um amor em um momento - trata-se de um conto que integra o livro do autor, "devaneios em...
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Um amor em um momentoMarcio José de Lima_________________________________________
A dieta da luz
Era um dia como qualquer um outro na vida de Sinestética.
Ela comentava com suas amigas que chegara ao limite do
seu peso e que haveria necessidade urgente em começar
um regime, precisava manter-se saudável. A amiga mais
magra e mais vaidosa, por consequência, comentava que
ouvira falar de uma super dieta da luz. Sinestética e
Monavir nunca ouviram falar, mas queriam saber como que
era essa dieta. A esguia explicava que se ela não estava
enganada era uma dieta praticada pela esposa do
imperador do Japão ou da China, não tinha muita certeza
de qual país ela era. Só lembrava que a mulher ensinou:
“era como que colher laranjas em uma árvore imaginária
em um dia de sol e pronto”. Era só tomar água e comer luz.
Todas riram muito. Despediram-se e cada uma foi para sua
casa.
Um amor em um momentoMarcio José de Lima_________________________________________
Todas solteironas, todavia, Sinestética era a única que não
tivera namorado até agora. Dizia-se feliz como era: solteira
e morando sozinha, embora a sua vida fosse uma imensa
monotonia.
A noite chegou e os pensamentos voaram. Sinestética
decidiu começar a dieta. Aquela noite comeria de tudo. E na
manhã seguinte começaria a comentada abstinência de
alimentos. Comeu muito. Teve que dormir sentada porque
passou mal.
Um amor em um momentoMarcio José de Lima_________________________________________
Primeiro dia da Dieta
Chega a manhã. Três grandes copos de água foram seu
alimento. E como uma doida varrida começou sua colheita
de laranjas imaginárias. Deve ter colhido quase uma
caminhão imaginário - pensou. Riu muito. Quase rolou de
rir. Sentiu-se feliz. Com a barriga roncando – no entanto –
feliz.
Doméstica era sua profissão. Fazia com tanta dedicação
seu serviço que ao final do dia tudo parecia que tinha
recebido um toque de mágica pelo brilho dos móveis e pelo
agradável perfume de limpeza que exalava da casa que
cuidava.
Mais uns dois litros de água, tomou no almoço. Precisava
se alimentar. E imaginou-se colhendo de novo as
imaginárias laranjinhas. Saiu ao quintal e pôs-se a colhê-
las. Uma mãozadinha aqui, outra mãozadinha lá e mais uns
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cem quilos colhidos. Que delícia – delirou ela. A vizinha que
estava no sobrado ao lado observava a doméstica pela
janela de vidro fumê. Ah mais uma doida fazendo a dieta da
luz – afirmou – isso não vai dar certo. Se bem que se essa
ficar um ano sem comer não vai dar muita diferença. - Riu
maliciosamente a crítica vizinha.
A barriga parecia que tinha um caminhão roncando. Pensou
nessa hora em tantas coisas. - Um boi inteiro assando no
espeto. - Acho que vai ser pouco. – delirava a caprichosa
secretária do lar. Sentou-se um pouquinho, antes de
terminar o segundo piso. Olhou uma barra de cereais que
trazia na sua mochila. É agora, lá vai ela. Não vai resistir.
Seus olhos se arregalaram. Seus lábios desapareceram.
Vai comê-los. – Não vou c-o-m-e-r! E realmente não comeu.
Pôs-se a trabalhar.
A tarde chegou. Hora de ir para casa. Mais uns quatro litros
de água. Saiu na janela e começou a colheita. Só que
agora imaginou uvas. Uma colheita de deliciosas uvas.
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Contava duzentos e três cachos deliciosamente colhidos.
Água na boca. Um barulho na barriga. E um turbilhão nos
olhos. – Vou me sentar. Pensou “isso passa”. Enfraqueceu-
se. Suou um pouco. Suou mais ainda. Quase lavada de
suor resolveu tomar banho.
No banho começa a lembrar de tudo que comera até ali. As
guloseimas, os bolos, os salgadinhos um mais gostoso do
que o outro: coxinha, risólis, pastéis, quibes, e outros...
Seus pensamentos em abrupto ímpeto mudam de direção.
E o intento cada vez fica mais forte: emagrecer, ficar bela,
saudável e quem sabe conseguir um amor – casar.
O banho termina. Ela vai para frente do espelho. Observa-
se, admira-se, gosta-se. Nunca se olhara daquele jeito,
nunca se gostara tanto. E a pergunta da aflita: - será que já
emagreci? – Riu. Comentou: – que precipitada eu sou. Já
quero resultado.
As primeiras horas da noite lhe são muito extensas,
demoram a passar. Esta sensação lhe era estranha. A
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fome. A dor no estômago. Os delírios por comida. - Quantas
horas demoram esses minutos? – pensou Sinestética. - Eu
vou sair para ajudar a passar o tempo mais ligeiro. Talvez
eu me esqueça um pouco dessa fome.
A rua estava muito iluminada, pois era noite de lua cheia.
Lembrou-se do brilho da luz. Resolveu sentar-se no banco
da praça e ficar ali a se alimentar da luz da lua. – Agora vou
colher o quê? Já sei vou colher lírios. – As flores naquela
noite estavam muito iluminadas. A igreja branquinha parecia
que possuía luz própria. Os holofotes iluminavam toda a
extensão da praça. Dando impressão de que era dia.
Observava as crianças correndo no parquinho, brincando
muito. Via a felicidade nelas, seus sorrisos ecoavam e a
cada um deles era como se ela se saciasse um pouco mais.
Um sorriso da molecada lhe apagava uma lembrança de
um salgadinho. Um beijo de um pai ou uma mãe em filho -
um tipo de docinho lhe saía da vontade de comer. E isso
começava a lhe dar prazer. Os namorados na praça se
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beijando – davam-lhe a seu paladar o doce do mel, o
frescor da menta. E isso lhe deu muito prazer – extasiada -
por um minuto ficou atônita. Não entendia bem o que era
isso. Mas, gostou. Quando se sentiu realmente alimentada,
decidiu caminhar um pouco. Esqueceu de sua colheita.
Achou que não precisaria mais se alimentar naquele
momento. – Estou cheia! Agora tenho que caminhar pra
gastar essas calorias a mais. – balançou a cabeça em sinal
de autossarcasmo.
O calor daquela noite lhe dava sede. Resolveu voltar para
casa. No caminho tudo lhe era - de certa forma – novo. A
maneira como olhava para cada coisa era diferente. Sua
vida parecia ter outro sabor. E algo lhe batia no peito
galopante, mais intenso – talvez a vida se renovando –
filosofava.
Chegou em casa depois de caminhar bastante. Tomou
muita água, precisava digerir tudo o que viu-viveu.
Fazia muito tempo que não observava as estrelas. Decidiu
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sair e louvá-las, decifrá-las. Esta noite elas estavam muito
belas, pareciam um shake de escuridão e luz. Alguns
minutos observando dava-lhe uma paz sem igual. Sentia
que seus horizontes se estendiam para mais longe. Pensou
ser um cometa. Viajava por entre estrelas e planetas, mas
se emocionou realmente quando passou pela terra e viu um
planeta azul com sua grandiosidade e beleza. Pensou em
sua perpetuação – pensou eu sua preservação – pensou-se
como criação – pensou na paz entre os homens. A viagem
terminou. E estava na hora de dormir.
Deitou-se, agradeceu a Deus por mais um dia. E como uma
criança que conheceu algo de novo no mundo dormiu como
um anjo.
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Segundo dia da dieta
O sol brilha. Com uma energia fora do comum, sente-se
mais viva do que no dia anterior. A fome já não lhe
incomoda. Dirige-se à pia e toma seus dois litros de água.
Agora sente que a água tem mais gosto. Delicia-se a cada
gole de água tomado. Veste sua roupa. As cores escolhidas
por ela deveria naquele dia ser verde e branca. Com esta
mistura de cores determinaria que seu dia fosse de paz e
esperança. – Paz e esperança. - Riu. Não sabia bem o
porquê. Mas deveria ser assim...
Saiu de casa e, antes de iniciar o trabalho resolveu passar
na igreja. Teve uma imensa vontade de agradecer a Deus
pela manhã, pelo canto dos pássaros, pela noite bem
dormida, pela natureza, e por tantas coisas que se fosse
agradecer por cada uma perderia a hora do trabalho. Fazia
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muito tempo que não rezava. Fazia matutinamente o
caminho casa-trabalho e trabalho-casa, poucas vezes
passava na igreja rezar, a pressa lhe determinava o trajeto
– como se tivesse o compromisso de chegar em casa em
determinado horário.
Começou a notar as pessoas. Suas expressões avivavam
nela sentimento de curiosidade - o que pensava cada uma,
suas histórias, seus sofrimentos, suas vitórias...
Em sua frente ia uma moça de vestido azul escuro.
