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// Revista da Faculdade de Direito // número 4 // segundo semestre de 2017 177 ANÁLISE ECONÔMICA DA EXECUÇÃO FISCAL NO BRASIL Marcio Cesar Costa* e Carlos Augusto Daniel Neto** *Doutorando em Direito Tributário pela PUC/SP. Mestre em Direito Tributário pela PUC/SP. Especialista em Direito Tributário pelo IBET/SP. Conselheiro Titular do Con- selho Municipal de Tributos em São Pau- lo. Professor Seminarista e Conferencista pelo IBET. Autor de livros e artigos. ** Doutorando em Direito Tributário pela USP. Mestre em Direito Tributário pela PUC/ SP. Especialista em Direito Tributário pelo IBET/SP. Conselheiro do Conselho Admi- nistrativo de Recursos Fiscais – CARF. Pro- fessor da Especialização em Direito Tributá- rio do IBDT. Autor de livros e artigos. Resumo: As execuções fiscais ocorrem todos os dias, de uma forma praticamente isolada umas das outras, atentas so- mente aos textos normativos e a jurisprudência vigente, para se orientar em seu conduzir. Este trabalho pretende utilizar a metodologia da Escola da Análise Econômica do Direito para examinar as consequências da repetição de execuções fiscais entre as partes que não participam da relação processual, mas que estão ligadas à atividade tributária e à cobrança direta de tributos. Ou seja, procura-se demonstrar a influência da repetição de jogos deri- vados da execução fiscal sobre as estratégias de conduta do Fisco e do Contribuinte, como forma e compreender o seu funcionamento e apresentar sugestões fundamentadas para o seu melhoramento. Palavras chave: Execução Fiscal; Estratégia; Decisão; Análise Econômica do Direito. Abstract: The fiscal executions occur every day in a substantially isolated way from each other, attentive only to the norma- tive texts and prevailing jurisprudence, to be guided in their conduct. This paper intends to use the methodology of the School of Law and Economics to examine the consequences of repeated fiscal executions between people that do not participate in the procedural relationship, but are linked to tax activity and direct tax reclaiming. It seeks to demonstrate the influence of repeated games arising from fiscal execution on the strategies of the Judicial, the Tax Collectors and the Taxpayers conduct, and as a way to understand its operation and make suggestions for its improvement. Keywords: Fiscal Execution. Strategy. Decision. Law and economics.

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Page 1: ANÁLISE ECONÔMICA DA EXECUÇÃO FISCAL NO BRASIL · de vontade do obrigado, produzam o mesmo resultado que ele não quis produzir, a saber, a satisfação do direito do credor (DINAMARCO,

// Revista da Faculdade de Direito // número 4 // segundo semestre de 2017

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ANÁLISE ECONÔMICA DA EXECUÇÃO FISCAL NO BRASIL Marcio Cesar Costa* e Carlos Augusto Daniel Neto**

*Doutorando em Direito Tributário pela PUC/SP. Mestre em Direito Tributário pela PUC/SP. Especialista em Direito Tributário pelo IBET/SP. Conselheiro Titular do Con-selho Municipal de Tributos em São Pau-lo. Professor Seminarista e Conferencista pelo IBET. Autor de livros e artigos.** Doutorando em Direito Tributário pela USP. Mestre em Direito Tributário pela PUC/SP. Especialista em Direito Tributário pelo IBET/SP. Conselheiro do Conselho Admi-nistrativo de Recursos Fiscais – CARF. Pro-fessor da Especialização em Direito Tributá-rio do IBDT. Autor de livros e artigos.

Resumo:As execuções fiscais ocorrem todos os dias, de uma forma praticamente isolada umas das outras, atentas so-mente aos textos normativos e a jurisprudência vigente, para se orientar em seu conduzir. Este trabalho pretende utilizar a metodologia da Escola da Análise Econômica do Direito para examinar as consequências da repetição de execuções fiscais entre as partes que não participam da relação processual, mas que estão ligadas à atividade tributária e à cobrança direta de tributos. Ou seja, procura-se demonstrar a influência da repetição de jogos deri-vados da execução fiscal sobre as estratégias de conduta do Fisco e do Contribuinte, como forma e compreender o seu funcionamento e apresentar sugestões fundamentadas para o seu melhoramento.Palavras chave: Execução Fiscal; Estratégia; Decisão; Análise Econômica do Direito.

Abstract:The fiscal executions occur every day in a substantially isolated way from each other, attentive only to the norma-tive texts and prevailing jurisprudence, to be guided in their conduct. This paper intends to use the methodology of the School of Law and Economics to examine the consequences of repeated fiscal executions between people that do not participate in the procedural relationship, but are linked to tax activity and direct tax reclaiming. It seeks to demonstrate the influence of repeated games arising from fiscal execution on the strategies of the Judicial, the Tax Collectors and the Taxpayers conduct, and as a way to understand its operation and make suggestions for its improvement.Keywords: Fiscal Execution. Strategy. Decision. Law and economics.

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INTRODUÇÃO

AExecução Fiscal recebeu seu regramento espe-

cífico no Direito Brasileiro com a Lei Federal nº

6.830/80 (LEF), que dispõe sobre o procedimento

judicial pelo qual a Fazenda Pública pode buscar a satis-

fação dos seus créditos que são consubstanciados em um

específico título executivo – a Certidão de Dívida Ativa (Cf.

PAULSEN et alii, 2010, p.145).

Explica Cândido Dinamarco que a sanção executiva consis-

te na imposição de medidas que, com ou sem o concurso

de vontade do obrigado, produzam o mesmo resultado que

ele não quis produzir, a saber, a satisfação do direito do

credor (DINAMARCO, 2009, p.31).

É cediço, pois, a lição de que a execução fiscal tem a fun-

ção de submeter o patrimônio do devedor (contribuinte ou

responsável tributário) ao credor. Apesar das peculiarida-

des que esse procedimento possui, bem como as inúmeras

questões que têm sido debatidas acerca desta temática,

esse trabalho volta os olhos pra outra pergunta – muitas

vezes esquecida pelos cientistas do Direito: quais os efei-

tos externos da execução fiscal, para além daquela relação

credor-juiz-devedor?

Mais precisamente, o que se pretende realizar é a utilização

da metodologia da Escola da Análise Econômica do Direito

para a compreensão da execução como um mercado, que

no seu funcionamento determina preços para o cumprimen-

to e o descumprimento de normas tributárias, de acordo

com a intensidade do incentivo que consegue gerar sobre

as partes que atuam nesse jogo.

Para isso, há de se percorrer um caminho prévio de delimitação

metodológico, bem como uma exposição sucinta de noções

básicas a respeito do funcionamento de mercados e das falhas

que ele está sujeito – as falhas de mercado e as falhas de Esta-

do – bem como noções basilares como utilidade e valor.

Em seguida, há que se desenvolverem considerações a

respeito da teoria da decisão, como forma de análise da

atuação do Contribuinte e do Fisco nesse intrincado jogo

de ações e reações. Para melhor compreender isto, será

utilizado também o instrumental da teoria dos jogos, para

a determinação de estratégias dominantes, situações de

Equilíbrio de Nash e de eficiência otimizada.

O terceiro capítulo tratará de expor dados empíricos com-

pilados em competentes trabalhos de Jurimetria coorde-

nados pelo Ministério de Justiça e pelo Conselho Nacional

de Justiça, respectivamente, pois eles serão o material da

análise que se pretende realizar no último capítulo.

Por fim, a conclusão que se pretende alcançar é a de que é

necessária uma série de medidas voltadas à reversão das

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atuais estratégias dominantes do Fisco e do Contribuinte,

que são desestimuladoras dos meios de cobrança direta e

estimulam a resistência fiscal, lícita e ilícita.

1 Direito e Economia – Noções Básicas

Primeiramente, para a análise que se pretende realizar a

respeito da Execução Fiscal, é mister expor brevemente

a metodologia da Escola da Análise Econômica do Direito

(AED), com o fito de esclarecer o instrumental analítico que

será utilizado para a construção das conclusões colimadas.

1.1 Metodologia

Primeiramente, deve-se frisar que a AED é, mais do que

uma escola, um movimento, abrangendo contribuições

originais, e por vezes divergentes, de diversas escolas tais

como: Escola de Chicago (Chicago Law and Economics),

Escola das Escolhas Públicas (Public Choice Theory), Esco-

la da Nova Economia Institucionalista (Institucional Law and

Economics), e outras (Cf. CALIENDO, 2009, p.14).

Seus rudimentos remetem às obras de Adam Smith e Jere-

my Bentham, mas o surgimento do Law and Economics só

se dá, efetivamente, à partir da década de 50, com os tra-

balhos de Richard Posner, Ronald Coase e outros – tendo

ganhado ampla repercussão e acato em escolas jurídicas

ao redor do mundo.

