns exemplos de componentes medidos isoladamente em condiçõeslaboratoriais

controladas e que apresentaram efeito da hora do dia são:

Desempenho psicomotor e habilidades motoras: com melhor resposta aocontrole motor e

cognitivo ocorrendo pela manhã, enquanto o tempo de reaçãosimples tende a ser melhor à

tarde;

Força muscular: o pico da força, independente do tipo de contração muscular e do

grupamento muscular utilizado, ocorre no período da tarde ou início da noite;

Exercícios de curta duração (Anaeróbio): com melhores resultados observados no período

da tarde;

Como se pôde observar, o melhor resultado para prática de uma modalidade esportiva

vai depender da variável investigada e da hora em que ocorre o seu pico. Além disso, deve-se

ressaltar que o esporte é formado pela associação de diversas variáveis relacionadas ao

desempenho e que tais variáveis podem não apresentar o mesmo ritmo circadiano.

Nesse sentido, para garantir um bom desempenho esportivo é importanteconhecer os

ritmos circadianos deste desempenho, os fatores que podem provocar alteração deste ritmo e,

acima de tudo, quais as características fisiológicas individuais dos praticantes de determinado

exercício físico.

Atualmente, a investigação sobre o caráter endógeno do ritmo circadiano do

desempenho esportivo, a partir da determinação do livre-curso em indivíduos cegos, têm sido

uma das linhas de pesquisa do CEPE. Em estudo recente, foi observado que a força de contração

isométrica de atletas cegos apresentaram acrofases ocorrendo em diferentes momentos do dia,

conforme o passar dos dias,caracterizando um verdadeiro ritmo circadiano endógeno e o seu

caráter em livrecurso. Assim, o período endógeno da força muscular, a exemplo da melatonina e

temperatura corporal, é maior do que 24 horas e estará sincronizado com o meio externo quando

o ciclo claro-escuro estiver presente.(Squarcine et al., 2012)

3. SONO E EXERCÍCIO FÍSICO

O exercício físico é comumente aceito como um importante aliado na promoção

do sono (Horne, 1981; Youngstedt, 2005). Estudos epidemiológicos demonstraram associações

positivas entre exercício físico e sono (Vuori et al., 1988; Sherrill et al., 1998; de Mello et al. 2000),

sendo o exercício físico considerado pela American Sleep Disorders Association (1991) uma

intervenção não farmacológica para a melhora da qualidade do sono.

Page 109: Apostila 3 - 2013

- 110 -

Nas últimas décadas, uma grande variedade de estudos envolvendo diferentes tipos de

populações e o exercício físico aeróbio foram realizados na tentativa de avaliar os efeitos desse

tipo de intervenção na quantidade e qualidade do sono (Shapiro et al.,1975; Shapiro et al., 1981;

Torsvall et al., 1984; Horne et al., 1985; Montgomery et al., 1988; Driver et al., 1994; King et al., 1997;

Taylor et al., 1997; Youngstedt et al., 1997; O’Connor et al., 1998; Youngstedt et al., 2000; Oda, 2001;

Hague et al., 2003). Entretanto, ainda não existe um consenso na literatura sobre quais os efeitos

do exercício físico nos parâmetros do sono (Driver & Taylor, 2000; Youngstedt, 2005).

O aumento do tempo total do sono (TTS) (Shapiro et al., 1975; Youngstedt et al., 1997),

aumento da latência para o início do sono REM (Youngstedt et al., 1997; Hague et al., 2003),

aumento da quantidade de sono de ondas lentas (SOL) (Shapiro et al.,1975; Shapiro et al., 1981;

Horne et al., 1985; Taylor et al., 1997; Hague et al., 2003) e diminuição da latência para o início do

sono (Hague et al., 2003) e da porcentagem do sono REM (Shapiro et al.,1975; Driver et al., 1994;

Youngstedt et al., 2000; Hague et al., 2003) são as principais alterações observadas.

Em contraste, alguns estudos não encontraram diferenças significativas no sono após a

realização do exercício físico (Montgomery et al., 1988; Oda 2001; Faria et al., 2009).

Essas diferenças podem ser devido a diferenças no horário de realização de exercício, tipo

de exercício (aeróbio x resistido), diferenças nas características das amostras dos estudos (atletas

e indivíduos fisicamente ativos x sedentários) e diferenças no volume e intensidade das sessões de

exercício físico.

Alguns modelos teóricos foram propostos e explicariam a influência do exercício físico no

sono. São elas, a teoria termorregulatória, teoria da restauração corporal e a teoria da

conservação de energia (Driver & Taylor, 2000):

3.1 Teoria termorregulatória: um aumento acentuado da temperatura corporal central antes do

horário de dormir pode ativar os mecanismos de perda de calor corporal central, que por sua vez

estão relacionados à indução do sono. O exercício físico pode ser considerado um dos fatores

que proporcionam aumentos na temperatura corporal ativando dessa maneira esses mecanismos

termorregulatórios, facilitanfdo o início e manutenção do sono..

3.2 Teorias da restauração corporal e conservação de energia: o sono, por reduzir o requerimento

metabólico, pode ter a função de restauração teciduale/ou conservação de energia.A duração

do sono e a quantidade de SOL podem aumentar em função do aumento da energia

despendida e das micro-lesões teciduais ocorridas durante o dia. As contrações musculares

exigidas no exercício físico são estímulos capazes de promover depleção dos estoques de energia

e micro-lesões, ou seja, uma alta atividade catabólica durante a vigília pode favorecer a

atividade anabólica durante o sono, em especial durante o SOL onde ocorre a maior liberação

de hormônio do crescimento (GH) durante as 24 horas de um dia.

Mais recentemente, outras hipóteses também vêm sendo estudadas, sendo as principais o

efeitos ansiolítico e antidepressivo do exercício físico (Youngstedt, 2005).

Page 110: Apostila 3 - 2013

- 111 -

Em relação ao mecanismo da redução dos níveis de ansiedade, Youngstedt (2005),

sugeriu este como a mais plausível justificativa para explicar os efeitos do exercício físico na

qualidade do sono. Como a ansiedade é um dos marcadores da insônia, um estímulo capaz de

a reduzir poderia promover o sono. Neste sentido, O’Connor et al., (2000) sugeriram que o

exercício físico agudo poderia reduzir o estado de ansiedade e a sua prática crônica poderia

resultar em redução no perfil de ansiedade.

A teoria antidepressiva sugere como um dos efeitos do exercício físico crônico, a redução

da depressão (O’Neal et al., 2000). Existem evidências de que a insônia seja um fator de risco para

o desenvolvimento da depressão, assim como de que a mesma pode decorrer deste transtorno

psiquiátrico. Está bem estabelecida na literatura a ação de diversos tratamentos antidepressivos

na redução do sono REM (Vogel et al., 1990). Como um dos efeitos do exercício físico agudo é a

redução do sono REM (Youngstedt et al., 1997), a prática regular de exercícios físicos poderia ser

uma alternativa para reduzir o nível de depressão e, em conseqüência, promover melhoras no

sono.

