reflexões sobre o dito e o feito nas intervenções pedagógicas no programa segundo tempo
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE NORTE
CENTRO CINCIAS DA SADE
DEPARTAMENTO DE EDUCAO FSICA
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAAO FSICA
REFLEXES SOBRE O DITO E O FEITO NAS
INTERVENES PEDAGGICAS NO PROGRAMA
SEGUNDO TEMPO
JUDSON CAVALCANTE BEZERRA
Natal/RN
Fevereiro de 2014
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Judson Cavalcante Bezerra
REFLEXES SOBRE O DITO E O FEITO NAS INTERVENES
PEDAGGICAS NO PROGRAMA SEGUNDO TEMPO
Dissertao apresentada como requisito
parcial para obteno do ttulo de mestre
em Educao Fsica no Programa de
Ps-Graduao em Educao Fsica da
Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, na linha de pesquisa Estudos
Pedaggicos sobre o Corpo e o
Movimento Humano.
Orientador: Prof. Dr. Jos Pereira de Melo
Natal/RN
Fevereiro de 2014
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REFLEXES SOBRE O DITO E O FEITO NAS
INTERVENES PEDAGGICAS NO PROGRAMA
SEGUNDO TEMPO
Diviso de Servios Tcnicos
Catalogao da Publicao na Fonte. UFRN / Biblioteca Central Zila Mamede
Bezerra, Judson Cavalcante.
Reflexes sobre o dito e o feito nas intervenes pedaggicas no Programa
Segundo Tempo / Judson Cavalcante Bezerra. Natal, RN, 2014. 146 f. : il.
Orientador: Jos Pereira de Melo.
Dissertao (Mestrado) Universidade Federal do Rio Grande do Norte.Centro
de Cincias da Sade. Programa de Ps-Graduao em Educao Fsica.
1. Esporte Dissertao. 2. Esporte Prtica Pedaggica Dissertao. 3.
Programa Segundo Tempo - Dissertao. 4. Polticas Pblicas - Dissertao. I. Melo,
Jos Pereira de. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Ttulo.
RN/UF/BCZM CDU 796:37
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Judson Cavalcante Bezerra
REFLEXES SOBRE O DITO E O FEITO NAS INTERVENES PEDAGGICAS
NO PROGRAMA SEGUNDO TEMPO
Banca Examinadora:
Professor Dr. (Orientador): Jos Pereira de Melo (UFRN)
Professor Dr. (Membro Interno): Allyson Carvalho de Arajo (UFRN)
Professora Dr (Membro Externo): Marta Gen Soares (UEPA)
Professora Dr (Membro Suplente): Maria Aparecida Dias (UFRN)
NATAL/RN
2014
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DEDICATRIA
Este trabalho de Dissertao de Mestrado consolida mais um ciclo de minha
formao acadmica na rea de Educao Fsica, agora em nvel de ps-graduao.
Constitui-se fruto dos esforos demandados no somente nos dois anos de curso que
exigem a ps-graduao stricto sensu do Programa de Ps-graduao em Educao
Fsica da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como tambm de muito
trabalho j realizado desde a poca de graduao.
nesse sentido que dedico este trabalho queles que me acompanharam desde o
incio desta trajetria: professores, colegas e amigos de turmas e mais turmas, tanto da
graduao como da ps-graduao, e familiares.
Mas, especialmente, gostaria de dedicar este trabalho de dissertao ao meu
querido Professor e Orientador Doutor Jos Pereira de Melo, pela pacincia, amizade,
carinho, compreenso e, sobretudo, pela confiana demonstrada em todos esses anos. A
voc, Pepe, dedico este trabalho!
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AGRADECIMENTOS
Meus agradecimentos vo primeiramente para aqueles a quem dediquei esta
dissertao. Mas a lista de agradecimentos mais extensa e requer a meno de nomes.
De incio, gostaria de agradecer a meus pais, Aldeci Dantas Bezerra e Maria de
Jesus Cavalcante Bezerra, os quais, apesar de no terem muita noo do significado que
a concluso de uma ps-graduao, no deixaram de se preocupar e de me apoiar.
Aos amigos? Tenho muitos a agradecer! Acho que mais at do que os 740 que
tenho espalhados pelo danado do Facebook. Portanto desculpem-me aqueles que no
foram lembrados. So amigos de graduao, Eduardo Santos, Mackson Luiz, Daniel
Ferreira, Raphael Ramos, Emanuel Augusto; de ps-graduao, Joo Cruz, Aline
Paixo, Moaldecir, Alison Batista, Rodolfo Pio, Hudson Pablo; da Seleo de Futebol
da UFRN de 2012 e 2013; enfim, amigos da vida.
Agradeo aos meus professores pelos momentos de aprendizagem, Jos Pereira
de Melo, Allyson Carvalho, Terezinha Petrucia, Maria Aparecida Dias, Antnio de
Pdua e Maria Isabel.
Me gustara agradecer tambin a una persona muy especial que ha surgido en mi
vida, mi hermosa pesadilla, mi novia Karina Fraihaut, por los lindos momentos de
cario y amor, que me viene demonstrando haca ms de un ao.
Por fim, agradeo a todos os recursos humanos que compem o convnio do
Programa Segundo Tempo na Prefeitura Municipal de Riacho da Cruz, pelo empenho e
confiana depositados na proposta de trabalho desenvolvida nesta pesquisa: Evilzio,
Evilzio Jnior, Damio, Estela, Nathlia, Ildevnia, Denis, Edriana, Ado-Blena, Ana
Clia, Ana Lcia, Robevnio, Leonria, Gleydson, Liane, Nascimento, Ivanilde,
Ivanzia, Regis e Sheyla. Em especial para o monitor de atividades esportivas Regis,
pela proatividade; e para o coordenador de ncleo Denis e coordenador pedaggico
Evilzio Jnior, que disponibilizaram total apoio a nossa instalao e permanncia em
suas residncias pessoais durante o desenvolvimento desta pesquisa.
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RESUMO
Ao longo desta pesquisa, defendemos que projetos sociais como o Programa Segundo
Tempo podem ampliar seus objetivos e aes interventivas para alm da incluso social
de pessoas excludas socialmente do acesso a direitos sociais, considerando esses
espaos tambm como promotores de possibilidades educativas. Dialogamos com
diversos autores da rea da Educao, da Educao Fsica e das Cincias Sociais, para
fortalecer nossos argumentos. Nesse sentido, nossa proposta de pesquisa orientou-se
pelo mtodo de pesquisa ao e pelas estratgias e tcnicas de pesquisa que o apoiam,
desenvolvendo uma proposta de interveno e acompanhamento sistemtico
caracterizado basicamente pela realizao de seminrios e ciclos de observao da
prtica pedaggica dos monitores e coordenadores de ncleo do PST no convnio da
Prefeitura Municipal de Riacho da Cruz, a fim de contribuir para processos de tomada
de conscincia e mudanas na prtica pedaggica que se apresentassem indesejveis s
orientaes tericas e metodolgicas do PST. Para tanto, buscamos analisar os
problemas da transio das orientaes tericas e metodolgicas do PST e contribuir
para essa transio por meio de acompanhamento pedaggico sistemtico. Partimos de
uma questo de estudo que no se encerra em si mesma, mas que foi constantemente
alimentada por novas problemticas e objetivos emergidos do campo emprico durante a
pesquisa: quais so os limites e possibilidades encontrados pelos monitores e
coordenadores de ncleo do PST para aplicar as orientaes tericas e metodolgicas
nos ncleos do programa? Os resultados demonstraram que as principais limitaes
enfrentadas pelos recursos humanos do convnio da Prefeitura Municipal de Riacho da
Cruz para aplicar as orientaes do PST so: no formao especfica na rea de
Educao Fsica ou Esporte; experincias de trabalho com o ensino do esporte
anteriores ao trabalho no PST, insuficientes ou inexistentes; fragilidades no processo de
capacitao segundo modelo do PST que no possibilitaram mais exemplos de
experincias para o ensino do esporte nos ncleos; e fragilidades no formato de
acompanhamento pouco assduo realizado pela Equipe Colaboradora. Sobre as
possibilidades para superao desse quadro encontramos, justamente na participao e
envolvimento do prprio grupo sujeito em tentar minimizar essas limitaes, buscando
na proposta de acompanhamento pedaggico por seminrios e ciclos de observaes das
atividades desenvolvidas, uma alternativa importante para a resoluo das situaes-
problemas emergidas nesta pesquisa. Desse modo, o sucesso da proposta desenvolvida
nos levou a algumas concluses, dentre as quais est a de que o sucesso do PST no
reside somente na cobrana da especificidade da rea ou grau de formao dos
monitores e coordenadores de ncleo que lidam com o trabalho pedaggico nos ncleos
dos convnios, mas na realizao de um acompanhamento mais assduo das Equipes
Colaboradoras aos ncleos, que possibilite maiores momentos de troca de experincias
entre as Equipes Colaboradoras do PST e o recursos humanos, inclusive considerando
as variantes de contexto, estreitando assim a relao teoria e prtica no PST. Por fim,
reconhecemos as limitaes do nosso estudo, o que abre perspectivas para futuras
reformulaes, mas esperamos contribuir para a interface estabelecida entre as reas de
Educao Fsica e Cincias Sociais, ampliando os conhecimentos relativos prtica
pedaggica em projetos sociais.
Palavras - chave: Esporte; Ensino; Polticas Pblicas.
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LISTA DE ILUSTRAES
Imagem 1 Cartaz de Identificao do Convnio de Riacho da Cruz. BEZERRA,
Judson Cavalcante (2013) Pgina 49
Imagem 2 Momento prtico da Capacitao. BEZERRA, Judson Cavalcante (2013)
Pgina 53
Imagem 3 Sala de apoio pedaggico do Convnio. BEZERRA, Judson Cavalcante
(2013) Pgina 58
Imagem 4 Concentrao dos professores antes da apresentao do Plano de
Interveno. BEZERRA, Judson Cavalcante (2013) Pgina 59
Imagem 5 Agrupamento dos recursos humanos por ncleo para realizao da
entrevista coletiva. BEZERRA, Judson Cavalcante (2013) Pgina 60
Imagem 6 Atividade vlei com lenol no Ncleo 4 sem separao entre meninos e
meninas. BEZERRA, Judson Cavalcante (2013) Pgina 69
Imagem 7 Atividade do lado abaixa no Ncleo 1. BEZERRA, Judson Cavalcante
(2013) Pgina 71
Imagem 8 Atividade para explorao de habilidades do atletismo no Ncleo 6.
