“É de crer que no próximo pdr venhamos a ter um …consideramos que não, cada uma tem o seu...

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novembro 2014 VOZ DO CAMPO ENTREVISTA No âmbito do projeto SIAC “HortINOV 2020” o Centro Operativo e Tecnológico Hortofrutícola Nacional (COTHN) está a desenvolver a primeira edição dos Prémios Hortofrutícolas COTHN. Trata-se de um concurso que quer promover, distinguir e reconhecer publicamente entidades, pessoas e projetos da fileira hortofrutícola que apostem na inovação e na colaboração como vetores de crescimento. Os prémios serão atribuídos durante a Gala Fruta Viva “Frutas e Legumes 2014”, no próximo dia 14 de novembro no Centro Cultural e de Congressos das Caldas da Rainha. Para nos falar mais sobre esta iniciativa e sobretudo para nos fazer um retrato do panorama hortofrutícola nacional conversámos com o presidente do COTHN, Paulo Águas. “É de crer que no próximo PDR venhamos a ter um cenário de investimento sério e sustentado” 32

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Page 1: “É de crer que no próximo PDR venhamos a ter um …Consideramos que não, cada uma tem o seu espaço. É necessário ter em conta o que o mercado quer e a sua dimensão. Este ponto

novembro 2014 VOZ DO CAMPO

ENTREVISTA

No âmbito do projeto SIAC “HortINOV 2020” o Centro Operativoe Tecnológico Hortofrutícola Nacional (COTHN) está a desenvolvera primeira edição dos Prémios Hortofrutícolas COTHN. Trata-sede um concurso que quer promover, distinguir e reconhecerpublicamente entidades, pessoas e projetos da fileira hortofrutícolaque apostem na inovação e na colaboração como vetores decrescimento. Os prémios serão atribuídos durante a Gala FrutaViva “Frutas e Legumes 2014”, no próximo dia 14 de novembro noCentro Cultural e de Congressos das Caldas da Rainha.Para nos falar mais sobre esta iniciativa e sobretudo para nos fazerum retrato do panorama hortofrutícola nacional conversámos como presidente do COTHN, Paulo Águas.

“É de crer que no próximo PDRvenhamos a ter um cenário deinvestimento sério e sustentado”

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Page 2: “É de crer que no próximo PDR venhamos a ter um …Consideramos que não, cada uma tem o seu espaço. É necessário ter em conta o que o mercado quer e a sua dimensão. Este ponto

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ENTREVISTA

Qual o panorama da hortofruticultura nacional(evolução, culturas, produtores ...)?

Trata-se de um setor em expansão, mas étambém muito profissional. Nos últimos doisanos deverá ter exportado em média milmilhões de euros por ano, sendo a produçãonacional de frutas e hortícolas avaliada emcerca de 2200 milhões de euros. Valor quedeverá aumentar nos próximos anos.

Basta referir que em termos de ProDer ahorticultura, incluindo flores, e a fruticulturasão os dois setores com maior peso emtermos de investimento apoiado. Em númerode projetos apoiados a fruticultura é a principalatividade produtiva, assumindo por si só cercade 10% do investimento total apoiado peloProDer. A elevada taxa de apoio, deveu-seem parte à entrada de muitos jovens naatividade. Acreditamos também que a taxa desucesso de muitos destes jovens não venha aser a desejada, mas esta situação não deveráser transversal ao setor, mas fruto de algumentusiasmo excessivo com o investimentoagrícola na generalidade. Isto aconteceu emmuitas outras áreas da produção agrícola, nãose trata de uma exclusividade dahortofruticultura.

“A plantação de amendoalfoi a que obteve registosmais elevados no últimoquinquénio.”

De notar também que o setor está a renovar-se em termos geracionais, dentro de muitasfamílias de produtores e organizações, commais-valias do ponto de vista técnico eorganizacional e nestes casos cominvestimentos muito bem delineados, visandoinclusivamente a internacionalização.

Em termos de culturas, os frutos frescoslideram os investimentos em plantação, emparticular as prunóideas, em que ainda nãoconseguimos assegurar as necessidades totaisdo mercado nacional, seguidos da maçã,citrinos e pera. No entanto, se considerarmosuma cultura individualmente, a plantação deamendoal foi a que obteve registos maiselevados no último quinquénio.

Mesmo com alguns insucessos que venhama detetar-se no contexto anteriormente referido,dada a dinâmica do setor, perspetivamos queno próximo PDR venhamos a ter um cenáriode investimento sério, sustentado, quemanterá a hortofruticultura com importantecontributo para a balança comercial alimentar,em valor, de que tanto se fala.