Resolveu, como quem não manda em seus atos, conversar
com ela. Mas como? – pensou. Simplesmente decidiu.
Cumprimentá-la com um alegre bom dia. E assim fez. A
moça alegremente retribuiu.
- Que belo dia hein? – falou Sinestética.
- Parece que hoje vai ser de sol. – retribuiu a moça de azul
num tom de intimidade.
- Está indo pra que lado? –
- Estou indo para o meu trabalho que fica em frente do
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cinema. Trabalho em uma livraria. E hoje tem o lançamento
de um livro. Preciso arrumar a exposição. O Autor vai estar
lá. Tem coquetel e tudo. Se você quiser ir lá será à noite. O
escritor dará uma breve palestra de apresentação de seu
livro.
- Quem é ele? Qual o nome do livro?
- Trata-se de um escritor novo, ele possui uns oito livros
lançados, o nome dele é Maximilliano Di Bruno - é um
pseudônimo. O livro é sobre o poder da mente e
neurolinguística.
Sinestética riu muito. Pediu desculpas mas falou que não
sabia o que era esse negócio de “neuro... neuro...”
- Neurolinguística. – Traduziu a moça. – Eu também não sei
muito sobre isso, mas ouvi falar que é algo que ajuda as
pessoas a serem mais felizes se entenderem mais. Dizem
até que as pessoas podem mudar suas vidas. O livro pelo
que ouvi falar tem a ênfase em tornar as pessoas mais
confiantes. Dizem que ele ajuda a superar algum de nossos
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traumas do passado e vivermos melhor.
- Parece muito interessante. Vou fazer o possível para ir.
- Tenho aqui um convite. Você aceita?
- Sim é claro.
As duas se despediram e Sinestética seguiu seu caminho.
A casa em que trabalhava parecia-lhe maior do que os
outros dias. Parou em frente e ficou a admirar a sua forma.
Era um sobrado em estilo alemão. Havia na frente um
bonito jardim. As janelas eram grandes. As cores da pintura
eram creme e marrom escuro. Havia no jardim uma estátua
de São Francisco de Assis. – História de doação e amor. –
Pensou ela. – É tem que ter coragem e muito amor pra
fazer o que este homem fez. Desprender-se de todos os
bens e viver uma vida de abstinência e doação.
Abriu o portão eletrônico e entrou. Na entrada da casa
sentiu uma forte dor na barriga. A fome lhe voltou. A tontura
também. Entrou na casa e foi direto para a geladeira.
Tomou um gole de água. Melhorou um pouco. Tomou mais
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água e sentiu-se melhor. Saiu no jardim e abaixou-se
tocando em petúnias, sentiu suas folhas, suas flores, e isto
a fez melhorar. Voltou para casa. Começou seu trabalho
que foi concluído antes do almoço. A hora do almoço - que
ela comeria - foi dedicada ao jardim. Regou-o, tirou as
daninhas, e passou um inseticida não tóxico para cuidar
das pragas. Retornou à estátua de São Francisco tocou-lhe
a mão. Admirou os pássaros que faziam seu cortejo e
pensou na integração do homem com o animal. Que luz os
atraía? Que luz tinha este homem? Sentou-se. Ficou vendo
as joaninhas, as abelhas, os beija-flores, as folhagens.
O tempo passou e já alimentada pela natureza sentia-se
satisfeita. Com mais força retorna ao trabalho. O dia de
trabalho termina. Liga o alarme e segue para sua casa.
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A palestra
Chega na sua casa. Checa sua caixa de correios - somente
cheia de contas a pagar: água, luz, telefone e crediários.
Imagina-se recebendo cartas de amigos, parentes, até de
admiradores – quem me dera, secretos; também de valores
a serem creditados em minha conta. Gargalhou de sua
medíocre condição. – Ah a esperança, florzinha que rego
diariamente e que teima em nascer...
Tomou um banho rápido. Tinha que chegar a tempo na
palestra. Sentiu-se um pouco fraca. Lembrou-se da janta. A
luz já tinha se ido e agora? Somente lhe restava a água. No
caminho de casa pegou água mineral de dois litros. Tomou
de um gole só mais ou menos um litro e meio. Sentiu o
doce da água, também sua salobridade - sentiu um
pouquinho de seu caminho, imaginou-a viajando por rios e
mares – mas isso foi só em um repente e retomou a sua
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missão arrumar-se para ir ao evento. Pegou em seu
guarda-roupa sua mais bela vestimenta, um conjunto muito
bonito de jeans e uma batinha azul-escura com uma
plataforma que nunca fora usada, aliás como todo o resto.
- O que será que vai acontecer lá? Nunca ouvi falar nisso.
Vou fazer feio... Aliás vou só conhecer melhor sobre isso –
na verdade nem estou interessada nesse negócio de
neuro... qualquer coisa – vou conhecer pessoas diferentes.
Quem sabe...
Sinestética não tinha o interesse por palestras. Sempre
evitava multidões. Seu interesse no máximo era ir fazer
visitas em pizzarias, lanchonetes, em petiscarias e na casa
de suas amigas Monavir e Tiseta. Sentia-se estranha.
Sentia algumas vontades novas. Amava ultimamente as
leituras fúteis, mas por alguns instantes pensava nos
clássicos, em alguns problemas do homem. O ócio na
maior parte do seu tempo era seu amigo e a tevê sua rede
para embalá-la ao sono dos finais de semana e às noites.
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Agora, sua vida dava uma guinada, se via toda arrumada
para um lançamento de um livro nem sabia de quem, nem
sabia para quem, nem sabia por quê. E, quem diria? Toda
arrumada, mais bela do que nunca.
Com o convite em mãos chegou em um hotel muito
elegante no centro da cidade. No hall a nova amiga estava
dando boas vindas aos presentes. Ela foi ficando por ali
mesmo. – Já chegou muita gente? – Você é a primeira. Riu
discretamente a amiga. – Nem o escritor chegou. Prometeu
que estaria aqui na porta. A propósito me chamo Durvalina,
pode me chamar de Dorva. Minutos depois começam a
chegar os convidados. Parece que ficaram na esquina
amontoados combinando em chegarem juntos. Também
chegou o escritor. Cumprimentou-as com um largo sorriso.
– Essas são minhas fiéis escudeiras? Brincou Maximilliano.
Dorva cumprimentou, como se estivesse em êxtase, um
mega star. – Nos falamos a maior parte do tempo só por
telefone, precisamos nos ver mais. Joseph está lá em cima.
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Ele dará as boas-vindas às pessoas na sala de palestras.
Já está tudo arrumado. O coquetel ficará a cargo do hotel.
Tudo em ordem. – Agradeceu exaustivamente Maxi. – Era
como queria ser chamado.
O olhar de Maxi e Sinestética se cruzaram de forma meiga
e verdadeira.
- Essa sua amiga é?
- Sinestética, muito prazer. – A esta altura Siné – era como
queria ser chamada ali pelo menos – estava muito à
vontade ajudando Dorva que entre um boa noite aos
convidados e uma palavra com Maxi organizavam a
recepção e davam um tom intimista ao lançamento – o que
era elogiado pela imprensa ali presente bem como por
alguns críticos de plantão que taxavam o comportamento
do autor de acordo com a linha de pensamento adotado em
seus livros: - a valorização do ser pelo ser. Sem distinção -
como se fosse um serviçal que de fato o era - resolveu não
vender ali nem um de seus livros – o que era feito por
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Joseph lá em cima.
- Não se preocupem autografo depois os livros. –
Tranquilizou o simpático escritor.
A recepção foi tranquila. As pessoas estavam à vontade. A
amizade de Dorva e Siné começou a se desenhar.
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O Triângulo
Siné percebeu que Dorva olhava cobiçosamente Maxi. Ele
com olhar fugidio desviava a admiradora, voltando-se para
Siné. Tudo se apagava ao seu redor como se aquilo não
estivesse acontecendo a ela como se as pessoas não
estivessem ali – só enxergava aquele que em um instante
roubou seus sentimentos – amor à primeira vista - pensou.
Dorva percebeu que havia um clima romântico entre os
dois. Um leve toque na mão quase que imperceptível entre
os dois selou tal desconfiança.
- Ah que bela amiga esta. – Ruminava Dorva.
Todavia, resolveu manter-se discreta. Morria ali – em seus
pensamentos medíocres - a possibilidade de uma amizade
verdadeira. Mas quem realmente saberia o destino desta
amizade?
- Dorva passou a observar Siné. Seus gestos suaves, sua
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profundidade de pensamento – embora não fosse de falar
muito – era preciso – falava com veemência e sabedoria. A
dor veio-lhe em segundos ao seu peito. - A ladra de coração
– pensou.
- Quem é esta mulher misteriosa? - Respirava Maxi. O
acontecimento já lhe rendera a oportunidade de conhecer
aquela bela moça que exalava um perfume de rosas. Seus
cabelos escuros davam-lhe um charme sem igual
contrastando com sua pele clara com algumas sardinhas
próximas ao seu aquilino nariz.