BEZERRA, Judson Cavalcante (2013) Pgina 72
Imagem 9 Segundo Seminrio: Desenvolvimento Motor e Habilidades Motoras.
BEZERRA, Judson Cavalcante (2013) Pgina 75
Imagem 10 Roda inicial no Ncleo 5. BEZERRA, Judson Cavalcante (2013) Pgina
86
Imagem 11 Incio de aula no Ncleo 2. BEZERRA, Judson Cavalcante (2013)
Pgina 99
Imagem 12 Videoaula sobre ttica do futsal no Ncleo 2. BEZERRA, Judson
Cavalcante (2013) Pgina 100
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SUMRIO
INTRODUO______________________________________________________10
Captulo I
Programa Segundo Tempo: o ofcio de ensinar em projetos sociais____________17
Captulo II
Delineamento metodolgico da pesquisa__________________________________36
2.1. Diagnstico e Contratualizao_____________________________________38 2.1. Planejamento e realizao em espiral: os Seminrios e os Ciclos de
Observaes_______________________________________________________39
2.2. Tcnicas para coleta de dados_______________________________________41 2.4. Avaliao e teorizao____________________________________________44
Captulo III
Programa Segundo Tempo no municpio de Riacho da Cruz: experincias de um
acompanhamento pedaggico___________________________________________47
3.1. Primeira Parte: Capacitao segundo o modelo do Programa Segundo Tempo____________________________________________________________50
3.2. Segunda Parte: Diagnstico e Contratualizao_________________________55 3.3. Terceira Parte: Seminrios e Ciclos de Observaes_____________________65 3.3.1. Primeiro Seminrio e Ciclo de Observaes___________________________65 3.3.2. Segundo Seminrio e Ciclo de Observaes ___________________________75 3.3.3. Terceiro Seminrio e Ciclo de Observaes ___________________________83 3.3.4. Quarto Seminrio e Ciclo de Observaes ____________________________88 3.3.5. Quinto Seminrio e Ciclo de Observaes ___________________________100
CONSIDERAES FINAIS___________________________________________111
REFERNCIAS_____________________________________________________115
Apndice 1__________________________________________________________123
Apndice 2__________________________________________________________126
Apndice 3__________________________________________________________128
Apndice 4__________________________________________________________140
Apndice 5__________________________________________________________142
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INTRODUO
A intencionalidade pela investidura particular sobre o trabalho expresso nesta
dissertao foi incutida a partir de experincias significativas ao longo da minha
formao inicial no curso de graduao em Educao Fsica da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte (UFRN).
Sem querer cometer o equvoco de menosprezar as demais experincias
advindas dessa formao inicial, as quais, sem dvida alguma, tm sua parcela de
contribuio para a formao humana e acadmica deste sujeito, destaco um momento
importante de minha trajetria acadmica que considero particularmente decisivo para o
investimento na ps-graduao. Esse momento deu-se a partir do meu ingresso num
programa de iniciao cientfica em 2010, em que me dedicava ao estudo da relao dos
programas e projetos sociais com a Educao Fsica escolar. Dessa memria, resgato
especialmente as conversas com colegas e membros do Grupo de Pesquisa Corpo e
Cultura de Movimento (GEPEC), as reunies com o orientador da pesquisa e a
aprendizagem de tcnicas de pesquisa. Atribuo destaque a essa experincia acadmica
porque foi dela que surgiu meu interesse em continuar estudando e ingressar no
Programa de Ps-Graduao em Educao Fsica da UFRN.
Confesso que sempre me interessei por questes ligadas Educao Fsica
escolar, entretanto ainda me era estranha a discusso sobre programas e projetos sociais,
sobretudo a relao destes com a Educao Fsica na escola. No incio, no foi fcil
transitar por uma rea de estudos que no era a minha habitual naquela poca, a qual
passou de estudos em Bioqumica para estudos nas reas das Cincias Polticas, Sociais
e Humanas, mais especificamente estudos sobre a relao dos programas e projetos
sociais com a Educao Fsica. Mesmo assim, com tantas dvidas acerca da temtica
dos programas e projetos sociais, decidi investir nesse projeto de iniciao cientfica.
Da relao estabelecida entre programas e projetos sociais e Educao Fsica
escolar pelo referido projeto de iniciao cientfica, constatamos, nas nossas
observaes, que a maioria dos programas e projetos sociais prev alguma prtica
corporal no plano de suas aes interventivas, sendo o esporte a mais comum entre elas.
Logo, os nossos estudos desde ento se concentraram na trade: Esporte, Educao
Fsica Escolar e Polticas Pblicas Sociais.
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Nesse cenrio, o Programa Segundo Tempo (PST), institudo em 24 de
novembro de 2003 pelo Ministrio do Esporte, por meio da Portaria Interministerial n
3.497, com o objetivo de democratizar o acesso prtica esportiva educacional para
crianas, adolescentes e jovens inseridos em contextos de alta exposio a situaes de
risco social1, configura-se como o exemplo mais expressivo dentre os programas e
projetos sociais que se apropriam do esporte como meio de interveno.
Algumas evidncias tm contribudo para que o PST assuma esse posto de mais
expressivo programa social de esporte na atualidade, quais sejam: o PST ocupa lugar
representativo no plano de aes estratgicas do Governo Federal para o oferecimento
regular da prtica esportiva educacional, conforme a Poltica Nacional do Esporte
publicada em 2004; o PST mobiliza milhares de estudantes e profissionais de Educao
Fsica por todo o Brasil para trabalho e acompanhamento dos ncleos2 e convnios
3 do
programa; o PST j atendeu mais de trs milhes de crianas e adolescentes em situao
de risco social espalhados pelas cinco regies administrativas do pas; e existe no PST
um sistema descentralizado para acompanhamento administrativo e pedaggico das
aes desenvolvidas nos convnios e ncleos do programa.
Foi a partir da cadeia de relaes existentes entre o PST, o esporte e a Educao
Fsica, bem como das justificativas anteriormente apresentadas, que decidimos tomar o
PST dentre vrios outros programas e projetos sociais como nosso objeto de estudo.
1 Entendemos por riscos sociais todas as situaes que expem a vida das crianas e adolescentes ao
perigo constante (BRASIL, 2006, p. 5), perigos esses que expressam a exposio de crianas e adolescentes s drogas, prostituio, gravidez precoce, criminalidade, ao trabalho infantil, etc.
2 De acordo com as diretrizes para o Programa Segundo Tempo, Ncleos de Esporte Educacional (NED)
so os espaos onde o PST desenvolve suas intervenes, sendo o ncleo caracterizado pela composio
de 100 crianas, adolescentes e/ou jovens, que tm suas atividades orientadas por um Monitor de
atividades esportivas e um Coordenador de ncleo. As atividades dos ncleos podem ser desenvolvidas
dentro da escola ou em espao comunitrio prximo escola, atendendo preferencialmente os alunos da
escola em que o ncleo est inserido, mas podendo atender tambm crianas, adolescentes e jovens da
comunidade.
3 Convnio, no mbito do PST, so acordos ou ajustes que disciplinam as transferncias de recursos
financeiros de dotaes consignadas nos oramentos Fiscal e da Seguridade Social da Unio e que tenha
como partcipe, de um lado, rgo ou entidade da administrao pblica federal, direta ou indireta e, de
outro lado, rgo ou entidade da administrao pblica estadual, distrital ou municipal, direta ou indireta.
Ou, ainda, entidades privadas sem fins lucrativos, visando execuo de programa de governo,
envolvendo a realizao de projeto, atividade, servio, aquisio de bens ou realizao de evento de
interesse recproco, em regime de mtua cooperao (art. 1, 1, VI, da Portaria Interministerial n
127/2008).
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12
Desde o incio da insero no referido projeto de iniciao cientfica, vimos
despertando para algumas inquietaes em torno do PST, algumas das quais
culminaram no exerccio de publicao e divulgao do conhecimento produzido a esse
respeito em congressos internacionais, nacionais, seminrios, colquios e em trabalho
de concluso de curso. Este, alis, teve como um de seus desdobramentos esta
dissertao de mestrado.
Evidencia-se, dessa forma, que uma das nossas inquietaes mais emblemticas
em torno do PST concentrava-se e ainda se concentra na forma como as atividades dos
ncleos do programa eram/so conduzidas. Essa questo foi o motivo problematizador
de dois trabalhos produzidos e publicados ainda durante a fase de iniciao cientfica,
sendo um deles publicado e apresentado no V Congresso Nacional de Educao Fsica,
Sade e Cultura Corporal, em 2011, em Recife; e o outro foi produto do trabalho de
concluso de curso em Licenciatura em Educao Fsica, tambm no mesmo ano.
Ambos os trabalhos foram estudos exploratrios sobre a realidade dos ncleos do
convnio 430/2007 do PST na Prefeitura Municipal de Natal.
No primeiro trabalho4, foram realizadas observaes assistemticas de aulas para
identificar os contedos e a metodologia adotados pelos monitores5 de ncleo do
programa. Os resultados dessa pesquisa apontaram fragilidades metodolgicas na forma
como o contedo esporte era acessado aos beneficiados em alguns ncleos,
desvirtuando, muitas vezes, do pretendido pelas orientaes metodolgicas do PST. No
segundo estudo6, discutimos os limites e as possibilidades pontuados pelos monitores de
ncleo do PST para operacionalizar os conhecimentos advindos das capacitaes do
Ministrio do Esporte. Nesse trabalho, os resultados apontaram fragilidades conceituais,
pedaggicas e metodolgicas dos monitores para operacionalizar os conhecimentos
advindos da capacitao, identificadas a partir do discurso dos monitores entrevistados.
4 BEZERRA, Judson C.; MELO, Jos P.; MENDES, Izabel B. de S. Reflexo sobre as prticas corporais
e as orientaes pedaggicas no Programa Segundo Tempo na cidade Natal/RN. IN: V Congresso
Nacional de Educao Fsica, Sade e Cultura Corporal, 2011, Recife. Anais, 2011, Recife. CD-ROM.
5 Monitor o estudante de graduao em Educao Fsica ou esporte que tenha cursado preferencialmente
a primeira metade do curso. Suas atribuies se encerram na conduo das atividades esportivas
educacionais desenvolvidas no ncleo.
6 BEZERRA, Judson C. Limites e possibilidades nas intervenes pedaggicas no Programa Segundo
Tempo. Natal, 2011. 69f. Monografia (Graduao em Educao Fsica). Departamento de Educao
Fsica, UFRN, 2011.
