análise de texto teatral

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Análise de texto teatral – “O Tuculento” de Plauto Titus Maccius Plautus, ou simplesmente Plauto, nasceu na cidade de Sarsina, situada na região central da Itália, em torno de 254 a.C.. Mudou-se para Roma ainda muito jovem. Foi soldado, ator, comerciante fracassado e moleiro antes de se tornar dramaturgo, aos 45 anos. Acredita-se que tenha sido cenógrafo ou carpinteiro para o teatro, e que esse ofício despertou seu interesse pela arte; seu talento para a atuação foi, eventualmente, descoberto, e adotou então os nomes “Titus Maccius” cuja tradução em latim de aproxima de “palhaço pé- chato”. Suas comédias estão entre as obras mais antigas em latim preservadas até os dias de hoje, entretanto boa parte das obras que se estima terem sido escritas por ele foram perdidas ou apresentam lacunas. Entre suas peças mais conhecidas estão Aululária (A comédia da panela), O Gorgulho, os Prisioneiros, Amphitruo (O Anfitrião, uma embrulhada de sósias), Captivi (Os Cativos) e Miles gloriosus (O soldado fanfarrão). Plauto foi um dramaturgo popular numa época em que o teatro romano ainda estava em sua infância, e era muito pouco desenvolvido. Paralelamente, a República Romana cada vez mais ampliava seu poder e influência no mundo Mediterrâneo. “O Truculento” foi escrito nesse contexto no Período Helenístico, mais precisamente em 189 a.C., já em período tardio da vida do autor. Nessa e em outras obras, Plauto chama atenção para o ambiente grego, assim suas comédias pertencem a uma categoria camada palliata, ou seja, comédias de assunto grego, em que as personagens usam o “pallium”, um manto grego. A palliata, ao invés da comédia grega “nova”, é um teatro que podemos classificar como musical. Apesar de conter características gregas, a peça desenrola-se em Atenas e se passa no período em que foi escrita. Em geral, a obra do dramaturgo inspirou-se na chamada comédia nova: uma fase da comédia caracterizada por não tratar de assuntos sérios como os de âmbito socio-economico ou intelectual, sem a presença do coro e com um foco muito maior no lar e na unidade familiar. A obra “O Truculento” não foi produzida durante essa fase, que durou de 323 a.C. até 260 a.C., no entanto não só ela como as outras obras de Plauto apresentam algumas características da comédia nova, como nos enredos, que giravam em torno de identidades falsas, intrigas familiares e amorosas. A exemplo disso estão algumas obras mais famosas do autor, como “Curculio” (ou O Gorgulho) e Amphitruo (ou Anfitrião). Outros assuntos bastante tratados em suas peças são a ganância e avareza, visivelmente

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Análise de texto teatral – “O Tuculento” de Plauto

Titus Maccius Plautus, ou simplesmente Plauto, nasceu na cidade de Sarsina, situada na região central da Itália, em torno de 254 a.C.. Mudou-se para Roma ainda muito jovem. Foi soldado, ator, comerciante fracassado e moleiro antes de se tornar dramaturgo, aos 45 anos. Acredita-se que tenha sido cenógrafo ou carpinteiro para o teatro, e que esse ofício despertou seu interesse pela arte; seu talento para a atuação foi, eventualmente, descoberto, e adotou então os nomes “Titus Maccius” cuja tradução em latim de aproxima de “palhaço pé-chato”. Suas comédias estão entre as obras mais antigas em latim preservadas até os dias de hoje, entretanto boa parte das obras que se estima terem sido escritas por ele foram perdidas ou apresentam lacunas. Entre suas peças mais conhecidas estão Aululária (A comédia da panela), O Gorgulho, os Prisioneiros, Amphitruo (O Anfitrião, uma embrulhada de sósias), Captivi (Os Cativos) e Miles gloriosus (O soldado fanfarrão).

Plauto foi um dramaturgo popular numa época em que o teatro romano ainda estava em sua infância, e era muito pouco desenvolvido. Paralelamente, a República Romana cada vez mais ampliava seu poder e influência no mundo Mediterrâneo. “O Truculento” foi escrito nesse contexto no Período Helenístico, mais precisamente em 189 a.C., já em período tardio da vida do autor. Nessa e em outras obras, Plauto chama atenção para o ambiente grego, assim suas comédias pertencem a uma categoria camada palliata, ou seja, comédias de assunto grego, em que as personagens usam o “pallium”, um manto grego. A palliata, ao invés da comédia grega “nova”, é um teatro que podemos classificar como musical.

