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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
JK E O SISTEMA DE TRANSPORTE
Por: Luiz Fernando Santos de Menezes
Orientador
Jorge Tadeu
Rio de Janeiro
2010
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
JK E O SISTEMA DE TRANSPORTE
Apresentação de monografia à Universidade Candido
Mendes como requisito parcial para obtenção do grau de
especialista em Logística Empresarial
Por: Luiz Fernando Santos de Menezes
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SUMÁRIO
RESUMO 8
METODOLOGIA 9
INTRODUÇÃO 11
CAPÍTULO I - A História do Automóvel 13
CAPÍTULO II – A Criação da Sociedade do Automóvel 22
CAPÍTULO III - A indústria automobilística em números 32
CONCLUSÃO 42
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 44
INDÍCE 46
FOLHA DE AVALIAÇÃO 47
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RESUMO
O presente trabalho tem como finalidade compreender o sucesso da
indústria automobilística nos dias atuais, utilizando como metodologia de
pesquisa a análise histórica do período entre 1950 e 1960. Iremos apresentar,
através de uma comparação entre os governos de Juscelino Kubitschek e
Getúlio Vargas, as manobras econômicas e como cada uma interferiu no
desenvolvimento da indústria automobilística. Analisando os governos
compreendidos no recorte histórico apresentado, notaremos que o
florescimento da indústria de carros se deu com Getúlio e sua consolidação
com JK, utilizando recursos do exterior para tal empreitada. Bibliografias foram
a base para a análise das práticas econômicas dos governos compreendidos
entre 1950 e 1960 no Rio de Janeiro; tabelas foram utilizadas para
observarmos, em números, o desenvolvimento da indústria automobilística
brasileira. Esta pesquisa aponta a entrada de capitais estrangeiros como a
causa do sucesso econômico no período de JK, refletida no desenvolvimento
da indústria nacional de veículos, novo modo de acumulação de capitais. A
ideologia desenvolvimentista, desejo inculto da classe industrial, foi a base
essencial para a consolidação da indústria no país. O desenvolvimento da
nação estava na mentalidade do novo homem, continuidade esta visível e
respondida através da análise histórica, que se reflete nos atuais recordes de
vendas de automóveis e expansão de rodovias.
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METODOLOGIA
O presente trabalho é uma análise bibliográfica histórica do governo JK
e as práticas econômicas que resultaram na sociedade do automóvel. Iremos
apresentar, através de pesquisadores sobre o assunto, como foi posto em
prática a ideologia desenvolvimentista que permitiu a entrada de capital
estrangeiro na indústria nacional, principalmente a indústria automobilística,
nova forma de acumulação de capital.
Os autores aqui apresentados são acadêmicos que enriqueceram a
história brasileira com seus estudos. Sônia Regina de Mendonça, autora de
Estado e Economia no Brasil: Opções de Desenvolvimento analisa a
questão econômica nacional do período entre o primeiro governo de Getúlio
Vargas – 1930 – até o governo militar. Ela defende que as bases da prática
econômica em JK e no governo militar são continuidades da política econômica
intervencionista e nacionalista de Vargas. Esse livro foi importante para dar o
contexto econômico nacional e também a base para as comparações feitas
neste trabalho entre o governo Vargas e Juscelino. Juntamente com
Mendonça, Boris Fausto História Concisa do Brasil e Lincoln de Abreu Pena
República Brasileira ajudaram a resumir e aprofundar as questões políticas,
sociais e econômicas que o país passava entre os anos de 1950 e 1960.
Miriam Limoeiro Cardoso, em seu trabalho intitulado Ideologia do
Desenvolvimento: Brasil: JK-JQ deu-nos o entendimento ideológico que
conduzia as práticas econômicas do governo JK. Outro trabalho que trata de
imaginário é o trabalho de Adriana Hassin Nas páginas das revistas – Poder
e indústria de massa no Brasil de JK que nos elucida como a ideologia
chegou a massa consumidora do Brasil, principalmente voltada para o
consumo de eletrônicos e automóveis.
Esses são os autores que fundamentam minhas argumentações nesta
pesquisa com relação ao sucesso da indústria automobilística nos tempos de
Juscelino e que continua presente nos dias atuais. Esse sucesso só foi
possível graças à entrada de capital estrangeiro e estes autores confirmam
esta teoria, concluindo que sem esta ajuda o desenvolvimento da indústria
automobilística seria retardado em alguns anos.
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Para esta pesquisa dados estatísticos foram usados para mostrar o
desenvolvimento, em números, da indústria automobilística nacional.
Comparações entre períodos anteriores mostram o quanto ela se desenvolveu
e contribuiu para o progresso nacional. Os dados foram retirados da biblioteca
do IBGE sendo utilizados anuários e relatórios estatísticos.
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INTRODUÇÃO
O presente trabalho relatará, através da história brasileira, o
desenvolvimento da indústria automobilística e a idéia atrelada a ela que
vemos nos dias atuais. Utilizaremos para essa análise histórica o governo JK,
maior incrementador da indústria automobilística nacional. Trataremos dos
recortes temporal - 1950 a 1960 – e espacial – Rio de Janeiro, Distrito Federal
na ocasião.
Símbolo de status e posse, que se tornou símbolo de progresso
industrial e do próprio país, os automóveis chegaram ao Brasil ao final da
década de 1910, passando por um revigoramento no governo Getúlio Vargas.
A política econômica nacionalista de substituição de importações permitiu que
indústrias automobilísticas nacionais começassem a aparecer. E com JK, há
abertura da economia ao capital particular.
Os dois governos trataram diferentemente da indústria automobilística.
Enquanto um substituía as importações nacionais, o outro trocou o
nacionalismo para o desenvolvimentismo, utilizando-se de recursos particulares
- principalmente estrangeiros – para fomentar a industrialização e caminhar
para o desenvolvimento, se igualando com as outras nações fortes. Esta
pesquisa tem como objetivo mostrar que a entrada de capitais particulares fez
diferença no salto dado pela indústria de veículos, elevando a altos números de
automotores fabricados no país em 10 anos.
O trabalho é dividido em três capítulos. O primeiro capítulo intitulado
História da Indústria Automotiva apresentará a história da indústria do
automóvel, através de um grande resumo do contexto nacional, focando os
governos Getúlio Vargas e Juscelino Kubistchek e suas políticas econômicas
com relação à indústria nacional.
No segundo capítulo, veremos a ruptura e a continuidade em Juscelino
da política econômica de Vargas e a criação da sociedade do automóvel,
associada ao novo homem, ao um novo tempo, a uma nova nação. Trataremos
aqui da ideologia do desenvolvimentismo que tomou lugar do nacionalismo
varguista de desenvolvimento industrial. Passando pela construção da
ideologia desenvolvimentista pelo ISEB – Instituto Superior de Estudos
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Brasileiros – e o imaginário do desenvolvimento através das revistas ilustradas,
peças de informação semanal de todos os tipos. Neste capítulo veremos como
a ideologia do desenvolvimentismo foi empregada também para um público de
massa. A preocupação de inserir o público de massa no programa
desenvolvimentista era importante e através das revistas foi possível essa
criação do novo homem. Veremos neste capítulo também a importância da
indústria automotiva como o novo padrão de acumulação de riqueza nacional
O capítulo 3 é a análise de tabelas e gráficos que mostram o
desenvolvimento da indústria automobilística no país no período de 1950 a
1960. Alguns dados foram retirados de tabelas de 1949. Apesar de não estar
dentro do recorte temporal, ajuda a visualizar dados de anos anteriores a 1955
devido à falta de tais dados nos anuários pesquisados. Este capítulo tem como
objetivo mostrar o desenvolvimento da indústria automobilística e o aumento do
consumo de produtos voltados para os automóveis, como combustíveis. Os
gráficos auxiliarão na captação visual do progresso da indústria automotiva e
seus derivados, mostrando que até hoje, apesar das crises referentes a esse
setor, é um dos mais que se desenvolve no país.
Dessa forma, concluímos que o sucesso da política econômica de
Juscelino com relação à indústria automobilística foi devido à entrada de
capitais particulares, estrangeiros em sua maioria, e as facilidades oferecidas
pelo governo para a instalação de fábricas estrangeiras no Brasil. Essa
ideologia do desenvolvimento contribuiu para a mentalidade rodoviária
nacional, resumidamente numa nova sociedade do automóvel, ultrapassando
recordes e mais recordes de produção nacional.
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CAPÍTULO I – HISTÓRIA DA INDÚSTRIA AUTOMOTIVA
Neste capítulo apresento um histórico das políticas referentes à indústria
automobilística e transporte, utilizando como recorte cronológico os anos de
1950 e 1960, no Distrito Federal, então o estado do Rio de Janeiro. Este
histórico é importante para entendermos a ideologia da “civilização do
automóvel” que afeta diretamente a visão dos transportes no Brasil dos dias de
hoje. Os períodos a serem analisados serão os dois governos Getulio Vargas –
1930/1945 e 1951/1954 – e o governo Juscelino Kubitschek – 1956/1961. Os
dois governos são importantes para se entender como se deu o processo de
industrialização nacional e consequentemente, a da indústria automobilística.