Não obstante o dissenso a respeito do objeto dos estudos

da AED, há um consenso a respeito da necessidade de

defini-lo a partir de seu método, mais do que do seu obje-

to. Segundo Gary Becker, esse método é o da pesquisa da

escolha racional, sendo tal pesquisa sumarizada em alguns

temas: maximização do comportamento humano, equilíbrio

mercadológico e a assunção de preferências estáveis (Cf.

KERKMEESTER, 1999, p.384).

A análise econômica do Direito apresenta uma dupla dimen-

são, descritiva e prescritiva, que correspondem às escolas

da concepção positiva e normativa do Direito e Economia.

A primeira busca explicar o funcionamento do Direito e a

eficácia de suas normas através de uma aproximação com

a teoria dos preços da Economia, considerando-as como

um sistema de incentivos e desincentivos que será aplicado

sobre o sujeito. A segunda, por sua vez, busca determinar

como deve ser o Direito para que o mesmo seja otimizado

em termos de eficiência econômica e regulatória, à partir

da análise de dados empíricos (Cf. CALIENDO, 2009, p.15).

Desde que se trate de um objeto de estudo onde escolhas

(choices) sejam feitas, é possível uma aproximação sob a

ótica do law and economics. Entretanto, há que se obser-

var que esse equilíbrio gerado pelas escolhas racionais não

pode ser buscado apenas nos mercados explícitos (explicit

markets) como a bolsa de valores, mas também nos chama-

dos mercados implícitos (implicit markets) como o mercado

para atividades criminais ou para a realização de casamen-

tos, os quais, para a AED, são mais do que simples metáfo-

ras (Cf. KERKMEESTER, 1999, p.384).

Como explicam Cooter e Ulen, a Economia proporcionou

uma teoria que permite desde a previsão dos efeitos das

sanções legais estabelecidas com as normas, assemelhan-

do-se a um sistema de preços no mercado de consumo, até

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o desenvolvimento de um padrão normativo útil para avaliar

a eficiência de políticas públicas, como se se tratasse de

uma transação comercial que se busca a maximização dos

lucros (Cf. COOTER et ULEN, 2010, p.25-26).

De forma sucinta, a AED possui alguns postulados básicos

que devem ser compreendidos antes de avançar na análise:

a) individualismo metodológico; b) escolha racional; c) pre-

ferências estáveis; e d) equilibrium.

Em primeiro lugar, deve-se observar que a ação individual é

a unidade básica de análise, de modo que os atores de uma

realidade maior devem ter suas atitudes analisadas singu-

larmente (Cf. KERKMEESTER, 1999, p.385).

Esse postulado do individualismo metodológico, entretanto,

não liga a maximização individual ao egoísmo, no sentido

de que as decisões serão tomadas somente nos interesses

pessoais do agente, tampouco se confunde com o indivi-

dualismo político-filosófico (Cf. CARVALHO, 2013, p.27).

Como consequência desse individualismo, considera-se

que o indivíduo decide com base em sua racionalidade in-

dividual, ainda que a mesma esteja limitada pela ausência

de informações ou incapacidade de processá-las, impedin-

do a maximização, mas permitindo o alcance de certo nível

de utilidade.

A escolha racional do indivíduo, portanto, deve dirigir-se à

maximização dos interesses individuais, mas atendendo às

limitações relacionadas à consistência na ordenação das

preferências de cada indivíduo, de acordo com a utilidade

que lhes atribuam.

Esta ordenação deve ser necessariamente completa, tran-

sitiva e reflexiva. Completa porque o sujeito deve ter ca-

pacidade de localizar qualquer bem na sua ordenação de

preferências; transitiva porque a preferência de A sobre B,

e de B sobre C, deve implicar a de A sobre C; e reflexiva

porque cada preferência é tão boa quanto ela mesma (Cf.

COOTER et ULEN, 2010, p.42).

Derivado da escolha racional é o postulado das estabilida-

des das preferências, que exige que a ordenação de cada

indivíduo seja estável em uma determinada situação e em

um curto prazo, impedindo, por exemplo, uma circularidade

que viole a necessária transitividade da ordenação.

Isso é necessário para que se possa construir uma curva de

utilidade para o sujeito determinado, que permitirá a iden-

tificação das escolhas que maximizarão as utilidades para

o mesmo.

Por fim, o postulado do equilibrium informa que as inte-

rações no Direito e na Política, assim como no mercado,

tendem a um equilíbrio através da barganha entre as par-

tes envolvidas na negociação, desde que sejam eliminados

os custos de transação – é o chamado Teorema de Coase

(COASE, 1960, p.1-44).

1.2 As Falhas de Mercado

Como foi dito no item anterior, o equilíbrio é a tendência de

um mercado sem custos de transação, e onde a compe-

titividade seja perfeita, sem falhas que comprometam seu

perfeito funcionamento.

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Apesar disso, existem causas que geram distorções no

mercado e, portanto, afetam esse equilíbrio: as falhas de

mercado (Market failures), analisadas primeiramente por

Francis Bator (BATOR, 1958, p.351-379), como as causas

da ineficiência do mercado.

O mercado utiliza de um instrumento de comunicação e si-

nalização para coordenar seus agentes: o preço dos bens e

serviços que nele são transmitidos. A determinação de pre-

ços e a tomada de decisão racional por parte de cada agen-

te permite que os recursos sejam distribuídos entre aqueles

que lhes deem maior valor (Cf. SOARES, 2001, p.76). Portan-

to, quando um mercado funciona, os recursos associados a

um preço são, em regra, distribuídos de forma eficiente.

Um mercado concorrencial perfeito demanda uma série de

condições básicas, quais sejam (HANLEY et alii, 1997, p.22):

a) a racionalidade dos agentes econômicos envolvidos,

para que ajam sempre buscando maximizar a sua utilidade;

b) a aceitação do preço como uma variável externa, de-

pendente apenas do funcionamento do mercado e não

de seus partícipes;

c) a informação completa à disposição dos agentes; e

d) a plenitude do mercado, abarcando os bens neces-

sários para a satisfação integral dos indivíduos

As falhas de mercado correspondem justamente a defeitos

na implementação em alguma das condições de um merca-

do concorrencial perfeito, que acabam por gerar desvios no

funcionamento do mesmo.

Neste trabalho adotar-se-á as quatro grandes fontes de fa-

lhas elencadas por Robert Cooter e Thomas Ulen (COOTER et

ULEN, 2010, p.61-64), em parte coincidente aquelas expostas

por Paul Krugman (KRUGMAN et alii, 2006, p.160-162):

a) Monopólio e Poder de Mercado;

b) Externalidades (Side-off effects);

c) Bens Públicos; e

d) Assimetrias informacionais graves.

1.2.1 Monopólio e Poder de Mercado

A ideia por trás de um mercado competitivo com os preços

em um patamar ótimo é a equivalência entre o custo margi-

nal e o benefício marginal na operação realizada1.

Entretanto, a existência de um monopólio, seja ele na pro-

dução ou no consumo, faz com que a combinação maximi-

zadora do lucro ocorra em um ponto que exceda o custo

marginal de produção – ou seja, o preço do bem é elevado

e a quantidade fornecida é baixa do ponto de vista da efi-

ciência (Cf. COOTER et ULEN, 2010, p.61).

Diante de um caso como esse, são necessárias políticas pú-

blicas voltadas à correção do preço cobrado pelo monopo-

lista, a exemplo das leis do direito antitruste e da regulação

estatal em certos mercados, como o do petróleo e derivados.

1.2.2 Externalidades

Normalmente, em uma transação de mercado, as partes

envolvidas realizam custos e captam benefícios, a partir das

informações que possuem sobre a operação e o valor que

atribuam aos bens envolvidos.

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Ocorre que, por vezes, os efeitos da transação, sejam eles

para o bem ou para o mal, acabam por serem refletidos em

partes externas através de benefícios ou custos externos,

ou externalidades positivas e negativas (Cf. CARVALHO,

2013, p.51). Um exemplo do primeiro é o aproveitamento

pela instalação de um parque pelas residências próximas, e

quanto ao segundo pode-se pensar nos efeitos da poluição

sobre uma determinada região.

É essencial que se explore mais a noção de externalida-

de negativa, pois o foco da exposição é justamente expor

como elas podem levar a uma falha de mercado nas exe-

cuções fiscais e de que formas as políticas públicas podem

resolver esse problema.

Retomando o exemplo da poluição, o depósito de detritos

em um rio ou a emissão direta de poluentes no ar se dá

porque, para o produtor, o custo marginal privado é menor

do que o custo marginal social (este corresponde ao custo

marginal privado e os custos impostos involuntariamente

a terceiros).

Dessa forma, a função das políticas públicas nesse caso

é a de fazer com que o gerador de externalidades leve em

conta os custos externos, através de uma internalização

destas externalidades, ou seja, fazendo com que a curva

de atuação leve em conta o custo social, e não o privado

(Cf. COOTER et ULEN, 2010, p.62).