Quanto ao horário de realização do exercício físico e sua interferência no sono, parece

que os principais efeitos são observados quando o exercício físico é realizado entre 4 e 8 horas

antes do horário de dormir. Isso estaria ligado a um rápido declínio da temperatura corporal que

ocorre pouco tempo após o término da sessão de exercício físico (Youngstedt, 1997) e sustentaria

a hipótese termorregulatória.

Com o intuito de verificar a influência da hora de realização do exercício físico no sono,

Horne & Porter (1976) realizaram um estudo que comparou o efeito do exercício físico aeróbio

realizado nos períodos da manhã (10:00 às 12:00 horas) e da tarde (16:00 às 18:00 horas) no sono e

encontraram alterações significativas apenas no estágio 3 do sono NREM quando o exercício

físico aeróbio foi realizado no período da tarde.

Nessa linha de pensamento, Buxton et al., (2003) observaram que o exercício físico aeróbio

de alta intensidade realizado em diferentes horários do dia, promove um avanço de fase da

melatonina apenas no exercício realizado no início da noite, entre 17:30 e 19:30 horas. Nesse caso,

exercícios de alta intensidade realizados nos períodos da manhã e tarde não possuíriam qualquer

tipo de influência no sono porque não promoveram alterações no ritmo circadiano da

melatonina, enquanto que exercícios intensos realizados no início da noite poderiam aumentar a

propensão ao sono devido a um avanço de fase da melatonina (Buxton et al., 2003). Isso

explicaria o declínio da temperatura corporal central ocorrido após o término do exercício físico.

Outros estudos foram conduzidos em horários específicos do dia (Torsvall et al., 1984 - 12:00

às 19:00 horas; Montgomery et al., 1988 - período da tarde; O’Connor et al., 1998 - 90 minutos

antes do horário habitual de início do sono, Faria et al., 2009 – manhã, tarde e noite) sendo que

apenas no estudo de Torsvall et al., (1984) ocorreram alterações significativas no sono. Esses

resultados confirmam a afirmação de que podem ocorrer alterações significativas no sono

Page 111: Apostila 3 - 2013

- 112 -

quando o exercício físico é realizado no período de 4 a 8 horas antes do horário habitual de início

do sono.

Além do tempo em cada estágio do sono, o exercício físico pode também alterar o

padrão eletroencefalográfico durante o sono. No estudo de Torsvall et al., (1984) o padrão do

sono foi avaliado após uma sessão de treinamento de corrida de 15-20 Km com intensidade

moderada, após uma sessão de treinamento de corrida de 30-40 Km realizado até a exaustão

voluntária sendo que também avaliaram o padrão do sono da noite seguinte à realização da

sessão de treinamento até a exaustão. Em relação a noite de sono basal, a latência para o sono

REM esteve aumentada e o sono REM esteve diminuído na noite de sono da sessão de exercício

físico até a exaustão e não ocorreram alterações significativas na duração do SOL em qualquer

condição. Entretanto, ocorreram aumentos significativos na densidade (onda delta com

amplitude maior) do EEG durante o SOL na noite de realização da sessão de exercício até a

exaustão.

Alterações na densidade do EEG durante o SOL também foram encontradas no estudo de

Hague et al., (2003) onde nos primeiros 10% da noite de sono a densidade do EEG dos estágios 3 e

4 estavam aumentados em relação a noite controle (sem treinamento físico).

Os efeitos do exercício físico resistido no padrão do sono foram pouco explorados. Em

alguns dos estudos realizados foram avaliados apenas o efeito crônico desse tipo de intervenção

na percepção subjetiva do sono de idosos sem avaliação objetiva por PSG (Singh et al., 1997;

Ferris et al., 2005).

Um estudo que utilizou o exercício físico resistido e avaliou o sono dos voluntários por meio

de registro polissonográficofoi o de Montgomery et al., (1988). Neste trabalho, o efeito do

treinamento de força no sono de atletas de levantamento de peso foi avaliado. Os resultados não

apontaram diferenças significativas em nenhum parâmetro do sono quando o treinamento físico

foi realizado em comparação com o dia de descanso. Vale ressaltar que os voluntários eram

atletas que treinavam em alta intensidade por no mínimo duas horas por dia, 5 dias por semana e

estavam no programa de treinamento há mais de 12 meses.

O efeito do exercício resistido em indivíduos sedentários também não promoveu alterações

no sono de indivíduos adultos. Faria et al., (2009) não encontraram alterações significativas nos

parâmetros do sono quando avaliaram a noite após a 1ª sessão de exercício resistido de

indivíduos sedentários que não tinham histórico nesse tipo treinamento.

A intensidade e duração (volume) do exercício físico, também podem ter influência no

sono. Quanto ao volume da sessão de exercício ou treinamento, em estudo de meta-análise,

Youngstedt et al., (1997) concluiram que o tempo mínimo de exercício capaz de promover

alterações no sono seria de 1 hora.

Montegomery et al., (1988) e Faria et al., (2009) ao avaliarem o efeito do exercício físico

resistido, não encontraram alterações significativas no sono. Como os dois estudos utilizaram

Page 112: Apostila 3 - 2013

- 113 -

cargas (alta x moderada intensidade) e volume (2 horas x 40-45 minutos) respectivamente, isso

pode ser um indicativo de que o tipo de exercício físico pode ser o responsável pelas alterações,

considerando que cada tipo de exercício físico possui mecanismos de respostas e adaptações

fisiológicas diferentes.

Além disso, o exercício físico resistido promove um gasto calórico menor do que o exercício

físico aeróbio (Montgomeryet al., 1988) sustentando a hipótese da conservação de energia e da

restauração corporal (Driver & Taylor, 2000).

É preciso considerar a hipótese do efeito “teto e chão” quando utilizamos em pesquisas

indivíduos com boa qualidade de sono (Youngstedt et al., 2003), ou seja, a margem para

alterações no sono pode ter sido diminuída uma vez que os indivíduos que participaram dos

diversos estudos citados possuíam boa qualidade de sono. Neste sentido, Flausinoet al., (2012)

com o objetivo de investigar a influência de diferentes intensidades e duração de exercício

realizados antes do horário de dormir, sobre o padrão do sono, avaliaram 17 homens jovens,

saudáveis, não atletas, considerados bons dormidores. Todos, foram submetidos a cinco dias

randomizados e não consecutivos de exercício físico aeróbico em esteria com diferentes volumes

e intensidades, próximos ao horário habitual de dormir. Observou-se aumento estatisticamente

significativo na eficiência do sono (ES) entre todos os protocolos, quando realizada comparação

com os dados basais, aumento na latência para o sono REM entre dois experimentos; observou-se

ainda, diminuição na porcentagem do estágio 1 do sono, bem como nos despertares após o

início do sono. O exercício físico aeróbio realizado antes do horário de dormir, além de não ter

prejudicado a qualidade do sono desta população avaliada, mostrou-se eficaz na melhora de

algumas variáveis do padrão de sono, podendo ser considerado em abordagens que visem a

melhoria do padrão de sono.

