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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
FERNANDO FRANCISCO TSUCANA
FORMAÇÃO SUPERIOR DE OFICIAIS DA POLÍCIA DE
MOÇAMBIQUE:
Articulação Entre os Fundamentos Teóricos e as Habilidades Práticas
SÃO PAULO
2014
FERNANDO FRANCISCO TSUCANA
FORMAÇÃO SUPERIOR DE OFICIAIS DA POLÍCIA DE
MOÇAMBIQUE:
Articulação Entre os Fundamentos Teóricos e as Habilidades Práticas
Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo, como exigência parcial para a obtenção do grau de Doutor em Educação: Currículo, realizada sob a orientação do Prof. Dr. Alípio Márcio Dias Casali.
SÃO PAULO
2014
NOTA PRÉVIA
Esta Tese foi redigida segundo a norma-padrão da Língua Portuguesa
usada em Moçambique
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho à memória dos meus pais, em especial da minha querida mãe Julieta Chuma, que me encorajou a iniciar os estudos, mas não viveu o suficiente para partilhar comigo o resultado.
Mamana Julieta, lavisa masinwini ya wena
A mbéu unga byala, yimilile hi ley!
- - -
Dona Julieta, olhe para a sua horta
A semente que você lançou germinou, ei-la!
AGRADECIMENTOS
Foi gratificante e honroso conhecer a PUC, sua diversidade, suas gentes, seus docentes
e todos os meus colegas e amigos da turma. A competência, simplicidade, empatia e
trato humano dos professores do Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo
me marcarão pelo resto vida.
Agradeço às autoridades do Ministério do Interior de Moçambique, do Comando Geral
da Polícia da República de Moçambique e da Academia de Ciências Policiais pela
confiança que depositaram em mim, concedendo a bolsa e permitindo que fosse
continuar os estudos fora do País. Os mesmos agradecimentos estendem-se ao Projecto
NPT do Governo Holandês através da Nuffic, pelo financiamento e gestão da bolsa.
Agradeço ao Professor Doutor Luis Pouw e à Professora Doutora Rachael Tompson,
pela orientação, pelos conselhos, incluindo a preferência pela PUC-SP, pela amizade e
carinho que sempre me dedicaram. É de reconhecer as suas qualidades humanas para
além de educadores.
Agradeço, igualmente, ao Professor Doutor Ronilson Luiz cujo espírito de amizade e
interajuda transcendeu as fronteiras interpessoais e fez questão de conhecer e dar o seu
saber também à minha instituição ACIPOL onde deixou saudades a todos quantos
tiveram oportunidade de conviver com ele. Agradeço, em especial, ao Professor Marcos
Masetto pelo seu tacto pedagógico, que levou muitos dos seus discentes a (re) construir
a sua visão sobre a docência e a inovação no ensino superior.
Aos meus colegas e compatriotas moçambicanos na PUC e em São Paulo, agradeço
todo o convívio fraterno, o apoio e partilha de idéias que marcaram os dias da nossa
convivência além-fronteiras que, de certeza, continuará no solo pátrio.
À Ana Maria Nhampule e ao Remane Selimane, não encontro palavras próprias e
suficientes para qualificar a irmandade que cimentamos e desejamos que se consolide.
Qualquer adjectivação arriscar-se-ia a reduzir tamanha obra que construímos a simples
palavras. Duma coisa tenho certeza: a semente que lançamos germinará. Obrigado por
tudo.
Agradeço de forma destacada ao meu orientador, Professor Doutor Alípio Casali, não
somente pela sapiente orientação, mas pelas suas qualidades humanas e nobreza de
espírito, pelo seu exemplo de vida e de luta pelas coisas certas. Pela sua capacidade de
acolhere atender “o próximo”, permitindo que aprendamos, a (des)construir e a
(re)construir paradigmas da academia e da cultura para nos tornarmos o que já não
somos. Bem haja!
À minha família (minha esposa, meus filhos e meus irmãos) que ao longo de todo o
tempo de presença e ausência, soube entender e assumir os meus estudos como um
projecto colectivo, não sem sacrifícios. Dela devo todo o amor e carinho que me
encorajaram e deram alento para atingir a meta.
RESUMO
Esta pesquisa foi orientada como um estudo sobre a relação entre a teoria e a prática no
curso de formação superior de oficiais da Polícia ministrado pela Academia de Ciências
Policiais (ACIPOL) de Moçambique. Partindo da inquietação de que a formação
oferecida pela ACIPOL vem sendo predominantemente teórica, os procedimentos
metodológicos usados na prática pedagógica não estabelecem uma ligação com as
práticas policiais reais, ao presente estudo interessou fundamentar como promover,
através do estágio curricular supervisionado e das práticas pré-profissionais, a
articulação entre os fundamentos teóricos e as habilidades práticas da formação.
Apoiando-se em fundamentos da pedagogia crítica e reflexiva, o presente estudo
recorreu a instrumentos quantitativos e qualitativos de pesquisa, para investigar um
grupo de oficiais da Polícia da República de Moçambique (PRM) no activo, recolhendo
suas opiniões e percepções que afectam a formação de oficiais oferecida pela ACIPOL.
Como resultado, o presente estudo levanta a proposição de que os cursos deveriam ter
um núcleo básico de formação que não se estruturasse simplesmente em torno de
disciplinas que repassassem conteúdos acabados, mas que transformasse a organização
actual de áreas científicas em eixos de aprendizagem, devidamente integrados e
articulados entre os fundamentos teóricos e as habilidades requeridas para a futura
função profissional dos formandos. Isso pressupõe uma nova concepção sobre as
actividades formativas, o processo formativo, os espaços de formação e os actores.
Palavras-chave: Formação policial; ACIPOL; Moçambique; Práticas Pré-Profissionais;
Estágio curricular.
ABSTRACT
This research is focused on the relationship between theory and practice in the course of
higher education of police officers given by the Academy of Police Sciences (ACIPOL)
of Mozambique. Starting from the concern that the training offered by ACIPOL has
been predominantly theoretical, methodological procedures used in teaching practice do
not establish a connection with actual police practices; this study promotes, through
supervised traineeship and pre-professionals practices, the relationship between the
theoretical and practical skills training. Based on fundamentals of critical and reflective
pedagogy , this study has used both quantitative and qualitative research tools to
investigate a group of the Republic of Mozambique Police (PRM) officers in active,
collecting their opinions and perceptions on issues affecting officer training offered by
ACIPOL. As a result, this study raises the proposition that the courses should have a
basic core training that is not simply structured around disciplines that finished passing
along content, but be able to transform the current organization of scientific areas into
learning axles, properly integrated and articulated with theoretical underpinnings and
skills required for future professional role of learners. This implies a new conception of
the learning activities, the training process, the training spaces and actors.
Keywords: Police training; ACIPOL; Mozambique, Pre-Professional Practices;
Curricular Supervised Fieldwork.
RÉSUMÉ
Cette recherche se concentre sur l' étude de relation entre la théorie et la pratique dans
le cadre de l'enseignement supérieur des officiers de police proposé par l'Académie des
Sciences de police (ACIPOL) du Mozambique. En sortant de la préoccupation que la
formation offerte par ACIPOL concernait, procédures méthodologiques principalement
théoriques utilisés dans la pratique de l'enseignement n'ont pas établi une connexion
avec les pratiques policières, l'étude presente c`est, par conséquence, à promouvoir, par
le biais de l'stage et pratiques supervisées pré-professionnels, la relation entre la
formation théorique et pratique. S'appuyant sur les fondements de la pédagogie critique
et réflexive, cet étude a utilisé des outils quantitatifs et qualitatifs de recherche pour
enquêter sur un groupe d'officiers de la Police de la République du Mozambique (PRM)
en activité, la collecte de leurs points de vue sur des questions touchant la formation des
officiers offert par ACIPOL. En conséquence, cet étude soulève la proposition que les
cours devraient avoir une formation de base qui ne soit pas simplement estructurée
autour avec des contenus acheve´s, mais de transformer l'organisation actuelle des
domaines scientifiques en essieux d´apprentissage, bien intégrée et articulé aux
fondements théoriques et compétences nécessaires pour le futur rôle professionnel des
apprenants. Cela implique une nouvelle conception des activités d'apprentissage, de
processus de formation, des espaces de formation et des acteurs.
Mots-clés: Formation de la Police; Pratiques Pré- Professionnelles; Formation
Curriculaire Supervisée; ACIPOL; Mozambique.
i
Índice INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 1
CAPÍTULO I .................................................................................................................. 22
1.1.Contextos .................................................................................................................. 22
1.2. O policiamento Público: breve resenha histórica .................................................... 23
1.3. Evolução da Polícia da República de Moçambique no período pós ....................... 30
independência nacional - Sinopse histórica: do CPM à PRM ........................................ 30
1.3.1. O Corpo da Polícia de Moçambique – CPM ............................................ 32
1.3.2. A Polícia Popular de Moçambique – PPM ............................................... 33
1.3.3. A Polícia da República de Moçambique – PRM ...................................... 34
1.3.4. A reforma da Polícia no período pós Acordo Geral da Paz (AGP ........... 36
1.3.5. Escalas profissionais da PRM e sistema de formação policial ...................... 39
1.3.6. A revogação da Lei que cria a PRM: Lei nº 16/2013 de 12 de Agosto .... 41
1.4. Processo de implementação do Acordo Geral de Paz: A Polícia como parte do 44
objecto de reformas institucionais .................................................................................. 44
1.5. A Academia de Ciências Policiais (ACIPOL) no processo da reforma da Polícia
45
1.5.1. Estrutura do Currículo .............................................................................. 48
CAPÍTULO II ................................................................................................................. 50
DESAFIOS CURRICULARES À FORMAÇÃO SUPERIOR DA POLÍCIA EM
MOÇAMBIQUE ............................................................................................................ 50
2.1. Génese e evolução do termo Polícia ........................................................................ 51
2.2. Polícia como profissão............................................................................................. 53
2.3. Formação policial para o desenvolvimento de profissionais competentes .............. 56
2.4. Buscando referências teóricas para a formação pretendida na ACIPOL................. 63
2.5. A formação policial em Moçambique ..................................................................... 72
2.5.1. Antecedentes ................................................................................................. 75
2.6. As fontes do modelo policial de Moçambique: uma revisita às escolas e ............... 80
modelos policiais no Mundo .......................................................................................... 80
2.6.1. Orientação e objectivos da escola de Polícia Anglo-Saxônica ..................... 82
ii
2.6.2. Orientação e objectivos da Escola de Polícia Oriental .................................. 82
2.6.3. Referência aos modelos policiais .................................................................. 83
2.6.4. Fontes e natureza das actividades policiais ................................................... 86
2.6.5. Em busca de um modelo funcional ............................................................... 88
2.7. Formação ................................................................................................................. 93
Breve discussão sobre o conceito formação ........................................................... 94
2.8. Profissão .................................................................................................................. 98
2.8.1. Formação Profissional ................................................................................ 101
2.8.2. Nossa referência sobre Competência .......................................................... 105
2.9. Considerações gerais sobre o currículo ................................................................. 108
2.9.1. O Termo Currículo ...................................................................................... 108
2.9.2. Revisitando o processo da construção do currículo da ACIPOL ................ 112
2.9.3. Breve olhar sobre as teorias do currículo .................................................... 117
2.9.4. A Teoria crítica como práxis ....................................................................... 120
2.9.5. O currículo integrado como evolução das idéias críticas sobre o currículo 124
2.10. O Estágio Curricular ............................................................................................ 126
2.10.1. Conceito de Estágio ................................................................................... 127
2.10.2. Algumas acepções sobre o Estágio ........................................................... 128
2.10.3. O que se entende por teoria e por prática .................................................. 129
2.10.4. O estágio como prática .............................................................................. 130
2.10.5. Um novo entendimento de prática ............................................................ 134
2.10.6. A Prática como exercício da técnica ......................................................... 136
2.10.7. Estágio como aproximação da teoria à realidade ...................................... 138
2.10.8. A pesquisa no estágio ................................................................................ 139
2.10.9. Conceituando as Práticas Pré-Profissionais ............................................. 142
2.10.10. Quanto ao objectivo das práticas pré-profissionais ................................. 143
2.11. Como diferenciar o Estágio das Práticas Pré-Profissionais? ............................... 145
CAPÍTULO III ............................................................................................................. 147
iii
A PERCEPÇÃO DOS COMANDANTES E DOS OFICIAIS DA PRM ACERCA DA
RELEVÂNCIA DA FORMAÇÃO OFERECIDA PELA ACIPOL ............................ 147
3.1. Opções metodológicas ........................................................................................... 148
3.2. Caracterização dos participantes da pesquisa ........................................................ 150
3.3. Técnicas de recolha de dados ................................................................................ 153
3.3.1. Entrevistas ................................................................................................... 153
3.3.2. Inquérito por questionário ........................................................................... 156
3.3.3. Processo de apresentação dos dados recolhidos .......................................... 158
3.3.4. Critério de selecção das tarefas a desenvolver nas Práticas Pré-Profissionais 159
e Estágio curricular supervisionado ...................................................................... 159
3.4. Apresentação e interpretação dos dados ................................................................ 160
3.4.1. Dados colectados através da ficha 1: tempo despendido por um comandante ... 161
da esquadra ................................................................................................................... 161
3.4.2. Dados recolhidos através da ficha 2: dificuldade de execução de tarefas .......... 173
3.5 Apresentação dos dados recolhidos através de entrevistas nas esquadras.............. 180
3.6. Resultados das entrevistas realizadas na PIC ........................................................ 180
3.7. Resultados das entrevistas realizadas na Polícia de Trânsito ................................ 181
3.8. Resultados das entrevistas realizadas nas esquadras ............................................. 181
3.9. Resultados da entrevista colectiva ......................................................................... 182
3.10. Análise descritiva e interpretação dos resultados de grupos focais, entrevistas
e inquéritos gerais ......................................................................................................... 184
CAPÍTULO IV ............................................................................................................. 225
POSSIBILIDADES DE EQUILÍBRIO ENTRE OS FUNDAMENTOS TEÓRICOS E
AS HABILIDADES PRÁTICAS DA FORMAÇÃO, A PARTIR DAS PRÁTICAS
PRÉ-PROFISSIONAIS E DO ESTÁGIO CURRICULAR SUPERVISIONADO ..... 225
4.1. Conhecer as necessidades operacionais para determinar as necessidades de
formação ....................................................................................................................... 225
4.2. Sobre a prática da formação em ciências policiais que a ACIPOL oferece .......... 230
4.3. Possibilidades de aprimoramento na formação de oficiais da Polícia no sentido . 233
da articulação entre a teoria e a prática ......................................................................... 233
4.3.1. Fortalecer a área de Ciências e Tecnologia Policiais .................................. 234
iv
4.3.2. Fortalecer a área policial articulando a pesquisa com a formação .............. 236
4.4. Os atributos ligados às relações com as comunidades como referenciais de uma 239
formação policial vinculada à realidade social ............................................................. 239
4.5. O currículo integrado como possibilidade de articulação entre os fundamentos .. 247
teóricos e as habilidades práticas na formação policial ................................................ 247
4.5.1. Restaurando experiências e expectativas: as expectativas que os oficiais de 249
comando tinham sobre o desempenho dos formados pela ACIPOL. .................... 249
4.5.2. Ideias preliminares sobre a construção do currículo integrado: Presupostos práticos e metodológicos ....................................................................................... 252
4.5.3. Elementos de aproximações sucessivas ao Perfil Profissional .................... 255
4.5.4. Pressupostos a considerar na Avaliação da aprendizagem do currículo ..... 258
integrado ................................................................................................................ 258
CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................... 268
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 274
ANEXOS......................................................................................................................287
v
Índice de Tabelas
Tabela 1: Áreas Científicas do Currículo da ACIPOL e Carga Horária ........................ 48
Tabela 2: Teorias de Aprendizagem, Representantes e Principal Fundamento ............. 65
Tabela 3: Valores absolutos/ reais de níveis de Escolaridade dos comandantes da Polícia
até 2007 .......................................................................................................... 75
Tabela 4: Valores em percentagens (%) dos níveis de escolaridade dos comandantes da
Polícia até 2007 .............................................................................................. 76
Tabela 5: Resumo de modelos de policiamento ............................................................. 93
Tabela 6: Exemplo de designações de formação em algumas línguas ........................... 93
Tabela 7: Níveis de Educação Profissional em Moçambique até o início da reforma
(2006)............................................................................................................ 102
Tabela 8: Classificação das instituições de Ensino Superior em Moçambique ............ 102
Tabela 9: Forma em que a Prática Pré-profissional pode ser realizada ........................ 118
Tabela 10: Estágio versus Práticas Pré-profissionais................................................... 145
Tabela 11: Principais documentos institucionais analisados ........................................ 146
Tabela 12: Dados gerais sobre a origem e o número dos participantes da pesquisa .... 149
Tabela 13: Fichas de entrevistas aplicadas ................................................................... 152
Tabela 14: Entrevistados por ramo policial e por função ............................................. 155
Tabela 15: Participantes do inquérito específico por província e função .................... 155
Tabela 16: Fichas de inquérito por questionário aplicadas........................................... 156
Tabela 17: Distribuição das questões de inquérito por ficha e categorias .................... 157
Tabela 18: Conteúdo das categorias codificadas .......................................................... 157
Tabela 19: Implicações das frequências das respostas................................................ 158
Tabela 20: Frequência de respostas da Ficha 1- Província de Nampula ...................... 160
Tabela 21: Frequência de respostas da Ficha 1- Cidade de Maputo ............................ 161
Tabela 22: Frequência de respostas da Ficha 1- Província de Sofala ........................... 162
Tabela 23: Frequência de respostas da Ficha 1 (somatório geral) ................................ 163
vi
Tabela 24: Selecção de tarefas com base nos dados da ficha 1 .................................... 164
Tabela 25: Frequência de respostas da Ficha 2 - Província de Nampula ..................... 165
Tabela 26: Frequência de respostas da Ficha 2 - Cidade de Maputo ........................... 173
Tabela 27: Frequência de respostas da Ficha 2 - Província de Sofala .......................... 174
Tabela 28: Frequência de respostas da Ficha 2 (somatório) ......................................... 175
Tabela 29: Selecção de tarefas com base nos dados da ficha 2 .................................... 175
Tabela 30: Tabela geral das tarefas seleccionadas (fichas 1 e 2) ................................. 179
Tabela 31: Comparação das actividades consideradas mais complexas ..................... 179
Tabela 32: Relação das perguntas de pesquisa aplicadas ............................................. 183
vii
Índice de Figuras
Figura 1: Organigrama do Ministerio do Interior ........................................................... 35
Figura 2: Modelo de Carreira Policial ............................................................................ 39
Figura 3: Organização da Policia da Republica de Moçambique ................................... 42
Figura 4: Ramos e Unidades de Operações Especiais e de Reserva .............................. 43
Figura 5: Organigrama da ACIPOL ............................................................................... 46
Figura 6: Ilustração das componentes curriculares e áreas de actuação dos graduados . 49
Figura 7: Desenvolvimento Profissional (modelo reflexivo) ......................................... 68
Figura 8: Triângulo da Ocorrência Criminal - Modelo da Escola Oriental .................... 83
Figura 9: Transformação dos modelos de polícia até século XX ................................... 89
Figura 10: Teoria Broken Windows (teoria de vidros quebrados) ................................. 91
Figura 11: Linha de tempo das teorias críticas ............................................................. 120
Figura 126: currículo integrado - exemplo de unidades de aprendizagem ................... 256
viii
Índice de Quadros
Quadro 1: Códigos usados na sistematização e análise dos resultados ........................ 185
Quadro 2:Disposições legais que regulam o ingresso na ACIPOL .............................. 193
Quadro 3: Actividades policiais consideradas difíceis ................................................. 198
Quadro 4: Matérias de aprendizagem sugeridas pelos graduados/Sofala ..................... 204
Quadro 5: Actividades que os cadetes realizam na esquadra durante o estágio .......... 209
Quadro 6: categorias indicadas pelos participantes ...................................................... 211
Quadro 7: Comparação de características entre o “bom” e o “mau” Polícia ............... 224
Quadro 8: Tarefas seleccionadas pelas fichas (1 e 2) ................................................... 227
Quadro 9: Matrix de resultados de aprendizagem ........................................................ 251
Quadro 10: resumo das possibilidades para assegurar uma formação policial equilibrada entre os fundamentos teóricos e as habilidades práticas............................ 260
ix
Índice de gráficos
Gráfico 1: Representação do Nível de Escolaridade dos comandantes provinciais da
Polícia (até 2007) ........................................................................................... 76
x
Lista de Siglas e Abreviaturas
ACIPOL: Academia de Ciências Policiais
AR: Assembleia da República
BR: Boletim da República
CIP: Contra Inteligência Policial
CPM: Corpo da Polícia de Moçambique
CRM: Constituição da República de Moçambique
CFQP: Centro de Formação de Quadros da Polícia
CPNM: Classificação Nacional das Profissões de Moçambique
CHA: Competências, Habilidades e Atitudes
DEIPLA: Departamento de Informação e Planificação
DINET: Direcção Nacional do Ensino Técnico Profissional
FADM: Forças Armadas de Defesa de Moçambique
FER: Forças Especiais e de Reserva
FGF: Força de Guarda Fronteiras;
FPAI: Força de Protecção de Altas Individualidades
FPLM: Forças Populares de Libertação de Moçambique
FPMLF: Força de Protecção Marítima, Lacustre e Fluvial
FRELIMO: Frente de Libertação de Moçambique
GF: Guarda Fiscal
ILEA: International Law Enforcement Academy
INE: Instituto Nacional de Estatística
ISP: Inteligência da Segurança Pública
ISCPSP: Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Publica de Portugal
OSTP: Ordem, Segurança e Tranquilidade Pública
PA: Polícia Aduaneira
PCFM: Polícia dos Caminhos de Ferro de Moçambique
PEACIPOL: Plano Estratégico da Academia de Ciências Policiais
PIC: Polícia de Investigação Criminal
PJ: Polícia Judiciária
POC: Policiamento Orientado para a Comunidade
POP: Policiamento Orientado para o Problema
PPM: Polícia Popular de Moçambique
xi
PRM: Polícia da República de Moçambique
PSP: Polícia da Segurança Pública
PT: Polícia de Trânsito
PTO: Police Training Officers (Programa de Treinamento de Oficiais da Polícia)
RDA: República Democrática de Alemanha
RENAMO: Resistência Nacional Moçambicana
SISE: Serviço de Informação e Defesa do Estado
TFS: Táctica das Forças de Segurança
1
INTRODUÇÃO
Este estudo começa com uma breve contextualização sobre a posição, função e
a importância dos actos da Polícia na sociedade como base para imergir na discussão
sobre a natureza e o tipo de formação policial que se pretende para a Polícia
moçambicana. De seguida, apresenta as razões de âmbito social, institucional,
académico e pessoal da pesquisa. Apresenta a necessidade do equilíbrio entre os
fundamentos teóricos e as habilidades práticas da formação policial, articulados
através das práticas pré-profissionais e do estágio curricular supervisionado como
ideia central em volta da qual gravitam as opiniões e contribuições dos sujeitos da
pesquisa, no que respeita à natureza e o tipo de formação policial.
No mundo contemporâneo não há sociedade nem Estado dissociado da Polícia,
pois, pelas suas próprias origens, ela emana da organização social, sendo essencial
para a sua manutenção. Ao analisar a gênese do poder e do dever de Polícia, Leal
(1995, p.8) sustenta que “a necessidade de regular a coexistência dos homens na
sociedade deu origem ao poder de polícia”. Ela foi criada para assegurar a execução
das leis e das normas de conduta social, e assim objectivando garantir a liberdade dos
cidadãos (não os cerceando), salvaguardando a segurança dos homens de bem.
A posição, função e a importância dos actos da Polícia na sociedade são
analisados e discutidos por vários estudiosos sociais, dentre os quais Murph (1993,
p.19) que as enaltece nos seguintes termos:
O acto policial deve ser nobre, elevado e revestido de indiscutível conteúdo ético e moral, com o objectivo de buscar sempre o bem social. O polícia é o espelho da sociedade onde convive e trabalha. Para isso, deve ser o melhor exemplo dos demais servidores públicos, de forma que, trabalhe mais, erre menos. Deve ser sóbrio e compreensivo para os humildes e necessitados; forte e inflexível frente aos arrogantes e perversos para, de algum modo, em razão das necessidades e choques sociais, ter que assumir a posição de médico, algoz, confessor e amigo quando necessário.
A partir do trecho acima podemos aferir que o trabalho da Polícia, como
serviço público, e dos polícias, como servidores públicos, é marcado por uma série de
atributos de qualidade que, não sendo inatos, devem ser desenvolvidos por meio da
formação.
A discussão sobre a natureza e o tipo de formação policial impõe-nos um
desafio de extrema complexidade e susceptível de criar divergências opinativas quanto
2
à sua real conceituação e concretização. Pode-nos remeter, conforme disserta Cardim
(1998), à dificuldade que persiste na determinação do conceito de formação
“profissional”, devido à sua origem histórica recente, à evolução diversificada das
intervenções que a caracterizam, e à sua abrangência e diversidade que marcaram o
próprio conceito, dificultando a identificação do seu conteúdo e inibindo a formulação
de uma definição universal (CARDIM & MIRANDA, 1998, P.13).
A autora refere que entre as causas dessa dificuldade são, provavelmente,
essenciais a diversidade das intervenções que merecem a designação genérica de
“formação”, mas também o próprio curto período que passou entre a sua generalização
e o presente. A literatura especializada advoga que a formação profissional1, na qual se
enquadra a formação policial, ao contrário da formação “convencional”, viu apenas no
fim do século passado a generalização das suas modalidades mais estruturadas e
institucionais, e tem sido alvo, neste século, de múltiplas experiências e inovações.
A formação policial do nível superior é uma actividade recente, sendo a sua
história sobremaneira curta para permitir a universalização de conceitos e critérios,
sintoma seguro de uma actividade amadurecida e consolidada nos seus contornos,
orientações e modelos. Move-se entre as escolas e modelos policiais existentes no
mundo, acrescentam os mesmos autores.
Situamo-nos assim, quando falamos de formação policial do nível superior,
num domínio de actividade em que não há um modelo absoluto e generalizado que
permita uma caracterização e tipificação clara e unívoca, das intervenções que nela se
enquadram. Cardim & Miranda (1998, P.14), afirmam que não há, igualmente, um
suporte institucional que permita essa caracterização como existem, no que respeita ao
ensino, a “Escola” e a “Universidade”, instituições capazes de tipificar certos tipos de
intervenções educativas, concorrendo para empreender certas características e uma
visibilidade que é essencial para afirmar actividades cuja realidade se concretiza ao
nível das representações sociais e da acção de mais actores.
Segundo Bayley (2006, p.16), na história mais remota da universidade não há
registos sobre práticas acadêmicas em Polícia ou em segurança pública que tenham
levado a estudos exaustivos ou à constituição de disciplinas e cursos universitários em
1 Formação profissional, neste trabalho, é entendida no seu sentido mais abrangente, que inclui a Recomendação nº 150 da OIT (organização Internacional do Trabalho), aprovada na sexagésima sessão, em 4 de Junho de 1975: no que respeita ao quadro geral, consignando-se uma perspectiva abrangente que integra adolescentes e adultos ao longo de toda a sua vida, em todos os sectores de economia e a todos os níveis de qualificação.
3
ciências policiais. Por isso, constitui ainda matéria de acesos debates se existe ou não
uma “ciência policial”2, mas não há, de certeza, qualquer dúvida sobre o papel e a
importância da Polícia na sociedade.
Sobre essa matéria, Valente (2009) afirma que à Polícia cabe, como função, a
defesa e garantia dos direitos dos cidadãos, que se encontram consagrados como uma
das tarefas fundamentais do Estado de direito democrático, no sentido de garanti-los e
de fazê-los observar por todos. Assim, acrescenta o autor, impõe-se ao Estado uma
postura activa para fazê-los valer como elemento objectivo da sociedade, passando
essa postura activa pela actividade de Polícia à qual cabe a sua defesa e garantia que
passará também pela defesa da legalidade democrática e garantia da segurança das
pessoas e do patrimônio (VALENTE, 2009, p.119).
Em tese, conclui Valente (2009), a formação dos polícias deve favorecer a
compreensão do exercício da actividade de segurança pública como prática da
cidadania, da participação profissional, social e política num Estado democrático de
direito, estimulando a adopção de atitudes de justiça, cooperação, respeito à lei,
promoção humana e repúdio a qualquer forma de intolerância. A concretização desses
objectivos requer profissionais competentes e comprometidos (ibidem).
A prática desses profissionais requer destrezas operacionais que permitam a
execução de procedimentos com segurança, técnica e atitudes relacionadas com o
sentimento de humanidade, respeito aos direitos humanos e compromisso social,
fundamentos que asseguram o exercício profissional ético.
Na actualidade a formação policial transcende as preocupações internas dos estados,
inscrevendo-se no nível global e da alçada das Nações Unidas, mesmo reconhecendo-se
que não pode ser uniforme, por se reconhecer a importância do papel das polícias na
garantia dos direitos humanos na sua universalidade, conforme se constata na citação
que se segue, retirada do manual de formação em direitos humanos para as forças
policiais, desenvolvido pelas Nações Unidas.
A formação profissional, a formação permanente, os cursos de reciclagem e outros tipos de formação apropriados servirão para proporcionar a aquisição e manutenção da competência profissional necessária a todas as pessoas encarregadas de assuntos referentes aos “direitos humanos” (ONU, 2001, p.282).
2 É uma ciência social aplicada que estuda as actividades de preservação e restabelecimento da segurança pública, de modo que haja a pacificação e o convívio social democrático por meio das actividades de policiamento ostensivo e investigativo (SILVA, 2010, p.51).
4
A formação vinculada ao contexto real do trabalho poderá contribuir para este
necessário aperfeiçoamento das instituições de ensino, dos processos pedagógicos e das
próprias organizações laborais, isto é, das unidades e subunidades da Polícia – no csao
de Moçambique, na medida em que permite que os polícias se formem continuamente
nas actividades e no contexto que verdadeiramente constituirá o seu ambiente de
trabalho, garantindo, dessa forma, uma articulação permanente entre os fundamentos
teóricos e as habilidades práticas na formação policial.
A partir da crítica à formação policial sempre relacionada somente com o
campo teórico e organizada de forma cartesiana, buscamos alternativas teórico-práticas
para inverter essa situação recorrendo, por exemplo, a Schön (2000) que propõe um
novo desenho para o ensino e a aprendizagem, em que a teoria e a prática estejam em
constante interacção e equilíbrio. Com base nessa proposta, abre-se a necessidade e
oportunidade de pensarmos e discutirmos uma formação policial equilibrada entre os
fundamentos teóricos e as habilidades práticas requeridas para o desempenho da função
de oficial da Polícia.
As acções formativas de oficiais da Polícia deverão, por conseguinte, criar
condições para que os profissionais em formação possam, na sua futura condição de
profissional, posicionar-se de maneira crítica, ética, responsável e construtiva nas
diferentes situações sociais, utilizando o diálogo como importante instrumento para
mediar conflitos e tomar decisões. Devem permitir-lhes conhecer e dominar diversas
técnicas e procedimentos, inclusive as relativas ao uso da força e as tecnologias não-letais,
no desempenho da actividade de Segurança Pública, utilizando-as de acordo com os
preceitos legais (ONU, 2001, p.282).
Inspirados nas declarações supracitadas, neste trabalho discutimos as estratégias
que permitam que as acções formativas estejam coerentes e sintonizadas com a
realidade social e policial concretas. Isso implica a selecção estratégica e consciente,
por parte da instituição formadora, de conteúdos estreitamente relacionados com as
situações reais ou simuladas extraídas da prática profissional, ou seja, a transformação
de uma teoria e uma prática de referência em uma teoria e prática significativas,
conforme afirma Rios (2003, p.79), criando, assim, condições para que ocorra o
processo de construção e aplicação do conhecimento pelo polícia em formação e não
apenas a simples operação sobre os conteúdos. Isto é, criar condições para que o
5
formando desenvolva o saber fazer bem como sinônimo de competência profissional
(RIOS, 2003, p. 47).
São as situações problematizadoras que mobilizam os saberes e geram
esquemas de acção, habilidades pessoais que tornam as situações compreensíveis,
envolvendo esquemas de percepção, decisão e avaliação, contribuindo para que, neste
caso, os polícias em formação desenvolvam, como sustenta Barato (2003, p.47), o
analisar, o reflectir, o justificar, o aprender-fazendo, considerados competência
imprescindível na construção da autonomia intelectual e principalmente na actuação
policial em situações diversas.
Neste contexto, as práticas pré-profissionais e o estágio curricular, como
actividades curriculares, constituem oportunidades singulares para o estudante (cadete)
de licenciatura em ciências policiais articular e aplicar os conteúdos que foram
explorados (leccionados) pelos professores das diversas disciplinas da matriz
curricular, na medida em que é desafiado a participar (aprendendo fazendo) e formular
relatórios analíticos da sua participação que sirvam de ponto de partida para a
elaboração de planos de acção resultantes da reflexão sobre a sua acção.
Representam, ainda, uma oportunidade de o estudante verificar que não existem
receitas prontas e ajustadas para toda e qualquer situação e, por isso mesmo, o
exercício profissional requer elevada capacidade de exercitar a interpretação a
compreensão e a reflexão dos parâmetros teóricos em relação à prática observada
(LIMA & OLIVO, 2007, p.10).
As práticas pré-profissionais e o estágio curricular supervisionado, neste
sentido, correspondem a actividades estratégicas do curso de ciências policiais na
licenciatura (graduação), na medida em que favorecem o desenvolvimento de
mentalidade crítica, reflexiva e analítica dos problemas que afectam a função policial e
da identificação de oportunidades que podem fortalecer a instituição policial e a
segurança da sociedade. Além disso, ocupam espaços de intervenção técnica e
pedagógica concreta e, por isso mesmo, representam componentes fundamentais no
processo de formação do cadete e do docente-orientador. Podem, ainda, representar
oportunidades valiosas de o cadete diagnosticar problemas e identificar oportunidades
institucionais, para posteriormente sugerir e colaborar na implantação de acções
estratégicas para a corporação policial actuar de forma mais competente (ibidem).
Por essa razão, a realização do Estágio Supervisionado e das Práticas Pré-
Profissionais requer a existência de regulamento próprio, de modo que fique claro o
6
que os estudantes devem realizar, a razão de ser dessas actividades, como elas serão
desenvolvidas, obedecendo a qual cronograma e com que suporte teórico, conceptual e
metodológico.
Esta pesquisa teve como epicentro a constatação de que a formação superior em
ciências policiais realizada pela Academia de Ciências Policiais de Moçambique
(ACIPOL), é predominantemente teórica, não está articulada com a prática policial
real. Essa situação foi entendida por uma missão que fez avaliação externa da ACIPOL
como factor que dificultaria a inserção dos oficiais graduados nos processos policiais,
bem como sua (eventual) estigmatização pelos oficiais e agentes da polícia no activo.
Importa referenciar que não raro, esses diagnósticos quando não devidamente
aprofundados resultam em “diminuir o tempo da teoria” para “aumentar o tempo da
prática” nos currículos, quando, muitas vezes, a questão não é a do “excesso da teoria”
e sim a da má qualidade da teoria, que se toma como isolada da prática.
No entender crítico dos avaliadores que acima referimos, os currículos de
formação em ciências policiais na ACIPOL têm-se constituído em um aglomerado de
disciplinas, isoladas entre si, sem qualquer explicitação de seus nexos com a realidade
que lhes deu origem. Assim, sequer pode-se denominá-las de teorias, pois constituem
apenas saberes disciplinares, em cursos de formação que, em geral, estão de certo
modo desvinculados do campo de actuação profissional dos futuros oficiais da polícia.
Neles, as disciplinas do currículo assumem quase total autonomia em relação ao campo
de actuação dos profissionais e, especialmente, ao significado social, cultural, humano
da acção desse profissional.
A partir dessa apreciação colocam-se questões tais como: O que significa ser
oficial da polícia? Que oficial se pretende formar? Qual a contribuição da área policial
no sistema de Segurança Pública, de suas relações e de suas estruturas de poder e de
política? Quais os nexos com o conhecimento científico produzido e em produção na
área da Segurança Pública? São questões (teóricas) que, apesar deste estudo não poder
responder a elas cabalmente – porque não é seu objecto de estudo, há consciência de
que não são devidamente consideradas nos programas das disciplinas, nos conteúdos,
objectivos e métodos que desenvolvem.
Essa contraposição entre teoria e prática não é meramente semântica, pois se
traduz em espaços desiguais de “poder” na estrutura curricular, atribuindo-se menor
importância à carga horária denominada de ‘prática’. Na realidade, as práticas Pré-
Profissionais, na ACIPOL, simplesmente não são realizadas e o dito “Estágio” não
7
passa de simples visitas às unidades e subunidades policiais que acontecem sem
nenhuma estruturação, orientação pedagógica nem supervisão adequadas.
Para desenvolver a perspectiva de superação da dicotomia “teoria-prática”, é
necessário explicitar-se os conceitos de prática e de teoria e como compreendemos a
superação da fragmentação entre elas a partir do conceito de práxis, conforme
explanam Pimenta & Lima (2006, Pp.7-8) que apontam para o desenvolvimento do
estágio como uma atitude investigativa, que envolve a reflexão e a intervenção na vida
da instituição de formação, dos docentes e formadores, dos formandos e, por
consequência, neste caso, da corporação policial moçambicana.
Partimos do pressuposto de que o estágio e as práticas pré-profissionais se constituem como um campo de conhecimento, o que significa atribuir-lhe um estatuto epistemológico que supera sua tradicional redução à actividade prática instrumental. Enquanto campo de conhecimento, o estágio se produz na interacção dos cursos de formação com o campo sócio-profissional no qual se desenvolvem as práticas policiais. Nesse sentido, o estágio poderá se constituir em actividade de pesquisa (PIMENTA & LIMA,2006, pp.8).
Para fundamentar essa concepção, procedemos a uma análise dos diferentes
enfoques que o estágio tem recebido nos cursos de formação dos oficiais da Polícia em
Moçambique.
Enfoque da pesquisa
A pesquisa foi orientada empiricamente para a recolha e análise de opiniões e
percepções sobre a relação entre a teoria e a prática no curso de formação superior de
oficiais da Polícia ministrado pela Academia de Ciências Policiais (ACIPOL) de
Moçambique. Através de investigação de um grupo de oficiais da polícia no activo,
entre graduados da ACIPOL e outros em exercício de funções de comando, direcção e
chefia, procuramos esclarecer quais são as tarefas que predominantemente
desempenham os oficiais de nível dos graduados da ACIPOL nos principais ramos da
polícia: ordem pública (que inclui a polícia de trânsito), investigação criminal, e
administração e logística, e levantar suas opiniões sobre aspectos fundamentais de
formação superior de oficiais da Polícia, que afectem principalmente a sua formação
prática, de modo a fundamentar propostas de formação equilibrada entre os
fundamentos teóricos e as habilidades práticas, articulados a partir das práticas pré-
profissionais e do estágio curricular supervisionado.
8
Problematização da pesquisa
Neste item apresentamos um breve historial da origem do problema de
pesquisa, visando contextualizar a razão porque o enfoque da pesquisa é a recolha de
opiniões dos oficiais da Polícia, de diversos níveis, principalmente aquelas que afectam
o processo de formação na ACIPOL. O ponto de partida é o relatório de uma avaliação
externa que foi denominada missão back-stopping.
A missão back-stopping3
Nos anos de 2003 e 2004, a Academia de Ciências Policiais solicitou uma
avaliação externa com o objectivo específico de verificar se o currículo e o perfil de
saída dos graduados responderiam à demanda operacional e social, e os desafios do
trabalho da Polícia. Esses atributos foram entendidos como “relevância” do curso e a
avaliação foi denominada missão back-stopping .
Uma das principais constatações da avaliação foi que a formação oferecida era
predominantemente teórica, os procedimentos metodológicos usados na prática
pedagógica não estabeleciam uma ligação com as práticas policiais reais. Por isso, estava
iminente o risco de os graduados não desenvolverem uma base sólida de formação para
responderem às exigências da sua futura função, em termos de competências
profissionais requeridas. Essa inquietação viria a ser confirmada, mais tarde, pelo
diagnóstico interno que foi realizada em 2006, durante o processo de elaboração do
Plano Estratégico da ACIPOL (PEACIPOL). Uma das passagens do relatório
diagnóstico diz claramente o seguinte:
Na implementação do currículo de licenciatura da ACIPOL deparou-se com problemas tais como: leccionação de matérias não adequadas ao curso (pela extensão, abordagem e pela sua superficialidade), discrepância de métodos de ensino e tipos de avaliação dos estudantes utilizados pelos docentes, incumprimento de programas e dificuldades de controle do processo. Consequentemente abriu-se espaço para dúvidas sobre se o perfil de saída preconizado pelo currículo foi e está sendo conseguido ou não (PEACIPOL, vol.I, diagnóstico da situação interna, p. 11).
3 Back-stopping é uma palavra inglesa que provém da área desportiva onde significa “retaguarda segura”; por aproximação ao português e em tradução livre, significa criar retaguarda segura. Neste caso significa “Parar e criar uma retaguarda segura para evitar o colapso”.
9
O referido diagnóstico interno, na análise que efectuou, apontou também
problemas relacionados com as práticas pré-profissionais, sugerindo uma revisão
curricular que introduzisse inovações na abordagem das práticas pré-profissionais, nos
seguintes termos:
(...) Os outros aspectos de fundo que durante a implementação do currículo formal foram constatados como carecendo de avaliação e adaptação referem-se às precedências e ao posicionamento das práticas pré-profissionais (...). As práticas pré-profissionais são feitas fora do curso, não possibilitando, assim, que os docentes possam seguir, analisar e avaliar. O cadete só começa a ter contacto com a instituição policial quando está prestes a terminar o curso. Este facto tem implicações na ambientação do futuro profissional depois do curso. Impõe-se, pois, uma revisão curricular que traga inovações para a abordagem das práticas pré-profissionais (PEACIPOL. Vol. I, p. 12)4.
Em resposta às constatações da avaliação externa – missão back-stopping e ao
diagnóstico interno realizado no âmbito da elaboração do Plano Estratégico, as
autoridades da ACIPOL decidiram que deveriam ser adoptados e introduzidos métodos
interactivos de ensino, em especial a Aprendizagem Baseada na Resolução de
Problemas (PBL), crendo que essa seria a solução do problema levantado pela missão
de avaliação externa. Essas decisões foram incluídas no Plano Estatégico da ACIPOL
(PEACIPOL) para a década 2008 -2017, editado em 2007, como tarefas prioritárias e
imediatas.
No entanto, essas decisões não foram implementadas. O currículo continuou sem
alteração, o processo pedagógico também. O estágio continuou sendo realizado nos
moldes tradicionais de os formandos irem ter contacto com a prática depois das
chamadas disciplinas curriculares (teóricas). Portanto, às decisões não se seguiu uma
estratégia de sua implementação prática, e a inquietação sobre a vinculação dos
fundamentos teóricos com as habilidades práticas requeridas aos oficiais graduados pela
ACIPOL continua.
Para ter uma visão complexa e crítica sobre as inquietações levantadas quer pela
missão back stopping, quer pelo diagnóstico interno, este estudo se propôs investigar um
grupo de oficiais da Polícia (de diversas categorias e funções, incluíndo graduados da
ACIPOL) levantando suas opiniões sobre aspectos fundamentais da formação superior
de oficiais da Polícia de Moçambique realizada pela ACIPOL, que afectem
principalmente a sua prática, e fundamentar propostas de formação equilibrada entre os
fundamentos teóricos e as habilidades práticas, articulados a partir das práticas pré-
4 Plano Estratégico da ACIPOL – Volume I – Diagnóstico da Situação Interna. Pag.12
10
profissionais e do estágio curricular5 supervisionado, que permitam uma formação
vinculada à prática, capacitando os formandos para o cumprimento adequado das
exigências gerais e específicas do trabalho da Polícia no contexto de Moçambique.
Clarificando o problema da pesquisa
Partindo da análise das constatações e recomendações do relatório da avaliação
externa e do relatório do diagnóstico interno, conclui-se que a principal inquietação que
ambos apresentam se relaciona com a falta de vinculação da formação que a ACIPOL
oferece às exigências profissionais práticas de um oficial subalterno da Polícia no
contexto de Moçambique.
Apesar de que tais constatações, da avaliação externa e do diagnóstico interno,
são susceptíveis de uma série de questionamentos, um dos quais poderia ser, por
exemplo, a falta de clarificação das referidas “exigências práticas”, as autoridades da
ACIPOL assumiram-nas como procedentes e, por isso, na tentativa de prover solução
para os problemas levantados, decidiram introduzir os métodos interactivos no processo
de formação e projectar a revisão do currículo de licenciatura (graduação) em ciências
policiais. Essas decisões foram incluídas no Plano Estratégico da instituição para a
década 2008 – 2017 como actividades prioritárias (PEACIPOL, 2007, p.10). Porém,
não foi feito nenhum estudo que permita aferir se as medidas tomadas são ou não as
mais adequadas para resolver o problema da falta de vinculação da formação oferecida
com as exigências profissionais práticas dos oficiais da Polícia, ou uma estratégia que
permita sua implementação de facto.
Reconhecendo que a inquietação da vinculação da formação às exigências
práticas se relaciona directamente com o problema da relação entre a teoria a prática;
considerando que a discussão que se faz necessária é a da possibilidade de se
estabelecer identidade entre o conhecimento teórico e a prática, o que vale dizer, no
processo de trabalho, entre o prescrito e o real; considerando, também, que o que se
põe, portanto para a discussão, é a possibilidade de articulação entre estes dois pólos - o
teórico e o prático, que embora não se oponham, unificando-se através do pensamento,
guardam especificidades, ao estudo interessa, portanto, saber como promover, através
do estágio e das práticas pré-profissionais, este equilíbrio, posto que (...) a realidade
5 Pimenta e Lima (2010, p.24) consideram Estágio Curricular como conjunto de actividades cuja finalidade é integrar o processo de formação do aluno, futuro profissional, de modo a conhecer o campo de actuação como objecto de análise, de investigação e de interpretação crítica, a partir dos nexos com as disciplinas do curso.
11
não se deixa aprisionar pelo conhecimento teórico, o qual questiona, nega e supera
permanentemente, através do pensamento que se move entre os pólos do abstracto e do
concreto (BARATO, 2003, p.21).
Deste modo, para orientar todo o percurso de estudo, elaborou-se a seguinte
pergunta de partida: Como assegurar o equilíbrio entre os fundamentos teóricos e as
habilidades práticas da formação, articulados a partir das práticas pré-profissionais e
do Estágio curricular supervisionado, correspondendo assim às exigências
profissionais do oficial subalterno da polícia?
Objectivos da pesquisa
O objectivo geral é estudar o currículo e a metodologia de formação na
ACIPOL e investigar um grupo de oficiais da polícia (de diversas categorias e funções,
incluíndo graduados da ACIPOL), levantando suas opiniões sobre aspectos
fundamentais de formação superior de oficiais da Polícia de Moçambique realizada
pela ACIPOL, que afectem principalmente a sua formação prática, de modo a
fundamentar, numa perspectiva crítica, propostas de formação equilibrada entre os
fundamentos teóricos e as habilidades práticas para os oficiais, articulados a partir das
práticas pré-profissionais e do estágio curricular supervisionado.
Especificamente
1. Analisar a estrutura e a forma de organização das actividades formativas do
currículo formal do curso de licenciatura (graduação) em ciências policiais;
2. Clarificar o conceito de práticas pré-profissionais no contexto da formação policial,
sua posição e função no curríulo de licenciatura (graduação) em ciências policiais;
3. Analisar o processo pedagógico nas componentes teórico-práticas, das práticas pré-
profissionais, bem como as actividades realizadas no estágio supervisionado e
discutir a sua relação com a componente teórica da formação;
4. Investigar oficiais da Polícia de diversas categorias e funções, graduados da
ACIPOL e cadetes finalistas (que já realizaram o estágio curricular) sobre aspectos
fundamentais das práticas pré-profissionais e do estágio supervisionado;
12
5. Fundamentar as possibilidades6 de introduzir adaptações no currículo, que articulem
os fundamentos teóricos com as habilidades práticas requeridas aos oficiais a partir
das práticas pré-profissionais e do estágio curricular.
Resultados esperados
Apresentar referências críticas para inovações na formação realizada pela
ACIPOL, nos domínios do currículo, da metodologia e do estágio curricular
supervisionado, através da análise aprofundada das práticas pré-profissionais e do
estágio supervisionado como eixos articuladores de uma formação equilibrada entre os
fundamentos teóricos e habilidades práticas, visando capacitar os formandos ao
cumprimento adequado das exigências gerais e específicas do trabalho da Polícia no
contexto de Moçambique. Consideramos inovação no processo de formação em
discussão neste estudo nos termos em que Masetto (2010) a conceitua:
A inovação compreende necessariamente a introdução de uma novidade num sistema educativo que promova uma real mudança resultante do esforço deliberado e conscientemente assumido, fruto de uma acção persistente e integrada num processo dinâmico, que objective uma melhoria pedagógica (MASETTO, 2010, p.).
Espera-se que a discussão proposta possa contribuir para a articulação do
conhecimento teórico com as experiências práticas cotidianas, objetivando a produção
sistemática de conhecimento teórico e técnico-operativo na área da polícia e da
segurança pública no contexto de Moçambique.
Espera-se, igualmente, que os resultados da pesquisa possam contribuir para a
implementação e consolidação da interdisciplinaridade como eixo curricular dos
programas de formação profissional da Polícia, tendo em vista estimular e sedimentar
conhecimentos, valores e atitudes que possibilitem o manejo adequado e o desempenho
competente das acções cotidianas dos futuros oficiais da Polícia concernentes à
manutenção da ordem e da segurança públicas.
Aspectos que justificam o estudo: a inspiração do autor
6 MORA, J.F.(2001), Dicionário de Filosofia, Possibilidade é entendida na sua correlação com a noção de potência entendida como o poder que tem uma coisa de produzir uma mudança em outra coisa (p.2336). A possibilidade é assim, a potencialidade residente numa coisa de passar a outro estado. A potência pode ser activa, quando se refere à operação pela qual o acto se realiza, ou passiva, quando se refere ao complemento do ser pelo qual ele é atuado (p.2336).
13
A área de especialização profissional do autor foi o primeiro critério de
selecção do tema do presente estudo, pela sua familiaridade com os problemas da área
de formação policial no contexto de Moçambique, quer no sentido da necessidade de
maior fundamentação teórico-prática dessa formação, que seja equilibrada entre os
fundamentos teóricos e as habilidades práticas requeridas para o trabalho do oficial de
Polícia, quer no sentido da falta de estudos geradores de conhecimento mais
contextualizado e actualizado sobre a realidade da área da ordem e segurança públicas e
da formação policial. A relevância deste estudo atribui-se, assim, à contribuição que o
mesmo pretende trazer para a área de conhecimento do pesquisador, da formação
policial no contexto de Moçambique e no contexto global do conhecimento científico.
Contribuíndo para a socialização do conhecimento policial
“As políticas de segurança e as instituições cujas atribuições são manter e assegurar a segurança, estão confrontadas, hoje em dia, com novos paradigmas, designadamente o paradigma da prevenção, da mediação, da proximidade e das parcerias(...). A segurança só pode ser resolvida através de novas práticas sociais que se devem basear no diálogo, no contrato e que devem conduzir à coprodução”(OLIVEIRA, 2006, p.79).
A formação de pessoas para o exercício de profissões que, embora baseadas em
conhecimentos científicos, exigem a prática no contexto de incertezas e informações
dinâmicas e incompletas, como é o caso da área de Segurança Pública, implica que as
instituições vocacionadas à formação policial abandonem suas estruturas curriculares
inflexíveis e fechadas e adoptem novos métodos e técnicas pedagógicas, que antecipem
o contacto dos alunos com as situações reais que irão se defrontar no seu futuro
profissional.
A prossecução e garantia da Segurança (pública) é função da Polícia enquanto
braço prossecutor de uma das tarefas fundamentais do Estado de Direito Democrático,
cabendo àquela promovê-la, defendê-la e repô-la dentro dos princípios norteadores da
actividade policial enquadrantes do pilar dos estados modernos: o princípio do respeito
da dignidade da pessoa humana (Valente, 2009, p.105). Quanto melhor preparados
profissionalmente, os polícias, melhor cumprirão a sua missão de promover e garantir a
ordem, a segurança e a tranquilidade públicas, proteger a vida, a integridade das
pessoas e a sua propriedade, assegurando não só o normal funcionamento das
instituições e o respeito da legalidade democrática, mas também garantir a
14
materialização dos direitos e liberdades, sendo o bem-estar cultural e económico um
dos mais reclamados em uma sociedade organizada política, cultural e socialmente.
A pesquisa como princípio educativo e cognitivo nos conduz a uma nova
compreensão e visão sobre o polícia, pois à medida que o compreendemos e o
formamos como sujeito do conhecimento, percebemos que ele não deve desempenhar
uma função meramente técnica. Assim, o oficial da Polícia tornar-se-á um sujeito que
além de produzir seu próprio conhecimento, se tornará aquele que também é construtor
de seu próprio modo de ser e de fazer-se autonomamente à medida que ele produz o
próprio conhecimento.
À medida que o oficial da Polícia reelaborar o seu saber, ele transformará a
informação em conhecimento e isso o lançará na direcção da parceria e co-produção da
segurança. Nesse sentido, o polícia, no espaço da segurança pública, de sua formação
inicial e de sua formação continuada tornar-se-á aquele sujeito que assume a
responsabilidade ética em toda a sua actuação profissional. Segundo (Casali apud
Cappelletti, 2009, p.12), “toda a ética individual, económica, política, social, de
convivência cultural, justifica-se, em última instância, em função do valor da vida”.
Contribuíndo para a (re) construção do conhecimento
Tomando a pesquisa, no seu sentido amplo, como toda a actividade voltada para
a solução de problemas; como actividade de busca, indagação, investigação, inquirição
da realidade, é a actividade que vai nos permitir, no âmbito da ciência, elaborar um
conhecimento, ou um conjunto de conhecimentos, que nos auxilie na compreensão
desta realidade e nos oriente em nossas acções (Pádua, 2004, p.31). Nesse sentido, o
conhecimento que vai ser elaborado no exercício deste estudo, da reflexão sobre o que
se conseguir apreender através dele, dos resultados a que se chegar e das acções que
forem desencadeadas a partir desses resultados, constituirá uma contribuição não
apenas para o campo policial, objecto deste estudo, mas também para as discussões e
propostas actuais de que o conhecimento deve ser dominado e orientado por uma visão
transdisciplinar, uma visão que não se quebre nas fronteiras entre as disciplinas, uma
visão multidimensional. Esses aspectos não serão separados neste estudo, mas sim
considerados de forma que concorram para uma visão poliocular, conforme frisou
(MORIN in PÁDUA, 2004, p.28).
15
Espera-se que este estudo contribua para o entendimento de que a formação
policial precisa ir além da profissionalização específica, buscando como proposta de
graduação em ciências policiais a integração e a interdisciplinaridade.
Desse modo, alertar para a necessidade de se desenvolver uma proposta
curricular onde áreas profissionais e especialidades aprendem juntas, sobre o trabalho
em conjunto, e sobre as especificidades de cada uma na melhoria da qualidade da
segurança de pessoas e do património e na manutenção da ordem pública, como
projecto colectivo, segundo afirma THURLER (2001, p.59).
Espera-se ainda que o estudo contribua para mostrar a necessidade de o
processo de instrução e transmissão de conhecimentos, que predomina na formação
policial em Moçambique, incluir alternativas de aprendizagem onde aprendizes
(docentes e cadetes) descobrem significados para as informações pesquisadas,
reconstroem de modo crítico as informações e chegam a produzir conhecimento; onde
aprendizagem não quer dizer só desenvolvimento intelectual, mas desenvolvimento
também de habilidades, atitudes e valores, necessários para uma intervenção policial
que corresponda às expectativas e exigências de uma sociedade democrática.
Espera-se, igualmente, que o estudo contribua para o entendimento do currículo,
como um conjunto de aprendizagens que, sendo essenciais, específicas e
contextualizadas, cabe à instituição de formação garantir e organizar, e é assumido
como um projecto no qual participam activamente docentes e cadetes em sua
elaboração, execução e avaliação. É, portanto, um instrumento significativo para
desenvolver os processos de conservação, transformação e renovação dos
conhecimentos (MOREIRA, 2003, p.37).
Espera-se que os resultados da presente pesquisa contribuam, também, para que
docentes e especialistas em assuntos policiais reflictam sobre o corporativismo, para
considerar o que está acontecendo na sociedade, as mudanças que estão se operando, as
necessidades actuais da população em segurança, as novas tendências em formação
policial para a defesa da ordem democrática e as novas exigências das carreiras
profissionais, bem como as representações e os contactos com a realidade.
Também se espera que os resultados da pesquisa ao entrarem em contacto com
os intelectuais e interessados em estudar os fenómenos da ordem e segurança públicas,
os coloque numa perspectiva de perscrutar o horizonte em busca de novas
possibilidades, de desafiar os limites do estabelecido e de pensar uma formação policial
que responda às exigências actuais e futuras.
16
Contribuíndo para a (re) contextualização institucional
Pádua (2011, p.40) considera que “a aplicação prática de um tema de pesquisa
atende às necessidades de uma área específica de conhecimento (e de actuação
profissional), tem contribuído para o avanço do conhecimento científico e para a
solução imediata de problemas concretos.” Neste estudo consideramos também que a
aplicação prática acima referida constitui uma actualização do currículo que se espera
que gere mudança nas práticas dos actores ligados ao objecto actualizado ou inovado.
Masetto (2004) fundamenta essa relação, explicando a importância da visão
dialéctica do problema e a necessidade do envolvimento dos actores como grupo de
reflexão e de trabalho:
Inovação sempre é um processo, são projectos em movimento que se constroem por fases, em geral de forma dialéctica, integrando reflexões e práticas pedagógicas, levados à frente pela participação e dinamismo de seus integrantes, ansiosos por respostas a necessidades ainda não atendidas. Uma prática inovadora nunca começa do zero. Sua origem e desenvolvimento sempre estarão relacionados à trajctória de cada instituição, ao seu contexto histórico, ao seu projecto pedagógico e necessidades sentidas pelo grupo e para as quais as respostas existentes já não satisfazem visando melhores resultados para seu projecto pedagógico (MASETTO, 2004, p.6).
O relatório da avaliação externa e o relatório do diagnóstico da situação interna
da ACIPOL são, a título exemplificativo, alguns dos documentos que se debruçam
sobre a necessidade de introduzir mudanças no processo de formação da polícia. Nesse
sentido, espera-se que este estudo contribua também para estabelecer uma ligação entre
a aprendizagem e a actividade profissional no local de trabalho, pois os novos modelos
de inovação curricular encaminham-se para a redifnição da formação de profissionais
com perfis mais actuais e de acordo com as novas exigências da sociedade em
segurança pública, para a reconceptualização do papel das disciplinas como
componentes curriculares, para a integração das disciplinas e actividades curriculares
em função dos objectivos da formação que se realiza, para a interdisciplinaridade no
conhecimento, novas formas de ensinar e de aprender, flexibilidade na distribuição do
espaço e do tempo de acordo com o processo de formação em presença.
Práticas pedagógicas inovadoras são fundamentais para colaborarem com um
processo pedagógico inovador para o alcance dos objectivos de formação de um
profissional competente. A nova organização curricular, como resultado da pesquisa,
17
poderá estimular a vivência de experiências problematizadoras, reflexivas e
integradoras do conhecimento, alternando a vivência e a sistematização do
conhecimento produzido, contemplando o diálogo entre distintas disciplinas do
domínio do saber policial. Concordando com Masetto (2010, pp-37-38), (...) A
organização curricular não é construída a partir de disciplinas, mas sim a partir de
problemas profissionais contextualizados.
Os problemas e as necessidades identificados pela ACIPOL no seu currículo e
no respectivo processo pedagógico, poderão se transformar em objectivos e metas a
serem alcançados, de modo a deixar bem clara a resposta que se pretende dar. É a
intencionalidade do novo processo pedagógico que ganha consideração especial num
contexto actualizado com a explicitação dos objectivos de formação e dos “perfis” de
saída a serem perseguidos e que uma vez alcançados significarão as necessidades
identificadas respondidas e acções futuras perspectivadas.
Mais concretamente, o problema de articulação das áreas científicas que
corporizam a estrutura curricular do curso, o problema de articulação entre as
actividades teóricas e práticas, bem como a organização das práticas pré-profissionais
e do Estágio Supervisionado, poderão ser melhor comprendidos, recontextualizados e
resolvidos.
A autosuperação através da acção reflexiva
O Professor pertence, para além do seu estabelecimento de ensino, a uma rede
profissional e sócio-cultural complexa, às vezes a uma equipa pedagógica mais restrita
ou a uma rede reagrupante dos docentes que trabalham em outras instituições de
ensino. Convive e comunica-se com seus alunos e dialoga com pessoas que pertencem
ao meio envolvente da sua instituição de ensino. A cultura do estabelecimento não é,
portanto, a única que o inspira, as relações com que se preocupa não se resumem
àquelas que mantêm com seus colegas de trabalho, isto é, seus debates sobre as práticas
pedagógicas não se limitam ao que ocorre em seu estabelecimento. Entretanto a
instituição de ensino onde está vinculado é o seu local de trabalho, é onde passa a maior
parte de seu tempo e é dali que retira parte de sua identidade profissional. Portanto, há
razões bastantes para se afirmar que a cultura, a dinâmica, o clima e o funcionamento
de sua instituição têm grande influência na maneira como ele constrói o sentido de
conhecimento.
18
Considerando que participei do processo da criação da ACIPOL, como membro
da Comissão Instaladora, no processo de construção e de implementação do currículo
em vigor na ACIPOL, considero que desenvolvo este estudo como um actor reflexivo.
Nesse sentido, (Dewey apud Zeichner e Liston, 1996, p.9), define a acção
reflexiva como aquela que envolve consideração de qualquer crença ou prática de
modo activo, persistente e cuidadoso, à luz das razões que a apoiam e as
consequências a que a mesma conduz, acreditando que a reflexão não consiste numa
série de passos ou procedimentos a serem usados pelos profissionais, antes deve ser
tida como um modo holístico de conhecer e responder aos problemas, uma maneira de
estar como profissional (ibidem).
Assim, a vivência com os problemas, os dilemas e as incertezas que surgem no
quotidiano do profissional (Dewey, 1989), em simultâneo com as influências exercidas
pelos contextos (Van Manen, 1995; Eraut, 1995) e pelas relações sociais (Britzman
apud Zeichner e Liston, 1996), estimulam o aparecimento de novos saberes e,
consequentemente, a formulação de teorias e práticas do trabalho, entendidas como
uma fonte-chave da aprendizagem e actualização profissional.
A minha experiência docente no ensino superior inicia, como carreira, na
ACIPOL desde a criação da instituição em 1999. Integrei a Comissão Instaladora e,
mais tarde, desempenhei funções de coordenador pedagógico durante dez anos (2000-
2010), mas mantive sempre a docência como minha actividade nuclear. Participei em
grupos de discussão para a elaboração do currículo de licenciatura (graduação) em
ciências policiais e, mais tarde, prestei meu contributo directamente na implementação
do referido currículo formal aprovado. Participei, também, no processo de elaboração
dos currículos do bacharelato regular e do curso executivo, este último realizado na
modalidade de ensino à distância, que foram introduzidos em 2003 e 2005,
respectivamente. Nos anos 2003 e 2004, na qualidade de coordenador pedagógico da
instituição, tive a oportunidade de acompanhar as actividades da equipa de avaliação
externa denominada missão back stopping e de participar na discussão do relatório da
missão.
Igualmente, no ano 2006, participei nas equipas técnicas que realizaram o
diagnóstico interno no âmbito do processo de elaboração do Plano Estratégico da
ACIPOL (PEACPOL) para o decênio 2008-2017 que, depois de ser aprovado pelo
Governo de Moçambique, viria a ser editado em 2008. Do plano estratégico, como já
foi referido nos pontos anteriores, constam os resultados do diagnóstico interno, que
19
confirmam as constatações da missão de avaliação externa (back stopping),
relativamente às fraquezas de ligação entre o campo teórico e o prático no processo de
formação, bem como no domínio da metodologia. Essa trajectória tem, obviamente,
uma forte influência na forma como, a partir das vivências e convivências com outros
profissionais, internos e de outras instituições, encarei e assumi a necessidade e a
oportunidade de explorar e aprofundar o estudo sobre a inovação no processo de
formação policial, no contexto em que se expressa na ACIPOL, e na forma discursiva
como se repercute na corporação policial em Moçambique.
Preocupado em contribuir na procura de estratégias que ajudassem a instituição
a resolver os problemas levantados tanto pela avaliação externa, quanto pelo
diagnóstico interno, desenvolvi, em 2005, um estudo sobre a realização do estágio
curricular do curso de bacharelato em ciências policiais. O objectivo era de
compreender como poderiam ser organizadas as actividades de estágio realizado em
unidades e subunidades da PRM, com a colaboração destas como parceiras de
formação nesse âmbito. Os resultados desse estudo foram apresentados em dissertação
de mestrado em desenvolvimento curricular e instrucional, na Universidade Eduardo
Mondlane de Moçambique, em 2005. Partes dos resultados dessa pesquisa foram,
posteriormente, adoptados na ACIPOL para o estágio tanto do bacharelato, quanto da
licenciatura (graduação) em ciências policiais, nomeadamente as áreas de incidência
das actividades de estágio, a composição das equipas operacionais e os modelos de
relatórios dos orientadores do estágio e dos estagiários.
Em 2008, coordenei uma equipa de docentes da ACIPOL que fez uma reflexão
retrospectiva sobre o processo pedagógico, tomando como pontos de análise, entre
outros, os levantados pela missão back-stopping e pelo diagnóstico interno. Como
resultado nuclear, identificou-se uma série de quick-wins7 e elaborou-se um projecto de
revisão curricular constituído por duas partes fundamentais. A primeira parte se
ocuparia da avaliação detalhada do currículo vigente; a segunda parte, decorrente dos
resultados da primeira, se ocuparia da discussão e elaboração de proposta de emendas e
adaptações a serem introduzidas no currículo. A primeira parte do projecto, a avaliação
do currículo vigente, foi feita no ano 2010, com participação de consultores externos
nacionais. A realização da segunda parte do projecto, referente às emendas e
7 Quick-wins- Segundo a Collins Dictionary (2009, p.795) são acções ou actividades de realização imediata e com sucesso. Linguagem usualmente empregue em “planificação estratégica” para se referir a actividades prioritárias cuja realização não necessita de um projecto específico, são imediatas.
20
adaptações ou revisão curricular, ficou dependente dos resultados e recomendações da
primeira fase do projecto - a avaliação.
Deste modo, a necessidade e pertinência de aprofundar o estudo de alternativas
que possam ajudar a identificar e introduzir mudanças no processo pedagógico e nos
métodos de formação, como componentes de desenvolvimento curricular na ACIPOL,
parte de minha reflexão sobre a prática e experiências vivenciadas e induzidas, em
parte, pelas decisões das autoridades da ACIPOL. O sentido da mudança é uma
construção individual, colectiva e interactiva, que ninguém pode fazer em lugar dos
interessados, pois ela tem sua lógica própria e varia em função das culturas dos actores
e das relações sócio-profissionais em que estão envolvidos. Essa proposição, tratada
por Thurler (2001, p.26) como mudança projectada, que se subscreve na
autosuperação, fundamenta e consolida a relevância pessoal deste estudo.
Estrutura do trabalho
Estruturamos este trabalho em quatro capítulos. No capítulo I, Evolução da
Formação Policial em Moçambique: interface entre contextos, percepções e desafios,
apresentamos uma breve resenha histórica do surgimento e evolução do policiamento
público no mundo até aos nossos dias. Fazemos a ligação dessa resenha ao contexto em
que surge e evolui a Polícia moçambicana, fazendo o enquadramento do processo de
formação policial, desde a independência nacional, e a criação da ACIPOL objecto
desta pesquisa, nesse processo.
No capítulo II, Desafios Curriculares à Formação Superior da Polícia em
Moçambique, apresentamos a fundamentação teórica da pesquisa, discutindo os
conceitos e princípios teóricos relevantes para a compreensão dos fundamentos teóricos
e práticos e sua aplicação num currículo de formação policial de nível superior.
Apresentamos também a nossa compreensão dos princípios de ligação teoria-prática,
reflexão-acção, práticas pré-profissionais e estágio como práxis, aplicados à formação
policial.
No capítulo III, A percepção de comandantes e de oficiais da PRM acerca da
qualidade de formação superior dos oficiais, descrevemos o processo metodológico
idealizado no início do estudo, mas reformulado para ser adequado às necessidades que
foram emergindo ao longo da pesquisa, facto considerado normal em pesquisa
qualitativa de natureza crítica e reflexiva. Descrevemos os procedimentos
21
metodológicos seguidos, tanto na parte da pesquisa com enfoque mais quantitativo,
quanto na parte mais descritiva, ilustrando os passos seguidos desde a preparação, a
recolha, sistematização, análise e interpretação dos dados.
No capítulo IV; As possibilidades de articulação do equilíbrio entre os
fundamentos teóricos e as habilidades práticas da formação, a partir das práticas pré-
profissionais e do Estágio curricular supervisionado, discutimos e analisamos os
dados, sistematizando e interpretando as opiniões apresentadas pelos participantes da
pesquisa e, à luz da teoria estudada, identificamos as possibilidades de uma formação
policial equilibrada entre os fundamentos teóricos e as habilidades práticas. Neste
capítulo, discutimos um modelo curricular que favoreça uma formação policial
equilibrada e articulada por meio das práticas pré-profissionais e do estágio curricular
supervisionado. Além disso, desenvolvemos a ideia do estabelecimento de directrizes
curriculares nacionais para a formação policial.
Nas Considerações Finais sintetizamos, sem pretender fechar a discussão sobre
o equilíbrio entre os fundamentos teóricos e as habilidades práticas na formação dos
oficiais da Polícia, os aspectos que o estudo mostrou ser importante serem tomados em
consideração na formação de um oficial da Polícia no contexto de Moçambique, e
levantamos questões de reflexão que, em nossa opinião, são pertinentes para a
actualização do currículo da ACIPOL e do sistema de formação policial no seu todo.
22
CAPÍTULO I EVOLUÇÃO DA FORMAÇÃO POLICIAL EM MOÇAMBIQUE:
CONTEXTOS E RESENHA HISTÓRICA
Neste capítulo apresentamos o percurso da evolução da formação da Polícia de
Moçambique desde a Independência Nacional, passando pelos diferentes contextos que
exigiram a readaptação do trabalho policial, até aos dias de hoje. Como resenha
histórica, começamos por apresentar a génese do termo Polícia, sua evolução ao longo
dos tempos e em diferentes contextos sociais, visando mostrar como é que o
policiamento evoluiu de um serviço restrito para um seviço público de grande
importância social.
1.1.Contextos
A Polícia da República de Moçambique (PRM)8 é uma organização que está em
processo de transformação, visando melhorar a qualidade dos serviços que presta ao
público no âmbito da garantia da ordem, segurança e tranquilidade públicas. A
formação dos agentes da polícia, em particular dos oficiais, está no centro deste
movimento de mudança, enquanto condição e possibilidade de adequação dos recursos
humanos às exigências da missão da Polícia.
Meu ponto de partida foi a preocupação com uma questão que me parece
extremamente relevante e actual – a formação superior do oficial da Polícia em
Moçambique. Enquanto oficial da Polícia, com mais de trinta anos de experiência e
convivência9, tenho a intenção de contribuir para essa formação, que em minha opinião,
vem sendo feita em Moçambique de forma precária, o que me impele a buscar
alternativas de actuação. Essa preocupação foi se aumentando à medida que, para além
de desenvolver meu trabalho docente e entrar em contacto com a bibliografia
publicada, participava nas discussões realizadas em encontros, seminários sobre a
qualidade da educação, ben como conferências de ensino superior em Moçambique.
8 A Polícia da República de Moçambique (PRM), é a única força policial nacional existente em Moçambique, estruturada em diferentes especialidades de serviço policial, mas com comando único e centralizado. É dirigida por um Comandante Geral com categoria de Inspector Geral da Polícia, no sistema de postos e patentes da Polícia moçambicana. 9 Convivência, segundo Masetto (2010, pp. 37-38) significa viver com o outro, “querendo destacar a fundamentalidade de seu carácter de integração com a realidade”.
23
Na reflexão sobre a formação policial e o desempenho do oficial da Polícia
graduado da ACIPOL destaquei um núcleo específico, relacionado com a questão das
práticas pré-profissionais e do estágio curricular supervisionado, aspectos que, em
última análise, se relacionam com a qualidade do trabalho do futuro oficial: a questão
da competência do oficial subalterno, mais especificamente a das habilidades técnico-
profissionais requeridas para responder adequadamente às exigências do seu trabalho,
incluindo a presença de uma dimensão ética nessa competência.
A formação técnico-profissional surge como um instrumento não só de
apreensão de novos conhecimentos e reconversão de conhecimentos anteriormente
adquiridos, mas também como forma de se poderem modificar ideias, valores, formas
de comunicação, relações sociais e as próprias concepções de trabalho e relações nas
instituições policiais. Esse processo envolve uma cultura e valores construídos,
consolidados e desenvolvidos ao longo da evolução histórica de cada corporação
policial.
Como problema nuclear, a discussão sobre a utilidade da formação profissional
permanente, em geral, não é pacífica em todos os planos em que esta pode analisar-se
e, em especial, quanto ao respectivo impacto, pois, como observa Valente (2009,
p.124):
A actuação da polícia não se esgota no mero contacto com o cidadão na resolução dos problemas, pois se estende aos planos jurídico, social económico e cultural cuja interdisciplinaridade lhe garante uma natureza capaz de se entrelaçar na demanda de uma segurança e liberdade próprias de uma sociedade em crescimento no exercício da cidadania e cuja legitimidade emana de uma concepção clara de que a polícia não está ao serviço do poder pelo poder, mas ao serviço dos interesses da comunidade e do cidadão considerado individual e comunitariamente.
Como ponto de partida, julgamos importante apresentar o “entendimento” do
termo polícia, como noção básica em volta da qual todos os outros conceitos
predominantes neste trabalho são articulados, funcionando, também, como núcleo onde
gravitam os objectivos desta pesquisa.
1.2. O policiamento Público: breve resenha histórica
O policiamento público é uma evolução antiga, não moderna. Alguns autores da
literatura especializada (por exemplo, Bayley,2003; Bayley & Skolnik,2006 e Bittner,
1990) afirmam, até, que historicamente é tão antiga quanto a existência de
comunidades soberanas que autorizaram a coerção física e criaram agentes dirigidos e
24
mantidos por elas. De acordo com as descobertas, os egípcios e os hebreus foram os
primeiros povos da antigüidade a incluírem em suas legislações medidas policiais, que
eram cumpridas de formas rudimentares.
Como se pode depreender, na antiguidade, a Polícia, ainda em fase embrionária,
já se fazia notar, como forma coordenadora e zeladora da segurança da comunidade.
Um caso considerado bem documentado foi encontrado em Roma, começando
no ano 27 a.C., quando o Caesar (Octavius) se tornou princeps, adoptando o nome de
Augustus. Ele criou o cargo de praefectus urbs, preenchido por indicação dos postos
mais altos do Senado, com a responsabilidade de manter a ordem pública executiva e
judicialmente. A equipa do praefectus urbs, incluíndo o praefectus vigilium – chefe da
policia – eram agentes executivos da coerção física dirigidos pela autoridade política
suprema. Pela primeira vez, Roma teve uma polícia verdadeiramente pública
(BAYLEY, 2006, p.41).
Na Inglaterra foi criado o cargo de Xerife (em inglês sheriff), um termo derivado
de Shire-reeve (prefeito do distrito), que era nomeado oficial real pelos reis normandos
no século doze e recebia poder para cobrar impostos e dos Hundred men que não
capturavam os criminosos. Ele era responsável por organizar os Tithing men, ou
simplesmente Tithings e Hundredmen, ou simplesmente Hundreds, inspeccionar suas
armas e agrupar os posse comitatus, que consistiam em todos os homens saudáveis com
mais de quinze anos. O oficial de Polícia Inglês dos dias actuais é o homem de Tithing
men medieval, mas agora com estatuto de funcionário público (BAYLEY, 2003, p. 42).
Na Inglaterra medieval também foi desenvolvido um posto importante para o
cumprimento da lei, um oficial de Polícia especializado – o Constable, agente
executivo da lei, agindo em nome do rei sem ser remunerado.
Existe, portanto, uma série de conceitos ligados à função e aos agentes da
manutenção da lei e ordem que, na contemporaneidade, caracteriza o policiamento
público.
Deixando de lado a confusão conceptual sobre quem era o polícia durante os tempos feudais, os únicos agentes de manutenção da lei na Inglaterra, antes do século dezoito, que podiam ser considerados públicos eram os Xerifes e os juízes comerciais londrinos. Em 1735 começou o primeiro de uma série de experimentos para a nacionalização da Polícia (ibidem).
Na França, a primeira Polícia pública foi o superintendente de Paris, um cargo
criado pelo Rei Louis IX da França, com sede no Chatelet, que era também a prisão da
cidade (Bayley, 2003, p.43). Três séculos mais tarde, foi criado o posto de Intendant,
25
um oficial com responsabilidade de manter a ordem, administrar a justiça e colectar
impostos nas trinta e duas províncias (généralités) da França. Em 1667 um
representante especializado em Lei e Ordem, o Tenente Geral da Polícia, foi criado em
Paris. (ibidem).
Na Prússia, pedra angular da unificação alemã em 1871, empregados civis de
alto nível como o Landrat e o Steuerrat, tinham poderes policiais, embora fossem
apenas de uma autoridade administrativa geral. O primeiro oficial de Polícia pública
especializada foi o director de polícia de Berlim, indicado em 1742, conforme relata
(Emerson apud Bayley, 2003, p.44). O autor refere ainda que Não existem registos
consistentes sobre o surgimento de grupos de polícia pública nos restantes países do
continente europeu antes do século dezanove. Assim, podemos aferir que instituições
policiais modernas, em sua maioria nas cidades, coexistiam com instituições feudais,
uma vez que nesse período ambos os sistemas eram parte constituída da autoridade
soberana.
Na Rússia, a primeira Polícia pública estatal, os temidos Oprichniki, foi criada
por Ivan, o Terrível, em 1564 (Florinsky apud Bayley, 2003, p. 44). Os Oprichniki
tornaram-se, mais tarde, a polícia secreta do Czar, além de controlar mercados, estradas
e outros locais públicos. Pedro, o Grande, criou oficialmente uma Polícia pública
especializada em São Petersburgo em 1718.
