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SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO
Superintendência da Educação
Diretoria de Políticas e Programas Educacionais
Programa de Desenvolvimento Educacional
Universidade Estadual do Norte do Paraná – UENP, campus de Jacarezinho
ARTIGO /PDE AUTORA: Profª Maria Cícera da Silva Benedito ORIENTADORA: Dr.ª Janete Leiko Tanno NRE: Cornélio Procópio ESCOLA: Colégio Estadual Professor Mailon Medeiros – Ensino Médio e Profissionalizante. DISCIPLINA: História TÍTULO: O NEGRO HOJE: desigualdades e novas formas de resistências.
Bandeirantes – PR 2012
O NEGRO HOJE: desigualdades e novas formas de resistências.
MARIA CÍCERA DA SILVA BENEDITO1
JANETE LEIKO TANNO2
Resumo
Este artigo aborda sobre a desigualdade racial e social do negro atualmente e
suas novas formas de resistência, visando sensibilizar os alunos da 8ª série, do
Ensino Fundamental, do Colégio Estadual Professor Mailon Medeiros, Bandeirantes
– PR, sobre a necessidade de conhecer e valorizar a luta do negro e sua
contribuição na formação da sociedade brasileira para tornar-se cidadão pleno, em
seus direitos e deveres. Percebe-se que as crianças e jovens negros, incorporam o
sentimento de inferioridade quando se discute o futuro profissional, fruto da ideologia
racista e a escola deve lançar um olhar pedagógico sobre esta questão. Diante da
realidade social brasileira, que contribuição a escola vem prestando ao aluno
afrodescendente para a conquista da igualdade racial e social? Nesse sentido, o
objetivo geral da proposta é conhecer os significados da resistência negra à
escravidão e o legado deixado desde o início da luta até o presente, identificando
novas formas de resistências que os povos afrodescendentes vêm praticando no
sentido da criação de uma identidade do negro como cidadão, com direitos
constitucionais legitimados na prática da cidadania. O projeto foi desenvolvido em
sala de aula durante o ano letivo de 2011, além de atividades virtuais em grupo com
docentes de diversos municípios e um levantamento de campo para constatar as
informações obtidas por meio da literatura consultada.
Palavras-chave: desigualdade, afrodescendente, resistência, cidadania.
1 Professora da Rede Estadual de Educação, Núcleo Regional de Educação de Cornélio Procópio. E-mail: cicera98@hotmail.com
2 Professora Adjunta do Departamento de História da Universidade Estadual do Norte do Paraná – UENP, campus de Jacarezinho. E-mail: janeteleiko@uenp.edu.br
1 Introdução
O artigo aborda o estudo das desigualdades racial e social do negro
atualmente e suas novas formas de resistência, visando sensibilizar os alunos da
8ª série, do Ensino Fundamental, do Colégio Estadual Professor Mailon Medeiros
sobre a necessidade de conhecer e valorizar a luta do negro e sua contribuição
na formação da sociedade brasileira para tornar-se cidadão pleno, em seus
direitos e deveres. A pesquisa tem como respaldo a Lei 10.639 de 9 de janeiro
de 2003, que instituiu os conteúdos de História e Cultura Afro-Brasileira e
Africana no Ensino Fundamental e Médio, oficiais e particulares como
obrigatórios. Portanto, impõe a discussão de questões relativas à temática em
sala de aula.
Percebe-se que as crianças e jovens negros, incorporam o sentimento de
inferioridade quando se discute o futuro profissional, fruto da ideologia racista.
Entusiasmam-se com algumas áreas até importantes, como esporte, dança e
música, mas, por outro lado, assumem certa ‘incapacidade’ para o que seria as
áreas dos brancos, que supostamente seriam as relacionadas à ciência e
tecnologia, de mais alta remuneração.
Nesse sentido, socializou-se o assunto com os alunos da 8ª série – ensino
fundamental, a maioria afrodescendentes, e sequencialmente, realizou-se uma
abordagem de sensibilização sobre a condição do negro na atual sociedade
brasileira, focando o olhar para a realidade dos alunos, o lugar onde moram e
estudam, abordando principalmente questões ligadas às desigualdades, aos
quais os negros e seus descendentes ainda são submetidos, assim como quais
formas de resistências eles estabelecem na luta por igualdade de oportunidades.
Diante da realidade social brasileira, que posicionamento a nossa pratica
didática e pedagógica tem assumido em sala de aula para debater as novas
formas de resistência do negro em nossa sociedade, para a conquista da
igualdade racial e social? Que contribuição a escola vem prestando ao aluno
afrodescendente para sua emancipação social?