1.2.3 Bens Públicos

Os bens públicos são, para a Economia, aqueles que agre-

gam duas características (Cf. COOLER et UTEN, 2010, p.63):

a) consumo não rival – o consumo de um bem público

por uma pessoa não deixa menos para qualquer outro

consumidor; e

b) consumo não excludente – os custos de exclusão dos

beneficiários não pagantes é tão grande que afaste o inte-

resse de qualquer empresa privada em fornecer esse bem.

Nesse caso, é natural que surjam free-riders, sujeitos que se

beneficiam do pagamento feito por outro, sem qualquer cus-

to para si. Visando corrigir essa falha de mercado que os go-

vernos podem ou subsidiar a provisão privada desses bens

públicos, como no caso de bolsas para pesquisa e estudo,

ou ele próprio provê-las, como no caso da defesa nacional.

1.2.4 Assimetrias de Informação

Por fim, a quarta causa de Market Failures são os desequi-

líbrios informacionais entre as partes envolvidas em uma

transação, que dificulta a correta avaliação das condições

da operação, podendo chegar ao ponto de inviabilizar o

negócio ou gerar trocas ineficientes sob o ponto de vista

econômico.

1.3 As Falhas de Estado

A redução da origem dos problemas aos casos típicos de

falhas de mercado, ideia própria da economia neoclássica,

é considerada ultrapassada (ANDERSEN, 1994, p.10-16).

As contribuições da Escola da Escolha Pública pôs em evi-

dência a necessidade de levar em consideração, no funciona-

mento do mercado, os interesses egoísticos dos sujeitos que

fazem parte das instâncias públicas. Como explica Common:

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Podem-se distinguir quatro tipos de participantes no pro-

cesso político: os eleitores, os eleitos, os burocratas e os

membros dos grupos de pressão. Supõe-se que os votan-

tes expressam o seu apoio a favor daqueles que acreditam

ser os que melhor servem os seus interesses individuais,

enquanto os que representam actuam no sentido da con-

cretização das suas expectativas de serem reeleitos. Os bu-

rocratas, por sua vez, buscam a maximização do tamanho

do aparelho que se inserem, tendo em mente a promoção

hierárquica e salarial. E os grupos de pressão promovem

seus objetivos junto dos políticos para cuja eleição con-

tribuíram e dos burocratas que aconselham estes últimos.

(COMMON, 1995, p.143)

Não é à toa, portanto, que Richard Posner sustenta que a

regulamentação de mercados imposta aos agentes econô-

micos não tem a função somente de corrigir as imperfei-

ções de mercado, mas também são formas de tirar proveito

do poder coercitivo do Estado para introdução de barreiras

à entrada no mercado ou a manipulação de preços acima

do patamar do mercado, a depender das pressões realiza-

das pelos grupos de interesse, os political rent seekers, que

buscam utilizar o aparato estatal em seu favor (Cf. POS-

NER, 1974, p.343).

Essa atuação distorcida em relação aos fins que deveriam

ser perseguidos pelo Estado acaba por agravar os desequi-

líbrios de mercado, afetando intensivamente a distribuição

de recursos e a eficiência das transações.

Um exemplo de falha de mercado relacionada com a temá-

tica da execução fiscal é a ampliação judicial das hipóteses

de responsabilização tributária dos sócios de uma socieda-

de limitada, que acaba por inibir o investimento estrangei-

ro por receio dos sócios de serem atingidos em sua esfera

patrimonial privada.

Da mesma forma, por exemplo, funciona a corrupção em

nos anéis burocráticos, que gera um estímulo à adoção de

formas de corrupção ativa e passiva, substituindo a figura

do burocrata pelo “agenciador”.

O que se pretende expor, de forma sintética, é que o pro-

cesso de decisão (analisado posteriormente) conduz a uma

ineficiente afetação dos recursos, devido não só às falhas

de mercado que podem surgir, mas também pela incapa-

cidade do Estado de atuar no sentido de sanar esses pro-

blemas de forma eficiente, gerando falhas de Estado – de

maior gravidade (Cf. SOARES, 2001, p.96).

Como explica Paulo Caliendo:

Para a Escola das Escolhas Públicas (Public Choice School)

e, especialmente, para Milton Friedman, toda tentativa de

corrigir as falhas de mercado por meio da ação do Estado

pode implicar erros maiores, em virtude dos custos decor-

rentes das falhas do governo (costs of government failures).

Essas falhas seriam derivadas principalmente das falhas

do regime democrático e do poder de grupos de interes-

se (special-interest groups), que se utilizam dos mecanis-

mos públicos para garantir seus interesses privados (rente

seekers). (CALIENDO, 2009, p.79).

Tais ilações serão confirmadas por Kenneth Arrow, que em

arrojado trabalho que trata de demonstrar a imperfeição do

regime democrático quanto ao atendimento dos requisitos

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de uma sociedade do bem estar social. Tal construção foi

denominada de teorema da impossibilidade de Arrow e foi

essencial à visualização moderna das inconsistências de-

mocráticas do sistema majoritário de votação, privilegiando

sempre uma minoria (Cf. ARROW, 1951).

As considerações feitas nesse capítulo, conquanto desenvol-

vidas e voltadas à Economia, guardam grande importância

para a análise econômica do Direito, sobretudo após os tra-

balhos de Gary Becker sobre a criminalidade (BECKER, 1974),

nos quais o autor desenvolveu um modelo de mercado implí-

cito voltado à compreensão dos payoffs envolvidos na opção

de um sujeito quanto à realização de um crime ou não.

As conclusões de Becker auxiliaram o governo norte-ameri-

cano no desenvolvimento de políticas de redução da crimi-

nalidade de uma forma nunca antes alcançada, evidencian-

do o sucesso do método.

O que se pretende neste trabalho, como dito alhures, é a

utilização do método da AED para, através da consideração

da execução fiscal como um mercado implícito, permitir a

análise da repercussão das falhas de mercado e falhas de

Estado sobre os contribuintes e sobre o Estado.

2 A Teoria da Decisão e a Teoria dos Jogos

O funcionamento do Direito consiste basicamente em uma

série de decisões a serem tomadas por seus agentes. Des-

sa forma, pode-se afirmar, um truísmo diga-se, que a exe-

cução fiscal é uma sequência de decisões jurídicas que dão

início a procedimentos, ou os encerram – o que torna es-

sencial a compreensão das bases teóricas do processo de

tomada de decisões racionais (no sentido de uma raciona-

lidade instrumental, voltada à maximização de utilidades).

Um ponto essencial da teoria da decisão é a noção de trade

off. Explica-se, para cada opção realizada pelo sujeito, ele

renuncia às outras opções disponíveis, gerando um custo

de oportunidade, correspondente ao custo da segunda me-

lhor alternativa, devendo ser incluído no custo final da op-

ção realizada (Cf. KRUGMAN et alii, 2006, p.800).

Além disso, deve-se ter em mente que as decisões racio-

nais devem buscar a eficiência como valor-meio para a con-

secução de outros valores – estes diluídos na função de

utilidade (Cf. CARVALHO, 2013, p.65).

Para aferir a eficiência de uma decisão há o clássico cri-

tério do Ótimo de Pareto, consistente na decisão em que

pelo menos um sujeito sofre uma melhora sem que nin-

guém seja prejudicado.

Apesar disso, considera-se mais útil a noção de melhoria

potencial de Pareto, ou Eficiência de Kaldor-Hicks, que exi-

ge somente que os ganhadores tenham ganho o suficiente

para indenizar explicitamente os perdedores em qualquer

mudança, ou seja, nesse caso, em uma decisão eficiente,

poderiam haver vencedores e perdedores, desde que os

primeiros ganhem mais do que os outros percam (Cf. COO-

TER et ULEN, 2010, p.64).

2.1 Risco e Incerteza na Tomada de Decisões

Diante de alternativas excludentes entre si, o sujeito deve

levar em consideração um critério de seleção que leve em

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consideração o risco envolvido e os payoffs de cada deci-

são. É o chamado valor esperado, a soma das probabilida-

des de cada resultado possível vezes o valor de cada um

desses resultados.

Imagine quatro resultados possíveis (R1, R2, R3, R4) e qua-

tro possibilidades, cada uma relacionada com um dos re-

sultados (p1, p2, p3, p4) – nessa situação, o Valor Esperado

será: VE = p1.R1 + p2.R2 + p3.R3 + p4.R4 (Cf. COOTER et

ULEN, 2010, p.65).

Nesse ponto deve-se frisar a distinção entre risco e incerte-

za, em precisa colocação de Frank Knight:

A diferença prática entre as duas categorias, risco e incer-

teza, é que na primeira a distribuição do resultado num gru-

po de casos é conhecida (quer através do cálculo a priori,

quer das estatísticas da experiência passada), enquanto no

caso da incerteza isso não ocorre, em geral devido ao fato

de que é impossível formar um grupo de casos, porque a

situação que se enfrenta é, em alto grau, singular. (KNIGHT

apud CARVALHO, 2013, p.99)

Ou seja, a diferença entre as duas categorias é qualitati-

va, pois o risco pressupõe uma relativa segurança quanto

a estimativa das probabilidades de êxito ou falha de cada

decisão, enquanto a incerteza é resultado de uma situação

de insegurança jurídica, marcada pela impossibilidade de

previsão que, por consequência, impede a tomada de uma

decisão racional através do cálculo do valor esperado.

