enade comentado 2007: serviço social - pucrs
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ENADE COMENTADO 2007 Serviço Social
ChancelerDom Dadeus GringsReitorJoaquim ClotetVice-ReitorEvilázio Teixeira
Conselho EditorialAna Maria Lisboa de MelloElaine Turk FariaÉrico João HammesGilberto Keller de AndradeHelenita Rosa FrancoJane Rita Caetano da SilveiraJerônimo Carlos Santos BragaJorge Campos da CostaJorge Luis Nicolas Audy – PresidenteJosé Antônio Poli de FigueiredoJurandir MalerbaLauro Kopper FilhoLuciano KlöcknerMaria Lúcia Tiellet NunesMarília Costa MorosiniMarlise Araújo dos SantosRenato Tetelbom SteinRené Ernaini GertzRuth Maria Chittó Gauer
EDIPUCRSJerônimo Carlos Santos Braga – DiretorJorge Campos da Costa – Editor-chefe
Gleny Terezinha Duro Guimarães
Francisco Arseli Kern
(organizadores)
ENADE COMENTADO 2007 Serviço Social
Porto Alegre
2010
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Ficha Catalográfica elaborada pelo Setor de Tratamento da Informação da BC-PUCRS.
EDIPUCRS – Editora Universitária da PUCRSAv. Ipiranga, 6681 – Prédio 33Caixa Postal 1429 – CEP 90619-900 Porto Alegre – RS – BrasilFone/fax: (51) 3320 3711e-mail: edipucrs@pucrs.br - www.pucrs.br/edipucrs
© EDIPUCRS, 2010
CAPA Vinícius XavierPREPARAÇÃO DE ORIGINAIS Gleny Terezinha Duro Guimarães e Francisco Arseli KernREVISÃO DE TEXTO Rafael SaraivaEDITORAÇÃO ELETRÔNICA Gabriela Viale Pereira e Laura Guerra
Questões retiradas da prova do ENADE 2007 do Serviço Social
E56 ENADE comentado 2007 : serviço social [recurso eletrônico] / organizadores, Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : EDIPUCRS, 2010. 127 p.
Sistema requerido: Adobe Acrobat Reade Modo de Acesso: <http://www.pucrs.br/edipucrs/> ISBN 978-85-397-0002-8 (on-line)
1. Ensino Superior – Brasil – Avaliação. 2. Exame Nacional de Desempenho de Estudantes. 3. Serviço Social – Ensino Superior. I. Guimarães, Gleny Terezinha Duro. II. Kern, Francisco Arseli. CDD 378.81
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO ..................................................................................................... 7 Beatriz Gershenson Aguinsky
COMPONENTE ESPECÍFICO - QUESTÕES OBJETIVAS
QUESTÃO 11 ........................................................................................................... 10 Maria Beatriz Marazita
QUESTÃO 12 ........................................................................................................... 14 Jane Cruz Prates
QUESTÃO 13 ........................................................................................................... 17 Maria Palma Wolff
QUESTÃO 14 ........................................................................................................... 22 Idilia Fernandes
QUESTÃO 15 ........................................................................................................... 26 Márcia Salete Arruda Faustini
QUESTÃO 16 ........................................................................................................... 31 Dolores Sanches Wünsch
QUESTÃO 17 ........................................................................................................... 35 Maria Palma Wolff
QUESTÃO 18 ........................................................................................................... 38 Leonia Capaverde Bulla
QUESTÃO 19 ........................................................................................................... 44 Inês Amaro da Silva
QUESTÃO 20 ........................................................................................................... 47 Ana Lúcia Suárez Maciel
QUESTÃO 21 ........................................................................................................... 50 Dolores Sanches Wünsch
QUESTÃO 22 ........................................................................................................... 54 Idilia Fernandes
QUESTÃO 23 ........................................................................................................... 62 Esalba Maria Silveira
QUESTÃO 24 ........................................................................................................... 65 Maria Isabel Barros Bellini
QUESTÃO 25 ........................................................................................................... 69 Idilia Fernandes
QUESTÃO 26 ........................................................................................................... 74 Ana Lúcia Suárez Maciel e Leonia Capaverde Bulla
QUESTÃO 27 ........................................................................................................... 78 Ana Lúcia Suárez Maciel e Inês Amaro da Silva
QUESTÃO 28 ........................................................................................................... 82 Patricia Krieger Grossi
QUESTÃO 29 ........................................................................................................... 85 Esalba Maria Silveira
QUESTÃO 30 ........................................................................................................... 89 Márcia Salete Arruda Faustini e Francisco Arseli kern
QUESTÃO 31 ........................................................................................................... 94 Patricia Krieger Grossi
QUESTÃO 32 ........................................................................................................... 96 Jane Cruz Prates
QUESTÃO 33 ......................................................................................................... 100 Patricia Krieger Grossi
QUESTÃO 34 ......................................................................................................... 102 Gleny Terezinha Duro Guimarães e Anelise Gronitzki Adam
QUESTÃO 35 ......................................................................................................... 107 Gleny Terezinha Duro Guimarães e Anelise Gronitzki Adam
QUESTÃO 36 ......................................................................................................... 112 Alzira Maria Baptista Lewgoy
QUESTÃO 37 ......................................................................................................... 115 Alzira Maria Baptista Lewgoy
COMPONENTE ESPECÍFICO - QUESTÕES DISCURSIVAS
QUESTÃO 38 ......................................................................................................... 120 Maria Beatriz Marazita
QUESTÃO 39 ......................................................................................................... 123 Maria Palma Wolff
QUESTÃO 40 ......................................................................................................... 124 Maria Isabel Barros Bellini
LISTA DE CONTRIBUINTES ................................................................................. 126
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 7
APRESENTAÇÃO
Um dos maiores desafios que se coloca para todos aqueles que dão vida a
dinâmicas e processos constitutivos da Educação Superior é a busca permanente
por mecanismos de construção de conhecimentos e aprendizagem que, de fato,
decorram de processos avaliativos. Como aprender sem avaliar? Como avaliar sem
perder de vista os processos formativos que deveriam ser intrínsecos a toda
avaliação no âmbito educativo? E como agregar valor a estratégias avaliativas –
sejam elas externas ou internas às Universidades – de modo a resistir a lógicas
binárias e retrógradas que insistem em povoar a cultura das práticas avaliativas,
quando associadas meramente a resultados per se, burocraticamente orientadas a
formas de premiação ou punição nas mais variadas dimensões da educação?
O enfrentamento desse desafio exige esforços intencionais de gestores,
professores e alunos, para que processos avaliativos não apenas estejam
incorporados ao cotidiano da vida universitária, mas que sejam conhecidos e
apropriados por todos, servindo a propósitos elevados: o compartilhamento de
saberes a serviço de patamares de qualidade na formação superior.
Com esse propósito, a Faculdade de Serviço Social (FSS) da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) associa-se à iniciativa da Pró-
Reitoria de Graduação, através da EDIPUCRS, lançando o ENADE 2007
Comentado: Serviço Social, na forma de e-book.
O Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE) é parte
integrante do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES),
responsável pela avaliação externa de Instituições de Ensino Superior e de Cursos.
É objetivo do ENADE de aferir o rendimento dos estudantes dos cursos de
graduação das Instituições de Ensino Superior. Por essa razão, costuma-se associá-
lo tão somente a uma prova. No entanto, o ENADE articula quatro instrumentos
distintos: uma prova, um questionário de impressões sobre a prova, um questionário
socioeconômico – todos a serem respondidos pelos estudantes – e um questionário
destinado ao(a) coordenador(a) do(a) curso/habilitação. Por força de disposições
legais do SINAES, o ENADE é componente curricular obrigatório, ficando a colação
de grau do estudante condicionada à comprovação de sua participação no Exame.
8 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
A prova aplicada na área de Serviço Social apresenta 40 questões, sendo 10
questões de formação geral, comuns a todos os cursos da área da saúde, e 30
questões de componente específico. Assim, tendo por base as questões do
componente específico do ENADE 2007, aplicada em todo o território nacional aos
estudantes de Serviço Social, a presente publicação reúne a contribuição de
docentes da FSS/PUCRS, que responderam às questões do ENADE de modo
comentado. O conjunto das questões e das respostas apresentadas na forma de e-
book, certamente será uma oportuna fonte de consulta e estudos de temas
contemporâneos da área para os estudantes e também como material didático para
o trabalho em sala de aula.
Agradeço aos Professores Francisco Arseli Kern e Gleny Terezinha Duro
Guimarães que organizaram o ENADE 2007 Comentado: Serviço Social. Agradeço
especialmente aos docentes da FSS que se dedicaram às respostas comentadas às
questões do ENADE, cujo produto do zeloso trabalho, ao tornar-se público, revigora
a certeza do quanto a avaliação formativa é fecunda para o aprimoramento
constante da formação de qualidade em Serviço Social.
Beatriz Gershenson Aguinsky
Diretora da Faculdade de Serviço Social da PUCRS
COMPONENTE ESPECÍFICO QUESTÕES OBJETIVAS
10 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 11
Corrente importante de estudiosos da profissão considera que a análise do papel do
Serviço Social na reprodução das relações sociais deve partir do suposto de que a
apreensão do significado histórico da profissão só é possível com a sua inserção na
sociedade, pois o Serviço Social se afirma como instituição peculiar na e a partir da
divisão social do trabalho. Esta concepção identifica, como princípio que rege a
estruturação das relações sociais na sociedade,
(A) a solidariedade. (B) a contradição de classes. (C) a ideologia. (D) a intersubjetividade. (E) o saber/poder. Gabarito: Questão B
Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: O Serviço Social no processo de reprodução das relações
sociais
Autora: Maria Beatriz Marazita
Comentário: A questão correta é a B
Desde os anos 80, a análise do significado social da profissão está centrada
no processo de reprodução das relações sociais, sustentando que a questão social é
indissociável das relações socais capitalistas, nos marcos da expansão monopolista
e de seu enfrentamento pelo Estado. (Iamamoto, 2001: 27).
A questão social encontra-se a base da profissionalização do Serviço Social
(Iamamoto, 1992; Netto, 1992). Ela tem sido analisada como elemento fundante do
exercício profissional na sociedade em suas múltiplas expressões: “A
profissionalização da profissão pressupõe a expansão da produção e de relações
sociais capitalistas, impulsionadas pela industrialização e urbanização, que trazem,
no seu verso, a Questão Social” (Iamamoto, 2008:171).
A obra Relações Sociais e O Serviço Social no Brasil de Iamamoto e
Carvalho, publicada em 1982, apresenta a análise da profissão de Serviço Social no
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 11
processo de produção e reprodução das relações sociais e a tese de que a profissão
afirma-se como uma especialização do trabalho coletivo no quadro do
desenvolvimento industrial e da expansão urbana.
Processos esses apreendidos sob o ângulo das classes sociais – a
constituição e expansão do proletariado e da burguesia industrial – e as modificações
verificadas na composição dos grupos e frações de classes que compartilham o
poder do Estado em conjunturas históricas determinadas (Iamamoto, 2008:167).
Os processos sociais que a questão social traduz estão no centro dos estudos
de Marx sobre a sociedade capitalista. Nessa tradição intelectual o regime capitalista
de produção é tanto um processo de produção das condições materiais da vida
humana quanto um processo que se desenvolve sob relações sociais histórico-
econômica: sua dinâmica produz e reproduz as condições materiais de existência; as
relações socais contraditórias e as formas sociais através das quais se expressam. Indissociável relação entre a produção dos bens materiais e a forma econômica social em que é realizada, isto é, a totalidade das relações entre os homens em uma sociedade historicamente particular, regulada pelo desenvolvimento das forças produtivas do trabalho social (Iamamoto, 2008:281).
Essa é a forma clássica de compreender as relações sociais do trabalho em
que sua dinâmica produz e reproduz seus expoentes: suas condições materiais de
existência e as relações sociais contraditórias e as formas sociais através das quais
se expressam. Essa análise tem uma dupla dimensão: a existência material das
condições de trabalho e a forma social pela qual se realiza: a natureza do valor de
troca e os fetichismos que a acompanham.
