pedagogia e pedagogos - para que

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513Cadernos de Pesquisa, v. 37, n. 131, maio/ago. 2007

Resenhas

PEDAGOGIA E PEDAGOGOS,

PARA QUÊ?José Carlos Libâneo

São Paulo: Cortez, 2005. 200p. (8. ed.)

O livro reúne textos escritos ao longo dadécada de 1990 por José Carlos Libâneo coma intenção de responder à pergunta que dá tí-tulo à obra. Como se trata de um autor cujopensamento é amplamente conhecido nosmeios educacionais, as respostas são familiaresàqueles que têm se interessado pelos destinosda pedagogia no Brasil, constituindo-se em au-têntico manifesto em favor da pedagogia e, con-seqüentemente, da profissão de pedagogo.

Em um manifesto são declaradas, publi-camente, as razões que justificam certos atos eopções. É isso que faz o autor ao longo dos cin-co capítulos do livro, expondo as razões quejustificam a existência da pedagogia como “ciên-cia da educação”, posicionando-se em favor daespecificidade da atuação profissional do peda-gogo e formulando uma clara proposta para asua formação.

Para Libâneo, o que justifica a existênciada pedagogia é o fato de esse campo ocupar-se do estudo sistemático das práticas educati-vas que se realizam em sociedade como pro-cessos fundamentais da condição humana. Apedagogia, segundo o autor, serve para inves-tigar a natureza, as finalidades e os processosnecessários às práticas educativas com o obje-tivo de propor a realização desses processosnos vários contextos em que essas práticasocorrem. Ela se constitui, sob esse entendi-mento, em um campo de conhecimento quepossui objeto, problemáticas e métodos pró-prios de investigação, configurando-se como“ciência da educação”.

Essa visão da pedagogia fundamenta-seem um conceito ampliado de educação. Para

Libâneo, as práticas educativas não se restrin-gem à escola ou à família. Elas ocorrem em to-dos os contextos e âmbitos da existência indi-vidual e social humana, de modo institucionali-zado ou não, sob várias modalidades. Entreessas práticas, há as que acontecem de formadifusa e dispersa, são as que ocorrem nos pro-cessos de aquisição de saberes e modos deação de moda não intencional e não institucio-nalizado, configurando a educação informal. Há,também, as práticas educativas realizadas eminstituições não convencionais de educação,mas com certo nível de intencionalidade e sis-tematização, tais como as que se verificam nasorganizações profissionais, nos meios de comu-nicação, nas agências formativas para grupossociais específicos, caracterizando a educaçãonão formal. Existem, ainda, as práticas educati-vas com elevados graus de intencionalidade, sis-tematização e institucionalização, como as quese realizam nas escolas ou em outras institui-ções de ensino, compreendendo o que o au-tor denomina educação formal.

Para Libâneo, são esses processos queconstituem o objeto de estudo da pedagogia,demarcando-lhe um campo próprio de inves-tigação. Ela estuda as práticas educativas tendoem vista explicitar finalidades, objetivos so-ciopolíticos e formas de intervenção pedagógi-ca para a educação. O pedagógico da ação edu-cativa se expressa, justamente, na intencionali-dade e no direcionamento dessa ação. Esseposicionamento é necessário, defende o autor,porque as práticas educativas não se dão deforma isolada das relações sociais, políticas,culturais e econômicas da sociedade. Vivemosem uma sociedade desigual, baseada em rela-ções sociais de antagonismo e de exploração.Por isso a pedagogia não se pode eximir de seposicionar claramente sobre qual direção a açãoeducativa deve tomar, sobre que tipo de ho-mem pretende formar. Do ponto de vista do

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autor isso é o que justifica a existência da pe-dagogia como área do conhecimento, cuja es-pecificidade é realizar uma reflexão global eunificadora da realidade da educação.

Nessa concepção, pedagogo é o profis-sional que atua em várias instâncias da práticaeducativa, indireta ou diretamente vinculadas àorganização e aos processos de aquisição de sa-beres e modos de ação, com base em objeti-vos de formação humana definidos em uma de-terminada perspectiva. Dentre essas instâncias,o pedagogo pode atuar nos sistemas macro, in-termediário ou micro de ensino (gestores, su-pervisores, administradores, planejadores depolíticas educacionais, pesquisadores ou ou-tros); nas escolas (professores, gestores, coor-denadores pedagógicos, pesquisadores, forma-dores etc.); nas instâncias educativas não esco-lares (formadores, consultores, técnicos, orien-tadores que ocupam de atividades pedagógicasem empresas, órgãos públicos, movimentossociais, meios de comunicação; na produção devídeos, filmes, brinquedos, nas editoras, na for-mação profissional etc.).

Essa formulação distingue claramente aatividade profissional do professor, que reali-za uma forma específica de trabalho pedagó-gico (ensino) e a atividade profissional do pe-dagogo, que se desenvolve em um amplo le-que de práticas educativas (informais, não for-mais e formais). Por isso Libâneo entende quea formação do professor e a do pedagogo nãopodem ser realizadas em um único curso, talcomo defendem os movimentos de reformu-lação dos cursos de formação de educadores,atualmente representados pela AssociaçãoNacional pela Formação dos Profissionais daEducação – Anfope.

A proposta do autor é a de que haja doiscursos, um de pedagogia para formar o peda-gogo stricto sensu e um de licenciatura paraformar professores para os níveis fundamen-

tal e médio de ensino. Em síntese, ela consis-te dos seguintes pontos: a. as faculdades deeducação ofereceriam dois cursos distintos,um de pedagogia e um de licenciatura para adocência no ensino fundamental e médio; b.o pedagogo receberia formação especializadaatravés de habilitações, entre elas a pedago-gia escolar; c. o licenciado obteria habilitaçõespara a docência no curso de magistério, nasdisciplinas de 5ª a 8ª série e ensino médio ounas séries iniciais do ensino fundamental; e d.a estrutura curricular teria uma base comum,englobando conhecimentos referentes aosfundamentos da educação, da escola e do en-sino e de uma parte específica de conhecimen-tos profissionais, definidos conforme o contex-to de atuação profissional (pedagogo, docen-te ou outra habilitação).

Trata-se de uma proposta coerente comuma visão de educação como prática socialque, por não restringir o educativo ao âmbitodo escolar, abre o campo de exercício profis-sional do pedagogo. Desde quando foi apre-sentada pela primeira vez, no 6º EncontroNacional da Anfope, realizado em 1992, emBelo Horizonte, a proposta tem sido objeto depolêmicas e discordâncias com esse movimen-to, que defende a docência como base daidentidade profissional do pedagogo, subsu-mindo o trabalho pedagógico ao trabalho do-cente. No entanto, tem sido coerentementedefendida pelo autor em congressos, simpó-sios, encontros e debates da área, nos quais aposição da Anfope foi sempre hegemônica.Assim como faz nestes eventos, com esta pu-blicação o autor apresenta seus argumentosem favor da especificidade da pedagogia, dosestudos pedagógicos e do exercício profissio-nal do pedagogo, conclamando os pedagogosa influírem nos rumos de sua profissão, talcomo o faz em um dos capítulos, intitulado“Que destinos os educadores darão à pedago-

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gia?” Com a palavra os pedagogos. A leitura dolivro pode ser uma boa fonte de argumentospara a construção desses destinos.

Verbena Moreira Soares de Sousa LisitaFaculdade de Educação da Universidade

Federal de Goiáslisita@uol.com.br

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