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Anderson de Oliveira Rodrigues

Ato1° Edição

Edição do Autor São Paulo

2020

Page 3: Anderson de Oliveira Rodrigues · A Ana Beatriz, que tirou minhas máscaras. Merda. Ato, por Anderson Rodrigues ... acordar com ela todos os anos e ser feliz ao seu lado * Decidi

Copyright © 2020 by Anderson Rodrigues

Diagramação RabiscariaCapa Rabiscaria

Revisão Rabiscaria

R696a Anderson RodriguesISBN 978-65-00-00834-0Ato/Anderson Rodrigues - Ed. 01 - Osasco, SPEsta obra é uma publicação independenteCopyright [2020] by Anderson RodriguesTodos os direitos desta edição reservados aoautor da obra

Índice para catálogo sistemático

Poesia brasileira CDD B869.1

Page 4: Anderson de Oliveira Rodrigues · A Ana Beatriz, que tirou minhas máscaras. Merda. Ato, por Anderson Rodrigues ... acordar com ela todos os anos e ser feliz ao seu lado * Decidi

A Ana Beatriz,

que tirou minhas máscaras.

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Merda

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Ato, por Anderson Rodrigues

Por um instante eu cortejei a eternidade

mas depois cancelaramviram que não era o que esperavamnão era dignoestava atrasado, o que é raronão acho que minha presença seja necessárioo fato é que nunca fui o que quiserammesmo com diagnósticotinha sempre algo que era contrárioentão não valhonem o ingresso, nem o espetáculosirvam-se eis o meu fracassodiante de mim tudo o que poderia ser e agora que é não estou para ver é muita arrogância achar que viverei depoisde morto?Eu sou um zumbitenho o coração em pedaços

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Ato, por Anderson Rodrigues

quando me quiseram eu era um idiotaagora que é bom nem pagandonão, eu não pagoquestão de honra ao méritovou ganhar uma medalhame disseramlá no paraísolonge dessa merda todaquem sabe lá eu encontre alguémenquanto não vemeu tenho que me foder mesmofiz pessoas sofreremisso eu pago em juros, adiantadomais do que o combinadoextras, férias e feriados e nunca estará pagosabe por quê?Eu não seié assim que pareceaqui anoitece

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Ato, por Anderson Rodrigues

o calor insuportávelquero mais do que o aceitávelo impossível e o invernodormir com ela umas três semanasacordar com ela todos os anose ser feliz ao seu lado

*

Decidi dormir mais cedopara não ter que pensar em você a noite todamas quando me deito eu pensoe se não penso eu sonhonão tenho para onde fugirminha mente não sai de mimfalamos do que é precisonão sabemos, mas procuramos motivos

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Ato, por Anderson Rodrigues

você me ensina a ser gente e eu o que te ensino?Te perguntei se estava beme você não disse nadapreferiria tomar uma facada no intestinodo que viver sua indiferença a tudo isso

*

Eu sofro por não me convencereu faço isso pra me convencereu não consigo entender

*

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Ato, por Anderson Rodrigues

Na literatura os relacionamentos são livres,se você esta com uma ideia, daqui a pouco ela some e pode não voltar, enquanto isso você já tem outra, e com ela nascem suas crias e elas crescem, vão pra faculdade, tem casos com escritores e umas até casam constroem família e tudo.

*

O futuro se insinua degradante a mim, as perspectivas são todas depreciativas, a dor é minha sombra, me espreita em sua escuridão, quando a noite cai, sou eu que estou no chão, tem algo mais deprimente do que fazer sozinho uma refeição? Eu prefiro ficar sozinho, mas para sofrer, gosto de compartilhar alegria, assim ela se

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Ato, por Anderson Rodrigues

legitima, ter alguém para perceber o que o tempo esta a fazer com seu semblante, e te dizer e você rir e pensar, a vida é assim, mas engolir a comida que esfria enquanto você olha os ponteiros dando voltas e voltas e aquela azia, a ânsia e a ansiedade, você deseja não querer viver, se tivesse umrevolver acabaria tudo ali, naquele instante e aí, talvez pare de sofrer, eu canto à solidão, prezo por mim mesmo, mas as vezes eu queria dividir um apartamento, uma casa, um barraco, o cobertor debaixo da ponte, ter alguém para escutar e dizer que ama, o sonho mais cotidiano do homem é ter uma mulher com quem dividira cama.

*

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Ato, por Anderson Rodrigues

devo cuidar de minhas coleções inúteiso amor é uma fábula para adultos

*

A dor do coração partir é tamanha ao infinito ruir. O que não tinha mensura de repente resume-se em cair.

*

Pensamentos contrários numa noite de sábado

*

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Ato, por Anderson Rodrigues

E essa amarguraque adoecee não tem curaquando anoiteceparece que acentua se não enlouquecesobra sobriedadee a realidade é uma putafrívola e imundae se eu te dissesse o que você quisessevocê me diria que a dor continua porque mesmo que o amor viessea amargura seria minha e suaé um sentidobuscar encontrar alguéme esperar que o sofrimento diminua mas o que acontece

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Ato, por Anderson Rodrigues

é que não podemos achar no outro o que é de responsabilidade tuapor isso vou rimar com a luapra que essa merda não evolua e acabe virando uma bíblia do entusiasta do romantismo, boa noite.

*

Vítima da vidame vitimizo ao sorriso da morteeu sou issorefém do meu próprio destinoquando eu for, o que será?O mundo continuará sendodeixarei livrosde mim vocês se livramnovos deuses virão

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Ato, por Anderson Rodrigues

os velhos morrerãodeles os seus filhose esses serão os pais das meninas e dos meninosaté tudo ter sidomães, padrastos, filhas, padrinhosse não vier o cometaou jesus não voltaressa merda nunca vai acabarhappy end.

*

Ela(e) sorriu de infelicidade.

*

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Ato, por Anderson Rodrigues

Um mendigo o parou na rua perguntando se tinha um cigarro, ele(a) tirou um do maço e o colocou atrás da orelha, então ofereceu o maço ao mendigo.

*

Só ficava surpreso quando não me surpreendia, ela era assim.

*

Meus pensamentos me elevam ao cume do egocentrismola eu fico sozinho me masturbando como à um Narciso

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o eco entoa vozes brandas de profunda apreciaçãoquando não me deprecio e fico no porão doisolamentocontando o tempo e cada lamentonão sei o que precisosó sei que estou fazendo o que possosem saber do impossíveleu entendo que isso é passível de esquecimentono entanto eu querosaber que não terei me faz querer maisentão eu peço ao vento, à luae mais uma vez, todas as vezesnada acontecea dependência é escravidãoeu não quero ser servosendo só isso o que somos no universo

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*

vivo como um quadro tortodesalinhado da sociedadeuma obra desacreditadaquem sabe um dia me vejam com outros olhosnão quero viver após a mortea eternidade é para os clássicosquem sabe ser por oraentende quanto demorapara compreender-se por inteiroas vezes estrangeiro de mim mesmoviajo em meus pensamentose chego de onde parti, aqui, sozinho, a noite, a musica, o desejoforam-se cigarros, ansiedade, espasmossaudades

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constatoo quadroentortadoe sofro de saudades

*

Doce ilusãoem meu coraçãoem minha mentenão sei mais discernir se estou doenteou se um dia estive são

*

não queria perder tempo

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com o que eu poderia ter feitomas se não faço é porque não possodepende de terceirosa vida é condicionaltudo tem um preçoo constato do real é um passo ao desesperoo ser sem fuga tenta se esconderna insignia da insignificâncianos vícios legaisnos amores à distancia cada dia ele percebe o quanto perdee o quanto não ganhacomo ter sem possuir?Cada vez mais longe de conseguir ele convence-se do fimeminentementeo fracasso o faz riresse palhaço que eu fuiri de tudo o que eu fiz

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ainda que eu chore pelos cantos uma vida de tragédiao retardamento mental, que é só o que podeser essa tal comédiaé desespero crônico mascarando o inevitávela dor doença incurávelnos apodrece lentamenteaté o final

*

é de pura inocência ou tremenda burrice enfrentar a polícia com pedras na mão

*

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Onde ela foi, pra onde ela vai, qual sua comida preferida, o livro mais lido, o filmeque lhe fez chorar, sua musica favorita, os dias que não esquece, os momentos que se eternizaram, se faz terapia, se brinca no chuveiro, se sente bonita, se entende o silencio, se ama, quem ama, por quê?

*

Ela me delira, eu tomo remédio, eu faço terapia, ela é a terapeuta

*

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- Você precisa fazer alguma coisa da vida...- Vou preparar um café.

*

Tenho que me acostumar ao que não posso aceitaré deprimente tanto quanto eminente que isso afete meu bem estar, gerando neurosesque transformam-se em psicoses daí vem as vozes e a irrealidade que meu inconsciente tenta deixar-me feliz, já que na realidade sou completamente e invariavelmente infeliz. Essa condição à que estou sujeito, da dependência por terceiros é frustrante e tudo é tão lento, se eu pudesse fazer todas as coisas em um só

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momento eu as faria, não é que eu vá me amontoar de afazeres e fazê-los ao mesmo tempo, mas providenciaria para que tudo não caísse no esquecimento fazendo do presente eterno enquanto passa. Se minha felicidade depende de outra pessoa, o que eu sou senão um escravo preso nas amarrasda esperança da boa vontade alheia? É, eu sei, eu posso tentar com outras pessoas, há uma infinidade delas, mas todas são iguais,hipócritas, idiotas e imbecis. Tem alguma coisa muito errada comigo e por mais que eu tente fazer o correto, nada dá certo. Pra ser sincero e honesto tenho a impressão idiota e isso me consola nas noites chuvosas a passar os dias quentes de que eu, Afrânio Gonçalves, terei mérito, serei opróprio império de toda vastidão da merda.

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*

Quis escrever uma poesia, saiu meu testamento.

*

Vês a fumaça da fábrica? Estão rabiscando e quanto mais se rabisca adentra-se à metafísica do inconsciente produzindo arte,fomentando cultura, desestruturando o estabelecido, não que faça alguma diferença, e se fizesse seria mínima,

*

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No momento precioso, não valeu nada, tudo o que soube fazer foi pensar: “eu deveria ter feito” e agora que passou só tem a conformar-se. Recebe o presente a todo instante e quer mudar o passado, é de fato um senhor, senhor retardado. Afonso esta escrito em sua certidão porém, ele precisa ser vilipendiado, leva o mundo nas costas e um sorriso no rosto, recebendo todo tipo de calúnia, porque é retardado.Eu sou o Afonso, disse o retardado. Ele é retardado, disse o narrador que se parece com você, retardado.

*

Queria ter escrito a letra da musica que ao sentar para escrever me vem sempre a

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mente. Não há nada do que ainda não tenhasido dito.

*

Em dado momento ele percebeu o quanto havia sido impulsionado pelo o que lhe foi imposto durante toda a vida, a corrupção humana de socialização fazia-o ter náuseas,a hipocrisia deliberada do contato deprimia-o nas mazelas da apatia, reconheceu a doença em si como causa natural, portanto sabia que a depressão nada mais era do que uma reação in natura do ser, suportar a dor e conviver com o sofrimento lhe fez o caráter, e de caráter misantrópico ele se isolou nos cumes da

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solidão, odiando a si mesmo por amar suas escolhas

*

Eu espero, vitima da esperança, que dê tudo certoe se não der, eu fiz o que podia ser feitoo impossível só se faz nas fábulasna realidade eu não consigojá tentei, mas ainda não desisti não pode ter sido tudo o que eu poderiatem de haver mais possibilidades

*

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- Vamos sair, vai ficar ai?- Sim, estou me preparando psicologicamente.

- Para o que?- Para passar com a psicóloga.

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A Psiquiatra disse:- Você não é esquizofrênico.

Contive as vozes no inconsciente que pediam: “mata ela, mata ela”.Eu disse:

- Ok.

*

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A realidade caiu aos meus pés por isso vivotropeçando. Quero chutá-la ao inferno me embriagando, para esquecer minhas lamúrias ou para sempre lembrar de minhas lástimas. Talvez assim eu seja feliz e se não for, serei infeliz com dignidade.

*

Fazia tanto tempo que não ficava triste, ou então eu estava a tanto tempo triste que nãosabia mais que estava. Como posso me entristecer por não ser doente? Por que anseio tanto por um diagnóstico? Porque provavelmente, eu não saiba quem sou e quando tinha um diagnóstico parecia que fazia parte de alguma coisa, assim sem nenhum o que eu sou? Comum, normal?

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Eu detesto ter de pensar que eu seja normal, e me deixa profundamente deprimido a possibilidade de que tudo isso seja apenas depressão, apenas... qualquer doença deveria não ser bem-vinda, mas o fato é que eu odeio tanto a humanidade quenão queria ser normal, se eu tivesse que serdoente para não ser igual à tantos imbecis, que eu fosse. Minha doença é ser idiota.

*

Despi toda minha alma vestido com a melhor roupa que eu tinha, e tudo foi tão inútil, tudo foi senão nada, quando me lembro de toda imbecilidade que desferi através das palavras, escrevo igual

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mediocridade, para não esquecer-me quão idiota sou.

*

Prolifera-se a idiotice e não há para onde fugir, em todo lugar em todas as direções, aimbecilidade tradicionaliza-se, é cultural e tem gente que compra, gasta o dinheiro quejuntou e dá emprego, as estatísticas estão corretas, o aumento das oportunidades de trabalho esta diretamente ligada à idiotização humana. Pessoas que formam-se nisso, seguem carreira e aposentam-se.Rir é o remédio do retardamento mental, quando nos detemos à uma situação, um ato, uma piada, algo engraçado, a animosidade vinda do mais puro íntimo de

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nós se aflora e para conter isso o riso é manifesto, assim nos livramos do que poderia acontecer, se não rissemos podia-se bater com a cabeça na parede ou pular feito um imbecil. O riso é uma vergonha aceita pela moralidade como algo satisfatório e saudável, sim, é sinal de saúde estar de bom humor, ainda mais fazer-se de idiota a serviço de terceiros, para que juntos ritualizem a imbecilidade.

*

Amanha vai ser melhor hoje é vésperavou dormir e quando acordar vou estar sonhandodividir o presente com minha divindade

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é um privilégioé um sonho em realidadeela, tão bela, tão elaeu vou sobreviver hoje para viver amanha

*

O que já apaguei do que escrevi daria um livro.

*

Tão certo quanto indefinidotudo esta perdidomeu bemeu não sei o que fazer com o que sintonem escrever eu consigo

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sem paralogismossem rimasnão seria divertidoeu sou um palhaçonão se esqueçapreciso do risoainda que eu enlouqueçaentre o real e o delírioeu quero que aconteçao impensadoa anarquiao impossível

*

Estava triste, tão triste quanto uma história de final feliz. Sabia que nunca a teria, mas mesmo assim queria querê-la, porque o

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impossível é como a perfeição, a buscamosinutilmente para continuar vivendo, para sefazer viver, por mais que não chegamos ao destino, ao menos percorremos o caminho.

*

- o que achou?- Ficou bom essa merda.

*

Ler é achar que pode escrever melhor.

*

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Na vida nada se ganha, tudo se perde.

