o pac-manguinhos: política urbana, usos e representações ... · 1" " o pac-manguinhos:...
Post on 14-Sep-2020
4 Views
Preview:
TRANSCRIPT
1
O PAC-Manguinhos: política urbana, usos e representações da cidade 1
Mila Henriques Lo Bianco
Orientação: Mariana Cavalcanti (CPDOC/FGV)2
Resumo: A implementação do Programa de Aceleração do Crescimento, desde 2008, em Manguinhos,
região do subúrbio carioca, vem alterando as dinâmicas sócio-espaciais até então vigentes no local. Se em
relação ao grande volume de investimento, o programa se apresenta como uma ação inédita na favela; no
que concerne à política de urbanização e integração social, ele corresponde ao acúmulo de experiências
adquiridas pela máquina pública e pela sociedade civil ao longo da história da cidade do Rio de Janeiro.
Com base em entrevistas semi-estruturadas e trabalho de campo, este estudo, de cunho etnográfico, busca
compreender de que forma a população local está vivenciando essas novas intervenções e de que maneira
essa política urbana informa sobre a cidade do Rio de Janeiro como um todo.
Palavras-chave: Programa de Aceleração do Crescimento, favela, Manguinhos, urbanização, etnografia,
espaço público, política urbana.
Introdução: Favela é cidade3
A experiência do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) no Complexo
de Manguinhos constitui objeto de estudo privilegiado para a reflexão sobre o
desenvolvimento da cidade do Rio de Janeiro4. De um lado, a compreensão da história e
da realidade social da região se remete à história da cidade como um todo, às políticas e
aos projetos urbanos formulados e nela implementados. Por outro lado, as premissas
teóricas do PAC sobre a urbanização de favelas demonstram a incorporação definitiva, 1 Este trabalho começou a ser formulado no âmbito da pesquisa “Bringing the State Back into the Favelas of Rio de Janeiro: Understanding changes in community life after a disarmament and pacification process”, ainda em andamento e desenvolvida por Marcelo Burgos, Mariana Cavalcanti, Mário Brum, Mauro Amoroso, Luis Fernando Almeida Pereira e Janice Perlman. Nela trabalho como assistente de pesquisa de Mariana Cavalcanti no estudo de caso sobre Manguinhos. Desse modo, grande parte do material teórico e empírico aqui articulado se beneficia de um esforço e de uma reflexão intelectual coletiva que vêm sendo realizada desde junho de 2011. 2 Dulce Pandolfi (IBASE e CPDOC/FGV) também foi examinadora deste Trabalho de Conclusão de Curso, finalizado em dezembro de 2011. 3 Frase constantemente proferida por Hebert José de Souza, o Betinho, no âmbito de seus trabalhos realizados no Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE). 4 O termo ‘complexo’ – e a demarcação espacial correspondente a ele – foi adotado pelo PAC, embora provoque estranhamento nos moradores, os quais não se referem a Manguinhos como tal. Segundo relatos de uma moradora, que têm trajetória de liderança, essa denominação ‘Complexo de Manguinhos’ foi adotada pelo Estado, em especial pela polícia, à ocasião da ampliação e do fortalecimento das facções criminosas nas favelas, a fim de melhor identificá-‐las – e vigiá-‐las em seus pontos de venda e suas áreas de atuação.
2
pelo Estado, das idéias de integração e de participação social, ao longo de muito tempo
defendidas por setores intelectuais e por movimentos sociais.
Desse modo, esse estudo busca, por meio do PAC-Manguinhos, analisar a favela
– ou uma política para a favela – não com o objetivo de compreendê-la em si mesma,
mas com intuito de a partir dela pensar a cidade do Rio de Janeiro e seu espaço urbano.
Se a própria máquina pública produz políticas que pressupõem a integração via
urbanização e trabalho social não se trata mais de continuarmos debatendo criticamente
sobre a dicotomia cidade/favela ou asfalto/favela. Antes disso, esse trabalho se constrói
a partir da premissa de que favela é cidade, na medida em que ao estudá-la, aprendemos
mais sobre o lugar em que vivemos e sobre a sociedade que somos5.
Pela primeira vez em sua história, Manguinhos recebe investimentos e
intervenções desse vulto. Até então, a maioria das ações do Estado não passaram de
obras pontuais e limitadas. Os motivos para a região não ter sido abarcada pelo
Programa Favela-Bairro, por exemplo, criado pelo prefeito César Maia em 1993,
revelam como as especificidades locais impõem uma série de dificuldades à ação do
Estado. Inicialmente, o programa contemplava apenas favelas de médio porte e por
Manguinhos ser um conjunto de favelas, ou seja, de grande porte, não se enquadraria.
No entanto, em sua segunda fase, o Favela-Bairro ampliou o número de
domicílios e ainda assim a região não foi beneficiada pela política6. “Segundo [Lu]
Petersen (2009) Manguinhos apresentava “problemas muito complicados”, com
bolsões de pobreza, alta densidade demográfica, o que acarretaria demolição de
5 “A denominação ‘favela’ (...) está relacionada a um determinado conjunto de características. Refere-‐se a um espaço constituído por habitações aglomeradas, em geral, ilegais, instaladas em locais com poucas vias carroçáveis e vários becos e vielas com serviços públicos precários (água, luz, esgotamento sanitário e pluvial, escola, atendimento médico, transporte, lazer). A grande maioria das construções encontra-‐se fora dos padrões estabelecidos como formais para moradias, utilizando material com características de provisoriedade, contrapondo-‐se à ‘cidade legal” (p. 45). Ver COSTA, Renato Gama-‐Rosa e FERNANDES, Tânia Maria. História de Pessoas e Lugares: memórias das comunidades de Manguinhos. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2009. 6 O Favela-‐Bairro consistiu em uma política de urbanização de favelas implementada, em duas etapas entre 1995 e 2000, durante o primeiro mandato do prefeito César Maia (1993-‐1997) e seu sucessor-‐aliado, Luis Paulo Conde (1997-‐2001). O programa contava com financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Seus objetivos de redução do déficit urbano e de integração social contribuíram de forma significativa para a consolidação do paradigma da urbanização como política adequada a ser realizada nas favelas – em oposição às políticas de remoção, largamente adotadas nas primeiras décadas do século XX e ao longo da Ditadura Militar (1964-‐1988), em especial durante o governo Carlos Lacerda (1960-‐1965) no estado da Guanabara. Para informações mais detalhadas sobre o assunto ver BURGOS, Marcelo Baumann. Dos Parques Proletários ao Favela-‐Bairro: as políticas públicas nas favelas do Rio de Janeiro. In. ALVITO, Marcos e ZALUAR, Alba (org.). Um século de favela. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2006.
3
moradias, e com o tráfico de drogas dos mais “truculentos” da cidade. [M.] Garrido
(2009) (...) acrescenta que Manguinhos exigia alternativas de engenharia muito
complexas, ressaltando a peculiaridade do solo, a extrema ocupação, inclusive em
áreas não edificantes, a necessidade de drenagem do terreno e de construção de
elevatória que conduzisse o esgoto sanitário para uma estação de tratamento, além da
necessidade de reassentamento de parte das famílias”. 7Assim, observa-se que os
desafios que estão sendo enfrentados pelo PAC não são poucos, muito menos simples.
Embora ambos os programas possuam características e objetivos distintos, eles
se situam em um longo processo de mudança no tratamento pelo Estado da questão das
favelas nas cidades brasileiras. Se ao longo da história (e em certo ponto até hoje) as
favelas foram vistas como um “problema” a ser solucionado, após muita luta e com a
redemocratização –, isto é, o resgate dos direitos políticos e civis – esses espaços (dentre
eles, muitos já consolidados) foram incorporados oficialmente nos mapas das cidades e
em suas regiões administrativas. Uma iniciativa importante nessa direção foi a
aprovação do Estatuto da Cidade em 2001, cuja regulamentação do uso da propriedade
urbana a partir da regularização fundiária e do usocapião (adotado pelo governo federal
desde 2000) garante a permanência das classes populares nas áreas por elas ocupadas8.
Em 2003, por sua vez, a criação do Ministério das Cidades representou outra grande
conquista da luta no direito pela moradia e à cidade.
Mesmo com esses inegáveis avanços no âmbito legislativo e institucional rumo
ao desenvolvimento de uma cidade mais democrática (no sentido amplo do termo),
observa-se que “a favela continuou a ser tratada por órgãos específicos (...) que
elaboravam e implementavam programas igualmente específicos”.9 Nessa direção, a
partir de um estudo etnográfico, esse trabalho tem como objetivo analisar a forma como
o PAC-Manguinhos está sendo experimentado pela população local e questionar em que
medida essa política urbana pode ser tomada como “nova”, no sentido de transformar as
condições de vida dos moradores da região, auxiliando na redução das desigualdades
sócio-espaciais tão fincadas no processo de formação da cidade do Rio de Janeiro. 7 COSTA, Renato Gama-‐Rosa e FERNANDES, Tânia Maria. História de Pessoas e Lugares: memórias das comunidades de Manguinhos. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2009. 8 “Em entrevista ao Jornal do Brasil, Ermínia Maricato afirma que o estatuto “mexe em uma questão nodal da sociedade brasileira que é o patrimonialismo”, dado o grande lucro especulativo e fundiário nas mãos de poucos, e apresenta uma das soluções para a questão habitacional nas cidades brasileiras, que seria baratear o custo da terra para torná-‐la acessível à população empobrecida”. (p. 67) Ver COSTA, Renato Gama-‐Rosa e FERNANDES, Tânia Maria. História de Pessoas e Lugares: memórias das comunidades de Manguinhos. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2009 9 Idem.
4
Em outras palavras, busca-se relativizar as premissas e o discurso oficial da
participação cidadã e da integração social contrapondo-os à forma como a política vem
de fato sendo implementada e de que maneira os indivíduos estão a vivenciando. O
paradoxo entre o esforço, cada vez maior, de planejar uma cidade integrada e a
continuidade na produção de políticas públicas diferenciadas para a favela e para a
cidade (como se fosse possível separá-las) emerge como a questão de pano de fundo
deste trabalho.
Por meio de trabalho de campo e da realização de entrevistas semi-estruturadas,
procura-se refletir até que ponto os diferentes espaços e equipamentos construídos pelo
PAC são capazes de produzir novas formas de interação no espaço público da favela.
Embora ainda seja cedo para constatar impactos mais duradouros na região, já é
possível observar que as obras realizadas no antigo terreno do Departamento de
Suprimentos do Exército (DSUP) configuram um novo espaço público da favela,
destituindo-o da lógica de domínio territorializante do tráfico (suas sociabilidades e
violência, nos momentos de incursões policiais).
No entanto, seus equipamentos ainda são pouco divulgados e utilizados pela
população local, de modo em que seus efeitos sobre o espaço da favela permanecem
restritos à área na qual estão fixados. No que concerne às intervenções mais pontuais –
como construção de praças, quadras, “parquinhos” – espalhadas pelas diferentes áreas
de Manguinhos, verifica-se um processo inverso, cujas intervenções realizadas são
reapropriadas pelo tráfico e depredadas devido ao uso voltado para o consumo de
drogas, dentre outros. As intervenções urbanísticas e sociais realizadas pelo Estado
esbarram, portanto, na questão do controle territorial da região por uma facção
criminosa. E, assim, a área do DSUP se assemelha a uma “bolha” isolada, do resto de
Manguinhos, não havendo integração entre esse espaço e os demais da favela.
Em primeiro lugar, uma contextualização de Manguinhos é feita a partir de suas
condições sócio-econômicas e de seu processo de formação, articulados às ações do
Estado empreendidas na cidade. Em seguida, apresentam-se algumas premissas teóricas
do PAC, em especial, naquilo que concerne à urbanização de favelas. Dando
prosseguimento, com base em material de mídias tradicionais e alternativas, e em
pesquisas já realizadas sobre o assunto, procura-se recapitular o processo de negociação
entre lideranças e militantes locais e as diferentes instâncias do governo em torno do
PAC. E, enfim, toma-se a “fala” dos moradores da região para saber sobre suas opiniões
e expectativas em relação ao impacto dessa política em suas vidas.