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Os resultados encontrados nos dois estudos exploratrios mencionados acima
nos forneceram indicadores da realidade do convnio da Prefeitura Municipal de Natal,
incitando-nos a continuar estudando a problemtica em questo, mas no contexto de
outros convnios, porque esse convnio estudado encerrou suas atividades no mesmo
ano da pesquisa, ou seja, em 2011.
O PST tem experimentado, nos ltimos anos, reformulaes necessrias para
melhor qualificar suas aes. Nesse sentido, o Ministrio do Esporte tem investido uma
quantia significativa de recursos financeiros para concretizar seus objetivos. Dentre os
esforos do programa, destacamos a organizao do Projeto de Acompanhamento
Pedaggico e Administrativo do Programa Segundo Tempo em 2008 pela Secretaria
Nacional de Esporte Educacional (SNEED), em conjunto com a Universidade Federal
do Rio Grande do Sul e Estaduais de Londrina e Maring, que, juntamente com outras
universidades pblicas do Brasil, tm promovido, desde ento, os Ciclos de Capacitao
especficos para o trabalho no programa por intermdio das Equipes Colaboradoras7
(EC), alm de acompanhar administrativa e pedagogicamente os convnios do
programa.
Esses esforos tm insistido sobre a qualificao das intervenes pedaggicas e
metodolgicas nos ncleos do programa, reforando a importncia das orientaes
tericas e metodolgicas para o trabalho dos recursos humanos nos ncleos. Apesar de
todas essas reformulaes pelas quais o PST vem passando, ainda constatamos, nos
relatrios de visita aos ncleos da Equipe Colaboradora 38 do Ministrio do Esporte,
socializados para todos os membros da equipe durante as reunies da mesma, reunies
que frequentamos enquanto membros na condio de Avaliador9 entre o perodo de
7 As Equipes Colaboradoras (EC) do Ministrio do Esporte revelam a lgica de gesto descentralizada do
PST por intermdio de parceria estabelecida entre o Ministrio do Esporte e Instituies de Ensino
Superior do Brasil. Sua funo de acompanhamento pedaggico e administrativo dos convnios do PST,
levando para estes as diretrizes e os pressupostos tericos metodolgicos para o bom funcionamento do
programa.
8 De acordo com a estratgia de descentralizao do Ministrio do Esporte para acompanhamento dos
convnios do PST, cada Equipe Colaboradora est encarregada de cobrir uma determinada rea de
acompanhamento, sendo atualmente a rea abrangida pelos estados do Rio Grande do Norte, Paraba e
parte do Cear a rea supervisionada pela Equipe Colaboradora 3.
9 Numa Equipe Colaboradora, o Avaliador o profissional responsvel por realizar as visitas in loco aos
convnios do PST na condio de representante do acompanhamento administrativo e pedaggico
desempenhado pelas Equipes Colaboradoras do Ministrio do Esporte.
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agosto de 2012 e janeiro de 2013, fragilidades no tocante questo das intervenes
pedaggicas e metodolgicas nos ncleos e, por conseguinte, a pouca migrao das
orientaes metodolgicas para a prtica pedaggica dos recursos humanos.
Esse quadro pode provocar uma srie de problemas prticos nos ncleos, haja
vista o descompasso entre o que est previsto nos documentos de orientao terica e
metodolgica e a prtica pedaggica dos recursos humanos do programa.
Desse modo, partindo-se do fato de que existem investimentos por parte do
Ministrio do Esporte, especialmente no tocante ao sistema de acompanhamento
administrativo e pedaggico para a qualificao das intervenes pedaggica dos
recursos humanos nos ncleos do PST e das evidncias de que as orientaes tericas e
metodolgicas do programa no esto efetivamente chegando na ponta, ou seja, nos
beneficiados do programa, problematizamos a transposio das orientaes tericas e
metodolgicas para a prtica pedaggica dos recursos humanos nos ncleos do PST.
Assim, como objetivo geral nesta pesquisa, buscamos analisar os problemas da
transio das orientaes tericas e metodolgicas do PST e contribuir para essa
transio por meio de acompanhamento pedaggico sistemtico.
Diante da problemtica evocada e do anseio de ampliarmos os estudos a ela
relativos, partimos da seguinte questo de estudo: quais so os limites e possibilidades
encontrados pelos monitores e coordenadores de ncleo10
do PST para aplicar as
orientaes tericas e metodolgicas nos ncleos do programa?
Nossa questo de estudo coloca os professores do PST como nosso foco de
pesquisa, alm de consider-los tambm pblico alvo desse programa social, alm das
crianas, adolescentes e jovens alunos j comumente anunciados, na medida em que
possibilita aos seus recursos humanos a oportunidade de se trabalhar com o ensino da
perspectiva educacional do esporte com crianas e adolescentes, ampliando, assim, as
experincias profissionais desse pblico.
Enfim, percebemos que os programas e projetos sociais de cunho educacional,
quando definem seu pblico-alvo, comumente se remetem aos seus beneficiados
10
Coordenador de Ncleo, o professor com formao na rea de Educao Fsica ou Esportes
responsvel por gerenciar, acompanhar e intervir sobre as aes administrativas e pedaggicas de ncleo
de esporte educacional.
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primrios, quais sejam, crianas, adolescentes e jovens expostos s injustias das
desigualdades sociais de nossa sociedade, desconsiderando muitas vezes aqueles que
tm na possibilidade de trabalhar nesses programas e projetos a oportunidade de ampliar
suas experincias profissionais e incrementar sua renda.
Ao considerarmos os recursos humanos do PST como pblico-alvo de nossa
pesquisa, e principalmente por reconhecermos tambm a experincia de atuao
profissional no PST como importante espao de formao de saberes docentes, seja para
profissionais ou estudantes da rea de Educao Fsica, seja de qualquer outra rea,
reforamos a relevncia do nosso estudo, fugindo assim do tradicionalismo dos estudos
que se propem a estudar uma poltica social implantada ao determinarem as crianas,
adolescentes e jovens beneficiados pelas aes do programa como o pblico-alvo
hegemnico.
No mbito acadmico, a relevncia do nosso estudo desperta para um horizonte
de pesquisa ainda pouco explorado, qual seja, o trabalho pedaggico em programas e
projetos sociais, em particular os de cunho esportivo educacional, contribuindo para a
produo do conhecimento nas interfaces estabelecidas entre programas e projetos
sociais e a Educao Fsica. Com efeito, esperamos possibilitar a promoo de
intervenes mais efetivas nos ncleos, que, por sua vez, contribuiro para o alcance
dos objetivos do programa.
Nesse sentido, tentamos ultrapassar a lgica descritiva to propagada em
pesquisas sobre polticas pblicas esportivas (AMARAL; PEREIRA, 2009) e
preocupamo-nos em intervir numa configurao social, qual seja, um convnio do PST,
a fim de tentar reverter uma situao-problema que tanto nos inquieta, que a transio
teoria prtica do trabalho pedaggico dos recursos humanos no PST.
Desse modo, esta dissertao foi organizada segundo trs captulos, sendo o
primeiro de fundamentao terica, o segundo captulo de detalhamento metodolgico
da proposta de pesquisa desenvolvida, e o terceiro de apresentao e discusso dos
resultados.
No primeiro captulo, intitulado Programa Segundo Tempo: o ofcio de
ensinar em projetos sociais, abrimos uma discusso sobre a definio e caracterizao
de projetos sociais, concebendo-o tambm enquanto espao para sistematizao de
possibilidades educativas que se apropriam do esporte como importante meio de
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interveno. Procuramos discutir a questo do ensino em projetos sociais baseando-nos
no caso do Programa Segundo Tempo. Nesse cenrio, apresentamos o Programa
Segundo Tempo como um exemplo de projeto social que considera efetivamente a
dimenso educativa em suas aes interventivas.
No segundo captulo, Delineamento metodolgico da pesquisa, apresentamos a
proposta metodolgica desenvolvida nesta pesquisa que detalha os aspectos
metodolgicos envolvidos neste trabalho, desde o mtodo, as etapas de pesquisa,
passando pelas estratgias metodolgicas e tcnicas de pesquisa empregadas.
Acreditamos que as caractersticas da proposta metodolgica investida nesta pesquisa
tenham subsidiado completamente os resultados encontrados, levando-nos a confiar na
adoo do mtodo pesquisa-ao para o atendimento das situaes-problemas
levantadas.
No terceiro e ltimo captulo, nomeado Programa Segundo Tempo no
municpio de Riacho da Cruz: experincias de um acompanhamento pedaggico,
apresentamos e discutimos os resultados encontrados nesta pesquisa. Nesse captulo,
detalhamos os eventos que compuseram a nossa proposta de interveno e
acompanhamento sistemtico do convnio do PST da Prefeitura Municipal de Riacho da
Cruz, relatando assim essa experincia e apontando possibilidades para outros estudos
que porventura venham a investir em questes parecidas.
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CAPTULO I
PROGRAMA SEGUNDO TEMPO: O OFCIO DE ENSINAR EM PROJETOS
SOCIAIS
Em se tratando de conhecimentos prvios acerca de projetos sociais, a
representao inicial que tnhamos era a de vrias crianas e/ou adolescentes jogando
futebol num terreno abandonado e a figura de uma pessoa, geralmente um lder ou
personalidade popular, responsvel pelas aes do projeto. Depois de algumas leituras,
descobrimos que essa era apenas uma das formas de manifestao dos projetos sociais,
qual seja, uma das menos estruturadas, que pode ser caracterizada pela falta de
incentivos financeiros, pela boa vontade dos seus lderes em continuar desenvolvendo
essa ao sem qualquer retorno financeiro, pela carncia de conhecimentos de gesto de
projetos sociais, o que culmina no desenvolvimento de prticas baseadas no senso
comum (CORREIA, 2008), mas de respeitvel altrusmo.
Exemplos de projetos sociais como o relatado acima existem vrios, como
tambm existem muitos outros programas e projetos sociais mais organizados e de
maiores dimenses de atendimento, sendo muitas vezes financiados pelo Primeiro,
Segundo ou Terceiro Setores, o que sugere um aporte de recursos humanos e materiais
bem mais altos e, geralmente, mais qualificados.
Programas e projetos sociais financiados pelo Governo Federal, empresas
privadas ou por Organizaes no Governamentais comumente desenvolvem aes
mais estruturadas, apresentam propostas e objetivos bem definidos, alm de usualmente
se desenvolverem em equipamentos pblicos como escolas, parques, praas, teatros ou
centros comunitrios.