- Você... sentimento que nasceu em meu coração como se
estes minutos que passamos aqui fossem triplicados com
tão agradável companhia. – Maxi, falou quase que
automaticamente corando frente a Siné, frase ouvida por
Dorva que teve em frangalhos seu palpitante coração.
A recepção estava feita. Era subirem à sala. Siné falou que
subiria. E o fez, entrando na sala cheia, deixando para trás
Dorva e Maxi.
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Dorva aproveitou o ensejo e atacou Maxi, roubando-lhe um
beijo no elevador. Maxi atônito vermelhou, nada falou. E
ambos chegaram ao salão sem mais nem uma palavra
proferida.
Joseph compôs a mesa chamando alguns repórteres e um
vereador da cidade que se fazia presente. Maxi expôs
durante quarenta minutos o mote do encontro, falando
extasiado sobre a experiência do livro que tratava de forma
profunda – mas segundo ele – com linguagem simples
vulgarizando teorias tão complexas como a filosofia
existencialista e a teoria da relatividade de Einstein. Os
focos principais eram: a ajuda ao homem para se perceber
como homem e; aproveitar seu tempo dando-lhe uma
elasticidade promovida pelo prazer de uma vida vivida em
sua plenitude - do homem que aprecia um simples lírio ao
homem que descobre Deus na grandiosidade complexa das
relações humanas.
A eloquência de Maxi fazia Siné voar por suas palavras,
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tudo parecia tão claro, tudo tão profundo, viajava numa
nebulosa de saber-amor-prazer.
Dorva era ensurdecida pelo ciúme. Os recônditos da sua
mente eram abrigados por estratégias de conquistas. –
Como não pude perceber esta traidora no primeiro
encontro. Seus olhos ligeiros, seu sorriso malicioso. Quanto
fui tola. Chamá-la ao meu lado. O lobo vem à casa do
cordeiro. Ruía-se por dentro Dorva.
A palestra acabou, os convidados se retiraram, Joseph
levou as autoridades para um jantar. Saiu dizendo que
aguardaria Maxi assim que ele terminasse ali.
Ficaram Dorva, Maxi e Siné no final. A conversa fluiu em
torno do sucesso que foi o lançamento do livro. Maxi
elogiou desmedidamente a competência de Dorva. – Esta
foi a melhor apresentação que já participei. Muita
simplicidade, objetividade, e de um profissionalismo sem
igual. Dorva corou e orgulhou-se. Agradeceu afirmando que
o evento foi o sucesso que foi pela qualidade do trabalho do
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escritor que não merecia que fosse diferente.
- Irei fechar a conta. Vocês vem comigo? – Falou Dorva.
- Não ficaremos aqui. Preciso conversar com Siné. Vou
chamá-la para trabalhar em meu consultório. Você achou
uma auxiliar à altura da qualidade do evento, preciso de
alguém assim a meu lado. Declarou Maxi – provocando
mais ainda a ira de Dorva.
Os dois a sós. Siné ainda extasiada pela eloquencia e
charme de Maxi. Parabeniza-o. – Você topa sair comigo
logo após o jantar? Convida meio que descrente Maxi.
Rindo discretamente, com a humildade de uma jovem
inexperiente – aceita.
- Temos muito que conversar. E com um discreto beijo
incendeia as bochechas de Siné. O que é flagrado pela
admiradora de Maxi que fica tristemente parada no final da
escada que dá acesso à cena.
Despendem-se deixando primeiro Siné em sua casa. Segue
levando Dorva ao jantar. – Nos vemos... diz Maxi. – Té
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Miga. Brigadão... A gente se vê. Despede-se Dorva.
No carro ao sair para o jantar Maxi deixa claro a Dorva que
o relacionamento entre os dois seria apenas profissional.
Desculpa-se afirmando: - Dorva não é por nada, você é
uma mulher atraente, muito inteligente, madura nos seus
atos e palavras, mas... podemos ser amigos e só... acho
que encontrei a pessoa que há muito procuro. Siné sua
amiga... – Ela não é minha amiga – braveja Dorva. – Ela foi
alguém que conheci no momento errado. Tudo bem
podemos ser amigos? Mas assim que você se decepcionar
com aquela imatura estou esperando por você. – Ambos
aceitam a condição, e sobem sem nada se falar, para o
jantar.
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O Amor bateu no coração
Siné vai para a geladeira pega de sua água e a consome
como se estivesse no deserto. Meio que aturdida não
compreendia o que estava acontecendo em sua vida. –
Tudo tão diferente em tão pouco tempo... – balbuciava a si
mesma. Nunca um homem havia a olhado como Maxi. –
Aqueles olhos, aquela expressão sábia, sua boca, sua voz,
seus cabelos, sua sensibilidade, sua inteligência. – Quantas
palavras para descrever o que o coração não entendia,
somente sentia. Mais do que nunca a necessidade de
conhecer o mundo para impressioná-lo fazia-se presente. –
Quero saber mais. Quero viver mais. Quero viajar mais.
Quero me embelezar. Quero ser feliz. Tudo isso com meu
amor. Jogou-se de cabeça – com palavras – no amor de um
desconhecido, que o sabia assim, todavia por alguma razão
lhe transmitia confiança.
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A lua ainda iluminada no céu com brilho se assemelhava a
um grande copo de leite alvo, luminoso, inspirador.
Ela pôs uma roupa leve e saiu na escada de sua casa que
dava para o quintal. De lá ficou a se alimentar da luz da lua,
dos sonhos ao lado do seu amado, das verdadeiras
amizades como Dorva que lhe oferecera até ali o que nem
uma amiga lhe tinha oferecido – a oportunidade de ser feliz,
de sonhar, de conhecer pessoas diferentes – embora não
soubesse o que se passava nos pensamentos de sua rival
amorosa. Isso Siné não sabia, pois Dorva dissimulou-se
muito bem. Sempre prestativa, sempre sorridente, sempre
pronta a responder atenciosamente o que Siné perguntava -
aparentemente uma pessoa sensível e autêntica. Talvez
tenha sido desfigurada pelos flamejantes dragões do ciúme
- quem sabe?
Os planos foram inevitáveis voltar a estudar. Decidiu voltar
a estudar, preparar-se para o vestibular, pois havia três
anos que tinha se formado no ensino médio. – Quero fazer
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psicologia. Decidi. – Quero fazer poemas. Aliás, esta noite
vou fazer um. - Adorava poemas. Eles a faziam sentir-se
melhor. No entanto poucas vezes pegou da caneta para
compor um. Eis a oportunidade. E num ímpeto queria ler
sonetos. Queria fazer para o seu amor – por ora platônico –
sonetos. Eles ajudariam também explicar sua paixão. Talvez
idealizá-lo como um cavaleiro que a acompanharia, que
estaria a protegê-la como a uma donzela em perigo.
O resultado de algumas horas tentando foi festejado logo
que saiu a primeira estrofe em um velho caderno:
Meu amor, que de longe imaginado
Pensava existir somente em estrela
Distante, outrora só em meu fado
Acendeu em mim, da esperança, a centelha.
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As tentativas se sucederam e adormeceu sentada no sofá
não conseguindo continuar a segunda estrofe.
Às duas horas da manhã. Bateu-lhe à porta Maxi. Meio que
atordoada abriu-a. Surpreendeu-a com um caliente beijo. E
a noite lhe ofereceu a inspiração que precisava para
terminar seu soneto. O que foi descrito logo de manhã após
Maxi ter se despedido com beijo - enquanto ela dormia -
deixando o número de seu telefone e as juras de amor
eterno presas pelos ímãs em sua geladeira num bilhete:
“Que desta noite ecoe o mais puro amor dos nossos
corações. Tomei a liberdade de ver seus versos. Amei-os.
Bjs.”
Emaranhei desejo não gozado
Em gotas de orvalho na lapela
Nunca havia deste mel experimentado
Sinto-me agora tinta em sua tela.
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Controlava, o pecado, meus conceitos
E você, meu amor, os olhou se quer
Com carinho ignorou meus defeitos
E com amor selou uma mulher
Que jamais sonhara tais deleitos
Que docemente em minha vida se fez mister.
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Dia de folga.
Ainda atônita perguntava-se era digna de tanta paixão.
Nunca imaginou que em tão pouco tempo começaria em
sua vida um momento deveras sublime.
A fome lhe veio como algo inesperado, como o verme que
lhe rói as vísceras. Com ela a sensação do esgotamento
tomou seus membros. Resolveu caminhar para esquecê-la.
Foi até a uma fonte no centro da praça próxima à sua casa.
Lavou-se: a cada vez que tocava sua face lhe vinha à
mente suores, ofegos, calafrios, felicidade... Embora, a
felicidade fosse um mar em que se encontrava submersa,
estremecia-se suas entranhas e o medo do amor frustrado
toldava-lhe por alguns instantes a luz que cintilava sorrisos
na alma que cobriam as mais densas lembranças de uma
vida sofrida. Aqui-agora-felicidade, pensou.