5
1. Manguinhos e sua história na cidade: a precariedade enquanto reflexo da
presença-ausente do Estado.10
“Como território em disputa, Manguinhos vive a eterna busca de sua vocação e suas
funções na cidade ao longo da história, que passam do lixão ao bairro industrial e área de
transição para alocação de removidos”11.
1.1 Conjuntura sócio-econômica atual
A região de Manguinhos, localizada no subúrbio carioca, constitui-se por um
conjunto de 11 comunidades12 que juntas, somam uma população em torno de 53 mil
habitantes. Em 1988, Manguinhos tornou-se um bairro oficial da cidade. Sua área é
delimitada pela Rua Leopoldo Bulhões, Avenida dos Democráticos, Linha Amarela,
pelo rio Faria Timbó e o rio Jacaré, pelo Canal do Cunha e pelo campus da Fundação
Oswaldo Cruz (FIOCRUZ). Esses rios são hoje verdadeiras valas de esgoto e fonte de
contaminação de doenças de toda sorte, contribuindo para que Manguinhos ocupe o
lugar de segunda região mais poluída do Rio de Janeiro. Originalmente, essa área
correspondia a um extenso manguezal, beirando a Baía de Guanabara, que foi ao longo
do seu processo de ocupação sendo aterrado13.
Essa especificidade de seu terreno de várzea, somada à precariedade das
condições de vida da população local, até hoje, se apresenta como um problema
recorrente na vida dos moradores, devido à grande freqüência de rachaduras nas
estruturas das casas, infiltrações e inundações. Manguinhos possui o 5º pior Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH)14 e ocupa a 150ª posição num total de 158 bairros
10 As informações que compõem essa seção foram extraídas em grande parte de COSTA, Renato Gama-‐Rosa e FERNANDES, Tânia Maria. História de Pessoas e Lugares: memórias das comunidades de Manguinhos. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2009. E artigo dos mesmos autores, Comunidades de Manguinhos: imagens da história de favelas. (projeto da pesquisa disponível em http://www.conhecendomanguinhos.fiocruz.br/). 11 Idem. 12 Nessa pesquisa, seguindo a escolha feita por COSTA e FERNANDES (2009), o universo social trabalhado engloba 12 comunidades, tendo em vista a incorporação de Vila União, devido sua proximidade espacial e sócio-‐cultural em relação a Manguinhos, além de também estar incluída nas obras do PAC. Oficialmente, entretanto, essa área pertence à Benfica. 13 Aterramento este que foi decorrente, em grande medida, de lixo e materiais de fontes diversas. 14 Ver TRINDADE, Cláudia Peçanha. O Programa de Aceleração do Crescimento: Infraestrutura/Urbanização de Favelas. Rio de Janeiro, 2007. O IDH foi criado em 1990, pelos economistas Amartya Sen e Mahbub ul Haq e é utilizado para medir o grau de desenvolvimento humano
6
contabilizados pelo Índice de Desenvolvimento Social (IDS)15. Segundo o Censo 2010,
10,83% dos seus domicílios não possuem coleta de lixo – sendo este o pior índice do
Rio de Janeiro; 6,28% das pessoas com 5 ou mais anos são analfabetos – 6º pior índice;
34% da população com 10 anos ou mais viviam com até um salário mínimo; e a renda
média mensal corresponde a R$ 424,26 – 5º pior da cidade16.
Além disso, Manguinhos (junto ao Jacarezinho) é conhecido como um dos
redutos mais antigos e fortalecidos do Comando Vermelho, facção criminosa de tráfico
de drogas que mantém a população local sob seu julgo e leis próprias. Não por acaso, a
mídia se refere, muitas vezes, à região como “Faixa de Gaza”.
1.2 Projetos urbanos e políticas públicas para a região
Tendo em vista esse quadro alarmante de condições de vida precárias e de
pobreza, as localidades de Manguinhos, embora bastante heterogêneas entre si,
apresentam como uma de suas fortes marcas a exclusão social. A conformação desses
entre os países, distinguindo-‐os entre desenvolvidos e em desenvolvimento. Esse índice, no entanto, também é utilizado em escalas menores, como no caso de diferenciar regiões dentro de uma mesma cidade. Seu cálculo, desde 2010, é feito a partir da média geométrica entre três índices: (1) expectativa de vida ao nascer, (2) índice de Educação (índice de anos médios de estudo e índice de anos esperados de escolaridade) e (3) índice de renda (Produto Interno Bruto per capta – paridade do poder de compra). Ver http://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%8Dndice_de_Desenvolvimento_Humano. 15 O IDS, inspirado no IDH, foi criado para dar conta das dimensões do urbano, revelando assim não apenas a situação sócio-‐econômica, mas também urbanística. Ao utilizar-‐se de unidades geográficas menores, o índice fornece informações mais precisas sobre as diferenças intraurbanas. Os 10 indicadores foram construídos a partir de Censo 2000, realizado pelo IBGE. São eles, “Dimensão Acesso a Saneamento Básico: (1) percentagem dos domicílios com serviço de abastecimento de água adequada – aqueles que têm canalização interna e estão ligados à rede geral; (2) percentagem dos domicílios com serviço de esgoto adequado – aqueles que estão ligados à rede geral; (3) percentagem dos domicílios com serviço adequado de coleta de lixo – aqueles que dispõem de coleta direta ou indireta de lixo; Dimensão Qualidade Habitacional: (4) número médio de banheiros por pessoa; Dimensão grau de escolaridade: (5) percentagem de analfabetismo em maiores de 15 anos; (6) percentagem dos chefes de domicílio com menos de quatro anos de estudo; (7) percentagem dos chefes de domicílio com 15 anos ou mais de estudo; Dimensão Disponibilidade de Renda: (8) rendimento médio dos chefes de domicílio em salários mínimos; (9) percentagem dos chefes de domicílio com renda até dois salários mínimos; (10) percentagem dos chefes de domicílio com rendimento igual ou superior a 10 salários mínimos. (Ver CAVALLIERI, Fernando e LOPES, Gustavo Peres. Índice de Desenvolvimento Social: Comparando as realidades microurbanas da cidade do Rio de Janeiro. In Armazém de Dados. Instituto de Urbanismo Pereira Passos, abril de 2008. (disponível em http://www.armazemdedados.rio.rj.gov.br/arquivos/2247_%EDndice%20de%20desenvolvimento%20social%20_%20ids.PDF). 16 Dados apresentados por Dulce Pandolfi (CPDOC/FGV, IBASE) na ocasião de sua palestra sobre pesquisa realizada pelo IBASE em conjunto com a Fundação Getúlio Vargas (FGV) acerca do PAC-‐Manguinhos, no I Seminário dos Estudantes de Pós-‐Graduação em Ciências Sociais do Estado do Rio de Janeiro (SEPOCS), realizado entre os dias 28 de novembro e 2 de dezembro de 2011.
7
territórios se deu por meio de uma combinação de fatores, como resultado de políticas
habitacionais de remoção implementadas na cidade e na própria favela – por motivo de
obras pontuais de urbanização ou locais de risco –, e em decorrência do deslocamento
de populações oriundas de outras favelas que sofreram com incêndios e inundações,
além dos migrantes da região Nordeste do país17. Em diversos momentos, o Estado
percebeu a região “como um espaço estratégico para o crescimento da cidade e
consolidação dos subúrbios, especialmente destinados a atividades industriais”.18
No entanto, poucas intervenções urbanísticas, políticas sociais e habitacionais
foram de fato concretizadas ali. As principais e poucas intervenções urbanísticas na
região se limitam à retificação dos rios Jacaré e Faria-Timbó, a abertura da Avenida
Leopoldo Bulhões e da Rua Carlos Chagas, o aterramento de parte da área do mangue, a
construção de alguns conjuntos habitacionais, assim como obras pontuais, em geral,
voltadas para o saneamento básico. O que, por sua vez, contribuiu para o agravamento
dos problemas das condições de vida, mediante adensamento populacional – que seguiu
uma lógica de ocupação informal, permeada por diversos conflitos e tensões entre os
moradores.
Em 1927, duas propostas semelhantes foram apresentadas para Manguinhos.
Uma se inseria no Plano de Melhoramento para o Rio de Janeiro, desenvolvido por
Alfred Agache e a outra se baseava no projeto de urbanização já formulado pela
Empresa de Melhoramentos desde 1922. “Os dois planos destacavam o crescimento das
favelas e propunham a construção de vilas operárias, incluindo Manguinhos, além da
construção de vias de acesso à cidade”.19 Sua destinação de bairro industrial era
justificada devido sua proximidade com o centro da cidade e a zona portuária. Já na
gestão do prefeito Henrique Dodsworth (1937-1945), foi apresentado, em 1943, o
projeto Park-way Faria Timbó, o qual previa a construção de vias na região com
“padrões menos retilíneos e mais adaptados às condições topográficas locais, tirando
partido da natureza”.20 No governo Carlos Lacerda (1960-1965), por sua vez, através
do Plano Doxiadis, também se previa a consolidação da região como área industrial e
residencial. 17 A inauguração gradativa da Avenida Brasil, ao longo da década de 1940, permitiu acesso facilitado à região de diversas áreas da cidade, e também contribuiu para um aumento populacional significativo. Nos anos 1950, esta passaria por obras de duplicação, ganhando a conformação atual. 18 COSTA e FERNANDES, 2009. 19 Idem. 20 Idem.
8
Embora a idéia de construção de uma zona industrial tenha perpassado diversos
governos e projetos, sua efetivação se deu muito mais pela iniciativa privada do que por
investimentos oriundos de políticas públicas. Na região instalaram-se diversas
instituições públicas e privadas, dentre elas, a própria FIOCRUZ, Empresa de Correios
e Telégrafos (ECT), Light, Abrigo Cristo Redentor, Empresa Brasileira de
Telecomunicações (Embratel), Companhia Nacional de Abastecimento (Conab),
Cooperativa Central de Produtores de Leite (CCPL), Refinaria de Petróleos de
Manguinhos S.A., Souza Cruz21, dentre outras. Nas últimas três décadas, entretanto,
com a crise econômica que abarcou a cidade do Rio de Janeiro, a intensificação do
controle territorial de facções criminosas nas favelas e a conseqüente escalada da
violência nessas áreas, muitas indústrias, empresas e fábricas foram desativadas e outras
mudaram de endereço.
Esse processo de desindustrialização modificou, ao longo do tempo, a paisagem
urbana desse subúrbio, cujos ex-galpões e fábricas, tornados ruínas industriais, foram
sendo ocupados por desabrigados ou interessados na possibilidade de ganho de moradia
legal ou indenização – uma vez que o governo abarcasse o local com alguma política
habitacional ou de urbanização22. As ditas fronteiras entre favela e asfalto passaram a
ser cada vez menos perceptíveis, na medida em que esses espaços foram sendo
incorporados ao espaço das favelas, reapropriados e reconfigurados como favelas-
fabris23.
1.3 Processos de ocupação e configuração das diferentes áreas de Manguinhos
Do contexto atual de ocupações e da expansão das favelas no espaço urbano, a
composição das áreas que hoje compõem Manguinhos remonta ao início do século XX
com a ocupação de terras públicas ou de antigas fazendas. O então Instituto Oswaldo
Cruz (IOC) também contribuiu para as primeiras ocupações de áreas contíguas a ele, por 21 Após negociação com o governo, o espaço da antiga fábrica Souza Cruz – localizada no cruzamento das Avenidas Dom Hélder Câmara e dos Democráticos – está sendo transformado na Cidade da Polícia, projeto – que estava previsto para ser concluído em Dezembro de 2011, porém, ainda em andamento – de transferência de todas as delegacias especializadas para a região. 22 Verificou-‐se esse mesmo tipo de estratégia na ocupação de locais de risco. O poder instaurado pelo tráfico, por sua vez, também facilitou esse processo de ocupações. 23 Termo cunhado por Blank, Cavalcanti e Fontes em CCPL: Favela Fabril, pesquisa ainda em desenvolvimento que aborda de forma instigante esse fenômeno relativamente recente, nessa região, das ocupações de antigos espaços fabris.