Historicamente a Questão Social tem a ver com o surgimento da classe
operária e seu ingresso no cenário político por meio das lutas em prol de direitos
trabalhistas. Foram as lutas sociais que romperam o domínio privado nas relações
entre capital e trabalho, extrapolando a questão social para a esfera pública,
exigindo a interferência do estado para o reconhecimento e a legalização de direitos
e deveres dos sujeitos sociais envolvidos (Iamamoto, 2001;17).
Assim, o Estado afirma o caráter público da questão social, administrando
suas refrações – que assumem um caráter massivo –, e reforça a aparência da
12 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
natureza privada de suas manifestações individuais, tidas como problema do
indivíduo isolado (Netto, 2001:44).
A alternativa A está incorreta porque o princípio da solidariedade, como
diretriz ordenadora das relações sociais obscurece a coisificação das relações que
se estabelece no universo da mercadoria, realçando as relações pessoais,
solidárias, personalizadas. Analisar a sociedade a partir desse princípio é negar a
sociedade capitalista e sua forma de produção e reprodução da vida material.
A alternativa C está incorreta porque, segundo Thompson (1995), o conceito
de ideologia é ambíguo e apresenta uma multiplicidade de significados e nuances
diferentes devido o longo caminho percorrido desde que foi introduzido nas línguas
europeias, há dois séculos. Na teoria social e política das duas últimas décadas
houve duas respostas comuns à herança ambígua do conceito de ideologia. Uma
define ideologia como “sistemas de pensamento”, “sistemas de crenças”, ou
“sistemas simbólicos”, que se referem à ação social ou à prática política. A outra
resposta aponta para o abandono do conceito. O conceito seria muito controvertido
e contestado, demasiado marcado por uma história em que ele foi usado e abusado
de diferentes modos, a tal ponto que ele não se prestaria mais, hoje em dia, para
fins de análise social e política (Thompson,1995:16).
A alternativa D está incorreta uma vez que a intersubjetividade não abrange a
totalidade das relações entre os Homens em uma sociedade capitalista, regulada
pelo desenvolvimento das forças produtivas do trabalho. A intersubjetividade remete
a um sistema de valores e crenças, uma proliferação de divisões entre indivíduos e
grupos, uma falta de consenso, atitudes opostas.
A alternativa E está incorreta porque o saber/poder, remete a tese da
“correlação de forças” que apresenta como eixo central de sua abordagem a relação
do Serviço Social com a política, com o pensamento gramsciano, introduzindo
noções de “hegemonia” e “intelectual”. Segundo Iamamoto (2008), nessa acepção o
objeto de trabalho do assistente social é uma questão disputada, um objeto de luta
formado pelas relações de força, de poder e de saber para a conquista pelas classes
subalternas de lugares, recursos, normas e espaços ocupados pelas classes
dominantes (Iamamoto, 2008:295).
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 13
Referências
IAMAMOTO, Marilda Villela. Renovação e Conservadorismo no serviço social. Ensaios Críticos. São Paulo: Cortez, 1992. ______. A Questão Social no Capitalismo. In: TEMPORALIS. Revista da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa. ABEPSS. Ano II, nº3, janeiro a junho de 2001. ______. Serviço Social em Tempo de Capital Fetiche: capital financeiro, trabalho e questão social. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2008. ______; CARVALHO, Raul de. Relações Sociais e Serviço Social no Brasil. Esboço de uma interpretação histórico-metodológico. São Paulo: Cortez, 1982. NETTO, José Paulo. Cinco Notas a Propósito da “Questão Social”. In: TEMPORALIS. Revista da Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social – ABEPSS. Ano II, nº3, janeiro a junho de 2001.
14 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 12
Analise as afirmativas a seguir.
Na expansão monopolista, as funções políticas do Estado burguês articulam-se
organicamente com as suas funções econômicas.
PORQUE O Estado condensa os interesses comuns de toda a sociedade.
A esse respeito é possível concluir que
(A) as duas afirmativas são verdadeiras, e a segunda justifica a primeira. (B) as duas afirmativas são verdadeiras, e a segunda não justifica a primeira. (C) a primeira afirmativa é verdadeira, e a segunda é falsa. (D) a primeira afirmativa é falsa, e a segunda é verdadeira. (E) as duas afirmativas são falsas. Gabarito: Questão C
Tipo de questão: Escolha associada com indicação da resposta correta
Conteúdos avaliados: Função política e econômica do Estado
Autora: Jane Cruz Prates
Comentário: O Estado tem papel fundamental na expansão monopolista, na medida em
que além de proporcionar as condições estruturais para viabilizar esse processo,
seja do ponto de vista da infraestrutura (prioridade na construção de portos,
estradas, incentivos fiscais e auxílios econômicos), seja via superestrutura, a partir
de uma cultura que promulga os valores capitalistas associados ao consumo e a
mercantilização que capilarizam-se em todas as esferas da vida social ou ainda via
legislação que protege os proprietários dos meios de produção. Contudo, é
permeado pela luta de classes atendendo a demandas populares quando essas
conformam-se como expressão da questão social. Ou seja, quando essas
reivindicações coletivas têm poder de pressão e pautam a implementação de
direitos e políticas públicas que as materializem. O Estado aporta, portanto,
também as condições políticas para viabilizar esse processo na medida em que
não podem ser dicotomizadas dos aspectos econômicos, pois se articulam
organicamente. O desenvolvimento do capitalismo é impensável sem a ajuda do
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 15
Estado como mediador, o que não significa dizer que ele não é atravessado por
contradições, como resultado da luta de classes e interesses antagônicos em
disputa, embora seja preciso reconhecer que hegemonicamente atende aos
interesses da classe dominante.
Conforme Iamamoto (2004, p. 132), a expansão monopolista “aprofunda as
disparidades econômicas, sociais e regionais, na medida em que favorece a
concentração social, regional e racial de renda, prestígio e poder”. Para tanto, o
Estado assume papel decisivo, unificando os interesses das frações da classe
burguesa e como elemento que irradia sua ideologia, valores e interesses para toda
a sociedade (cultura burguesa passada como cultura geral).
Há diferentes formas de interpretar o papel do Estado. Numa primeira
perspectiva é simplesmente considerado um aparelho de dominação de uma classe
sobre a outra, contudo, em razão do reconhecimento da contradição, se pode
afirmar que ele é permeado pelos diferentes interesses da sociedade, mesmo que
em níveis diferenciados e deve, portanto, condensar os interesses coletivos.
Pereira considera como condições fundamentais à explicitação da questão
social a problematização da relação entre estrutura e sujeitos, entre necessidades e
agentes com poder de pressão para dar visibilidade às formas diversas de opressão,
mas, ressalta que é fundamental a presença de um Estado e uma superestrutura
(leis, ensino, comunicação) que regule e garanta direitos. Contudo, é exatamente
isso que está sendo desmantelado. Questão social, diz a autora, “não é sinônimo de
contradição entre capital e trabalho [...], mas de embate político determinado por
essas contradições” (Pereira, 2004, p. 53-54).
Logo, com relação às alternativas de resposta apontadas na questão 12, a
primeira afirma serem ambas verdadeiras e a segunda justifica a primeira. Em que
pese o fato da primeira parte da afirmativa estar correta, a segunda não justifica a
primeira, ao contrário a condensação de interesses, em princípio, deveria se
contrapor a esse processo de expansão, na medida em que a grande maioria da
população se vê alijada dos benefícios que proporciona a grupos privados.
A alternativa B é a correta, considerando a segunda concepção de Estado
apontada por nós. Nessa alternativa de resposta há a afirmação de que ambas são
verdadeiras, embora a segunda não justifique a primeira.
16 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
A alternativa C considera a primeira resposta verdadeira e a segunda falsa,
essa afirmativa só poderia ser considerada correta caso a concepção de Estado
utilizada não levasse em conta a contradição, como explicitado anteriormente.
Por fim, as alternativas D e E consideram a primeira assertiva falsa ou ambas
as afirmações falsas, estão, portanto, incorretas.
Referências
IAMAMOTO, Marilda. A questão social no capitalismo. In: Revista Temporalis, nº. 3. Brasília: ABEPSS, 2004. p. 9-32. PEREIRA, Potyara. Questão social, Serviço Social e Direitos de Cidadania. In: Revista Temporalis, nº. 3. Brasília: ABEPSS, 2004. p. 51-62
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 17
QUESTÃO 13
É hoje consensual que, no Brasil, o Serviço Social se origina no seio do movimento
católico, mas seu processo de profissionalização e legitimação está vinculado à
expansão das grandes instituições assistenciais em um período histórico marcado
pelo aprofundamento do corporativismo do Estado e por uma política econômica
industrializante. A expansão do proletariado urbano cria a necessidade política de
controlar e absorver este contingente. O Estado, incorporando parte das
reivindicações populares, amplia a base legal da cidadania, mediante uma intensa
legislação social e sindical.
Este período da história brasileira refere-se
(A) à República Velha (1889-1930). (B) à Segunda República (1930-1937). (C) ao Estado Novo (1937-1945). (D) à Quarta República (1945-1964). (E) à transição democrática (1985-1988). Gabarito: Questão C
Tipo de questão: Escolha simples com indicação da resposta correta
Conteúdos avaliados: Desenvolvimento econômico e social brasileiro,
institucionalização do Serviço Social, política social e legislação social no Brasil.
Autora: Maria Palma Wolff
Comentário: No contexto histórico brasileiro é apenas um ano antes da Proclamação da
República que se registra a criação da primeira legislação social, com a criação de
uma caixa de socorro para a burocracia pública. Tal concepção de proteção social,
como direitos coorporativos, perdurará até os anos 60 do século XX. (BEHRING E
BOSCHETTI 2007). Com a Proclamação da República em 1889 e a instalação da
República Velha (1889-1930), outras legislações, abrangendo categorias específicas
de trabalhadores urbanos, foram sendo implantadas, entre as quais se destaca a Lei
Eloy Chaves, que em 1923 cria a Caixa de Aposentadoria e Pensões dos
Ferroviários. No entanto, ainda que fosse registrado um crescente processo de
18 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
industrialização as iniciativas da época não representaram um rompimento com as
características agrário-exportadora, oligárquica e rural da economia e da política
brasileira. Assim, ainda que seja registrado a implantação de legislações e a
expansão do proletariado no período mencionado, as reivindicações protagonizadas
– citando-se em especial a greve geral de 1917 – não se traduziram em intensa
legislação social e na expansão da cidadania (FEE 1983). O controle desses
movimentos era dado por uma intervenção repressiva, ou seja, a resolução dos
conflitos que emergiam da relação capital e trabalho eram tratados como casos de
polícia e não alvo de estratégias políticas no âmbito do Estado, estando, portanto,
incorreta a alternativa A. O segundo período, referido pela alternativa B, referente à Segunda
República (1930-1937) é caracterizado pela crise do poder oligárquico e pelo
aumento da importância da indústria e do comércio na economia, fato que contribuiu
para o surgimento de medidas de promoção e controle da massa trabalhadora. Com
a Revolução de 30 inicia-se um processo de centralização que reduziu a autonomia
dos estados e aumentou a intervenção na sociedade; os movimentos do proletariado
urbano, que possuía uma forte organização sindical, foram contrapostos com
medidas de atrelamento ao Estado e de controle da massa trabalhadora através de
uma significativa incorporação das políticas sociais. Foram criados inúmeros
institutos de pensões e aposentadorias (bancários, comerciários, industriários) cuja
separação por ramo de produção também significou um elemento de controle dos
trabalhadores já que dificultava a união em torno de reivindicações comuns. Outro
aspecto a destacar é a orientação dessa política para as populações urbanas,
denotando interesse na promoção da industrialização sem que, no entanto, fossem
atingidos os interesses da oligarquia rural. Isso porque, a despeito do
enfraquecimento político e econômico, a mesma continuava a deter influência na
correlação de forças do cenário político brasileiro. (FEE, 1983).
Uma medida importante desse período foi a criação em 1930 do Ministério do
Trabalho, da Indústria e do Comércio e do Ministério da Saúde Pública e Educação.