1.1- GOVERNO GETÚLIO VARGAS
A história da empresa automobilística no Brasil se funde com a própria
história da indústria nacional. Não podemos compreender o seu surgimento
sem nos atentar as iniciativas de incremento industrial propostos pelos
governos de Getúlio Vargas – primeiro e segundo mandatos – e Juscelino
Kubitschek.
Como é de conhecimento, o governo JK foi o mais preocupado com a
indústria automobilística e seu desenvolvimento no Brasil, mas a indústria
automobilística aparece em 1919, com a Ford e em 1925 com a General
Motors. Os carros eram produzidos aqui no Brasil, importando peças das
matrizes. Não havia indústria de peças no Brasil.
Essa realidade só muda com o primeiro governo Getúlio Vargas, que na
sua política econômica de substituição de importações, proíbe as importações
de carros montados e cria obstáculos à importação de autopeças. A
industrialização em Vargas tinha como objetivo a substituição das importações
para incrementar a indústria nacional de base. De cunho nacionalista, Vargas
centralizou a economia pelo Estado, sendo este o principal incentivador,
buscando investimentos de outras áreas econômicas, como por exemplo, a
agricultura.
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Vocacionado para transformar a indústria no carro-chefe das atividades produtivas, os estrategistas do regime procuraram integrar o setor agrícola dos esforços do crescimento econômico desejado. A idéia era a de fazer da agricultura uma aliada do processo de industrialização, e para tal sua função seria a de produzir alimentos em grande escala. O formento dessa produção levaria (...) a necessidade de mecanização do setor (...) (PENNA, 1999, p. 201).
No Estado Novo, o Estado organiza e centraliza os processos
econômicos em vista da industrialização de base. Quando Getúlio volta ao
poder em 51, segue o nacionalismo e se transforma no principal investidor da
indústria pesada. A intervenção e o nacionalismo econômico de Vargas não
pode ser apontado como um período cujo capital estrangeiro não chegou ao
Brasil. Um exemplo disso é a criação da CSN – Companhia Siderúrgica
Nacional – com capital norte americano. Em troca, Getúlio deveria cortar
relações com a Alemanha no contexto da 2ª Guerra Mundial e se tornar aliado
dos EUA. Getúlio, que até então conduzia uma política externa de neutralidade,
aproveitando-se de ambos os investimentos em prol do desenvolvimento do
país. De acordo com Mendonça (1988, p. 43/44) a política econômica de
Vargas “iria exarcebar sua feição nacionalista, levando ao primeiro plano dos
debates da época as questões do intervencionismo estatal e da recusa do
capital estrangeiro no país. (exceto quando imprescindível)”.
Os grupos privados e o próprio Vargas inclinavam-se por uma
associação com capitais estrangeiros, alemães ou americanos. Para Fausto
(2002, p. 208) “o incentivo à industrialização foi muitas vezes associado ao
nacionalismo”, mas
as transações com a Alemanha eram atraentes não só para certos grupos exportadores como também para os que defendiam a necessidade de modernizar e industrializar o país. Os alemães acenaram sempre com possibilidades de romper a linha tradicional do comércio exterior das grandes nações, oferecendo material ferroviário, bens de capital etc. (FAUSTO, 2002, p. 211).
O 2º governo de Getúlio, apesar de continuar com o nacionalismo no
âmbito da política econômica acenou para o capital estrangeiro, este
interessado na indústria de bens de consumo, sendo o governo responsável
investido na indústria pesada.
Um importante fator presente no segundo mandato presidencial de
Getúlio foi a divisão ideológica dualista de dois grupos: os nacionalistas e seus
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adversários, conhecidos como “entreguistas” 1 (Fausto 2002, p.225) Getúlio
tinha que arbitrar essas diferenças, mas acabou por levar a cabo as aspirações
dos nacionalistas que defendiam o desenvolvimento baseado na
industrialização, enfatizando a necessidade de se criar um sistema econômico
autônomo, independente do sistema capitalista internacional. Para Fausto
(2002, p.213), “isso significava dar ao Estado um papel importante como
regulador da economia e como investidor em áreas estratégicas – petróleo,
siderurgia, transportes, comunicações.”
Os nacionalistas não recusavam o capital estrangeiro, mas o encaravam
com muitas restrições, seja por razões econômicas, seja porque acreditavam
que o investimento de capital estrangeiro em áreas estratégicas poria em risco
a soberania nacional. Os adversários desse projeto nacionalista defendiam
uma menor intervenção do Estado na questão econômica. A prioridade deste
grupo era a abertura controlada ao capital estrangeiro, responsável pelo
progresso do país na mentalidade dos adversários do nacionalismo. Dessa
forma, eles também não davam prioridade à industrialização. Providencias para
realizarem investimentos públicos foram tomadas, basicamente nos sistemas
de transporte e energia. Vargas tinha a intenção de criar uma rede de
transportes otimizada, que permitisse o desenvolvimento industrial. Sem uma
rede de transportes integrada, dificultaria o projeto de desenvolvimento da
Nação.
O programa econômico de substituição das importações foi importante
para a implantação da indústria automobilística no Brasil. No momento da
proibição das importações de automóveis montados e a imposição de
obstáculos a importação de autopeças, as montadoras foram estimuladas a
instalarem linhas de montagem e o país passa dispor de industrias de
autopeças como a Metal Leve e as molas Suéden no final da Segunda Guerra.
A partir de 1953, o presidente norte americano Trumam adotou uma
postura rígida diante dos problemas financeiros dos países em
desenvolvimento. A linha dominante, segundo Fausto (2002, p. 220)
1 “No âmbito das Forças Armadas, uma divisão ideológica se cristalizara entre nacionalistas e seus adversários, chamados depreciativamente de ‘entreguistas’ ela abrangia tanto os temas da política econômica interna quanto a posição do Brasil no quadro das relações internacionais.”(FAUSTO, 2002, p. 225).
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consistiria em abandonar a assistência estatal e dar preferência aos investimentos privados. As possibilidades de o Brasil obter créditos públicos para obras de infra-instrutora e para cobrir os déficits do balanço de pagamentos encolheram sensivelmente. Esta nova postura dificultou a execução do Plano Nacional de
Reaparelhamento Econômico – Plano Lafer – que visava investimentos,
sobretudo em energia, transporte e modernização da agricultura. Com isso os
transportes só puderam ser incentivados no governo JK, pois a capitação de
recursos externos era essencial para a concretização deste plano. Assim,
Getúlio deveria abandonar a sua política de intervenção na economia o que
não foi feito. Getulio adota o nacionalismo na economia brasileira e
responsabiliza o capital estrangeiro pelos problemas do balanço de
pagamentos.
A oposição ao governo Getúlio começa a pressionar, tendo a UDN como
principal veículo dos interesses norte americanos. Pressões com relação a sua
política econômica que não agradava aos interesses “desenvolvimentistas” do
capital estrangeiro surge como uma solução ao impasse ao esgotamento da
economia de substituição das exportações. Segundo Mendonça (1988, p. 45)
a abertura da economia ao capital estrangeiro se colocou como solução para o impasse da ‘substituição de importações’ que se esgotava. O reverso da medalha seria a implantação de um novo modelo de acumulação que, consolidando o capitalismo brasileiro, iria redefinir e aprofundar a dependência econômica do país. A posse de Juscelino Kubitschek foi o marco na reorientação dos rumos de nossa economia.
Enquanto permanecesse na condição de país agrário-exportador, o
Brasil não romperia a situação de atraso com relação aos demais componentes
da divisão internacional do trabalho, ratificando sua posição de inferioridade. A
solução para o dualismo – que impedia a plena constituição da nação – estava
na via capitalista avançada atingida através do desenvolvimento econômico.
Nestes termos, toda e qualquer colaboração em prol do desenvolvimento era
válida, inclusive a participação do capital estrangeiro.
1.2 – GOVERNO JK
O governo JK promoveu uma ampla atividade do Estado tanto no setor
de infra estrutura como no incentivo direto à industrialização. Mas assumiu
também a necessidade de atrair capitais estrangeiros, concedendo-lhes
13
inclusive grandes facilidades. Desse modo a ideologia nacionalista perdia
terreno para o desenvolvimentismo. O governo permitiu a larga utilização de
uma legislação, baixada no governo Café Filho, substituto de Getúlio após a
sua morte na presidência, autorizando as empresas a importar equipamentos
estrangeiros sem cobertura cambial, ou seja, sem depositar moeda estrangeira
para pagamento dessas importações. A condição de usufruir dessa regalia era
possuir, no exterior, os equipamentos a serem transferidos para o Brasil ou
recursos para pagá-los. As empresas estrangeiras, que podiam preencher
esses requisitos com facilidade, ficaram em condições vantajosas para
transferir equipamentos de suas matrizes e integrá-los ao seu capital no Brasil.
A legislação facilitou os investimentos estrangeiros em áreas consideradas
prioritárias pelo governo: indústria automobilística, transportes aéreos e
estradas de ferro, eletricidade e aço. O governo de Juscelino ficou associado à
instalação da indústria automobilística, embora antes dele existissem
montadoras e fábricas de autopeças no Brasil, em proporções limitadas.