9
parte de seus funcionários que, na época, encontravam grandes dificuldades de
locomoção até a região devido às condições de transporte esparsas e precárias. Ainda
que os processos de ocupação distingam-se bastante uns dos outros, a história de
Manguinhos é permeada até hoje pela história da luta pelo direito à moradia, ou melhor,
pelo direito à cidade. Muitas de suas áreas se formaram a partir de políticas de remoção
de favelas empreendidas por diferentes governos, cujo objetivo, em geral, era a
transferência das classes populares, habitantes da área central da cidade ou da Zona Sul
para regiões mais distantes e menos valorizadas pelo mercado imobiliário – o que se
traduzia em grande parte na falta de infraestrutura e serviços básicos.
De acordo com Costa e Fernandes (2009), é possível identificar cinco momentos
marcantes na origem das diferentes áreas de Manguinhos. O primeiro corresponde à
ocupação, no início do século XX, do Parque Oswaldo Cruz (ou Morro de Amorim ou
Amorim), que se deu em uma encosta próxima à FIOCRUZ. Esse núcleo habitacional se
constituiu pela migração de outras partes da cidade, por funcionários da FIOCRUZ e
por imigrantes portugueses – “à semelhança de outros bairros do subúrbio carioca,
como a Penha e Bonsucesso”.24 Atualmente, essa área distingue-se bastante das demais
localidades de Manguinhos, assemelhando-se mais a um bairro de classe média, com
relativa infraestrutura e disponibilidade de serviços. Assim como a Vila União, o
Amorim é comandado por milícia e talvez por conta disso, abrigue sedes de empresas
de segurança privada.
O segundo momento de ocupação se deu no início da década de 1940, no Parque
Carlos Chagas, conhecido por Varginha25. A população que se formou era oriunda de
diversas outras regiões da cidade e de fora dela. Embora houvesse projeto urbanístico
proposto para essa área desde os anos 1920, este se resumiu apenas à retificação e
aterramento do litoral, modificando a configuração de manguezal. “Essa comunidade
não apresenta as características atuais comuns às favelas no que se refere ao
arruamento com becos e ruelas estreitas, devido a um processo de remoção garantida
pelos próprios moradores, que impedem a ocupação desordenada”26 – além de contar
com uma certa área verde, em geral, inexistentes em favelas estabelecidas em terrenos
planos. Segundo relatos informais, a Varginha corresponde a uma das áreas mais
“tranqüilas” de Manguinhos.
24 COSTA e FERNANDES (2009). 25 Esse nome se deu em virtude do terreno que era uma espécie de vargem que enchia muito de água. 26 COSTA e FERNANDES (2009).
10
A ocupação do Parque João Goulart, da Vila Turismo, do Conjunto Habitacional
Provisório (CHP-2) e da Vila União, no decorrer da década de 1950, marcam o terceiro
momento significativo da constituição de Manguinhos27. A partir de então, o fluxo de
ocupação da região é impulsionado pelo processo de industrialização (planejado desde
1920, mas só então alavancado com o pós-guerra) e pela abertura de importantes vias de
acesso, como a Rua Leopoldo Bulhões, a Avenida Brasil, a Rio-Bahia e a Rio-São
Paulo, que facilitaram a circulação de mercadorias e pessoas pelo espaço urbano.
O CHP-2 – hoje também reconhecido pela população local pelo nome de Coréia
– era composto por prédios que foram construídos em 1951. Entre 1972 e 1973, porém,
estes foram demolidos por ocasião de enchentes que abalaram suas estruturas, deixando-
os condenados para habitação. No momento atual, essa área constitui-se por casas de
alvenaria em geral de um ou mais andares. Já o Parque João Goulart, também com
instalações de caráter provisórias – e que em alguns casos até hoje se mantêm – possuía
barracões de tábuas corridas e telha francesa, cuja aparência assemelhava-se a vagões de
trem28.
Essa localidade se apresenta como área de risco, pois além de ser atravessada
pela adutora da Cedae, também abriga torres de eletricidade da Light29. Atualmente,
CHP-2 e João Goulart são considerados por moradores áreas “complicadas” de
Manguinhos, pois além do tráfico estar presente massivamente, com bocas durante o dia
e “feiras” de drogas à noite, ali se instalou a cracolândia – a qual alterou profundamente
as sociabilidades locais. Embora boa parte da região já tenha sido pavimentada por
obras do PAC, há ainda escombros e entulhos de casas esvaziadas, deixados na região,
que precarizaram ainda mais o ambiente30.
A Vila União, por sua vez, surgiu em 1955 com investimento do governo federal
na construção de conjuntos habitacionais destinados a funcionários da Casa da Moeda e 27 Ao final dessa década, em 1959, também foram realizadas, em Manguinhos, as obras de retificação do rio Faria-‐Timbó e a construção da Igreja São Daniel, o Profeta -‐ projeto assinado por Oscar Niemeyer. Atualmente, a Igreja está fechada ao público em situação de extrema precariedade e falta de conservação. Não se sabe por que sua reforma não foi incluída nas obras do PAC na região. 28 Essa configuração foi narrada por uma moradora antiga da região em CORREA e FERNANDES (2009). 29 Acidentes com a adutora já ocorreram e, ao final da década de 1990, parte da população local foi removida para conjuntos habitacionais construídos às margens da Leopoldo Bulhões como veremos mais a diante. 30 Alguns se tornaram “bocas” de venda de droga ou ponto para vigília do tráfico sobre o território. A demolição de casas sem a intervenção de obras urbanísticas logo em seguida produz um efeito perverso às ações do Estado na favela, na medida em que desconfigura espaços de sociabilidade locais, deixando espaços vazios e de ruínas propícios às atividades do tráfico ou de usuários de drogas. Esse cenário, por sua vez, torna o ambiente ainda mais precário e violento. Essa situação é discutida em maior profundidade nas seções posteriores deste estudo.
11
aos ex-combatentes da Segunda Guerra Mundial. Oficialmente, essa área pertence à
Benfica, mas seu contexto sócio-espacial está atrelado mais a Manguinhos, haja vista
sua inclusão nas intervenções do PAC. Diferentemente do restante de Manguinhos, seus
prédios possuem estruturas boas e seus apartamentos são espaçosos e bem divididos,
tendo de 2 a 3 quartos, com sala, banheiro, cozinha e área de serviço. Os moradores
também possuem toda a documentação de suas moradias regularizadas. Esses fatores
fazem com que o local se assemelhe mais a um bairro formal de classe média, classe
média baixa. No entanto, em seu entorno, casas irregulares foram construídas e ali
também exercem poder sobre o território, grupos paramilitares.
O quarto e quinto momentos de ocupação, enfim, se deram nas décadas de 1990
e nos anos 2000 respectivamente. A Prefeitura, em parceria com o governo do estado,
construiu os conjuntos habitacionais Nelson Mandela e Samora Machel às margens da
Leopoldo Bulhões, com financiamento do Banco Internacional para a Reconstrução e
Desenvolvimento (BIRD).31 “O terreno foi adquirido pela prefeitura em permuta com a
Embratel”32. A transferência dos moradores para o conjunto teve que ser feita antes da
conclusão completa das obras devido à ameaça de invasão do terreno por outras
pessoas, vítimas das enchentes de 1988 e do incêndio que ocorreu no Parque João
Goulart em 1989. Em 1995, outra parte desse terreno da Embratel foi ocupado
ilegalmente, dando origem à Mandela de Pedra, uma das áreas mais precárias de
Manguinhos e em processo de remoção atualmente33. Em 2001, outra área denominada
Samora II se formou, e, no ano seguinte, surgiu Vitória de Manguinhos, resultante da
invasão dos galpões abandonados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).
A atuação do tráfico em Mandela é bastante ostensiva e há incursões policiais
com uma certa freqüência na região. Por ter sido uma área planejada urbanisticamente,
as casas possuem boa estrutura e as ruas são todas pavimentadas, com a existência de
comércio e espaços públicos, como praças. No entanto, no decorrer dos anos, verificou-
se um processo de verticalização, assim como de ampliação das casas, os chamados
“puxadinhos”, o que propiciou o estrangulamento do sistema de esgotamento sanitário,
dentre outros problemas de infraestrutura.
31 Instituição pertencente ao Banco Mundial. 32 COSTA e FERNANDES (2009). 33 Nesse mesmo ano, “em função da desocupação dos barracões no Parque Carlos Chagas, onde viviam famílias vítimas do incêndio de 1989, surgiu uma pequena área denominada Greenville”. (Idem). A disposição espacial da área, com um único local de entrada, faz com que o tráfico não atue ali, pois não há pontos de fuga, no caso de operações policiais. O que torna a região mais tranqüila do que suas imediações.
12
Assim, não é possível compreender a história de Manguinhos sem refletir sobre
a própria história da cidade do Rio de Janeiro e das ações do Estado nela empreendidas.
Se, de um lado, a falta de concretização dos planos e projetos criados para a região (leia-
se investimentos públicos), ou melhor, a aparente ausência e negligência do Estado
contribuíram para seu crescimento desordenado e para sua precária infraestrutura; por
outro, foi a partir de determinadas concepções de cidade e de políticas urbanas
implementadas pelo Estado, ou seja, através da presença ativa do Estado, que
Manguinhos se constituiu como “depósito de gente” 34 – de pessoas que não deveriam
permanecer em seus locais de origem, mas que não por acaso lá poderiam se instalar.
Nesse sentido, a construção de conjuntos habitacionais provisórios que se
tornaram permanentes, assim como as ações constantes de remoções internas – de áreas
de risco ou contempladas por obras pontuais – apontam a provisoriedade como uma
característica ou traço permanente na história de Manguinhos. Provisoriedade esta que
contribui apenas e ainda mais para a precarização da vida de pessoas que se vêem, a
todo o momento, desafiadas pela ação do Estado a reformular suas trajetórias
(subjetivas e materiais) em outro lugar35. Com o anúncio do PAC em 2007, Manguinhos
vive, desde então, um momento de reformulação, recebendo um alto investimento com
obras de grande vulto que vão desde a urbanização da região, com pavimentação,
esgotamento sanitário e vias de transporte até a construção de equipamentos públicos e
de conjuntos habitacionais. As obras geram impactos positivos e negativos na vida da
população local o que acarreta em opiniões e expectativas diversas em relação ao
andamento do programa. Dependendo da forma como este seja conduzido, da sua
continuidade e da cooperação entre as instâncias federativas, mudanças significativas
podem ocorrer na condição de vida local.
Essa possibilidade, no entanto, esbarra em uma série de entraves e conflitos
difíceis de serem superados, como no caso do forte poder do tráfico de drogas sobre o
território e a população, e a extrema pulverização das lideranças locais, que além de
estarem envolvidas em diferentes alianças políticas com partidos e políticos
profissionais, são comandadas pelos “chefes” do tráfico. Desse modo, a participação da 34 Expressão cunhada por um morador da região, o qual entrevistei. 35 É importante ressaltar que esse desafio na maioria das vezes se apresenta em forma de ameaça a um mínimo de estabilidade adquirido através de muito esforço, mas, em muitos casos, também aparece como possibilidade de melhora de vida, pela aquisição de moradia ou recebimento de indenização, tal qual já mencionado. E, em outros, observa-‐se ainda a formação de um mercado imobiliário informal, constituído na medida em que determinada área é contemplada por políticas habitacionais.
13
população na implementação e na fiscalização do PAC é esvaziada, em parte, devido à
falta de demandas locais que tenham sido coletivamente formuladas.
2. As premissas do PAC como política de desenvolvimento e de urbanização de
favelas36
O Programa de Aceleração do Crescimento, lançado em 2007, pelo governo do
Presidente da República Luis Inácio Lula da Silva, enquanto um programa de
desenvolvimento, busca além de promover a aceleração do crescimento econômico
(como o próprio nome já diz), o aumento do emprego e a melhoria das condições de
vida dos brasileiros. Suas medidas destinam-se a incentivar o investimento privado,
aumentar o investimento público em infra-estrutura e remover obstáculos –
burocráticos, administrativos, normativos, jurídicos e legislativos – ao crescimento37.