Nos últimos dez anos quais foram as grandesmudanças no setor? Um exemplo dafruticultura, um exemplo na horticultura ondehouve uma mudança “radical”.

As mudanças deram-se essencialmente aonível da organização e capacidade técnicaquer dos empresários agrícolas quer dostécnicos, o que permitiu que a hortofruticulturase tenha tornado um setor cada vez maisprofissional e economicamente maisinteressante. Atualmente Portugal tem cercade 35% da produção a passar pelasorganizações de produtores, o que representa

um acréscimo de 10% nos últimos cinco anos.Alguns subsetores como por exemplo a perarocha, se disser que 90% da produção estáorganizada, não deverá ser exagero. Noentanto a dimensão das organizações poderáser um senão. É também um setor em que acompetitividade existente nunca permitiráconsiderar que os objetivos estão atingidos.

“Atualmente Portugal temcerca de 35% da produção apassar pelas organizaçõesde produtores, o que repre-senta um acréscimo de 10%nos últimos cinco anos.”

Fruticultura: É um caso de sucesso ao nívelda produção cada vez mais sustentável, querdo ponto de vista económico como ambiental.Já não se fala apenas de qualidade do produto,falamos de qualidade da produção incluindonesta, a responsabilização social. O facto determos uma grande parte das explorações

certificadas por sistemas de qualidade que lhespermitem colocar produtos nos mercadosmais exigentes do mundo, é um forte sinal dacapacidade que o setor teve de se adaptar àsexigências destes parceiros do mercadointernacional. Hoje o grau de exigência dosclientes nacionais já não é substancialmentediferente dos outros, o que implica um rigorcontinuado ao nível das explorações e dascentrais. Neste contexto a horticulturaacompanhou a tendência.

Ao nível da horticultura, a expansão dasculturas hidropónicas, com elevadaincorporação de tecnologia de ponta e agestão energética associada à forçagem temsido uma aposta que torna a visita a muitasdestas explorações uma verdadeira aula degestão de recursos. Também neste caso, aevolução das intervenções pós-colheita,permitindo apresentações no mercado muitodiversas para um mesmo produto, tem sidonos últimos anos um exemplo de mudançamais que evidente.

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Na horticultura é de referir uma forte expansão das culturas hidropónicas

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ENTREVISTA

Estamos a assistir a uma mudança em termosde culturas, como é que estão estas novas”culturas (mirtilo, goji, baby leafs ....) a convivercom as tradicionais? Há perigo das primeirasanularem as segundas?

Consideramos que não, cada uma tem o seuespaço. É necessário ter em conta o que omercado quer e a sua dimensão. Este pontojulgamos que será essencial. Portugal é ummercado muito conservador em termos deconsumo, há muito trabalho por fazer emtermos de encontrar oportunidades para asnovas culturas, há muito trabalho deorganização da produção por fazer, mastambém há gente empenhada.

Muitas destas novas culturas estãoessencialmente a ser realizadas por jovensagricultores, que procuram alternativas àsculturas ditas mais convencionais. Muito dotrabalho que está em falta, terá que ser feitopor eles.

Temos várias Denominações de OrigemProtegida/ Indicações Geográficas Protegidasna fruta, tem sido uma mais-valia para osetor? E no caso das hortícolas, não fariamsentido também estes “nomes” paradiferenciar os produtos?

As Denominações de Origem têm tidoalgum sucesso, essencialmente quandofalamos do caso da Pera Rocha, da Maçã Bravode Esmolfe e alguns tipos de malápios. Otrabalho que a Cooperativa de Mangualde temfeito na tentativa de valorização destasvariedades com a criação da marca “BravoMangualde” é um bom exemplo disso.

As IGP, como por exemplo a Maçã deAlcobaça e a Maçã da Beira Alta, têm tidocampanhas alargadas de promoção e têm tidoalgum impacto junto do consumidor. Aqualidade da fruta nacional e das regiões ondesão produzidas é reconhecida pelosconsumidores.

Muitas regiões têm explorado operaçõesde marketing territorial conseguindopromover as suas regiões e reciprocamenteos seus produtos. A associação dasdenominações a produtos transformadostambém evidenciou interesse por parte dosconsumidores.

O desconhecimento de muitas das nossasdenominações, na fruta, pelos consumidores,deve-se também a alguma inação ou mesmodesinvestimento de algumas entidadesgestoras. Nestes casos, pensamos que assituações deveriam ser avaliadas nãopermitindo que se torne vulgar a existênciade uma denominação e a inexistência deproduto no mercado.