*

Estou morrendo de saudadeestou morrendo de cigarroestou morrendo de vontadeestou morrendo de caféestou morrendo de estar vivendoestou morrendo a todo momentoe a todo instantede sentimentose de livros na estanteestou morrendo de escreverestou morrendo de pensarde amor e de paixãode dor e sofrimento

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apatiaestou morrendo de poesiatodo dianesse segundo, nesse quarto, nessa atmosferaestou morrendo de estar sedentopor seus beijos e seu conhecimentoestou morrendo aos poucosestou morrendo de estar quase loucoestou morrendo de lucidezestou morrendo de sensatezestou morrendonão posso fazer nadaaté o ultimo suspiro estarei morrendopara enfim morrer e dizerem que não vivipois estava sempre morrendo.Estou morrendo quando durmomorro enquanto tomo banhofaleço de vez em quandoe no entanto

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estou vivoestou escrevendo que estou morrendoenquanto estiveres lendosobrevivo

*

É por pura lucidez que se enlouquece

*

O inverno esta indo embora e eu tenho ficado cada vez mais sozinhotem sido assim, é assim agorae parece que continuará sendo

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eu me lembro que antigamente era mais friose passava quase uma semana inteira chovendoeu era pequenoe já me admirava vendo a chuva e o ventobaterem na janelae o calor lá dentroum glorioso mingau me esperando na tigelae claro, na TV todos os desenhoslá se foi um bom tempo e ele levou minha infância sem perguntar se podia roubaram-me a ingenuidade a lástima de não conseguir aceitar o hojeo passado é pura saudadenostálgicoassim os dias vão passando até a próxima estação

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até perceber que tudo cai na perdiçãosó resta viverum dia após o outro

*

O impossível só existe na inexistência, nas páginas de um livro, num roteiro de um filme no cinema, na pinceladas do pintor no quadro, no desenho em quadrinhos, a arte proporciona o impossível, mas somente dentro da arte, a arte e a realidade coexistem simultaneamente, a arte fazendo o impossível dentro da realidade que é possível, logo não existe o inexistente e o que é possível é que não haja impossibilidade

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*

Quando a musica acaba eu ouço o desesperovindo das entranhas do inconscientea minha mente manipula a realidadee em delírios físicos e alucinações sonoraseu escuto o inexistenteo que eu queria ouvir dela, o que ela não diznão fosse os remédios estaria numa sinfonia de mortevozes malditasmurmúrios estapafúrdiosregendo a orquestra do meu apocalipse de toda forma me enganoe o plano do real é um desenganotoda dor de ser e de não ter amortoda esperança se nega e me cega

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e eu sigo sempre sozinhodiante de mim um mundo inteiroe estou presonas amarras da insegurançado medodo sofrimentocanso de imaginardetesto sonhare o que me resta?

*

Estou sozinho essa noitecomo tem sido frequentementedesde que aprendi a apreciar a solidãonão quero companhia se não for a sua

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Frente à frente se faz uma enorme distanciaestava ao lado dela e parecia quilômetrosnenhuma palavra seria o bastanteo que nos separa é a liberdadesó quero o que ela quiserela só quer o que não quero

*

Vês a fumaça da fábrica:metafísica!Físico mentalsonho real.

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Ler induz escrever.

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Fiquei mais próximo de ti por alguns momentos, você não estivera ao meu lado, nem em minha frente, não me fez companhia, ainda assim estive mais perto de você. Com a memória é possível reviveros instantes, entrementes, não é suficiente, com lembranças do que já havia escrito, lendo outra vez, vendo suas fotos, conhecendo um ínfimo de seu trabalho através da leitura, ouvindo algumas musicas, tudo isso trouxe você até mim e posso dizer, sem medo de correr o risco de

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ser só um romântico ou platônico, fiquei feliz. Fiquei feliz sabendo da impossibilidade de estarmos juntos, de como traçaram nossos destinos, e entendo isso porque não quero fazer-te sofrer, a única maneira de te amar é estando longe de você, por mais que meu corpo grite por um contato físico, a prospecção é nosso reduto e lá nos amamos interminavelmente.Pronto, tá escrito, pelo bem da poesia, do meu inconsciente maldito! Agora eu digo, fique comigo! Quero você, sua carne, seu corpo, seu cheiro, quero seus beijos, quero você vestida, despida, vestindo, despindo, quero entrar em você e morar em você, ahhhhh.

*

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Ato, por Anderson Rodrigues

Erros diante o incerto

*

Quero morrer enquanto posso, pois senão depois posso morrer de um jeito que não quero.

*

Pequenos pés brancoseu os amoas veias que por onde passam o sanguesão verdespés brancos, quase transparentes

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Ato, por Anderson Rodrigues

entre tantos os seusó deus! Tamanha delicadezaés os pés de minha deusapermita-me lambê-los?Eu os vi, debaixo da mesaimagino o perfume de vossos cabelospermita-me acarinhá-los?Ó deus, que humano haveria de poder tocá-los?Inimaginável ó deusa, possibilita-me a impossibilidadeconceda-me esse milagree morrerei feliz.

*

Noite de sábadoestou aos pedaços

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Ato, por Anderson Rodrigues

juntando forças sem nenhum centavofumando cigarrosouvindo os lamentos de meu coraçãoao som de rock in roll, blues ou jazzjá se faz trinta e eu nessa vidasem saber o que virá depoisenquanto solitáriofeito um otáriosem amor próprioquem há de amar um ser tal como sou?Sofrimento miserávelo romantismo só faz vítimaslivre de toda doutrinaeu quero ser livree me livrar de toda dorou ao menos suportá-la com dignidade

*

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Ato, por Anderson Rodrigues

A minha pretensão é um absurdoa minha vontade um disparateambiciono o impossívela meta é o infindávela perfeição é mazelaos deuses me pedem conselhose tudo o que eu faço é nadanão há nada como não fazer nadanada

*

Já devo ter fumado uma fábrica de cigarrosporque hoje é sábadolitros de café ao som do rádioporque é diferente quando eles tocama musica que faz toda diferença

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Ato, por Anderson Rodrigues

a inadimplência segueestou desempregadopensando no que fazerresolvida questãoo ato de escrever, para não enlouquecer como fez Bukowskiuma dose de uísqueuma mulherdo que mais precisaria?Me satisfaço com o necessáriopor isso estou sozinhoe sóbrio.

*

Ao povo pérolas de plástico, os pobres poderão pagar o preço para parecerem um pouco ricos. Caro companheiro, o ex-

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presidente é um presidiário, o presente, outro porco que fica com as legitimas pedras.

*

Estou aqui perdendo meu tempo pensando em como perder tempo de forma majestosa, tudo, afinal de contas, é uma perda de tempo, só ganhamos tempo antes de nascer, depois só se inicia o fim.

*

Não queria escrever obviedades, tem a filosofia pra isso. Não queria escrever

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sobre a pessoa que eu amo, porque eu não sei nada sobre ela. Não queria escrever sobre esse calor no inverno, é horrível, nem as estações do ano são respeitadas nesse país. Não queria escrever nenhum manual de como não fazer alguma coisa, é inútil, como a filosofia. Não queria escrever poesia, ainda mais com rimas, enche a paciência. Não queria escrever sobre ontem, por isso não vou, nem sobre amanha que não existe, o negocio é agora enquanto teclo cada uma dessas palavras, mas também não queria escrever sobre estar escrevendo, tem quem faça e fez melhor, a questão não é nem estética ou gramatical, literal ou artística, é de ser e não há nada no mundo que possibilite isso, ser é não ser, entende? Ficando filosófico acoisa perde o entusiasmo, cientifico fica muito certo, é melhor eu parar, não vou me

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atrever a filosofar, tem gente que ganha dinheiro pra fazer isso, faz todo processo para deixar a coisa ainda mais pedante, a ignorância é uma benção. Não queria escrever o que já escreveram, nem o que disseram, tudo tem de ser inédito, exclusivo, autentico, especial, veja só como são as coisas, esperar demais de algoé criar expectativa, e só o que vivemos fazendo é quebrá-las uma a uma, livro à livro, palavra após palavra, não é questão de agradar ninguém, mas forçosamente nãopodemos fazer algo sem que haja objetivo algum, mesmo que para si mesmo, você já estará dominado pelo sentimento social e altruísta, daqui a pouco estarás nas manifestações tacando pedra em pessoas armadas, um erro aceito que até fazem ser romântico, mas cada um, cada um, acabei escrevendo diversas coisas com a não

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vontade de escrever. E todas elas eu não me orgulho de ter escrito e nem queria ter feito isso, mas já que fiz, você lê, assim funciona as engrenagens do sistema, até a próxima, passe bem. Comunistas não passarão, alunos indisciplinados ficaram retidos e eu passo mal escrevendo essas idiotices, mas é até divertido. Antes de terminar uma má notícia e uma advertência: tudo só tende a piorar. Good luck, como dizem os que falam inglês, masisso não fará diferença alguma.

*

Se todas as vozes em minha cabeça se juntassem, seria uma multidão de eu repressores de mim mesmo, formariam um

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time inimigo de mim, todos em união contra a minha consciência, fariam um motim para dividir meu corpo, uma revolução psicológica e eu teria que me mutilar para dar para cada eu um pedaço que lhe pertenceria, assim eu seria, mas como não sou e as coisas continuam como estão, a rebelião esta apaziguada com água e comprimidos, café e cigarros, terapia e poesia. Não estou querendo meter o louco, e dizer que não estou metendo o louco, nãofará com que eu não esteja metendo o louco, preciso preencher esse livro com pensamentos circunstanciais de minha vidamonótona, tudo é passível de poesia, mesmo não sendo esse o caso, queria saberdistinguir poema de poesia e poesia de prosa, como não sei, escrevo asneiras, rabiscos, textos, o que importa batizar a coisa? Não quero ser pai, já escrevi que um

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dia quis, hoje, nesse instante não quero, o tempo faz as coisas mudarem, ou as coisas mudam porque tudo é mutável, ou sei lá mais o que, poderia ser isso a introdução desse livro, mas como não quero ser previsível, vou deixar onde está, depois eu me viro, não preciso fazer sentido, como jádisseram, quem faz sentido é soldado. Presunção a minha escrever para um público? Achar que posso ter um? Escrevo para a multidão em mim, também. Não estou maluco, a normalidade é que é bem louca.

*

Me enebria teu embaraço

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Ato, por Anderson Rodrigues

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Ser lido é ser responsável pelo o que esta escrito.

*

Acordei antes do despertador, o despertador era meu pai, voltei a dormir e levantei uma hora depois, tudo dentro do horário. Fiquei esperando a carona tomando um café depois de ter tomado os remédios, antidepressivos para ser minucioso, três deles, umas setenta e cinco gramas de pura felicidade comprimida, ou algo perto disso, quando não é apatia, eu

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vivo confundindo os sentimentos, mas os sinto extremamente, mesmo que isso seja contraditório, meu problema é não saber equilibrar as coisas, achar o tal do meio termo, já que o clitóris dela, ela não me deixa procurar, então eu passo meu tempo ponderando essas coisas todas, difícil não pensar nela, minha intenção nem era mencioná-la, mas de qualquer forma, tudo acaba me levando ao seu encontro, toda finalidade, é o destino, sou servo dos meus princípios e tudo esta designado, sentença essa que faço por não ter mais o que fazer, escrever é um prazer que uso para fins de me aproveitar da arte, não sei o que isso faz de mim, já li muitos escritores crucificando escritores por causa dessa, como dizem eles, falta de caráter, nem sei se é realmente isso, mas enfim, uso e tenhousado, não posso voltar atrás, estou usando

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agora, o meu sentimento é de tristeza por minha imaginação ser tão tacanha a pouco de eu precisar usar desse artifício, como não sou nenhum profissional e não tenho aspirações muito grandes (as vezes, na verdade acho que sou um grande escritor, quando não quero me matar e tudo), pronunciar o que me faz ser esse mau caráter que muitos pensam, mesmo que seja só minha mente: foda-se.Eu estava indo trabalhar, não faço isso commuita frequência, normalmente trabalho para adquirir alguma regalia inútil que me dará prazer momentâneo, mas o que diabosnão é assim, me diga? Dessa vez eu precisava quitar uma mensalidade, já tinha pedido emprestado, mas sabe como é, né? Então fui eu dignamente, como todos gostam de ver, lutar para conquistar, não, claro que não, não tive que brigar com

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ninguém, pelo menos não dessa vez, eu usei esse negócio gramatical que deixa as coisas serem o que não são, artifício que uso quase sempre, acho divertido, inclusivefalar sobre o que acabei de fazer, é tudo a mesma joça, tudo o mais do mesmo, dizemque é estilo, eu acho que é só para se ganhar umas linhas e manter o entretenimento, enfim, rejuntei as paredes e o chão e não terminei, porque era serviço pra mais de dias, pra mais de gente, o fato é que fiz minha parte, conheci uma pessoa maravilhosa que nos recebeu com uma hospitalidade fora do comum, era a dona da residencia, a patroa e seus filhos animais, não, não é que os filhos dela sejam depravados ou loucos, são animais mesmo, tipo cachorros e gatos, sabe como é? Fim de semana voltarei para lá, terminaro inacabado, ou pelo menos tentar. E eu

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fico impressionado com as coisas, essa tal de sincronicidade e tudo, coisa doida, um pé de pimenta chamado pimenta-de-bode e bode ser eu, olha que bonito, não é maravilhoso? O tempo todo maquinando o que levaria para a terapia, era um exercício, literalmente. Mas vivi, vivi aqueles momentos sem tanta ansiedade, fazendo o que tinha que fazer com um pouco de ansiedade, afinal de contas, faço tratamento pra isso, hoje eu acho que tenhotranstorno de ansiedade, ontem eu queria ser esquizofrênico, mas agora me diagnostico como maníaco. É um passo enorme, já que teve dias que acreditei ser psicopata, para ver como evoluímos com o tempo. Vou chamar esse escrito de “Meio Bukowskiano”, você lembra aquilo do clitóris? Então, queria ver a reação dela, gostei muito, foge um pouco do que

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costumo fazer e isso é bom, o novo desperta entusiasmo. Longe de mim quererdar uma de crítico, ainda mais de mim mesmo, que é a pior espécie que existe, mas as linhas estão fluindo e me pergunto agora como ela estará lendo isso, artifício que não me trará benefícios, tenho que dizer, tudo é tão difícil, senão impossível, me contenta que tenha lido isso.

*

O desespero não tem razões.

*

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O velho sabe meu nome e eu que esqueci odele, passo por sua casa quando vou ao mercado, sempre me cumprimenta, eu profiro algo ininteligível, tipo “Boa tarde senhor Dércio” com enfase no “senhor” e uma entonação acentuada no “Dér” depois cilo, silvo, ou civo, sei que seu nome começa com “D”, minha memória não esta tão decadente assim, porque ele responde, talvez seja só por educação, mas parece que há um entendimento mútuo e assim a vida vai seguindo, ando a ladeira até o supermercado, compro o que tenho que comprar e na volta, se ele estiver lá ainda, acenamos um para o outro.