Dentre suas premissas, a expansão de investimento em infra-estrutura se
apresenta como condição para: a aceleração do desenvolvimento sustentável com a
eliminação dos gargalos para o crescimento da economia; o aumento da produtividade e
a superação dos desequilíbrios regionais e das desigualdades sociais.
Seus projetos de infra-estrutura atuam em três eixos distintos: logístico,
energético e social e urbano. Os critérios de seleção para os projetos correspondem ao
forte potencial para gerar retorno econômico e social, à recuperação de infra-estrutura
existente e à conclusão de projetos em andamento. Os principais atores envolvidos no
processo são a Casa Civil e a Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da
República como coordenadoras centrais; o Ministério das Cidades como gestor; a Caixa
Econômica Federal e o BNDES como agente operador e financeiro; os estados e
municípios como proponentes e agentes executores38.
Tendo em vista os aspectos mais gerais do PAC, para os propósitos desta
pesquisa, faz-se necessária uma descrição mais detalhada das premissas teóricas
governamentais voltadas para o eixo social e urbano, mais especificamente, naquilo que
se refere ao processo de urbanização de favelas, isto é, de intervenção em assentamos
36 Essa seção se baseia, sobretudo, na publicação Urbanização de Favelas: a experiência do PAC – Ministério das Cidades, Secretaria Nacional de Habitação – Brasília, 2010 e na apresentação PAC: programa de Aceleração do Crescimento 2007-‐2010 – Brasília, 2007 (ambos disponíveis para download em www.cidades.gov.br). 37 Ver PAC: programa de Aceleração do Crescimento 2007-‐2010 – Brasília, 2007 (www.cidades.gov.br) 38 Ver Urbanização de Favelas: a experiência do PAC – Ministério das Cidades, Secretaria Nacional de Habitação – Brasília, 2010 (www.cidades.gov.br).
14
precários39. O conceito dessa intervenção se sustenta em cinco pilares. Primeiramente, a
(1) integração urbana diz respeito à preocupação de se superar as condições de
precariedade por meio da incorporação dessas áreas à cidade formal, dotando-as de
infra-estrutura básica, com construção de equipamentos e serviços públicos. Em
seguida, a (2) moradia digna volta-se para o desadensamento e o reordenamento da
ocupação, implicando no remanejamento ou no reassentamento da população para
outros locais40. Além da participação contínua dos envolvidos no processo, o governo
deve esforçar-se para que o local de reassentamento seja próximo ao de origem. O
governo deve atentar, também, para prováveis indenizações das famílias ou para a
necessidade de produzir unidades habitacionais de uso misto – residência e comércio –
para que não haja diminuição das condições de sobrevivência das famílias. A aquisição
de imóveis usados para recuperação ou modificação de uso pode ser uma alternativa
mais econômica à construção de novas unidades41.
Já o terceiro aspecto da intervenção, (3) a regularidade fundiária, se aplica a
partir de duas ações, a identificação e comprovação da titularidade e a garantia dos lotes
gerados. “O objetivo final da regularização é fazer com que as unidades habitacionais
ou lotes decorrentes da intervenção, reflitam compromisso de constituição de direito
real sobre o imóvel em favor das famílias beneficiadas”42. A fim de garantir esse direito
a regularização inclui dois procedimentos indispensáveis: a regularização patrimonial,
por meio da qual assegura-se juridicamente a posse ou propriedade pelo registro no
Cartório de Registro de Imóveis (CRI); e a regularização urbanística mediante a
adequação à legislação urbana – podendo exigir inclusão do assentamento em Zonas de
Especial Interesse Social (ZEIS) por lei municipal. A Lei nº 11.977 de 2009 representa,
dessa forma, importantes avanços na regularização fundiária, na medida em que busca
conferir maior agilidade e efetividade aos processos, sobretudo, àqueles que estão
39 “A precariedade caracteriza-‐se por vários aspectos: pela irregularidade fundiária e/ou urbanística; pela deficiência da infra-‐estrutura; pela ocupação de áreas sujeitas a alagamentos, deslizamentos ou outros tipos de risco, pelos altos níveis de densidade dos assentamentos e das edificações combinados à precariedade construtiva das unidades habitacionais; pelas enormes distâncias percorridas entre a moradia e o trabalho associadas a sistemas de transportes insuficientes, caros e com alto nível de desconforto e insegurança; além da insuficiência dos serviços públicos em geral, principalmente os de saneamento, educação e saúde”. Idem. 40 Idem. 41 Nos casos em que as famílias permanecem na moradia, as melhorias habitacionais apresentam-‐se como uma forma de se aproveitar os investimentos já realizados pelos moradores. As questões no caso de permanência se deslocam para a resolução da insalubridade, insegurança, padrão mínimo de edificação e quantidade de cômodos. Idem. 42 Idem.
15
circunscritos no interesse social. Além disso, essa lei confere maior autonomia às
prefeituras nos casos de licenciamento urbanístico e ambiental43.
A (4) inclusão social é realizada por meio do trabalho social que também se
constitui por duas frentes: mediações sociais que assegurem a participação da população
local e suas associações e o desenvolvimento sócio-econômico propiciado por ações
educativas e pela qualificação profissional44. Para que isto ocorra é preciso buscar a
articulação com outros programas governamentais, como os do Ministério da Cultura.
“A integração das intervenções físicas com o trabalho social e a efetivação da
regularização fundiária são condições essenciais para a sustentabilidade das
intervenções de urbanização”45. Por fim, (5) o componente ambiental tem como
objetivo mitigar os impactos ambientais das obras, realocar as famílias de áreas de risco,
recuperar as áreas desocupadas e criar programas de educação ambiental – como parte
das funções do trabalho social. Para que tais ações ocorram, a participação de órgãos de
controle ambiental no processo de fiscalização das obras e do programa mostra-se
fundamental.
Os investimentos para a urbanização de favelas do PAC foram
proporcionalmente distribuídos à dimensão da precariedade habitacional em cada região
do país. O que difere os recursos do PAC de outros investimentos precedentes em
projetos de intervenção em favelas, como no caso do Programa Favela-Bairro, é o fato
de originarem do Tesouro Público, não necessitando de empréstimos privados ou de
organismos internacionais e evitando, assim, a geração de dívidas46. Além dos recursos
da União, as contrapartidas estaduais e municipais compõem os investimentos.
“Atualmente encontram-se alocados R$ 21, 4 bilhões em intervenções em favelas com
43 Idem. 44 No caso do Trabalho Social do PAC-‐Manguinhos, a essas duas dimensões incorpora-‐se uma terceira, de elaboração de um “retrato” das comunidades envolvidas, com cadastro dos moradores residentes da área, suas necessidades, deficiências e problemas retratados, isto é, um Censo Domiciliar e Empresarial. (Ver PAC Social – Plano de Ocupação Social nas favelas, Escritório de Gerenciamento de Projetos do Governo (EGP-‐Rio) e Secretaria Estadual de Assistência Social e Direitos Humanos – apresentação Fórum da Cidadania – IBASE – 11/05/2009). 45 “Item obrigatório [o trabalho social] nos projetos habitacionais geridos pelo Ministério das Cidades, visa promover a autonomia, o protagonismo social e o desenvolvimento da população beneficiária, por meio de ações de participação, mobilização e organização comunitária, educação sanitária e ambiental e atividades ou ações de geração de trabalho e renda destinadas à população diretamente beneficiada”. Ver Urbanização de Favelas: a experiência do PAC – Ministério das Cidades, Secretaria Nacional de Habitação – Brasília, 2010 46 Ver TRINDADE, Cláudia Peçanha. O Programa de Aceleração do Crescimento: Infraestrutura/Urbanização de Favelas. Rio de Janeiro, 2007.
16
recursos do PAC em 785 contratos (...). Esses recursos irão proporcionar a melhoria
das condições de habitabilidade de mais de 1,8 milhão de pessoas”47.
3. Processo de implementação e negociação do PAC-Manguinhos entre o governo
e as lideranças locais.
O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) foi lançado em janeiro de
2007 pelo governo federal “como proposta de retomada de investimento público”48 a
partir de investimentos federais, estaduais e municipais em grandes obras de
infraestrutura. Dos 3,9 bilhões investidos no estado do Rio de Janeiro, 860 milhões
seriam destinados à urbanização das favelas do Complexo do Alemão, Manguinhos,
Rocinha, Cantagalo e Pavão-Pavãozinho – o chamado PAC-Favelas 49. Em março de
2008, Lula e o governador do estado Sérgio Cabral visitaram as referidas comunidades
para assinatura de ordem para o início das obras.
No mês seguinte, o PAC-Manguinhos começou sob responsabilidade do
consórcio formado pelas empreiteiras Andrade Gutierrez (60%), EIT (20%) e Camter
(20%)50. Sendo a instância estadual e a municipal as executoras do projeto, aquela ficou
responsável pelas “grandes obras de eixo viário, elevação da linha férrea, construção
do maior número de equipamentos sociais e unidades habitacionais”, enquanto esta se
encarregou das “principais intervenções nas partes internas das localidades com obras
de saneamento básico, construção de creches e postos de saúde da Família”51. As
propostas apresentadas para a região correspondem à instalação de sistema de
esgotamento sanitário; sistema de abastecimento de água potável; instalações
hidrosanitárias/ 350 unidades; contenção e proteções de canais; drenagem de águas
fluviais; recuperação ambiental; terraplanagem e pavimentação do sistema viário;
iluminação pública; elevação da via férrea de passageiro e carga52; estação intermodal;
47 Ver PAC: programa de Aceleração do Crescimento 2007-‐2010 – Brasília, 2007 (www.cidades.gov.br). 48 Ver TRINDADE, 2007. 49 Dados extraídos da apresentação da pesquisa sobre o PAC-‐Manguinhos realizada pelo IBASE em 2009. (http://www.youtube.com/watch?v=owZ7x7ypMoY&feature=related). 50 Ver Eduardo Sá. Uma visão do PAC Em Manguinhos (http://pig2010.blogspot.com/2010/02/uma-‐visao-‐do-‐pac-‐em-‐manguinhos.html). 51 Ver TRINDADE, 2007. 52 Essa obra é motivo de grande polêmica entre os moradores não apenas pela sua centralidade no projeto, em termos de custeio e esforços, como também por não a elegerem de suma importância, quando comparada à urgência por moradia adequada e por obras de saneamento.
17
implantação do parque linear urbano; construção de 1774 unidades habitacionais53;
aquisição de 75 unidades habitacionais; alojamentos provisórios; regularização
fundiária; uma escola de ensino médio, creches, biblioteca e centro de referência da
juventude54.
No que concerne às 14 comunidades contempladas pelo projeto, nem todas
pertencem à delimitação do bairro ou do Complexo de Manguinhos, mas mesmo assim
foram incluídas devido à proximidade e às condições igualmente precárias. São elas,
CCPL e Favela Vila Vitória (Chupa-Cabras); e as que compõem Manguinhos são,
Favela Comunidade Agrícola de Higienópolis, Favela Vila São Pedro, Favela Parque
Oswaldo Cruz (Morro do Amorim), Favela Vila Turismo, Favela Vila União, Conjunto
Habitacional Provisório 2 (CHP-2), Favela Parque João Goulart, Favela Parque Carlos
Chagas (Varginha), Conjunto Nelson Mandela (Mandela 1), Conjunto Samora Machel
(Mandela 2), Favela Mandela de Pedra (Mandela 3), Favela Embratel (Nova Mandela/
Samora II) e Vitória de Manguinhos (CONAB)55. O valor total estipulado ao PAC-
Manguinhos era de R$ 328,3 milhões56. Essas obras de infraestrutura estariam aliadas a
estratégias de desenvolvimento sustentável da região a partir de um Trabalho Social
realizado pelo poder público e as lideranças locais.