Na China e na Índia, os altos e baixos do policiamento público se estenderam
por mais de mil anos. Quando dinastias poderosas criavam grandes impérios,
invariavelmente surgiam oficiais de Polícia – em cidades, como fizeram os Mauryas e
Moguls, em distritos (hsien), como fizeram os Tangs e Mings (Basham apud Bayley,
2003, p.44). Quando o poder imperial declinava, voltavam às instituições policiais não-
oficiais, baseadas em pequenas comunidades voluntárias ou em obrigações de
colonização. Uma inequívoca Polícia pública não era dominante na Índia até a
aceitação da Lei da Polícia Indiana em 1862 e a abolição dos Estados principados em
1948-1949, e na China até o Partido Comunista criar um novo e eficaz centro imperial
em 1949 (BAYLEY, 2003, p.45).
Nos Estados Unidos da América, o policiamento público chegou com os
primeiros colonizadores. Nova Amsterdã, que mais tarde se tornaria Nova Iorque, criou
uma vigília burguesa em 1643, um ano depois de ter sido fundada, mas não pagava por
seus serviços até 1712 (Bopp e Schultz apud Bayley, 2003, p.45). Comparativamente
aos outros países acima mencionados, a polícia pública tornou-se importante nos
26
Estados Unidos quase ao mesmo tempo que na Inglaterra, um pouco depois da França,
muito depois da Índia ou China, e aproximadamente na mesma época que na Prússia e
Rússia. No Oeste Americano foram criados grupos de manutenção da ordem, as
posses, não remunerados, que permaneceram como o principal suporte da Lei e Ordem
até o Século XX.
Em Portugal, os registos sobre a história do policiamento público são mais
recentes que noutros países da Europa e da Península Ibérica. Esse facto tem a ver,
entre outras razões, com o período em que Portugal foi reconhecido internacionalmente
como Estado Soberano. As primeiras medidas com vista ao estabelecimento da Ordem
Pública remontam desse período de “instabilidade” provocada pelos confrontos
militares e de procura de centralização régia da Coroa.
D. Afonso Henriques começou a usar o título de Rei de Portugal em 1139, após
a vitória sobre os muçulmanos na batalha de Ourique. Porém, faltava a Portugal ser
reconhecido internacionalmente como Estado idôneo. Por isso, o “conquistador” (D.
Afonso Henriques) ofereceu a sua vassalagem à Santa Sé. Após um longo período de
negociações, o Papa Alexandre III, através da bula Manifestis probatum est,
reconheceu o monarca português como “rei dos portugueses”, em 1179 (COSME,
2006, p. 23).
Em termos de marco histórico mais significativo, a literatura sobre a história dos
primórdios do policiamento público em Portugal indica que, em 12 de Setembro de
1383, o Rei D. Fernando criou os Quadrilheiros, que teriam como missão específica
zelar pela segurança ulissiponense10.
Este corpo estender-se-ia aos principais aglomerados urbanos do País e, apesar de passar por muitas vicissitudes e dificuldades, manter-se-ia, durante muito tempo, como o principal e, por vezes, único agente zelador da segurança nas diversas comunidades citadinas (COSME, 2006, p.251).
Cosme (2006, p.35) menciona que os Quadrilheiros tornaram-se os agentes
principais na luta contra os prevaricadores do convívio comunitário pacífico. Porém,
como o cargo não era remunerado e as funções eram pouco atraentes, em 1418,
conseguiram ficar isentos de efectuar rondas nocturnas, missão que voltou a estar a
cargo dos homens da alcaidaria. Nem assim, menciona o autor, se conseguiu atrair
10 Referente à natural ou habitante da capital portuguesa, Lisboa. O mesmo que lisboês, lisbonense, olissiponense, ulissibonense. Em http://nossalinguaportuguesa.com.br/dicionario/olissiponense/, acesso aos 15-03-2013.
27
gente para estas funções. Os lugares de Quadrilheiro de Lisboa continuavam por
preencher.
Aos Quadrilheiros sucedeu a criação do cargo de Intendente Geral de Polícia da
Corte e dos Reinos aos 25 de Junho de 1790. Esta instituição vigorou até a criação do
Corpo de Polícia Civil em Lisboa e outro no Porto, por Lei de Luís I, de 2 de Julho de
1867.
Visando consolidar a polícia portuguesa no (então) ultramar, nos finais do
século XIX foram criados corpos da Polícia Cívica em Moçambique e Angola. Não
foram incluídos na categoria de Polícia de Segurança Pública pela reforma de 1927,
tendo competências inerentes à Polícia Internacional e à Polícia de Investigação.
Apenas em princípios de 1961 lhes foram atribuídas funções próprias da Polícia de
Segurança Pública (COSME, 2006, p.196).
A emergência do alargamento das funções próprias da Polícia de Segurança
Pública (PSP) às províncias ultramarinas deveu-se ao aparecimento dos designados
“movimentos autonomistas” na maioria das então províncias ultramarinas portuguesas,
por exemplo, em Moçambique, Angola e Guiné (ibidem).
No continente africano, embora com poucos estudos publicados, também há
registo de que ao longo da história foram constituídos corpos de milícia com função
específica de Polícia, dando a entender que ali o Estado estava prioritariamente
preocupado com a segurança pública.
Na obra Historie de la Police, (Marcel Le Clerè in Cosme, 2006, p. 23).
afirma que
O primeiro exemplo da Polícia que conhecemos, responsabilizada justamente pela vigilância de rua e pelas funções de pretório, milhares de anos antes da nossa era, foi o do Egipto. Essa Nação, antes mesmo de existirem Babilônia, Atenas e Roma, estava dividida em 42 regiões administrativas, confiadas cada uma a um delegado directo de Faraó: o monarca, que reunia as funções de magistrado administrativo e judicial era assistido por um chefe de polícia, simultaneamente, juiz de instrução, policial e carrasco (MARCINEIRO, 2007, p. 18).
O mesmo autor acrescenta ainda ter encontrado nas legislações dos antigos
egípcios e hebreus prescrições nitidamente policiais. Em cada tribo hebréia, segundo o
autor, eram designados Intendentes de Polícia, os SARPAKALEK, para policiarem os
súbditos e os víveres, e a cidade de Jerusalém, para que o policiamento fosse mais
eficiente, foi dividida em quatro sectores, chamados quarteirões.
28
Os exemplos acima citados ajudam a compreender como é possível determinar
se um policiamento público existiu ou existe numa determinada era ou local. O carácter
público, uma característica das forças que dominam o policiamento nos dias de hoje,
não é uma invenção moderna. Sua antiguidade não é normalmente reconhecida,
especialmente devido à confusão a respeito do conceito em si. Sustentando essa ideia
Bayley aponta uma segunda razão: a história tende a diminuir o valor dos sistemas
políticos antigos, sistemas que deram lugar a outros centros de poder, especialmente
se estes novos centros ainda existem nos dias actuais (BAYLEY, 2003 p.45).
Noutros continentes e países que foram objecto de conquistas e consequente
colonização das potências ocidentais, como é o caso do continente africano, a história
da Polícia (dos países colonizados) apresenta, geralmente, dois marcos principais: o
primeiro é o da Polícia estabelecida pela potência colonizadora, uma Polícia repressiva
que servia os interesses do colonizador; o segundo, é o da Polícia estabelecida a partir
do período da descolonização, variando de país para país, conforme foi levado a cabo o
processo de descolonização.
Em Moçambique, então colónia portuguesa11 desde a Conferência de Berlim12,
o primeiro corpo de Polícia pública, denominado Corpo de Polícia de Lourenço
Marques, foi criado por Decreto do Governo Central de Portugal de 18 de Agosto de
1887. Essa medida tinha em vista a passagem da então Vila de Lourenço Marques
(actual Maputo-capital de Moçambique) à categoria de cidade. Essa força constituída
por um total de 158 homens, sob comando de um Major, desembarcou na então
Lourenço Marques, em 15 de Maio de 1888.
Sofrendo reorganizações sucessivas, em 1893, o seu efectivo foi elevado a 171
unidades e, dois anos depois, beneficiou do aumento de 30 auxiliares. Por Decreto de
20 de Março de 1895, do Comissário Régio António Enes, foi lhe confiada mais ampla
missão e a sua orgânica sofreu nova alteração: assumiu o cargo de fiscalização
aduaneira, foi-lhe reduzido o número de oficiais e aumentado o de praças e passou a
11 Desde a Conferência de Berlim até 1974 (no entanto a presença portuguesa em Moçambique se registou desde 1498). 12 Foi um evento que ocorreu entre 19 de Novembro de 1884 e 26 de Fevereiro de 1885 com a participação de Itália, França, Grã-Bretanha, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, Alemanha, Império Otomano (atual Turquia), Portugal, Bélgica, Holanda, Suécia, Rússia e Império Austro- Húngaro (actuais Áustria e Hungria). A Conferência foi proposta por Portugal e organizada pelo Chanceler Otto Von Bismarck da Alemanha. O objectivo do encontro foi definir como esses repartiriam entre si os territórios africanos.
29
denominar-se Corpo de Polícia E Fiscalização de Lourenço Marques, denominação esta
que durou até 1902, data em que voltou a designar-se Corpo de Polícia de Lourenço
Marques.
Em 1903, a designação da corporação foi novamente alterada e passando a
denominar-se Corpo de Polícia Civil, constituído por 1 comissário, 1 escrivão, 2 chefes
de secção, 6 chefes de esquadra, 80 guardas europeus e 60 auxiliares.
Por alturas de 1910, com a mudança do regime político em Portugal, surgiram
na ex-Lourenço Marques as primeiras disputas partidárias em que a Polícia, sem que
alguma culpa tivesse, foi envolvida num ambiente desfavorável.
Por isso, o Governo Central alarmado por notícias chegadas à Metrópole sobre o
perigo de alterações da ordem em Moçambique, decretou em 1911 a criação de um
conjunto policial denominado Guarda Cívica de Lourenço Marques, constituído por
agentes europeus recrutados no Exército, na Guarda Fiscal e na Guarda Nacional
Republicana, destinado a assegurar a ordem na então Província, guarda esta que, por
força da legislação que a criou, podia agregar o pessoal do Corpo da Polícia Civil e da
Guarda Fiscal, anteriormente constituído, e abrangê-lo pelo seu regime disciplinar.
Assim se manteve esta miscelânea até 1913, incumbida de serviço de
policiamento e segurança, ano em que foi extinta e deu lugar a criação da Guarda
Republicana , à qual foi incumbida a missão atribuída à Guarda Cívica e conferido o
dever de ocupação territorial e policial dos caminhos, povoações, propriedades rurais,
emigração e caça.
Todavia, continuava de pé o Corpo da Polícia Civil de Lourenço Marques,
graças à Portaria nº 2223, de Novembro de 1914, que, mantendo-a em vigor, evitou a
sua absorção pela Guarda Republicana. Continuou até 1916, quando em Portaria de 10
de Fevereiro, mereceu a atenção do Governador Geral, que, em atenção ao seu passado,
o submeteu à apreciação do Conselho, sendo deliberado que fosse melhorado com a
criação de uma Secção de Polícia Judiciária, constituída de 1 chefe, 2 cabos, 12 guardas
e 12 auxiliares, incumbida do julgamento de vários delitos e transgressões.
Ao alargamento da área citadina e o aumento da respectiva população,
correspondeu o aumento deste Corpo que, por altura de 1939, se compunha de um
efectivo de 367 homens.
Nas primeiras décadas do século XX, a par deste crescimento, outros núcleos
policiais foram criados e distribuídos por diferentes locais da então Província, sendo,
30
em 1913, no Decreto nº144, publicado o Regulamento de Serviços Policiais para o
Concelho do Ibo, extensivo a Porto Amélia (actual Pemba).
Assim se fez a distribuição de vários Corpos de Polícia pela então Província,
independentes uns dos outros, num sistema que se manteve até 1943, quando, pela
publicação do Decreto n.º 32819, se criou o Corpo de Polícia Civil da Província De
Moçambique, que substituiu o Corpo de Polícia Civil de Lourenço Marques, reunindo
sob um comando-geral, todas as Polícias que na data existiam em Moçambique.
Depois, embora já nessa data tivessem sido imperiosas tais medidas e urgisse,
portanto, uma remodelação que viesse assegurar o funcionamento dos serviços de
molde a permitir à Polícia uma ocupação conveniente, que garantisse o sossego e a
segurança dos interesses políticos, sociais e económicos de Portugal em Moçambique,
só mais tarde foi possível a sua concretização com o envio, da Metrópole, como
reforço, das 5ª, 6ª e 8ª Companhias Móveis de Polícia, criadas para o efeito, tendo as
duas primeiras desembarcado em Lourenço Marques a 11 de Setembro de 1961 e a
última em 28 de Junho de 196513.
Logo em 19 de Outubro do mesmo ano (1965), e dentro do mesmo espírito, o
Ministro do Ultramar, pelo Diploma Legislativo n.º27, aprovou o Estatuto do Corpo de
Polícia de Segurança Pública Da Província De Moçambique, que veio estatuir e
reajustar organicamente a vida da Corporação com a criação do Comando-Geral,
Secções e Serviços, Comandos Distritais e Comissariados. Esta polícia vigorou até
Maio de 1975, altura em que, observando o previsto no artº 11 dos Acordos de Lusaka,
foi criado o CORPO DE POLÍCIA DE MOÇAMBIQUE (CPM), através do Decreto-
Lei nº 54/75, de 17 de Maio, cuja evolução é apresentada no ponto que se segue e que
está directamente ligada com a criação da Polícia da República de Moçambique (PRM).
1.3. Evolução da Polícia da República de Moçambique no período pós
independência nacional - Sinopse histórica: do CPM à PRM
A evolução da história da Polícia moçambicana pode ser dividida em três
períodos principais, nomeadamente o período colonial (até 1974-ano dos Acordos de
Lusaka), o período pós-independência nacional (a partir de 1975 até 1992) e o período
pós-Acordo Geral de Paz (a partir de 1992). Este estudo aborda com mais detalhes as
13 Nessa altura, em 1965, já tinha sido iniciada, em 1964, a luta armada de libertação nacional dirigida pela Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), fundada em 1962.
31
transformações que se operaram relativamente ao processo de formação dos oficiais da
polícia no período pós-Acordo Geral de Paz e avança propostas para a melhoria do
processo de formação superior de oficiais da Polícia moçambicana. No entanto,
apresenta uma breve retrospectiva da história da Polícia moçambicana cuja fonte é o
preâmbulo ao Plano Estratégico da Polícia da República de Moçambique (PEPRM,
2003, pp. 27-32), e serve de pressuposto para se compreender como é que iniciou e
evoluiu a formação dos agentes e dos oficiais da Polícia de Moçambique e que marcas
conceptuais e ideológicas se mantêm até aos dias actuais.
A trajectória histórica da Polícia moçambicana está intimamente ligada ao
processo da Luta Armada de Libertação Nacional. Nas zonas libertadas14 foram
instituídas as milícias populares que tinham como missão a realização de funções que
hoje estão acometidas à PRM, em parte, tendo em consideração as diferenças
evolutivas e contextuais que caracterizam as duas forças, a milícia e a Polícia.
Foi com esse fundamento que, segundo Chissano,15 aquando das negociações
entre a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) e o Governo Português saído
do 25 de Abril de 197416, a questão da polícia mereceu um tratamento específico. Deste
modo, a cláusula 11 dos Acordos de Lusaka17 preconizava a criação de uma Polícia
moçambicana que teria como missão, em estreita colaboração com as restantes Forças
Policiais que então existiam no país, a manutenção da ordem e a segurança das pessoas
e seus bens.
Com efeito, nos termos da primeira parte da cláusula 11 dos Acordos de Lusaka
se estabeleceu que “o Governo de Transição criará um Corpo de Polícia encarregado de
assegurar a manutenção da ordem e da segurança das pessoas (Boletim oficial n° 113, I
Série, 1974)”. Na sequência, foi criada a primeira corporação policial não colonial
denominada Corpo da Polícia de Moçambique (CPM).
14 Zonas libertadas – territórios que durante a luta de libertação nacional de Moçambique eram conquistados e ficavam sob controle e administração dos guerrilheiros da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO). 15Intervenção de Joaquim Alberto Chissano, antigo Presidente da República de Moçambique, Professor Emérito da ACIPOL, na Primeira Conferência Nacional sobre as Linhas de Pesquisa da ACIPOL, Maputo, 2005. 16 Refere-se ao Governo saído do Golpe de Estado de 25 de Abril de 1974 em Portugal, que derrubou a ditadura fascista. 17 Acordo de cessar-fogo e de independência total e completa de Moçambique, assinado entre o governo colonial português e a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) em Lusaka, capital da República da Zâmbia, aos 7 de Setembro de 1974.
32
1.3.1. O Corpo da Polícia de Moçambique – CPM
O Governo de Transição, na aplicação da cláusula 11 dos Acordos de Lusaka,
decretou através do Decreto-Lei n° 54/75, de 17 de Maio, a criação de uma Polícia
directamente dependente do Ministério da Administração Interna, com a designação de
Corpo de Polícia de Moçambique — CPM. Note-se que esta corporação é criada antes
da declaração oficial da independência nacional ocorrida a 25 de Junho de 1975.
A criação do CPM em si não significou logo à partida o desfazer-se das
estruturas coloniais, foi o primeiro passo de um processo que se foi completando
gradualmente, primeiro através de integração de novos efectivos provenientes dos
guerrilheiros da FRELIMO18, sem formação policial, e depois a reestruturação
completa da sua orgânica e do seu funcionamento, para que ela se tornasse
verdadeiramente diferente da Polícia colonial nesses domínios e no da sua orientação
político-ideológica. Assim, foram integrados nela alguns batalhões de guerrilheiros das
FPLM (Forças Populares de Libertação de Moçambique) que se juntaram aos efectivos
que, de forma voluntária, transitaram da Polícia de Segurança Pública (PSP) para esta
nova força.
Em Outubro de 1974, um grupo considerável de jovens provenientes de todo o
país, respondendo à mobilização da FRELIMO, foram enviados para formação no
Centro de Preparação Político-militar de Nachingweya19 com o apoio da Polícia da
República Unida da Tanzânia. Em Fevereiro de 1975, alguns grupos foram enviados
para os mesmos fins para a então República Democrática Alemã e outros ainda
permaneceram em Moçambique, tendo sido treinados conjuntamente pelos instrutores
das Forças Populares de Libertação de Moçambique (FPLM) e da Policia Portuguesa
em Lourenço Marques, hoje Maputo, e no Dondo, em Sofala. (CHISSANO, 2005, p.4).
Nesse contexto, teve início o processo de formação do efectivo daquela que
seria a primeira Polícia integralmente moçambicana. Esse processo teve lugar tanto no
interior do país, designadamente em Maputo e Beira, como no exterior, através do
envio de cidadãos nacionais para a Repúblicas da Tanzânia e da Zâmbia, em Àfrica, e
Democrática Alemã, na Europa (PEPRM, 2003).
A dinâmica político-social do País no período pós-independência, resultante da
opção pelo socialismo científico como via de desenvolvimento e da necessidade de
18 Frente de Libertação de Moçambique 19 Nachingweya, Base principal da FRELIMO na Tanzânia, durante a Luta de Libertação Nacional.
33
adequar todos os processos sócio-económicos aos princípios dessa via, e catalizada
pelo facto a FRELIMO ter optado pelo Marxismo-Leninismo como filosofia de
desenvolvimento político-social, ditou transformações rápidas no seio da Polícia que
teve de ser readaptada ao novo contexto do sistema político socialista, em termos de
estrutura organizacional, ideologia e filosofia de funcionamento. Foi nesse contexto
que o CPM foi extinto e em sua substituição foi criada a Polícia Popular de
Moçambique (PPM).
1.3.2. A Polícia Popular de Moçambique – PPM
Com o evoluir das estruturas do Governo resultado da proclamação da
independência nacional, as outras forças policiais que até então existiam em
Moçambique foram também objecto de tratamento específico, no sentido de as tornar
verdadeiramente moçambicanas. Nesse contexto, foram extintas e em seu lugar novas
foram criadas. Designadamente através do Decreto n°25/75, de 18 de Outubro, a
Polícia Judiciária (PJ) foi extinta e em seu lugar criada a Polícia de Investigação
Criminal (PIC); a Guarda Fiscal (GF) foi extinta e em seu lugar criada a Polícia
Aduaneira (PA); a Polícia dos Caminhos de Ferro de Moçambique (PCFM) foi extinta
e em seu lugar criada a Polícia de Transportes e Comunicações (PTC). Todas essas
forças passaram a funcionar na dependência directa do Ministério do Interior, tal como
já sucedia com o CPM. (BR nº 60, I Série, de 26 de Maio de 1979).
O III Congresso da FRELIMO determinou a introdução de emendas
substanciais à Constituição da República Popular de Moçambique, o que ocorreu
através da Lei n° 1 1/78, de 15 de Agosto, que optou pela orientação política Marxista-
Leninista para edificar uma sociedade socialista, através de uma forma de Estado de
ditadura da aliança operário-camponesa (Documentos do 3º Congresso da FRELIMO,
1977, p.147)20.
Assim, procurando responder à nova concepção do poder do Estado que se
definia pela sua natureza de classe, impôs-se a reestruturação das forças policiais. Nesta
perspectiva, através da Lei n° 5/79, de 26 de Maio, foi criada a Polícia Popular de
Moçambique (PPM), que funcionou no período 1979-1992. Nesta altura, funciona um
comando único da polícia que dirige efectivamente todo o sistema policial integrando
20 Documentos do 3º Congresso da FRELIMO, 1977: O Partido e as classes trabalhadoras moçambicanas na edificação da democracia popular. Relatório do Comité Central ao 3º Congresso.
34
os comandos nacionais de Polícia de Protecção (PP), Polícia de Trânsito (PT), Polícia
de Transportes e Comunicações (PTC), e Polícia de Investigação Criminal (PIC).
A PPM foi criada como um Órgão do poder unitário do Estado, ao serviço da
aliança operário-camponesa, cujo objectivo era o de garantir a ordem, segurança e
tranquilidade públicas, o respeito pela Constituição, a protecção das conquistas
revolucionárias, da paz e da revolução, prevenindo, investigando, reprimindo as
violações da lei e ordenando a prisão dos agentes dos crimes (Lei nº 5/79, art. 1 nº2).
Esta Polícia funcionou no período de 1979 – 1992, altura em que a opção pela
economia de mercado e a adopção de um Estado de Direito fundado na democracia
multipartidária impuseram o abandono do sistema socialista. Nesse contexto, no
processo de adequação dos órgãos e das estruturas das forças de defesa e segurança,
incluindo a Polícia, à nova realidade da sociedade e do Estado, foi extinta a PPM e
criada a Polícia da República de Moçambique (PRM).
1.3.3. A Polícia da República de Moçambique – PRM
Como já foi referenciado acima, a designação e a estrutura orgânica da Polícia
viriam a sofrer uma nova alteração, devido à nova revisão da Constituição da República
de 1990 e ao Acordo Geral de Paz (AGP).21
Mencione-se que em Moçambique um ano depois da independência nacional,
isto é, em 1976, iniciou uma guerra civil interna desencadeada pela Resistência
Nacional de Moçambique (RENAMO), actualmente segundo maior Partido Político de
Moçambique depois da Frelimo, contestando o regime socialista de Governo adoptado
pelo então partido único, a Frelimo. Essa guerra viria a terminar 16 anos depois, isto é,
em 1992, com a assinatura do Acordo Geral de Paz acima referido, como reflexo da
revisão da Constituição em 1990, introduzindo um novo regime político de democracia
multipartidária e de Estado de Direito.
É assim que a Assembleia da República (AR), pela Lei n° 19/92 de 31 de
Dezembro, criou a Polícia da Republica de Moçambique (PRM) e a definiu como
21 Acordo assinado em Roma, aos 4 de Outubro de 1992, entre o Governo de Moçambique e o
Movimento de Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) que liderou a guerra civil contra o
sistema socialista adoptado pela FRELIMO depois da independência nacional. A partir desse acordo, que
incluía o reconhecimento oficial da RENAMO pelo governo como um movimento político nacional, foi
observado o cessar-fogo que conduziu ao fim do conflito armado.
35
organismo público e força paramilitar integrada no Ministério do Interior, com a
missão de garantir a ordem, a segurança e tranquilidade públicas, o respeito pelo
Estado de Direito, a observância estrita dos direitos e liberdades fundamentais dos
cidadãos. Impõe-se, portanto, à nova Polícia Nacional, uma nova posição perante os
órgãos de soberania de que antes era parte integrante e já não é mais, e uma nova
função perante a sociedade, resultante dos princípios e regras de uma sociedade
democrática de Estado de Direito, com separação clara dos poderes legislativo, judicial
e executivo.
No actual quadro do regime político moçambicano, de matriz presidencialista, a
tutela da Polícia é exercida pelo governo através do Ministério do Interior, integrando
as forças de defesa e segurança das quais o Presidente da República é o Comandante-
Chefe e ao qual devem obediência hierárquica. A figura 1, que se segue, apresenta a
estrutura orgânica do Ministério do Interior onde está integrada a Polícia como uma das
suas áreas de actividade.
Figura 1: Organigrama do Ministerio do Interior
Ministro do Interior
Comando Geral da
PRM
DirecçãoNacional de Identificação
Civil
DirecçãoNacional de
Migração
DirecçãoNacional de Bombeiros
Direcção de Informação
Direcção de Recursos Humanos
Departamento de
Administração e Finanças
Vice - MinistroSecretário
Permanente
Gabinete doMinistro
ConselhoConsultivo
ConselhoCoordenador
Gabinete de Estudos e Plano
Gabinete Jurídico
Inspecção
Gabinete de Relações
Internacionais
Fonte: Diploma Ministerial nº68/2001 de 2 de Maio: Estatuto Orgânico do Ministério do Interior.
Como se pode constatar, as transformações evolutivas da Polícia moçambicana
acompanham e são consequência das transformações político-sociais da sociedade
moçambicana, tanto ao nível da filosofia que orienta a sua formação e o seu
funcionamento, quanto ao nível da estrutura organizacional. Na sequência,
sensivelmente nos meados do ano de 1976, o CPM entrou em processo de adequação
das suas unidades orgânicas, consubstanciado na extinção das Repartições e na criação,
36
em seu lugar, das Subsecções Nacionais que mais tarde evoluíram a Comandos
Nacionais com a criação da PPM, e na actual orgânica da PRM tomaram a forma de
direcções que operacionalmente se articulam em unidades e subunidades.
1.3.4. A reforma da Polícia no período pós Acordo Geral da Paz (AGP
Por força da Nova Constituição de 1990, introduzindo o Estado de Direito, foi
criada a Polícia da República de Moçambique pela Lei nº 19/92 de 31 de Dezembro e
pelo Decreto Lei nº 22/93 de 16 de Setembro foi aprovada a nova estrutura orgânica da
PRM. A revisão da constituição da República feita em 2004, praticamente não mexeu
na Polícia em termos de natureza, função e objectivos.
A Organização geral da Polícia em Moçambique tem consagração
constitucional no artigo 255º da Constituição da República de Moçambique (CRM),
que dispõe que a lei estabelece a organização geral da polícia, fixa os respectivos
ramos, determina a sua função, estrutura e as normas que regem o ingresso.
A função da Polícia da República de Moçambique (PRM) está consagrada no
artigo 254º da CRM como sendo a de garantir a observância da lei e ordem, a
salvaguarda de pessoas e bens, a tranquilidade pública, a inviolabilidade da fronteira
estatal, o respeito pelo Estado de Direito Democrático e dos direitos e liberdades
fundamentais dos cidadãos, organizando-se em cinco ramos22: Polícia de Protecção
(PP), Polícia de Trânsito (PT), Polícia de Transportes e Comunicações (PTC), Polícia
de Guarda Fronteira (PGF), Forças Especiais e de Reserva (FER).
Na nova orgânica, a Polícia da República de Moçambique (PRM) organiza-se
em Unidades e Subunidades (Decreto nº 27/99 de 24 de Maio, artigo 1 nº 1).
São unidades (nº2 do artigo 1 do capítulo 1): o Comando-Geral; os Comandos
Provinciais; as Forças Especiais e de Reserva (FER); os Estabelecimentos de Ensino.
A ACIPOL, objecto do presente estudo, nos termos do articulado supracitado é
uma unidade orgânica na estrutura organizacional da Polícia da República de
Moçambique, e até ao presente momento é o único estabelecimento de ensino superior
da polícia.
São subunidades (nº3 do artigo 1 do capítulo 1): os Comandos Distritais; as
Esquadras; os Postos Policiais; os Destacamentos das Forças Especiais e de Reserva. 22 A Estrutura Orgânica da Polícia da República de Moçambique está em processo de revisão desde o ano de 2010. Portanto, poderá ser alterada logo que a Assembleia da República aprovar, por lei, a proposta da nova orgânica.
37
Nos termos dos números 1 e 2 do artigo 2 do Decreto nº 27/99 de 24 de Maio, a
criação e extinção de subunidades da PRM é efectuada por Despacho do Ministro do
Interior, sob proposta do Comando-Geral. O mesmo instrumento legal acrescenta que a
criação e extinção dos comandos distritais obedece à divisão administrativa23. A
República de Moçambique organiza-se territorialmente em províncias, distritos, postos
administrativos, localidades e povoações (CRM, 1992, artigo 7).
São estabelecimentos de ensino policial:
de Nível Superior – Academia de Ciências Policiais (ACIPOL);
de Nível Médio – (ainda não existe um estabelecimento oficialmente criado);
de Nível Básico – Escola Prática de Polícia (EPP-Matalana) e Escola Prática de Polícia
(EPP-Dondo).
Destacamentos das Forças Especiais e de Reserva
Os Destacamentos das Forças Especiais e de Reserva são subunidades
desdobradas no terreno de acordo com a situação operativa policial e obedecem à
cadeia de comando estabelecida na orgânica de cada Comando de Força Especial e de
Reserva.
As Forças Especiais e de Reserva (FER) são unidades da PRM preparadas para
missões especiais de garantia da ordem, segurança e tranquilidade públicas e
compreendem: Força de Intervenção Rápida (FIR); Força de Guarda Fronteiras (FGF);
Força de Protecção Marítima, Lacustre e Fluvial (FPMLF); Força de Protecção de Altas
Individualidades (FPAI).
Conforme está explicado no Plano Estratégico da Polícia (PEPRM, 2003), até à
assinatura do AGP a formação da Polícia era assegurada por cinco estabelecimentos de
ensino, nomeadamente:
i. Centro de Formação de Quadros da PRM – Michafutene (província de Maputo)
ii. Centro de Formação de Unidades da PRM – Matalana (província de Maputo)
iii. Centro de Formação de Unidades da PRM – Dondo (província de Sofala)
iv. Centro de Formação de Unidades da PRM – Natikiri (província de Nampula)
23 De acordo com os números 1 e 2 do artigo 11 do capítulo II da Lei nº 8/2003 - A Província é a maior unidade territorial da organização política, econômica e social da administração local do Estado. A Província é constituída por Distritos, Postos Administrativos, Localidades e Povoações.
38
v. Centro de Instrução de cães-polícia (Maputo-cidade).
Os estabelecimentos de ensino policial, ou centros de formação, estavam
distribuídos pelas regiões norte, centro e sul de Moçambique, mas o centro de
Michafutene, fundado em 1976, era o único vocacionado à formação de “quadros”. Os
restantes formavam unidades da PRM. O termo “quadros da Polícia” significa oficiais
da Polícia com preparação técnico-profissional para desempenhar funções de comando,
direcção e chefia. Por seu turno, o termo “unidades da Polícia” significa guardas da
Polícia com preparação técnico-profissional para desempenhar funções policiais de
base, tais como patrulhamento, vigilância móvel e fixa, protecção de eventos e de locais
de interesse público, e outras de carácter simples.
Até 2013, existiam em Moçambique uma Academia (ACIPOL) e duas Escolas
Práticas de Polícia, sendo uma localizada no distrito Dondo, província de Sofala e outra,
localizada no distrito de Marracuene, na provínvia de Maputo (EPP-Matalana). A
formação visa o ingresso e o acesso às escalas profissionais da PRM. As escalas
profissionais da PRM estão ilustradas na figura 3.
39
1.3.5. Escalas profissionais da PRM e sistema de formação policial Figura 2: Modelo de Carreira Policial
GUARDA
Selecção 2 Convocatótias
4 Anos Serviço Efectivo Máximo 47 Anos
Selecção 1 Convocatórias
Curso de Promoção ESCOLHA
ESCALA BÁSICA ESCALA MÉDIA ESCALA SUPERIOR
12a Classe
SARGENTO
Antiguidade 5 Anos
SARGENTO PRINCIPAL
SUBINSPECTOR
Antiguidade 3 Anos
INSPECTOR
ADJUNTO SUPERINTENDENTE
SUPERINTENDENTE PRINCIPAL
4 Anos Serviço Efectivo Máximo 42 Anos
Concurso – Provimento 3 Convocatórias
Curso de Promoção
5 Anos Serviço Efectivo Máximo 42 Anos
Concurso – Provimento 3 Convocatórias
Curso de Promoção
SUBINSPECTOR
4 Anos de Serviço Efectivo
INSPECTOR
ADJUNTO SUPERINTENTENDE
10a Classe 19 – 30 Anos
Concurso – Provimento 3 Convocatórias
Curso de Formação Básica +
2 Anos de estágio
12a Classe Civil 19 – 30 Anos
Militar Policia 18 – 26 Anos Concurso – Provimento
3 Convocatórias Curso de Formação Superior
+ 1 Anos de estágio
5 Anos de Serviço Efectivo Selecção
ADJUNTO DO COMISSÁRIO
5 Anos Serviço Efectivo Selecção
Curso de Promoção Escolha
10 ADJUNTO DO COMISSÁRIO
2 Anos de Serviço efectivo Escolha
COMISSÁRIO
Escolha
INSPECTOR GERAL
Reserva aos 50 Anos
Reserva aos 52 Anos
Reserva aos 53 Anos
Reserva aos 54 Anos
Reserva aos 56 Anos
Reserva aos 58 Anos
2 Anos de service Efectivo Máximo 36 Anos
Concurso – Provimento 3 Convocatórias
Curso de Promoção
SEGUNDO CABO
Antiguidade 1 Ano
PRIMEIRO CABO
Antiguidade 4 Anos
5 Anos de Serviço Efectivo
Curso de Promoção
SUPERITENDENTE
Antiguidade 5 Anos
40
As escalas profissionais24 da Polícia da República de Moçambique estruturam-
se em três níveis: básico, médio e superior. O acesso a cada escala requer um conjunto
de requisitos, fixados pelo Estatuto do Polícia25, aos quais está directamente ligado o
sistema de formação policial. Segundo consta do capítulo III, artigo 19 do Decreto nº
28/99 de 24 de Maio, a PRM tem as seguintes escalas profissionais: a escala básica, que
integra os guardas e cabos oriundos de curso de formação básica policial; a escala
média, que integra os sargentos e oficiais subalternos habilitados com os respectivos
cursos de formação e/ou de promoção; a escala superior, que integra os oficiais
oriundos do curso superior de formação policial ou equivalente.
O ingresso e promoção dos membros da Polícia da República de Moçambique
ocorre nas escalas profissionais definidas na base dos requisitos previstos no
instrumento legal acima referido. O sistema de formação policial garante a
continuidade do processo de instrução e educação dos membros da PRM e realiza-se
por meio de cursos de formação, cursos de aperfeiçoamento e estágios (nº2 do artigo 22
do Decreto nº28/99 de 24 de Maio):
Os cursos de formação são aqueles que se destinam a assegurar a preparação
policial e os conhecimentos técnico-profissionais para o ingresso nas escalas
profissionais da PRM. A formação que a Academia de Ciências Policiais realiza,
habilita os graduados a ingressarem na escala superior, escalão de oficiais subalternos,
com a patente de Subinspector da Polícia.
Os cursos de aperfeiçoamento são aqueles que se destinam a capacitar o
membro da PRM para efeitos de promoção, especialização e actualização. O acesso à
frequência dos cursos de actualização pelos membros da PRM é através da convocação
e tem carácter obrigatório. Os cursos de aperfeiçoamento previstos no Estatuto do
Polícia são os seguintes:
i. Cursos de Promoção - que se destinam a habilitar o membro da PRM para o
desempenho de funções de nível de responsabilidade mais elevado, constituindo,
nos termos fixados no Estatuto do Polícia, condição especial de acesso à patente
ou posto imediato;
ii. Cursos de Especialização - que se destinam a obter ou melhorar os
conhecimentos técnico-profissionais do membro da PRM, visando habilitá-lo
24 Capítulo III, artigo 19, nº 1, alíneas a), b) e c) do Decreto 28/99 de 24 de Maio. 25 O Estatuto do Polícia foi aprovado pelo Decreto nº 28/99 de 24 de Maio.
41
para o exercício de funções para as quais sejam requeridos conhecimentos e
habilidades específicos;
iii. Cursos de Actualização - que se destinam a reciclar os conhecimentos técnico-
profissionais tendo em vista recuperar uma qualificação ou acompanhar a
evolução da doutrina e da técnica policial.
iv. Os estágios são aqueles que se destinam a completar a formação técnico-
profissional anteriormente adquirida em cursos de formação; preparar o membro
da PRM para o exercício de funções específicas em cargos para os quais seja
nomeado e avaliar a capacidade do membro da PRM para o exercício de novas
funções.
1.3.6. A revogação da Lei que cria a PRM: Lei nº 16/2013 de 12 de Agosto
Para responder à necessidade de adequar a Polícia da República de
Moçambique, sua estrutura organizacional e funcional à actual dinâmica do quadro
jurídico constitucional e à demanda sócio-político e económico de Moçambique, ao
abrigo do disposto no nº 2 do artigo 25526 conjugado com o nº 1 do artigo 17927, ambos
da CRM, a Assembleia da República, através da Lei nº 16/2013, de 12 de Agosto,
determinou a revisão da Lei nº 19/92, de 31 de Dezembro, que cria a Polícia da
República de Moçambique e da Lei nº 5/88, de 27 de Agosto, que cria o sistema de
Patentes e Postos da Polícia da República de Moçambique.
No quadro da nova lei, a natureza da Polícia sofre uma profunda alteração ao
ser designada por “serviço público e apartidário”, nos termos que se seguem:
A Polícia da República de Moçambique, abreviadamente designada por PRM é
um serviço público, apartidário, de natureza paramilitar, integrado no Ministério que
superintende a área da ordem e segurança públicas (Artigo1, nº 1 da Lei nº 16/2013
de 12 de Agosto).
Relativamente às funções a nova lei estabelece que
26 Artigo 255 (Comando e organização)- nº 2. A lei estabelece a organização geral da Polícia, fixa os
respectivos ramos, determina a sua função, estrutura e as normas que regem o ingresso. 27 Artigo 179 (Competências)- nº 1. Compete à Assembleia da República legislar sobre as questões
básicas da política interna do país.
42
A PRM, em colaboração com outras instituições do Estado e da sociedade em geral, tem como função garantir a observância da lei e ordem, a salvaguarda da segurança de pessoas e bens, a tranquilidade pública, a inviolabilidade da fronteira estatal, o respeito pelo Estado de Direito Democrático e dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos (Artigo 3 da Lei nº 16/2013 de 12 de Agosto).
Figura 3: Organização da Policia da Republica de Moçambique
ORGANIZAÇÃO DA PRM
PRM
UNIDADES DE OPERAÇÕES
ESPECIAIS E DE RESERVA
RAMOS
FONTE: Autor - com base na Lei nº 16/2013 de 27 de Agosto
A Polícia da República de Moçambique tem uma organização nacional única
para todo o território, estruturando-se, de acordo com a nova lei, em ramos e unidades
de operações especiais e de reserva. Os ramos desdobram-se em comandos provinciais,
comandos distritais, esquadras e postos policiais. As unidades de operações especiais e
de reserva se subdividem em unidades especiais.
Depreende-se, portanto, que a missão fundamental da Polícia é a preservação da
Ordem Pública, através de: combater o crime, proteger as pessoas e bens e, fazer
cumprir as leis. Na figura 3 apresenta-se a estrutura orgânica da PRM, apovada pela Lei
nº 16/2013 de 27 de Agosto. De notar, porém, que os estabelecimentos de ensino não
constam deste organigrama por serem matéria de regulamento específico.
A figura 4 ilustra a composição dos Ramos e das Unidades de Operações
Especiais e de Reserva na estrutura orgânica da PRM.
43
Figura 4: Ramos e Unidades de Operações Especiais e de Reserva
ORGANIZAÇÃO DA PRM
RAMOS DA PRM
Polícia de Ordem e Segurança
Pública
Polícia de Investigação
Criminal
Polícia de Fronteiras
Polícia Costeira, Lacustre e
Fluvial
UNIDADES DE OPERAÇÕES ESPECIAIS E DE RESERVA
Unidade de Intervenção
Rápida
Unidade de Protecção de
Altas Individualidades
Unidade de Operações de Combate ao
Terrorismo e Resgate de Reféns
Unidade Canina
Unidade de Cavalaria
Unidade de Desativação de
Engenhos Explosivos
Fonte : Autor – com base na Lei nº 16/2013 de 27 de Agosto
No histórico do processo de formação policial assinala-se que as academias e
escolas da Polícia frequentadas pelos moçambicanos, tanto dentro como fora do país,
estavam desenhadas seguindo o modelo dos campos de recrutas militares, com regras e
regulamentos militares, disciplina rígida, e salientando o imperativo de obedecer às
ordens. Em Tanzânia, Zâmbia e na República Democrática Alemã (RDA) – as mais
expressivas - as academias policiais constituíam a plataforma principal de formação
policial. Eram simultaneamente legalistas e militaristas. Essa experiência foi
posteriormente aplicada nos centros de formação policial em Moçambique e abrangeu
todos os ramos da Polícia, antes dispersos e independentes e, com a revisão da primeira
constituição em 1978, unificados pela criação da Polícia Popular de Moçambique nos
termos acima explicados (Lei nº 5/79 de 26 de Maio).
A literatura especializada sobre a formação da Polícia revela que, no percurso
da história da Polícia, evidencia-se, sobremaneira, que os aspectos vinculados à
burocratização e à militarização, com excessivo realce no comportamento profissional e
legalista dos polícias, permearam a construção de um determinado modelo policial, que
ainda hoje serve de base para a estrutura policial nas sociedades democráticas
ocidentais, orientando a organização da Polícia, os seus princípios e métodos, desde a
aplicação do treinamento, englobando desde a filosofia, a terminologia, a literatura
organizacional até o estilo de policiamento, envolvendo tácticas e estratégias, o
44
equipamento utilizado nas operações de policiamento e os demais aspectos
organizacionais e operacionais (LUDWIG, 1998, pp.22-23).
O autor acima referenciado sublinha ainda que é importante reconhecer que esse
modelo policial profissional, proveniente das reformas da Polícia, em quase todos os
continentes, que ocorrem no final do século XIX e durante a primeira metade do século
XX, é uma resposta inovadora para os problemas que precederam sua montagem e a
sua peculiaridade reside no entrelaçamento de dois modelos de Polícia - o burocrático-
militar e o de aplicação da lei (ibidem).
Em Moçambique, no que respeita à formação, essa característica do modelo da
Polícia foi influenciado pelos processos de cooperação internacional com as
organizações policiais estrangeiras, quer enviando agentes e oficiais da PRM para
serem formados no exterior, quer recebendo docentes e formadores estrangeiros nas
escolas da Polícia de Moçambique, quer ainda, implementando em Moçambique cursos
de aperfeiçoamento28 desenhados fora do contexto moçambicano, por formadores ou
especialistas cooperantes, com fraca ou sem nenhuma participação de formadores da
PRM.
Esse marco voltou a evidenciar-se, mais recentemente, com a retomada da
cooperação policial entre Moçambique e Cuba, no domínio da formação, em que a
partir dos anos 2011-2012, contingentes de docentes, formadores e especialistas
cubanos se instalaram na Academia de Ciências Policiais, fazendo formação em
diversos domínios dos processos policiais (ordem pública, Investigação Criminal,
Polícia de Trânsito, Migração, Inteligência e outras) sem participação efectiva de
docentes e formadores da ACIPOL, e aplicando currículos e materiais didácticos
concebidos unilateralmente na ou pela escola policial cubana.
1.4. Processo de implementação do Acordo Geral de Paz: A Polícia como parte do
objecto de reformas institucionais
No decurso da implementação do Acordo Geral de Paz em Moçambique, parte
dos doadores representados pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
(PNUD) manifestaram o interesse em incluir a Polícia no grupo das instituições a
serem admitidas no âmbito do apoio à democratização de Moçambique. A intenção era
28 Aperfeiçoamento, nos termos do artigo 24 do Decreto nº 28/99 de 24 de Maio-Estatuto do Polícia - compreende os cursos de promoção, especialização, actualização e estágios.
45
de introduzir reformas no conteúdo e métodos de trabalho da Polícia, por meio de
reciclagem dos efectivos então existentes no activo, e através de formação de raiz
(inicial) de novos agentes da Polícia, em princípio no nível básico (unidades) e, por
iniciativa e interesse do Governo de Moçambique, também no nível superior (quadros).
Para a formação básica de raiz foi reactivado o funcionamento do então centro
de Matalana, com a nova designação de Escola Prática da Polícia (EPP). Para a
formação policial superior de raiz foi necessário criar-se uma nova instituição de
ensino, vocacionada aos cursos de graduação, pós-graduação e aos cursos de
aperfeiçoamento. Foi nesse contexto que se criou a Academia de Ciências Policiais,
como instituição de formação superior em ciências policiais, através do Decreto nº
24/99, de 18 de Maio.
1.5. A Academia de Ciências Policiais (ACIPOL) no processo da reforma da
Polícia
A Academia de Ciências Polícias é uma instituição pública de Ensino Superior,
vocacionada à formação de oficiais de polícia. No quadro dos seus Estatutos, e relativa
à Polícia, goza de autonomia administrativa, científica e financeira. A direcção da
Academia é realizada pelo Reitor, coadjuvado por um Vice-Reitor. No seu
funcionamento apoiam-se em unidades orgânicas, conforme se pode visualizar no
organigrama que se segue.
46
Figura 5: Organigrama da ACIPOL
REITORConselho
Científico e Pedagógico
Conselho Directivo
Conselho da Academiaa
Vice-Reitor
Gabinete das Relações Públicas e
Cooperação
Gabinete do Reitor
DirecçãoPedagógica
Direcção de Investigação e
Extensão
Direcção de Logística e Finanças
Direcção de Pessoal
Estrutura Orgânica da ACIPOL
Fonte : Plano Estratégico da ACIPOL – Volume I, 2006, pag.53 – adaptado pelo autor
Ao nível máximo existem três órgãos colegiais: o Conselho Directivo, o
Conselho Científico - Pedagógico e o Conselho da Academia.
O Reitor é auxiliado por um Gabinete e por um sector de Relações Públicas e
Cooperação. Abaixo, na vertical e respondendo directamente ao Reitor, estão os
Directores das quatro Áreas, também designadas unidades orgânicas (Pedagógica,
Investigação e Extensão, Logística e Finanças e Pessoal). Por estatuto, os cargos de
Direcção são ocupados por oficiais superiores da PRM, de modo a garantir uma ligação
natural com o principal stakeholder (parte interessada) – a PRM.
De uma maneira geral a estrutura não é muito pesada e ajusta-se à missão,
especificidades e tamanho da Academia. É de salientar, porém, que existem algumas
lacunas estruturais que deverão ser analisadas num processo futuro de revisão da
estrutura orgânica da ACIPOL. Por exemplo, prevendo-se a possibilidade de introduzir
outros níveis de formação (pós-graduação) e outros cursos (especialização) a estrutura
que gere a área de formação poderá tornar-se singela demais.
Os objectivos da ACIPOL, entre outros, são os seguintes: preparar oficiais de
polícia, mediante adequada formação científica, profissional e deontológica, e
assegurar a ligação com a actividade policial como meio de formação técnica e
profissional dos estudantes. Estes dois objectivos são destacados por estarem mais
relacionados com o presente estudo. O quadro 1, que se segue, apresenta a visão e
missão da ACIPOL.
47
Quadro 1: Visão e Missão da ACIPOL
VISÃO MISSÃO
Ser uma instituição moderna, de qualidade reconhecida no país, na região e no mundo na formação e investigação em ciências policiais.
Realizar, de forma integrada, a formação, instrução paramilitar, investigação científica e extensão visando a disseminação do ensino superior de qualidade, o desenvolvimento das ciências policiais e a formação de quadros com visão técnica, científica e humanística, de forma a responder às exigências e dinâmica da sociedade na área de Ordem e Segurança Públicas.
Fonte: Plano Estratégico da ACIPOL, 2007, Volume IV, p.6
À Academia de Ciências Policiais, no quadro das suas atribuições, compete,
dentre outras actividades, organizar e ministrar cursos superiores em ciências policiais;
organizar e ministrar cursos de aperfeiçoamento e estágios para oficiais da Polícia;
realizar e ministrar outros cursos de formação, de aperfeiçoamento e estágios; apoiar
pedagógica e metodologicamente outras instituições de ensino policial moçambicanas;
desenvolver nos formandos a consciência deontológica e o brio profissional; contribuir
permanentemente na introdução de inovações na doutrina, técnica e táctica policiais
(Decreto nº 24/99 de 19 de Maio, art.6).
Desde o início do seu funcionamento em 1999, a ACIPOL ministra cursos
superiores em ciências policiais a dois níveis académicos, nomeadamente bacharelato29
e licenciatura. Mais recentemente, em 2012, introduziu o Mestrado em Ciências
Policiais. Cada curso tem um currículo autónomo embora a estrutura seja similar em
termos de áreas científicas. O curso de licenciatura é destinado a formar oficiais
subalternos da Polícia, que ingressam na escala profissional superior da Polícia com a
patente de subinspector. Este estudo concentra-se no curso de licenciatura,
fundamentalmente na sua componente curricular30 e de estágio supervisionado.
29 O nível acadêmico de Bacharelato foi extinto do sistema de Ensino Superior de Moçambique pela Lei 27/2009, de 29 de Setembro (Lei de reforma do Ensino Superior). 30 Refere-se a todas as actividades de aprendizagem previstas no currículo do curso. Por sua vez, Estágio refere-se às actividades práticas realizadas em unidades e subunidades policiais como parte integrante e obrigatória da formação.
48
1.5.1. Estrutura do Currículo
A estrutura curricular do curso de graduação (licenciatura) em ciências policiais
está organizada em seguintes áreas científicas:
1. Área de Ciências e Tecnologia Policial;
2. Área de Ciências Jurídicas;
3. Área de Ciências Exactas e de Gestão;
4. Área de Ciências Sociais e Humanidades; e
5. Área do Estágio Supervisionado.
O curso tem a duração de quatro anos com a carga horária de 5040 horas: 1260h
anuais; 630h semestrais; a carga horária se distribui pelas áreas científicas conforme a
tabela 1 que se segue.
Tabela 1: Áreas Científicas do Currículo e Carga Horária
N/O ÁREA DE CONHECIMENTO (CIENTÍFICA)
% DA CARGA HORÁRIA
01 Ciências e Tecnologia Policiais (CTP) 50%
02 Ciências Jurídicas (CJ) 25%
03 Ciências Sociais e Humanidades (CSH) 20%
04 Ciências Exactas e de Gestão (CEG) 05%
05 Estágio Curricular e Práticas Pré-Profissionais
(5% deduzidos das CTP)
Duração do curso = 8 Semestres 5040 horas
Na área do Estágio, o plano curricular prevê que os estudantes realizem práticas
pré-profissionais ao longo do curso e cumpram um estágio curricular supervisionado,
em unidades e subunidades policiais seleccionadas para o efeito, ou em instituições
julgadas adequadas para esse fim. As práticas pré-profissionais poderão ocorrer a
qualquer nível do curso.
O estágio está previsto para o segundo semestre do quarto ano, isto é, para o 8º
semestre do curso de licenciatura (graduação). Importa registar que as práticas pré-
profissionais nunca foram realizadas, porque, apesar de constarem do plano curricular,
na verdade, na ACIPOL não há clareza sobre o que são e qual é a estratégia de sua
implementação. Por isso, neste estudo foi nossa intenção aprofundar o entendimento, o
49
alcance e as possibilidades de sua realização como dimensão articuladora do equilíbrio
entre os fundamentos teóricos e as habilidades práticas de formação.
A figura que se segue ilustra as áreas científicas do currículo de formação
(componentes curriculares) e as áreas de actuação dos graduados depois da formação.
O objectivo é permitir que se tenha uma ideia sobre a relação entre os componentes de
formação e as áreas onde os graduados actuam depois da formação.
Figura 6: Ilustração das componentes curriculares e áreas de actuação dos graduados
Componentes curriculares e áreas de actuação profissional dos graduados
Ciências e Tecnologia Policial
Ciências Jurídicas
Ciências Sociais e Humanidades
Ciências Exactas e de Gestão
Práticas Pré-Profissionais e Estágio Curricular
Ordem e Segurança Pública
Investigação Criminal
Polícia de Fronteiras
Forças de Operações Especiais e de Reserva (FER)
Administração e Logística e Áreas afins à Polícia (Identificação Civil)
Componentes do currículo de formação Áreas de actuação do graduado
Depois que entrou em funcionamento no ano de 1999, o currículo do curso de
licenciatura (graduação) da ACIPOL já foi objecto de avaliação externa, pelo menos
uma vez, por uma equipa constituída por avaliadores estrangeiros ao serviço do
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimendo (PNUD), que foi denominada
missão back-stopping. A avaliação foi solicitada por um dos parceiros de cooperação
do governo de Moçambique para a instalação da ACIPOL, a cooperação Suíça, e
realizada, obviamente, em consenso com as autoridades moçambicanas. Os resultados
dessa avaliação foram devidamente retratados no capítulo da problematização do
presente estudo.
50
CAPÍTULO II
DESAFIOS CURRICULARES À FORMAÇÃO SUPERIOR DA POLÍCIA EM MOÇAMBIQUE
Neste capítulo apresentamos os principais fundamentos teóricos deste estudo.
Partindo da clarificação do entendimento sobre a formação policial, discutimos
referências teóricas sobre a formação pretendida na ACIPOL, bem como as bases legais
da formação policial em Moçambique e ainda uma revisão às escolas e modelos
policiais do mundo destacando sua aproximação ao modelo policial predominante em
Moçambique. Como questão de fundo, o capítulo faz uma breve discussão sobre os
conceitos de formação, competência, currículo, revisita o processo de construção do
currículo da ACIPOL e discute as práticas pré-profissionais e o estágio como
aproximação da teoria à prática.
A consideração geral do capítulo é a concepção da formação voltada para a
reflexão sobre a prática e na prática, que promove uma série de mudanças no perfil do
profissional da Polícia inserido em acções operacionais de manutenção da ordem
pública. Remete à idéia de que o oficial da Polícia poderia, através da reflexão e do
pensamento crítico, identificar a actual situação de sua prática como agente da lei e
ordem.
O modelo profissional de Polícia, resultante de um longo processo de
profissionalização desencadeado pelas reformas policiais em alguns países do mundo
democrático ocidental no final do século XIX e durante a primeira metade do século
XX, caracteriza- se predominantemente pelo entrelaçamento de dois modelos: o
burocrático-militar e o de aplicação da lei (PONCIONI, 2007, p.23).
Analisando os currículos dos cursos de formação profissional dos oficiais da
Polícia em Moçambique, revela-se tendências semelhantes na sua formação. Entre
essas semelhanças está a presença, ainda que com ênfases diferenciadas (dependendo
do nível do curso), de uma concepção dominante que tem como preocupação principal
moldar o Polícia para um comportamento legalista, numa versão que Poncioni (2007,
p.25) chama de burocrático-militar, com forte incidência ao combate ao crime.
Destaca-se, igualmente, nessa formação profissional, a quase total ausência de matérias
capacitadoras para a área da actividade preventiva, com realce na negociação de
conflitos e no relacionamento directo com o cidadão. Evidencia-se, ainda, um claro
descuido na formação para o trato de outras demandas e interesses da população que
51
não se encontram limitadas ao cumprimento da lei, mas se relacionam com a
manutenção da ordem pública.
Constata-se, portanto, que a formação profissional dos oficiais da Polícia
sobrepõe princípios de modelos profissionais por vezes incompatíveis entre si, sem
uma extensa e profunda análise das condições internas e externas para a superação do
modelo policial profissional tradicional ainda em vigor na Polícia de Moçambique.
2.1. Génese e evolução do termo Polícia
A palavra “Polícia” é do termo grego “politeia” e do latim tardo-medieval
“politia”. A pólis (πολις) - plural: poleis (πολεις) é, sumariamente, o conceito grego de
Cidade. A Polis grega era formada por quatro unidades: a Acrópolis (parte mais alta do
relevo, onde se situavam os templos), a Ágora (área aberta, onde se encontravam os
mercados e feiras livres), a Khóra (campo, onde se produziam os alimentos) e a Ásty31
(onde se aglomeravam as habitações). As poleis, teriam sido organizadas a partir do
século VIII a.C. Com a dominação dos romanos, a partir do século II a.C., elas viriam a
perder a sua anterior importância (CASALI, 2012, p.193).
O habitante da Polis, o cidadão na denominação latina, era chamado de
politikós. Quando os Romanos dominaram militarmente a Grécia, traduziram Polis por
Civitas. Ou seja, Militar (do grego militece; do latim militaris – Miles = soldado) era, e
continua sendo até aos nossos dias, antítese conceitual de civil, no sentido primitivo os
que se domiciliavam na cidade (os civis) e os que estavam fixados fora da civitas (os
militares). Assim, os corpos militares (as legiões romanas) eram sediados fora dos
limites da cidade para defendê-la dos invasores (os bárbaros) e não podiam passar esses
limites para dentro da cidade sem permissão do governo (CASTORIADIS, 1981,
p.269)
O polícia é o guardião da Polis. Originariamente Polícia era o conjunto de
funções necessárias ao funcionamento e à conservação da cidade-Estado (polis grega),
partindo daí a etimologia de polícia e civitas romana, que origina o termo civil, isto é,
inerente à civitas. Civil era, pois, derivação de cidade, conceito político e não
urbanístico, donde surge o Direito Civil (o Direito dos nascidos na civitas romana) e
31 Em grego contemporâneo o conceito de Polícia é expresso pelo vocábulo Astinomia. A actual polícia grega é conhecida como "astinomia”. Está escrito nos escudos da polícia grega “Elenike astinomia” (Casali, 2012, p.23). Astínomo: Antigo magistrado grego encarregado da segurança pública.
52
cidadão - aquele a quem é dado o direito de influir na gestão da coisa pública32, da
Civitas. Sumarizando, Res publica é uma expressão latina que significa literalmente
"coisa do povo", "coisa pública". Portanto, é a origem da palavra república e,
conceitualmente, da palavra inglesa “commonwealth” (Castoriadis, 1981, p.271).
Dentro da civitas, só bem depois, já no final da dominação do império romano
Século V (Gaeta e Villan (1986, p.323), é que ocorreu o fenómeno do pretorianismo,
militarização transitória de determinadas funções estatais ligadas à segurança pública
e, em princípio, aplicado como instrumento de conquista, manutenção e exercício
forçado do poder. Decorrente disso explica-se o fenómeno político, já histórico,
denominado militarismo (degeneração profissional que culmina com o controle da vida
civil pelos especialistas militares).
Assim na essência policiar é civilizar, porquanto a vida civilizada (vida na
civitas, em comunidade) implicava e implica em refreamentos e controle do que não é
civilizado, do que não é urbanidade (civitas e urbis são, igualmente, raízes latinas para
a ideia de virtude, a aretè dos gregos clássicos).
Nesse processo e durante esse período de civilização latina, os juristas conferem
um conteúdo e um lugar específicos à noção de Polícia, em construções teóricas que
visam justificar a soberania absoluta do Estado imperial sobre os seus súbditos. Nessa
concepção, o imperium constitui o fundamento último do poder coercitivo do Estado –
a potestas – que é aquela que se manifesta, na prática, através da acção administrativa,
judiciária e policial (LUIZ, 2003, p.26).
É assim que a essência da função governamental vai consistir em definir as
fronteiras entre o público e o privado, por meio da produção de normas cujo respeito é
assegurado por órgãos administrativos específicos, que utilizam, se necessário, a
coação física. A protecção pública permanece ligada aos Estados, mas a definição de
Estado passa a referir-se à capacidade colectiva de governar, “uma vez que essa
capacidade é quase universal, o carácter público torna-se uma experiência social
organizada” (BAYLEY, 2003, p.39).
A importância operativa e sistémica do termo polícia, pela acção estatal, só foi
aparecer nos Estados da Renascença, na Itália e, principalmente, na França, no Ducado
de Borgonha — momento em que a expressão implicava claros fins políticos e
32 MORA, J.F.(200, p. 2345), Dicionário de Filosofia, a palavra publica é o feminino singular do adjetivo publicus, que é por sua vez derivado de uma forma mais antiga, populicus – "relacionada a populus [povo]".
53
cumprimento dos deveres públicos e cívicos dos súbditos. Da Borgonha passa para a
Alemanha, obtendo aí difusão e grande sucesso, mas já não tendo a intenção de
segurança na esfera pública.
2.2. Polícia como profissão
Nos dias de hoje, não parece relevante levantar uma discussão, ainda que breve,
sobre se o trabalho da Polícia se enquadra ou não nos padrões e quadro de profissões
socialmente consideradas e reconhecidas. Não cremos que haja, nas sociedades actuais,
qualquer divergência de opiniões sobre a sustentação da tese e do reconhecimento do
ofício de Polícia como uma profissão à semelhança das demais, diferindo-se,
obviamente, pelo seu campo e objecto de actuação, pelas suas particularidades sócio-
políticas e pela forma como sua actividade afecta e é afectada pela sociedade,
considerada globalmente.
David H. Bayley, um dos investigadores mais destacados na área da Polícia e
segurança pública, cautelosamente afirma, na sua obra sobre Padrões de Policiamento,
que Nosso conhecimento histórico da Polícia é, na melhor das hipóteses, tão
incompleto que operar a partir de perspectivas teóricas específicas atrapalha, ao invés
de auxiliar, a experiência (Bayley, 2003, p.28). Essa afirmação demonstra, por um
lado, que ao longo da história do desenvolvimento da humanidade e das sociedades
houve pouco interesse, principalmente dos cientistas e académicos, em fazer estudos
aprofundados sobre a instituição policial. Por outro, instiga ao melhor entendimento e
enquadramento da instituição policial, pelo seu papel e função nas sociedades
democráticas e de Estado de Direito de hoje.
O estudo de Bayley, embora não se preocupe em posicionar-se, explicitamente,
sobre se a Polícia é uma profissão ou não, ajuda-nos a compreender e esclarecer essa
questão a partir dos dados históricos demonstrativos que balizam a evolução da Polícia
e do desenvolvimento da Polícia moderna, apontando os indicadores mínimos que
caracterizam uma polícia profissional:
A profissionalização da polícia é um atributo moderno da polícia mais claro do que o carácter público ou a especialização. Também é uma característica mais complexa. A profissionalização conota uma atenção explícita dada à conquista da qualidade no desempenho. Indicadores mínimos de uma polícia profissional são o recrutamento de acordo com padrões específicos, remuneração alta o suficiente para criar uma carreira, treinamento formal e supervisão sistemática por oficiais superiores. De certo modo a palavra
54
profissionalização transformou-se num tipo de arte nos círculos policiais dos dias de hoje, abrangendo características como a especialização funcional dos polícias, uso de tecnologia moderna, neutralidade na aplicação da lei, uso responsável de discrição e uma certa medida de autonomia ( BAYLEY, 2003, p.60).
Ainda assim, reconhece-se que especificar o momento em que se deu a
profissionalização da força policial é problemático por várias razões das quais o autor
aponta quatro, nomeadamente a diversidade das partes constituintes do processo nas
diferentes experiências policias; a irregularidade do processo nos diversos países do
mundo; a ocorrência em velocidades diferentes em diferentes níveis hierárquicos; no
continente Europeu, por exemplo, a profissionalização foi se realizando lentamente
num período de quase duzentos anos, enquanto na Inglaterra isso ocorreu num período
menor e abrangeu todos os níveis hierárquicos e, por último, a necessidade de serem
feitos julgamentos qualitativos para se determinar se é possível dizer que tenha
ocorrido qualquer tipo de profissionalização.
Contudo, aponta o autor, a grande virada aconteceu, evidentemente, com a
criação da Polícia Metropolitana de Londres, em 1829. “O recrutamento era feito com
base em sexo, altura, peso, personalidade e habilidade em ler e escrever. O treinamento
era obrigatório, embora consistisse quase exclusivamente na repetição das ordens”
(BAYLEY, 2003, p.61).
Das experiências menos sucedidas aponta–se a Rússia na qual por volta de
1860, as tentativas de melhorar o nível de trabalho burocrático, especialmente
eliminando a corrupção, a preguiça e incompetência fracassaram. Igualmente, nos
Estados Unidos, o controlo dos departamentos de Polícia pelos partidos políticos não
foi eliminado até meados do século vinte. A extrema fragmentação da autoridade
policial nos EUA fez com que a questão da profissionalização fosse descoberta e
aplicada em todo o País.
Segundo o autor, a única excepção notável ao padrão oscilante da
profissionalização aconteceu no Japão onde o governo Meiji criou uma Polícia
profissional nacional em cerca de uma década, começando com a criação do
Departamento da Polícia Metropolitana de Tóquio (Keishicho) em 1878. Os polícias de
todo o país eram rigorosamente seleccionados, em sua grande parte dentre os antigos
Samurais33, e treinados nas escolas policiais das prefeituras (BAYLEY, 2003, p.62).
33 Samurai (侍) - era como soldado da aristocracia do Japão entre 1100 a 1867. Suas principais
características eram a grande disciplina, lealdade e sua grande habilidade com a Katana. O nome samurai
55
Reconhecendo que determinar uma data para o estabelecimento da Polícia
profissional seria impreciso e opinativo, aponta que a grande era de profissionalização
foi o século dezanove.
Durante cerca de cem anos decorridos (1815 a 1915), a profissionalização ocorreu nos principais países do mundo aproximadamente nesta ordem: Japão, França e Alemanha, Grã-Bretanha, Índia, Estados Unidos e Rússia. Essa ordem indica, apenas, que os problemas de recrutamento, treinamento, pagamento e supervisão foram explicitamente abordados e tratados sistematicamente. A prioridade é do Japão, porque não apenas profissionalizou sua polícia como os outros países europeus, mas também foi o primeiro país a desenvolver escolas de treinamento para os polícias de todos os níveis34 (BAYLEY, 2003, p.63).
Já a especialização é um termo relativo, referente à exclusividade em se
desempenhar uma tarefa. “Em policiamento, esta tarefa é a aplicação da força física
dentro da comunidade. Uma Polícia especializada dedica toda a sua atenção à aplicação
de coerção física” (BAYLEY, 2003, pag. 50).
Uma Polícia não especializada faz muitas outras coisas além disso. O Intendente
na França do século dezassete era um agente policial não especializado; O constable na
Inglaterra era um agente policial especializado. O Magistrado distrital no Paquistão dos
dias de hoje é não especializado, responsável por desempenhar tarefas administrativas,
judiciais e policiais; o superintendente distrital da Polícia é especializado. Uma vez que
a Polícia raramente é totalmente especializada, as avaliações de especialização devem
ser feitas comparativamente. Ou seja, devem ser comparadas a um determinado padrão.
Além disso, haver uma força policial especializada na sociedade não é o mesmo
que haver uma única força policial. Especialização em uma função e monopólio dessa
função são coisas diferentes. Os países podem ter mais de uma agência cuja função
primária seja a manutenção de ordem pública (ibidem).
Historicamente, a Polícia especial mais antiga era composta pelos vigilantes,
encontrados quase universalmente nas sociedades, dos chowkidars nos vilarejos do sul
da Ásia até à vigília nocturna na Europa medieval. Embora sua função fosse certamente
significa, em japonês, aquele que serve. Portanto, sua maior função era servir, com total lealdade e empenho, ao Imperador. Em troca disso recebia privilégios, terras e/ou pagamentos, que geralmente eram efetuados em arroz, numa medida denominada koku (200 litros). Um termo mais apropriado para
Samurai é bushi (武士), significando literalmente "guerreiro ou homem de armas", que era usado durante
o período Edo (RIBEIRO, 2002, P.). 34 Tóquio tinha um programa de treinamento a tempo integral para os postos mais baixos em 1880, Paris só após 1883, e mesmo então apenas em meio período, alternado com outras tarefas. A escola de treinamento da polícia de Londres foi fundada em 1907 (BAYLEY, 2006, p.62).
56
especializada, nem sempre se tratava de policiamento. Muito frequentemente eles
agiam apenas como sentinelas, responsáveis por convocar outros para prender
criminosos, repelir ataques ou acabar com incêndios. Eles representavam uma polícia
especializada, na medida em que usavam força física e só se dedicavam exclusivamente
a isso, sendo esta a característica fundamental de especialização.
Um aspecto importante da especialização da polícia foi a remoção dos militares
da manutenção da ordem interna. Uma vez que as unidades militares também
defendiam as comunidades externamente, seu uso dentro do País, que ocorreu
historicamente em praticamente todos os lugares, representa uma especialização
imperfeita do policiamento. Este tipo de especialização imperfeita tem sido uma
característica importante no continente europeu, representado pelo sistema da
Gendarmerie35. Desenvolvidos inicialmente na França, as gendarmeriess eram
compostas por militares designados para manter a lei e a ordem em áreas rurais e ao
longo das vias principais. Alguns descendentes contemporâneos dessa gendarmerie são
os Carabinieri da Itália, a Guardia Civil da Espanha, o Rijkspolitie da Holanda, a
Landespolizei da Alemanha, *Guarda Nacional Republicana de Portugal, e a Polícia
Militar do Brasil ( BAYLEY, 2003, p.53).
2.3. Formação policial para o desenvolvimento de profissionais competentes
Quando se fala em formação do oficial da Polícia, com vista a uma
profissionalização em que haja desenvolvimento de habilidades técnico-profissionais,
está se falando da presença de competência, até porque o currículo da ACIPOL fala
explicitamente de formar para desenvolver competências, mas aqui defendemos a
Competência e não as competências (no subcapítulo que se segue discutiremos este
assunto), devendo, por isso, mencionar-se o duplo carácter dessa Competência - a sua
dimensão técnica, e a sua dimensão política e ética. Neste caso, referimo-nos a duas
dimensões de um único elemento – dimensões distintas, mas profundamente
articuladas: não podemos referir-nos a uma sem a outra. E entenda-se que não se trata
de uma constatação apenas ao nível teórico e da bibliografia, mas de algo presente de
facto na natureza institucional e na prática concreta do trabalho policial, se considerada
35 Gendarmerie (Gent d´armes = Gendarme), foi o nome dado durante a revolução francesa para o velho marechausée, que por sua vez surgiu a partir das compagnies d´ordonnance. A Gendarmerie viria a tornar-se padrão nos países europeus durante a primeira metade do século dezanove.
57
como um dos elementos do aparelho ideológico do Estado. Buscamos a sustentação
desta afirmação em Louis Althusser quando afirma que,
O Estado é um aparelho repressivo, repressão esta executada através de seus mais variados órgãos. Os Aparelhos Repressivos do Estado (ARE) são, na verdade, o governo, a administração, o exército, a polícia, os tribunais, as prisões, e que funcionam através da violência, ao menos em situações-limite, já que a repressão, por exemplo, administrativa, pode ocorrer sem qualquer acto violento (ALTHUSSER, 1985, pp. 67-8).
Entretanto, Rios (2003, p.8) chama a atenção ao facto de que “a partir da
explicação dos componentes da competência, pode surgir uma dicotomia entre esses
componentes” que gera uma discussão entre alguns pensadores. De um lado, procura-se
destacar a dimensão técnica e a idéia de neutralidade (ou imparcialidade) na actuação
policial; de outro, destaca-se a dimensão política e a idéia de militância como
indispensável para o trabalho policial.
Neste trabalho não aprofundamos essa discussão, pois nosso propósito não é
optar por raciocinar usando alternativas exclusivas (ou/ou), mas procurar demonstrar
porque é que ancoramos a formação equilibrada entre os fundamentos teóricos e as
habilidades técnico-profissionais às práticas pré-profissionais e ao estágio curricular
supervisionado, pois o agir profissional exige sempre a competência requerida pelo
cargo ou função. Ao longo do presente texto o termo que será usado é Competência,
porém, como grande parte dos autores que colaboram com suas reflexões neste trabalho
usam o termo competências, sempre que este conceito aparecer deverá ser entendido
como Competência nos termos em que é definido por RIOS (2003, p.9).
Deste modo, é esclarecedora a visão da autora Terezinha Rios quando, afirma
que:
(...) a realidade nos obriga a tomar consciência de que a conjunção correta é aditiva. A realidade não é sim ou não – ela é sim e não. No caso da competência, na verdade, nem sequer estamos diante de elementos contraditórios; pelo contrário, eles se interpenetram e completam o sentido da competência (RIOS, 2003, pp.8-9).
Em todo o caso, os esforços da interpretação dialéctica da dicotomia não
superam ainda as divergências em volta do tema, esse tipo de discussão ainda se
mantém e provoca reflexões. Mas a mesma autora esclarece que:
58
A dicotomia pode ser evitada, e superada, se tomarmos consciência de que há uma dimensão ética articulada à dimensão política e à dimensão técnica. Não se trata de acrescentar mais um elemento aos já existentes (o que certamente não faria avançar a discussão e só contribuiria para complicá-la), mas trata-se de apontar um elemento que existe como mediação36 entre as duas dimensões – inseparáveis- da competência (RIOS, 2003, p.9).
Aplicando as ideias da autora à formação policial podemos aferir que o facto de
se estabelecer uma polémica com relação à competência já revela uma preocupação
com o dever ser do desempenho do oficial da polícia em qualquer que seja a área e
nível de actividade policial. Citando a autora:
Se analisarmos a expressão saber fazer bem como explicadora do que é necessário” ao oficial da polícia para que profissionalmente ele ocupe o lugar que lhe compete na polis, verificaremos que o advérbio bem indica algo que diz respeito tanto à verdade, do ponto de vista do conhecimento, como ao valor, do ponto de vista da atitude que se exige do polícia. “Ser competente é saber fazer bem o dever (RIOS, 2003, p.9).
Ao dever se articulam, além do saber, o querer e o poder. No essencial é
necessário um saber, isto é, o domínio dos conteúdos a serem aprendidos e das técnicas
para articular esses conteúdos às características da formação que é oferecida, dos
alunos que atendem a essa formação e do contexto, mas esse saber pode perder seu
significado se não estiver ligado a uma vontade política, a um querer que determina a
intencionalidade do acto formativo. Rios (2003, p.10) afirma que esse ato não se exerce
com seu sentido real de práxis, de trabalho, se não contar com a liberdade, enquanto
poder de direcionamento do processo.
Ao mencionarmos as características da formação policial, não podemos deixar
de considerar que se trata de preparação de profissionais cujo objecto de trabalho são,
em parte, as relações que envolvem a organização do poder na sociedade. Desse modo,
a articulação entre o dever e o poder leva-nos, necessariamente, a considerar e “a
perceber a relação entre a moral e a política – o dever se estabelece na polis, numa
determinada organização social, em que se estruturam diversas formas de poder”
(RIOS, 2003, p.23).
36 O conceito de mediação indica que nada é isolado. Implica, então, o afastamento de posições irredutíveis e sem síntese superadora. Por outro lado, implica uma conexão dialéctica de tudo o que existe, uma busca de aspectos afins, manifestos no processo em curso. A distinção existente entre esses aspectos oculta uma relação mais profunda que é a fundamentação nas condições gerais da realidade.” (Cury apud Rios, 2003, p.9).
59
O Polícia é o guardião da Polis. Segundo Casali (2012, p.15) os mesmos
sentidos conceituais que associam o Policial à Cidadania, Civilidade e Civilização
devem associá-lo igualmente à Política e, consequentemente, ao poder.
Bobbio, citado por Rios (2003, p.23), estabelece essa relação nos termos
seguintes:
O poder é definido por vezes como uma relação entre dois sujeitos, dos quais um impõe ao outro a própria vontade e lhe determina o comportamento. (...) O poder político pertence à categoria do homem sobre outro homem e não do homem sobre a natureza. Esta relação de poder é expressa de mil maneiras, onde se reconhecem fórmulas típicas da linguagem política: como relação entre governantes e governados, entre o soberano e súbdito, entre Estado e cidadãos, entre a autoridade e a obediência, etc.
Para o nosso caso específico da área policial num Estado de direito democrático,
ao fazer referência ao poder, vislumbra-se a necessidade de desvinculá-lo da
concentração exclusiva de dominação e resgatá-lo, como diz Rios (2003, p.58), na sua
significação de consenso (como queremos que ele exista na construção de uma nova
sociedade).
Considerando a afirmação supracitada para a acção do polícia na sociedade no
que Libâneo citado por Rios (2003, p.58) chama de saber ser, ao lado do saber que se
identifica com domínio dos conteúdos e da tecnologia policial, temos de encontrar um
“saber que sabe”, aquilo que a autora chama de consciência, não num primeiro nível,
de percepção da realidade (policial), mas de percepção da percepção, isto é, percepção
crítica.
O “saber que sabe”, de forma reflexiva, sabe o alcance do saber, as suas implicações, o seu rumo. E não poderá recusar-se a uma tomada de posição diante do saber que constata possuir. É por isso que dizemos que uma visão crítica da realidade não leva, automaticamente, a uma intervenção crítica, mas é um primeiro passo, se se pode ver com clareza o apelo da necessidade que está presente no real (RIOS, 2003, pp.58-59).
Na sociedade moçambicana onde os interesses, ainda que não antagônicos, são
divergentes, as vontades, sem dúvida, dirigem-se para objectivos conflitantes, apesar de
o discurso “oficial” referir-se a um objectivo único: o chamado “bem comum”, que se
traduz na realização pessoal, a integração participante na sociedade. O que o polícia
decide fazer com o conhecimento, com as habilidades e tecnologia que domina é
extremamente relevante para que sua acção seja legitimada e qualificada de
competente.
60
Pode-se afirmar que, nesse sentido, o saber e o saber fazer ganham uma espécie
de carácter instrumental, isto é, eles não têm sentido isolados do para quê saber e fazer,
que afasta a possibilidade de uma suposta neutralidade. Não há, nem pode existir uma
polícia (tal como ela é entendida e definida hoje) neutra.
Se o oficial da polícia pensar que sua tarefa é aplicar restritamente a lei e
ignorar as pessoas concretas das comunidades concretas e a condição em que vivem,
trabalham e convivem, obviamente não vai aprender a pensar politicamente ou talvez
vá agir politicamente em termos conservadores, chocando e perturbando a sociedade
com atitudes que conflituam com seus valores, usos e costumes.