O sono de boa qualidade é fundamental para a restauração física e mental. No caso do

exercício físico, existe uma relação em forma de “U” invertido (Figura 4) entre a fadiga induzida

pelo exercício físico e a qualidade de sono (Hobson, 1968), ou seja, a carga moderada do

exercício parece ser a que promove os melhores resultados no sono, enquanto a carga leve e

intensa não promove benefício algum ou promove até redução na qualidade do sono,

respectivamente.

O exercício físico em demasia bem como o sono de má qualidade, podem prejudicar o

rendimento durante os treinamentos e durante as competições; dessa forma, conhecer melhor o

padrão de sono pode ser uma referência importante para se alcançar melhor desempenho na

realização do exercício, bem como para controlar o nível de estresse do treinamento (Martins et

al., 2001).

Page 113: Apostila 3 - 2013

- 114 -

Relação

entre a sobrecarga do exercício físico e a qualidade do sono.

3.3. Exercício Físico e Distúrbios Do Sono

A prática de exercícios físicos também tem sido avaliada como terapia não

farmacológica para os distúrbios do sono. Os principais distúrbios que vem sendo avaliados são: a

síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS), a insônia crônica primária e a síndrome das pernas

inquietas (SPI) associada aos movimentos periódicos de pernas (MPP).

Um estudo realizado com o objetivo de avaliar o efeito do exercício físico como terapia

coadjuvante ao tratamento convencional com aplicação de pressão positiva nas vias aéreas dos

pacientes com respiração espontânea durante o ciclo respiratório (CPAP) com SAOS, demonstrou

uma significante redução do índice de apnéia/hipopnéia (IAH) destes pacientes, de 32.8 (apnéia

grave) para 23.6 (apnéia moderada) (Giebelhaus et al., 2000), indicando que o exercício físico

pode contribuir para a redução da gravidade da SAOS.

Os distúrbios respiratórios do sono, como a SAOS, podem provocar uma redução no

desempenho cardiorrespiratório. Um estudo recente demonstrou associação significativa entre o

consumo máximo de oxigênio (VO2max) e o IAH de mulheres sedentárias (Cintra et al., 2009).

Outros estudos também descreveram associação negativa entre o IAH e a prática de exercícios

físicos em homens e mulheres com SAOS (Peppard e Young, 2004). Além disso, a freqüência

cardíaca de recuperação é significativamente mais baixa nos pacientes com SAOS grave

quando comparados aos pacientes com SAOS leve a moderada (Maeder et al., 2008). Com base

nestas informações, pode-se concluir que as pessoas com SAOS além de se beneficiar da pratica

de exercícios físicos como terapia complementar, estarão de certa forma protegidos de uma

perda na capacidade cardiorrespiratória.

Page 114: Apostila 3 - 2013

- 115 -

Estudos epidemiológicos têm correlacionado as queixas de insônia com a prática de

atividades físicas. Um estudo realizado na cidade de São Paulo, com voluntários saudáveis e

idades acima de 25 anos, demonstrou que pessoas fisicamente ativas têm menos queixas de

insônia que pessoas sedentárias (De Mello et al., 2000).

O primeiro estudo clínico realizado com o objetivo de verificar os efeitos do exercício físico

no sono de insones foi realizado em 1995, por um grupo da Universidade de Stanford (Guilleminault

et al., 1995). Após quatro semanas de intervenção, foi observada uma tendência, não

significativa, de aumento no TTS e de redução na LS e no TVS dos insones, avaliados pelo diário do

sono e pela actigrafia. Eles também descreveram um effect size importante para as variáveis TTS e

Latência de Sono (LS) (0,39 e -0,36, respectivamente), indicando que embora os efeitos não

tenham sido significativos do ponto de vista estatístico, os autores os consideram importantes do

ponto de vista clínico.

Um estudo posterior foi realizado com o objetivo de verificar o efeito agudo de três tipos de

exercícios físicos na qualidade do sono e no estado de ansiedade de pacientes com insônia

crônica primária de acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 4a

Ed(DSM IV). Os pacientes selecionados para participar do estudo apresentavam idade média de

44 anos. Os resultados demonstraram que após uma sessão de exercício aeróbio moderado,

houve uma redução na LS (54%) e no tempo total acordado - TTA (36%) e um aumento no TTS

(21%) e na ES (18%) avaliados por polissonografia. Quanto à qualidade subjetiva de sono, foi

observado um significativo aumento no TTS (37%) e uma significativa redução na LS (40%) dos

voluntários do mesmo grupo. No estado de ansiedade também foi observada uma redução

significativa após a sessão de exercício aeróbio moderado (7%). Os resultados deste estudo

sugerem que uma sessão aguda de exercício aeróbio moderado poderia reduzir o estado de

ansiedade e melhorar a qualidade do sono dos pacientes com insônia crônica primária (Passos et

al, 2010).

Outro importante estudo realizado por Passos et al, 2011 teve como objetivo avaliaro efeito

do exercícioaeróbio moderado, realizado por um período de 6 meses,na qualidade do sono,

qualidade de vida e no perfil de humorde insones e,analisar seestes efeitosdifeririam entre o

exercício realizado no período da manhãe no final da tarde. Foram recrutados dezenove

indivíduos sedentárioscom insônia primáriacrônica,com idade média de45 anos. Os resultados

demonstraram significativa redução da latência parainício do sono (de 17,1 para 8,7min, p <0,01),

diminuição do tempo acordado após início do sono(de 63,2 minpara 40,1 min) e aumento

significativo naES (de79,8%para 87,2%). Em relação aos dados dos diários de sono foi encontrada

significativa redução nalatência de sono, melhora na qualidade do sono e sensação de

descanso ao acordar pela manhã. Não foram apresentadas diferenças significativas em relação

aos horários em que foram praticados os exercícios. Após o período de treinamento, algumas

medidas de qualidadede vida também apresentaram melhora significativae diminuição

significativafoi encontrada no perfilde humor: tensão-ansiedade,depressão e distúrbio total de

humor. A longo prazo, a prática de exercícioaeróbio moderadoprovocoumelhora significativaem

Page 115: Apostila 3 - 2013

- 116 -

alguns parâmetros de sono, na qualidade de vida e no humor deindivíduos cominsônia crônica

primária.