Apesar de conter características gregas, a peça desenrola-se em Atenas e se passa no período em que foi escrita. Em geral, a obra do dramaturgo inspirou-se na chamada comédia nova: uma fase da comédia caracterizada por não tratar de assuntos sérios como os de âmbito socio-economico ou intelectual, sem a presença do coro e com um foco muito maior no lar e na unidade familiar. A obra “O Truculento” não foi produzida durante essa fase, que durou de 323 a.C. até 260 a.C., no entanto não só ela como as outras obras de Plauto apresentam algumas características da comédia nova, como nos enredos, que giravam em torno de identidades falsas, intrigas familiares e amorosas. A exemplo disso estão algumas obras mais famosas do autor, como “Curculio” (ou O Gorgulho) e Amphitruo (ou Anfitrião). Outros assuntos bastante tratados em suas peças são a ganância e avareza, visivelmente presente em “O Truculento” na atitude da personagem principal, a meretriz Fronésio e sua escrava, Astáfio, e que também se pode encontrar em outras obras do autor, como em Aulularia (ou A Comédia da Marmita), conhecida peça de Plauto.

Não se pode afirmar que a obra O Truculento lhe assegure no campo do cômico um lugar excepcional, ou sequer entre as outras obras do próprio Plauto, talvez pela enorme quantidade de lacunas.

Homem vestindo Pallium

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De qualquer forma, nas peças plautinas certos aspectos característicos da sociedade romana não estariam assim longe da realidade. Na peça em questão, nota-se uma crítica de plauto à natureza inescrupulosa e manipuladora das cortesãs na época em que a obra foi escrita, e ainda hoje o cômico dessa situação se preserva, no entanto com a crítica muito mais suavizada, quando aplicada ao comportamento autoritário de dissimulado de algumas mulheres. De qualquer forma, a peça reforça o estereótipo das meretrizes como mulheres cúpidas e gananciosas. As personagens Fronésio e Astáfio confirmam esse comportamento em diversos trechos da obra, na Cena II do Ato I notamos isso claramente no diálogo entre Astáfio (escrava e ajudante de Fronésio) e Diniarco (jovem ateniense explorado por Fronésio até a ruína), onde este era tratado com indiferença por Astáfio, que julgava já terem conseguido tirar tudo do jovem: “Diniarco: Ó Astáfio, tu antes não costumavas falar-me nesse tom, mas carinhosamente, quando eu ainda tinha em minha casa aquilo que agora está na vossa. Astáfio: Conhece-se um homem enquanto ele está vivo. Logo que morre, paz à sua alma! Quando tu estavas vivo, eu conhecia-te. [nesse trecho, “morto” é uma metáfora para “arruinado”]Diniarco: Julgas, porventura, que eu estou morto?Astáfio: Diz-me, acaso poderia estar mais claro? Tu que anteriormente eras considerado como o amante mais importante, agora não tens para oferecer à tua querida mais do que lamentos.” Um cliente sem dinheiro é para as cortesãs como se fosse um homem morto, no entanto mais a frente, quando Diniarco afirma ainda possuir alguns bens, a indiferença de Astáfio é substituída por um súbito interesse mascarado com ternura: “Diniarco: Por Hércules, eu ainda não estou completamente morto! Ainda tenho terras e uma casa.Astáfio: (mudando repentinamente de tom) Então, diz lá, porque é que estás especado diante da porta como um desconhecido e um estrangeiro? Vá, entra! Na verdade tu não és um estranho! Com efeito, por Castor, ela hoje não vai amar ninguém mais do que a ti, no seu coração e na sua alma, se realmente tu possuis terras e uma casa!”. A Própria Fronésio confirma isso em sua fala no quarto ato (Cena IV): “(...)É verdadeiro o velho provérbio que diz: “onde há amigos, há riqueza”. Graças a ele, tenho esperança de que ainda hoje irá ser enganado o soldado [Estratófanes] que, por Castor, eu amo mais do que a mim própria enquanto puder tirar dele aquilo que desejo! Embora tiremos muito, muito daquilo que nos foi dado nunca aparece! É esta a reputação das meretrizes!”.