Além disso, como afirmou Herbert Simon (SIMON, 1957),

os sujeitos possuem uma racionalidade limitada (bounded

racionality), pois a racionalidade de um indivíduo é limitada

pela quantidade de informação que ele possui, os limites

cognitivos no processamento dessas informações e o tem-

po finito disponível para a tomada de decisão.

Dessa forma, a racionalidade é utilizada muito mais para

simplificar o âmbito das decisões possíveis do que para es-

colher a decisão ótima – a sua ausência de capacidade de

analisar todos os aspectos relativos à adequação ótima de

uma escolha fazem com que ele busque uma decisão tão

somente satisfatória.

Os teóricos da Economia Comportamentalista (Behavioral

Economics) buscaram estudar as falhas de cognição e mo-

dos de lidar com elas na tomada de uma decisão racional.

Para tanto, desenvolveram o processo heurístico como uma

forma de redução de incertezas decorrentes da informação

incompleta, auxiliando a tomada de decisão (Cf. CARVA-

LHO, 2013, p.73-74).

Cristiano Carvalho traz alguns desenvolvimentos acerca

das heurísticas mais conhecidas, valendo mencionar (Cf.

CARVALHO, 2013, p.74-76):

a) Representatividade: É a heurística que faz com que

as pessoas estimem a probabilidade de um evento

ocorrer levando em consideração o quanto esse even-

to é representativo de uma classe de eventos. Ex: As-

sociar a incerteza quanto a ocorrência de um furto ao

estereótipo do ladrão maltrapilho;

b) Disponibilidade: É quando o indivíduo estima a fre-

quência de um acontecimento com base na lembrança

mais imediata e disponível. Ex: O medo de manter uma

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caderneta de poupança após o congelamento das con-

tas por um ato do governo;

c) Ancoragem: É a realização de estimativas a partir de

um valor inicial que possuem ou que lhes é dado. Ex:

Conceder cortesias para fidelizar clientes cujas despe-

sas sejam robustas;

d) Imitação: É uma forma simples, baseando-se na imi-

tação do que outros fazem, uma vez que se perceba o

sucesso de determinada ação. Ex: O aumento do in-

vestimento no mercado de capitais após a notícia do

enriquecimento extraordinário de algum investidor;

2.2 As Árvores de Decisão

A teoria da decisão busca desenvolver a metódica das de-

cisões racionais e eficientes, de forma normativa/prescriti-

va, afirmando como elas devem ser. Para que se possa de-

senvolver isso, entretanto, é necessário que o agente tenha

consciência dos atos, estados e resultados envolvidos no

processo decisório. Ou seja, ele está sujeito a condições

(estados de coisa), em relação às quais ele deve realizar

atos, de acordo com os resultados que pretende obter (Cf.

CARVALHO, 2013, p.95-96).

Na Execução Fiscal, o conjunto de normas jurídicas perti-

nentes ao tema, assim como as posições jurisprudenciais e

práticas judiciárias e administrativas farão parte do estado

de coisas que deverá ser levado em conta pelo sujeito no

momento de realizar qualquer decisão nesse âmbito, seja

visando cobrar o tributo, pelo Fisco, seja visando elidi-lo,

para o contribuinte.

A ideia por trás da teoria das escolhas racionais é justamen-

te a percepção de que os estados de coisa não estão sob

o controle do agente, mas devem ser levados em conside-

ração para que se opte por um curso de ações (estratégia)

para alcançar um resultado pretendido. Essas ações se da-

rão através da precisa estimativa dos payoffs decorrentes

de cada opção.

Para a tomada de decisões, utiliza-se o agente das árvores

de decisão, que consistem na representação gráfica das

alternativas e de suas respectivas estimativas, de modo a

permitir a escolha do caminho mais racional a ser tomado,

em relação ao fim pretendido.

A título de exemplo, pode-se pensar no caso de um sujeito

que tenha financiado um carro no valor de R$ 50.000,00.

Ele tem a opção de pagar o valor corretamente ou de discu-

tir judicialmente as parcelas do financiamento (com um cus-

to de R$ 2.000,00), com a possibilidade de reduzir em 50%

o valor a ser pago, mas com uma probabilidade de 10%

de obter êxito, ao passo que há o risco de 90% de ter que

arcar com juros e multas, elevando o montante a ser pago

em 20%. A árvore teria a seguinte estrutura simplificada:

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Pagar

Discutirjudicialmente(R$2.000)

Pagar

Pagar

R$25.000,00

R$50.000,00

R$60.000,00

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Nesse caso, é necessário o cálculo do valor esperado de

cada estratégia de ação, para optar por aquela que seja

mais eficiente. O valor esperado para a opção de discus-

são judicial é igual à soma dos produtos das probabilidades

e dos respectivos payoffs, menos o custo de tomar essa

ação, resultando em um valor esperado de perda é de R$

58.500, enquanto o valor esperado da outra opção (paga-

mento) é de R$ 50.000, o que demonstra que esta é a op-

ção racional a ser seguida.

Deve-se frisar que a definição das estimativas, no âmbito

jurídico, pode se dar de diversas formas: seja através dos

arrojados e modernos estudos de jurimetria e das análises

empíricas das decisões das Cortes, até a análise das Sú-

mulas e da clareza da legislação. A estimativa é subjetiva,

mas pode ser paulatinamente aprimorada com o acréscimo

de informações e o correto trato das mesmas pelo agente.

2.3 A Teoria dos Jogos

Por vezes o Direito envolve situações em que a análise das

ações de um agente só não é suficiente para a escolha da

ação mais adequada, pois a eficiência da ação depende da

decisão de outro agente envolvido neste processo.

É o que a doutrina econômica chama de jogos, pois a pes-

soa precisa desenvolver estratégias que correspondam a

planos de ação aptos a responder da melhor forma possível

às reações dos outros “jogadores” (Cf. COOTER et ULEN,

2010, p.56).

Para a definição de um jogo é essencial delimitar a situa-

ção em termos de ações disponíveis para os jogadores e

os respectivos payoffs, que são funções das ações adota-

das pelos jogadores. A partir disto, deve-se responder às

perguntas: Quem são os jogadores? Quais as ações dispo-

níveis? Qual o momento de cada ação, simultâneas ou se-

quenciais? Há repetição das interações ou se dão somente

uma vez? E por fim, quais os payoffs para cada ação? (Cf.

JACKSON, s/d, p.1-2).

Pelo foco do trabalho, a forma mais rápida de complemen-

tar a exposição é com um exemplo bastante tradicional do

funcionamento da teoria dos jogos: o dilema do prisioneiro

(Cf. COOTER et ULEN, 2010, p.56-57).

Neste caso, duas pessoas – Suspeito 1 e 2 – foram presos e

detidos em salas distintas, de modo a não se comunicarem.

As autoridades os interrogam tentando jogar um suspeito

contra o outro, obtendo a condenação de um pelo depoi-

mento do outro, já que as provas que existem contra eles

são circunstanciais. Se o promotor denunciá-los com essas

provas, os suspeitos serão acusados apenas de uma trans-

gressão menor e receberão uma punição leve (1 ano de pri-

são). Mas se um deles confessar e implicar o outro, o impli-

cado receberá pena pesada de 7 anos de prisão, enquanto

o delator receberá um privilégio que o manterá preso por

somente meio ano. E, por fim, se ambos confessarem, a

pensa será de 5 anos para cada.

As estratégias à disposição de cada um podem ser expos-

tas em uma matriz bem simples:

Dentro dos quadrantes, o número da esquerda representa

o payoff do Suspeito 1, enquanto o número da direita, o

payoff do Suspeito 2. Essa representação matricial também

D

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pode ser posta de forma extensiva, em uma árvore de deci-

são, na forma como foi delineada no item anterior.

Nesse caso, deve-se determinar a estratégia dominante de

cada jogador, que corresponde àquela ação que lhe trará

melhor resultado independente da ação escolhida pelo ou-

tro jogador. Neste caso, a estratégia dominante de ambos é

confessar, pois lhe garante um somatório melhor de payoffs

possíveis, apesar de a ação ótima ser ambos ficarem cala-

dos, sendo denominados de Equilíbrios de Nash os pontos

onde o payoff de um dos jogadores não possa ser aumen-

tado sem reduzir o do outro, dentre as estratégias dominan-

tes – esse é o ponto interessante do Dilema do Prisioneiro,

demonstrando que as ações ótimas não são funções das

estratégias dominantes.