É destaque ainda, a Constituição Federal de 1934 que incorporou ao seu texto a
previdência social através da assistência médica e sanitária ao trabalhador e à
gestante e da previdência, mediante contribuição paritária da União, do empregador
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 19
e do empregado. Esse texto legal atribui pela primeira vez ao Estado a
obrigatoriedade de assegurar o amparo dos desvalidos. No entanto, a despeito de
tal previsão, nenhuma medida concreta foi tomada nesse período, o que só iria
acontecer com a vigência do Estado Novo (IAMAMOTO E CARVALHO, 1985).
Esse momento histórico marca o surgimento do Serviço Social no Brasil,
processo desencadeado a partir de diversas ações desenvolvidas pela Igreja
Católica no campo social em busca da reforma social e a restauração dos valores
cristãos. A primeira escola de Serviço Social foi criada em São Paulo, em 1936,
após a participação de representantes brasileiros em cursos da École Catholique de
Service Social, na Bélgica. (AGUIAR 1985)
Assim, apesar desse período (1930-1937) ter representado avanços no
ordenamento da política econômica industrializante, a oligarquia agrária continuava
mantendo influência na vida política e econômica brasileira. Nos anos mencionados
ocorreu a organização das bases da política social e não sua consolidação. Da
mesma forma, era incipiente o processo de profissionalização do Serviço Social,
bem como da criação de grandes instituições sociais, sendo a opção B incorreta.
Foi no período do Estado Novo (1937-1945), mencionado na alternativa C,
que o conjunto de medidas políticas, econômicas e sociais, levou à constituição
definitiva da sociedade urbano-industrial, consolidando medidas adotadas
anteriormente. A Constituição Federal de 1937 representou retrocessos em
relação às conquistas democráticas da Carta de 1934; entre as medidas adotadas
estava a intervenção nos estados e a proibição da organização sindical
independente. Assim, o Estado assume um caráter marcadamente autoritário,
tendo praticamente eliminado a oposição operária e atrelado os sindicatos à
estrutura governamental. (FEE 1983).
Entre as principais medidas do período está a instituição, em 1940, do salário
mínimo para uma jornada de 200 horas mensais. Foi fixado de forma diferenciada
para cada uma das regiões brasileiras, percentuais para a alimentação, vestuário,
habitação, higiene e transporte; em 1943 foi instituída a Consolidação das Leis do
Trabalho – CLT. No âmbito da previdência social verificou-se uma ampliação das
instituições de aposentadorias de pensões e assim da cobertura até então fornecida
aos trabalhadores. Esse fato expressava interesse do governo em ampliar seu
20 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
espectro de controle, mas contraditoriamente, permitiu também a ampliação do
acesso dos trabalhadores a esses serviços.
Outro destaque foi a criação do Serviço Nacional da Indústria (SENAI), em
1942, e o Conselho Nacional de Serviço Social, junto ao Ministério da Educação e
Saúde, em 1938, com funções de consultivas no campo das políticas sociais.
Embora tenha sido um organismo de pouca efetividade, esse Conselho expressou a
intenção de organização e de centralização de uma política assistencial no país.
(IAMANOTO E CARVALHO, 1985). Tal papel será efetivamente exercido pela
Legião Brasileira de Assistência – LBA – criada, em 1942, pela primeira dama Darcy
Vargas. Embora a proposta inicial dessa Instituição tenha sido fornecer amparo às
famílias dos praças que combatiam na II Guerra Mundial, posteriormente vai se
configurar “como instituição articuladora da assistência social no Brasil, com uma
forte rede de instituições privadas conveniadas, mas sem perder essa marca
assistencialista, fortemente seletiva e de primeiro-damismo”. (BEHRING E
BOSCHETTI, 2007, p. 108).
É nesse período que se consolida a instiuicionalização do Serviço Social no
Brasil; no Rio de Janeiro é criado o Instituto de Educação Familiar Social, em 1937,
e em seguida outras escolas de Serviço Social são criadas no Brasil. Ao mesmo
tempo em que o surgimento do Serviço Social no Brasil é definido com uma estreita
vinculação com a Igreja Católica, inúmeras professoras das Escolas de Serviço
Social realizaram, no início da década de 40, programas de estudos em
universidades norte-americanas com bolsas do governo dos Estados Unidos,
marcando a introdução do funcionalismo na formação e no exercício profissional do
Serviço Social brasileiro.
Dessa forma, a opção C está correta, ter sido no período do Estado Novo
(1937-1945) que ocorreu a efetiva consolidação da industrialização no Brasil, a
ampliação da legislação social, a criação de grandes instituições assistenciais e a
institucionalização da profissão de Serviço Social.
A opção D está incorreta. Ela menciona a Quarta República (1945-1964)
período marcado por uma grande disputa de projetos nacionais e intensificação da
luta de classes, com uma lenta expansão de direitos, mantendo o formato
corporativista anterior. Assim, também a transição democrática (1985-1988), referida
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 21
na letra E, expressou uma grande arena de lutas e de esperança para a população
brasileira (BEHRING E BOSCHETTI, 2007) o que não traduz as condições
mencionadas no enunciado da questão, ou seja, também a opção E está incorreta.
Referências AGUIAR, Antônio Geraldo de. Serviço Social e Filosofia. São Paulo: Cortez, 1985. BEHRING, Elaine R. e BOSCHETTI, Ivanete. Política Social: fundamentos e história. São Paulo: Cortez, 2007. FEE – Fundação de Economia e Estatística. A Política social brasileira 1930 – 1964. Porto Alegre: FEE, 1983. IAMANOTO, Marilda Vilela e CARVALHO, Raul. Relações Sociais e Serviço Social no Brasil. São Paulo: Cortez, 1985.
22 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 14
Analise as afirmativas que se seguem, relativas às particularidades históricas da
sociedade brasileira.
I – Durante a República Velha, desenvolveu-se a indústria pesada no país. II – A chamada Revolução de 1930 é um marco na revolução burguesa no Brasil. III – A “questão social” resulta, no Brasil, do fim da República Velha. IV – No Brasil, o desenvolvimento capitalista coincidiu com a expansão da
democracia. V – A modernização capitalista, no Brasil, não rompeu com a dependência
econômica do país. Estão corretas, apenas, as afirmativas (A) I e IV. (B) I e V. (C) II e III. (D) II e V. (E) III e V. Gabarito: Questão D
Tipo de questão: Escolha combinada
Conteúdos avaliados: Particularidades históricas da sociedade brasileira
Autora: Idilia Fernandes
Comentário: A questão D é a correta, considerando que a opção II “a chamada Revolução
de 1930 é um marco na revolução burguesa no Brasil”, pois a partir dela a estrutura
do Estado brasileiro modifica-se profundamente depois de 1930, tornando-se mais
ajustada às necessidades econômicas e sociais do país, em contraponto as políticas
oligarquicas do período anterior. Da mesma forma está correta a afirmação V,
demonstrando que “A modernização capitalista, no Brasil, não rompeu com a
dependência econômica do país”. Essa modernização se deu no limite do “ajuste
necessário” as novas demandas produtivas dos países desenvolvidos, mantendo-se
como regra a relação de fornecedor de matérias-primas ou produtos cada vez mais
“qualificados” e demandados pelas economias centrais capitalistas.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 23
O capitalismo se desenvolveu, estamos na era toyotista da acumulação
flexível, o que significa dizer na era da super informatização, de super exigências
para o trabalhador que hoje deve ser polivalente, na era da flexibilização dos
contratos de trabalho, dos direitos trabalhistas, mas grande parte da sociedade vive
em condições de pobreza e exclusão social. Segundo NETTO (2001), a Questão
Social surge com a capacidade da sociedade produzir riquezas e bens sociais e
muitos não terem acesso a isso. O país se modernizou, sim, produziu riquezas, mas
ainda somos dependentes de outras economias e com alto nível de exclusão social
e pobreza de seu povo.
A alternativa I, que diz que “durante a República Velha, desenvolveu-se a
indústria pesada no país”, está errada porque a República Velha desenvolveu-se de
1889 a 1930. A indústria de base no Brasil foi instalada a partir de 1939 com a
participação do país na II Guerra Mundial.
Sendo assim, a questão A e B estão erradas.
Como está colocado na afirmação IV – “No Brasil, o desenvolvimento
capitalista coincidiu com a expansão da democracia”. Pode-se dizer que essa
afirmação é falsa, pois é possível compreender o desenvolvimento brasileiro
enquanto um processo dotado de especificidades marcantes, entre as quais
podemos afirmar que: 1. o estudo do período colonial torna-se essencial, pois é
sobre esse “passado” que conforma-se uma certa estrutura econômica, dotada de
características próprias, distintas das estruturas que emergem de um passado
feudal; 2. sobre essa estrutura irá se desenvolver uma economia capitalista, cujo
ponto culminante estará na emergência de forças produtivas especificamente
capitalistas, com a “industrialização pesada”, a partir da segunda metade do século
XX. Esse processo de desenvolvimento das bases do capitalismo brasileiro é,
obviamente muito anterior aos processos de expansão da democracia que, de fato
vão ocorrer a partir da II Guerra Mundial.
Na afirmação III “A ‘questão social’ resulta, no Brasil, do fim da República
Velha”. Por consequência as opções apontadas nas questões C e E também estão
erradas. Segundo Iamamoto (2001, p. 11): A expressão questão social é estranha ao universo marxista, tendo sido cunhada por volta de 1830 (Stein, 2000). Historicamente foi tratada sob o ângulo do poder, vista como ameaça que a luta de
24 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
classes – em especial, o protagonismo da classe operária – representativa à ordem instituída. Entretanto, os processos sociais que ela traduz encontram-se no centro da análise de Marx sobre a sociedade capitalista. Nessa tradição intelectual, o regime capitalista de produção é tanto um processo de produção das condições materiais da vida humana, quanto um processo que se desenvolve sob relações sociais-históricos-econômicas – de produção específicas. Em sua dinâmica produz e reproduz seus expoentes: suas condições materiais de existência, as relações sociais contraditórias e formas sociais através das quais se expressam. Existe, pois uma indissociável relação entre produção dos bens materiais e a forma econômico-social em que é realizada, isto é, a totalidade das relações entre os homens em uma sociedade historicamente particular, regulada pelo desenvolvimento das forças produtivas do trabalho social.
Com a crescente globalização econômica, acentua-se a privatização, quando
a questão social deixa de ser associada ao mercado de trabalho para ser vinculada
ao mercado de consumo. Atualmente o Estado procura diminuir o seu tamanho, ou
seja, reduzir os custos com as políticas públicas voltadas a realização da cidadania.
O cidadão agora é visto pela sua capacidade de consumo e não por ser portador de
direito ao pertencimento social pelo fato de fazer parte da sociedade, assim também
a sua proteção social fica reduzida e ameaçada.
O povo se vê desvalido de direitos sociais básicos, enquanto que as elites
políticas não articulam democracia política com democracia social, pois o país é uma
das maiores economias do mundo e também é uma das maiores desigualdades
sociais. Os direitos sociais, cada vez mais, passam a ser entendidos como
necessidades sociais, pois os direitos estando privatizados, vincula a proteção à
capacidade produtiva de cada um.
A questão social no Brasil é moldada de acordo com os interesses das elites
políticas. A questão social, que com a questão trabalhista firma-se como proteção
social (como direitos sociais e filantropia), assume característica paternalista, de
política do favor, de patriarcalismo autoritário, ou seja, misérias transformam-se em
instrumentos, armas de dominação, bem como a reprodução do sistema. Por isso,
ainda hoje, direitos são vistos pela elite como privilégios, favores.
Desde a sua origem, o nosso sistema de proteção social, ao invés de existir
para garantir a capacitação e inclusão dos cidadãos (desempregados, analfabetos,
pessoas em situação de miséria) no mercado de trabalho, tem funcionado apenas
para reproduzir o atual sistema de reprodução de subalternidade, de subserviência,
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 25
de apadrinhamento das classes assalariadas e do povo, em geral, para com aqueles
detentores do poder econômico e político do país. Vivemos na verdade um sistema
de desproteção social e as múltiplas expressões da questão social atravessam o
cotidiano da maior parte dos brasileiros, levando-os a uma vida de privações e não
acesso aos bens sociais e a riqueza produzida socialmente.