Os exercícios físicos resistidos (musculação) também estão entre as modalidades de

intervenções utilizadas em protocolos experimentais para pessoas com queixas de sono. Em um

estudo, Singh et al., observaram uma melhora na qualidade do sono de idosos que apresentavam

sintomas depressivos associados à má qualidade de sono. A intervenção consistiu de um

programa de treinamento resistido, realizado três vezes por semana, durante um período de 10

semanas. Os resultados mostraram que o exercício físico resistido foi eficaz na melhora da

qualidade subjetiva do sono, da depressão, da força máxima e da qualidade de vida dos idosos.

Os efeitos dos exercícios físicos sobre osMPP também fazem parte dostemas de pesquisa.

Aukerman et al. (2006) avaliaram os efeitos de um programa de exercícios combinados (aeróbica

e força muscular), durante 12 semanas. Os resultados demonstraram que os sintomas de

SPIreduziram estatisticamente quando comparado ao grupo controle, a partir da 6a semana de

intervenção.

Esteves et al. (2009) realizaram um estudo com o objetivo de avaliar os efeitos do exercício

intenso exercício agudo e crônico sobre o padrão de sono em pacientes com MPP. Os resultados

demonstraram que após a pratica de exercício físico agudo houve um aumento na ES, no sono

REM e reduziu o tempo de vigília após o início do sono, enquanto que após o exercício físico

crônico foi observado um aumento da ES, do sono REM e uma redução da latência do sono.

Neste estudo, observou-se também uma correlação negativa entre a liberação de b-endorfina

após o exercício agudo intenso e o índice de MPP. Os autores concluíram que o exercício físico

pode melhorar os padrões de sono e reduzir os níveis de MPP.

4. HIPÓXIA, FUNÇÕES COGNITIVAS E EXERCÍCIO FÍSICO

Diversos fatores podem afetar as funções cognitivas. Dentre elas podemos citar o

exercício físico. Pois este é considerado um agente estressor que pode influenciar as funções

cognitivas por meio de mecanismos neuro-humorais e hormonais, podendo assim, afetar a

capacidade de formação de novas memórias imediatamente após a realização de exercício

agudo, bem como, contribuir no armazenamento de novas informações através do treinamento

físico sistemático. (Santos, 1994; Richardson et al.,1998)

O exercício físico parece influenciar as funções cognitivas em diversas faixas etárias. Na

infância, estudos demonstram que o exercício físico aeróbio de intensidade moderada pode

melhorar o controle cognitivo da atenção e o desempenho acadêmico (Hillman et al., 2009). Já

em crianças com transtorno do déficit de atenção e hiperatividade um estudo demonstrou que

Page 116: Apostila 3 - 2013

- 117 -

o exercício físico agudo foi capaz de melhorar a atenção sustentada tanto em crianças que já

realizavam tratamento farmacológico quanto para as que não realizavam (Medina et al., 2010).

Por outro lado, os idosos também parecem se beneficiar com a prática de exercícios

físicos. Bixby et al.,(2007) verificaram que idosos que praticam exercício físico entre três e cinco

anos, obtêm uma melhora das suas funções cognitivas.

Estudos têm relatado que o exercício aeróbio pode estar relacionado à melhora na

função cognitiva. Em uma meta-análise, realizada por Colcombe e Kramer em 2003, os autores

verificaram que o aumento na aptidão aeróbia estava associado àmelhora nos processos

cognitivos dos indivíduos.

Em um estudo, por meio de dois experimentos, Colcombe et al. (2004) demonstraram que o

aumento na aptidão cardiovascular resultava em melhora das funções cognitivas. Tanto os

indivíduos com alta aptidão, como os que realizaram treinamento físico, obtiveram melhor

ativação do circuito atencional do cérebro, tendo este sido avaliado pela ressonância

magnética funcional. Corroborando com este estudo, em outro experimento observou-se que

após seis meses de treinamento aeróbio, houve aumento do volume cerebral na região pré-

frontal (área responsável pelo circuito atencional) e temporal (Colcombe et al., 2006).

Já os exercícios físicos resistidos também parecem melhorar, ou pelo menos manter, a

saúde física e mental dos idosos, pois, além de todos os benefícios advindos da sua prática,

estes também promovem o aumento da densidade mineral óssea, da força e da massa

muscular, possibilitando ao idoso uma maior autonomia e melhor qualidade de vida (Perrig-

Chiello et al.,1998).

Os trabalhos que associam as funções cognitivas aos exercícios físicos resistidos são

escassos, contudo, em um dos poucos trabalhos realizados para determinar os efeitos deste tipo

de exercício físico no funcionamento cognitivo verificou melhoras no bem-estar psicológico,

assim como nas tarefas de recordação livre e de reconhecimento após oito semanas de

treinamento (Perrig-Chiello et al.,1998). Já em outro estudo Cassilhas et al. (2007) observaram

que o treinamento físico resistido tanto em intensidade alta quanto baixa é capaz de melhorar

as funções cognitivas (atenção, função executiva e memórias de curto e longo prazo) de

idosos.

É importante ressaltar que o indivíduo que realiza tipos de exercícios físicos diferentes,

diversificando assim as suas atividades, parece estar positivamente relacionado com o seu

desempenho cognitivo quando da realização de testes de velocidade de processamento e de

flexibilidade mental (Angevaren et al., 2007). Entretanto, apesar de alguns estudos terem sido

realizados utilizando o treinamento combinado e com múltiplos componentes, ainda não há um

consenso sobre estas modalidades (Emery e Gatz, 1990; Okumiya et al., 1996; Williams e Lord,

1997; Carral e Pérez, 2007; Tanaka et al.,2009;).

Page 117: Apostila 3 - 2013

- 118 -

Com relação aos mecanismos, estudos têm especulado que o exercício físico promove

aumento da atividade metabólica cerebral, o que faria com que a perda das funções

cognitivas se desse de forma mais lenta (Dustman et al., 1984; Kara et al., 2005).

Existem dois mecanismos básicos que têm sido sugeridos para explicar os efeitos dos

exercícios físicos sobre as funções cognitivas. O primeiro é denominado hipótese da circulação

sangüínea cerebral, que demonstra que o exercício induz ao aumento do fluxo de sangue

cerebral, o segundo é a hipótese da estimulação neurotrófica.

Existem evidências de que com o aumento da capacidade aeróbia há uma diminuição

da viscosidade sangüínea (que é um dos métodos utilizados para comprovar a hipótese da

circulação sangüínea cerebral) (Immanuel et al., 2006).

