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Turma e Ano: Flex A (2014)
Matéria / Aula: Direito Penal / Aula 01
Professora: Ana Paula Vieira de Carvalho
Monitora: Mariana Simas de Oliveira
AULA 01 CONTEÚDO DA AULA: Conceito. Bem Jurídico. Funções. Principio da legalidade.
BIBLIOGRAFIA SUGERIDA:
Direito Penal, parte geral – Juarez Cirino dos Santos – Editora ICP. Comentários da professora: É
a obra mais indicada para parte geral de Direito Penal. O autor é profundo nos temas, porém sintético.
Pressupõe leituras anteriores, não sendo indicado para ser uma primeira leitura.
Tratado de Direito Penal, parte geral, vol. 1 – Cezar Roberto Bitencourt – Editora Saraiva.
Comentários da professora: Não é um livro que trata os temas com profundidade.
Curso de Direito Penal Brasileiro, vol.1 (parte geral) – Luiz Regis Prado – Editora Revista dos
Tribunais (RT). Comentários da professora: Também não é um livro que trata os temas com
profundidade.
Curso de Direito Penal, vol.1 (parte geral) – Fernando Capez – Editora Saraiva. Comentários da
professora: A parte especial é muito boa. No entanto, apesar da parte geral ser superficial, é indicado
para quem está começando a estudar Direito Penal.
Curso de Direito Penal, parte geral, vol.I – Rogério Greco – Editora Impetrus. Comentários da
professora: Também é um livro mais superficial. Para uma primeira aproximação é um ótimo autor,
que é didático.
Direito Penal, parte geral – Fernando Galvão – Editora Lumen Juris. Comentários da professora:
Não é tão claro quanto o Greco e muitas vezes as abordagens de determinados temas não agradam a
professara. Algumas questões ele trata com maior profundidade e outras de forma mais superficial.
DIREITO PENAL
Nos temas introdutórios, vale a pena a leitura do livro “Introdução crítica ao Direito Penal” – Nilo
Batista
DELIMITAÇÃO
O Direito Penal pode ser conceituado como o setor do ordenamento jurídico que define
crimes, comina penas e prevê medidas de segurança aplicáveis aos autores de condutas
incriminadoras (José Cirino dos Santos).
CARACTERÍSTICAS DO DIREITO PENAL:
Finalidade Preventiva
A ideia de prevenção e o impacto do Direito Penal na comunidade e no indivíduo são, hoje,
uma linha mestra no estudo do Direito Penal.
Subsidiariedade
O Direito Penal é um remédio sancionador extremo, não sendo usado para todos os
problemas da comunidade. Ele só é usado para a proteção daqueles bens jurídicos especiais e para
lesões especialmente graves.
A partir dessa ideia, havendo um determinado bem jurídico que merece proteção penal (o
patrimônio, por exemplo) o princípio da subsidiariedade aponta que essa proteção não será integral;
não será qualquer lesão ao patrimônio que interessará ao Direito Penal, mas somente aquelas
especialmente graves.
Essa gravidade leva em conta ou a intensidade da lesão ao bem jurídico ou a forma de
realização da conduta.
Por isso a proteção do Direito Penal quase nunca é homogênea\integral, mas sim
fragmentária (princípio da fragmentariedade como consequência da subsidiariedade). Surge, daí a
princípio da intervenção mínima.
FUNÇÃO DO DIREITO PENAL
O Direito Penal tem a função de exclusivamente proteger os bens jurídicos, sendo essa
a posição dominante na doutrina brasileira (também é a posição de Roxin).
A intervenção do Direito Penal é ilegítima onde não exista um bem jurídico a ser protegido.
Essa ideia é traduzida no princípio da ofensividade ou da lesividade, que são, para a
maioria dos autores, sinônimos.
Bitencourt faz distinção entre esses dois princípios: o princípio da lesividade exige que haja
um bem jurídico a ser protegido; o da ofensividade que a lesão a esse bem jurídico seja significativa.
BEM JURÍDICO
Existe hoje na doutrina estrangeira uma discussão sobre a viabilidade do conceito de bem
jurídico.