Essa é a estratégia dominante no caso de uma única repe-

tição do jogo, haja vista que no caso de várias rodadas, a

tendência é a indução à cooperação (tit for tat), de modo

que o jogador coopera se o outro tiver cooperado na roda-

da anterior, e se não cooperou, ele também não coopera na

seguinte (AXELROD, 2006).

A possibilidade de repetições infinitas de um determinado

jogo permitem que os jogadores criem expectativas a res-

peito das atuações dos outros, e com isso desenvolvam

estratégias que tendem à otimização de seus payoffs.

Isso se aplica diariamente ao Direito Tributário, desde a de-

cisão mais básica de realizar ou não o fato gerador, consi-

derando a possibilidade de vir ou não a ser autuado pelo

Fisco para pagar o tributo devido, até outras decisões como

a de entrar em um parcelamento ou se manter litigando na

execução fiscal.

Aplicando a teoria dos jogos à decisão de pagar ou não o

tributo, Cristiano Carvalho observa que a decisão que re-

sultaria no resultado ótimo seria a de todos pagarem seus

tributos, pois a arrecadação e geração de bens públicos

seriam maiores, além de permitir a diminuição da tributação

per capita – mas que isso não ocorre porque os indivíduos

buscam racionalmente a situação que lhes traga a melhor

recompensa, gerando o Equilíbrio de Nash, que é inferior à

solução cooperativa, Kaldor-Hicks eficiente.

Com este capítulo, está completamente delineado o instru-

mental metódico que será utilizado para a análise da execução

fiscal, restando necessário somente a exposição sucinta dos

dados empíricos necessários para as avaliações pretendidas.

3 A Execução Fiscal em Números

A AED tem o grande mérito de aproveitar-se do instrumen-

tal de análise de dados construído ao longo dos séculos de

Revista da Faculdade de Direito da Universidade São Judas Tadeuhttp://www.usjt.br/revistadireito/

Suspeito 2

Suspeito 1

Confessar Calar

Confessar -5, -5 -0,5, -7

-7, -0,5 -1, -1Calar

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evolução da Economia, mas esbarra em uma limitação nas

pesquisas jurídicas: a ausência de trabalhos estatísticos a

respeito do funcionamento do Direito no Brasil.

Tal lacuna, entretanto, vem sendo suprida com o desenvol-

vimento da Jurimetria, explicada por Marcelo Guedes da

seguinte forma:

A metodologia própria para o estudo empírico de um uni-

verso de eventos é dada pela Estatística. A Estatística

permite recolher, resumir, interpretare modelar dados da

realidade, esclarecendo como uma determinada popula-

ção de eventos se comporta. A aplicação dos métodos da

Estatística e da Probabilidade ao estudo e elucidação dos

fenômenos jurídicos dá origem à área do conhecimento

que convencionamos chamar de Jurimetria. (COELHO et

NUNES, 2010, p.E-2)

A importância dessa metodologia de pesquisa foi reconhe-

cida pelas autoridades judiciárias, legislativas e executivas

que, cientes da necessidade de estudos quantitativo-empí-

ricos para aperfeiçoar a sua gestão, iniciaram esforços no

desenvolvimento de pesquisas dessa natureza, nas mais

diversas áreas do Direito.

O Direito Tributário e a Execução Fiscal, pela essencial impor-

tância que possuem para o funcionamento do Estado, não

deixaram de receber interessantes levantamentos de dados,

que serão agora utilizados. Trata-se aqui de dois estudos

que darão o material de análise: o “Estudo sobre Execuções

Fiscais no Brasil”, promovido pelo Ministério da Justiça em

2007, e o “O Custo Unitário do Processo de Execução Fiscal

na Justiça Federal”, organizado pelo CNJ e IPEA em 2011.

Inicialmente, é necessária uma visualização ampla da Exe-

cução Fiscal, daí se aproveitar aqui do fluxograma do pro-

cesso de execução previsto na Lei n.6830/80, presente em

um dos Estudos (BRASIL, 2007, p.22):

3.1 A Quantidade de Execuções Fiscais em Tramitação e

o Saldo Líquido Anual

O primeiro dado que é essencial ser levantado é a quantida-

de de execuções fiscais em relação à totalidade de proces-

sos ajuizados, e o trabalho demonstra que a quantidade é

elevadíssima no âmbito da Justiça Estadual de São Paulo e

do Rio de Janeiro, chegando à espantosa marca de 50% de

todos os feitos em tramitação, enquanto na Justiça Federal

a média nacional é de 36,8% (BRASIL, 2007, p.26).

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Pedido

Executado nãoencontrado

Inexistência de bens ou arresto

Arquivamentodo processo

Arquivamentocaso não haja

bens

Arquivamentodo processo

2. Penhora e laudode avaliação

3. Embargos àexecução.prazo: dias4. 1º Leilão

(valor igual ou acimada avaliação)

5. =-92º Leilão(a quem der mais)

6. Arremataçãoou adjudicação

7. Embargos àarrematação

ou adjudicação8. Pagamento ao exequentee arquivamento.

Se houver saldo devedor,há nova penhora

Impugnaçãoou aceitaçãoda penhora

Inexistênciade bens

Executadocomprova

pagamento

Executadonomeia bemà penhora

1. Citação do executadopara pagar e garantir

a execução

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// DIREITO, ARTE E CULTURA | PROCESSO CIVIL | PRIMEIRAS LINHAS // número 4 // segundo semestre de 2017

Além disso, o saldo líquido anual (a relação entre feitos

ajuizados e finalizados) das execuções fiscais demonstra

tendência de rápido acúmulo de processos no âmbito da

Justiça Estadual, com uma taxa de crescimento anual mé-

dio de 20% (idem, ibidem, p.28-29).

Os dados demonstram basicamente que as Execuções Fis-

cais ocupam a maior parte da burocracia judiciária e que a

tendência é passar a ocupar parcelas cada vez maiores, em

razão dos processos não serem finalizados no mesmo ritmo

com que são criados.

3.2 A Dívida Ativa Arrecadada e o Estoque

Outro dado de relevância é a relação existente nos entes

federados entre o valor de Dívida Ativa em estoque, consi-

derada a soma de todas as CDAs válidas e constituídas, e

os valores arrecadados como forma de quitação das res-

pectivas obrigações.

A pesquisa mostrou que a relação entre a arrecadação e o es-

toque da Dívida Ativa da União, no ano de 2005, foi de 0,78%,

e dos Estados a média foi de 0,77% (idem, ibidem, p.43-44),

valores baixíssimos que demonstram que a capacidade de

constituir CDAs não acompanha a eficiência em cobrá-las.

A estatística demonstra que somente com a Lei n.9.964/2000

e a Lei n.10.684/2003, que instituíram regimes de parcela-

mento de débitos tributários de pessoas físicas e jurídicas

que houve um significativo aumento na arrecadação anual

da Dívida Ativa da União, mas em aumento ainda proporcio-

nalmente menor que o do Estoque.

3.3 O Custo da Execução Fiscal para o Executivo

Este tópico está ligado diretamente aos custos do Estado

para implementar a sua arrecadação, o que é fator essen-

cial da medida de eficiência da atividade tributária.

O primeiro dado diz respeito à relação entre o montante ar-

recadado da Dívida Ativa e a Despesa Total do ente federa-

do para a manutenção do aparato de cobrança judicial. Os

dados demonstram que a eficiência das procuradorias es-

taduais é baixíssima em Estados como Rio de Janeiro e Rio

Grande do Sul, com uma relação de 2,15 e 4,67 respectiva-

mente – e em São Paulo, a despesa total é quase três vezes

maior do que a arrecadação, com uma relação de 0,29.

Na União por outro lado, a eficiência é bem maior, com o

custo correspondente, no máximo, à vigésima parte da ar-

recadação total, com saltos nessa relação, chegando à 1/50

nos anos em que há programas de parcelamento vigentes

(idem, ibidem, p.51-53).

3.4 O Custo da Execução Fiscal Federal para o Judicário

No segundo trabalho que foi mencionado, “O Custo Unitá-

rio do Processo de Execução Fiscal na Justiça Federal”, foi

realizada uma pesquisa por amostragem de processos de

Execução Fiscal da Justiça Federal em todo o Brasil, para

identificar o custo que eles geram para o Judiciário.

A metodologia de cálculo utilizou uma complexa fórmula2

que envolve o tempo gasto, a frequência de determinada

etapa do processo de execução fiscal e o salário pago aos

servidores envolvidos, para cada etapa, determinando o

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// DIREITO, ARTE E CULTURA | PROCESSO CIVIL | PRIMEIRAS LINHAS // número 4 // segundo semestre de 2017

preço da execução como a soma dos custos de cada etapa

considerada individualmente (Cf. BRASIL, 2011, p.14).

A partir daí, eles iniciam com uma caracterização minuciosa

da Execução Fiscal média, apontando que a Procuradoria

da Fazenda Nacional e a Procuradoria Federal são respon-

sáveis, conjuntamente, por 59,1% das execuções propos-

tas, enquanto os Conselhos Profissionais ajuizaram 36,4%,

uma quantidade expressiva (idem, ibidem, p.17).