Referências
CASTEL. Robert. As Armadilhas da Exclusão. 2ª edição. In: Desigualdade e a Questão Social. São Paulo: EDUC, 2000. IAMAMOTO, Marilda. A Questão Social no Capitalismo. In: Revista Temporalis 3, Ano II, nº 3, jan./jul. 2001. Brasília: ABEPSS, Grafline, 2001, p.9-32. MARX, Karl. Manuscritos Econômicos e Filosóficos de 1844. In: Conceito Marxista do Homem. Apêndice: manuscritos econômicos e filosóficos de 1844 de Karl Marx. 8ª ed. Rio de Janeiro: Zahar editores, 1983. NETTO, José Paulo. Cinco Notas a Propósito da “Questão Social”. In: Revista Temporalis 3, ano II, nº 3, jan./jul. 2001. Brasília: ABEPSS, Grafline, 2001.
26 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 15
A análise do significado social do Serviço Social no processo de reprodução das
relações sociais salienta o caráter contraditório da profissão. Ela reproduz, pela
mesma atividade, interesses contrapostos que convivem em tensão – demandas do
capital e do trabalho – e só pode fortalecer um ou outro pólo pela mediação de seu
oposto. De que decorre esse caráter contraditório da atuação profissional?
(A) Da intencionalidade do Assistente Social. (B) Da condução da atuação profissional. (C) Da pressão dos empregadores. (D) Da relação de classes. (E) Das demandas dos usuários. Gabarito: Questão D Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da resposta correta.
Conteúdos avaliados: Identidade social da profissão Autores: Márcia Salete Arruda Faustini
Comentário: A alternativa correta é a (D).
Encontramos essa ideia em Iamamoto e Carvalho (1993), quando discutem
“O Serviço Social no processo de produção das relações sociais”, na obra citada.
Nessa obra – marco do pensamento crítico na profissão – os autores trazem a
discussão do significado social da profissão no contexto da sociedade capitalista.
Para tanto, irão (re)tecer a trajetória histórica da profissão e situá-la no contexto
das relações capitalistas, destacando, especialmente, a lógica reprodutiva do capital e
as relações sociais construídas no contexto. As referências teóricas trazidas e as
reflexões pontuadas em Relações Sociais e Serviço Social no Brasil, tendo sua
primeira edição em 1982, são balizas à evolução do pensamento crítico na área.
Entender a profissão é entendê-la em seu contexto, é compreendê-la no
contexto da divisão social do trabalho, e, não, simplesmente, tentar compreendê-la a
partir de movimentos endógenos que a mesma poderia autoproduzir. Estado,
sociedade civil e profissão são elementos inter-relacionados para essa
compreensão. Assim, a profissão precisa ser compreendida, tanto na reprodução
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 27
das relações de classe quanto no relacionamento contraditório entre elas. “É
necessário historicizar as práticas da sociedade, as lutas sociais recriadas nas
contradições do capitalismo...” (CELATS, 1985, p.57).
As necessidades sociais humanas vão impondo estratégias a sua satisfação,
que ocorrem por meio do trabalho. Pela via do trabalho os homens produzem
objetos, e, no contexto da organização social capitalista, produzem também
mercadorias, que envolvem a possibilidade de reprodução de sua vida material,
mas, ao trabalharem os homens também vão tecendo relações entre si. Iamamoto
(2001, p.26) destaca que “Quando se fala em produção/reprodução da vida social
não se abrange apenas a dimensão econômica [...]”. A autora faz uma crítica a uma
redução economicista, muitas vezes, feita nessa questão, e complementa que a
produção e a reprodução das relações sociais incidem também em “[...] formas de
pensar, isto é, formas de consciência, através das quais se aprende a vida social”.
(Marx apud Iamamoto, 2001, p.27).
Então, o trabalho profissional, ao incidir sobre as expressões da questão
social – compreendendo que manifestam desigualdades da sociedade capitalista –
lida com uma contradição fundamental: o trabalho, cada vez mais coletivizado e
apropriação de sua atividade e de seus frutos, cada vez mais privativa. E, nesse
contexto, diversos e divergentes interesses concorrem, expressando-se, no
cotidiano, em manifestações de vida em diversas áreas – no trabalho, na família,
nas amizades, na saúde, na educação [...] –, revelando expressões de fragilidades,
mas também de rebeldia e resistência. (Iamamoto, 2001).
A profissão encontra seu significado no movimento da sociedade, adquire
concretude histórica ao enfrentar seu objeto de intervenção – as expressões da
questão social –, mas, para fazê-lo, trabalha na contradição gerada por distintos
interesses frutos da relação capital x trabalho. Nesse espaço contraditório, tem como
objetivos profissionais, à luz do Projeto Ético-Político – que, encontra-se respaldado
no Código de Ética (1993); na Lei de Regulamentação Profissional (1993) e nas
Diretrizes Curriculares (1996) – acionar mecanismos que direcionem-se a garantia
de direitos. Por isso, o lugar do Estado é tão importante, posto que “[...] só o Estado
pode atribuir universalidade a estes direitos” (Iamamoto, 2002, p.28).
28 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
É importante destacar que o significado social da profissão vai sendo tecido
nas próprias relações da sociedade, que são econômicas, políticas, ideológicas,
afetivas, entre outras, relações que implicam numa dinâmica de poder, remetem ao
terreno de uma totalidade social. A dinâmica da sociedade capitalista cria
mecanismos para que as formas de produção e reprodução da lógica de
acumulação possam garantir a sobrevivência do sistema social, e, nesse
movimento, entram em cena mecanismos de reprodução da vida social. Não sem
confronto e conflitos, asseveram-se formas de desigualdades entre os homens no
que diz respeito ao acesso e a permanência no usufruto dos bens, coletivamente,
produzidos. A apropriação, por parte da população, de uma parcela maior dos bens,
socialmente, gerados em sociedade, traz a marca da contradição do sistema e
engendra formas de tensão e resistência por parte de parcelas que se veem
excluídas desse usufruto. O Estado assume um lugar importante na administração
dessa relação, na medida em que, via políticas públicas, preenche um campo
importante de possibilidades mediadoras a essa relação.
Os interesses do capital e do trabalho convivem em tensão. Por isso, a
importância da clareza de um projeto profissional que seja coletivamente construído,
teoricamente adensado, permanentemente avaliado e enraizado em seu tempo e
seu contexto. A dinâmica das classes sociais e as formas de produzir-se e
reproduzir-se a vida social, sofrem profundas alterações neste início de século,
consequentemente, as mediações profissionais não podem ser assumidas como
fórmulas e nem replicadas a distintos contextos sociais sem que uma clareza de
compreensão se construa.
Iamamoto (2008) ao final de sua obra, na qual problematiza as alterações
profundas no movimento do capital e seu fetiche, bem como o trabalho profissional
nesse contexto, lembra o grande pensador brasileiro Ianni que refere: para conhecer a história do Brasil é indispensável conhecer ‘ a história social do povo brasileiro’. A maneira como se relacionam os grupos e classes sociais é uma dimensão fundamental da realidade política (Ianni apud Iamamoto, 2008, p. 469).
Portanto, as alternativas (A), (B), (C) e (E) não respondem a questão
enunciada, na medida em que, suas afirmações não respondem ao enunciado:
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 29
(A) Da intencionalidade do Assistente Social: configura-se como um elemento
importante para compreender a direção do trabalho profissional. Entretanto, a
intenção, o sentido, a direção do trabalho não indica, por si só, o caráter
contraditório da atuação, do exercício do trabalho, em si, do assistente social. A
intencionalidade irá indicar finalidades da ação.
(B) Da condução da atuação profissional: elemento vago para compreensão
do trabalho profissional. Não é a condução da atuação que determina o caráter
contraditório da mesma, mas o próprio caráter contraditório da ação profissional é
que condiciona possibilidades e limites da ação profissional.
(C) Da pressão dos empregadores: o caráter contraditório da atuação
profissional advém de uma “relação” e não de um só elemento constitutivo da
relação.
(E) Das demandas dos usuários: o mesmo argumento do item (C). Segundo
Lefebvre apud Iamamoto (2008, p.49-50), [...] as relações sociais de produção envolvem contradições de classe (capital e trabalho) que se amplificam em contradições sociais (burguesia e proletariado) e políticas (governados e governantes). Toda a sociedade torna-se o ´lugar` da reprodução das relações sociais.
Portanto, o caráter contraditório da atuação profissional vai mediar interesses
do capital e do trabalho, a partir da dinâmica das classes sociais, em determinado
contexto histórico.
Referências
ABESS/CEDEPSS. Proposta básica para o projeto de formação profisssional. In: Revista Serviço Social e Sociedade: o serviço social no século XXI. São Paulo: Cortez, ano XVII, nº 50, p.143-171, abril de1996. BRASIL. Lei de Regulamentação da Profissão de Assistente Social. Lei n. 8.662/1993. CENTRO LATINO AMERICADO DE TRABALHO SOCIAL – CELATS. Serviço Social Crítico: problemas e perspectivas. São Paulo: Cortez, 1985. CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. Código de Ética do Assistente Social. Brasília 1993. IAMAMOTO, Marilda. Serviço Social em Tempo de Capital Fetiche: capital financeiro, trabalho e questão social. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2008.
30 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
______. Projeto Profissional: espaços ocupacionais e trabalho do assistente social na atualidade. In: CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. Atribuições Privativas do Assistente Social em questão, Brasília: CFESS, fev. de 2002. p.13-49. ______. O Serviço Social na Contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 5ª ed. São Paulo: Cortez, 2001. ______; CARVALHO, Raul de. Relações Sociais e Serviço Social no Brasil: esboço de uma interpretação histórico-metodológica. 9ª. ed. São Paulo: Cortez; [Lima,Peru]: CELATS, 1993.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 31
QUESTÃO 16
Na trajetória recente do Serviço Social, surgem requisições inéditas; novas
respostas profissionais são exigidas, tanto no campo investigativo quanto no da
intervenção. Entre outras, abrem-se possibilidades no complexo campo da
formulação, gestão e avaliação de políticas públicas, planos, programas e projetos
sociais.
Em face das atuais exigências de democratização do espaço público, o que cabe a
gestores e técnicos para que o planejamento não fique adstrito ao âmbito da gestão
e do poder?
(A) Processar teórica, política e eticamente as demandas sociais, intervindo para o seu atendimento.
(B) Elaborar pronunciamentos políticos e planos, afirmando intenções sociais na perspectiva das demandas.
(C) Executar projetos de lei e decretos governamentais, dando visibilidade às demandas.
(D) Socializar recursos para, com as organizações não governamentais, viabilizar projetos.
(E) Viabilizar ações que atendam as demandas populares, tais como estas são direta e empiricamente formuladas.
Gabarito: Questão A
Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da alternativa correta. Conteúdo avaliado: Política Social, Gestão e Avaliação de Políticas Públicas,
Serviço Social e Processo de Trabalho Autora: Dolores Sanches Wünsch
Comentário: A alternativa correta é a (A). Compreende-se que o “processar teórica, política
e eticamente as demandas sociais, intervindo para o seu atendimento”, possibilita
contribuir para formular respostas efetivas, por meio das políticas sociais públicas,
às demandas sociais, as quais materializam diferentes expressões e dimensões da
questão social. As políticas sociais como resultado das históricas contradições entre
estado e sociedade, Boschetti (2009), se desenvolveram como um importante
mecanismo para o enfrentamento das desigualdades sociais e garantia de direitos
32 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
sociais, na sociedade capitalista. Historicamente, as políticas sociais, constituíram-se
em espaços profissionais “privilegiados” para o trabalho do Assistente Social, sendo
que, a profissão se institucionalizou e legitimou circunscrita a um conjunto de
determinações sócio-históricas que a requisitaram para atender as refrações de um
modelo de desenvolvimento societário desigual.
As conformações atuais das políticas sociais, entretanto, trazem novas
requisições para os Assistentes Sociais, renovando suas competências e atribuições
e que ultrapassam as funções “tradicionais” voltadas, exclusivamente, à execução
das políticas sociais.