*

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Ansiada véspera, ânsia voluptuosa, a ansiedade sacia a vontade, momentaneamente, enquanto o destino nãose faz. Saudade tenho sentido, satisfaz-me por ora, lembrar-me, quando esta na hora e é preciso agir, eu estou, com todo sentido ecom todo sentimento, vivo o derradeiro e tudo é tão verdadeiro, visto-me teoricamente bem, de um jeito fora do comum, os pobres tem esse costume, o queesta fora do cotidiano é preciso valorizar, por mais que entre na rotina depois, ainda assim é uma novidade e é preciso estar pronto sempre, enquanto escrevo o universo dará um jeito de desmarcar o encontro, no ultimo momento ela vai ligar e me dizer que aquele dia não poderia ser, porque teria uma reunião, bem na hora da sessão. Só que dessa vez isso não vai acontecer, porque eu escrevi que iria e

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como escrevi que fosse, não será. Um mistério caí sobre nós e cada vez mais é difícil precisar como, quando e por que, um caminho sem volta eu peguei, tentei umatalho, mas não encontrei, agora estou perdido e pra qualquer direção que for é a direção contrária, mesmo que não possa voltar. Assim materializo o sentido, transponho meu coração em linhas e palavras, escrevo enquanto não esqueço, escrevo quando o peso fica demasiado, escrevo na véspera, a noite ainda resta, o dia vai nascer pra todos nós, mais um dia, menos outro, na matemática da vida procuramos dividir o amor para somar felicidade e multiplicar alegrias, fazendo isso tudo sem esquecer de subtrair os malefícios à zero. Zelo por minha vida nesse momento, me matando aos poucos com cigarro, ou simplesmente por estar

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vivo, viver tem sido pra mim um privilégio, devo aos meus pais tudo, sou grato e quero fazer alguma coisa mais.

*

Me deparo com a falta de adjetivo para interpretar o que sinto e fico pasmo, inutilidade é pouco, superficialidade é quase sinônimo, o fato é que as coisas parecem mais degradantes, mais decadentes e piores depois de acordar cedo, escovar os dentes, tomar o café amanhecido, pegar o trânsito, fazer as coisas que se tem de fazer no trabalho e voltar a pegar o trânsito, ser recepcionado com um café na hora, acessar as redes cibernéticas sociais, fumar, então escrever.

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Não é nada do que foi, comparado ao que é, queria ser o que não sou, enquanto sou o que estou sendo. É deprimente estar vivendo sem ter outras vidas, não poder estar em mais lugares ao mesmo tempo, sem condições para isso e aquilo, é um desperdício. E a vida se esvaindo, a cada instante, a sensação de não estar vivendo.

*

Eu quero te corromper, eu sou corrupto, não faço parte desse sistema, eu o quero abaixo, vou te dizer, os desajustados estão se tratando com você, e você quer-nos na sociedade, vamos derrubar o Estado, nesse estado calamitoso, o herói dos vilões esta do nosso lado, ele é um palhaço

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metamorfoseado, já foi Bakunin, agora estano espelho, esperando o momento certo, olhe pra si mesmo, estabeleça o eterno, estas em suas mãos e a revolução nunca esteve tão perto.

*

Repugnância, encontrei o adjetivo que interpreta o que sinto quando vejo a desoladora realidade que criam, que vivem,que alimentam, que cultuam, entre sinônimos e sinônimos e palavras e ideias parecidas. Repulsa por pessoas, tristeza de ser uma, prazer em constatar, ódio pela filosofia, maldigo a sociedade.

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Felicidade é um conjunto de alegrias que se desvanece ao constato do óbvio.

*

Só queremos saúde para arruiná-la.

*

O ato começou há algumas páginas e não sabemos onde isso vai nos levar, o estou escrevendo de olhos fechados, vendo as palavras no escuro, nas profundezas do pensamento, surgido do inconsciente, uma

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guerra pacífica entre o cérebro e o coração,o sentimento e o pensamento, não chegarei a lugar nenhum, ninguém nunca chegou em qualquer que fosse o lugar, a Terra há de cobrir-nos de vermes que nos consumiráaté a putrefação se encerrar e sermos mais que somente nada, os humanos criaram essas coisas para o passatempo da vida, tudo é tão inútil e não há nada que não seja, se cairmos no abismo do niilismo podemos ver debaixo a grandeza de todas as coisas, mas há de acessar o fim do poço,só de lá se pode mensurar alguma coisa, euquase estive lá, por pouco não seria um habitante do submundo, e não consigo discernir moralmente o não fato, acontece que é de tamanha pequenez ver o mundo como à um verme, ou ameba, já disse que somos menos que isso e repito, a grandiosidade é ilusória, a humanidade

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entrará em extinção e o nada tomará tudo por completo, isso sendo otimista, querendo ser esperançoso, a verdade é que não sou ninguém, por que escrevo? Porque não tenho o que fazer, e penso, penso e penso, passarei a vida pensando e só e sempre chegarei a nada, como todos, tem os que criam algo, mas tudo se perde, eu criei uma não-cria para passar-me por algo e enquanto alimentarem minhas loucuras, continuarei fazendo, assim segue, assim é. O ato é falho, o ato é legítimo, o ato é circunstancial, o ato humano de um teatro de páginas, veja como esta o cenário, decorado de realidade, dor e sofrimento, morte, o tempo esta passando e não para, não espera, é. Um país tropical à espera do carnaval, sol e muita loucura, temos que aproveitar o momento, tentei decorar com um estilo glacial, mas pela janela o calor

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aquece sem tréguas, esta ficando insuportável pensar, suo pelos poros, sou pobre, somos todos sós, soo à predileção, sumariamente e solidificado sem solução, sem mais, seremos só serenos sociopatas. O ato vale mais que mil palavras e esse ato com mais de mil palavras vale menos do que se paga, o valor é relativo e nossa relação termina a cada palavra proferida, eu não sei onde vou chegar senão no cemitério, na sua mente, nesse instante e depois? Serei sócio de sociedades sociopatas, sozinho, esse é o s, demorei um tempo para poder escrevê-lo e a professora ria do meu lamento por não conseguir, s. Desenhar uma palavra é escrever uma pintura, pintar um texto é desenhar um livro, publicar olivro é um ato, o ato é uma peça de teatro, o teatro é música encenado em atos nos olhos dequem vê e esse livro é literatura como cura de minha doce loucura momentânea transcrita em

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Ato, por Anderson Rodrigues

páginas, atenção, estou atento, o intento é deixar o lamento em linhas, leia, leia, leia...

*

Filosofia é areia movediça.

*

A cada nova doença a promessa de tratamento, mas não a cura. Saio das terapias renovado, pronto para poder voltarna semana seguinte, depois e nos próximosanos, enquanto houver vida. A consistênciado que se produz não é palpável e demasiado abstrato, não há de

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quantificação, a qualidade do atendimento se reproduz em transferência e da transferência se produz essas palavras, o ato. O ato é um livro que cabe no bolso, sendo feito numa dimensão em que o pensamento está, o tempo é relativo, veja por você mesmo, o agora que foi e não é, oato é um tiro no escuro.

*

Conheci uma prostituta na ultima vez que acampei, surgira do nada, assim como nos filmes pornôs, a vida nunca me tinha sido tão surpreendente quanto aquele dia, por isso acho que minha cota já foi batida e seja esta a razão de tudo desde então não haver boas novas, não quero ser prolixo, o

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que interessa é que depois de termo-nos aquecido naquela noite de inverno, mantemos o contato, eu estava profundamente carente, jazia uns dois anossem ninguém, queria ver como aquilo acabaria, trocamos telefone, nos adicionamos nas redes sociais, e ela se apegou a mim, nossas ideias eram totalmente contrárias, era engraçado, nada excepcional como podemos ver, nem dignode estar sendo relatado neste ato, fora o diaem que nos vimos pela ultima vez, ela morava com um parente que tinha lhe deixado o aluguel por pagar e se mandado fora, uns gatos e nenhum móvel, estávamosno colchão trocando carícias, não tínhamosfeito nada até então, mesmo naquela noite fria de inverno no acampamento, como havia dito, só tínhamos nos aquecido, eu queria provar alguma coisa que não sabia

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bem o que era, hoje já não lembro, estávamos indo bem, tinha levado um cartão de memória e pedi para que ela o pusesse no seu celular afim de ouvirmos uma canção para a coisa ficar mais bonita eela não achar que estava trabalhando, tínhamos comprado um litro de vinho, os remédios desceram com ele, e a coisa começou a ficar boa, até que começou a tocar Beethoven, Sonata ao Luar, ela perguntou o que era aquilo, não conseguia parar de ouvir, e foi ficando triste, de repente, nus, estávamos nós, paramos para contemplar, ela pôs a cabeça em meu peito e começou a chorar, dormimos assim, acordei e ela já não estava ao meu lado, levou os gatos e deixou um bilhete sob minha carteira, não precisei ler, sabia de cor o que estava escrito, é o que as

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mulheres sempre me dizem quando começo a amá-las. Estava escrito adeus.

*

Realizo meu sonho todos os dias, o de ser quem sou.

*

Cada vez mais feio, gordo e pouco a poucomorto, perto da eminencia, os traços velhos, a barriga cresce, só resta a resignação, se tiver dignidade. Estética, ética, técnica. Estética desfavorecida, ética duvidosa, técnicas que não tenho. Essa

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queda parece longa, caio de braços abertos,o fim não termina. Lágrimas secaram no rosto pálido de ansiedade, o trem próximo, a próxima estação, a escada rolante, o bilhete comprado antes da volta, as semanas passam formando anos, e minha hora se aproximando, vivo pensando que vou morrer, que qualquer coisa irá me matar, eu sou covarde, tenho medo, já quis ser herói

*

Meus sonhos tem mais arte que o museu doLouvre.

*

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O palhaço triste me disse que não existe felicidade, o palhaço que sou ri de mim poracreditar que é possível acreditar no inexistente, senhoras e senhores, o ato é falho, portanto esta fadado a ser o que não foi, esse livro não é o que parece, é o que não parece, circo e teatro, textos cinematográficos, palavras desenhadas, pintura musicalizada, são neurônios kamikazes, origami de frases, certadamentefalho, o ato é inato, eu mesmo faço, do yourself, o baluarte, é também commedia dell’arte e abstrações espaciais, especificações especiais de excessos sensoriais do inconsciente da mente doentede um escritor ex-esquizofrênico diagnosticado com o não-diagnóstico de um método moderno psiquiátrico e psicológico de uma equipe solidária no

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manicômio da rua Itararé, CAPS Adulto Sé, desce na Consolação e anda a pé, ou plantando bananeira, até a Frei Caneca, toma-se um café, fuma-se cigarros, consome-se remédios e atrás do Shopping, um alto prédio, toda semana, estarei te esperando aqui mesmo, nestas páginas, esse é o nosso tratamento, e eu o trato com todo tato, esse é o Ato, por Anderson Rodrigues, escrito ali em cima, na primeirapágina, na capa, em todo maldito lugar, espero que não se esqueça, e que não enlouqueça, ter problemas de cabeça, é a matemática obsoleta fazendo parecer tudo isso que não é. All Right? Ou não All Right? Tá parei. Proximamente pretendo decepcioná-lo ainda mais, até lá...

*

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Livros livra-nos da ignorância, ignorância pode ser uma benção, conhecimento é poder, o poder tem de ser destruído. Um pouco de cada coisa, equilíbrio e estar-se bem, nada realmente importa, tudo é inútil,ou não.

*

Eu vou lá compro dois quilos de sal, era um favor, a dona reclamou, fiquei com issona cabeça, que direito tem alguém de reclamar sobre um favor? Ela queria um quilo, eu trouxe dois. Dois é melhor que um. Tudo bem, sigo minha vida, uso redes cibernéticas e me vem publicidades de sal,

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do concorrente, droga, estão me perseguindo? A doutora disse que não sou esquizofrênico, o diagnostico que colocariatudo nos devidos lugares, mas não, os rótulos são só para produtos, como esse sal, um renomado psicanalista diria se tratar de sincronicidade, o que o universo estaria tramando? Me quer paranoico, para entender que o universo é todo grande e tudo? Toda sua vastidão enorme, ó universo, você é foda, e agora? O que eu ganho? Nada. Será que o FBI está atrás de mim pelos downloads efetuados? Eu uso torrent e tudo, tenho conta em sites, conta gratuitas, é claro, vou perder meu tempo delirando sobre o que universo quer comigo, só vejo o fato de que agi erroneamente e assim meu inconsciente fica dando facadas em minha consciência, quando que minha intenção era a melhor

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possível, e o inferno esta cheio delas, é o que dizem por aí.

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Sofrer para valorizar.

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Minha doença é ser humano.

*

ElaMetade poema.

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Outra metade poesia.Inteiramente arte.

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As relações humanas não prestam nem para ficção. De uns tempo para cá venho escrito mais sobre mim mesmo, dizem que não tem como não escrever autobiograficamente, ou como eu mesmo escrevi em Diário Insone “Não tem como onarrador não ser personagem, quem escreve sua história?”. Não vou ficar em cima do muro, nem levantar bandeira, existem ciências não autorizadas que podem esclarecer isso melhor, a imaginação pode adentrar em dimensões que não conhecemos. Ceticismo é

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malandro. Existem vias de mão única, duplas e assim por diante. A escolha é quem faz você, ninguém faz escolha nenhuma. Essa minha vida de escritor, pseudo, ou aspirante, faz-me escrever, e para isso, é preciso ou recomendável, que aja experiencias (logo a coisa passará a ser autobiográfica, mas não vamos discutir isso outra vez), o fato é que preciso de material para escrever e as pessoas são um ótimo exercício, o que contraria o começo desse tópico, as relações humanas não servem para nada, eu escrevi, e agora estoume contradizendo, acontece, sobretudo nessa fase da vida onde nenhuma certeza me fez crer em nada. Queria parecer sociopata, e não sei o por que disso, tantas coisas boas para se ser, como astronauta, fora de questão, açougueiro, cortar carnes de animais mortos, é viável, desde que não

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seja de domingo à domingo, se eu continuar com isso a coisa se tornará ainda mais degradante para os politicamente corretos, psiquiatras e psicólogos e o pior, à vossa senhoria que estais a ler, não estou me confessando, nem nada do tipo, estou aceitando a mim mesmo como realmente sou, intimo demais, escrever para si mesmoé demasiado egocêntrico, mas acontece quesou meu melhor leitor, apesar de dar-me um profundo mal-estar ao fazer isso, por isso volto ao início, o ato. Está acontecendo nesse momento e é tão isento de adjetivo, só sei sentir, e sinto muito se isso esteja ruim para você, mas não farei o que venho tentando em minha vida particular fazer com qualquer infeliz, agradar. Erro? Caminhamos nisso, a humanidade em si é o próprio erro. Veja o mundo como está, veja só onde cheguei,

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onde sempre me perco, na contradição e redundamento. É o ato.

*

Perdido em horas inúteis, a vida passa e não é nada, devia estar dormindo, pelo menos os sonhos daria uma perspectiva diante ao marasmo da realidade

*

As palavras ecoam no abismo da mente, memórias e lembranças no inconsciente, o discernimento do pensamento confunde-se à ideias e os desejos funde-se à intuições em dimensões diferentes, concilio o

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Ato, por Anderson Rodrigues

presente como ausente, a junção dos tempos reincidem em momentos dentre a eternidade e o efêmero, se eu perder a razão e a loucura ditar a direção, vou enlouquecer ou estarei pleno de emoção?