Já a influência do treinamento resistido ainda não está clara. El-Sayed em 1998 sugeriu

que o treinamento resistido também pode ser vantajoso, uma vez que a diminuição da

viscosidade sangüínea implicaria em maior fornecimento de oxigênio para os músculos, devido

a menor resistência ao fluxo sangüíneo. Contudo, quando a viscosidade sangüínea foi

mensurada, após o treinamento resistido de longo prazo em duas intensidades diferentes, não se

observaram diferenças significativas, embora tenha havido melhora significativa da cognição

(Cassilhas et al., 2007).

A segunda hipótese é a da estimulação neurotrófica. Segundo esta, os exercícios podem

elevar os níveis do IGF-1 (fator de crescimento semelhante à insulina), do fator neurotrófico

derivado do cérebro (BDNF), além de outros fatores de crescimento, estimulando assim a

neurogênese, aumentando a resistência aos danos cerebrais e melhorando as funções

cognitivas (Van Boxtel et al., 1997; Aleman et al., 1999; Ding et al., 2006; Okereke et al., 2007; Trejo

et al., 2007; Cassilhaset al., 2007).

O IGF-1 desempenha um papel anabolizante e neuroprotetor, sendo altamente expresso

no cérebro. Ele é essencial para o desenvolvimento cerebral normal, promovendo a projeção

dos neurônios em crescimento, a sua arborização dendrítica e a sinptogênese. Essa substância

garante a captação da glicose no tecido cerebral (Bondy et al., 2004), e existe em abundância

nas áreas responsáveis pela cognição, como o hipocampo e a região pré-frontal (Van Dam et

al., 2004).

Cassilhas et al., (2007) observaram um aumento dos níveis do IGF-1 em idosos que

praticaram exercício físico resistido por um período de seis meses. Este aumento ocorreu em

paralelo à melhora nas funções cognitivas nessa mesma população. Outro estudo também

observou aumento nos níveis do IGF-1 em idosos que realizaram treinamento aeróbio (Poehlman

et al.,1994), pelo que parece haver uma correlação positiva entre o consumo de oxigênio e os

níveis do IGF-1 (Haydar et al., 2000).

Page 118: Apostila 3 - 2013

- 119 -

Além das relações do exercício físico com as funções cognitivas observadas até o presente

momento também é importante ressaltar a hipótese de que os efeitos da hipóxia também levam

a uma possível modulação de diversos sistemas do organismo, incluindo piora nos estado de

humor e nas funções cognitivas Lemos et al., 2010; Lemos et al., 2010; De Aquino Lemos at al.,

2012.

Muitas pessoas se expõem a condições de altitude tanto a trabalho quanto a lazer ou

ainda para a prática de esportes. Nesse contexto, essas pessoas podem sofrer conseqüências não

tão desejáveis em decorrência dos efeitos das grandes altitudes que reduz a pressão atmosférica

levando à redução das moléculas de oxigênio (O2) por unidade de volume, acarretando então a

hipóxia, que pode alterar diversas funções do organismo, tanto fisiológicas quanto

comportamentais, incluindo, especificamente as alterações cognitivas (Ohkuwa et. al., 2003;

Pavlicek et. al., 2005; Ortega et. al., 2004). Partindo deste pressuposto, diversos estudos mostram

que os efeitos da hipóxia podem estar associados a inúmeras alterações no escopo cognitivo.

Um experimento feito com ratos revelou que os efeitos crônicos da hipóxia diminuem as

taxas das catecolaminas (adrenalina, noradrenalina e dopamina), em diferentes regiões do

cérebro como estriatum, cerebelo, hipocampo e lobo frontal (Ohkuwa et. al, 2003). Assim, pode-

se observar que os danos podem ser ocasionados em diferentes regiões cerebrais. Mesmo assim,

alguns autores ainda relatam haver controvérsia sobre os prejuízos que podem estar associados às

funções cognitivas (Lieberman et. al, 2005).

A exposição aguda à hipóxia pode provocar no organismo alterações que podem causar

diversos eventos, tais como prostação, sonolência, fadiga muscular e mental (Buss e Oliveira,

2006). Mesmo assim, o mau funcionamento das funções cognitivas relacionada com o efeito da

hipóxia, pode provocar variabilidades individuais para cada tipo de pessoa, demonstrando que

alguns organismos são mais adaptáveis a altitude em relação a outros (Reilly e Waterhouse, 2003).

Um estudo realizado no Monte Everest em uma altitude de 5300 a 8000m com o objetivo

de monitorar a fala e os déficits cognitivos de um grupo de alpinistas, revelou que não é

surpreendente que alguns deles sejam mais resistentes a altitude do que outros alpinistas, sendo

que a monitoração da fala e as medidas cognitivas refletiram estas diferenças (Lieberman et. al,

2005).

O mau funcionamento de aspectos cognitivos em função da exposição à hipóxia tanto

em ambientes naturais de montanha quanto em simuladores de altitude pode gerar disfunções

psicomotoras, alterações nos processos de percepção como tempo de reação e discriminação

de cores; memória, aprendizagem, atenção, dentre outras alterações (Ortega et al., 2004;

Gilbson, et al., 1981; Hornbein, et al., 1989). Para o efeito da hipóxia não prejudicar tanto a

performance de indivíduos que se expõem a estas condições, ambientes com menor pressão

atmosférica, a aclimatização pode minimizar tais efeitos negativos da hipóxia, sendo que curtas

aclimatizações com períodos intermitentes sugere eficiente pré-adaptação ao corpo e àmente

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- 120 -

humana, sem maiores prejuízos na escolha de tarefas durante estágios agudos da altitude intensa,

que pode variar entre 5000 a 7000 m de altitude acima do nível do mar (Leiffen et al., 1997).

Em um estudo com indivíduos de ambos o gênero comparou-se medidas de humor

durante o dia e à noite, sendo que a linha de base para o início da escalada foi determinada a

200m e o estudo foi dividido em dois grupos, sendo que o primeiro foi avaliado a 4.300m e o

segundo foi avaliado a 1.600m de atitude. Este estudo revelou que a 4.300m, os indivíduos

apresentaram pensamento claro, vertigem, sonolência e sentimento de infelicidade. Já a 1.600m,

os participantes apenas apresentaram sonolência durante este percurso (Shukitt e Banderet,

1988).

Um estudo investigou as circunstâncias anômalas das experiências perceptuais em um

grupo de 8 alpinistas expostos a uma altitude extrema, sobre 8.500m, sem oxigênio suplementar,

indicou que quase todos os atletas exceto um, relataram sentir ilusões, distorções de esquema

corporal, pseudo-alucinações visuais e auditivas, além disso, a privação social e a tensão aguda

parecem desempenhar um papel presente na gênese destas experiências (Brugger et. al., 1999).

Além dos problemas de memória, concentração, sonolência, dentre outros, gerados pela altitude,

também foi observado que tais indivíduos quando são expostos a grandes altitudes, ainda ficam

ausentes do mundo social e a tensão pode ser considerada algo inerente a estas situações.