A chave para se entender essa crítica para a sociedade romana da época é compreender que freqüentavam o teatro todas as classes sociais, e que este era uma forma de passagem de aprendizado para a população. Se o público ria, é porque reviam no palco muitas atitudes que se praticavam no dia a dia, de forma mais ou menos encoberta.

Além da visão romana das meretrizes, a obra também releva diversos outros aspectos da sociedade do século II e III a.C., que ajudam inclusive a entender o modo de viver das pessoas naquela época. Na segunda e cenas do quarto ato, por exemplo, há algumas menções curiosas quanto ao ponto de vista legal, como no trecho “Agora, por Hércules, ó sedutora, eu vou escarnecer de ti com a minha gritaria em plena rua, já que, violando a lei, aceitaste dinheiro de muitos amantes ao mesmo tempo!” ou na terceira cena desse ato, em que Cálicles aparece com duas escravas de Fronésio que, perante açoites, confessaram o plano da cortesã de usar o filho de Diniarco para fingir ser do soldado Estratófanes e assim conseguir extrair-lhe os bens, concluindo assim que os escravos podiam ser sujeitos a espancamento e a suplícios específicos, e que perante o sistema judicial romano era válida a confissão obtida junto de escravos sujeitos a sevícias. Além, é claro, da própria relação servo-amo que havia naquela época.

Observa-se ainda o sistema monetário romano, pois na peça são citadas minas de ouro, Felipes (moeda grega que valia 80 minas de ouro), moedas de prata, além de outras formas de se comprar bens ou, nesse caso, o amor das meretrizes, como ovelhas, perfumes, incensos, jóias, etc. Observa-se também que já naquele tempo, uma moça de família deveria

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oferecer dotes ao noivo, e que moças que não mais eram virgens dificilmente casavam-se e tinham, então, que se tornar mulheres de vida fácil. No entanto, a principal característica da sociedade passada pela peça é afinal o modo de vida das cortesãs e a firma como era tratada a sexualidade na Roma antiga. É tópico habitual da comédia que a violência sexual seja induzida em dia de festa e de bebedeira, o texto nos deixa diante dos traços mais característicos da misoginia antiga, a imagem da mulher beberrona, em especial a ama. Quanto a esse modo de ver as mulheres, a maior expressão disso na peça é a cena IV do primeiro ato, cena que se dá em frente à casa de Estrábax, que inspira o nome do livro e pode até ser considerada a cena mais cômica da peça. Trata-se de um diálogo entre Truculento, o escravo de Extrábax, e Astáfio, onde os ataques desferidos mutuamente são de um primor extraordinário, como exemplo a fala de Extrábax: “Estou-me nas tintas para a tua saudação! Não a aceito, não estou de saúde! Preferia estar doente a estar de saúde com a tua saudação. O que eu quero saber é a que se deve a tua presença aqui em nossa casa.” Por nada deste mundo o servo Truculento quer conversas com Astáfio, pois sabe que a desavergonhada é capaz de propor tudo a um camponês, só para rir ou aproveitar-se dele. Ainda por cima, o servo pronuncia mal as palavras, trocando sentidos que vão todos eles desembocar no erotismo, o que é constante não apenas nessa cena, mas ao longo de toda a peça.

Personagens

Lista de personagens por ordem de entrada:Diniarco, jovem (amante de Fronésio);Astáfio, criada (de Fronésio);Truculento, escravo (de Estrábax);Fronésio, meretriz;Estratófanes, soldado (amante de Fronésio);Cíamo, escravo (de Diniarco);Estrábax, jovem (rústico, amante de Fronésio);Cálicles, velho;Cabeleireira (de nome Sira);Criada (de Cálicles);Escravos Açoitadores.