A partir da luta pela democratização do estado brasileiro, em meados da
década de 80, fortalece-se a lógica do direito da cidadania, que tem como um de
seus desdobramentos o processo de descentralização político-administrativa da
gestão pública, representada pelo processo de municipalização das políticas sociais
públicas e garantido pela Constituição Federal de 1988. Esse novo cenário
redimensiona o trabalho do Assistente Social, sendo este, chamado “a atuar na
esfera da formulação e avaliação de políticas e do planejamento e gestão”
(IAMAMOTO, 2006, p. 192). Dessa forma o Assistente Social, no papel de gestor ou
técnico, necessita de um conjunto de competências profissionais que se expressa no
plano teórico-metodológico, técnico-operativo e ético-política de sua ação. O
trabalho profissional parte do reconhecimento do papel do Estado e sua relação com
a sociedade e dos interesses de classe que a envolvem; passa pela democratização
dos espaços públicos com a efetiva garantia da participação da população no
planejamento e decisões dos rumos das políticas sociais; no fortalecimento do
controle social, traduzindo-se na definição de programas e projetos, bem como,
avaliando, constantemente, o impacto dos mesmos no atendimento às reais
necessidades da população.
Sendo assim, é incorreto afirmar que compete ao técnico ou gestor, conforme
presume a alternativa (B), “elaborar pronunciamentos políticos e planos, afirmando
intenções sociais na perspectiva das demandas”, uma vez que essa ação que não
condiz com o domínio das suas legítimas atribuições, no âmbito das políticas
sociais. Suas competências passam, sim, pela ampliação e criação de canais de
planejamento participativo e do envolvimento dos diferentes atores e profissionais
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 33
para sua implementação. As proposições e intenções do gestor só irão atender as
demandas da população-usuária quando incorporarem os seus interesses e
necessidades, que se dá pelo conhecimento da realidade social e das formas
particulares que essas demandas emergem dos processos sociais. Havendo, para
tanto, a exigência de uma permanente formação teórica-metodológica para o
processamento desse conhecimento e suas mediações sobre a realidade.
Dessa forma, requer do profissional um perfil crítico e investigativo, que
supere o pragmatismo de suas ações, como limitar-se a “executar projetos de lei e
decretos governamentais, dando visibilidade às demandas” e que estão colocadas,
também, incorretamente, na alternativa (C). Ou seja, essa ação representa uma
resposta verticalizada às demandas sociais e, mesmo que dê visibilidade às
mesmas, é imprescindível reconhecer os diferentes condicionantes e determinações
que perpassam a elaboração de leis e projetos resultantes das relações de poder
que as definem, especialmente em razão do planejamento destas, nem sempre
garantir mecanismos de participação social.
Evidencia-se, também, a necessidade do profissional conhecer e dominar a
leitura e análise dos orçamentos das políticas sociais e suas fontes de
financiamento e dessa forma identificar recursos disponíveis para melhor propor
projetos sociais. Não cabe a esse profissional “socializar recursos para, com as
organizações não governamentais, viabilizar projetos”, como enseja de forma
incorreta a alternativa (D), sendo a definição dos recursos para as entidades uma
prerrogativa dos conselhos setoriais e de direitos, através de ampla participação
dos conselheiros na elaboração do plano municipal da política específica, definindo
diretrizes programáticas e orçamentárias e a destinação dos recursos de seus
fundos públicos.
São múltiplas, portanto, as competências profissionais, para o processamento
do trabalho em que se insere o Assistente Social, no âmbito da gestão das políticas
sociais. São competências que condiz com um perfil profissional que rompa com
práticas imediatistas, empiristas que reproduzam antigas e insuficientes “fórmulas”
de enfrentamento as necessidades sociais. Portanto, evidencia-se que a alternativa
(E), “viabilizar ações que atendam as demandas populares, tais como estas são
direta e empiricamente formuladas”, também é incorreta, pois significa reiterar ações
34 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
destituídas do caráter participativo, político e ético, comprometida com a
transformação da realidade, na mera reprodução cotidiana das crescentes
demandas sociais.
Por fim, para melhor situar esta análise é fundamental retomar a questão do
papel do Estado e a democratização do espaço público, na perspectiva de
compreender o significado e o papel das políticas sociais, como campo de
conhecimento e intervenção do Serviço Social e outras profissões. Segundo
Boschetti (2009), deve-se buscar analisar a política social na sua totalidade e
compreender o seu caráter contraditório, bem como articular os determinantes
estruturais que incide na conformação das políticas sociais como as diferentes
forças sociais que agem na sua formulação e execução. Portanto, não há respostas
profissionais às demandas sociais, sem a devida apropriação de competências
teórico-práticas adquiridas ao longo da formação profissional e construídas nas
tensas relações político-institucionais cotidianas.
Referências
BOSCHETTI, Ivanete. Avaliação de políticas, programas e projetos sociais. In: Serviço Social: direitos sociais e competências profissionais. Brasília: CFESS/ABEPSS, 2009. 760p. IAMAMOTO, Marilda. As dimensões ético-políticas e teórico-metodológicas no Serviço Social contemporâneo. In: MOTA, A.E. et al. (Org). Serviço Social e Saúde: formação e trabalho profissional. São Paulo: Cortez, 2006.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 35
QUESTÃO 17
Considerando que a cidadania moderna compõe-se, tradicionalmente, de três
ordens de direitos, assinale aqueles que, no decurso do século XX, foram os que
mais tardiamente ingressaram na agenda pública brasileira.
(A) Direitos humanos. (B) Direitos civis. (C) Direitos sociais. (D) Direitos políticos. (E) Direitos de expressão. Gabarito: Questão A
Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da resposta correta.
Conteúdos avaliados: O ingresso dos direitos humanos na agenda pública
brasileira Autora: Maria Palma Wolff
Comentário: Inicialmente é necessário destacar que o gabarito oficial, que define a letra A
como resposta para essa questão, está incorreto. Isso porque o conceito de “Direitos
humanos” abrange diversas categorias de direitos, inclusive aquelas referidas nas
demais opções. A resposta incorre, portanto, em redundância e imprecisão no
tratamento do tema proposto.
De acordo com seu surgimento histórico convencionou-se definir gerações de
direitos humanos; assim, os direitos civis e os direitos políticos são considerados
como a primeira geração de direitos humanos, isso porque são os que, no contexto
histórico, foram primeiro definidos e positivados. Os principais marcos da definição
desses direitos são a declaração dos direitos do Homem e do Cidadão de 1789 e a
Declaração da Independência dos Estados Unidos da América de 1776.
Os direitos sociais, introduzidos a partir da luta dos trabalhadores no final dos
séculos XIX e no século XX por melhores condições de vida e de trabalho, são
considerados a segunda geração de direitos humanos.
No âmbito do direito internacional, a principal referência na definição dos
direitos humanos é a promulgação da Declaração Universal de Direitos Humanos
36 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
das Nações Unidas, em 1948, a qual abrange, tanto os direitos civis e políticos como
os direitos econômicos, sociais e culturais. No contexto pós II guerra e da guerra fria
a Declaração foi dividida para que fossem especificados os direitos, definindo-se,
então, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional dos
Direitos Econômicos Sociais e Culturais, ambos datados de 1968.
Assim, “Direitos civis”, letra B, “Direitos sociais”, letra C, “Direitos políticos”
letra D e os “Direitos de expressão” – que fazem parte dos direitos civis – letra E,
são todos considerados direitos humanos, sendo, portanto, impossível afirmar que
foram os direitos humanos, enquanto uma categoria genérica, a ordem de direitos
que mais tardiamente ingressaram na agenda pública brasileira.
Da mesma forma não está correta a letra B, já que os direitos civis se
constituem na primeira conquista de direitos; surgem no século XVIII, associados a
afirmação do processo capitalista de produção europeu e, consequentemente, à
organização do estado liberal. São assim relacionados às liberdades individuais:
liberdade de palavra, liberdade de pensamento e de fé, direito à propriedade e direito
à justiça. Esse processo teve correspondência tardia na implementação dos direitos
humanos no Brasil. Aqui é possível registrar como marca dos direitos civis a abolição
da escravidão (1888) e posteriormente a primeira Constituição Republicana (1891)
que assegurou a igualdade legal entre os cidadãos brasileiros, garantiu as liberdades
de crença, de associação e reunião, além do habeas corpus para fazer frente a
violências ou coações por ilegalidade ou abuso de poder. Os direitos de expressão,
referidos na letra E, compõem o catálogo dos direitos civis, fazendo parte daqueles
que menos tardiamente foram recepcionados pela legislação brasileira.
Na sequência dos direitos civis estão os direitos políticos, que no âmbito
internacional e local representam as conquistas posteriores. No continente europeu,
já no final do século XVIII, as legislações de alguns países já asseguravam a participação da população nos assuntos políticos por meio do voto, ou seja, o direito
de votar e ser votado. No Brasil, a Constituição Republicana de 1891 aboliu o voto
censitário, que exigia um padrão de renda para que o cidadão pudesse votar. No
entanto, as mulheres somente conquistaram o direito ao voto na Constituição de 1934 e os analfabetos em Lei sancionada em 1985. Dessa forma, a letra D, também
não pode ser considerada correta, já que os direitos políticos são, ainda que não em
sua totalidade, originários da organização republicana.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 37
A resposta correta seria, portanto, a letra C, que se refere aos “Direitos sociais”,
os quais são conquistas que surgem com mais força no século XX. Trata-se de
direitos que estão relacionados à busca de garantias de condições dignas de vida
para os segmentos sociais e parcelas da população assalariada ou pobre. Os direitos
sociais incorporam direitos trabalhistas, a aposentadoria e garantias de acesso à
educação e à saúde pública. A Constituição Federal Brasileira de 1934 também
marcou a introdução dos direitos sociais no contexto brasileiro, quando foram
disciplinadas as condições de trabalho, estabelecendo o salário mínimo, a jornada de
trabalho de 8 horas, o repouso semanal, as férias remuneradas, a indenização por
dispensa sem justa causa, a assistência médica ao trabalhador e à gestante, também
trabalhadora. No entanto, a ampliação dos direitos sociais, ou seja, sua definição
também para os trabalhadores rurais e à população não vinculada ao mercado de
trabalho ocorreu apenas pela Constituição Federal de 1988, a qual universalizou o
acesso à saúde, à previdência e à assistência social, estipulando direitos para todos
os cidadãos, independentemente de sua vinculação ao mercado de trabalho. Pelo
exposto, no âmbito dos direitos de cidadania, enfocado no enunciado da questão, é
possível considerar os direitos sociais como aqueles que por último foram legitimados,
tanto do ponto de vista político como legal. Portanto, a letra C seria aquela que
poderia responder corretamente à questão.
Assim, considerando que a definição de direitos humanos engloba mais do
que uma categoria de direitos, é impossível afirmar como quer o gabarito oficial
através da letra A que esses foram os “que mais tardiamente ingressaram na
agenda pública brasileira”. Salienta-se ainda que desde a definição das leis que
enfrentaram a escravidão no Brasil, estava-se buscando a efetivação de direitos
humanos, ainda que nesse caso tratava-se apenas dos direitos civis.
Referências
MONDAINI, Marco. Direitos Humanos no Brasil. São Paulo: Contexto, 2009. TRINDADE, José Damião de Lima. História Social dos Direitos Humanos. São Paulo: Peirópolis, 2002. BRAGATO, Fernanda Fizzo; CULLETON, Alfredo; FAJARDO, Sinara Porto. Curso de Direitos Humanos. São Leopoldo: Unisinos, 2009.
38 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 18
“O Assistente Social é (...) um intelectual que contribui, junto com inúmeros outros
protagonistas, na criação de consensos na sociedade. Falar de consenso diz
respeito não apenas à adesão ao instituído: é consenso em torno de interesses de
classes fundamentais, sejam dominantes ou subalternas, contribuindo no reforço da
hegemonia vigente ou criação de uma contra-hegemonia no cenário da vida social.” IAMAMOTO, M.V. O Serviço Social na Contemporaneidade: trabalho e formação
profissional. 5 ed. São Paulo: Cortez, 2001, p. 60.
A partir da leitura do texto acima, pode-se afirmar que,
(A) há consenso de que todos os Assistentes Sociais defendem os interesses das classes subalternas.
(B) há consenso de que todos os Assistentes Sociais defendem os interesses das classes dominantes.
(C) a criação de consensos depende da adesão ao instituído por parte dos Assistentes Sociais.
(D) o Assistente Social pode contribuir para a formação de consenso contra- hegemônico.