Segundo Fausto (2002, p. 236) “o governo incentivou a produção de
automóveis e caminhões com capitais privados, especialmente estrangeiros.
Estes foram atraídos para o Brasil graças às facilidades concedidas e graças
também às potencialidades do mercado brasileiro”.
A política econômica de Juscelino foi definida no Programa de Metas.
Integravam-se, pela primeira vez, sob o controle do governo, as atividades do
capital público e do privado (nacional e estrangeiro). Ele abrangia 31 objetivos,
distribuídos em seis grandes grupos: energia, transportes, alimentação,
indústria de base, educação e a construção de Brasília, a metassíntese do
programa. As transformações ocorridas na economia brasileira na gestão JK
foram tão rápidas e de tal monta que seus desdobramentos são referência
obrigatória para a análise de nossa própria situação econômica atual e também
na questão da indústria automobilística e o sistema de transportes. Este último
grupo pertencente ao Plano de Metas visava atingir o reequipamento e
construção de estradas de ferro, de rodagem, portos, barragens, marinha
mercante e transportes aéreos. Basicamente este plano visava realizar a
substituição das importações nos setores de bens de consumo duráveis. O
primeiro setor ficou para o Estado e o segundo para o capital estrangeiro. O
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Estado investiu nos setores básicos menos lucrativos, como siderurgia,
hidrelétrica e estradas de rodagem. A iniciativa privada, em particular o capital
estrangeiro, ficou com a indústria de bens de consumo duráveis –
eletrodomésticos, automóveis, tratores, produtos químicos etc.
Operou-se uma ruptura quase total com a orientação da política
econômica anterior, e isto em dois níveis, como aponta Mendonça (1988, p.
45): “na redefinição do novo setor industrial a ser privilegiado pelo Estado e no
estabelecimento das novas estratégias para o financiamento da
industrialização brasileira.”. Esta relativa abundancia de recursos externos
contribuiu decisivamente para a reorientação da política econômica do Estado
brasileiro, reforçando a posição dos setores da sociedade que já denunciavam
o esgotamento da substituição das importações. Ainda Mendonça (1988, p.
49):
por meio destes expedientes logrou-se obter o clima propicio para a montagem, em tempo recorde e em bloco, dos setores mais modernos e dinâmicos da estrutura industrial brasileira, responsáveis pela plena implantação da acumulação capitalista no país. Dentre eles destacavam-se ramos como o automobilístico, o de construção naval, o de mecânica pesada e outros, sob o controle, em sua maioria, do capital externo.
As grandes empresas multinacionais, como a Willys Overland, a Ford, a
Volkswagen e a General Motors, concentraram-se no ABC paulista – área da
Grande São Paulo que abrange os municípios de Santo André, São Bernardo e
São Caetano – mudando completamente a fisionomia daquela região. Entre
outras conseqüências, a indústria automobilística passou a concentrar
operários em proporções inéditas no país. A Volkswagen, a Mercedes Benz ou
a General Motors, por exemplo, foram responsáveis pela larga margem de
superação da meta prevista de cem mil veículos em 1960 para 321.150, sendo
90% de seus acessórios produzidos no Brasil. Segundo Mendonça (1988, p.
50)
a demanda derivada das multinacionais aqui instaladas estimulou o surgimento ou a modernização das indústrias nacionais, as quais construíram um cinturão de empresas fornecedoras daquilo que o núcleo dinâmico necessitava, como foi particularmente evidente nos ramos metais-mecânico ligados às grandes fábricas de automóveis.
Parece que a ideologia entreguista presente no governo Getúlio continua
a interferir e conduzir na adoção da política desenvolvimentista que melhor
colocasse o país no seu lugar incluso na Divisão Internacional do Trabalho e
aumentar mais a sua dependência com os EUA na gestão JK.
15
A idéia de formulação de uma ideologia no sentido de orientar um
programa voltado para o desenvolvimento toma forma no ano de 1955, quando
é criado o Instituto Superior de Estudos Brasileiros – ISEB. Desde o início a
“ideologia nacional-desenvolvimentista” tornou-se hegemônica no ISEB,
responsáveis pela criação de uma fórmula que fosse capaz melhorar o padrão
de vida do povo brasileiro. Mendonça (1988, p.64) utiliza do discurso de JK
para ilustrar os pressupostos exibíamos:
Minha ambição foi a de tornar-me agente de uma revolução indispensável, uma revolução renovadora, a revolução necessária, cuja base é o trabalho, cujo instrumento agressivo é técnica e cujo objetivo a atingir será ver o Brasil deixar de ser eternamente o país do futuro e tornar-se realidade tangível. (MENDONÇA, 1988, p. 64)
A contradição básica a ser superada, entre esses intelectuais que
pertenciam ao instituto era entre nação e antinação, entre técnica e não
técnica, o que permitia envolver a todos os setores sociais na tarefa de
promover o crescimento. O ISEB se tornaria uma verdadeira fábrica de
ideologias legitimadoras das transformações econômicas em curso no período.
Apesar das divergências existentes, esses pensadores compartilhavam
de uma mesma convicção: a necessidade de uma ideologia que preparasse a
todos para o desenvolvimento. A transformação das mentalidades era uma
condição prévia – e também uma alavanca – para as transformações
econômicas e, como tal, deveria criar o clima propício do aparecimento do novo
homem brasileiro, despertando-o para seu papel na tarefa como agente
responsável pelo desenvolvimento do país. O resultado desse processo de
mobilização seria a revolução brasileira, responsável pela extinção do
subdesenvolvimento e pela redefinição do lugar do Brasil no contexto do
capitalismo mundial.
O slogan “Cinqüenta anos em cinco” ganhava ressonância, estimulando
uma atitude de esperança nos destinos do país. E o Plano de Metas fez com
que os cinco anos de governo Juscelino fossem lembrados como um período
de otimismo associado a grandes realizações, cujo maior exemplo é a
construção de Brasília.
Por mais nocivos aos interesses nacionais que possam ter sido os
resultados do Plano de Metas foram, sem dúvida, exitosos do ponto de vista
16
qualitativo. Enquanto se previra a construção de dez mil quilômetros de novas
rodovias, elas estenderam-se por mais de vinte mil quilômetros.
Brasília, a nova capital, construída por JK representou o símbolo da
prosperidade desse período. Na prática, o desenvolvimento abriu o país do
capital estrangeiro, o que levou a economia brasileira a internacionalização.
Este projeto, como Mendonça (1988, p. 66) defende “se resume na fórmula:
capital estrangeiro, mais iniciativa privada nacional, mais controle estatal dos
recursos básicos, sem nenhuma competição entre os três”.
Todos os caminhos levavam a Brasília, mas para se chegar a ela,
rodovias precisaram ser construídas. Brasília otimizou as vias rodoviárias para
o interior do país. “Desenhou-se, principalmente em parceria com JK, um
sistema rodoviário que cortava o Brasil de ponta a ponta, resultando em
algumas estradas de padrão internacional.” (SILVA, 2007, p.238). A partir de
Brasília se formou a unidade nacional, tanto ideológica quanto política. Ao
mesmo tempo, se era verdade – como se difundiu na época – que todos os
caminhos levam à Brasília, bem se vê o quanto essa meta representava a
prioridade dada à indústria automobilística e ao transporte rodoviário como
eixos do desenvolvimento nacional.
Vista em termos numéricos e de organização empresarial, a instalação
da indústria automobilística representou um inegável êxito. Porém ela se
enquadrou no propósito de criar uma “civilização do automóvel” em detrimento
da ampliação de meios de transporte coletivo para a grande massa. A partir de
1960
a tendência em fabricar automóveis cresceu, a ponto de representar quase 58% da produção de veículos em 1968. Como as ferrovias foram abandonadas, o Brasil se tornou cada vez mais dependente da extensão e conservação das rodovias e do uso dos derivados do petróleo na área de transportes. (FAUSTO, 2002, p. 237).
Propagandas em revistas ajudaram a construir a imagem do
desenvolvimento atrelada a “civilização do automóvel”. Nas páginas desses
semanários, observamos a ação deliberada na explicitação do
desenvolvimento. Segundo Silva (2007, p. 238),
estes veículos de comunicação fizeram-se valer de sua condição de enunciação às massas para cumprir o projeto de construção da modernidade nacional (...). Contudo, antes mesmo de existirem o Planalto Central, Brasília e a modernidade nacional precisavam existir mesmo era no imaginário popular.
17
No esforço de consolidação do discurso de modernidade inerente ao
projeto desenvolvimentista de JK, algumas peças publicitárias publicadas nas
revistas oferecem-nos grandes exemplos do investimento pedagógico feito pela
mídia coligada aos setores governistas. Grande exemplo dado por Adriana
destas peças publicitárias refletoras do discurso da modernidade pelos anos JK
e consumido pela população a partir dos meios de comunicação de massa é a
Caterpillar do Brasil. Segundo Silva (2007, p.238), “divulgando seus serviços, a
empresa evoca a modernidade nacional, ainda insipiente, numa evidente
pedagogia do desenvolvimento.”