O estudo teve como objetivo geral conhecer os significados da
resistência negra à escravidão e o legado deixado desde o início da luta até o
presente, identificando novas formas de resistência que os povos afrodescendentes
vêm praticando no sentido da criação de uma identidade do negro como cidadão,
com direitos constitucionais legitimados na prática da cidadania.
2. O negro no Brasil: uma história de lutas e resistências
A exclusão racial e social da comunidade negra no Brasil sempre fez parte da
história desse grupo e mesmo com a Carta Magna vigente assegurando no seu
artigo 113, inciso I, que “todos são iguais perante a lei”, muitas formas de exclusão e
exploração ainda persistem, apesar de algumas conquistas, como a própria
Lei10.639/2003.
Nessa perspectiva a pesquisa se justifica devido a importância de se
conhecer como a questão étnico-racial tem relevância no cotidiano da sala de aula
e como vem sendo tratada, sob o ponto de vista pedagógico da preparação do
indivíduo, para a vida e a cidadania.
Segundo relato de Moreira & Candau (2008, p. 116):
A escola sempre teve dificuldades para lidar com a pluralidade e a diferença.
Tende a silencia-la e a neutraliza-la. Sente-se mais confortável com a
homogeneização e a padronização. No entanto, ao abrir espaços para a
diversidade, a diferença e o cruzamento de culturas constitui-se o grande
desafio que está sendo chamada a enfrentar.
O estudo pretende, então, conhecer e refletir sobre a questão racial e social,
visando elevar a estima dos alunos afrodescendentes, incentivando-os a estudar e a
conquistar o espaço que lhe pertence na sociedade, citando como exemplo de vida,
a primeira-dama americana Michelle Obama, que ensina “Se você quer, você
pode”.3
3 Frase dita no dia 19/03/2011- no discurso que proferiu para um grupo de estudantes, na cidade do Rio de Janeiro, durante a visita da família Obama ao Brasil.
Analisando o cenário do nosso passado histórico, constata-se que o negro ao
ser transformado em escravo perde a condição de ser humano e passa a ser
considerado uma “coisa”, um “objeto”, uma “mercadoria” e fica à mercê da vontade e
do desejo do seu dono. Entretanto, esta condição não é aceita pacificamente,
conforme nos informa a história da escravidão negra no país. As lutas, as
resistências faziam parte da vida dos negros. Com a Abolição em 1888, estes
passam a criar estratégias diversas para posicionar-se em condições de igualdade
na sociedade brasileira.
Diante de tais fatos históricos, que posicionamento a nossa prática didática e
pedagógica tem assumido em sala de aula para debater as novas formas de
resistência do negro em nossa sociedade, para a conquista da igualdade racial e
social? Que contribuição à escola vem prestando ao aluno afrodescendente para
sua emancipação social?
Nesse momento de inquietação, vale lembrar a percepção de Guimarães a
respeito da questão racial (1999, p. 169):
Classificamos ou não as pessoas por sua cor? Consideramos ou não
algumas pessoas “brancas” e outras “pessoas negras”? Discriminamos ou
não discriminamos as pessoas em termos de cor? Tudo se passa nessa
versão romântica de antirracismo, como se se quisesse negar uma realidade
na qual, no íntimo, acredita-se: declara-se que as raças não existem, mas
usa-se a classificação de “negros” e “brancos” dos Estados Unidos, como se
esta fosse uma classificação racial verdadeira, como se os brancos
americanos não fossem, eles próprios, também mestiços; como se eles
fossem puros, “cem por cento brancos”. Apenas nossos brancos é que seriam
mestiços [...]
No entendimento de Carl Degler (1976) a construção da figura do mulato
(mestiço, pardo, moreno ou termo que o valha) no Brasil, serve para amortecer o
choque racial. Como os negros constituíam, desde o período colonial, a maioria da
população e os brancos uma minoria, fabricou-se uma categoria intermediária – o
mulato – que serviria como uma válvula de escape para a tensão racial. Esta saída
teria sido providencial: um ser híbrido que nunca se define se é negro ou é branco.
O discurso ideológico da mestiçagem popularizou-se, de modo que a população
brasileira – ao contrário da americana, por exemplo, nunca se assume racialmente.