Vestia amarelo claro. Sentia na boca o gosto do enxaguante
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bucal que lhe enjoava. Sentou-se em um banco bem de
frente à igreja. Os raios solares, lambiam-lhe o rosto,
refletidos nas águas da pequena lagoa em que nadavam
alguns patinhos. A água naquele dia tinha que ser
reflexivamente apreciada goles calmos no fundo
ensalobros, salgado-doce. O coração sentia-o bater
aceleradamente. Mais água, os patos pareciam não se
mover, aliás tudo parecia não se mover – pelo menos é o
que parecia.
Apreciou um velho ipê amarelo. Seus galhos cobertos por
um ponche verde claro davam-lhe uma imponência real.
Lembrou-se do rei Salomão, suas riquezas, sua sabedoria,
sua mortalidade, do sermão do padre na quarta-feira de
cinzas, da simplicidade dos lírios da praça... O sofrer pelas
coisas terrenas. A correria do dia a dia em busca de se
eternizar por um momento, em um mísero momento. O fato
de não ter que animalescamente perder a eternidade para
garantir um tórrido pedaço de pão. Riu-se, xingou-se “boba,
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isso não é tua realidade! Esquece. Ô ô volte à tua aguinha!”
Sua voz ordenou para que voltasse de seu momento de
reflexão. O homem às vezes se animaliza na busca de seus
ideais, esquece de sua origem subliminar e prende-se ao
predatório materialismo. Espiralava seus sentidos tal
reflexão. “Já sei a fome. Quero mais água”. Saciou-se por
mais alguns segundos.
Não queria se lembrar da incrível noite – o medo do
abandono a atormentava – a eternização daquele momento
era seu locus amoenus. “Aprazíveis caminhos me levam ao
meu Amor. Seu celular... Vou ligar... Nem que eu queira
meus dedos não me obedecem, nem minha razão... Não
posso ser aquela que rasteja... Mas é o meu amor... Não
posso...”
- Minhas amigas. – Lembrou-se de suas amigas. Mas de
todas Dorva era a que lhe puxava o fio da memória.
Admirava-a, sua paciência, sua sabedoria, seu
conhecimento. – Minha mentora. – Balbuciou.
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As amigas
Já não se sentia tão faminta. Dirigiu-se à livraria em que
trabalhava Dorva. Ao chegar à vitrine da loja um choque
correu-lhe à vértebra. O livro de Maxi exposto, um grande
folder à porta com a fotografia de Maxi segurando o fruto de
seu trabalho e o slogan “Viver um fardo? Ou um presente
divino? Você faz a escolha.”
Para ela a escolha do amor gerava-lhe uma dúvida,
mesclada de satisfação e esperança.
Ficou alguns segundos em um plano diferente daquele em
que estava. As coisas ao seu lado ofuscaram-se. Maxi saía
do folder lhe abraçava, satisfazia-lhe, saciava-lhe, entendia-
lhe. Maxi talvez não soubesse a que intensidade incendiara
esta rica criatura. O amor de Siné era algo que – segundo
muitos - não existe mais em nossos dias. Em pouco tempo -
como uma adolescente – entregara-se aos encantos de
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uma paixão.
A mulher degladiava-se com a inocente criança que
habitava os recônditos de sua essência. A primeira alertava-
a à possível decepção, à superficialidade dos
relacionamentos, à maturidade da mulher que não se
aprisiona, mas deixa a paixão livre como um cavalo
selvagem. Já a segunda... possessiva, louca de paixão... a
entrega certa... a espera do príncipe encantado... algo
edipiano; o casamento; a casa limpinha... a dona de casa, a
comidinha, os filhinhos, os cachorros, as juras de amor
eterno...
Alguém a desperta com leve toque ao ombro. Com um
sobressalto interrompe-se a divagação. Olha para trás e
Dorva lhe recepciona com um largo sorriso. Siné a abraça
sinceramente. A amiga – pensou: porto seguro, conselho
certo.
- Como vai você? Desculpe-me o jeito. Onde você estava?
– sorriu maliciosamente Dorva.
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- Longe, muito longe. Aqui no meu peito tem um navio que
navega sem rumo. Ora no mar, ora no cais. – Filosofa Siné.
- Ah malandrinha, apaixonada não é?
- Digamos que... talvez...
- Seus olhos não enganam. Maxi é um Don Juan com as
mulheres, um legítimo gentleman. Esse Maxi. – apontou
com o dedo – Não se entregue fácil. É das mais difíceis que
ele mais gosta. - Alertou tardiamente Dorva.
Siné só sorriu.
- Maxi esteve aqui hoje cedinho. Ele passou aqui assinar o
contrato com a editora. Joseph estava muito contente com
a expectativa positiva do livro frente às vendas. Já é um
sucesso. – Comemorou Dorva.
Siné sorriu.
– Ele é muito inteligente. Inteligência e carisma são um prato
cheio para o sucesso. Reafirmou Dorva.
- E você como está Dorva?
- Estou ótima. Vou ganhar uma promoção. Vou ser
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responsável pela turnê de Maxi. Vou viajar com ele no
lançamento do livro na Europa por uns três meses. Depois
me estabeleço na França por mais seis meses na filial de lá
me aperfeiçoando e volto para gerir os negócios aqui no
Brasil na região sul. – Extasiava-se Dorva comemorando
oceanicamente.
Os olhos de Siné arderam, a palpitação, a falta de ar.
Engoliu tudo isso a seco e falou:
- Que bom! Quando vocês viajam?
- Daqui uns quinze dias. – Pausa.
- A propósito você não quer trabalhar aqui? Uma de nossas
atendentes vai ficar no meu lugar e vai sobrar uma vaga o
que você acha? Joseph amou seu trabalho, você ontem se
saiu muito bem. Vou acertar com você, você foi ótima. –
Dorva acatou muito bem a ordem. A discrição era pedido de
Maxi para que Siné não desconfiasse que o pedido viera
dele. Ele acreditava nela, mas, quem daria trabalho nesta
área para uma pessoa que não tem muito conhecimento em
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literaturas. Deveria ela conhecer muito. Mas isso não era
problema para Siné gostava de leitura, embora não tivesse
ainda frequentado uma faculdade. Era autodidata, aprendia
com a vida, aprendia com a natureza. – Um espírito
inquieto, uma mente limpa, um coração mais limpo ainda,
uma malícia pueril que decifrava o espírito das coisas.
Talvez foi isso que só Maxi percebeu. O conteúdo e não o
frasco daquela incomensurável fragrância.
- Amei o que fiz ontem. Não se preocupe aprendo rápido,
amo livros. Aceito o emprego. Quando começo? – Abraçou
Dorva agradeceu-a exaustivamente.
A situação era nova. Poucas vezes decidiu tão prontamente
por alguma coisa. Sabia que o desafio era grande. Mas que
engrandecida sentia-se. Era uma sensação de felicidade e
um dedinho de preocupação com seus patrões. Sempre
confiaram nela... e assim sair de repente, deixá-los na mão.
Eles entenderiam, - pensou, - sempre torceram por mim e
sabem que o meu momento chegou. Tenho que voar, tenho
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que conhecer coisas diferentes. Sempre estivera anônima
na multidão. Os rostos das pessoas lhe pareciam não
focarem em sua direção. Sempre uma anônima. Mais uma
carinha assustada que caminha na rua. Seus sentimentos,
sua vida, sua história, não interessava a ninguém... às
vezes nem a ela que procurava recalcar tudo que a fazia
infeliz. Tudo que a diminuía. Sua tristeza embora
embalasse seus dias, empurrava-a à uma vida diferente de
sublimação de apreciação das coisas pequenas: do canto
dos pássaros, das flores amarelinhas que faziam sua vida
mais feliz, dos cachorros na rua com seus olhares tristes,
solitários, famintos, às vezes doentinhos... Chorava por não
poder cuidá-los como deveria, o tempo lhe era pouco.
Cuidava poucos dias, encaminhava-os a alguém que
pudesse criá-los, o último que adotou morreu... Decidiu por
um tempo não tê-los. A posse: quem tem quem? Síntese
quase perfeita: homem x cão: amizade e não solidão.
Pensou “Seria muito infeliz se não tivesse sido curada da
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solidão pela presença em minha vida no momento em que
mais precisava de um amigo cão”.
Dorva selou neste momento, sem perceber, um contrato de
amizade. Uma amiga verdadeira. Daquelas que briga por
aqueles que a cercam.
Por outro lado, na ótica de Dorva, teria Siné por perto.
Vigiaria sua concorrente. Pelo fato de como mencionou que
seria companhia a Maxi em sua turnê já causou – bem no
íntimo de Siné – ciúme. Dorva comemorava o fato de quem
ficaria com Maxi seria ela. Era uma questão de tempo e em
poucos dias seriam um casal.
