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Analisar um documento iconográfico TEHA11-P1 © Porto Editora Identificar o documento: – natureza (ilustração, pintura, escultura, fotografia, cartaz, caricatura, etc.). É também importante verificar se a imagem apresentada é uma obra completa ou um fragmento de um conjunto mais vasto; – situação no tempo e no espaço (quando e onde foi produzido); – autor e/ou comanditário; – título/tema. Identificar o contexto histórico no momento da sua produção. Discriminar os elementos figurativos e suas inter-relações (se a complexidade da imagem o exigir, decompô-la em setores – centro, direito, esquerdo, superior, inferior – e/ou planos – pri- meiro plano, segundo plano…). Interpretar/descodificar o documento (termine sintetizando, numa frase ou pequeno parágrafo, a mensagem principal do documento). Regras de análise Charles Le Brun, Retrato do Chanceler Seguier, c. 1660. Óleo sobre tela, 295x351 cm, Museu do Louvre. Para uma completa descodificação do documento, torna-se imprescindível efetuar uma pequena pesquisa que forneça elementos sobre o retratado, o pintor e as circunstâncias em que foi efetuado o retrato. Em casos como este, o recurso à Internet revela-se rápido e eficaz. 1. Apresente o documento. 2. Forneça alguns elementos sobre o retratado e sobre o autor da obra. Questões Análise de documentos/fontes

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Page 1: Análise de documentos/fontes - Abre Horizontes- Porto Editora · 26 de agosto de 1660, percorreu a cidade de Paris, por ocasião do casamento do jovem Luís XIV com Maria Teresa

Analisar um documento iconográficoT

EH

A11-P

1 © P

orto Editora

Identificar o documento:

– natureza (ilustração, pintura, escultura, fotografia, cartaz,caricatura, etc.). É também importante verificar se a imagemapresentada é uma obra completa ou um fragmento de umconjunto mais vasto;

– situação no tempo e no espaço (quando e onde foi produzido);

– autor e/ou comanditário;

– título/tema.

Identificar o contexto histórico no momento da sua produção.

Discriminar os elementos figurativos e suas inter-relações (se acomplexidade da imagem o exigir, decompô-la em setores –centro, direito, esquerdo, superior, inferior – e/ou planos – pri-meiro plano, segundo plano…).

Interpretar/descodificar o documento (termine sintetizando,numa frase ou pequeno parágrafo, a mensagem principal dodocumento).

Regras de análise

Charles Le Brun, Retrato do Chanceler Seguier, c. 1660. Óleo sobre tela, 295x351 cm, Museu do Louvre.

Para uma completa descodificação do documento, torna-se imprescindível efetuar uma pequena pesquisa que forneça elementos sobre o

retratado, o pintor e as circunstâncias em que foi efetuado o retrato. Em casos como este, o recurso à Internet revela-se rápido e eficaz.

1. Apresente o documento.

2. Forneça alguns elementos sobre o retratado e sobre o autor da obra.

Questões

Análise de documentos/fontes

Page 2: Análise de documentos/fontes - Abre Horizontes- Porto Editora · 26 de agosto de 1660, percorreu a cidade de Paris, por ocasião do casamento do jovem Luís XIV com Maria Teresa

3. Em que contexto é representado o chanceler?

4. Descreva, em traços gerais, o quadro.

5. Que imagem do retratado nos é transmitida? Que elementos a veiculam?

6. Avalie o contributo do documento para a compreensão histórica da época.

1. A imagem reproduz um quadro a óleo de Charles Le Brun, de dimensões impressionantes, que retrataum alto dignitário francês, o chanceler Pierre Seguier, rodeado de um pequeno séquito. Executadapouco depois de 1660, a obra encontra-se hoje no Museu do Louvre.

2. O retratado, Pierre Seguier (1588-1672), foi um dos homens mais influentes do seu tempo. Oriundo deuma família de comerciantes parisiense, notabilizou-se como jurista e, de degrau em degrau, subiu na car-reira administrativa até ao seu mais alto cargo, o de chanceler, função que desempenhou durante 37 anos.Responsável pela aplicação da chancela (ou selo) real, sem a qual os decretos, sentenças, perdões, con-cessões de títulos e todos os demais documentos careciam de valor legal, Seguier retirava do seu cargohonrarias, protagonismo e poder. Em 1650, Luís XIV agraciou-o com o título de duque de Villemor.O pintor Charles Le Brun (1619-1690) conta-se entre os mais famosos pintores do século XVII e tinha,para com o chanceler, uma dívida de gratidão. Ainda adolescente, beneficiara da proteção de Seguier,que o acolhera e custeara a sua formação, enviando-o a Itália para que copiasse as obras dos grandespintores do Renascimento. À época em que o retrato foi pintado, Le Brun ocupava já um lugar proemi-nente na corte do Rei-Sol, para quem trabalharia até à sua morte, mas mantinha grande deferência peloseu primeiro mecenas. Alguns críticos de arte acreditam que se autorretratou, nesta obra, na figura dopajem que segura o guarda-sol.