Para que serve discutir o conceito de bem jurídico? R: Uma vez construído um conceito de
bem jurídico que possa ser manejado pelos profissionais que trabalhem com o Direito, pode-se
delimitar o âmbito de atuação do legislador penal (lembre-se que a função do Direito Penal é
proteger bens jurídicos). O legislador, portanto, não pode criminalizar nenhuma conduta que não afete
um bem jurídico.
Sobre essa discussão a professora irá disponibilizar um artigo do Greco.
CONCEITO DE BEM JURÍDICO
Para Luís Greco bem jurídico são “dados fundamentais para a realização pessoal dos
indivíduos ou para a subsistência do sistema social, compatíveis com a ordem constitucional”.
Para Roxin bem jurídico é a “realidade ou fins que são necessários para uma vida
social livre e segura, que garanta os direitos fundamentais dos indivíduos, ou para o
funcionamento do sistema estatal erigido para a consecução de tal fim”.
Basicamente, esses conceitos demonstram que podem ser bens jurídicos toda a realidade
ou situação social que seja importante para interação dos indivíduos em sociedade. Além desse
aspecto mais individual, também pode ser bem jurídico toda a estrutura estatal que garanta essa
interação e realização pessoal. Por exemplo: a administração pública é a estrutura estatal que garante
a proteção de direitos e garantias individuais e, portanto, a realização pessoal dos indivíduos.
Exemplo de criminalização ilegítima onde não existe de bem jurídico tutelado:
criminalização do homossexualismo.
Esse conceito não explica todas as infrações penais existentes (isso será visto mais a
frente).
DIFERENÇA ENTRE BEM JURÍDICO TUTELADO E OBJETO MATERIAL DO CRIME
Bem jurídico é um conceito abstrato, enquanto objeto material é um conceito corpóreo e
sobre o qual recai a conduta criminosa.
No furto, por exemplo, o bem jurídico protegido é o patrimônio e o objeto material é a coisa
furtada.
FUNÇÕES\UTILIDADES DO CONCEITO DE BEM JURÍDICO
Garantia
Onde não houver bem jurídico tutelado não poderá haver criminalização de conduta
(remete ao princípio da lesividade).
Teleológica ou interpretativa
É importante refletir sobre o bem jurídico tutelado a partir de cada tipo penal.
Exemplo: Extorsão mediante sequestro, prevista no art.159 do CP:
Art. 159 - Sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem,
como condição ou preço do resgate: (...)
“Qualquer vantagem” pode ser moral ou apenas patrimonial? Obviamente precisa ser
patrimonial, pois esse é um crime contra o patrimônio.
Individualizadora
O bem jurídico servirá como critério de medida pena, levando-se em conta a gravidade da
lesão ao bem jurídico.
O crime é ação típica, ilícita e culpável. A ideia de que culpabilidade não faz parte do crime
é ultrapassada e poucas pessoas repetem isso.
Ao estudar a teoria do crime, aprendemos que existem duas grandes etapas de estudo: a
primeira, chamada de injusto (estudo da ação realizada e lesão ao bem jurídico); a segunda, onde se
estuda a culpabilidade (estudo das características do agente). (A teoria do crime será objeto de estudo
mais a frente no curso).
Desvalor da ação
Injusto +
Desvalor do resultado (lesão ao bem jurídico).
Na primeira fase é estudada a conduta realizada e a intensidade da lesão ao bem
jurídico. Essa intensidade da lesão ao bem jurídico vai repercutir na quantidade de pena a ser
aplicada ao sujeito, servindo como um dos critérios para a sua fixação, como se observa do art.59 do
CP:
Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à
personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem
como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para
reprovação e prevenção do crime: (...)
Sistemática
Os tipos penais são classificados e organizados no Código Penal através da ideia de bem
jurídico: crimes contra a vida; crimes contra o patrimônio; etc.
CONSEQUÊNCIAS DO CONCEITO DE BEM JURÍDICOS
Impossibilidade de punir penalmente condutas meramente imorais.
Algo que atente a uma moral média de determinada comunidade, mas que não ofenda
qualquer bem jurídico não pode ser criminalizada pelo legislador.
Exemplo: opções sexuais.
Impossibilidade de punir a simples violação de um dever
Existem deveres que podem ser funcionais, por exemplo, mas não envolvem a violação de
um bem jurídico.