Nos anos de 2008, 2009 e 2010, a partir de artigos, pesquisas qualitativas e
quantitativas realizadas, matérias de jornais, revistas e informações disponibilizadas nos
sites do Laboratório Territorial de Manguinhos e do Fórum da Cidadania, observou-se
intenso debate entre a sociedade civil, lideranças comunitárias de Manguinhos e órgãos
públicos quanto ao andamento das obras do PAC. A falta de informação
disponibilizada, a inexistência de um projeto executivo – daí a dificuldade e
discordância entre os números divulgados – e a necessidade da participação da
população local no processo de decisão, implementação e fiscalização do projeto deram
a tônica das discussões. 53 Este número foi obtido após muita luta do movimento social de Manguinhos, como aponta Patrícia Evangelista, ex-‐secretária executiva do Fórum do Movimento Social de Manguinhos. De acordo com Cláudia Trindade, o número de unidades habitacionais divulgados variou de 546 em outubro de 2007 a 1944 em junho de 2008. No que diz respeito ao tamanho, foi apresentada uma casa-‐modelo de 72m² construída na entrada do conjunto, posteriormente, demolida. Em seguida, diferentemente dos 42m² anunciados para os apartamentos, constatou-‐se que estes medem 37m². 54 IBASE, 2009. 55 Segundo relatos informais, a CONAB entrou e saiu do calendário de obras inúmeras vezes, de modo em que até hoje os moradores desconhecem o que ficou definido para o local, que seria todo reassentado para dar lugar a um viaduto. 56 Em fevereiro de 2009 esse valor foi atualizado para R$ 368 milhões (TRINDADE, 2007).
18
Em janeiro de 2008, movimentos sociais de Manguinhos apresentaram a
Proposta de Regimento Interno do Comitê de Acompanhamento do PAC-Manguinhos.
Neste documento, propuseram que o Comitê fosse composto por representantes das
secretarias estaduais, municipais e federais; das Associações de Moradores, dos poderes
legislativos municipal e estadual, de órgãos técnicos especializados (Conselho Regional
de Engenharia e Arquitetura; Fundação Oswaldo Cruz e das Universidades Estadual e
Federal do Rio de Janeiro – UERJ e UFRJ) e do Ministério Público e da Defensoria
Pública do Estado do Rio de Janeiro57. Outro projeto que surgiu em abril, com intuito
de criar mais um canal de participação da população local no processo de urbanização,
foi o PAC das favelas: documentação fotográfica e memória territorial. Em parceria
com profissionais do projeto Imagens do Povo na Maré, organizado pelo Observatório
das Favelas, o projeto visava construir uma memória social do PAC 58.
Neste mesmo ano (2008), artigo escrito por pesquisadores da FIOCRUZ apontou
o PAC-Manguinhos como uma promessa e como esperança para a região na medida em
que sua mobilização “não está dissociada da luta por redução de violências no local,
[sendo] mais uma frente de luta conjunta pela restituição do estado de direito em
Manguinhos, que não está restrita apenas à violência provocada pelo crime ou pela
repressão ao tráfico de drogas, mas para todas as formas de violências que destituem a
população de seus direitos de cidadania, por exemplo, a falta de moradia, educação,
trabalho e mesmo a forma como as instituições de segurança pública tratam a
57 Dentre as atribuições do Comitê estavam: “contribuir com a fiscalização de todo o processo de contratação de mão-‐de-‐obra (...) de forma a avaliar os critérios a serem utilizados, (...) zelar pela aplicação da legislação trabalhista vigente e pela qualificação funcional e cidadã dos trabalhadores. Contribuir com a fiscalização de todo o processo de compra e contratação (e subcontratação) de produtos e serviços (terceirização), zelando pela qualidade dos mesmos, mas também sempre que possível, e eficiente, propugnando pela contratação de produtos e serviços disponíveis nos bairros de Manguinhos e/ou em seu entorno (...). Propor melhorias (modificações no Projeto e em seu detalhamento, nos editais e nos processos de licitação e contratação de produtos e serviços para atender às demandas sócio-‐comunitárias e promover o Desenvolvimento Local Equitativo... Participar (...) da realização de todas as etapas de Estudos de Impacto Social e Ambiental e Licenciamento Ambiental, de forma retroativa inclusive ao Licenciamento já concedido (revisão deste). Fiscalizar, avaliar e encaminhar, aos órgãos competentes, denúncias de irregularidades na execução do PAC-‐Manguinhos... (Ver documento na íntegra em www.conhecendomanguinhos.fiocruz.br). 58 De acordo com o projeto, os jovens locais, após receberem curso de fotografia, produziriam “painéis dos impactos e resultados das obras de urbanização previstas nas comunidades selecionadas, colhendo vivências e percepções de seus moradores ao longo de todo o processo”. Às imagens seriam acrescentados registros orais para a montagem de um banco de dados disponibilizado em site interativo, com objetivo de fortalecer “relações de pertencimento com o bem público”. No entanto, atualmente, não há nem imagens, nem depoimentos no site do projeto, ainda que tenha sido publicada uma versão impressa com as fotos. Ver http://www.memoriasdopac.org.br/.
19
população local”59. Por outro lado, alguns aspectos do projeto davam razões para gerar
uma série de desconfianças. A primeira delas, de que o PAC se resumisse a uma política
de segurança pública. Uma segunda apreensão concerne à elevação da via férrea, como
a obra mais cara dos investimentos, diante de uma situação de necessidades urgentes na
área de habitação e saneamento. Outro fator de desconfiança refere-se à falta de
informações sobre as reais ações em Manguinhos e das remoções decorrentes de obras,
como a abertura de via que ligue a Leopoldo Bulhões à Avenida Brasil60.
As ambigüidades em torno das obras do PAC permaneceram ao longo do ano.
Em discurso por ocasião do Fórum da Cidadania, em novembro de 2008, Patrícia
Evangelista, então secretária executiva do Fórum do Movimento Social de Manguinhos,
denunciou o descumprimento do poder público ao Estatuto da Cidade, fundamentado
em especial pela “(1) garantia do direito às cidades sustentáveis (direito á terra
urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, a infraestrutura urbana, ao transporte e
aos serviços públicos); e pela (2) gestão democrática por meio da participação da
população na formulação e na execução de projetos de desenvolvimento urbano”61. De
acordo com ela, até então, a prefeitura e o governo do estado não haviam criado canais
de participação local, sendo o diálogo quase inexistente, o que já se evidenciava pela má
execução de obras devido ao desconhecimento dos problemas locais. A rede de esgotos,
por exemplo, está sendo conectada com a rede de água pluvial, que é despejada nos rios
da Baía de Guanabara. Haveria a necessidade de maior integração entre as políticas do
PAC e do Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG)62.
Outra crítica proferida voltou-se à extensiva utilização de indenizações como
política habitacional, o que “não garante o direito à moradia digna destas pessoas,
59 Ver PIVETTA, Fátima e PORTO, Marcelo Firpo. PAC-‐MANGUINHOS: Como promessa, como desconfiança, como esperança. (texto escrito como contribuição ao GTPAC/ENSP-‐FIOCRUZ, 2008). 60 No local vivem 3 mil famílias e foi dito que apenas 1936 famílias seriam realocadas. Dessa forma os autores questionam: “Todas as famílias em áreas de risco serão realocadas? Esta política de “melhoria” no sistema viário, ligando as duas ruas citadas acima, vai melhorar em quê a qualidade de vida da população do Município do Rio de Janeiro, já que este trecho quase não é utilizado por ter fama de “Faixa de Gaza”? A abertura das vias será feita então para facilitar as operações policiais nesta área por conta dos agentes do Estado?”. 61 http://www.pactopelacidadania.org.br/ 62 Segundo Marcelo Salles, em matéria publicada, em 2009, na Revista Caros Amigos sobre o PAC-‐Manguinhos, “a principal crítica dos moradores foi a instalação dos esgotos, que reaproveitou o sistema de água construído pelos moradores na formação da comunidade: vai tudo para o mesmo lugar... Quando chove, disseram, que continua entupindo tudo. Moradores que trabalham em obras apontaram inadequações no projeto, como a utilização de canos pequenos, o que deverá apenas postergar os problemas”.
20
incentivando a reprodução de formas irregulares de ocupação do solo urbano para fins
de moradia, mas também a especulação imobiliária”. Esse quadro de pouca
participação e imposição de projeto caracterizou a ação do poder público mediante a
população e as lideranças de Manguinhos, na medida em que o governo do estado se
eximiu de instituir o Comitê de Acompanhamento do PAC-Manguinhos (7 meses
passada sua proposição)63. O governo utilizou-se de uma “norma infra-legal para
recuar de uma proposta que encontra amparo no Estatuto das Cidades”. Além de se
desobrigar a instituir o Comitê, o governo também não apresentou nenhuma outra
proposta, “restringindo a participação ao acompanhamento indireto, via ‘trabalho
social’”.
Reivindicações semelhantes são encontradas no Dossiê-Manifesto de 11 meses
do PAC Manguinhos pelo respeito ao princípio da Gestão Democrática do Estatuto da
Cidade, realizado pelo Fórum Social de Manguinhos e outras organizações em 3 de
fevereiro de 200964. O documento denuncia a inconstitucionalidade do Trabalho Social
como mediador da relação entre poder público e sociedade civil, que se pressupõe que
deva ser direta. Essa mediação é realizada por “agentes privados, diretamente
interessados nos resultados do processo (‘redução de custos), contratados, sem
legitimação social, pelo Consórcio de empreiteiras responsável pelas intervenções de
engenharia, sem um mínimo de articulação e integração intersetorial e
intergovernamental”. Além do déficit de informação do processo, o Trabalho Social
também contratou ‘lideranças’ sem reconhecer seu protagonismo e tampouco ofereceu
qualificação adequada aos trabalhadores da região para atender às demandas por
profissionais nas obras e nos demais postos de trabalho gerados pelos investimentos; a
contratação de profissionais residentes de Manguinhos também não estava sendo
priorizada tal como acordado65.
Outras críticas mais pontuais, mas não menos significativas, dizem respeito ao
atraso na divulgação dos resultados do Censo Manguinhos. Mesmo sem saber como o
Censo iria atuar, as negociações em torno do desalojamento das famílias já estavam
sendo feitas. No processo de remoção já em curso, o documento afirma que, duas 63 Essa proposta redigida pelo Fórum veio em resposta à sugestão do próprio vice-‐governador em 4 de agosto de 2007, na Quadra da Escola de Samba Unidos de Manguinhos, quando prometeu a implantação imediata de um Conselho de Acompanhamento do PAC-‐Manguinhos. 64 Ver documento na íntegra em http://www.anf.org.br/2009/02/dossie-‐manifesto-‐de-‐11-‐meses-‐do-‐pac-‐manguinhos/. 65 Idem.
21
dezenas das famílias que moravam nas imediações das adutoras da Companhia Estadual
de Águas e Esgotos (Cedae), no CHP-2, “foram expulsas de suas moradias sob a
ameaça de três ‘Caveirões’ (veículo blindado de uso militar da PM), coagidas a aceitar
uma ‘indenização’ pela Cedae”. Na comunidade de Nova Mandela, também há relatos
de que um novo documento invalidando um anterior induz no processo de
reassentamento à opção pela indenização coercitivamente. O dossiê sugere que seja
priorizada a política de compra assistida com reassentamento (regularização fundiária)
em detrimento das indenizações, que devem ser apenas aplicadas quando o sujeito de
direito manifestar interesse66.
De um modo geral, as negociações das obras polarizaram-se entre a Secretaria
de Obras do Governo do Estado do Rio de Janeiro e o Fórum do Movimento Social para
o Desenvolvimento Equitativo e Sustentável de Manguinhos (FMDES)67. Apesar da
Secretaria Municipal de Habitação demonstrar interesse pelo Trabalho Social em sua
apresentação sobre o PAC-Manguinhos68, Cláudia Trindade aponta que a ação da
prefeitura caracterizou-se pelo seu silêncio tanto em relação aos moradores quanto ao
governo do estado e a Caixa Econômica no detalhamento de informações69.