3. Ao encomendar este retrato, o chanceler quis imortalizar a sua participação no cortejo solene que, em26 de agosto de 1660, percorreu a cidade de Paris, por ocasião do casamento do jovem Luís XIV comMaria Teresa de Áustria, infanta de Espanha. Numa época em que os cerimoniais e a pompa assumiamgrande importância social e política, Pierre Seguier abrilhantou a sua participação fazendo desfilar todo opessoal da chancelaria em traje de gala, bem como um corcel ricamente ajaezado que carregava, nodorso, dentro de um cofre, o selo do Estado, de que era guardião (fig. 1).

Comentário

Fig. 1 – Reproduçãode um dos catorzedesenhos que repre-sentam a participa-ção da chancelaria naentrada do casal realem Paris. Presumi-velmente mandadosexecutar pelo chan-celer Seguier, encon-tram-se em Esto-colmo.T

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4. No quadro figuram sete personagens, mas toda a composição é dominada pela figura de Pierre Seguier.No centro do quadro, o chanceler enverga um sumptuoso traje comprido, de brocado dourado, e montaum belo cavalo branco, com rédeas também douradas e o dorso inteiramente coberto por uma mantabordada a fio de ouro. Rodeiam-no seis pajens a pé, vestidos de forma requintada, que lhe conduzem ocavalo e seguram um dos guarda-sóis de seda que protegem o chanceler. Por trás da montada, adivinha--se um outro elemento, que suporta o segundo guarda-sol.A cena recorta-se sobre um pavimento neutro e um céu nublado, sem quaisquer outros elementos quedistraiam o espectador do grupo representado.

5. O quadro transmite, de imediato, a posição proeminente do chanceler. Num tempo em que o poder semanifesta externamente através de convenções, símbolos e ostentação, o retrato é eloquente quanto àelevada posição do retratado. Evidencia-se ela:– no retrato equestre, tipo de representação desde sempre reservada aos altos dignitários, que agiganta

a estatura do retrato e lhe confere imponência;– na sumptuosidade dos tecidos, em que predomina o brilho do ouro, símbolo do esplendor e da riqueza;– no chapéu que lhe cobre a cabeça e que só a sua condição superior lhe permite usar numa cerimónia

real. A cabeça descoberta dos demais personagens acentua o valor desta convenção;– no colar da Ordem do Espírito Santo que ostenta ao peito, a mais prestigiada ordem de cavalaria da

monarquia francesa;– nos guarda-sóis que o cobrem, assinalando, de forma clara, que, protegido por eles, desfila um grande

senhor;– no séquito que o rodeia, ricamente trajado, mas em evidente situação de inferioridade face ao ilustre

senhor que serve;– no porte altivo e sereno, que lhe confere um ar quase majestático.

6. A obra apresentada espelha, de forma clara, a importância assumida pela hierarquia social no AntigoRegime. Nesta época, o lugar de cada um na sociedade estava definido com precisão, conferindo deve-res e direitos específicos que todos deviam aceitar e cumprir. Deus, pensava-se, não desejava a igual-dade entre os homens, reservando a alguns uma condição superior, plena de dignidade e poder. Frutodesta conceção, os sinais de grandeza manifestavam-se de forma explícita, exibindo os grandes, comorgulho, as insígnias da sua condição.No entanto, mesmo em tal contexto, o retrato do chanceler revela-se algo excessivo.As dimensões gigantescas da tela, o fausto e imponência dada à figura do retratado fazem deste quadrouma obra única e asseguram-lhe um lugar próprio entre os muitos retratos de aparato que, da época,nos ficaram. É como se o chanceler quisesse confirmar, de forma inquestionável, o seu direito a umlugar cimeiro, lugar que não lhe pertencia por nascimento, já que Pierre Seguier pertencia à nobreza detoga, ao punhado dos que lograram elevar-se pelos bons serviços prestados ao rei. Numa sociedade deordens, em que o berço constituía a base da distinção social, tal facto não conferia prestígio, bem pelocontrário. Talvez por isso, Charles Le Brun empregue todo o seu talento para colocar, desta forma tãoenfática, o seu protetor entre os grandes do seu tempo.Em suma, mais do que o retrato de um homem, o quadro de Charles Le Brun é o retrato de uma épocae dos seus critérios de valor social.

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