Plauto não se preocupou muito em expressar nas suas comédias o estado de alma das personagens. É basicamente o que acontece em O Truculento, peça que apresenta um elenco de personagens convencionais: o jovem ateniense, apaixonado e gastador (Diniarco); a serva esperta e sagaz (Astáfio); o escravo de modos brutais e que dá o nome à peça (Truculento); a mais cúpida das cortesãs de Plauto (Fronésio); o soldado fanfarrão, rival de Diniarco (Estratófanes); o escravo de Diniarco (Cíamo); o jovem camponês, adversário de Diniarco (Estrábax); o velho (Cálicles); a cabeleireira de Fronésio (Sira); e ainda personagens menos relevantes: uma escrava de Cálicles e escravos açoitadores. Observemos como Plauto retratou cada uma destas personagens.

Diniarco é o típico jovem apaixonado, urbano, que arruinou o seu patrimônio ao serviço da cortesã Fronésio. Diniarco revela-se constantemente como um irresponsável, um gastador nato, cujos verdadeiros sentimentos morais pouco lhe importam, assim como os bens que possa gastar com a cortesã. É por isso que diz logo na primeira cena do ato inicial: “(...) Tal como o pescador que lança a rede para o viveiro — logo que a rede vai ao fundo, puxa a linha e, se o peixe tiver entrado na rede, trata de não o deixar escapar, cercando o peixe com a rede por todos os lados até o tirar para fora —, assim sucede com o amante. Se ele dá o que lhe é pedido e é mais generoso do que agarrado aos seus bens, concedem-se-lhe mais algumas

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noites; durante esse tempo ele morde o isco.” A imagem, para ele, pouco contava. Louco de amores por uma cortesã aproveitadora. Ao permitir que a cortesã pudesse utilizar o seu filho com sua prometida esposa, filha de Cálides, a fim de obter mais graças e deleites do soldado que chegava a Roma depois de 9 meses em guerra, Diniarco torna-se horrendo, quase monstruoso. Uma atitude de tal calibre é difícil de entender seja em que época for.

Astáfio é uma escrava inteligente, ligeira nas afirmações, hábil nas atitudes e pensamentos, e uma dominadora das situações, cujas intervenções constantes, além de ajudarem Fronésio a lidar com seus amantes, são decisivas para apurar mais bens para a casa da ama.

Fronésio é a rainha das cortesãs de Plauto, a mais desejada e cúpida das meretrizes plautinas. Fronésio explora sem qualquer pudor os seus três amantes: Estratófanes, Diniarco e Estrábax. Para continuar extraindo riquezas do soldado, Estratófanes, Fronésio arma um plano que sugeria a suposta existência de um filho entre os dois, que na verdade pertence a Diniarco e outra moça, mas Diniarco, bêbado de amores por Fronésio, acaba por “emprestar” a criança na esperança de voltar a ser o principal amante da meretriz como nos velhos tempos.

Estratófanes é um típico soldado romano. Inofensivo e ingênuo como os outros que se entregam a Fronésio, é enganado por completo e no fim perde o que julgava ter adquirido por direito próprio. O personagem de Estratófanes reflete quase que completamente o Soldado Fanfarrão da peça homônima (ou no latim Miles Gloriosus) e muito conhecida de Plauto. Uma reprodução incontestável do fanfarrão, ele tende a achar-se sempre melhor do que é, fato que acaba por colocá-lo perante situações ridículas. Essa classe teria na verdade poucos homens dignos.

Quanto ao servo de Diniarco, Cíamo, apesar de observar com perspicácia e entender perfeitamente tudo o que o rodeia, tenta ajudar o seu patrão, a fim de que este consiga satisfazer os seus desejos, mesmo sabendo que ele caminha para a ruína total.

Estrábax não possui destaque extraordinário na peça senão por vincular com o enredo o servo que dá nome à obra. Sua figura é de um rude camponês que escapa da casa do pai pelo muro de pedras que a separa da casa de Fronésio para perder-se entre as meretrizes e arruinar sua fortuna, como diz o próprio Truculento em seu diálogo com Astáfio na quarta cena do ato I: “Que Estrábax, o filho do meu amo, se perde em vossa casa, que vós o estais a fazer cair num ignóbil embuste e na desonra.”