H aqueles projetos sociais fortemente assistencialistas, que s preveem em seus
objetivos atingir as demandas de injustia social, pela transferncia de valores para
famlias necessitadas, ou por medidas de reabilitao social atravs do trabalho para
jovens delinquentes, ou pela ocupao do tempo ocioso de crianas, adolescentes e
jovens com atividades esportivas ou de lazer. Existem ainda aqueles projetos sociais
que, alm de incluir socialmente crianas, adolescentes e jovens, preocupam-se em
promover experincias educativas srias com propostas bem definidas.
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Nesse sentido, a concepo de todo e qualquer projeto social precedida por
uma srie de reflexes sobre suas intencionalidades e seus impactos na sociedade, em
especial no pblico-alvo que se pretende atingir. Tais reflexes culminam na elaborao
da proposta que se pretende desenvolver, em que ficam patentes suas razes e os
princpios que orientaro as aes das pessoas envolvidas. assim que os projetos
sociais expressam, alm das intencionalidades dos seus mentores, uma srie de
argumentos e razes que sustentam e justificam sua existncia, dando-lhes bases slidas
para o seu desenvolvimento.
Entretanto muitos projetos sociais, segundo Correia (2008b), so dotados de
boas e ms intenes e seguem comumente princpios paternalistas, utilitaristas ou
clientelistas de promoo social. Ainda, Gohn (2000, p. 16) refora que h projetos que
de social s tm o nome, pois tratam os indivduos isoladamente, como usurios,
clientes consumidores de polticas sociais de cunho compensatrio.
De maneira geral, os programas e projetos sociais procuram atingir um problema
social que aflige populaes especficas da sociedade com vistas soluo desse
problema. Os problemas sociais manifestam-se na ausncia total ou na escassez de
acesso a um bem social comum e podem ser identificados como sendo problemas de
acesso educao, segurana, sade, ao trabalho, moradia, ao lazer, ao esporte,
etc. Diz-se das populaes que, por algum motivo, no conseguem ter acesso a esses
bens, que se encontram em situao de vulnerabilidade social ou em situao de risco
social, quando as injustias sociais colocam em risco a prpria integridade fsica, mental
e moral das pessoas.
Assim, de acordo com Stephanou (2003 apud MELO; DIAS, 2009, p. 16),
projetos sociais nascem do desejo de mudar uma realidade. Os
projetos so pontes entre o desejo e a realidade. So aes
estruturantes e intencionais, de um grupo ou organizao social, que
partem da reflexo e do diagnstico sobre determinada problemtica e
buscam contribuir, em alguma medida, para outro mundo possvel.
No contexto de desigualdades sociais vigentes no Brasil, os projetos sociais
erguem-se como alternativas para minimizao do caos social. De forma geral, esses
projetos
-
19
objetivam a participao dos cidados visando inclu-los, enquanto
parcela dos excludos, em programas sociais de natureza variada.
Muitos deles se desenvolvendo por meio de atividades scio-
educativas que se preocupam, de fato, com a mudana social e a
emancipao dos indivduos. Eles buscam criar uma interlocuo que
lhes possibilite constiturem-se como sujeitos coletivos e autnomos. Entretanto, h outros projetos que de social s tm o
nome, pois tratam os indivduos isoladamente, como usurios, clientes
consumidores de polticas sociais de cunho compensatrio (GOHN,
2000, p. 17).
Desse modo, definimos projetos sociais como aes diretivas e planejadas por
organizaes governamentais ou no governamentais para grupos especficos da
sociedade que, por algum motivo, encontram-se vulnerveis socialmente no tocante ao
acesso a algum direito social previsto em lei. Seus objetivos vo da democratizao ao
acesso de algum bem pblico, proteo social e pessoal. Eles podem se estender s
diferentes camadas sociais sem discriminao de etnia, cultura, orientao sexual,
condio fsica, idade ou conhecimento cientfico. Compartilham do princpio da
universalizao e da emancipao. Vale ressaltar, tambm, que um projeto social nasce
da convico de pessoas, organizaes governamentais ou no-governamentais, tendo-
se como princpio a necessidade de mudar realidades que afetam as condies de vida e
o desenvolvimento das pessoas (MELO; DIAS, 2009, p. 17).
O conceito de projeto social muito se confunde com o de programa social, mas
h certas caractersticas que os distinguem, lanando-nos a necessidade de ampliarmos
os julgamentos acerca desse objeto. Enquanto os projetos sociais atendem, mais
pontualmente, grupos relativamente pequenos da sociedade, geralmente expostos a
algum tipo de injustia social, apresentando como principais caractersticas: durao
determinada, utilizao de recursos tcnicos, financeiros e materiais, alcance de
resultados previstos em sua concepo (CORREIA, 2008b, p. 119) os programas
sociais assumem propores de atendimento em grande escala e geralmente no tm
tempo de durao determinado. De acordo com o mesmo autor: o que diferencia os
dois a magnitude e a amplitude dos objetivos. Vrios projetos constituem um
programa que, necessariamente, devem estar articulados entre si.
De acordo com Correia (2008a), Gawryszewski (2006) e Vianna e Lovisolo
(2009), na expectativa de solucionar os problemas sociais, em muitas ocasies, o
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20
esporte, como canal de socializao ou incluso social11
, frequentemente incorporado
nos programas e projetos sociais como meio interventivo para transformao da
realidade das classes mais populares.
As questes que se colocam para explicar o lugar do esporte na agenda poltica
do Governo so vrias e partem indiscutivelmente das evidncias de que ele se tornou
um dos fenmenos mais expressivos da atualidade (BRACHT, 2005).
Evidncias disso so sublinhadas por Stigger (2002, pp. 1-2), tanto a partir de
um olhar para o cotidiano, como para o contexto social mais amplo:
so as pessoas que praticam o esporte nos parques, nas praias, nas ruas; so
as famlias que organizam seus fins de semana a partir da programao
esportiva veiculada pelos meios de comunicao de massa; so as inmeras
pginas de jornais e revistas destinadas a esta temtica; so os muitos
empregos e inclusive profisses direta ou indiretamente relacionadas a esta
atividade; so as muitas horas de antena que, a preos astronmicos esto
voltadas para eventos esportivos; so os incontveis grupos de indivduos que
despendem muito das suas vidas nas atividades das torcidas organizadas de
futebol; o enorme fluxo de dinheiro que circula pelo mundo, relacionado ao
patrocnio e outros aspectos relativos ao esporte; o grande mercado de bens
e servios vinculado a esta atividade.
Entretanto o esporte nem sempre foi compreendido como uma manifestao a
que todos pudessem ter acesso, porque historicamente esteve atrelado a interesses
ideolgicos e polticos, predominando seu carter competitivo e de alto rendimento
(BRACHT, 2005).
Foi a partir do movimento de reviso conceitual do esporte, verificado a partir da
dcada de 1960, que essa compreenso comeou a ser modificada. Esse movimento teve
como uma de suas aes principais o surgimento e o desenvolvimento do movimento
Esporte para Todos (TUBINO, 2001).
O movimento Esporte para Todos, contestando o carter competitivo e de alto
rendimento do esporte, possibilitou grandes campanhas de valorizao das prticas
esportivas, reforando muito o aumento da abrangncia do renovado conceito de
esporte (TUBINO, 2001, p. 14).
11
Por incluso social entendemos que esta relaciona-se com a igualdade e a luta contra a excluso social de grupos marginalizados em larga escala, seja por motivos culturais ou por outro tipo de contexto social (PACHECO et al., 2007, p. 16).
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21
No Brasil, o movimento Esporte para Todos (EPT) foi lanado em 1977, num
contexto poltico e social conturbado pelo regime de ditadura militar que se perdurara
desde a dcada de 1960 e se prolongaria at a dcada de 1980. A proposta de
democratizao da prtica esportiva de lazer no EPT trouxe uma nova perspectiva de
interveno pelo esporte, que at ento era muito restrita prtica esportiva de alto
rendimento (CAVALCANTI, 1984).
Nesse contexto social de represso militar, o esporte e a Educao Fsica eram
frequentemente utilizados como elementos estratgicos tanto para ocupao dos jovens
rebeldes, como para fins ideolgicos de elevao do nome da nao pelas conquistas
esportivas junto ao cenrio internacional (CAVALCANTI, 1984).
Em 1985, o Regime Ditatorial arruinou-se, mas o esporte continuou na pauta de
interesses do Estado brasileiro aps muitas reivindicaes com a publicao da
Constituio Federal de 1988, a qual prev o esporte como um direito social.
Atualmente o Ministrio do Esporte tem dedicado bastante ateno ao fomento do
esporte em suas diversas dimenses e em todo o territrio nacional. Nesse sentido,
podemos mencionar as iniciativas de criao de programas sociais, tais como o
Programa Esporte e Lazer na Cidade, o Programa Pintando a Liberdade, o
Programa Pintando a Cidadania, o Programa Bolsa-Atleta, o Programa Descoberta
de Talento Esportivo e o Programa Segundo Tempo. Programas sociais que buscam
dar vazo ao direito constitucional, viabilizando e democratizando a prtica do esporte
em mbito nacional, regional, estadual e local.
Nesse cenrio, sobre o Programa Segundo Tempo que o Ministrio do Esporte
tem demandado maior ateno.
Projetos sociais como o PST so exemplos de que o argumento da incluso
social como objetivo dos projetos sociais pode ser ampliado e ressignificado, abrindo
perspectivas tambm para possibilidades intencionalmente educativas e de maior
controle social.
Dessa maneira, so previstos como princpios fundamentais que regem o PST: a
reverso do quadro atual de injustia, excluso e vulnerabilidade social; o fomento ao
esporte e ao lazer como direito de cada um e dever do Estado; a universalizao e
incluso social; e a democratizao da gesto e da participao (BRASIL, 2007).
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22
Partindo desses princpios, foram nomeados os seguintes objetivos12
para o
programa:
Democratizar o acesso prtica esportiva e ao lazer prioritariamente em reas
de vulnerabilidade social;
Oferecer prticas esportivas educacionais, estimulando crianas e adolescentes
a manter uma interao efetiva que contribua para o seu desenvolvimento
integral;
Oferecer condies adequadas para a prtica esportiva educacional de
qualidade;
Desenvolver valores sociais;
Contribuir para a melhoria das capacidades fsicas e habilidades motoras;
Contribuir para a melhoria da qualidade de vida (autoestima, convvio,
integrao social e sade);
Contribuir para a diminuio da exposio aos riscos sociais (drogas,
prostituio, gravidez precoce, criminalidade, trabalho infantil e a
conscientizao da prtica esportiva, assegurando o exerccio da cidadania).