Exemplo: o dever de um administrado para com a administração. Em algumas situações
isso pode não envolver lesão a um bem jurídico: infração de trânsito que não gera perigo nenhum é
uma mera violação de um dever.
Impossibilidade de proibições meramente ideológicas
Na época do Nazismo punia-se o casamento entre pessoas de raça diversas. São
proibições que só fazem sentido à luz de determinada ideologia. Também não há bem jurídico
tutelado.
Impossibilidade de punir um modo de ser
Seria o chamado direito penal do autor. Exemplo: ser bêbado; ser vagabundo; etc.
Informativo 722, STF.
Art. 25 da LCP e não recepção pela CF/88
No mérito, destacou-se que o princípio da ofensividade deveria orientar a aplicação da
lei penal, de modo a permitir a aferição do grau de potencial ou efetiva lesão ao bem
jurídico protegido pela norma. Observou-se que, não obstante a contravenção impugnada
ser de mera conduta, exigiria, para a sua configuração, que o agente tivesse sido
condenado anteriormente por furto ou roubo; ou que estivesse em liberdade vigiada; ou que
fosse conhecido como vadio ou mendigo. Assim, salientou-se que o legislador teria se
antecipado a possíveis e prováveis resultados lesivos, o que caracterizaria a presente
contravenção como uma infração de perigo abstrato. Frisou-se que a LCP fora concebida
durante o regime ditatorial e, por isso, o anacronismo do tipo contravencional. Asseverou-
se que a condição especial “ser conhecido como vadio ou mendigo”, atribuível ao
sujeito ativo, criminalizaria, em verdade, qualidade pessoal e econômica do agente, e
não fatos objetivos que causassem relevante lesão a bens jurídicos importantes ao
meio social. Consignou-se, no ponto, a inadmissão, pelo sistema penal brasileiro, do
direito penal do autor em detrimento do direito penal do fato. No que diz respeito à
consideração da vida pregressa do agente como elementar do tipo, afirmou-se o não
cabimento da presunção de que determinados sujeitos teriam maior potencialidade de
cometer novas infrações penais. Por fim, registrou-se que, sob o enfoque do princípio da
proporcionalidade, a norma em questão não se mostraria adequada e necessária, bem
como afrontaria o subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito. Os Ministros Teori
Zavascki, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio e Celso de Mello ressaltaram, em
acréscimo, que a tipificação em comento contrariaria, também, o princípio da presunção de
inocência, da não culpabilidade. RE 583523/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 3.10.2013. (RE-
583523) RE 755565/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 3.10.2013.(RE-755565)
Impossibilidade de punir bens não fundamentais
Não basta que haja uma situação social que seja importante para o interesse dos
indivíduos, ela tem que ser especialmente importantes para serem tutelados pelo Direito Penal.
BEM JURÍDICO E CONSTITUIÇÃO
O Direito Penal, como visto, tem como função exclusiva a proteção de bens jurídico. A
função mais importante do bem jurídico é a de garantia (também é a mais controvertida).
A fisionomia do conceito de delito é fortemente influenciada pelo tipo de Estado em que se
insere o legislador penal.
Da Constituição decorrem (Luciano Feldens)
O referido autor tem uma série de obras que se relacionam ao tema Constituição e bem
jurídico.
A professora irá disponibilizar um artigo do Feldens sobre o tema em questão.
Proibição de penalização (limites materiais ao Direito Penal):
Limitações ao legislador penal decorrentes da CRFB\88 que tenham relação com a ideia
de bem jurídico:
(i) Direitos constitucionalmente tutelados. Exemplo: crime contra a honra que afete
os limites da liberdade de expressão. Haveria uma criminalização inconstitucional;
(ii) Criminalizações de condutas que não afetem determinado bem jurídico. Essa
proibição não está explícita na CRFB\88.
De forma geral, defende-se o acento constitucional do princípio da lesividade através da
ideia de dignidade da pessoa humana. Isso porque, a pena criminal somente seria justificável nas
hipóteses em que se mostrasse necessária, o que não ocorre quando não haja um bem jurídico em
jogo. Nessas hipóteses, o indivíduo é utilizado como instrumento para assegurar uma determinada
moral prevalente, o que gera a sua coisificação e atenta contra o princípio da dignidade da pessoa
humana. Assim, a criminalização de uma conduta sem bem jurídico é inconstitucional a partir do
princípio da dignidade humana.