(E) os Assistentes Sociais são intelectuais que excluem o consenso das suas atividades.
Gabarito: Questão D
Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da resposta correta. Conteúdos avaliados: O Assistente Social como intelectual e sua contribuição para
a formação de consenso na sociedade
Autora: Leonia Capaverde Bulla1
Comentário:
Na questão 18 é solicitada a escolha da alternativa que melhor se relacione
com o posicionamento de Iamamoto (2001, p.60), expresso em um trecho de seu
livro O Serviço Social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 1 Leonia Capaverde Bulla, Assistente Social, Mestre em Serviço Social (UNI-LAVAL - Canadá), Doutora em Ciências Humanas-Educação (UFRGS - Brasil), Pós-Doutora em Serviço Social (UNI-KASSEL- Alemanha), Professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Graduação, Mestrado e Doutorado); Membro da Comissão Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social. Coordenadora do Núcleo de Pesquisas em Demandas e Políticas Sociais; Coordenadora do Programa Geron da PUCRS; Pesquisadora do CNPq, nível I. lbulla@pucrs.br
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 39
Dentre as alternativas propostas, a resposta (D) é a correta, ou seja, “o Assistente
Social pode contribuir para a formação de consenso contra-hegemônico”.
O texto que fundamenta a questão 18 traz à discussão alguns conceitos
tratados por Gramsci em sua obra Os intelectuais e a organização da Cultura (1981),
entre eles, a questão do Intelectual, relacionada à formação de consenso, aos
interesses das classes subalternas, à hegemonia e à contra-hegemonia e que são
discutidos por Iamamoto (2001, p.60) quando trata, mais especificamente, da
“prática como trabalho e a inserção do Assistente Social no processo de trabalho”.
Para aprofundar essas questões, é importante que se retome, então, o
pensamento de Gramsci sobre o assunto. Para o autor, os intelectuais
desempenham um papel fundamental na organização da hegemonia, articulando a
infraestrutura com a superestrutura, assegurando o consenso ideológico da massa
em torno do grupo dirigente. Gramsci não se referia, entretanto, aos que comumente
se conceituam como intelectuais, sejam os literatos, os filósofos, os artistas e outros,
colocados num alto pedestal, como se fossem forças independentes, nas lutas
político-ideológicas que se enfrentam numa sociedade. Na realidade, dizia o autor,
"todos os homens são intelectuais", pois nenhuma atividade humana dispensa um
mínimo de intervenção intelectual (GRAMSCI, 1981, p.14).
Gramsci propunha, dessa forma, uma concepção ampliada de intelectual, que
levasse em conta a função exercida no conjunto das relações sociais e não a
natureza do trabalho que cada pessoa realiza de modo preponderante, manual ou
intelectual. Sua preocupação era com a criação de uma nova camada intelectual,
que se articulasse ativamente com a prática social, que ajudasse a construir uma
nova relação orgânica com a classe revolucionária, o proletariado.
As reflexões de Gramsci partem da constatação de que não existem
intelectuais autônomos e independentes. Eles estão ligados de modo orgânico ao
seu grupo social, não podendo esse prescindir dos intelectuais “que lhe dão
homogeneidade e consciência da própria função, não apenas no campo econômico,
mas também no social e no político” (GRAMSCI, 1981, p.7). Sendo altamente
qualificados nos vários campos do saber ou especialistas na metodologia científico-
tecnológica, os intelectuais estão preparados para elaborar, aprofundar e justificar a
concepção de mundo de seu grupo social, estando em condições de planejar e
40 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
colaborar, igualmente, nas estratégias de direção e domínio da sociedade. A
assimilação e a conquista ideológica desses elementos é um fator muito importante
na escalada de um grupo em direção ao poder.
Nas sociedades capitalistas, os intelectuais ligam a infraestrutura à
superestrutura, como se fossem um “tecido conjuntivo” (MACCIOCCHI, 1977,
p.197), e que garante ao bloco histórico a conquista e a permanência no poder. Com
base em dados históricos e na realidade concreta, Gramsci conclui que os
intelectuais são “os comissários do grupo dominante” (GRAMSCI, 1981, p.14), os
elementos mediadores, não só para o desempenho da função da hegemonia, mas
também para a função de comando político. Nesse sentido, os intelectuais são os
organizadores da coesão social de um bloco de forças, são os porta-vozes da classe
no poder, para conseguir o consentimento “espontâneo” da população, mas estão
também em conexão estreita com o governo político, com o comando do aparato
estatal, de aplicação de leis, de punição, repressão e violência.
Assim como os grupos dominantes possuem seus intelectuais, é
imprescindível que a classe trabalhadora crie os seus. Contando com pessoal
especializado e elementos mediadores, os trabalhadores teriam maiores chances de
acesso à cultura, poderiam incrementar as instituições de classe e desenvolver
estratégias de ação na sociedade, que possibilitasse uma futura conquista do poder.
Desse modo, a classe trabalhadora poderia ir assumindo algumas funções de
direção na sociedade, preparando-se para assumir o poder governamental.2
Seria igualmente fundamental a conquista de intelectuais não originários da
classe operária ou dela afastados, para que eles se tornassem organicamente
aliados aos trabalhadores na luta por uma nova hegemonia.
A ação contra-hegemônica não é mecânica nem automática. Exige esforços.
Mas como poderá o homem assumir seu papel de sujeito da práxis social, se lhe
falta uma percepção mais ampla da realidade em que está inserido, se ele não
consegue compreender as relações de poder em que se estrutura a sociedade? As
reflexões de Paulo Freire auxiliam a responder a essas questões:
2 Gramsci faz a distinção entre direção e domínio. Para ele direção é o momento de organização do consenso e domínio é o momento da força. Mesmo que o grupo social tenha assumido o poder, ele precisa continuar a ser dirigente e nesse ponto é muito importante a ação intelectual, pois, segundo o autor, “o grupo dominante não se torna dirigente senão quando chega, por meio dos seus intelectuais, a exercer a sua hegemonia sobre a sociedade inteira” (GRAMSCI, 1981, p.72-73).
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 41
O homem não pode participar ativamente na história, na sociedade, na transformação da realidade, se não é auxiliado a tomar consciência da realidade e de sua própria capacidade para transformá-la. [...] É importante preparar o homem para isso por meio de uma educação autêntica: uma educação que liberte, que não adapte, domestique ou subjugue (FREIRE, 1980, p.40).
O acesso ao saber significa a possibilidade de desvelar as múltiplas
conexões do poder, através do questionamento das relações sociais e de suas
contradições. Pelo saber, o indivíduo se descobre como parte integrante de um
todo social, enquanto assimila os bens culturais da humanidade. A escola, a
universidade e outras instituições da sociedade (como o Serviço Social) podem
assumir um papel de mediação muito importante nesse processo de
conscientização. Introduzindo um discurso crítico nas relações pedagógicas e
estabelecendo um elo entre a teoria e a prática, essas instituições preparam as
pessoas para a ação transformadora.
Assim como os demais intelectuais (na acepção de Gramsci), os assistentes
sociais podem exercer uma ação transformadora na sociedade, assumindo um papel
de mediação no processo de conscientização, dando a sua contribuição à formação
de consenso e à luta contra-hegemônica (BULLA, 1992). Isso não significa que
todos os Assistentes Sociais contribuam para essa ação contra-hegemônica e sim,
que os assistentes sociais podem defender os interesses das classes trabalhadoras
e que podem contribuir para a formação de consenso contra-hegemônico. Nas
últimas décadas, houve um processo de renovação muito significativo no Serviço
Social afinado com as mudanças ocorridas na sociedade brasileira, formando-se um
consenso profissional sobre a necessidade de construção de um novo projeto ético-
político que deu as bases para o Código de Ética Profissional dos Assistentes
Sociais, instituído em 1993 (CFESS, 1993). A partir desse Código de Ética, os
assistentes sociais assumem compromissos alicerçados em princípios fundamentais,
entre eles aqueles que deixam claro alguns pontos enfatizados nesta discussão: Reconhecimento da liberdade como valor ético central e das demandas políticas a ela inerentes – autonomia, emancipação e plena expansão dos indivíduos sociais; Defesa intransigente dos direitos humanos e recusa dos arbítrios e do autoritarismo; a ampliação e consolidação da cidadania, considerada tarefa primordial de toda sociedade, com vistas à garantia dos direitos civis sociais e políticos das classes trabalhadoras; [...] Opção por um
42 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
projeto profissional vinculado ao processo de construção de uma nova ordem societária, sem dominação exploração de classe, etnia e gênero (CFESS, 1993).
Partindo dos princípios fundamentais preconizados pelo Código de Ética
Profissional (CFESS, 1993) conclui-se que compete ao Assistente Social posicionar-se
em favor da classe trabalhadora e que o profissional pode contribuir para a construção
de um consenso contra-hegemônico sempre que houver, na sociedade, ameaças à
liberdade e a ordem democrática. A resposta D é, portanto, a correta. Mas não se trata
somente de criar consensos societários contra-hegemônicos para o restabelecimento
da vida democrática, mas, também, de desafios cotidianos propostos ao profissional de
Serviço Social. Como afirma Iamamoto (2001, p.59), o Assistente Social se encontra
num “mar de criação de consensos” juntamente com outros profissionais e demais
integrantes da sociedade que labutam pela criação de melhores condições de vida
para toda a população, sem abrir mão dos princípios democráticos.
As respostas A, B, C e E são, por outro lado, consideradas incorretas.
Embora todos os assistentes sociais possam contribuir para a criação de consensos,
não se pode afirmar que todos defendam os interesses das classes subalternas. Por
outro lado, não há como excluir o consenso das atividades dos assistentes sociais e
a criação de consensos não depende da adesão ao instituído por parte dos
profissionais, pois nem sempre o instituído reconhece e respeita a “autonomia,
emancipação e plena expansão dos indivíduos sociais”, mas esse é um
compromisso dos assistentes sociais alicerçado em princípios fundamentais do seu
Código de Ética Profissional (CEFESS, 1993). Nesse caso, cabe ao profissional “A
defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e do autoritarismo, a
ampliação e consolidação da cidadania” (CEFESS, 1993), associando-se a todos
aqueles que defendem a mesma proposta de sociedade, formando um consenso
contra-hegemônico, com vistas à garantia de direitos civis, políticos e sociais e de
melhor qualidade de vida para todos os cidadãos.
Referências
BULLA, Leonia Capaverde. Serviço Social, Educação e Práxis: tendências teóricas e metodológicas. Tese de Doutorado. Porto Alegre: FACED/UFRGS, 1992.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 43
______. Origens e profissionalização do Serviço Social no Brasil. In: FLICKINGER, Hans-Georg. Entre caridade, solidariedade e cidadania: história comparativa do Serviço Social Brasil/Alemanha. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000. CFESS. Código de Ética Profissional dos Assistentes Sociais. Resolução nº.273/93 do Conselho Federal de Serviço Social, publicada no Diário Oficial da União, nº. 60, de 30/3/93, Seção I, p. 4.004-4.007 e alterado pela Resolução CFESS, nº. 290, publicada no Diário Oficial da União de 11/2/1994. Brasília, 1993. FREIRE, Paulo. Conscientização: teoria e prática da libertação, uma introdução ao pensamento de Paulo Freire. São Paulo: Cortez e Moraes, 1980. GRAMSCI, Antonio. A ciência política e o príncipe moderno. Lisboa: Estampa, 1974. (Obras escolhidas). ______. Os intelectuais e a organização da cultura. São Paulo: Círculo do Livro, 1981. IAMAMOTO, Marilda Villela. O Serviço Social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional. São Paulo: Cortez, 2001. ______. Serviço Social em tempo de capital fetiche: capital financeiro, trabalho e questão social. 2ª. ed. São Paulo: Cortez, 2008. MACCIOCCHI, Maria Antonietta. Gramsci y la revolución de occidente. 3ª. ed. México: Siglo Veinteuno, 1977.
44 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 19
Dentre suas atribuições, o Assistente Social enfrenta o desafio de elaborar planos,
programas e projetos para a Área Social. Observe o quadro, que explicita os
diferentes níveis do planejamento social.
I – PLANO Maior nível de abrangência do planejamento social.