A criação do Comitê de Acompanhamento das Obras se deu, finalmente, como
fruto das negociações entre o Fórum e a Secretaria Estadual de Obras70. Para muitos
moradores, porém, ele serve apenas como instrumento de cooptação, chapa branca71. Já
66 Diversas outras reclamações são feitas, como no caso da política educacional do PAC, cujos investimentos não contribuirão para resolver os principais problemas da localidade: o restrito número de vagas para o ensino fundamental e educação infantil (em quantidade e em qualidade). Sem essas melhorias, o Fórum questiona, de que forma os jovens chegarão à Luiz Carlos da Vila – escola de Ensino Médio construída pelo PAC. 67 Constituído em maio de 2007. 68 Nesta apresentação a secretaria estabelece para o trabalho social, “Criar comissões de acompanhamento de obras e conselhos comunitários representativos; estabelecer canais de diálogo entre órgãos envolvidos e demais parceiros; mobilizar organização e gestão comunitária; esclarecer os moradores que residem em locais que serão ocupados pelos projetos de urbanização sobre as formas de indenizações e/ou aquisições assistidas (compra de casas); reuniões com moradores, técnicas sociais e equipe de obras; dinâmicas de grupo; oficinas educativas; capacitação para acampamento das intervenções”. (download: http://www.pactopelacidadania.org.br/). 69 Ver em TRINDADE, Claudia; COSTA, Renato Gama-‐Rosa e FERNANDES, Tânia Maria. Memória e conflitos sociais no espaço urbano – Manguinhos/Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: XIII Encontro de História Anpuh, 2008. 70 Esse processo envolveu muitos conflitos entre as partes. Se, por um lado, o Fórum conseguiu aumentar o número de unidades habitacionais a serem construídas; por outro, a Secretaria conseguiu mudar o regimento interno do Comitê, limitando sua atuação e seu poder fiscalizador. Ver em TRINDADE, COSTA e FERNANDES, 2008. 71 Matéria de Marcelo Salles publicada na Revista Caros Amigos em 2009. (download: http://www.pactopelacidadania.org.br/).
22
para Ruth Jurberg, coordenadora do Trabalho Social do PAC para o Governo do Estado
do Rio de Janeiro, “apesar das reuniões serem abertas à comunidade, os moradores
não comparecem. Apenas três ou quatro lideranças comunitárias participam”72. Em
outra ocasião, ela reconhece a carência de informação sobre as obras e fala dos esforços
na criação de “canteiros itinerantes” para “levar informação mais qualificada ao
próprio morador, e não somente através da liderança”. Havia também a vontade de se
criar um jornal que fale das obras e das ansiedades e desejos da população. Enquanto
essas medidas não fossem criadas, o morador poderia encontrar informações no canteiro
social ou nas reuniões do próprio Fórum de Manguinhos.
O censo domiciliar do PAC-Manguinhos realizado pelo governo do estado foi
divulgado em junho de 2009. O Complexo de Manguinhos somaria então 31.432
moradores distribuídos em 11.444 imóveis. Dentre as demandas da população local, o
saneamento básico apareceu como a principal com 15,2%. “Em seguida, aparecem
ampliar a residência (8,5%), área de lazer (7,2%), saúde pública (5,7%), iluminação
pública (5,7%), abastecimento de água potável (5,1%), pavimentação (4,2%),
educação/escola/curso (3,7%) e obra residencial (3,3%). O item segurança pública
aparece em décimo lugar representando 3,1% na lista de prioridades”73.
Embora a segurança pública não apareça como demanda prioritária no censo, em
pesquisa realizada no início deste mesmo ano pelo IBASE, em conjunto com a
Fundação Getúlio Vargas, 57, 5% dos entrevistados acreditam que o PAC favela só irá
dar certo se acabar com o tráfico. Entretanto, 68% dos moradores acham que o PAC vai
colaborar na redução da violência74. Já nos grupos focais, os jovens de Manguinhos
“avaliam com certo ceticismo a redução da violência e tem receios sobre a
interferência do tráfico no programa”; e os adultos “são unânimes ao afirmar que os
projetos de intervenção urbana precisam ser acompanhados de forte política de
segurança pública. Falam espontaneamente que são favoráveis à presença do Exército
em suas localidades, a fim de garantir ordem e minimizar riscos de conflitos. Entendem
que apenas obras não resolverão o problema da violência, percebido como um dos
72 Matéria de Elaine Ramos, O PAC no II Fórum, 11.05.2009. (http://www.pactopelacidadania.org.br/). 73 Matéria publicada no jornal O Globo em 04.06.2009 (disponível em: http://oglobo.globo.com/rio/mat/2009/06/04/governo-‐do-‐estado-‐divulga-‐censo-‐do-‐pac-‐no-‐alemao-‐em-‐manguinhos-‐756200971.asp) 74 Survey realizado pela FGV Opinião: Dimensões da cidade: Favela e Asfalto. Maio 2009. Nessa mesma pesquisa, a Segurança Pública despontou como pior serviço, contrapondo, assim, os resultados obtidos pelo Censo do PAC.
23
mais graves da localidade”75. Assim, observa-se que a percepção da situação de
violência e da necessidade de uma política para transformá-la varia de acordo com a
forma pela qual o tema é abordado – se isoladamente ou atrelado a outras questões mais
palpáveis e cotidianas voltadas para a melhoria das condições de vida da população.
Ainda nesta mesma pesquisa, os moradores de Manguinhos elencaram como
principais objetivos do PAC: em primeiro lugar, construir casas populares; em seguida,
construir escolas, creches/ saneamento, esgoto; e, em terceira posição, hospitais e
escolas novamente. Como outra informação interessante aparece a alta expectativa dos
moradores de Manguinhos em relação ao cumprimento dos objetivos do PAC, que se
contrapõe a certo ceticismo dos moradores do dito “asfalto”. No entanto, no Grupo
Focal realizado pelo IBASE, o ceticismo e o receio de que seja “mais uma maquiagem,
sem continuidade e com fins eleitoreiros” também aparece entre as opiniões dos
moradores de Manguinhos.
Em abril de 2010, o FMDES escreveu outro manifesto por ocasião da 4ª
Conferência da Cidade do Rio de Janeiro com intuito de debater os prejuízos ocorridos
em Manguinhos em decorrência das chuvas dos dias 5 e 6 do mesmo mês. Não apenas
as comunidades não atendidas pelo PAC sofreram com enchentes, mas, “no caso das
habitações construídas pelo PAC no DESUP, em terreno baixo, as chuvas subiram
mais de 40 cm dentro das casas fazendo com que os moradores perdessem tudo que
estivesse nessa altura”76.
No manifesto, o Fórum relembra que, nos primeiros encontros relacionados às
obras do PAC, havia advertido a EMOP quanto à topografia do terreno escolhido para
construção de casas ser propícia à ocorrência de enchentes. Seus representantes, porém,
não foram ouvidos pelo poder público. Desse modo, o Fórum evidenciou mais uma vez
a falta de participação dos representantes locais e a necessidade de inclusão dos mesmos
no processo de decisão, tendo em vista a história e as particularidades locais que
precisam ser levadas em consideração na implementação dos projetos de urbanização.
75 Grupos Focais: síntese dos resultados. O que pensam os(as) cariocas sobre o PAC-‐Favelas? Equipe do Pacto pela Cidadania. (download: http://www.pactopelacidadania.org.br/). No Survey, a violência aqui também se refere à violência policial, uma vez que 22,1% dos moradores afirmaram já tê-‐la sofrido. 76 Manifesto do Fórum do Movimento Social de Manguinhos para o Desenvolvimento Equitativo e Sustentável para a 4ª Conferência da Cidade do Rio de Janeiro. (download: http://www.conhecendomanguinhos.fiocruz.br/)
24
4. Percepções sobre o PAC-Manguinhos: os usos dos equipamentos públicos e as
expectativas da população local quanto à finalização e ao impacto das obras77.
As obras do PAC-Manguinhos, até agora realizadas, têm produzido efeitos
variados sobre a configuração dos espaços de sociabilidade na favela. A construção da
elevação da linha férrea, por exemplo, está em andamento, de modo em que todos os
dias, há uma equipe trabalhando no local. O trânsito da Leopoldo Bulhões, por conta
disso, foi alterado. No entanto, não se sabe quando ela será concluída78. Na região do
CHP-2, uma rua inteira de casas foi removida, para a construção de uma creche, já
inaugurada, às margens da Avenida dos Democráticos. Nesta área e no Parque João
Goulart, uma série de intervenções de pavimentação, asfaltamento das ruas, realização
do esgotamento sanitário, construção de praças e quadras de esporte foi realizada. Há,
entretanto, reclamações constantes, por parte dos moradores de que ainda ocorrem
alagamentos na região, por ocasião de fortes chuvas, o que revela a inadequação das
obras realizadas79.
Em grande parte dos espaços construídos, como no caso das praças de concreto,
com mesas e bancos, e quadras, não se vê ninguém os utilizando. Em uma quadra, no
Parque João Goulart, observa-se o acúmulo de lixo e, próximo dali, a cracolândia, onde
homens, mulheres e crianças se drogam durante o dia todo. Ao lado de outra obra do
PAC, um “parquinho” com brinquedos, encontra-se o rio Jacaré, sem urbanização e
contenção às suas margens, com um cheiro de esgoto muito forte. Em ambos os casos, a
percepção da presença de recente intervenção estatal contrasta com um entorno marcado
por sua ausência, devido às atividades ilegais praticadas e à situação de extrema
precariedade e abandono. As obras, dessa forma, passam a sensação de artificialidade e
inadequação total ao contexto desses lugares. Não se vê qualquer integração entre as
77 Nesta seção me baseio, sobretudo, no trabalho de campo e nas entrevistas semi-‐estruturadas com a população local, que realizei em parceria com Kristina Rosales, Gleide Guimarães e Consuelo Nascimento, sob coordenação de Mariana Cavalcanti no âmbito da pesquisa sobre as UPPs, já citada no início deste artigo. 78 Embaixo da elevação está prevista a construção de uma espécie de “shopping” popular, mas ainda não há indícios do início das obras. 79 Numa casa localizada em frente à creche do CHP-‐2, construída pelo PAC, observa-‐se que, diante de seu portão, toda a rua foi pavimentada recentemente. Entretanto, no seu interior, há marcas na parede, mais ou menos na altura de pouco mais de meio metro, que segundo a moradora, corresponde ao nível de água que enche quando há chuvas fortes. Segundo relato de outros moradores, regiões onde não “enchiam” tanto, após as obras do PAC passaram a encher, pois não foram feitas pavimentações adequadas com escoamento e drenagem.
25
obras e seu entorno. Em vez delas tornarem o ambiente mais agradável, acabam por
enfatizar ainda mais sua condição de pobreza e violência.
Nessa mesma área de Manguinhos (o Parque João Goulart), uma série de
famílias foram removidas dali e as casas, semi-demolidas. O intuito da remoção é a
construção no local de uma grande área de lazer e circulação, denominado Parque
Metropolitano de Manguinhos, uma espécie de rambla. Mas, segundo moradores, já se
passou um bom tempo desde as remoções e nada, até então, fora realizado no local. O
lugar, portanto, além de toda a precariedade já imposta pela falta de infraestrutura,
torna-se ainda mais decadente devido à existência desse espaço vazio deixado, não
ocupado, ou melhor, desocupado. Grande parte das casas não foram sequer
completamente destruídas, deixando-se destroços por todos os lados e casas demolidas
pela metade – entre as quais algumas viraram “boca” de venda de droga.