*

Meu bem, estou sozinhonesse feriado de finadosparece até que eu é que estou mortovendo as horas passareminerte na saudade absortome envolvo na solidãoe eu morromorro de estar vivendocontinuo obtuso te querendosabendo que não posso

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que o destino não permiteque existem leis e códigostudo contra o que sintomesmo assim sinto tanto, tanto desejode estar contigo, sozinho, mas com vocête ligar quando chegasse em algum lugarem casa, ou na estaçãosó pela obrigaçãoqueria dar-te minha liberdadee ficar preso no seu coraçãoe aí nós brigaríamosquando eu quisesse ficar sozinhomas sempre haveria reconciliação no melhor jeito possívelcomigo na cama, você nua ou de pijamavestida e se despindoveria teu sorrisoé só poderia amar tudo aquilomas hoje o feriado do dias dos mortosme lembra que assim um dia estarei

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Ato, por Anderson Rodrigues

foi-se o tempo em que me contentava com o fato de que ameihoje eu quero o ápice e o apogeumas só quero o que tu quiserem dobrome descubro sem rumosabendo que tudo é tão somente nadaque nunca terei-te como o que quer que seja

*

em estado de decomposição vou compondoesta ação, o ato. Deixo meus pedaços para compor estes versos, redijo regojizando espasmódicas linhas vindas do meu interiorpara a tela desse computador, há dor, por toda esfera, a dor do amor não

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correspondido, é costumeiro, inevitável e aceitável, convivo com isso desde que estou vivo, não sei ser amado, amar parece mais fácil, é simples se apaixonar, basta teralgo em comum, ou algo incomum que até seja engraçado, como o fato do sexo oposto, a diferença estabelece vínculos, o circo pega fogo, a paixão chamusca os pares e é tudo tão lindo, mas há dor, a dor do amor não correspondido, aí meu bom, o caso é que estais fodido, mal visto, maldito, condenado à solidão perpétua, preso em si mesmo e no mundinho próprio,as alucinações consolam de vez em quando, mas é uma doença que corrói aos poucos, toma-se remédios, faz-se terapia, compra novos ternos, livros de romances de histórias de amores impossíveis, escreve-se cartas e não remete, suspira-se acada entoada de cantoria, vive-se a própria

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poesia, escreve-se até não mais poder, enlouquece-se de querer, mas caríssimo, não haverá retorno, tudo será inútil, viverásesquecido até ser encontrado quando morto, do que adiantará? E se assim nem for? Não fará diferença de qualquer forma. O estado podrido, as fisiologias degradantes, o fedor, as entranhas, os buracos, ser humano é definitivamente definhar para o pior, encontrar alguém parasofrer junto é romântico, vende-se isso através dos tempos nas artes, talvez assim se reduza o sofrimento, outros porém veriam como duplicar as responsabilidades, seja o que for, eu sou servo do amor e por tanto eu amo.

*

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Ato, por Anderson Rodrigues

O amanhecer de primaveradrogasão quase meio-diaesta nubladochuviscando intermitentementemas os ipês estão floridoso amarelo do sol que não saiu essa manhão dia promete filmes que não vereimas que é o ideal farei o possívelsempre faço o que possomas nem sempre é o bastanteo aquém tem desdém por quem lhe quermerdala vou eu falar de amore de pessoas que não me amamé sempre a mesma historia mas dessa vez não é sábadohoje é o meio da semana

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Ato, por Anderson Rodrigues

quase ao meio-diaestou completamente pela metadetentando fazer com que ela preencha o restanteo que não consigoacaba comigolentamentediante tudo issoo pequeno instanteem que me vejo diante dissoangustiosamenteas vezes até deliranteo bom é que chove momentaneamenteparece que limpa todo o cinza da mentee o paraíso parece mais lindoaqui eu vivocada dia como se fosse o ultimodeixando pra depois o que podia ser feito no agoraeu me contradigo

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não tenho o que fazerrabiscona primaverameio sorrisoainda há chuviscoas lágrimas do céunão posso chorarmas a chuva molha meu rosto.

*

Só a morte pode me derrubar!Ou um câncer, um carro, um brutamontes.Merda.Queria ser positivista com o fato de ter uma obra rejeitada.Mas o máximo que consigo é usar isso parame degradar publicamente. Tem gente em

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mim que me odeia. Somos nossos piores inimigos.

*

chega um momento do dia em que eu preciso ouvir determinadas músicas ou a coisa não acontece mais, são as mesmas musicas, nunca deixei de ouvi-las, suponhoque um buraco negro se formaria no atempo e me sugaria para não sei onde, então eu tomo as devidas precauções.

*

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As ansiedades vem carcomido o tempo, quando o presente passa, não sobra o futuro, sobra nada, a estranha sensação de não viver, de estar-se inerte ao perene instante e é tão insolúvel. Há ânsia de estar,repugna-me a realidade e ao mesmo patamar à resignação de se estar pleno em si mesmo, a vida não poderia ser de toda uma dádiva, a morte intransigente aniquila e não sei mais se ela é ou não uma esperança, o medo nos assola, temer divindades como a eternidade é o que nos fizeram crer em lavagens cerebrais de nossa querida infância, quanto eu sofri semsaber e quanto sofro agora sabendo do que não sei. Angustia decorre no mais pleno emboçar de ideias, somo a descrença e tudo se subtrai, a fé perdida deixa o vazio infinito, nunca ei de conseguir preencher o que não se pode, há dor, ardor, ah, dor!

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Que dói, sangra, respinga, a dor de não ser amado pelo amor, oh crescente desesperança da vida, e não se poder fazer nada, só olhar, contemplar a desgraça, cadavez mais, menos tempo. Quero frisar esse frenesi de temperança, passei por cá e fiz o que pude, não quero me despedir antes da hora e sempre será tarde demais, deixo então com que as palavras soltas e livres façam da minha dor presa em mim, a liberdade de expressar os sentimentos confusos que afloram por dentro, queimando e corroendo meu ser em pedaços, perdi-me dentro de mim, quem quer que esteja escrevendo agora que fale, quem quer que seja, por fora da incerteza esconde-se o que é certo e nunca foi tão ruim fazer o que é bom, o mal e o bem se unem contra o que sou e os caminhos todosnão são senão percurso de direções opostas

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com o mesmo destino, chega disso, cansei, não chegarei a lugar algum, mesmo que nem ao menos tenha partido, só estou perdido e nada pode me mostrar o caminho.

*

Quando a chuva vem me dizero que você não quer falarouço no silencio a sabedoria da água

*

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Perguntei à uma puta de estrada se ela acreditava em amor à primeira vista, ela sorriu e me disse:

— Só em pagamento à vista, amor.

*

A insegurança deixa-se influenciar.

*

Me digas que tu fazes com tempo livre, e vos direi quem eres.

*

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O que seria de nós não fosse a arte? As mulheres, é claro.

*

Drogas ilícitas para sair da realidade e drogas prescritas para entrar.

*

Tem semanas que não parto um comprimido ao meio, e outras que carrego cimento.

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O deus abençoa com maldição, o diabo amaldiçoa com benção,

*

A idiotização cultural diz respeito a quem aconsome.

*

Viver é mais do que simplesmente estar vivo, é preciso sobreviver, lutar pela vida sabendo que é uma batalha perdida, é o

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combustível do sadismo, alimento para a maldade, e deus e o diabo disputam quem éo pior, o ser-humano não é diferente, senãoo bode expiatório, então o ser mais ordinário existente, todo ser é maldito, só há desgraça e eu estou sendo otimista.

*

Há tempo para pensar e tempo para agir, tempo para trabalhar e tempo para estar ocioso, tempos nublados e tempos ensolarados, tempo de dia, tempo de noite, há tempo para dizer e tempo para ouvir, tem tempo curto e tempo longo, tem a eternidade e o efêmero, tem quando rir e tempo de chorar, tem tempo... as vezes sobra, as vezes é curto, não se tem tempo

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para estar atrasado e há tempo para se adiantar, tempo de espera e de esperança, não tem tempo para intolerância, mas há para paciência, tempos de plantio e tempo de colheita, tempos descalço, tempos apertados, tempos de trânsito, temporariamente penoso, tensionalmente tempestuoso, tempo de olhar estrelas, tempo de ser estrela, tempo para miséria, fracasso e sofrimento, esse é o tempo de aprendizado, tempo para ensinar se quiser, tempo da mulher, já se foi o tempo dos homens, tempo de brincar, tempo para brigar, tempo... tem possibilidades, tem poder que deve ser destruído, tem porra nos ovários, tempo que encontram, tempo que se perde, há tempo. E nesse tempo todo ainda não houve o tempo em que não me fizesse pensar nela, no tempo que ela foi menina, nesse tempo de agora, essa

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mulher temperamental que me faz terapia, tempo pra isso, mas não há tempo além disso.

*

Começar uma página nova, depois de pulara metade de outra.É um desperdício ou uma sobra de espaço, antes isso do que papel, a página cibernética não se importa e não tem ongs que a defendem, não estou tomando partido, o fato é que não há nada do que não seja obvio, quando escrito assim se torna, então tudo é senão inútil, eu sei o que realmente presta, o cigarro que fumo e que me mata, presta nesse instante para mematar, e claro, como companhia, exemplo

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miserável, mas foi a primeira coisa que veio a mente, mentira, eu tinha pensado num beijo, mas eu não tenho ninguém e não queria trazer para esse lado esse relato,como sempre faço, escrevo sobre os sentimentos e pela veneração da mulher, homem não tem o que fazer mesmo, achamos que a vida bem poderia ser um filme pornô, para muitos até é, mas para ossolitários como eu, o cigarro vive na boca, ao invés de uma boceta suculenta de uma mulher atraente, porque eu sou profundamente superficial e encontro cada vez mais motivos para ser sozinho, até minha solidão é uma fraude, vivo cercado de pessoas, não dá para estar realmente só na civilidade, ainda que estejas morando só, tem os vizinhos e o entregador de pizza.Mas tem quem compete miserabilidade, outro motivo para ser sozinho, cada vez

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mais e completamente quando morrer, o suprassumo da solidão, ou não... quem se importa?

*

Se ajuda por reconhecimento, só quer ajudar a si mesmo.

*

Passou-se cinco minutos até eu escrever isso, quantos litros de chuva caiu nesse tempo eu não consigo mensurar, é uma chuva calma e densa, fina e pretensa, que faz gorjeio no presente, sua musica entoa

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no vazio imenso do mundo, esse bairro no planeta esta sendo encharcado de água lenta, lavando as ruas e calçadas, molhandoos telhados e os cachorros vadios, sentam debaixo dos toldos de oficinas fechadas, esperam a chuva como a fome passar, tem aqueles que ficam perto dos carrinhos de churrasco, quem sabe uma alma tenha compaixão, quem sabe jogam mais do que só o espeto no chão, e se tiver algum pedaço nele também é lucro, loucos e sãos,beberrões e crentes, para eles todos são iguais, para eu que vejo daqui, a diferença é indiferente pra mim. Penso meio que como um cão, uivo se for necessário, tudo para não ser humano, vejo que não vai render nada dessa vez, queria escrever o ode ao ostracismo, me deixei levar pela chuva, é impossível não mencioná-la, quando que és tão passível de ser escrita, e

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vista e admirada, tornando essa tarde um pouco mais decente, penso no que é preciso para escrever, toda e qualquer coisaé descritível, até mesmo o impossível, por exemplo: eu e ela. Ela a mulher. Não vou usar nome, para poder usar com a próxima.Impossível dada a situação a qual me escraviza, vide, ética, querencia e liberdade, tudo contra mim, já esta bom? Podemos falar de algo diferente? Consegui expor o impossível? Acho que só é claro para mim mesmo, mas vou tentar de outra maneira, só que agora, não vou me importar com nada, vou gritar.Não pôde ouvir daí, não é mesmo? Porque não importa a entonação, o fato é que é inútil escrever, e eu quero produzir, mas não sei para quê. A dor no papel é estética da literatura, farão reuniões para decidir se faz parte de um determinado lugar, se não

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fizer de nenhum, cria-se-á um novo, mas só se pagar, se for cidadão respeitável e tiver uma vida interessante, as vezes eu quero morrer com glória, a glória de ir dormir e no outro dia não acordar, é meu maior medo e minha maior vontade, minhaúnica ambição, já quis viver um amor impossível, mas não me aceitaram em Hollywood, eu quero viver o que tiver que viver, até a minha morte, fazendo todo necessário para sair do habitual, eu não quero ser normal, quero a extinção da humanidade, mais ou menos desse jeito começaria o ode ao ostracismo, ódio à humanidade, oh! Sociedade... assim por diante, teria ócio e ópio para rimar e tudo, mas não vou escrever mais isso porque é o ápice do ostracismo algo que nunca será lido. Mas esta escrito em cada olhar de caipiras do interior, dê uma passada lá para

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ver, eu não posso escrever, eles me matariam.Não sei quanto tempo passou, mas a chuva se foi, não sei quando é mais triste. Os cachorros irão sobreviver até o dia de suas mortes. Desculpe.

*

O extremo da alucinação, achar que na realidade estão todos fingindo, que na verdade tudo isso é um teste para avaliar asescolhas e se errar perde-se tudo. Tudo esta perdido, desde que começou, a mente se diverte maquiavelicamente sem saber que ela também sou eu, ou sabe e nãose importa, o negocio é tacar fogo no circo e assistir de camarote. Mente maldita.

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Ato, por Anderson Rodrigues

*

Minha tristeza é sua felicidade, durma feliz, estou profundamente triste.Sua felicidade é minha alegria, então eu estou em melancolia.Esse é o status dessa noite, senhoras e senhores, façam disso o que quiserem, se é que dê pra fazer alguma coisa, não serve nem para limpar a bunda.

*

Todo mundo se cala perante a madrugada, o silencio predomina, o café esfria e eu estou insone, uma informação veio à tona, ela vai se casar, eu deveria estar feliz

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porque sou incapaz de fazer alguém feliz e alguém à fará feliz, mas não consegui dormir. Nunca tive nenhuma chance, é verdade, só que agora esta mais impossíveldo antes, engraçado né? Não, vou contar algo mais divertido: um amigo meu se apaixonou pela terapeuta, ele faz tratamento também, olha só que coincidência, e ela nunca deu chances a ele, não necessariamente na realidade, porque em seus delírios o amor rolava solto, um belo dia ela apareceu com um anel no dedo da mão direita, não sei o nome do dedo, só sei que é aqueles que se põe anéis de noivado, então, aí o nosso querido herói passou a crer que eles fossemcasar, olha só que beleza, que ela tinha comprado o próprio anel e posto no própriodedo para mostrar aos interessados que os dois fariam o acordo de monogamia eterna

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enquanto dura, contrato assinado e catalogado e abençoado pela igreja e pelo Estado e tudo mais, ele e ela, pode uma coisa dessas? Pois é, não é lá diversão que você encontra no stand up, mas é bem hilária, eu mesmo estou rindo litros, Ha... Ha... Ha...

Senhoras e senhores, esse livro será completado essa madrugada abençoada pelos deuses que nos deu essa chance maravilhosa. Não perca mais nenhuma linha, fique por aí, mas agora um recado denossos patrocinadores:

Pague para escrever, pague para publicar, pague para ser lido, seja escritor, você pode!

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Voltamos agora com a programação normal.Não votamos em nenhum boçal.Quero mingau, quero mingau.

Eu penso que as pessoas tem olhos de pinico, porque é tanta merda que elas veem.

Veja só:

Marmota dois, marmota dois. Câmbio na escuta? Ou na lida?

Leia só:

A Meleca Viva, por Afrânio Gonçalves.

Estava eu no esplendor da tarde sem fazer absolutamente nada, quando me dei conta

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Ato, por Anderson Rodrigues

que precisava limpar o nariz, não sei exatamente como isso ocorre, parece que é meio instintivo, toda bactéria alojada fazem festa no salão, então precisava limpá-lo. Assim foi que se deu o maior erro da minha vida. Como trabalho numa usina nuclear e bem naquela manhã tinha esquecido de usar as luvas, ficou então impregnado em minha mãos dejetos nucleares, eu deveria ter começado assim esse relato, mas só foi agora que lembrei, mais atualizações conforme informações. Aí já viu né, dejetos nucleares com dejetos de nariz, virou uma meleca viva! Que tomou conta da minha mão, e foi crescendoaté o braço, agora estou ditando esse relato enquanto os doutores tentam conter a forçamaligna do excremento, daqui posso ver gente dos jornais e da TV se amontoando lá fora para dar uma espiada nessa

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condição maldita em que estou, o exército foi acionado, os cientistas estão abismados e eu estou para morrer.Fim.