Que mesquinha sou eu! Por que estes pensamentos me
rondam? Não posso pensar isso. Esta pobre alma amou
aquele homem... Ela confia em mim... Pobre menina
perdida...
Por um instante Dorva compadeceu-se de Siné.
A viagem de Maxi trazia ao coração de Siné a realidade
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dura, dura realidade, e, isso a puxava ao seu mundo.
“Sei que Maxi não gosta de mim!” O conflito entre paixão
possessiva e consciência desconcertou Siné. E por alguns
segundos entregou-se à figura de amiga. – Talvez eu seja a
ele uma amiga, mais uma em sua vida. Seja o que for, foi
ótimo.
Um calor imenso corou Siné e Dorva notou. Mas não
comentou, apenas percebeu que fazia algum tempinho que
estava falando sobre o trabalho. O que deveria fazer. Ela
balança a cabeça e pede que ela continue.
- Vamos tomar um café assim a coisa flui melhor. E Dorva
sai com Siné como duas amigas confidentes, traçando
planos de quando ela começaria.
- Você folga hoje, amanhã você começa. Acerta a tua vida.
Tudo bem? Sorriu Dorva muito prestativa.
Siné festejou mais uma vez: carteira assinada, uma chance
diferente, um universo diferente...
Por outro lado a família que há dois anos a adotara seria
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deixada. Sentiu-se traidora. Mas a mudança teria que
acontecer e o pedido de conta: o choro, a despedida, o
início de uma nova vida.
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A tarde do Passeio
Siné resolveu retirar-se do mundo pois precisava refletir
sobre sua mudança repentina de vida. Tudo a aturdia: o
amor, a dieta, o novo trabalho, novas amizades, passou a
gostar-se.
Saiu diretamente do café e embarcou no ônibus. Ao
adentrá-lo as pessoas a fitavam alegremente. Algumas a
olhavam com inveja. Interrogava-se se era para ela mesma
que olhavam. Não se sentia neste momento como antes –
invisível ao olhar das pessoas – era como se uma luz
despertasse aqueles que a cercavam. Sentou-se na
poltrona. A brisa daquela tarde entrava alegre pela janela
lavando-lhe ainda mais suas desilusões passadas. Sentia-
se linda, sentia-se desejada, sentia-se como se a vida lhe
valesse a dura pena que pagara até aquele momento... “a
dor me edificou, hoje mereço o que vivo pela imensa dor
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que senti. Valeu ser uma boa moça e ter um amor
verdadeiro, pelo menos o meu é verdadeiro, e é isso que
realmente conta.” No seu interior Siné sabia que a sua dor
não era tão imensa como daquelas pessoas que sofrem de
doenças, ou daquelas que sofrem privadas da liberdade, ou
males maiores. Todavia, havia algo nela que poderia ter-lhe
tirado a vida. Sentia que às vezes não tinha liberdade, pois
não a vivia na sua mais profunda significação. Vivia presa
dentro de si mesma. Havia de se libertar. E essa nova vida
estava lhe oferecendo a oportunidade de sair de seu interior
e no mais íntimo de seus desejos viajar muito longe.
Absorver a vida que raiava nas manhãs e que ela por muito
tempo a ignorou optando por ficar na escuridão que toldava
seu desejo de presenciar coisas tão simples como o raiar
de uma manhã ensolarada.
Junto com a brisa veio-lhe gritinhos. Era da filhinha de uma
senhora que estava com uma pequena menina. A criança
chamava-lhe a atenção. Como se quisesse conversar com
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ela. Sorriu-lhe altivamente e se escondia atrás da mãe. Fez
várias vezes e Siné retribuía com um sorriso tão largo
quanto o da menina.
- Linda menina... uma princesinha. – Falou Siné elogiando
meio que timidamente.
- Ela realmente é muito linda, é minha meninha. Não é
filha? - Encolheu-se muito mais a criança quase que
desaparecendo atrás da mãe.
- Você tem filhos? Indagou a mãe da menina segurando a
menina que queria sair do colo.
Siné respondeu: - Não. (pausa) - Mas tenho veneração por
elas. Elas me relembram um tempo em que somente as
crianças me eram verdadeiras.
A mãe sorriu meio reticente. – Elas nos entendem, embora
sua consciência de mundo seja limitada e ingênua, seus
olhinhos veem coisas que nós adultos não enxergamos.
Elas nos pregam, às vezes, uma imensa lição.
Siné encantada com a meninha viajou a sua infância.
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Infância dura de uma família de poucos recursos. O pai era
biscateiro e a mãe trabalhava como diarista. Seu pai,
semianalfabeto, assim como a mãe. Mas a honestidade e o
valor à vida – pela vontade de sobreviver - era o que
segundo eles deixariam a ela. O pai sempre lhe falava: “te
darei estudo filha e ele não é tudo, mas é o que não podem
te tirar, meu maior presente a você. Enquanto eu puder te
sustentarei para você estudar”. Esta possibilidade não
durou muito tempo, haja vista ter tido a necessidade de
trabalhar bem nova para ajudar sua família no sustento da
casa. Ajudava sua mãe de manhã e à tarde ia para a
escola. Sua sofrida vida nem era percebida. As dores lhe
açoitavam, no entanto, com sua valentia as suportava, e no
fundo acabava até se divertindo com as poucas coisas que
lhe davam prazer. “Siné é muito madura para idade dela”
falavam as amigas da mãe. Essa menina um dia será
alguém na vida. A inteligência de Siné era elogiada pelas
patroas da mãe. “Uma menina com olhar vivo, com atitudes
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vivas, e uma luz muito grande.” Foi assim que foi definida
Siné por uma historiadora dona de uma das casas em que
a mãe dela faxinava. “Eu lhe darei alguns livros e você os
leia, assim que puder te darei mais. Conseguirei para você
uma carteirinha da biblioteca.” Esse foi um dos maiores
presentes que Siné ganhou, pois lhe traria uma lucidez de
espírito que a faria forte em sua caminhada.
Trabalhando, estudando, vivendo. As dores lhe eram
diversões, fortaleciam-lhe. Sua sofrida vida passava e os
sofrimentos não lhe eram assimilados. Mas, com o passar
do tempo veio-lhe a ansiedade. E sua dieta calórica,
oferecida pelos poucos recursos, lhe daria os contornos os
quais odiaria e lhe faria – como vaga desculpa – infeliz com
sua aparência. Mesmo assim, no seu interior, dizia-se feliz,
e seus pais até o final de sua adolescência sempre
estiveram com ela dando-lhe companhia e força para
suportar as dificuldades da vida e a sua desenfreada busca,
quase que inutilmente, em entendê-la. Lembrava-se
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também que às noites o pais contava histórias e não raras
as vezes seus pais cantavam embalados à luz do lampião.
Definia aqueles momentos como sua riqueza, sua
integridade. Seus pais cuidando - instintivamente - em seu
pouco entendimento, da integridade emocional da filha,
queriam que ela não se ferisse. Protegê-la, pois ela era a
eles “sua menininha”.
Aproximava-se o ponto de parada precisava descer. Beija
calorosamente a menina no rosto, bem como sua mãe e
desce. “Você valeu o dia!” disse docemente Siné
despedindo-se.
Havia perto de onde ela desceu um santuário. Tirou as
sandálias e andou pela grama até chegar à capela central.
Uma pequena capela em volta muitas árvores ao longe um
vale. Precisava olhar longe libertar sua mente. O céu tocava
o verde. Sentou-se embaixo de uma árvore. O canto dos
pássaros se fizeram sua música, relaxava-a. A lucidez
precisava fazer-se amiga dela, pois nesse momento ela
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precisava mais do que nunca ser lúcida. Entendia que a
felicidade podia ser momentânea e neste momento ela
poderia toldar-lhe seus sentidos.
Rezou alguns instantes. Entregou a Deus suas decisões.
Entregou a Deus seu amor por Maxi.
Ficou o resto da tarde ali. Depois foi para casa.
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As juras de amor
Quando chegou próximo a sua casa viu que o carro de Maxi
estava estacionado em frente. Sentiu uma imensa alegria, e
também insegurança. Não sabia o que falar. Gostaria de
poder encantá-lo, mas a criatividade é um animal selvagem.
Às vezes não conseguimos domá-lo, às vezes nem
conseguimos nem se quer vê-lo.
Maxi estava sentado na pequena varanda que havia na
saída para o jardim.
- Olá? Como vai? – perguntou Maxi.
- Muito bem e você?
- Já conseguiu assimilar a nova vida que você viverá daqui
para frente? – Sorriu Maxi.
- A maior mudança aqui é você. – Justificava Siné, com um
largo sorriso.
Ele a beijou suavemente, pegou suas mãos. E interrogou: -
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você não vai me convidar para entrar?
Siné sorriu novamente e abriu a porta. Abre toda a casa.
Sentam-se na sala.
A conversa foi longa. Haviam coisas para serem tratadas.