Em diversas outras áreas de remoção, observa-se a mesma situação, em que as
casas são destruídas, mas todos os destroços permanecem, não são recolhidos e deixam
o ambiente com um aspecto muito pior. No que concerne às remoções, em decorrência
das obras, muitas famílias já foram atingidas em diversas áreas de Manguinhos. No
entanto, os relatos dos moradores são muito divergentes em relação uns aos outros, não
parecendo haver qualquer padrão na forma como se dão essas realocações. Uma jovem
moradora me afirmou que sua família não pôde optar entre aluguel social, compra
assistida ou indenização, sendo esta última a única possibilidade dada pelo governo. Ela
afirma ainda que foram dados apenas 10 dias para que eles saíssem da casa, após a
entrega do cheque.
Já outro morador afirma que lhe deram alguns meses para sair do local e que ele
pôde escolher entre as três opções de financiamento, optando pela indenização. Em um
terceiro caso, ainda, outra moradora reclamou quanto ao tratamento dado aos moradores
pelos agentes da prefeitura que vão fazer as ações de despejo, dizendo que estes
colocavam muita pressão para que os moradores saíssem. Ela afirma que se não tivesse
emprego fixo e economias, não teria arranjado nenhum outro lugar para morar com o
baixo valor da indenização80. De um modo geral, os moradores reclamam sobre a falta
80 Na CCPL – favela localizada ao lado do espaço do DSUP de Manguinhos que será implodida para a construção de conjunto habitacional no âmbito do PAC – o processo de desocupação do terreno demorou muitos meses devido às dificuldades impostas pelo sistema de aluguel social. Segundo moradores, a EMOP atrasou diversas vezes o aluguel social e, por conta disso, muitos tiveram que voltar a ocupar o local. Além disso, muitos afirmam que pessoas, que nunca moraram no local, estão sendo contempladas com um apartamento. Já, de acordo com a presidente da associação, muitos moradores mesmo recebendo o aluguel social voltaram para o local, com intuito de usar o dinheiro para outros fins.
26
de informações em relação a todo o programa do PAC. Uma moradora do CHP-2
contou: “quando eu vi, O PAC já estava. Quando eu me dei conta... já vi só os buracos
quebrando, já era o PAC ali, tirando as casas. Para mim o PAC não teve muito impacto
não”.
Outro efeito negativo das obras do PAC são as rachaduras que estão aparecendo
na casa das pessoas, que segundo moradores, resultaram no impacto no solo provocado
pelas máquinas pesadas. Em uma casa do Parque João Goulart, a moradora apreensiva
diz já ter feito reclamações inúmeras vezes à associação de moradores e à prefeitura
sobre a situação de alto risco de desabamento que se encontra sua casa, mas até agora
não lhe deram nenhuma resposta sobre o que será feito. Para piorar sua situação, ela
utiliza a mesma casa como salão de beleza, sendo esta sua única fonte de renda. As
rachaduras, de fato, estão espalhadas por diversas paredes e cômodos, chegando a
larguras suficientes para se encaixar um cabo de vassoura81.
Numa outra direção, no terreno no qual se localizava o antigo Departamento de
Suprimentos do Exército (DSUP), às margens da Avenida Dom Hélder Câmara82, o
PAC construiu um “novo” espaço público, completamente diverso daquele existente até
então na favela. O espaço foi todo urbanizado, com pista para caminhada, gramado,
árvores, parques de areia, bancos, latas de lixo, postes de iluminação, etc. Crianças
circulam e brincam por ali livremente e adultos caminham e correm, além de
permanecerem no local. O tráfico não atua ali e há sensação de segurança, tanto que
mesmo ocorrendo confrontos em Manguinhos entre policiais e traficantes, não tem
problema algum continuar no DSUP83. Assim, esse espaço produz uma certa sensação
de “bolha” em relação ao resto de Manguinhos.
Além de conjuntos habitacionais para moradores removidos de outras áreas de
Manguinhos, ele é composto por diversos equipamentos públicos que funcionam, uns
mais do que outros, relativamente bem. Ocupam o espaço a escola Luiz Carlos da Vila,
a Biblioteca-Parque de Manguinhos, um Centro de Referência da Juventude, o Canteiro
81 A fim de acompanhar a situação dos moradores com casas rachadas, funcionárias da Secretaria Municipal de Assistência Social visitam as residências para criar um cadastro. Elas afirmam que embora muitas casas possam ter piorado por conta das obras, outras já deveriam estar rachadas muito antes das obras começarem. Sua atuação de cadastramento e acompanhamento não garante a solução da questão, pois esta requer a articulação de outras áreas da Prefeitura. 82 Ou seja, num local bem à vista daqueles que passam de carro ou de metrô. 83 Essa sensação é relativizada alguns metros adiante, no terreno ao lado, onde estão os conjuntos habitacionais, pois além de não haver movimento de transeuntes devido à falta de comércio, também não há policiamento e nem a “chefia” do tráfico, o que deixa alguns moradores receosos com a possibilidade de assaltos.
27
Social do PAC, um Centro de Apoio Jurídico (CAJ) – ainda desativado, um Centro de
Geração de Renda (CGR), uma Academia do Idoso, uma Farmácia Popular, uma
Unidade de Pronto Atendimento 24h (UPA), uma Clínica de Saúde da Família (CSF), a
Casa da Mulher, um POUSO – onde dentro funciona também um Ponto de Economia
Solidária. A maioria dos equipamentos é gerida pelo governo do estado84, porém, por
diferentes secretarias, que não possuem em geral um planejamento de atividades
articuladas. Isso se traduz na falta de comunicação entre os equipamentos e de uma ação
conjunta para a região.
Segundo a ex-coordenadora do CRJ, é necessário haver maior articulação com a
iniciativa privada, pois as verbas são limitadas para as atividades. Além disso, seria
preciso realizar um certo trabalho de conscientização com os jovens para que se
interessassem mais a participar das atividades e dos cursos oferecidos no local. Ela e um
funcionário da biblioteca afirmam que muitos dos moradores acham que o espaço e os
equipamentos não são destinados a eles, por ser um local limpo, novo, bem estruturado
e urbanizado – diferentemente das outras áreas de Manguinhos.
O funcionário da biblioteca, que também foi morador a vida inteira de
Manguinhos, classifica esse desconhecimento e esse estranhamento dos moradores com
o local como “preconceito”. “Tem aquele medo, aquele preconceito. “Não, lá é um
lugar muito bonito, eu não vou porque eu não estou com um tênis legal, não estou com
uma calça legal...” As pessoas têm esse preconceito. Então, elas acabam não vindo,
acabam não vindo aqui, por achar que só tem pessoas... E é dentro da favela assim,
ainda tem isso. Então, elas acham o local só para rico, só para pessoas de, sei lá... Elas
têm esse preconceito pela beleza do local. Elas não acham que aquilo é para elas”.
Para um morador e liderança informal antiga de Manguinhos, envolvido com
atividades culturais, não há interesse, por parte dos equipamentos, em se inserirem
completamente na comunidade. Ele afirma que é preciso sair de dentro dos
equipamentos e adentrar a comunidade, realizando atividades em seu interior. Desse
modo, ele diz que há sim interesse em se manter certa distância do resto de
Manguinhos. Ele, assim, reivindica que “a biblioteca não é do Estado. A biblioteca é
um direito da comunidade”.
Já um agitador cultural – que conhece muito bem Manguinhos e trabalha há
muitos anos em um colégio estadual localizado na Avenida dos Democráticos – diz ser
84 À exceção do POUSO e do Ponto Solidário, ambos coordenados pela Prefeitura, e da Farmácia Popular que está sob responsabilidade do governo federal.
28
favorável aos projetos do PAC, pois pior do que está Manguinhos não poderá ficar.
Mesmo assim, ele atenta para a importância de conhecer bem o lugar onde será
desenvolvido qualquer projeto, a fim de atender às necessidades e especificidades
locais. Em grande medida, ele acredita que isso não seja ainda feito com o cuidado
necessário pelo Estado.
A distância de suas casas ou trajetos diários aparece na fala de muitos moradores
como motivo para não utilizarem os equipamentos. No entanto, essa distância não se
refere ao espaço físico, uma vez que muitas vezes não precisariam caminhar mais de 10
minutos para chegar até o local. Há, nesse sentido, uma distância simbólica reforçada
pelo estabelecimento de microterritorialidades no interior da favela. A violência, por sua
vez, também faz com que muitos moradores evitem sair de suas casas ou fiquem
transitando pela favela. Ao perguntar para jovens do Jacarezinho, favela vizinha de
Manguinhos, se freqüentavam a biblioteca, eles responderam, “ah, não... Lá é
Manguinhos”85.
Ainda assim, a mudança no dia-a-dia daqueles que já utilizam os equipamentos,
principalmente no caso da biblioteca, é inegável. Além de ser muito bem equipada, com
computadores e um bom acervo de livros, ela possui um espaço agradável, colorido e
lúdico, com salas de vídeo, aulas de música e de reuniões, além de um teatro-cinema
digital. Assim, uma funcionária da biblioteca, também moradora de Manguinhos, afirma
que “a biblioteca muda, muda mesmo [a vida de quem a freqüenta]. Tipo assim, a
criança que nem tinha descarga em casa... Na ludoteca, as atividades que fazem ali são
maravilhosas. Essas crianças conseqüentemente vão chamando os amigos deles. O
pessoal do hip-hop foi um movimento espontâneo e hoje em dia eles estão se
organizando86... Isso tudo é uma coisa de ir na biblioteca, sabe?! Os pais ficam
seguros, “eu estou indo na biblioteca””.
Considerações Finais
85 Nota-‐se que essa distância não se traduz, por exemplo, no comércio, já que moradores de Manguinhos têm o hábito de ir ao Jacarezinho para fazerem suas compras. Desse modo, essa distância além de estar relacionada às microterritorialidades criadas, também diz respeito à necessidade de se estabelecer um novo trajeto, um novo hábito no cotidiano desses moradores para que passem a freqüentar os equipamentos. 86 Há um grupo de jovens b-‐boys que costuma se encontrar e treinar as danças ao lado da biblioteca.
29
A partir das potencialidades e limitações do projeto aqui discutidas, ainda é cedo
para se mensurar os reais impactos que o PAC produzirá na região de Manguinhos e em
seu entorno. Se a partir das experiências daqueles que vivenciam e se utilizam dos
novos equipamentos já é notável a existência de certo otimismo em relação ao futuro,
devido às novas oportunidades de vida que lhes são oferecidas; para a grande maioria da
população local, esses empreendimentos, ainda pouco notados, não modificaram em
nada suas condições de vida e seu cotidiano.
Em grande medida, as intervenções urbanísticas e os equipamentos construídos
possuem seus efeitos limitados e dissuadidos pela permanência do controle territorial do
tráfico de drogas e pelas sociabilidades por ele mantidas, como no caso do uso aberto e
ininterrupto de drogas – tendo sua expressão máxima nas cracolândias e na população
de “craqueiros” que circula por todas as áreas da comunidade. No novo conjunto
habitacional da Embratel, por exemplo, localizado da Avenida Leopoldo Bulhões, a
polícia em operação encontrou uma boca de fumo, que contava com telhado e sofá para
a permanência dos traficantes87. Essas freqüentes incursões policiais a fim de combater
o tráfico, por sua vez, também perpetuam a situação de insegurança e de violência, a
qual também inibe e cerceia as possibilidades de uso do espaço público na favela.
Nesse sentido, a inauguração da Cidade da Polícia e de uma futura Unidade de
Polícia Pacificadora (UPP) na região, dependendo da forma como sejam
implementadas, talvez possam, acompanhadas do PAC e de seu trabalho social,
melhorar as condições de vida locais. Caso contrário, corre-se o risco de que, com o
tempo, todas as obras e projetos realizados até então sejam novamente incorporados ao
restante da favela. Isso ocorrerá na medida em que as intervenções forem sendo
precarizadas, pela sua falta de manutenção, pela ocupação informal que se perpetua e
pela atuação do tráfico, a qual favorece todo esse cenário.