Ficou bom essa merda? De nada, foi um prazer imenso.

Agora no ato veremos coisas mais significativas, como o fato do amor mal amado do nosso querido autor. Ele escreve em depoimento:

É assim a vida, um dia a gente perde, no outro a gente apanha, na outra semana a gente bebe, no fim do mês deixa de tomar remédios, quando vai ver esta internado no manicômio a anos.

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Ato, por Anderson Rodrigues

Agora chega dessa merda, vamos falar de coisas sérias:

Como é pra você aos trinta anos, nesse ano da publicação desse livro já terá trinta e um, ser um péssimo escritor morando com os pais e que não consegue nenhuma mulher?

Bom... não, é ruim. Ruim... é ruim caralho!

Até onde você pretende levar essa vida asquerosa?

Bom... Agora que sabemos que você

perdeu o que mais queria e isso não quer dizer que um dia teve, o que fará com sua vida asquerosa?

Bom... Você é realmente um...

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Deixa eu falar mano, oxi. É péssimo, nem bom, nem ruim, é péssima a situação atual do momento de agora desse instante derradeiro, primeiro, eu vou publicar esse livro e ficar rico, segundo, ela vai ler e se comover e cancelar o casamento e terceiro seremos felizes para todo o sempre.

Você acha que ela vai te convidar para o casamento?

Sinceramente, acho que não vai, primeiro que quando o padre falar se tem alguém contra, já viu né. Segundo que ela me trata, não pode né, ética, estética, elétrica, et cetera...

Por que você faz piada que não é engraçada? Além de péssimo escritor, é um péssimo palhaço...

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Bom... vou responder com um escrito de um cara anonimo da Itália, para que as pessoas que tenham ganhado esse livro, usufruam de algo útil:

“ Quando eu era jovem, eu pensava que com a arte seria possível mudar o mundo.

Eu buscava constantemente um espetáculo que pudesse despertar no coração do público uma esperança.

Eu queria mostrar uma maneira diferente de viver, com mais amizade, criatividade, sem a obrigação de perseguir o dinheiro e opoder. Ilusão fútil que eu nunca consegui alcançar. Não só a revolução não chegou, como as pessoas se tornaram cada vez maisloucas e materialistas.

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Quando eu me dei conta disto eu vivi momentos difíceis pensando, pensando inclusive que minha vida era um fracasso eque todo esforço era inútil.

Mas um dia eu tive uma revelação: se não se pode mudar o mundo, pelo menos é possível mudar a si mesmo, encontrar algo em seu coração, um desejo, uma necessidade e entregar-se totalmente a ele, sem olhar para trás. Isso não é para a sociedade ou para os outros, não, é para você mesmo.

E eu fazendo esse palhaço que eu sou, eu encontrei essa coisa. Provocar, burlar e fazer o público rir. Isso era tudo o que eu buscava em minha vida. Por certo eu não mudava o mundo, mas os palhaços nunca

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mudaram o mundo, passam o tempo tentando sem nunca conseguir, por isso sãopalhaços.

Os palhaços gostam do fracasso e das ações ineficazes, são perdedores alegres e isto é a verdadeira força que têm, nunca se cansam de perder. Desfrutam de cada fracasso e voltam em seguida a fracassar de novo, diluindo assim as certezas das pessoas sérias e que nunca duvidam.

Então, esse sangue que pareço ter na minhacabeça, esse sangue que tenho sobre a minha camisa, esse sangue que tenho no meu coração, esse sangue que está todo emmim é tão patético e inútil em seu simbolismo porque é sangue de um palhaço. Um sangue que não vem de uma grande luta ou em nome de uma causa

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heroica. É sangue de brincadeira, ao mesmo tempo verdadeiro e pouco importante.”

Não respondeu a pergunta. Foda-se. Desculpe.

Para continuar com a inutilidade, passemospara o próximo tópico, típico de quem tem complexo de inferioridade, tipo o que foi feito agora… desvalorizar a coisa toda, essa coisa é deprimente e já que estamos falando de coisas, um breve estudo sobre algumas coisas:

Uma coisa pra se ser coisa não precisa tanto, basta ser.

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Tem cada coisa pra alguma coisa, uma coisa precisa da outra, uma coisa não se fazsó, a coisa da galinha e o ovo por exemplo,o que veio primeiro nada mais foi do que a própria questão da coisa toda.

Tem coisa que não tem explicação mesmo,mas nem por isso deixa de existir, proferir alguma coisa já à faz ser coisa, coisa metafísica. A meta da coisa é tornar-se física e pra isso aquela coisa de ciência.

Certas coisas demoraram uma eternidade para serem inventadas.

Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa ou seja, uma é coisa, e outra também é coisa, mas uma é coisa que não outra e a outra é coisa que não uma, outra.

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Acumulação de coisas faz as coisas serem uma. Um ser. Que pode ser você.

A abstenção de certas coisas e de coisas certas é um paradoxo. Há que determinar ao que se é certo abdicar e ao que é errado ter. Assim não havendo coisa alguma a coisa vira nada, logo tudo ao que é, é nada.Tudo é nada e nada é tudo. Sem nada não há coisa e com tudo, milhares e bilhões de coisas, é uma coisa infinita.

Essa coisa de escrever sobre as coisas é meramente... outra das coisas que é uma e não a outra.

Há coisas que o coração sente, mas que os olhos não veem, essas coisas são sentimentos.

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Ato, por Anderson Rodrigues

Nos sentimentos tem coisas também, uma das coisas é aquela coisa esquisita que sentimos chamada paixão, é uma coisa boa de se viver, da sentido à vida se você não tiver nenhum. As vezes acaba se confundindo com outra coisa, misturando-se e formando outra coisa, amor, amor é uma coisa cheia de outras coisas, há paixãono amor como há ternura também, inúmeras coisas.

Todas as coisas juntas forma-se um universo, o universo é uma coisa, ou dois até, quantos universos existem? Tem coisa que a imaginação desconhece.

Tem coisas que não existem.

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Ato, por Anderson Rodrigues

As que existem já são tantas, imagine só ascoisas inexistentes, por pensá-las torna-as coisas, é uma coisa impressionante.

Há filmes de coisa, e coisa de filmes. O filme da coisa é A Coisa, coisa de filmes é aquilo que só acontece neles, finais felizes,coisas assassinas, super-heróis, essas coisas.

Terror é uma coisa que faz valorizar a vida

Não poderíamos abranger todas as coisas, faltaria palavras, páginas, espaço, intelecto.

Pensar sobre coisas é uma coisa filosófica, filosofia é uma coisa que ainda não se propuseram à denominá-la, podendo ser qualquer coisa, masturbação do pensamento por exemplo.

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Ato, por Anderson Rodrigues

Comédia seria outra coisa, sendo os filósofos a piada. Filósofos são coisas humanas propensos à criar abstrações da realidade denominando-as como lhes convém, em acordo com suasexperiencias pensantes e dados históricos de ideias, são em suma os detentores do que o sistema é composto. Alguns podem vir a não ser coniventes com o que esta vigente, esses entretanto, não são quantificados e tão pouco qualificados então não entram na estatística que é uma coisa cientifica para organizar coisas.

A ciência é uma coisa que prova a existência de coisas.

Essa coisa de falar sobre as coisas sem um aprofundamento acadêmico é visto como uma coisa leiga, logo, uma coisa não

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Ato, por Anderson Rodrigues

confiável entre os que mantêm as coisas como são, sociedade, Estado, pátrias, culturas e tudo mais.

O dicionário é uma coisa útil quando se quer saber o significado das coisas, e neles há diversos para uma coisa só, isso esta longe de ser um, portanto não me venham com apregoamentos morais.

Apregoamentos morais são coisas desagradáveis, a própria moral é uma coisaassim, sustenta-se com preconcebimentos sem prévio entendimento.

Entendimento é essa coisa que há entre nós, você ai, eu aqui, as palavras falando e tudo mais, isso é mágico, Stephen King diria ser telepatia.

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Ato, por Anderson Rodrigues

Telepatia é uma coisa doida que pode enlouquecer qualquer são.

São, são coisas sãs, de perfeito juízo.

Juízo é concebimento, que é uma coisa moral.

Moral é uma coisa que mantém as coisas como são.Dividisse em duas categorias, coisas certas e coisas erradas.Uma coisa que não sei qual é a graça de colocar graça nas coisas, a espirituosidade é uma coisa tipo retardamento mental, a comicidade é coisa parecida, imbecilidade.

A seriedade é uma coisa desonesta, sério mesmo.

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Ato, por Anderson Rodrigues

Coisa de outro mundo são coisas inexplicáveis que quatro dimensões não compreendem, fogem do comum e do normal.

Coisas normais são coisas habituantes.

Coisa chata é: “habituantes são coisas normais.”

Coisa sem graça é: coisa chata é: coisas normais são coisas habituantes, habituantessão coisas normais.

Coisa sem futuro é que morre no presente.

Presente é coisa que se ganha.

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Ato, por Anderson Rodrigues

As coisas podem designar o estado de pessoas, como quando perguntam “como vão as coisas?”.

Coisa sem sentido é uma coisa sem senso.

Senso é uma coisa sensitivo.

Sensitivo é uma coisa da parapsicologia.

Parapsicologia é uma coisa que estuda coisas extrassensoriais.

Extrassensoriais são coisas independentes do sentido.

Sentido é particípio passado.

Coisa designa algo.

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Ato, por Anderson Rodrigues

Algo é alguma coisa.

Alguma coisa pode ser uma doença.

Doença é uma coisa que não necessariamente mata, mas pode coisar.

*

Escrevi das três ás seis, mas não terminei olivro, seria uma estratégia de marketing que desisti, gosto das coisas verdadeiras, por isso não uso nenhum entorpecente paradeixá-lo mais comovente, uso Fluoxetina e Risperidona, nicotina e cafeína. O final já esta escrito, é uma merda. Esse livro é um

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Ato, por Anderson Rodrigues

protesto, por isso é assim. Não vou me desculpar dessa vez.

*

Passei a noite em claro com pensamentos obscuros, não cheguei a nenhuma conclusão, quando pensei que estava ganhando tempo, só vi ele partir, o perdendo por completo, agora que o dia nasceu, cresce em mim uma desesperança cósmica do tamanho do infinito, parece não haver fim o estado em que me encontro, perdido como nunca estive antes,o sofrimento se materializa, meu estômago faz digestão de si mesmo, a ânsia provoca convulsões, olheiras negras, fome de nada, é difícil manter-me em pé, o cérebro em

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Ato, por Anderson Rodrigues

estado catastrófico, o coração alarmante não sabe se bate ou se para, o sangue quer se jorrar para fora com medo de permanecer nesse corpo em decomposição,os cabelos caem e outros ficam grisalhos, minha boca gagueja o ininteligível, os dedos tremem, o braço formiga, as pernas cedem, o pé incha, as unhas apodrecem, os pelos encravam, os dentes trincam, zumbido no ouvido, vejo o dia escurecer asoito e quarenta e nove da manhã, o tempo passa, é quase a hora de ligar para emergência, mas ainda dá para respirar, ainda há vida que a morte não tirou, ainda respiro, vou vomitar, não quero socorro, quero estar morto, o desgosto me tomou, e o pior é que isso não tem fim.

*

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Ato, por Anderson Rodrigues

Erros nos faz quem somos.

*

O sorriso psicopático de quem partiu muitos corações me atraiu, pensei, pobre de mim.

*

Esperança escraviza.

*

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Ato, por Anderson Rodrigues

Infinito, vazio, estrelas, constelações, via láctea, sol, planetas, lua, os raios solares e estrelares à ilumina, na Terra, num hemisfério, continente e país, num Estado um município, então um bairro, nele uma rua, nessa rua uma casa, no fundos da casa tem uma janela aberta dando para noite, de lá se vê a lua-cheia clareando os pensamentos de um escritor, ele recebe a mescla de toda energia vinda dos confins do universo, surge uma ideia, escreve, o livro toma forma, em outras noites, e dentro dos dias, ele continuará recepcionando a metafísica dos sistemas solares e galáxias e constelações e dirá vir da lua, por ela ter uma atração natural que fornece para a Terra e então termina o livro, uma, duas, três vezes, o publica e pensa que poderia ter feito melhor.

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*

Amor é servidão livre e espontânea.

*

Ele disse que a amava, ela disse adeus.

*

O silencio é o melhor conselho.

*

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Ato, por Anderson Rodrigues

A melhor hora é o agora.

*

Pensamentos contrários numa noite de sábado, se eu escrevesse como fumo cigarros e se a quantidade ditasse a qualidade, não estaria escrevendo essas bobagens, mas sabe, o que sei da vida ainda é pouco pra dizer algo que preste, o erro é certo, então me acredite, não creia-me.

*

Viver é uma recorrência de conformações.

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Ato, por Anderson Rodrigues

*

Não se faz omelete sem quebrar alguns ovos - Disse o revolucionário, defensor dosdireitos dos ovos.

*

As crianças pequenas voltam chorando do sono porque é difícil aceitar essa realidade imbecil que os adultos criaram.

*

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Ato, por Anderson Rodrigues

she's a sick, she's a human shit

this is a poetry of love

*

Liberdade é o direito de ir contra direitos.

*

Procrastino, para não dizerem que não façonada.

*

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Ato, por Anderson Rodrigues

Tem de escrever muita merda para escreveralgo bom.

*

Sou poeta quando não escrevo, quando escrevo sou esquisito, o tempo todo talvez, mas você sabe como funciona os jogos de palavras não é mesmo?

*

Sucesso é para os fracos, fortes são os fracassados.

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Ato, por Anderson Rodrigues

*

No pesadelo eu acordava de um sonho, na realidade eu dormia de olhos abertos, em todas as dimensões havia dor, a dor do medo,a dor do amor, a dor de estar vivo. Cada instante da vida é dor, e há dor de pensar que morto não haverá dor, qual é o mérito de viver? De se estar vivo? Não queria que cessasse a vida, por mais doída, porque o delírio da esperança esta enraizado no inconsciente, e viver é basicamente esperar, ser paciente, pela boa vontade, pela bondade, pelo amor e aceitação alheia.Ser humano é ser escravo, como disse Fernando Pessoa, “Haja ou não deuses, deles somos servos.” Dependência

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Ato, por Anderson Rodrigues

absoluta, ninguém é nada sendo só. Portando sou sozinho.