Os ideais de modernidade iluminados pelo governo JK propõem a união
de ambas as categorias: tanto a preocupação com o delineamento de uma
identidade nacional, quanto uma vinculação mais pragmática com o
desenvolvimento econômico industrial brasileiro, buscando o integrar os
quadros modernos e civilizados do mercado internacional. Segundo Martin-
Barbero (2001, p. 56), até os anos 60, a idéia de modernidade esteve
associada ao conceito de nação, e após, o conceito de modernidade se atrela à
noção de desenvolvimentismo 2.
Para o sucesso do plano desenvolvimentista de JK, houve a
necessidade do apoio dos trabalhadores, do povo, da massa que passaria a
ser consumista para chegar ao nível de desenvolvimento e progresso
almejados pela classe industrial, principalmente. Os industriais passam a
pegarem para si a ideologia difundida pelo ISEB. Exemplo disso foram a
criação da FIRJAN e da FIESP.
2 “Versão renovada da idéia de progresso, o desenvolvimento é concebido como um avanço objetivo, isto é, um crescimento que encontraria seu expoente quantificável no crescimento que encontraria seu expoente quantificável no crescimento econômico e sua conseqüência natural na democracia política”. (MARTIN-BARBEIRO, 2001, p.56)
18
CAPITULO II – A CRIAÇÃO DA SOCIEDADE DO
AUTOMÓVEL
Neste capítulo tentaremos, através de uma análise do contexto histórico
do governo de JK, como se deu a criação da sociedade do automóvel pelo
público de massa através da ideologia do desenvolvimentismo, (CARDOSO
1978, p.117). Se em 2009 batemos recorde de vendas de automóveis, isso de
deve a essa “sociedade” estar calcada no imaginário nacional. Com isso, o que
podemos ver será a falta de atenção a outros meios de transporte de massa,
como as ferrovias e transportes marítimos em detrimento do automobilismo
nacional.
2.1 – IDEOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO
O programa desenvolvimentista de JK teve êxito por vários motivos. No
momento de seu governo, JK tentou atender a todos os anseios das classes
nacionais. Todos deveriam estar em consonância com o governo para que as
metas fixadas em cinco anos fosse realidade. A situação de otimismo que
imperava no momento foi também importante para o sucesso do plano.
Sucesso esse com ressalvas como vimos no capítulo anterior, mas nos
ateremos à construção desse otimismo através da figura de JK.
O sucesso da política econômica de Kubitschek foi o resultado direto de
seu sucesso no sentido de manter a estabilidade política. Segundo Skidmore “o
segredo residia na marcante habilidade de Kubitschek em encontrar alguma
coisa para cada um (as classes), enquanto evitava qualquer conflito direto com
seus inimigos.” (SKIDMORE, 1982, p.207). JK adaptou cuidadosamente o seu
nacionalismo desenvolvimentista, a fim de ganhar a máxima simpatia de cada
classe.
Os agricultores brasileiros não ofereciam problemas para a estratégia de
JK. Amparar e manter o sistema de propriedade rural foi a prática do governo,
através da expansão do crédito rural, por exemplo.
Com a classe trabalhadora, JK adotou uma política cautelosa de
generosos aumentos salariais e continuou com o controle governamental na
19
estrutura sindical. Aos intelectuais foi dada a Meca das pesquisas e do ensino
dos problemas brasileiros – ISEB. O instituo lançou uma série de livros e
publicações racionalizando o problema da industrialização e explicando as
causas e os efeitos do subdesenvolvimento em cada setor da sociedade e da
economia.
Dos industriais ele podia esperar um apoio entusiasta. O seu governo
oferecia aos empresários credito fácil, além de continuar a protegê-los das
importações, prometendo-lhes desse modo grandes benefícios no mercado
interno em rápida expansão.
Essa configuração de apoio das classes nacionais favoreceu o
surgimento da ideologia do desenvolvimento. O ISEB foi um dos principais
fomentadores dessa ideologia. Se não o construíram, pelo menos “reconhecê-
la, organizá-la e difundi-la” no imaginário empresarial do período. Segundo
Mendonça
sendo a industrialização a meta básica da burguesia nacional e, ao mesmo tempo, a síntese das necessidades objetivas de todo o país, era ela apontada como portadora da autentica ideologia nacional. Afinal, representava os interesses de todos os setores progressistas da sociedade. (MENDONÇA,1988, p. 63.)
O desenvolvimento capitalista se faz assim por meio da produção
econômica e da produção ideológica. Nesta, o principal papel cabe ao poder do
Estado, voltado primordialmente para o crescimento e o fortalecimento da
economia. A estrutura ideológica capitalista é montada sob a dominância do
seu campo ideológico político, a partir dos aparelhos de Estado, e neste campo
a dominância cabe a ideologia econômica, com a formulação de políticas
destinadas a permitir e a garantir a expansão econômica, com a qual a forma
do Estado é condizente. Todos os demais campos ideológicos – o religioso, o
filosófico, o artístico, o cientifico, etc. – se constroem sob esta dominância e
são marcados por ela.
O nacional desenvolvimentismo como ideologia é a expansão ideológica
das relações sociais do governo JK, especialmente do estabelecimento da
relação de domínio das suas frações dominantes. Segundo Miriam Limoeiro o
controle político tem como finalidade a expansão econômica e que se tratando
de uma sociedade de classes, a forma de poder e da expansão são formas
20
adequadas ao sistema vigente da divisão de classes. Ainda Miriam “uma
determinada ideologia dominante não se define em função da classe
dominante, mas das relações entre as classes” (CARDOSO 1978, p.89).
A industrialização do país era a preocupação grande e constante do
governo JK. Ele acredita que com o advento industrial, com o crescimento da
indústria pesada virá aumento da riqueza, virá à prosperidade, que não atinja
apenas grupos particulares, mas a sociedade inteira: “todos que a compõem
poderão se beneficiar do progresso alcançado. De acordo com Juscelino,
portanto, a busca da prosperidade tem em si mesma a marca do social, e nesta
a de toda a coletividade” (CARDOSO 1978, p.94).
O que inferioriza e humilha uma nação, nos moldes do pensamento
desenvolvimentista é a sua pobreza. Defender esta nação significa livrá-la
desta inferioridade, acabar com a sua pobreza.
Já que caracteriza a situação do Brasil – identificada com a de vários outros países, especialmente os da América Latina – como de pobreza, e porque entende esta pobreza como um estágio, como um retardamento na longa rota do desenvolvimento, a conseqüência necessária em termos da política desses países deverá ser no sentido de apressar o passo para atingira posição de grande nação. Dessa forma, o desenvolvimento é progresso e bem-estar. (...). (CARDOSO, 1978, p.95).
.
Na ideologia do desenvolvimento, o subdesenvolvimento não é
entendido com resultante de nenhum determinismo que distinguisse por
fatalidade alguns países dos demais. Ao contrário, o quadro apresentado é de
relativização da miséria em que se encontram esses países: ela pode ser
ultrapassada, é mesmo fatal que seja, e a mentalidade do desenvolvimento
deverá fazer com que esse seu destino se cumpra mais rapidamente. Nos
discursos de Juscelino é visível essa mentalidade de transposição da miséria e
do subdesenvolvimento:
(...) o desenvolvimento constitui a mudança na rota de um País empenhado em transpor a barreira do subdesenvolvimento e ocupar entre os povos do Mundo, o lugar que lhe cabe pela sua extensão, pelas suas riquezas, pelo valor dos seus filhos (JK – Mensagem, 1960 XXVIII).
O Brasil tem potencial para se tornar um país desenvolvido e o
desenvolvimento estava na força da sua industrialização. Isso remonta ao
sacrifício do povo, ao trabalho “realizado, o atraso destas regiões poderá ser
superado”. (CARDOSO,1978, p. 101) O desenvolvimento segundo Cardoso é
progresso e bem-estar do povo. A coletividade é necessária para que todos os
21
envolvidos sejam beneficiados pelo progresso que a industrialização – modo de
sair do atraso econômico na visão dos isebianos – promoverá a nação e a
sociedade brasileira.
Um futuro promissor é a perspectiva com que o desenvolvimento acena
e de que se utiliza como fator de mobilização da sociedade. A ideologia
transmite a certeza de que estamos mesmo à custa de sacrifícios, construindo
um futuro melhor. A ênfase desta ideologia é a mobilização para o
desenvolvimento. O desenvolvimento infunde a crença de que a nossa
esperança não é infundada, pois não podemos fugir do nosso destino, um
destino de grandeza. “Isto é, que a unidade nacional se manifeste numa única
vontade coletiva: possibilitada pela apresentação de um objetivo comum, fruto
da mesma esperança animando a todos”. (CARDOSO, p. 240) A atitude que
informa a mobilização é assim, um misto de emoções e comportamentos que
envolvem otimismo, fé, entusiasmo, esperança, todos voltados para a
realização de um destino que já é dado como grandeza. Há, conforme Cardoso
aponta, dois principais pontos de sustentação ideológica para a política do
governo: o destino nacional, afirmado como altamente positivo e encorajador e
a fé que emana dele.