No entanto, se em grande medida a presença do tráfico dificulta a mudança de
perspectiva de vida local, não se trata aqui de colocá-lo como o algoz ou bode
expiatório da sociedade, já que este também é fruto da forma como a própria sociedade
se articulou na cidade do Rio de Janeiro. O Estado possui uma parcela de
responsabilidade fundamental no estado do quadro atual, através de seu planejamento e
87 “Polícia destrói boca de fumo durante operação em Manguinhos”, O Globo, 04.11.2011 (http://br.noticias.yahoo.com/pol%C3%ADcia-‐destr%C3%B3i-‐boca-‐fumo-‐durante-‐opera%C3%A7%C3%A3o-‐manguinhos-‐115200872.html)
30
de suas políticas urbanas implementadas na cidade ao longo dos anos88. Por conta disso,
para além dos avanços legislativos e discursivos alcançados, o cumprimento dos
paradigmas da integração e da participação social ao longo da realização do PAC ainda
é colocado em xeque e muito criticado pela população local – haja vista a reclamação
constante em relação à falta de informações sobre o programa.
Em 03 de novembro de 2011, O DIA Online, publica uma matéria sobre graves
problemas técnicos encontrados nas obras do PAC:
“Solução de moradia para quem vivia na Favela de Manguinhos, os apartamentos do Programa
de Aceleração do Crescimento (PAC) na comunidade já apresentam problemas. Nas paredes e
no teto dos imóveis do Condomínio João Nogueira, rachaduras que surgem a cada dia revelam
a fragilidade da obra. Nos corredores dos edifícios, entregues em maio de 2009, fissuras nas
escadas aumentam a sensação de insegurança. A instabilidade dos muros de proteção que
balançam com simples apoiar de braços, dando a impressão de que vão desabar, também
preocupa. Assim como as infiltrações, que estão por toda a parte”89.
A aparição dessas rachaduras nos novos apartamentos construídos pelo PAC
torna-se motivo de preocupação e desconfiança em relação à durabilidade dos efeitos
dessa política. Estas sugerem, antes disso, a continuidade das desigualdades de
qualidade e montante de investimento público que é feito pela cidade e que,
conseqüentemente, reproduzem as suas desigualdades sócio-espaciais. Daí, que a
manutenção da formulação de políticas públicas específicas para favelas, em vez de
compensar uma situação de segregação, em grande medida, a perpetua.
As rachaduras, nesse sentido, estão presentes na vida da população de
Manguinhos de diversas formas: seja por efeito das condições do solo, seja como efeito-
perverso das obras do PAC ou como resultado direto da falta de qualidade nas
construções, por ele, realizadas. Em outras palavras, as rachaduras aparecem nas casas
como fruto, de um lado, da ausência do Estado; e, por outro, de uma presença, do
mesmo, determinada e diferenciada daquela que se faz nas demais áreas mais ricas da
cidade.
88 Não entrarei aqui nas questões de políticas de segurança pública que, como se sabe, também contribuíram para o desenvolvimento do tráfico de drogas nas favelas, tal qual se encontra atualmente. 89 “Rachaduras nos prédios do PAC em Manguinhos”, O DIA, 03.11.2011 (http://odia.ig.com.br/portal/rio/html/2011/11/rachaduras_nos_predios_do_pac_em_manguinhos_203764.html)
31
Referências Bibliográficas
BELÉM, Cíntia e AGUIERRE, Eddy. PAC: Impactos da Biblioteca-Parque no Complexo de Manguinhos. Londrina: Anais do XIII EREBD, 2011.
BRASIL, Flávia de Paula Duque Brasil. Participação cidadã e reconfigurações nas políticas urbanas nos anos 90. In Revista de Estudos Urbanos e Regionais – v.6, n.2, 2004: ANPUR. BRESCIANI, Maria Stella. A cidade: objeto de estudo e experiência vivenciada. In Revista de Estudos Urbanos e Regionais – v.6, n.2, 2004: ANPUR.
BURGOS, Marcelo Baumann. Cidade, Território e Cidadania. In Dados – Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, vol. 48, nº 1, 2005, pp. 189 a 222.
______________________. Dos Parques Proletários ao Favela-Bairro: as políticas públicas nas favelas do Rio de Janeiro. In. ALVITO, Marcos e ZALUAR, Alba (org.). Um século de favela. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2006.
CAMARGO, Paula de Oliveira. As cidades, a cidade: Política, Arquitetura e Cultura na cidade do Rio de Janeiro. (dissertação). Rio de Janeiro: CPDOC/FGV, Março de 2011.
CAVALCANTI, Mariana. Sem morro, varandão, salão, 3 dorms: a construção social do valor em mercados imobiliários “limiares”. In Revista Antropolítica, Niterói, n. 28, p. 19-46, 1. sem. 2010.
_________________. Do Barraco à casa – tempo, espaço e valor(es) em uma favela consolidada. RBCS, vol. 24, nº 69, fevereiro/2009.
_________________. FONTES, Paulo e BLANK, Thais. CCPL: Favela Fabril.
COSTA, Renato Gama-Rosa e FERNANDES, Tânia Maria. História de Pessoas e Lugares: memórias das comunidades de Manguinhos. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2009.
HARVEY, David. The Urban Experience. John Hopkins, 1985.
JUNIOR, Pedro de Novais Lima. Les nouveaux príncipes de l’urbanisme de François Ascher. Paris : Éditions de l’Aube, 2004 (resenha). In Revista de Estudos Urbanos e Regionais – v.6, n.2, 2004: ANPUR.
32
LAGO, Luciana Corrêa do. Os instrumentos da reforma urbana e o ideal de cidadania – As contradições em curso. In Revista de Estudos Urbanos e Regionais – v.6, n.2, 2004: ANPUR.
___________________. O associativismo produtivo na periferia urbana: novos conflitos em pauta. ANPOCS, 2011.
LOW, Setha M. Spatializing Culture: The Social Production and Social Construction of Public Space in Costa Rica. American Ethnologist, vol. 23, nº 4, (Nov.,1996), pp. 861-879. (disponível em JSTOR). NASCIMENTO, Denise Morado e TOSTES, Simone Parrela. Programa Minha Casa Minha Vida: a (mesma) política habitacional no Brasil. Revista Arquitextos, 133.03 ano 12, jun 2011. PIVETTA, Fátima e PORTO, Marcelo Firpo. PAC-MANGUINHOS: Como promessa, como desconfiança, como esperança. (texto escrito como contribuição ao GTPAC/ENSP-FIOCRUZ, 2008).
REIS, Elisa P. Percepções da elite sobre a pobreza no Brasil. RBCS, vol. 15, nº 42, janeiro de 2000.
RISEK, Cibele Saliba. Práticas sociais e culturais: novas tessituras? ANPOCS, 2011
_______________. Práticas culturais e Ações Sociais: Novas Formas de Gestão da Pobreza. ANPUR, 2011.
ROCHA, Lia da Mattos. Representações e autorepresentações: notas sobre a juventude carioca moradora de favelas e os projetos sociais de audiovisual. ANPOCS, 2011.
SILVA, Jonathas Magalhães Pereira da Silva. O programa “Morar Carioca” e a experiência de intervenção em favelas na cidade do Rio de Janeiro: Remoção à Urbanização. ANPUR, 2011. TORRES, Ana Clara Torres e ACSELRAD, Henri. O desenvolvimento urbano democrático como utopia – entrevista com Ermínia Maricato, Secretária Executiva do Ministério das Cidades. In Revista de Estudos Urbanos e Regionais – v.6, n.2, 2004: ANPUR.
TRINDADE, Cláudia Peçanha. O Programa de Aceleração do Crescimento: Infraestrutura/Urbanização de Favelas. Rio de Janeiro, 2007. (texto produzido a partir do projeto de pesquisa Manguinhos – diagnósticos histórico-urbano-sanitário. Subsídios para políticas públicas sustentáveis em saúde).
33
_______________________; COSTA, Renato Gama-Rosa; FERNANDES, Tânia Maria. Memória e conflitos sociais no espaço urbano – Manguinhos/Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: XIII Encontro de História Anpuh, 2008.
VAINER, Carlos B. Pátria, empresa e mercadoria – notas sobre a estratégia discursiva do Planejamento Urbano Estratégico.
VAZ, Lilian Fessler. Um território híbrido na Maré, RJ. Novo território cultural?. ANPUR, 2011.
______________. A “culturalização” do planejamento e da cidade: novos modelos?
- Relatórios, projetos e apresentações de pesquisa e de políticas
CAVALLIERI, Fernando e LOPES, Gustavo Peres. Índice de Desenvolvimento Social: Comparando as realidades microurbanas da cidade do Rio de Janeiro. In. Armazém de Dados. Instituto de Urbanismo Pereira Passos, abril de 2008. (http://www.armazemdedados.rio.rj.gov.br/arquivos/2247_%EDndice%20de%20desenvolvimento%20social%20_%20ids.PDF).
MALITO, Daniella Guedes Rocha Malito. Ontem e Hoje: Um estudo comparativo dos processos de remoção de favelas na cidade do Rio de Janeiro. 2011.
Complexo de Manguinhos – Apresentação da Secretaria Municipal da Habitação. (http://www.pactopelacidadania.org.br/).
PAC: Programa de Aceleração do Crescimento 2007-2010 – Brasília, 2007 (www.cidades.gov.br).
PAC Social – Plano de Ocupação Social nas favelas, Escritório de Gerenciamento de Projetos do Governo (EGP-Rio) e Secretaria Estadual de Assistência Social e Direitos Humanos – apresentação Fórum da Cidadania – IBASE – 11/05/2009 (http://www.pactopelacidadania.org.br/).
PAC das favelas: documentação fotográfica e memória territorial. (http://www.memoriasdopac.org.br/). Resultados dos grupos focais do projeto Imagem PAC-Manguinhos. IBASE, Janeiro de 2009. (http://www.pactopelacidadania.org.br/).
Survey realizado pela FGV Opinião. Dimensões da Cidade: Favela e Asfalto. Maio de 2009.
34
Urbanização de Favelas: a experiência do PAC – Ministério das Cidades, Secretaria Nacional de Habitação – Brasília, 2010 (www.cidades.gov.br).
Zoom nas Condições Sociais das Grandes Favelas Cariocas – CPS-FGV (http://www.fgv.br/cps/favela/principais_favelas.pdf).
- Artigos da mídia alternativa e tradicional extraídos da internet
Dossiê-Manifesto de 11 meses do PAC Manguinhos. (http://www.anf.org.br/2009/02/dossie-manifesto-de-11-meses-do-pac-manguinhos/).
Governo do Estado divulga censo do PAC no Alemão e em Manguinhos. O Globo (http://oglobo.globo.com/rio/mat/2009/06/04/governo-do-estado-divulga-censo-do-pac-no-alemao-em-manguinhos-756200971.asp).
Manifesto do Fórum do Movimento Social de Manguinhos para o Desenvolvimento Equitativo e Sustentável para a 4ª Conferência da cidade do Rio de Janeiro (http://www.conhecendomanguinhos.fiocruz.br/).
BATISTA, Vera Malaguti. O Alemão é muito mais complexo. ANF, 13 de setembro de 2011. (http://www.anf.org.br/2011/09/o-alemao-e-muito-mais-complexo/).
MISSE, Michel. Os rearranjos de poder no Rio de Janeiro. Le Monde Diplomatique (http://diplomatique.uol.com.br/print.php?tipo=ar&id=959). SÁ, Eduardo. Uma visão do PAC Em Manguinhos (http://pig2010.blogspot.com/2010/02/uma-visao-do-pac-em-manguinhos.html).
SALLES, Marcelo. Esperança, medo e críticas. Revista Caros Amigos, 2009.2 (http://www.pactopelacidadania.org.br/).
- Sites consultados
Centro de Políticas Socias da Fundação Getúlio Vargas (CPS-FGV) – http://cps.fgv.br/favela
Laboratório Territorial de Manguinhos – http://www.conhecendomanguinhos.fiocruz.br/
Projeto Memórias do PAC-Manguinhos – http://www.memoriasdopac.org.br/
Ministério das Cidades – http://www.cidades.gov.br/
35
Pacto pela Cidadania – IBASE – http://www.pactopelacidadania.org.br/
Secretaria da Cultura do Governo do Rio de Janeiro – www.cultura.rj.gov.br
top related