Historicamente, a escravidão no Brasil foi uma instituição adotada de 1500 a
1888 e tem sua razão baseada em quatro fatores, segundo Paixão (2006, p. 64 ): “a)
lucro obtido com o tráfico de escravos; b) escravidão do indígena não atender aos
interesses da colônia portuguesa; c) baixa população de nativos no país; d) o
aprisionamento de índios sempre provocar guerras entre as tribos”. Relata o
autor, que os senhores compravam os africanos e estes iam para o engenho, para
as plantações de cana-de-açúcar, nas casas-grandes, e em atividades ligadas ao
processamento do açúcar. Outro destino, eram as minas de ouro e ainda, ficar na
cidade como empregados domésticos, ou no exercício do ofício de sapateiro,
alfaiate, carpinteiro, vendedor ambulante ou outras atividades de interesse dos
senhores.
As relações entre o senhor e o escravo eram controvertidas. Assim, como
havia senhores compreensíveis, havia também os cruéis. Muitos escravos aceitavam
com docilidade a exploração e o mando, enquanto outros se revoltavam com os
vínculos de dependência e explorações e por isso, fugiam formando grupos de
resistência – os quilombos. Estes fatos foram desencadeados desde a fase colonial
até a libertação dos escravos em 1888. Portanto, constata-se que o processo de luta
e resistência dos negros vigorou desde o início da escravidão e perdura até os dias
de hoje.
De acordo com Fonseca (1986) existiam entidades de defesa da raça negra
no inicio da história da República, com forte mobilização nas grandes cidades. Ao
contrário do que se escreveu sobre a convivência pacífica das raças no Brasil, as
relações entre elas eram, no cotidiano, marcadas por conflitos e tensões.
(CHALHOUB, 1988; FERNANDES, 1986; SCHWARCZ, 1987 e AZEVEDO, 1993).
Segundo Azevedo (1993) duas revoltas importantes marcaram o movimento
negro no Brasil: a revolta dos Malês e a revolta da Chibata.
A revolta dos Malês (malês tem origem africana – ioruba, significa
muçulmano) ocorreu entre os dias 25 a 27 de janeiro de 1835, em Salvador, cujos
revoltosos eram negros que exerciam atividades livres (alfaiates, artesãos,
carpinteiros) e que se sentiam discriminados por serem negros e praticarem o
islamismo e também, por encontrar dificuldades para ascensão social, comenta
Azevedo (1993).
A revolta da Chibata, foi um acontecimento singular da luta do negro.
Aconteceu no dia 22 de novembro de 1910, a bordo de um navio de guerra brasileiro
– o encouraçado Minas Gerais, que dirigia-se para o Rio de Janeiro. Na época, as
faltas graves dos marinheiros eram corrigidas com 25 chibatadas e o marinheiro
Marcelino Rodrigues feriu um colega e foi castigado com 250 chibatadas, fato que
desagradou a todos os marinheiros.
O líder da revolta – Almirante João Cândido, conhecido como “Almirante
Negro” redigiu uma carta ao então Presidente Hermes da Fonseca, fazendo
reivindicações como: fim do castigo físico, melhoria na alimentação e anistia para os
revoltosos e ameaçou bombardear a cidade do Rio de Janeiro, caso não fosse
atendido. O presidente acatou as solicitações, porém, expulsou alguns dos
marinheiros e mandou internar como “louco” o Almirante Negro, que foi libertado
dois anos mais tarde. Este movimento representou um avanço positivo para o
movimento negro no país.
No século XX as organizações surgiram para aumentar a capacidade de ação
dos negros na sociedade e para combater a discriminação racial e criar mecanismos
de valorização da raça negra. Dentre as bandeiras de luta destaca-se o direito à
educação. Essa bandeira, explica Gonçalves (2000), esteve presente em todos os
movimentos, sendo concebida de várias formas: ora vista como estratégia capaz de
equiparar os negros aos brancos, dando-lhes oportunidades iguais no mercado de
trabalho; ora como veículo de ascensão social e, por conseguinte, integração; ora
como instrumento de conscientização por meio do qual os negros aprenderiam a
história de seus ancestrais, os valores e a cultura do seu povo, podendo a partir
deles reivindicar direitos sociais e políticos, direito à diferença e respeito humano.
Até o início do século XX as crianças negras não frequentavam a escola.
Desde tenra idade as crianças eram levadas a praticar atividades remuneradas para
ajudar a família e a sua formação para o trabalho eram feitas sob a orientação dos
patrões, no desempenho das mais variadas tarefas, relata Silva (1997).