Com efeito, so esperados como impactos sociais diretos sobre os beneficiados
do programa na realidade social onde eles esto inseridos: interao entre eles e destes
com a sua realidade local; melhoria da autoestima; melhoria das capacidades e das
habilidades motoras; melhoria das condies de sade; aumento do nmero de
praticantes de atividades esportivas educacionais; melhoria da qualificao de
professores e estagirios de educao fsica, pedagogia ou esporte (BRASIL, 2007).
Para a instalao de um convnio do PST necessrio o estabelecimento
primeiro de um convnio firmado entre rgos ou entidades da administrao pblica,
direta e indireta, de qualquer esfera de governo, bem como entidade privada sem fins
lucrativos, atravs de acordo previsto entre a entidade proponente e o Ministrio do
Esporte.
12
MINISTRIO DO ESPORTE. Programa Segundo Tempo. Disponvel em:
http://www.esporte.gov.br/snee/segundotempo. Acesso em: maio de 2011.
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23
A gesto desses convnios dada a um Coordenador Geral por convnio
firmado diretamente com o Ministrio do Esporte, preferencialmente profissional da
rea de Educao Fsica ou de Educao, com experincia em gesto de programas
esportivos educacionais, seguido do auxlio de outros profissionais, como um
Coordenador Setorial para convnios a partir de 20 ncleos, com formao na rea de
Educao Fsica ou Esporte e experincia no desenvolvimento de aes comunitrias,
organizao e superviso de projetos; um Coordenador Pedaggico com formao em
Educao Fsica ou Esporte e experincia pedaggica para coordenao, superviso e
orientao na elaborao de propostas pedaggicas; tantos quantos forem necessrios
Coordenadores de Ncleo, tambm da rea, para cada ncleo de 100 alunos
beneficiados; e de dois Monitores para cada 100 alunos beneficiados, sendo um Monitor
de Atividades Esportivas e outro para Atividades Complementares, alm de estudantes
de graduao regularmente matriculados em curso de Educao Fsica ou Educao,
preferencialmente com a primeira metade do curso j concluda (BRASIL, 2011).
Os ncleos podem funcionar tanto nas escolas como em outros espaos pblicos
ou privados, desde que sem prejudicar o rendimento dos beneficiados nas escolas,
oferecendo atividades no contraturno de aulas regulares. Assim, recomenda-se para
frequentar as aulas do PST apenas os beneficiados matriculados nas escolas no
contraturno s atividades do programa.
Desde o estabelecimento do convnio entre a entidade proponente e o Ministrio
do Esporte, deve ser definida a oferta obrigatria nos ncleos de pelo menos duas
modalidades esportivas coletivas e uma individual, orientadas por professores e
estagirios de Educao Fsica.
Essas atividades so desenvolvidas em escolas ou espaos fsicos da comunidade
onde o ncleo est inserido, denominados Ncleos de Esporte Educacional, mediante
programao de atividades a serem desenvolvidas no contraturno escolar, tendo como
enfoque principal o esporte educacional.
Assim, no PST o esporte concebido na sua dimenso educacional como
promotor de desenvolvimento integral. A busca por talentos no a sua finalidade
primria, pois o PST apresenta como princpios fundamentais a universalizao da
prtica esportiva e a incluso social, tendo-se no esporte educacional um meio para
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24
contribuir no desenvolvimento integral de crianas e adolescentes (MELO; DIAS,
2009, p. 22).
De acordo com Darido e Oliveira (2009, p. 209), no PST,
[...] o esporte ultrapassa a ideia de estar voltado apenas para o ensino
das tcnicas, tticas e regras dos esportes, embora inclua esses
aspectos. Muito mais que isso, cabe aos professores e Monitores de
Educao Fsica vinculados ao PST problematizar, interpretar,
relacionar, compreender com seus alunos as amplas manifestaes da
cultura corporal, de tal forma que os alunos compreendam os sentidos
e significados impregnados nas prticas corporais.
No mbito do PST, via dimenso educacional do esporte que as aes de
incluso, emancipao, transformao e formao integral devem ser materializadas,
conforme preconizado pela Poltica Nacional do Esporte.
Assim sendo, trata-se de um esporte trabalhado no mbito de um
programa que contempla o acervo de contedos ou temas da cultura
corporal, sem hierarquia. Um esporte que foge da ditadura dos gestos,
modelos e regras, que tem suas normas questionadas e adaptado
realidade social e cultural dos alunos. Um esporte desmistificado pelo
conhecimento, praticado de forma prazerosa, com vivncias de
sucesso para todos. Um esporte apropriado como bem cultural, cuja
prtica passa a ser compreendida como direito (LORENZINI;
SANTOS, 2010, p. 35).
Alm disso, no mbito do PST, o esporte deve dar um tratamento plural aos seus
beneficiados, respeitando a diversidade. De acordo com Goellner (2009), as prticas
pedaggicas no PST devem flexibilizar os conceitos de performance, aptido fsica,
capacidade e funcionalidade no esporte, sem delas se distanciar, claro. Para tanto, foram
investidos grandes esforos do Ministrio do Esporte para qualificar a formao
esportiva educativa dos seus beneficiados, inclusive lanando um sistema de
capacitao especfico para o trabalho dos recursos humanos nos ncleos do programa,
bem como a publicao de materiais de referncia pedaggica especficos para esse
trabalho (OLIVEIRA; PERIM, 2008; OLIVEIRA, 2011a; OLIVEIRA, 2011b;
OLIVEIRA; PERIM, 2009).
Nesse sentido, destacamos o avano do PST sobre a questo da qualificao de
suas aes pedaggicas, se comparado a outros projetos sociais. O exemplo disso pode
ser verificado nas orientaes tericas e metodolgicas do programa expressas tanto nas
capacitaes como nos livros de referncia.
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25
Desde a constituio do PST, esteve prevista e garantida a capacitao dos
recursos humanos do programa, como indicado no artigo n 10 da j citada portaria
(BRASIL, 2003), mas esta, assim como o prprio programa, experimentou substanciais
modificaes desde a sua inaugurao at os dias atuais.
Inicialmente, as capacitaes dos recursos humanos eram ministradas pelo
Centro de Ensino Distncia da Fundao Universidade de Braslia UnB, por
intermdio de parceria firmada com o Ministrio do Esporte. E eram previstos dois
formatos de capacitaes diferentes para Coordenadores e Monitores.
At 2006, as capacitaes eram especficas para cada recurso humano do PST, e
o formato das capacitaes para os Coordenadores Gerais e de Ncleo seguia
caractersticas de ps-graduao, com titulao de Especialista em Esporte Escolar ao
final do processo, aps defesas de monografias perante bancas examinadoras. O curso
era estruturado em seis mdulos temticos com carga horria de 60 horas cada um,
sendo necessrios momentos presenciais de formao, totalizando 360h. Para os
monitores, era previsto um formato de capacitao por meio de cursos menores,
ministrados pelos prprios Coordenadores Gerais e de Ncleos previamente capacitados
pelo formato especializao, em dois mdulos de 60h horas cada um, com atividades
especficas desenvolvidas nos prprios ncleos (BRASIL, 2006).
Pensando na reviso desse formato de capacitao para os recursos humanos do
programa, a Secretaria Nacional de Esporte Educacional comeou, no ano de 2007,
alguns experimentos realizados em parceria com o Instituto Ayrton Senna, bem como a
realizao de projetos-pilotos de capacitao e acompanhamento pedaggico em
convnios dos estados de So Paulo, Santa Catarina, Paran e Rio Grande do Sul.
Durante o ano de 2007, a partir dos experimentos e da experincia de cada
professor convidado, foi editado e publicado no ano de 2008 o primeiro livro para
orientao do novo formato nacional de capacitao dos recursos humanos do PST.
O primeiro livro Fundamentos Pedaggicos para o Programa Segundo Tempo:
1 ciclo nacional de capacitao dos coordenadores de ncleos, tambm chamado
capa verde, reunia a colaborao de vrios estudiosos da rea de Educao Fsica e
constituiu-se um dos primeiros esforos do programa para elaborar um material que
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26
subsidiasse uma estruturao pedaggica consistente que atenda aos preceitos tcnicos
e tericos da constituio dos Ncleos do PST (GAYA, 2008, p. 12).
A necessidade de elaborao de um material que orientasse o trabalho dos
recursos humanos nos ncleos do programa, bem como subsidiasse o trabalho dos
professores formadores no novo modelo de capacitao, tornou esse livro um marco
referencial para o PST.
O livro foi organizado em nove temas que abordam diversos assuntos
delimitando as concepes que fundamentam as diretrizes do programa, desde conceitos
a exemplos de experincias prticas com o ensino do esporte educacional, quais sejam:
1) Educao para o Desenvolvimento Humano pelo Esporte; 2) A Cultura Corporal do
Movimento Humano e o Esporte Educacional; 3) Aquisio e Desenvolvimento de
Habilidades Esportivas: consideraes para a prtica; 4) A Metodologia de Ensino dos
Esportes no Marco do Programa Segundo Tempo; 5) Percepes de Competncia,
Autoconceito e Motivao: consideraes para a prtica esportiva; 6) Incluso, Gnero e
Deficincia; 7) Processos Avaliativos para Acompanhamento do Desenvolvimento
Humano e Capacidades Fsicas; 8) Planejamento e Organizao para o Programa
Segundo Tempo; 9) Experincias Prticas: aes diferenciadas por faixa etria.
Dessa forma, iniciou-se, em 2008, o Primeiro Ciclo de Capacitao para o
trabalho no PST, fruto da parceria estabelecida entre o Ministrio do Esporte e IES, com
a participao dos Coordenadores Gerais e de Ncleos, e Monitores ao mesmo processo
de capacitao. Esse formato de capacitao funcionava de acordo com trs modelos, a
saber: presencial; integrado presencial e a distncia; e telepresencial.
Monitores e Coordenadores Gerais e de Ncleo tinham acesso ao mesmo
referencial terico-metodolgico para o trabalho no programa13
, porm via
procedimentos e focos diferenciados, segundo a especificidade de sua funo no
programa.
No novo formato, era de responsabilidade do Ministrio do Esporte, atravs da
Secretaria Nacional de Esporte Educacional e da parceria estabelecida com a
13
OLIVEIRA, Amauri A. B. de; PERIM, Gianna L. (org.). Fundamentos Pedaggicos para o programa
segundo tempo: 1 ciclo nacional de capacitao dos coordenadores de ncleos. Braslia: Ministrio dos
Esportes; Porto Alegre: UFRGS, 2008.