A criação do espírito do desenvolvimento exige e apresentação de
condições favoráveis, mesmo que estas sejam tão somente imagens evocadas
de sentimentos e disposições propicias. O futuro da riqueza material, bem estar
social e grandeza é delineado com esta função principal, recorrendo a imagem
de uma sociedade mais justa. Segundo Cardoso este é um dos fatores mais
eficazes quanto aos propósitos de mobilização pela nova mentalidade do
desenvolvimento.
Para JK o pauperismo degrada o homem, a prosperidade o valoriza. A
valorização do homem brasileiro constitui o objetivo final de todos os
empreendimentos do seu governo, preparando-o para usufruir as conquistas da
civilização contemporânea industrial. E a nação não sendo desenvolvida não
tem a sua soberania forte.
Os aspectos centrais da ideologia do desenvolvimento são a
prosperidade e a ordem. Os dois se fundem no seu conceito de soberania
como equivalente da autodeterminação, identificada como igualdade com os
grandes Estados. Para o desenvolvimentismo, num país economicamente fraco
22
a soberania não deixa de ser precária. Somente os países que se afirmam no
terreno econômico e em que vigora o regime democrático podem exercer
plenamente a sua soberania. E assim desenvolver no povo, na massa nacional
o sentimento de patriotismo, de nacionalismo atrelado ao desenvolvimento,
este promulgado graças aos investimentos estrangeiros e nacionais. Ser
patriota era agora lutar pelo desenvolvimento do Brasil. Ser soberano é o
equivalente a um país rico.
Em resumo, a mensagem transmitida é que o desenvolvimento será
proveitoso para todos, mas que, também, todos devem contribuir para que ele
seja atingido o mais depressa possível. Na verdade, o processo da sua
aceleração no ritmo pretendido pesará mais sobre os outros da grande massa
consumidora, da parcela da população que vive de rendimentos fixos. A
ideologia procura a adesão, assim, dos demais setores, convencendo-os de
que também serão beneficiados. Ou melhor, não distinguindo setores, grupos
ou classes, ela pensa a nação, o país e identifica o benefício nacional com o
benefício do seu povo.
A ideologia do desenvolvimento colocou toda a nação brasileira a um
clima de euforia. Todas as classes, sendo atendidas em suas ambições, vêem
ao encontro do governo, legitimando-o e a sua política econômica. Foram os
isebianos os responsáveis de difundir conceitos de perspectiva histórica e
consciência crítica da realidade nacional. Os intelectuais isebianos associavam
o conceito de desenvolvimento nacional ao de consciência crítica, um processo
orgânico institucional que desembocaria na “revolução brasileira” – um país
industrializado e desenvolvido. Uma ideologia do desenvolvimento, naquela
perspectiva, devia, antes de tudo, ser um fenômeno de massas, sendo que a
eficácia do projeto nacional só poderia ser alcançada quando o seu
sustentáculo social residisse também na consciência das camadas populares.
A mobilização da sociedade era vista como necessária para sustentar o projeto
de desenvolvimento brasileiro. Na concepção dos isebianos, o projeto não
deveria vir de cima como artefato de especulação de uma elite de sábios que
se auto-intitula esclarecida, pois o desafio era pensar o projeto de
desenvolvimento brasileiro sem fazê-lo à distância, mas consubstancialmente
junto às massas.
23
2.2 – O NOVO PADRÃO DE ACUMULAÇÃO – A INDÚSTRIA
AUTOMOBILISTICA
Para o incremento da industrial nacional automobilística foi criada em
1956 o GEIA – Grupo Executivo para a Industria Automobilística. Esse grupo
como todos os outros criados no governo JK eram os responsáveis em aprovar
projetos apresentados pelos grupos de trabalho envolvidos em cada setor do
Plano de Metas, segundo os interesses definidos pelo Plano. Eram compostos
por técnicos do Estado e das empresas privadas e controlavam a oferta de
tecnologia e financiamento aos empreendimentos particulares. De acordo com
Mendonça (1988, p. 54) estes grupos executivos acabaram por se transformar
no orientador da composição das inversões privadas, aprofundando a
dependência do capital com relação a ele. “Ao GEIA coube inicialmente
dimensionar o mercado nacional para os vários tipos de veículos e estudar a
natureza dos serviços que cada um deles se destina a prestar no quadro geral
da nossa economia de transporte.” (MEIRA, 1957, p.3).
O GEIA viria a
criar condições que afinal vieram despertar o interesse da inciativa privada, tanto nacional quanto estrangeira , para a industria automobilística, da maior importância e significação para o Brasil, industria que constitui o verdadeiro coroamento do processo de desenvolvimento industrial de um país e parece comportar em seu bojo todas as técnicas do nosso tempo. (MEIRA, 1957, p.4).
A indústria automobilística em si junta todas as características já
mencionadas na ideologia do desenvolvimentismo como sendo a mais
importante indústria de um país desenvolvido.
Ainda no discurso do Ministro da Viação, a indústria automotiva é a
espinha dorsal do destino de grandeza nacional que o Brasil é predestinado.
tudo isso nos dá a medida correta da importância que assume para os nossos destinos a implantação da indústria brasileira de auto-veículos. Porque, na verdade, a experiência já nos há de ter ensinado que sem produzirmos no Brasil os meios básicos de transportes de que carecemos, sujeitando-nos a importá-los em condições cada vez mais adversas, difícil, senão impossível, será assegurarmos a eficiente circulação das nossas riquesas, como o exigem os mais altos interesses da economia nacional. (MEIRA, 1957, p.3).
A falta de uma indústria nacional de veículos colocaria em perigo a
própria política econômica qüinqüenal do governo Juscelino. Lúcio Meira, em
24
seu discurso fala desse perigo e compara o insucesso dos setores de
transportes navais e ferroviários com a prosperidade da indústria automotiva.
Vale lembrar que essa insuficiência nos setores navais e ferroviários é
histórico, podendo aqui apontar o porquê da falta de desenvolvimento desses
setores e a sua continuidade nos dias de hoje de falta de investimentos, em
detrimento ao setor rodoviário.
se continuássemos como meros importadores de veículos motorisados poderíamos, eventualmente, comprometer, ou pelo menos tornar injustificáveis os planos rodoviários do Govêrno. Teríamos, assim uma repetição do que aconteceu nos setores de transportes marítimo e ferroviário, em virtude, justamente, da ausência, no país , das indústrias de construção naval e de fabricação de locomotivas, e da exigüidade de produção de trilhos, carros de passageiros e equipamentos para as estadas de ferro, circunstancia que, sujeitando-nos à dependência dos fornecimentos estrangeiros e aos azares da nossa falta de recursos em divisas, prejudicou, consideravelmente a nossa eficiência naqueles setores. (MEIRA, 1957, p.6).
Por mais nocivos aos interesses nacionais que possam ter sido os
resultados do Plano de Metas foram exitosos do ponto de vista quantitativo.
Previa-se a construção de 10 mil km de novas rodovias, elas estenderam-se
por mais de 20 mil km. É importante destacar que o desenvolvimento de todos
estes setores estava indissociavelmente ligado à implantação da indústria
automobilística, o carro-chefe do novo padrão de acumulação de riquezas e
que levaria ao país ao desenvolvimento. Esta visão é encontrada no discurso
de Lucio Meira no primeiro aniversário do GEIA.
Vê-se assim, quão importante é o papel que está reservado à nossa indústria de veículos motorizados. Não esqueçamos, por outro lado, que essa indústria, onde quer que se implante, enseja sempre um surto de prosperidade por assim dizer ilimitado. Indústria de integração por excelência, seus efeitos promocionais suplantam os de qualquer outro empreendimento industrial. Serviços e atividades, da mais variada natureza, florescem à sua sombra (...). Em função dela outras indústrias, leves ou pesadas, irão sendo criadas ou se ampliarão (...). (MEIRA, 1957, p.7).
É a partir da indústria de automotores que outras se desenvolveram e
ampliaram, gerando mais riqueza e prosperidade a nação brasileira. Por isso,
como sugere Sônia, que é a indústria automotiva a principal forma de
acumulação do pensamento desenvolvimentista.
Justificativas de que a indústria automobilística é a indústria da vez dos
países que caminham rumo ao desenvolvimento estão explícitos neste discurso
do Ministro Lucio Meira. Ela sendo a principal indústria de acumulação de
riquezas no ideário desenvolvimentista, é fácil entendermos o porquê da sua
25
importância no governo JK. É a indústria chefe que levará o Brasil ao mais alto
grau de desenvolvimento, igualando-se com os demais países desenvolvidos e
soberanos. É a indústria automotiva que desenvolverá e criará outras
indústrias, voltadas elas a necessidade da própria indústria de carros nacional.
É esse imaginário que se mostra contínuo, levando aos atuais quebras de
recorde na indústria automotiva nacional e com previsões satisfatórias nos
próximos anos, enquanto os setores ferroviários e navais ficam a mercê de
empreendimentos exclusivamente externos. Para exemplificarmos, os novos
trens da SuperVia do Rio de Janeiro foram todos construídos na Coréia.