*

O bem que ela me faz é indizívelo mal que eu mesmo me faço com o bem que ela me faz é incomensurávelas distinções das ilusões a fazem reais, masa realidade não as fazem acontecer, dentro do abstrato não existe certezas, fora de mim é o único jeito de dizer o que não falo,preciso desprender-me do meu eu para ser o que proclama, o que escreve não fala, o que fala não escreve. Há quantos eu em mim mesmo? Vamos lá, parar com clichê, é normal estar dentro de um estereotipo, eusou humano, é difícil me convencer disto,

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estou a mercê do que me fizeram e do que me fiz no decorrer de minha existência, a ciência ao menos presta para tentar explicar. Já que sou o que sou, não me resta mais nada, tento entender e se não sou claro, é porque sou moreno. Estou insatisfeito com a satisfação de mim mesmo, caminho entre erros e acertos, sendo errante num destino sem premeditação, o desígnio faz-se sozinho, como a mim, antropófago e ouroboros. O bobo em mim, faz-me rir, a melancolia triste sem fim é assim, começa e termina em mim. Se eu pudesse escrever com meu sangue este livro, talvez você entendesse tudo isso, não é questão de compreensão, esta além do entendimento, é a merda do sentimento que tenho por dentro, que essas palavras interpretem o sangramento, a poesia é hemorragia de sentimentos, e

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como doem, deus meu, como doem! Esse instante não é suficiente, é preciso mais, algo concreto e material, é a porra do livro,dessas páginas, de cada palavra, mas é tão insuficiente! Minha gente, gentilmente e humildemente me humilho à migalhas de carinho, e depois quando tenho, só quero estar sozinho, não se pode estar pleno de completude, tudo tem de ser pela metade? Equilíbrio maldito, é sabedoria que reina, antídoto da vida, cada cromossomo e cada célula de meu corpo gritam, “viva”, “viva”,“viva” mas meu deus, veja o tédio e a condição social, veja desigualdade, veja a meritocracia, e me diga, como posso viver equilibrando toda lástima de ser e não ser, a obrigação de ter e não ter, a vida é uma dádiva só á aqueles que não pensam, não sentem e não querem, à ignorância absoluta, à esperança absurda, a felicidade

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imunda, toda merda ilusória humana. Só é feliz quem se engana. Como queria me enganar com a mulher que fosse me dividira cama, e nesse momento ela partilha, a mim sobra a solidão, o desamor, a tristeza e a dor de amar e não ser quem ela ama.

*

É muita responsabilidade ser especial, por isso sou um mero depressivo, é bem comum e normal, tiro das costas a carga deser raro, ademais, depressão nem doença é.Na minha medíocre concepção, é claro. É um estágio de consciência, sem volta, que se adquire com conhecimento e experiencias, ou seja, vivendo, tá vendo

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como não passo da normalidade? É depressivo isso.

*

O ato começou e não quer parar, mesmo depois de escrito ele continuará sendo, até aqui nada exuberante, a forma que ele tomaé abissal, da minha mente para cá se necessitou de watts, toneladas e quilômetros de neurônios, mortos nesse momento, deram a vida para isso aqui, sim,causa perdida, és a vida.O ato de escrever deu-se quando era insuficiente falar, precisava-se registrar, a fala se perde, os escritos perduram.O ato marcado contra o aumento da passagem se dá a todo começo de ano,

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tradicionaliza-se, se me ver por lá, finja que não conhece, é melhor para todos nós.O ato de amar é altruísmo, negativizando toda sociopatia que eu finjo ter. Minha libido vai bem, obrigado. Prova disso é o que imagino fazendo no consultório, talvezo erro esteja ai, só imaginar, mas se parte para o ato, aí te internam, te prendem, te julgam, te ameaçam, te menosprezam.O ato de ouvir musica é o único sentido que existe.O ato de fumar esta sendo vendido nesse instante, você acabou de ler, só a menção do ato já é propagação, daqui uns anos vão proibir isso também. Ah, mas é muito fedido... se eu tivesse um bar e não pudessefumar, eu não teria um bar.O ato de usar drogas é normal. A vida é uma droga, quando não é.

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O ato de falar sobre atos é um ato dentro deum ato, num livro chamado ato. Eu sou umfilósofo.Vejamos... a quais atos estais interessado? Há uma infinidade deles, vou falar sobre o ato de degradar.O ato de defecar, é um dos meus últimos prazeres nessa vida, falo assim porque pode vir uma hemorroida e acabar com tudo.Um ato de fé, é não fazer nada.O ato de escrever deixa muitas pessoas descontentes, uns acham que o escritor nãotem chances, nunca escreverá algo que preste, outros pensam que as suas vidas estão sendo contadas sem os devidos direitos, já alguns falam que já se tinha chegado a essas conclusões muito antes, sóagora ele vem falar? E todos pensam a mesma coisa, eu escreveria melhor.

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Ato, por Anderson Rodrigues

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Não sei nem rir.

*

Véspera de natal ao sul do trópico e o anonimatonão procuro reconhecimento a ponto da humanidade comemorar meu aniversáriome basta ser excluído das festas por ser o desajustadomas sem precisar dar satisfaçãoaqui a solidão faz estadiaquando passou do meio dia eu pensei que meia noite me farão acordar

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malditos rojões, maldita humanidadeesse ano eu não presenteei-a meus ideias são contra tradiçõesa partir de hoje meu ideal é fazer aquilo que me apetecerse eu quiser presenteá-la todo fim de ano assim vai ser mesmo que não precise, e que ela não queira e que não aceitee que eu não tenha dinheirotudo para me contradizer e achar que sou livreano que vem promete o piorpara mim, obvioo casamento dela é meio que meu óbito todos os sonhos vão para o infernotoda esperançatoda expectativatoda insinuação de felicidade

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Ato, por Anderson Rodrigues

as ilusões e a querenciatudo pro brejoos servos seguem as tendenciasas tendencias fazem os servossigo à beira do brejo.

*

É bom aproveitar os benefícios conquistados pelo consumismo exacerbado, adquiri infinidades de coisas que nunca usei, estão nas prateleiras se mostrando para o nada, dessa vez eu vi um lampião verde vintage, a última vez que acampei eu levei um que fiz com vasilhame de azeitonas, esta pronto para uso, risquei essa possibilidade, mochila já tenho, meio rasgada, mostra personalidade,

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Ato, por Anderson Rodrigues

barraca é o que falta, anotei e circulei na caderneta, mas bem caro, os benefícios nãochegam a tanto, o que esta ao alcance é uma bússola, bem atraente, mas para que serve uma bússola quando não se sabe paraonde ir?

*

As mesmas festasAs mesmas conversasas mesmas promessasnesse novo ano que começao problema não se encerraperpetua-se a tragédiaa ganancia prosperao sofrimento se regeneraa doença se prolifera

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se completa uma décadae nada muda

*

Um dia desses fumando um cigarro na praçaela passa eu digo seu nome e ela para sorri, vem até mim e me oferece o rostodou-lhe um beijo, não foi o primeiro, mas foi o últimoseu gosto é de deusameus lábios divinizaram-se felizesé curada a dor do sofrimento, do coração no peito e suas cicatrizes nasce um contentamento livreuma paixão que nunca tive

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desejos ardentes sem limitesvoo ao céu habitando lugares que nunca estive em um átimo, sou os átomos mais apaixonados no universoeu que sempre sou tristevi a felicidade incidir em meus nervosguardo aqueles momentosagora eternizados nestes versos

*

Não tem graça rir da própria piada, é nada mais do que masturbação do ego, por que aprópria tragédia seria engraçada?Divertimento não me nego, mas ás custas de si mesmo é um retrocesso. e se destruir publicamente é o processo ás custas da

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puta do sucesso, a inversão desses valores para pessoas sem progresso nunca mascarará o fato do insucesso, a realidade é uma só, o fracasso faz o riso do palhaço.O riso do palhaço é algo doentio, é uma patologia em forma de alegria, e a alegria émelancolia, a felicidade do fracassado, o palhaço em mim recita poesia, incita agonia, infringe a ordem estabelecida, incide o triste junto à alegria, e ri. Como se... pudesse fazer rir, desengraçadamente o desgraçado se demite, brincando com a responsabilidade e a seriedade, nas profundezas do limbo da inconsciência para a transparência real da sobriedade. Desengonçado e desajustado, não se encaixa na sociedade, é sozinho, vilipendiado, ermo, complacente de desassossego, é o próprio erro, mortal e humano, animal insano, bicho esquisito,

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*

Sou um exemplo do que não ser.

*

Negar a realidade não faz ela mudarpor mais que eu queira que ela não seja como éela é o que é e não tem nada que não a façanão sereu cansei da irrealidadeas coisas por lá são muito fáceise não são palpáveiseu quero apalpar a bunda delae o sonho não tem êxtase

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quero a matériaquero ela

*

Toda advertência é inútil quando há disposiçãoas leis são supérfluas para a exceção e eu posso enumerar ações e suas contradiçõesque nada fará mudar o que a vida étem mais verdades em uma poesiado que na filosofia e suas eternas enunciações

Rimas atraem como ímãs nas poesiasmusicalidade nas frasesas palavras dançam

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Poemas são como águaPor isso é difícil pagar para tê-los.

O pensamento é segredo

Psicólogos são agentes secretos

Eu era esquizofrênico

Agora estou relendo

Desisti.

*

Essa noite calorenta de cor negra nega minhas afliçõesalgum dia houve alguma rosa?

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As que eu costumava mandar eram secas, talvez serviriam para marcar um livro, penso na utilidade que as pessoas dão ao presente inútil que lhes ofereci, não que eu esperasse algo de volta, na verdade eu só queria surpreender e não sei porque odeio tanto surpresas, nunca é o que você quer. Acabei de ouvir No Suprises do Radiohead, é meu estado de espírito.Essa noite vai ser difícil dormir, tantos problemas não resolvidos e tão maus, postergá-los é a saída mais fácil e eu assim me satisfaço, então fodam-se todos eles, agora vou ouvir Problems do Sex Pistols, eé assim que vem sido os dias, procuro e encontro nas músicas um melhor jeito de estar no mundo, elas dizem por mim o que sou incapaz de transcrever, dizer e até mesmo sentir, agora é hora de uma canção que descobri e é tudo o que não esta escrito

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aqui, é a ultima canção que ouço antes de dormir, diz mais por mim do que eu posso dizer por eu mesmo, é simplesmente fabulosa, ela é “Six Feet Under” de Billie Eilish.

*

Ontem parecia eterno, hoje parecia eterno, as trevas tomaram parte de tudo e amanheceu sob a claridade do sol, porque tudo acaba e começa outra vez, poderíamosser assim, mas é sofrimento demais para aguentar, temos que descansar em paz, a eternidade ternamente nos interna em seus manicômios sem hora e nem data, um dia para sempre ou uma noite infinita? Pode escolher, ou somos escolhidos? Foda-se isso, há de viver agora, depois

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descobrimos. A chuva de verão passou, trovoou e escureceu, o pôr do sol voltou, asnuvens o tinham encoberto, uma mistura de cores e sensações térmicas no ar, o céu se abre para se fechar, a noite caindo devagar, se tiver lua hoje os lobos vão uivar, o deserto de concreto e seus milhões de solitários, vivendo o momento pensandono amanhã, no mais tardar, pensam no pagamento do mês, em quê irão se endividar, no que para os filhos vão deixar,e os filhos querem a juventude para sempre, não querem trabalhar, amar, amar e amar. Os deuses se deleitam-se, eles pensam no que agora vão criar, esta tudo pronto? O Jeremias nos agradeceu por essedia, amanha virá outro para nos vangloriar e o costume passará por gerações até bater a cota e bater o ponto e aproveitar as férias

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para casar e no próximo ano quem sabe venha um messias?

*

Meu jovem, ninguém tolera tamanha tristeza, há que positivar a coisa sabe, passamos dias sobre noites trabalhando para nosso sustento e uma mensagem de apoio não cairia tão mal quanto a queda de vossos escritos, ninguém esta interessado em melancolia e depressão, tem instituições para isso, faça um tratamento, a vida é bela, tem um trocado aí?Meu caro senhor, eu não escolhi escrever tanta porcaria, simplesmente sai de mim como a porra do carbono, se eu pudesse liberar oxigênio por aí eu o faria sem

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pestanejar, mas a coisa vem de dentro, a putrefação do inconsciente derivado de coisas que aconteceram ao limiar da vida, tudo é dor, entendo que deve encher o sacoter de ler o que já se sabe, mas a minha imaginação é tacanha e se sou autobiográfico é porque não posso sair de mim, já tentei com diversas drogas, e nem foram todas, infelizmente não descobri nada diferente da merda existente e eu ia tepedir emprestado agora...

*

Eu disse que escrevia pelo menos uma folha por dia, o que é mentira, me contentocom uma frase em um momento de epifania, é bem mais valorosa do que

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trezentas linhas de escrever sobre escrever,esse é o ultimo e o primeiro recurso que separa o escritor bem sucedido do fracassado. Autopiedade é piegas, não sou vendedor, essa necessidade é terapêutica, sim, é uma necessidade escrever, ainda quesobre a mesma coisa frequentemente, é deprimente, eu achei que estava destinado a grandes coisas na vida, mas o fato é que não consigo escrever uma linha sem os artifícios mais pobres que existem, eu sou muito preguiçoso, escrever é um ato engenhoso, deveria ser pelo menos, eu quero ir reto nas curvas, o percurso menor, atalhos e afins. Recuperei isso que estava escrevendo, não costumo deixar escritos demolho, geralmente são todos espontâneos eimediatos, mais do que para me contrariar, como um exercício intervertido, decidi deixar pegando tempero aqui por um dia,

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me deparo com meu passado e contemplo. Escrito de dois tempos, o agora é sempre insuficiente, talvez melhore, enquanto isso escrevo que o beijo é o ensejo do êxtase, nunca quis deixar a ela um gosto ruim na boca, por isso nunca tentei e até evito, sabia? Tenho medo e queria que fosse perfeito, mas cada dia mais se estabelece o que é direito, o certo é certo, isso não representa não querencia, apatia em mim também é evidente, e minha libido é lamber seus lábios, ok, obrigado. Sim os decima, e os debaixo. Mas como deve saber teria gosto de tabaco, do mais barato do mercado, contrabandeado para ser exato, eles bem que poderiam me patrocinar, mas como não o fazem, não farei propaganda gratuita.Eis o ato, o ato de escrever depois de um sábado, a solidão ao meu lado, o cigarro no

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cinzeiro, o café na caneca, a chuva que se foi, o tempo nublado, a repetição meio diferente hoje, a noite é dos solitários, queria estar internado para saber valorizar minha liberdade, sou meio retardado, mas ésério, eu não sei mais o que é que eu quero,me desespero e espero, espero e me desespero, pacientemente passeio em minha mente, doente ou são, o diagnóstico do momento é um numero na estatística, faz-me ser algo e é nessa ilusão que eu temporariamente me perco, até esterco serve pra alguma coisa e eu não consigo escrever algo significante.

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Encontrei um baralho e nas velhas cartas estava lá um ás de copas escrito “te amo”, lembrei que era um plano pô-la entre as coisas dela para que quando ela o encontrasse soubesse o que não pude até então dizer, escrevi, escrevi em todo lugar o seu nome, os meus sentimentos, mas não disse, eu não poderia porque ela não fez nada para que eu sentisse isso e a situação em que nos encontramos é sempre de tensão ínfima, se eu dissesse talvez quebrasse a nossa ponte e não posso partir nossos caminhos, ainda não, talvez um dia,quando eu melhorar, se melhorar, mas se acontecer não terá razão pra fazer isso, a menos que eu queira me afundar novamente, gente como eu só procura motivos pra isso, e estou ficando velho, já devia ter aprendido. Esse ás virou marca páginas, entendi infantil a primeira

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proposta, o que é uma pena, pois é tão lindo ser criança. Mas não sou mais adolescente, as mulheres precisam de estabilidade, quem vive de amor são as fábulas, só o ideal, a realidade é dor, e elas procuram a quem possa diminuí-la, o material se pode palpar, a casa na praia é bom para descansar nos fins de semana, um carro para chegar ao trabalho é uma mão na roda, um celular para saber onde seesta, com quem falar é quase indispensável, e o salário, os almoços, jantares, a carreira, a ambição, o futuro, o primeiro filho... É majestoso... você se acaba no sofrimento enquanto elas estão planejando o casamentoporque decidiram não usar preservativosé mais gostoso...