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27
Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, garantir a oferta de capacitaes para os Coordenadores Gerais e de Ncleos, e
estes, por sua vez, se responsabilizariam pela replicao da capacitao para os
Monitores dos Ncleos dentro das Diretrizes e Propostas apresentadas (BRASIL, 2007).
Logo, as capacitaes deveriam se dividir numa fase nacional e outra regional e
tinham a inteno de constituir padres conceituais, operacionais e metodolgicos
minimamente homogneos, abordando aspectos gerenciais e pedaggicos por meio da
formao de multiplicadores, devendo ocorrer de forma regional e descentralizada
(Idem, p. 15).
Aps os experimentos realizados e a publicao do primeiro livro, a SNEED, em
conjunto com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Universidades Estaduais
de Londrina e Maring, organizou o Projeto de Acompanhamento Pedaggico e
Administrativo do Programa Segundo Tempo em 2008, o qual, desde ento, e
juntamente com outras universidades pblicas do Brasil, tem promovido Ciclos de
Capacitao especficos para o trabalho no programa por intermdio das Equipes
Colaboradoras (EC) do Ministrio do Esporte (OLIVEIRA, KRAVCHYCHYN, 2011).
Embora satisfeitos com os resultados positivos dos eventos de capacitao em
massa realizados segundo esse formato, a SNEED considerava a possibilidade de
aprimorar ainda mais esse formato de capacitao, de maneira a contribuir para a
consolidao de sua proposta (FILGUEIRA; PERIM; OLIVEIRA, 2009).
Segundo Filgueira, Perim e Oliveira (2009, p. 14), foram sendo identificadas
lacunas no processo de formao, entre as quais se destacou a necessidade de reviso e
aprofundamento dos fundamentos pedaggicos estabelecidos inicialmente.
Nesse sentido, partindo das contribuies do primeiro livro e das constataes
das Equipes Colaboradoras em campo, foi elaborada uma nova proposta pedaggica
para o PST com a ajuda de alguns autores iniciais e outros autores convidados que se
integraram ao processo.
Assim, com a publicao do segundo livro Fundamentos Pedaggicos do
Programa Segundo Tempo: da reflexo prtica, ou tambm chamado capa branca,
iniciou-se o Segundo Ciclo de Capacitaes do Programa Segundo Tempo, com o
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28
objetivo de qualificar o trabalho desenvolvido pelos profissionais da rea nos NEE14 e
consolidar a proposta pedaggica construda a muitas mos pelos professores que
constituem as Equipes Colaboradoras do Programa (FILGUEIRA; PERIM;
OLIVEIRA, 2009, p. 15).
O novo livro permitiu revisar os temas anteriores, atualizando-os, bem como
aprofundou algumas temticas que se apresentaram essenciais para a consolidao da
nova proposta pedaggica do programa, a saber: 1) Fundamentos do Programa Segundo
Tempo: entrelaamentos do esporte, do desenvolvimento humano, da cultura e da
educao; 2) Fundamentos do lazer e da animao cultural; 3) Corpo, gnero e
sexualidade: educando para a diversidade; 4) Estilos de ensino e aprendizagem motora:
implicaes para a prtica; 5) Questes da deficincia e as aes no Programa Segundo
Tempo; 6) Organizao e desenvolvimento pedaggico do esporte no Programa
Segundo Tempo; 7) Procedimentos metodolgicos para o Programa Segundo Tempo; 8)
Planejamento do Programa Segundo Tempo: a inteno compartilhar conhecimentos,
saberes e mudar o jogo.
Com a continuidade de alguns autores iniciais e integrao de novos autores
nesse segundo livro, algumas temticas abordadas no primeiro livro foram suprimidas,
outras condensadas em discusses dentro de novos captulos, algumas foram
atualizadas, e outras foram mais aprofundadas.
Para o ano de 2010, manteve-se a estrutura idealizada no ano anterior, exigindo-
se que apenas os novos coordenadores (novos contratados e/ou substitutos de
coordenadores que se afastaram) tivessem a obrigao de realizar nova capacitao.
Mas os esforos do PST para a concretizao de seus objetivos no cessaram.
Atendendo novamente a constataes das Equipes Colaboradoras em suas visitas
sistemticas para acompanhamento dos convnios, foram elaborados e publicados dois
novos livros menos terico-reflexivos e com mais exemplos de experincias prticas de
sistematizao do contedo esporte.
De acordo com Oliveira (2011, p. 13), os novos livros do PST constituem-se um
material didtico,
14
NEE significa Ncleo de Esporte Educacional
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29
fruto da colaborao dos integrantes das Equipes Colaboradoras, que
ao analisarem e pesquisarem as aes desenvolvidas pelos
Coordenadores de Ncleos e Monitores dos diversos convnios se
propuseram a disponibilizar suas experincias e vivncias, a fim de
potencializar a proposta pedaggica do Programa.
Os dois novos livros, na verdade, so dois volumes e, diferentemente dos dois
primeiros livros do PST, Ensinando e aprendendo esportes no Programa Segundo
Tempo, procuram estreitar as barreiras entre a teoria e prtica, apresentando propostas
de sistematizao de contedos esportivos a partir de experincias dos seus autores com
o ensino das especficas modalidades esportivas.
Dessa maneira, percebemos os esforos do Programa Segundo tempo em
realmente qualificar as suas aes pedaggicas, evidenciando o compromisso do
programa em garantir aos seus beneficiados possibilidades efetivamente educativas que
superam o discurso da incluso social.
Em todos os referenciais citados, constam as orientaes necessrias para o
trabalho pedaggico no PST. Desde conceitos a propostas metodolgicas especficas
para o trabalho pedaggico com o esporte educacional nos ncleos do programa.
Sobre todas as reformulaes pelas quais vem passando o programa, Oliveira e
Kravchychyn (2011, p. 3) inferem que
O processo institudo pela SNEED/ME para os atores do PST em
relao formao continuada em servio se coloca como indito em
termos de Programas Sociais. O PST tem procurado inovar e avanar
com suas aes e procedimentos, reconhecendo a necessidade da
formao qualificada de seus quadros. Entretanto, como se trata
tambm de uma ao indita, muito teve que ser criado e idealizado
sem uma base de experincia, portanto, passvel de equvocos e
acertos. Felizmente, os acertos tm sido maiores do que os erros, mas
mesmo assim, muito ainda h que ser aprimorado, conforme apontam
os avaliadores das ECs.
Com efeito, o PST assume o pioneirismo entre programas e projetos sociais
esportivos educacionais na elaborao e publicao de referenciais tericos
metodolgicos prprios ao seu funcionamento, bem como de realizao de ciclos de
capacitao especficos para o trabalho no programa.
A partir de ento, os profissionais do PST tm sua disposio referenciais
mpares para a concretizao dos objetivos do programa.
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30
Desse modo, o PST procura contribuir para minimizar o tempo de exposio de
crianas, adolescentes e jovens a situaes de riscos sociais quando estes no esto nos
seus horrios de aulas regulares, atribuindo ao esporte um papel central, alm de tentar
ampliar as possibilidades educativas de seus alunos por meio da dimenso educacional
do Esporte.
Nesse sentido, Leal (2010) demonstra concretas possibilidades educativas do
esporte educacional democratizado pelo PST, relatando sua experincia com a
sistematizao desse esporte mediante as orientaes do programa num ncleo de
esporte educacional do convnio firmado entre o Ministrio do Esporte e a Associao
Caruaruense de Ensino Superior (ASCES), desenvolvido na Escola Estadual Andr
Cordeiro, no municpio de Brejo da Madre de Deus, no estado de Pernambuco.
A experincia relatada pelo autor consistiu na sistematizao do contedo
esporte para uma turma do Ncleo IV do convnio da ASCES composta por 30 alunos,
segundo uma proposta de pedagogizao do esporte a partir da criao de jogos
desenvolvida em 15 aulas, a fim de confirmar os efeitos educacionais e emancipatrios
das orientaes metodolgicas do PST (LEAL, 2010).
Cada turma foi dividida em trs grupos de 10 alunos, sendo lanada para as
turmas individuais a tarefa de pesquisar e apresentar jogos que utilizassem bolas com os
ps, jogos que utilizassem bolas com as mos e jogos que no utilizassem o aparato da
bola. A organizao das 15 aulas adotou uma estratgia que partiu primeiro de
momentos de pesquisa e apresentao dos grupos de alunos sobre as trs tarefas
geradoras para, em seguida, serem sistematizados os ciclos de criao, transformao e
experimentao dos jogos.
Para os ciclos de criao, transformao e experimentao dos jogos, cada grupo
foi previamente instalado num espao determinado da quadra segundo a diviso das
tarefas que os definiram enquanto grupos, ou seja, segundo os tipos de jogos com
utilizao da bola com os ps ou com as mos, ou sem bola. O objetivo dessa
organizao era possibilitar, at o final das 15 aulas, um rodzio de criao,
apresentao e experimentao dos diferentes tipos de jogos por todos os grupos.
Assim, cada grupo deveria criar, apresentar e experimentar os trs tipos de jogos que
utilizassem a bola com os ps ou com as mos, ou jogos que no se utilizavam da bola.
-
31
Ao final dessa experincia, o autor chegou concluso de que foi possvel
promover possibilidades educativas mediante as orientaes do PST para os
beneficiados do programa, quando constatou o interesse participativo, efetivo e eficaz
dos beneficiados na resoluo das atividades pertinentes metodologia utilizada
(LEAL, 2010).
Entretanto Bezerra (2011) e Bezerra, Melo e Mendes (2011) demonstraram que
a tarefa de ensinar em projetos sociais no nada fcil, inclusive em convnios do
prprio PST. Segundo Bezerra (2011), entre as principais dificuldades encontradas
pelos monitores e coordenadores de ncleo do PST para operacionalizar as aulas no
programa esto: a) condies estruturais dos espaos onde as prticas so realizadas; b)
dificuldades de ordem pedaggica para conduzir as aulas; c) conflitos entre as aulas do
PST e outros programas sociais ou entre o PST e a prpria escola; d) compreenso
reducionista do PST por parte de membros da comunidade escolar quando inserido na
escola; e) dificuldades de se trabalhar em ncleos inseridos em contextos de to
evidentes riscos sociais.
No entanto, a escassez de estudos que abordem a questo do ensino em projetos
sociais revela o desafio que para ns abordar essa temtica.