Apesar de a SUPERVIA ser uma empresa atualmente particular, seria com
certeza mais vantajoso que tivesse uma empresa nacional o que poderia
baratear o custo total desta encomenda, o que poderia ser revertido em outros
setores, como o Atendimento ao Cliente, etc. Se hoje somos defasados em
relação a ferrovias e navios, devemos isso ao projeto desenvolvimentista de
JK.
Como já mencionamos, o desenvolvimentismo de JK ia ao encontro dos
industriais. O fomento da indústria e a posterior subida de importância da
classe industrial são graças a esse período. É no governo de Juscelino que os
industriais se firmam como classe social e como a diretriz da política estatal e
econômica nacionais. As idéias defendidas pelos membros do ISEB caíram
como luva nos interesses industriais das décadas de 50 e 60 do século XX.
Mas como trazer o apoio da massa para a causa desenvolvimentista? Como
fazer a massa consumir os produtos da nova era industrial, o modo americano
de viver? Outra ajuda é necessária, um veículo de idéias, não apenas ligada
aos intelectuais na produção isebiana de trabalhos sobre desenvolvimento,
mas à massa consumidora – as revistas ilustradas.
No século XX, sobretudo a partir da década de 1950, conservando seu papel noticioso informativo, as revistas ilustradas assumem uma função de formadora de opinião. Uma vez vinculadas à determinadas empresas e/ou capitais, as revistas ilustradas acabam por servir de instrumento de poder conformador de um discurso, acoplado à matriz ideológica que a subsidiava. (SILVA, 2007, p. 223).
Intermediando o jornal e o livro, as revistas prestaram-se a ampliar o
publico leitor, aproximando o consumidor do noticiário ligeiro e seriado,
26
diversificando-lhe as informações. E mais – seu custo baixo, configuração leve,
de poucas folhas, leitura entremeada de imagens, atendia a grande parte da
população que não tinha recursos de compra de livros ou simplesmente que
não sabiam ler. Em 1950 a taxa de analfabetismo chegava aos quarenta por
cento (40%) da população brasileira (IBGE, 2002). Como abarcar toda a massa
nacional se um grande percentual dela não sabia ler? Um marco revolucionário
na imprensa da época foram as ilustrações. Conformando um novo gênero da
imprensa periódica, as revistas ilustradas passaram a contar, além da
velocidade da leitura e informação e da multiplicidade de temas arrolados,
como apelo visual, a sedução das imagens primeiramente ilustradas e, depois,
no suporte das reproduções fotográficas. Silva destaca que o “impacto causado
pelas publicações ilustradas que, inaugurando a construção de um referencial
imagético pelo leitor, demanda, crescentemente, um hábito de leitura e
interpretação de imagens.” (SILVA, 2007, p. 234.)
Revistas como a Manchete e o Cruzeiro foram veículos disseminadores
da ideologia desenvolvimentista do governo JK. Peças publicitárias das
indústrias automobilísticas presentes no Brasil reinavam nas revistas, onde a
ilustração por si só já falava mais que mil palavras. Dessa forma, as empresas,
implicitamente ou não, veiculavam a idéia de desenvolvimento e progresso
através das páginas das revistas. Sendo o GEIA o responsável por
“dimensionar o mercado nacional para os vários tipos de veículos e estudar a
natureza dos serviços que cada um deles se destina a prestar no quadro geral
da economia de transporte” (MEIRA, 1957, p.8). Caberia as revistas
apresentarem os modelos a serem consumidos conforme a necessidade do
novo homem brasileiro, beneficiado com o consumo do progresso. O
desenvolvimento é um produto a ser consumido por uma grande parcela da
população. A massa consumidora que o capitalismo necessita para continuar a
acumular capitais e seguir a trilha do desenvolvimento do país.
A massa é colocada como a principal mola do processo de
desenvolvimento que o país passara entre 1950 e 1960. Sem a ajuda da
população com rendimentos, o Plano de Metas proposto por JK não seria
vitorioso como foi para alguns pensadores da época. Por isso a preocupação
dos isebianos em trazer a massa para a intentona desenvolvimentista que
assolava os ideários nacionais.
27
A indústria nacional automobilística era como já apontamos o carro
chefe da acumulação de riquezas, necessária para colocar o país nos trilhos,
ou melhor, dizendo, na estrada do progresso e do desenvolvimento. Essa idéia
deveria ser também adquirida pela massa consumista. A sociedade do
automóvel criou o imaginário de algo que, possuindo-o, seria ele considerada o
novo homem brasileiro. Combatendo-se a pobreza do indivíduo em busca do
progresso pessoal e assim da nação inteira, o consumo de um novo estilo de
vida foi o foco das campanhas publicitárias contidas nas revistas ilustradas.
Além dos automóveis, vemos campanhas de eletrodomésticos, energia, etc.,
alargando a ideologia do desenvolvimentismo para os lares brasileiros.
28
CAPITULO 3 - A INDÚSTRIA AUTOMOBILÍSTICA EM
NÚMEROS
Neste capítulo apresentaremos os números referentes à produção
industrial automobilística. Veremos através dos gráficos e tabelas referentes ao
período de 50 a 60 o desenvolvimento da indústria nacional e o seu incremento
através da expansão das estradas e o aumento do consumo de combustíveis
automotivos, mostrando o sucesso da indústria de automóvel no Brasil e a sua
continuidade nas quebras de recorde na indústria nos dias de hoje.
Em 50 anos o País fabricou nada menos do que 40 milhões de
automóveis – excluindo-se, inclusive, comerciais leves. Isso reflete a
continuidade do pensamento da “sociedade do automóvel” e o progresso que
veio junto da ideologia do desenvolvimento.
A produção automobilística não priorizou diversos tipos de transportes.
Ela surge com o caminhão, este o principal veículo necessário para o
progresso. A própria implantação da Mercedes Benz partiu de um produtor de
chocolates americano, que ao chegar ao Brasil percebeu a insuficiência dos
transportes, instalando sua fábrica aqui no Brasil.
Os carros de passeio, apesar de toda a propaganda e ideologia
empregada na sua comercialização não estava disponível a toda a massa
consumidora. Além disso, o papel do GEIA em apontar os veículos necessários
para o desenvolvimento fizeram os carros de passeio a serem produzidos em
pequena escala, se comparados aos caminhões, caminhonetas, utilitários e
tratores, voltados para a logística dos produtos manufaturados e para a
otimização da produção agrícola respectivamente. Abaixo vemos a tabela de
variação de salários praticados no Distrito Federal, na ocasião o estado do Rio
de Janeiro.
29
Salários
I – Salário Mínimo Estabelecido para os Municípios das Capitais - 1940/1961
(em cruzeiros novos) 3
Município
1951 a 1954
1954 a 1956
1956 a 1958
1958 a 1960
1960 a 1961
Rio de Janeiro
1.200 2.400 3.800 6.000 9.600
Fonte: IBGE - Anuário Estatístico do Brasil – 1961, p. 266.
Este era o salário mínimo praticado no Distrito Federal. A variação
salarial entre os municípios da federação chega a 300%. Ou seja, não era em
todo o país um salário fixo. Cabia aos estados estipularem o seu mínimo.
Pegamos como exemplo o Rio Grande do Norte entre 1956 e 1958. O salário
praticado era de NCr$ 1.200,00 (IBGE,1958, p.275) 32% menor que o do
Distrito Federal no mesmo período. Abaixo apresentamos a tabela de preços
dos automóveis praticados pelas principais indústrias automobilísticas. Os
dados são Do triênio 1958/1960, pois não foram encontrados dados referentes
ao período de 1950 a 1956.
II– Indústria Automobilística Brasileira
Evolução dos preços médios ao público (*)
Segundo as classes e o tipo – 1957/1969
(*) Em cruzeiros novos
AUTOMÓVEIS
1958
1959
1960
DKV - Vemag
511
622
727
Dauphine
------
499
538
Chrysler (todos os modelos)
------
958
1.106
Volkswagem
------
496
560
Fonte: DNER - Anuário Estatístico dos Transportes – 1970. Rio de Janeiro, Ministério dos Transportes, p. 32.
Podemos levantar a seguinte conclusão: a região sudeste tinha mais
condições de renda, podendo adquirir automóveis. Já com relação ao resto do
país, principalmente na região nordeste (IBGE,1958, p.266) era impraticável a 3 O valor contido nas tabelas já está corrigido para cruzeiros novos. Vemos, devido à inflação, elevadas taxas de aumento, mas os valores apresentados foram convertidos para o índice do ano de 1962.
30
aquisição, a não ser por indivíduos que ganhavam mais que um salário mínimo.
Dessa forma, o projeto desenvolvimentista vinculada na formação da
sociedade do automóvel, por mais que tenha sido preocupada com a massa,
esta, por sua vez, não tinha real renda para aquisição de automóveis.
Mercadoria de luxo na maioria do imaginário brasileiro.