O relato de um dos lideres do movimento negro de 1920, em São Paulo,
revela a experiência de uma criança afastada da escola e lançada no mercado de
trabalho precocemente. Nascido em 1900, Correia Leite lembrou dos seguintes
eventos de sua infância: “minha mãe foi uma negra, doméstica, muito lutadora, mas
não podia me manter. Ela tinha me deixado na casa dos outros para poder
trabalhar. Eu sempre vivi maltratado. [..] tive uma irmã que veio depois e viveu a
mesma circunstância que a minha. [..] com ajuda de minha mãe fui trabalhar como
entregador de marmitas, menino de recados e ajudante de carpinteiro. (Entrevista
com Correia Leite, s.d., apud:SILVA, 1997).
A escolarização entre os homens negros nascidos no início do século XX
quando ocorreu, foi na sua maioria, na idade adulta, assevera Silva (1997). Relata o
autor, que as mulheres eram encaminhadas aos orfanatos, onde recebiam preparo
para trabalhar como empregada doméstica ou costureira. Famílias abastadas as
adotavam quando adolescentes como filhas de criação, o que de fato significava
empregada doméstica sem remuneração e isso concorreu para estigmatizar o lugar
da mulher negra no mercado de trabalho.
Silva (1997) chama a atenção para o fato de que nessa época, em geral, a
mulher negra era quem arcava com a despesa da família, porque era importante a
empregada doméstica, principalmente as negras, porque elas sabiam lidar na
cozinha, fazer a limpeza e tinham facilidade de obter emprego.
Pode-se perceber que o mundo do trabalho ou mais precisamente, a
necessidade do trabalho afastava tanto o homem como a mulher negra da escola,
mas as entidades negras não se acomodaram e diante da situação, combateram o
analfabetismo e incentivavam os negros a se educarem.
Destarte essa expectativa positiva para o negro brasileiro, a sua luta pelo
estado de direito e de cidadania vem de quase dois séculos.
Em todos os momentos da história do negro no Brasil houve lutas, militâncias
e resistências para a sua inclusão como trabalhador e contra sua invisibilidade
social. O negro sempre sentiu necessidade de ser visto e reconhecido como
cidadão, escreve Heringer (2004). Ideologicamente, a elite dominante de cor branca
forjou instrumentos de coerção intelectual para justificar a supremacia do homem
branco. Apesar das ideologias impostas, o movimento negro brasileiro ganhou força
no século XX, com o surgimento de duas importantes instituições: a Imprensa Negra
Paulista e a Frente Negra Brasileira que se tornou posteriormente, um partido
político expressivo na época e que foi dissolvido em 1937 com o advento do Estado
Novo.
No final de 1940, importante manifestação racial ocorreu no Rio de Janeiro e
resultou positivamente na Constituição Federal de 1946, com a derrocada da
ditadura de Vargas, reporta Gonçalves (1997). O movimento negro conseguiu
estabelecer alianças com setores progressistas da sociedade, e destacou-se um
importante movimento de valorização da cultura negra. Entre os aliados estavam
Jorge Amado e Edson Carneiro, que criaram em 1930 com apoio de outros
intelectuais baianos a “Academia dos Rebeldes”, sediada em Salvador
(GONÇALVES, 1997).
Em 1945, a Associação dos Negros Brasileiros (ANB) lançou o Manifesto de
Defesa à Democracia e elaborou textos que pretendiam integrar ao novo texto
constitucional, mas não obtiveram apoio parlamentar, relata Nascimento (1978). O
movimento negro de 1940 a 1950 reivindicava ensino fundamental gratuito para
crianças (negras e brancas) e tinham uma visão holística da sociedade. Porém,
quando se referem ao ensino secundário e universitário, faz a defesa do grupo
étnico e defendem subsídios para o negro, observa Barcelos (1992).
Outros focos de resistência cultural de importância foram criados em meados
das décadas de 1950-1970 no Rio de Janeiro – a Associação Cultural do Negro e o
Instituto de Pesquisa e Cultura Negra, que tiveram como propósito a rearticulação e
a criação de ideologias do movimento negro. (Souza, 2004).
O período de 1964-1984 manteve o movimento negro “engessado” devido à
ditadura militar e na segunda metade da década de 1980 o movimento recomeça
sua luta e o avanço esperado vem em parte com a Constituição Federal de 1988,
que assegura direitos iguais aos cidadãos brasileiros, escreve Souza (2004).
Resultados obtidos são registrados como a cota para negro no ingresso à
Universidade; cota para cargos públicos e outros avanços assegurados como
“direitos constitucionais”.