Truculento dá o nome à peça e, de brutamontes, fiel ao seu nome indicador da rudeza e mau caráter, passa a amante dedicado, também ele disposto a perder os seus bens. A princípio, diferente de Estrábax, totalmente ludibriado e que não vê o que fazem com ele as meretrizes, Truculento está atento à manipulação das moças: “(...)ele não acumulou a sua fortuna dando presentes a meretrizes de meia tigela, mas sim com a sua parcimónia e avareza, fortuna que, agora, é transportada às escondidas para vossa casa, ó malvadas! Vocês comem-na, gastam-na em perfumes, bebem-na. Não hei-de eu denunciar estas coisas? Por Hércules, pois é agora mesmo que eu vou ao foro para contar estes factos ao velho! Este enxame de mal não se irá abater sobre a pele das minhas costas. (sai)” No entanto, no penúltimo ato da peça, acaba ironicamente a se perder bem como os outros amantes.

O velho Cálicles descobre toda a enganação que haviam feito com o seu neto e com a sua filha, obrigando Diniarco a reparar os males causados à jovem e ao neto. Mais uma vez, Diniarco sai perdendo: perde um quinhão do dote que lhe era devido do casamento com a filha de Cálicles e a liberdade de que havia gozado até aí com Fronésio.

Sira, cabeleireira de Fronésio tenta ao máximo esconder de Cálicles a horrenda tramóia que ajudou a concretizar com a ajuda de uma criada: furtar o menino da filha de Cálicles, donzela que havia sido horrivelmente violentada por Diniarco, e entregá-lo a Fronésio, para que esta o fizesse passar por seu filho, fruto de uma relação que a cortesã havia mantido com Estratófanes.

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Quanto às outras personagens (uma escrava de Cálicles e escravos que açoitam com correias), elas são meramente acessórias, ainda que importantes para o desenrolar da peça.

Vestimentas

Como já foi citado anteriormente, “O Truculento” pertence a uma categoria chamada “Palliata”, e que esta categoria é caracterizada (e é nomeada) pelos trajes usados pelos atores, o chamado “Pallium”, vestimenta masculina típica dos gregos. O Pallium podia ser usado dobrado ou vestido. Normalmente vestia-se uma túnica por baixo do Pallium e usava-se um par de “Crepidae”, sandálias usadas nas civilizações antigas.

Pallium dobrado. Pallium Vestido. Crepidae.

apenas por essa menção à deusa Vitória, mas em tantos outros trechos do livro, nota-se a crença politeísta dos romanos na época; isso está bastante presente nas expressões usadas pelos personagens).

Além de descrever os acessórios usados por Astáfio no momento do diálogo, o servo comenta ainda sobre “esses teus caracóis enfeitados, arranjados, frisados e perfumados!” e mais na frente “Porque te atreveste a aproximar-te da nossa porta, ungindo-te de perfumes, e porque tens as bochechas tão lindamente pintadas de púrpura (...) Borraste as tuas bochechas com tinta vermelha e o resto do corpo com pó branco. Vocês são umas pestes.”. Nesses trechos o leitor pode ter uma boa ideia de como de vestiam Fronésio e Astáfio, dos acessórios, do aspecto de seus cabelos, do uso de maquiagem, etc.

Quanto às mulheres, vestiam um traje chamado “Stola”. A stola era um vestido simples usado pelas mulheres durante grande parte da época imperial romana. Era sempre comprido e possuía mangas bastante largas e muito pano. Embora as cortesãs não pertencessem a uma classe mais elevada, as personagens de Plauto vestiam-se muito bem, como se pode observar no diálogo entre Astáfio e Truculento, onde ele descreve a moça em meio às palavras rudes que proferia contra ela. Em meio ao diálogo, Truculento cita ainda “os braceletes de bronze”, “anéis de bronze” e um pouco mais a frente, em uma rubrica “(fazendo gesto de tocar nos pingentes de Astáfio)”, pingentes que representavam a deusa Vitória. (Abro um parênteses para uma consideração importante: vale frisar que não

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Típicas vestimentas femininas romanas.

As vestimentas de Estratófanes diferiam das dos demais personagens, uma vez que ele era soldado, logo se vestia como tal. Por ser uma comédia, ainda que o personagem não estivesse mais em guerra, sua roupa o caracterizava como soldado, e quem sabe tornava-o um tanto caricato. Essa interpretação pode ser feita já na primeira cena desse personagem (Cena II, Ato II): “Astáfio: Deu à luz um menino extremamente encantador. Estratófanes(empertigando-se): Ena! Por acaso é parecido comigo?Astáfio: Ainda perguntas? Como não, se, logo ao nascer, exigia uma espada e um escudo?Estratófanes: É meu filho. Percebe-se logo pelas provas.” Estratófanes estava sempre com sua espada, que chega a desembainhar na cena III do segundo ato, quando propõe um duelo com Cíamo.