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Afinal de contas, ela quem tinha cartas na manga. São as boas vindas da realidade.

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Plebeu com plebeiaprincesas com príncipesrainhas com reisbobos-da-corte e ninguém.

nesse atoo palhaço mata a plateiade riressa é a tragédia

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Foi na terapia que descobri, a utopia me deixou assim, amante do impossível, foi lá também que entendi, o tratamento sem fim é que faz a roda girar, entre os extremos entendo infimamente o pouco que deixa-me louco de sanidade, a desigualdade, a meritocracia, as imperfeições da sociedade,os clichês e o mais do mesmo, eu mesmo sou todo clicherizado, que é para manter saudável o estado mental, assim é mais fácil, comum, normal, básico, toda motivação por uma revolução agora não passa de medo do impensado, eu penso em por que não pensam o que devia ser inevitável, o bem estar de cada um em conjunto, mudar o mundo eu quis, mas temmuita gente que não quer, isso me fez egoísta, e faz deles democráticos, acabaremos nos perdendo em termos, mas

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para quem não sabe, os comunistas são a pior especie de fascistas, a esquerda é nojenta, a direita é contra direitos, a defesa do obvio feita pelas pessoas boas é inata e insignificante, a humanidade precisa ser extinta.

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Não posso querer nada.

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O palhaço quer ser estreia eterna.

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Sonhos me dão cócegas.

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Delírio: Enquanto teclo simultaneamente é transmitido ao vivo num daqueles prédios de publicidade da Times Square. Mas isso não representa necessariamente o sucesso, eles fazem isso para me degradar, ouve as vaias? Eu posso imaginar. Mas tem todo lisonjeamento também, como se eu fosse um grande gênio, geralmente isso acontecequando publico alguma coisa que nem foi eu quem criou, para ver-se a doentia situação, receber créditos pelo o que não se

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fez, uma frase de um poeta bem colocada que retrata a ocasião, seja de minha vida ouda realidade atual. E minha vida é como aquele filme “O Show de Truman”, mas sónos momentos de dignidade e sorte. Tudo isso parece imbecil de se acreditar, mas a sensação é tão idiota quanto e eu besta que até creio, quando não se acredita deixa de ser delírio, seria então imaginação automática? Psiquiatria é bem interessante e se eu não fosse preguiçoso e odiasse estudar, ainda assim não adiantaria, se minha vida dependesse disso possivelmente, vai saber, bom, vou perguntar para quem sabe na devida hora, por enquanto serviu para esse extravasamento, seria mais interessante publicar respostas, perguntas qualquer um faz, dá o que se pensar não é mesmo? Maisinformações conforme atualizações, ou o

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contrário, não sei de onde eu tirei isso, inventar as coisas é ser esquecido. Indubitavelmente.

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Entre desmérito e o insucesso, a má fama crescente, conduzido pelo inconsciente, adjacente solidão, estranho ao mundo, ardor do verão, a dor no coração, o amor é alucinação e estas linhas são feridas da carne e da imaginação, o sofrimento é a todo momento, frenético e mordaz, suportar e ser capaz é o que eles querem, mas eu não posso mais, fingir e sobreviver como um bom rapaz,

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Tem artifícios que só a musica pode proporcionar, por isso as vezes a escrita é insuficiente, as duas casam primorosamente, sozinhas tem cada uma o seu charme próprio. Acabei de escutar a musica que não paro de ouvir e chego a conclusão de que achei que não poderia haver no mundo alguém que pudesse sentircom tamanha maestria a vida tal como é, como ela foi interpretada nessa canção.

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Hoje o dia estava difícil, até ela me ligar, aípiorou, ela disse: tenho que cancelar, eu

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disse tudo bem, eu sempre aceito as coisas que não quero, concluí: quem sabe um dia?Ela disse não saber, eu perguntei se ela ligaria quando descobrisse, ela novamente disse que não sabia, indaguei se ela era algum tipo de filósofa, ela riu e disse que eu não prestava, falei que eu não tenho mesmo preço, que talvez um dia ela conheceria o meu valor, ela falou: isso é tão clichê, eu disse que fazia o que podia e que o impossível não existia, ela disse que existia sim, que era impossível nos ver.

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Opinião pública: “Ele ficou “assim” depoisque a garota o deixou”.Opinião Estatal: CID 10 F171

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Opinião Espiritual: Falta de féOpinião própria: Fiquei assim desde que nasci.

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Veio cá um amigo dos velhos tempos, entrou pela casa com a cachorra latindo, o que não quer dizer nada, já que ela late pra todo mundo, tão descontente quanto eu porvisitas num domingo de calor, passou pela porta e me olhou como que decepcionado por eu estar vivo, acho que ele pensou que encontraria um cadáver, tive que frustrá-lo tanto quanto eu estava por vê-lo, cumprimentamo-nos como fazíamos, e como se deve na etiqueta que os humanos inventaram, depois disso veio o que eu

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esperava, as mesmas perguntas e as mesmas respostas e ficou pior, após ritualizarmos toda essa imbecilidade social,ele veio pedir-me um favor, com direito à clássica interrogação proeminente: “posso te pedir uma coisa?” como se estivesse num leito de morte, o que se parar para pensar é o presente de cada um, eu disse que faria, o que aconteceria se eu dissesse “não”? Provavelmente ele riria desacreditando, para não ter também que rir hipocritamente, e me fazer de bobo, decidi pela inverdade, sentindo-me idiota, é incrível, não tem escolha que te faça bem, talvez matar me fizesse se eu fosse um psicopata, mas seria como tudo, efêmero. O favor era a desculpa ou o incentivo para deslocar-se de sua casa à de meus pais e sermos infelizes um com o outro pessoalmente, já que os tempos

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passaram e nada é como foi, difícil aceitar a eminencia das mudanças, a banha da minha barriga esta mais esbelta, ele não deixou de notar e comentar, agradeci o elogio e disse que era recíproco, o tempo só nos maltrata, torna as coisas ruins piorese assim por diante. Onde uma visita num domingo pode nos levar? Ao bar não pode ser porque estou na abstenção, ao puteiro não seria porque estou no celibato, ao parque não poderia porque o sol estava bem ensolarado, não havia para onde irmos, por isso ficamos onde estávamos ouvindo uma rádio de classic rock, o que deu uma conversa sobre bandas e tudo, depois que o assunto morreu, ficou difícil encarar o silencio, queria estar sozinho, elequeria dormir e por que não fazíamos o quequeríamos? Eu não podia ficar só, porque estava acompanhado, expulsá-lo seria rude,

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mas pelo menos seria sincero, dormir ele não iria porque não estava em sua casa, não haveria nenhum problema nisso, mas as visitas tem todo um código a seguir, de lógica, etiqueta e frescura, eu podia jurar que ele estava esperando eu perguntar como estava o trabalho dele, porque os trabalhadores adoram falar de vossos empregos, e não fosse o suficiente, ele tem dois trabalhos, porque até aí ele decidiu falar disso sem ser perguntado, era o motivo do sono em pleno dia, eu disse que não fiz nada e nem faria, então ficou satisfeito e quis ir embora, e agora eu escrevo porque é o que eu faço, mas isso também não importa.

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As nuvens no céu premedita a chuvao sol se pôs, mas clareia o luara lua iluminada cor de prataalumia a Terra e minha casaquem olha para ela tem certeza que é beladela verões e suas quimerasde outonos, invernos e primaverasparece eterna e será enquanto estivermos vivosquem vê deuses morrer como consegue viver?

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a sensação em que me encontro se assemelha ao intervalo de pós envio da

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carta e a certeza de que não terá resposta, uma espécie de expectativa frustrante, o remetente tem em seu poder algo que foi meu e que agora lhe pertence e essa posse é inútil e agora ele pensa em como irá descartar a coisa sem tanta culpa, é mais oumenos isso a sensação. Como no filme “Trinta anos esta noite”, o interprete vive uma ânsia de esperar por algo e nem sabe que algo é esse, talvez assim interprete melhor o meu estado.

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Estado de Poesia, de Chico César, também é meu estado.

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O médico disse que eu estava com taquicardia eu disse que estava apaixonadoele marcou cardiologistaeu fiz amarração para o amorambas doençasque causam muita dore acabarão por me matar

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Talvez eu devesse escrever um pouco sobre que talvez eu devesse esperar um pouco mais, mas talvez já tenha esperado osuficiente, ou talvez nunca será o bastante.

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Talvez eu devesse fazer alguma coisa, além do mais, mas talvez eu não possa fazer o impossível, talvez seja possível fazer o impossível, mas só talvez, talvez se eu me esforçasse mais, desse mais de mim,talvez se eu mudasse e começasse de novo,talvez fosse inútil, ou talvez não importe o que eu fizer, talvez nada importe, talvez essa noite chova e melhore, talvez amanha eu escreva algo que preste, talvez agora, talvez se eu não escrevesse sobre talvez, talvez nem seja essa a solução, talvez é quem lê que faz a coisa acontecer, tem tantos escritores que talvez não merecesse tanta puxação de saco, talvez eles tiveram sorte, talvez eu esteja sendo invejoso, mas talvez eu nem me importe, talvez escreva por estar escrevendo, talvez o cigarro me mate, talvez eu devesse comer mais abacate, talvez não haverá mais rimas,

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talvez isso encha o saco, talvez já encheu osaco, talvez eu pare, talvez alguma coisa aconteça, talvez um cometa, talvez é só doença, talvez... mais uma vez talvez.

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Vivo como no passado vivoMorto como no passado morto

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Isso é uma terapia, embora não tenha uma segunda opinião, ter tem, mas não de um terceiro, afinal de contas o ego tem vida própria, e o meu ego tem personalidades

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múltiplas e uma dessas personalidades é esquizofrênica, no total temos então umas dúzias de opiniões, mas todos são idiotas.Hoje era dia de terapia, não essa que estamos fazendo nesse instante, a clássica com a psicóloga e tudo, mas não teve, ela alegou uma reunião, como essa que estamos tendo agora, com meu ego e suas personalidades e você, não estou querendo ser engraçado nem nada, desculpe se chegou a parecer, a minha intenção é dar seguimento ao tratamento, consequentemente em minha vida e daí o livro, esse livro. Redundo e me contradigo.Queria ser você ao ler esse livro, mas não posso, só posso imaginar, nem isso faço direito, o fato é que escrevo por estais lendo, não vou a lugar algum, pode ficar tranquilo, tenho essa convicção, a certeza única da vida é a morte, então todo mundo

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que acha que é algo maior do que é, não é, eu sei que isso soa um tanto quanto desculpas para o fracasso, mas acredite nãoé, notas não são muito higiênicas, não servem para limpar o rabo, mas servem para comprar o papel designado para a função, droga, vê como é complicado estar em mim mesmo? Novamente, não são desculpas, é um constato, redundo e me contradigo, não sirvo para escrever, os escritores são todos donos de si mesmos, cheios de autoestima e tudo mais, eu fico a me deplorar comigo mesmo, isso é deverasdeprimente, mas não pretendo salvar o mundo, não hoje, hoje eu queria ter ido na terapia, ter pego o ônibus, sentar-me no banco alto do lado direito do motorista, o mesmo do cobrador, olhar pela janela as ruas tristes e esperar que suba ao carro umamulher atraente só para admirá-la e achar

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que talvez pudesse haver uma reciprocidade, se no momento estivesse com a autoestima boa, se ela não fosse algodesumano, como as mulheres costumam ser, e então descer na estação, depois delas,naturalmente, e esperar o trem sentindo-meum viajante, é melhor isso do que quando nos sentimos umas sardinhas, e novamente desejar que tenha alguma mulher bonita novagão só para olhá-la esporadicamente na viajem quando ficar tedioso a vista pela janela, nunca perco quando chega as velhasfábricas, o sentimento nostálgico, e descer na mesma estação que a maioria, depois damultidão, eventualmente se não tiver pressa, pegar o lado direito da escada rolante se não for pela escada de degraus, ou o lado esquerdo se tiver pressa, aí temoso metrô, ficar em pé encostado na parede do primeiro vagão, designado aos usuários

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preferencias, desço logo e pego outro que também é breve, teoricamente, quando não tenho pressa, uma boa caminhada pelas ruas apinhada de executivos e estudantes, gente que vai almoçar, trabalhadores e mendigos por todo lado, ascender um cigarro de praxe, olhar-se nos vidros para ver se não tem papel higiênico pendurado nas calças, admirar as mulheres, especialmente as fitness com suas roupas molduradas e então entrar no shopping e certificar de que os seguranças me olharam, ir em direção aos elevadores e daruma mijada no banheiro, parar com a música do celular sem chip, olhar-se no espelho do elevador para certificar-se de que a barguilha fora fechada com êxito e sair para a rua, do outro lado esta o CAPS, os loucos evitamos, cumprimentamos os recepcionistas e aguardamos a chamada

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que será pelo primeiro nome em interrogação, até isso acontecer ficamos sentados olhando o teto, a janela, os pés, oscomputadores, o marca ponto, ouvimos conversas, evitamos conversas, pensamos epensamos e até sermos chamados pensaremos, o que dizer? Como foi a minha semana? E aqueles planos de conquistá-la? Achar uma breja para um beijo, e quando vamos ver ouvimos nosso nome e ficamos completamente apáticos, como uma página em branco, até o sangue esquentar e lembrarmos dos planos, da semana, de como é linda e improvisamos imbecilidades e focamos em coisas doentias para provarmos que estamos doentes e no fim, não dizer nada do que realmente deveria, segundo o consenso da reunião do ego e suas personalidades e então ficamos pensando no que poderia ter

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dito e planejamos que na próxima assim será.

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Tudo estava bem, eu até estava me envolvendo com outra pessoa, então ela apareceu primeiro com um anel e depois com uma tatuagem. Um anel tem bastante significado, ainda mais quando é outra pessoa que o oferece, não tinha certeza de nada.Tatuagens são marcas que o tempo não apaga, registrado até o fim o que outra pessoa o fez em seu corpo, penso que precisou-se de muito para chegar até isso, talvez seja o motivo de eu nunca ter feito uma, depois que ela fez eu pensei nisso, e

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escrevo agora sobre. E agora que escrevi não quero mais falar sobre isso.

Nada estava bem, bom, ainda estava ruim, eu não tinha o que queria e sabia que nuncateria, e não ter sabendo que nunca terá é ainda pior, é mais fácil quando nos iludimos, é menos doloroso pelo menos, mas aqui estou, e ainda sei do obvio e mesmo assim nos confins de um lugar remoto tem-se uma esperança ridícula sobressaindo-se da escuridão da certeza, uma pequena chama que ilumina o caminho da morte, não fosse isso não seria nada e o nada é difícil, eu quero querer o que eu quiser, apatia é frívola, como a realidade. Então nenhuma novidade, a repetição ressoa como musica e eu atoa entoo a canção que ecoa nas páginas, queria escrever algo significante,

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esplendoroso, único e tudo que faço é poesia de palhaço, contando cada descaso efracasso, querendo o que não posso, juntando pedaços de migalhas, costurando trapos, tomando sopapos, sofrendo e fraco aos frangalhos, desassociado do ócio, desassossegado e desenganado, deplorado e explorado, eu escrevo pós bisteca frita com berinjela refogada, estou cheio, satisfeito e daqui a um segundo não estarei mais, tudo me virá como sempre o é, o que não tenho é questão de desculpas, o que eu quero é impraticável, o que eu sou é inominável, tenho a sensação como nunca antes de que estou morrendo e de que não serei eterno, é angustiante, deprimente e desolador, é só questão de tempo, não quero dormir, tenho medo de não acordar equeria morrer dormindo, mas nunca é a hora, jamais estarei pronto, quero gozar a

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vida, mas não tenho condições, não quero lutar, eu sou um perdedor, no dia do vencimento tem de ser pago, do contrário tem encargos, o amargo da dúvida é amargura da vida, a certeza me matará, nãovou dar minha cara à tapa, mas também não vou fugir, estarei aqui, como tu estais aí e no momento seguinte não estarei mais até um dia em que duvidarão que um dia estive.