Em cumprimento de sua missão de manter a ordem, segurança e tranquilidade
públicas, a Polícia depara-se, inúmeras vezes, com actos deliberados de perturbação ou
quebra da ordem pública, que não é simples delinquência comum, sendo exigida a sua
intervenção para a reposição da ordem. Porém, por detrás desse fenómeno de quebra de
ordem há motivações políticas inconfessadas. Se o oficial da Polícia pensar que sua
obrigação é aplicar a lei e ignorar essas motivações políticas inconfessadas, poderá
chocar e perturbar a sociedade com atitudes que, embora legais, conflituam com
interesses legítimos da cidadania.
A literatura filosófica contemporânea, que importa referenciar para se
reposicionar e reforçar a noção de guardiões da Polis, converge na ideia de que o
comportamento do homem é político enquanto logos (razão e palavra), mas também
enquanto nomos (criação de regras, escolha e compromisso). Na verdade, no
compromisso o homem empenha a sua palavra, criadora de valores, de significações,
conforme afirma Andrade citado por RIOS (2003, p.55):
A consciência política (...) será historicamente conceptualizada no logos e no nomos. A Polis, concretização racional do nomos, é o lugar onde o homem legitima seu destino, dando significação e finalidade às suas acções, e escapando, dessa maneira, à arbitrariedade do fatum. A Polis é uma totalidade onde o homem confere sentido à sua existência, reconhece e assume seus valores e assume explicitamente seu destino como uma pergunta que tentará responder com sua acção política. A Polis é uma efectivação do logos, da palavra explicitada.
Aqui, destaca e enfatiza-se a perspectiva de relação que se encaminha para o
social, o qual está contido no político. E, mais uma vez, ressalta a importância da Polis
e sua significação.
61
Sendo social ou “político” por natureza, por isso que é logos, razão e palavra, que implica em si mesmo o outro, ou a alteridade, o homem está destinado a viver na Polis, na cidade, não sendo possível transformá-lo (nem protegê-lo), isto é, educá-lo... sem transformar simultaneamente a polis na qual o homem vive. (CORBISIER apud RIOS, 2003, p.54).
Por outro lado, resgata-se o sentido da história e do trabalho, fundamento desta,
como componente essencial da “humanidade” do homem. Assim, se ligarmos a idéia de
profissão à de trabalho, teremos de explorar a noção de “profissionalidade” do campo
da segurança pública – campo de trabalho da polícia. Se quisermos recuperar o carácter
profissional da actividade ou prática policial, devemos aprofundar a questão tanto da
dimensão técnico-ética quanto da dimensão ético-política do desempenho do polícia.
Quando nos referimos ao desempenho do polícia (como indivíduo que age na
corporação), diferente do desempenho da Polícia (organização/corporação que integra
os polícias), é preciso estabelecer e distinguir a subjectividade, presente na dimensão
política. Apesar de não haver como afastar a subjectividade que está presente na
valorização, na intencionalidade que se confere à prática policial, há, entretanto,
algumas observações e distinções que é preciso estabelecer, para auxiliar a nossa
compreensão no uso dos termos.
É preciso distinguir subjectividade de singularidade. O singular é o que diz
respeito ao indivíduo, aspectos de sua actuação que o distinguem dos demais (Rios,
2003, p.53). Portanto, quando nos referimos à subjectividade e a distinguimos de
singularidade, para evitar o risco de individualismo, devemo-nos referir também à
distinção subjectividade/objectividade, que permeia a discussão sobre a relação
existente entre ética e técnica. A técnica aparece como o espaço da objectividade, que é
inadequadamente (ibidem, p.55) identificada com neutralidade. Quanto a esse aspecto,
apesar de não ser nosso principal objecto de reflexão neste trabalho, há a considerar o
seguinte: Se o conhecimento é resultado de relações sociais dos indivíduos, ele tem,
indiscutivelmente, uma conotação de valor, ainda que revistida de objectividade.
Quando se fala em objetividade, deve-se pensar na atenção às características do objeto, na necessidade de se evitarem as interferências que podem distorcer o conhecimento. Mas se o conhecimento é relação dialéctica sujeito-objeto, não posso em momento algum falar na possibilidade de “não envolvimento” do sujeito com o que ele conhece. Isso não significa que nos encaminhamos para um relativismo no campo do conhecer, mas sim que todo o conhecimento é historicamente situado e que, ainda que tenha como característica a objectividade, não é de modo algum neutro. É assim que posso descobrir a moralidade, o ethos na dimensão técnica da actuação do polícia. (RIOS, 2003, p.56).
62
Podemos aferir, portanto, que há escolhas, há exigências de carácter social no
que se chama de técnico, no policiamento, no trabalho policial em geral. E essas
escolhas têm implicações ético-políticas.
Essas considerações conceituais, ainda que pareçam supérfluas, são
indispensáveis para melhor posicionarmos a questão da relação entre Polícia – política
– poder ou ainda, o poder político do polícia como um poder que deve ser eticamente
exercido.
Pela sua importância no esclarecimento da questão em discussão, transcrevemos
uma passagem do artigo de CASALI (2011), citando Enrique Dussel, que é longa, mas
difícil de parafrasear, para não destoar seu conteúdo optamos por trazê-la na íntegra:
(...) Dussel denomina de potentia o poder originário e inerente que tem a comunidade política, o povo, para realizar sua vontade colectiva. Mas a potentia da comunidade política tende a dispersar-se em consequência da disparidade e contraposição de interesses particulares no seu interior. Essa dispersão, se não for canalizada em prol do bem comum, resultaria em impotência. Por isso, por imperativo meramente racional e organizacional, a potentia de uma comunidade deve ser unificada e ordenada numa ordem superior representativa e delegada: a potestas. Temos, assim, a potentia como a fonte do exercício do direito à realização da vontade coletiva da comunidade (que consiste antes em realizar sua vida, simplesmente, do que em não-ser-dominada, como postulava Maquiavel); e a potestas como o dispositivo instrumental institucional que tornará exequível essa vontade coletiva da comunidade. A potestas é, pois, o conjunto de dispositivos do poder político institucional como exercício delegado da potentia. No pólo do poder como potentia, pois, está o povo; no pólo do poder como potestas estão os órgãos do Estado e os governantes e, como delegados do Estado, ou seja, em última instância como delegados do povo, estão os Policiais” (DUSSEL apud CASALI, 2011, pp.3-4).
Destacamos a citação supra para ressaltar algo que procuramos reforçar aqui:
fazemos referência a querer político, a missão histórica consciente e conseqüente, a
ampliação da margem da liberdade. Vontade, liberdade, consequência – conceitos que
estão sem dúvida no terreno da ética política. A articulação entre esses conceitos é que
nos auxilia na busca da compreensão da competência do oficial da Polícia, pois
constatamos que não basta levar em conta o saber, mas é preciso querer. E não adianta
saber e querer se não se tem percepção do dever e não se tem o poder para accionar os
mecanismos de transformação no rumo da segurança pública e da sociedade que é
necessário construir (RIOS, 2003, p. 57).
Aqui se faz desse modo, a conexão dos elementos envolvidos no cerne do
comportamento moral, que interessa à Ética, como vimos, refere a mesma autora,: só
posso falar em compromisso, se menciono a adesão, a partir de uma escolha do sujeito,
63
a uma certa maneira de agir, a um certo caminho para a acção. É para que essa adesão
seja significativa que devem se conjugar a consciência, o saber e a vontade, que de
nada valem sem explicitação do dever e a presença do poder (ibidem).
Se assim é, a dimensão ética da competência não está presente apenas na
competência do oficial da Polícia. Ela faz parte da competência profissional, qualquer
que seja o campo de actividade ou de actuação dos indivíduos. Neste trabalho
destacamos a competência do oficial da Polícia, na medida em que estamos fazendo
uma reflexão sobre uma prática que é a nossa, e da qual temos estado mais próximos.
2.4. Buscando referências teóricas para a formação pretendida na ACIPOL
Como foi referido no capítulo anterior, o resultado esperado desta pesquisa é
apresentar referências críticas para inovações na formação realizada pela ACIPOL, nos
domínios do currículo, da metodologia e do estágio curricular supervisionado, através
da análise aprofundada das práticas pré-profissionais e do estágio supervisionado como
eixos articuladores de uma formação equilibrada entre os fundamentos teóricos e
habilidades práticas, capacitando os formandos ao cumprimento adequado das
exigências gerais e específicas do trabalho da polícia no contexto de Moçambique.
A inovação compreende necessariamente a introdução de uma novidade num sistema educativo que promova uma real mudança resultante do esforço deliberado e conscientemente assumido, fruto de uma ação persistente e integrada num processo dinâmico, que objetive uma melhoria pedagógica. (MASETTO, 2010, p.79).
No entanto, a formação superior em ciências policiais ainda não é algo comum
em África, havendo poucos países africanos com academias policiais que fazem
formação superior de raiz. A título de exemplo, na África Austral são conhecidas, por
enquanto, apenas duas Academias policiais que realizam formação superior,
nomeadamente a International Law Enforcement Academy (ILEA), localizada em
Gaberone na República do Botswana, e a ACIPOL em Moçambique. Este facto
justifica, em parte, a escassez de bibliografia específica em formação policial na África
Austral. Por extensão, o campo epistemológico que sustenta estudos desta natureza não
é desenvolvido, facto que exige uma pesquisa capaz de abarcar e considerar as
experiências pessoais, orais e escritas, de profissionais directamente envolvidos tanto
na área operacional como na de formação policial.
64
Sob o ponto de vista epistemológico, neste estudo, a realidade policial no
contexto de formação em Moçambique é tomada como objecto de investigação, mas
numa perspectiva crítica, “capaz de desenvolver um movimento que busque
compreender essa realidade enquanto totalidade e produto de múltiplas determinações”
(BRANDÃO & STRECK, 2006, p. 127).
Este estudo tem como finalidade levantar opiniões e sugestões de oficiais da
polícia sobre a formação policial vinculada à prática, articulada a partir das práticas
pré-profissionais e do estágio curricular, capacitando os formandos a desenvolverem
conhecimentos, competências, e habilidades técnicas integradas de policiamento
orientado para a resolução de problemas da segurança pública no contexto de
Moçambique. Habilidades técnicas, segundo Martins (2000, p.49), são as capacidades
requeridas para executar com eficiência um certo acto ou uma certa tarefa. Neste caso,
orientando o estudante ao desenvolvimento da competência que será requerida na sua
futura função, através do processo de aprendizagem.
O conceito de aprendizagem, bem como o seu estudo, tem vindo a sofrer
modificações e abordagens diversas ao longo do tempo, estando, contudo, ligado ao
desenvolvimento da psicologia e das diferentes correntes de pensamento.
As diversas teorias de aprendizagem surgidas distinguem-se entre si pela forma
como explicam o aparecimento de novos comportamentos que delas decorrem, e
explicam os diferentes conceitos de aprendizagem e as diferentes formas de aprender.
A título meramente elucidativo, a tabela que se segue apresenta as principais teorias de
aprendizagem e o seu enfoque:
65
Tabela 2: Teorias de Aprendizagem, Representantes e Principal Fundamento Teroria de Aprendizagem Representante/s Principal Fundamento
Epistemologia Genética PIAGET
Estrutura cognitiva do Sujeito: Assimilação, Acomodação e Equilíbração
Teoria Construtivista BRUNER Aprendizagem como Processo Activo, Participativo e Interactivo
Teoria Sócio-Cultural VYGOTSKY Zonas relacionais de desenvolvimento
Aprendizagem baseada em Problemas/instrução ancorada
BRANSFORD & the CTGV
A aprendizagem inicia com um “problema” mal estruturado
Teoria de Flexibilidade Cognitiva FELTOVITCH & COULSON
Transferência de conhecimentos e habilidades para situações novas
Teoria de Aprendizagem Situada LAVE Aprendizagem inseparável da Prática
Teoria de Gestalt LEWIN (1890-1947); KOHLER (1887-1967).
Enfatiza a percepção em vez da resposta ao estímulo; figura e Fundo
Teoria da Inclusão AUSUBEL
Conhecimento Prévio como principal factor da aprendizagem
Teoria da Aprendizagem Experimental
ROGERS
Experiência como principal factor da Aprendizagem
Teoria de Inteligências Múltiplas GARDNER Existência de vários tipos de inteligência de aprendizagem
Fonte: Pozo (1998, p.135) Teorias Cognitivas da aprendizagem- adaptado pelo autor
As teorias fazem uma nítida distinção de enfoques de incidência e de discussão
sobre o que consideram factor fundamental para que a aprendizagem ocorra, ou seja,
para que alguém aprenda. Porém, no real processo da aprendizagem, à medida que o
aprendente vai buscando recursos (estratégias) que lhe permitam desenvolver novos
conhecimentos, os enfoques referidos pelas teorias vão se cruzando, complementando,
entrelaçando, em um complexo processo que Morin (2007, p. 10) designa por
organização do conhecimento 37.
POTTER (1999) defende que aprender é adquirir novos conhecimentos ou
habilidades através da prática reforçada e da experiência. Quem aprende acrescenta de
forma construtiva novos conhecimentos aos conhecimentos que possui, rentabilizando
os já existentes. Mas o conhecimento não vale por si, senão pelo seu valor prático.
Os formandos são muitas vezes acusados de não conseguirem fazer uma
adequada ligação entre a teoria e a prática dos conhecimentos adquiridos. Dadas as
características da própria formação, que inclui instrução e treino, a importância da
37Qualquer conhecimento opera por selecção de dados significativos e rejeição de dados não significativos: separa (distingue ou disjunta) e une (associa, identifica); hierarquiza (o principal, o secundário) e centraliza (em função a um núcleo de noções-chaves). Estas operações, são de facto comandadas por princípios combinados e supralógicos.
66
transferência na aprendizagem é enorme e não se pode limitar ao processo em si. Não
chega. É necessário que o formando seja confrontado com situações de aprendizagem
(cognitivas e contextuais) a partir das quais possa mobilizar os conhecimentos
interdisciplinares que detém para aquele momento presente, mas também que seja capaz
de os projectar para o futuro e que os consiga aplicar em situações concretas. É neste
contexto que se revela a importância da transferência da aprendizagem.
A transferência de aprendizagem pode ser definida como a aplicação efectiva no
trabalho dos Conhecimentos, Habilidades e Atitudes (CHAs) desenvolvidos em acção
instrucional ou de formação (PILATI & ABBAD, 2005, p.43).
Neste trabalho, CHAs são usados como significando:
C = saber
H = saber fazer
A = saber ser, saber estar
Abbad e Borges-Andrade (2004, p. 237) definem transferência de aprendizagem
como sendo as mudanças no indivíduo verificadas em actividades e situações diferentes
daquelas em que ocorreu a aprendizagem, podendo variar em sentido (lateral e vertical)
e direcção (positiva e negativa). A transferência lateral se refere a um tipo de
generalização que inclui desempenhos que não foram directamente aprendidos, mas que
são semelhantes aos aprendidos, ou seja, apresentam o mesmo grau de complexidade. A
transferência vertical envolve aprendizagem de capacidades/habilidades mais
complexas a partir de capacidades/habilidades mais simples. A actividade da Polícia é
tão específica, complexa e dinâmica que só pode ser desempenhada com sucesso se os
profissionais intervenientes tiverem a adequada capacidade de transferir os
conhecimentos a ela inerentes para a situação.
Na realidade da nossa formação é fundamental que o docente/formador reflicta
com o formando quais as implicações e solicitações práticas que os conhecimentos
teóricos permitirão atender, e atender satisfatoriamente. Por isso, defende-se neste
trabalho uma formação em que o conhecimento pertinente seja construído de forma
consciente, significativa e participativa.
Esse tipo de formação é sustentada por correntes teóricas empenhadas em
explicar como a inteligência humana se desenvolve partindo do principio de que o
desenvolvimento da inteligência é determinado pela interacção entre o indivíduo e o
meio. Esta concepção do conhecimento e da aprendizagem que deriva, principalmente,
das teorias da epistemologia genética de Jean Piaget, parte da idéia de que o homem não
67
nasce inteligente, mas também não é passivo sob a influência do meio, isto é, ele
responde aos estímulos externos agindo sobre eles para construir e organizar o seu
próprio conhecimento, de forma cada vez mais elaborada (AZENHA, 1997, p.18).
De acordo com Azenha (1997), o construtivismo (com os aspectos radicais
superados) é uma das correntes teóricas que propõem que o estudante, em actividade de
formação, participe activamente na própria aprendizagem, mediante a experimentação,
a pesquisa em grupo, o estímulo à dúvida e o desenvolvimento do raciocínio, entre
outros procedimentos. Assim, o sujeito do conhecimento está o tempo todo modelando
suas acções e operações conceituais com base nas suas experiências.
Azenha defende o método de formação que enfatiza a importância do erro não
como um tropeço ou fracasso, mas como um trampolim na rota da aprendizagem. Uma
pessoa aprende melhor quando toma parte de forma directa na construção do
conhecimento que adquire, superando progressiva e conscientemente as dificuldades
que se interponham (AZENHA, 1997, p.18).
Propor contribuições das teorias psicológicas para a formação policial é válido e
a Psicologia, há muito, tem contribuído enormemente para a formação profissional,
especialmente por valorizar o formando enquanto sujeito da acção formativa, no
triângulo formando – formador – conteúdo. Porém, as mudanças sugeridas pela
abordagem pedagógico reflexiva vão além e interferem na dinâmica formativa, na
estrutura da instituição formadora: tiram o docente/formador de seu papel tradicional –
de detentor soberano do saber, apresentador de conhecimentos, tornando - o um
mediador da aprendizagem; modificam a acção do formando – a quem cabe elaborar
idéias e discuti-las, ao invés de ouvir e repetir, e da instituição provedora da formação –
que passa a ter como principal função levar o formando a construir conhecimentos e
não oferecer (somente) às novas gerações os conhecimentos, neste caso,
corporativamente valorizados, ou seja, o legado cultural da corporação.
A descrença em abordagens formativas de natureza prescritiva, exteriores ao
ambiente de trabalho do oficial da Polícia e ao seu contexto particular, visando a
aplicação e reprodução de regras e receitas castrenses tidas como eficientes e eficazes,
coloca novos desafios curriculares e é partilhada por um leque alargado de autores
(Alarcão, 2001; Araújo & Satre, 2009; Azenha, 1997; Barato, 2003; Cardim &
Miranda, 1998; Masetto, 2010; Pacheco, 2001; Pimenta, 2011; Sá – Chaves; 2000;
Schön, 1987; Wallace, 1991; Vieira, 1993ª, entre outros).
68
A uma visão marcadamente técnica e aplicacionista da formação profissional,
sustentada por uma pedagogia transmissiva, estes autores contrapõem modelos de
formação cujo foco se centra na acção-reflexão-acção, como práxis, e cuja finalidade
primordial é a melhoria da prática profissional do formando, visando o
desenvolvimento da sua autonomia e emancipação profissionais. Superando o
construtivismo, propõem o desenvolvimento de um profissional prático reflexivo
consumidor crítico das teorias públicas e produtor criativo de saberes profissionais
específicos e contextualizados.
O termo reflexão é discutido por vários autores com perspectivas teóricas
diferentes. Na perspectiva crítica e pedagógica de formação profissional, para Ferreira
(2000) reflexão significa acto ou efeito de reflectir (-se); volta de consciência, do
espírito sobre si mesmo, para exame de seu próprio conteúdo. Reflectir, segundo o
autor, designa uma acção que favorece a retomada do que será praticado, foi, ou está
sendo a fim de proporcionar a retrospectiva da actividade realizada em um momento
que privilegia a formulação de novos conceitos, idéias e olhares, visando assim corrigir
o que for necessário ou reforçar as acções que deram certo, e, que, portanto devem ser
repetidas e consolidadas. Em termos de currículo, essa visão coloca o sujeito da
formação no centro da aprendizagem e visa desenvolver uma consciência crítica
(FREIRE, 2010, p.41).
O esquema conceptual de Wallace (1991, p.49) representado na Figura 1, que se
segue, é elucidativo dos processos através dos quais, no seio de um paradigma
reflexivo, o conhecimento profissional se desenvolve.
Figura 7: Desenvolvimento Profissional (modelo reflexivo)
Conhecimento
Recebido
Conhecimento
Prático
Esquemas conceituais
ou constructos mentais do profissional
em formação
Competência Profissional
Prática Reflexão
Estágio 1(Pré-treinamento)
“Ciclo Reflexivo”
Estágio 2(Formação/Desenvolvimento Profissional)
Objectivo
Modelo Reflexivo do Desenvolvimento Profissional
Fonte: Wallace, 1991, p. 49 – (adaptado pelo autor)
69
A reflexão crítica da prática operacional do polícia permite-lhe desenvolver
competência necessária ao seu exercício, tendo em vista que o mesmo refere-se a uma
nova maneira de agir e interagir com as pessoas e situações que demandam sua
intervenção. Observar, reflectir, analisar, indagar, confrontar situações e agir é um
caminho necessário à acção policial, pois proporciona novos conhecimentos, uma
ressignificação da própria prática, bem como a construção de novas situações que
favorecem um melhor resultado no trabalho desenvolvido. “É esse processo que
constitui uma conversação reflexiva com os materiais e acções de uma situação”
(SCHÖN, 2000, p.124).
Importa salientar que na linguagem policial normal o termo polícia reflexivo
não é comumente utilizado, ou quando o é, o que acontece esporadicamente, é apenas
como um adjectivo, vazio até de sentido. Assim, muitos profissionais da polícia acabam
banalizando o real sentido referente à concepção, sem levar em consideração que a
prática reflexiva é permeada por um significado. Não se pode afirmar que um polícia
realizou uma reflexão para realização de uma determinada actividade, e por isso é um
polícia reflexivo. Se o processo reflexivo que permeou a acção do polícia não for
permanente nem crítico, é difícil conceber a prática deste como uma prática reflexiva.
Podemos destacar os movimentos que caracterizam a presença da reflexão na
concepção do polícia como profissional reflexivo, recorrendo à visão de Schön (2000),
e com os subsídios de Perrenoud (2000). O autor aponta alguns sentidos da reflexão
necessários ao profissional reflexivo: a reflexão-na-acção, a reflexão-sobre-a acção e
a reflexão-sobre-a-reflexão-na-acção, procurando entender o que seriam esses
movimentos que, em nossa opinião, permeiam a concepção, por analogia, do oficial da
Polícia como um profissional reflexivo, destacamos o sentido e significado de cada um
deles.
A reflexão na acção representa a reflexão realizada no momento da acção, o que
proporciona uma ampla aproximação do oficial da Polícia com o problema,
necessidade ou situação apresentada. A reflexão durante a acção ajuda ao oficial
compreender criticamente o processo que naquele momento permeia o que está
acontecendo no calor da ação. Assim sendo,
(...) A reflexão-na-ação tem uma função crítica, questionando a estrutura de pressupostos do ato de conhecer-na-ação. Pensamos criticamente sobre o pensamento que nos levou a essa situação difícil ou essa oportunidade e podemos, neste processo, reestruturar as estratégias de ação, as compreensões
70
dos fenômenos ou as formas de conceber os problemas. (SCHÖN, 2000, p. 33).
O mesmo autor destaca ainda que a reflexão-na-acção ocorre no acto de
conhecer na acção. O problema, necessidade ou situação se apresenta e neste momento
o oficial da Polícia reflectirá em torno do que seria necessário fazer para solucioná-lo.
Assim, o oficial acaba por dialogar com a situação que está ocorrendo, buscando
solucionar os problemas que surgiram.
Relativamente à reflexão-sobre-a-acção, esta dimensão apresenta um sentido
retrospectivo, uma vez que provoca no oficial da Polícia, uma análise da acção
desenvolvida, procurando despertar nele uma melhor compreensão a fim de que caso a
acção se repita, o oficial já tenha consciência do que seria necessário fazer, que
medidas tomar, ou como agir.
Se assim é, a reflexão-sobre-a-acção permite ao oficial questionar-se acerca da
acção desenvolvida, procurando compreender suas opções e analisar se estas foram
correctas, adequadas e oportunas, a fim de que, caso seja necessário em outras
situações, elas sejam transformadas, atendendo de facto às necessidades apresentadas.
Salienta-se ainda que a dimensão reflexão-sobre-a-acção provoca no oficial da
Polícia questionamentos que permeiam a acção que ele desenvolveu, onde ele procura
conhecer os resultados que sua acção provocou, comparando-os com os resultados
esperados, compreendendo assim os significados que sua acção tem e os significados
que ela deveria ter.
Finalmente, a reflexão que permeia a dimensão da reflexão-sobre-a-reflexão-na-
acção faz com que o oficial da Polícia seja um verdadeiro investigador de sua prática,
analisando além das acções desenvolvidas, os saberes que a norteiam, a teoria na qual
as acções foram desenvolvidas, agindo criticamente em torno de sua prática: o porquê
de reflectir, o que o levou a reflectir sobre a acção, por isso uma reflexão-sobre-a-
reflexão-na-acção. Esta dimensão da reflexão inclui os significados e resultados
produzidos por aqueles que, sendo colaterais ou colaboradores, agiram na sequência e
por conseqüência da acção do oficial da Polícia.
Desta forma, pode-se perceber que o processo que envolve a prática profissional
concreta do oficial da Polícia reflexivo é complexo e envolve uma série de acções
permeadas e subsidiadas pela reflexão, para atingir a criticidade necessária ao exercício
de uma prática crítico-reflexiva.
71
À formação cabe a complexa missão de transformar as acções do oficial não
reflexivo em acções crítico-reflexivas, o que requer reposicionamentos, reconstrução de
concepções e, acima de tudo, necessita primeiramente que o formando assuma uma
postura crítica frente à sua prática, pois ser um polícia crítico-reflexivo irá depender
fundamentalmente da visão do próprio oficial frente às necessidades de seu trabalho, as
necessidades de pesquisar e reconstruir sua prática policial, e, sobretudo as
necessidades de, por meio da sua acção, assegurar a garantia dos direitos e liberdades
dos cidadãos, o que poderá levar a uma profunda transformação e os oficiais da Polícia,
e a Polícia, devem estar preparados para tal situação.
Para o efeito, o currículo e os programas de formação devem permitir que a
aprendizagem esteja ligada a ambientes profissionais, que desafiem o cadete a
mobilizar, de forma articulada, interdisciplinar e interactiva, todo o conhecimento
proporcionado pelas diferentes disciplinas do curso, organizadas por eixos ou pilares de
conhecimento para agir na realidade profissional; devem permitir que o cadete
desenvolva a qualidade que Freire (2010, p. 40) denomina de consciência crítica, se
caracterize pelo anseio de profundidade na análise de problemas; não se satisfaz com as
aparências e reconhece que a realidade é mutável.
Pelos fundamentos conceptuais e teóricos que apresenta, a abordagem reflexiva,
como aprendizagem significativa na perspectiva de prática reflexiva, é a teoria da
aprendizagem que enfoca de forma mais destacada o problema do equilíbrio entre os
fundamentos teóricos e as habilidades práticas no processo de formação profissional
que este estudo defende, articulados a partir das práticas pré-profissionais e do estágio
curricular supervisionado.
O que esta teoria oferece são visões críticas do currículo, podendo este definir-
se como um interesse emancipatório, resultante dos interesses e das experiências
desejadas por todos quantos participam nas actividades de formação. Ela distancia-se
da pura acepção tecnicista, admitindo, contudo, a articulação com a acepção prática. O
que as distingue é o conceito de práxis inerente ao interesse cognitivo crítico e que é
constituído pela acção e reflexão.
De acordo com (Gundy apud Pacheco, 2001, p.41), a práxis conduz, por um
lado, à emancipação, e esta só ocorre em condições de justiça e de igualdade dos vários
intervenientes do currículo e, por outro, à crítica da ideologia, que enforma todo o
projecto curricular, tornando-se só possível pela reflexividade e pela acção autônoma.
72
A autora afirma, ainda, que quando os elementos da práxis são aplicados à
natureza do currículo, estabelecem-se cinco princípios:
1. Os elementos constituintes da práxis são a acção e a reflexão;
2. A práxis tem lugar no real, não no mundo hipotético. Segue o princípio de que a
construção do currículo não pode ser separada do acto da implementação;
3. A práxis trabalha no mundo da interacção, do social e do cultural. Operando
como um tipo de práxis, não pode ser apenas sobre aprender coisas. Pelo
contrário, a aprendizagem deve reflectir-se sobre a profissão e seu contexto;
4. O mundo da práxis é o mundo construído e não o mundo natural. Este princípio
exige o reconhecimento de que o aprender é uma construção social. Através da
acção de aprender, os estudantes tornam-se particpantes activos na construção
do seu próprio conhecimento;
5. A práxis assume o processo de fazedor de sentido, que reconhece o significado
como uma construção social. O fazer significado e a interpretação é central para
o conhecimento.
Assim, a orientação crítica para todo o conhecimento é essencial quando se está
comprometido em diferentes tipos de práxis. Isto, pelo contrário, afirma, reforça a
idéia de que o processo currículo é, sem dúvida, político porque o fazer sentido
também envolve significados em conflito. Aqueles que têm o poder de controlar o
currículo são aqueles que têm o poder de se certificarem que os seus significados sejam
aceites como úteis na implementação.
2.5. A formação policial em Moçambique
A formação policial em Moçambique é definida nos termos do nº 1 do artigo 22,
secção II do capítulo III do Decreto nº 28/99 de 24 de Maio, como sendo “a
preparação técnico-profissional dos membros da PRM para a realização da missão da
PRM”.
O nº 2 do mesmo dispositivo legal refere que: O sistema de formação policial
garante a continuidade do processo de instrução e educação dos membros da PRM e
realiza-se através dos cursos de formação, cursos de aperfeiçoamento e estágios.
73
Os cursos de formação são definidos pelo artigo 23 do mesmo diploma legal
como sendo aqueles que se destinam a assegurar a preparação policial e os
conhecimentos técnico-profissionais para o ingresso nas escalas profissionais da PRM.
Os conceitos: técnico - profissional, sistema, instrução e educação presentes
tanto no artigo 22, quanto no artigo 23 do Estatuto do Polícia, sugerem, em nosso ver, a
intencionalidade de formação policial não como mera instrução técnica, mas também
como acto educativo, que é mais do que formação profissional, dos membros da PRM
para a missão social da instituição policial.
Partindo desse entendimento, destaca-se, portanto, a importância da formação
profissional inicial para a construção da identidade profissional, fundamentalmente,
como uma etapa que marca considerável diferença para a vida profissional do oficial da
Polícia, não apenas pela importância da experiência de formação do membro na
aquisição formal dos valores e normas próprias da profissão e das competências e das
habilidades para o campo de trabalho, mas também na aquisição dos valores e crenças
acerca da profissão, consubstanciados em uma base de conhecimento e de cultura
comum sobre o que é ser oficial da Polícia em um determinado modelo de Polícia
profissional.
Pode-se afirmar que, embora nos últimos anos, desde que reiniciou a formação
em 1998 depois do fim da guerra civil dos 16 anos (terminada em 1992), tenham sido
experimentadas algumas inovações na área da formação profissional da Polícia em
Moçambique, não há até o momento uma avaliação aprofundada e abrangente acerca
do seu êxito em termos de mudanças efectivas nas práticas e procedimentos
dominantes. Assim sendo, para as intervenções que visam qualificar o trabalho policial,
é necessário empreender um extenso e profundo exame das condições em que se dá a
formação profissional na Academia e nas escolas de Polícia, ou fora delas, por um lado.
Por outro, é preciso ter em conta as escolas e modelos de Polícia existentes no mundo e
que, de algum modo, inspiram formas de organização e os métodos de trabalho da
Polícia moçambicana.
A literatura especializada produzida pelas ciências sociais aponta para uma
enorme quantidade de modelos atribuídos à Polícia, sendo de destacar, dentre outros, os
seguintes: modelo paramilitar, burocrático-militar, modelo de aplicação da lei (law
enforcement), modelo de serviço, modelo de Polícia comunitária (community policing)
(PONCIONI, 2004, p. 23).
74
No entanto, importa salientar que não há modelos policiais puros,
unidimensionais, como também não há práticas policiais estáticas e que envolvam uma
só dimensão. Um modelo constitui um quadro de referência analítico, que apresenta um
conjunto coeso de argumentos acerca do papel, das funções e da missão da Polícia, da
filosofia de trabalho, da política administrativa adoptada e das estratégias e tácticas
operacionais concebidas pela organização para moldar o comportamento da Polícia
numa determinada sociedade, num dado momento histórico (ibidem).
Na Polícia moçambicana, cuja espécie de missão parece ser essencialmente a de
combater contra o crime, o modelo de prontidão militar mostra-se como aquele que está
sendo aplicado, invariavelmente, para complementar de maneira, supostamente mais
eficiente a acção da polícia, com vistas a controlar o crime.
Na literatura especializada esse modelo é criticado porque as actividades que
deslocam a Polícia para resolver outros tipos de problemas da comunidade, e requerem
outros tipos de resposta, são identificados como assistência social, e são objecto de
desprezo – garbage calls (MOORE, apud PONCIONI, 2004).
De acordo com esse modelo toda a acção policial deve ser explicada por meio
da referência à legalidade e os polícias são encorajados a controlar situações comuns
como se fossem questões de aplicação da lei, ao invés de manutenção de ordem. Com a
ênfase no controle do crime, os polícias são pressionados a produzir prisões e multas,
sendo esperado que façam seu trabalho usando a lei para punir aqueles compreendidos
como infractores (ibidem).
Nesse modo, o polícia age como um aplicador imparcial da lei relacionando-se
com os cidadãos profissionalmente, em condições neutras e distantes, cabendo-lhe
cumprir os deveres oficiais, seguindo os procedimentos de rotina, independentemente
de inclinações pessoais e a despeito das necessidades do público não-enquadradas pela
lei. As expressões “Pela lei e Ordem”; “somos implacáveis contra o crime” e outras,
usadas pela Polícia moçambicana como slogans38 (a primeira, usada principalmente nas
escolas de formação, incluindo a ACIPOL e a segunda, em alguns comandos da
Polícia) parece confirmarem um determinado modelo de Polícia e uma determinada
38 Slogan é uma palavra ou frase curta e de fácil memorização, usada com frequência em propaganda. É um termo proveniente do inglês, cuja origem etimológica é do gaélico sluagh-ghairm (pronuncia-se slo-gorm) em que sluagh significa “exército” e ghairm corresponde a choro ou grito. Sluagh-ghairm seria então o grito de guerra que identificava determinado grupo.
75
ideologia adjacente, não abertamente expressados em documentos doutrinários, mas
facilmente identificáveis no modus operandi39 da Polícia.
2.5.1. Antecedentes
Na PRM a formação policial possui um valor ambivalente: Em primeiro lugar,
ela visa incrementar o número de efectivos policiais para tentar responder à demanda
social, em termos de quantidade de polícias disponíveis. O estudo diagnóstico da
situação realizada no âmbito da elaboração do Plano Estratégico da Polícia revelou o
limitado efectivo da PRM sendo o rácio actual de 1 Polícia para 806 habitantes (1/806)
contra o convencionado de 1 polícia para 350 habitantes (1/350). Em segundo lugar, e
paralelamente ao aumento da quantidade, visa prover oficiais com melhor preparação
técnica e cientifica, para as necessidades actuais da PRM, pois os resultados de
análises recentes, acima referidos, mostram que a instituição tem fragilidades internas
ligadas ao baixo nível de escolaridade do seu corpo de oficiais. A tabela que se segue
mostra o nível de Escolaridade na base: Unidades e Subunidades (Província, distrito e
esquadra, incluindo os chefes das operações dos mesmos níveis) em 2007.
Tabela 3: Valores Absolutos/ reais de níveis de Escolaridade dos comandantes da Polícia em 2007
Função Superior Médio Básico Elementar Existentes
Comandantes Provinciais
03 08 00 00 11
DOSP Provincial 00 07 03 01 11 Comandante Distrital/Esquadra
08 45 106 43 202
Chefe das Operações 17 20 69 74 180 Total 28 80 178 118 404
Fonte: Direcção de Pessoal e Formação do Comando Geral da PRM, 2007
DOSP = Director de Ordem e Segurança Pública
39 Modus operandi é uma expressão latina que em criminologia significa "modo de operação". Utilizada para designar uma maneira de agir, operar ou executar uma actividade seguindo sempre os mesmos procedimentos. Esses procedimentos são como se fossem códigos (Barroso, 2010, p.13).
76
Tabela 4: Nível de escolaridade dos comandantes da Polícia em percentagens (%)
Função Superior Médio Básico Elementar Total
Comandante Provincial 0.7% 1.9% 00 00 2.7% DOSP Provincial 00 1.7% 0.7% 0.2% 2.7%
Cdte Dist/Esquadras 1.9% 11.1% 26.2% 10.6% 50% Chefe das Operações 4.2% 4.9% 17.1% 18.3% 44.5%
Total 6.9% 19.8% 44.1% 29.2% 100% Fonte: Direcção de Pessoal e Fformação do Comando Geral da PRM, 2007
Gráfico 1: Representação do nível de escolaridade dos comandantes (até 2007)
Fonte: Direcção de Pessoal e Formação do Comando Gerald da PRM, 2007- (adaptado pelo autor)
As tabelas e o gráfico acima mostram o nível de escolaridade dos 404 oficiais
da PRM que desempenhavam os cargos de comando, direção e chefia nos comandos
províncias, comandos distritais e esquadras, até 2007.
Conforme os dados, pode-se depreender que menos de 7% têm o nível superior
de escolaridade, ou seja, pessoal academicamente qualificado. A maior percentagem
destes é a dos chefes de operações com 6.9%.
Assim, 73.3% possuem o nível básico e elementar40, o que demonstra o baixo
nível de escolaridade dos membros da polícia a todos os níveis. Um estudo de análise
da situação interna feito em 2007 revela que
40 As designações de níveis elementar, básico e médio são utilizadas no Ensino Técnico Profissional cujo ingresso corresponde a: Nível Elementar = 5ª classe do Ensino Geral; Nível Básico = 7ª classe do Ensino Geral; Nível Médio = 10ª classe do Ensino Geral.
77
Esta situação pode estar associada à falta de uma política de formação e desenvolvimento dos recursos humanos na instituição, o que estimula práticas de nepotismo e clientelismo, sobretudo na formulação de propostas de promoção/progressão feita de forma a beneficiar interesses especiais e sem observância dos critérios legais (MINT, 2007, p.38).
Um estudo aprofundado sobre a história da formação policial em Moçambique,
desde suas origens até a actualidade, que leve em conta as diversas variáveis
intervenientes e todas as transformações operadas, ainda não foi feito por nenhum
cientista ou investigador interessado na temática de segurança pública. O que pode ser
constatado, a partir de uma leitura dos raros artigos, predominantemente de carácter
jornalístico, que tratam do assunto, é a presença nessa história de alguns
acontecimentos relevantes.
O desenrolar dos factos, tal como foi mencionado no capítulo introdutório,
indica que a Polícia da República de Moçambique foi constituída a partir dos
guerrilheiros das Forças Populares de Libertação de Moçambique (FPLM) - mais tarde
Forças Armada de Defesa de Moçambique (FADM), e formada a partir de influências
recebidas das congêneres estrangeiras.
Tomando como ponto de partida as últimas três décadas, pode-se inferir que
Tanzania e a República Democrática Alemã (RDA) constituiram o influxo inicial. De
facto, o quadro de oficiais ao longo dessas décadas era constituído, principalmente, por
elementos formados em Tanzania ou na República Democrática Alemã, aliás, a Polícia
alemã foi a principal formadora dos quadros médios de direcção, que iniciavam funções
de comando, direcção e chefia a partir do nível de comandante distrital, e como ainda
não havia formação policial de nível superior, esses quadros progrediam na carreira até
assumir cargos a nível províncial e central.
A formação de quadros médios de direcção era realizada directamente na RDA,
em Aschersleben ou no Centro de Formação de Quadros da Polícia (CFQP-
Michafutene) em Moçambique, por formadores da Polícia Alemã, assistidos, no caso de
Michafutene, por oficiais da Polícia moçambicana que iniciavam dessa forma a carreira
de formadores policiais.
A estratégia adoptada pelo governo de Moçambique para fortalecer a polícia foi
a de combinar a formação no interior do país e no estrangeiro com a formação prática
em contexto real de trabalho, aproveitando o conhecimento e a experiência dos polícias
que, voluntariamente, transitaram da Polícia de Segurança Pública portuguesa para o
Corpo de Polícia de Moçambique (CPM). Os maiores contigentes de jovens para a
78
formação policial no estrangeiro foram dirigidos principalmente para a Tanzania e para
a República Democrática da Alemanha (RDA), mas não só.
Embora a Polícia Alemã tenha contribuído para tornar a Polícia moçambicana
mais moderna e operacional, através da formação, fornecimento de equipamentos,
meios de ensino e logística, ela passou aos oficiais da Polícia moçambicana, por meio
das actividades de instrução, algumas de suas características e ideologia políticas, que
podem ser explicadas na base das teorias de reprodução social, melhor explicadas por
Bowles e Gintis.
Esses autores criticam o reprodutivismo social que se caracteriza pelas condutas
de subordinação e domínio assimiladas pelo aluno por meio das relações hierárquicas
ou linhas verticais de autoridade vigentes nas instituições de ensino. Essa explicação
aplica-se com grande margem de aproximação às organizações policiais militarizadas,
próprias do modelo “burocrático-militar” em que o sistema de patentes e postos é uma
pirâmide contínua, com linhas de autoridade directas e insofismáveis e canal de
comunicação escalonado, constituindo linha de identidade profissional socializada aos
integrantes da corporação desde a sua formação inicial (LUDWIG, 1998, p.30).
O ambiente de trabalho da caserna é predominantemente autoritário, pois as
ameaças de punição, sua prática e a vigilância são uma constante, assim como é clara a
aversão em utilizar procedimentos de conduta e persuação (LUDWIG, 1998, p.32).
Esse ambiente que marca todo o processo de formação dos polícias acaba sendo,
de alguma forma, reproduzido na acção profissional destes. Desenvolve-se um conflito
(um dilema) na medida em que o discurso do que lhes é exigido na actuação
profissional é contrário ao que lhes é aplicado durante a formação; o tratamento a que
são sujeitos tanto na formação quanto na vida profissional, quanto ao interface entre
direitos e deveres, é contrário ao que lhes é ensinado. Assim, a capacidade de agir de
acordo com a doutrina e com o código deontológico fica dependente, em grande
medida, da consciência e da capacidade de “desconstruir-construir” de cada um.
Apesar de o autoritarismo ser predominante, constata-se que na pedagogia
castrense existem práticas que podem ser denominadas de democráticas. Os cadetes
da ACIPOL, por exemplo, avaliam regularmente o corpo docente constituído por civis
e polícias, e muitos docentes e instrutores procuram alterar seus procedimentos depois
dessa avaliação; os cadetes reúnem regularmente com a direcção da Academia, através
das unidades orgânicas, para analisar o funcionamento da instituição e dos cursos;
oficiais da administração consultam os cadetes em certas ocasiões sobre as dificuldades
79
que estão encontrando para aprender, e diversas sugestões que fazem são aceites e
colocadas em prática. Importa referir, também, que vários cadetes têm oportunidade de
viajar a outros países de sólida tradição democrática para visitar academias policiais. É
provável que eles sofram influxos positivos com esses contactos.
É importante realçar, e acredita-se, que as matérias pertencentes ao rol das
ciências humanas, ministradas não só na Academia, mas também nas outras escolas da
Polícia, têm um poder especial de desenvolver o senso crítico dos alunos. Os conteúdos
e métodos de ensino, próprios da sociologia, psicologia, filosofia, etc. tendem a fazer
com que os formandos coloquem em acção seus esquemas operatórios, exercitando a
reflexão, que é uma actividade de consciência especificamente humana. Porém, não
chegam a romper a barreira do modelo formativo reduzido à sala de aula e ao campo de
instrução militar, nem a barreira do modelo profissional de Polícia predominante.
Outras teorias da reprodução seriam capazes de explicar também essa
dependência do ensino policial ao modelo. É o caso, por exemplo, da teoria da
violência simbólica de Bourdieu e Passeron. Os temas da imposição de um arbítrio
cultural, do habitus, definido como um esquema de pensar, apreciar, perceber e agir e o
tipo secundário do trabalho pedagógico, destinado à conversão radical do indivíduo,
aplicam-se à prática pedagógica castrense (LUDWIG, 1998, p.33).
A concepção de Althusser relativa aos aparelhos ideológicos do Estado, pode
ser usada para o entendimento da educação policial. Aliás, a proposta desse filósofo é a
que mais se aproxima do ensino policial, uma vez que dois de seus componentes – a
idéia de que a escola é uma instituição destinada a preparar os indivíduos de acordo
com os papéis que devem desempenhar na sociedade, sendo um deles o de agente da
repressão e o processo de inculcação da ideologia dominante – aplicam-se também à
pedagogia e ao currículo castrense (ibidem, p.33).
Por exemplo, o texto de compromisso de honra que o membro da Polícia
moçambicana, a partir do nível de sargento até aos diferentes escalões de oficiais, deve
prestar como precondição para o início do exercício de funções de comando, direcção,
chefia e confiança (art. 3, capítulo I, Decreto nº 28/99, de 24 de Maio) é demonstrativo
dessa verticalidade do cumprimento da ordem e do dever, tendo a ordem sempre em
primeiro plano e acima da consciência do dever:
Eu,..., juro por minha honra como Oficial/Sargento cumprir as ordens e os deveres policiais, de acordo com as leis e os regulamentos, contribuir com todas as minhas capacidades para o prestígio da PRM e servi-la com zelo e
80
eficiência no exercício das funções e tarefas que me são confiadas (nº 3, cap. I, art.3, Decreto nº 28/99, de 24 de Maio).
Pode-se notar, na citação supra, que todo o compromisso dá primasia ao
cumprimento de ordens e de deveres corporativos, e nada se refere, pelo menos de
forma explícita, ao principal objecto de trabalho da Polícia – a preservação da ordem e
segurança públicas e a garantia dos direitos e deveres dos cidadãos.
Podemos, portanto, afirmar que os modelos de actuação das organizações
policiais e das organizações de segurança pública correspondem aos modelos
ideológicos e de escolas policiais existentes no mundo, desenvolvidos, consolidados e
disseminados por via da formação policial.
2.6. As fontes do modelo policial de Moçambique: uma revisita às escolas e
modelos policiais no Mundo
Em estudos mais recentes da literatura especializada consta que a primeira vez
que um grupo de pessoas reuniu-se para estudar as técnicas policiais foi em 1901, na
Itália. Nas últimas décadas, entretanto, o estudo da actuação policial e dos demais
organismos de segurança pública tem sido objecto de grande atenção acadêmica
(MARCINEIRO, 2007, p.35).
Na abordagem sobre as escolas de Polícia, a literatura conclui que existem
diferentes tipos de escolas, decorrentes das políticas de segurança pública41 adoptadas
na época e local do seu surgimento.
Sabe-se que a actividade policial não foi sempre a mesma desde a sua origem,
foi sofrendo modificações em função da dinâmica da evolução das sociedades,
conforme foi desenvolvido no primeiro capítulo deste trabalho, porém mencione-se que
a história da actividade policial, num formato similar ao existente ainda hoje, remonta
ao século XIII, quando na França, com o fim do período feudal, é reorganizada a
polícia a partir da investidura militar, sendo criada a Gendarmerie, voltada a missões
militares e também de segurança pública MARCINEIRO (2007, p. 6).
Alguns séculos depois, Napoleão Bonaparte, durante suas conquistas pela
Europa, disseminou o modelo “gendarmerie” francês por todas as nações conquistadas,
modelo esse que perdura até os dias de hoje, tendo atingido também outros continentes. 41
Em termos de doutrina, segurança pública pode ser conceituada como um estado antidelitual, um
estado ideal em que impera o mais estrito respeito às normas legais e aos costumes. Aliada à salubridade e à tranquilidade pública, integra o que entendemos por ordem pública (Marcineiro, 2007, p. 35).
81
Das instituições policiais oriundas do modelo francês: fardadas, organizadas
militarmente e responsáveis pela ordem pública, as mais tradicionais são:
Gendarmeries austríacos, os Carabinieri italianos, a Guardia Civil espanhola, o
Koninklijke Marechaussee holandês, as forças policiais da Grécia, Marrocos, Argélia, a
Real Polícia Montada do Canadá, os Carabineros do Chile e demais polícias da
América Latina (MARCINEIRO, 2007, p. 6).
A maioria dos autores da literatura especializada afirma que a origem da polícia
moderna se deu em 1829, quando Sir Robert Peel, então Primeiro Ministro Inglês, criou
a Real Polícia Metropolitana de Londres, para a garantia da paz e tranqüilidade do povo
londrino. Mas ele teve como base de referência a Polícia francesa.
Por sua vez, essa Polícia francesa foi formada em decorrência da necessidade
que os Marechais de Campo tinham de cuidar da sua tropa, estacionada nas periferias
das cidades, nos intervalos de guerra. Nesta ocasião, os soldados de folga iam às
cidades e praticavam as mais variadas e abusivas atitudes contra o patrimônio e as
pessoas que ali viviam. Os Marechais, então, passaram a escolher dentre os seus
comandados aqueles que, pela sua conduta exemplar e correção de atitude, pudessem
vigiar os seus colegas para evitar que eles cometessem abusos e, se cometessem,
fossem devidamente sancionados. Esses militares policiais passaram a constituir a tropa
pessoal dos Marechais. Daí a expressão Marechaussee que denominou a Polícia na sua
origem e serve, ainda hoje, de nome para algumas polícias do mundo (MARCINEIRO,
2007, p.37).
Podemos, por isso, destacar que a preservação da ordem pública praticada hoje
e que evoluiu de forma incremental, teve forte influência da referência francesa, cuja
origem remonta à necessidade dos comandantes militares de guardar a cidade da
agressão dos próprios militares, e da referência inglesa, que fez o seu modelo
aproveitando princípios do modelo francês e do alemão.
Assim, duas grandes escolas de persecução criminal vêm influenciando a
história das polícias e dos demais órgãos de segurança pública no mundo.
Os estudos comparativos de John D. Brewer e D. H. Bayley mostram que, a par
da Polícia autoritária dos regimes totalitaristas, que não parece utilizável, as duas
grandes escolas de Polícia são: Escola de Polícia Anglo-Saxônica e Escola de Polícia
Oriental (MARCINEIRO, 2007, p.38).
82
2.6.1. Orientação e objectivos da escola de Polícia Anglo-Saxônica
A escola de Polícia Anglo-Saxônica caracteriza-se pela grande especialização,
em realizar suas tarefas associadas à vigilância do cumprimento da Lei, perseguindo e
punindo o criminoso. Firma-se como agência de administração pública, com mais
autoridade legal que moral, limitando-se a atender as situações de emergência, quando
for chamada para atender uma ocorrência. Seus agentes até podem participar da vida
diária da comunidade, mas isso não é o objecto da organização; não existe uma
interacção permitindo detectar sinais de anormalidade e agir com antecipação. Segundo
Marcineiro (2007), este é o modelo que mais se encontra nas democracias liberais.
O foco dessa escola de Polícia é a identificação da autoria do crime para punir o
criminoso. Em assim sendo, procura especializar-se na investigação criminal, no
combate ao criminoso e na severa sanção a quem tenha cometido uma infração à
legislação vigente.
2.6.2. Orientação e objectivos da Escola de Polícia Oriental
Segundo Marcineiro (2007, pp. 39-41), a Escola de Polícia Oriental enfatiza as
acções dos órgãos de segurança pública orientados para o serviço à comunidade. A
Polícia faz parte da vida diária da comunidade, existindo uma interação: Polícia X
Comunidade. A vida em sociedade é mantida sob controle através da persuasão,
aconselhamento e ajuda. Tal estratégia permite que a Polícia faça parte do contexto
social e não seja um agente estranho ao processo, de modo que todo serviço é relevante,
e nenhum assunto é tratado com indiferença.
Enquanto na escola de Polícia anglo-saxônica o foco de actuação é centrado no
combate ao criminoso, na escola oriental o trabalho das agências de preservação da
ordem pública é centrado no tratamento proativo42 do crime, agindo sobre os
elementos que possibilitam a prática do crime, quais sejam: um ambiente apropriado
para a prática do crime, um agente disposto a praticar tal crime e uma vítima em
potencial.
42 Ser pró-ativo é ser parte integrante da comunidade onde presta seu serviço (Marcineiro, 2007, p. 39).
83
A figura 8 demonstra que o crime possui, a exemplo do fogo que necessita a
interacção do combustível, comburente e uma fonte de calor para existir também um
triângulo de elementos imprescindíveis para que ocorra.
Figura 8: Triângulo da Ocorrência Criminal - Modelo da Escola Oriental
CRIME
AMBIENTE
AGENTE VÍTIMA
CRIME
Fonte: Nazareno Marcineiro, 2007 - adaptado
O autor chama à atenção para o facto de que apesar dos anunciados princípios
de inserção e colaboração com a comunidade, na escola oriental não se dispensa o uso
da força necessária para restaurar o estado de normalidade da vida em sociedade. Há,
sim, uma permanente busca de legitimação do uso dessa força.
Com o passar do tempo as organizações de preservação da ordem pública e as
polícias foram sendo influenciadas por ambas as escolas, conduzidas pelo permanente
intercâmbio cultural que existe entre os países. Hoje não há mais a prática pura dos
princípios de uma ou outra escola. Há a constatação de que a segurança pública é uma
busca humana complexa e que, por isso, deve haver a participação de todos para a
construção interactiva dessa segurança, sendo os órgãos de persecução criminal apenas
parte dos actores que deverão agir para obter os resultados desejados (ibidem).
As escolas de polícia podem ser divididas em duas classes distintas, portanto: aquela que se preocupa em reagir aos factos criminosos depois que alguém já foi vitimado e aquela que, além de uma eficiente reação, tenha como principal preocupação evitar que estes factos ocorram (MARCINEIRO, 2007, p. 39).
2.6.3. Referência aos modelos policiais
Os modelos de Polícia são as formas pelas quais os organismos de segurança
pública são estruturados e actuam nos diversos países, com foco nos objectivos a serem
atingidos.
84
Marcineiro (2007) sustenta que as polícias do mundo, e com elas os demais
órgãos do sistema de segurança pública, se distinguem em dois grandes grupos que são
as do tipo latino e as do tipo anglo-saxônico. Podemos notar que o autor introduz o
tipo latino no lugar do oriental.
As do grupo latino são mais observadas nos países unitários e as suas unidades
uniformizadas são conhecidas como Gendarmerias, Polícias Nacionais, Guardas
Nacionais e Carabineiros.
O modelo francês, ainda assim, é considerado o principal modelo mundial, pois,
como vimos, se desenvolveu e se organizou de forma integrada ao exército,
constituindo unidades de elite, as quais, a partir da Revolução Francesa e no Primeiro
Império, já no século XIX, foram introduzidas nos países conquistados por Napoleão
Bonaparte durante suas campanhas, incluindo nas ex-colónias
2.6.3.1. Aproximação ao modelo adoptado em Moçambique
Conforme desenvolvemos no capítulo introdutório, na retrospectiva histórica, a
Polícia moçambicana, embora tenha sido criada com a função de manter a ordem
pública em todo o território nacional, era invariavelmente utilizada como auxiliar ao
exército na defesa do país, constando tal missão dos respectivos estatutos.
Criada nas vésperas da independência nacional (em 1975) em uma época (de
libertação nacional) em que o país se constituía em um estado unitário, era uma
instituição tipicamente militar, exercia o papel de força de reserva das forças armadas
(Forças Populares de Libertação de Moçambique – FPLM) e baseava sua acção na
força (eram comuns as expressões combater, reprimir, atacar, etc.), embora nos seus
estatutos constasse que era uma Polícia do povo e para o povo.
A influência da formação militar na acção de Polícia foi sempre dominante,
tendo, inclusive, adoptado os regulamentos do Exército Moçambicano no que tange à
disciplina e treinamento militar.
Durante a guerra civil a Polícia esteve inteiramente envolvida na guerra
juntamente com o exército, ou sozinha onde não tivesse unidades do exército. Durante
esse período o combate tanto era à guerra como o crime; o infractor e o inimigo
confundiam-se; toda a formação era basicamente militar, a formação policial
propriamente dita era apenas complementar.
85
A transição do Estado do regime socialista de partido político único para o
regime de democracia multipartidária e de Estado de Direito, gerou a necessidade de se
estabelecerem novos procedimentos e nova estrutura organizacional para a Polícia
Moçambicana, concretizada pela Lei nº 19/92 de 31 de Dezembro, que cria a PRM.
2.6.3.2. O impacto do modelo adoptado
Essa alteração do paradigma da Polícia moçambicana sofreu uma confluência
de ideologias de actuação das polícias espanhola, portuguesa, francesa e norte-
americana, que se tornaram os grandes teóricos do novo modelo organizacional,
também chamado de Modelo Profissional (também conhecido por modelo burocrático-
militar), para a Polícia moçambicana. Nos últimos anos, pode-se registar também a
influência da ideologia da Polícia cubana, graças à retomada da cooperação entre a
PRM e a Polícia cubana.
Esse modelo surgiu do processo de “reforma”, ocorrido a partir dos anos
1996/97, visando superar o modelo de Polícia então existente – modelo este marcado
por duas características negativas: ser instrumento da ditadura, decorrente da ditadura
do proletariado de cujo aparelho estatal a Polícia era parte, e submissão aos interesses
político-ideológicos do Partido no poder.
O processo de reforma começou mudando o relacionamento da Polícia
moçambicana com os políticos, restringindo a área de interferência destes sobre a
organização policial e evitando que os políticos administrassem a Polícia de acordo
com os seus interesses partidários; em seguida foram estabelecidos programas de
reciclagem dos polícias e cursos de formação inicial, visando reformar a filosofia e os
métodos de actuação da Polícia.
A adopção de uma doutrina de actuação na área da Manutenção da Ordem
Pública, com base no cruzamento de filosofias de actuação de uma Polícia oriunda do
modelo Anglo-Saxão, com o modelo Oriental, somada à manutenção da ideologia
militar, típica das Polícias do modelo Latino, fez com que a PRM se tornasse numa
Polícia híbrida, com orientação e disciplina militar e competências de carácter policial.
Uma das características desse modelo é que a Polícia mantém simultaneamente as
funções de carácter militar e as próprias de carácter policial, e Marcineiro observa que:
86
A vertente militarista da segurança e a indistinção entre os campos político e militar levou as organizações públicas à utilização retórica de expressões como: “combate à fome”, “guerra à pobreza”, “batalha da educação”, etc. Ora, na doutrina militar, enfrentar o inimigo implica inclusive o emprego não-seletivo da força e da inteligência militar; no combate há que haver vencedores e vencidos. Tal concepção é o oposto do pretendido na preservação da ordem pública, que deseja a “erradicação” da violência, a “extirpação” do crime, com a adoção de múltiplas ações do Sistema de Justiça Criminal como um todo, ações da polícia especificamente, da sociedade civil e dos cidadãos em geral (MARCINEIRO, 2007, p. 48).
2.6.4. Fontes e natureza das actividades policiais
Quanto às fontes, as actividades policiais derivam, fundamentalmente, de três
fontes diferentes (LEITÃO, 2007, pp.2-3):
a) Tarefas provenientes de um processo de agregação, que muitas instituições
podem desempenhar, constituindo nalguns casos atribuições e competências,
mas que a Polícia por acidente ou de forma planeada desempenha. Outras tarefas
emergem pura e simplesmente porque a Polícia tem sido tradicionalmente um
braço ou ferramenta do poder executivo e logo uma autoridade estatal que por
força da sua implantação, formação e fácil activação, ainda por cima a baixo
custo, é uma garantia de efectividade para as políticas ou decisões legislativas e
executivas.
b) Tarefas “auto-assumidas” de auxílio e socorro, atribuídas em razão da sua
prontidão, isto é, pelo facto de a Polícia poder (dever) “estar lá”. O facto de
trabalhar 24h por dia e ser um corpo bem disciplinado e treinado e, sobretudo,
ou apesar de tudo, ter uma tradição de ajuda ao cidadão, tem atraído estas
funções.
c) Tarefas de Polícia, próprias do mandato policial distintivo de todas as outras
organizações, que apenas a polícia faz ou devia fazer. Estas tarefas têm a sua
génese na relação entre a Polícia e o Estado. Basicamente todas elas giram à
volta da manutenção da ordem e da aplicação da lei (no sentido anglo-saxónico
do termo law enforcement). Neste sentido, a Polícia serve para efectivar os
desígnios legislativos, através dos seus poderes coercivos para regular e
controlar as acções das pessoas. Tais poderes têm como premissa essencial a
capacidade de a Polícia poder utilizar a força legitimamente e de forma não
negociável, se assim for necessário, tendo em vista assegurar o cumprimento das
normas administrativas e legais estabelecidas (em sentido restrito) ou para
manter a conformidade entre atitudes e normas (em sentido lato).
87
Quanto à natureza, outros autores como Brodeur e Landreville (1983), avançam
com outros tipos de modelos possíveis, mencionando como exemplos o caso canadiano,
também inspirado no modelo francês, o qual serve como modelo para a identificação
das funções desempenhadas por polícias uniformizadas em muitos países. Alguns
traços desses modelos também podem ser identificados na Polícia da República de
Moçambique (PRM), em particular:
a) Controle da actividade criminal, incluindo o registo, prevenção, detecção,
aplicação da lei, detenção e recuperação de bens furtados, em coordenação ou
não com o poder judicial;
b) Manutenção da ordem, e da tranquilidade sociais, seja no âmbito da
reposição da ordem como da sua manutenção através da vigilância e imposição
da “normalidade social” ou das conformidades sociais, num conceito mais
sociológico;
c) Prestação de serviços à comunidade, também chamadas de assistência social,
disponibilidade para situações de emergência, cooperação com outras entidades,
reencaminhamento para serviços adequados à solicitação, aconselhamento
jurídico, dentre outros.
d) Serviços de carácter administrativo, incluindo as atribuições e competências
na área económica, saúde pública e salubridade, ambiente, tráfego rodoviário,
migração, lacustre e fluvial, e outras.
Poder-se-á dizer com alguma segurança, que nenhuma outra organização estatal
tem um leque funcional tão alargado e complexo como as polícias modernas. Na
verdade, policiar não é uma actividade única, tratando-se antes de um conjunto
complexo de actividades (BAYLEY, 1998, 37).
De qualquer forma, as funções de controlo criminal e manutenção da ordem e
tranquilidade pública são as funções nucleares do mandato policial tanto em termos de
soberania do Estado, como em termos simbólicos na imagem que os cidadãos têm da
Polícia.
A percepção da Polícia como uma instituição especializada no combate ao
crime está obviamente ligada à secular exclusividade reclamada por si em nome do
monopólio estatal do uso da força, retirando-a da esfera privada e individual. Embora a
Polícia reclame a sua especialização, o certo é que as solicitações, os inputs dos
cidadãos, ultrapassam desproporcionalmente a representação que os polícias fazem de
si próprios, no sentido de exigir da instituição policial respostas de assistência social
88
ou de emergência em matérias não criminais. Bittner (1990, p.249) defende mesmo,
numa definição universalmente celebrada, que a Polícia é a primeira instituição a ser
invocada em cenários em que “algo que não deveria estar a acontecer e acerca do qual
alguém deveria, já, fazer alguma coisa”.
Para Bittner (1990, p.131), os incidentes não chamam a atenção policial por
serem ilegais, mas por requererem uma resposta de emergência. Ou seja, a acção de
alguém com autoridade para fazer cessar o incidente, não necessariamente através da
força – uma vez que a maior parte das vezes a Polícia não utiliza a coerção –, mas
porque o público tem uma expectativa razoável de que o seu uso poderá ser importante
para a sua resolução. Esse autor define o papel da Polícia como um mecanismo de
distribuição da força coerciva não-negociável, aplicada de acordo com os ditames de
um domínio intuitivo das exigências situacionais. Uma das formas de compreender esta
definição de Bittner (1990) consiste em analisar todo o processo de inputs e os
diferentes outputs, isto é, diferentes resultados ou efeitos produzidos.
2.6.5. Em busca de um modelo funcional
Ponsaers (2001, p.70) refere que a análise longitudinal e presente dos modelos
de Polícia (não confundir com organizações policiais), revela a existência de 4 grandes
paradigmas: Um modelo Burocrático-Militar; um modelo Legalista; um modelo
Orientado para a Comunidade e um modelo Público-Privado. A estes há que juntar, ou
autonomizar o Policiamento Orientado para o Problema, enquanto modelo com uma
identidade própria, enquanto Ponsaers (2001) o considera apenas como uma variante do
policiamento orientado para a comunidade.
PONSAERS (2001) integra ainda um elemento sociológico para melhor
explicar as transformações dos modelos de Polícia desde o século XIX até ao final do
século XX. Assim, dentro do momentum moderno, são considerados dois modelos
distintos: o modelo burocrático-militar e o modelo legalista de Polícia, conforme indica
a figura que se segue.
89
Figura 9: Transformação dos modelos de polícia até século XX
Fonte: Ponsaers, P. (2001), Reading about community
(oriented) policing and police models
2.6.5.1. O modelo burocrático-militar
O modelo burocrático militar assenta, num primeiro momento, na matriz militar
da organização policial prosseguido pela Polícia moderna criada por Sir Peel43, com
fortes raízes no modelo napoleónico do séc. XVIII. Num segundo momento, a teoria
fordista e “taylorista” fizeram renascer modos de organização baseados num controle
rígido das relações de trabalho, na especialização funcional, na coercibilidade
disciplinar e na construção de uma cadeia verticalizada de comando, controlo e
supervisão. Tal período corresponde ao período da reforma, da profissionalização
autonomista, que atravessou quase todas as forças policiais ocidentais, embora com
velocidades diferentes, tendo também influenciado as corporações policiais de outros
continentes que passaram a assumir-se e a actuar como “forças paramilitares”.
A designação força paramilitar44, presente em muitos textos legais e políticos
moçambicanos mesmo após a opção democrática, e ainda hoje referencial conceptual
da Polícia moçambicana, colhe neste modelo a sua génese, sendo o ethos policial
pautado pelo primado da ordem pública.
43 Sir Peel, ex-Primeiro Ministro Inglês, criou a Polícia Real Metropolitana de Londres em 1829, inspirado no modelo francês e no modelo alemão. 44 “É criada a Polícia da República de Moçambique, abreviadamente designada por PRM, como organismo público e força paramilitar integrado no Ministério do Interior” (nº 1 do artigo 1, capítulo I da Lei nº 19/92, de 31 de Dezembro).
90
2.6.5.2. O modelo legalista de Polícia
O modelo legalista de Polícia é conceptualizado por Ponsaers (2001, p.123)
como a subordinação funcional à estrita aplicação da lei. Toda a acção policial deve ser
pautada pela legalidade, dentro de uma racionalidade legalista, abolindo qualquer
forma de discricionariedade. Antes de ordem pública está o valor lei, mais do que
peace-keepers (mantenedores/preservadores da paz) os polícias devem ser identificados
como law-enforcers (aplicadores da lei). A legitimação da função policial advém da lei,
a qual é a emanação da vontade popular, devendo os interesses privados subordinar-se
aos interesses gerais. A sanção conduz ao impedimento para cometer mais crimes.
Organizacionalmente este modelo segue as mesmas linhas do modelo burocrático
militar, com uma grande ênfase na centralização, na especialização, repressivo e
reactivo, hierarquizado, com fraca integração das expectativas das comunidades,
privilegiando as necessidades das fontes de legitimação oficial.
2.6.5.3. O modelo orientado para a comunidade
Numa fase designada por Ponsaers (2001, p.131) de pós-moderna, surge em
primeiro lugar o modelo orientado para a comunidade. É um modelo de reacção em
relação aos modelos ditos reactivos prevalecentes até à década de 70/80. Segundo o
autor, tem sido dos modelos sobre os quais mais se tem escrito nas duas últimas
décadas. O modelo nasceu em reacção às fortes criticas dos modelos clássicos, mas de
facto já existiam experiências anteriores à forte contestação dos finais dos anos
sessenta.
O policiamento orientado para a comunidade (POC) consiste numa estratégia
policial que visa combater as causas sociais da delinquência procurando melhorar o
nível de vida, o controlo criminal e a legitimidade policial, e aumentando o sentimento
de segurança e a qualidade de serviço, em cooperação com outros organismos de
regulação social e com as próprias comunidades.
As palavras-chave deste modelo são comunidade, co-produção, parceria,
descentralização, horizontalização hierárquica, desespecialização, proactividade,
territorialidade. Organizacionalmente, esta filosofia procura através da afectação
geográfica ou comunitária dos agentes, promover uma aproximação entre Polícia e
91
cidadãos no sentido de revitalizar os laços comunitários enfraquecidos pela crise dos
sistemas de controlo formal (LEITÃO, 2007,P.14).
2.6.5.4. O modelo orientado para o problema
O policiamento orientado para o problema (POP) não é apenas uma variante do
policiamento orientado para a comunidade (POC). Trata-se de uma reacção a este nos
seus axiomas estruturantes.
(...). A raison d’étre do POP não são as causas profundas do crime, antes se orientando para a identificação permanente e sistemática dos incidentes relevantes para a qualidade de vida dos cidadãos, mas com uma menor ênfase na componente serviço / apoio social (LEITÂO,2007, p.15).
O POC reorienta o serviço policial para os problemas de ordem pública,
conceptualizando-os como o primeiro degrau no caminho para a degeneração das
comunidades e para o aparecimento de problemas criminais mais graves. O novo estilo
preconiza uma menor discricionalidade para os agentes no terreno, um papel mais
efectivo para as chefias de primeiro nível, e a especialização dos oficiais da Polícia em
análise criminal. Uma das correntes que na actualidade tem sustentado o modelo POC é
a teoria dos vidros quebrados45, também conhecido por broken windows theory cujos
elementos de conteúdo são apresentados na figura 8.
Figura 10: Teoria Broken Windows (teoria de vidros quebrados)
Fonte: Wilson e Kelling, 1982 (in Leitão, 2007, p.15)
45 Em 1982, o cientista político James Q. Wilson e o psicólogo criminologista George Kelling, ambos americanos, publicaram na revista Atlantic Monthly um estudo em que, pela primeira vez, se estabelecia uma relação de causalidade entre desordem e criminalidade. Naquele estudo, cujo título era The Police and Neighborhood Safety ( A Polícia e a Segurança da Comunidade), os autores usaram a imagem de janelas quebradas para explicar como a desordem e a criminalidade poderiam, aos poucos, infiltrar-se numa comunidade, causando a sua decadência e a conseqüente queda da qualidade de vida.
92
O conceito levou à introdução de novos aparatos tecnológicos para o tratamento
da informação produzida e ao nascimento de um novo conceito – o intelligence led
policing. Continua-se a apostar na especialização e na flexibilidade organizacional para
adaptação rápida ao ambiente. Neste domínio, dá-se a génese de três novas palavras no
léxico das polícias mundiais – tolerância zero, broken windows, e incivilidades.
Os incidentes identificados pela Polícia devem ser alvo de análise especializada
seja do agente no terreno seja de analistas de forma remota, agrupados em problemas
tentando identificar padrões, analisados cenários alternativos de resposta aos problemas
identificados e avaliação permanente dos resultados obtidos.
Dá-se um alargamento do âmbito dos comportamentos susceptíveis de
contribuir para a diminuição da qualidade de vida, aplicando-se-lhe “tolerância zero46
através de intervenções policiais agressivas no sentido da sua detecção e repressão.
2.6.5.5. O modelo orientado para o risco
Ponsaers (2001, p.143) chama a este modelo público-privado, acentuando a
dicotomia que se estabelece entre a produção da segurança pelo sector público e pelo
sector privado em paridade. A questão não é nova e a crise do estado-providência com
a consequente limitação da despesa pública, tem vindo a alterar tanto a natureza da
relação como a correlação de forças. Se tradicionalmente a relação era de subordinação
do privado ao público, a situação actual é substancialmente diferente.
A segurança privada, que numa primeira fase se limitava a segurança passiva de
espaços privados, tem hoje nalguns países a possibilidade de vigilância de pessoas e
dos seus comportamentos e não apenas no espaço privado. No que respeita ao espaço
de actuação, passou a primeira fase de mera segurança de instalações de espaços
privados, para um segundo patamar de vigilância de espaços semi-públicos, ou seja,
espaços de propriedade e gestão privada, mas de grande afluência pública (ex: área da
indústria do lazer, zonas comerciais, acontecimentos desportivos), para obter a paridade
em relação ao poder público assumindo a vigilância sobre pessoas e espaços públicos e
46 A expressão Tolerância Zero soa a uma espécie de solução autoritária e repressiva, mas o seu conceito principal é muito mais a prevenção e promoção de condições sociais de segurança. Não é tolerância zero em relação à pessoa que comete o delito, mas tolerância zero em relação ao próprio delito. Trata-se de criar comunidades limpas, ordenadas, respeitosas da lei e dos códigos básicos da convivência social humana (Leitão 2007, p. 16).
93
nalguns casos chegando mesmo a ser o primeiro actor da reacção perante a constatação
do facto, em espaços de natureza pública (LEITÃO 2007, p.16).
Tabela 5: Resumo de modelos de policiamento
MODELO PRINCIPAL ORIENTAÇÃO
BUROCRÁTICO -MILITAR
Assenta, num primeiro momento, na matriz militar da organização policial prosseguido pela Polícia moderna criada por Sir Peel; modos de organização baseados num controle rígido das relações de trabalho, na especialização funcional, na coercibilidade disciplinar e na construção de uma cadeia verticalizada de comando, controle e supervisão.
LEGALISTA DE POLÍCIA
Toda a acção policial deve ser pautada pela legalidade, dentro de uma racionalidade legalista, abolindo qualquer forma de discricionariedade. Antes de ordem pública está o valor “lei”.
ORIENTADO PARA A COMUNIDADE (POC)
Estratégia policial que visa combater as causas sociais da delinquência; melhorar o nível de vida; aumentando o sentimento de segurança e a qualidade de serviço, em cooperação com outros organismos de regulação social e com as próprias comunidades.
ORIENTADO PARA O PROBLEMA (POP)
Reorienta o serviço policial para os problemas de ordem pública, considerando-os como o primeiro degrau para a degeneração das comunidades e para o aparecimento de problemas criminais mais graves.
ORIENTADO PARA O RISCO
Modelo público-privado acentuando a dicotomia que se estabelece entre a produção da segurança pelo sector público e pelo sector privado em paridade.
Fonte: Leitão, 2007, p.14 : Apontamentos sobre modelos de policiamento
2.7. Formação
O conceito de formação deriva da palavra latina formatĭo. Trata-se da acção e
do efeito de formar ou de se formar (dar forma a/constituir algo ou, tratando-se de duas
ou mais pessoas ou coisas, compor o todo do qual são partes).
Em diferentes línguas a palavra formação se relaciona com Forma ou Estrutura,
por exemplo:
Tabela 6: Exemplo de designações de formação em algumas línguas
LÍNGUA ESTRANGEIRA DESIGNAÇÃO Italiano Formazione Espanhol Formación Francês Formation Alemão Bildung Inglês Training
Fonte: autor, inspirado em MINTZBERG e WESTLEY (1992)
No sentido genérico e comum, a formação também se refere ao modo como
uma pessoa foi criada e socializada na sua infância e adolescência, isto é, à educação
que recebeu. Por exemplo, é comum afirmar-se: Aquele/a senhor/a é muito bem
educado/a (e tem modos elegantes).
94
A noção de formação tem sido associada à ideia de educação formal ou
profissional, que compreendem cursos com o objectivo da inserção e reinserção laboral
e actualização (reciclagem) de conhecimentos. Além dissso, no âmbito militar a
formação é o modo como as tropas, os aviões ou os navios de guerra se dispõem
(ordenadamente) para o combate.
Nessa perspectiva, o objectivo da formação profissional consiste em
desenvolver e adequar o conhecimento e as habilidades dos trabalhadores ao longo da
vida. Em geral, os teóricos dessa área consideram que existem três tipos de formação
profissional: a formação profissional específica ou inicial (destinada aos estudantes que
decidem iniciar-se na vida activa), a formação profissional ocupacional (para pessoas
desempregadas que desejam reintegrar-se no mundo do trabalho) e a formação
profissional contínua (para os trabalhadores no activo que querem adquirir maiores
competências e que procuram actualizar permanentemente as suas capacidades e
habilidades contribuindo assim para aumentar as possibilidades de melhorar a
qualidade de sua prestação profissional). A formação profissional ocupacional muitas
vezes é da iniciativa da entidade empregadora.
Breve discussão sobre o conceito formação
O uso do conceito formação tem sido recorrente na área das forças de defesa e
segurança, estando associado, geralmente, à formação dos soldados, agentes e oficiais,
tema não muito comum no cenário académico. Assim, mesmo reconhecendo a
formação como um termo de destaque no campo militar e policial, temos que ser
cautelosos para não fazer um uso indevido deste termo, empregando-o de forma
indiscriminada, sem considerar sua complexidade e as diferentes perspectivas teóricas
que o fundamentam.
O claro entendimento do conceito formação e a análise de importantes
elementos conceituais e princípios formadores da profissionalidade policial são
pressupostos centrais para a compreensão do processo de formação no qual os oficiais
da Polícia estão envolvidos. Nóvoa (1995), usa o termo “profissionalidade” para
expressar uma perspectiva reflexiva de formação, diferentemente do termo
“profissionalismo”, que traz a idéia de uma formação de carácter eminentemente
técnico, táctico ou estratégico, discutível na seguinte colocação de Manuel Monteiro
GuedesValente:
95
A Polícia, como actividade de defesa da liberdade democrática de garantia da Ordem, Segurança e dos direitos do cidadão não pode ser encarada só sob o ponto de vista sociológico, nem do ponto de vista político (braço ou instrumento deste), nem sob o ponto de vista operacional (estratégico, táctico e técnico), mas impõe-se, isso sim, um aprofundamento jurídico teórico-prático da actividade da Polícia, que fundamente e justifique a necessidade de um corpo organizado dotado de ius imperii na prossecução de uma das tarefas fundamentais do Estado: defesa e garantia dos direitos e liberdades fundamentais (VALENTE, 2009,p.17).
No entendimento de Ferry (1991, p. 36), a formação aparece com um significado
de um processo de desenvolvimento individual destinado a adquirir ou aperfeiçoar
capacidades. Nessa perspectiva e sem discutir o termo capacidades, a formação de
oficiais da Polícia diferencia-se de outras actividades de formação em três dimensões
distintas: trata-se de uma formação dupla, combinando a formação acadêmica com a
táctica e técnica; é um tipo de formação profissional; é uma formação de agentes da lei
e ordem, sendo necessária a articulação e o equilíbrio entre a formação de polícia e a
sua prática profissional.
Do ponto de vista da filosofia da educação, Severino (2006, p. 621) revela que a
educação foi sempre vista como processo de formação humana. Essa formação,
segundo o autor, significa a própria humanização do homem, que sempre foi concebido
como um ente que não nasce pronto, que tem necessidade de cuidar de si mesmo como
que buscando um estágio de maior humanidade, uma condição de maior perfeição em
seu modo de ser humano. Portanto, a formação é processo do devir humano como devir
humanizador, mediante o qual o indivíduo natural devém um ser cultural, uma pessoa.