Apenas bens constitucionalmente relevantes são passíveis de tutela?
Existem duas concepções:
(i) 1ª concepção: Figueiredo Dias. Sim, devem estar pelo menos implicitamente
previstos na Constituição.
Na visão de Luciano Feldens, quanto mais direta a previsão constitucional, maior
será a legitimidade da penalização.
(ii) 2ª concepção: Luís Greco, Dolcini e Marinucci. A professora adota essa corrente.
Basta que o bem jurídico seja compatível com os princípios da Constituição.
Exemplo: fé pública.
Pode ser obrigado o legislador a castigar lesões a bens jurídicos constitucionalmente
protegidos (ex.: aborto)? - Já caiu em prova.
Essa discussão é sobre os mandados de criminalização:
A lei X criminaliza o aborto. Posteriormente, a lei Y descriminaliza a conduta do aborto. A
lei Y pode ser tida como inconstitucional por proteção deficiente do bem jurídico vida?
Essa questão foi discutida quando foi prevista uma séria de normas penais tratando do
pagamento como forma de extinção da punibilidade nos crimes contra a ordem tributária, a qualquer
tempo, mesmo depois de sentença penal condenatória.
Os Procuradores da Fazenda defenderam a tese de que essas normas teriam proteção
deficiente, mas o STF aplicou o pagamento como causa de extinção da punibilidade em diversos
habeas corpus.
Sobre o tema (mandados constitucionais), existem duas correntes:
(i) 1ª corrente: Luciano Feldens entende que a nossa CRFB\88 estabelece algumas
obrigações de penalização (ex.: art.5º, XLII, XLIII).
Art.5º. (...)
XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de
reclusão, nos termos da lei;
XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da
tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como
crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo
evitá-los, se omitirem;
Com base nesses mandados criminalizadores claros, Feldens diz que:
(a) Não há espaço para abolicionismo penal;
(b) Impossibilidade de revogação das normas que incriminam as condutas tratadas
na CRFB\88. Exemplo: uma lei gerando uma total abolitio criminis seria
inconstitucional por proteção deficiente.
(c) Da necessária penalização de condutas como a retenção dolosa de salário
(art.7º, X, CRFB\88), extrai-se que implicitamente se deseja também a proteção
do próprio trabalhador e de seus direitos mais valiosos, os direitos
fundamentais;
(d) Essa conclusão também é fruto da eficácia objetiva dos direitos fundamentais e
do princípio da proporcionalidade, a impedir a proteção deficiente.
(ii) 2ª corrente: Dolcini e Marinucci. Professora adota essa corrente. A CRFB\88
apenas prescreve o dever de proteção aos bens jurídicos, mas não o modo de
proteção destes mesmos bens. Cabe ao legislador a escolha dos meios adequados
para proteger esses bens jurídicos.
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
“Nullum crimen, nulla poena sine lege”.
O princípio da legalidade tem a sua origem histórica na Carta Magna Inglesa de 1215, na
Declaração dos Direitos do homem e do cidadão. No entanto, com o formato atual aconteceu a partir
do século XIX, com Feuerbach.
Dispõe o art.5º, XXXIX, da CRFB\88 que “não há crime sem lei anterior que o defina,
nem pena sem prévia cominação legal”.
DESDOBRAMENTOS DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
(i) Só quem criminaliza condutas é a lei, que deve ser:
- Prévia;
- Escrita – não se pode falar em criminalização ou descriminizalição pelos
costumes;
- Estrita – não pode ser estendida por analogia;
- Certa – mora, aqui, o princípio da taxatividade.
Essa restrição da criminalização somente pela lei esta direcionada à
criminalização de condutas. Temas penais não relacionados à criminalização
podem ser tratados por Medidas Provisórias, como aconteceu com uma das leis
que estabeleceu a extinção de punibilidade pelo pagamento nos crimes contra a
ordem tributária.
(Continua na próxima aula).