O caminhão era o automóvel principal para o incremento da indústria,
necessitada de um modo de transporte rápido para a entrega de seus produtos
ao consumidor final. Estradas estavam apontando para o progresso e as
indústrias consonantes com ele se valiam desta jóia do desenvolvimento para
se inserir no programa nacionalista brasileiro. Vimos que o nacionalismo nada
mais era que o desenvolvimento do país, atrelado ao capital particular –
estrangeiro ou não. Ser nacionalista era acreditar no desenvolvimento do país
em prol de se igualar aos grandes Estados Nacionais. Anexamos uma tabela
para avaliarmos como a indústria foi importante para as empresas otimizarem
suas demandas. Pegaremos o exemplo dos Correios e sua frota nos anos
finais da década de 40. Esses dados, apesar de não serem do período
estudado, nos mostram a dimensão e a incorporação do automóvel nas vias de
comunicação antes mesmo do governo JK. Não devemos achar que foi
Juscelino o toque de Midas da indústria automobilística nacional. Vargas foi o
seu primeiro impulsionador.
Vias de Comunicação
I – Correios e Telégrafos
Nº de Veículos em serviço
1947
1948
1949
Automóveis e Motociclos
267
277
290
Bicicletas e Triciclos
600
800
1.053
Fonte: IBGE – Anuário Estatístico do Brasil – 1950.
Outra tabela mostrará melhor a demanda do transporte rodoviário para
transporte de cargas. Poderemos notar nela a substituição do transporte
ferroviário pelo rodoviário.
31
III - Evolução do Tráfego Interurbano
Mercadorias, segundo o setor de transportes – 1950/1960.
(*) em bilhões de toneladas
Tipo de Transporte
1950
1951
1952
1953
1954
1955
1956
1957
1958
1959
1960
Rodoviário
10,8
13,4
16,3
19,7
22,3
23,1
25,5
26,8
32,0
37,3
42,6
Ferroviário
8,3
8,8
9,1
9,2
9,4
9,3
9,7
10,2
10,5
12,5
13,2
Fonte: DNER - Anuário Estatístico dos Transportes – 1970. Rio de Janeiro, Ministério dos Transportes, p. 10.
Podemos, através da tabela acima, perceber a demanda do transporte
rodoviário para a entrega de mercadorias. Apesar do crescimento em toneladas
transportadas pelas linhas férreas, é pelas rodovias que passam a maior parte
dos produtos finais para os consumidores. Percentualmente, o transporte
ferroviário perde desde 1950 para as estradas de rodagem. Se nesse ano, as
linhas férreas transportavam 29,2% das mercadorias, em 1960 ele é
responsável por 18,7% do transporte, ao passo que as rodovias, em 1950 era
responsável por 38% do transporte, chegando a 1960 com o índice de 60,5%
das mercadorias transportadas pelo Brasil.
A utilização do transporte rodoviário por parte das empresas para
otimizar entregas gerou um ganho na economia com relação ao acumulo de
capitais. Os preços dos serviços de transporte caem, pois para se entregar os
produtos precisa agora apenas de um meio de transporte, ou dois no máximo.
Para isso foi necessário a construção de rodovias que acabaram por integrar
todo, ou grande parte do território nacional
Outra mudança significativa foi com relação ao transporte de
passageiros dentro do território nacional. Deixaram-se de lado as ferrovias, os
velhos trens pelos novos automóveis e ônibus que agora cortam todo, ou
quase todo país. A tabela a seguir mostra com clareza essa mudança no
transporte de massa nacional.
32
V - Evolução do Tráfego Interurbano
Passageiros, segundo o setor de Transportes (*) taxa percentual
Tipo de
Transporte
1950
1951
1952
1953
1954
1955
1956
1957
1958
1959
1960
Rodoviário (somente ônibus)
58,3
57,5
59,4
60,2
60,7
61,1
61,8
64,3
66,3
67,5
69,8
Ferroviário (interior)
32,7
33,3
31,5
30,8
30,6
30,4
28,8
26,1
25,6
25,2
22,4
Fonte: DNER - Anuário Estatístico dos Transportes – 1970. Rio de Janeiro, Ministério dos Transportes, p. 11.
Esses números saltam quando entra o ano de 1968. O setor rodoviário é
responsável pelo transporte de 89,1% dos passageiros, enquanto o ferroviário
cai para 7,7%. Os setores marítimo – de 3% em 1950 a 0,6% em 1968 – e o
aéreo – de 6% em 1950 para 2,6% em 1968 – eram os outros tipos de
transportes utilizados no contexto estudado. Vemos através dos números a
queda vertiginosa do setor ferroviário e o crescimento do setor rodoviário. Muito
disso se deve ao próprio investimento dos setores de transportes.
Apresentaremos outra tabela que explicita valores em cruzeiros novos.
Decidimos manter a cotação sem reverter para a nossa moeda corrente devido
a inflação sofrida, por isso deixamos para dar a dimensão dos investimentos e
seus valores.
V - Investimento em Transportes
Dispêndio efetivo do Ministério dos Transportes
(*) em milhões de cruzeiros novos
Setor de Transportes
1956
1957
1958
1959
1960
Rodoviário
3,5
6,6
15,0
18,0
27,8
Ferroviário (RFFSA e DNEF)
1,4
2,0
6,1
9,9
11,0
Fonte: DNER - Anuário Estatístico dos Transportes – 1970. Rio de Janeiro, Ministério dos Transportes, p. 16a.
33
A produção de carros de passeio chegou, no ano em que a indústria
nasceu aos 1 mil 166 automóveis fabricados. Muito menos do que os 16 mil
259 caminhões e os 10 mil 871 comerciais leves produzidos no mesmo
período. Perderam até dos ônibus e suas 2 mil 246 unidades fabricadas
naquele 1957 (www.artigonal.com,) a tabela a seguir dará a dimensão da
produção nacional entre 1957 e 1960, divididos em categorias.
VI – Indústria da Construção e Montagem do Material de Transporte.
Produção de veículos de Autopropulsão – 1957/1961
Segundo os tipos
Tipo de Veículo
1957
1958
1959
1960
Automóveis
-------
2.189
12.001
37.843
Caminhões Leves
1.008
4.682
7.908
9.626
Caminhões médios e Ônibus
15.475
26.479
36.312
37.518
Caminhões pesados
3.372
4.447
3.344
4.181
Jipes
9.291
14.322
18.178
19.514
Utilitários
1.554
9.010
18.500
24.396
Total produzido
30.700
61.129
96.243
133.078
Fonte: IBGE – Anuário Estatístico do Brasil – 1961, p.101.
É notório o florescimento da indústria de veículos. Em três anos,
saltamos de 30.700 veículos para 133.078, o que corresponde a 433,48% a
mais de veículos nas ruas. Apesar da pouca importância dada ao veículo de
passeio, nos anos de 1958 a 1960, sua produção cresceu em 1.729%, vindo
logo após os utilitários com a taxa percentual de crescimento em três anos de
1.570%. Os caminhões leves tiveram um aumento de 955% e os jipes, 210%.
Os caminhões pesados tiveram pouca variação, mas de qualquer forma o seu
crescimento é importante para entendermos o sucesso do Plano de Metas
apresentada por JK. Podemos apontar que esta produção esteja em
consonância com a ideologia do desenvolvimento. Tudo infere que o otimismo
34
e a fé no progresso tenham abarcado a população. A tabela sugere
que no âmbito da indústria automobilística o sucesso do plano econômico de
Juscelino foi inegável. O desenvolvimento chegava ao Brasil, e por meio das
rodas dos veículos.
É a partir de 1961 que o incremento do automóvel de passeio acontece.
A tabela abaixo mostra a evolução do índice de habitantes por carro de passeio
produzido no país.
VII – Frota Nacional de Veículos
Evolução do Índice habitantes/carros de passeio, segundo as regiões e as
Unidades da Federação
Ano 1950 1955 1960 1961 1962 1963 1964 1965
Total 203,9 142,3 108,9 100,2 85,4 73,6 63,7 57,4
Fonte: DNER - Anuário Estatístico dos Transportes – 1970. Rio de Janeiro, Ministério dos Transportes, p. 26.
Percebemos através da tabela acima que o índice de habitantes por
carro produzido vem diminuído a cada ano. Não temos os dados de 1951 a
1959, excetuando o ano de 1955. Vemos que a queda se faz mais forte a partir
do ano de 1961, e caindo até hoje. Temos que levar em conta que estes
números são uma média nacional e variações deste índice podem ser vistas
nas unidades da federação, como mostra o relatório do Departamento Nacional
de Estradas e Rodagem. Mas mesmo assim, podemos perceber a quantidade
de carros adquiridos no Brasil. Em 1950 o índice era um veículo para 203,9
habitantes, em 1965 passa de 57,4 habitantes por carro em utilização.
Outra tabela aqui analisada mostra o número total da frota nacional de
veículos entre os anos de 1949 a 1967. Ater-nos-emos até o ano de 1960, o
recorte de nossa pesquisa.
35
VIII – Frota Nacional de Veículos
Por tipo de veiculo, segundo as regiões e Unidades da Federação –
1949/1960
Veículo
1949
1960
Automóvel
194.815
570.195
Ônibus
11.171
27.645
Caminhão
139.542
320.197
Camioneta
14.352
69.576
Fonte: DNER - Anuário Estatístico dos Transportes – 1970. Rio de Janeiro, Ministério dos Transportes, p. 20. O salto mostrado através dos números da tabela acima mostra o
sucesso do Plano de Metas e a ideologia do desenvolvimentismo impregnada
na mentalidade do novo homem brasileiro.