Segundo Gohn (2009), tem aumentado a preocupao a respeito da qualidade
das prticas educativas desenvolvidas em projetos sociais, porm esses projetos, em si,
ainda no so tratados como objetos de estudo pela rea da Educao, tornando essa
realidade muito incipiente de estudos aprofundados a esse respeito.
Ainda, segundo Pacheco (2006) e Correia (2008), estudos na rea de educao
que investigam projetos sociais ainda so pouco difundidos, porque fundamentalmente
se baseiam em prticas livres de intervenes pedaggicas slidas, ausentes de dilogo
com o Projeto Pedaggico da escola quando inseridos nesta, e desenvolvendo prticas
baseadas no senso comum, quando no movidos por aes oportunistas.
Embora sejam poucos os casos de projetos sociais que se preocupam de fato com
a qualidade das aes educativas desenvolvidas, temos observado em alguns projetos
sociais, como o Programa Segundo Tempo e o Programa Mais Educao15
, exemplos de
15
O Programa Mais Educao um programa social criado pela Portaria Interministerial n
17/2007, que objetiva aumentar a oferta educativa nas escolas pblicas por meio de atividades
-
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prticas educativas conscientes, deliberadas e planificadas, com a finalidade explcita de
instruo ou ensino de algum saber socialmente construdo e culturalmente organizado,
inserindo-os, a nosso ver, tambm no quadro das agncias promotoras de educao. So
projetos sociais que, alm da inteno de incluir socialmente, preocupam-se de fato em
sistematizar intencional e explicitamente algum saber social, tendo no esporte um de
seus principais meios de interveno.
Logo, percebe-se que a questo da prtica pedaggica em projetos sociais algo
ainda pouco discutido, porque, em linhas gerais, seus objetivos tm se limitado a
questes assistencialistas. Tanto que muitos autores orientados pelas cincias polticas e
sociais definem projetos sociais como atividades de carter educacional no-formal
(ZALUAR, 1994; PACHECO, 2006; GOHN, 2009).
Mas nossos esforos, nesta dissertao, so de demonstrar exatamente o
contrrio e que h projetos sociais que no se limitam apenas incluso social, mas que
vo alm e tambm pensam no carter educativo de suas propostas, inclusive
legitimando a importncia da qualidade dos saberes sistematizados, bem como da
qualificao necessria dos professores para o trabalho nesses projetos. Procuramos,
assim, evidenciar que no cabe somente escola a tarefa de proceder a momentos de
socializao sistematizada dos saberes.
Para tanto, torna-se necessrio delimitar uma compreenso de educao que
supere a compreenso tradicional de educao realizada apenas no mbito escolar
(LEAL, 2010).
Nesse sentido, Libneo (1994, p. 22) define educao como:
um conceito amplo que se refere ao processo de desenvolvimento
onilateral da personalidade, envolvendo a formao de qualidades
humanas fsicas, morais, intelectuais, estticas tendo em vista a orientao da atividade humana na sua relao com o meio social,
num determinado contexto de relaes sociais.
O autor, ampliando esse conceito, ainda argumenta que tambm se pode falar em
educao formal e educao no-formal segundo a intencionalidade, os objetivos
pretendidos e os meios onde se processam as prticas educativas:
optativas agrupadas em macrocampos, como: acompanhamento pedaggico, meio ambiente,
esporte e lazer, direitos humanos, cultura e artes, cultura digital, preveno e promoo da
sade, educomunicao, educao cientfica e educao econmica.
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33
Educao no-formal quando se trata de atividade educativa
estruturada fora do sistema escolar convencional (como o caso de
movimentos sociais organizados, dos meios de comunicao de
massa, etc.) e da educao formal que se realiza nas escolas ou outras
agncias de instruo e educao (igrejas, sindicatos, partidos,
empresas) implicando aes de ensino com objetivos pedaggicos
explcitos, sistematizao, procedimentos didticos (LIBNEO, 1994,
p. 18).
Nesse sentido, o que distingue se uma prtica educativa configura-se como
sendo formal ou no-formal no o espao onde ela est sendo desenvolvida, tampouco
podem ser definidas como sendo educao formal somente aquelas prticas educativas
desenvolvidas dentro da escola, ou educao no-formal aquelas prticas educativas
desenvolvidas fora escola. Acreditamos que o que define se uma prtica educativa
configura-se como sendo formal ou no-formal a intencionalidade explcita de educar,
os objetivos pedaggicos almejados, a sistematizao do ensino e os procedimentos
didticos empregados, e no somente os espaos.
A escola , reconhecidamente, um espao de educao formal, porque nela esto
explcitos os interesses educativos e os procedimentos necessrios sistematizao da
prtica educativa, mas isso no quer dizer que outros espaos extramuros escolares no
possam se configurar como tal (LIBNEO, 1994).
Instituir fronteiras entre educao formal e no-formal, alegando apenas que
uma se processa na escola, e a outra usualmente fora da escola, reduzir a compreenso
desses conceitos, porque em algum momento processos educativos formais podem se
configurar fora da escola, segundo a sua intencionalidade educativa, a sistemtica de
suas intervenes, as estratgias empregadas e os espaos solicitados, bem como o
contrrio, na prpria escola haver processos no-formais de educao.
Nessa concepo, compreendemos, portanto, que alguns projetos sociais podem
se configurar como espaos de prtica social e educao formal, desde que se articulem
para esse determinado interesse.
Nesse caso, podemos citar o exemplo do Programa Segundo Tempo, que pode
desenvolver suas atividades intencionalmente educativas tanto em espaos pblicos,
como as escolas, quanto em espaos privados das comunidades onde est inserido.
Quando o PST desenvolvido em escolas, seu papel educativo parece ser mais
evidente, utilizando-se do espao escolar, bem como dos alunos nela inseridos, o que
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atualmente pode ser evidenciado na parceria composta entre o Programa Mais
Educao, o Programa Segundo Tempo e a escola.
O fato de o PST estar inserido na escola refora, portanto, seu compromisso
social na formao dos beneficiados. Assim sendo, acreditamos que o PST deve se
aproximar do Projeto Pedaggico da escola, a fim de melhor dialogar com os objetivos
desta.
O PST, quando inserido na escola, deve nutrir e tambm ser nutrido pelo Projeto
Pedaggico desta, e no ser concebido de forma parasita. Por meio de uma proposta
integrada que dialogue com os interesses da escola e da comunidade, o PST segue para
o sucesso de suas intervenes. Quando concebido de forma indiferente, ele corre o
risco de promover intervenes vagas e descontextualizadas da realidade em que est
inserido.
De acordo com a portaria que regula o PST, no seu artigo 3, est previsto o
incentivo integrao do PST ao planejamento escolar dos estabelecimentos de ensino
em que for implantado (BRASIL, 2003). Nesse sentido, PST e escola no devem ser
compreendidos de forma estanque, um separado do outro, mas sim unidos pelo mesmo
propsito, o de educar. Nessa acepo, exatamente na escola onde a interface do PST
com a disciplina curricular de Educao Fsica mais se evidenciam.
Da insero do PST no espao escolar, da Educao Fsica que ele mais se
aproxima. Do contedo esporte semelhante a procedimentos metodolgicos parecidos,
seria inevitvel negar a relao do PST com esse componente curricular. Alm de
procedimentos metodolgicos e o contedo esporte em comum, ambos partilham
frequentemente o mesmo espao na escola. Mesmo fora dela, as experincias que o PST
proporciona aos seus beneficiados constituem-se em ricos momentos de reforo dos
contedos da Educao Fsica escolar, se assim podemos dizer.
Se seus beneficiados no fossem devidamente identificados com a camisa e o
bon do PST, materiais concedidos pelo Ministrio do Esporte, qualquer desavisado que
visualizasse o programa em ao, num ambiente escolar, poderia confundir as aulas do
PST com uma aula de Educao Fsica.
No obstante, o PST e a Educao Fsica escolar no so uma mesma unidade de
sistematizao do contedo esporte que, na ausncia de um, o outro pode suprir.
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35
Conforme previsto no artigo 7 da supracitada portaria, a participao do aluno no PST
no o dispensa das aulas de Educao Fsica (BRASIL, 2003). Tampouco, o PST deve
ser concebido de forma independente da escola, a ponto de lhe ser atribuda uma funo
parasita, em que a escola sua hospedeira e de nada importa o dilogo com o
Projeto Pedaggico desta.
De certa forma, as atividades do PST so um complemento da Educao Fsica
escolar quando da apropriao do esporte em suas intervenes. Inserido ou no nas
escolas, de responsabilidade do PST promover a incluso social por meio de
atividades esportivas intencionalmente educativas, de maneira a atingir a formao
integral dos beneficiados.
Por fim, cremos que, para o sucesso do PST, no basta apenas capacitar os
recursos humanos envolvidos com o trabalho pedaggico no programa ou publicar
documentos de orientao. necessrio tambm haver a intencionalidade em cada um
dos atores sociais envolvidos com o trabalho nos ncleos do programa em transformar a
realidade; necessria a assuno da responsabilidade social de cada um, para que a
proposta do programa possa ser concretizada. necessrio haver aquele impulso ntimo
que leva os sujeitos a agirem sobre a realidade. necessria, sobretudo, uma pedagogia
da esperana!
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CAPTULO II
DELINEAMENTO METODOLGICO DA PESQUISA
Como j comentado anteriormente, nossa inteno de pesquisa parte de uma
problemtica que nos inquieta j h algum tempo: a migrao das orientaes tericas e
metodolgicas do PST para as intervenes pedaggicas dos recursos humanos do
programa. Essa inquietao nos levou ao exerccio de investigao e publicao de dois
trabalhos exploratrios. Embora esses estudos exploratrios tenham identificado
fragilidades na prtica pedaggica de coordenadores de ncleo e monitores do PST
apenas no convnio n 430/2007 da Prefeitura Municipal de Natal/RN, encerrado no
ano de 2011, ainda temos constatado, nos relatrios de visita in loco da Equipe
Colaboradora 3 (EC-3) do Ministrio do Esporte aos convnios da PST sob sua
jurisdio, fragilidades no tocante questo das intervenes pedaggicas e
metodolgicas nos ncleos e, por conseguinte, a pouca migrao das orientaes
tericas e metodolgicas para a prtica pedaggica dos monitores e coordenadores de
ncleo.
No devemos refutar, entretanto, ao destacarmos os problemas identificados, os
casos exitosos de experincias com a sistematizao do esporte educacional sob as
orientaes tericas e metodolgicas do programa tanto em convnios supervisionados
pela Equipe Colaboradora 3 como em outros convnios do PST espalhados pelo Brasil,
superestimando os problemas (LEAL, 2010).