Um estudo avaliou a relação entre estados de humor, incluindo ansiedade e mudanças de

performance no tempo de reação, habilidades psicomotoras e eficiência mental em 8 alpinistas

de gênero masculino entre 24 a 37 anos de idade, expostos em uma câmara hipobárica a 8.848m

acima do nível do mar, o que revelou que a exposição crônica à hipóxia pode provocar

alterações nos déficits de aprendizagem, nas habilidades psicomotoras e na eficiência mental.

Além disso, os indivíduos também apresentaram diversas mudanças nos níveis de humor,

depressão e ansiedade que possivelmente podem influenciar na performance de muitas tarefas,

além do aumento significativo no estado de fadiga (Bolmont, Thullier, Abraini, 2000);(Nelson, 1982);

(Shukitt e Banderet, 1988).

Diferentes funções de algumas áreas cerebrais tais como têmporo-parietal e as junções do

córtex pré-frontal também podem ser alteradas pela hipóxia (Arzy et. al, 2005). Com o aumento

da altitude em relação ao nível do mar de até 5000m mudanças no organismo humano podem

ocorrer, tais como menor resistência muscular nos braços e nas pernas, dores de cabeça, tonturas,

alterações visuo-motora, dificuldades para respirar e, além disso, também pode causar mudanças

no estado de personalidade como ideação paranóide, obsessão compulsiva e hostilidade.

A importância em analisar o papel da hipóxia sobre possíveis alterações cognitivas em

indivíduos expostos a esta condição pode ser importante para um entendimento mais amplo do

assunto que pode estar associado a mortes já ocorridas em condições de hipóxia.Com base nesta

linha de pensamento, na maior montanha do mundo, com 8848mde altitude acima do nível do

mar, morre um em cada oito pessoas que se expõe a esta condição e, para cada quatro que

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- 121 -

atingem com sucesso o cume do Monte Everest, há pelo menos um que perde a vida

(Loewenstein, 1999). De fato, é indubitável que o risco e o perigo são inerentes a esta exposição

ambiental adversa (Ortner, 1997).

As capacidades cognitivas em indivíduos não aclimatizados podem se alterar de acordo

com mudanças de altitude, por exemplo, a 2500m acima do nível do mar, a sensibilidade visual é

de 83%, atenção espacial 100%, memória de curto prazo 97% habilidade aritmética 100% e

tomada de decisão também 100% (McFarland, 1972). Estes índices comparados a 5000m acima

do nível do mar mostram uma mudança brusca em alguns das capacidades cognitivas, como se

pode ver, a sensibilidade visual corresponde a 48%, atenção espacial 57%, memória de curto

prazo 76% habilidade aritmética 86% e tomada de decisão também 90% (Ortega et al.,2006).

As observações relatadas até o momento foram sem exercício físico e muitas pessoas vão

para altitude fazer algum tipo de exercício. No entanto, os efeitos do exercício sobre o sono, a

cognição e o humor na hipóxia, ainda, não são tão bem desconhecidos.

De um modo geral, o exercício físico tem sido descrito na literatura científica como uma

forma de melhorar diversas funções do organismo, incluindo o padrão de sono, a memória, a

atenção, o estado de humor e o erro decisório (Monteiro e Filho, 2004; De Mello et al., 2005; Ando

et al., 2011; Chang et al., 2011; Chodzko-Zajko e Moore, 1994; Van Boxtel et al., Antunes et al.,

2006; Bos et al., 2011).

As relações entre o exercício físico e a cognição podem ser observadas no estudo de

Kumar et al., (2010), realizado com 60 pessoas saudáveis de ambos os gêneros, que teve por

objetivo avaliar os efeitos do exercício físico agudo na intensidade dos 60% aos 80% do consumo

máximo de oxigênio durante a sua realização, tendo os resultados mostrado que houve uma

melhora cognitiva. Labban e Etnier (2011) observaram 48 pessoas que realizaram 30 minutos de

exercício físico em uma bicicleta ergométrica, a uma intensidade de 70% do consumo máximo de

oxigênio, mostrando que houve melhora nas capacidades de memória de longo prazo. Em

relação ao estado de humor, Herring e O'Connor (2009) realizaram um estudo com 14 jovens

saudáveis, no qual investigaram os efeitos do exercício físico realizado a 70% do consumo máximo

de O2. Os resultados mostraram que, após uma sessão de exercício físico, houve modificações no

humor, incluindo o aumento do vigor e da fadiga.

Além do exercício físico agudo com intensidade moderada contribuir para a melhora das

funções cognitivas, este também está relacionado à manutenção do sono, auxiliando na

diminuição da sua fragmentação, no aumento do sono de ondas lentas, na diminuição da sua

latência e no aumento do seu tempo total (Guilleminault et al., 1995; Driver e Taylor, 2000;

Youngstedt et al., 2000). De acordo com O’Connor e Youngstedt (1995), o sono dos indivíduos que

fazem exercício é melhor do que os dos que não o fazem. Vuori et al., (1988) afirmaram que o

exercício físico melhora o sono da população em geral. Para mostrar a importância do exercício

físico sobre o sono, Youngstedt, O'Connor, Dishman (1997) revisaram 38 artigos sobre os efeitos do

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- 122 -

exercício agudo, os quais foram compilados em uma meta-análise. Os resultados observados

incluíram o aumento do sono de ondas lentas, o aumento na porcentagem de sono REM e do

tempo total de sono, após a realização do exercício agudo com intensidade moderada.

Assim, pôr a hipótese que o exercício físico agudo com intensidade moderada, realizado

em condição de altitude, pode influenciar nos efeitos da exposição à hipóxia aguda sobre a

memória, a atenção, o estado de humor, o erro decisório e as alterações no padrão de sono.

5. EXERCÍCIO FÍSICO E HUMOR

O estado de humor pode ser entendido como um conjunto de sentimentos, de natureza

efêmera, variando em intensidade e duração, geralmente envolvendo mais de uma emoção

(Lane e Terry, 2000), visto como uma representação da saúde psicológica do indivíduo (Boyle e

Joss-Reid, 2004).

O humor negativo é considerado um fator de risco para diversas doenças e o humor

positivo, dentro do intervalo normal, um importante preditor da saúde e da longevidade (Young,

2007).

Neste sentido a compreensão dos fatores que influenciam negativamente e positivamente

o humor se faz inerente a formação complementar de profissionais da área da saúde.

Sabe-se que o exercício físico é um importante preditor de saúde psicológica, sendo uma

alternativa não medicamentosa ao tratamento e a prevenção de doenças relacionadas a saúde

mental (Rethorst et al.,, 2009; Penedo e Dahn, 2005).