Entretanto, comentando a situação do negro no Brasil na década de 1980,
Pinsky (1988: 65), afirma:
[..] estudos bem elaborados vêm mostrando que infelizmente, a alegada
democracia racial não existe. Relata que o negro ocupa uma situação
subalterna na sociedade brasileira, seja em termos de mercado de trabalho,
de acesso à educação, de cargos públicos ocupados e assim por diante.
Infelizmente, há uma estranha convivência entre o preconceito e a
idealização da igualdade racial, o que nos impede de uma reflexão séria
sobre o problema.
Segundo Silva (1997, p. 35) “hoje existem organizações que desempenham
importantes papéis no interior da população negra. Atuando como pólos de
agregação que podem funcionar como clubes recreativos e associações culturais ou
como entidades de cunho político ou mais recentemente como forma de mobilização
de jovens em torno de movimentos artísticos com forte conteúdo étnico (hip-hop,
blocos afros, funk e outros)”. Em alguns casos, elas se configuram como espaços
educativos, na medida em que os sujeitos que participam delas os transformam em
espaços de educação política.
Apesar desses avanços, a sociedade pratica a discriminação social mantendo
o afrodescendente em subemprego, salários inferiores e menores oportunidades
oferecidas para ocupar lugar de destaque no cenário da economia globalizada no
século XXI. Porém, independente da origem étnica o afrodescendente tem boa
expectativa para este século, observa Figueiredo (2002, p. 30):
Os movimentos negros deflagrados pela igualdade racial e social no Brasil,
começam a criar novas políticas públicas que podem contribuir decisivamente
para a formação da identidade do negro, como sujeito de direito. Estes
movimentos são decorrentes das novas formas de resistência do negro à
desigualdade.
A observação do autor tem o aval da pesquisa do IBGE (2003) – Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) cujo relato é que, a cada seis negros
que se movimentam na pirâmide social, cinco melhoram a sua condição de vida e
que a população negra corresponde a 1/3 da classe média brasileira. Chamando a
atenção para o período de 1992-2001, quase dobrou o número de chefes de família
negros que ganham mais de 5 salários mínimos.
Barbi & Fernandez (2004) relatam que existem duas barreiras na sociedade
brasileira: a racial e a social. O negro precisa vencer as duas: conquistar um
emprego de bom nível e auto-afirmar-se como pessoa. Comentam ainda, que para o
negro o dinheiro e o prestígio ainda não bastam para eliminar o racismo e citam o
exemplo de jogadores negros bem pagos e que são alvos de racismo por colegas
brancos, igualmente bem pagos. Há de se lembrar, o recente incidente com o
jogador brasileiro Roberto Carlos, atuando no futebol da Rússia, quando um
torcedor atirou uma banana no campo. O jogador renomado, tricampeão mundial,
deixou o gramado e se recolheu na sua indignação por ter a cor da pele “tão negra
quanto a ignorância dos homens”.
Por conseguinte, a relação entre classe e cor em nosso país é camuflada,
porém, se compararmos o “prestígio social” de um negro rico e um branco pobre,
nota-se maior vantagem para o primeiro, o que vem a confirmar que o fator raça,
apesar de ser importante e mesmo condicionante para a aceitação de um indivíduo
perante a sociedade, não é determinante. Ou seja, outras variáveis, principalmente
situação econômica, são tão importantes quanto a origem étnica para se entender o
status individual no Brasil.
E, na busca da igualdade social e racial, a proposta pedagógica desse estudo
foi incentivar os alunos afrodescendentes a desenvolver maior interesse pelos
estudos, preparando-se com habilidades e competências múltiplas para o mercado
de trabalho, sem perder a visão dos valores necessários para uma vida pessoal e
profissional com a possibilidade de intervenção na realidade e de transformação da
sociedade.
3. Implementação do projeto na escola: ações e resultados
Trata-se de um estudo descritivo e analítico baseado na bibliografia
pertinente sobre o assunto. Neste sentido, parte do conteúdo deste artigo foi
apresentado em sala de aula durante o segundo semestre do ano de 2011, para
alunos da 8ª série do Ensino Fundamental, na faixa etária de 14 anos, do Colégio
Estadual Professor Mailon Medeiros.
O assunto abordado – O negro hoje: desigualdades e novas formas de
resistência, constitui-se num conteúdo de História, cumprindo o que está
estabelecido na Lei 10.639 de 9 de janeiro de 2003, que instituiu os conteúdos de
História e Cultura Afro-Brasileira e Africana no Ensino Fundamental e Médio, oficiais
e particulares como obrigatórios.