Diante disso, procuramos, nesta pesquisa, investir numa proposta de interveno
e acompanhamento sistemtico de algum convnio do PST supervisionado pela EC-3,
sendo o convnio n 740366/2010 da Prefeitura Municipal de Riacho da Cruz, Rio
Grande Norte, o convnio escolhido como nosso campo emprico, porque procurvamos
algum convnio do PST que nos recebesse por, no mnimo, meio ciclo pedaggico de
funcionamento (seis meses), j que buscvamos levar os recursos humanos a processos
de tomada de conscincia e possveis mudanas na prtica pedaggica, conscientes de
que demandaramos tempo para promover tais mudanas.
Dentre as opes de convnios que tnhamos, todos j haviam iniciado suas
atividades ou j estavam prximos de encerrar sua vigncia de um ciclo pedaggico
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equivalente a um ano de durao. Portanto decidimos pelo convnio de Riacho da Cruz,
porque este daria incio a suas atividades justamente no perodo previsto para o incio
do trabalho de campo, embora sua localizao fosse afastada da nossa cidade de
residncia, Natal, tambm no estado do Rio Grande do Norte.
Assim, pela longa distncia existente entre a nossa cidade e o campo emprico da
pesquisa, a qual totaliza 357 quilmetros, nossa proposta se deu por momentos
presenciais e no presenciais.
No acompanhamento a distncia, os coordenadores pedaggico e geral do
convnio constituram-se os nossos colaboradores mais ntimos, mas as atribuies
individuais de cada um se mantiveram respeitadas. Alm de desenvolverem suas
atribuies pedaggicas e administrativas normalmente, auxiliavam nosso
acompanhamento pedaggico, mantendo-nos atualizados sobre as deliberaes do
convnio, sobretudo pedaggicas, e fornecendo a logstica necessria ao bom
andamento desta pesquisa.
O acompanhamento presencial no seguiu uma periodizao fixa, devido a
entraves como: feriados, festas regionais, paralisaes das atividades do convnio,
cumprimento de obrigaes acadmicas do pesquisador, anlise do material coletado,
programao e edio do retorno ao campo emprico e motivos pessoais do pesquisador.
Mas foi sobre o acompanhamento presencial do convnio nosso maior
investimento nesta pesquisa, uma vez que propomos uma metodologia de interveno
social fundamentada no mtodo de pesquisa-ao, porque o objetivo desse mtodo,
assim como o nosso, promover mudanas numa realidade social a partir da conduo
de processos de tomada de conscincia, culminando na produo de conhecimentos a
esse respeito, sempre com a esperana de resoluo de um problema (BRACHT, 2002).
Assim, nossa proposta de pesquisa est balizada nas orientaes de Barbier
(2007), que infere existirem quatro etapas centrais no processo de pesquisa-ao, a
saber: (1) identificao da situao-problema e a contratualizao; (2) o planejamento e
a realizao em espiral; (3) as tcnicas para coleta de dados em pesquisa-ao; (4) a
teorizao, a avaliao e a publicao dos resultados. Elas foram balizadoras das etapas
desta pesquisa, bem como da prpria estrutura desta dissertao e sero descritas com
detalhes mais adiante.
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Os tpicos descritos em seguida neste captulo caracterizam cada uma dessas
etapas e como elas se apresentaram nesta pesquisa.
2.1. Diagnstico e Contratualizao
Esta pesquisa teve incio no dia 31 de agosto de 2012, quando tivemos a
oportunidade de capacitar os monitores e coordenadores de ncleo do convnio da
Prefeitura Municipal de Riacho da Cruz.
Diferentemente de outras pesquisas, em pesquisa-ao, o problema ou situao-
problema no suscitado pelo pesquisador, este preferencialmente deve acolh-los
depois de j inseridos no campo emprico (BARBIER, 2007).
Nesse sentido, reunindo os resultados dos eventos diagnsticos desta pesquisa,
identificamos trs situaes-problemas na migrao das orientaes tericas e
metodolgicas do PST para a prtica dos recursos humanos nos ncleos, quais sejam:
problemas para elaborao e sistematizao de instrumentos avaliativos, dificuldades
para planejamento e necessidade de mais exemplos de experincias prticas de ensino
do esporte.
Segundo as recomendaes de Barbier (2007), depois de identificada a situao-
problema, o prximo passo formalizar de fato o contrato de pesquisa com o grupo
sujeito da situao investigada.
Numa pesquisa-ao, o contrato precisa as funes de cada um, o sistema de
reciprocidades, as finalidades da ao, os encargos financeiros, a temporalidade, as
fronteiras fsicas e simblicas, as zonas de transgresso e o cdigo tico da pesquisa
(BARBIER, 2007, p. 120).
A partir desse contrato, foi formalizada a participao ativa dos monitores e
coordenadores de ncleo na pesquisa na funo de pesquisadores implicados na situao
investigada como colaboradores da pesquisa coordenada por um pesquisador
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profissional16
, constituindo assim um grupo-sujeito de pesquisa denominado por Barbier
(2007) de pesquisador-coletivo.
De acordo com Barbier (2007, p. 103), o pesquisador-coletivo um grupo-
sujeito de pesquisa constitudo por pesquisadores profissionais (provenientes de
organismos de pesquisa ou de universidades) e por membros, que gozam de todos os
privilgios (mas particularmente implicados), da produo vinculada a investigao
participativa.
Portanto, para constituir esse pesquisador-coletivo, convidamos todos os
monitores (doze), todos os coordenadores de ncleo (seis), o coordenador pedaggico e
o coordenador geral do convnio da Prefeitura Municipal de Riacho da Cruz para
compor nossa amostra intencional de pesquisa, porque acreditamos na possibilidade de
trabalharmos coletivamente sobre as trs situaes-problema identificadas com esse
quantitativo de colaboradores sem, contudo, inviabilizar a proposta de pesquisa (GIL,
2009). Sem distino, todo e qualquer colaborador poder se afastar dessa pesquisa a
qualquer momento sem nenhuma punio.
2.2. Planejamento e realizao em espiral: os Seminrios e os Ciclos de
Observaes
Toda investigao que se pretende pesquisa-ao requer do pesquisador um
papel ativo no equacionamento dos problemas encontrados, no acompanhamento e na
avaliao das aes desencadeadas em funo dos problemas (THIOLLENT, 2011, p.
21). De acordo com Barbier (2007, p. 117) o esprito mesmo da pesquisa-ao consiste
em uma abordagem em espiral que a todos utiliza. [...] todo avano em pesquisa-ao
implica o efeito recursivo em funo de uma reflexo permanente sobre a ao.
Assim, o pesquisador vai e volta, passa e repassa sobre a situao pesquisada,
recorrendo permanentemente teorizao da prtica e prtica da teorizao. Em outras
palavras, a pesquisa-ao a cincia da prxis. Essa tcnica de pesquisa extrapola o
positivismo cientfico em que se necessrio conhecer para depois agir. Na pesquisa-
16
Pesquisador profissional o especialista proveniente de organismos de pesquisa ou de universidades
(BARBIER, 2007).
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40
ao, a prpria ao torna-se objeto de investigao numa lgica recursiva de reflexo
sobre a ao.
De acordo com Gil (2009) existem diversas tcnicas que podem ser utilizadas
em pesquisa-ao, tais como entrevista coletiva ou individual, questionrios, observao
participante, dirio de campo ou histria de vida, e Thiollent (2011) aponta para o
seminrio como sendo uma tcnica para coleta de dados importante em pesquisa-ao.
Acreditamos que o movimento de reflexo, ao e retorno reflexo,
oportunizado pelos investimentos dessa pesquisa, podem provocar conflitos
sociocognitivos na prtica educativa dos professores, levando a mudanas na sua prtica
educativa.
Em estudo semelhante, Palma (2001, p. 26) j havia chegado a concluso
parecida:
Ao se optar por um processo de capacitao continuada e em servio,
por meio da pesquisa-ao, teve-se claro que ele estaria compreendido
de momentos de reflexo, anlise e abstrao. Nesse sentido, foram
adotados, como processo de interveno, situaes que
constantemente suscitaram conflitos scios-cognitivos.
Segundo Carugati e Mugny (1988 apud PALMA, 2001, p. 26), uma das
eficcias do conflito sociocognitivo justamente a de proporcionar informaes que
ajudam os sujeitos a elaborarem uma resposta nova.
Nessa lgica, os seminrios constituram os momentos de reflexo que
encaminharam sugestes para ao e foram caracterizados nessa pesquisa pelos
momentos de formao, planejamento e avaliao, os quais foram pensados segundo o
princpio de que devemos refletir, agir e voltar a refletir incansavelmente sobre a nossa
prtica pedaggica, dialogando com os ensinamentos de Paulo Freire (2011) quando nos
adverte de que a pesquisa e a reflexo crtica sobre a prtica so saberes necessrios
prtica educativa.
A estratgia por seminrios adotada nesta pesquisa seguiu uma ordem
sistemtica de eventos peridicos de visitas ao convnio da Prefeitura Municipal de
Riacho da Cruz, num prazo que perdurou por cinco meses, desde o incio da realizao
do primeiro seminrio, a fim de atender os interesses de pesquisa do pesquisador e dos
objetivos de ao emergidos do campo emprico.
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No total foram realizados cinco seminrios, seguidos por cinco ciclos de
observaes. Todos os seminrios procuraram atingir tanto as situaes-problemas
diagnosticadas nesta pesquisa como os objetivos de ao emergidos dos ciclos de
observaes por meio de estratgias que suscitaram momentos de reflexo sobre a ao
e encaminharam novas aes sobre as reflexes tecidas.
Os ciclos de observaes alimentavam as reflexes sobre a prpria prtica
pedaggica do grupo-sujeito, funcionando tambm como mecanismo de avaliao do
impacto das intervenes dos seminrios para o pesquisador e para os monitores e
coordenadores de ncleo que compem o grupo-sujeito, numa forma de ciclo de
reflexo-ao-reflexo sobre a prtica pedaggica.
Dessa maneira, o investigador e os sujeitos investigados no ocupam espaos
estanques. Ambos esto unidos na busca pela resoluo da situao-problema. Tanto o
investigador como os outros atores sociais da pesquisa17
participam democraticamente
do processo de produo do conhecimento.
Assim, entre monitores e coordenadores de ncleo no houve diferenciao
quanto s suas contribuies nesta pesquisa,
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