O autor aponta ainda que o sentido dessa categoria envolve um complexo conjunto de
dimensões que o verbo formar engloba: constituir, compor, ordenar, fundar, criar,
instruir-se, colocar-se ao lado de, desenvolver-se, dar-se um ser, devir.
Nessa linha de reflexão, o mesmo autor sublinha ser relevante observar que o
sentido mais rico do conceito formação é aquele do verbo reflexivo, como que
indicando que é uma acção cujo agente só pode ser o próprio sujeito. Nessa óptica, o
conceito afasta-se de alguns de seus cognatos, por incompletude, como informar,
reformar e repudia outros por total incompatibilidade, como conformar, deformar.
Converge apenas com transformar:
A idéia de formação é, pois aquela do alcance de um modo de ser, mediante um devir, modo de ser que se caracterizaria por uma qualidade existencial marcada por um máximo possível de emancipação, pela condição de sujeito autônomo. Uma situação de plena humanidade. A educação não é apenas um processo institucional e instrucional, seu lado visível, mas fundamentalmente
96
um investimento formativo do humano, seja na particularidade da relação pedagógica pessoal, seja no âmbito da relação social coletiva. Por isso, a interação docente é considerada mediação universal e insubstituível dessa formação, tendo-se em vista a condição da educabilidade do homem (SEVERINO, 2006, p. 621).
De seguida, Severino analisa a polissemia do termo formação e as diferentes
conceituações que tem assumido, vincando, por fim, o entendimento que se deve ter
quando se projecta a educação como um processo de formação do Homem:
O termo formação é onipresente nas diversas conceituações de educação, mas o mais das vezes para contrapor-se à informação. Outras vezes, arrasta consigo a conotação do pôr em forma, moldar, sentido que é exatamente o contrário daquele em que está sendo tomado aqui. O sentido aqui é exatamente aquele da constituição do sujeito que não tem molde onde se encaixar, para se enquadrar, medidas para se medir. Um sujeito totalmente contingente, com muito precárias referências históricas para se guiar em sua existência. Precisa ser, ou melhor, vir-a-ser sem que caminhos precisos estejam previamente traçados (SEVERINO, 2006, p.624).
O conceito adorniano47 de formação citado por Severino (2006, p.624) embora
forjado a partir da sua vivência no contexto da cultura alemã, ganha um alcance mais
amplo, tornando-se uma fecunda categoria de análise da vida social, cultural e
profissional contemporânea. O autor refere que a Bildung, como lado subjetivo da
Kultur, só se legitima como exercício de juízo existencial crítico e autocrítico, de
carácter emancipatório, indo além da semiformação, Halbbildung, definição de uma
produção simbólica em que prevalecem a adaptação e o conformismo, típicos da
cultura massificada.
Influenciado e, até certo ponto, representante das idéias da escola de Frankfurt
de uma educação emancipadora, Adorno aponta para a intrínseca necessidade de uma
crítica permanente, referindo que se impõe uma reelaboração do passado, uma severa
crítica do presente, se se almeja um futuro mais humanizado. E ao mesmo tempo em
que Adorno alerta para os riscos de um processo educacional pautado apenas nas luzes
da consciência (pura formação ético-epistêmica), sem considerar sua orientação social,
chama a atenção para os igualmente graves perigos do comprometimento do ético
frente à determinação social (pura formação política). A proposta da educação como
47 Adorno, Theodor Wiesegrund (1903-1969), Filósofo alemão, fundador, juntamente com Horkheimer, em 1924, da famosa escola de Frankfurt, que se originou no Instituto de Pesquisas Sociais de Frankfurt. Desenvolveu uma teoria crítica da ideologia da sociedade industrial e de sua cultura, que marca distintamente a posição da escola de Frankfurt. Denunciou, sobretudo, a ideologia da dominação da natureza pela técnica, que traz como conseqüência a dominação do próprio homem (in Marcondes & Japiassú. Dicionário Básico de Filosofia, 4 ed, Zahar Editora, Rio de Janeiro: 2006).
97
formação cultural destaca que a educação não concerne apenas a formação da
consciência de si, como aperfeiçoamento moral, mas nem por isso reduz-se a mero
enquadramento social, pura determinação política. A educação tem sentido unicamente
como educação dirigida a uma auto-reflexão crítica (SEVERINO, 2006, p. 121).
Explicitando a sua concepção sobre a educação, (Adorno apud Severino, 2006,
pp. 141-142) expressa-se nos seguintes termos:
Evidentemente não a educação assim chamada modelagem de pessoas, porque não temos o direito de modelar pessoas a partir de seu exterior; mas também não a mera transmissão de conhecimentos, cuja característica de coisa morta já foi mais do que destacada, mas a produção de uma consciência verdadeira. Isto seria inclusive de maior importância política; sua idéia, se é permitido dizer assim, é uma exigência política. Isto é: uma democracia com o dever de não apenas funcionar, mas operar conforme seu conceito, demanda pessoas emancipadas. Uma democracia efetiva só pode ser imaginada enquanto uma sociedade de quem é emancipado.
Na óptica deste autor o compromisso da educação é transformar-se num
processo emancipatório, no qual ocorra uma luta sistemática pela autonomia, pela
emancipação. E sua única ferramenta é o esclarecimento que se constitui como
passagem do inconsciente para o consciente, do não ciente para o ciente, do
pseudociente para o ciente. O esclarecimento ilumina e elimina.
Na perspectiva da Teoria Crítica, o papel da educação, que abarca a formação, é
o de assegurar a sobrevivência da formação cultural numa sociedade que a privou de
suas bases. Cabe aos processos educativos investir na transformação da razão
instrumental em razão emancipatória. Por sua vez, a educação pode viabilizar-se,
garantindo-se sua fecundidade formativa, se se constituir como exercício da auto-
reflexão crítica. Trata-se, para a educação, de produzir uma consciência verdadeira.
Trata-se de uma formação imanente do sujeito da história real da desalienação na
história presente, alienada. É que na sociedade industrializada do capitalismo, a
educação crítica do indivíduo, base de sua formação emancipatória, encontra-se
travada, realizando-se apenas como adaptação, ou seja, como semi-formação (Adorno,
1995), travamento da experiência emancipadora.
O que se deve enfatizar é que a formação emancipatória transpassa todas as
áreas que em sua especificidade constituem partes da formação integral do indivíduo,
do profissional. A formação emancipatória não é simplesmente transversal, mas sim o
núcleo fundamental de um processo intencional que visa formar profissionais
conscientes, reflexivos, críticos e competentes. Esse é o pressuposto em que se assenta
98
a intencionalidade da formação de oficial da polícia capaz de responder adequadamente
à demanda dos paradigmas de garantir ao cidadão o gozo pleno dos seus direitos e
liberdades, e da co-produção da segurança.
2.8. Profissão
Na literatura especializada existem vários conceitos de profissão, entretanto é
consensual que etimologicamente a palavra “profissão” vem de uma palavra latina
professĭo,-ōnis, do verbo “profiteri” “acção de declarar; declaração; manifestação;
promessa; anúncio; publicação; acção de professar, de ensinar; profissão; mister;
estado; exercício; ocupação; emprego”. Surgiu no Século XIII, evoluíndo de
Professus- – partiúpio – profissão (CUNHA, 1997, p. 582).
Deste modo, a palavra profissão nasceu ligada a uma forma de vida que é
publicamente assumida e reconhecida. Por exemplo, aos primeiros professores das
universidades era-lhes exigido que fizessem uma profissão de fé, numa cerimônia
pública, num misto de influências laicas e religiosas simultaneamente. Neste sentido,
“profissão” opunha-se ao “ofício”, pois enquanto a primeira assumia um saber
reconhecido e professado em público, o segundo estava aliado à ideia de negócio ou
trabalho manual. E, portanto, o ofício pode ser visto como “Ocupação habitual,
geralmente mecânica, com vista ao lucro, que se distingue das profissões liberais e da
produção de artigos básicos” (DUBAR, 2005, P.124).
Por sua vez, (Cabral apud Dias, 2010, p.38) afirma que numa perspectiva
sociológica o conceito de Profissão constitui o que podemos designar por um
constructo, dada a dificuldade em detalhar os seus atributos. Na língua portuguesa, o
termo adquiriu um sentido muito amplo de ocupação ou emprego. Nos países anglo-
saxónicos, pelo contrário, o termo é aplicado para designar as profissões liberais como
médico, advogado ou engenheiro. Os atributos destas profissões, segundo o mesmo
autor, transformaram-se em requisitos para todas as actividades profissionais que
tenham como objectivo constituirem-se numa profissão, tendo para o efeito que
possuir:
i. Um saber especializado, aliado a práticas específicas que o profissional
necessita de dominar, adquiridas através de uma formação profissional
estruturada;
99
ii. Uma orientação de serviço. O profissional afirma-se perante outros que exerce a
sua actividade por motivos altruísticos, não se pautando somente por interesses
particulares.
iii. Um código deontológico, que determina e regula o conjunto de deveres,
obrigações, práticas e responsabilidades que surgem no exercício da profissão.
iv. Uma associação profissional, cujo objectivo seria, entre outros, o de manter e
velar pela ocupação dos padrões estabelecidos entre os seus membros.
Por sua vez, Reuner (2007, P.61) afirma que:
(…) considera-se como profissão de um indivíduo, o ofício ou a modalidade de trabalho, remunerado ou não, a que corresponde um determinado título ou designação profissional, constituído por um conjunto de tarefas que concorrem para a mesma finalidade e que pressupõem conhecimentos semelhantes, que este efectua ou efectuava, se se tratar de um desempregado à procura de novo emprego.
Muitos autores têm reagido contra esta tipificação, tomada de empréstimo às
profissões liberais, por a mesma ser demasiado estática, esquecendo-se as
transformações que nas mesmas ocorreram, nomeadamente a sua integração em
organizações burocráticas, nas quais os profissionais perderam grande parte da sua
autonomia. O associativismo, por exemplo, per si é discutível como elemento
essencialmente constituitivo ou caracterizador do conceito profissão sabido que
existem grupos profissionais que, por sua natureza e função social, estão legalmente
vedados à constituição de associações ou sindicatos.
Para (Greenwood apud Dias, 2010, p.38) uma profissão acarreta os seguintes
atributos:
i. Um corpo sistemático de teoria cujo aprendizado e conseqüente domínio requer
treino tanto técnico, como intelectual, diferenciando-o daquele exigido pelas
ocupações.
ii. Autoridade profissional, fundada pelo treino intensivo num corpo de teoria que,
por sua vez, destaca a relativa ignorância do leigo e gera o sentimento de
segurança por parte do cliente.
iii. A legitimação pública da autoridade traduzida pela garantia de deveres e
direitos, entre os quais se incluem: o controlo sobre o conteúdo do treino e,
eventualmente, sobre as escolas profissionais, controlo sobre as formas de
admissão à profissão e imunidade com relação ao julgamento por parte dos
leigos no que tange às questões técnicas.
100
iv. Adopção de um Código Deontológico de modo a contrariar o uso abusivo dos
poderes e privilégios concedidos à profissão e evitar que os mesmos sejam
eventualmente revogados pela sociedade.
v. Existir uma cultura profissional.
Amesma visão é partilhada por (Moore apud Dias, 2010, p.39) o qual considera
a definição da formação nos seguintes termos:
i. Profissão é uma ocupação a tempo integral no sentido em que o profissional
passa a viver da remuneração obtida a partir do seu trabalho e naquela
actividade;
ii. Caracteriza-se pela vocação sugerindo identidade profissional com os valores
difundidos pela profissão, aceitação das suas normas e modelos e identificação
com os seus pares;
iii. Possui organização, sobretudo relativa à defesa dos interesses corporativos da
ocupação, controlando também as formas de admissão na profissão e do
exercício da mesma – formalização através de um Código Deontológico (CD);
iv. Possui um corpo de conhecimento formal complexo e teórico que é transmitido,
geralmente por universidades e em cursos de longa duração;
v. Possui orientação para o serviço, destinando-se a servir os interesses dos clientes
e da comunidade;
vi. A ocupação adquire autonomia.
Em muitos países do Mundo existem instituições que se ocupam da
classificação das profissões consideradas nos respectivos contextos. Em Moçambique,
por exemplo, a classificação das profissões é tutelada pela Classificação Nacional das
Profissões de Moçambique (CNPM), um organismo público adistrito ao Instituto
Nacional de Estatística (INE).
De acordo com a Classificação Nacional de Profissões de Moçambique
(CNPM) Uma profissão é definida por um conjunto de tarefas que concorrem para a
mesma finalidade e que pressupõem conhecimentos semelhantes. (CNPM, 2003, p.12).
Walther (1962, p.26), por sua vez, considera que uma profissão se define como
actividade económica destinada a assegurar a manutenção da vida. Este autor defende
que do ponto de vista técnico do trabalho, caracteriza-se como um conjunto de
habilidades, adquiridas mediante certa aprendizagem, seja de que género for.
A CNPM considera que as profissões, em geral, são constituídas, teoricamente,
a partir da junção de uma gama variada de tarefas que, na prática, correspondem a
101
vários postos de trabalho. Uma profissão pode englobar vários postos de trabalho, cujos
titulares realizam uma ou outra das diversas combinações possíveis das tarefas (Ibidem,
p.12).
Rodrigues (2002, p.282) defende que as profissões estão enraizadas numa tríade
de valores humanos: saber, fazer, ajudar, sendo caracterizadas por um conjunto
complexo de valores e normas expressos sob a forma de prescrições, preferências e
permissões, legitimadas pela institucionalização desses mesmos valores. Este autor
refere que o valor ajudar, por exemplo, especificado na norma do altruísmo, implica que
os profissionais devem fazer mais do que é expressamente requerido.
2.8.1. Formação Profissional
O sistema de qualificação profissional inicial existente em Moçambique segue,
essencialmente, dois modelos de organização. Um tem por base o sistema educativo, ou
seja, o sistema nacional de educação e o outro segue a estratégia de alternância entre
ministérios, empresas e outras instituições de formação. Esta realidade permite assumir
que a análise da dimensão moçambicana do sistema organizativo da formação
profissional pode fornecer informação relevante para o equacionamento do problema
que se coloca ao País e às instituições sobre a qualificação profissional dos cidadãos,
para desempenhar funções produtivas em diversas áreas, participando activamente e
dessa forma no desenvolvimento do País.
O governo de Moçambique está a implementar, desde 2006, uma Reforma da
Educação Profissional (REP), em parceria com o sector privado e a sociedade civil, e
que conta com os parceiros internacionais de cooperação. Essa reforma inclui, numa
primeira fase, a implementação do Programa Integrado de Reforma da Educação
Profissional (PIREP). Porém, essa reforma não inclui, por enquanto, a formação feita
por instituições que não estão sob tutela da Direcção Nacional do Ensino Técnico
Profissional (DINET).
bem como melhores oportunidades econômicas
Segundo a COREP48 a Educação Profissional em Moçambique até ao início da
reforma era ministrada a cinco níveis, conforme ilustra a tabela que se segue.
48 COREP – Comissão Executiva da Reforma da Educação Profissional
102
Tabela 7: Níveis de Educação Profissional em Moçambique até o início da reforma (2006)
NÍVEL DENOMINAÇAO INGRESSO DURAÇÃO INSTITUIÇÃO FORMADORA
1 Curta Duração Até 9 meses
Centros de Formação Profissional
2 Nível Elementar 5ª classe 2 a 3 anos Escolas profissionais
3 Nível Básico 7ª classe 3 anos Escolas básicas
4 Nível Médio 10ª classe 3 anos Institutos Médios
5 Nível Superior 12ª classe 2 a 4 anos
Institutos Superiores Politécnicos
Fonte: COREP, 2011, p. 7 – (adaptado pelo autor).
Existem, portanto, diferentes abordagens de formação profissional em
Moçambique. A nossa intenção neste subcapítulo não é analisar nem discutir as
abordagens de formação profissional, mas sim procurar enquadrar a formação policial
nos sistemas de fomação profissional vigente ao nível do ensino superior, conforme a
lei classifica e caracteriza as respectivas missões.
Tabela 8: Classificação das instituições de Ensino Superior em Moçambique TIPO DE
INSTITUIÇÃO SUPERIOR
MISSÃO
Universidades Instituições que dispõem de capacidade humana e material para o ensino, investigação científica e extensão em vários domínios do conhecimento, proporcionando uma formação teórica e acadêmica, estando autorizadas a conferir graus e diplomas acadêmicos;
Institutos Superiores Instituições especializadas filiadas ou não a uma universidade, que se dedicam à formação e investigação no domínio das ciências e da tecnologia ou das profissões, bem com à extensão e que estão autorizados a conferir graus e diploma acadêmicos;
Escolas Superiores Instituições de ensino superior filiadas ou não a uma universidade, a um instituto superior ou a uma academia, que se dedicam ao ensino num determinado ramo do conhecimento e à extensão e que estão autorizadas a conferir graus e diplomas académicos;
Institutos Superiores Politécnicos
Instituições de ensino superior filiadas ou não a uma universidade, que oferecem estudos gerais ou uma formação profissional e que estão autorizadas a conferir certificados e todos os graus acadêmicos, excluindo o de Doutor, reservando a atribuição de graus de pós-graduação aos institutos politécnicos filiados;
Academias
Instituições de ensino superior que se dedicam ao ensino em áreas específicas, nomeadamente as artes, a literatura, habilidades técnicas tais como as militares e policiais, a formação especializada e o comércio, estando autorizadas a conferir diplomas e graus acadêmicos;
Faculdades
Unidades académicas primárias de uma universidade ou de um instituto superior que se ocupam do ensino, investigação, extensão e aprendizagem num determinado ramo do saber, envolvendo a interacção de vários departamentos académicos e a provisão de ensino conducente à obtenção de um grau ou diploma.
Fonte: Lei nº 27/2009 de 29 de Setembro, Cap. II, Secção I, artigo 14.
Como se pode observar, as academias têm classificação e missões próprias à luz
da lei do Ensino Superior.
103
O primeiro passo para a discussão da formação profissional remete para a
definição do conceito de Formação Profissional, com vista a situar, o mais claramente
possível, quais os domínios teórico e empírico de que trata.
Assim, de acordo com Cardim (1998), não existe um consenso universal com
relação ao conceito de Formação Profissional. Contudo, mesmo considerando a sua
variação de abrangência e a sua diversidade de forma e conteúdo, existem traços
comuns que permitem uma caracterização sua relativamente genérica. De facto, tendo
por base a revisão de literatura e a súmula final feitas por Duarte (1999), a autora diz
que:
A formação profissional é um processo intencional, planeado e desenhado de forma sistemática com a finalidade de modificar as atitudes e os comportamentos dos indivíduos em situação de trabalho, pela transmissão de conhecimentos, técnicas ou normas, permitindo que estes se desenvolvam e se adaptem, e, consequentemente, melhorem o seu desempenho tendo em vista a eficácia organizacional (CARDIM, 1998, pp. 39-40).
A definição de Cardim (1998, p.39) tem sido criticada por vários autores pelo
seu enfoque economicista e empresarial. Embora a formação profissional seja norteada
pelos objectivos da área ou sector de intervenção profissional a que se destina, ela tende
a ser vista no sentido integrador do desenvolvimento social e humano.
A formação profissional não deve ser vista apenas como uma estratégia de
natureza econômica, isto é, percebida, delineada e orientada unicamente no sentido
empresarial, visando o aumento da produção e da produtividade e competitividade
econômica. Ela deve desempenhar um papel preponderante na visão futura de uma
cultura que se quer inovativa, mas de base social. Isto é, deve providenciar
conhecimentos e habilidades básicas e técnicas necessárias para o desempenho
profissional e social e permitir o desenvolvimento de uma cultura de inovação
sustentada tendo em vista o aumento da capacidade de transferência do conhecimento
para as necessidades de intervenção profissional adequada em cada situação
(FIGUEIRA, 2003, pp. 11-12).
Seguidamente, interessa expôr quais são os níveis de intervenção da Formação
Profissional, de maneira a compreender a natureza da sistematização posterior realizada
em relação à formação proposta, atendendo, especialmente, aos seus objectivos e
conteúdo programático.
De facto, conforme argumenta Meignant (1999), a Formação Profissional, por
tradição, abrange três níveis de intervenção necessários à realização de uma qualquer
104
tarefa de uma actividade profissional, os quais se referem às necessidades que os
indivíduos têm de aprender certos saberes teóricos e operar cognitivamente sobre a
tarefa (saber), de possuir a motivação requerida e as atitudes e comportamentos
adequados à realização da mesma tarefa (saber-ser e saber-estar) e de desenvolver as
competências e capacidades apropriadas à sua execução (saber-fazer). Adicionalmente,
porém, Duarte (1999) sustenta que, tendo em conta a realidade social e económica
actual, existem outros níveis qualificativos que podem ser igualmente objecto de
intervenção da Formação Profissional, nomeadamente, as necessidades que os
indivíduos têm de possuir capacidade de iniciativa e decisional (saber-agir), de saber
liderar de modo eficaz (saber-fazer-fazer) e de ter uma capacidade de auto-
desenvolvimento permanente (saber-aprender ou aprender a aprender).
Finalmente, é pertinente caracterizar as modalidades de Formação Profissional
que permitem delimitar a abrangência, a forma e o tipo de conteúdo que retratam a
formação proposta.
Concretizando melhor, salienta-se a modalidade de formação contínua, a qual,
segundo Figueira (2003, p.12), abrange todos os processos formativos que, através da
sua organização formal e institucionalização subsequente à formação inicial, vão
permitir que os indivíduos adquiram conhecimentos, competências e capacidades
adicionais aos que já possuem, por forma a serem criados novos mecanismos de
adaptação às exigências que as transformações, sobretudo, sociais e tecnológicas,
colocam a um adequado exercício da sua profissão.
Com base no mesmo autor, ainda dentro da formação contínua, convém realçar
a sub-modalidade de aperfeiçoamento profissional, que visa desenvolver as
qualificações já detidas pelos sujeitos activos e reforçar as suas atitudes e
comportamentos, de modo a que estes possam obter um nível superior de desempenho
na sua actividade profissional. Aliás, as necessidades de aperfeiçoamento profissional
surgem quando existe um claro défice entre o desempenho real e o desempenho
desejável para o exercício da actividade profissional. Trata-se de uma lacuna que pode
ser colmatada por meio de acções formativas de curta duração, relativamente
estruturadas e feitas no seio da organização, não obstante a que, a longo prazo, possa
requerer uma actualização permanente durante a vida profissional dos indivíduos,
expressa no conceito de formação contínua ao longo da vida (CARDIM, 1998, p.40).
105
A teoria de formação profissional está intimamente ligada à prática de formação
profissional, que tem vindo a influenciar os padrões dos sistemas nacionais de
formação profissional, bem como as culturas regionais (Kuhn in Figueira, 2003, p. 29).
A ACIPOL é uma instituição de ensino superior vocacionada para formação de
quadros para a área da Ordem e Segurança Públicas. Definida desta maneira, a
Academia parece situar-se numa zona cinzenta de interacção entre o sistema nacional
de educação (mais exactamente, o subsistema de ensino superior) e a PRM e o
Ministério do Interior (PEACIPOL, 2007, Vol.4, p.7). Porém, essa dúvida fica
dissipada se tivermos em consideração a tabela 5 relativa à classificação e missões das
instituições de ensino superior em Moçambique, a qual especifica que as academias se
dedicam ao ensino em áreas específicas, nomeadamente (...), as habilidades técnicas
tais como as militares e policiais (...). Deve-se, porém, ter em conta que neste estudo
defendemos que as habilidades técnicas são as capacidades requeridas para executar
com eficiência um certo acto ou uma certa tarefa (Martins, 2000, p.49). São aquelas
que permitem desenvolver nos formandos a qualidade que Freire (2010, p.40)
denomina de consciência crítica, em contraposição à consciência ingênua, que segundo
o mesmo autor:
A Consciência Ingênua Revela uma certa simplicidade, tende a um simplismo, na interpretação dos problemas, isto é, encara um desafio de maneira simplista ou com simplicidade. Não se aprofunda na casualidade do próprio facto. Suas conclusões são apresentadas superficiais. Diz que a realidade é estática e não mutável (FREIRE, 2010, P.41).
O principal destaque, que constitui núcleo da missão e objectivos da ACIPOL, é
que a formação deve ter em conta as necessidades operacionais da polícia e,
consequentemente, a necessidade de formar profissionais com competência e perfil
adequados para desempenhar suas funções, no sector específico, no quadro da estrutura
orgânica e funcional da Polícia.
2.8.2. Nossa referência sobre Competência
No interior da instituição policial, o oficial da Polícia exerce sua profissão. A
ideia de profissão remete-nos à de ofício, que insere em si o sentido de dever, de
obrigação. A idéia de exercício relaciona-se à idéia de actividade, de trabalho. O oficial
da Polícia, enquanto profissional, enquanto trabalhador numa determinada sociedade,
tem de realizar sua obrigação de uma maneira específica. Então, o que compete ao
106
oficial da Polícia? Essa pergunta nos remete a necessidade de estabelecer o que se
entende por competência.
Dissociando-nos da polêmica que frequentemente se tem manifestado em volta
do termo competência, principalmente entre pensadores da área da educação,
aproximamo-nos à definição dada por Rios (2003), que apesar de estar voltada para o
campo da educação é aplicável, por analogia, ao campo da reflexão sobre a actividade
da Polícia. A autora se posiciona nos seguintes termos:
Falar de competência significa falar em saber fazer bem (...). Minha definição de saber fazer bem como sinônimo de competência, em princípio, aproxima-se da posição dos educadores que apresentam esse saber fazer bem numa dupla dimensão: técnica e política (...). Afirmo que o saber fazer bem tem uma dimensão técnica, a do saber e do saber fazer, isto é, do domínio dos conteúdos que o sujeito necessita para desempenhar o seu papel, aquilo que se requer dele socialmente, articulado com o domínio das técnicas, das estratégias que permitam que ele “dê conta de seu recado, em seu trabalho. Mas é preciso saber bem, saber fazer bem, e o que me parece nuclear nessa expressão é o termo “bem” (RIOS, 2003, pp. 46-47).
A autora destaca o termo bem como indicando tanto a dimensão técnica quanto
a dimensão política (quando alguém realiza um trabalho que vai de acordo com as
expectativas, isto é, vai ao encontro daquilo que é desejável, que está estabelecido
valorativamente com relação â sua actuação). Portanto, o conceito de bem não deve ser
entendido numa perspectiva metafísica; o que se entende por bem, reitera a autora,
responde a necessidades historicamente definidas pelos homens de uma determinada
sociedade.
Deste modo, podemos aferir que a idéia de bem se destaca como significativa na
definição da competência, porque ela aponta para um valor que não tem apenas um
carácter moral. Ele não se desvincula dos aspectos técnicos nem dos aspectos políticos
da actuação do oficial da polícia ou da polícia em geral.
A polémica que se tem manifestado ora acusando-se a competência técnica de
tecnicista, ora acusando-se a competência política de politicismo, poderá ser
ultrapassada se recuperar no próprio carácter complexo e dialéctico da prática policial a
articulação entre os dois pólos da competência referidos por Rios (2003) – o técnico e o
político, pois é nessa medida que se poderá compreender a ética como mediação,
porque ela está presente na definição e na organização do saber que está veiculado na
instituição policial e, ao mesmo tempo, na direcção que será dada a esse saber na
actuação policial na sociedade.
107
O maior problema que se encara, no que respeita às dimensões técnica e política
da competência do oficial da Polícia, é a desarticulação entre os dois pólos. Na verdade
a referência à competência técnica e compromisso político pode até, em determinados
momentos, ter levado a essa desarticulação aparente. O que é importante é falar em
competência, pura e simplesmente, e nela apontar seus componentes – interligados,
indissolúveis, essenciais – o técnico e o político (RIOS, 2003, p.50).
Se atendermos que a função policial é uma função essencialmente política,
Saviani chama nossa atenção para algo importante: (...) Não se faz política sem
competência e não existe técnica sem compromisso; além disso, a política é também
uma questão técnica e o compromisso sem competência é descompromisso (SAVIANI
apud RIOS, 2003, p.50).
Por outro lado, ao discutirmos a competência no trabalho policial é importante
termos em conta a presença da ética como dimensão dessa competência. O trabalho da
Polícia, como já referi no capítulo introdutório, tem como objecto as pessoas. Por isso,
a ética é indissociável de qualquer actuação do polícia e da Polícia. Deste modo, a
importância de se resgatar a relação triológica técnica/ética/política no centro da
discussão sobre a competência sustenta o núcleo da reflexão que apresentamos neste
trabalho, uma vez que faz emergir a possibilidade de discutir um aspecto, segundo
Terezinha Rios, pouco explorado sistematicamente – a presença da dimensão ética
incrustada na técnica e na política.
Frequentemente se percebe que os próprios polícias não têm clareza da
dimensão política de seu trabalho. Ao interpretarem política como envolvimento
partidário, como refere a autora que temos vindo a citar, alguns procuram até negar que
tenham algo a ver com isso, invocando uma posição de “apoliticidade” em sua prática.
No entanto, não podem se recusar a admitir a (forçosa) presença da moralidade em sua
acção.
Se assim é, a formação policial pretenderá obter um profissional que deve ser,
ao mesmo tempo, agente de mudança, individual e colectivamente, e embora seja
importante saber o que deve fazer e como, também é importante saber por que deve
fazê-lo.
108
2.9. Considerações gerais sobre o currículo
A literatura especializada e as discussões actualizadas sobre o currículo
reconhecem-no como uma realidade difícil de limitar em conceitos simples,
esquemáticos e esclarecedores por sua própria complexidade e pelo facto de que tenha
sido um campo de pensamento de abordagem recente dentro das disciplinas
pedagógicas, além de controvertido ao ser objecto de enfoques contraditórios e reflexo
de interesses conflitantes. Trata-se de um complexo processo social com múltiplas
expressões, mas com uma determinada dinâmica, já que é algo que se constrói no
tempo e dentro de certas condições (SACRISTÁN, 2008, p.21).
Falar do currículo é abordar a expressão de uma série de determinações políticas
para a prática formativa e educativa, é falar de conteúdos sequencializados em
determinadas matérias, é abordar saberes desenvolvidos por professores e alunos no
espaço da aula, como campo das interacções e dos intercâmbios entre diversos actores
do espaço escolar, como espaço de práticas diversas, como espaço de convivência.
O Currículo é uma realidade prática que tem uma existência concreta que as
teorizações devem explicar e esclarecer. Por isso, importa esclarecer o conteúdo e
dinâmica dessa prática e ressaltar, em alguma medida, os significados que este conceito
pretende sistematizar.
2.9.1. O Termo Currículo
O lexema Currículo vem do étimo latino, curriculum, que etimologicamente
significa caminho, jornada, trajecto, percurso a seguir, pista ou circuito atlético e
encerra, por isso, duas ideias principais: uma de sequência ordenada, outra de noção de
totalidade de estudos.
Sendo um conceito polissêmico, que não possui um sentido unívoco, carregado
de ambigüidade, deve reconhecer-se, tautológico como afirma Pacheco (2001, p.15),
existindo na diversidade de funções e de conceitos em função das perspectivas que se
adoptam, o que vem a traduzir-se, por vezes, em alguma imprecisão acerca da
natureza e âmbito do currículo.
Segundo Goodson (1995, p.7), o termo curriculum é derivado do verbo latino
currere, que significa correr. Pode também estar se referindo à ordem como sequência
e à ordem como estrutura. Nesta última acepção, remonta ao conjunto de práticas
109
educativas difundidas no século XVI, em universidades, colégios e escolas, a partir do
Modus et Ordo Parisienses. Modus designava a combinação e a subdivisão das escolas
em classes, com a retenção da instrução individualizada, isto é, aluno – por – aluno e
Ordo (ordem) com dois significados: sequência (ordem de eventos) e coerência
(sociedade ordenada) (HAMILTON, 1992, p.41).
Com efeito, datam do século XVI os registros históricos de quando e em que
circunstância aparece, pela primeira vez, a palavra curriculum aplicada ao meio
educacional. Tais registos evidenciam que currículo esteve ligado à idéia de "ordem
como estrutura" e “ordem como sequência", em função de determinada eficiência
social. Assim, na Universidade de Leiden (1582), dos registos consta que tendo
completado o curriculum de seus estudos o certificado era concedido ao aluno. Na
Universidade de Glasgow (1633) e na Grammar School de Glasgow (1643), o
curriculum referia-se ao curso inteiro de vários anos, seguido pelos estudantes, e não
apenas às unidades pedagógicas curtas (HAMILTON, 1992, p.43).
No período Romano a ordem e a disciplina faziam parte das actividades dos
estudantes. É assim que o currículo constituía-se uma metáfora do atletismo clássico.
Assim como o curso era a pista onde os estudantes tinham que correr. Era uma ordem
ou sistema de disciplinas. Na Roma antiga as Artes e o Direito já eram apresentados
por Cícero e Varro, por exemplo, como disciplinae, palavra derivada de discere, que
significa aprender. Nos primórdios da era moderna, a palavra foi empregue num
contexto acadêmico pelo humanista espanhol Luis Vives (BURKER, 2003, p.86).
Desde a apropriação deste termo pelo vocabulário pedagógico, os sentidos mais
usuais desta palavra referem-se a planos e a programas, a objectivos educacionais e a
conteúdos, ao conhecimento escolar e à experiência de aprendizagem. Esse
entendimento é, na actualidade, extensivo à formação profissional. De acordo com
Burker, das manifestações curriculares mais antigas regista-se que
Em 1450, o currículo das universidades européias, uma rede que se estendia de Coimbra à Cracóvia, era notavelmente uniforme, permitindo assim que os estudantes se transferissem com relativa facilidade de uma instituição para outra (prática conhecida como peregrinnatio académico). O primeiro grau era o bacharelato, e as artes em que o estudante se tornava bacharel eram as sete “artes liberais”, divididas em duas partes, o trivium, mais elementar, que lidava com a linguagem (gramática, lógica e retórica), e o quadrivium, mais avançado, que lidava com os números (aritmética, geometria, astronomia e música). Na prática, havia também lugar para as três filosofias, ética, metafísica e o que era conhecido como filosofia natural, o último dos temas sendo estudado com especial referência à Física de Aristóteles e seu Tratado Da Alma (BURKER, 2003, p. 87).
110
Segundo a Oxford English Dictionary, o primeiro atestado de graduação
registou-se em 1633, outorgado a um mestre da Universidade de Glasgow, Escócia.
Acredita-se que nessa época o termo latino curriculum passou a ser adoptado com a
conotação de totalidade estrutural e integridade sequencial, buscando indicar unidade
dos estudos a serem seguidos e concluídos. Desta forma, o emprego da palavra
Currículo na educação escolar associou-se, desde sempre, às idéias de unidade, ordem e
sequência de um curso, num clima marcado por aspirações de imprimir maior rigor à
organização do processo de ensino, implicando na exigência de formalização que
envolve planificação, metodologia e controle. Nessa perspectiva, também se acham
presentes as idéias de regularidade e centralidade inerentes ao princípio de disciplina,
entendida como regra de vida (HAMILTON, 1992, p. 41).
A literatura especializada sobre os assuntos da educação menciona que as
teorizações sobre currículo são mais recentes e podem ser situadas no início do século
XX, embora as manifestações de currículo datem de séculos anteriores. Nos Estados
Unidos, por exemplo, é reconhecido o papel que desempenhou Franklin Bobbit, ao
elaborar o primeiro tratado de currículo - The curriculum (1918) – e, posteriormente o
How make the curriculum (1924). Além de Bobbit, são citados como importantes
investigadores da área de currículos naquele país W. W. Charters, Edward L.
Thorndike, Ross L. Finney, Charles C. Peters e David Snedden. Esses autores
centraram seus estudos na definição de qual deveria ser a relação entre a estrutura do
currículo e o controle social, em um período histórico de transição da América do Norte
rural, agrária, do século XIX marcado pelo crescente processo de industrialização e
divisão do trabalho.
A concepção tradicional de currículo vem sendo questionada desde a década de
1970, considerando que a concepção de aquisição e construção de conhecimento vem
se modificando ao longo do tempo. Por outro lado, a dinamicidade do mundo
contemporâneo, que se caracteriza por mudanças rápidas e constantes, gera a
necessidade de se repensar o processo de trabalho, da aprendizagem, do que se aprende
e do como se aprende.
Como já referimos, a década de 70, do século XX, foi dominada pela tendência
tradicionalista do currículo caracterizada pelo estilo tecnicista de Franklin Bobbitt e
outros, com a preocupação de prestar serviço aos professores e às escolas e à
racionalidade burocrática e tecnológica.
111
Também nos anos 70, nos Estados Unidos, estudiosos como Henry Giroux e
Michael Apple, influenciados pela teoria social européia, pela psicanálise, por Paulo
Freire e pela Nova Sociologia da Educação inglesa, mostraram-se insatisfeitos com as
tendências no campo do currículo. Criticaram a abordagem técnica e deram ênfase ao
carácter político dos processos de pensar e fazer currículo, sendo considerados
pioneiros da tendência curricular crítica.
Preocupados com o tipo de conhecimento que a escola veiculava, realizaram
uma análise de forte cunho sociológico, procurando mostrar como as formas de
selecção, organização e distribuição do conhecimento favorecem a opressão de classes
e grupos subordinados. Discutiram alternativas que permitam sua organização a favor
da emancipação individual e colectiva.
Na perspectiva crítica, Silva (2009) toma o currículo como um documento de
identidade com significados que ultrapassam aqueles que foram dados pelas teorias
tradicionais, referindo que:
O currículo tem significados que vão muito além daqueles aos quais as teorias tradicionais nos confinaram. O currículo é lugar, espaço, território. O currículo é relação de poder. O currículo é trajetória, viagem, percurso. O currículo é autobiografia, nossa vida, curriculum vitae: no currículo se forja nossa identidade. O currículo é texto, discurso, documento. O currículo é documento de identidade (SILVA, 2009, p. 150).
Assim, cada período histórico apresenta preocupações específicas em relação à
educação e, por esta razão, O currículo é sempre o resultado de uma seleção: de um
universo mais amplo de conhecimentos e saberes selecionados aquela parte que vai
constituir, precisamente, o currículo (SILVA, 2009, p. 15).
O currículo será, como área de conhecimento, um terreno prático, socialmente
construído, historicamente formado, que não se reduz à aplicação de saberes
especializados desenvolvidos por outras disciplinas, que possui um corpo disciplinar
próprio. Por isso, a prática do currículo é um processo de representação, formação e
transformação da vida social que deve ser entendido como um todo (PACHECO, 2003,
p.23).
Ressurge, assim, no campo da formação profissional a preocupação com a
questão do currículo. Como deve ser o ensino tendo em vista a formação do trabalhador
em suas diversas áreas de actuação? Como garantir que ele aprenda aquilo que
realmente é necessário para uma actuação efectiva, responsável, ética e crítica, levando
em conta as particularidades do contexto sócio-cultural e político onde se insere?
112
Reaparece, de novo, a questão: “o que se considera um profissional competente?”
Reaparece, deste modo, a questão da formação integral, uma formação para a
cidadania. Muitas teorias sobre o currículo se posicionam de maneiras diferentes.
2.9.2. Revisitando o processo da construção do currículo da ACIPOL
No fim da guerra civil em Moçambique, marcado pelo Acordo Geral de Paz
(AGP), e em cumprimento dos preceitos desse acordo, foram criadas estruturas a vários
níveis e sectores de actividade para a implementação, ou fiscalizar a implementação
dos princípios e objectivos do Acordo. Ao nível das Forcas de Defesa e Segurança,
iniciou um amplo processo de desmobilização dos militares do exercito do Governo e
dos guerrilheiros da RENAMO. Esse processo foi dirigido por unidades específicas da
ONUMOZ49- um programa das Nações Unidas (ONU) para apoiar a implementação
do acordo de paz em Moçambique; foi extinto o Serviço Nacional de Segurança
Pública (SNASP) e, na sequência, foram desmobilizados seus agentes, alguns dos quais
foram integrados na Policia da República de Moçambique; foi criada uma unidade
especifica para a reforma da polícia da Republica de Moçambique dirigida pelo PNUD
(Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento).
A reforma da Polícia incluía as áreas organizacional, infraestrutral, legal
(regulamentos), reciclagem dos efectivos existentes e formação de novos efectivos em
novos conteúdos e métodos de trabalho. A idéia geral gravitava em torno da
reestruturação completa da Polícia. Durante esse processo, foram organizados e
realizados vários cursos de reciclagem em quase todas as áreas de actividade da Polícia,
incluindo dois cursos de formação de formadores que garantiriam a continuidade do
processo de formação no período pós-PNUD. Todos esses cursos foram desenhados e
implementados pelo PNUD, através da Guardia Civil Espanhola, especialmente
contratada para esse fim.
No processo da Reforma da Polícia, foi reiniciada a formação básica da polícia
que havia sido interrompido havia cerca de 10 anos devido a guerra civil; o Governo de
49 Operação das Nações Unidas em Moçambique (ONUMOZ) estabelecida pela Resolução 797 (1992) do Conselho de Segurança, de 16 de dezembro de 1992, ampliada pela Resolução 988 (1994), de 23 de fevereiro de 1994. A ONUMOZ tinha como objectivo fundamental garantir a implementação do Acordo Geral de Paz de 1992, assegurando o bom funcionamento de quatro esferas essenciais: a política, a militar, a humanitária e a eleitoral.
113
Moçambique e alguns doares incluíram a criação de uma instituição de formação
superior para a Policia de Moçambique. Para o governo e alguns doadores essa era uma
oportunidade para iniciar um programa de formação superior de futuros oficiais,
capacitando-os técnica e cientificamente para responder aos novos desafios da ordem e
segurança publicas que se desenhavam para a sociedade moçambicana, para além da
almejada “mudança da imagem” da polícia moçambicana. Porém, para outros
observadores (nacionais e estrangeiros) a idéia era improcedente, por uma série de
razões, entre as quais as seguintes:
1. A paragem de cerca de uma década do processo de formação exigia que todos os
esforços fossem direccionados para o reinício da formação, sua modernização e
consolidação para o nível dos guardas e sargentos, que constituem a maioria da
força operacional realmente necessária para a manutenção da lei e ordem;
2. A formação de oficiais poderia ser feita no exterior ou em cursos
esporadicamente organizados de acordo com as necessidades específicas
reveladas pela situação da segurança pública em Moçambique;
3. Moçambique era um País pobre, saído de uma Guerra civil, não teria recursos
suficientes para a manutenção de uma escola superior da Polícia.
Apesar das diversas posições e opiniões discordantes, o governo de
Moçambique decidiu levar avante o projecto da criação de uma Academia para a
formação superior dos oficiais da Polícia. Alguns dos doadores que antes comungavam
essa idéia reconsideraram suas posições e desistiram do projecto, ficando a cooperação
Suíça, a cooperação do Reino dos Países Baixos (Holanda) e a cooperação portuguesa
como únicos parceiros que garantiram seu apoio ao Governo de Moçambique no
financiamento do Projecto.
Foi assim que em Março de 1998, um núcleo especifico foi constituído para
iniciar o processo de elaboração da documentação necessária para a criação da
instituição, nomeadamente estatutos, regulamentos e o currículo. O subgrupo de
elaboração do currículo foi chefiado por um curriculista da Universidade Pedagógica de
Moçambique e integrava três oficiais da Polícia, mas ninguém dos integrantes do grupo
tinha feito estudos superiores em Polícia. Ao grupo juntou-se um oficial da Polícia de
Segurança Pública de Portugal (PSP), que também desempenhava funções de oficial de
ligação entre a Polícia de Moçambique e a Polícia portuguesa, o qual era graduado em
114
ciências policiais pelo Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Publica
(ISCPSP) de Portugal, mas sem experiência em desenvolvimento curricular.
Os oficiais da Guardia Civil Espanhola, um Coronel e um Tenente-Coronel, que
trabalhavam na reforma da Polícia moçambicana sob os auspícios do Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), tinham recebido ordens das suas
chefias (não posso precisar se GCE ou PNUD) para não integrarem nem colaborar com
o grupo que estava a preparar a criação da ACIPOL.
Em Agosto de 1998, o grupo de trabalho foi formalizado como Comissão
Instaladora da ACIPOL, presidida por um acadêmico ex-governante de Moçambique e
que tinha até exercido funções de Ministro do Interior. O Vice-Presidente da Comissão
Instaladora era um oficial da Policia, que exercia funções de Comandante do Centro de
Formação de Quadros da Polícia (CFQ), cujas instalações transitaram para a ACIPOL.
A comissão instaladora era composta por 11 elementos, dos quais 5 oficiais da
polícia, 2 docentes da Universidade Eduardo Mondlane de Moçambique, 1 docente da
Universidade Pedagógica de Moçambique, 2 juristas, sendo 1 deles Juiz Conselheiro do
Tribunal Administrativo e 1 acadêmico independente.
As grandes questões que se colocavam para o desenvolvimento do Currículo de
Licenciatura em Ciências Policiais eram: Quem define o que e como a Academia
deveria ensinar (formar)? Isto é, a Comissão deveria definir o que ensinar, para que
ensinar, como ensinar. Deveria, igualmente, ter em conta como essas determinações
formais do currículo iriam se manifestar na Academia. Significa que a equipe de
elaboração do currículo deveria estudar a legislação educacional, bem como a
documentação oficial do Ministério do Interior e do Comando Geral da Polícia e das
reformas políticas e sociais que estavam em curso no País, com o objectivo de orientar
a implementação desses dispositivos legais no que se referia ao currículo.
A partir daí, tornava-se necessário identificar que acções precisariam ser
planificadas e realizadas pela futura Academia para colocar em prática um currículo
que contemplasse os objectivos da formação superior no contexto da reforma da polícia
moçambicana.
Durante o processo de discussão sobre os princípios e as bases para o desenho
curricular que se projectava para a ACIPOL, reapareceram os oficiais da Guardia Civil
Espanhola ao serviço do PNUD já com ordens expressas não apenas para participar no
desenho do currículo, mas para orientarem o processo. Assim, apresentaram uma
proposta já elaborada do currículo para ser apreciada e aprovada pela comissão.
115
Por sua vez, o oficial da Polícia portuguesa também apresentou uma proposta já
elaborada para ser apreciada e aprovada. Mais tarde, o consultor policial dos Estados
Unidos também apresentou uma proposta já elaborada para ser apreciada e aprovada e
que, segundo ele, tinha sido aplicada com sucesso na Polícia de Uganda.
No entanto, houve uma “resistência” a essses modelos acabados devido às
circunstâncias políticas, econômicas, culturais e educacionais do nosso país, em
contraste com o contexto internacional das propostas, mas não havia referências
internas sobre a formação superior em Polícia.
Oscilou-se, então, entre a tentativa de rejeição dos modelos espanhol, português
e americano para a adaptação crítica dessa e de outras experiências na busca de um
desenvolvimento mais independente no campo do Currículo que se pretendia desenhar.
Foi nesta segunda perspectiva que no final de 1998, acabou por se concluir o desenho e
aprovar-se o currículo que está em vigor na ACIPOL, que absorveu os aspectos
considerados adequados e compatíveis com os objectivos da formação policial em
Moçambique.
O currículo foi socializado com a comunidade acadêmica moçambicana e
representantes de todas as instituições de ensino superior (IES) moçambicanas, públicas
e privadas. Foi uma atitude considerada pioneira por parte da Polícia, pois nunca antes,
haviam sido discutidos fora da corporação matérias sobre a formação da polícia. O acto
foi considerado um grande sinal de abertura da Polícia à colaboração e participação da
sociedade civil nas actividades de interesse social comum.
Segundo Gimeno Sacristán (2000), quando definimos o currículo estamos
descrevendo a concretização das funções da própria escola, no caso vertente da
Academia, e a forma particular de enfocá-las num momento histórico e social
determinado, para um nível ou modalidade de formação, numa contextura institucional.
O objectivo deste curso é a formação de profissionais que possam actuar na
perspectiva da promoção da segurança pública e contribuam para o desenvolvimento
dessa área, no âmbito teórico e prático.
O currículo de Licenciatura (graduação) em Ciências Policiais estrutura-se em
áreas científicas entendidas como um conjunto delimitado e articulado de competências
e habilidades que configuram oportunidades de concentração de estudos, práticas pré-
profissionais e estágios nos domínios da função policial. As áreas são compatíveis com
as demandas sociais actuais e/ou potenciais, e com a vocação e condições da
116
instituição. Portanto, o currículo definiu um perfil de saída generalista, assegurando ao
graduado a possibilidade de actuar em qualquer área de função policial.
A definição das áreas científicas partiu de um processo de discussão iniciado
pelos membros da comissão instaladora da ACIPOL e, em seguida, em sessão plenária
com os professores e académicos de outras áreas e instituições de ensino superior. este
colectivo discutindo numa perspectiva de formação interdisciplinar, chegou à definição
das quatro áreas que norteiam a formação dos cadetes de Licenciatura (graduação) em
Ciências Policiais na ACIPOL. As quatro áreas científicas são:
1. Ciências e Tecnologia Policiais
2. Ciências Jurídicas
3. Ciências Sociais e Humanidades
4. Ciências Exactas e de Gestão
Nas áreas científicas não havia disciplinas isoladas, todas estavam constituídas
por módulos que integravam um grupo de disciplinas afins, enfocando a leccionação ao
objectivo global do curso e não das disciplinas, isto é às competências e habilidades
requeridas para o desempenho de funções de um oficial subalterno. Por exemplo, o
módulo de ciências sociais e humanidades (CSH) incluía as disciplinas de psicologia,
sociologia, antropologia; o módulo de Técnica das Forças de Segurança (TFS) incluía
todas as disciplinas de procedimentos policiais.
Este processo seguido na construção do Currículo do Curso de Ciências
Policiais mostra que havia intencionalidade de mudança integrada no processo de
formação sem crise; a mudança progrediria porque haveria mudança das lógicas
burocrática e profissional por lógicas organizacionais adaptativas e flexíveis, que
consideraria melhor a necessidade de autonomia versada em responsabilidade
colectiva e desenvolvimento da qualidade.
Porém, o currículo falhou na implementação. Na prática foi desconstruído e
retornado ao sistema de disciplinas isoladas. E porquê? Entre outras razões a imediata
foi a seguinte:
-Na realidade, o currículo não foi suficientemente socializado ao nível da
corporação policial e os docentes, actores principais da garantia de sua implementação,
não foram incluídos na discussão do projecto nem na discussão do currículo aprovado
antes da sua implementação. Não se considerou que O engajamento colectivo em um
117
projecto comum parece um meio de integrar acções dispersas, criar sinergias,
responsabilizar o conjunto dos actores e mobilizar-se sobre objectivos claros
(THURLER, 2001, p. 115).
Dessa forma, alguns dos subsídios fundamentais para a configuração do
currículo que são o conhecimento e os valores orientados para uma determinada
formação podem ter sido afectados, pois a sistematização dessa formação por esses
subsídios é o currículo. Sobre esse aspecto, Macedo (2007, pp.25-26) afirma que:
1. O currículo deve inscrever-se em um processo de projecto realista e criar
as condições para alcançar seus objectivos;
2. O Currículo é a expressão de uma vontade explícita e partilhada do
estabelecimento de ensino para responder ás necessidades do formando;
3. O Curso fundamenta-se em acção colectiva. Um projecto deve ser
suficientemente explícito para permitir que se representem as estruturas, os
conteúdos, as práticas a serem desenvolvidas e o procedimento para
chegar a isso.
2.9.3. Breve olhar sobre as teorias do currículo
Uma definição não nos revela o que é, essencialmente, o currículo: uma definição nos revela o que uma determinada teoria pensa o que o currículo é. (Tomaz Tadeu da Silva, 2010).
A base para se discutir um currículo, qualquer currículo, no âmbito educativo ou
de formação profissional, é a teoria de aprendizagem adjacente. Sacristán (2008, p. 37)
explica que as teorias desempenham várias funções: são modelos que seleccionam
temas e perspectivas; costumam influir nos formatos que o currículo adopta; têm um
valor formativo e profissional para os alunos e professores; oferecem uma abertura de
racionalidade às práticas formativas e educativas. As teorias curriculares se convertem
em mediadores ou em expressões da mediação entre o pensamento e a acção em
educação.
Algumas teorias sobre o currículo apresentam-se como teorias tradicionais,
que pretendem ser neutras, científicas e objectivas, enquanto outras, chamadas teorias
críticas e pós-críticas, argumentam que nenhuma teoria é neutra, científica ou
desinteressada, mas que implica relações de poder e demonstra a preocupação com as
conexões entre saber, identidade e poder.
118
Tomás Tadeu da Silva apresenta a seguinte discussão sobre o currículo:
O Currículo envolve a construção de significados e valores culturais. O Currículo não está simplesmente envolvido com a transmissão de "fatos" e conhecimentos "objetivos". O Currículo é um local onde, ativamente, se produzem e se criam significados sociais. Esses significados, entretanto, não são simplesmente significados que se situam no nível da consciência pessoal e individual. Eles estão estreitamente ligados a relações sociais de poder e desigualdade. Trata-se de significados em disputa, de significados que são impostos, mas também contestados (SILVA, 2010, pp. 55-56).
As ilações que se podem tirar a partir da citação acima relacionam-se com os
saberes transmitidos pela escola através do currículo como algo que está directamente
ligado às relações sociais do poder, designadamente de significados que são impostos,
mas chama a atenção sobre o facto de que através do currículo esses valores também
podem ser contestados. Se assim é, regista-se a importância do diálogo, da integração e
da interação entre os actores da educação.
Por sua vez, Pacheco (2001, pp.33-34) aponta essencialmente três teorias
curriculares (técnica, prática e a crítica) que segundo ele, encaixam-se em modelos
socioeconômicos diacrônicos e que conduzem os rumos da sua autonomia dados ao
fazer pedagógico. A tabela 9 ilustra as teorias curriculares, caracterização e suas
concepções de currículo.
Tabela 9: teorias curriculares, caracterização e concepções de currículo TEORIA CARACTERIZAÇÃO CONCEPÇÕES DE CURRÍCULO
Teoria Técnica
Legitimidade Normativa; Racionalidade Técnica; Ideologia Burocrática; Interessa Técnico; Discurso Científico; Organização Burocrática; Acção Tecnicista; Teoria – Prática
- Currículo como produto ou conteúdos organizados por disciplinas; - Currículo como auto-realização dos alunos; - Currículo como meio tecnológico ou plano para aprendizagem
Teoria Prática
Legitimidade Processual; Racionalidade Prática; Ideologia Pragmática; Interesse Prático; Discurso Humanista; Organização liberal; Acção Racional; Teoria - Prática
- Currículo como Texto - Currículo como Projecto - Currículo como Hipótese de Trabalho
Teoria Crítica
Legitimidade Discursiva; Racionalidade Comunicativa Ideologia Crítica; Interesse Emancipatório; Discurso Dialéctico; Organização Participativa, Democrática e Comunitária; Acção Emancipatória Teoria - Prática
- Currículo como Práxis - Currículo como Acção argumentativa
Fonte: Pacheco, 2001, p.33 (Currículo: Teoria e Práxis)
119
Tais teorias desdobram-se nas seguintes acepções curriculares:
i. Currículo como desenvolvimento dos processos cognitivos – maior preocupação
com o aperfeiçoamento das operações intelectuais do que com os conteúdos;
ii. Currículo como tecnologia – preocupação com o como se aprende e não
propriamente com o quê já que o currículo é visto como um processo
tecnológico ou um meio para organizar a aprendizagem;
iii. Currículo como auto-realização ou como experiência consumatória – centrado
no aluno – e nos conteúdos de aprendizagem – e orientado para a sua autonomia
e desenvolvimento pessoal;
iv. Currículo como reconstrução social – preocupação com a visão social da
aprendizagem;
v. Racionalismo acadêmico – valorização da aprendizagem de conteúdos
organizados em disciplinas.
Nessa linha de raciocínio quando se refere às teorias curriculares Pacheco
chama a nossa atenção para o seguinte:
(...) as teorias são classificação ou síntese de várias concepções de currículo com o intuito de facilitar a compreensão da complexidade curricular, sendo apresentadas quer sob a forma de orientações, ideologias, concepções, quer sob a forma de processos de legitimação e de modelos de conhecimento (PACHECO, 2001, p. 33).
Partindo da concepção da citação acima, pode-se afirmar que as teorias
curriculares são apenas um caminho apontado para o entendimento das acções que se
entrelançam nas complexas relações sociais que permitem a validação através dos
projectos institucionais e que devem ser trabalhadas nas instituições de ensino
(extensivo às de formação profissional), visando oferecer aos estudantes conhecimento
da ideologia social e cultural vigente; confrontá-las com aquelas que as precederam
para que o educando possa formar seu próprio juízo de valor a respeito dos conceitos,
das versões e daí possa tornar-se um cidadão cônscio do que acontece dentro e fora do
contexto escolar.
Relativamente à formação policial, reforça-se a idéia de colocar, em evidência
assuntos que realcem, reforcem, valorizem e modifiquem o futuro oficial que está em
fase de formação, porque a experiência nos mostra que, sem os desafios, sem a
prudência e sem a perseverança não se consegue alcançar os êxitos pretendidos na
formação, mas que, sem a prudência na aplicabilidade, corre-se o risco de ser dado
120
relevo a itens que não importam, não adicionam, não valorizam e nem formam o oficial
pretendido pela sociedade democrática e dinâmica. Neste caso, as teorias curriculares
estariam a serviço exclusivamente de ideologias subjacentes às decisões curriculares.
O cerne do desafio que se apresenta nasce da necessidade de se abandonar, no que for necessário, o paradigma fortemente militarista e implantar um novo paradigma com base nos princípios pedagógicos, a saber: compreensão e valorização das diferenças, formação e qualificação profissional continuada, flexibilidade, interdisciplinaridade, valorização do conhecimento anterior, valorização do conhecimento da realidade, integração, abrangência e capilaridade, universalidade, articulação, qualidade e atualização permanente (LUIZ, 2011)50.
2.9.4. A Teoria crítica como práxis
As teorias críticas começaram a surgir na década de 60, década caracterizada
por grandes agitações e transformações sociais. Foi nessa altura que segundo Silva,
2009, p.29), a literatura inglesa reclama a prioridade para a chamada “nova sociologia
da educação”, um movimento identificado com o sociólogo inglês Michael Young.
Nessa altura, assinala-se também o importante papel da obra de Paulo Freire, enquanto
na França se destacavam os ensaios de Althusser, Bourdieu, Passeron e outros. As
teorias críticas do currículo efectuam uma completa inversão nos fundamentos das
teorias tradicionais.
Figura 11: Linha de tempo das teorias críticas
TEORIAS CRÍTICAS
80
Dermeval Saviani – Pedagogia Crítico-Socialdos Conteúdos.
60
Teorias Críticas
70 – Paulo Freire – “Pedagogia do Oprimido”
71 – Michael Young – Nova Sociologia da EducaçãoBasil Bernstein – Teoria dos Códigos
76 – Samuel Bowles e Herbert Gintis – Teoria daCorrespondência
LINHA DE TEMPO
FONTE: Autor, inspirado em SILVA (2010, p. 30)
50 Comunicação intitulada “Polícia: o fiel da balança no cenário democrático”, apresentada em Moçambique, em Agosto de 2011, na Conferência Internacional sobre os Desafios da Formação Policial no Contexto da Governação Democrática.
121
A teoria crítica, segundo Pacheco (2001, pp. 41-42), caracteriza-se por um
discurso dialéctico, por uma organização participativa, democrática, comunitária e por
uma acção emancipatória. Nesta teoria o currículo se apresenta não como resultado do
trabalho dos especialistas, nem dos professores em acção individual, mas na acção
colectiva dos professores e portadores de consciência reflexiva e crítica.
Assim sendo, esta teoria é desenhada numa legitimidade discursiva que
proporciona a racionalidade comunicativa e remete para uma ideologia crítica que
persegue interesse emancipatório. Nesse sentido o sujeito activo do processo
desenvolve um discurso dialéctico que permite uma organização participativa,
democrática e comunicativa visando acção emancipatória. Neste ponto a teoria e a
prática convergem e se confundem porque uma é complementar à outra, dando-lhe
apoio para que a acção seja mais equilibrada entre os dois fundamentos e mais
autêntica. Na teoria crítica, a dicotomia teoria/prática perde o caráter hierárquico e
assume a qualidade de complementaridade recíproca (ibidem).
Se assim é, o currículo apresenta-se como práxis, como acção argumentativa.
Esse entendimento é partilhado e secundado por Grundy citado por Pacheco (2001,
p.41), nos seguintes termos:
A práxis conduz, por um lado, à emancipação, e esta só ocorre em condições de justiça e de igualdade dos vários intervenientes no currículo e, por outro, à crítica da ideologia, que enforma todo o projeto curricular, tornando-se só possível pela reflexibilidade e pela acção autónoma.
Na esteira do autor supracitado, quando os elementos da práxis são aplicados à
natureza do currículo, estabelecem-se os seguintes cinco princípios interligados: 1) os
elementos da práxis são acção e reflexão, 2) a práxis tem lugar no real, mas não no
mundo hipotético, 3) a práxis trabalha no mundo da interpretação, do social e do
cultural, 4) o mundo da práxis é o mundo construído, não o mundo natural, 5) a práxis
assume o processo de fazedor de sentido, que reconhece o significado como uma
construção social (...). Quando alunos e professores, em conjunto, desafiam esta
ascendência, reivindicando o direito de eles próprios determinarem o significado, o
processo de construção do currículo torna-se um acto político (ibidem).
Pacheco defende que a teoria crítica seria aquela desejável por uma sociedade
do conhecimento que busca a emancipação social do ser que vive num determinado
contexto. Acrescenta ainda, que os problemas curriculares não devem ser resolvidos
com teorias, mas sim com acções práticas, pois, o currículo é um amplo corpo de factos
122
acerca dos quais a abstracção teórica guarda silêncio, que se deve buscar pela
aplicação do método deliberativo (PACHECO, 2001, p.38).
A teoria crítica apontada por Pacheco encontra reflexo e aplicabilidade no
processo e contexto de formação de oficiais da Polícia de Moçambique, uma vez que as
políticas de inserção dos estudantes passam pelo discurso dialéctico visando acção
emancipatória para que o produto oriundo da ACIPOL (o egresso) possa interagir na
realidade do trabalho policial que exige mais do que apenas conhecimentos acerca dos
assuntos da actividade policial. A sociedade do conhecimento e da informação impõe
novos paradigmas ao trabalho da polícia que requer profissionais habilidosos, que
saibam transformar esses saberes, processá-los e aplicá-los numa atitude responsável,
ética, interativa e competente. Esses atributos retiram a hipotética apoliticidade dos
polícias e do trabalho policial.
O outro destacado curriculista e defensor da teoria crítica é Michel Young
(2000) para quem a distinção entre teorias críticas do currículo de outros tipos de
teorias curriculares é o facto de serem teorias sobre políticas curriculares que
reconhecem que seu objectivo é tanto a compreensão quanto a mudança. Melhor
explicando, afirma que:
O que distingue as teorias críticas do currículo de outros tipos de teorias do currículo é o fato de serem teorias sobre políticas curriculares que reconhecem que seu objetivo é tanto a compreensão quanto a mudança. Em outras palavras, as teorias críticas implicam intenções, porque seu ponto de origem é a educação como forma de ação intencional, e qualquer ação intencional como a educação não pode ser simplesmente tema de compreensão. No entanto, a compreensão do currículo ganha sentido se essa compreensão desempenha um papel na mudança dele, de maneira tal que amplie a qualidade e a quantidade das oportunidades de aprendizado (YOUNG, 2000, pp.17-18).
Para Basil Bernstein, o conhecimento educacional formal (incluindo o
profissional) encontra sua realização através de três sistemas de mensagens: o
currículo, a pedagogia e a avaliação:
O currículo define o que conta como conhecimento válido, a pedagogia define o que conta como transmissão válida do conhecimento, e a avaliação define o que conta como realização válida desse conhecimento da parte de quem é ensinado (SILVA, 2009, p.71).
A teoria de Bernstein, conhecida como teoria dos códigos é, entretanto, ao
menos em parte, uma teoria sociológica do currículo. A importância que a teoria crítica
desse autor tem para o nosso estudo reside no facto de que o autor não está preocupado
123
com o conteúdo propriamente dito do currículo. Assim também aponta, pelo menos em
parte, o nosso estudo. Ele não questiona por que se ensina esse tipo específico de
conhecimento e não outro, nem tampouco por que esse conhecimento particular é
considerado válido e aquele outro não. Ele está mais preocupado com as relações
estruturais entre os diferentes tipos de conhecimento que constituem o currículo.
Bernstein procura saber como o currículo está estruturalmente organizado. Além disso, ele pergunta como os diferentes tipos de organização do currículo estão ligados a princípios diferentes de poder e controle (...). Bernstein distinguia dois tipos fundamentais de organização estrutural do currículo: o currículo tipo coleção e o currículo integrado (SILVA, 2009, p.72).
No currículo tipo colecção, as áreas e campos de conhecimento são mantidos
fortemente isolados, separados. Não há permeabilidade entre as diferentes áreas de
conhecimento. No currículo integrado, por sua vez, as distinções entre as diferentes
áreas de conhecimento são muito menos nítidas, muito menos marcadas. A organização
do currículo obedece a um princípio abrangente e ao qual se subordinam todas as áreas
que o compõem (ibidem, p.72).
Com base nessa concepção, Bernstein cunhou um termo para se referir ao maior
ou menor grau de isolamento e separação entre as diversas áreas de conhecimento que
constituem o currículo: “classificação”. Quanto maior o isolamento, maior a
classificação, considerada pelo autor como uma questão de fronteiras. Nesse sentido, a
classificação responde, basicamente, à questão: que coisas podem ficar juntas? Um
currículo tradicional, marcadamente organizado em torno de disciplinas acadêmicas
tradicionais, seria, na concepção de Bernstein, fortemente classificado. Um currículo
interdisciplinar, em contraste, seria fracamente classificado.
Reflectindo sobre o Currículo da Academia de Ciências Policiais, pelas
características estruturais que apresenta, podemos identificar alguns elementos
claramente comparáveis com os destacados por Bernstein. Entre eles os mais salientes
são: estruração do currículo por áreas de conhecimento (não por eixos de conhecimento
que correspondam às exigências profissionais do oficial da Polícia), neste caso, possui
cinco áreas, nomeadamente ciência e tecnologia policiais, jurídica, ciências exactas e
de gestão, ciênciais sociais e humanas, e estágio curricular); estruturação das áreas de
conhecimento por disciplinas; Nítida separação entre a área policial e as restantes áreas
de conhecimento.
124
Essas características consubstanciam, observada a devida contextualização, o
que Bernstein denomina de “classificação”, característica de um currículo de tipo
colecção. Compreende-se que a construção de um currículo de formação
profissionalizante de uma área de actuação profissional bastante ampla e controversa,
com é a área policial, não é actividade fácil e tampouco consensual. Porém, a
complexidade, sob ponto de vista dialéctico não justifica o isolamento, pois conforme
afirma Edgar Morin ao explanar o sentido da sua tese paradigmática sobre o
pensamento complexo:
Colocamos ao mesmo tempo a possibilidade e a necessidade de uma unidade da ciência (...). Tal unidade é, evidentemente, impossível e incompreensível no quadro actual onde miríades de dados se acumulam nos alvéolos disciplinares cada vez mais estreitos e fechados. Ela é impossível no quadro onde grandes disciplinas parecem corresponder a essências e a matérias heterogêneas. Mas ela só tem sentido se for capaz de apreender ao mesmo tempo unidade e diversidade, continuidade e rupturas (...). A unidade da ciência respeita as disciplinas e áreas de conhecimento, mas quebra o departamentalismo, o sectorismo (MORIN, 2007, p.50).
Do treccho supracitado podemos entender que a perspectiva da unidade da
ciência é transdisciplinar. Para o objectivo deste trabalho é preciso pensar no que será
possível fazer na estrutura do currículo e no espaço da escola (Academia) para superar
os problemas da classificação. O possível neste caso significa explorar os limites, para
reduzi-los, e as alternativas de acção para ampliá-las.
2.9.5. O currículo integrado como evolução das idéias críticas sobre o currículo
Santomé (1998, p.9) explica que a denominação currículo integrado tem sido
utilizada como tentativa de contemplar uma compreensão global do conhecimento e de
promover maiores parcelas de interdisciplinaridade na sua construção. A integração
ressaltaria a unidade que deve existir entre as diferentes disciplinas e formas de
conhecimento nas instituições escolares.
A idéia de integração em educação, tributária da análise de Bernstein (1996),
como já referimos, coloca as disciplinas e cursos isolados numa perspectiva relacional,
de tal modo que o abrandamento dos enquadramentos e das classificações do
conhecimento escolar promove maior iniciativa de professores e alunos, maior
integração dos saberes escolares com os saberes cotidianos dos alunos, combatendo,
assim, a visão hierárquica e dogmática do conhecimento. Em síntese, o autor aposta na
125
possibilidade de os códigos integrados garantirem uma forma de socialização
apropriada do conhecimento, capaz de atender às mudanças em curso no mundo do
trabalho mediante o desenvolvimento de operações globais.
A formação profissional, por sua vez, é um meio pelo qual o conhecimento
científico adquire, para o trabalhador, o sentido de força produtiva, traduzindo-se em
técnicas e procedimentos, a partir da compreensão dos conceitos científicos e
tecnológicos básicos.
No currículo integrado, conhecimentos de formação geral e específicos para o
exercício profissional também se integram.
Um conceito específico não é abordado de forma técnica e instrumental, mas
visando compreendê-lo como construção histórico-cultural no processo de
desenvolvimento da ciência com finalidades produtivas.
Em razão disto, no currículo integrado nenhum conhecimento é só geral, posto
que estrutura objectivos de produção, nem somente específico, pois nenhum conceito
apropriado produtivamente pode ser formulado ou compreendido desarticuladamente
das ciências e das linguagens.
O currículo formal exige a selecção e a organização desses conhecimentos em
componentes curriculares, sejam eles em forma de disciplinas, módulos, projetos e
outros, mas a integração pressupõe o restabelecimento da relação entre os
conhecimentos seleccionados. Como o currículo não pode compreender a totalidade, a
selecção é orientada pela possibilidade de proporcionar a maior aproximação do real,
por expressar as relações fundamentais que definem a realidade.
O currículo integrado organiza o conhecimento e desenvolve o processo de
ensino-aprendizagem de forma que os conceitos sejam apreendidos como sistema de
relações de uma totalidade concreta que se pretende explicar/compreender. No trabalho
pedagógico, o método de exposição, por exemplo, não deve limitar-se à simples
exposição, deve restabelecer as relações dinâmicas e dialécticas entre os conceitos,
reconstituindo as relações que configuram a totalidade concreta da qual se originaram,
de modo que o objecto a ser conhecido revele-se gradativamente em suas
peculiaridades próprias (GADOTTI, 1995, p.19).
Sob diferentes concepções e modalidades e refletindo distintas finalidades
educativas e sociais, o discurso sobre integração regista longo percurso na educação e
na história do currículo. Quase sempre relacionada à ideia de inovação ou de renovação
educacional, no nosso entendimento a integração é, em geral, associada à melhoria do
126
processo de ensino-aprendizagem e à maior compreensão da realidade e dos conteúdos
formativos. Autores com diferentes perspectivas teóricas defendem essa organização
curricular, em contraposição à fragmentação e à compartimentação do conhecimento.
Essas análises colocam a necessidade de relacionar o âmbito de formação dos
oficiais da Polícia à prática policial concreta. A proposta de “currículo integrado” na
perspectiva técnico-policial e humana dos oficiais da Polícia incorpora essas análises e
busca definir as finalidades da formação policial por referência às necessidades da
formação humana. Com isto, podemos aferir que as aprendizagens durante a formação
devem possibilitar à classe policial a compreensão da realidade para além de sua
aparência e, assim, o desenvolvimento de condições para transformá-la em benefício
das necessidades de assegurar o exercício da cidadania, a ordem e segurança públicas.
2.10. O Estágio Curricular
Uma das questões mais recorrentes quando a temática é a formação profissional
é a relação teoria e prática, alicerce da formação, entretanto, objecto de muitas dúvidas
quanto a sua estrutura e constituição. A literatura especializada e vários estudos
realizados e disponíveis apontam para a necessidade de que o Estágio Supervisionado
extrapole o limite do empírico, das actividades isoladas e passe a ter função
fundamental que não é apenas levar os conhecimentos teóricos ao campo da prática,
mas compreendê-los, reelaborá-los, pensando a realidade vivida pelo futuro
profissional.
Pimenta e Gonçalves (1990)51 consideram que a finalidade do estágio é a de
propiciar ao formando uma aproximação à realidade52 na qual actuará. Assim, o
estágio se afasta da compreensão até então corrente, de que seria a parte prática do
curso. Defendem uma nova postura, uma re-definição do estágio que deve caminhar
para a reflexão, a partir da realidade.
51 Revista Poíesis -Volume 3, Números 3 e 4, pp.5-24, 2005/2006 52 A aproximação à realidade só tem sentido quando tem conotação de envolvimento, de intencionalidade.
127
2.10.1. Conceito de Estágio
Considera-se estágio53 as actividades programadas, orientadas, supervisionadas
e avaliadas que proporcionem ao aluno aprendizagem social, profissional, cultural,
através da sua participação em atividades de trabalho vinculadas à sua área de formação
acadêmica. É um componente determinante da formação profissional e da cidadania
dos estudantes universitários.
Por se caracterizar como um componente acadêmico determinante da formação
profissional, o estágio poderá assumir a forma de atividades de pesquisa e extensão,
mediante a participação do estudante em atividades ou projetos de relevância social,
fortalecendo a integração destas funções à universidade.
Os estágios classificam-se em obrigatório (curriculares) e não obrigatórios
(extra-curriculares). O estágio curricular constitui-se como componente do currículo
pleno dos cursos de graduação. O estágio extracurricular-não obrigatório – constitui-se
em actividade complementar à formação acadêmico-profissional do aluno, realizado
por livre escolha do mesmo.
Neste estudo a nossa abordagem é sobre o estágio curricular supervisionado, tal
como foi anunciado no capítulo introdutório, cuja finalidade é integrar o processo de
formação do cadete, futuro profissional, de modo a considerar o campo de actuação
como objecto de análise, de investigação e de interpretação crítica, a partir dos nexos
com as disciplinas do curso.
O estágio curricular é um campo de conhecimento, portanto volta-se a uma
visão ampla deste e está implicado na organização do currículo do curso no seu todo.
Por isso, objectiva-se, aqui, reflectir sobre o estágio curricular como espaço de
formação cujo eixo é a pesquisa, superando sua redução tradicional à prática
instrumental. Sendo assim, impõe-se a análise conceitual do estágio no contexto dos
demais componentes disciplinares do curso e o desenvolvimento da compreensão da
pesquisa no estágio.
Nesta análise partimos do pressuposto de que o estágio curricular é um espaço
de aprendizagem da profissão na formação inicial, para quem ainda não é agente da
Polícia, na formação contínua para quem já actua como Polícia. Portanto,
53 Na língua portuguesa Estágio é entendido como etapa, fase, nível (que supõe continuidade em outros
níveis). Na língua inglesa é tratado como trabalho de campo (Field work).
128
perspectivamos discutir a possibilidade de organizar sistematicamente o trabalho de
estágio e das práticas pré-profissionais, abrangendo todo o seu processo de
planificação, execução e avaliação no contexto curricular.
2.10.2. Algumas acepções sobre o Estágio
O estágio sempre foi identificado como a parte prática dos cursos de formação
de profissionais, em contraposição à teoria tida no senso comum como conhecimento
livresco que não habilita ninguém para o saber fazer. Atentos a essa afirmação popular,
Lima & Pimenta (2010, p.33) afirmam que:
(...) Não é raro ouvir a respeito dos alunos que concluem seus cursos, referências como “teóricos”, que a profissão se aprende “na prática”, que certos professores e disciplinas são por demais “teóricos”. Que “na prática a teoria é outra”. No cerne dessa afirmação, está a constatação (...) de que o curso nem fundamenta teoricamente a atuação do futuro profissional nem toma a prática como referência para a fundamentação teórica. Ou seja, carece de teoria e de prática.
No capítulo introdutório deste trabalho referimos que uma das constatações da
missão back stopping e do diagnóstico interno realizado na ACIPOL durante o
processo de elaboração do Plano Estratégico, foi que a formação ministrada era
demasiado teórica e dissociada da realidade do trabalho policial. Como que a
confirmar essa visão, durante a sessão do grupo focal realizado na ACIPOL no
processo de recolha de dados para esta pesquisa, um oficial subalterno da polícia,
egresso da ACIPOL, afirmou que foi chocante ouvirmos um oficial superior da polícia,
com funções de comando, dizer em plena sessão do conselho da PRM que os
graduados da ACIPOL não sabem nada. Nem sequer a protecção de um local de
crime.
Embora seja extrema e inadequada a expressão de que os graduados não sabem
nada, na verdade, o currículo do curso de licenciatura em ciências policiais está
estruturado por áreas científicas, constituídas em aglomerado de disciplinas isoladas
entre si, sem fundamentação clara de seus nexos com a realidade que lhes deu origem.
Assim, como consideram Lima & Pimenta (2010), nem sequer se pode denominá-las
teorias, pois são apenas saberes disciplinares em cursos de formação, que em geral
estão desvinculados do campo de actuação profissional futura dos formandos.
129
Para os formandos, segundo a autora, as disciplinas do currículo assumem quase
que total autonomia em relação ao campo de actuação dos profissionais e,
especialmente, ao significado social, cultural, humano da actuação profissional. E
questiona: O que significa ser profissional? Que profissional se quer formar? Quais os
nexos com o conhecimento produzido na área de actuação e em produção? São
questões que muitas vezes não são consideradas nos programas das disciplinas.
Precisamos, portanto, de iniciar por uma aproximação ao entendimento da teoria e da
prática.
2.10.3. O que se entende por teoria e por prática
De acordo com o conceito de acção policial, a profissão de Polícia é uma
prática social. É uma forma de intervir na realidade social, no caso, por meio de manter
a lei e ordem pública e garantir a segurança de pessoas e bens (patrimônio). Por isso, a
actividade policial é ao mesmo tempo, prática e acção.
Para Sacristán (1999, p.150), a prática é institucionalizada; no caso, são as
formas de intervir na comunidade que ocorrem em diferentes contextos
institucionalizados, configurando a cultura e a tradição das instituições. Valente (2009,
p.198) afirma que a Polícia em qualquer tipo ou sistema político (foi) é e será sempre a
face visível da lei. A orgânica e o funcionamento dela é o resultado da sociedade que
criamos e das estruturas de poder material que construímos.