II – PROGRAMA Menor nível de abrangência que o Plano, setorialização do planejamento social e menor detalhamento que o projeto.
III – PROJETO Menor abrangência que o Plano e o Programa e maior detalhamento de ações de execução das políticas sociais.
A análise do quadro permite assegurar que está (ão) correta(s) a(s) afirmação (ões)
contida na(s) coluna(s):
(A) I, apenas. (B) II, apenas. (C) III, apenas. (D) I e II, apenas. (E) I, II e III. Gabarito: Questão E
Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da resposta correta.
Conteúdos avaliados: Conceito de Plano, Programa e Projeto
Autora: Inês Amaro da Silva
Comentário: A resposta correta é a (E): estão corretas as características enunciadas para
os três níveis do Planejamento: Plano, Programa e Projeto.
O Planejamento Social constitui-se em uma instância estratégica da
intervenção profissional na realidade social e é condição para uma ação profissional
competente, crítica e criativa, alinhada com a dinâmica da realidade e das
necessidades e demandas sociais.
Como processo político, o planejamento social envolve continuamente a
tomada de decisões, as quais se inscrevem nas relações sociais e envolvem poder,
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 45
participação social e exercício de cidadania. Enquanto processo técnico-político, o
planejamento tem como centro de interesse uma situação social delimitada que se
constitui objeto da intervenção profissional. Nesse sentido, todo o planejamento
envolve e expressa uma intencionalidade, bem como requer domínio instrumental,
para seu pleno desenvolvimento.
O planejamento é um importante instrumento da gestão social. Como função
gerencial, através do mesmo a instituição/organização prepara-se para o futuro,
traça objetivos, define recursos e meios necessários para atingi-lo. Planejar permite
realizar rupturas com as ações aleatórias e dispersas na realidade social, muitas
vezes sustentadas por ideias superficiais e orientações difusas, dirigidas por
espontaneismo ou ativismo.
Para cada nível da gestão institucional/organizacional – Estratégico Tático e
Operacional – correspondem diferentes níveis e funções de planejamento, que se
materializam em Planos, Programas e Projetos.
Do ponto de vista da dinâmica do processo, o planejamento envolve uma
racionalidade que se expressa em um conjunto de operações complexas e
interligadas de reflexão, decisão, ação e retorno da reflexão. Esse processo se dá
em um movimento contínuo de análise e síntese entre prioridades, meios e recursos
disponíveis para consecução das finalidades, efetivação de metas e realização dos
resultados desejados, em determinados períodos de tempo.
Para cada uma dessas fases metodológicas do processo de planejamento
social (reflexão, decisão, ação e retorno da reflexão), existem instrumentos
correspondentes. Os Planos, Programas e Projetos são documentos que
materializam o momento das decisões no planejamento e dizem respeito aos
diferentes níveis da gestão, acima referidos.
Dessa forma, o Plano constitui-se no documento que expressa a dimensão
mais ampla, é um instrumento normativo e político que contempla as decisões do
nível estratégico e de caráter geral do sistema, as grandes linhas, as diretrizes
gerais e os macro-objetivos que norteiam a instituição ou organização. Os Planos
correspondem muitas vezes à dimensão da Política Social, por exemplo: Plano
Nacional da Educação, Política/Plano Nacional da Assistência Social.
46 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
O Programa é o documento de desdobramento do Plano. Apresenta por
setores ou áreas, as diretrizes, os objetivos e as metas setoriais, estabelecendo o
quadro mais amplo de referência dos projetos. Assim como um programa social é
um conjunto de projetos, uma política social é um conjunto de programas. No
planejamento social, projetos e programas são a tradução operacional das políticas
sociais. O Programa corresponde, assim, ao nível tático da gestão e envolve, em
geral, um horizonte de tempo mais longo que os projetos.
O Projeto é o documento que sistematiza e cria um traçado prévio da
operacionalização da ação. Contém um conjunto de atividades inter-relacionadas e
coordenadas para atingir determinados resultados em uma dada perspectiva de
tempo, em geral, em horizonte mais curto, e com determinado limite de recursos,
previstos em orçamento. O projeto constitui-se, assim, na unidade elementar do
processo de racionalização das decisões, sendo o instrumental mais próximo da
operação ou da execução propriamente dita.
(A) I, apenas – esta alternativa não é correta, pois estão certas as
características apontadas nos itens I, II e III, referentes à Plano, Programa e Projeto.
As demais alternativas estão incorretas
pelas razões a seguir:
(B) II, apenas – esta alternativa não é correta, pois estão certas as
características apontadas nos itens I, II e III, referentes à Plano, Programa e Projeto.
(C) III, apenas – esta alternativa não é correta, pois estão certas as
características apontadas nos itens I, II e III, referentes à Plano, Programa e Projeto.
(D) I e II, apenas – esta alternativa não é correta, pois estão certas as
características apontadas nos itens I, II e III, referentes à Plano, Programa e Projeto.
Referências
BAPTISTA, Myrian Veras. Planejamento Social: intencionalidade e instrumentação. São Paulo: Veras; Lisboa: CPIHTS, 2000. LUCK, Heloisa. Metodologia de projetos: uma ferramenta de planejamento e gestão. 4ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2003. MELO RICO, Elizabeth (org.). Avaliação de Políticas Sociais: uma questão em debate. São Paulo: Cortez, 1998. TENÓRIO, Fernando G. Gestão de ONGs: principais funções gerenciais. 9ª ed. Rio de janeiro: FGV, 2005.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 47
QUESTÃO 20
Analise as afirmações a seguir:
No contexto da ofensiva neoliberal, a elaboração e execução de projetos sociais
vêm sendo deslocadas do Estado para as ONGs e Organizações Sociais, cuja
atuação não esgota o atendimento às demandas do campo dos direitos e das
políticas sociais.
PORQUE Só o Estado reúne as condições da universalidade com potencialidade de promover
ações permanentes, abrangentes e sistemáticas, na provisão de serviços e sistemas
sociais.
A esse respeito, é possível concluir que
(A) as duas afirmações são verdadeiras, e a segunda justifica a primeira. (B) as duas afirmações são verdadeiras, e a segunda não justifica a primeira. (C) a primeira afirmação é verdadeira, e a segunda é falsa. (D) a primeira afirmação é falsa, e a segunda é verdadeira. (E) as duas afirmações são falsas. Gabarito: Questão A
Tipo de questão: Asserção e razão; escolha simples com indicação da resposta
correta.
Conteúdos avaliados: Neoliberalismo e Terceirização das Políticas Sociais
Públicas
Autora: Ana Lúcia Suárez Maciel
Comentário: A resposta correta é a A: “as duas afirmações são verdadeiras, e a segunda
justifica a primeira”.
Ao analisarmos a questão fica evidente a discussão acerca da incidência
do neoliberalismo nas políticas sociais. Neoliberalismo é um termo que, a partir
da década de 60, passou a significar a doutrina econômica que defende a
absoluta liberdade de mercado e uma restrição à intervenção estatal sobre a
economia, só devendo esta ocorrer em setores imprescindíveis e ainda assim
num grau mínimo. (Moraes, 2001).
48 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
Desde a Constituição Brasileira de 1988, quando os direitos sociais foram
incluídos como direito do cidadão e dever do Estado, as políticas sociais passaram a
ocupar o centro das discussões acerca da sua garantia em uma perspectiva de
universalidade, sendo o Estado o ator central na sua condução. Historicamente, o
Estado brasileiro desenvolveu um importante papel na sociedade, sendo
considerado um ator essencial porque colaborava com o funcionamento da
economia de mercado, estabilizando e aumentando a sua produtividade. No entanto,
a partir do final da década de 70 e início dos anos 80, o Estado passou a apresentar
sinais de enfraquecimento no que dizia respeito às suas forças enquanto regulador
e, com isso, o seu papel começou a ser repensado no sentido de restaurar as
condições para a liberdade do mercado, tendo em vista a conjuntura marcada pela
manifestação de sinais de falência do seu padrão intervencionista.
A política econômica brasileira da década de 90, especialmente a adotada pelo
governo de Fernando Henrique Cardoso, estava ancorada na perspectiva de fazer o
país avançar no sentido de sua integração ao contexto internacional de globalização.
A criação do Ministério de Administração e da Reforma do Estado, com destaque para
o Plano Diretor da Reforma do Estado, elaborado em 1995, foi um dos fatores
decisivos para a conformação de uma nova forma do Estado gerenciar as políticas
públicas. O objetivo da reforma do Estado pode ser conferido no extrato a seguir: Reformar o aparelho do Estado significa garantir a esse aparelho maior governança, ou seja, maior capacidade de governar, maior condição de implementar as leis e políticas públicas. Significa tornar muito mais eficientes as atividades exclusivas de Estado, através da transformação das autarquias em "agências autônomas", e tornar também muito mais eficientes os serviços sociais competitivos ao transformá-los em organizações públicas não-estatais de um tipo especial: as "organizações sociais”.3
Conforme a citação acima, a reforma do Estado supõe uma mudança
gerencial, mas, especialmente, uma redefinição das atividades exclusivas do
Estado, o que vem sendo considerada uma contrarreforma do Estado brasileiro. No
âmbito das políticas sociais, verifica-se que “(...) no atual contexto neoliberal, global
e produtivo, são substantivamente alteradas em suas orientações e em sua
funcionalidade” (Behring, 2003: 244).
3 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/publi_04/COLECAO/PLANI6.HTM. Acesso em 30/4/2010.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 49
Dentre as novas formas de gerenciamento das políticas públicas se destaca a
constituição da esfera pública não estatal, ou seja, a constituição da parceria do
Estado com as organizações do chamado Terceiro Setor que abrange as ONGs e as
OS referidas no enunciado da questão em análise.
Como consequência se verifica novas formas de gestão dos programas sociais,
com destaque para a focalização, a terceirização como forma de contratação, a
descentralização do atendimento pela transferência direta, ou através de parcerias,
nos serviços para a comunidade, ou para organizações filantrópicas particulares.
A atuação desse Terceiro Setor, diferentemente do Estado, se caracteriza
pelo atendimento das demandas sociais, a partir, de um recorte das mesmas,
considerando-se a missão com a qual a organização se propõe a atuar. Assim, é
comum que as organizações que compõem esse setor atuem com um determinado
grupo ou demanda social, já que não lhes é exigido o trato universal, tal qual ocorre
no âmbito das políticas públicas.
Desse modo, conclui-se que a atuação das ONGs e OS se caracteriza como
uma forma complementar a ação do Estado e, por isso, a sua prática não esgota o
atendimento às demandas do campo dos direitos e das políticas sociais, o que
justifica a resposta A para a questão proposta.
Com relação à alternativa B, de fato, as duas afirmações são verdadeiras,
mas a segunda alternativa não justifica a primeira, pois o que está em questão é o
modelo de gestão do Estado (neoliberal) e não a natureza do mesmo.
Com relação à alternativa C, a mesma está incorreta, pois a primeira
afirmação é verdadeira e a segunda também é verdadeira.
A alternativa D está incorreta, pois ambas as afirmações são verdadeiras.
Por fim, a alternativa E está incorreta, pois afirma que as duas afirmações são falsas, quando na verdade, é o contrário: ambas são verdadeiras.
Referências
BEHRING, Elaine. Brasil em Contra-Reforma: desestruturação do Estado e perda de direitos. São Paulo: Cortez, 2003. BRASIL. PLANO DIRETOR DA REFORMA DO APARELHO DO ESTADO. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/publi_04/COLECAO/PLANDI6.HTM. Acesso em 30/4/2010. MORAES, Reginaldo. Neoliberalismo: de onde vem, para onde vai? São Paulo: Senac, 2001.
50 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 21
A participação dos usuários nos Conselhos de Políticas Públicas tem sido um
desafio para a sociedade brasileira: de fato “os usuários só poderão ter participação
efetivamente qualificada e transitando para o status de sujeito de direitos se tiverem
os instrumentos de análise da realidade.” GOMES, A.L. Os conselhos de políticas e de direitos. Capacitação em Serviço
Social e Política Social: módulo 4 – O trabalho do Assistente Social e as políticas Sociais. Brasília: UnB, 2000.