As roupas dos servos, com exceção das de Astáfio, que já foram citadas, eram em geral bem mais simples e pouco coloridas, feitas com tecidos menos delicados que aqueles que vestiam seus amos.

Soldado da Roma Antiga Servos

Unidade de ação

Ao longo de todo o enredo, uma das personagens principais, Fronésio, não demonstra nenhum escrúpulo ou princípio moral e não mede esforços para extrair mais e mais presentes de seus amantes. Fronésio está a todo momento pensando em meios de aumentar sua

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fortuna, essa é sua ideia central, e o que é retratado na peça é justamente o plano mais radical que já pôs em execução a fim de consegui-lo. “Eu, que sou má, sou má graças à minha mãe e à minha maldade natural. Eu que fingi estar grávida com o olho no soldado babilónio, quero que o soldado encontre agora essa maldade preparada com cuidado. Ele estará aqui, creio, dentro de muito pouco tempo. Então eu, conscientemente, tomo as precauções e fico de cama, ataviada como uma grávida que acabou de dar à luz.”, essa é a fala da meretriz no Ato II, Cena I, onde mostra-se consciente do mal que está fazendo. O objetivo de Fronésio era fazer com que o soldado, estúpido como mostrara ser, acreditasse que ela deu a luz a um filho dos dois, filho que na verdade pertencia a Diniarco, e extrair com mais eficácia os bens do soldado, que os daria agora com muito mais benevolência, acreditando que seriam usados para criar a criança. Uma demonstração disso é o trecho do diálogo entre Estratófanes e Fronésio, na primeira cena do Ato V: “Estratófanes: Eu, ó meu amor, se antes te ofendi em alguma coisa, trago-te esta mina de ouro como reparação. (estende-lhe a bolsa) Se não acreditas, olha.Fronésio (sem se voltar, estende a mão para apanhar a bolsa): A minha mão proíbe-me de acreditar em alguma coisa antes de ela a ter na sua posse. É preciso comida para o menino, é preciso também para a comadre que dá o banho ao menino, é preciso para a ama, para ela ter leite, vinho velho em abundância para beber dia e noite102, é preciso lenha, é preciso carvão, é preciso faixas, travesseiros, berço, o enxoval para o berço, é preciso azeite, <é preciso> farinha. Enfim, é sempre preciso alguma coisa o dia inteiro. Não há um único dia em que a tarefa se dê por terminada, pois há sempre outra tarefa. É que os filhos de soldados não podem ser criados como os dos pássaros.” O principal obstáculo que encontra é conseguir ficar com a criança mesmo depois que o velho Cálides descobre sua armação pela confissão das servas. Fronésio havia também que manter sempre próximos de si os amantes, e cuidar que não houvesse desentendimento entre eles. Após ter que se fingir em recuperação pós parto e cuidar por alguns dias da criança, seus esforços não foram em vão, pois a história se conclui com Estrábax e Estratófanes entrando na casa de Fronésio, após discutirem por ela e terem sido persuadidos com sua lábia. O desfecho da peça se dá com as palavras de Fronésio, já sozinha no palco, para os espectadores: “Por Castor, que linda caçada eu fiz cacei lindamente e conforme ao meu desejo! E como estou a ver o meu negócio bem gerido (com ar velhaco), em seguida vou gerir o vosso. Por favor, se alguém está decidido a fazer negócio, faça-me chegar uma proposta! Em honra de Vénus, venham os aplausos: esta comédia está sob a sua tutela! [Espectadores, passai bem, venham daí as palmas e ... costados ao alto!]”.