Por sua vez, Zabala (1998, p.167) refere que a estrutura da prática institucional
obedece a múltiplos determinantes institucionais, organizativos, tradições
metodológicas, possibilidades reais dos funcionários e das condições físicas existentes.
Nessa perspectiva, Sacristán sintetiza que:
A acção refere-se aos sujeitos, seus modos de agir e pensar, seus valores, seus compromissos, suas opções, seus desejos e vontade, seu conhecimento, seus esquemas teóricos de leitura do Mundo, seus modos de trabalhar e de planificar, de se relacionar com os outros e com a sociedade. Se a pretensão é alterar as instituições com a contribuição das teorias, precisamos compreender a imbricação entre sujeitos e instituições, acção e prática (SACRISTÁN, 1999, P.2001).
Em sentido amplo, a acção designa a actividade humana, o fazer, um fazer
efectivo ou a simples oposição a um estado passivo. Entretanto, em uma compreensão
filosófica e sociológica, a noção de acção é sempre referida a objectivos, finalidades e
130
meios, implicando a consciência dos sujeitos para essas escolhas, supondo um certo
saber e conhecimento (LIMA & PIMENTA, 2010, p.42).
Assim, denominamos acção policial as actvidades que a Polícia realiza no
âmbito do cumprimento da sua missão supondo o desenvolvimento de certas
actividades materiais (operacionais, judiciais e administrativas) orientadas e
estruturadas. Tais actividades têm por finalidade a garantia da ordem e segurança
pública. Esse processo é composto de conteúdos técnicos, habilidades e posturas
científicas, sociais, afectivas e humanas. Assim, na instituição policial “Compreendida
na sua diversidade como corporação, temos diferentes acções e diferentes sujeitos com
funções que também se diferenciam para a concretização do objectivo colectivo, a
garantia da ordem e segurança pública”.
Portanto, no estágio dos cursos de formação policial, compete:
Possibilitar que os futuros oficiais compreendam a complexidade das práticas institucionais e das ações aí praticadas por seus profissionais como alternativa na preparação para a inserção profissional. Isso só pode ser conseguido se o estágio for uma preocupação, um eixo de todas as disciplinas do curso e não apenas daquelas erroneamente denominadas “o trabalho (LIMA & PIMENTA, 2010, pp.43-4). práticas”.Todas as disciplinas, conforme nosso entendimento, são ao mesmo tempo “teóricas” e “práticas”. Todas devem contribuir para a sua finalidade, que é formar profissionais a partir da análise, da crítica e da proposição de novas maneiras de fazer.
2.10.4. O estágio como prática
O termo “praticar” no Dicionário Aurélio54encontramos como sinônimo fazer,
realizar algo (objectivo) ou acção (por exemplo, de fazer patrulha apeada ou
motorizada). Sabemos que para fazer, realizar, é preciso saber, conhecer e ter
instrumentos adequados e disponíveis. Uma das formas de conhecer é fazendo igual,
imitando, copiando, experimentando (no sentido de adquirir experiência), praticando
(PIMENTA, 2011, p.28).
O exercício de qualquer profissão é prático nesse sentido, na medida em que se
trata de fazer “algo” ou “acção”. A profissão de Polícia é também prática. E se o curso
tem por função preparar o futuro profissional para praticar, é adequado que tenha a
preocupação com a prática. Como não é possível que o curso assuma o lugar da prática
profissional, que o aluno exercerá quando for profissional, o seu alcance será tão-
54 Cf. Aurélio Buarque de H. FERREIRA. Novo Dicionário da Língua Portuguesa, I Ed. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, p. 1125 apud PIMENTA, 2011, p.28.
131
somente possibilitar uma noção da prática, tomando-a como preocupação sistemática
no currículo do curso (ibidem). Enquadra-se, a partir desta compreensão, a noção de
Práticas Pré-profissionais, que é desenvolvida no ponto 2.6.9.
Nos primórdios da polícia moçambicana, logo após a criação do CPM em 1975,
a finalidade primeira da formação policial era “prover a formação de unidades das
forças policias necessárias para reprimir o crime e a reação, assegurar as conquistas
revolucionárias, (Decreto-Lei nº 54/75, de 17 de Maio). Em toda a legislação referente
à Polícia, nessa época, não se fazia menção à formação profissional.
Os cursos de formação realizados no país ou no exterior, todos de nível básico e
médio, visavam preparar os agentes da Polícia mais para acções reactivas (combater,
reprimir, tec.). Essa missão pode ser, como foi, cumprida com pouca exigência em
termos de qualificações acadêmicas, mas com adequada instrução e treinamento, mais
aproximados ao adestramento de comportamentos e habilidades específicas do que ao
desenvolvimento de competências. A parte essencial da formação era a designada
“preparação político-militar”. Os alunos eram chamados “instruendos”, termo próprio
de quem está submetido à instrução.
Percebe-se então que não é possível afirmar que o exercício do trabalho policial
era uma profissão, mesmo considerando que cumpria quase todos, mas não totalmente,
os requisitos característicos de uma profissão conforme explicados por Bayley (2003).
A prática que se exigia para a formação do futuro agente (unidade) era tão-
somente aquela possibilitada por algumas disciplinas (de táctica policial). A prática
profissional como componente da formação, sob a forma de um estágio profissional,
não se colocava como necessária, uma vez que, de um lado, não tínhamos propriamente
uma profissão e, de outro, a destinação dos “instruendos” não era necessariamente o
exercício de Polícia (stricto sensu).
Já os cursos de Quadros médios de Direcção, primeiro com duração de nove
meses, depois dezoito e mais tarde vinte e quatro meses, tinham as práticas previstas no
respectivo currículo de formação com duração de 30-45 dias. Mesmo nestes cursos
nunca houve regulamentação sobre as práticas ou estágio. Os estudantes eram
encaminhados para uma determinada unidade policial e aí permaneciam durante o
tempo previsto, acompanhando (às vezes praticando) o que os profissionais faziam na
prática. É este tipo de estágio que foi herdado pela ACIPOL quando iniciou a formação
superior em ciências policiais e que constitui nosso objecto de análise neste estudo.
132
Sobre este tipo de acções na formação profissional, Pimenta (2011) observa
que:
A observação é feita sem objectivo predeterminado e sem o preparo que leve o aluno a dela retirar subsídios para os estudos posteriores, sendo muitas vezes realizada sem a assistência de professor capaz de discutir e analisar criticamente o que foi observado. Quanto à supervisão (grifo nosso), as oportunidades são quase inexistentes (PIMENTA, 2011, p. 40)
No currículo de licenciatura (graduação) em ciências policiais ministrado na
ACIPOL está previsto o Estágio Curricular e as Práticas Pré-profissionais, estas
definidas como sendo “actividades práticas de inserção, programadas, relacionadas com
o curso, de carácter obrigatório realizadas por estudantes do curso de graduação em
unidades e subunidades policiais e similares, do primeiro ao terceiro ano do curso, sob
orientação de docentes, que as avaliam, e supervisão da coordenação do estágio”.
O alcance destas actividades é que os estudantes em formação inicial tenham,
desde o primeiro ano do curso, contactos com o seu futuro campo profissional,
acompanhando as actividades realizadas pelos profissionais, de modo a ampliar e
consolidar os seus conhecimentos sobre as actividades policiais, interagindo com eles.
Pressupõe-se que as práticas pré-profissionais sejam constituídas por módulos
interdisciplinares construídos na base dos conteúdos fundamentais das disciplinas que
corporizam cada nível do curso pelos docentes desses níveis que orientam, também, a
sua realização prática.
Porém, a prática evidencia que tanto o estágio curricular, quanto as práticas
profissionais nunca foram regulamentados. Talvez seja por isso que as práticas pré-
profissionais nunca foram realizadas desde que começaram os cursos de graduação em
ciências policias, nem os respectivos módulos construídos. O estágio curricular sempre
foi realizado nos moldes tradicionais de “entrega” do estagiário ao local do estágio sem
nenhum guião sobre o que deve fazer, como deve fazer, que metas deve alcançar, sobre
o quê e por quem vai ser avaliado. Provavelmente, este é um dos factores de
desinteresse dos estagiários e de descrédito de suas competências profissionais pelos
profissionais experientes.
Consideremos, em seguida, a proposta da autora segundo a qual a prática em
seu sentido amplo seja dominante e absoluta, pois “da realidade virão os problemas a
serem analisados”. Disso resulta ainda que os professores da Prática tenham ampla
133
experiência em trabalho operativo, além de serem constantemente actualizados (ibidem,
p.40).
Sobre esse entendimento, Masetto se posiciona claramente ao fazer a seguinte
afirmação interrogativa:
O estágio precisa urgentemente ser resgatado como um grande espaço de formação profissional. Merece um lugar de destaque no currículo. Por que não pensá-lo como um dos eixos de formação que perpassa todo o currículo, favorece a integração das disciplinas e da teoria com a prática, se realiza durante todo o curso em situações diferentes, cada vez mais complexas, sempre com acompanhamento não apenas de um professor encarregado do estágio, mas de todos os professores em cujas disciplinas ele é realizado (MASETTO, 2010, pp.72-73).
Diagnosticando o distanciamento entre a realidade prática e os cursos de
formação, a autora aponta algumas possíveis causas nos seguintes termos:
As instituições de formação traduzem no seu interior – na sua organização e
funcionamento, no seu currículo e nos programas, nos métodos de formação, nos seus
professores (no trabalho destes) – o não compromisso com a formação do professor
necessário à transformação quantitativa e qualitativa do ensino, isto é, a instituição não
está sendo competente para formar professores capazes de contribuir com a formação
(policial) de qualidade (ibidem, p.44).
Sendo assim, continua o autor, a prática foi ficando cada vez mais “teórica”, ou
seja, distanciada da realidade. Nem se poderia falar mais aqui em prática como
experiência, como reprodução de modelos – que modelos? Para o caso da Polícia,
destaca-se aqui a importância da formação dos docentes próprios para a formação
policial ser realizada em cursos específicos, com profissionais especializados, se
necessário, em parceria com a Universidade. Enfim, aponta-se uma nova política de
formação de professores próprios da área policial que articulem as diferentes áreas dos
processos policiais e os conhecimentos dos diferentes níveis de formação policial –
básico – médio e superior de forma sistêmica.
Tendo em atenção estas considerações, poderíamos voltar às constatações dos
avaliadores da missão backstopping; de que prática eles falam? O esclarecimento desta
dúvida é importante para não incorrermos no erro de reduzir a prática à actividade. E
passarmos a postular um curso de formação onde haja identidade entre conhecimento
teórico e actividade.
134
2.10.5. Um novo entendimento de prática
Ao nível conceitual, vários estudos vêm contribuindo para o melhor
entendimento da indissociabilidade entre a teoria e aprática.
Examinando historicamente a relação teoria-prática, (Candau & Leis Apud
Pimenta, 2011, P.66), identificam duas visões. A primeira é a dicotômica, que enfatiza
a autonomia da teoria em relação à prática e vice-versa. A expressão mais radical dessa
visão é o entendimento de que na prática a teoria é outra. Mas também considera teoria
e prática como pólos associados, diferentes e não necessariamente opostos. A teoria
tem primazia em relação à prática e esta é aplicação daquela, podendo eventualmente,
ser corrigida ou aprimorada pela prática. Mas, via de regra, a prática conforma-se à
teoria.
Segundo essa visão dicotômica, característica do positivismo, Candau & Leis
defendem a visão de Unidade entre a teoria e prática. Unidade que não é identidade,
mas relação simultânea e recíproca de autonomia e interdependência. Teoria e prática
são componentes indissociáveis da Práxis55 definida, conforme (Vásquez apud
Pimenta, 2011, p.67), como actividade teórico-prática, ou seja, tem lado ideal, teórico,
e um lado material, propriamente prático, com a particularidade de que só
artificialmente, por um processo de abstração, podemos separar, isolar um do outro.
Traduzindo essa unidade de teoria e prática para a formação policial, podemos
afirmar que o fazer policial, “o objecto do policiamento56” e “como realizar o
policiamento” deve ser articulado ao para quê e para quem, expressando a unidade
entre os processos proacvtivos e os processos reactivos; entre a prevenção e a
investigação; entre a manutenção e a reposição da ordem pública. A partir dessa ideia
podemos apontar para a possibilidade de o policiar (fazer policiamento) desenvolver
uma práxis criadora.
Os estudos de Fávero (1992) citados por Pimenta (2011, pp.68-9), sobre o
estágio curricular na universidade, trazem outras contribuições para a nossa reflexão. A
autora parte do ponto de vista de que a propalada unidade entre a teoria e a prática, na
55 Para Marx (apud VÁSQUEZ1968), Práxis é a atitude (teórico-prática) humana de transformação da natureza e da sociedade. Não basta conhecer e interpretar o Mundo (teórico) é preciso transformá-lo (práxis). 56 Policiamento, como conjunto dos processos policiais (administrativos e operativos) realizados para a manutenção da ordem pública e garantia da segurança de pessoas e do patrimônio.
135
realidade, continua sendo um mecanismo de ajuste para encobrir o defasamento entre
teoria e prática.
Partindo dessa constatação, a autora levanta três questões: deverá o estágio na
universidade ser elemento de mediação entre teoria e prática? Em caso afirmativo, que
factores impedem essa realização? Por que o estágio curricular, em geral, não prepara
para o efectivo exercício profissional?
A autora inicia denunciando a prevalência da concepção dicotômica na qual o
papel da universidade é possibilitar a aquisição de conhecimentos acumulados e não
elaborar elementos que contribuam para a intervenção na realidade social. Esta
concepção, continua a autora, também se manifesta pela ênfase e até privilégio da
formação prática, vista como se tivesse lógica própria, independente de teoria.
Opondo-se a essa concepção, propõe a concepção dialéctica na qual teoria e
prática são o núcleo articulador da formação do profissional. Teoria e prática são
indissociáveis. A prática (a análise teórica da prática) é o ponto de partida e de chegada.
A conseqüência disso é que ninguém se tornará profissional apenas porque sabe sobre
os problemas da profissão, por ter estudado algumas teorias a respeito. Não é só com o
curso que o indivíduo se torna profissional. É, sobretudo, comprometendo-se
profundamente como construtor de uma práxis que o profissional se forma (FÁVERO
apud PIMENTA, 2011, p.69).
Concordamos com a autora deste texto quanto à visão dialéctica sobre a relação
entre teoria e prática, pois o nosso entendimento é que a finalidade do estágio
supervisionado e das práticas pré-profissionais é proporcionar que o estagiário tenha
uma aproximação e vivência com a realidade na qual irá actuar. Portanto, não se deve
colocar o estágio como o pólo prático do curso, mas como uma aproximação à prática
(entendida como intervenção e interacção com os profissionais), na medida em que será
conseqüente à teoria estudada no curso, que, por sua vez, deverá se constituir numa
reflexão sobre e a partir do policiamento no contexto em que decorre.
Se esse é o entendimento, o estágio curricular na ACIPOL deverá ser um
projecto integrado e integrador das áreas científicas e disciplinas do curso, sob
coordenação da ciência e tecnologia policiais, e será reflexão e análise dos problemas
levantados do cotidiano das unidades e subunidades policiais.
As diferentes disciplinas, sob coordenação das respectivas áreas científicas,
conforme a estrutura do currículo, deverão fornecer os subsídios para a compreensão
dos determinantes dessa prática, pois o objecto do trabalho policial possui uma
136
dinâmica essencialmente articulada às determinações sociais mais amplas. A reflexão
sobre a prática, sua análise e interpretação constroem a teoria que retorna à prática para
esclarecê-la e aperfeiçoá-la.
Ivani Fazenda, conceituada pesquisadora em interdisciplinaridade, sistematiza
da seguinte forma a sua visão sobre o estágio:
(...) o estágio vem sendo órfão da prática e da teoria (...): Como lida basicamente com as questões da realidade concreta, da prática, o aluno vai perceber que para explicá-la e nela intervir é necessário refletir sobre a mesma, e que essa reflexão só não será vazia se alimentar-se da teoria (...). O bom professor, o professor comprometido, tem a obrigação de saber o que indicar, o como indicar, o onde indicar, aí a importância das fontes (FAZENDA, 1994, p.20).
A lição que se tira da concepção de André & Fazenda sobre o estágio é que,
enquanto processo da compreensão da realidade, o estágio deve indicar como o aluno a
explora e a compreende, deve conduzir a observação do aluno, para que ele entenda em
cada detalhe o todo, a totalidade, o como agir que, somado ao entendimento dos outros
actores pode descortinar novos horizontes para processos policiais mais audaciosos
relativamente aos novos paradigmas do policiamento. Em nosso entender, dessa forma
vai desenvolver o discernimento de que a tecnologia policial se concretiza e se valoriza
nas práticas policiais (VENDRAMINI,2010, p.25).
2.10.6. A Prática como exercício da técnica
A construção do conhecimento se faz pela integração das informações de uma disciplina com as informações obtidas junto às demais disciplinas de modo multi ou interdisciplinar (Masetto, 2010, p.79).
Lima & Pimenta (2010, p.37) afirmam que O exercício de qualquer profissão é
técnico, no sentido de que é necessária a utilização de técnicas para executar as
operações e acções próprias. Logo, qualquer profissional necessita desenvolver
habilidades específicas para operar os instrumentos próprios de seu ofício. O polícia
também. No entanto, completam aquelas autoras, as habilidades não são suficientes
para a resolução dos problemas com os quais se defrontam, uma vez que a redução às
técnicas fica empobrecida do conhecimento científico e da complexidade das situações
do exercício dessas profissões. Nessa perspectiva, o profissional fica reduzido ao
prático: não necessita dominar os conhecimentos científicos, mas tão somente as
rotinas de intervenção técnica deles derivadas (ibidem).
137
Essa compreensão se traduz, muitas vezes, em posturas dicotômicas em que
teoria e prática são tratadas isoladamente, o que pode gerar equívocos no processo de
formação profissional.
A prática pela prática e o emprego de técnicas sem a devida reflexão podem reforçar a ilusão de que há uma prática sem teoria ou de uma teoria desvinculada da prática. Tanto é que freqüentemente os alunos afirmam que “na minha prática a teoria é outra”. Ou pode-se ver em painéis de propaganda: “A Faculdade onde a prática não é apenas teoria”(...). Nessa perspectiva, a atividade de estágio fica reduzida à hora da prática, ao “como fazer”, às técnicas a ser empregadas, ao desenvolvimento de habilidades específicas do manejo de instrumentos (LIMA &PIMENTA, 2010,p.37).
A formação policial ainda é marcada por uma forte componente de instrução e
treino para o desenvolvimento de habilidades técnicas para o atendimento necessário ao
público (preenchimento de autos diversos, fichas diversas, modelos de informação e
relatório, entre outros) por um lado, e habilidades técnicas para o desembaraço físico
necessário para intervenção em situações de reposição da ordem, detenções, manejo de
armas de fogo e outras que implicam o uso da força. É verdade que o processo
formativo é mais amplo, complexo e inclui situações específicas de treino, mas não
pode ser reduzido a este. Parece-nos que em certo nível, é possível falar em domínio de
determinadas técnicas, instrumentos e recursos para o desenvolvimento de
determinadas habilidades em situação.
Se assim é, cabe indagar: quem define as habilidades mais importantes a ser
treinadas? Seriam as habilidades treinadas generalizáveis para o trabalho policial com
qualquer agrupamento de formandos (cadetes)? Portanto, entenda-se que a habilidade
que o oficial da polícia deve desenvolver é saber lançar mão adequadamente das
técnicas conforme as diversas e diferentes situações em que o policiamento ocorre, o
que necessariamente implica a criação de novas técnicas. A formação deve considerar
sempre o facto de que as situações policiais não são iguais e nem sempre poderão ser
resolvidas com técnicas.
As reclamações sobre a qualidade do oficial graduado da ACIPOL podem-nos
induzir a conceber o estágio como o pólo da prática, por um lado e, por outro, podem
ser o indicativo de que as disciplinas que compõem o curso de formação não
estabelecem os nexos entre os conteúdos que desenvolvem e a realidade na qual o
policiamento ocorre.
Como afirma Kopnin (2001, p.135), O pensamento nasce de necessidades
práticas para satisfazer necessidades da prática; é um processo dirigido por
138
finalidades; é a prática que determina ao homem o que é necessário, e o que ele deve
conhecer para atender a estas finalidades, bem como quais são as suas prioridades no
processo de conhecer; teoria e prática funcionam como processo de mútua
retroalimentação.
Quando dizer/ouvir e demonstrar/imitar são combinados, como geralmente o são, oferece uma grande variedade de objectos e modos de reflexão possíveis que podem ser combinados para preencher os espaços inerentes em cada processo. Perguntar, responder, aconselhar, demonstrar, observar, imitar, criticar – todos estão conectados de forma que uma intervenção ou resposta possa desencadear ou construir outra. Constitui-se, assim, a corrente de acções e reflexões recíprocas que forma o diálogo entre o estudante, o instrutor e a realidade com que estão envolvidos (SCHÖN, 2000, p.95).
2.10.7. Estágio como aproximação da teoria à realidade
Lima & Pimenta (2010, p.45) corroboram com a nossa visão de que a finalidade
do estágio é propiciar ao aluno uma aproximação à realidade na qual actuará no seu
futuro profissional. Assim, o estágio se afasta da compreensão até então corrente, de
que seria a parte prática do curso. As autoras defendem uma nova postura, uma
redifinição do estágio, que deve caminhar para a reflexão a partir da realidade.
No entanto, a aproximação referida não deve ser conotada com a observação
minuciosa da realidade. Elas esclarecem que,
A aproximação à realidade só tem sentido quando tem conotação de envolvimento, de intencionalidade, pois a maioria dos estágios burocratizados, carregados de fichas de observação, é míope, o que aponta para a necessidade de um aprofundamento conceitual do estágio e das atividades que nele se realizam.
Barato (2003, p.66), valoriza sobremaneira o aprender participando e rebusca
as afirmações de Wenger sobre aprendizagem, significado e identidade como um
percurso para o desenvolvimento profissional significativo. Em outras palavras,
entende que actos de participação vão construindo o aprender nos níveis individual e
social. Nesse sentido, considera o aprender fazendo um caminho natural para
aprendizagens significativas. Porém, o mesmo autor chama a atenção parao seguinte:
O termo Prática, ou conhecimento prático, parece ser inadequado para designar saberes cujos níveis de representação, quando vistos sem desvios etnocêntricos, são muito mais abstratos do que o esperado (...). Saber fazer não é apenas uma receita que possa ser automaticamente aplicada, não é um simples exercício instrumental. Saber fazer é processo que engaja os sujeitos
139
em aventuras cognitivas muito mais abrangentes que o desempenho observável (BARATO, 2003, pp.66-67).
Esse entendimento implica que os professores orientadores de estágio
procedam, no colectivo, junto a seus pares e formandos (estagiários), a essa apropriação
da realidade para analisá-la criticamente como objecto da práxis.
No cerne desse aprofundamento Lima & Pimenta (2010, p. 45), concluem que o
estágio, ao contrário do que se propugnava, não é actividade prática, mas teórica,
instrumentalizadora da práxis profissional, entendida esta como actividade de
transformação da realidade. Nesse sentido, o estágio curricular é actividade teórica de
conhecimento, fundamentação, diálogo e intervenção na realidade, esta, sim, objecto
da práxis.
Sobre esse ponto de vista, Masetto (2010) defende que a formação profissional
deve ser realizada em ambientes profissionais, chamando a atenção para a riqueza e a
importância dessa formação e para a necessidade de rever os princípios que a regem:
(...) cabe destacar que uma situação profissional é real, complexa, conflitiva, que exige conhecimentos adquiridos ou a serem pesquisados, habilidade de os aplicar a uma situação real, integrando teoria e prática, buscando solução ou encaminhamento para um problema, convivendo numa equipe de trabalho que pode envolver profissionais de áreas diferentes trabalhando conjuntamente, demonstrando a necessidade da multi ou interdisciplinaridade (Masetto, 2010, pp.71).
2.10.8. A pesquisa no estágio
A pesquisa no estágio é uma estratégia, um método, uma possibilidade de
formação do estagiário como futuro profissional.
A pesquisa no estágio, como método de formação de futuros profissionais, se traduz, de um lado, na mobilização de pesquisas que permitam a ampliação e análise dos contextos onde os estágios se realizam; por outro lado, e em especial, se traduz na possibilidade de os estagiários desenvolverem postura e habilidade de pesquisador a partir das situações de estágio, elaborando projetos que lhes permitam ao mesmo tempo compreender e problematizar as situações que observam (LIMA & PIMENTA, 2010, p.46).
O estágio a que a citação acima se refere, pressupõe outra abordagem diante do
conhecimento, que passe a considerá-lo não mais como verdade capaz de explicar toda
e qualquer situação observada. Supõe que se busque novo conhecimento na relação
entre as explicações existentes e os dados novos que a realidade impõe e que são
percebidos na postura investigativa (ibidem).
140
As autoras explicam ainda que a incorporação da pesquisa no estágio
possibilitou o desenvolvimento da concepção do profissional reflexivo, que valoriza os
saberes da prática em contextos institucionais (Schön,1992) e capazes de produzir
conhecimento (Nóvoa, 1999), e como profissional crítico-reflexivo (Pimenta, 2003).
A expressão“profissional reflexivo foi cunhada por Donald Schön, referindo-se
aos professores. Observando a prática dos profissionais e valendo-se de seus estudos de
filosofia, principalmente sobre Dewey, Schön propõe que a formação dos profissionais
não se dê mais nos moldes de um currículo normativo que primeiro apresenta a ciência,
depois a sua aplicação e por último um estágio que supõe a aplicação pelos alunos dos
conhecimentos técnico-profissionais.
O profissional assim formado não consegue dar respostas às situações que emergem no dia a dia profissional, porque estas ultrapassam os conhecimentos elaborados pela ciência e as respostas técnicas que esta poderia oferecer ainda não estão formuladas (PIMENTA, 2010, p.48).
Valorizando a experiência e a reflexão na experiência referidas Dewey, Schön
propõe uma formação baseada numa epistemologia da prática, ou seja, na valorização
da prática profissional como momento de construção de conhecimento por meio de
reflexão, análise e problematização dessa prática e a consideração do conhecimento
tácito, presente nas soluções que os profissionais encontram em acto (ibidem).
Deste modo, encontramos em Schön uma forte valorização da prática na
formação dos profissionais, mas uma prática reflectida, que os possibilita a responder
com actuações novas às situações de incerteza e indefinição.
No tocante à formação em Ciências Policiais, Silva (2010, p.77) e Antunes
(1997, pp.41-42) sugerem como melhor opção o currículo integrado, que faz uma
articulação dinâmica entre trabalho e ensino, prática e teoria, ensino e proximidade com
a comunidade, levando em conta as características sócio-culturais do contexto em que
ocorre.
Para o efeito, a estratégia adoptada foi de envolver, de forma participativa, os
diferentes actores da ACIPOL, nomeadamente docentes, alunos e os funcionários na
análise das diferentes dimensões que compõem e caracterizam o currículo formal
vigente e o processo pedagógico. Também foram envolvidos, de forma selectiva,
profissionais da Polícia em exercício de funções nas unidades e subunidades da Polícia
da República de Moçambique. Esse procedimento, segundo Chizzotti (2010, p. 77),
consubstancia a pesquisa qualitativa como activa.
141
De acordo com Brandão & Streck (2006), essa modalidade de pesquisa
apresenta dois atributos básicos: relação de reciprocidade entre sujeito e objecto e
relação dialéctica entre teoria e prática . Isso significa que o conhecimento da realidade
só se dá no estabelecimento de uma relação entre o pesquisador, técnicos operacionais
e de formação policial, grupos de trabalho em áreas policiais, em que já não se pode
mais falar na separação produzida pela dicotomia entre sujeito e objecto da pesquisa e
entre teoria e prática.
A esse propósito Brandão (2006, p. 128) afirma que “O pesquisador e os demais
envolvidos com essa realidade passam a construir um sujeito, uma unidade em acção,
que busca desenvolver um aspecto ou aspectos da realidade, apropriando-se
criticamente desta...” Na verdade, a realidade do trabalho policial é complexa, é
distinta de uma actividade prática produtiva: a “matéria” com que o polícia lida é o
cidadão. Os aspectos a serem priorizados na formação dos oficiais só podem ser
discutidos e criticamente seleccionados em colaboração com os que estão envolvidos
no trabalho prático do dia-a-dia. O facto de o estudo ter como enfoque as práticas pré-
profissionais e o estágio supervisionado explica e justifica essa interacção.
No presente trabalho é aplicável, com a devida contextualização, o pensamento
de Lapassade, citado por Barbier (2007), ao criar a tipologia da International Council
for Adult Education (1977), descrevendo os seguintes aspectos que caracterizam a nova
abordagem da pesquisa participante:
o problema nasce na instituição que o define, analisa e assume o compromisso de o resolver; a meta da pesquisa é a transformação da realidade existente e a melhoria dos métodos de trabalho das pessoas nele envolvidas. Os beneficiários da pesquisa são, portanto, os próprios membros da instituição; o procedimento da pesquisa participativa pode suscitar nos participantes uma melhor conscientização dos seus próprios recursos e mobilizá-los de maneira a prepará-los para um desenvovimento endógeno. Trata-se de um procedimento de pesquisa que a participação da comunidade envolvida no ambiente ou objecto pesquisado facilita uma análise mais precisa e mais autêntica da realidade pesquisada. (pp. 60-62).
Os principais conceitos que este estudo discute, de acordo com o enfoque da
pesquisa, estão relacionados com a formação policial para o desenvolvimento de
competência requerida para o desempenho de funções de oficial da Polícia, articulada
pelo estágio curricular supervisionado e pelas práticas pré-profissionais.
142
Deste modo, no desenvolvimento desta pesquisa todo o conceitual teórico
referente à visão sobre o currículo, sua concepção, desenvolvimento e avaliação; as
acepções sobre o estágio curricular supervisionado e sobre as práticas pré-profissionais,
visando o equilíbrio entre os fundamentos teóricos e as habilidades práticas da
formação, são analisados, discutidos e concebidos numa perspectiva crítica.
2.10.9. Conceituando as Práticas Pré-Profissionais
Sempre que um indivíduo se encontra numa empresa, ou numa organização,
sem contrato de trabalho, com termo ou sem termo, há a tendência de considerá-lo
como estagiário, quer pelo próprio, quer pelos colegas de trabalho, ou até mesmo pela
própria organização.
No entanto, nem sempre tal é verdade. Nem todos aqueles que se encontram
numa empresa sem um vínculo laboral são estagiários ao serviço de uma organização.
Há uma figura que não é considerada num estágio. Tal figura é a Formação Prática em
Contexto Real de Trabalho, também conhecida por Práticas Pré-Profissionais.
Neste estudo, adoptamos preferencialmente o termo Práticas Pré-Profissionais
(PPP) para designar a Formação Prática em Contexto Real de Trabalho.
De acordo com Lima & Olivo (2007), Práticas Pré-Profissionais (PPP) são
caracterizadas como um conjunto de actividades de práticas, exercidas em situações
reais de trabalho, sem vínculo empregatício. Significa aprendizagem, ou seja, estudos
práticos para aprendizagem e experiência em determinado assunto ou profissão visando
o desenvolvimento profissional. Assim, as PPP, como parte integrante do currículo de
formação, consistem em trabalho obrigatório de campo, no qual as actividades práticas
são exercidas de forma orientada e gradativa, desde o início do curso até à realização
do Estágio, sinalizando o seguinte aspecto:
(...) Serem interpretadas como um ponto convergente entre a teoria e a prática, percebendo-as como um elo facilitador no ajustamento natural do estudante, no sentido de melhor receber adequação e entendimento das exigências técnico-profissionais e éticas do mercado de trabalho no qual terá de atuar (LIMA & OLIVO, 2007, P.51).
As Práticas Pré-profissionais, também designadas por Formação Prática em
Contexto Real de Trabalho, consistem na realização pelo formando, de actividades
profissionais enquadradas em itinerários de formação estruturados e sob a orientação de
um Tutor, inseridas em processos reais de trabalho junto de pessoas singulares ou
143
colectivas, que desenvolvam uma actividade de produção de bens ou prestação de
serviços.
Entende-se por Tutor/Formador em Contexto Real de Trabalho o profissional
que assegura funções pedagógicas, em relação directa, com um ou mais formandos,
jovens ou adultos, em sistemas de formação inicial ou formação de activos/contínua,
preparando, desenvolvendo e avaliando a actividade formativa realizada em contexto
real de trabalho.
As Práticas Pré-Profissionais (PPP) configuram-se, simultaneamente, como um
espaço de formação para o futuro oficial da Polícia e uma instância de pesquisa para o
processo de compreensão e intervenção na realidade, contribuindo para a formação
policial como um todo.
Práticas Pré-Profissionais (PPP) visam a aprendizagem de competências e habilidades próprias da actividade profissional e à contextualização curricular, com o objectivo de propiciar o desenvolvimento do formando para a vida cidadã e para o trabalho (ibidem).
Como estratégia de formação profissionalizante, o futuro oficial da Polícia – ao
realizar as Práticas Pré-Profissionais (PPP) em questão – poderá vivenciar experiências
que enriquecerão a aprendizagem acadêmica, produzir indagações, articular teoria e
prática e realizar analogias com o contexto de desenvolvimento do Curso de
Licenciatura (graduação) em Ciências Policiais. Assim, esse componente curricular
constitui-se no espaço privilegiado de articulação entre a formação teórica e o início da
vivência profissional supervisionada pela instituição formadora. O licenciando
(graduando) terá, portanto, a oportunidade de se defrontar com os problemas concretos
do processo ensino-aprendizagem, gestados na dinâmica própria do espaço escolar,
relacionando-os com a realidade vivenciada nos ramos policiais.
Para tanto, precisa ser planificado, executado, acompanhado e avaliado
obedecendo às directrizes relativas aos currículos, programas e calendários escolares.
Na ACIPOL pressupõe-se que as práticas pré-profissionais sejam constituídas por
módulos interdisciplinares construídos na base dos conteúdos fundamentais das
disciplinas que corporizam cada nível do curso pelos docentes desses níveis que
orientam, também, a sua realização prática.
2.10.10. Quanto ao objectivo das práticas pré-profissionais
144
O objectivo geral das Práticas Pré-Profissionais consiste em promover a imersão
do estudante nessa realidade profissional, de forma a levá-lo a identificar, de forma
gradativa, potencialidades e fragilidades do processo formativo. A acção poderá
contribuir tanto para a consolidação da formação do formando, que estará actuando
sobre uma realidade concreta e próxima, como para o espaço de formação integral, no
sentido de receber contribuições no encaminhamento de aspectos que demandam
melhoria, detectados ao longo da vivência com a realidade policial.
Como foi referido na definição, elas se realizam de forma gradativa ao longo do
curso. No término de cada fase, o formando deverá apresentar um relatório analítico,
destacando prioridades de acção nas diferentes modalidades, que afectam o processo de
formação e visando o desenvolvimento de projectos formativos.
Inspirados em Schön (2000, P.95), podemos afirmar que no caso da formação
policial as práticas pré-profissionais visam, entre outros, três objectivos fundamentais:
i. Articular conhecimentos, habilidades e atitudes (CHAs) em ambiente de
actuação policial;
ii. Proporcionar ao formando oportunidades de desenvolver suas competências,
analisar situações e relacionar a formação (o ambiente educacional) com a
realidade do trabalho policial;
iii. Estimular o desenvolvimento da criatividade, de modo a formar profissionais
inovadores, capazes de aprimorar modelos, métodos, processos e de adotar
tecnologias e metodologias alternativas para o desenvolvimento dos processos
policiais de forma crítica e reflexiva.
2.10.11. Forma de realização das Práticas Pré-Profissionais
A Prática Pré-Profissional na unidade ou subunidade policial é uma
oportunidade para que o cadete aprimore suas competências profissionais em ambiente
real de trabalho. A prática pré-profissional não se confunde com a afectação ou estágio.
Trata-se de um período de ambientação e realização de actividades profissionais pelo
cadete na unidade ou subunidade seleccionada para tal. Em decorrência do carácter
formativo da Prática Pré-Profissional, é necessário que o cadete, ao realizar suas
actividades, seja acompanhado e orientado por um oficial da unidade/subunidade,
formalmente designado para exercer a função de orientador local.
145
Saville & Cleveland (2002, p.47), apresentam 3 possibilidades básicas de
realização da Prática Pré-profissional as quais podem, mais tarde, ser combinadas de
duas formas com o Estágio Curricular: pode ser realizada de forma Concomitante,
Sequencial ou Concomitante e Sequencial em simultâneo. As formas concomitante e
sequencial também podem ser combinadas com o Estágio curricular. A tabela 9 ilustra
os tipos de prática pré-profissional e a forma de realização das actividades.
Tabela 10: Forma em que a Prática Pré-profissional poderá ser realizada
Tipo de prática pré-profissional Forma de realização das actividades
a) Prática Pré-Profissional Concomitante:
O cadete realiza a prática pré-profissional na unidade de forma simultânea ao curso desenvolvido na Academia. A ACIPOL define as principais áreas de intervenção e a partir de que data o cadete poderá desenvolver a prática pré-profissional na unidade/subunidade.
b) Prática Pré-Profissional Sequencial
O cadete realiza a prática pré-profissional na unidade/subunidade de forma sequencial ao curso desenvolvido na ACIPOL. É recomendável a prática pré-profissional na unidade/subunidade de forma sequencial, pois, o cadete, após a conclusão da fase escolar possui uma formação mais sólida. Acrescente-se ainda que, com a estruturação do currículo em tronco comum (3 anos) e orientação para a especialidade (1 ano), a unidade/subunidade permanece mais tempo com um mesmo cadete, aprofundando o conhecimento de suas habilidades, dificuldades e necessidades de apoio formativo.
c) Prática Pré-Profissional Concomitante + Sequencial
O cadete realiza a prática pré-profissional, inicialmente, de forma concomitante ao curso desenvolvido na Academia. Quando finalizada a fase escolar, o cadete desenvolve somente a prática pré-profissional de forma sequencial, dentro da unidade. Neste caso, a prática pré-profissional pode confundir-se com o Estágio Curricular.
d) Prática Pré-Profissional Concomitante + Estágio Curricular
O cadete realiza o Estágio Curricular na unidade/subunidade diferente de onde realizou a prática pré-profissional.
d) Prática Pré-Profissional Sequencial + Estágio Curricular
O cadete realiza o Estágio Curricular na unidade/subunidade onde realizou a prática pré-profissional. O que varia é o nível de autonomia e a profundidade da intervenção do formando em processos policiais.
Fonte: autor, inspirado em SAVILLE, G. & CLEVELAND (2002, p.47)-Program Training Officers
model.
2.11. Como diferenciar o Estágio das Práticas Pré-Profissionais?
Apesar de diferentes, é corrente aplicar-se o conceito de estágio para ambas as
hipóteses (estágio e práticas pré-profissionais), isto é, para uma pessoa externa à
empresa/organização e que está a aprender sistemas e métodos de trabalho. Esse
tratamento também é corrente nas áreas e ramos policiais quando recebem estudantes
(cadetes) ainda em formação policial. São todos tratados comumente por estagiários.
O Estágio Supervisionado Obrigatório constitui-se em actividade obrigatória,
com a finalidade de propiciar a complementação do ensino, desenvolver a capacidade
146
de interacção adequada com situações e ambientes específicos da realidade profissional
e competências para o exercício ético, técnico e responsável da profissão.
Ao nível da literatura a maior parte dos autores (Por exemplo, Pacheco, 2001;
Lima & Olivo, 2007; Pimenta & Lima, 2010; Pimenta, 2001), definem o estágio como
o período de iniciação prática à profissão. Neste quadro, o estágio em sector de
produção (empresa, serviços) é o meio privilegiado de encontrar e explorar as
experiências e que envolve sempre o contacto com a prática.
As actividades do Estágio Supervisionado Obrigatório são planificadas,
executadas e avaliadas em conformidade com os currículos, programas, cronograma e
procedimentos específicos das práticas oferecidas em cada curso.
Práticas Pré-Profissionais (PPP) são caracterizadas como um conjunto de
actividades práticas, exercidas em situações reais de trabalho, sem vínculo laboral.
Significam aprendizagem, ou estudos práticos para aprendizagem e experiência em
determinado assunto ou profissão visando o desenvolvimento profissional. Consistem
em trabalho obrigatório de campo, no qual as actividades práticas são exercidas de
forma orientada e gradativa.
Tabela 11: Estágio versus Práticas Pré-profissionais: Diferenças
PRÁTICAS PRÉ-PROFISSIONAIS ESTÁGIO CURRICULAR
Inserido na formação Sim Sim
Designação Tutorando Estagiário
Tutor Orientador do estágio
Vínculo laboral Contrato de formação Contrato de estágio
Estruturação Módulos faseados (gradativos) Global (enfoque no perfil de saída)
Duração Conforme a duração do programa de formação (tronco comum)
Entre 4 e 6 meses
Resultados esperados
-Capacidade de relacionar os fundamentos teóricos da formação com as actividades práticas da Polícia; -Conhecimento sobre organização e funcionamento da corporação policial; -Conhecimento da posição e função dos Ramos da Polícia; -Domínio das actividades policiais básicas.
-Domínio dos princípios da doutrina policial; -Habilidade de intervenção em processos policiais concretos; -Desenvolvimento de habilidades de relacionamento com a comunidade.
147
CAPÍTULO III
A PERCEPÇÃO DOS COMANDANTES E DOS OFICIAIS DA PRM ACERCA DA RELEVÂNCIA DA FORMAÇÃO OFERECIDA PELA
ACIPOL
Neste capítulo apresentamos as opções metodológicas que orientaram o presente
estudo, os participantes da pesquisa, bem como sua caracterização. É descrito todo o
processo de recolha, tratamento, análise e interpretação dos dados da pesquisa de
campo, considerando o cruzamento da informação das diferentes fontes e dos diferentes
instrumentos aplicados. Nota-se, neste capítulo, que a primeira parte dos dados
recolhidos é profundamente quantitativa e a segunda, mais qualitativa e descritiva. A
consideração geral do capítulo é a constatação das áreas de formação, as competências-
chave, as matérias consideradas fundamentais pelos participantes da pesquisa e a
emergência de um currículo integrado como umas das vias para articular o equilíbrio
entre os fundamentos teóricos e as habilidades práticas da formação.
O preâmbulo do currículo da ACIPOL refere que, tendo em conta a
especificidade da formação superior de oficiais da Polícia, os formandos devem ser
capazes de responder com competência às solicitações da realidade social. Desse modo,
as competências que lhes são exigidas apresentam-se a três níveis: profissional,
institucional e pessoal. Assim, sob o ponto de vista profissional o oficial da polícia
deve possuir habilidades e competências para lidar com os desafios profissionais. Em
termos pessoais habilidades, valores e atitudes, bem estar físico e emocional e
disposição para uma aprendizagem ao longo da vida.
De acordo com Azevedo e Souza (1998, p. 203) convergem para o
desenvolvimento das competências profissionais os saberes teóricos, práticos e
instrumentais relacionados aos saberes situacionais, ou seja, das situações encontradas
na prática profissional.
Na realidade, os saberes práticos, originados das experiências cotidianas da
profissão, são adquiridos e reconstruídos em situações de trabalho sendo através desses
saberes que os profissionais são avaliados pelos seus pares e pelos seus superiores. Le
Le Boterf (2003, p.53) explica que entre os saberes práticos distinguem-se: os saberes
sobre a prática (saberes procedimentais e sobre o como fazer); os saberes da prática
148
(produto das acções que tiveram êxito) e o saber quando e onde os saberes podem ser
aplicados.
Neste capítulo o estudo apresenta e analisa os dados colhidos no campo sobre a
percepção de comandantes e de oficiais da PRM acerca da qualidade da formação
superior de oficiais desenvolvida pela ACIPOL.
3.1. Opções metodológicas
Conforme foi anunciado no capítulo introdutório, o objectivo desta pesquisa é
estudar o currículo e a metodologia de formação na ACIPOL e pesquisar um grupo de
oficiais da polícia (de diversas categorias e funções, incluíndo graduados da ACIPOL),
levantando suas opiniões sobre aspectos fundamentais de formação superior de oficiais
da polícia, que afectem principalmente a sua formação prática, de modo a fundamentar
propostas inovadoras de formação equilibrada entre os fundamentos teóricos e as
habilidades práticas para os oficiais, articulados a partir das práticas pré-profissionais e
do estágio curricular supervisionado, capacitando os formandos ao cumprimento
adequado das exigências gerais e específicas do trabalho da polícia no contexto de
Moçambique.
Para compreender os processos que envolvem a realização do estágio e a
implementação do programa curricular do curso de licenciatura (graduação) em
Ciências Policiais ministrado pela ACIPOL de Moçambique, recorremos ao método
qualitativa de pesquisa, envolvendo o compartilhamento de acções com os participantes
da pesquisa, factos e percepções de oficiais da polícia em exercício de funções em
locais e níveis de responsabilidade propositadamente seleccionados como parte
integrante da pesquisa, para daí extrair e interpretar os significados dos dados
recolhidos.
O percurso metodológico foi constituído de 03 (três) etapas, que definimos
como ciclo da pesquisa, que se articulam e se complementam.
A primeira etapa refere-se à pesquisa documental, que se destinou ao
levantamento, recolha, organização e análise dos documentos relacionados com o curso
e o currículo em estudo57. Esta etapa serviu também para conhecermos o estado da arte
57 Resultou em um relatório parcial que deu subsídios para a produção de dois artigos científicos que
foram apresentados em eventos científicos, nomeadamente no X encontro de Pesquisadores da PUC-SP e
149
do assunto em pesquisa. A tabela 11 ilustra os principais documentos que foram
analisados.
Tabela 12: Principais documentos institucionais analisados
N/O TIPO DE DOCUMENTO INSTITUIÇÃO RELAÇÃO C/PESQUISA
01 Plano Estratégico da ACIPOL ACIPOL Fonte do problema de pesquisa
02 Lei do Ensino Superior ACIPOL Enquadramento legal da
formação dada pela ACIPOL
03 Regulamentos Internos (lote) ACIPOL Missão, funcionamento, cultura
04 Revisão Curricular: relatório de
consultoria ACIPOL
Problemas detectados e nova
visão sobre o currículo.
05 Plano Estratégico da PRM Comando Geral da
PRM
Pilares estratégicos da formação
policial
06 Legislação sobre orgânica e
Estatutos da PRM (lote)
Comando Geral e
ACIPOL
Enquadramento sobre a missão
e carreiras da PRM
A segunda etapa consistiu na realização do trabalho de campo em cinco cidades
moçambicanas, nomeadamente Nampula no norte do país, Beira no centro, Xai-xai,
Maputo e Matola no sul, e na ACIPOL, o que combinou técnicas diversificadas, tais
como: inquéritos por questionário, entrevistas, grupos focais e memoriais reflexivos.
Esta etapa foi substancialmente fundamental na medida em que nos devia permitir uma
compreensão global dos fenômenos da pesquisa, através do contacto directo com os
participantes da pesquisa.
Essa compreensão só poderia ser alcançada com uma conduta participante que
partilhasse das práticas, das percepções e das experiências dos participantes da
pesquisa, procurando compreender a significação e importância social e técnico-
profissional por eles atribuída à relação entre a teoria e a prática na função dos oficiais
da polícia, com implicação na sua formação, e captar suas sugestões sobre as
estratégias de acção para a solução do problema que a pesquisa coloca. Conforme
sustenta Chizzotti, o conhecimento é uma obra colectiva e que todos os envolvidos na
na Conferência Internacional da ACIPOL sobre “Desafios da Formação Policial no Contexto da
Governação Democrática”.
150
pesquisa podem identificar criticamente seus problemas e suas necessidades, encontrar
alternativas e propor estratégias adequadas de acção (CHIZZOTTI, 2010, p. 82).
A terceira e última etapa configurou-se entre o cruzamento das análises dos
documentos, da bibliografia e os dados levantados, a partir dos instrumentos de colecta
de dados, nomeadamente os inquéritos por questionário aplicados aos comandantes
distritais, das esquadras e/ou chefes das operações dos mesmos níveis de distrito e
esquadras; as entrevistas dirigidas aos directores de Ordem e Segurança e aos directores
de Pessoal e Formação das províncias de Nampula, Sofala, Gaza e Maputo-cidade. Na
ACIPOL, para além das entrevistas feitas ao Director Pedagógico (director acadêmico)
e ao chefe do Departamento de Ensino e Aprendizagem, foi realizado um grupo focal
constituído por docentes, investigadores, cadetes do 4º ano (finalistas) e graduados da
ACIPOL.
Outro grupo focal foi realizado no Comando da PRM da cidade de Maputo,
integrando comandantes das esquadras e chefes das operações, inspectores da Polícia
de Investigação Criminal (PIC) da cidade de Maputo, oficiais da Polícia de Trânsito
(PT) e oficiais do Comando das Forças Especiais e de Reserva (FER), para além dos
directores da Ordem Pública, da PIC e de Pessoal, todos do Comando da PRM-Cidade
de Maputo. Para a organização e análise desses dados foram utilizados distintos
recursos tecnológicos que privilegiaram a análise qualitativa. Recorremos à técnica de
análise de discurso para interpretar as respostas obtidas nas discussões dos grupos
focais e nas entrevistas realizadas, relativamente às concepções dos participantes e suas
sugestões sobre a relação entre a teoria a prática na formação de oficiais da polícia.
Para análise das informações, foram agrupadas as questões e as respostas de
acordo com a ordem em que foram dispostas nos inquéritos. Foram elaborados quadros
que propiciaram a visualização e diferenciação das respostas permitindo a interpretação
e cruzamento das mesmas.
Relativamente às entrevistas e grupos focais recorremos às técnicas de análise
de conteúdo e de categorias (BARDIN, 2011, PP. 65 e 201).
3.2. Caracterização dos participantes da pesquisa
De forma deliberada recorreu-se à técnica de amostragem propositada (não
probabilística), também chamada intencional por Marconi & Lakatos (1999, p.207),
151
escolhendo os comandantes das esquadras58, chefes das operações, inspectores e
subinspectores com funções de direcção e chefia, nas esquadras e noutras áreas
operativas da Polícia moçambicana, exceptuamdo nas Forças Especiais e de Reserva
(FER), nomeadamente na Polícia de Trânsito, na Polícia de Investigação Criminal, na
Polícia de Transportes e Comunicações, por considerar-se que eram capazes de
fornecer informações importantes e que interessassem aos propósitos deste estudo. A
participação na pesquisa foi voluntária.
De acordo com Marconi & Lakatos (1999, pp.43-44), o universo ou população
de uma pesquisa depende do assunto a ser investigado. “A amostra que realmente será
submetida à verificação, é obtida ou determinada por uma técnica específica de
amostragem”. Grande parte dos pesquisadores e das teorias de pesquisa em ciências
sociais sustenta que há duas grandes divisões em processos de amostragem: a
probabilística e a não probabilística. A característica principal das técnicas de
amostragem não probabilística é a de que, não fazendo uso de formas aleatórias de
selecção, não poderão ser objectos de certos tipos de tratamento estatístico e, por essa
razão, os resultados obtidos não podem ser generalizados a toda a população. Estão
sujeitos, por exemplo, entre outros, a erros de amostra (na perspectiva probabilística).
Neste estudo foi aplicada a forma de amostragem não probabilística. Esse
procedimento dependeu das características dos participantes da pesquisa, e tinha em
vista permitir que fossem explorados, com certa profundidade, as percepções e opiniões
dos participantes sobre os problemas relacionados com o défice da ligação entre a parte
teórica da formação e o contexto real de trabalho dos oficiais da Polícia, e permitir que
os dados recolhidos com recurso a diferentes técnicas fossem cruzados e generalizados.
O quadro que se segue apresenta os dados identificativos dos participantes da pesquisa.
58 Esquadra, é designação que no português padrão de Moçambique se dá à uma Delegacia de polícia.
152
Tabela 13: Dados gerais sobre a origem e número dos participantes da pesquisa
N/O Participantes Maputo
Cidade
Maputo
Província ACIPOL Gaza Sofala Nampula Tot.
01 Comando Geral da
PRM 02 02 04
02 Comandantes de
Esquadras 18 01 --- 10 10 10 49
03 Directores da
Ordem Pública 01 01 --- 01 01 01 05
04 Directores de
Pessoal e Formação 01 01 --- 01 01 01 05
05 Egressos da
ACIPOL 09 --- 03 05 05 05 27
06 Docentes da
ACIPOL --- --- 14 --- --- --- 14
07 Cadetes do 4º ano --- --- 30 --- --- --- 30
Tot. 31 03 49 17 17 17 134
Legenda:
*CGPRM: Comando Geral da PRM
*Cdtes: Comandantes
Este procedimento de amostragem é também defendido por Quivy &
Campenhoudt (1998, pp.160-163), que apresentam três possibilidades de procedimento
na amostragem, nomeadamente: estudar a totalidade da população, estudar uma
amostra representativa da população e estudar componentes não probabilisticamente
representativas, mas representativas da população.
No caso deste trabalho estudou-se componentes não probabilisticamente
representativas. Os participantes seleccionados são devidamente conhecidos e
conhecedores da matéria do objecto de estudo. Não se trata de conhecimento
individual de cada participante, mas sim das funções de cada um deles e do seu
envolvimento no contexto em que se observa o problema de pesquisa considerado. Foi
atendendo às características deste grupo (heterogéneo) e à profundidade da informação
necessária que se operacionalizou as técnicas de recolha de dados utilizadas,
nomeadamente grupos focais, entrevistas e inquéritos por questionário.
153
3.3. Técnicas de recolha de dados
Para a recolha de dados recorreu-se às técnicas de investigação qualitativa,
nomeadamente o grupo focal, a entrevista, e o inquérito por questionário. A pesquisa
bibliográfica (Pedron, 2001, pp.132-133) foi usada para fundamentar teoricamente cada
técnica de recolha de dados, sua importância, usos e seus procedimentos. Este método
foi desenvolvido a partir de material já elaborado e consistiu na leitura de diversas
obras, relatórios da Polícia da República de Moçambique (PRM), revistas, artigos
científicos e documentos extraídos da Internet.
A utilização destes diferentes instrumentos visou a obtenção de dados de
diferentes tipos, a qual proporcionou a possibilidade de cruzamento de informações
obtidas de diferentes fontes. Por exemplo, os relatórios da PRM que não estão
directamente ligados à formação, informam sobre as actividades mais frequentes nos
processos policiais, o grau de dificuldade com que se realizam, os sucessos que se
conseguem obter e sobre o desempenho dos efectivos neles envolvidos. Essa
informação foi cruzada com as respostas das entrevistas aos comandantes distritais e de
esquadras sobre as actividades que realizam com frequência, as que lhes ocupam mais
tempo e as que realizam com dificuldades. Foi ainda cruzada com as respostas dos
graduados da ACIPOL sobre as actividades que realizaram durante o seu estágio e as
matérias que julgam que devam ser aprendidas durante a formação.
3.3.1. Entrevistas
A técnica de entrevista foi usada com os seguintes propósitos: explorar o
entendimento, as expectativas, as inquietações e as opiniões dos dirigentes da Polícia
dos níveis central, provincial e de distrito sobre o curso de Licenciatura em Ciências
Policiais que a ACIPOL ministra, bem como sobre o perfil e desempenho dos egressos
da ACIPOL; explorar o entendimento, inquietações e expectativas dos dirigentes da
ACIPOL e dos docentes, sobre o currículo em desenvolvimento na ACIPOL, sobre o
processo pedagógico, sobre o modelo de estágio em curso e sobre a qualidade (técnico-
profissional) dos graduados ; para explorar a opinião e o sentimento dos cadetes sobre o
currículo do curso, as actividades de formação, sobre o estágio e sobre a sua própria
inserção no curso; para explorar as opiniões dos graduados sobre o currículo do curso,
154
sobre o estágio, sobre o ligação entre a formação recebida e as exigências do trabalho
na prática.
Também foi usada a técnica de entrevista para complementar as informações
colhidas através do inquérito por questionário sobre as principais actividades
quotidianas desenvolvidas pelos oficiais da PRM do nível dos graduados da ACIPOL,
isto é, os comandantes das esquadras e chefes das operações das esquadras; a
complexidade da sua execução, o tempo dispendido na sua execução e sobre outras
actividades não prescritas nos termos de referência dos cargos que ocupam, mas que
constituem demandas que devem atender no seu dia-a-dia profissional.
Os objectivos visados pela técnica de entrevista justificam, neste trabalho, o
facto de ter sido aplicada com enfoque aos dirigentes dos níveis central, provincial e
distrital/esquadra por serem os níveis em que havia interesse em explorar a expectativa
sobre os graduados da ACIPOL, bem como as actividades desenvolvidas pelos oficiais
subalternos.
Sobre esta técnica, Quivy & Campenhoudt (1998, p.69) argumentam que as
entrevistas têm, como função principal, revelar determinados aspectos do fenómeno
estudado que o investigador não teria por outras vias conseguido recolher e, assim,
completar as pistas de trabalho sugeridas pelas suas leituras. Por sua vez, Marconi &
Lakatos (1999, pp.94-96), citando Goode e Hatt, consideram que a entrevista consiste
no desenvolvimento de precisão, focalização, fidedignidade de um acto social,
realizando-se face a face, de maneira metódica, proporcionando ao entrevistado,
verbalmente, a informação necessária para se orientar aos objectivos do entrevistador.
Na tipificação das entrevistas apresentam-se três tipos básicos, nomeadamente a
entrevista padronizada ou estruturada, a entrevista despadronizada ou não estruturada e
o painel. Neste trabalho, a modalidade de entrevista predominante foi a semi-
estruturada, porque consideramos que este tipo de entrevista permitiria aos
entrevistados expressar as suas próprias compreensões nos seus próprios termos, o que
facilitaria o entendimento das suas percepções e experiências pessoais por parte do
entrevistador.
Os procedimentos usados foram os descritos por SZYMANSKI (2010, p.18),
entre os quais: os contactos iniciais aos entrevistados (algumas vezes mais do que um
contacto); a informação que pretendia obter; um roteiro aberto, mas com objectivos
claros. A tabela que segue apresenta a estatísta das fichas de entrevistas aplicadas
155
Tabela 14: Fichas de entrevistas aplicadas
Código Conteúdo da Ficha Participantes Quantidade Questões
Ficha 1 Roteiro de entrevista do nível central Níveis Central e ACIPOL 04 14
Ficha 2 Roteiro de entrevista do nível provincial Níveis Provincial e Distrital 10 15
S/N Entrevista Inspectores da PIC 02 05
S/N Entrevista Oficiais da PT 02 05
S/N Entrevista Docentes ACIPOL 03 07
Foram realizadas 21 entrevistas com inspectores e sub-inspectores que
trabalham nas esquadras, na polícia de investigação criminal e na polícia de trânsito na
cidade de Maputo. Cada função de um inspector ou sub-inspector dentro destas
unidades foi abrangida, pelo menos por uma entrevista (tabela 14). O roteiro da
entrevista aplicada consta do anexo 3.
Tabela 15: Entrevistados por ramo policial e por função
Ramo policial Função Entrevistas
Esquadra da PRM Chefe das operações Oficial de permanência Comandante de pelotão
06
Trânsito
Chefe das operações Chefe de secção Comandante de pelotão
08
PIC Chefe de secção de instrução Chefe de brigada Chefe do Departamento de Informação Operativa (DIO)
06 Colectiva Comandantes das esquadras 01 Total 21
Aos comandantes das esquadras, para além do inquérito por questionário, foi
aplicada uma entrevista colectiva, na qual foram interrogados sobre as mesmas
questões constantes do anexo 1 deste trabalho. A entrevista colectiva consistiu em
juntar os respondentes na mesma sala, o pesquisador fazer as perguntas e discutir-se as
respostas até atingir-se a resposta consensual. Este procedimento teve como razões o
número relativamente elevado dos comandantes de esquadra e chefes das operações
abrangidos (34), e a necessidade de aprofundamento da informação recolhida através
do questionário. O objectivo final foi o cruzamento das informações recolhidas.
156
3.3.2. Inquérito por questionário
O processo de elaboração do questionário aplicado foi o proposto por Marconi
& Lakatos (1999, pp.101-116), segundo o qual deve-se elaborar um formulário de
perguntas, elaborar o questionário, agrupar as perguntas e classificá-las, fazer o pré-
teste, avaliar e reajustar o questionário e expedi-lo para os inquirir. Sobre o inquérito e
sua administração, Quivy & Campenhoudt (1998, pp.188-189) apresentam uma série de
7 procedimentos. O procedimento no presente estudo foi o referente à variante de
administração directa, que consistiu em os próprios inquiridos preencherem o
questionário. Esta variante foi aplicada a todos os inquiriridos.
Um grupo de 54 oficiais entre comandantes de esquadras, chefes das operações,
chefes de brigadas da Polícia de Investigação Criminal (PIC) e subinspectores afectos
na Polícia de Trânsito das províncias de Nampula, Sofala e Cidade de Maputo, foi
aplicado um inquérito específico constituído por duas fichas, elaboradas e analisadas
usando um método quantitativo.
Tabela 16: Participantes do inquérito específico por província e função
O objectivo consistia em aprofundar os dados sobre as actividades que os
oficiais daquele nível realizam nas esquadras, grau de dificudade e frequência dessa
actividades. Essas informações constituem um indicativo do que poderá concorrer para
a adaptação curricular em termos de “actividades de formação” e permitiram analisar
em que aspectos a formação teórico-prática deverá incidir.
Para além do que foi referido, foram elaborados quatro questionários, conforme
os participantes a quem se destinavam. A tabela que se segue faz a demonstração da
distribuição das fichas de inquérito aplicadas.
Província Função Participantes
Província de Nampula Comandantes das esquadras Chefe das operações
13
Maputo Cidade
Comandante das esquadras Chefe das operações Trânsito PIC
31
Província de Sofala Comandante das esquadras Chefe das operações
10
Total 54
157
Tabela 17: Fichas de inquérito por questionário aplicadas
Código Conteúdo da Ficha Participantes Quantidade Administração Nº questões
Ficha 3 Questionário
Actividades realizadas
por um cadete estagiário
na Esquadra da PRM
30 directa 06
Ficha 4 Questionário
comandantes de
Esquadra / chefes de
operações
31 Directa /Indirecta 14
Ficha 5 Questionário Egressos da ACIPOL 15 Directa 13
G/F-1,2
Guião de debate do
grupo focal
(entrevista)
Níveis: provincial,
distrital, esquadra,
especialidades, docentes
e egressos
GF1 = 15
GF2 = 22 --- 07
GF1 = Grupo Focal 1 GF2 = Grupo Focal 2
No caso do grupo específico de 54 oficiais acima referidos, foram elaborados
dois questionários, um sobre as actividades realizadas por um comandante de esquadra,
denominada Ficha 1 (vide anexo 1). Nesta ficha foi organizada uma lista de 7 temas. Os
temas são identificados por letras maiúsculas do alfabeto de A a G. Os temas
subdividem-.se em 4 a 5 perguntas fechadas. As respostas focalizam o tempo
despendido na execução das tarefas do comandante da esquadra. Por isso, a grelha de
respostas possíveis é apresentada na escala de Likert, indicando a amplitude do tempo
despendido.
No segundo questionário, designado Ficha 2 (anexo 2), também sobre as
actividades realizadas por um comandante da esquadra, pretende-se determinar o tipo
de dificuldade de execução e frequência de tarefas que são solicitadas diariamente a um
comandante da esquadra. Nesta ficha foi organizada uma lista de 7 temas, com 5 a 18
perguntas fechadas e uma aberta em cada tema. Cada resposta focaliza dois aspectos,
nomeadamente a dificuldade de execução da tarefa e a frequência da tarefa. Por isso, a
grelha de respostas tem duas colunas paralelas com números de 1 a 3, indicando as
opções de resposta.
Tabela 18: Distribuição das questões de inquérito por ficha e categorias
FICHA CATEGORIAS / Nº DE QUESTÕES TOTAL A B C D E F G
01 07 05 02 05 07 03 01 30 02 09 05 20 18 01 0 0 53
83
158
A administração do inquérito foi directa e presencial, isto é, os inquiridos
preencheram pessoalmente as fichas do inquérito na presença do pesquisador, que no
fim recolheu todas as fichas preenchidas. Na cidade da Beira foi utilizado o mesmo
procedimento por um inquiridor mandatado. Um aspecto a sublinhar relacionado com a
aplicação directa dos instrumentos de pesquisa é o facto de o procedimento ter
permitido que os inquiridos fizessem perguntas de esclarecimento que não tinham sido
levantadas na fase do pré-teste do instrumento. O pré-teste foi aplicado na Academia de
Ciências Policiais (ACIPOL), administrado a estudantes do primeiro ano, que já
desempenharam funções de comandantes ou chefes das operações das esquadras.
3.3.3. Processo de apresentação dos dados recolhidos
Tendo em consideração a extensão e a complexidade do estudo, são
apresentados os dados que correspondem aos objectivos do estudo. Por ser difícil
estabelecer comparações entre os dados não classificados, uma vez que constituem uma
soma muito grande de informações, recorreu-se aos seguintes procedimentos: Primeiro,
foi feita uma leitura de todos os dados recolhidos através de notas, entrevistas,
inquéritos e leituras. O passo seguinte consistiu no desenvolvimento de uma lista
preliminar de categorias de codificação. As unidades de dados foram constituídas por
parágrafos das notas de campo e das transcrições das entrevistas. Depois, foram dadas
códigos em ordem alfabética. Em seguida desenvolveu-se um sistema de codificação
com um número limitado de códigos (7 códigos), conforme ilustra a Tabela 18, só
englobando os dados relacionados com os códigos referidos.
Tabela 19: Conteúdo das categorias codificadas
Categorias Categorias / Conteúdos
Ficha 1 Ficha 2 A Organização da Esquadra Tarefas Judiciais
B Gestão de recursos humanos Tarefas administrativas
C Gestão do tempo de um comandante de Esquadra
Tarefas operacionais
D Actividades de planeamento e concepção Gestão de recursos humanos e materiais
E Relações privadas ou institucionais Actividades de ligação Polícia-comunidade
F Competências operacionais
G Outras actividades não especificadas
159
A apresentação dos dados é feita seguindo um sistema de categorias cujo
conteúdo emerge dos objectivos prosseguidos que constituiu uma forma de organizar a
informação obtida acerca das actividades mais complexas e mais frequentes de um
comandante de esquadra (subunidade policial) e de inspectores e sub-inspectores da
Polícia com funções de comando, direcção e chefia em unidades e subunidades da
polícia.
Em seguida, recorreu-se a procedimentos estatísticos como técnica auxiliar para
redução de dados, tendo sido usadas as medidas de posição, medidas de dispersão e
comparação de frequências, que correspondem à estatística descritiva. Procedeu-se à
análise do conteúdo das categorias codificadas, sendo o tratamento gráfico efectuado na
Microsoft Excel.
De salientar que na apresentação dos dados estatísticos não se reputou
necessário incluir o Desvio Padrão (DP) devido à quantidade reduzida de dados
considerados para provável generalização dos resultados
3.3.4. Critério de selecção das tarefas a desenvolver nas Práticas Pré-Profissionais
e Estágio curricular supervisionado
Os resultados da pesquisa podem indiciar a selecção de tarefas e actividades que
respondam às necessidades dos formandos na fase de Práticas Pré-Profissionais e de
Estágio Curricular. Com base em critérios definidos, o pesquisador adoptou uma escala
que permitisse seleccionar as tarefas e actividades de acordo com os critérios do
CODE59, um modelo para identificação de excessos de treinamento e deficiências,
desenvolvido por Tessmer, McCann & Ludvigsen (1999), que integra os seguintes
aspectos: criticidade, oportunidade, dificuldade e ênfase:
• Alta: 70% – 100%
• Média: 49% - 69%
• Baixa: 1% - 48%
59 CODE – Código/Modelo de identificação de excessos e deficiências de necessidades de treinamento:
Reavaliação de Programas de Treinamento, desenvolvido por McCann & Ludvigsen (1999). Disponível em http://www.citeulike.org/user/mcleavitt/article/1586922, acesso em 02/06/2013.
160
A escala acima apresentada é aplicada de acordo com o seguinte quadro de
implicações.
Tabela 20: Implicações das frequências das respostas Criticidade Oportunidade Dificuldade Frequência ou Ênfase Implicação Alta pouca muita muita Muito treino Média muita pouca Alta ou baixa Treino normal Baixa muita pouca muita Excesso de treino
Criticidade: Tarefa básica da função policial, ou com frequência tendente ao equilíbrio
dos dados
Oportunidade: Possibilidade de aprender/exercitar no local de trabalho
Dificuldade: Complexidade ou falta de habilidades para a execução
Frequência ou Ênfase: Amplitude de ocorrência
Implicação: Necessidade ou não de formação ou treino
Note-se que também foi usada a sigla ‘dd’ (dispersão de dados), para indicar os
casos em que os resultados tendem para uma distribuição equilibrada de dados. As
tarefas ‘dd’ são consideradas críticas, pois se distribuem um pouco por todos os
aspectos e níveis de análise considerados, significando que não há um domínio
enfocado.
Os critérios acima definidos permitem a selecção de tarefas e das actividades de
aprendizagem durante as Prática Pré-Profissionais e Estágio Curricular. As tarefas
seleccionadas foram discutidas com os oficias subalternos da Polícia em exercício de
funções, por aérea de especialidade policial, correspondentes, para os efeitos de
formação, às 4 áreas curriculares em que se baseiam as Práticas Pré-Profissionais e o
Estágio Curricular, nomeadamente Ciências e Tecnologia Policiais, Ciências Jurídicas,
Ciências Sociais e Humanidades e Ciências Exactas e de Gestão. O resultado da
discussão com os participantes da pesquisa foi cruzado com os dados das entrevistas e
dos grupos focais, e determinou-se as actividades da aprendizagem constantes do
Mapeamento das actividades do Estágio Curricular e das Práticas Pré-Profissionais.
3.4. Apresentação e interpretação dos dados
O processo de apresentação e interpretação de dados envolveu diversos
procedimentos, nomeadamente o agrupamento de dados, a codificação das respostas,
tabulação dos dados e cálculos estatísticos. Como já foi referido no início deste
161
capítulo, as questões foram apresentadas em códigos A, B, C, D, E, F, que constituem
classes ou categorias de pesquisa. As categorias de pesquisa representam tarefas. As
tarefas, por sua vez, subdividem-se em actividades. Assim, as tarefas possuem um
número diferente de actividades, de acordo com a sua complexidade.
Não existindo directrizes curriculares para a formação de oficiais da PRM, a
indicação das tarefas de aprendizagem e respectivas actividades teve como base as
atribuições estatutárias da PRM e o levantamento das tarefas e actividades que os
oficiais subalternos da PRM com funções de comando, direcçao e chefia realizam no
dia-a-dia em diferentes áreas de função policial nas unidades e subunidades, recolhidos
através das fichas 1 e 2 a quais já referimos.
Ss dados recolhidos foram dispostos em tabelas de frequência para possibilitar
uma melhor verificação das inter-relações entre eles, através do processo técnico de
análise estatístico-descritiva, que permitiu sistematizar os dados recolhidos. Assim, as
tabelas que se seguem ilustram a distribuição geral das respostas dos participantes da
pesquisa, por grupo de dados e por ficha, conforme o agrupamento anteriormente
referido. Estes dados resultam dos dados parciais por província e por ficha aplicada.
Em primeiro lugar, apresentam-se as tabelas de frequência de respostas relativas
ao tempo despendido na realização das tarefas que por qualificação são solicitadas
diariamente a um comandante de esquadra ou subunidade policial.
3.4.1. Dados colectados através da ficha 1: tempo despendido por um comandante
da esquadra
Tabela 21: Frequência de respostas da Ficha 1: Província de Nampula
Grupos/Produto A % B % C % D % E % F %
Nenhum 6 7, 2 7 11,8 2 8,3 5 8,4 12 18,1 7 20,0
Algum 37 44,5 14 23,7 11 45,8 16 27,1 21 31,8 8 22,8
Pouco 25 30,1 26 44,0 7 29,1 17 28,8 24 36,3 8 22,8
Muito 15 18,0 12 20,3 4 16,6 21 35,5 9 13,6 12 34,2
∑ 83 99.8 59 99.8 24 99.8 59 99.8 66 99,8 35 99,8
Fazendo a leitura da tabela 21 constata-se que na Província de Nampula as
respostas mostram a tendência de que despende-se entre algum (44,5%) e pouco
162
(30,1%) tempo na tarefa A (organização da esquadra). Nota-se que só uma pequena
percentagem (18,0%) dedica muito tempo nessa tarefa.
No que concerne à tarefa B (gestão de recursos humanos/logísticos), a
tendência da maioria dos participantes é de dedicar pouco tempo (44,0%), havendo
certa aproximação ao equilíbrio entre os que dedicam algum (23,7%) e muito (20,3%)
tempo.
Na tarefa C (gestão do tempo de um comandante de esquadra), as respostas
indicam que a maioria dedica entre algum (45,8%) e pouco (29,1%) tempo. Situação
particular se verifica na tarefa D (actividades de planeamento e concepção), em que se
verifica uma dispersão, relativamente equilibrada, entre muito tempo (35,5%), pouco
tempo (28,8%) e algum tempo (27,1%).
A tarefa E (relações privadas ou institucionais), em geral mostra certa tendência
a equilíbrio entre pouco (36,3%) e algum (31,8%) tempo. Situação de dispersão
relativamente equilibrada, verifica-se com relação à tarefa F (competências
operacionais), em que 34,2% das respostas indicam, muito tempo, (22,8%) algum e
(22,8%) pouco tempo. Portanto, um equilíbrio nesta tarefa entre algum e pouco tempo.
Tabela 22: Frequência de respostas da Ficha 1: Cidade de Maputo
Grupos/Produto A % B % C % D % E % F %
Nenhum 2 2,6 4 7,2 2 9,0 3 5,7 9 13,6 1 2,2
Algum 33 44,0 23 41,8 11 50,0 16 30,7 30 45,4 15 33,3
Pouco 26 34,6 14 25,4 4 18,1 19 36,5 15 22,7 13 28,8
Muito 14 18,6 14 25,4 5 22,7 14 26,9 12 18,1 16 35,5
∑ 75 99.2 55 99.8 22 99.8 52 99.8 66 99,8 45 99,8
A tabela de frequência de respostas da Cidade de Maputo indica a seguinte
situação:
Tarefa A (organização da esquadra), a tendência oscila entre algum (44,0%) e
pouco (34,6%) tempo despendido nessa tarefa; Quanto à Tarefa B (gestão de recursos
humanos), verifica-se o predomínio de algum tempo (50,0%) e um equilíbrio entre
muito (25,4%) e pouco (25,4%) tempo despendido; Na tarefa C (gestão de tempo de
um comandante de esquadra), a metade das respostas (50,0%) indica que os
comandantes dispendem algum tempo; Na tarefa D (actividades de planeamento e
concepção) verifica-se uma distribuição relativamente equilibrada entre pouco (36,5%),
163
Algum (30,7%) e muito (26,9%) tempo; Na tarefa E (relações privadas ou
institucionais), a predominância das respostas é de algum tempo (45,5%). No
concernente à tarefa F (competências operacionais), verifica-se uma dispersão, tendente
ao relativo equilíbrio, entre muito (35,5%), algum (33,3%) e pouco (28,8%) tempo
dispendido pelos comandantes nessa tarefa.
Tabela 23: Frequência de respostas da Ficha 1- Província de Sofala
Grupos/Produto A % B % C % D % E % F %
Nenhum 7 11,2 5 11,1 4 25,0 7 15,9 8 15,6 6 17,1
Algum 20 32,2 12 26,6 7 43,7 15 34,0 25 49,0 14 40,0
Pouco 20 32,2 14 31,1 4 25,0 11 25,0 13 25,4 7 20,0
Muito 15 24,1 14 31,1 1 6,2 11 25,0 5 9,8 8 22,8
∑ 62 99.7 45 99.9 16 99.9 44 99.9 51 99,8 35 99,9
Na província de Sofala, Cidade da Beira, a tabela de frequência de respostas
mostra a seguinte situação:
Tarefa A (organização da esquadra), uma distribuição equilibrada de respostas
entre algum (32,2%) e pouco (32,2%) tempo dedicado, com uma ligeira tendência para
muito tempo (24,1%);
Tarefa B (gestão de recursos disponíveis), distribuição equilibrada de respostas
entre pouco (31,1%) e muito (31,1%) tempo, com uma ligeira tendência para algum
tempo (26,6%); Tarefa C (gestão do tempo de um comandante de esquadra), há
predominância de algum tempo (43,7%) e um equilíbrio de 25% entre nenhum e pouco
tempo, respectivamente;
Tarefa D (actividades de planeamento e concepção), ligeira predominância de
algum tempo (34,0%) e distribuição equilibrada entre muito (25,0%) e pouco (25,0%)
tempo, respectivamente;
Tarefa E (relações privadas ou institucionais), predominância de algum tempo
(49,0%) e ligeira tendência para pouco tempo (25,4%);
Tarefa F (competências operacionais), predominância de algum tempo (40,0%),
distribuição relativamente equilibrada das percentagens de respostas entre muito
(22,8%) e pouco (20,0%) tempo, respectivamente.
164
Em seguida faz-se a apresentação e análise do quadro geral de frequência de
respostas da Ficha 1, resultante do somatório das frequências parciais de respostas das
províncias de Sofala, Nampula e Maputo-cidade (Tabela 23).
Tabela 24: Frequência de respostas da Ficha 1 (Somatório geral: Províncias de Sofala, Nampula e Maputo-cidade)
Grupos/Produto A % B % C % D % E % F %
Nenhum 15 6,8 16 8,75 8 12,9 15 9,6 29 15,8 14 12,1
Algum 90 40,9 49 30,6 29 46,7 47 30,3 76 41,5 37 32,1
Pouco 71 32,2 54 34,4 15 24,1 47 30,3 52 28,4 28 24,3
Muito 44 20,0 40 26,2 10 16,1 46 29,6 26 14,2 36 31,3
∑ 220 99.9 159 99.9 62 99.8 155 99,8 183 99,9 115 99,8
Da leitura da tabela acima, depreende-se que, de uma forma geral, as tarefas B
e D mostram uma distribuição relativamente equilibrada entre algum e pouco tempo,
com tendência pouco variada para muito tempo na tarefa D:
- B (34,4% pouco tempo; 30,6% algum tempo) – Tendência para muito tempo (26,6%);
- D (30,3% algum tempo; 30,3% pouco tempo) – Tendência para muito tempo (29,7%).
A tarefa F, mostra uma distribuição relativamente equilibrada entre algum e
muito tempo, com tendência para pouco tempo:
- F (32,1% algum tempo; 31,3% muito tempo) – Tendência para pouco tempo (24,3%).
As tarefas C e E, apresentam uma predominância de frequência de respostas de
algum tempo, com tendência para pouco tempo:
- C (46,7% algum tempo) – Tendência para pouco tempo (24,1%);
- E (41,5% algum tempo) – Tendência para pouco tempo (28,4%).