Assim, a linha de pesquisa que se dedica à investigação das repercussões físicas e

psicobiológicas decorrentes das alterações de humor em relação a respostas agudas ou crônicas

do exercício físico, tendo como alvo diferentes populações de ambos os gêneros, tanto jovens,

adultos e idosos, têm mostrado sucesso nas intervenções que envolvem o exercício físico.

5.1 Como Medir Variações Do Estado De Humor?

Como citado anteriormente, o humor compreende um conjunto de sentimentos,

geralmente envolvendo mais de uma emoção.

Page 122: Apostila 3 - 2013

- 123 -

Neste sentido, instrumentos subjetivos autoavaliativos são propostos, sendo utilizados na

maioria das vezes em conjunto (mais de um instrumento por envolver diversas emoções), além de

medidas fisiológicas e bioquímicas que possam influenciar o estado de humor.

Dentre os diversos instrumentos disponíveis, pode-se citar Perfil do Estado de Humor (Profile

of Mood State Questionnaire -POMS)– deMcNair et al., (1971),composta por uma lista de 65

adjetivos relacionados ao estado de humor, resultando em seis fatores de humor ou estado

afetivos: tensão, depressão, raiva, vigor, fadiga e confusão.

As medidas fisiológicas e bioquímicas surgiram de maneira complementar, na tentativa de

elucidar os fatores que influenciam as variações do estado de humor em sua relação com o

exercício físico, surgindo posteriormente algumas hipóteses.

5.2 Hipóteses Do Humor

A primeira hipótese, relaciona o aumento das endorfinas circulantes, durante e após o

exercício físico, a sentimentos de euforia, redução da ansiedade, da tensão, da raiva e da

confusão mental (Morgan, 1985).

De maneira semelhante, a hipótese das monoaminas, preconiza que o exercício aumenta

o nível dos neurotransmissores noradrenalina (Dishman, 1997) e serotonina (Chaouloff, 1997), os

quais se encontram diminuídos em pessoas depressivas, podendo promover uma melhoria no

estado de humor (Werneck et al.,2005).

Em uma perspectiva fisiológica, a hipótese termogênica leva em consideração a

elevação da temperatura central como um dos mecanismos envolvidos na melhora do estado de

humor, através da redução da ansiedade (Koltyn, 1997).

5.3 Qual O Melhor Exercício ?

Os questionamentos na literatura acerca das variações no estado de humor influenciadas

pela prática do exercício físico giram em busca da relação ideal entre volume e intensidade. Em

outras palvras para obtenção de melhoras no estado de humor dos praticantes, são propostos

protocolos de exercício físico distintos em relação ao volume e intensidade.

De uma maneira geral, exercício aeróbio de intensidade moderada, em diferentes

modelos de prescrição, é o mais elucidado na literatura quanto a melhora do humor após sua

execução.

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- 124 -

Hoffman e Hoffman (2008) aplicaram uma simples sessão de corrida (20min em intensidade

correspondente a 13 da escala de Borg), observando melhoras no humor de mulheres adultas,

fisicamente ativas e atletas.

Nabetani e Tokunaga (2001) observaram melhoras no humor de jovens fisicamente ativos

do gênero masculino, tanto para uma sessão de15min quanto para 30min com velocidades auto-

selecionadas compreendendo uma média de 80% da frequência cardíaca máxima, não

havendo diferenças entre as sessões de corrida.

Steptoe et al., (1993) investigaram respostas agudas do humor frente ao exercício

moderado e submáximo em bicicleta, para indivíduos ativos e sedentários do gênero masculino,

divididos em três grupos e/ou protocolos (20min a 50% do VO2máx,O 20min a 70% do VO2máx e

grupo controle) distintos. Os sujeitos ativos e inativos apresentaram aumentos de vigor, após dois

minutos da execução das sessões moderada e intensa, sem diferenças entre os mesmos.

Modalidades distintas de corrida e ciclismo possuem menor número de estudos e dados

ainda não conclusivos, sendo o exercício resistido o que mais cresce nos últimos anos com

resultados promissores em relação a variação de humor após sua execução.

Em relação ao exercício físico realizado de maneira sistemática e planejada (treinamento

físico), os estudos também são reduzidos porém com resultados semelhantes à sessão aguda ou

seja, treinamento aeróbio de intensidade moderada como referência na promoção de melhoras

no estado de humor.

6. DEPENDÊNCIA DE EXERCÍCIO FÍSICO (DE)

Os estudos com a temática da Dependecia de Exercício Físico, tiveram inico a partir da

década de 70, porém o objetivo principal do estudo era o de verificar os efeitos de um mês de

privação de exercício no padrão de sono dos praticantes regulares de exercício físico.

O pesquisador encontrou grande dificuldade em em compor sua amostra, pelo perfil de

sujeitos o qual proocurava (sujeitos que se exercitavam habitualmente de 5 a 6 vezes por

semana), os quais se sujeitassem a ficar o período estipulado sem praticar sua atividade regular,

mesmo oferecendo um incentivo financeiro.

O autor redirecionando o perfil de praticantes conseguiu realizar o estudo com sujeitos

que se exercitavam 3 a 4 vezes semanais, tendo como resultado que, os participantes reportaram

um aumento de ansiedade, tensão sexual, despertares noturnos, decréscimo no bem estar e na

convivência social quando privados de sua atividade habitual (Baekeland, 1970).

Em suma, o autor observou que corredores habituais que corriam de cinco a seis dias por

semana, se recusaram a interromper seu programa de exercício por um período de um mês e

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- 125 -

que, corredores regulares, que corriam de três a quatro dias por semana quando privados desta

atividade, reportavam sintomas de abstinência, semelhantes aos vistos em outros

comportamentos abusivos (Hamer & Karageorghis, 2007).

Segundo Hausemblas e Dows (2002), a dependência de exercício deve ser caracterizada

e vista segundo os critérios para dependência de substâncias (modificada) apresentada no DSM-

IV (2004) sendo estes: tolerância, perca de controle, importância excessiva a atividade, tempo

gasto com a atividade, estreitamento do repertório social, redução de outras atividades,

realização da atividade em condições adversas, entre outros.

Ainda existem vários termos e definições distintas que se relacionam a temática da

dependência de exercício físico, encontramos na literatura trabalhos que se referem a temática

com os termos: exercício excessivo, exercício compulsivo, Obligatory Exercise, Exercise Addiction,

Dependence Exercise. Porém, segundo Haussenblas e Downs (2002), baseado nos critérios do

DSM-VI (2002), essa compulsão pela prática do exercício físico pode ser definida como

Dependência de Exercício sendo esta, uma ânsia pela atividade física, caracterizada por uma

vontade incontrolável de se exercitar bem como por uma intensa preocupação com o exercício,

ocorrendo alterações negativas do ponto de vista fisiológico e psicológico, quando o sujeito é

impedido de se exercitar.