Entretanto, há que se observar que enquanto o valor médio

das execuções propostas pela PGFN é de R$ 26.303,82,

para os Conselhos Profissionais a média é de R$ 1.540,74

(Idem, ibidem, p.18).

O imenso gargalo inicial da execução fiscal é a fase de ci-

tação, onde em 43,5% dos casos o devedor sequer é loca-

lizado, enquanto em 47,4% há uma primeira tentativa sem

êxito, com uma probabilidade de apenas 34,8% do devedor

ser localizada na segunda tentativa de citação. Em 15% dos

casos de citação há penhora de bens, e somente 33% des-

tas penhoras resulta da apresentação voluntária de bens

pelo devedor (idem, ibidem, p.19).

Quanto à defesa do executado, só em 4,4% dos proces-

sos de execução fiscal ocorre algum tipo de objeção de

pré-executividade, e somente 6,4% dos devedores opõem

embargos à execução (idem, ibidem, p.19).

Em regra, uma vez havendo a citação pessoal, o que ocorre

é a extinção da ação de execução fiscal pelo pagamento.

Apenas em 10,3% dos casos há a não apresentação de

bens à penhora ou o oferecimento de defesa. Mas havendo

penhora, apenas 2,6% das ações executivas fiscais chega

à fase de leilão, com ou sem êxito, e em apenas 0,2% o

pregão satisfaz o débito, enquanto a adjudicação é eficaz

em 0,3% dos casos (idem, ibidem, p.19).

Apesar de tudo, a pesquisa demonstra que o grau de su-

cesso das ações de execução fiscal é relativamente alto,

uma vez que em 33,9% dos casos a baixa ocorre em virtu-

de do pagamento integral da dívida, índice que sobe para

45% nos casos em que houve citação pessoal, incluindo,

além do pagamento propriamente dito (7,1%), os casos

de expropriação (0,2%), parcelamento (12,3%), conversão

de depósito em renda (14%) e adjudicação (0,3%) (Idem,

ibidem, p.20).

Quanto às causas restantes de extinção, a prescrição

e a decadência são o segundo principal motivo de baixa

(27,7%). Em seguida, vem o cancelamento da inscrição

do débito (17%) e a extinção sem julgamento do mérito

(11,5%). Causas menores de extinção incluem a remissão

(8%), o julgamento de embargos favoravelmente ao deve-

dor (1,3%), o julgamento de objeção de pré-executividade

favoravelmente ao devedor (0,3%) e o declínio de compe-

tência (0,2%) (Idem, ibidem, p.20).

Algumas ilações são importantes nesse ponto. A primeira

diz respeito aos percentuais praticamente iguais da ex-

tinção por pagamento e por prescrição ou decadência, o

que indica que a probabilidade do executivo fiscal ser bem

ou mal sucedido é praticamente a mesma. O outro dado

importante é a quantidade de execuções extintas por par-

celamento, que corresponde a praticamente um terço das

baixas bem sucedidas para a Fazenda (idem, ibidem, p.20).

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// DIREITO, ARTE E CULTURA | PROCESSO CIVIL | PRIMEIRAS LINHAS // número 4 // segundo semestre de 2017

Outra reflexão é necessária, a respeito da eficiência dos

meios de defesa do executado. Dos executados, apenas

4,4% apresentam objeção de pré-executividade, com êxito

somente em 0,3% dos casos totais, ou seja, uma taxa de

sucesso de 7,4%, e apenas 6,5% apresentam embargos do

devedor, com êxito somente em 1,3%, o que corresponde a

uma taxa de sucesso de 20,2% (idem, ibidem, p.21).

Quanto aos valores arrecadados pelo executivo fiscal, a

pesquisa demonstra que a média de arrecadação é de R$

9.960,48 em principal e R$ 37,69 em custas, enquanto apenas

naqueles extintos por pagamento a média de arrecadação é

R$ 23.751,18 em principal e R$ 100,83 em custas judiciais.

O tempo de duração de uma execução fiscal foi estima-

do pelos pesquisadores em certa de 2.989 dias, noutros

termos, oito anos, dois meses e nove dias (idem, ibidem,

p.22), o que demonstra um crescimento em relação ao tem-

po calculado no ano de 2007, onde o tempo médio era de

sete anos e quatro meses (BRASIL, 2007, p.21), o que cor-

responde a um aumento de 11,6% no tempo de duração,

em um período de cinco anos – uma média de 2,3% ao ano.

Conclui a pesquisa que o custo médio da Execução Fis-

cal de primeiro grau, composto basicamente pela mão-de-

-obra, é de R$ 4.368,00, levando-se em conta o tempo in-

tegral que a ação tramitará, e não somente aqueles em que

houver atuações (idem, ibidem, p.34).

Entre outras conclusões importantes para análises do exe-

cutivo fiscal, vale menção a uma: quanto maior o valor da

causa, mais rápido é o executivo fiscal e maior é a probabi-

lidade de que resulte em pagamento.

Dito isto, deve-se agora realizar a análise desse contingente

de dados empíricos através do instrumental da AED e da

teoria da decisão.

4 A Análise Econômica da Execução Fiscal no Brasil

Conforme foi exposto no primeiro capítulo, algumas tran-

sações ocorridas no âmbito de um mercado geram efeitos,

sejam eles para o bem ou para o mal, que acabam por se-

rem refletidos em partes externas através de benefícios ou

custos externos, ou externalidades positivas e negativas (Cf.

CARVALHO, 2013, p.51) – causando desequilíbrios em ou-

tros mercados ou alterando utilidades de terceiros.

Por vezes o Estado tenta reverter ou corrigir os efeitos das

externalidades, mas acaba gerando desequilíbrios maiores,

nas situações que se configuram como Falhas de Estado.

A teoria dos jogos explica que as estratégias dominantes

são aquelas que permite a maximização da utilidade para

o jogador que a adota, independente da atitude dos outros

jogados. Ou seja, a tendência racional é que se opte pelo

caminho que gerará os melhores payoffs.

Além disso, como foi dito, a repetição infinita de jogos per-

mite que os jogadores adaptem suas estratégias, pois pas-

sam a esperar determinadas condutas do outro jogador.

O que se realizará agora é a análise das externalidades que

afetam o Judiciário, e dos efeitos da repetição de jogos

para os Contribuintes e o Estado (poder executivo).

4.1 Externalidades relativas ao Poder Judiciário

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// DIREITO, ARTE E CULTURA | PROCESSO CIVIL | PRIMEIRAS LINHAS // número 4 // segundo semestre de 2017

As regras processuais, enquanto instrumentos de aplicação

do Direito Material tem um custo administrativo para o seu

uso, pois demandam a mobilização de todo um corpo de

burocratas para que se operem as várias etapas que com-

põe o procedimento adequado à tutela do direito.

O que se observou dos dados levantados pelas pesquisas

compulsadas foi que o custo do processo de execução fis-

cal não é uma função do valor do crédito tributário que se

busca executar, apesar de apresentar um relativo aumento

na possibilidade de pagamento e uma redução no tempo

total quanto maior for o valor discutido.

O custo financeiro médio de uma execução fiscal foi calcu-

lado em R$ 4.368,00, como uma função da mão-de-obra e

da duração do processo. Entretanto, esse valor é superfi-

cial, e não demonstra o efetivo dispêndio que o Judiciário

tem por conta das execuções fiscais.

Explica-se: analisando o percentual de execuções fiscais

nas Justiças Estadual e Federal, o que se visualiza são nú-

meros astronômicos, em torno de 36,8% neste, e chegando

até em 50% naquela outra – sem prejuízo do saldo positivo

de 20% todos os anos, em relação às execuções propostas

e as finalizadas, que evidenciam uma proporção crescente

de forma bastante acelerada.

Ora, agregado ao custo calculado pelo IPEA há que se co-

locar também uma parcela referente aos gastos com mo-

dernização e ampliação do aparato Judiciário, podendo de

forma aproximativa vincular o percentual investido com o

percentual de processos de execução presentes em um de-

terminado âmbito – o que permite a conclusão de que mais

de um terço dos investimentos de ampliação e moderniza-

ção o são em função das execuções fiscais.

Fundamentalmente, é a cultura organizacional burocrática e

formalista, associada a um modelo de gerenciamento pro-

cessual ultrapassado, que torna o executivo fiscal um pro-

cedimento moroso e propenso à prescrição (BRASIL, 2011,

p.24). Não é a toa que a estatística demonstra que a segun-

da maior causa de baixas é a prescrição ou a decadência,

frutos de um aparelho moroso, paquidérmico.

Quanto mais devagar funciona o Judiciário, por conta da

incapacidade de dar vazão à grande quantidade de exe-

cuções fiscais, mais cresce o percentual de baixas rela-

cionadas com a prescrição e a decadência, bem como as

remissões e anistias – muitas vezes concedidas como ins-

trumento de barganha política, derivada de uma das mais

graves falhas de Estado, a corrupção.