Relativamente às hortícolas, realmenteexistem apenas alguns casos, como o da BatataDoce de Aljezur. No entanto existem outrosprodutos que têm todas as condições para setornarem IGP e DOP, sendo necessário fazero trabalho de caracterização, que só épossível quando um grupo de produtores semobiliza para tal. Talvez a mais fracaorganização no setor hortícola se reflita nomenor número de produtos IGP ou DOP.

Alqueva e a produção hortofrutícola nacional.O que mudou?

O Alqueva veio alargar a área de produçãode hortofrutícolas no Alentejo. Aspotencialidades são enormes, uma vez que oclima consegue otimizar as condições deprodução. O facto de ser possível utilizarvariedades melhor adaptadas a climas maisquentes permite alargar a janela de produçãoe comercialização. É uma vantagem uma vezque os produtos nacionais passam a poderapresentar-se no mercado numa alturadiferenciada e assim tornarem-se maiscompetitivos.

O preço da água que se estima para oAlqueva, ao atingir o ano cruzeiro, poderáser impeditivo da viabilidade económica demuitas culturas, nomeadamente de arvensesprimaveris. No entanto, no caso das frutícolase de algumas hortícolas, esta questão poderánão ser tão limitante e eventualmente mantera oportunidade de alargamento da área e dajanela comercial já referida. Esta questão,caso a política do preço da água para oAlqueva não se altere, será com toda a certezaum assunto em discussão num futuro muitopróximo.

Novos mercados? Onde é que os produtosnacionais estão a chegar?

Os produtos nacionais estão a chegar a todaa Europa de uma forma geral, com maiorenfoque em países como a Inglaterra,Alemanha, Polónia, Rússia, Espanha, França.Este ano devido ao embargo russo podemosconsiderar um ano atípico, não só pelo fechodo mercado russo, mas também pelasalterações provocadas nos fluxos comerciais,bem como pelas operações de retiradaapoiadas financeiramente pela União Europeia.No entanto, também fora da Europa, Portugaltem tentado conquistar mercados como osdo Norte de África (Marrocos) e Ásia (Dubaie China). Em termos do ContinenteAmericano, o Brasil é um mercado muitoimportante para a Pera Rocha, embora tambémcheguem produtos nacionais à Costa Rica.

Sendo o COTHN um centro de conhecimento,quais são as suas principais áreas de trabalho?

Decorrem com a participação do COTHNvários projetos que abrangem várias áreas.Poderemos destacar: conservação de longoprazo para pomóideas; soluções para algunsproblemas fitossanitários em pomóideas,tomate e brócolo; ferramentas de apoio àdecisão, também no contexto do uso dosfitofármacos.

Também alguns projetos mais relacionadoscom a qualidade, nomeadamente determinaçãode épocas ótimas de colheita da pera rocha edesenvolvimentos de uma tecnologia quepermite a minimização dos danos provocadospela colheita de processamentos nas centraishortofrutícolas.

Estamos igualmente envolvidos numprojeto de fileira para o pêssego da Cova daBeira, que vai deste a melhoria dos processosprodutivos até à qualidade e valorização doproduto final.

Paralelamente temos estados envolvidosem projetos de transferência de conhecimentotais como a Rede Inovar e o Agrofood3, etambém de potenciar a participação dasempresas do setor em projetos internacionaisno âmbito do HORTIZONTE 2020, o projetoHortINOV2020.

“Talvez a mais fraca organiza-ção no setor hortícola se refli-ta no menor número de pro-dutos IGP ou DOP.”

Prestes a acontecer mais uma Gala Viva “Frutas e Legumes”,onde serão entregues os prémios Hortofrutícolas Cothn 2014,o que se pretende com esta iniciativa?

Com esta iniciativa pretendemos mostrar o dinamismodeste setor e premiar alguns dos muitos que se têmdestacado pela inovação, empreendedorismo e

internacionalização do setor. Será tal como nas duas galasanteriores, um espaço para o convívio dos diversos

associados e interlocutores do setor, que estão na génesee na lógica da existência do COTHN desde 2001: os

produtores, as suas organizações e empresas; as entidadesligadas à investigação aplicada que partilham com a produçãoas suas necessidades e problemas; o Ministério (da Agriculturae do Mar) que tutela o setor; e as empresas e municípios quevêm colaborando connosco enquanto parceiros em muitosdos projetos desenvolvidos nos últimos 13 anos.

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