Assim como outros comportamentos de dependência, a dependência de exercício

parece ser iniciada e ter relação com o envolvimento impulsivo/compulsivo pela atividade sendo

vista como dependência propriamente dita a partir do momento em que se estabelecem

sintomas de abstinência e tolerância (Freimuth et al., 2011)

Segundo estudo realizado por Sussman, Lisha e Griffiths (2011), a estimativa de DE na

população geral (americana) é de aproximadamente 3%, no entanto em grupos como, ultra-

maratonistas, estudantes de ciências do esporte, triatletas, este percentual parece ser mais

elevado. Um estudo conduzido pelo nosso grupo, encontrou que 35,34% em atletas brasileiros

parecem se envolver de forma compulsiva com a atividade praticada regularmente (Modolo et

al, 2009).

A prevalência real da DE não é conhecida, e a variabilidade dos dados existentes,

possivelmente refletem diferenças em função da grande diversidade de instrumentos envolvidos

na avaliação, pelos termos e definições utilizadas, forma de envolvimento, tipo de atividade

realizada e tipos de amostras envolvidas nos estudos (DeCoverley Veale, 1987, Hausemblas &

Downs, 2002, Meyer & Taranis, 2011).

Se relacionado a forma a qual tais sujeitos se tornam compulsivos pela prática do exercício

físico, Decoverley Veale (1987), descreve uma classificação para tipos de dependência de

exercício, sendo esta relacionada ao principal objetivo, que leva o sujeito a se exercitar.

Page 125: Apostila 3 - 2013

- 126 -

Segundo Veale, a DE pode ser classificada em dois tipos distintos, dependência primária,

quando a motivação para se exercitar tem fins no exercício por si só, ou dependência secundária,

quando a motivação para se exercitar tem outros fins (o ganho ou perda de massa corporal,

melhora da forma física) sendo o exercício físico a principal ferramenta para alcançar o objetivo

principal (Decoverley Veale, 1987).

Considerando a importância do tema e os aspectos nele relacionados, algumas hipóteses

têm sido propostas no sentido de tentar explicar porque algumas pessoas desenvolvem a DE e

outras não, e quais os mecanismos psicobiológicos estariam envolvidos no desenvolvimento da

desta condição.

Em relação aos mecanismos psicobiológicos que possivelmente estão envolvidos com a

DE, hipóteses que apontam participação de substâncias com ação central e alterações na

percepção da imagem corporal tem ganhado destaque.

A hipótese da participação da Beta-Endorfina no desenvolvimento da DE é talvez a mais

clássica e conhecida, e está baseada no fato de ocorrer um aumento na liberação dessa

substância com o exercício físico, além de participar de processos de analgesia, com a ativação

de áreas cerebrais responsáveis por prazer e satisfação (Pierce et. al., 1993; Goldfarb & Jamurtas,

1998).

Já a hipótese mais conciliadora, aponta para uma combinação de alterações tanto

fisiológicas quanto psicológicas, sugerindo assim que, a DE poderia seguir o mesmo modelo de

reforço relacionado ao desenvolvimento da dependência de drogas psicoativas, ou seja, a

prática de exercícios apresentaria tanto propriedades de reforço positivo quanto negativo (Davis

& Scott-robertson, 2000).

Outra hipótese aponta na direção dos transtornos de imagem corporal como o principal

elemento motivador para a prática da atividade física excessiva. Estes transtornos também

estariam relacionados com a utilização de dietas e métodos de redução da massa corporal total,

com o intuito de adquirir uma forma física mais aceita socialmente (McCreary & Sasse, 2000).

Outro forte candidato na tentativa de explicar os mecanismos do desenvolvimento da DE

refere-se à participação das citocinas, particularmente da interleucina 6 (Il-6). Essa hipótese foi

recentemente proposta por Hamer & Karageorghis (2007), e se baseia na influência da periferia no

cérebro, onde as citocinas teriam um papel no sistema nervoso central, incluindo o sistema

serotoninérgico, noradrenérgico e o eixo HPA (Hipófise-Pituitária-Adrenal), promovendo mudanças

na atividade neuronal influenciando o comportamento. Em sujeitos saudáveis, a infusão de IL-6

recombinante, ocasiona um aumento das concentrações de IL-6 circulantes, similar ao observado

em uma condição de exercício resultando no aumento de fadiga, diminuição da concentração

e alterações na arquitetura do sono, aumento de ansiedade e humor deprimido.

Page 126: Apostila 3 - 2013

- 127 -

O sistema endocanabinóide também pode estar envolvido com a DE, essa hipótese se

baseia no papel desse sistema como um elemento capaz de ativar mecanismos de reforço,

sendo que há ativação deste durante a prática de exercício agudo (Sparling et al, 2003, Dietrich

& McDaniel, 2004; Kanareck et. al., 2009; Heyman et. al., 2012 ). Os endocanabinóides parecem

apresentar uma profunda relação com o controle alimentar (Di Marzo e Matias, 2005), com a

analgesia e sensação de bem-estar (Kanarek et al., 2009), parecendo estar relacionado com

atitudes de recompensa e repetição do comportamento(Trezza, 2011). Dessa forma, pode se

considerar que esse reforço também poderia ser expresso na DE devido ao aumento da atividade

deste sistema durante o exercício físico (Heyman et al,. 2012).

Alguns autores apontam tentam explicar esta forma de envolvimento com o exercício a

partir da relação com a personalidade do sujeito, os estudos mostram que sujeitos com perfil,

perfeccionista ou narcisista parecem tem uma tendência a se envolver de forma compulsiva ou

exsessiva com exercício físico, principalmente pela busca de resultados ou questões relacionadas

a auto estima (Davis & Scott-Robertson, 2000; Hausenblas & Giacobbi, 2004, Hall et al., 2009,

Grandi et. al., 2011 )

Como já descrito, o exercício físico apresenta a possibilidade de se tornar uma obsessão.

No entanto, para a caracterização de fato da presença dos sintomas para dependência de

exercício, deve-se considerar a frequência e intensidade da realização do comportamento; as

motivações que o levam, a magnitude de manifestação quando este não é realizado.

Deve-se considerar também, outras manifestações negativas adjuntas que poder ser vistas

(Ex: alterações no sistema imune, na qualidade do sono, aumento da fadiga, dor, aumento da

ansiedade, irritabilidade, culpa, depressão) que influenciarão negativamente na saúde do sujeito,

quando este é impossibilitado de praticar (Mond et. al., 2006; Berczik, 2012).

Vale resaltar que, a temática da dependência de exercício físico, teve seu inicio adjunto a

estudos com privação de exercício físico, uma vez que os sinais e sintomas que se assemelham a

sindrome de abstinência foram reportados na ausência da prática, sendo a partir daí o exercício

físico visto como um possivel comportamento- dependente.

Page 127: Apostila 3 - 2013

- 128 -

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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