Dessa forma, o que ocorre é uma diminuição nos valores

esperados relacionados com a opção do Fisco em execu-

tar, e um aumento no valor esperado do Contribuinte de não

pagar, pois são funções do citado percentual.

4.2 As Estratégias de ação do Executivo

Alguns pontos saltam aos olhos quando se discute as re-

percussões do mercado das execuções fiscais sobre o Exe-

cutivo e a sua representação judicial.

O primeiro ponto é a baixíssima relação entre o montante

arrecadado pelas procuradorias estaduais e a despesa total

dos mesmos, especialmente se cotejadas com Procurado-

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ria Geral da Fazenda Nacional, muito mais eficiente. Isso se

dá em grande parte pela maior quantidade de informações

disponíveis à Fazenda Nacional, permitindo-lhe atingir com

mais segurança o contribuinte.

É necessário que as Procuradorias se modernizem, atra-

vés de uma integração maior de informações e de recursos,

tanto entre si, como com os órgãos administrativos, como

forma de combater também outro dado alarmante: a relação

entre o Estoque da Dívida Ativa e o montante arrecadado.

Este dado demonstra que se produz CDAs em uma velo-

cidade maior do que o Estado consegue cobrá-las – ge-

rando um déficit de confiabilidade nas mesmas, por criar

nos contribuintes a sensação de que a sua dívida nunca

será cobrada. Uma atuação conjunta das Procuradorias e

dos Agentes Administrativos deve ser voltada à produção

de títulos que abarquem valores maiores, cujas responsa-

bilidades tributárias tenham sido definidas desde o âmbito

administrativo, e com correção formal – evitando a grande

quantidade de execuções inócuas.

Os dados indicam claramente que o piso mínimo para o

ajuizamento de ações de Execução Fiscal pela PGFN deve

ser aumentado para além dos atuais R$10.000,00.

Não basta levar em conta simplesmente o custo médio da

Execução Fiscal para calcular esse piso, pois além desse

custo, há o custo da burocracia executiva, o aumento da

quantidade de execuções no Judiciário, prejudicando o an-

damento daquelas de valor realmente substancioso – de

forma sintética, gera muito esforço para pouco retorno, e

perde recursos que poderiam ser aplicados em devedores

com créditos e liquidez maiores.

Por outro lado, o aumento do patamar mínimo para cobran-

ça geraria nos contribuintes o sentimento de que não há

obrigatoriedade de arcar com execuções fiscais cujo mon-

tante seja menor do que o mínimo, gerando inadimplência.

Neste ponto vale lembrar um dado: quanto maior o valor da

causa, mais rápido é o executivo fiscal e maior é a probabili-

dade de que resulte em pagamento. Isso leva a uma singela

ilação de que se devem privilegiar os meios indiretos de

cobrança para os créditos tributários de menor valor, en-

quanto os meios diretos para aqueles de maior valor, como

forma de aproveitamento do crescimento do percentual de

pagamento e redução do tempo de execução nas dívidas

de maior monta, geralmente cobradas de sujeitos de mais

provável liquidez.

Algumas sugestões são postas no trabalho publicado em

2007 pelo Ministério da Justiça:

i) Restringir o crédito público em caso de não paga-

mento dos débitos constantes na dívida ativa ou, pelo

menos, condicioná-los a um plano de pagamento; tra-

ta-se de outra forma de se evitar o processo judicial e

obter a satisfação da dívida.

ii) Condicionar a autorização de participação em lici-

tações (ou outra modalidade de contratação com o

Poder Público) ao cumprimento ou alguma forma de

transação da dívida pode ser mais eficiente que o ajui-

zamento de uma execução fiscal.

iii) Protesto da certidão da dívida ativa que, para alguns,

como é o caso do representante do Tribunal de Justiça

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do Rio de Janeiro, é providência abusiva e ilegal. Sus-

tenta-se que o Poder Público tem outros mecanismos

para efetivas a cobrança. (BRASIL, 2007, p.69).

Analisar de forma gráfica as opções do Fisco, bem como

as respectivas estimativas dos payoffs resultantes facilita a

compreensão da opção que se deve fazer:

Trata-se claramente de uma simplificação que elimina uma

série de outros custos envolvidos, como o custo da Procu-

radoria, os custos de eventual sucumbência em embargos

do devedor, e o tempo da demanda, que amplia severa-

mente seus custos naturais.

Apesar disso, fica claro que em uma execução de R$

10.000,00, o Valor Esperado do êxito, em razão da baixa

eficiência da Execução Fiscal, é menor do que o custo mé-

dio do processo, o que torna irracional o ajuizamento dessa

execução – devendo o Executivo, nesse caso, optar pelos

meios indiretos de cobrança.

Na hipótese levantada, seria necessário que o percentual

de sucesso fosse de aproximadamente 73% para que pas-

sasse a ser racional a decisão de executar uma CDA no

valor de R$ 10.000,00, haja vista que a condição de racio-

nalidade da decisão é que o Custo do Processo fosse igual

à soma dos Valores Esperados para os possíveis payoffs.

Em matemática singela, considerando o custo médio da

execução fiscal, torna-se racional a opção pela via de co-

brança direta nas seguintes situações: a) o percentual de

sucesso é igual ou maior a 73%, ou b) o valor da CDA é

igual ou maior que R$ 20.000,00. Isso sem contar os outros

custos (de difícil contabilização) que foram mencionados,

mas postos fora da árvore de decisão, que acabariam por

aumentar o valor mínimo da CDA – mas que por questões

pragmáticas serão desconsiderados aqui.

4.3 Externalidades relacionadas com o Contribuinte

Ninguém é tão atento à relação entre comportamentos e

payoffs do que o Contribuinte. A sociedade civil é, por na-

tureza, muito mais eficaz na produção de riqueza e na ado-

ção das estratégias mais eficientes do que o Poder Público,

dada a sua capacidade de rápida adaptação a novos es-

tados de coisas, condicionando de pronto suas decisões.

As normas jurídicas funcionam para os contribuintes como

um sistema de preços, e eles agem de acordo com o sis-

tema de incentivos. Como explica Raz, há situações em

que até o violador contumaz adapta-se à norma, desde que

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CDAR$10.000

C=-4.638,00

Execu

tar

36,3% R$ + 10.000,00

Insucesso63,7%

Suce

sso

R$ - 10.000,00 VE = - 6.370

VE = 3.630

Não Executar

R$ 0

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tenha uma forte convicção de que a sanção prevista será

aplicada eficazmente (RAZ, 1999, p.125).

Foi Gary Becker que percebeu isto, ao conceber o mercado

do crime, onde o criminoso age como um sujeito racional,

guiando-se pela sanção esperada, e não pela sanção pre-

vista na norma geral e abstrata, sopesando o risco que ele

corre de ser pego e os benefícios da prática do crime (BE-

CKER, 1974).

Da mesma forma o contribuinte pauta suas condutas: exa-

mina o ônus que terá pagando o tributo e o sopesa com

o risco de ser pego no ato de sonegação, conjuntamente

com as sanções que serão realmente aplicadas a ele, e não

aquelas nominalmente previstas em lei.

Como aponta Cristiano Carvalho, há também formas alter-

nativas de sanção que devem ser levadas em conta pelo

contribuinte no momento da escolha: as sanções políticas.

A inclusão no cadastro de devedores, a negativa de certidão

de regularidade fiscal, bem como a proibição de emissão de

notas fiscais, são medidas que indiretamente geram uma

grande pressão sobre o devedor, muitas vezes inviabilizan-

do a sua atividade econômica e gerando prejuízos maiores

do que simples multas (Cf. CARVALHO, 2013, p.226).

Outro ponto também deve ser levantado para a compreen-

são das estratégias a serem assumidas pelo Contribuinte.

Diferente do Estado, que arca com um custo médio de R$

4.638,00 para pagar a burocracia relacionada à prestação

jurisdicional, o Contribuinte tem como custos de ingresso

somente a contratação de um advogado (que se pode es-

timar aqui em 10% do valor da causa) e as custas judiciais,

calculadas em uma média de R$ 100,00. Isso lhe garante

um Valor Estimado menor pela reinvindicação judicial para

que justifique um ingresso no Judiciário.

De qualquer forma, deve-se montar a árvore da decisão

para examinar as externalidades da execução fiscal sobre

o contribuinte:

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Fatogerado R$10.000

Cumpri

r Cumpri

r

Suced

ida

R$ 0R$ 0

Não autuadop = 0,8

Autu

ado

p =

0,2

R$ - 10.000,00

Principal + multa de 75% =R$ - 17.500,00

R$ - 17.500,00

ExecuçãoC = R$1.850,00

R$ - 17.500,00

Descumprir

Descumprir

Falha

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Algumas pequenas considerações devem ser colocadas a

respeito do modelo construído:

1) Estipulou-se uma taxa (otimista, diga-se) de 20% de

chance de autuação do contribuinte sonegador;

2) Padronizou-se a multa de descumprimento no valor

de 75%, eliminando do cálculo os juros e a correção

monetária do crédito;

3) Diante da baixíssima eficiência dos meios de defesa

do contribuinte na execução, limitou-se o trata da exe-

cução como bem ou mal sucedida, independente da

atuação do Contribuinte para se defender; e

4) os percentuais de sucesso e malogro da execução

fiscal foram mantidos iguais àqueles do modelo anterior.