A questão racial, a discriminação e a falta de oportunidades para o
negro na sociedade de ontem e de hoje, fizeram parte de estudos exaustivos de
textos, discussões e reflexões. Foram apresentados vídeos, filmes, dramatizações
contendo cenários sobre a desigualdade e as formas de resistência do passado e do
presente. Além disso, os alunos aplicaram um formulário com questões alusivas ao
tema na comunidade, que os tornou ainda mais interessados na questão, justamente
porque na escola o tema nunca havia sido abordado com tanta clareza..
Outra etapa importante na execução do Programa de Desenvolvimento
Educacional – PDE foi a implementação pedagógica do estudo com um Grupo de
Trabalho em Rede (GTR) integrando quinze professores de Bandeirantes e de
outros municípios do Estado do Paraná, atuando no sistema de ensino à distância.
A ação constou da apresentação on line dos textos trabalhados em sala de
aula para os docentes, promovendo as intervenções complementares sobre o tema
e amplo debate desenvolvidos com a professora tutora (no caso, a autora) e
interagindo também com pelo menos dois docentes do grupo, o que resultou numa
experiência pedagógica inovadora, desafiadora e gratificante de “ensinar e aprender
virtualmente”.
Essa ação proposta foi avaliada e os resultados foram satisfatórios,
demonstrando que a abordagem foi interessante e de utilidade na formação dos
alunos e de interesse para a reflexão dos demais envolvidos no projeto.
Outro momento de importância para o estudo foi a aplicação de um
questionário (ANEXO I) estruturado com perguntas abertas realizada pelos alunos
com a comunidade escolar e cujas respostas foram condensadas para integrar as
informações, sobre a questão em estudo: o negro hoje e as novas formas de
resistências.
Ao tabularmos os dados coletados, observamos que as atividades
desenvolvidas no projeto de intervenção pedagógica apresentou efeito imediato na
estima dos alunos. Isto porque, no início dos trabalhos os alunos demonstravam
pouco ou nenhum interesse em seguir uma profissão de maior destaque social. O
sonho era pequeno, buscavam uma ocupação que exigia mais esforço físico do que
intelectual.
Após as discussões, leituras e reflexões, surpreendentemente, a maioria
dos alunos agora sonha em cursar o ensino superior, e as profissões escolhidas
com maior destaque são Direito e Engenharia Civil. Isto vem corroborar com a ideia
de Carl Rogers (1982, p. 43) de que, “o crescimento pessoal dos educandos que
estão sob os cuidados da escola, tem a sua autoestima influenciada pelo sistema
educacional”. A sociedade deve aceitar a ideia de que a autoestima é um dos
elementos básicos e tem importância essencial no desenvolvimento e formação da
personalidade dos alunos e das pessoas em geral.
A pesquisa demonstrou também, que dentre os textos estudados,
Autoestima, escrito por Ronaud Pereira e publicado no site: www.ronaud.com
acessado em 12 de julho de 2011, despertou maior curiosidade e interesse em
conhecer com maior profundidade os mecanismos que a pessoa precisa aprender e
desenvolver para o “ato de gostar e ter mais confiança em si mesma”. Inqueridos
sobre a discriminação racial, também foram unânimes em confessar que já
passaram por esse constrangimento, porém, acreditam que o padrão de vida
elevado diminui o preconceito.
Finalizando, os alunos se declararam “mais valorizados” com as ações
pedagógicas apresentadas e trabalhadas nesse período. Relataram também,
compreender melhor a necessidade de buscar melhores oportunidades na vida, ter
igualdade de condições e acreditar na premissa da Constituição Federal do país que
afirma: “todos são iguais perante a lei”.
5- Considerações finais
As novas políticas de inserção do negro no mercado de trabalho e na
universidade por meio de cotas representam para as gerações afrodescendentes a
esperança de construir uma identidade e uma cidadania para o negro, ainda neste
século. Essas novas formas de lutas e resistências visam combater as
desigualdades sociais e raciais e garantir aos afrodescendentes o direito de
igualdade, garantido constitucionalmente.
Considerando que a raça negra representa 45% da população brasileira
(IBGE, 2006) novas políticas públicas devem surgir para garantir o acesso aos
serviços de educação e saúde e também, aos níveis mais elevados de condição de
vida. Os baixos índices de escolaridade da população negra é um fator decisivo do
impedimento ao acesso ao mercado de trabalho, com rendimento e qualidade de
vida compatível com a de o trabalhador branco.