- A (40,9 algum tempo; 32,2% pouco) – Tendência paramuito tempo (20,0%).
De acordo com os critérios de selecção de tarefas e actividades estabelecidos
pelo pesquisador, e já referidos na parte introdutória deste capítulo, são consideradas
críticas as tarefas que mostram uma distribuição de frequências de respostas dispersa e
165
com relativo equilíbrio. As outras tarefas são seleccionadas ou não, em função da sua
maior ou menor percentagem de frequência de respostas dadas.
A tabela 25 ilustra a selecção de tarefas com base no tempo da execução das
actividades da ficha 1, segundo os critérios do CODE.
Tabela 25: Selecção de tarefas com base nos dados da ficha 1
Tarefa Criticidade Ênfase Implicação
A dd Alta baixa 40,9% Treino
B Med Alta baixa 34,4% treino
C Med Med média 46,7% treino
D dd Alta baixa 30,3% treino
E Baixa baixa baixa 41,5% Ex.treino
F dd Alta baixa 32,1% M. treino
Legenda:
A – Organização da esquadra (subunidade)
B – Gestão de recursos (humanos e logísticos)
C – Gestão do tempo de um comandante
D – Planeamento e concepção
E – Relações privadas ou institucionais
F – Competências operacionais
NB: ‘dd’ significa dispersão de dados (tarefa crítica)
A tabela acima mostra que as tarefas A, B, C e D precisam de treino. A tarefa F, precisa
de muito treino, enquanto que a tarefa E, tem excesso de treino, por isso, não é
seleccionável (na perspectiva do CODE).
Dados gerais da ficha 1
Os dados apresentados nesta tabela sugerem que para A (Organização da
Esquadra), os participantes necessitam de tempo para a execução das suas actividades.
Com efeito, as opiniões dos participantes subdividiram-se de forma equilibrada entre os
que afirmaram que dedicam algum tempo (32,2%); e os que dedicam pouco
tempo(32.2% ), enquanto outros precisam de muito tempo (24,1%) para realizar a
tarefa.
166
É lógico que para as diferentes actividades executadas numa Esquadra o
comandante necessita de fazer uma reflexão sobre a melhor forma de levar a cabo
determinadas tarefas. A competência de um comandante de esquadra é exigida e
mostra-se, em primeiro lugar, na sua capacidade de organizar a esquadra, os agentes e
oficiais que a ele estão subordinados e os meios alocados à sua subunidade para o
cumprimento das missões da polícia naquele território.
Ao interpretar-se o resultado das respostas dos participantes é necessário ter em
conta uma série de factores que podem concorrer para a dispersão de dados, conforme
foi demonstrado acima. De acordo com o nosso critério de análise, a dispersão de
resultados indica que a actividade é crítica, podendo ser afectada por factores como
experiência profissional, nível de formação, conhecimento sobre o conteúdo da tarefa
(organização de uma esquadra), dentre outros.
Para o Caso da tarefa B (Gestão de recursos disponíveis), a distribuição
equilibrada de respostas entre pouco (31,1%) e muito (31,1%) tempo, com uma ligeira
tendência para algum tempo (26,6%), mostra também que é constituída por actividades
de que os participantes não se desembaraçam com facilidade e que exige, por isso,
formação e experiência na sua realização. Na prática, a gestão de recursos (in)
disponíveis exige muita perspicácia por parte do gestor que tem o nus de definir
prioridades e a oportunidade de aplicação dos recursos, muitas vezes escassos, para
garantir resultados máximos.
Sobre a gestão de recursos nas organizações policiais, DEBORTOLI (2007)
observa que o recente e crescente processo de cobrança por resultados a que a Polícia
vem sendo exposta tem conduzido as estruturas policiais a uma inevitável
reinterpretação de suas actividades internas e de seu relacionamento externo. Nesse
novo contexto, vêm ganhando força as interpretações relativas à necessidade de
conhecimento e utilização de indicadores de eficiência, eficácia e efetividade60 como
60 A eficiência é a obtenção de resultados através da ênfase nos meios, da resolução dos problemas
existentes e da salvaguarda dos recursos disponíveis com o cumprimento das tarefas e obrigações. Significa fazer bem as tarefas, administrar os custos, reduzir as perdas e o desperdício; a eficácia é a obtenção de resultados através da ênfase nos próprios resultados e nos objectivos a serem alcançados, com a exploração máxima do potencial dos processos. Significa a optimização das tarefas com a agilização de recursos para alcançar o resultado esperado; a efetividade é a obtenção de resultados através da ênfase na percepção do cliente. Significa que há preenchimento das expectativas do cliente, através de uma ação programada e planejada para satisfazer os seus desejos.
167
pressuposto fundamental para o desenvolvimento de processos policiais e de políticas
de segurança pública.
A reação das organizações policiais a esta nova demanda materializou-se, em alguns casos, sob a forma de aplicações distorcidas das noções de eficiência, eficácia e efetividade na mensuração de processos e resultados que envolvem um alto grau de complexidade. Na maioria dos casos as estruturas responsáveis pela segurança pública e defesa social possuíam pouca ou nenhuma experiência no uso de indicadores de desempenho (DEBORTOLI, 2007, p.33).
É notória a preocupação dos participantes em dispor de tempo considerável para
se dedicarem a questões relacionadas com a gestão dos recursos (in) disponíveis para o
cumprimento da missão da PRM ao nível da subunidade (esquadra). A gestão de
recursos inclui, no caso considerado nesta pesquisa, a gestão dos efectivos afectos à
esquadra e a gestão dos equipamentos e meios (in)disponíveis para a realização
adequada do trabalho da esquadra, por exemplo, consumíveis (modelos das peças de
expediente, material de escritório e relacionado, consumíveis em geral, equipamentos
individuais (coletes de protecção, lanternas, cacetetes, etc.), equipamentos colectivos
(viaturas, armas, algemas, rádios de comunicação e outros).
Um controle deficiente ou inadequada das armas e munições existentes na
esquadra, por exemplo, pode resultar em desvio desses equipamentos e seu uso
indevido,por um lado. Por outro, uma gestão deficiente ou inadequada dos efectivos
pode degenerar em conflitos entre estes e o comando, falta de motivação e
indisponibilidade para o trabalho, ou em atitudes antiéticas que prejudiquem a relação
entre a Polícia e a o público.
Em relação à tarefa C (Gestão de tempo do Comandante da Esquadra), maior
número dos participantes sugeriu precisar de algum tempo (46,7%) enquanto outro
número considerável optou por pouco tempo (24,1%) e só uma pequena percentagem
(16,1%) indicou que precisaria de muito tempo. O que se pode perceber das respostas
dos participantes é que o comandante da esquadra enquanto dirigente da subunidade
deve dedicar certo espaço de tempo para a agenda diária de funcionamento da sua
subunidade.
O volume de tempo necessário para o efeito depende, para além de outros
aspectos, do grau de organização, da experiência e habilidade de liderança e da situação
da segurança do território. A manutenção dos níveis operacionais de comando requer
do comandante, para além da disponibilidade de seus colaboradores directos, contactos
168
com os diferentes escalões de oficiais e subordinados para a análise, discussão e
instruções sobre missões operacionais, resultantes da análise criminal e da segurança
pública do território.
No caso da tarefa D (Actividades de planeamento e concepção), a dispersão
equilibrada de dados entre algum tempo (30,3%) e pouco tempo (30,3) com tendência,
também relativamente equilibrada, para muito tempo (29,6), mostra a complexidade da
tarefa e é classificada como crítica exigindo, por isso, muito treino. Dado o carácter das
actividades previstas nesta categoria, que constituem, tecnicamente, a base para o
cumprimento da missão de uma subunidade e assumem um carácter transversal a todas
as outras categorias (tarefas) consideradas nesta pesquisa, é justificável que requeiram a
devida atenção porque se circunscrevem nas actividades de direcção. O Comandante
necessita de dedicar tempo específico para analisar, planificar, organizar, executar e
controlar a realização de missões policiais. É contraditório o equilíbrio entre algum e
pouco tempo com tendência para muito tempo dedicado a esta actividade, sendo de
difícil execução se tomarmos em consideração o facto de que a planificação e
concepção se projecta directamente para o sistema da segurança pública, como campo
de actores diferenciados.
As idéias contidas em expressões como “preservação da ordem pública”, “elevação da sensação de segurança” ou “controle da criminalidade”, por si só, remetem a um grau de complexidade suficiente para que dependam diretamente da compreensão individual de cada gestor policial e de cada operador do sistema de segurança, e da percepção de sua relevância sobre o desenvolvimento das políticas de segurança pública (DEBORTOLI, 2007, p.34).
A tendência dos resultados leva à presunção de que a maior parte dos
participantes que responderam o inquérito não possui conhecimento e habilidades para
realizar adequadamente a planificação e concepção de actividades operacionais que
levem à proactividade policial para preservar a ordem e segurança públicas do espaço
territorial da subunidade. Por isso, é justificável que seja uma actividade que exige
muito treino e a dedicação de muito tempo na sua realização.
Em relação à tarefa E (Relações privadas ou institucionais), os participantes
sugerem dedicar predominantemente algum tempo (41,5%) tendendo para Pouco tempo
(28,4%). Dependendo do tipo de actividade a realizar neste âmbito, a opção dos
participantes aponta para o facto de não constituir uma grande preocupação
169
provavelmente pelo facto de algumas das tarefas serem esporádicas e não de execução
permanente.
Trata-se, provavelmente, de reafirmar aquilo que são a natureza e as
características da organização policial moçambicana (predominantemente aplicador da
lei), em que os dirigentes da polícia, ao nível local, não priorizam a criação de redes de
relacionamento e parcerias com os diferentes actores sociais do território que, de
alguma forma, podem participar ou influir na segurança pública do território.
Preocupam-se mais em perseguir indicadores de resultados que possam projectar a
melhor visibilidade institucional e formação de opinião pública favorável.
(...) as percepções dos executivos de polícia, outros operadores do sistema de segurança pública e justiça criminal, autoridades políticas, cidadãos, formadores de opinião, meios de comunicação etc, acerca dos níveis de visibilidade do trabalho policial, influenciam os tipos de cobranças de resultados das polícias e, por conseguinte, a escolha dos indicadores de desempenho “mais adequados” para responder a estas mesmas cobranças (DEBORTOLI, 2007, p.35).
No território da esquadra é da responsabilidade do comandante estabelecer e
desenvolver as políticas de proximidade. As políticas de proximidade, não só ao nível
policial, são especialmente importantes para reforçar relações “perdidas” dentro das
comunidades ajudando a desenvolver laços de conhecimento e confiança entre as
pessoas. O estabelecimento de relações privadas e institucionais com os diferentes
actores sociais além de melhorar as relações entre polícia e comunidades, é
especialmente útil para que todos assumam um papel determinante na sua segurança e
bem-estar.
(...). O estabelecimento de parcerias é uma técnica que pode ser bastante útil em situações mais complexas que exijam respostas multidisciplinares. No entanto o estabelecimento de relações formais, recorrendo a parcerias ou não, é sempre uma abordagem positiva já que encoraja os elementos das comunidades a envolverem-se nos seus problemas. Este envolvimento proporciona soluções a longo prazo com todas as vantagens daí resultantes, sendo este um objectivo a ter em conta quando se fala de prevenção criminal (LEITÃO, 2003, p.18).
Quanto à tarefa F (Competências operacionais), os participantes sugerem
equilíbrio entre algum (32,1%) e muito tempo (32,1) com uma tendência para algum
(28.7%) e pouco tempo (24,3%). De acordo com os critérios de selecção que foram
adoptados nesta pesquisa, esta é uma tarefa crítica que exige, por isso, muito treino. É
também uma tarefa considerada difícil por alguns e fácil de realizar por outros.
170
Este facto indica que as respostas dadas dependem, para além de outros
factores, do nível de formação técnico-profissional, da experiência profissional do
particpante, da situação criminal e da segurança pública do território. Para todos os
efeitos, esta tarefa constitui o eixo central das actividades de uma subunidade e, por sua
natureza, forma uma relação interdependente com a tarefa D (Actividades de
planeamento e concepção). Portanto, as tarefas D e F se relacionam recíproca, teórica e
praticamente.
Para esta categoria, o que se pode perceber das respostas dos participantes é que
as actividades operacionais diárias a executar nas esquadras necessitam de tempo para
sua planificação, organização, execução, controle, capacidade de gestão e formação
profissional adequada. Para actividades operacionais a disponibilização de tempo é um
aspecto importante porque permite avaliar a oportunidade e as circunstâncias em que
determinadas actividades devem ser executadas e permite a tomada de decisões em
tempo oportuno. É nas actividades operacionais onde mais claramente se expressa a
acção profissional da Polícia.
O discurso profissionalizante das polícias, o qual assume forte acolhimento na
subcultura policial, afirma que o verdadeiro serviço policial assenta no combate ao
crime e na manutenção e reposição da ordem pública.
A função e profissão policial seriam assim um conjunto de técnicas
especializadas naqueles dois domínios, enquanto todo o resto se constituiria como um
“excesso” que apenas serve para reduzir a eficácia policial. Fica claro que
reconhecendo que este conjunto de técnicas deve ser exclusivo da polícia, torna–se
mais difícil reconhecer que o objectivo de combater o crime, aumentar o sentimento de
segurança das populações e a tranquilidade pública é mais facilmente alcançado com a
colaboração de outros actores sociais.
A literatura especializada que analisa os novos paradigmas da função policial
nas sociedades democráticas afirma que:
Está hoje demonstrado por todo o mundo ocidental que esta excessiva profissionalização autonomista provocou o distanciamento entre polícia e cidadãos. A polícia concentrou-se em lutar reactivamente contra os "maus" esquecendo-se de trabalhar proactivamente com os "bons" (...). Torna-se necessário trabalhar no sentido de incutir nos polícias que o seu trabalho é bem mais eficaz reconhecendo que as tarefas de assistência e ajuda, vistas tradicionalmente como secundárias e pouco profissionais, são hoje um factor importante em termos de eficácia, imagem e colaboração com aqueles que servimos (LEITÃO, 2003, p. 16).
171
Deste modo, podemos afirmar que o serviço policial ultrapassa largamente a
representação no público, nos decisores policiais, nos decisores políticos e dos meios
de comunicação de massas, os quais tendem a limitar a acção policial à prevenção e
repressão policial e à manutenção e reposição da ordem pública. Grande parte da acção
policial diária lida com problemas que não são da competência da polícia, mas que têm
graves consequências em termos criminais e de ordem pública.
Nas organizações policiais de natureza militar ou paramilitar, como é o caso da
Polícia de Moçambique, as tarefas A, B, C, D, E, F acima analisadas, consubstanciam a
função de comando. Segundo Claus Möller (2006), o exercício da Função Comando
exige características específicas do comandante no processo de aplicação dos recursos
e, acima de tudo, no relacionamento com os subordinados, beneficiários/destinatários,
parceiros, comunidades e com representantes de entidades governamentais. Estimular o
desenvolvimento pessoal e continuado dos colaboradores é um desafio constante aos
dirigentes. A Função Comando, quando estruturada e operada a partir do
“employeeship61” é fundamentada nos princípios de colocar as pessoas em primeiro
plano, delegar responsabilidades e administrar, para todos (MÖLLER, 2006, p.42).
O exercício da Função Comando exige do gestor habilidades e atitudes
adequadas, de modo a aglutinar os interesses e mitigar os conflitos naturais e os
derivados do processo de desenvolvimento das funções policiais. Exige conhecimento e
habilidades de trabalho com aquilo que na “gíria” policial é conhecido como “ciclo das
actividades de direcção”, que integra: Informação, Análise, Planificação, Organização,
Execução e Controle, conforme ilustra a figura 13.
61 Employeeship – “O acto de assumir responsabilidades e poder. Neste caso, o funcionário é o sujeito central da acção, mas a organização deve criar um ambiente propício para que ela se desenvolva” MÖLLER in Revista Exame (FSP, 1995).
172
Figura 12: ciclo de actividades de direcção na PRM
PROCESSO DE DIRECÇÃO
INFORMAÇÃO
ANÁLISE
PLANIFICAÇÃO
ORGANIZAÇÃO
EXECUÇÃO
CONTROLE e AVALIAÇÃO
Fonte: Autor, inspirado em Claus Möller in (REVISTA EXAME,1995, p. 18).
As áreas identificadas no ciclo de actividades de direcção se influenciam
reciprocamente, pois a informação constitui a base do trabalho policial, esta quando é
recebida ou produzida deve ser analisada, depois da análise planificam-se ou
concebem-se as acções a serem realizadas; segue-se a organização para o cumprimento
do que foi planificado, em seguida executa-se e durante o processo faz-se a monitoria e
a respectiva avaliação. Este ciclo vai gerando novas informações que retroalimentam
continuamente o processo e podem gerar novos inputs.
Sob o ponto de vista de reflexão-na-acção, em caso como acima exposto, Schön
(2000) explica que em cada passo o profissional experimenta uma surpresa que o leva a
repensar seu processo de conhecer-na-acção de modo a ir além de regras, factos, teorias
e operações disponíveis. Ele responde àquilo que é inesperado ou anômalo através da
reestruturação de algumas de suas estratégias (experiências) de acção, teorias de
fenômenos ou formas de conceber o problema e inventa experimentos imediatos para
testar suas novas compreensões. O autor afirma que o profissional, comporta-se mais
como um pesquisador tentando modelar um sistema especializado do que como um
especialista cujo comportamento é modelado. Diz ainda que:
(...). Na base dessa visão da reflexão-na-acção do profissional está uma visão construcionista da realidade com a qual ele lida – uma visão que nos leva a vê-lo construindo situações de sua prática, não apenas no exercício do seu
173
talento técnico profissional, mas também em todos os outros modos de competência profissional (SCHÖN, 2000, p.39).
Importa salientar que esta visão distingue-se da racionalidade objectiva da
relação do profissional de conhecimento com a realidade que ele conhece. Nessa visão
os factos são o que são e a verdade das crenças é passível de ser testada estritamente
com referência a elas. Todo o conhecimento profissional baseia-se em um alicerce de
factos (ibidem).
3.4.2. Dados recolhidos através da ficha 2: dificuldade de execução de tarefas
Em segundo lugar, apresentam-se as tabelas de frequências de respostas
relativas ao tipo de dificuldade de execução e frequência de tarefas que são solicitadas
diariamente a um comandante de esquadra.
Tabela 106: Frequência de respostas da Ficha 2 – Província de Nampula
Grupos/Dados A % B % C % D %
Dificuldades
S/D 57 60,0 26 61,9 122 59,8 142 74,7
D 35 36,8 15 35,7 76 37,2 35 18,4
MD 3 3,1 1 2,3 6 2,9 13 6,8
∑ 95 99.9 42 99.9 204 99.9 190 99.8
Frequência
P/F 41 38,3 13 22.8 52 23,7 61 31,1
F 38 35,5 20 35,0 87 39,7 68 34,6
M/F 28 26,1 24 42,1 80 36,5 67 34,1
∑ 107 99.9 57 99.9 219 99.9 196 99.8
Legenda
S/D: sem dificuldades P/F: pouco frequente
D: dificuldades F: frequente
MD: muitas dificuldades MF: muito frequente
A frequência de respostas da Tabela 25 mostra que na província de Nampula as
tarefas A (tarefas judiciais 60,0%), B (tarefas administrativas 61,9%), C (tarefas
operacionais 59,8%), e D (gestão de recursos humanos 4,7%), são executadas sem
174
dificuldades, embora todas elas apontem para uma considerável tendência para a
dificuldade.
Quanto à frequência: A é pouco frequente (38,3%,) tendendo para frequente
(35,5%); B é muito frequente (42,1%) com tendência a frequente (35,0%); C mostra
certa tendência a um equilíbrio relativo entre frequente (39,7%), e muito frequente
(36,5%), com maior dispersão para pouco frequente (23,7%); D também mostra uma
dispersão relativamente equilibrada entre frequente (34,6%), muito frequente (34,1%) e
pouco frequente (31,1%).
Na cidade de Maputo (veja Tabela 26), a frequência das respostas mostra que as
tarefas A (judiciais-75,8%), B (administrativas-56,8%), C (operacionais-85,9%), e D
(gestão de recursos humanos-72,5%), são executadas sem dificuldades. Em todas as
tarefas acima referidas a tendência é para a dificuldade, exceptuando a tarefa D cuja
tendência é para muita dificuldade (19,4%). Quanto à frequência, A é
predominantemente pouco frequente (64,3%) embora mostre tendência para frequente
(20,5%); B mostra uma dispersão de frequência, com tendência muito forte ao
equilíbrio, entre muito frequente (34,7%), frequente (32,6%) e pouco frequente
(32,6%); C também mostra uma distribuição com tendência ao equilíbrio, entre
frequente (37,9%), pouco frequente (35,6%) e muito frequente (26,4%). D também
apresenta uma distribuição percentual dispersa e com tendência ao equilíbrio relativo
entre muito frequente (38,0%), frequente (33,3%) e pouco frequente (28,5%).
Tabela 27: Frequência de respostas da Ficha 2 – Cidade de Maputo
Grupos/Dados A % B % C % D %
Dificuldades
S/D 66 75,8 25 56,8 299 85,9 127 72,5
D 15 17,2 13 29,5 30 8,6 14 8,0
MD 6 6,8 6 13,6 19 5,4 34 19,4
∑ 87 99,8 44 99.9 348 99.8 175 99.9
Frequência
P/F 47 64,3 15 32,6 62 35,6 42 28,5
F 15 20,5 15 32,6 66 37,9 49 33.3
M/F 11 15,0 16 34,7 46 26,4 56 38,0
∑ 73 99.8 46 99.9 174 99.9 147 99.8
175
Em Sofala (veja tabela 27), as tarefas A (judiciais 50,0%), B (administrativas -
67,3%), C (operacionais 52,4%), e D (gestão de recursos disponíveis 68,4%), são
executadas sem dificuldades, mas todas com tendência para dificuldade. Quanto à
frequência: A mostra uma dispersão com tendência ao equilíbrio, entre frequente
(36,4%), pouco frequente (32,3%) e muito frequente (30,2%); B é predominantemente
muito frequente (64,8%); C também é predominantemente muito frequente (40,8%), e
D é igualmente muito frequente (41,1%).
Tabela 28: Frequência de respostas da Ficha 2 – Província de Sofala
Grupos/Dados A % B % C % D %
Dificuldades
S/D 48 50,0 33 67,3 85 52,4 104 68,4
D 35 36,4 9 18,3 54 33,3 32 21,0
M/D 13 13,5 7 14,2 23 14,1 16 10,5
∑ 96 99.9 49 99.8 162 99.8 152 99.8
Frequência
P/F 32 33,3 7 12,9 41 23,5 39 24,6
F 35 36,4 12 22,2 62 35,6 54 34,1
M/F 29 30,2 35 64,8 71 40,8 65 41,1
∑ 96 99.9 54 99.9 174 99.9 158 99.9
Tabela 29: Frequência de respostas da Ficha 2
(Somatório geral: províncias de Sofala, Maputo e Maputo-cidade)
Grupos/Dados A % B % C % D %
Dificuldades
S/D 171 61,5 84 62,2 506 70,8 373 72,1
D 85 30,5 37 27,4 160 22,4 81 15,6
M/D 22 7,9 14 10,3 48 6,7 63 12,1
∑ 278 99.9 135 99.9 714 99.9 517 99.8
Frequência
P/F 120 43,4 35 22,2 155 27,3 142 28,3
F 88 31,8 47 29,9 215 37,9 171 34,1
M/F 68 24,6 75 47,7 197 34,7 188 37,5
∑ 276 99.8 157 99.8 567 99.9 501 99.9
176
Dados Gerais da Ficha 2
O somatório dos dados apresentados na tabela referente à ficha 2, que reporta as
dificuldades de execução e frequência das tarefas, de uma forma geral indicam que para
a tarefa A (Tarefas jurídicas), os participantes predominantemente sugerem a execução
Sem dificuldade (61,5%) enquanto parte significativa acha que a tarefa é de Difícil
execução (30,5%). O que se pode perceber é que a maioria, como se afigura, minimiza
este tipo de tarefa.
Duas leituras podem ser feitas a respeito do que as respostas dos participantes
indicam: uma, é que os oficiais da Polícia que desempenham funções de comando,
direcção e chefia nas unidades e subunidades policiais possuem sólidos conhecimentos
jurídicos, por isso, não acham qualquer dificuldade em atender, resolver e encaminhar
os assuntos de natureza jurídica com que se deparam no seu trabalho.
Outra, por sinal a mais provável, é que por se pensar, erradamente, que a parte
jurídica das actividades policiais é tratada pelas instâncias jurídicas, os oficiais da
polícia não têm suficiente visão sobre as funções de natureza jurídica da Polícia, o que
contrasta com a posição e função da Polícia num Estado de Direito:
(...). A Polícia, hoje, não é um instrumento de poder exercido de forma totalitária, mas, como “face visível da lei”, é e deve ser defensora e garante da qualidade de vida e do bem-estar da comunidade, possibilitando liberdade em segurança, e instrumento de conciliação entre os três poderes: Político-legislativo, Judicial e Executivo (VALENTE, 2009, p.108).
A percepção distorcida a que fizemos referência parece ser fundamentada pela
frequência deste tipo de casos que apresenta maior índice como de pouco frequente.
Com efeito, cerca de 43,4% das respostas dos participantes sugerem ser Pouco
frequente, enquanto 31,8% consideram-na de Frequente.
Para o caso B (Tarefas administrativas), a percentagem predominante das
respostas dos participantes sugere a execução sem dificuldade (62,2%), só uma pequena
parte considera que a tarefa se realiza com dificuldade (27,4). A parte administrativa
parece constituir a parte das actividades de rotina quotidiana realizadas a nível de cada
esquadra, sendo, por isso, que a maior parte das respostas dos participantes sugere que
sua execução é sem dificuldade. Com efeito, todo o processo pelo qual se desenvolvem
as actividades na esquadra passa necessariamente pelo registo de dados das ocorrências
177
e dos que recorrem à assistência policial por razões variadas. Porém, o serviço
administrativo não pode ser reduzido só a isso, ele abrange todo o policiamento.
(...). Na verdade, policiar não é uma actividade única, tratando-se antes de um conjunto complexo de actividades (BAYLEY, 2006, p.118). De qualquer forma, as funções de controlo criminal e manutenção da ordem e tranquilidade públicas, são as funções nucleares do mandato policial tanto em termos de soberania do Estado, como em termos simbólicos na representação que os cidadãos fazem da polícia. Porém, a Polícia realiza também Serviços de carácter administrativo, incluindo as atribuições e competências na área económica, saúde pública e salubridade, ambiente, tráfego rodoviário, etc. (BITNER, 2003, p.253).
É desta forma que a maior percentagem dos participantes sugere ser uma
actividade muito frequente (47,7%) ao nível das Esquadras, com tendência para
equilíbrio relativo entre frequente (29,9%) e pouco freqüente (22,2%). Deste modo, a
dispersão de dados que se segue ao principal enfoque da tarefa (muito frequente) sugere
que é uma tarefa que precisa de treino, na perspectiva do CODE.
Em relação à tarefa C (Actividades Operacionais), os participantes sugerem sua
execução sem dificuldade (70,8%) com dispersão de dados, tendendo para dificuldade
(22,4%), facto que torna a tarefa crítica, nos critérios de clasificação do CODE. O
conjunto de actividades que formam esta categoria são de carácter permanente e
rotineiro, o que pode induzir os participantes a acharem que é realizada sem
dificuldade. Tal como referenciamos na análise da ficha 1 desta pesquisa, as
actividades operacionais diárias a executar nas esquadras implicam conhecimento e
habilidades para sua planificação, organização, execução, avaliação e controle,
capacidade de gestão e formação profissional adequada.
As actividades operacionais corporizam a principal função policial que é
sobretudo relacionada com a prevenção criminal e com a manutenção e reposição da
ordem pública. O público em geral, os decisores políticos, os decisores policiais e os
próprios polícias assumem normalmente estes dois papéis como sendo os nucleares de
entre todas as responsabilidades policiais (LEITÃO, 2003, p.15). A própria legislação
moçambicana – Constituição da República (CRM), lei da Política de Defesa e
Segurança (lei nº 17/97 de 1 de Outubro) e a lei Orgânica da PRM (lei nº 19/92 de 31
de Dezembro) os consagra como exclusivos da acção policial. Interrupção -20h15.
A Frequência sugerida pelos participantes (frequente-37,9%), com tendência a
equilíbrio com muito frequente (34,7%) parece confirmar esta tendência – crítica, pois
os polícias sabem no entanto que a sua acção não se resume a estes papéis. No dia a dia
178
a polícia acaba por ter que desempenhar um leque muito vasto de funções e tarefas as
quais não estão de forma alguma previstas juridicamente como sendo competências ou
atribuições policiais (LEITÃO, 2003, p.16).
Relativamente à tarefa D (Gestão de recursos disponíveis), os participantes
sugerem que ela é executada sem dificuldade (72,1%), tendendo para uma dispersão
que varia entre dificuldade (15,6%) e muita dificuldade (12,1. Importa realçar que a
dispersão de dados (dd) que se verifica torna a tarefa crítica, necessitando, de acordo
com o nosso critério de classificação, de muito treino.
A percentagem de frequência desta categoria: muito frequente (37,5%),
tendendo para um relativo equilíbrio com frequente (34,1) e uma relativa dispersão para
pouco frequente (28,3%), confirma a natureza crítica das actividades de gestão de
recursos disponíveis nas unidades e subunidades da PRM. O que se pode perceber é
que os comandantes das unidades e subunidades policiais, com ou sem formação e
experiência adequada em gestão, administram ou procuram administrar os recursos
disponíveis em suas unidades. De acordo com os objectivos deste estudo, o que deve
ser entendido e considerado relativamente à gestão de recursos, é a função de
administrar, definida como:
uma função sócio-profissional que consegue que as coisas sejam realizadas (...). Entre os clássicos destaca-se a ideia de que a Administração constitui um recurso para a racionalização e condução do processo produtivo. O conceito entre os humanistas refere-se à condução do processo de cooperação e relações humanas no trabalho (LITTERER, 1980 p.4).
A gestão das actividades da esquadra enquadra-se na necessidade de aplicação e
observância de métodos de liderança. Uma visão sistémica coloca a gestão dos recursos
disponíveis como uma técnica de conduzir o processo do policiamento e as relações
sociais na esquadra, conforme solicitações do ambiente de tarefa (interno) e do
ambiente geral (comunidade), isto é, administração de situações e da incerteza
(LITTERER, 1980 p.5).
Deste modo, recorrendo aos critérios de selecção estabelecidos pelo
pesquisador, são consideradas seleccionáveis as tarefas da ficha 2 constantes da Tabela
30.
179
Tabela 30: Selecção de tarefas com base nos dados da ficha 2
Tarefa Criticidade Oportunidade Dificuldade Ênfase/freq. Impl.
A med med med 61,5% baixa 43,4% treino
B med med med 62,2% med 47,7% treino
C dd alta baixa Alta (s/d) 70,8% baixa 37,9% M.treino
D dd alta baixa Alta (s/d) 72,1% baixa 37,5% M.treino
Legenda
A – Judiciais
B – Administrativas
C – Operacionais
D – Gestão de recursos disponíveis
Pela leitura da Tabela 29 acima apresentada, conclui-se que as tarefas A e B
precisam de treino normal, enquanto que as tarefas C e D precisam de muito treino. Em
seguida apresenta-se o quadro geral das tarefas seleccionadas através das fichas 1 e 2
para as práticas pré-profissionais e o estágio curricular supervisionado.
Tabela 31: Tabela geral das tarefas seleccionadas (fichas 1 e 2) Tarefas Fichas 1 Ficha 2
Operacionais F C
Administrativas A, D B
Gestão de Recursos Disponíveis B D
Judiciais A
Legenda: Ficha 1
C – Gestão do tempo de um comandante
D – Planeamento e concepção
B – Gestão de recursos disponíveis
E – (Relações privadas ou institucionais)
F – Competências operacionais
Legenda: Ficha 2
A – Judiciais
B – Administrativas
C – Operacionais
D – Gestão de recursos disponíveis
180
De acordo com o quadro acima apresentado, foram seleccionadas as tarefas
(F,A,D,B) da ficha 1 e (C,B,D,A) da ficha 2. Pelo critério da “CODE”, não foi
seleccionada a tarefa E (Relações privadas e institucionais) da ficha 1.
3.5 Apresentação dos dados recolhidos através de entrevistas nas esquadras
Como foi referido no capítulo da metodologia, na PIC foram entrevistados 6
inspectores e subinspectores; na polícia de trânsito foram realizadas 8 entrevistas,
enquanto que nas esquadras da polícia (segurança pública) foram realizadas 6
entrevistas. Cada função de um inspector ou subinspector dentro destas unidades foi
abrangida, pelo menos por uma entrevista. Aos comandantes das esquadras e chefes das
operações foi administrada uma entrevista colectiva. Os inquiridos foram entrevisados
sobre:
• As actividades mais frequentes (actividades essenciais).
• As actividades mais complexas (com ênfase durante a formação, isto é, que não
são ensinadas durante a formação, mas que são exigidas no trabalho quotidiano)
• As actividades que devem realizar e que não vêm mencionadas nos seus Termos
de referência
3.6. Resultados das entrevistas realizadas na PIC
Os detentores dos postos de inspectores e sub-inspectores desempenham
principalmente as funções de chefes de brigada, colocados em unidades regulares e
especializadas. Eles descrevem as suas actividades principais do seguinte modo:
• Supervisão do delito comum
• Realização ou direcção de investigação de crimes mais complexos (incluindo
crime organizado)
• Supervisão de detenção preventive (controle dos prazos da prisão preventiva dos
processos com argüido-preso)
As investigações sobre crimes sumários e de querela são feitas por agentes da
PIC sob a supervisão de subinspetores. Os inspectores e subinspetores concentram as
suas actividades nas investigações mais complexas de criminalidade mediana à
181
criminalidade de alto nível, tal como o crime organizado, roubo de viaturas, tráfico de
drogas, lavagem de dinheiro, etc. Todos os inquiridos declararam que o seu trabalho é
complexo e difícil, sublinhando a necessidade de mais formação na sua área. Este dado
é importante para as actividades do Estágio Curricular.
3.7. Resultados das entrevistas realizadas na Polícia de Trânsito
Na direcção de trânsito, os inspectores e sub-inspectores têm uma diversidade
acrescida de tarefas:62 planificação e comando operacional, condução e execução de
actividades no campo de operações (fiscalização, regulação, protecção VIP). Nem todas
as funções possuem o mesmo grau de complexidade: algumas requerem uma formação
de nível superior, por exemplo a engenharia de trânsito, outras não; algumas requerem
especialização, por exemplo a investigação de acidentes de viação, outras não. Quando
inquiridos sobre a dificuldade do seu trabalho, os entrevistados colocaram a
investigação sobre um acidente de trânsito (topografia, reconstituições e relatório) no
topo da sua lista. Também foram mencionadas outras actividades difíceis, tais como, a
planificação da protecção VIP ou a relação com a comunidade (educação pública).
3.8. Resultados das entrevistas realizadas nas esquadras
As entrevistas realizadas nas esquadras visavam entender as actividaes que os
subinspectores (categoria inicial dos graduados da ACIPOL) e inspectores (categoria
para que são promovidos depois de 5 anos de serviço) da Polícia desenvolvem nas
esquadras.
Os Inspectores e Sub-inspectores nas esquadras da Polícia realizam um amplo
leque de actividades em diversas funções: chefe de um pelotão operacional, chefe das
operações, chefe da brigada auxiliar da Polícia de Investigação Criminal (PIC) e oficial
de permanência. Nota-se que pelo seu nível hierárquico (patente), nas esquadras
desempenham funções de direcção, chefia ou de coordenação. Este grupo de
participantes apontou que as actividades mais frequentes na esquadra são:
Planificação e comando operacionais; Supervisão das actividades no terreno; Gestão do
pessoal (serviço, horas, disciplina);
62 Foram realizadas entrevistas, na Província de Maputo com o Chefe de Operações, com o Comandante da Compamhia, com o Analista, com os Chefe dos Pelotões Especiais (polícia motorizada e de Reguladores).
182
Actividades de permanência (actividades judiciais; registo de queixas, ligação com a
PIC, interrogatórios e notificações); Relatórios e/ou análises da situação criminal.
Segundo os participantes, várias actividades foram consideradas mais
complexas que outras. As consideradas mais complexas foram assim ordenadas:
Planificação operacional; Tomada de decisão sob stress; Análise sobre a segurança do
território; Resolução de conflitos (na comunidade); Reuniões com a comunidade63;
Motivar os efectivos (pessoal); Efectuar detenções64.
3.9. Resultados da entrevista colectiva
Os comandantes das esquadras e chefes das operações mencionaram que as
actividades mais frequentes são as seguintes:
- Análise da situação operativa do território; Planificação e comando de operações;
Resolução de conflitos; Despacho e encaminhamento de expediente; Elaboração de
relatórios.
Segundo os participantes, várias actividades foram consideradas mais
complexas que outras. Na percepção deles as mais complexas são as seguintes:
• Planificação e realização de operações dirigidas
• Dirimir conflitos que envolvem os efectivos
• Controlar o potencial delitivo da zona de jurisdição da esquadra
Em seguida elaborou-se uma tabela de comparação entre as actividades
consideradas mais complexas pelos inspectores e subinspectores que trabalham nas
esquadras e os comandantes e chefes das operações das esquadras. Na tabela 31, nota-
se que os inspectores e subinspectores indicaram 7 actividades como sendo as mais
complexas e mais frequentes nas esquadras. Por sua vez, os comandantes e chefes das
operações das esquadras indicaram 4 actividades como sendo as mais complexas.
63 Os subinspectores que trabalham com os chefes de sectores (polícias colocados em regime permanente num determinado bairro ou parcela do território da esquadra para estabelecer o policiamento de ligação com a comunidade) afirmaram que é difícil estabelecer uma agenda de trabalho com as comunidades. 64 Os Subinspectores confirmando a PIC também mencionaram que investigar um crime com autores não conhecdos e um crime organizado são tarefas complexas ( de acordo com a sua lista de complexidade).
183
Tabela 32: Comparação das actividades consideradas mais complexas N/O Inspectores/Subinspectores Comandantes/Chefes das operações
01 Planificação operacional Análise da situação operativa do território
02 Tomada de decisão sob stress Planificação e realização de operações dirigidas
03 Detenção Dirimir conflitos que envolvem os efectivos
04 Análise sobre a segurança do
território Controlar o potencial delitivo da zona
05 Resolução de conflitos
(comunitários)
06 Reuniões com a comunidade
07 Motivar os efectivos
Das actividades indicadas, 3 são concidentes e 5 não coincidentes. As
concidentes são:
1. Análise da situação operativa do território/ Análise sobre a segurança do
território;
2. Planificação operacional/ Planificação e realização de operações dirigidas;
3. Resolução de conflitos/ Dirimir conflitos que envolvem os efectivos.
As actividades não coincidentes são:
1. Controlar o potencial delitivo da zona;
2. Tomada de decisão sob stress;
3. Detenção;
4. Reuniões com a comunidade;
5. Motivar os efectivos.
O que se pode perceber é que as actividades operacionais, judiciais e de gestão
são percebidas por todos os oficiais que trabalham nas esquadras como mais complexas
e frequentes que outras, entendendo-se, a partir desse pressupostos, que sejam também
de difícil execução.
Os dados apresentados até aqui nos permitem perceber as actividades que são
desenvolvidas nas unidades e subunidades policiais, por oficiais subalternos do nível
dos graduados da ACIPOL (subinspector) até à sua primeira promoção (inspector) que,
184
segundo o regulamento da carreira policial moçambicana, ocorre cinco anos depois de
permanência no posto inicial, observados os demais requisitos constantes do aludido
regulamento.
Como foi mencionado na parte introdutória deste capítulo, era imprescindível
que ficasse claro em relação a que actividades concretas é requerida competência ao
oficial subalterno, graduado da ACIPOL. As habilidades técnico-profissionais a ele
requeridas estão relacionadas com que actividades policiais? Portanto, era necessário
delimitar o campo de actividades no qual será vinculada a formação prática do cadete,
futuro oficial subalterno da Polícia.
A partir dessa compreensão de base, passamos à análise dos dados que nos
permitiram relacionar a formação dos oficiais subalternos com a prática policial real. A
intenção é levantar as possibilidades de vincular as práticas formativas às práticas
profissionais e em ambiente de trabalho policial concreto, de forma a estabelecer o
equilíbrio entre os conhecimentos teóricos e as habilidades práticas requeridas a um
oficial subalterno, tomando as práticas pré-profissionais e o estágio curricular
supervisionado como articuladores desse equilíbrio.
3.10. Análise descritiva e interpretação dos resultados de grupos focais,
entrevistas e inquéritos gerais
Para além dos 54 oficiais que foram constituídos como grupo específico para o
inquérito sobre as actividades do comandante da esquadra (fichas 1 e 2), cujos
resultados foram analisados quantitativamente, outro grupo de oficias participou na
pesquisa, respondendo às questões que se seguem na tabela 32 abaixo, em grupos
focais, entrevistas e inquérito por questionário.
185
Tabela 33: Relação das perguntas de pesquisa aplicadas N/O CONTEÚDO DAS PERGUNTAS
01
Sobre a formação em ciências policiais que a Acipol oferece, levanta-se o problema de ligação entre a
teoria e a prática. Muitas vozes dizem que a formação que a Acipol oferece não está ligada à prática
policial concreta. O que acha sobre isso?
02 O que acha que deve ser melhorado na formação de oficiais da polícia?
03 Actividades policiais consideradas mais difíceis
04 Em que aspectos a formacão devia incidir mais: Que aspectos ou matérias acha que deveriam se
introduzidos ou acrescentados na formação em ciências policiais?
05 Que competências (conhecimentos, habilidades e atitudes) você acha que os polícias deveriam ter no
final da sua formação (superior) na ACIPOL?
06 Actividades que os cadetes realizam na esquadra durante o estágio
07 Que outras actividades acha que os cadetes deveriam realizar na esquadra durante o estágio?
08 Qual é para si o verdadeiro trabalho policial? Justifique
09 Como acha que devia ser organizado o estágio curricular? E as práticas pré-profissionais?
10 Como é que as diferentes áreas e disciplinas do currículo podem participar dos estágios e das práticas
pré - profissionais?
11 Tomando em consideração que acompanhou o processo de criação da ACIPOL, que expectativas tinha
sobre o desempenho dos policiais e da policia?
12 O que é um bom e um mau polícia?
13 Como avalia profissionalmente os graduados (egressos) daACIPOL?
Os participantes foram codificados conforme se apresenta no quadro que se
segue. Em cada resposta incluída neste texto consta o código que identifica o
participante.
Quadro 1: Códigos usados na sistematização e análise dos resultados Códigos Participantes
AC Grupo focal 1 MC Grupo focal 2
CDG Comandantes distritais e de esquadras da província de Gaza ICO/SF Comandantes distritais e de esquadras da província de Sofala CDNPL Comandantes distritais e de esquadras da província de Nampula
ESF Graduados (egressos) de Sofala ENP Graduados (egressos) de Nampula
AC/GF Graduados (egressos) da ACIPOL EDPF/SF/12 Dirigentes de nível provincial EL/AC1/12 Dirigentes de nível central
EP Cadetes do 4º ano (ACIPOL)
186
A primeira pergunta que foi colocada aos participantes visava explorar a
sensibilidade deles sobre o principal problema da pesquisa, a ligação entre a teoria e a
prática que afecta o processo de formação na ACIPOL.
Perg.6-Anexo7. Sobre a formação em ciências policiais que a ACIPOL oferece, levanta-
se o problema de ligação entre a teoria e a prática. Muitas vozes dizem que a formação
que a ACIPOL oferece não está ligada à prática policial concreta. O que acha sobre
isso?
-Sinto que talvez haja algo a complementar na formação. Quando chegamos
ao terreno sentimo-nos estrangeiros. As 4 áreas curriculares ajudam-nos na
formação como pessoas, mas na prática há muitas diferenças. A área policial,
mesmo durante a formação é a mais pobre relativamente a outras áreas
curriculares, isso se revela também na prática porque o que se espera de nós
não é o que conseguimos apresentar e assim não podemos partilhar com os
outros na prática. Há o problema do saber ser como polícia. O que nós
aprendemos não há espaço para aplicar no terreno; o oficial da ACIPOL não
sabe ser e estar (AC2- egresso).
Os participantes enfatizam sua falta de habilidade para actuar sobre sistemas
mais amplos pelos quais são tidos injustamente como responsáveis. Ao mesmo tempo,
chamam à atenção para a disparidade entre os métodos tradicionais de formação e as
complexidades da exigência policial actual, em constante mudança. Eles clamam por
reformas na metodologia e estruturas curriculares actuais da formação policial.
-A ACIPOL oferece grosso modo uma boa bagagem teórica devendo melhorar
as aulas práticas. As dificuldades dos cadetes nos primeiros anos de trabalho
têm a ver com o conflito de gerações e níveis de formação, o que resulta em
exigências desfasadas do contexto científico. Em Matalana temos aulas
práticas, mas na academia não. Em nenhum momento realizei aula prática em
todas as cadeiras, no entanto estou já no 4º ano. No estágio o chefe diz: se
houver desordem todos vamos intervir, mas ainda não sei como manejar uma
arma. Não há actividades de tiro. No laboratório não se faz nenhuma aula
187
prática, mas no terreno exige-se. Na academia não há aulas práticas (AC9-
egresso).
Apesar dessas diferentes ênfases, críticos profissionais fazem uma reclamação
em comum: as áreas mais importantes da prática profissional devem encontrar-se,
agora, além das fronteiras convencionais da dicotomia teoria-prática.
-O saber fazer é o grande problema, porque na Prática é onde deve haver
melhor integração. O que muitas pessoas não sabem é qual é a função do
ensino superior. Há diferença entre aquele que foi fazendo a polícia “fazendo”
e aquele que parte do arcabouço teórico. Nota, a ACIPOL nunca implementou
o currículo desenhado e não tem docentes próprios da área policial. Por
exemplo, a cadeira de ordem unida devia ser dosificada e avaliada. A questão
é da obediência cega que os comandantes procuram dos formados na Acipol,
daí os estereótipos de doutorzinhos. Mas é preciso entender que na polícia há
melhorias com base nos egressos da ACIPOL. O curso executivo também
ajudou muito a melhorar os comandantes da polícia. Há problemas de visão,
mas que se resolverá com a substituição dos antigos sem formação, pelos
novos. Os graduados devem ter paciência e saber esperar (AC-grupo focal 1).
Um dos problemas fundamentais levantado pelos participantes da pesquisa,
como sendo factor que afecta a relação entre a teoria e a prática na formação policial,
está relacionado com a docência na ACIPOL. Na Educação Superior, em geral, muitas
vezes a docência não é vista como o ponto fundamental para uma formação
universitária. Acabam-se valorizando mais a organização e o ambiente formativo, a
formação social e cultural do estudante e seus conhecimentos prévios, uso de recursos
disponíveis em detrimento do exercício da docência.
-Houve um workshop em que apareceu um estudo que concluiu que os
graduados da ACIPOL não sabiam nada, nem mesmo a preservação do local
do crime. Mas essa seria a questão fundamental da formação na ACIPOL?
(saber preservar o local de crime). Nota-se que há conflitos inter-gerações; na
ACIPOL precisa-se de uma esquadra-escola, que vem até no PEACIPOL, pois
isso ajudaria a resolver muitos dos problemas práticos a partir dessa unidade
188
operativa. As pessoas que intervêm na área policial não têm formação para
essa área, isto é, a ACIPOL não tem docentes próprios para essa área. Nunca
houve formação de docentes nem formadores, por isso é o elo mais fraco na
formação: entre os docentes há alguma discriminação entre os civis e
policiais. Os policiais são olhados como secundários, porque muitos deles
foram alunos dos civis e sabem que eles não tiveram nenhuma formação
adicional (AC8-grupo focal 1).
Docentes de Educação Superior actualmente deveriam estar ocupados sobretudo
em ensinar seus estudantes a aprender a tomar iniciativas, ao invés de serem
unicamente fontes de conhecimento. Devem ser tomadas providências adequadas para
pesquisar, actualizar e melhorar as habilidades pedagógicas, por meio de programas
apropriados de desenvolvimento de pessoal (MASETTO, 2003, p.16).
-Dou como exemplo os estudantes que foram devolvidos por um comandante
provincial, porque são indisciplinados: aí vê-se que o problema é mesmo de
relacionamento e comunicação entre ACIPOL e as unidades e subunidades
operacionais da PRM (...). Alguém também já disse ao Reitor que “esses seus
estudantes não sabem nada”. Esse assunto o Reitor já levou para ser discutido
no Conselho Directivo. Mas tudo passa necessariamente pela formação do
corpo docente. Onde fica o corpo docente e qual é a função que tem? Será que
é possível fazer-se uma formação adequada sem professores com formação
apropriada? (AC13-grupo focal 1).
De acordo ainda com Masetto (2003), o professor universitário hoje, deve ser
um profissional intercambiável, que combine a imaginação e acção, capaz de se
intercomunicar nacional e internacionalmente, capaz de mediar a aprendizagem dos
estudantes de forma interactiva e orientá-los para o desenvolvimento de capacidades de
saber saber, saber fazer e saber estar com os outros.
(...). O objectivo máximo de nossa docência é a aprendizagem de nossos alunos. Donde a importância de o professor ter clareza sobre o que significa aprender, quais são seus princípios básicos, o que se deve aprender actualmente, como aprender de modo significativo, de tal forma que a aprendizagem se faça com maior eficácia e maior fixação (...), como se aprende no ensino superior, quais os princípios básicos de uma aprendizagem
189
de pessoas adultas e que estejam valendo para alunos de ensino superior, como integrar no processo de aprendizagem o desenvolvimento cognitivo, afectivo-emocional, de habilidades e a formação de atitudes? Como aprender a aprender permanentemente? (MASETTO, 2003, pp.27-28).
Os participantes falaram tanto do problema da docência na ACIPOL,
principalmente na área curriculara de Ciências e Tecnologia Policial, quanto da relação
que no campo de trabalho se estabelece entre os oficiais graduados pela ACIPOL e os
profissionais mais antigos que desempenham funções de comando, direcção e chefia
das unidades e subunidades policiais. Porém, a questão de fundo são as fragilidades
institucionais relativamente ao corpo docente próprio da área policial de formação.
Entende-se pois que esse facto enfraquece tanto o relacionamente entre os profissionais
de gerações diferentes, quanto uma formação policial sólida e adequada.
O outro facto apontado pelos participantes é que há relatos de melhoria do
trabalho nas unidades e subunidades policiais como resultado da contribuição dos
oficiais graduados da ACIPOL, o que contradiz a tese de que “não sabem nada”. Outros
relataram a forte exigência de disciplina militar feita aos novos oficias que é remetida à
fraca preparação prática destes durante a formação.
-Pude notar que houve melhorias e a população fala disso. Por exemplo, os
autos já não são devolvidos pelos tribunais. O que acontece na prática é que
os comandantes querem um Oficial obediente e militarmente bom. O problema
do cadete é não saber estar militarmente. O outro problema é a falta de
enquadramento porque o cadete termina a formação sem experiência e essa
experiência se ganha na prática (AC-grupo focal 1).
A afirmação de que os graduados da ACIPOL “não sabem nada” é questionada
por grande parte dos participantes da pesquisa, mas todos comungam a ideia de que
não há relacionamento entre a formação dada e a prática policial real. Alguns apontam
como uma das razões a fraca coordenação entre a ACIPOL e as unidades e subunidades
operacionais da Polícia sobre as necessidades destas em termos de nível de
competência profissional requerida aos oficiais graduados pela ACIPOL.
-Essa de que os cadetes não sabem nada é grave. Isso desautoriza a
instituição. O ponto de partida é: O que é que o cadete deve saber de facto.
Por exemplo: na cadeira de Direito Processual Penal, o que o cadete deve
saber disso? Nas relações internacionais, o que o cadete deve saber sobre
isso? Não há rastreio, dentre as cadeiras, daquilo que o polícia deve saber.
190
Outro ponto: Devia haver formação integral do cadete. Por exemplo: quando
o cadete obedece as formaturas e voz de comando ele está aprendendo. No
primeiro curso falava-se muito de autos e peças de expediente e no terreno
encontramos peças de expediente que não existem no código do processo
penal. Isso tudo porque durante a formação nunca houve encontro entre esses
instrumentos. Existe uma separação entre a ACIPOL e o comando geral na
formação do cadete e, como resultado disso os cadetes, nos trabalhos de final
de curso, investigam coisas sem interesse da polícia. Na ACIPOL os cadetes
não estão informados sobre o que interessa à polícia. Sugere-se um gabinete
de estudo na ACIPOL que sirva de ligação entre o comando geral e a
ACIPOL. Porque é que o cadete da ACIPOL só tem contacto com a polícia no
4º ano? Porque não se pode capitalizar o período de férias do cadete, no seu
local de origem, para entrar em contacto com a unidade policial da zona,
trabalhar lá e fazer um relatório no fim? Pelo menos duas semanas, para se
familiarizar. Há falta de contacto com a polícia e, por isso, os cadetes ficam
sem ideias para elaborar assuntos de pesquisa de interesse policial. Essa
familiarização devia começar a partir do 2º ano e não no 2º semestre do 4º
ano (AC10-egresso).
Em seguida, procuramos explorar as opiniões dos participantes que possam
contribuir para melhorar a formação na ACIPOL.
Perg.1-Anexos 3,4 e 5. O que acha que deve ser melhorado na formação de oficiais da
Polícia?
O eixo central identificado nessa pergunta perpassa pela reestruturação e
melhoramento da organização, planificação, coordenação das actividades de formação
e a preparação de todos os actores que actuam na formação.
-O melhoramento da formação dos oficiais da polícia deve ter como base o
melhoramento da: organização, planificação, coordenação e a preparação de
todos os actores que actuam na formação (AC1-grupo focal 1).
191
-Alguns dos apectos que devem ser melhorados são: a formação dos docentes,
reestruturar o corpo de alunos, preparar as infrastruturas de ensino, reforço
das horas de contacto com a prática, por exemplo, laboratórios e tiro,
melhorar as salas de aula e rever os meios didácticos; um laboratório policial
onde tenha todos os equipamentos de trabalho da polícia (AC3-grupo focal 1).
As afirmações acima registadas (AC1 e AC3) levantam uma série de questões
relacionadas com a organização do estágio e da formação policial em geral. No entanto,
há ideias-chave que levantam problemas específicos tais como a formação do corpo
docente policial próprio e o incremento das horas de contacto com a prática. Um dos
pontos identificados como crítico é a formação profissional prática. O que se percebe é
que a formação actual “não comunica com a realidade, ela faz comunicados”. É
necessário tornar a articulação entre a teoria e a prática uma realidade da formação e da
vida profissional dos oficiais da Polícia. Porém, esse ponto se vincula necessariamente
a um corpo docente devidamente preparado.
-Os cadetes que tem aparecido na esquadra para estagiar demonstram que têm
bons conhecimentos teóricos, mas são muito fracos em aspectos práticos. Por
isso, nós achamos que devem ser submetidos a actividades de patrulhamento,
de permanência, de investigação de delitos e de protecção de objectivos
estratégicos, entre outras actividades (CM1- grupo focal 2).
-Deviam ser realizadas visitas de estudo às unidades e subunidades da PRM
onde seriam dados esclarecimentos nos próprios locais das unidades, por
exemplo visita à medicina legal, FPAI, FIR, FER65, etc, etc,. Deve-se planificar
aulas teóricas e aulas práticas e deve-se incentivar a pesquisa, facto que passa
necessariamente pela ligação com o DEIPLA66 que devia fornecer informações
sobre os aspectos de interesse policial; a questão da esquadra-escola devia ser
retomada com seriedade; dos mestrados que estão sendo feitos, qual é que está
ligado a área policial? Quase que nenhum (AC2-grupo focal 1).
65 FPAI – Força de Protecção de Altas Individualidades; FIR – Força de Intervenção Rápida; FER – Forças Especiais e de Reserva. 66 DEIPLA – Departamento de Informação e Plano.
192
Um dos problemas levantados pelos participantes da pesquisa está relacionado
com o processo de ingresso na ACIPOL. Eles afirmaram que é necessário melhorar o
processo de ingresso como requisito específico para a melhoria do processo de
formação dos futuros oficiais. O que se pode perceber é que se “acusa” falta de
transparência nos processos de ingresso na ACIPOL. Questiona-se o mérito dos
candidatos que são admitidos, facto que acaba influenciando negativamente o processo
de formação. Quando se fala da superlotação das turmas ficam levantam-se problemas
organizacionais, problemas de admitir mais candidatos do que a capacidade instalada,
factores que têm a ver com a pressão externa sobre a academia por autoridades com
poder para isso.
-Deve retomar-se os critérios objectivos (transparência, imparcialidade) na
selecção dos candidatos ao curso; reduzir ou mesmo inibir as interferências
externas que produzem impactos negativos na formação policial; criar um
laboratório de trânsito para as aulas de trânsito e segurança rodoviária;
preparar formadores para cada área; Há fortes interferências externas no
processo de formação e isso é que de alguma forma concorre para a
superlotação das turmas. Deve evitar-se a superlotação das turmas na
academia e organizar melhor o enquadramento. O outro problema que em
minha opinião mancha o processo de ingresso é que a maioria dos admitidos
são só candidatos do sul, do centro e norte só vem duas ou três candidatos
(AC5-grupo focal 1).
-Na selecção dos novos candidatos deve se introduzir os exames psicotécnicos,
pois pressupõe-se que quem lida com a segurança das pessoas deve ser um
indivíduo mentalmente são; melhorar a organização da academia; os docentes
civis devem ter um enquadramento para se identificarem com a instituição e
seus objectivos. Como ensinar o cadete a comportar-se como polícia se os
docentes mostram certo liberalismo (AC9-grupo focal 1).
-O ingresso deve ser com base num exame de admissão para todos candidatos
de modo a aferir melhor qualidade dos mesmos, dada a situação da má
qualidade do ensino nos níveis anteriores (ENP2);
O ingresso para os cursos de graduação em ciências policiais na ACIPOL é
regido pela Lei do Ensino Superior em Moçambique operacionalizado por meio de um
193
concurso público (Edital) que é divulgado pela ACIPOL em cada período de admissão.
Esse Edital estabelece os requisitos e condições de concurso de ingresso em cada época
acadêmica, observando as disposições conjugadas da Lei nº 27/2009 de 29 de Setembro
(Lei do Ensino Superior) com o Decreto Lei nº 28/99 de 24 de Maio (Estatuto do
Polícia) e o Diploma ministerial nº 86/90 (que institui os exames de admissão para o
ingresso no ensino superior em Moçambique), conforme indica o quadro abaixo.
Quadro 2:Disposições legais que regulam o ingresso na ACIPOL
O currículo deve ser entendido como processo, que envolve uma multiplicidade
de relações, abertas ou tácitas, em diversos âmbitos, que vão da prescrição à acção, das
administrativas às práticas pedagógicas, na Academia como instituição e nas unidades
formativas especificamente. Para compreendê-lo e, principalmente, para elaborá-lo e
DISPOSITIVO LEGAL ARTICULADO CONTEÚDO
LEI Nº 27/2009, de 29 de
Setembro – Lei do
Ensino Superior
Capítulo I, Secção I
Artigo 4:
(Acesso ao ensino superior)
1. As condições de acesso a cada instituição de ensino superior são
regulamentadas pela referida instituição, de acordo com os seguintes
parâmetros:
a) enquadramento legal existente e políticas nacionais do sector;
b) preferência do candidato, o seu nível de conhecimento científico e
aptidões;
c) capacidade da respectiva instituição.
Diploma Ministerial nº
86/90 de 26 de Setembro
Institui os exames de admissão às instituições do ensino superior em
Moçambique
Decreto Lei nº 28/99, de
24 de Maio (Estatuto do
Polícia)
Capítulo II
(Ingresso, formação e
avaliação);
Secção I – Ingresso;
Artigo 20-Requisitos gerais
Artigo 21, nº 3-Requisitos
especiais
Artigo 21, nº 3 – Requisitos especiais
a) Habilitações literárias mínimas 12ª classe ou equivalente;
b) Ter idade mínima de 18 e máxima de 22 anos para os
civis;
c) Ter idade mínima de 18 e máxima de 26 anos para os
membros da PRM e ex-militares.
Artigo 26, nº2 – acesso à formação policial
O ingresso nos estabelecimentos de ensino para os cursos de
formação policial é efectuado na sequência dum anúncio público,
mediante provas de admissão e com estrita observância dos
princípios de igualdade, mérito, aptidão, publicidade e transparência.
ACIPOL
Academia de Ciências
Policiais
EDITAL
Estabelece os requisitos e condições de concurso de ingresso em cada
época acadêmica,observando as disposições conjugadas da Lei nº
27/2009 com o Decreto Lei nº 28/99 e o Diploma ministerial nº
86/90.
194
implementá-lo de modo a transformar o ensino, é preciso reflectir sobre grandes
questões (SACRISTÁN,1998, p.13).
O currículo compreende também os programas, que dispõem os conteúdos
básicos de cada componente e as indicações metodológicas para seu desenvolvimento.
Por conseguinte, organização do trabalho pedagógico. A formação policial, como
formação profissional, carece de clarificação do que se pretende que em cada nível, em
cada área de conhecimento e no curso todo o formando alcance. O que se pode
perceber da afirmação que se segue é que na formação deve ser melhorada também a
clarificação dos conteúdos ministrados em cada disciplina.
-É preciso descrever-se claramente o perfil de saída do oficial da polícia, mas
o currículo não ajuda. Por exemplo, as aulas que são dadas no trânsito não se
diferem daquilo que é dado na escola de condução. Será esse o objectivo da
formaçã? (AC11-grupo focal 1).
No entanto, é necessário pensar-se numa formação diferenciada para os ramos
especializados da Polícia, tais como a Polícia de Investigação Criminal (PIC) e Polícia
de Trânsito (PT). Formação diferenciada significa especialização, mas no caso do curso
de Licenciatura em Ciências Policiais, que não inclui a especialização, por formação
diferenciada entende-se a orientação para as especialidades. Esta matéria embora eteja
já acautelada no currículo revisto que entrou em vigor no ano 2013, continua sem
clareza sobre como serão realizadas as práticas pré-profissionais e o estágio curricular
supervisionado, tendo em conta a estruturação do currículo revisto em tronco comum e
orientação para a especialidade.
-Para os casos da PIC e da PT é preciso pensar em cursos próprios, porque os
finalistas que recebemos nem sabem por onde começar um auto. Eles têm uma
informação geral sobre o que é a PIC ou PT, mas não estão em condições de
fazer nada. Por isso, quando chegam nós organizamos um pequeno curso de
capacitação (CM3- grupo focal 2).
-A sociedade diz que o tratamento dos criminosos não está sendo adequado,
daí a justiça pelas próprias mãos. E nós insistimos em dizer que não pode ser
assim, devem ser usadas as instituições de administração da justiça instituídas.
Mas isso precisa de um meio termo que só pode ser encontrado através da
195
pesquisa, e a ACIPOL poderia arrancar com a iniciativa. Esta é uma questão
que nos pressiona no trabalho normal, porque fazemos reuniões de ligação
polícia-comunidade, mas em seguida há linchamentos. Então precisamos de
descobrir qual seria a alternativa de solução deste problema e alertar, se
necessário, os órgãos de administração da justiça. Aqui a ACIPOL tem um
vasto campo de pesquisa. É verdade que estamos numa fase embrionária, mas
não podemos estar a defender coisas que para a sociedade estão
ultrapassadas ou inadequadas (EDPF/SF/12).
A afirmação supracitada feita por um dirigente de nível provincial, participante
da pesquisa, levanta dois aspectos que ele classifica de bastante importantes para
melhorar a formação, ou melhor, a serem melhorados na formação. Trata-se da
pesquisa, direccionada para o campo do trabalho policial, como forma de descobrir
demandas que preocupam a população; o outro aspecto está relacionado com as
práticas das relações comunitárias, dando exemplo das reuniões de ligação polícia-
comunidade. O problema que o interlocutor levanta é “qual é a mensagem que a polícia
leva para essas reuniões. Será que essa mensagem é do interesse da população”? É a
partir da necessidade de entender as preocupações da população que ele afirma que se
deve tornar a pesquisa num mecanismo para melhorar a formação.
-No geral, eu acho que a formação dos polícias deve começar da selecção e
do recrutamento, porque nós podemos pegar nos polícias e meter nos centros
de formação, mas se o mal começou no recrutamento e na selecção, não vamos
ter bons polícias, nos tempos passados, as pessoas que iam à polícia eram
pessoas idôneas, pessoas bem disciplinadas e iam lá fazer bons cursos. Mas
hoje em dia, não há rigorosidade na selecção dos polícias, em termos de
comportamento, em termos de verificação da vocação, as pessoas vão para a
polícia como refúgio, porque há falta de emprego, quando se inscrevem às
vezes escapam nos processos de selecção e conseguem ingressar, outros
entram na polícia porque acham que entrando na polícia vão ter facilidades
de ter arma para fazer assaltos à mão armada, essas pequenas coisas quando
eles voltam a gente nota que este foi para a polícia para conseguir algo que
está fora do seu controle (poder e arma). Então, temos no geral esses
problemas (EDO/SF/12).
196
Na resposta do participante (EDO/SF/12) estão expressas várias idéias
diferentes sobre o que devia ser melhorado na formação dos oficiais da Polícia. Uma
delas se refere aos critérios de recrutamento e selecção dos candidatos ao curso de
oficiais eu acho que a formação dos polícias deve começar do recrutamento e da
selecção. Nessa idéia ele associa o processo de recrutamento ao resultado da formação
e não inclui o processo de formação como capaz de desenvolver nos formandos o perfil
que se pretende de um oficial subalterno. Embora não expressa explicitamente, pode-se
perceber que valoriza mais os processos do “passado” que provavelmente foi a sua
realidade, sustentando-o por termos como “idoneidade”, “vocação” e “disciplina” e, por
isso, faziam “bons cursos”.
A outra idéia que pode ser percebida nas respostas do mesmo participante é de
que para os cursos da Polícia ingressam marginais que se inscrevem com o propósito de
usar de forma ilegal e abusiva o poder de Polícia e a arma de fogo para fins pessoais.
Percebe-se aqui que o participante associa esta idéia à falta de “rigor” não só da
instituição formadora, como também da corporação policial que alberga os referidos
marginais depois da sua formação. Mas também pode-se perceber que é um “desabafo”
com teor apelativo para o melhoramento dos critérios de selecção e os métodos de
gestão dos efectivos pós-formação.
A pergunta que se segue visava colher informações que seriam cruzads com os
dados recolhidos através de entrevistas e questionários nas esquadras sobre as
actividades nas quais os comandantes e chefes das operações despendem mais tempo.
Perg.(geral)-Anexos 1 a 5. Actividades policiais consideradas mais difíceis
A Polícia moçambicana, quanto à natureza, é um modelo híbrido, conjugando
carcterísticas de três modelos descritos por Brodeur e Landreville (1983), citados por
(LEITÃO 2007, p.2):
a) O controle da actividade criminal, incluindo o registo, prevenção, detecção,
aplicação da lei, detenção e recuperação de bens furtados, em coordenação ou
não com o poder judicial.
b) A Manutenção da ordem, e da tranquilidade sociais, seja no âmbito da reposição
da ordem como da sua manutenção através da vigilância e imposição da
197
“normalidade social” ou das conformidades sociais, num conceito mais
sociológico;
c) A Prestação de serviços à comunidade, também chamadas de assistência social,
disponibilidade para situações de emergência, cooperação com outras entidades,
reencaminhamento para serviços adequados à solicitação, aconselhamento
jurídico, e outros.
Por causa dessa condição híbrida da natureza da Polícia de Moçambique,
algumas actividades são consideradas mais complexas e mais difíceis de realizar que
outras. Aos participantes desta pesquisa foi perguntado que actividades consideravam
mais difíceis, ao que deram as seguintes respostas:
-Encaro mais dificuldades na elaboração de relatórios, dado que fiz uma
formação geral e fui enquadrada numa especialdade, ou seja numa área
específica que exige muito mais (ESF1);
-A grande dificuldade no sector onde trabalho é a falta de definição das
competências ou atribuições do sector. Isto remete-nos muitas das vezes a ter
uma ordem com prioridade (ESF2);
-No sector onde trabalho encaro mais dificuldades na realização de análises
químico-legais (ENP1);
-No presente momento, a minha tarefa é de lidar com efectivo, e cada
indivíduo tem suas particularidades e também alguns membros principalmente
os antigos resistem às novas idéias. É difícil fazer gestão de pessoas (ENP2);
-O que é mais complexo é a planificação devido à ausência de instrumentos
orientadores e na instrução de processos disciplinares devido à existência de
legislação obsoleta (ENP3);
-O mais difícil para mim é a forma como se planifica e administra uma
esquadra ou sub-unidade equiparada, seja de protecção de VIP’s67, eventos,
etc (ENP4).
-O mais difícil é o patrulhamento numa altura em que os efectivos em relação à
população são muito irrisórios, não facultando de certo modo a cobertura geral
da vigilância policial (CDNPL1);
67 VIP’s (very important persons) – na linguagem policial significa Altas Individualidades
198
-As actividades que considero mais difíceis no meu posto de trabalho são as
operativas, para esclarecer um caso criminal ocorrido na minha área de
jurisdição (CDNPL3);
-O mais difícil é a actividade de patrulhamento que envolve esclarecimento de
delitos ora cometidos por desconhecidos (CDNPL5).
Podemos constatar que a maior parte das respostas dadas tem como base as
actividades que cada participante realiza e a sua experiência de trabalho. Também
podemos notar que há tendência de juntar várias idéias na mesma resposta, porém
querendo referir a componente diferentes da resposta. Por exemplo, Actividade de
patrulhamento que envolve esclarecimento de delitos ora cometidos por desconhecidos
(CDNPL5).
Neste trecho de resposta o participante considera difícil o patrulhamento para
prevenir delitos, por um lado, por outro, considera difícil esclarecer delitos cometidos
por autores não conhecidos.
Nas respostas podemos notar também que, quase todas elas, consideram difíceis
as tarefas de natureza operacional, com algumas excepções que apontam para as tarefas
de natureza administrativa e de gestão. No quadro 3 apresentamos o resumo das onze
actividades mais significativas consideradas difíceis e citadas por mais do que um
participante.
Quadro 3: Actividades policiais consideradas difíceis N/O ACTIVIDADES DIFÍCEIS ÁREA 01 Elaboração de relatórios Operacional 02 Gestão de pessoas (efectivos) Gestão 03 Planificação Operacional 04 Patrulhamento preventivo Operacional 05 Instrução de processo criminal Operacional/Técnica 06 Instrução de processos disciplinares Gestão 07 Protecção de VIP’s Operacional 08 Administração de uma esquadra ou sub-unidade Gestão/ Operacional 09 Esclarecimento de casos criminais ocorridos Operacional 10 Motivação dos efectivos Gestão/Liderança 11 Análises químico-legais Técnica
Conforme se pode notar no resumo do quadro acima não constam, por exemplo,
actividades de relações comunitárias. A presença do polícia na comunidade permite
199
estabelecer a denominada “mediação de conflitos”. Essa técnica humanística ajuda os
membros da comunidade na busca de consenso para desavenças sanáveis. Sem isso, os
conflitos humanos podem evoluir para ameaças, agressões e homicídios, originando um
clima de insegurança no seio da comunidade, além de transformarem-se em
ocorrências policiais processos judiciais e sistemas carcerários(VENDRAMINI, 2010,
p.131).
Não há uma mensuração do benefício que a mediação de conflitos traz à
sociedade, mas certamente contribui para a democracia, a paz, a economia e o
progresso social do País. Somente o políca treinado, dotado de sensibilidade humana,
comunitário, próximo e com credibilidade poderá exercer esse papel junto à
comunidade (ibidem).
A pergunta que se segue visava aprofundar as opiniões dos participantes sobre o
que deviam ter aprendido durante a formação para melhor responder às exigências
profissionais que enfrentam.
Perg. (geral)-Anexos 5,6,7. Que competências (conhecimentos, habilidades e atitudes)
você acha que os polícias deveriam ter no final da sua formação (superior) na ACIPOL?
-Os graduados da ACIPOL deviam ter, para além de conhecimentos teóricos,
domínio de actividades policiais práticas e habilidades de ligação com as
comunidades. Deviam ser mestres em artes marciais. Entendo que no campo
teórico eles são bons,mas no campo operacional há muitas lacunas, é preciso
fortalecer essa componente prática para eles servirem de modelo
(EDPF/SF/12).
Na resposta deste participante nota-se, mais uma vez, a preocupação sobre a
articulação da formação com o campo prático da actividade policial e o ponto de
incidência é a área policial. Quando afirma que mas no campo operacional há muitas
lacunas, refere-se claramente às actividades policiais de natureza operacional, tal como
foi identificado pelo resultado do inquérito específico aos comandantes de esquadras e
chefes das operações. A outra idéia que é apresentada se refere mais à expectativa que
ele tem sobre os graduados da ACIPOL. Esta passagem: fortalecer essa componente
prática para eles servirem de modelo. Pode-se perceber que o modelo por ele referido
tem como base a competência técnico-profissional que o graduado devia demonstrar na
200
actividade policial concreta, (...) principalmente para a questão de transmissão de
valores, porque o que se verifica neste momento é que os valores dos egressos são
baixos, razão pela qual nalgumas situações temos estado a chamar à atenção, por
exemplo, na forma de lidar com a população, porque um polícia deve ser modelo de
bom cidadão dentro e fora do serviço. A falta dessa ligação é que origina, em parte, os
problemas de comportamento a que me referi e, consequentemente, a falta de
confiança para com esses egressos (alguns deles). Alguns já têm processos
disciplinares e criminais, outros já cumpriram prisões disciplinares. Quando é um
egresso da ACIPOL a ser detido ou sancionado o impacto negativo é maior do que
quando se trata de um guarda porque julga-se que o tempo de 4 anos que levou na
formação é suficiente para ele ser modelo e respeitado. Contudo, entendo que a
formação não termina na escola, os comandos provinciais devem dar continuidade
(EDPF/SF/12).
Várias idéias podem ser identificadas no depoimento acima, mas a primeira
delas é a que se refere aos “valores” que em sua opinião deviam ser transmitidos dos
profissionais (polícias) mais velhos aos mais novos. Pode-se perceber que tais valores
vão desde os relacionados com a cultura policial desenvolvida por aqueles que estão e
servem há mais tempo a corporação até aos éticos e deontológicos, que sustentam um
relacionamento saudável com a comunidade: (...) razão pela qual nalgumas situações
temos estado a chamar à atenção, por exemplo, na forma de lidar com a população,
porque um polícia deve ser modelo de bom cidadão dentro e fora do serviço (...).
Aqui nota-se, portanto, a preocupação que o participante demonstra sobre a
relação entre a Polícia e a comunidade e que acredita ser um aspecto primordial da
competência do oficial da Polícia, e que deve ser desenvolvido durante a formação.
Podemos aferir que há uma clara alusão de que a primeira coisa que a polícia precisa
fazer hoje é acreditar nos valores e princípios basilares que a norteiam. Sobre essa
matéria, Da Silva esclarece que:
Ética, Legalidade, Planejamento, Técnica e Ação de Comando formam o pentagrama de atuação de um comando de polícia nos ideais do Estado Democrático de Direito para a preservação da ordem pública. Dentro desse diapazão, pode-se citar o primeiro valor-fonte das ciências policiais que é a protecção integral aos Direitos Humanos, ou seja, agirir com a finalidade de propor segurança aos interesses e às garantias individuais e colectivas da pessoa, quer seja natural ou jurídica, pública ou privada (DA SILVA, 2010, p.66).
201
A outra idéia que podemos registar é a que se relaciona com a formação
contínua do graduado da ACIPOL, dentro do princípio de formação ao longo da vida,
ao afirmar que Contudo, entendo que a formação não termina na escola, os comandos
provinciais devem dar continuidade. A formação ao longo da vida é um princípio
integrante dos quatro pilares de educação para o século XXI e muito debatido nos
campos académcos e sócio-profissionais. Seu conteúdo, significado e alcance podemos
encontrar, por exemplo, na abordagem analítica e histórica da formação do conceito de
competências desenvolvida por Chizzotti & Casali.
(...). A formação ao longo da vida, como analisa Gaussel (2011), remete à redefinição da articulação entre a educação básica e a superior e os processos de aprendizagem dos adultos, em especial as relações entre os saberes acadêmicos e os saberes profissionais, a universidade e a formação após a educação básica, tema esse que o marco de referência europeu procura solucionar (CHIZZOTTI & CASALI, 2011, P.15).
Ao remeter a responsabilidade da continuidade da formação dos graduados da
ACIPOL aos comandos provinciais, o participante não só chama a atenção para o
processo de integração dos graduados nos comandos como, também, procura despertar
a consciência dos próprios graduados para esse processo.
Pergs.4,6,7-Anexos 3,4,5. Em que aspectos a formacão devia incidir mais: Que aspectos
ou matérias acha que deveriam ser introduzidos ou acrescentados na formação em
ciências policiais?
O currículo revisto da ACIPOL fixa como finalidade da formação em ciências
policiais que:
(...) O plano curricular tem como finalidade permitir que os oficiais formados possam contribuir para a melhoria do desempenho nas áreas de Segurança Pública; Investigação Criminal e Criminalística; Migração e Fronteiras; Administração e Logística Policial. Por outro lado, o desenvolvimento de um sistema de valores éticos e deontológicos prosseguidos através de uma nova atitude, ao nível do comando e liderança, constitui também objectivo da formação de oficiais de nível superior. Assim, espera-se que o licenciado em Ciências Policiais contribua para a introdução de métodos de trabalho mais eficientes e adequados às necessidades operativas (p.4).
202
Quando questionados sobre que aspectos (em termos de áreas de conhecimento
ou conteúdos) a formação superior de oficiais da Polícia deveria focalizar mais, as
respostas foram variadas, mas, de forma geral os comandantes distritais e de esquadras
tendem a mencionar as áreas policiais “tradicionais”, isto é, aquelas que constituem os
processos policiais habituais. Todos mencionam a planificação, a ética e deontologia
profissional, a investigação de delitos praticados por autores desconhecidos e as
relações com a comunidade.
Em contrapartida, os oficiais recém-graduados (egressos da ACIPOL) para além
das tradicionais, tendem mais para áreas especializadas, áreas ou matérias novas tais
como empreendedorismo, investigação de crimes cibernéticos e tráfico de pessoas.