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Vago no vazio das ruas ao relento da noite,choro em palavras as lágrimas que não caem, trago e guardo no peito amargura e cigarros, o sentido de que tudo contínua e écontínuo me situa, então libero a fumaça e

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o que ficou é o que vagarosamente me mata. Vivo porque respiro, respiro porque é instintivo, o instinto é um sentido, o sentido é sofrer, sofrer é a vida, a vida é morrer.

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A Susie é uma cachorra muito problemática, acho que ela é doida, não tem modos, só teve mordomias, esta deitada ao meu lado nesse instante ouvindoas teclas soarem, pausarem e pararem intermitentemente, como quem não dá a mínima se eu contar seus segredos. É difícil sair na rua com ela, como diz meu sobrinho, ela grita, é tão estridente seu latido que é realmente isso, me envergonha

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quando penso sobre o que pensam, quando não me importo. Atualmente tem cinco anos e depois desse tempo todo eu decidi sair com ela na rua, pelo menos essa semana, nenhuma vez falhei e olha que é quinta-feira hoje, ela ganhou uma coleira rosa do meu irmão, não quis que fosse inútil. Fui displicente em sua criação, mal me respeita, dorme comigo, porque a camaem que dormia ela destruiu, tentei fazê-la dormir no chão, e dormia até uma certa hora da madrugada até que ia para minha cama, eu cansei de bater nela para voltar pro chão, ela foi tão destemida que conquistou o lugar, outra vergonha quando não me importo. Quando tirei ela da gaiola junto aos outros filhotes numa veterinária perto de onde eu trabalhava com meu tio eu não soube identificar se era macho ou fêmea, achei que fosse macho, então

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batizei-a com o nome da menina dos quadrinhos, amiga do Calvin e Haroldo, criado pelo Bill Watterson, me identifica muito suas tirinhas, depois andando na rua percebi que é um nome bem comum em cachorrinhas como ela, ninguém nunca me perguntou, por isso estou dizendo.Ela representa a minha volta á casa de meus pais, um tempo de grande mudança em minha vida, como se não fosse o bastante eu ter de voltar, ainda arrumo um animal, minha mãe evidentemente não gostou nada, mas agora já se acostumou, e eu fiz isso porque estava meio doidão falando com animais e tudo, quando não era com a televisão, andando com ela a caminho do serviço disse em seu ouvido que cuidaria dela, meu tio no serviço não deixou ela ficar lá porque latia muito, entãoa trouxe para casa dos meus pais. Escrevi

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isso para que possa mensurar minha dignidade ou a falta dela, se de alguma forma me fizerem passar pelo o que não fui, um dia. E para que você entenda quem é o cão na capa deste livro, foi uma forma de expressar o carinho que sinto por ela.

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Pré terapia, pretéritos e o presente

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A dor na têmpora vai para o olho direito indo e voltando, pulsando na veia.

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Tentei abordar o assunto, ela o abortou veemente.

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A dor na mente é dormente

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Esperar pela sexta-feira e que não esteja calor, enquanto espero os cinco segundos de propaganda para poder ouvir a musica do momento que represente os

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sentimentos, assim espero o corpo recompor-se para o próximo cigarro, esperar a encomenda chegar, para presentear e esperar que seja do agrado, esperar o tempo passar para chegar no horário, esperar o ônibus e o trem, esperar o almoço ficar pronto e depois esperar esfriar, esperar com senha e sem senha, esperar começar e esperar que nunca termine, esperar no dentista que acabe logo, esperar escrever algo que realmente importe, esperar dizer o que importa, esperar escutar eu te amo, esperar pela morte, esperar que não chegue a morte, esperar viver, esperar não sofrer, esperar pelo sono, esperar sonhar com ela, esperar acordar no outro dia, esperar morrer dormindo, esperar não cometer erros, esperar não perder tempo, esperar dormir sossegado, esperar a marmita esquentar,

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esperar não precisar, esperar nada, esperar a hora certa, esperar não ser a hora errada, esperar uma gargalhada, esperar espontaneidade, esperar sentimentos, esperar em vão, esperar sentado, esperar sozinho, esperar acompanhado, esperar nãodesistir, esperar conectar, esperar atualizar,esperar baixar, esperar não esperar, esperar. Entre esperar a chuva e esperar a chuva passar.

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Fica cada vez mais impossível e saber disso é como pular de um precipício esperando que surja asas para voar, só a reciprocidade poderia dar esse dom, a lucidez põe tudo de uma vez em suas

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devidas diretrizes, o fim é eminente, só beijarei a morte no ultimo instante, enquanto caio contemplo o desejo, quanto mais impossível, mais eu quero. Sou retardado, esse é meu diagnóstico.

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Entre amar o presente e odiar a modernidade;

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A resposta sobre a imaginação automática fora: “é possível”. Ou foi só minha imaginação.

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Meus pensamentos me matam numa nova espécie de pessimismopara além do niilismo e qualquer ismoultrapassa a depressãoacima do indizívelé uma coisa extremadachora de dar risada e ri como se a tristeza fosse engraçadamelancólica e faz cócegas junto á apatia toda melancolia tem alegria tristee no meu caso insiste e inexiste dualidade relativa

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Ato, por Anderson Rodrigues

Com uma espécie de complexo de édipo e uma carência infernal eu me atiro nos braços de qualquer mulher, essa é a verdade, e na realidade nem as putas me querem, olha o ponto em que cheguei, usar meus martírios para me deteriorar publicamente, tenho feito isso esse livro inteiro e não vai ser agora que deixarei de fazer, tenho a terapia pra isso, mas escrevervai além, marca, sabe como é? Perdi a conta do tempo que permaneço sozinho, acho isso apelativo, mas se eu não fizer isso ninguém o fará, quero mudar meu estilo, o modo como escrevo, vou continuar com minha barba ridícula, usando boina e camisetas sem estampas, não espero nada do futuro,

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Ato, por Anderson Rodrigues

Uma sensação de que tudo esta perdido de estar sendo enganadode ser o único a não saber do segredode estar sendo vigiado, monitorado e usurpadosenso de medoe a depreciação incontrolável do ego

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Tento não pensar, mas acabo pensando mais do que pensaria querendo pensar, medito todas minhas ações antes e depois enão faço o que ponderei, faço o que o presente me faz, planos só dão certo em palavras, por isso quando chegar amanha e estivermos frente á frente eu não sei o que

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direi, então eu escrevo, porque falar e falar é muito fácil, o que é complicado é o que faço do que eu sinto, mais uma vez, eu escrevo, não posso fazer diferente, já tenteio desenho, teatro, até auxiliar na cozinha, escrever ainda que não seja nenhuma literatura cult reconhecida por terceiros, cheia de pompons e teorias e técnicas, é para mim uma necessidade, o resto eu faço porque não tenho mais o que fazer. Agora, o conteúdo e o desenvolvimento deveriam como a necessidade, serem autônomos, mas tudo é passível de prova e comparações e todo escritor por mais independente que seja esta sujeito a isso.

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Ato, por Anderson Rodrigues

Á vi vindo das profundezas da virtude, vislumbrei vossa voz, vilipendiei-me em erros vorazes, vou voltar varias semanas e verei tudo outra vez, verdadeiramente votivo e atroz, venerarei até o fim

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A proteção de tela foi acionada três vezes, até eu escrever que foram três, mas na verdade foi uma só, escolhi o três porque um é pouco, pode ser dois, mas três é melhor, se fosse por essa lógica ficaria eternamente tentando enumerar o infinito, mas como estamos num livro, há de ter um discernimento, do contrário não há entendimento, mas se bem que não é essa aquestão vital, a chave da indagação é o fato

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de que chegaria a um determinado numero,que não sei qual seria, depois talvez do novecentos e noventa e nove quadrilhões, novecentos e noventa e nove trilhões, novecentos e noventa e nove bilhões e assim sucessivamente, isso pensando por ora, assim encima do tempo, para não ter de pesquisar nem nada, com toda probabilidade de estar incorreto e tudo, tenho que dizer que o mínimo que eu poderia fazer era ter um conceito prévio para escrever as coisas, mas se pensar nissonão vou escrever nada, e não quero que se contente com isso, se me ver na rua eu o autorizo a me vilipendiar, eu ia dizer espancar, mas ficaria muito masoquista, em suma, quando a proteção de tela do computador foi acionada, a escuridão vinhatomar a claridade, e eu á usava como lampada aqui do escritório, porque estou

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com preguiça de levantar do sofá para teclar no interruptor e fazer acender a luz, na verdade isso é mentira, a realidade mesmo é que eu estava cá posterior á ouviruma musica emocionante que me fez ter a necessidade de escrever alguma coisa, já que faz um tempo que não o faço, porque todas as vezes eu fazia a mesma coisa, escrevia sobre estar escrevendo, até que permaneci, não sei, uns dez minutos? Frente ao computador olhando a barra que escreve pulsando intermitentemente feito um coração, até que as luzes iam desvanecendo e toquei no mouse e decidi escrever sobre o que tinha acabado de fazer, assim surgiu essa coisa inútil que não nos levou a lugar nenhum, talvez a outra página, era essa a intenção principal, não posso me vilipendiar assim tão toscamente, fazemos as coisas sempre

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pensando na posterior, uma coisa leva outra, é a roda, a engrenagem e ou a metáfora idiota que for, tá bom? Diz a si mesmo e estará me respondendo em outra dimensão, isso lhe irrita? Tem sido bom? Como é pra si? Eu não me importo, mas isso foi pensado em você.

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Meia idade é meio morto, metade na cova, amanha eu morro, hoje quero dizer que tivealguns prazeres, muitas tristezas, talvez porter tido poucas mulheres, se tivesse muitas seriam mais problemas, talvez, quem sabe, não se sabe nada do indefinido, tem gente que prefere assim, apreciam o mistério, eu estou usando isso para escrever hoje,

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Ato, por Anderson Rodrigues

porque como escrevi anteriormente, amanha eu morro, digo isso porque é sexta feira, teve terapia e consequentemente vemo sábado, tem sido isso desde que nasci, acho que não será agora que mudará, algo me diz isso, e não é a lógica, é outra voz, a que se afugenta e que me fala o que escrever, ela é até meio engraçada, mas é mais sem graça, já pensei que fosse um palhaço, é difícil achar um palhaço engraçado, são mais desgraçados, vou parar com essa merda, tenho que ir ao mercado

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No fundo do poço “There Is A Light That Never Goes Out”.

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À meia luz de uma lampada de filamento de carbono, às sombras e ao abandono, todo amor que eu sinto ilumina a escuridãoda minha solidão, à meia-noite metade de mim dorme e há outro, sobressaindo-se de mim, insone.Ao meio do dia estou inteiramente sóbrio esozinho, a refeição se torna responsabilidade, comer sem prazer e para manter-se são, somente desprazer e individuação, solenemente sereno sossegado, invariavelmente desassossegado a contrariedade enaltece a

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dualidade múltipla e placidamente o plástico das esmeraldas ilude o cego de fé.A todo momento há um momento dentro do momento que morre e renasce.Ao todo são todos programados

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O dia vai acabar comigo…Lindo sol alumiante, calor que aquece a alma, pássaros sinfonizam a trilha sonora de minha vida, que dia maravilhoso, hoje eu morro.

Não estou morto, mas estarei, estou absortona ideia de morte, a tarde preenche o dia deuma sensação ambígua, a espera pela noite e a expectativa dela é escura, pensamentos

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de cores anuviantes moldam o cerebelo curvo, turvo e mudo, a ordem é estar, nunca estive tão estacionado, a comodidade acomoda o espírito rebelde, a contemplação da satisfação torna incômodae insatisfatória, as horas do agora se juntaram com depois e surge diante mim o após, insuficientemente, o que eu tenho não é o que preciso e o que preciso não é o que eu quero, doce infância se foi e me deixou infeliz, a realidade fez de mim ateu,a fé perdida não é nenhuma perda, tudo permaneceu como sempre foi, o que mudou não moldurou o hoje, se fui infeliz foi porque eu quis desacreditar do que se faz feliz.

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Sem essa de querer ser doido, provar alguma coisa, ser politicamente correto e não ser politicamente correto, ser ateu e terfé na humanidade, querer a extinção dos humanos, ser sociopata e altruísta, egoísta e lutar pelas causas perdidas, escritor de escritos biográficos e imaginários, catador, causador de dor, calculista,

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Hoje o dia acabou e a noite amanheceu, foimais um dia entre todos os dias, nada mudou, morri um pouco e não morri, as horas passaram, os pássaros cantaram, os rojões explodiram, os carros buzinaram, os beberrões beberam, os bebes choraram, as

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criançadas gritaram, as musicas entoaram, os fura filas furaram e eu me pergunto o que fizeram com o tempo que roubaram, filhos elementarmente, os times jogaram, mentira que hoje é sábado, verdade para várzea, verde para os vales, vozes falaram, psicólogos escutaram, mães aconselharam, pais fizeram churrasco, filhos fizeram netos, em salas de cinemas fizeram filas, quem furou fila é um filho da puta, as putasderam, ganharam, choraram, beijaram, apanharam, furaram filas, não me fizeram nada, não me pagam, trambiques trambicaram, palpites palpitaram, peitos pularam, pintos infiltraram, poemas problematizaram, pobres endividaram, pedreiros trabalharam, as epidemias se alastraram, faleceram-se felizes e infelizes faleceram, felicidades faliram, infelicidades e fetiches fabricaram,

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Ato, por Anderson Rodrigues

felizmente fizeram certo, infelizmente furaram fila, fumaram cigarros, frases se fizeram, fez-se tarde, fez-se noite, fez-se dia, diagnosticaram doenças e endoidaram os doidos, definitivamente definho nessa tarde de sábado sozinho, solitário, somente só, suportando a solidão sobriamente sempre sendo o que sei ser, sereno sofredor.

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Eu tinha que sonhar para sair desse pesadelo, o mais cabível era acordar e viver a realidade, mas dos três não tem qual seja bom, o sonho ilude, o pesadelo machuca, o real é nauseante, então eu decidi escrever, aqui a dor transfere-se em

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Ato, por Anderson Rodrigues

palavras num conjunto de lamúrias, musicalmente dançam na mente, da tela ao papel, do papel aos olhos, claro, inutilmente.O ato de escrever diz mais do que sou do que esta escrito, e tudo se repete contradizendo-se um à um, o absolutismo éabsurdo, a magia só engana. Não sigo um contrato, se tudo é insuficiente como parece, é porque sou falho, me falta muito e nunca será o bastante, mas o ato é autenticamente genuíno, o relato de um homem que escreve o que lhe acontece para deixar a dor menos sofrida, inspire-se,eis a vida. Diga a quem ama que a ama, assim se muda os dias e mudando um dia, muda-se toda uma hierarquia, atreva-se, seja.

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