Espera-se que a elaboração deste artigo possa contribuir para a
continuidade de abordagens que tenham como objeto de estudo temas da história
brasileira relacionados a história dos africanos e afrodescendentes, pouco
estudados por educadores e estudantes do ensino fundamental e médio das escolas
paranaenses, contribuindo assim para a ascensão do negro na sociedade brasileira
e pelo fim da discriminação racial e social.
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ANEXO I
QUESTIONÁRIO
Este questionário tem como objetivo coletar informações para compor os dados para
a execução de um projeto de intervenção pedagógica, do Programa de
Desenvolvimento da Educação – PDE, localizado no Colégio Estadual “Prof. Mailon
Medeiros” – Ensino Fundamental, Médio e Profissionalizante, em Bandeirantes -
PR. A identidade dos colaboradores será mantida em sigilo. Em nome do
aprofundamento pedagógico na área de História, esta pesquisadora agradece a
cooperação de todos.
Profa. Pesquisadora Maria Cícera
As entrevistas foram realizadas pelos alunos da 8ª série do Ensino
Fundamental do Colégio Professor Mailon Medeiros e foram entrevistados 45
pessoas da comunidade escolar e os resultados obtidos foram:
1) Idade dos entrevistados:
62,2% com 14 anos de idade e 37,6% com 16 anos.
Os alunos apresentam compatibilidade entre a faixa etária e o nível
escolar.
2) Sexo dos entrevistados:
44,4 % feminino e 55,6% masculino.
Embora a estatística do município tenha constatado mais mulheres que
homens, na sala de aula ainda a predominância é masculina, com relativa
vantagem numérica.
3) Como você avalia sua autoestima?
98% consideram alta e 2% não souberam informar.
Importante ressaltar, que os adolescentes se mantém com autoestima alta
e apenas uma minoria não está sintonizada com a realidade da vida.
4) Costuma projetar o futuro?
88.8% responderam sim e 11,2% responderam não.
Da mesma forma, quem sonha com o futuro tem mais garra para lutar no
dia a dia, enquanto, que uma pequena parcela não valoriza o projeto de
futuro.
5) Você sofreu discriminação ou preconceito
88.8% responderam sim e 11,2% responderam não.
Elevado o percentual daqueles que já sofreu discriminação racial e social,
isto sinaliza que a escola tem muito a trabalhar para criar uma cultura da não
discriminação, embora, estejamos presenciando cotidianamente, questões de
conflitos raciais e sociais no mundo e inclusive no Brasil, onde se diz ser “um
país de todas as cores”.
6) Você tem observado alguma ação da escola para incentivar os alunos
afrodescendente a agirem em igualdade com os demais alunos:
88.8% responderam sim e 11,2% responderam não.
Interessante ressaltar, que a ação observada foi a desencadeada pelo
projeto que suscitou um amplo trabalho de reflexão não só em sala de aula,
como em todos os âmbitos da Escola, especialmente com o trabalho sobre
autoestima.
7) Que profissão você pretende seguir?
26,6% Direito; 26,6% Engenharia Civil e 46,8% outras profissões.
Interessante percepção revelada na pesquisa: foram citadas 15 profissões,
das quais Direito e Engenharia Civil se destacaram, porém, a Profissão
Professor, não foi citada por nenhum dos entrevistados, o que denota a falta
de prestígio da nossa profissão perante aquele a quem dedicamos a nossa
missão de ensinar.
8) Você gosta de desafios?
53,4% responderam sim e 46,6 não. Resposta condizente com a faixa
etária, pois, o adolescente é por natureza um adepto do desafio. O percentual
não adepto, evidencia uma parcela de adolescentes apáticos, sem uma
perspectiva de vida definida.
9) Citar 3 celebridades da raça negra no Brasil ou no mundo.
77,7% citaram Pelé, Lázaro Ramos e Anderson Silva e 22,3% citaram
Glória Maria, Michele Obama e Barack Obama.
A citação do lutador de MMA – Anderson Silva chama a atenção para a
nova modalidade que está atraindo os adolescentes, enquanto que Pelé é
uma referência dos pais , avós e da mídia, pois os alunos conhecem a história
do Rei. Já o ator Lázaro Ramos, chama a atenção pela atuação em cinema,
teatro e novelas. Os outros nomes citados também são frutos da mídia,
especialmente o casal Obama.
10) Por que o negro dá prioridade à profissão de atleta?
88.8% responderam ser devido ao porte físico e 11,2% não responderam.
O esporte de modo geral, é um segmento que dá oportunidade aos
pobres, especialmente o futebol.
11) Você conhece algum partido político que prestigia o negro no Brasil?