Como se pode ver facilmente pelo cálculo do Valor Espera-

do em cada uma dessas operações, independente do curso

de ação adotado pelo Fisco, a opção do contribuinte de

negar-se a pagar será sempre economicamente mais bené-

fica – o que permite inferir que a conduta racional do con-

tribuinte nesta situação seria sempre sonegar e resistir às

autuações e execuções.

Isso demonstra que a alternativa de pagar se torna o ca-

minho racional em uma dessas duas hipóteses: a) Um per-

centual de autuação maior do que 57%; ou b) O valor da

multa corresponde a quatro vezes o valor do tributo devido.

Ambas as condições apresentam-se distantes da atual rea-

lidade jurídica brasileira – quanto a primeira, o Fisco não

goza de um aparato fiscalizatório que alcance tamanha efi-

ciência, enquanto a segunda encontra barreira no princípio

do não-confisco e a sua extensão garantida pelo Supremo

Tribunal Federal às multas sancionatórias.

Novamente, a teoria dos jogos permite alcançar a conclu-

são de que diante da ineficiência do aparato fiscalizatório

do Estado e do baixo percentual de sucesso nas execu-

ções, a tomada de sucessivas ações de resistência fiscal é

a estratégia dominante para o Contribuinte, independente

da estratégia adotada pelo Fisco, pois é a que lhe trará me-

lhores payoffs.

Isso ressalta a importância dos meios indiretos de cobran-

ça para forçar o pagamento, especialmente nos casos de

tributos cuja multa seja menor, ou daquelas cuja fiscaliza-

ção seja com maior dificuldade, como forma de otimizar a

arrecadação e compensar a natural e racional resistência

perante os meios de cobrança direta.

Além disso, a medida apontada anteriormente de amplia-

ção do intercâmbio de informações entre os entes federa-

dos contribui para que a o percentual de autuações cresça,

com um incremento na capacidade fiscalizatória.

De qualquer forma, são necessárias uma série de medidas

que representem um primeiro passo no sentido de tornar

o pagamento a estratégia dominante do contribuinte, bus-

cando dessa forma fazer coincidir o Equilíbrio de Nash e o

Ótimo Kaldor-Hicks na atividade tributária.

CONCLUSÕES

Este trabalho teve como objetivo realizar uma análise eco-

nômica da execução fiscal e as decorrências das falhas de

mercado e das falhas de Estado envolvidas na atividade de

cobrança direta de tributos por meio do procedimento de

Execução Fiscal.

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Para isto, utilizou-se do instrumental metodológico da Es-

cola da Análise Econômica do Direito, para aclarar noções

técnicas relativas às falhas possíveis em um mercado, bem

como a possibilidade de modelização de um mercado im-

plícito à partir da execução fiscal.

Em seguida, apresentaram-se rudimentos a respeito da

teoria da decisão e da teoria dos jogos aplicada à análise

de estratégias e a construção de árvores de decisão.

O terceiro capítulo tratou de expor dados empíricos obtidos

em dois trabalhos de Jurimetria desenvolvidos pelo Estado:

o “Estudo sobre Execuções Fiscais no Brasil”, promovido

pelo Ministério da Justiça em 2007, e o “O Custo Unitário

do Processo de Execução Fiscal na Justiça Federal”, orga-

nizado pelo CNJ e IPEA em 2011.

O quarto e último capítulo foi utilizado para realizar a análise

dos dados que haviam sido expostos e construir conclu-

sões a respeito dos efeitos do atual estado das execuções

fiscais sobre o Judiciário, o Executivo e o Contribuinte, che-

gando às seguintes conclusões, em súmula:

i) O custo médio da execução fiscal apresentado pela

pesquisa omitiu gastos importantes relacionados com

o desenvolvimento do aparato burocrático, que contri-

buem para encarecer essa via de cobrança;

ii) A morosidade do Judiciário e a baixa eficiência das

execuções contribuem para diminuir o percentual de

sucesso nas cobranças que, por fazer parte da função

de determinação dos Valores Esperados do Fisco e do

Contribuinte, acabam estimulando a inadimplência e

desestimulando a propositura de execuções fiscais;

iii) Considerando o custo médio da execução fiscal e o

modelo apresentado, torna-se racional a opção do Fis-

co pela via de cobrança direta nas seguintes situações:

a) o percentual de sucesso para eles é igual ou maior

que 73%, ou b) o valor da CDA é igual ou maior que R$

20.000,00 – o que evidencia uma necessidade urgente

de remodelar o piso das execuções fiscais da PGFNi

e a estipulação do mesmo para outras procuradorias;

iv) O intercâmbio de informações entre os entes tribu-

tantes é medida que aumenta a possibilidade de en-

contrar o devedor, gerando acréscimo substancial no

percentual de sucesso da execução, ao passo que au-

menta também a eficiência nas autuações – condições

que contribuem para tornar menos atrativa a opção do

contribuinte pela resistência fiscal;

v) A alternativa do contribuinte de pagar o tributo so-

mente se torna o caminho racional, consideradas as

circunstâncias do modelo proposto, em uma dessas

duas hipóteses: a) Um percentual de autuação maior

ou igual a 57%; ou b) O valor da multa corresponde

a pelo menos quatro vezes o valor do tributo devido.

Ambas as condições apresentam-se distantes da atual

realidade jurídica brasileira, por motivos diversos que já

foram explanados.

vi) Isso também demonstra que o valor do tributo devi-

do não influencia diretamente a escolha do contribuinte

por pagar ou não o tributo devido. A influência desse

fator no cálculo da estratégia dominante se dá em ra-

zão de outras condições ligadas ao funcionamento da

empresa e o risco operacional envolvido na judicializa-

ção de demandas tributárias;

vii) A teoria dos jogos permite concluir que a tomada

de sucessivas ações de resistência fiscal (seja não pa-

i. Esse piso atualmente foi elevado para o valor de R$ 20.000,00 no dia 26 de Março e 2012, refletindo precisamente as conclusões que foram encontradas neste trabalho cuja confecção original, e inédita, se deu em Janeiro de 2012, antes da divulgação desse novo valor.

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gando o tributo devido, ignorando a autuação ou con-

testando a execução) é a estratégia dominante para o

Contribuinte, independente da estratégia adotada pelo

Fisco, lhe trazendo melhores payoffs;

viii) O intercâmbio de informações, a economia de recur-

sos (com um piso superior para as execuções fiscais) e o

aprimoramento dos meios de cobrança indiretos são me-

didas economicamente eficazes no sentido de tornar o

pagamento a estratégia dominante do contribuinte, bus-

cando dessa forma fazer coincidir o Equilíbrio de Nash e

o Ótimo Kaldor-Hicks no jogo da cobrança tributária.

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D

Notas

1. De forma singela, os economistas chamam de marginais as mudanças em relação ao nível inicial do sujeito. Dessa forma, um tomador de decisões pode ampliar a produção de algo através de uma decisão que imponha um custo marginal x, mas que traga um benefício marginal y, onde y>x. Enquanto o benefício for maior que o custo, a tendência racional é que o sujeito amplie os custos para gerar ainda mais benefícios (decrescentes em suas quanti-dades) até o momento que o y=x, no qual atingiu-se o nível ótimo de produção (Cf. COOTER et ULEN, 2010, p.45-46)

2. A formula utilizada foi a seguinte: PEFM = ∆twz(a) + ∆twz (b) + ∆twz(c) + ∆twz(d) + ∆twz(e) + ∆twz(f) + ∆twz(g) + ∆twz(h) + ∆twz(i) + ∆twz(j) + ∆twz(k) + ∆twz(l) + ∆twz(m) + ∆twz(n) + ∆twz(o). De forma sucinta, ela representa a soma dos produtos do intervalo de tempo médio, em minutos, para uma determinada etapa, a frequência com que essa etapa ocorre, e o valor médio, por minuto, da remuneração dos servidores envolvidos nessa etapa. As etapas consideradas foram as seguintes: a) autuação; b) despacho inicial; c) citação pelo correio (AR); d) citação por oficial de justiça; e) citação por edital; f) mandado de penhora e avaliação; g) leilão; h) vista ao exequente; i) objeção de preexecutividade; j) embargo do devedor ou de terceiros; k) agravo; l) apelação; m) recurso especial ou extraordinário; n) sentença; o) baixa definitiva. (Cf. BRASIL, 2011, p.14)

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