Maxi disse que era como se ele a conhecesse há muito
tempo. Não precisava conversar muito com ela para saber
que havia algo de muito bom nela.
- O que você viu em mim? Não tenho nada de interessante.
Sou uma menina sem a metade do seu conhecimento de
mundo. Você é viajado. Não sei nada de você.
Nesse instante Maxi põe levemente a mão nos lábios de
Siné e suavemente pede que ela não fale mais nada. Beija
carinhosamente sua mão. E diz: - amanhã você entenderá.
Poderia te dizer tudo o que senti por você. Mas passei a
tarde inteira escrevendo sobre isso. Seria tautológico.
Portanto amanhã leia minha crônica que publiquei sobre
nosso amor. Peço desculpa se expus a gente. Mas
precisava falar para o mundo inteiro. Eternizar um momento
Um amor em um momentoMarcio José de Lima_________________________________________
que para mim foi um dos mais felizes da minha vida. A
mulher que sempre sonhei. Mas... Amanhã você lerá e
entenderá tudo. Agora vamos aproveitar este momento.
Resolveram sair. Precisavam aproveitar o tempo. Maxi
dispensou seus compromissos e entregou-se a Siné.
- Vamos jantar depois, vamos ao cinema.
Não sabia da dieta de Siné. Logo saberia. Ficou meio
atônito, todavia resolveu respeitar. Não sem antes
aconselhá-la como quem tem conhecimento de causa, por
ter como aconselhadas várias meninas que sofriam de
anorexia.
- Você não sabe o quão triste é o sofrimento dessas
meninas, o quanto sofrem suas famílias e aqueles que as
amam. Pense profundamente no que você está fazendo. Na
livraria você encontrará vários livros a respeito do assunto.
Siné contra-argumenta afirmando que não está passando
fome, só mudou seu alimento. E desde que mudara, sua
vida também mudou. E agora ela se sentia muito feliz.
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- Olhe Maxi. (pausa) Desde que mudei meu foco de vida
cresci muito. Talvez não seja o momento de eu parar. Eu
supervalorizava algumas coisas. E não aproveitava outras.
Deixei de me alimentar da vida. E é isso que entendi.
Sentada à mesa com Maxi se alimentava de suas palavras
de sua preocupação, de seu amor quase que paternal. E a
noite passou agradável. Com cada um contando sua
história de vida.
Mais Siné falava, Maxi só ouvia como que se sonhasse.
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A crônica
Maxi saiu antes de amanhecer. Um bilhete na geladeira: “os
sonhos que mais nos prendem são aqueles a que nos
entregamos sem nem uma reação. Um agradável dia a
você. Um início ótimo de trabalho. Boa sorte. Passo à tarde
aqui. Com amor Maxi.”
Siné era toda empolgação. Seus olhos flamejavam. Era um
sonho que não sonhara, mas que o vivia com intensidade.
As colegas de trabalho a receberam com bonomia. Foram
simpáticas e dispostas. Embora uma delas, a mais velha,
aparentemente falou com ar de graça “aqui se muito
trabalha, pouco se ganha, mas muito se diverte, boa sorte
colega. Aliás livros novos chegaram, você já tem o que
fazer. Axulina você ensina Siné na catalogação?”.
Era um ambiente bem arejado, uma iluminação ótima, havia
uma sala de leitura com confortáveis almofadas, um
ambiente Hi-Fi, e tudo que uma livraria bem montada
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precisava ter, inclusive um ambiente infantil com salinha de
leitura e jogos lúdicos. Era algo muito agradável a Siné. O
saber batia em sua porta. Ali com certeza aprenderia muito.
Axulina chegou com um exemplar do jornal de circulação
regional em mãos. Falou a Siné. Dorva pediu que eu o
entregasse a você. Tem algo muito importante aí que te
interessa. Siné continuou catalogando. Observava as
pessoas que entravam. E cada uma delas apresentava um
ar que despertava nela o interesse de saber um pouco de
suas vidas. Aproximava-se para vê-las qual eram suas
preferências de leitura. Estudava-as e sem perceber a cada
pessoa que entrava arriscava mais ou menos a que sessão
se dirigiria – algumas vezes acertava – e isso se fazia uma
interessante brincadeira. As colegas às vezes não muito
simpáticas abandonavam os clientes muitas vezes nem
perguntando no que se interessaria. O que desejaria. E
assim passou a manhã. Dorva chegou perto da hora de
Siné sair para o almoço. Abraçou-a e falou:
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- Siné hoje estou conversando com algum de nossos
clientes e fornecedores, caso você precise de alguma ajuda
só você me ligar te deixo meu número de celular com você.
Ligue não se apure. Se você precisar de algum livro para
você se familiarizar temos todos em versão digital. Alguns
dos editores nos abrem para conhecermos seu conteúdo
com sinopses muito interessantes. A senha te entregarei
também. Não se envergonhe em perguntar. Todas as
meninas estão muito bem aconselhadas em não te deixar
na mão. Você é minha amiga. Eu não vou te deixar na mão
(insistiu). – Dorva falava ligeiro Siné só balançava com a
cabeça concordando. – A propósito tenho que ir ligeiro em
casa almoçar, à tarde continuo com meus serviços
externos. Até mais Siné. Amanhã conversamos mais.
Beijão.
Dessa forma sem Siné dizer alguma coisa Dorva falou com
uma das meninas e saiu apressada.
Logo após sai Siné para a hora do almoço.
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Curiosa Siné dirigiu-se à igreja. Benzeu-se. Sentou-se e
tirou de sua bolsa o jornal. Foi folhando até chegar na
coluna de Maxi. E começou a ler:
“O amor em sonhos e realidades. Prezados leitores.
Sempre venho a vocês semanalmente falar das relações
humanas e suas dificuldades. Atualmente tenho vivido um
conto de fadas. Lembram-se vocês de alguma vezes ter
citado em minhas crônicas uma mulher que sempre sonhei?
Era minha companheira ideal. Não digo que não tenho que
agradecer às muitas mulheres a que conheci e que muitas
vezes traçamos histórias muito felizes. Decepções vivi sim.
E mesmo elas me ajudaram a definir o meu padrão do que
realmente quero para minha vida. Agora volto a falar de
minha companheira ideal. Vejam só os senhores. Sairei de
minha formal maneira de escrever baseada na ciência para
de maneira – quase que coloquial – traduzir o que estou
vivendo. Há poucos dias no lançamento de meu último livro
havia feito um pedido aos céus. Que precisaria conhecer
Um amor em um momentoMarcio José de Lima_________________________________________
alguém especial. E foi nessa mesma noite que conheci. Eu
antes mesmo de conhecê-la pessoalmente já a imaginava
há muito tempo. A descrição era a mesma: fisicamente,
intelectualmente e sentimentalmente. Ela poucos dias, em
forma de sonho já havia se apresentado a mim. Seu rosto
não conseguia enxergar, mas sua voz para mim era clara,
era a mesma da mulher que me ajudou ter sucesso num
dos eventos mais importantes a que participei. Meu maior
contrato com uma editora. Minha maior chance de minha
vida. Sobretudo minha noite mais feliz depois de tantas que
se passaram como que se fosse a repetição de outras
opacas noites. Saliento que sua luz era sem igual. Sua aura
de bondade era um coisa fora do normal. Sua aparência
física era completada por uma sabedoria, daquelas
imanentes, daquelas que nasce com a pessoa. Confesso
que ela não precisa dizer muitas coisas. Como já falei, eu já
a conhecia. Senti medo disso. Mas o amor é maior. As
viagens que fiz me conduziram para caminhos
Um amor em um momentoMarcio José de Lima_________________________________________
desconhecidos. A cada uma delas a novidade me trazia
algo um pedaço do desconhecido e necessário à minha
vida. Sinto que de todas as viagens amorosas essa é a que
mais tem a me trazer algo novo. (Desculpo-me aqui aos
meus amores passados a que tenho muito que agradecer).
Confesso que pensei que não confessaria nunca um amor.
Principalmente a vocês leitores. Nunca fui tão pessoal nas
minhas escritas destinadas a vocês. Mas achei que esta
seria a chance de me fazer conhecer – uma pessoa
sensível, leitor de poesias, que se emociona com um filme,
que se emociona com a natureza, que se compraz com
aqueles que padecem, e que também sofre, mas não deixa
de acreditar. Em meus artigos, vocês sempre encontrarão
um pouquinho de mim. Hoje vocês tiveram a chance de ver
muito de mim. E isso graças a uma mulher que colocará
com certeza nos meus próximos livros – se ela mesma
quiser – um charme maior às minhas manifestações por
quanto tempo ela assim desejar. Termino hoje afirmando
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que vale a pena se entregar ao amor, ele é o remédio a
todos os males trazidos pelo tédio. Uma ótima e iluminada
semana.”