Conforme a demanda de automóveis cresce, alargam-se também os
quilômetros de rodovias. Abaixo anexamos uma tabela que mostra esta
extensão em comparação as ferrovias.
XIX - Extensão da Rede Rodoviária
Total, segundo as regiões e unidade da federação -1959/1967
(*) em quilômetros
1959
1960 1961 1968
Total 462.411
467.026 498.872 931.422
Fonte: DNER - Anuário Estatístico dos Transportes – 1970. Rio de Janeiro, Ministério dos Transportes, p.39.
X – Extensão da Rede Ferroviária
(*) em quilômetros
1959 1960 1961 1968
Total 37.120 37.230 36.986 32.054
Fonte: DNER - Anuário Estatístico dos Transportes – 1970. Rio de Janeiro, Ministério dos Transportes, p.71.
36
Verificamos o pouco alargamento das ferrovias. As causas dessa falta
de investimento, ou melhor, pouco investimento em expandir as linhas é
justamente a entrada de investimentos particulares, especialmente
estrangeiros, nas rodovias e indústrias automotivas. Cabe ao Estado de
Juscelino incrementar investimentos nas rodovias, ao passo que o capital
externo estaria voltado para os bens de consumo, vulgo indústria de
eletrodoméstico e, sobretudo, automóveis. Notamos também que há a
substituição de linhas férreas por rodovias a partir de 1961. É neste ano que
vemos, através dos dados apresentados, um “boom” extensivo relacionado às
rodovias e um retrocesso das linhas férreas, com desativação de trechos.
Em 1948 a extensão em rodovias era um pouco mais de 200 mil
quilômetros. Em 1960 vemos este numero duplicar, enquanto as linhas férreas
sofreram um “encurtamento” de quilômetros. Nada mais visível que a ideologia
do desenvolvimento empregada nesta mudança em menos de 15 anos.
É fato comprovado que com a indústria automobilística, outras empresas
ligadas a ela se desenvolveram em conjunto. Empresas de transformação de
derivados de petróleo e metalurgia cresceram muito no período estudado.
Podemos verificar esse desenvolvimento através do consumo dos derivados do
petróleo.
XI – Consumo de Derivados do Petróleo (1939-1969)
(*) milhares de litros
Derivado do petróleo
Gasolina A e B Óleo Diesel Óleo Combustível
1939
543.543 170.357 591.998
1960
4.426.928 2.953.960 5.196.964
Fonte: IBGE – Anuário Estatístico do Brasil – 1961, p.95.
Apesar de o recorte ser além do nosso pesquisado, foi interessante
colocar os dados integrais da tabela para podermos ter a dimensão de quanto
as empresas ligadas diretamente a indústria automobilística se desenvolveram.
Infelizmente outros dados não foram encontrados como os das empresas de
metalurgia e motores, mas esta tabela dá a dimensão, ou pelo menos tenta
explicar, através dos dados, o quanto o desenvolvimento da indústria nacional
esteve atrelada ao desenvolvimento da indústria de automóvel. E logicamente
37
ao próprio consumo nacional de automotores, sejam para o emprego na
agricultura, seja para ocupar as recém construídas estradas brasileiras.
As tabelas apresentadas neste capítulo tentam ilustrar o sucesso da
ideologia desenvolvimentista, empregando capitais estrangeiros num misto
com recursos nacionais. Para os autores aqui apresentados e as tabelas acima
analisadas, vemos que o capital estrangeiro foi o fator imprescindível do
desenvolvimento do país.
38
CONCLUSÃO
A presente pesquisa teve como objetivo maior mostrar que a indústria
automobilística conheceu seu ápice no governo JK. A história do Brasil foi a
base dessa análise, usando como metodologia de pesquisa a comparação
entre os governos de Juscelino Kubistchek e de seus antecessores, mais
notoriamente Getúlio Vargas.
Vimos que a indústria nacional foi incrementada, fomentada no governo
Vargas. O nacionalismo econômico de Vargas proporcionou o desenvolvimento
da indústria brasileira ao substituir as importações por produtos nacionais. A
instalação de indústria automobilística pelo Estado começa a surgir como a
Fábrica Nacional de Motores. As empresas estrangeiras tinham que consumir
as peças feitas no Brasil, pois a política de substituição impedia a essas
empresas de importar, e se inicia a montagem em território nacional.
O incremento da indústria automobilística nacional aconteceu no
governo JK. A prática econômica de substituição de importações perde lugar
para o nacional-desenvolvimentismo, e logo para o programa
desenvolvimentista construída por grupos sob tutela do Estado. O ISEB, como
vimos, foi o principal meio difusor da nova Ideologia do Desenvolvimento e viu
que não poderia construir qualquer idéia de nação desenvolvida sem o
consentimento do povo brasileiro, da massa nacional. Logo as revistas
ilustradas, principal veículo de disseminação de idéias povoam suas páginas
com propagandas de carros, sempre ligada ao sentido de desenvolvimento, da
nação, do novo homem brasileiro.
Percebemos que a classe industrial era o grupo mais próximo da
ideologia desenvolvimentista, chegando a serem apontadas por pesquisadores
como a própria personificação da ideologia, principal baliza do Plano de Metas
de Juscelino. Em cinco anos o salto do progresso industrial foi notável,
principalmente o automobilístico, visto como o novo modelo de acumulação de
capitais. A combinação de recursos oriundos do exterior e as vantagens dadas
pelo Estado para essa entrada foram importantes para que a sociedade do
automóvel pudesse ser algo palpável.
39
Vemos nesta pesquisa, utilizando pesquisas acadêmicas e dados
estatísticos, o surgimento e o desenvolvimento da indústria nacional de
automóveis, percebidas atualmente no setor de transportes. O detrimento da
ferrovia em relação ao rodoviário que hoje é fato tem sua causa na história do
Brasil.
Se hoje vemos superação de recordes na indústria de automóvel é
graças a essa ideologia desenvolvimentista implementada por JK. A sociedade
do automóvel é a continuidade visível do governo Juscelino.
40
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
Anuário Estatístico dos Transportes. Rio de Janeiro, DNER/Ministério dos
Transportes, 1970;
Anuário Estatístico do Brasil. Rio de Janeiro, IBGE, 1950;
Anuário Estatístico do Brasil. Rio de Janeiro, IBGE 1958;
Anuário Estatístico do Brasil – Rio de Janeiro, IBGE, 1961;
Relatório Alfabetização por Raça e Sexo no Brasil (1940/2000). Rio de Janeiro:
ENCE/IBGE, 2002;
CARDOSO, Miriam Limoeiro. Ideologia do Desenvolvimento: Brasil: JK-JQ. 2ª
edição. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978;
FAUSTO, Boris. História Concisa do Brasil. São Paulo: Edusp, Imprensa Oficial
do Estado, 2002;
MARTIN-BARBEIRO, Jésus. Dos Meios às Mediações – comunicação, cultura
e hegemonia. Rio de Janeiro: UFRJ, 2001;
MENDONÇA, Sônia Regina de. Estado e Economia no Brasil: Opções de
Desenvolvimento. 2ª edição. São Paulo: Editora Graal, 1988;
MEIRA, Lúcio. Advento do Automóvel Brasileiro. Discurso de abertura da
exposição da indústria automobilística brasileira, comemorativa do 1°
aniversário do Grupo Executivo da Indústria Automobilística – GEIA. Aeroporto
Santos Dumont, Rio de Janeiro, 22 de Julho de 1957;
PENNA, Lincoln de Abreu. República Brasileira. Rio de Janeiro: Editora Nova
Fronteira, 1999;
41
ROZEN, Marcos. 40 milhões de automóveis fabricados. No Brasil!
www.artigonal.com. 18-01, 2010;
SKIDMORE, Thomas. Brasil: de Getúlio a Castelo. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1982, p 207
SILVA, Adriana Hassin. Nas páginas das revistas – Poder e indústria de massa
no Brasil de JK in Desvelando o Poder – Histórias de Dominação: Estado,
Religião e Sociedade (org.). Niterói: Vício de Leitura, 2007;
42
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
SUMÁRIO 3
RESUMO 4
METODOLOGIA 5
INTRODUÇÃO 7
CAPÍTULO I
A HISTÓRIA DO AUTOMÓVEL 9
1.1 – Governo Getúlio Vargas 9
1.2 – Governo JK 12
CAPÍTULO II
A CRIAÇÃO DA SOCIEDADE DO AUTOMÓVEL 18
1.1 – Ideologia do Desenvolvimento 18
1.2 – O novo padrão de acumulação –
a Indústria Automobilística 23
CAPÍTULO III
A Indústria Automobilística em números 28
CONCLUSÃO 38
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 40
ÍNDICE 42
FICHA DE AVALIAÇÃO 43
43
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: Título da Monografia: Autor: Data da entrega: Avaliado por: Conceito:
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