88,8% não conhecem e 11,2% citaram o Partido Verde. A resposta denota
uma falta de engajamento e politização. A História tem um papel fundamental
na formação de opinião. O Partido Verde tem uma linha de proteção e
defesa ao meio ambiente e a figura da Senadora Marina da Silva deve ser a
referência do negro.
12) Na sua cidade, Bandeirantes, você conhece alguma pessoa negra no
poder público?
11,2% responderam sim e 88,8 % responderam não.
O baixo percentual está condizente com a realidade, a presença do negro
no poder público é quase insignificante, quer seja na esfera municipal,
estadual e federal.
13) Na sua cidade, Bandeirantes, você conhece empresário (a) negro (a)?
88,2 responderam sim e 11,8 responderam não.
Percentual significativo, o microempresário local é na maioria
afrodescendente, representado por pequenos comércios varejista, oficinas
mecânicas, consertos de eletrodomésticos, entre outros. Já os médios e
grandes negócios tem à frente os empresários brancos ou amarelos.
14) Na sua escola, existe aluno afrodescendente? Quantos?
77,7 % responderam 40 alunos e 22,3% responderam 30 alunos.
Percentuais condizentes com a realidade, significativa parcela dos
alunos da instituição pesquisada são afrodescendentes.
15) Nas duas universidades (UENP e UNOPAR) que funcionam na cidade
de Bandeirantes, você conhece aluno negro ou afrodescendente?
77,7 responderam sim e 22,3% responderam não.
É notória nos estudantes universitários a predominância do branco,
porém, com reduzida parcela de afrodescendente,
16) No quadro de docente, das duas universidades citadas, tem docente
negro?
6,4% responderam sim e 93,6 % responderam não.
No quadro de docente universitário predomina o branco e a
presença do negro ou afrodescendente é quase inobservável.
17) Você saberia citar o nome de poetas ou escritores brasileiros negros?
91,1% citaram Machado de Assis e 8,9 % não responderam.
Denota uma necessidade de trabalhar a realidade, as personalidades
atuais não são mencionadas nas aulas e os alunos desconhecem.
18) Na cadeia pública de Bandeirantes os presidiários são a maioria
negros. Isto é verdadeiro?
91,1 % responderam que há equilíbrio entre negros e brancos e 8,9
% não responderam.
A resposta é coerente, o que se deduz que nos atos ilícitos e
criminosos as raças se equilibram.
19) Os trabalhadores no cultivo da cana-de-açúcar são a maioria negros.
É uma expressão verdadeira?
91,1% responderam que há equilíbrio entre negros e brancos e
8,9% não responderam.
Da mesma forma que os presidiários, os trabalhadores braçais
também unem as raças, não há predominância. Isto significa que a falta de
qualificação profissional e de oportunidade de emprego de médio e alto nível
é uma realidade para brancos e negros.
20) Observando a estrutura socioeconômica do município de
Bandeirantes, pode-se observar que os cargos públicos de relevância são
ocupados por homens e mulheres brancos. É verdadeira a expressão?
91,1% responderam sim e 8,9 % não responderam.
A pesquisa demonstra o quadro expresso na literatura, os empregos
de alto nível, boa remuneração é exercido por homem branco e viril em
qualquer escalão de atividades pública e privada, denotando a presença
marcante do preconceito racial, de gênero e de sexo.
a) Atividades desenvolvidas no sistema EaD:
Com relação as atividades desenvolvidas em Grupo de Trabalho em
Rede (GTR) obteve-se resultados excelentes com o fórum de debates e a
participação dos docentes, dos quinze inscritos, treze concluíram com êxito.
Ressalte-se ainda, que os docentes participantes do GTR reapresentaram os
conteúdos da Unidade Didática para seus alunos, ampliando a divulgação da
proposta e fortalecendo a discussão do assunto.
b) Atividades em sala de aula:
Das atividades programadas e executadas em sala de aula, os alunos
tiveram exemplar participação e dos textos trabalhados - autoestima foi o
mais significativo. Destacam-se algumas frases elaboradas pelos alunos:
Alunas A, B e C:
“Ter autoestima é saber viver e saber se valorizar”.
Alunos D, E e F:
“Autoestima é mentalizar coisas boas todos os dias. A cura da
autoestima baixa é se cuidar e dar o melhor de si, diariamente”.
Foram elaboradas frases com diversos olhares sobre a autoestima e
colocados no mural da escola para a visibilidade de todos, ampliando os
questionamentos sobre o modo de agir e pensar de cada um.
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