Espaço dramático

A peça, como já se foi dito, se passa em Atenas. Na cena vê-se a casa de Fronésio e a de Estrábax; uma das saídas laterais conduz ao porto; a outra, à cidade e ao campo. Essas informações são dadas no prólogo, e não há muitas mudanças de cena o longo da peça. Todo o desenrolar da história se dá em frente à casa de Fronésio ou de Estrábax, com exceção da primeira cena do soldado Estratófanes, onde a cena ocorre simultaneamente dentro e fora da casa de Fronésio. As portas dessas duas casas, bem como as saídas laterais, também são usadas para entrada e saída de cena. Muitos detalhes não são fornecidos da cena, mas há a menção a um muro de pedra entre a casa da meretriz e do camponês, cujas pedras foram tiradas por este para entrar, às escondidas do pai e do servo, a casa de Fronésio.

Elementos que caracterizam o texto teatral

A estrutura do texto em diálogos e a presença de rubricas cênicas são os principais elementos que denunciam o texto como teatral. Os sentimentos, gestos, reações e tons de voz que irão usar os atores na representação dos personagens estão descritos nessas rubricas cênicas, que aparecem entre parêntese. Há ainda a presença de um espaço cênico, o tempo

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dramático, a presença de enredo, tema e conflitos e principalmente a divisão da peça, que ocorre em atos e cenas, e que caracterizam O Truculento como sendo um texto teatral.As rubricas cenas ajudam o leitor a compreender melhor a cena. Na cena II do ato I, por exemplo, no trecho “Diniarco (tentando alcançar Astáfio, que se dirige para casa de Estrábax): Olá, Astáfio, espera aí um instante antes de te ires embora.Astáfio (sem olhar para o lado de Diniarco): Quem é que me chama?Diniarco: Olha para aqui e logo saberás.Astáfio (sem se voltar): Oh! Desgraçada de mim, estás a maçar-me, quem quer que sejas! (afasta-se)Diniarco (irritado): Ó malvada, espera!Astáfio: Ó simpático, tu estás a aborrecer-me. (voltando-se)”, nessa cena as rubricas cênicas são essenciais para se compreender que Astáfio ignora propositalmente Diniarco, que já então não era de muita importância para Astáfio ou Fronésio, pois elas o julgavam totalmente falido. Os monólogos e conversas diretamente com os espectadores também são constantes na obra, e constituem elementos caracterizadores do gênero: “É assim mesmo, por Pólux, e muitos de vós, espectadores, sabeis, por Pólux, que eu não vos minto nisto! Para eles então é uma vitória e uma proeza arrebatar a presa aos piratas!” (Astáfio em Cena II, Ato I); “Estratófanes (entra acompanhado por um escravo e duas escravas): Não espereis, ó espectadores, que eu venha proclamar as minhas façanhas!” (Estratófanes em Cena II, Ato II).

“O Truculento” de Plauto em síntese

A história acontece em torno da cortesã Fronésio, e seus três amantes: Diniarco, que se arruinou e foi desamparado por ela; Estratófanes, um militar coberto de ouro; e o camponês, Estrábax, que a vigilância de Truculento não pôde impedi-lo de encontrar-se com ela. Fronésio tem uma criada, Astáfio, que se encarrega de enganar os amantes de se substituir à Fronésio quando necessário. Estratófanes já antes de partir para a guerra, tinha sido já amante de Fronésio, que finge ter tido um filho dele. Para isso encontra uma criança e toma-a por sua. Estratófanes, feliz com esta paternidade, assegura generosamente seu sustento. Contudo, o bebê é fruto de uma jovem de boa família que Diniarco tinha abandonado depois de lhe ter prometido casamento. O pai da jovem descobriu o abandono interrogando as servas que tinham participado. Diniarco se vê obrigado a tomar de volta o filho, mas não de imediato, pois irá deixá-lo alguns dias ainda com Fronésio.

Referências

http://historymedren.about.com/od/clothingandfabric/ig/Medieval-Clothing/http://www.netsaber.com.br/biografias/ver_biografia_c_2945.htmlhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Plautohttp://www.algosobre.com.br/biografias/plauto.htmlhttp://www.caleidoscopio.art.br/cultural/teatro/historia-do-teatro/teatro-grego-parte2-as-origens-da-comedia-grega.htmlhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Teatro_na_Gr%C3%A9cia_Antiga#Com.C3.A9dia

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Aluna: Anna Luiza da Costa NepomucenoT.2.1433.1M Geologia (2º ano)Disciplina: Arte III Prof.ª Marinalva Moura

“O Truculento” de PlautoAnálise de texto teatral

Natal – 2013