Os comandantes distritais e de esquadras em Sofala incidiram as suas respostas
no seguinte:
-Em primeiro lugar deve-se ensinar os conceitos policiais, cultura policial,
civismo, formação geral em conhecimento universal, especialização, patrulhar
o campo prático (ICO/SF3);
Matéria policial e ciências universais para permitir o conhecimento global dos
membros oficiais da polícia (ICO/SF1);
Nas respostas dos dois participantes supracitados pode-se pereceber qua as suas
ideias extravasam as áreas policiais tradicionais para outras que em suas opiniões
permitem o oficial ter conhecimento global, quando afirmam, por exemplo, que (...)
formação geral em conhecimento universal; (...) e ciências universais para permitir o
conhecimento global (...).
Também fazem menção à especialização o que nos permite perceber que há
precocupação em que os graduados tenham um certo direccionamento às
especialidades. É verdade que essa orientação para as especialidades já está acautelada
no currículo revisto, como já mencionamos acima, mas a opinião é legítima porque esse
curículo (revisto) só entrou em funcionamento no início do ano académico de 2013, o
que significa que os primeiros graduados (nesse currículo) só sairão em 2017.
-Para mim seria a matéria da técnica policial, tática policial e incidir mais na
matéria que diz respeito o cotodiano policial, e deontologia profissional
(ICO/SF2);
203
-Actividade de liderança (direcção), planificação, controlo de massas e de
grandes eventos, técnicas de prevenção ao crime e de investigação (ICO/SF4);
-Giro, patrulha, sectorização, planficação. Isto para poderem dirigir as bases,
só se instruir no que se domina. Matéria de direito no geral, com ênfase no
direito administrativo, direito penal e processual penal (ICO/SF5).
A leitura que se pode fazer das três respostas acima é que as opiniões cingem-se
naquilo que já mencionamos como áreas ou actividades tradicionais de função policial,
tais como planificação (operacional) e a prevenção e investigação dos crimes.
Em Nampula, sobre a mesma questão os comandantes de esquadras deram as
seguintes opiniões:
-Técnicas policiais para cada vez mais ter o domínio de actuação e técnicas,
sobretudo, para a captura de infractores. A componente jurídica que é um dos
elementos chave para o trabalho policial (CDNPL1);
-Com maior profundidade, deveria se ensinar a forma de dirigir (CDNPL2);
-Acho que deveriam ser ensinadas, com maior profundidade nos cursos de
formação de oficiais de Polícia. Noções fundamentais de direito
administrativo, Polícia administrativa aplicada, treinos militares, sociologia e
psicologia (CDNPL3);
-Matéria sobre o que foi Moçambique antes da independência e depois da
guerra (CDNPL4);
-Que seja introduzida a disciplina militar por forma a existir um respeito
militar hierarquicamente. Constar teoria e prática dentro da formação –
existência de uma Esquadra na Academia para o efeito (exclusivamente)
(CDNPL5);
Por sua vez, os graduados (egressos) da ACIPOL que trabalham na província de
Sofala onde foram inquiridos, quanto à mesma questão deram as seguintes opiniões:
-Tratando-se de formação de oficiais, devia se incidir mais na matéria de
Direcção (comando e liderança) e nos aspectos práticos ligados à
especialidade que cada um devia seguir (ESF4);
204
-Devia se incidir mais na carreira de tiro, actualmente temos acompanhado
muitos problemas de falta de perícia no disparo. Outro ponto tem a ver com
intercâmbios de conhecimentos com estudantes de outras faculdades (ESF1);
-Deveria ser mais para matéria de âmbito policial. Aspectos ou matérias a
introduzir são: actividades de primeiros-socorros e alguma que tenha a ver
com crimes cibernéticos e tráfico de pessoas (ESF5);
-Tendo em conta que o trabalho policial nota-se mais na Esquadra, sou de
opinião que deve-se ensinar como elaborar um auto na prática, não só na
teoria, e aprofundar-se mais o Direito Penal (ESF2);
-A formação deveria incidir mais na área de planificação operativa e na
instrução processual (ESF3);
-As cadeiras policiais com docentes qualificados e não indivíduos escolhidos
em função da experiência ou tempo de serviço (ESF).
Quadro 4: Matérias de aprendizagem sugeridas pelos graduados/Sofala N/O MATÉRIAS SUGERIDAS ÁREA
01 Direcção (Comando e Liderança) Gestão
02 Carreira de Tiro Operacional
02 Actividades de Primeiros-Socorros Operacional
03 Crimes Cibernéticos Investigação
04 Tráfico de Pessoas Operacional
05 Planificação Operativa Planificação
O6 Instrução Processual Investigação
07 Direito Penal Operacional
08 Elaboração de Peças de Expediente Operacional
Aos graduados (egressos) da ACIPOL que trabalham na província de Nampula
foi colocada a mesma questão, tendo dado as seguintes opiniões:
-Introduzir no âmbito da Polícia Administrativa Aplicada (PAA) uma espécie
de práticas policiais, onde os estudantes pudessem aprender a fazer ou se
familiarizar fazendo tarefas de cada uma das áreas de intervenção policial
(seria uma espécie de Comando Modelo) ou simplesmente pensar-se numa
205
orientação específica do estudante no 4º ano (uma espécie de especialização).
Introduzir a cadeira de serviço social e empreendedorismo; As matérias de
PAA devem ser acompanhadas por pesquisas constantes do discente (ENP1);
-A formação policial deveria incidir mais nas cadeiras policiais como Policia
Administrativa Aplicada, com um corpo docente com domínio dessa cadeira
(ENP2);
-Deveria introduzir curso de especialização (ENP3);
-Dever-se-ia especificar as áreas, ou seja, as especialidades, evitar
dependermos da sorte ou do “Deus dará” para sermos enquadrados noutras
áreas como PIC, PT, etc. (ENP4);
-Tratamento digo, instruir-se aos cadetes como se fazem os processos desde a
denúncia até a tramitação ao juiz de instrução (ENP5).
Nas respostas acima transcritas, várias ideias-chaves podem ser assinaladas
relativamente ao que os participantes da pesquisa (graduados da ACIPOL em Nampula)
consideram como matérias ou conteúdos a serem ministrados nos cursos de formação
policial na ACIPOL.
O participante “ENP1” debruça-se, por exemplo, sobre a necessidade de se
introduzir as práticas pré-profissionais. Esta ideia, que constitui um dos focos da
presente pesquisa, não é em si nova, porque no currículo vigente da ACIPOL (o antigo)
consta como matéria curricular. Porém, e como já mencionamos no capítulo
introdutório desta pesquisa, nunca foram realizadas. Daí a pertinência de considerar
esta opinião como procedente.
O mesmo participante apresenta outras ideias que podem ser consideradas tanto
como elementos relacionados com a estruturação e planificação dos cursos, como com
os conteúdos a serem ministrados. Trata-se das ideias sobre a realização de práticas
policiais concretas pelos estudantes em unidades para o efeito seleccionadas, que
serviriam de modelo, a pesquisa em Polícia Administrativa Aplicada (PAA), e a
introdução das novas cadeiras de serviço social (entenda-se como serviços de socorro e
apoio à comunidade) e empreendedorismo.
Nas contribuições dos paticipantes ENP2, ENP3 e ENP4 nota-se a coincidência
na necessidade de orientação para as especialidades. Na ideia do participante ENP5, a
ideia que subjaz às matérias de intrução processual até à submissão do processo à
instância judiciária (juiz) está relacionada com o sistema de justiça moçambicano,
206
considerada deficitária por o agente instrutor do processo criminal não fazer
acompanhamento do mesmo até ao seu desfecho, isto é, o julgamento.
Durante o debate realizado no grupo focal 1, realizado na ACIPOL com um
guião próprio (anexo 5), as opiniões registadas são as seguintes:
-Tudo está no currículo vigente (AC1);
-Artes marciais, isto é, defesa pessoal é fraca, os cadetes não têm instrução
sobre isso. O tempo que a formação em ciências policiais leva dá para formar
um cinturão negro (AC2);
-Conhecimentos vinculados nas 4 áreas de estrutura do currículo; - Deve
olhar-se para a formação integral (AC3).
-Esta questão pode ser discutida em várias vertentes. Alguns consideram que
um polícia fisicamente bem preparado raciocina melhor. Deve ter habilidades
de comando, porém, tudo deve ser feito dentro dos limites que têm a ver com o
tipo de cadetes que se tem, logo, tem também a ver com a selecção que é feita
(AC4).
Em seguida, registamos as opiniões resultantes do grupo focal 2 realizado na
cidade de Maputo:
-Primeiro eu acho que ele (o graduado) devia ser disciplinado, saber cumprir
as ordens e ser humilde; depois, devia ser bom operativamente: saber analisar
a situação criminal e saber que medidas devem ser tomadas e saber dar
relatório às estruturas competentes (CM1);
Das afirmações do participante (CM1) acima transcritas podem ser registadas
pelo menos três ideias relacionadas com matérias a serem ministradas nos cursos de
graduação em ciências policiais: análise criminal, resposta policial e comunicação
policial (relatório policial).
-Acho que um recém graduado nunca será bom antes de começar a trabalhar
na realidade; no terreno quando a situação muda o cadete esquece tudo o que
aprendeu na escola e perde a cabeça, mas quando já tem alguma experiência
até sabe interpretar os fenómenos. Por isso, acho que o que ele precisa é ter
207
contacto regular com a realidade antes de terminar o curso para saber o que
lhe espera depois (CM12).
Na intervenção deste participante (CM12) a ideia fundamental que se regista é a
da necessidade de a formação policial ser feita em articulação com o ambiente do
trabalho policial concreto.
-Um oficial tem que estar em condições de orientar o trabalho operativo, fazer
planos operativos, saber trabalhar com a população e, sobretudo saber
atender as situações de emergência, também saber coordenar com outras
forças de defesa e segurança. Mas há um aspecto que é imporante que há
cadetes que já eram polícias e outros que são novos ingressos. Para os novos é
um pouco complicado, esses deviam ser ensinados mais matérias policiais
operacionais (CM3).
Nas respostas do participante (CM3) estão subjacentes três ideias relacionadas
com as matérias que deveriam ser ministradas nos cursos de graduação da ACIPOL: a
elaboração dos planos operativos, a ligação com a comunidade e o atendimento a
emergências.
Os comandantes distritais e de esquadras da província de Gaza apresentaram as
seguintes opiniões sobre as matérias que deveriam ser leccionadas nos cursos de
graduação em ciências policiais.
-Conhecimentos em especialidades (CDG1);
-Ao longo da formação para além de matéria de índole criminal e sociológico
deveria se pensar na seriedade de moldar os cadetes na preparação combativa
e educação patriótica (CDG5);
-Os policias formados na ACIPOL deveriam estar dotados de conhecimento de
direito criminal, administrativo (CDG2);
-Acho que após a formação deveriam ser instruídos antes da sua saída sobre
as responsabilidades que vão assumir levando a sério esta instrução para bem
estar do povo mesmo dele” (CDG3);
208
-Ao fim da formação deviam ter conhecimentos ou deviam ser divididos e
formados em especialidades, PIC, PT e outras áreas da policia, para permitir
a sua inserção real (CDG4);
-O estágio, digo depois da formação, durante o estágio devem dedicar-se à
busca da experiência acumulada nos polícias antigos (CDG5);
Depois da formação deveriam passar por uma reciclagem como oficiais de
permanência por um período para se familiarizar com o trabalho policial e
fazendo patrulha (CDG6).
Manfredi (1999, pp.9-10) argumenta que (...) A qualificação de um indivíduo é
sua capacidade de resolver rápido e bem os problemas concretos mais ou menos
complexos que surgem no exercício de sua actividade profissional. O exercício dessa
capacidade implicaria a mobilização de competências adquiridas ou construídas
mediante aprendizagem, no decurso da vida activa, tanto em situações de trabalho
como fora deste, reunindo:
- o saber fazer, que recobre dimensões práticas, técnicas e científicas, adquirido
formalmente (cursos/treinamentos) e/ou por meio da experiência profissional;
- o saber ser, incluindo traços de personalidade e caráter, que ditam os
comportamentos nas relações sociais de trabalho, como capacidade de iniciativa,
comunicação, disponibilidade para a inovação e mudança, assimilação de novos
valores de qualidade, produtividade e competitividade;
- o saber agir, subjacente à exigência de intervenção ou decisão diante de
eventos - exemplos: saber trabalhar em equipe, ser capaz de resolver problemas
e realizar trabalhos novos, diversificados.
Pode-se considerar que esta é a visão que permeia o desenho do perfil ideal de
qualificação nas organizações inovadoras. Há, pelo visto, nítida convergência entre as
organizações de diferentes sectores e características, quanto aos traços mais relevantes
desse perfil, em matéria de conhecimentos, habilidades, atitudes e características
pessoais (ibidem).
Perg.(geral)-Anexos 5,6,7. Que actividades os cadetes realizam na esquadra durante o estágio curricular?
209
Esta pergunta foi dirigida especificamente aos 33 cadetes do 4º ano de
graduação em ciências policiais (finalistas) que tinham já realizado o estágio nas
esquadras da Polícia. A intenção era compreender em que actividades foram engajados
durante o estágio e colher suas opiniões sobre a compatibilidade dessas actividades
com o seu programa de formação.
Em seguida apresentamos o quadro geral das actividades que os cadetes
mencionaram como tendo realizado durante o estágio. No inquérito participara 33
cadetes. De salientar que o estágio foi realizado nas esquadras dos comandos
provinciais de Maputo – cidade da Matola e na Cidade de Maputo. O quadro indica as
áreas de actuação, as actividades realizadas e a frequência das respostas.
Quadro 5: Actividades que os cadetes realizam na esquadra durante o estágio N/O ÁREA ACTIVIDADES FREQ.
01 Organização da Esquadra
- ligação com a comunidade da zona de jurisdição da esquadra, elaboração das escalas de serviço ; - planificação da actividade operacional, tarefas de análise e despacho do expediente diário elaborado, tarefa de instrução das forças operativas; - aplicação do regulamento disciplinar da PRM.
27
28
22
02 Operacional da Esquadra
- Planeamento de missões operacionais, elaboração de relatórios de missões operacionais, execução de missões operacionais de rotina, análise da situação ciminal da área da esquadra, serviço de oficial de permanência; - Avaliação do desempenho da força; - Protecção aos locais de crime.
30
1 1
03 Investigação Criminal
- Pedido de mandados de busca a residências, notificação de tribunal, audição de testemunhas e arguidos, cumprimento de mandados de condução ao tribunal, instrução de processos criminais; - Pedido de identificação do arguido ou testemunha; - Recolha de vestigios dactiloscopicos; inspeccionar detalhadamente o local de facto (local do crime); - Cumprimento do tempo legalmente previsto para a notificação de um particular.
29
6
1
1
04 Polícia de Trânsito
- Fiscalização de trânsito em geral, controle de álcool aos automibilistas, fiscalização de excesso de velocidade, elaboração de autos de transgressão, operações de auto-stop; - Fiscalização de veículos com registos viciados (falsos), participação em peritagem de acidentes de viação; - Identificação das matrículas ou chapas de inscrição dos veículos.
29
25
1
Em seguida, aos cadetes finalistas foram solicitadas opiniões sobre as
actividades que deveriam ser realizadas pelos cadetes numa esquadra durante o estágio
supervisionado. A pergunta colocada foi a seguinte:
210
Perg.(geral)-Anexos 4,5,6,7. Que outras actividades acha que os cadetes deviam realizar
na esquadra durante o estágio?
As respostas foram resumidas nos seguintes termos:
-Patrulha, planeamento de missões em pelotões, elaboração de escalas extraordinárias
diariamente (EP1); - Actividades operacionais.
-O cadete deveria particpar nas reuniões de planificação das actividades operativas
(EP2); - Actividades operacionais.
-Para além das tarefas do oficial de permanência, deviam ser integrados no grupo
operativo em exercicio de tarefas concretas no terreno, como forma de conhecer as
reais actividades de Polícia (EP3); - Actividades operacionais.
-Os cadetes deviam também realizar actividades ligadas às comunicaões e não
centrando-se apenas nas actividades de oficial de permanência. Deviam realizar
actividades ligadas à secretaria da esquadra (EP5); - Actividades
operacionais/Administrativas.
-Os cadetes deveriam: patrulhar com mais frequência para ter um maior contacto com
a população, elaborar processos, elaborar escalas de serviço, ter mais dominio na
permanência (EP7); - Actividades operacionais/Relações comunitárias.
-Assumirem o papel de comandante da Esquadra, intervirem nas reuniões da esquadra;
participarem activamente nas patrulhas (EP10); - Actividades
operacionais/Administrativas/Judiciais.
-Actividades ligadas à operatividade nas esquadras, patrulha auto (EP12); -
Actividades operacionais/Trânsito.
-As tarefas não podem planificar-se ao centrarem-se apenas nas tarefas de oficial de
permanência; conhecer as tarefas de um comandante de esquadra assim como de chefe
de operações; como dirigir o efectivo de uma esquadra (EP13);- Actividades
operacionais/Planificação/Judiciais/Administrativas.
-Na minha opinião, acho que os cadetes deveriam realizar o estágio não apenas ao
nível da PRM mas também noutras áreas do MINT e também participar na autópsia
(EP16);- Actividades operacionais /Administrativas.
211
-O cadete deveria ter a oportunidade de trabalhar com os comandantes das esquadras
para se inteirarem do trabalho que estes realizam (EP19); - Actividades
operacionais/Administrativas
-Sou da opinião que os cadetes deveriam participar na planificação da actividade
operacional junto com o chefe das operações, de modo que estes possam elaborar
eficazmente os planos de missões operacionais na área operativa (EP22); - Actividades
operacionais/Planificação/Administrativas.
Em função dos objectivos perseguidos por este estudo, as respostas
apresentadas pelos participantes podem ser agrupados nas categorias que se seguem no
quadro abaixo. O agrupamento em categorias visa, primeiro, a sua compreensão,
porque alguns termos mantidos tal como foram apresentados pelos participantes não
são de domínio comum, são específicos do meio policial, por exemplo: permanência,
patrulha apeada, autos, balística, audições, local do facto, entre outros.
Quadro 6: categorias indicadas pelos participantes N/0 ACTIVIDADES
01 Actividades Operacionais
02 Actividades Administrativas
03 Actividades de Gestão
04 Actividades Judiciais
05 Planificação
06 Relações Comunitárias
Em segundo lugar, o agrupamento visa facilitar o cruzamento da informação
com os dados recolhidos através das fichas 1 e 2 de inquérito sobre as actividades
realizadas pelos comandantes das esquadras, chefes das operações e pelos inspectores e
subinspectores (oficiais subalternos) nas esquadras.
O objectivo é estudar como essas actividades podem ser articuladas com o
conhecimento teórico no processo de formação de oficiais da Polícia na ACIPOL, por
meio das práticas pré-profissionais e do estágio curricular supervisionado.
212
Os participantes foram também solicitados para explicarem qual é o verdadeiro
trabalho da Polícia. Esta pergunta deveria ser respondida de acordo com os
conhecimentos e experiências profissionais vividas por cada participante.
Perg.5-Anexos 3,4. Qual é para si o verdadeiro trabalho policial? Justifique.
Os comandantes distritais e de esquadras da província de Gaza responderam da
seguinte forma:
-O verdadeiro trabalho policial é de prevenir e combater o crime (CDG1);
-O verdadeiro trabalho policial é de garantir a ordem e segurança públicas,
proteger os cidadão e seus bens” (CDG2);
-O verdadeiro trabalho policial é defender a CRM, garantir a OSTP. Porque
esta é a missão principal da Polícia, segundo a lei fundamental (CDG4);
-O patrulhamento, protecção dos objectos económicos e sociais e planificação
dos trabalhos operativos em geral (CDG5);
-Protecção de pessoas e seus bens. Esse exercício de proteger as pessoas e
seus bens é o verdadeiro trabalho do Polícia (CDG8);
-O verdadeiro trabalho da policia é o patrulhamento. Porque é através do
patrulhamento que se realiza o trabalho proactivo e reactivo da Polícia”
(CDG10);
Por sua vez, os graduados da ACIPOL em serviço na província de Sofala deram
as seguintes respostas:
-O verdadeiro trabalho policial é todo aquele que é levado a cabo, na rua,
pelos patrulheiros. Na medida em que encontramos na via pública todo o tipo
de situações no âmbito social, económico, cultural, etc. (ESF1);
-O trabalho da Polícia é vasto e inclui tudo o que tem a ver com a segurança e
o bem estar das pessoas (ESF2);
-Em minha opinião, o trabalho policial é preventivo e operativo. Preventivo na
medida em que com o conhecimento teórico pode se criar estratégias de
prevenção do crime e quando estas não funcionam pode-se recorrer ao lado
operativo, por forma a garantir a OSTP (ESF3);
213
-O verdadeiro trabalho policial, para mim, seria necessariamente a
efectivação ou materialização de tudo quanto foi ensinado nas escolas de
formação, acompanhado de uma monitoria em todas as fases de progressão
(ESF4);
-O verdadeiro trabalho policial de um oficial é a direcção da área operativa.
Esta direcção devia-se aprender na cadeira de Comando e Liderança no estilo
daquilo que era a actividade de direcção nos cursos de quadros médios de
direcção (ESF5).
Analisando as respostas dadas tanto pelos comandantes distritais e de esquadras,
quanto pelos graduados da ACIPOL nota-se que em geral são genéricas, são
apresentadas como slogans. Porém, percebe-se que todas elas giram em volta de
actividades operativas e administrativas.
Em seguida, foi discutida em grupo focal a questão sobre a a organização do
estágio curricular e das práticas pré-profissionais. O objectivo era de explorar os pontos
de vista dos participantes sobre como os cadetes podem ser engajados em actividades
práticas relacionadas com a sua formação.
Perg.2-Anexo 5. Como acha que devia ser organizado o estágio curricular? E as práticas
pré-profissionais?
-O EC (estágio curricular) deve ser organizado na academia, mas devia haver
supervisão, porque a instituição que recebe o cadete não sabe o que deve fazer
com os estagiários (AC5-grupo focal 1);
A idéia principal que este participante apresenta é a necessidade de haver
supervisão do estágio. Esta idéia provém do facto de que na situação actual a
supervisão é deficiente, ou mesmo inexistente. A parte complementar da idéia refere-se
ao sector que recebe o estagiário, isto é, ao conhecimento que deve ter sobre o conteúdo
do estágio que, para o caso, inclui a existência de um orientador local. As duas idéias
aqui apresentadas pressupõem, acima de tudo, boa coordenação entre a instituição
formadora (ACIPOL) e os sectores profissionais que recebem o estagiário (unidades e
subunidades policiais).
214
-A experiência do estágio do bacharelato mostrou que havia sempre na
esquadra ou qualquer unidade alguém que recebia e enquadrava os
estagiários. Não era necessariamente alguém da academia que enquadrava,
mas acompanhava (AC9-grupo focal 1);
-Actualmente o estágio falha na planificação, porque as pessoas responsáveis
não coordenam nem acompanham o que é feito (AC4-grupo focal 1);
A idéia principal na afirmação dos participantes acima é a realização do estágio
como actividade planificada, por isso, parte integrante do currículo e não uma
actividade extra-curricular. O mais interessante é que todos os participantes deixam
transparecer a idéia de que estão conscientes de que o estágio deve ter lugar nas
unidades e subunidades policiais.
-Devia haver sintonia entre a ACIPOL e as unidades/subunidades da PRM que
recebem os estagiários; deviam ser preparadas pessoas para orientar os
estagiários nessas unidades, através duma instrução concreta; deve haver
formação desses orientadores locais (AC10-grupo focal 1);
-A ACIPOL não tem contacto directo com as unidades policiais, mas sim com
o comando geral. Isso dificulta a interacção e coordenação na realização do
estágio; por isso, os estagiários não têm orientação local (AC2-grupo focal 1);
-Antes de os estudantes partirem para o estágio deve haver uma palestra com
eles sobre todos aspectos do estágio: o que devem fazer, como devem fazer, o
que será avaliado e que relatórios devem produzir; isso implica que haja
coordenação e supervisão (AC7-grupo focal 1);
Nas afirmações acima registadas as idéias concentram-se na necessidade de a
planificação e organização do estágio incluir a participação dos principais actores dessa
actividade, nomeadamente a própria ACIPOL (direcção e docentes), os estudantes e os
sectores de trabalho, incluindo a preparação de orientadores locais.
-Há falta de um instrumento que harmonize as relações entre a ACIPOL e as
unidades no qual se indicam os deveres das partes, tanto dos que enviam
quanto dos que recebem os estudantes e dos próprios estudantes; esse
documento seria aprovado pelo Comando Geral em coordenação com a
215
academia. Uma espécie de regulamento de estágio. O que acontece é que os
cadetes agora não fazem estágio, mas visitas de estudo (AC3-grupo focal 1).
-Devia ser adoptado um modelo de prática pedagógica com um guião que
contenha o que os cadetes devem realizar durante o estágio, para que
actividades devem ser orientados, e no fim do período deviam ser avaliados,
também através de uma ficha que contenha os aspectos objecto de avaliação.
Assim, os sectores onde eles fazem o estágio participariam também na
avaliação dos cadetes, incluindo sobre os aspectos de comportamento. A
ACIPOL é que devia organizar e fornecer tais fichas de orientação e de
avaliação (CM1- grupo focal 2);
As duas afimações acima registadas (AC3 e CM1) levantam a necessidade da
existência de um regulamento que institucionalize e oriente sobre todos os
procedimentos a serem seguidos no estágio. Na verdade e na realidade policial
moçambicana onde as instituições policiais seguem princípios de “burocracia militar”,
esse instrumento vincularia formalmente os actores do estágio. Portanto, a ligação entre
a instituição de formação e os sectores operacionais seria fortalecida por um vínculo
formal.
-A Direcção do estágio da ACIPOL devia direccionar o que deve ser feito e o
que se pretende com o estágio. A forma actual de organização do estágio não é
vantajosa porque a ACIPOL se limita a entregar os cadetes e as esquadras e
outros sectores é que devem pensar o que fazer com eles. Assim, cada um
acaba fazendo o que acha melhor (CM3- grupo focal 2):
-A ACIPOL devia indicar as metas a serem atingidas com os cadetes através
do estágio, pois é ela que define o que deve ser aprendido a cada momento
para fornecer bons profissionais aos sectores operativos da polícia. A
avaliação dos cadetes estagiários deve ser conjunta entre a ACIPOL e os
sectores de estágio, isto, as áreas onde os cadetes realizam o estágio,
principalmente sobre o desempenho e aspectos de deontologia profissional
(CM2- grupo focal 2);
As duas afirmações dos participantes (CM3 e CM2) acima registadas levantam
duas questões: o problema de coordenação entre a ACIPOL e os sectores que recebem
216
os estagiários, bem como a falta de clareza sobre o quê deve ser feito e como devem ser
organizadas as actividades do estágio; a participação dos sectores que recebem os
estagiários na avaliação destes. Fica implícito, no conteúdo das respostas, que falta
instrumento regulador do estágio (regulamento do estágio) que indique o que se
entende por estágio na formação policial e como ele deve decorrer, bem como os
actores vinculados.
-Primeiro, é que um estágio não é uma passagem, o estágio difere de uma
passagem, uma simples visita, um estágio é um momento de aprendizagem, por
isso, antes de os estudantes serem conduzidos ao estágio deve-se definir os
objectivos, o que eles devem saber, isto é, o que é que objectiva esse estágio,
os conhecimentos que devem ser dominados. Deve ser colocado alguém no
sector onde vão estagiar que deve estar a par dos objectivos que se pretendem
com esses estágio, ou seja, o sector de estágio deve dominar os objectivos do
estágio, e estar em condições de monitorar esse estágio. Por exemplo, quando
o estagiário vai a uma brigada qualquer deve desde a entrada do processo até
a sua saída, saber, por exemplo, que na investigação de um incêndio não se
começa com a busca do cadáver e outras coisas; quando se fala de um
homicídio, primeiro pensar onde é que está o cadávere, etc. Portanto, deve ser
definido ao ir para estágio que quando terminar deve estar em condições de
dominar isto e aquilo. E fazer-se a monitaria e avaliação da permanência do
estagiário no sector de estágio. Quer dizer, os sectores ou as pessoas
colocadas no sector onde devem estagiar deverão estar em condições de fazer
a avaliação do estágio, o que não acontece. O estagiário chega numa brigada,
dão-lhe um processo e dizem-no para instruir o processo. Isso não é estagiar,
isso é, quando muito, aprender a fazer um trabalho. O estagiário deve ser
acompanhado, saber que uma determinada pergunta pode ser feita doutra
maneira, saber e reflectir se uma determinada actividade pode ser feita doutra
maneira. Acho que o estágio nesse sentido pode ser mais rentável e eles
próprios, os estagiários, devem elaborar um relatório no final do seu estágio.
Esse relatório deverá ser visto e avaliado também pelo sector onde estiveram a
estagiar para dar o seu parecer avaliativo sobre o desempenho do estagiário.
Dessa maneira, poderá garantir-se que no fim do estágio o estagiário trabalhe
de maneira autônoma sobre a matéria do estágio (ECI/SPIC/12).
217
No depoimento do partcipante (ECI/SPIC/12) podem ser identificadas várias
ideias sobre como devia ser organizado o estágio curricular e as práticas pré-
profissionais. Primeiro, o participante olha para o estágio como um momento de
aprendizagem realizada no campo de actividade profssional, por isso, deve ser
planificado, definir-se os objectivos, traçar-se o roteiro dos estagiário e prever-se
orientadores locais de estágio nas unidades e subunidades que acolhem os estagiários.
O outro aspecto sugerido pelo participante é a supervisão do estágio por parte da
instituição formadora (ACIPOL), evitando-se que os estagiários fiquem só sob tutela
das uniddades e subunidades hospedeiras dos estagiários.
A esta idéia está ligada a necessidade da avaliação dos estagiários pelo sector
que os recebe e os orienta. Por outro lado, os próprios estagiários devem elaborar um
relatório individual sobre o estágio o qual deve ser analisado na Academia pelos
docentes. A intenção é que depois de realizar o estágio, o etagiário possa começar a
trabalhar autonomamente.
Visando explorar a possibilidade da participação dos docentes e das matérias
das diferentes disciplinas nos módulos das práticas pré-profissionais e do estágio
curricular, foi colocada aos participantes a pergunta que se segue.
Perg.4-Anexo 5. Como é que as diferentes áreas e disciplinas do currículo podem
participar dos estágios e das práticas pré-profissionais?
-A questão de base é a articulação entre as disciplinas do mesmo nível em que
se leccionam, para depois combinar os diferentes conhecimentos nas práticas.
A visão deve ser multidisciplinar e os responsáveis das áreas participam
directamente. As práticas a serem feitas devem ser coordenadas por aqueles
todos que intervêm (AC5);
-O atendimento de um assunto ou de uma pessoa na esquadra envolve uma
multiplicidade de áreas de conhecimento que devem ser accionadas ao mesmo
tempo pelo estagiário. Daí é preciso organizar uma unidade de práticas.
Aquele que recebe o estagiário deve ser uma pessoa conhecedora da prática
que deve ser feita nesse momento na unidade (AC9);
-Deve haver interdisciplinaridade em que os docentes discutem os assuntos
próximos num determinado nível ou período de escolaridade de forma a
218
evitar-se repetições desnecessárias; deve haver, por isso, a selecção dos
conteúdos a serem dados. Isso facilitará também a supervisão e a avaliação
(AC8).
As ideias apresentadas pelos participantes nas passagens acima registadas
levantam um forte desafio para quem enfrenta a tarefa de elaborar e aplicar um
currículo para a formação profissional que integre trabalho e ensino.
Esta tarefa, realmente inovadora no âmbito da formação policial, supõe uma
ruptura com as concepções tradicionais de treinamento e, fundamentalmente, com as
práticas formativas academicistas desvinculadas da prática real e cotidiana de uma
determinada profissão (BARATO, 2003, p.17).
Supõe uma ruptura com a antiga divisão entre teoria e prática, uma vez que
ambas se encontram integradas no exercício profissional. Sobre esta passagem, é
bastante ilucidativa a afirmação do participante (AC9) ao afirmar que O atendimento de
um assunto ou de uma pessoa na esquadra envolve uma multiplicidade de áreas de
conhecimento que devem ser accionadas ao mesmo tempo pelo estagiário.
O que se pode perceber é que a competência de resolver um determinado
problema ou de realizar uma determinada actividade não se apresenta fragmentada por
áreas de conhecimento que servem de sua base sustentadora, mas sim de forma unitária,
estruturada e coerente.
O participante (AC5), ao afirmar que A visão deve ser multidisciplinar e os
responsáveis das áreas participam directamente, remete-nos à idéia de LE BOTERF
(2003), segundo a qual o desafio das organizações parece estar relacionado à utilização
de novos modelos de gestão, baseados em conceitos de competência e desempenho,
acrescidos das práticas de aprendizagem colectiva, desenvolvimento de equipes e
gestão do conhecimento, entre outros que ofereçam múltiplas oportunidades de
crescimento pessoal e profissional aos membros da organização e estimulem as pessoas
não só a desenvolver colectivamente (a)s competência(s), mas também, a compartilhá-
la(s).
Para configurar uma prática policial inovadora, é possível inferir que a
formação que considere a competência do futuro oficial deve possuir como objectivo
maior não somente a melhoria das performances profissional e organizacional, mas,
sobretudo o desenvolvimento dos formandos como pessoas na sua plenitude. Assim a
competência representaria, ao mesmo tempo, um valor social para a organização e um
219
valor sócio-profissional para o indivíduo, mesmo quando considerada como um
“objectivo ambicioso” como afirmam Chizzotti & Casali (2011), na sua análise crítica
aos discursos da União Europeia e da OCDE68 sobre a emergência e propósitos da (s)
“armadilhas epistemológicas” do termo competência (s):
Depreende-se dos discursos curriculares oficiais da OCDE e da União
Europeia, nesta primeira década do século, o ambicioso propósito de
estabelecer referências comuns (...) – a sociedade, os pais, os educadores e os
alunos - mantendo a expectativa de que a escola ofereça uma base sólida de
conhecimentos e atitudes que permita aos estudantes aplicá-los em todas as
situações da vida e ter os meios indispensáveis para continuar sua formação
ao longo da vida, a fim de que eles compreendam os desafios da humanidade,
a universalidade e diversidade da vida e, assim, possam tomar parte nas
transformações emergentes da sociedade (CHIZZOTTI & CASALI, 2011,
p.13).
Entendemos como “armadilhas epistemológicas” os aspectos e significados,
muitas vezes inconfessados, que estão implícitos nas várias acepções polissêmicas do
termo competência (s), designadamente a sua politização e mercantilização
Nos depoimentos dos participantes podemos depreender ainda termos como:
multidisplinaridade, interdisciplinaridade, unidade de práticas, termos que, por um
lado, têm um alcance profundo se entendermos a realidade curricular “a partir de uma
perspectiva dinâmica que permite interligar num todo sistémico os contextos de
decisão, os actores intervenientes, as condicões determinantes, e nunca a dicotomia
entre a teoria e a prática, entre propósitos e prática (PACHECO, 2001, p.145).
Por outro lado, se entendermos o currículo como um projecto sócio-formativo e
didáctico que engloba intenções e decisões tomadas em diferentes contextos, que vão
da máxima generalização à máxima concretização (Pacheco, 2001, p.145), não
poderemos deixar de aceitar para o seu desenvolvimento os aspectos essenciais
centrados no processo, sem os quais estaria comprometido o equilíbrio entre os
fundamentos teóricos e os fundamentos práticos da formação.
68 (OCDE) - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico.
220
Considerando que a criação da ACIPOL foi um projecto institucional
acompanhado por todos os agentes da PRM, principalmente os oficiais que
desempenham funções de direcção e chefia, perguntou-se aos comandantes distritais e
de esquadras sobre as melhorias que esperavam no desempenho da Polícia.
Perg.2-Anexos 3,4. Tomando em consideração que acompanhou o processo de criação
da ACIPOL, que expectativas tinha sobre o desempenho dos políciais e da Polícia?
O primeiro grupo de participantes a quem foi colocada a questão das
expectativas que a Polícia tinha com a criação da ACIPOL, foram os comandantes
distritais e esquadras da província de Gaza que apresentaram as seguintes ideias:
-Tinha como expectativa ver os polícias a demonstrarem bom desempenho das
suas funções, mas não é o que fazem neste momento, alegadamente por falta de
condições de trabalho. Acho que a Polícia devia criar condições adequadas
para o polícia desempenhar melhor as suas funções (CDG2);
-A expectativa que tinha com a criação da ACIPOL era que teríamos oficiais
da Polícia com qualidade, tecnicamente bem preparados, porque com o tempo
que dura a formação na ACIPOL isso é possível (CDG8);
-A expectativa que eu tinha era de ver a nossa instituição melhorada em
termos de actuações dos nossos membros, mas muitos casos que têm-se
verificado na prática parecem sugerir que muitos dos oficiais que são
formados na ACIPOL só queriam adquirir a licenciatura, não têm vocação
para polícia (CDG9);
-A expectativa que eu tinha era que formação dada na ACIPOL capacitaria os
oficiais para trabalharem nas especialidades da Polícia, sairiam da ACIPOL
dominando pelo menos uma especialidade (CDG10);
-Nós contávamos que com a criação da ACIPOL pudéssemos ter gente com
formação prática imediata, mas a experiência mostra que o graduado (egresso)
não é produto acabado, sobretudo no ramo da polícia, mesmo que a gente
conceba maior teoria, é sempre necessário aliar com a prática, então aí é onde
está o problema, é preciso que a ACIPOL inculque nos formandos que quando
chegarem às províncias (postos de trabalho) não vão ascender logo a posições de
221
chefia, aliás, isso pode estar nos documentos mas a prática é diferente, aqueles
graduados (egressos) precisam de conhecer a actividade policial na base, pois
têm de saber o que é estar na secretaria de um comando, o que é patrulhar, o que
é grupo de patrulha, isso não é vergonha para um oficial, pelo contrário, é regra
para um polícia. Porque quando começam logo como oficiais de permanência
ignoram o que vem atrás (antecede), ficam sem saber que a razão da existência
da Polícia é a guarda, é na patrulha onde temos bom resultado (...). O bom
resultado do trabalho policial é avaliado a partir dos resultados da patrulha-
prevenção (EDPF/SF/12).
A resposta dada por este dirigente de nível provincial (EDPF/SF/12) insere
dentro de si mais do que uma idéia chave. Porém, em função dos objectivos da
pergunta e da pesquisa podemos registar as seguintes idéias: Nós contávamos que com
a criação da ACIPOL pudéssemos ter gente com formação prática imediata. Nesta
passagem está subjacente a idéia de “gente com qualificação profissional prática”,
pronta para intervir com autonomia em processos policiais. Mas, em seguida, expressa
como essa expectativa não foi alcançada ao afirmar que, mas a experiência mostra que
o graduado (egresso) não é produto acabado e indica a área de formação em que os
graduados, na opinião dele, mostram mais fraquezas: sobretudo no ramo da polícia
(...). Em seguida, aponta as causas e mistura com uma advertência: mesmo que a gente
conceba maior teoria, é sempre necessário aliar com a prática, então aí é onde está o
problema (...). Em suma, menciona a expectativa que tinha com a criação da ACIPOL e
aponta que essa expectativa não foi atingida porque a formação dada aos oficiais na
ACIPOL é mais teórica e menos prática.
-Na ACIPOL, o curso de formação superior foi um bom projecto, acho que
vale a pena apostar nesse curso, mas devemos reconhecer que nos princípios
falhamos, porque não explicamos adequadamente àqueles jovens, porque
haviam vozes que diziam que “vocês são os únicos para salvar a Polícia, esses
velhos caducos devem reformar-se” assim eles formaram-se com a
mentalidade de que à saída iam tomar posições de direcção e chefia da Polícia
e, quando saíram fora apanharam outra realidade. Isso foi muito mau,
andamos a dizer coisas que na prática não seriam factíveis. É verdade que no
seio da Polícia há problemas relacionadas com oficiais com baixa formação,
222
mas não devia ter sido veiculada a informação de que os mais novos, com
formação superior, viriam substituir os menos instruídos. Mas o curso em si, é
muito bom, os egressos da ACIPOL marcam diferença. Eu tive a ocasião de
receber os primeiros graduados quando estava na cidade de Maputo como
director da Ordem, enquadramos a eles, havia um projecto que era muito bom,
de seleccionarmos algumas esquadras para servirem de modelo que deviam
ser organizados ou estruturalmente constituídos pelos egressos da ACIPOL,
primeiro como oficial adjunto de permanência, depois colocados como oficiais
de permanência e nalgumas esquadras a constituição devia ser só pelos
egressos da ACIPOL, desde o comandante da esquadra, o chefe das
operações, os oficiais de permanência e seus adjuntos que era para depois
avaliarmos se o atendimento do público melhorou, o manuseamento do
expediente, etc. Os resultados foram positivos, os egressos mostraram uma
diferença entre as esquadras ocupadas por eles e outras esquadras, mas esse
projecto foi abandonado, não sei porquê...em minha opinião era um bom
projecto que abrangia a 1ª, a 2ª, a 4,ª a 6ª, e a 18ª Esquadras. Nessas
esquadras o corpo de oficiais de permanência era somente dos egressos da
ACIPOL, incluindo os chefes das operações que eram os egressos que foram
para a Academia já polícias. Esse projecto foi bom, mas o que acho, agora, é
que alguns comandantes enquadram bem os egressos, outros não. A
experiência da cidade de Maputo acho que foi produtiva porque alguns
egressos que passaram por esse processo já são comandantes de esquadras e
outros, chefes das operações e, em algumas excepções, há os que assumem
responsabilidades mais complexas (EDO/SF/12).
Os depoimentos acima registados revelam que a criação da ACIPOL foi um
projecto bem acolhido pelos oficiais da Polícia. Esperavam e acreditavam que da
ACIPOL sairiam oficiais tecnicamente bem preparados. Apesar de não ter sido
expressamente citado, podemos supor que a expressão oficiais bem preparados inclui os
aspectos técnicos, éticos e deontológicos da sua formação.
Dos depoimentos também se pode perceber que há um certo sentimento de
contrariedade sobre o que se esperava dos graduados e o que estes revelam na prática,
em termos técnico-profissionais. Acredita-se que uma formação adequada,
223
acompanhada por um programa de enquadramento adequado nas unidades e
subunidades policiais pode superar essa lacuna.
A pergunta que se segue tinha como objectivo explorar mais idéias dos participantes
sobre os atributos que qualificam e diferenciam um bom polícia de um mau polícia, que
podem ser considerados objecto de análise na sua formação.
Perg.6- Anexos 3,4. O que é um bom e um mau polícia?
Nossa avaliação teórica sobre o saber, quando aplicada ao policiamento, leva a
uma visão no fundo muito prática da profissão de Polícia. Na mesma direcção de
TARDIF & GAUTHIER citados por Paquay (2001, p.200), nós, de facto, consideramos
simplesmente que os polícias são profissionais dotados de razão, como todos os outros
profissionais. Pensamos que eles, nas suas actividades profissionais, fazem
julgamentos, tomam decisões nesses sistemas de acção complexos que são a segurança
pública e a sociedade, que eles se comportam geralmente de acordo com regras e que
sua conduta é dirigida por seus pensamentos, julgamentos e decisões baseadas em
certas exigências de racionalidade.
Em suma, o polícia sabe, na maioria dos casos, porque diz e faz qualquer coisa,
no sentido de que ele fala e age em função de razões e de motivos que servem para
determinar seus julgamentos profissionais em seu meio de trabalho (Paquay, 2001,
p.200), mas sabe também que ele é avaliado e julgado “bom” ou “mau” polícia em
função de sua conduta e procedimentos.
À pergunta sobre o que é um bom e mau polícia, os participantes da pesquisa,
nomeadamente comandantes distritais, comandantes de esquadras e graduados da
ACIPOL em serviço na província de Sofala deram as respostas ilustradas no quadro 7.
224
Quadro 7: Comparação de características entre o “bom” e o “mau” Polícia Características do “Bom” Polícia Características do “Mau” Polícia
Trabalha de acordo com as leis Não segue as normas vigentes
Cumpre rigorosamente a ética e deontologia profissional Apresenta-se ao cidadão sem postura e sem profissionalismo, mal comportado
Sabe transmitir aos colegas o que aprende Não transmite nada sobre a formação adquirida, é egoísta
Cumpre com as leis e regulamentos da Polícia e as demais instruções de serviço.
Aparece desorganizado e embriagado dentro e for a do serviço
Cumpre e faz cumprir as ordens superiormente dadas É retrógrado nas missões dadas superiormente
Cumpre com as suas obrigações profissionais Não cumpre cabalmente as suas obrigações
Primeiro sabe se respeitar, segundo ao cidadão e sabe servir a comunidade
Desleixado, não respeita o cidadão eviola os direitos dos cidadãos
Cumpre exacta e fielmente as ordens Desobediente e infiel
Aceita o sacrifício e compreende que o país ainda tem dificuldades
Aquele que só vê o enriquecimento
Cumpre com zelo as suas obrigações e deveres e domina as actividades do seu sector
Não cumpre com obrigações e deveres e não domina a sua actividade
Aceita a correcção, a crítica, procura investigar, consulta tudo sobre o que tiver dúvidas, colabora dando sua opinião
Aquele que é arrogante, não aceita a crítica e é incorrigivel
Utiliza os seus conhecimentos em benefício da instituição e ensina os colegas e acata as ordens legais
Aquele que faz o inverso
O que atentamente aceita correcções Julga ter dominio universal das questões policiais
Aquele que prioriza a prevenção no seu trabalho operativo. Espera as coisas acontecerem para depois agir
Pode-se notar no quadro-resumo que os participantes apresentaram as respostas
dicotômicas no sentido em que afirmam o que acham que caracteriza um bom polícia e,
em seguida, o que acham que caracteriza um mau polícia. O julgamento parte de
pontos de vista diferenciados, isto é, uns consideram a conduta ética e deontológica,
outros consideram a competência profissional e outros, ainda, a lealdade e confirmismo
do polícia. Todos os aspectos referenciados têm importância para as actividades de
formação do futuro oficial da Polícia.
225
CAPÍTULO IV POSSIBILIDADES DE EQUILÍBRIO ENTRE OS FUNDAMENTOS TEÓRICOS E AS HABILIDADES PRÁTICAS DA FORMAÇÃO, A PARTIR DAS PRÁTICAS PRÉ-PROFISSIONAIS E DO ESTÁGIO
CURRICULAR SUPERVISIONADO
O equilíbrio aqui referido não é estático, mas um equilíbrio tenso e essa tensão é
geradora de sua impermanência e abertura histórica, isto é,
Um sistema nunca constitui de facto uma consecução absoluta dos processos de equilibração e, de um equilíbrio atingido, instável e até estável, derivam sempre objectivos novos, sendo cada conclusão, mesmo mais ou menos duradoira, origem de novos encaminhamentos (PIAGET apud MACEDO, 1994, P.124).
Na perspectiva da formação em estudo, deve-se procurar nos desequilíbrios uma
das fontes de progresso no desenvolvimento dos conhecimentos, pois só os
desequilíbrios obrigam o processo e os sujeitos a ultrapassarem seu estado actual e
procurar seja o que for em direcções novas.
Para a apresentação de dados foi necessário retomar a inquietação que originou a
questão de partida do presente estudo ou seja que a formação oferecida pela ACIPOL
não corresponde às exigências do trabalho prático dos oficiais subalternos da polícia no
contexto de Moçambique. Consideramos ser necessário termos uma visão clara sobre as
actividades do oficial subalterno nas unidades e subunidades policiais.
4.1. Conhecer as necessidades operacionais para determinar as necessidades de formação
Sinto que talvez haja algo a complementar na formação. Quando chegamos
ao terreno sentimo-nos estrangeiros. As 4 áreas curriculares ajudam-nos na
formação como pessoas, mas na prática há muitas diferenças. A área policial,
mesmo durante a formação é a mais pobre relativamente a outras áreas
curriculares; isso se revela também na prática porque o que se espera de nós
não é o que conseguimos apresentar e assim não podemos partilhar com os
outros na prática. Há o problema do saber ser como polícia. O que nós
aprendemos não há espaço para aplicar no terreno; o oficial da ACIPOL não
sabe ser e estar (AC2- egresso).
226
Considerando esse pressuposto, o ponto de partida foi entender que actividades
os oficiais subalternos realizam na prática, tendo como categorias de análise os
principais processos policiais agrupados em: tarefas judiciais, tarefas administrativas,
tarefas operacionais e tarefas de gestão (entendida, neste caso, como gestão de forças e
meios). É verdade que a recolha de dados sobre a categoria de gestão incidiu mais
sobre a gestão de pessoal do que o aspecto de meios (logística) por entendermos que a
logística de uma esquadra não é muito complexa, embora importante, por exemplo, em
situação de gerir armas e munições e meios escassos.
O conhecimento dessas tarefas é que nos permitiria fazer cruzamento com a
informação curricular da formação dos oficiais subalternos na ACIPOL, no domínio da
organização curricular, metodologia e processos pedagógicos, pois segundo McCann &
Ludvigsen (1999, p. 86), um programa de formação existente pode ser reavaliado para
determinar quais as necessidades de treinamento que ainda existem. Neste caso,
necessidades que levem à aproximação entre a aprendizagem teórica e a realidade
operacional da Polícia, ou seja, as actividades policiais concretas no contexto de
Moçambique. Para o efeito, recorremos ao sistema de código, mais conhecido por
CODE69, desenvolvido por McCann & Ludvigsen (1999).
As primeiras duas fichas de inquérito (ficha 1 e 2) aplicadas específica e
propositadamente aos comandantes das esquadras, chefes das operações,
subinspectores colocados na Polícia de Investigação criminal (PIC) e na Polícia de
Trânsito (PT) que desempenham funções de comando, direcção e chefia, tinham o
propósito de recolher dados sobre as actividades que, na realidade, os oficiais
subalternos do nível de graduação da ACIPOL (subinspectores) realizam nas unidades
e subunidades policiais.
A recolha de dados foi extensiva aos comandantes das esquadras e chefes das
operações por duas razões: a primeira é que a esquadra é a subunidade básica do
trabalho policial em zonas urbanas e que apresenta uma estrutura completa do
funcionamento dos processos policiais em um território limitado. Por estrutura
completa entende-se a representação de todas as forças operacionais básicas da Polícia
no contexto de Moçambique: Polícia de Protecção ou de Ordem e Segurança Pública
(polícia ostensiva), Polícia de Investigação Criminal (PIC) e Polícia de Trânsito (PT).
69 Um modelo para identificar excesso de treinamento e deficiências
227
Segundo, porque os graduados da ACIPOL são, regra geral e maioritariamente,
colocados nas esquadras, pelo menos durante os seus primeiros anos de serviço,
incluíndo o ano de estágio profissional. Nas esquadras começam por desempenhar
funções de oficial de permanência, progredindo paulatinamente para funções policiais
mais complexas.
Com base nesse entendimento, recorremos a procedimentos quantitativos
(fichas 1 e 2) para demonstrar, a partir dos dados colectados, as tarefas que constituem
o universo da realidade prática policial no contexto de Moçambique, pelo menos nos
principais centros urbanos do País, Maputo, Beira e Nampula (sul, centro e norte),
embora se acredite que as realidades das restantes 9 cidades do País apresentem
especificidades locais, incentivadas pela dinâmica do desenvolvimento sócio-
económico que estão conhecendo progressivamente nos últimos anos, mas na essência,
em termos de trabalho policial, tais especificidades podem ser enquadradas dentro das 7
categorias de análise seleccionadas (vide tabelas 18 e 19, pp.166 e 167).
Verifica-se que os fundamentos doutrinários e a metodologia de trabalho
utilizada na área da segurança pública são os mesmos utilizados pelo órgão central e
pelos demais componentes do sistema policial. Foi nesse contexto que resultou a
selecção das tarefas que constam do quadro 8.
Quadro 8: Tarefas seleccionadas pelas fichas (1 e 2) Legenda: Ficha 1
C – Gestão do tempo de um comandante
D – Planeamento e concepção
B – Gestão de recursos disponíveis
E – (Relações privadas ou institucionais)
F – Competências operacionais
Legenda: Ficha 2
A – Judiciais
B – Administrativas
C – Operacionais
D – Gestão de recursos disponíveis
De acordo com o quadro acima apresentado, foram seleccionadas as tarefas
(F,C,D,B) da ficha 1 e (C,B,D,A) da ficha 2. Pelo critério da “CODE”, não foi
seleccionada a tarefa E (Relações privadas e institucionais) da ficha 1. Porém, nos
resultados das entrevistas realizadas nas esquadras com os subinspectores que
desempenham funções de diversa ordem, a tarefa de relações privadas e institucionais
foi considerada uma das mais complexas, por isso, não realizada com frequência. Esta
informação de alguma forma coincide porque enquanto através do “CODE” é
228
considerada tarefa não crítica, não frequente, por isso não necessita de treino, as
entrevistas indicam que ela não é realizada porque é complexa, os oficiais não têm
habilidades suficientes para realizar regularmente a tarefa.
A outra leitura que pode ser feita é que a tarefa das relações privadas e
institucionais no modelo legalista de Polícia, conceptualizado por PONSAERS (2001,
p.123) como a subordinação funcional à estrita aplicação da lei, as relações privadas e
institucionais (no sentido descricionário) não constituem actividade prioritária dos
oficiais da Polícia. Essa tarefa não é ensinada nas escolas de Polícia como o é, por
exemplo, nas escolas de modelo oriental de Polícia.
Antes da ordem pública, explica o mesmo autor, está o valor da lei, os polícias
devem ser identificados como law-enforcers (aplicadores da lei). A legitimação da
função policial advém da lei, a qual é a emanação da vontade popular, devendo os
interesses privados subordinar-se aos interesses gerais. A sanção conduz ao
impedimento para cometer mais crimes. Como já referenciamos, organizacionalmente
este modelo segue as mesmas linhas do modelo burocrático militar, com fraca
integração das expectativas das comunidades, privilegiando as necessidades das fontes
de legitimação oficial (ibidem).
Ademais, considerando que a designação “força paramilitar” presente ainda
hoje no referencial conceptual da Polícia moçambicana, colhe no modelo burocrático
militar a sua génese, sendo o ethos policial pautado pelo primado da ordem pública,
justifica-se, mais uma vez, a negligência do ensino e prática das relações privadas e
institucionais pelos oficiais subalternos da Polícia moçambicana.
-Um oficial tem que estar em condições de orientar o trabalho operativo, fazer
planos operativos, saber trabalhar com a população e, sobretudo saber
atender às situações de emergência, também saber coordenar com outras
forças de defesa e segurança (CM3)
Importa salientar que em Moçambique existe uma ambiguidade entre o discurso
político e a prática policial real. Em termos de discurso, mesmo dos gestores séniores
da PRM, apregoa-se um modelo orientado para a comunidade. Os documentos
doutrinários (como a lei que cria a PRM e outros) e a prática, são pautados por um
híbrido entre o modelo burocrático militar e o modelo legalista.
229
De acordo com Leitão (2007, p.14), as palavras-chave do modelo orientado
para a comunidade são comunidade, co-produção, parceria, descentralização,
horizontalização hierárquica, “desespecialização”, proactividade, territorialidade.
Organizacionalmente, esta filosofia procura através da afectação geográfica ou
comunitária dos agentes, promover uma aproximação entre Polícia e cidadãos no
sentido de revitalizar os laços comunitários enfraquecidos pela crise dos sistemas de
controlo informal.
Porém e como referimos, a prática policial moçambicana ainda está aquém do
nível do discurso. Por consequência, as acções formativas dos oficiais da Polícia não
destacam as matérias sobre as relações comunitárias e, paradoxalmente, nem as
matérias sobre o policiamento comunitário. Essas matérias estão omissas tanto no
currículo inicial que foi analisado neste trabalho, quanto no currículo revisto, que
entrou em funcionamento no ano 2013.
A análise de Rosenbaum (2002, pp. 32-38) mostra que o modelo de
policiamento tradicional tem contribuído para reforçar a imagem da Polícia como
combatente do crime, tendo como principal ferramenta de intervenção a repressão,
conforme ele descreve:
(...) o trabalho de controlar o crime é considerado como prioridade maior da polícia sob o modelo tradicional (outras funções–chave incluem fornecer serviços de emergência, administrar a justiça através de prisão e oferecer uma cadeia de serviços não-emergenciais). Esses métodos tradicionais usados para combater o crime incluem detenção (através de patrulha preventiva ou prisão), incapacitação e reabilitação. [...] as polícias têm adotado completamente (e promovido através dos anos) a imagem de ‘combatentes do crime’ [...]. Um dos maiores problemas com o policiamento tradicional tem sido a confiança excessiva no policiamento repressivo como principal instrumento de controle do crime e da desordem. Qualquer que seja o problema, a primeira inclinação dos policiais é fazer uma prisão, e esta tendência é resultado tanto da pressão da comunidade quanto da pressão de dentro da organização policial.
Exige-se, portanto, que o mandato policial seja ampliado de modo a alcançar
novas funções alargando o espectro de acção a contextos classicamente desprezados ou
meramente fora da esfera de atribuições legalmente previstas.
Rosenbaum (2002, p.37) também apresenta um estudo sobre a mudança no
papel da Polícia, discutindo a oposição entre policiamento comunitário e policiamento
repressivo. Os elementos comumente encontrados no modelo de policiamento
comunitário incluem:
i. uma definição mais ampla de trabalho de Polícia;
230
ii. um reordenamento das prioridades da Polícia, dando maior atenção ao crime
leve e à desordem;
iii. um enfoque na solução de problemas e prevenção mais do que ao policiamento
direcionado ao incidente;
iv. reconhecimento do papel fundamental da comunidade na solução dos problemas
e o reconhecimento de que a Polícia deve ser reestruturada e reorganizada para
dar conta dessas reivindicações e
v. encorajar um novo comportamento dos oficiais e agentes da Polícia.
Na tabela que se segue apresentamos os dados indicativos das actividades
consideradas mais complexas, tanto pelos Inspectores e Subinspectores que trabalham
nas esquadras, quanto pelos Comandantes e Chefes das Operações das esquadras.
4.2. Sobre a prática da formação em ciências policiais que a ACIPOL oferece
-Os graduados da ACIPOL deviam ter, para além de conhecimentos teóricos,
domínio de actividades policiais práticas e habilidades de ligação com as
comunidades (...). Entendo que no campo teórico eles são bons, mas no campo
operacional há muitas lacunas, é preciso fortalecer essa componente prática
para eles servirem de modelo (EDPF/SF/12).
A Teoria e a Prática estão nitidamente dissociadas nos cursos de licenciatura
(graduação) em ciências policiais, o que causa o empobrecimento da prática. Essa
dissociação está presente em várias áreas do conhecimento e é valorizada pela
ideologia castrense ainda predominante na Polícia, que privilegia a separação entre o
trabalho intelectual e operacional.
Os participantes chamam a atenção para a disparidade entre os métodos
tradicionais de formação e as complexidades da demanada policial actual, em constante
mudança. Eles clamam por reformas na metodologia e estruturas curriculares actuais da
formação policial. A afirmação de que os graduados da ACIPOL “não sabem nada” é
questionada por grande parte dos participantes da pesquisa, mas todos comungam a
ideia de que não há relacionamento entre a formação dada e a prática policial real,
facto que se relaciona directamente com as fragilidades institucionais relativamente
ao corpo docente próprio da área policial de formação;
231
A fraca coordenação entre a ACIPOL e as unidades e subunidades operacionais
da Polícia sobre as necessidades destas em termos de nível de competência profissional
requerida aos oficiais graduados pela ACIPOL é apontada como um dos factores que
concorre para o distanciamento entre a formação oferecida pela ACIPOL e os sectores
de actividade policial concreta. Uma formação policial eficiente e eficaz não pode ser
realizada fora do contexto das actividades policiais que caracterizam o estado de
segurança pública.
-A ACIPOL oferece de grosso modo uma boa bagagem teórica devendo
melhorar as aulas práticas. As dificuldades dos cadetes nos primeiros anos de
trabalho têm a ver com o conflito de gerações e níveis de formação o que
resulta em exigências desfasadas do contexto científico. Em Matalana temos
aulas práticas, mas na academia não. Em nenhum momento realizei aula
prática em todas as cadeiras, no entanto estou já no 4º ano. No estágio o chefe
diz: se houver desordem todos vamos intervir, mas ainda não sei como
manejar uma arma. Não há actividades de tiro. No laboratório não se faz
nenhuma aula prática, mas no terreno exige-se. Na academia não há aulas
práticas (AC9-egresso).
A articulação entre a teoria e a prática na formação de oficiais da Polícia é
motivada por mudanças que vêm ocorrendo nos campos social, cultural, econômicos,
tecnológico e político. Ambas (teoria e prática) devem estar intimamente relacionadas,
numa relação de reciprocidade, são indissociáveis numa visão de unidade (PIMENTA
& LIMA, 2010, p.44).
Caso contrário, ter-se-à uma teoria desvinculada da prática e vice-versa, sendo
que a ACIPOL entra em contrapartida ante essas concepções, por ser o espaço
formador de oficiais da Polícia, tendo por finalidade apresentar as práticas pré-
profissionais e o estágio curricular como articuladores do equilíbrio entre a teoria e a
prática para essa formação. Daí a necessidade de estudar esta relação para a formação
do oficial da Polícia como um agente de transformação da realidade policial. Segundo
Pimenta e Lima:
O papel da teoria é iluminar e oferecer instrumentos e esquemas para análise e investigação que permitam questionar as práticas institucionalizadas e as ações dos sujeitos e, ao mesmo tempo, elas próprias em questionamentos, uma vez que as teorias são explicações provisórias da realidade (PIMENTA & LIMA, 2004, p. 43).
232
Faz-se imperioso melhor qualificar a formação técnica do profissional da
Polícia por ser essencial em seu labor cotidiano, bem como no relacionamento com os
cidadãos e a comunidade em geral. A segurança pública no contexto moçambicano
actual requer profissionais da Polícia habilitados para tomarem decisões prudentes
frente aos dilemas éticos e deontológicos relacionados à garantia da segurança de
pessoas, património, direitos humanos e da paz.
Na óptica e objectivos desta pesquisa teoria e prática são concebidas como
indissociáveis, ou seja, uma depende da outra, numa relação recíproca, em que a teoria
é reformulada de acordo com as necessidades reais. Deste modo,
Todos os componentes curriculares devem trabalhar a unidade teoria-prática sob diferentes configurações, para que não se perca a visão de totalidade da prática pedagógica e da formação como forma de eliminar distorções decorrentes da priorização de um dos polos (CANDAU, 1996, p. 60).
Assim, sob esta perspectiva, a ACIPOL enquanto instituição formadora de
oficiais da Polícia moçambicana tem a possibilidade de, através do deslocamento do
foco da aprendizagem dos formadores para os formandos, e do ambiente da
aprendizagem da sala de aula fechada para o ambiente de trabalho policial, favorecer
em seu currículo esta união equilibrada entre teoria e prática para que o futuro oficial
da Polícia tenha condições de inserir-se na corporação e na sociedade como
profissional qualificado.
-Deviam ser realizadas visitas de estudo às unidades e subunidades da PRM
onde seriam dados esclarecimentos nos próprios locais das unidades, por
exemplo visita à medicina legal, FPAI, FIR, FER, etc, etc,. Deve se planificar
aulas teóricas e aulas práticas e incentiva-se a pesquisa, facto que passa
necessariamente pela ligação com o DEIPLA70 que devia fornecer informações
sobre os aspectos de interesse policial; a questão da esquadra-escola devia ser
retomada com seriedade; dos mestrados que estão sendo feitos, qual é que
está ligado a área policial? Quase que nenhuma. ( AC2-grupo focal 1).
70 DEIPLA – Departamento de Informação e Plano.
233
4.3. Possibilidades de aprimoramento na formação de oficiais da Polícia no sentido da articulação entre a teoria e a prática
A formação actual “não comunica com a realidade, ela faz comunicados” (CM3).
As ideias fundamentais apontam para a (re)estruturação e melhoramento da
organização, planificação, coordenação das actividades de formação e a preparação de
todos os actores que actuam na formação; foi apontado que a formação actual “não
comunica com a realidade, ela faz comunicados”. Este dado constitui um indicador
forte do distanciamento entre o conteúdo da formação e as necessidades específicas das
áreas operacionais da Polícia.
É necessário tornar a conexão entre a teoria e a prática uma realidade da
formação e da vida profissional dos oficiais da Polícia, podendo ser melhorada,
também, a selecção dos conteúdos ministrados em cada disciplina. Por último, pensar-
se na formação integral dos futuros oficiais da Polícia.
-Acho que um recém graduado nunca será bom antes de começar a trabalhar
na realidade; no terreno quando a situação muda o cadete esquece tudo o que
aprendeu na escola e perde a cabeça, mas quando já tem alguma experiência
até sabe interpretar os fenómenos. Por isso, acho que o que ele precisa é ter
contacto regular com a realidade antes de terminar o curso para saber o que
lhe espera depois (CM12).
-Sou da opinião que os cadetes deveriam participar na planificação da
actividade operacional junto com o chefe das operações, de modo que estes
possam elaborar eficazmente os planos de missões operacionais na área
operativa (EP22);
-Acho que o cadete devia passar em todos os sectores que compõem uma
esquadra, nomeadamente: serviço de permanência, PIC, trânsito,
comunicações, sectores burocráticos e outros, em vez de o cadete esgotar todo
o tempo previsto para o estágio no sector de permanência (EP23);
-Para além das tarefas do oficial de permanência, os cadetes deviam ser
integrados no grupo operativo em exercício de tarefas concretas no terreno,
como forma de conhecer as reais actividades do Polícia (EP3);
234
-Tratando-se de formação de oficiais, devia se incidir mais na matéria de
Direcção (comando e liderança) e nos aspectos práticos ligados à
especialidade que cada um devia seguir (ESF4);
Analisando as contribuições dos participantes e do currículo vigente da
ACIPOL, entre outros aspectos, constata-se que o processo de formação pode ser mais
ajustado à natureza e forma de funcionamento das unidades operacionais da Policia e, a
partir dessa aproximação, introduzir mudanças qualitativas no modo de organizar as
actividades formativas, tendo em vista ajudar os estudantes a atingirem o máximo
rendimento pedagógico e os docentes/formadores a melhorarem a mediação.
4.3.1. Fortalecer a área de Ciências e Tecnologia Policiais
A área de Ciências e Tecnologia Policiais, ao contrário das restantes áreas
científicas do currículo, apresenta baixo índice de organização e de funcionamento,
devido à falta de docentes e formadores próprios, e à escassez de bibliografia e meios
de ensino para o suporte das matérias leccionadas. Mais preocupante ainda é a
constatação de que grande parte dos conteúdos leccionados nas diversas disciplinas da
área policial, pela sua falta de profundidade e abrangência, não parece adequada ao
nível superior.
Portanto, faz-se referência que um dos aspectos a ser melhorado é a actualização
dos conteúdos, em resposta aos últimos desenvolvimentos, principalmente
tecnológicos, na sociedade e no mundo do crime, como o crime organizado, o tráfico de
seres humanos, o tráfico e consumo de drogas, a pedofilia, os crimes cibernéticos, o
combate ao terrorismo, a Inteligência policial e a Inteligência da segurança pública, e
os paradigmas de parcerias, proximidade, mediação, cidadania, adesão ou orientação
para os problemas, co-produção da segurança e justiça restaurativa.
Ética, Legalidade, Planejamento, Técnica e Ação de Comando formam o pentagrama de atuação de um comando de polícia nos ideais do Estado Democrático de Direito para a preservação da ordem pública. Dentro desse diapasão, pode-se citar o primeiro valor-fonte das ciências policiais que é a proteção integral aos Direitos Humanos, ou seja, agir com a finalidade de propor(?) segurança aos interesses e às garantias individuais e coletivas da pessoa, quer seja natural ou jurídica, pública ou privada (DA SILVA, 2010, p.66).
235
Deve-se, também, considerar as questões mais gerais de conhecimento tais
como a reforma do sector público, a democratização da Polícia (policiamento
comunitário, policiamento de proximidade), a criação de Ramos da Polícia, segundo o
nº1 do artigo 13 da nova Lei da Polícia da República de Moçambique (Lei nº 16/2013
de 27 de Agosto, que revoga a Lei nº 19/92 de 31 de Dezembro) – com a necessidade
de alimentar estes com pessoal formado; a integração regional; a interligação com as
outras áreas, pois o trabalho policial é vasto e complexo.
(...). Na verdade, policiar não é uma actividade única, tratando-se antes de um conjunto complexo de actividades (Bayley, 2006, p.118). De qualquer forma, as funções de controlo criminal e manutenção da ordem e tranquilidade pública, são as funções nucleares do mandato policial tanto em termos de soberania do Estado, como em termos simbólicos na representação que os cidadãos fazem da polícia. Porém, a Polícia realiza também Serviços de carácter administrativo, incluindo as atribuições e competências na área económica, saúde pública e salubridade, ambiente, tráfego rodoviário, etc. (BITTNER, 2003, p.253).
A outra questão levantada está relacionada com a formação integral do cadete o
que significa, sob nosso ponto de vista, a adopção de um currículo integrado.
A integração curricular, no entanto, não se realiza apenas pela oferta de
disciplinas da educação/formação profissional. Integrar requer uma leitura da realidade
concreta, com a participação dos sujeitos envolvidos na aprendizagem, para considerar
e retratar suas relações e suas especificidades. Para isso, é necessário mais do que
práticas de cooperação entre as disciplinas do conhecimento científico. “A integração
exige que a relação entre conhecimentos gerais e específicos seja construída
continuamente ao longo da formação, sob os eixos do trabalho, da ciência e da cultura”
(RAMOS, 2005, p. 122).
O exercício da aprendizagem, nesta perspectiva, tem relações estreitas com as
condições específicas dos formandos e formadores. Por isso, integrar sob os eixos do
trabalho, da ciência e da cultura como operação didáctica e pedagógica pressupõe uma
atitude e acção comprometidas com as relações estabelecidas no lugar da
aprendizagem.
Esse compromisso, na formação policial, é político-profissional e, como tal,
requer a compreensão de que formar exige interferir em determinada realidade e tomar
posição. Não posso ser oficial da Polícia “se não percebo cada vez melhor que, por não
poder ser neutro, minha prática exige de mim uma definição” (FREIRE, 2010, p. 102).
236
4.3.2. Fortalecer a área policial articulando a pesquisa com a formação
Uma das sugestões apresentadas pelos participantes foi a necessidade de
articular a pesquisa com a formação. Constata-se que a pesquisa científica que se
realiza na ACIPOL é insipiente e fraca, nomeadamente por parte dos docentes e
cadetes. Portanto, ela está separada do processo de formação, o que é uma situação
preocupante para uma Instituição de Ensino Superior, na qual a qualidade da formação
está intimamente ligada à qualidade da pesquisa, porque é fundamentalmente na
pesquisa que os docentes, mas também os discentes contribuem para o aumento do
acervo científico institucional e nacional, como pontos de partida para sua contribuição
ao nível geral da (re)construção do conhecimento.
Pelo facto de que as organizações, tal como é a Polícia da República de
Moçambique, serem geralmente complexas, ambíguas e repletas de paradoxos, faz-se
necessário aprender a lidar com esta complexidade, o que acaba gerando o benefício de
se encontrar novas maneiras não só de organizar, mas também de equacionar e resolver
os problemas organizacionais por meio de pesquisas que contemplem as várias
abordagens. Lima & Pimenta (2010) consideram que um dos pontos de abordagem
pode ser o estágio curricular:
O estágio como método de formação (dos futuros oficiais), se traduz, de um lado, na mobilização de pesquisas que permitam a ampliação e análise dos contextos onde os estágios se realizam, em especial, se traduz na possibilidade de os estagiários desenvolverem postura e habilidades de pesquisador a partir de situações de estágio, elaborando projectos que lhes permitam ao mesmo tempo compreender e problematizar as situações que observam (PIMENTA & LIMA, 2010, p.46).
Acima de tudo, o trabalho policial propriamente dito é sempre um trabalho de
pesquisa, quer seja das situações sobre as quais é preciso tomar decisões, agir,
encaminhar, quer seja para enquadrar as decisões e as acções à legislação apropriada,
quer seja ainda para dirimir conflitos ou esclarecer fenômenos enigmáticos. Portanto, a
pesquisa permeia sempre a acção de um oficial da Polícia reflexivo e competente.
237
4.3.3. A orientação às especialidades como estratégia de formação prática
Relativamente à formação orientada para as especialidades, o currículo do curso
de licenciatura (graduação) na ACIPOL estrutura-se em quatro áreas científicas, as
quais corporizam o tronco comum do curso com a duração de três anos lectivos.
1. Área de Ciências e Tecnologia Policiais
2. Área de Ciências Jurídicas
3. Área de Ciências Exactas e de Gestão
4. Área de Ciências Sociais e Humanidades.
Esta estrutura foi mantida mesmo depois da revisão do currículo concluída em
2012 e introduzido em 2013. A distribuição do fundo de tempo lectivo é de 48% para a
área policial; 26% para ciências sociais e humanidades, 17% para a área jurídica e 9%
para a área de ciências exactas e de gestão. Essa distribuição mostra certo incremento
do fundo de tempo na área das ciências sociais e humanidades (antes 20%, agora 26%),
facto que revela a preocupação em tornar a formação dos oficiais da Polícia mais
orientada às necessidades sociais dos cidadãos.
A figura 14 ilustra as áreas científicas do currículo revisto e respectiva
distribuição do fundo de tempo em percentagem (%).
Figura 13: áreas científicas e carga horária do currículo revisto
12Fonte: ACIPOL, currículo revisto, 2012, pp. 7-8.
Além da combinação das várias áreas científicas, tem-se em conta, neste modelo curricular, a ligação entre o conhecimento teórico e prático, a colocação do cadete no centro do processo de ensino-aprendizagem, o
238
desenvolvimento de práticas de reflexão e pesquisa no terreno e o desenvolvimento de um “esprit de corps” como bases para a formação das competências requeridas para a formação superior do oficial da polícia (ACIPOL, 2012, p.2).
A discussão havida aos vários níveis do Ministério do Interior (MINT), da
Polícia da República de Moçambique (PRM) e ACIPOL, partindo da análise da
estrutura e das necessidades da sociedade, do MINT e da PRM, concentrou-se na
determinação das diferentes especialidades que constituiriam o perfil de saída. Foram
assim definidas quatro especialidades que corporizam 4 perfis de saída dos graduados:
1. Segurança Pública
2. Investigação Criminal e Criminalística
3. Migração e Fronteiras
4. Administração e Logística
Os participantes da pesquisa referiram-se a esta matéria nos seguintes termos: é
necessário pensar-se numa formação diferenciada para os ramos especializados da
Polícia.
A idéia predominante é de que as práticas pré-profissionais sejam realizadas ao
longo dos três anos de tronco comum do curso e o estágio curricular supervisionado
seja realizado na etapa complementar do curso e direccionado aos perfis de saída. Esse
procedimento permitiria que o processo de aprendizagem se aproximasse mais ao
ambiente do trabalho policial em que o oficial estará envolvido depois da graduação.
Em termos de processo pedagógico, os perfis de saída podem constituir-se eixos
de aprendizagem, em que matérias específicas, que exigem habilidades específicas,
com finalidades específicas, desafiam os estudantes e os docentes (formadores) no
campo teórico-prático e em actividades formativas de prática em ambiente profissional,
combinando assim o desempenho e o conhecimento, que a literatura analisa
criticamente nos seguintes termos:
Temos, portanto, dois elementos a serem considerados: o desempenho e o conhecimento. Mas a análise ainda não está completa. Pessoas se comunicam. Dizem ou mostram o que sabem fazer. Isso cria uma teia comunicativa que é muito importante em termos de aprendizagem. Temos assim três diferentes componentes que podem ser considerados na constituição do saber técnico (prático): a informação, o conhecimento e o desempenho (BARATO, 2003, p.28).
239
4.4. Os atributos ligados às relações com as comunidades como referenciais de uma
formação policial vinculada à realidade social
Os atributos ligados às relações comunitárias são a proximidade, parcerias,
mediação e co-produção da segurança. Para Oliveira (2007, p.12), a expressão
proximidade exprime a forma como se devem processar as relações entre o aparelho
administrativo do Estado e os cidadãos (isoladamente ou organizados). Trata-se de
estabelecer uma relação mais aberta e orientada para as pessoas, que abranja a ideia de
uma predominância do papel dos cidadãos, de exigências de desburocratização, e
expectativas de participação na gestão e nas decisões comunitárias.
Parcerias constituem, grosso modo, junção de esforços entre várias entidades,
no sentido de resolverem problemas que se inserem no âmbito da sua missão –
dinâmica horizontal. O objectivo é resolver problemas que não possuem, normalmente,
uma natureza exclusivamente securitária ou policial, por via de uma acção concertada,
global e concomitante entre os diferentes parceiros. Para o efeito, existem parcerias
formais/institucionais e informais ou “privadas” (OLIVEIRA, 2007, p.13).
Mediação é um dos processos de relacionamento entre a administração e os
cidadãos, em oposição à anterior relação autoritária da administração. Trata-se de um
processo/oportunidade para resolver disputas ou incomunicabilidades em que um
elemento neutral ajuda as partes em litígio a chegarem a um consenso.
A co-produção, por sua vez, é o processo de trabalho conjunto entre vários
actores (responsáveis pela segurança – novos e tradicionais) no sentido da construção
de uma sinergia global, que proporcione mais e melhores respostas para os problemas
da (in)segurança pública.
O Conhecimento (Expertise) coloca a necessidade de adaptar as respostas de
segurança/policiais às situações, em concreto, isto é, antes da tomada de decisão é
necessário estar na posse do conhecimento técnico relativo ao meio, aos intervenientes
sobre os quais vai intervir o diagnóstico social/segurança, enquanto ferramenta
privilegiada de conhecimento (OLIVEIRA, 2007, pp. 7 e 16?).
Relativamente à Inteligência Policial, podemos registar que a inteligência é uma
das ferramentas para a obtenção de conhecimentos voltados para o processo de tomada
de decisões e de implementação de políticas públicas nos domínios da política externa,
defesa nacional e preservação da ordem pública.
240
Por sua vez, a inteligência de segurança pública (ISP) actua no suporte e auxílio
das investigações e na assessoria para a tomada de decisão nos níveis táctico e
estratégico da organização policial.
Na actividade policial, mais concretamente no domínio prospectivo e proactivo,
a Inteligência analisa as tendências da criminalidade, apoiando a gestão da segurança
pública na formulação de novas políticas, programas e planos focados mais nas causas
estruturais do que conjunturais. No nível táctico, a inteligência produz conhecimentos
que possibilitam o eficiente, eficaz e racional emprego do policiamento ostensivo
(FERNANDES, 2012, p. 9)
Assim, a Inteligência Policial tem como objectivo produzir informações
operacionais a serem utilizadas pelos gestores dos serviços policiais com a finalidade
de enfrentar a criminalidade com maior eficiência e eficácia, proporcionando à
sociedade maior segurança. Trata-se de uma actividade que, nas polícias modernas, é
imprescindível na busca de dados, com o objectivo de produzir informações criminais
operacionais, que permitem o mapeamento criminal e alicerçam a co-produção da
segurança em parceria com as comunidades (ibidem).