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A quinzena de amor
A crônica de Maxi aumentou ainda mais o amor de Siné,
bem como a admiração do público-alvo de seus livros que o
viam como um homem da ciência que escrevia friamente,
mas não de forma vazia, sobre o homem e seus recônditos
– suas fraquezas e seus caminhos alternativos para sair da
depressão e enfrentar de frente este mundo capitalista
predador. Este conflito, admiradores e Siné não perturbava
Maxi que tinha bem claro seu caminho, seus ideais – ter
filhos, viver um grande amor, fazer profissionalmente o que
sentia prazer: escrever.
Os quinze dias passavam rapidamente. Siné não
abandonou sua dieta que já não a incomodava – o sol, as
alegrias, as idas a lugares floridos ou em que a natureza
cantava silenciosamente uma canção, a igreja, aos templos,
suas amizades, seu novo trabalho que a cada dia mais a
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impressionava pela riqueza que possuía as infinitas páginas
das obras que se ofereciam carinhosamente a ela – que
servia como mediadora entre objeto desejado e ávido
consumidor. Enfim alimentava-se, às vezes, enfastiando-se
de vida que se fazia abundante ao seu lado.
Esses dias foram transcritos em uma poesia em seu diário:
“Fez-se enfim primavera
Fez-se em mim felicidade
E a quinzena... Já era.”
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A viagem de Maxi
Chegou o dia da viagem de Maxi. Abre-se aqui um
parêntese para comentários a respeito do tempo. Os dias
antes da revolução na vida de Siné eram muito extensos –
a sua dor – muitas vezes sem motivo, pareciam infindáveis.
Suas mágoas regurgitavam em suas vísceras e o tempo
regurgitava dessa forma. Seu sofrimento diário sempre era
novo. No seu interior a dor era intensa – fibromiálgica.
Embora buscasse externar-se como pessoa feliz,
sorridente, muito pronta a tudo, quase uma mãe de suas
amigas. Era estoicista, sofria por suas amigas, por ela
mesma, pelo mundo, pelas estrelas... Agora as novidades
de uma vida radiante aceleravam sua vida, páginas novas
no livro de sua existência, eram páginas prazerosas de
serem folheadas e quando revistas reavivavam mais ainda
seu dia a dia. Tornou-se solidária, agora, de sorrisos, de
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bons conselhos, porém sem deixar-se contaminar pela dor
do outro. Sentia prazer e, ser fonte de luz aos outros. Uma
nova vida.
Com essa radiância acordou ao lado de seu amado. As
malas estavam prontas. Era o dia. Maxi afirmou que
noivaria com ela no retorno e, ela ficava na incumbência da
organização do noivado. Sentou-se aos pés de Maxi a olhá-
lo era como um sonho que ainda não acreditava: o amor em
um tempo em que sentimentos puros são raros em meio a
tanta atitude mesquinha com o semelhante em que as
pessoas parecem ter saído de um iceberg.
O avião partiria às 15 horas, até lá buscaria fazer o que
pudesse para disfarçar a Maxi a imensa saudade que iria
sentir e a que já estava sentindo mesmo antes da partida.
Precisava ser forte. E de fato o dia foi muito agradável,
conseguindo aproveitá-lo mesmo diante de tal situação.
O fato que mais marcou o dia de Siné, foi Maxi ter feito um
noivado simbólico no meio da praça. O que ele fez a Siné,
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foi tirar suas sandálias, ele tirou os seus sapatos. Embaixo
de um pé de plátamo, apanhou um galho de uma flor
branca fazendo-o à forma de uma grinalda, no celular o
toque da marcha nupcial. Mas, o cortejo da natureza e dos
pássaros foi o que mais impressionou o momento – embora
não planejados – pareciam que o fora. Siné achou muito
engraçado, muito espontâneo, Maxi parecia muito feliz,
mais do que nunca, e seu sorriso ora quase que orbital,
seus olhos em chama não o deixaria mentir diante de tão
grande evento: natural, original, poético. Ao fim selaram um
amor, uma aliança. E devido à demora, quase que Maxi
perdeu o avião, saiu um pouco do planejado. Dorva estava
preocupadíssima – ligando sem parar a Maxi. Até que ele
chegou e ela se sentiu aliviada.
- Cuida bem dele Dorva.
- Cuidarei como meu irmão. Não se preocupe Siné.
Siné abraçou calorosamente Maxi, em seus olhos o amor,
em seus olhos a saudade, em seus olhos uma história que
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parecia não ter fim. O choro-riso inevitáveis. Olhar vivo de
ambos: o amor celebrado em de uma rica e transparente
taça de cristal.
- Contigo vai meu coração.
As lágrimas em seu olhos marejados caíram timidamente,
sua tez resplandeceu, e uma indescritível fragrância floral
foi sentida por Maxi, as flores abençoando uma união.
A solidão
Siné sentiu-se muito só. Em seus primeiros dias sem Maxi
ainda ecoavam seus momentos de felicidade ao seu lado.
Com o passar dos dias o sol já não brilhava para ela da
mesma forma. Nem os e-mails de Maxi com as fotos dos
lugares aos quais visitara conseguiam colocá-la para cima.
Certo dia quando caminhava na rua, viu um senhor sentado
na calçada. Era um dia muito quente. O homem lhe pediu
uma moeda para comprar pão. Ela parou e enquanto
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procurava em sua carteira moedas o senhor a interrompeu.
- Minha filha você está triste. Não se preocupe. (pausa) Ele
voltará.
Ela pegou as moedas e as entregou ao pedinte.
- Este homem não merece seu sofrimento.
- Como assim? – Indagou Siné.
(até aqui) - Ele trairá você com sua melhor amiga. – Meio
que sussurrou o homem com um imenso bafo de cachaça.
- O senhor não conhece meu noivo. Não me conhece.
- Não o conheço. Mas sei que ele não é fiel a você.
Siné sentiu um choque correr por se corpo. Sua garganta
quase que se fechou, seu coração palpitou. Suas mãos
suaram. Sua mente pedia-lhe que não contra-
argumentasse, que nada falasse – afinal era somente um
bêbado – alguém fora de seu juízo normal. Mas, tem coisas
que a razão não explica, como o nosso corpo reage
instintivamente quando provocado.
- O senhor diz isso porque a maior parte das pessoas trai.
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Nós somos muito felizes. Ele não vai me trair.
Num súbito impulso Siné deu por si e resolveu sair dali.
“Esse senhor está blefando. Quanto sou tola, dando
importância ao que diz esse bêbado.” Quando se afastou
um pouco mais, o senhor insistiu:
- O escritor... O escritor vai te trair.
Aí foi o golpe final. Siné fitou profundamente aquele
homem. Formigava seu estômago. O medo apoderou-se de
seus sentidos. E, ela afastou-se rapidamente com os olhos
marejados. A angústia. A dúvida. “Não vou acreditar... Esse
bêbado com certeza conhece Maxi... Ele deve ter nos
visto.” Assim pensava, assim esperava, assim rezava.
Mesmo tendo duvidado das palavras do mendigo – pelo
menos era assim que insistia em pensar – elas ecoavam
em sua mente. Agora a dieta era também de noites
dormidas. Os seus livros lidos passaram a ser os
ultrarromânticos. A dor. A nostalgia. A fuga. Trabalhava o dia
todo e à noite se internava na leitura. Suas amizades se
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preocupavam com ela, mas o telefone não o atendia. Os e-
mails de Maxi ficaram sem resposta e os colegas de
trabalho entregavam inutilmente os recados a ela. Os
postais chegavam à sua casa esbofeteando-a como uma
imensa mão que trazia escrita em seus vãos dos dedos a
palavra: traição.
Siné resolveu conversar com o mendigo. Dias ela desviou o
caminho em que ele poderia se encontrar. Todavia, chegou
o momento em que ela enfrentaria seus temores.
Aproximou-se da esquina em que ficava aquela esfarrapada
criatura – pensava-o assim por seu incrustado ódio. Parou.
Decidiu retornar e não o enfrentar. “Não. Decididamente
preciso ir.” O mundo nesta hora girou. Quase desmaiou.
Sentia as veias do corpo inteiro, seu coração a pulsar
fortemente. Seus braços estavam formigando. Passa uma
moça com olhar assustado e pergunta a Siné ali parada.
- Tudo bem com você?
- Só estou um pouco enjoada. Isso pode ser gravidez minha
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filha. - Sorriu a moça.
Sentou-se havia esquecido da possibilidade de gravidez.
- Não, não é minha senhora, estou em dia.
- Então pode ser o sol minha filha. Se alimente com comida
leve. Beba muita água. Aliás já te trago um pouco de água
pra você. – Assim entrou a senhora na lanchonete trazendo
em seguida água a ela.
- Obrigada minha senhora pode deixar estou melhor.
Siné recuperou-se um pouco e decidiu continuar no
empreendimento.
Quando virou a esquina olhou o senhor que estava sentado
no mesmo lugar que o vira antes. Ao observá-lo mais de
perto, não o reconheceu como sendo o mesmo daquele dia.
- Uma moedinha para o “veinho” minha filhinha.