Segundo Gonçalves (2010, p.231), a doutrina de Inteligência Policial, ao nível
do comando, salvo algumas excepções, compreenderá a produção de conhecimento a
três níveis: estratégico, tático e operacional e destinar-se-á a “facilitar o processo
decisório de gestão policial bem como a subsidiar o trabalho de Polícia
Judiciária/Investigação Criminal na produção de provas e revelação de evidências sobre
autoria de crimes.” Naturalmente, haverá algumas variações desta concepção
doutrinária conforme as especificações e legislação de cada País, mas em geral, a
produção do conhecimento nesta área tenderá a facilitar as decisões a estes níveis.
Inteligência Policial: é o conjunto de acções que empregam técnicas especiais de investigação, visando a confirmar evidências, indícios e a obter conhecimentos sobre a actuação criminosa dissimulada e complexa, bem como a identificação de redes e organizações que actuem no crime, de forma a proporcionar um perfeito entendimento sobre a maneira de agir e operar, ramificações, tendências e alcance de condutas criminosas (GONÇALVES, 2010, p.232).
Quanto à Inteligência da Segurança Pública (ISP), Lima Ferro define-a nos
seguintes termos:
Inteligência de Segurança Pública: é a actividade permanente e sistemática via acções especializadas que visa identificar, acompanhar e avaliar ameaças
241
reais ou potenciais sobre a segurança pública e produzir conhecimentos e informações que subsidiem o planejamento e execução de políticas de Segurança Pública, bem como acções para prevenir, neutralizar e reprimir actos criminosos de qualquer natureza, de forma integrada e em subsídio à investigação e à produção de conhecimentos (FERRO, 2006, p.85).
i. Formar para defender os direitos dos cidadãos e racionalizar o uso da força
O uso da força na actuação policial tem-se constituído como um dos pontos de
divergência de opiniões entre vários analistas, organizações da sociedade civil e, com
particular destaque, as organizações defensoras dos direitos humanos. Para a Polícia,
muitas vezes se tem constituído num dilema entre o limite de uso desse poder
discricionário e a necessidade de cumprimento do dever de reposição da ordem,
quando, por alguma razão ou circunstância, é quebrada.
Em Moçambique são recorrentes opiniões e pronunciamentos que contestam a
actuação da Polícia, principalmente das unidades de operações especiais de
intervenção. Alguns pronunciamentos denunciam o uso excessivo da força na
intervenção policial, enquanto outros apontam para o excesso de zelo. Marcineiro
(2007, p.57) analisa esse dilema nos seguintes termos:
A polícia tem como papel principal nas sociedades contemporâneas o controle do crime e a manutenção da ordem, no sentido de garantir a segurança e o convívio harmônico entre os seres humanos em sociedade. Isto significa dizer que a atividade policial refere-se, de um lado, ao conceito de crime, que é por definição legal, fundamentado por regras formais, gerais e expícitas; de outro, à noção de ordem pública, resultante de opiniões e convenções, sujeita a diferentes interpretações. Esse paradoxo ligado à atividade policial, ao concentrar conceitos de certa forma contraditórios, representa o dilema enfrentado pelos Estados Democráticos na imposição de um modelo de “ordem sob lei.
A Organização das Nações Unidas (ONU) impõem regras e limites de utilização
da força pelas polícias dos países membros e, acima de tudo, orientam que os
funcionários que por razão das suas funções usam armas de fogo, devem ser
devidamente treinados:
Todos os funcionários responsáveis pela aplicação da lei deverão possuir as características morais, psicológicas e físicas adequadas e receber formação apropriada. A sua aptidão para o desempenho das respectivas funções deverá ser reexaminada periodicamente. A formação deverá incidir sobre a legítima utilização da força, os direitos humanos e as técnicas policiais, devendo ser prestada especial atenção às alternativas à utilização da força e de armas de fogo, nomeadamente métodos de resolução pacífica de conflitos (ONU, 2001, p.122).
242
Na formação é possível é possível serem considerados e serem postos em
prática procedimentos eficazes de participação e recurso, aplicáveis aos possíveis
incidentes de utilização da força e de armas de fogo.
No entanto, É difícil descrever o dilema do papel da Polícia na sociedade
democrática, ou seja, de se transformar em instrumento politicamente neutro no
controle social (Marcineiro, 2007, p.57). A figura 15 mostra uma cena de uso da força
pela Polícia moçambicana que pode ser circunscrita no dilema entre a necessidade e a
racionalidade.
Figura 14: Cena de uso da força pela Polícia moçambicana
Fonte: CIP (centro de Integridade Pública), 2010
A fonte que registou a imagem (CIP), no texto explicativo descreve-a como
Pormenor da violência policial contra cidadãos: violação de direitos humanos só
possível em Moçambique neste tipo de situações.
Retratos, imagens, gravações, vídeos e outros materiais didácticos podem ser
usados para ilustrar as boas práticas e as práticas proibidas de uso da força pelas
autoridades policiais.
Os funcionários superiores deverão ser considerados responsáveis pela
utilização ilegal da força ou de armas de fogo por parte dos seus subordinados caso
tenham conhecimento, ou devessem ter tido conhecimento, de tais abusos e não tomem
medidas adequadas para lhes pôr fim.
243
Permite-se a utilização de armas de fogo em legítima defesa do próprio agente
da Polícia ou de terceiros contra um perigo iminente de morte ou lesões físicas graves,
ou a fim de proceder à captura de uma pessoa que apresente tal perigo, caso as medidas
menos extremas se revelem insuficientes. É proibida a utilização intencional de armas
de fogo com conseqüências fatais, a menos que absolutamente inevitável a fim de
salvar uma vida (ONU, 2001, p.121).
Figura 15: Cena de utilização de armas de fogo para dispersar manifestações em Moçambique
Fonte: CIP (centro de Integridade Pública), 2010
As normas e regulamentos sobre a utilização de armas de fogo por parte de
funcionários responsáveis pela aplicação da lei deverão fornecer orientações sobre as
circunstâncias em que tais funcionários estão autorizados a transportar armas de fogo,
garantir que as armas de fogo sejam utilizadas apenas nas circunstancias adequadas e
de maneira a diminuir os riscos de lesões, disciplinar o controlo, armazenagem e
distribuição de armas de fogo e prever um sistema de participação sempre que os
agentes policiais façam uso de uma arma de fogo no exercício das suas funções (ONU,
2001, p.121).
Para além dos motivos éticos e jurídicos que obrigam a que a Polícia respeite as
normas internacionais relativas à utilização da força e de armas de fogo, existem
244
também considerações de índole prática e política. Os abusos e excessos na utilização
da força por parte da Polícia podem ter como efeito levar a que um trabalho, já de si
difícil, se torne impossível. Para além disso, tais abusos e excessos comprometem um
dos principais objectivos da actividade policial – a manutenção da paz e estabilidade
social.
Em resumo, as normas internacionais de direitos humanos exigem que a
utilização de armas de fogo pela Polícia seja uma medida excepcional; que a utilização
da força por parte da Polícia seja necessária e proporcional ao objectivo pretendido; e
que a utilização da força e de armas de fogo pela Polícia seja regulamentada, controlada
e compatível com os direitos fundamentais à vida, à liberdade e à segurança das
pessoas.
A formação dos oficiais da Polícia deve incidir sobre a demanda da PRM e da
sociedade em matérias de segurança pública. O currículo da ACIPOL fixa como núcleo
central os seguintes objectivos de formação:
Dos oficiais formados na ACIPOL, licenciados em Ciências Policiais, se espera que ajudem a impulsionar a PRM para que seja, uma instituição, cada vez mais actuante no domínio da prevenção e repressão do crime nas suas múltiplas vertentes; aceite pela relação construída com as comunidades; alicerçada no respeito pelos direitos humanos e na confiança mútua; respeitada pela integridade profissional da sua acção; reconhecida pela prontidão de resposta policial na defesa das populações e das instituições democráticas (ACIPOL, 2012, pp.3-4).
O novo conceito de segurança na sociedade democrática põe a problemática da
necessidade de adaptar as respostas às situações. Isto é, antes da tomada de decisão é
necessário estar na posse do conhecimento técnico, expertise relativo ao meio e aos
intervenientes sobre os quais se vai intervir (Goldstein,1990; Spelman e Eck, 1986
apud Oliveira, 2007, p.6). É necessário diagnosticar os problemas para que as soluções
encontradas sejam as mais adequadas. Daí a necessidade de diagnósticos de segurança,
como pré-requisito para a decisão e para a implementação das políticas de segurança. A
dinâmica da segurança é, assim, uma dinâmica horizontal que pretende mobilizar vários
actores sociais, através de um trabalho em parceria.
A prevenção de problemas complexos, como é caso do crime e do sentimento
de insegurança, exige respostas políticas interdisciplinares e multifacetadas, porque
como já afirmámos a segurança é fundamentalmente uma questão política. Mas
também exige das instituições que têm a tarefa específica de manter a segurança e a
tranquilidade públicas mudanças no sentido da prevenção, colocando por exemplo,
245
mais elementos policiais em funções de vigilância e de informação, que, de acordo com
alguns trabalhos empíricos reforça o sentimento de segurança (Wilson e Kelling apud
Ferreira, 2007, p.6); implementando modelos policiais inovadores no sentido da
resolução dos problemas de segurança mais prementes da comunidade e que melhores
resultados possam alcançar (SHERMAN apud FERREIRA, 2007, p.6).
Em suma, a formação dos oficiais subalternos da Polícia que dominem a
competência técnico-profissional que o graduado deve demonstrar na actividade
policial concreta, implica a adopção de um currículo que atenda às necessidades da
PRM, respeitando as especificidades dos ramos integrantes, mas tendo como foco a
filosofia da prevenção da violência; da mediação de conflitos; da investigação e
inteligência no controle da criminalidade; do policiamento voltado para a construção de
uma relação entre polícia e sociedade como parte de uma política de direitos humanos;
do exercício de valores morais e éticos de carácter colectivo; e da Polícia como um
serviço público voltado para a garantia da ordem e segurança públicas e a protecção e
defesa da cidadania.
O que se nos deu a compreender, através dos dados da pesquisa, foi que, na
prática, as actividades realizadas pelos cadetes durante a formação não estabelecem,
pelo menos de forma organizada e didáctica, uma ligação lógica e formativa com a
formação teórica recebida na Academia. Por um lado, porque o sistema curricular
vigente é de um processo institucional de transmissão de conhecimentos e de inclusão
de valores corporativos socialmente aceites.
Uma característica notável que comprova esta afirmação é observada no facto
de que, através do seu desenvolvimento histórico, o sistema formativo da Polícia
moçambicana vem conservando o essencial: Transmissão de conhecimentos parcelados
em disciplinas; estudo dos problemas e processos concretos isolado do contexto policial
em que se dão; aprendizagem por acumulação de informações obtidas em manuais ou
processadas por outros.
Por outro lado, não existe ao nível da PRM e do MINT um instrumento (uma
matriz) que define os principais conteúdos de formação policial e que vincula os
estabelecimentos de formação policial, pelo menos ao nível dos oficiais. Os conteúdos
de formação são definidos pelos estabelecimentos de ensino. Por consequência, não
existe também um instrumento de regulação do estágio, especificando o seu conteúdo, ,
processo e objectivos, bem como os intervenientes ou actores.
246
No entanto, é possível reverter esta situação, contextualizando as actividades
formativas aos espaços de trabalho policial e o currículo à demanda social e da PRM.
Quer dizer, através de despachos e ordens de serviço emanados por autoridades
competentes, os cadetes podem ser integrados em espaços e grupos operativos em
exercício de tarefas concretas no terreno, para conhecer e praticar as reais actividades
da Polícia, desde que tal integração seja metódica, orientada, avaliada e visando
objectivos formativos de articulação entre os fundamentos teóricos e as habiliades
práticas da formação.
Os outros pontos de contacto podem ser as outras áreas de trabalho, ou seja, os
restantes ramos da Polícia como bombeiros, migração, unidades de operações especiais
e de reserva, tendo em conta que há oficiais da ACIPOL que são colocados nessas
áreas.
Tratando-se de oficiais subalternos cujas futuras actividades incluem,
estatutariamente, funções de comando, direcção e chefia, é imperioso que as suas
actividades, tanto nas práticas pré-profissionais quanto no estágio curricular,
contemplem o contacto com os dirigentes das unidades e subunidades, em busca de
conhecimento sobre as actividades de direcção.
ii. Desenvolver o sentido crítico
O que se pode perceber dos dados da pesquisa é a ausência de reflexão crítica
por parte dos participantes, sobre o que a Polícia faz. Esse facto, em primeiro lugar
induz à falta de elementos referenciais para os conteúdos de formação dos futuros
oficiais da Polícia.
Em segundo lugar, resume o trabalho da Polícia aos conceitos genéricos de
prevenção e combate ao crime, no entanto incipientes de conteúdo em termos de
estratégias, actividades proactivas e metodicamente reactivas para garantir a
manutenção da ordem e segurança públicas.
Em terceiro lugar, foram constantemente citados, de forma genérica, os
conceitos de trabalho proactivo e reactivo da Polícia. Esta forma de mencionar
conceitos pode significar que os participantes analiticamente não têm clareza sobre
trabalho da Polícia, limitando-se a repetir conceitos considerados aceites pelos valores
corporativos. Desta forma, podemos considerar a chamada de atenção dada por
MARCINEIRO (2007, p.26):
247
(...) a função da polícia passa a ser a de manutenção da ordem pública, da liberdade, da prosperidade e da segurança individual. É bem verdade que, embora date dessa época o início da preocupação com a garantia dos direitos individuais, fruto da declaração dos direitos humanos e do cidadão, em muitas sociedades o discurso dos dirigentes públicos de segurança contemplou esses valores, mas as ações dos integrantes das corporações de segurança foram em outra direção.
Marcineiro afirma também que a responsabilidade primeira da Polícia é a
garantia da segurança da sociedade e de cada membro da sociedade individualmente,
explicando a segurança nos seguintes termos:
a) A segurança individual é aquela pela qual o homem deverá sentir-se interna e
externamente seguro, ou seja, ter garantido direitos como os de liberdade, de
propriedade, de locomoção, de proteção contra o crime e também a solução de
seus problemas de saúde, educação, justiça, subsistência e oportunidade social;
b) A segurança comunitária é entendida como a garantia dos elementos que dão
estabilidade às relações políticas, econômicas e sociais, preservando a
propriedade, o capital e o trabalho para plena utilização do interesse social;
c) A segurança colectiva, por fim, é a idéia segundo a qual o poder nacional pode
ser fortalecido em consequência do apoio recíproco que se venha a estabelecer
com outros centros de poder, isto é, com um determinado grupo de países,
buscando-se nessa relação mútua a eliminação de controvérsias e maior
capacidade de conquistar e manter os objetivos de interesse comum.
4.5. O currículo integrado como possibilidade de articulação entre os fundamentos
teóricos e as habilidades práticas na formação policial
A idéia central se relaciona com a necessidade de se elaborar e aplicar um
currículo para a formação profissional equilibrada entre os fundamentos teóricos e as
habilidades práticas.
Os particpantes da pesquisa falaram claramente em desenvolver um currículo
integrado; desenvolver a multidisplinaridade, interdisciplinaridade, e criar uma
unidade de práticas;
Essa apreciação leva-nos a examinar o currículo integrado, o qual poderíamos
tentar definir como um plano pedagógico e sua correspondente organização
institucional que articula dinamicamente o campo de acção profissional e a formação,
prática e teoria, formação e relações com as comunidades.
248
O que se estimularia nos cadetes neste tipo de currículo não seria a
memorização passiva de conteúdos e dados, mas sim a investigação e compreensão dos
problemas, ou seja, a construção de seu próprio conhecimento através da participação
activa neste processo.
Relembremos que a emancipação curricular se adquire pela práxis, cujos
elementos constituintes são a acção e reflexão Grundy, (apud PACHECO, 2001),
p.142), e pela revitalização, no caso da realidade a que se refere este estudo, do
discurso crítico sobre a Polícia e condições em que desenvolve seu trabalho através de
potenciação de oportunidades de desenvolver reflexões-críticas a diversos níveis.
O Currículo Integrado, neste caso, seria uma opção formativa que permitiria,
como já referimos, a real integração entre prática e teoria e o imediato teste da prática,
ou seja, uma efectiva articulação entre formação e prática profissional.
Gadotti (1995), sustenta que o currículo integrado organiza o conhecimento e
desenvolve o processo de aprendizagem de forma que os conceitos sejam apreendidos
como sistema de relações de uma totalidade concreta que se pretende
explicar/compreender. No trabalho pedagógico, os métodos devem restabelecer as
relações dinâmicas e dialécticas entre os conceitos, reconstituindo as relações que
configuram a totalidade concreta da qual se originaram, de modo que o objecto a ser
conhecido revele-se gradativamente em suas peculiaridades próprias.
Em relação à integração formação-campo profissional, que este estudo propõe, é
necessário ter em consideração o facto de que aproximá-los espacialmente não garante
por si só a sua integração. Pode-se ter, por exemplo, uma sala de aula dentro do serviço
e a formação permanecer distanciada deste.
Além disso, corre-se o risco de tomar a chamada “realidade profissional” como
parâmetro de formação sem distinguir as insuficiências desta, reproduzindo-as
acriticamente.
Nestes espaços formativos, os componentes das unidades ensino-aprendizagem
ou dos eixos de formação devem preservar e desenvolver entre si uma relação de
interdependência que se concretiza na medida em que o processo de aprendizagem
avança.
Assim, o currículo integrado inscreve-se entre as propostas de inovação
formativa na ACIPOL, cujo objectivo é permitir uma efectiva integração entre ensino e
prática profissional; a real integração entre prática e teoria e o imediato teste da prática;
a busca de soluções específicas e originais para diferentes situações; a integração
249
formação-trabalho-comunidade, implicando uma imediata contribuição para esta última;
a integração docente–cadete na pesquisa e busca de esclarecimentos e propostas
(DAVINI, 2009, p.285);
Independentemente de a formação vir a ser orientada cada vez mais às
especialidades, é preciso compreender e considerar que para actuar no mundo, pensava
Comenius, não se pode ignorar a existência das coisas. É o que no mundo
contemporâneo se chama de conhecimento ou cultura geral; é o que no domínio policial
e da segurança pública se designa Inteligência. Ter uma compreensão do todo no que se
refere à ciência, à técnica, à cultura e às diferentes áreas de actuação policial não
significa tornar-se um especialista em cada uma delas. O importante é perceber o
objectivo de que todos os ramos policiais e todos os domínios da segurança pública
sejam actores, isto é, tenham uma postura activa no sistema de segurança pública.
4.5.1. Restaurando experiências e expectativas: as expectativas que os oficiais de
comando tinham sobre o desempenho dos formados pela ACIPOL.
As expectativas, de forma geral, incidem sobre mudanças que eram esperadas
com a formação e integração dos novos oficiais “recém chegados” à corporação
incluídos no seio dos oficiais mais experientes. Esta actualização é uma quebra de
paradigma, revitalizando a PRM que necessita de constante actualização para alcançar
os resultados de trabalho pretendidos, através de concepções cada vez mais
actualizadas.
Do curso de formação de oficiais esperava-se o desenvolvimento ou reforço de
qualificações científicas e técnico-profissionais para que as funções e os deveres do
grupo profissional em causa pudessem ser desempenhados de forma eficaz e com o
devido respeito pelos regulamentos policiais específicos.
O desenvolvimento de competências deve ser visto como um processo contínuo,
uma vez que as habilidades são aperfeiçoadas através da prática e da aplicação. Esse
processo pode assim ter de ser continuado à luz das necessidades de formação
identificadas em áreas específicas do trabalho dos graduados, por exemplo, através dos
programas de acompanhamento e assistência técnica desenvolvidos localmente.
250
Assim, uma formação eficaz visará a melhoria: dos conhecimentos técnico-
profissionais; das habilidades e das atitudes para contribuir para o cumprimento da
missão da Polícia e para um comportamento individual e colectivo adequado.
No entanto, fazendo uma análise mais profunda das opiniões apresentadas pelos
participantes pode percebe-se que a expectativa é que se desenvolva programas de
formação para melhorar os conhecimentos dos futuros oficiais nas seguintes áreas:
operacional, jurídica, administrativa e de gestão, relações comunitárias, ética e
deontologia profissional, fundamentos de ciências policiais e fundamentos de
segurança pública. Essas áreas quando desdobradas em actividades formativas
representam, de facto, um vasto campo de conhecimento.
Neste sentido, e interpretando as opiniões dos participantes com recurso ao
manual de PTO71, podemos identificar os assuntos–chave que se supõe que um oficial
subalterno domine como resultado da aprendizagem e, na sequência, os conteúdos
formativos que o currículo deveria incluir. Esses assuntos apresentam-se como
actividades e são designados, tecnicamente, por competências–chave. Por uma questão
de coerência com a maioria da literatura especializada, vamos designá-los da mesma
forma neste trabalho.
A matriz do PTO identifica 15 resultados da aprendizagem na formação de
oficiais da Polícia. Neste trabalho foram identificados 18 resultados, mais três do que
os identificados no PTO, nomeadamente Direcção e Estratégia policial, Cooperação
policial/parcerias e Análise criminal/inteligência policial.
71 PTO manual- Police training officer manual (manual de formação de ofiais da polícia), é um manual desenvolvido pelo Fórum Executivo da Pesquisa Policial (Police Executive Research Forum) do Departamento da Justiça dos EUA em 2001.
251
Quadro 9: Matrix de resultados de aprendizagem
N/O COMPETÊNCIA-CHAVE (De Natureza Cognitiva)
N/O COMPETÊNCIA-CHAVE
(De Natureza Operacional/habilidade)
01 Resolução de conflitos 12 Operação policial motorizada
02 Procedimentos locais, políticas, legislação, filosofia organizacional
13 Uso da força e de armas de fogo
03 Liderança 14 Elaboração de relatórios
04 Problemas específicos das comunidades
15 Habilidades de resolução de problemas
05 Diversidade cultural e necessidades específicas de grupos sociais
16 Segurança pessoal e segurança no trabalho
06 Autoridade legal 17 Habilidades de comunicação
07 Direitos individuais 18 Análise criminal/inteligência policial
08 Ética e Deontologia profissional 19 Estilo de vida; Autoconsciência; Auto-regulação perante situações de stress
09 Direcção e Estratégia policial
10 Cooperação policial/parcerias
11 Preservação da Paz e Segurança
Fonte: autor- cruzamento dos dados da pesquisa com a matriz de resultados da aprendizagem do PTO (2002, p.89)
O desenvolvimento das competências-chave identificadas implica a adopção de
estratégias formativas nos currículos e nos cursos de formação de oficiais. Uma das
estratégias que mais se aproxima à estrutura do currículo de formação em ciências
policiais pode ser a descrita por Schön (2008) e Davini /2012), que consiste na
organização dos conteúdos em componentes:
a) Componente Sócio-Cultural
Esta componente deve proporcionar condições para o desenvolvimento ou
reforço das capacidades de autonomia, acção reflexiva, iniciativa, auto-aprendizagem e
resolução de problemas no exercício da profissão, com enfoque nas habilidades,
atitudes e comportamentos de natureza pessoal, relacional e social;
b) Componente Científico-Tecnológica
Esta componente visa o desenvolvimento de conhecimentos (competência) que
integram o exercício profissional, no domínio das tecnologias e actividades práticas
(habilidades) com ele relacionadas.
252
c) Componente Prática
Esta componente pode ser desenvolvida em contexto de formação que integra o
contexto real de trabalho, por forma a permitir o treino das habilidades desenvolvidas
em todo o processo formativo, bem como criar condições que permitam uma maior
adequação às necessidades do trabalho policial geral e específico.
A aprendizagem e o treino destas competências poderão ser realizados de
variadas formas, nomeadamente com recurso à articulação das actividades formativas
com:
• As Práticas pré-profissionais desenvolvidas ao longo do curso em unidades e
subunidades policiais ou instituições do sistema da administração da justiça com
incidência na área da segurança pública;
• O Estágio curricular supervisionado em unidades e subunidades policiais com as
quais a Academia, entanto que entidade formadora, pode celebrar protocolos.
4.5.2. Ideias preliminares sobre a construção do currículo integrado: Presupostos
práticos e metodológicos
O Currículo Integrado, pela sua gênese, tem carácter transformador e apresenta-
se, portanto, como possibilidade de superação do carácter dual e excludente que tem
acompanhado historicamente o processo educativo, em especial, a formação
profissional. Por esta razão, apresenta um conjunto de pressupostos epistemológicos e
pedagógicos a partir dos quais oferece alternativa às formas dicotômicas da educação.
No estudo sobre o currículo um dos pontos mais críticos é precisamente o como
montar um currículo que considere e atenda todas as sensibilidades nele interessadas. O
mesmo acontece com o currículo integrado. As diferentes teorias e estudos sobre este
tipo de currículo debruçam-se sobre o seu conteúdo, suas vantagens e outros atributos,
mas dificilmente pode-se encontrar uma receita sobre como montar um currículo
integrado. Davini (2012, p.285) afirma a esse respeito que:
É precisamente neste ponto onde não existem receitas padronizadas e é aqui onde se espera a criatividade dos que se defrontam com a tarefa de elaborar um currículo com ditas características. É necessário compreender que o trabalho deve ser encarado como um processo desenvolvido em comum e procurando vencer as tendências estereotipadas de reproduzir experiências anteriores.
253
A autora anota que o currículo, obedecendo aos mínimos fixados pelas
autoridades da instituição formadora, deve ser flexível e adaptado às diversas situações,
susceptível de ser constantemente avaliado e melhorado de acordo com as experiências.
Ao montar o currículo integrado para a formação policial é preciso considerar
que a formação de Polícia inclui um processo de obter conhecimentos, habilidades e
atitudes que permitam executar tarefas profissionais específicas.
Os polícias em início de carreira e menos gradudos têm de seguir essa via para
ganharem a capacidade de desempenhar tarefas específicas de Polícia. A formação
superior de Polícia tem como objectivos os conhecimentos, habilidades e atitudes, mas
são apresentados e aprendidos através de uma maior reflexão, mais orientados para o
problema e analisando o processo de aprendizagem (JASCHK et al, 2007, p.5).
De todos os modos, é factível sugerir alguns passos e procedimentos úteis para a
elaboração do currículo integrado adaptado à realidade, articulando o equilíbrio entre
os fundamentos teóricos e as habilidades práticas da formação. As sugestões que se
seguem baseiam-se nas reflexões conjugadas de Davini (2012), Masetto (2010), Schön
(2008) E Pimenta & Lima (2004).
1. É aconselhável partir para a elaboração de uma clara definição de atribuições
que estão e deveriam estar implicadas na prática social da função policial. É
importante levar em conta tanto as atribuições que “estão” como as que
“deveriam estar”, pois incorporar somente as vigentes significa pensar que a
prática actual é absolutamente ajustada às necessidades do serviço e da
sociedade ou que não existiriam possibilidades de melhorar na definição das
mesmas. Mas também é necessário identificar atribuições que, apesar de serem
desejáveis, não poderiam ser incorporadas por não estarem dadas as condições
sociais e organizacionais para fazê-las. Daí ser importante que este primeiro
passo seja desenvolvido através de um fecundo debate entre as pessoas
envolvidas na tarefa de montar um currículo e, dentro do possível, com
entidades vinculadas à própria Polícia e com os próprios interessados.
Chamaremos de Perfil Profissional a resultante deste processo de debate, que
inclui atribuições profissionais legitimadas pela prática policial actual e
atribuições desejáveis em condições de serem incorporadas e aceites.
Na definição deste perfil devem também ser levadas em conta as caraterísticas
do meio social onde o policiamento se desenvolve, e as características dos estudantes
254
(cadetes). As primeiras se referem à estrutura social, grau de organização comunitária,
localização social da profissão policial, formas de vida, valores, costumes, e outros. As
segundas, aos esquemas de aprendizagem predominantes nos formandos, as suas
experiências educacionais e profissionais. Se não forem levados em conta estes
factores, corre-se o risco de elaborar um perfil bonito em sua apresentação, porém
desvinculado da realidade (DAVINI, 2012, p.286).
2. Para evitar que a elaboração do perfil fique em forma de lista de atribuições,
talvez seja conveniente reuni-las em áreas ou conjuntos de atribuições,
referindo-se cada a um tipo genérico de actividades. Esta classificação pode
adoptar diversas formas, segundo o que se quiser destacar, devendo-se optar pela
que reúna mais consenso e seja mais adequada ao exercício da profissão de
Polícia.
3. De cada área de atribuição deverão ser detectadas as competências necessárias e
os conceitos, processos, princípios e técnicas para o desenvolvimento de tais
competências;
4. O passo seguinte será arrolar as diferentes listas de conceitos e processos para o
desenvolvimento das competências, estabelecendo relações entre elas,
detectando conhecimentos comuns e hierarquizando-os.
Trata-se de um processo de síntese e destaque dos conhecimentos necessários
que dará como resultado uma árvore de conhecimento, encadeados e relacionados
como em uma rede. Chamaremos esta rede de estrutura de conteúdos. Aos conceitos,
processos ou princípios mais gerais ou englobados chamaremos de assuntos-chave,
sendo provável que existam vários assuntos-chave na estrutura total.
5. Cada assunto-chave e sua correspondente rede de conhecimentos teóricos e
práticos dará lugar a uma unidade de aprendizagem. Esta se define como uma
estrutura pedagógica dinâmica, orientada por determinados objectivos de
aprendizagem, em função de um conjunto articulado de conteúdos e
sistematizada por uma metodologia didáctica. Cada unidade guarda certa
autonomia com respeito às demais, porém, ao mesmo tempo, se encontram
articuladas com as outras com vista à integração das áreas de atribuições e do
perfil profissional.
255
4.5.3. Elementos de aproximações sucessivas ao Perfil Profissional
A seguir, apresentaremos algumas sugestões sobre os elementos centrais da
programação curricular, os objectivos e a metodologia. Essas sugestões, em nossa
opinião, são relevantes na medida em que poderão ser tidos em conta na orientação e
avaliação das práticas pré-profissionais e do estágio curricular, no sentido de verificar
como é que os fundamentos teóricos e as habilidades práticas se encadeiam e alcançam
os objectivos da formação.
1. Se aderirmos a uma pedagogia que pretende preparar o formando como sujeito
activo, reflexivo, criativo e solidário, os objectivos da aprendizagem que
propusermos não poderão consistir na memorização de informações, nem na
execução mecânica de determinados comportamentos. Isto não quer dizer que os
conhecimentos em si sejam negligenciados. Pelo contrário, além de serem
imprescindíveis, a actividade de aprendizagem do sujeito que aprende se aplica
sempre a um objectivo ou assunto que requer ser “apreendido”. Mas o que
importa é criar condições para que o formando possa construir activamente o seu
próprio conhecimento. Assim, a aprendizagem se dará como resultado da
“apreensão” activa a partir da própria prática do sujeito e das sucessivas
mudanças provocadas pela informação gradativamente acomodada nas
experiências anteriores.
2. Portanto, os objectivos de cada unidade deverão reflectir esta actividade de
aprendizagem do formando no processo de sucessivas aproximações ao
conhecimento. Assim, por exemplo, poderão indicar, como metas parciais de
aprendizagem, que o formando compare, distinga, classifique, busque causas e
consequências, identifique princípios ou regularidades, determine objectivos de
acção, selecione métodos e técnicas adequadas, execute, e analise criticamente a
sua acção e o processo seguido (DAVIN, 2012, p.288).
256
Figura 126: currículo integrado - exemplo de unidades de aprendizagem
• Objectivo• Assunto ou Conceito – Chave• Metodologia
• Objectivo• Assunto ou Conceito – Chave• Metodologia
• Objectivo• Assunto ou Conceito – Chave• Metodologia
Unidade 1
Unidade 2
Unidade 3
PERFILPROFISSIONAL
ÁREA DEATRIBUIÇÕES
OUCOMPETÊNCIAS
CURRÍCULO INTEGRADO: Unidades de Ensino - Aprendizagem
Fonte: Autor, adaptado a partir de DAVINI (2012, P. 286 ) -
3. Importa fazermos referência ao outro elemento central na elaboração das
unidades curriculares: a metodologia. É neste ponto que se opera uma profunda
mudança no processo pedagógico, já que o currículo integrado representa a
integração trabalho-ensino. A metodologia supõe planificar uma série encadeada
de actividades de aprendizagem que surgem das situações do próprio serviço. A
partir delas, se incentivará a reflexão e busca de conhecimentos que reverterão
em novas formas de acção.
A figura 18 faz uma representação esquemática do percurso operacional de uma
unidade de aprendizagem. Cada unidade de aprendizagem percorrerá o mesmo processo
podendo variar os materiais e estratégias, integrando aprendizagem individual e grupal,
mas sempre no mesmo sentido.
257
Figura 17: Unidade de aprendizagem no currículo integrado
UNIDADES DE ENSINO DO CURRÍCULO INTEGRADO: PROCESSO DE BUSCA DO CONHECIMENTO
TEORIA
SELECÇÃO DE PRINCÍPIOS E
MÉTODOS PARA ACÇÃO FUTURA
NOVA PRÁTICA/TRANSFORMA
ÇÃO DA REALIDADE
REFLEXÃO
Fonte: Autor, adaptado de DAVINI (2012, P. 287 )
De acordo com Davini (2012, p. 288), este modelo de organização curricular se
fundamenta no princípio de que a aprendizagem não é alcançada de forma instantânea
nem por domínio de informações técnicas, pelo contrário, requer um processo de
aproximações sucessivas e cada vez mais amplas e integradas, de modo que o
formando, a partir da reflexão sobre suas experiências e percepções iniciais, observe,
reelabore e sistematize seu conhecimento acerca do objecto em estudo.
Enquanto processo pedagógico, o desenvolvimento do programa curricular
supõe a interacção dinâmica entre o supervisor e o formando. Cabe ao primeiro
estimular e orientar este processo de modo que a apropriação da informação científica,
necessária ao desempenho eficaz do formando, se dê respeitando o ritmo individual, os
esquemas de aprendizagem de que dispõe e as características culturais. Assim, a
programação curricular funciona como orientação para o supervisor e mediação entre
este e o formando (SCHÖN, 2008, p.126).
Ao supervisor cabe orientar sistematicamente a reflexão e análise a partir das
próprias percepções iniciais dos formandos, estimulando a observação, a indagação e a
258
busca de resposta. Durante este processo corrigirá desvios e junto com seus formandos
avaliará seus avanços e dificuldades.
Nesta metodologia de aprendizagem, o supervisor obriga-se sempre a respeitar o
ritmo de aprendizagem e os padrões culturais de quem aprende, não para retardar o
processo, mas, sim, para que os formandos produzam seus próprios conhecimentos e
mudanças com um sentido de integração e compromisso com seu trabalho e com a
unidade à qual pertençam. Estimulará sempre a busca activa de conhecimentos e
técnicas apropriadas a cada situação. Finalmente, as actividades pedagógicas
sequenciadas segundo esta metodologia deverão guardar coerência com os objctivos
selecionados (DAVINI, 2012, p.288).
4.5.4. Pressupostos a considerar na Avaliação da aprendizagem do currículo
integrado
O tema Avaliação requer um detalhamento especial, não somente pela
importância do assunto, mas pela função especial que lhe cumpre dentro do currículo
integrado. Este currículo se fundamenta no princípio de que a aprendizagem não é
alcançada de forma instantânea nem por domínio de informações técnicas, pelo
contrário, requer um processo de aproximações sucessivas e cada vez mais amplas e
integradas, de modo que o formando, a partir da reflexão sobre suas experiências e
percepções iniciais, observe, reelabore e sistematize seu conhecimento acerca do objeto
em estudo (DAVINI, 2012, p. 289).
Durante a realização das tarefas, o educando consolidará sua aprendizagem
aprofundando a observação de seu meio e aplicando os conceitos que pouco a pouco
vão sendo elaborados. O supervisor, como orientador da aprendizagem, acompanha
este processo, discute com o educando, corrige e oferece informações adicionais,
estimula a reflexão e a observação, detectando também as difi-culdades específicas,
registrando-as para solução imediata ou retomada no próximo período de concentração.
Esta atividade é denominada recuperação paralela e pode ser dirigida a indivíduos ou a
grupos que apresentam a mesma dificuldade.
Do exposto, infere-se que nós estamos abordando o processo de avaliação
defendido por Cappelletti (2011) e Saul (2010) que se inicia com o acompanhamento
sistemático da evolução do educando na construção do seu conhecimento.
259
Dentro desta perspectiva, a avaliação é um componente de grande importância,
sendo considerada como parte integrante do processo de planificação curricular,
estando presente em todos os estágios de seu desenvolvimento e não apenas confinada
aos seus resultados finais.
Assim, nesta proposta não se concebe a avaliação como um momento separado
ou independente do processo de ensino. Ao contrário, ela é pensada como uma
actividade permanente e indissociável da dinâmica de ensino-aprendizagem, o que
permite acompanhar passo a passo o avanço dos formandos, detectar a tempo suas
dificuldades, ajustar e reajustar a formação e suas características aos diferentes
contextos, corrigir e reforçar o processo de ensino.
Não se trata, portanto, de avaliar para eliminar, mas sim para acompanhar e
recuperar. Sendo assim, a avaliação não está dirigida somente ao formando, mas
também ao processo como um todo, visando subsidiar a tomada de decisão no sentido
de superar dificuldades de operacionalização e assegurar uma apropriada utilização e
combinação de tempo, recursos humanos e materiais para o alcance dos objectivos
desejados.
Portanto, além do acompanhamento sistemático do formando, a avaliação
permite ao mesmo tempo estimar a eficácia do programa de formação, verificar sua
adequação aos objectivos e detectar possíveis falhas, tanto do programa quanto do
trabalho do supervisor.
Estas duas dimensões da avaliação não são estanques. A existência de um
encadeamento lógico entre a programação e a execução é de primordial importância e
a compatibilização entre elas pode ser feita através de “produtos parciais” que
correspondam às várias unidades didácticas e que orientam a execução em direcção a
resultados finais esperados.
Finalizando a análise dos dados sobre as possibilidades de assegurar uma
formação equilibrada entre os fundamentos teóricos e as habilidades práticas,
articulados a partir das práticas pré-profissionais e do estágio curricular supervisionado,
no quadro 10 resumimos as principais constatações deste estudo, tomando em
consideração os seguintes elementos de análise: Conteúdo de trabalho dos oficiais
subalternos da Polícia, objectivos da formação, conteúdos formativos, componentes
curriculares da formação, valores que a formação visa promover, conteúdo das práticas
pré-profissionais e do estágio curricular, articulação entre a ACIPOL e as unidades e
subunidades da Polícia.
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ação
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ínio
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mor
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26
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ciam
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26
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icas
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e se
gura
nça
públ
ica.
265
266
O quadro 11 apresenta a proposta de princípios pedagógicos funcionais para a
formação policial, desenvolvidos com inspiração na pedagogia crítica. Os princípios da
pedagogia crítica enfatizam foco no processo de aprendizagem; a construção de redes
de conhecimento que promovam a integração, a cooperação e a articulação entre
diferentes instituições; as diversas modalidades de ensino; os diferentes tipos de
aprendizagem e recursos; o desenvolvimento de competências cognitivas, operativas e
afectivas; a autonomia intelectual72 e a reflexão antes, durante e após as acções.
72 Autonomia Intelectual - “Adaptabilidade do profissional, isto é, sua possibilidade de agir em situações diferentes, de gerir incerteza e de poder enfrentar as mudanças no exercício da sua profissão.” (PAQUAY et al. 2001, p. 32 apud ALTET 1992).
267
Quadro 11: Proposta de Princípios Pedagógicos Funcionais para a formação policial
N/O PRINCÍPIO
PEDAGÓGICO CONTEÚDO ESSENCIAL
01 Integração com a comunidade
No centro da formação do cadete deve estar contemplado o objectivo do mesmo actuar com a comunidade profissional da polícia e de todo o sistema de segurança pública, visando as necessidades da comunidade global (população).
02 Postura mais activa do estudante
O estudante deve estar no centro da aprendizagem, participando activamente em todas as actividades da sua formação.
03 Postura mais facilitadora, mediadora do docente
O docente deve desenvolver acções de ensino que incidem nas dimensões activas e interactivas dos estudantes, discutindo e orientando-os nos caminhos de busca, escolha e análise das informações, contribuindo para que sejam desenvolvidos estilos e estratégias de estudo, pesquisa e socialização do que foi apreendido. Insere-se, ainda, o esforço em propiciar situações de aprendizagem que sejam mobilizadoras da produção colectiva do conhecimento.
04 Indissociabilidade Ensino-Pesquisa
Docência voltada à orientação do estudante para a construção do seu conhecimento por meio da pesquisa. Observa-se que, na ACIPOL interagem diferentes modelos de docência: o do pesquisador com total dedicação à academia e uma sólida formação científica; o do professor reprodutor do conhecimento e o do professor que se dedica à actividade acadêmica, mas carece de uma formação consistente para a produção e socialização do conhecimento. A institucionalização de práticas de formação docente torna-se, assim, fundamental.
05 Avaliação como feedback, numa concepção formativa
Nessa perspectiva, a avaliação é tomada como meio de aprendizagem e não um fim em si mesma. A avaliação oferece o norte para melhor conduzir a aprendizagem dos estudantes e o próprio PEA. A feedback constante garante a certeza da interlocução na relação aluno-professor.
06 Desenvolvimento docente na formação interprofissional
Como parte de sua filosofia, a instituição deve envolver o docente, ao dar responsabilidade e reconhecimento pelo debate crítico, desenvolvimento e revisões necessárias ao curso, formados por eixos composto por módulos distintos a serem trilhados pelos estudantes. O saber profissional de cada um deve ser partilhado para o projecto comum. A formação e desenvolvimento do corpo docente deve ser parte integrante da filosofia institucional.
07 Formação compartilhada e integrada
A formação do oficial da Polícia não pode ser feita através de uma única área de conhecimento. Ela integra várias áreas e várias sensibilidades. Assim, também é novo para o professor sair da métrica disciplinar e colocar-se no diálogo com colegas oriundos de outros campos disciplinares, relativizando suas certezas e acreditando ser possível e necessário (re)conhecer as dinâmicas do saber, fazer e ser em formação policial.
Fonte: Autor, inspirado em princípios da Pedagogia crítica de Giroux (1997), Mclaren (1997), Schön
(2000)
268
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo revela que a inquietação da missão back stopping e do relatório do
diagnóstico interno desenvolvido no âmbito da elaboração do Plano Estratégico da
ACIPOL (PEACIPOL), se justifica nas lacunas que o currículo do curso de
Licenciatura (graduação) em Ciências Policiais oferecido pela ACIPOL apresenta.
Os dados da pesquisa mostram que o currículo do curso de formação
profissional para os futuros oficiais da Polícia revela uma ênfase excessiva no controle
do crime em uma estratégia exclusivamente reactiva da Polícia, e dirigida
principalmente para o confronto, apontando deficiências, na área da actividade
preventiva, com enfoque na negociação de conflitos e no relacionamento directo com o
cidadão para a co-produção da segurança; evidencia-se, igualmente, uma clara
insuficiência na preparação do oficial da Polícia, para o trato de outras demandas e
interesses da população que não estejam restritas apenas ao cumprimento da lei, mas
que dizem respeito à manutenção da ordem pública pela via das parcerias, participação
e negociação.
A área de Ciências e Tecnologia Policiais, que constitui o núcleo central do
curso, ao contrário das restantes, apresenta baixo índice de organização e de
funcionamento, devido à falta de docentes e formadores próprios, e à escassez de
bibliografia e meios de ensino para o suporte das matérias leccionadas. Mais
preocupante ainda é que grande parte dos conteúdos leccionados nas diversas
disciplinas da área policial, pela sua falta de profundidade e abrangência, não é
adequada ao nível superior.
Quanto ao processo pedagógico, caracteriza-se por deficiente entrosamento
entre as áreas científicas definidas no currículo, as quais se mantêm estanques,
fragmentadas, isoladas umas das outras, e pelo uso excessivo do método expositivo em
sala de aula, em detrimento de espaços de aula e da cooperação com os sectores da
actividade policial real.
As idéias dos oficias investigados sobre as possibilidades do aprimoramento na
formação dos oficiais divergem, com os oficiais mais antigos (comandantes) a
defenderem uma formação mais rígida e voltada para os aspectos doutrinários,
disciplinares e tácticos da corporação, e os oficiais mais novos a defenderem uma
formação mais aberta, com conteúdos e métodos que tenham em conta a dinâmica
269
social actual. Porém, todos defendem que o currículo deve ser melhorado e a formação
deve estar articulada com a prática policial real.
Assim, antes que se proponham currículos e metodologias, cumpre levar em
conta que a formação policial em Moçambique ainda é marcada por uma concepção
autoritária do emprego da Polícia, e que os próprios polícias não estão isentos de
valores culturais de uma sociedade fortemente preconceituosa e hierarquizada (Da
Matta, 1979).
A discussão dos dados da pesquisa e as propostas (possibilidades) que são
apresentadas consideram, portanto, que não se trata de formar apenas os polícias que
entrarão na Polícia doravante (formação inicial), mesmo porque estes poucos que
entrariam (em relação à totalidade dos polícias em actuação em Moçambique hoje), não
fariam muita diferença nem mesmo a médio prazo. Mais que tudo, trata-se de realizar a
formação continuada dos polícias já “formados” anteriormente, para desconstruir
paradigmas de pensamento e acção dentro de uma nova concepção, em que todos os
cidadãos, inclusive os polícias, independentemente da sua condição social, sejam vistos
como sujeitos de direitos e destinatários da protecção da Polícia.
A formação do oficial da Polícia, por conseguinte, é aqui vista de uma
perspectiva democrática e crítica, fundamentando-se nas seguintes premissas: a
política de emprego da Polícia numa sociedade democrática é parte da política geral de
efectivação e promoção da cidadania e da universalização dos direitos; a Polícia é um
serviço público para a protecção e defesa da cidadania; o fundamento da autoridade
policial é a sua capacidade de administrar e solucionar conflitos.
A Polícia, portanto, não é neutra nem imparcial, por definição: é a favor da lei e
da ordem e contra aqueles que a querem infringir ou perturbar. A tarefa de law
enforcement, que vai fundar essa função institucional, refere-se sempre à imposição
universal – igual para todos – de uma determinada regra de conteúdo perfeitamente
identificável por todos e de expressão literal, acertada como de vigência consensual em
um determinado local (DA MATTA, 1979, p.193).
Os dados da pesquisa permitem afirmar que a formação dos polícias tem que
incluir processos de socialização acadêmica e profissional que os actualizem em
termos de procedimentos vigentes de construção da verdade e de administração de
conflitos.
A metodologia, ou melhor, a dinâmica da formação escolarizada é mais
importante do que os currículos enquanto intencionalidades formais. A formação do
270
polícia entre nós tem sido tradicionalmente centrada na idéia de “treinamento” ou
“instrução”, onde se busca a padronização de procedimentos, na base de repetições
mecânicas, reproduzindo uma ideologia marcadamente repressiva e punitiva, retirando
dos polícias a capacidade reflexiva diante de situações complexas, como as questões da
delinqüência juvenil, da adolescência, das drogas, da descriminação social, do gênero,
do idoso, da criminalidade violenta, da preservação da Paz e outras. Em suma,
condiciona-se o polícia para obedecer ordens irreflexivamente.
Se a primeira e mais substantiva função legítima da Polícia constitui a
administração e solução de conflitos do cotidiano, é evidente que a esta função devem
estar subordinadas as demais, por definição secundárias. Assim, tanto a reconstrução da
verdade dos factos pela investigação destinada a esclarecê-los e a punir eventuais
transgressores da lei, quanto a repressão explícita necessária e a contenção de
comportamentos individuais ou colectivos que põem em risco a segurança de todos,
devem se constituir em procedimentos previsíveis e conseqüentes, decorrentes de uma
política de segurança pública baseada na inevitabilidade do conflito e na necessidade de
sua administração para o exercício pleno da cidadania na sociedade estruturada
juridicamente em Estado moderno, de Direito e Democrático.
Formados para exercer com competência e zelo esta função, devem os oficiais
da Polícia e os demais polícias, acima de tudo, estar seguros e cientes de que a teoria,
na prática não pode ser outra, mas que os princípios explícitos que informam a
segurança pública, a ser implementada por seus agentes, devem ser aplicados por todos
a todos, de maneira universal, constituindo-se sua transgressão em acto ilegítimo que
não pode ser caracterizado nem sustentado pelos valores que pretendem perenizar a
desigualdade e a exclusão na sociedade moçambicana, em nome de uma concepção
idealizada e anacrônica de uma sociedade sem conflitos.
Relacionando as opiniões dos oficiais da Polícia investigados, os dados da
pesquisa e a orientação para a especialidade preconizada pelo currículo revisto,
podemos concluir que os conhecimentos específicos, por actividade, como investigação
criminal e criminalística, ou técnicas de abordagem e outras que corporizam os perfis
de saída do currículo revisto, aos quais fizemos alusão no capítulo III, seriam
enfatizados e consolidados em cursos técnicos ou de especialização profissional
propriamente dita, numa perspectiva integrada. Tais cursos, no entanto, teriam que ser
fundados e desenvolvidos como partes subsequentes da formação inicial.
271
Esta socialização especializada, entretanto, certamente encontrará dificuldades
adicionais, uma vez que os polícias, tanto nos ramos quanto nas unidades de operações
especiais e de reserva quanto ainda em áreas de processos policiais, estão
hierarquizados de forma excludente e elitizada, com comandantes, chefes e oficiais no
topo, e sargentos e guardas na base, respectivamente, o que não é estranho para uma
corporação policial paramilitar como a PRM.
Porém, para retroalimentar todo o sistema em termos de pessoal qualificado, e
universalizar a formação, por um lado, e especializá-la, por outro, os cursos deviam ser
oferecidos de acordo com critérios de mérito em relação às habilitações específicas
dos candidatos às funções. Assim, a hierarquia e a disciplina da Polícia – muito
reclamada pelos oficiais mais antigos – estariam fundamentadas em valores coerentes,
não se pressupondo que o comandante seja aquele que tudo sabe, que melhor
habilitação tem para administrar com eficiência e legitimidade a acção colectiva.
Essa formação, realizada de acordo com os preceitos que o estudo propõe,
objectivaria capacitar os futuros oficiais da Polícia para o desempenho da sua função
em estrita observância dos cânones norteadores da função policial numa sociedade
democrática. Além disso, visaria preparar os futuros oficiais para actuarem com
responsabilidade e bom senso, compreendendo a importância do seu papel social, onde
deve-se destacar sua habilidade em administrar ou dirimir conflitos através da
combinação de técnicas operativas com as discursivas e de negociação pela persuasão e
argumentação, só recorrendo à coerção com uso de força física ou tecnológica em caso
de extrema necessidade e dentro dos preceitos legais.
Finalmente, tal formação também transmitiria a aprendizagem que caracteriza a
produção de conhecimentos científicos – verdades e factos – de acordo com os
princípios correntes na validação da produção científica e contemporânea.
Deste modo, o presente estudo também levanta a proposição de que os cursos
deveriam ter um núcleo básico de formação que não se estruturasse simplesmente em
torno de disciplinas que repassassem conteúdos acabados, mas que transformasse a
organização actual de áreas científicas em eixos de aprendizagem. Haveria de ter,
além das disciplinas e módulos, seminários e actividades práticas. Disciplinas técnicas
complementares e cursos para actividades especiais completariam a formação do oficial
da Polícia.
272
Estariam previstos desdobramentos periódicos do curso – as práticas pré-
profissionais – tanto no sentido horizontal – de consolidação das aprendizagens
realizadas – quanto no vertical – de aprofundamentos temáticos e pesquisa,
introduzindo, de facto, um projecto de formação continuada e articulada com a prática,
que permita ao futuro oficial reciclar-se contínua e permanentemente. Assim, as
práticas pré-profissionais e o estágio curricular seriam um elo articulador, por
serem interpretados como um ponto convergente entre a teoria e a prática, percebendo-as como um elo “equilibrador” no ajustamento natural do estudante, no sentido de melhor receber adequação e entendimento das exigências técnico-profissionais e éticas da área policial na qual terá de atuar (LIMA & OLIVO, 2007, P.51).
Na abordagem crítica conhecida como práxis (prático-teórica), preconiza-se que
o processo de formação (ensino e aprendizagem) esteja calcado na metodologia
participativa, em que os fundamentos teóricos, geralmente discutidos em diferentes
espaços de aula, funcionando o formador (docente) como orientador e estimulador das
discussões, se complementam com actividades práticas concretas da realidade
profissional, que poderão ser estudos de caso, análise de vídeos sobre actuações
policiais reais, participação orientada e acompanhada em missões operacionais, entre
outras.
A pesquisa revela que falta instrumento regulador do estágio e das práticas pré-
profissionais (regulamento do estágio e práticas pré-profissionais) que indique o que se
entende por estágio na formação policial, como ele deve decorrer, bem como os actores
vinculados.
A teoria estudada e os resutados da pesquisa mostram que os saberes do fazer
são tão ou mais exigentes, inteligentes e dignos que os saberes do saber. Boa parte da
qualificação dos oficiais da Polícia de Moçambique ainda ocorre de acordo com as
dinâmicas da aprendizagem corporativa. Para nós, essa idéia, que vem tomando corpo
desde que iniciou a formação superior em Ciências e Tecnologia Policiais, é
conservadora. Nós formadores policiais, como actores críticos e reflexivos,
visualisamos o modelo de formação integral como a opção mais se aproxima às
necessidade de formação profissional no contexto de Moçambique, pois é algo
“científico” e garante resultados mais sólidos em termos de competências e domínio
de conhecimentos e habilidades por parte do oficial graduado (BARATO, 2003, p.20).
273
Considera, igualmente, que se o espaço para a formação não valorizar a
dignidade das pessoas que serão responsáveis por garantir a segurança de outras
pessoas, elas poderão reproduzir o desrespeito aos seus pares e aos cidadãos, quando
estiverem na actividade-fim.
Por fim, apresentamos como proposta para discussão a necessidade de se
estabelecer uma Matriz Curricular Nacional contendo preceitos que fundamentem a
concepção das acções formativas para os oficiais da Polícia, e para todos os polícias,
como profissionais da área de segurança pública, entendidas como um processo aberto,
complexo e diversificado que reflecte, desafia e provoca transformações na concepção
e implementação das políticas de segurança pública, contribuindo para a (re)construção
de novos paradigmas culturais e estruturais.
274
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287
ANEXOS
Relação dos anexos
Anexo Conteúdo
1 Ficha 1- inquérito sobre as actividades realizadas por um comandante de
esquadra: tipo de complexidade, dificuldade de execução e frequência de
tarefas que são solicitadas diariamente a um comandante de esquadra
2 Ficha 2 - inquérito sobre as actividades realizadas por um comandante de
esquadra: tipo de dificuldade de execução e frequência de tarefas que são
solicitadas diariamente a um comandante de esquadra.
3 Roteiro de entrevista dos participantes do nível central da PRM
4 Roteiro de entrevista dos participantes do nível provincial (comandantes
provinciais da PRM e directores da Ordem)
5 Guião de debate (entrevista) dos grupos focais 1 e 2
6 Questionário sobre as actividades realizadas por um cadete estagiário na
esquadra da PRM
7 Questionário dirigido aos graduados (egressos) da ACIPOL
Anexo 1
INQUÉRITO SOBRE AS ACTIVIDADES REALIZADAS POR UM COMANDANTE DE ESQUADRA1
FICHA 1
(Documento de pesquisa)
Este questionário destina-se a determinar o tipo de complexidade, dificuldade de execução e
frequência de tarefas que são solicitadas diariamente a um comandante de esquadra.
Este inquérito é anônimo, pelo que não deve escrever o seu nome, assinar ou rubricar neste
documento em qualquer lugar.
Este questionário é constituído por duas colunas:
Coluna 1: As competências, qualificações e solicitações exigidas a um comandante de
esquadra.
Coluna 2: Tempo despendido na realização das tarefas enunciadas na coluna 1.
Nos quadros seguintes estão tipificadas algumas tarefas relacionadas com as diferentes
actividades exigidas a um comandante de esquadra, durante a gestão diária de um
serviço.De acordo com o quadro da direita, atribua a cada uma delas a importância que
considera adequada em termos de solicitação dos seus conhecimentos teórico e práticos
adquiridos durante a sua formação policial.
Para tal deve formular previamente a seguinte questão:
Exemplo: Nas actividades de organização de uma esquadra, as tarefas de planificação
requerem........................................................................................................... 1 2 3 4 5
1
TIPOS DE QUALIFICAÇÕES OU COMPETÊNCIAS
EXIGIDAS DURANTE A GESTÃO DIÁRIA DE UM
SERVIÇO OPERACIONAL
Qual o tempo despendido nas actividades descritas?
Nunca Nenhum significativo Algum Muito
1 2 3 4 5
A. Organização da esquadra
1. Tarefas de planificação da actividade operacional; 1 2 3 4 5
2. Tarefas realizadas na aplicação do regulamento
disciplinar da PRM;
1 2 3 4 5
3. Tarefas realizadas no âmbito da gestão logística da
esquadra; 1 2 3 4 5
4. Tarefas de análise e despacho do expediente diário
elaborado;
1 2 3 4 5
2
5. Tarefas solicitadas por outros serviços da PRM; 1 2 3 4 5
6. Elaboração das escalas de serviço diário e
extraordinário;
1 2 3 4 5
7. Tarefas de âmbito civil e administrativo; 1 2 3 4 5
B. Gestão de Pessoal2
8. Supervisão da actividade operacional (execução de
serviço);
1 2 3 4 5
9. Análise dos relatórios e sugestões do pessoal
policial; 1 2 3 4 5
10. Implementação dos melhoramentos que
considerou importantes realizar após a análise dos
relatórios e sugestões apresentadas;
1 2 3 4 5
11. Propostas de louvor ao pessoal, nos termos do
Regulamento disciplinar da PRM; 1 2 3 4 5
12. Reuniões de preparação de uma actividade ou
missão operacional; 1 2 3 4 5
C. Gestão do tempo de um comandante de esquadra
13. Gestão da própria agenda diária; 1 2 3 4 5
14. Manutenção dos mesmos níveis operacionais de
comando em condições de stress; 1 2 3 4 5
D. Actividades de Planeamento e Concepção
15. Planeamento e concepção de actividades de
carácter social (palestras, conferências, festas); 1 2 3 4 5
16. Planeamento e concepção de rojectos de âmbito
policial; 1 2 3 4 5
17. Planeamento e concepção de discursos e
intervenções em público; 1 2 3 4 5
18. Planeamento e execução de Normas de Execução
Permanente (NEP´s);
1 2 3 4 5
19. Planeamento e execução de peritagens; 1 2 3 4 5
Muito obrigado pela colaboração
3
E. Relações Privadas ou institucionais
20. Contactos com instituições privadas da sua área
de jurisdição (competência);
1 2 3 4 5
21. Contactos com instituições públicas da sua área
de jurisdição (competência); 1 2 3 4 5
22. Porta-voz perante a comunicação social; 1 2 3 4 5
23. Análise da imprensa diária; 1 2 3 4 5
24. Execução e realização de palestras, conferências e
seminários; 1 2 3 4 5
25. Representação da PRM junto à comunidade local; 1 2 3 4 5
26. Participação em reuniões e comissões de
trabalho; 1 2 3 4 5
F. Competências Operacionais3
27. Planeamento e elaboração de relatórios de
missões operacionais; 1 2 3 4 5
28. Execução de uma missão operacional de rotina; 1 2 3 4 5
29. Execução de operações especiais (intervenção em
casos de terrorismo, crime organizado, seqüestro,
tráfico de pessoas, etc.). 1 2 3 4 5
Anexo 2
INQUÉRITO SOBRE AS ACTIVIDADES REALIZADAS POR UM COMANDANTE DE ESQUADRA
FICHA 2
(Documento de pesquisa)
Este questionário destina-se a determinar o tipo de dificuldade de execução e frequência de
tarefas que são solicitadas diariamente a um comandante de esquadra.
Este inquérito é anônimo, pelo que não deve escrever o seu nome, assinar ou rubricar neste
documento em qualquer lugar.
Para cada tipo de tarefa, classifique-a, marcando com círculo a proposta que considera
adequada, de acordo com a seguinte escala (veja o exemplo).
Quanto à dificuldade de execução:
1-Sem dificuldade; 2- De difícil execução; 3- De muito difícil execução
Quanto à freqüência:
1-Pouco freqüente (menos de 3 vezes por mês); 2- Frequente (entre 4 e 10 vezes por mês);
3- Muito frequente (mais de 10 vezes por mês).
TAREFAS Das tarefas enunciadas, classifica-as de acordo com:
Dificuldade de execução
Frequência
Tarefas judiciais
0 Exemplo: “Lavrar peças de expediente” 1 2 3 1 2 3
1 Notificações de tribunais 1 2 3 1 2 3
2 Pedidos de comparência 1 2 3 1 2 3
3 Audição de testemunhas ou arguidos 1 2 3 1 2 3
4 Pedidos de mandatos de busca 1 2 3 1 2 3
5 Pedidos de tribunais cíveis 1 2 3 1 2 3
6 Notificações para comparência no
hospital de vítimas de violência 1 2 3 1 2 3
7 Pedidos de notificação de argüidos ou
testemunhas 1 2 3 1 2 3
8 Cumprimento de mandatos de
condução ao tribunal 1 2 3 1 2 3
9 Cumprimento de mandatos de captura 1 2 3 1 2 3
Tarefas administrativas
10 Elaboração de expediente 1 2 3 1 2 3
11 Autos de denúncia (queixas) 1 2 3 1 2 3
12 Autos de detenção 1 2 3 1 2 3
13 Correcção do expediente elaborado
pelos agentes 1 2 3 1 2 3
14 Despacho do expediente 1 2 3 1 2 3
15 Transmissão de ordens ou informações 1 2 3 1 2 3
16 Serviço de protecção a altas
individualidades 1 2 3 1 2 3
17 Elaboração de Normas de Execução
Permanente 1 2 3 1 2 3
18 Operações de auto stop 1 2 3 1 2 3
19 Elaboração de autos de transgressão 1 2 3 1 2 3
20 Autos de apreensão 1 2 3 1 2 3
21 Fiscalização de excesso de velocidade 1 2 3 1 2 3
22 Fiscalização de álcool 1 2 3 1 2 3
23 Identificação de suspeitos 1 2 3 1 2 3
24 Autos de detenção 1 2 3 1 2 3
25 Buscas a residências 1 2 3 1 2 3
26 Elaboração de participações de
acidentes 1 2 3 1 2 3
27 Controle de manifestações e alterações
da ordem pública 1 2 3 1 2 3
28 Segurança a espetáculos públicos 1 2 3 1 2 3
29 Segurança a eventos desportivos 1 2 3 1 2 3
30 Actividades de investigação criminal 1 2 3 1 2 3
31 Análise de situação criminal da área de
jurisdição 1 2 3 1 2 3
32 Elaboração de mapas estatísticos de
criminalidade 1 2 3 1 2 3
33 Análise do relatório do serviço de
guarda 1 2 3 1 2 3
34 Condução de detidos 1 2 3 1 2 3
35 Participações disciplinares 1 2 3 1 2 3
36 Elaboração de processos disciplinares 1 2 3 1 2 3
37 Supervisão da actividade do pessoal 1 2 3 1 2 3
38 Organização de processos de
averiguações 1 2 3 1 2 3
39 Ministrar instrução militar 1 2 3 1 2 3
40
Ministrar instrução permanente (novas
informações e legislação recentemente
aprovada)
1 2 3 1 2 3
41
Supervisão ou passar revista ao
fardamento e ao equipamento
individual do pessoal
1 2 3 1 2 3
42 Supervisão do estado de conservação
do equipamento da esquadra 1 2 3 1 2 3
43 Elaboração de relatórios de rondas ou
serviços 1 2 3 1 2 3
44 Supervisão do serviço de secretaria 1 2 3 1 2 3
45 Supervisão e inspecção das instalações
de detenção 1 2 3 1 2 3
46 Elaboração e controle de escalas de
serviço 1 2 3 1 2 3
47 Elaboração e controle de escalas de
serviço extraordinário 1 2 3 1 2 3
48 Resposta a petições do pessoal 1 2 3 1 2 3
49 Elaboração e controle de mapas de
férias 1 2 3 1 2 3
50 Delimitação e controle de rondas 1 2 3 1 2 3
51 Supervisão da operacionalidade do
equipamento 1 2 3 1 2 3
52 Controle das viaturas e dos
equipamentos de comunicação 1 2 3 1 2 3
53 1 2 3 1 2 3
Muito obrigado pela sua colaboração
Anexo 3
Roteiro de entrevista do nível central
I - Dados Individuais do entrevistado:
1. Sexo: Masculino ( ) Feminino ( )
2. Idade:
3. Naturalidade: Província (.......)
4. Estado Civil: Solteiro (......); Casado (.......); Divorciado (......); Viúvo (......).
5. Escolaridade:
Secundário (......)
Bacharel (......)
Licenciatura (......)
Pós-Graduação (......)
II - Dados Profissionais:
1. Ano de ingresso na corporação: _______
2. Escola de formação: Nacional_________; Estrangeira:________
3. Ocupação anterior: ________
III. Questões preliminares
1. Que se lembra do seu processo de formação policial (disciplinas, instrutores, relação
instrutor e instruendo; espaço físico de formação)?
2. Em que sector mais dedicou- se no trabalho policial?
3. Como avalia sua formação policial em relação a actual (diferenças e pontos
comuns)?
4. Qual foi o papel ou missão da polícia que aprendeu na sua formação e qual é o
actual?
5. Qual é para si o verdadeiro trabalho policial (antes ou agora)? justifique
6. O que é um bom e um mau policial?
IV. Questões específicas
1. O que acha que deve ser melhorado na formação dos polícias?
2. Tomando em consideração que participou do processo da criação da ACIPOL que
metas tinham sido traçadas ou planificadas para a concepção de um novo polícia ou
de uma nova polícia?
3. E como avalia profissionalmente esse grupo de jovens recém formados pela
ACIPOL como resultado dessa planificação?
4. (Que competências (conhecimentos, habilidades e atitudes) você acha que os
polícias deveriam ter ao final de sua formação (superior) na ACIPOL)?
5. Acredita que a formação profissional na Academia de Polícia poderá reflectir na
qualidade dos profissionais da segurança e do serviço prestado? Justifique
6. Que expectativas se tinham em relação à formação dos policiais de nível superior
(ACIPOL)?
7. Acha que essas expectativas estão sendo correspondidas pelos recém formados na
ACIPOL?
8. Acha que devia haver algum envolvimento das unidades e subunidades operativas
da Polícia no processo de formação de oficiais feita pela ACIPOL? Se sim, de que
forma?
9. O que acha do estágio feito pelos cadetes durante a formação? (em termos de
organização, duração, locais de realização, acompanhamento e envolvimento dos
oficiais operativos).
10. Que sugestões poderia dar para melhorar a formação na ACIPOL, incluindo a
realização do estágio?
11. Qual é a opinião, em geral, dos dirigentes dos sectores que já receberam graduados
da ACIPOL, sobre o desempenho destes?
12. Considera o corpo docente da ACIPOL preparado para o ensino e pesquisa em
ciências policiais? E o que da situação de ser um corpo docente misto (polícias e
civis)?
13. Como avalia as pesquisas desenvolvidas pelos estudantes no final e ao longo do
curso na ACIPOL?
14. Que imagem você acha que a sociedade tinha e tem da polícia (antes e depois da
criação da ACIPOL)? Por quê?
Anexo 4
Roteiro de entrevista do nível provincial
(comandantes provs. da PRM e directores da Ordem)
I - Dados Individuais do entrevistado:
1. Sexo: Masculino ( ) Feminino ( )
2. Idade:
3. Naturalidade: Província (.......).
4. Estado Civil: Solteiro (......); Casado (.......); Divorciado (......); Viúvo (......).
5. Escolaridade:
Secundário
Bacharel
Licenciatura
Pós-Graduação (Mestrado, doutorado ou especialização)
II - Dados Profissionais:
6. Ano de ingresso na corporação: _______
7. Escola de formação: Nacional_________; Estrangeira:________
8. Ocupação anterior: ________
III. Questões preliminares
1. Que se lembra do seu processo de formação policial (disciplinas, instrutores,
relação instrutor e instruendo; espaço físico de formação)?
2. Em que sector mais dedicou- se no trabalho policial?
3. Como avalia sua formação policial em relação a actual (diferenças e pontos
comuns)?
4. Qual foi o papel ou missão da polícia que aprendeu na sua formação e qual é o
actual?
5. Qual é para si o verdadeiro trabalho policial (antes ou agora)? justifique
6. O que é um bom e um mau policial?
IV. Questões específicas
1. O que acha que deve ser melhorado na formação dos polícias?
2. Tomando em consideração que acompanhou o processo da criação da ACIPOL
que expectativas tinha sobre o desempenho dos polícias e da polícia?
3. Já teve a oportunidade de trabalhar directamente e interagir com os graduados da
ACIPOL?
4. E como avalia profissionalmente esse grupo de jovens recém formados pela
ACIPOL como resultado dessa interacção?
5. Em que áreas de actividades policiais (operativas, administrativas e de ligação
com a comunidade) você acha que os polícias formados na ACIPOL têm bom
domínio?
6. Que competências (conhecimentos, habilidades e atitudes) você acha que os
polícias deveriam ter ao final de sua formação (superior) na ACIPOL?
7. Que expectativas se tinham em relação à formação dos policiais de nível
superior (ACIPOL)?
8. Acha que essas expectativas estão sendo correspondidas pelos recém formados
na ACIPOL?
9. Acha que devia haver algum envolvimento das unidades e subunidades
operativas da Polícia no processo de formação de oficiais feita pela ACIPOL? Se
sim, de que forma?
10. O que acha do estágio feito pelos cadetes durante a formação? (em termos de
organização, duração, locais de realização, acompanhamento e envolvimento
dos oficiais operativos).
11. Que sugestões poderia dar para melhorar a formação na ACIPOL, incluindo a
realização do estágio?
12. Considera o corpo docente da ACIPOL preparado para o ensino e pesquisa em
ciências policiais? E o que acha da situação de ser um corpo docente misto
(polícias e civis)?
13. Que assuntos você acha que os cadetes deveriam pesquisar no final e durante o
curso?
14. Que imagem você acha que os polícias mais antigos têm com relação aos recém
formados pela ACIPOL? (são bem aceites e integrados, são estigmatizados e
rotulados, etc.) Justifique.
15. Que imagem você acha que a sociedade tinha e tem da polícia (antes e depois da
criação da ACIPOL)? Por quê?
Anexo 5
Guião de debate: grupos focais 1 e 2
I - Dados Individuais dos participantes:
1. Quantos participantes (......)
2. Sexo: Masculino (......) Sexo Feminino (......)
3. Escolaridade: Bacharel (......); Licenciados (......); Pós-graduados (......); Mestres
(......); Doutorados (......); Pós.doutorados (......); Cadetes (......).
4. Membros da PRM há mais de: 2 anos (......); 5 anos (.....); 10 anos (......); 15 anos
(......); 20 anos (.....).
II - Dados Profissionais:
1. Área profissional actual: docência (......); operativa (......); administrativa (......);
área de apoio (......); fora da PRM (......); em formação (......).
2. Escola de formação: Nacional (......); Estrangeira (......).
3. Área de formação: policial (......); Jurídica (......); ciências sociais (......);
Humanidades (......); Exactas (......); gestão (......); outras (......).
III - Questões específicas
1. O que acha que deve ser melhorado na formação dos polícias?
2. Como acha que devia ser organizado o estágio curricular? E as práticas pré
profissionais?
3. Quem acha que deve participar na organização, realização e avaliação do estágio
e das práticas pré-profissionais?
4. Como é que as diferentes áreas e disciplinas do currículo podem participar no
estágio e nas práticas pré-profissionais?
5. O currículo revisto da ACIPOL considera a existência de actividades
curriculares e actividades extra-curriculares. Qual é a sua opinião sobre essa
classificação?
6. Considera o corpo docente da ACIPOL preparado para o ensino e pesquisa em
ciências policiais? E o que acha da situação de ser um corpo docente misto
(polícias e civis)?
7. Que competências (conhecimentos, habilidades e atitudes) você acha que os
polícias deveriam ter ao final de sua formação (superior) na ACIPOL?
Anexo 6
Inquerita sabre as actividades realizadas par urn cadete estagiaria na
esquadra da PRM
Ficha 4
A
Este inquerito destina-se a determinar 0 tipo de complexidade, dificuldade de
execucao e frequencla de tarefas que sao solicitadas diariamente a um cadete
estagiario na Esquadra. Os resultados serao usados para elaborar a proposta de
organlzacao do estagio dos cadetes da ACIPOL.
B
Este inquerito e confidencial, pelo que nao deve escrever 0 seu nome, assinar ou
rubricar este documento em qualquer lugar,
c Este inquerito e constitufdo per quatro areas:
J.
II.
III.
IV.
Area de organtzacao da Esquadra
Area operativa da esquadra
Area de Investigacao Criminal
Area da PoHcia de Transite
D
Em cada area indique pelo menos cinco actividades que acha terem sido dificeis de
executar durante 0 teu estaglo na Esquadra,
Tarefas de planlflcacao da actividade operacional; Tarefas de analise e despacho do
expediente diario elaborado; Elaboracao das escalas de service diarlo e extraordinarlo:
Tarefas de Iiga<;ao com a comunidade da zona de jurisdicao da Esquadra; Tarefas de
lnstrucao das forcas operativas; Tarefas realizadas na aplicacao do regulamento
disciplinar da PRM na Esquadra;
1
II
Tarefas de oficial de Perrnanencia: Planeamento de missoes operacionais
(planeamento operativo); Elaboracao de relat6rios de missoes operacionais; Execucao
de mlssees operacionais de rotina (buscas, capturas, proteccao aos locais de crime,
etc.); Analise da sltuacao criminal da area da esquadra.
III
lnstrucao de processos crimina is; Notlficacoes de tribunais; audlcao de testemunhas
ou arguidos; Pedidos de mandados de busca a residencias: Pedidos de identiflcacao de
arguidos ou testemunhas; cumprimento de mandados de conducao ao tribunal; etc.
IV
Operacoes de auto-stop; Elaboracao de autos de transgressao: Hscallzacao do transito
em geral; Hscallzacao de excesso de velocidade; Hscallzacao de alcool aos
automobilistas; Fiscalizacao de veiculos com registos viciados (falsos); Elaborar;:ao de
partlclpacoes de acidentes de vlacao: Participacao em peritagens de acidentes de
viacao: etc.
2
v Que outras actividades acha que os cadetes deveriam realizar na Esquadra durante 0
estagio?
Que actividades ou rnaterias relacionadas com 0 trabalho pratico da polfcia acha que
os cadetes deveriam aprender na Academia antes de irem ao estaglo?
Qual ea sua oplnlao sobre 0 acompanhamento do estaglo pelos docentes da Academia
e pelos oficiais da Esquadra?
VI
Qual e 0 seu ponto de vista (opintao) pessoal sobre 0 conteudo, a organlzacao e 0
perfodo de realizacao do estagio?
Muito obrigado pela colaboracaol
3
Anexo 7
ANEXO. 5: Egressos da ACIPOL
Este inquerito econfidencial, pelo que nao deve escrever seu nome nem qualquer outro
dado que possa concorrer para a identificacao do inquirido. Os dados constantes deste
inquerito serao usados exclusivamente para elaborar as propostas de inovacao no
curriculo de formacao em ciencias policiais oferecida pela ACIPOL e do estagio
curricular do mesmo curso. Agradece-se a sua colaboracao em opiniao para rnelhorar a
formacao dos oficiais da PRM.
1- Dados Individuais do Inquirido:
1. Sexo: Masculino C ) Feminino C )
2. Idade:
3. Naturalidade: Provincia C ).
4. Estado Civil: Solteiro C ); Casado C....... ); Divorciado C......); Viuvo C· .. ...) .
5. Escolaridade:
Licenciatura
Pos-Graduacao C ), Mestrado C ), Doutorado C )
Especializacao C )
II - Dados Profissionais:
6. Ano de ingresso na PRM: _
7. Ocupacao anterior ao ingresso na PRM: _
III. Questoes preliminares
1. Em que sector mais dedicou- se no trabalho poJicial depois do seu curso de
formacao?
2. Como avalia 0 enquadramento dos graduados da ACIPOL nas areas
operacionais da PRM?
1
3. Qual e a avaliacao que faz entre 0 que aprendeu durante a formacao e as
exigencies policiais concretas?
4. Qual epara si 0 verdadeiro trabalho policial? Justifique.
5. 0 que eurn born e um mau policial?
IV. Questoes especificas
1. Opiniao sobre a formacao na ACIPOL: a formacao que recebeu na ACIPOL correspondeu as suas expectativas e permite responder as exigencias
profissionais actuais?
2. Em que e que a formacao que recebeu na ACIPOL ajuda nas suas funcoes
actuais?
3. Em que aspectos e que a formacao que recebeu na ACIPOL e forte e em que
aspectos efragil?
2
4. Lembrando todo 0 curso, 0 que mais te marcou: pela positiva e pela negativa?
5. Em que aspectos a formacao deveria incidir mais: • Que aspectos ou materias acha s que deveriam ser introduzidos ou
acrescentados na formacao em ciencias policiais?
• Que rnaterias ou aspectos achas que poderiam ser dispensados da
formacao em ciencias policiais?
• Que actividades encontraste na pratica e que achas que deveriam ser ensinadas na ACIPOL?
• Em que actividades encaras mais dificuldades no sector onde estas a
trabalhar neste momento?
3
6. Oplniao sobre 0 estagio curricular: tem se dito que a formacao que a ACfPOL oferece e mais teorica e nao esta vinculada apratica policial concreta. Concorda com essa opiniao? Argumente.
• Qual e a sua opiniao sobre 0 estagio que os cadetes realizam durante 0
curso em termos de: organizacao,
• locais de realizacao,
• 0 momento ou lugar do estagio no currlculo,
4
• participacao dos sectores operativos onde se realiza e avaliacao - forma de realizacao e peso nos resultados da formacao.
Qual e a sua opiniao sobre 0 curriculo do curso de licenciatura em ciencias policiais em termos de irnportancia para 0 trabalho que reaJizas neste momento:
• 0 tipo das materias abordadas,
• os metodos de formacao,
• duracao do curso,
o regime de internato e as actividades praticas.
7. Opiniao sobre 0 enquadramento pes-formacao
• Achas que a ACIPOL poderia tel' algum papel ou opiniao sobre 0
enquadramento dos graduados? Se sim, qual?
5
8. Tern algurna opiniao a acrescentar, que nao tenha side incluida neste inquerito? POl' favor, registe-a.
Muito obrigado pela colaboracao!
6
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