- O senhor sabe onde está o homem que estava sentado
aqui dias atrás?
- Aqui é meu ponto minha filha. Não tem outro que pode
ficar aqui minha filha. É a lei da selva. Tudo para sobreviver.
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Depois eu contribuo com a cachacinha para os irmãos. –
Assim sorriu largamente o senhor com muitas falhas nos
dentes.
Siné insistiu.
- O Senhor me conhece?
- Já vi você passar por aqui. Mas nunca falei antes com
você. Difícil alguém me enxergar aqui minha fiinha. Ainda
mais moça bonita assim...
- Atônita Siné teve sua visão tolhida. Quase desmaiou.
- Tudo bem moça? – Perguntou um homem de terno que
passava por ali.
- Tô bem. Tô bem. – E saiu Siné apressada dirigindo-se à
ingreja.
Siné não entendia. Parecia estar alucinada. Vendo coisas
estranhas. Era a falta de Maxi? Era a dieta? Não conseguia
resposta.
A resposta talvez estivesse nos livros. Mas em que livro?
Mergulhou na leitura sobre o assunto. Metafísica não era
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seu forte, mas aos poucos ganhou força, apegando-se com
santos e anjos para enfrentar o momento.
Deixou-se esquecer do que havia ocorrido. Desligou-se da
saudade de Maxi. Embora às vezes ela a açoitasse. Suas
Suas chagas: trabalhos voluntários aos finais de semana.
Assim distraía-se. E os dias passavam.
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A invisibilidade
Aquele dia ao se acordar sentiu-se diferente. A luz parecia-
lhe mais amiga que outrora. Conseguia - como se seu
corpo fosse o fim de uma aresta - ver as diversas cores da
branca luz que lhe transpassava. A corpulência desse
evento distraía-lhe os sentidos. Notou suas mãos diferentes
– muito brilhantes. Sua face quase translúcida ao espelho
também refletia muito forte a luz. Ao sair à janela, um beija-
flor parou em sua frente, quase imóvel, tentou beijar-lhe os
lábios, o que conseguiu de leve. Ficou atônita diante de tal
acontecimento.
“Um beija-flor tentou provar de meu néctar.” Brincou consigo
mesma. Sentia como se formigas devorassem seu
estômago. A luz, agora, transpassava-lhe completamente. A
fome se intensificava. A saudade de Maxi, suas palavras.
Precisava abrir seus postais, seus e-mails. Decidiu em meio
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a tudo aqui – ir à tarde à uma lan house. Era domingo, não
trabalhava. Precisava ir ao parque, ir à igreja. O abraço dos
idosos um dia antes a reanimara, assim como a umas
palavras em sinal de gratidão e carinho de uma senhorinha
de cabelos azuis: “viva o amor como se ele fosse o único
motivo de sua vida, o tempo passa e só ele é a lembrança
que mais nos impulsiona a viver mais. Lembre-se disso,
pois ainda vivo intensamente aqui cada ato de amor que
vivi (apontava para o coração). Vale muito a pena, pode ter
certeza, pois é uma das poucas que tenho”. Sentia uma
imensa vontade de sair. Apressou-se em se arrumar. Foi
apanhar a escova dental, segurou-a, mas ela caiu. Achou
natural “escorregou”, pensou. Continuou logo após
arrumando-se. Ao tentar fechar a porta caiu-lhe da mão a
chave. Tentou pegá-la quase que não conseguiu. No
entanto, teve dificuldades, mas fechou a porta – a esse
momento o medo e a loucura eram tolhidos por um
resquício de sobriedade que não deixa nós pobres mortais
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acreditarmos em coisas do gênero. “Que está
acontecendo??!!” – indagou Siné. Descartou a loucura,
ignorou o fato e seguiu. Viu ao longe uma colega de
trabalho. Ao se aproximar a mesma não a viu. O que foi
autojustificado como sendo sua amiga “orgulhosa. Finge
que não vê as outras pessoas. Normal isso hoje em dia.
Falsas amizades, falsos colegas.” O padre de sua paróquia
– amigo de Siné – também não a enxergou. Aliás, todos
pareciam não enxergá-la. “Opa, opa, opa, tem algo de
estranho aqui!.” - Sentia alguma coisa que não sabia bem o
que era. Ela só sabia que isso não era o que deveria sentir.
Nesta situação os sintomas de um ataque de nervos seria o
mínimo razoável. Mas... não era o que estava acontecendo
com ela.
Vinha-lhe uma outra colega de trabalho em sua direção e -
esta daria graça se não a visse mesmo - o que acabou
acontecendo. Queria chorar. Não conseguia. Gritou,
ninguém a ouviu. Olhou-se: o corpo em luz, radiante, muito
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belo. Seus pés levitavam. “Subliminar” pensou. “Agora sou
um anjo” - não deixando de lado seu censo de humor. “Que
sonho mais demoradinho esse!” devaneava ironicamente.
No fundo, ela pensava-se num sonho. Aparentemente não
era. E esse frio da dúvida corria-lhe pelo seu subliminar
corpo.
“Cadê meus sentimentos? Se dissiparam com... com... –
não sabia definir. – Deve ser... isso?!” Que êxtase. Sentiu-
se inebriada. As pessoas ao seu comando andavam
devagar, bem devagar.
Pensou “Sei...! eu acho que... como é que eu vou dizer
isso? Eu...” Resolveu não dizer o que achava o que tinha
ocorrido. Mas então deve se igual aquele filme “O sexto
sentido”. Então...” Parou na praça em frente à fonte e ao
velho ipê. Voltou no tempo na noite de lua cheia e viu-se
sendo iluminada. Viu-se bela. Viu-se plena... A solidão a
deixou. Cada pessoa que passava perto dela agora a
alimentava. Seus sabores corriam - como se fossem
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essência – aos seus olhos. Suas dores, felicidades e
angústias. Escutava-lhes seus pensamentos – quando
assim desejava. Tudo isso a aturdia, mas não a
incomodava. Andou, viajou, viveu de forma diferente. Sentiu
prazer no canto do pássaro o qual contou com sua
presença por alguns instantes. Se emocionou ao ver vida
no ninho e a mãe alimentando seus filhotinhos. Continuou
andando na rua. Ao passar pela esquina em que tinha visto
o mendigo, o avistou novamente. Ela parou em sua frente.
Encarou-o com coragem, mas ele abaixou sua cabeça.
Conferiu - não foi o segundo que negou conhecê-la. Ela
parou poucos instantes ali. O senhor lhe dirigiu a palavra:
- Você ainda tem dúvida minha filha?
- O senhor consegue enxergar-me?
- Sim até seu lindo interior.
- Procurei o senhor novamente, mas não estava aqui.
- Eu estava aqui. Você não me enxergou. Éramos dois.
- Então...
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Um silêncio imperou. Siné resolveu não entender o que
havia realmente ocorrido. O fato é que ela conseguiu vê-lo.
As indagações eram menores que ânsia de talvez
aproveitar o estado em que se encontrava: feliz, em paz.
- O que está acontecendo? O senhor quem é?
- Você estava muito confiante em um amor e eu resolvi
testá-la. Hoje poucas pessoas amam de forma que você
está amando. – A face do senhor era tão expressiva quanto
suas palavras, como um druida respondia Siné com
sabedoria e paciência.
- Eu o amo muito...
- Você quer vê-lo?
- Sim muito.
- Então que se faça.
Tudo se espiralou ao seu lado em fechos de luzes
multicolores. Pararam em frente à janela do apartamento
em que estava hospedado Maxi. Pela janela Siné observou
Maxi abraçado com Dorva. Neste momento compreendeu
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as palavras que a alertavam à traição. Mas não se
enfureceu, apenas observou. Não entendeu porque a fúria
não invadiu seu coração que parecia bloqueado. Ficaram ali
alguns instantes.
- Nos aproximemos mais.
Ao se aproximarem ela viu que Maxi chorava. Durva
Consolava. Abraçados Maxi afirmou:
- Siné. (pausa) – O que aconteceu com ela?
Em um repuxo tão forte Siné e o misterioso homem saíram
dali. Retornaram à esquina. Siné fitou o senhor, pegou a
sua mão, beijou-lhe a face e atônita retirou-se.
Em frente à igreja sentada sentia os primeiros pingos de
chuva. A chuva engrossou e a água começou a lhe trazer
de novo à materialidade. Pouco tempo depois a mãe e a
criança que ela havia acompanhado no ônibus se
aproximaram e a menina ao colo da mãe lhe sorriu, jogou-
lhe um beijo com as mãos, sua mãe não percebeu o que
ocorria.
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Siné seguiu para casa. No caminho desmaiou. Uma mão
quente tocou-lhe à face. Abriu lentamente os olhos e com
um sorriso um médico - com a mesma face do mendigo –
lhe falou:
- Você menina precisa se alimentar... (sorrindo brincou)
agora você precisa comer por dois.
Fim
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