Com base nessa afirmação, e levando em conta o Código de Ética Profissional
vigente, cabe aos Assistentes Sociais:
(A) contribuir para a ampliação do conhecimento dos usuários para garantir direitos.
(B) substituir, em algumas circunstâncias, os usuários nos Conselhos. (C) fortalecer as representações das instituições que atendem os usuários. (D) criar normas e manuais de conduta que ensinem os usuários a serem
conselheiros. (E) representar, sistematicamente, os usuários nos seus Conselhos. Gabarito: Questão A
Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da alternativa correta. Conteúdos avaliados: Conselhos de Políticas e de Direitos, Participação Social e
Projeto Ético-político da Profissão
Autora: Dolores Sanches Wünsch
Comentário: A questão problematiza a participação dos usuários nos Conselhos de
Políticas Públicas, evidenciando a importância e os desafios para a sua efetivação e
o papel do Assistente Social, a luz do Código de Ética Profissional, nesses espaços,
bem como a sua relação com os conselheiros-usuários. Cabe situar que o processo
de democratização do Estado brasileiro e a descentralização das políticas públicas
são recentes em nosso país, é através da Constituição Federal brasileira de 1998
que se cria uma nova institucionalidade na relação Estado-sociedade. Sendo os
conselhos das políticas sociais setoriais e de direitos e expressões desse processo,
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 51
constituindo-se em importante instrumento de controle social no âmbito da esfera
pública. Segundo Raichelis (2006), os espaços de representação social na
organização e gestão das políticas sociais ao se ampliarem, permitiram a
participação de novos e diversificados atores sociais, em particular aqueles que
historicamente estiveram excluídos das decisões políticas. Por sua vez, para o
Assistente Social esses espaços encontram-se em consonância com os princípios
fundamentais que norteiam o projeto ético-político profissional contribuindo para o
fortalecimento da direção social da profissão na busca constante da garantia dos
direitos de cidadania.
Esse breve preâmbulo atesta que a alternativa (A) está correta, pois cabe ao
Assistente Social, “contribuir para a ampliação do conhecimento dos usuários para
garantir direitos,” essa contribuição situa-se no reconhecimento do papel dos
usuários das políticas sociais, na proposição e definição dos rumos das mesmas
para atendimento das reais necessidades da população destinatária das políticas.
Evidencia-se que os conselhos são espaços de disputa de projetos hegemônicos
societários distintos, quanto mais qualificada for a participação dos usuários, mais se
amplia o processo democrático de controle social. Considerando especialmente, que
os usuários das políticas públicas, historicamente representam segmentos sociais,
subjugados a relações de poder e de subalternização entre governo e governados.
Na perspectiva dessa análise é de competência ético-política do Assistente
Social, nas políticas sociais, atuar nas instâncias de controle social. Seu trabalho na
relação com os conselheiros-usuários passa, dentre outras competências, pela
democratização da informação e ampliação do conhecimento dos princípios,
diretrizes e orçamento da política, e dessa forma, a representação e participação
destes, torna-se mais equânime, os usuários têm a possibilidade de exercerem um
papel mais efetivo, ou seja, de fato como sujeito de direitos.
Portanto, destaca-se que é incorreto afirmar que cabe ao Assistente Social
“substituir, em algumas circunstâncias, os usuários nos Conselhos,” conforme cita a
alternativa (B) ou ainda, a alternativa (E) “representar, sistematicamente, os
usuários nos seus Conselhos”, uma vez que a participação dos usuários é uma
prerrogativa legal. Também o Assistente Social não deve se limitar a “criar normas e
manuais de conduta que ensina os usuários a serem conselheiros” como sugere a
52 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
alternativa (D), nem tão pouco “fortalecer as representações das instituições que
atendem os usuários” indicada pela alternativa (C) em detrimento a representação
dos próprios usuários. Todas essas alternativas são expressões de tutela à
participação política dos usuários, presentes na cultura política autoritária da
sociedade brasileira e criam obstáculos a autonomia dos usuários e ferindo assim o
Código de Ética Profissional, em seu princípio primeiro, que é o de “reconhecimento
da liberdade como valor ético central e das demandas políticas a ela inerentes –
autonomia, emancipação e plena expansão dos indivíduos sociais” (CFESS, 1993).
Nessa direção, o Assistente Social deve contribuir para o processo de
autonomia dos usuários, tornando os conselhos um instrumento de mobilização e
aprendizagem para que os usuários possam se reconhecer como agentes políticos
públicos. Conforme aponta Gomes (2000), a participação qualificada e politicamente
comprometida dos usuários, incide no exercício do controle social e amplia o espaço
público.
Ressalta-se que a construção da esfera pública como espaço de participação
social dos usuários e demais atores envolvidos, relaciona-se a outros princípios do
Código de Ética Profissional que preconiza a ampliação e consolidação da cidadania, considerada tarefa primordial de toda a sociedade, com vistas à garantia dos direitos civis sociais e políticos das classes trabalhadoras; e a defesa do aprofundamento da democracia, enquanto socialização da participação política e da riqueza socialmente produzida (CFESS, 1993).
Nessa perspectiva concebe-se a esfera pública, conforme definida por
Raichelis (2006), como uma totalidade dinâmica e articulada, sendo constitutiva
desta a visibilidade social das ações, que pressupõe a transparência e publicização
das políticas públicas e a representação dos interesses coletivos, através da
constituição de sujeitos políticos ativos.
Finalizando, a participação do Assistente Social, no campo do controle
democrático das políticas sociais, fortalece o projeto ético-político da profissão, seu
trabalho envolve diferentes estratégias e competências cujas determinações
conjugam ações que transformam e resignificam esses espaços profissionais,
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 53
reconhecendo-os como potencialmente locus de enfrentamento de amplos e
históricos processos de desigualdades sociais.
Referências
CFESS. Código de Ética Profissional. Brasília: CFESS, 1993. GOMES, Ana Ligia. Os conselhos de políticas e de direitos. In: Capacitação em Serviço Social e Política Social: módulo 4 – O trabalho do Assistente Social e as políticas Sociais. Brasília: UnB, 2000. RAICHELIS, Raquel. Democratizar a gestão das políticas sociais – um desafio a ser enfrentado pela sociedade civil. In: MOTA, A.E. et al. (Org). Serviço Social e Saúde: formação e trabalho profissional. São Paulo: Cortez, 2006.
54 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 22
Analise as afirmativas a seguir:
O Assistente Social deve estimular a participação dos usuários nas instâncias em
que se decidem as políticas públicas.
PORQUE A democracia é princípio constitutivo dos compromissos éticos do Serviço Social.
A esse respeito, é possível concluir que
(A) as duas afirmativas são verdadeiras, e a segunda justifica a primeira. (B) as duas afirmativas são verdadeiras, e a segunda não justifica a primeira. (C) a primeira afirmativa é verdadeira, e a segunda é falsa. (D) a primeira afirmativa é falsa, e a segunda é verdadeira. (E) as duas afirmativas são falsas. Gabarito: Questão B Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da resposta correta
Conteúdos avaliados: participação social e democracia para o serviço social
Autora: Idilia Fernandes
Comentário: A questão B é a verdadeira porque a democracia é princípio dos
compromissos éticos do serviço social como indica o Código de ética dos assistentes
sociais: “defesa do aprofundamento da democracia, enquanto socialização da
participação política e da riqueza socialmente produzida” (1997, p. 31). Além da democracia ser princípio ético do serviço social, a participação social
é um processo que diz respeito as relações sociais e que pode ser trabalhada a
partir de seus elementos pedagógicos, tais sejam: a conscientização, a organização
e a capacitação, que são assim vislumbrados por Souza (1993). Para o serviço
social é essencial trabalhar com o processo social da participação. Seguindo a
orientação de Souza a “conscientização” é o momento em que se pode ampliar os
horizontes da consciência, ampliar o olhar sobre aquilo que se percebe da realidade.
É a superação da consciência ingênua para uma consciência crítica. Quando é
possível despertar para o sujeito coletivo de ações articuladas, de percepções de
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 55
situações em comum, estamos no momento da “organização”. No momento da
capacitação, uma pequena coletividade deverá adquirir conteúdo técnico e político
para planejar intervenções concretas diante das situações vivenciadas e
enfretamentos das expressões da questão social. Define-se como processo educativo da participação: o processo que se expressa através da conscientização, da organização e capacitação contínua e crescente da população ante sua realidade social (Souza, 1993, p. 84).
A questão A está errada, pois o fato de ser dever do assistente social
estimular os usuários é justificado pelo fato da democracia ser princípio constitutivo
e não o contrário. Os profissionais da área social têm a possibilidade de propiciar a
abertura de espaços para o desenvolvimento da participação, trabalhando com
acesso a informação sobre os direitos do povo e estimulando o mesmo a reconhecer
seus direitos e a se reconhecer como um cidadão que deve estar atento a forma
como as políticas públicas vêm atendendo a suas necessidades humanas. A própria
constituição de 1988, na seção IV, (da assistência social) artigo 204 preconiza no
inciso II: “– participação da população, por meio de organizações representativas, na
formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis”. Enquanto
processo social a participação é ponto alto a ser trabalhado nas práticas sociais, no
intuito de estimular o processo de fortalecimento da dimensão coletiva da profissão e
do elo entre a população, seus direitos, suas necessidades em comum e sua
possibilidade de protagonizar sua história. Por isso, a questão D está errada, pois
sugere que a primeira afirmativa que fala do estímulo à participação esteja errada. O processo social precisa ser compreendido no desenvolvimento das
relações sociais. Processo social é o que está sendo produzido, constantemente, na
dinâmica das relações socais. É, portanto, também, resultado dessas relações, das
interações entre os sujeitos, entre os grupos, entre as nações. Nas relações sociais
os sujeitos se aproximam ou se afastam, se incluem ou ficam de fora das diversas
instâncias societais. Os processos sociais são produzidos constantemente nas
interações entre os seres humanos na sociedade. Essa produção pode ser de
aproximação entre pessoas, grupos, nações, tanto quanto poderão ser de
afastamento, hostilidade, discriminações e segregações.
56 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
Há uma dinâmica que se desenvolve nas interações entre as pessoas, dinâmica
que é mediatizada por uma série de fatores econômicos, culturais, históricos, locais e
globais. Existe, também, uma interação de reciprocidade e interdependência nessa
dinâmica com as pessoas entre si e o seu contexto histórico social. [...] Embora o homem seja um indivíduo único – e é justamente esta particularidade que o torna um indivíduo, um ser comunal realmente individual – ele é igualmente o todo, o todo ideal, a existência subjetiva da sociedade como é pensada e vivenciada (Marx, 1983, p. 119).
A dinâmica da realidade social, sempre em construção, propicia resultados
também dinâmicos, por isso os processos sociais estão em constante
processualidade e construção. Entretanto, existem alguns processos sociais que
permanecem existentes no movimento histórico dos povos e da civilização, bem
como no processo histórico de consolidação da sociedade de classes, mediada pela
relação entre capital e trabalho, que produz mais valia, sociedade salarial e
inúmeras desigualdades entre os indivíduos. O processo social é ação, é o que
acontece na interação, não é algo simbólico ou metafísico, é práxis, pois transforma
o real com o seu movimento e sua rede de inter-relações. O homem cria a história e vive na história já muito tempo antes de conhecer a si mesmo como ser histórico. Mas a consciência histórica, que descobriu na história a dimensão essencial da realidade humana, não nos diz ainda por si mesma a verdade sobre o que é a história (Kosik, 1995, p. 210).
O Serviço Social apresenta uma particularidade significativa, o fato de mediar-
se pelo contato direto com as pessoas, com a população, através do estabelecimento
de relações, seu principal instrumento de trabalho. Essa característica se concretiza
em um amplo campo de ação. A ação profissional passa pelo atendimento
individualizado, grupal, comunitário, institucional e outros aspectos. Esses aspectos
estão em uma unidade dialética, o que implica, necessariamente, trabalhá-los em
conjunto, como um todo. Afinal, não se pode apreender o indivíduo sem a percepção
do seu contexto comunitário, assim como não há sentido trabalhar com a
comunidade como abstração conceitual, e sem a leitura dos meandros institucionais,
nos quais, os indivíduos sociais organizam suas vidas.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 57
Para o Assistente Social há uma mediação realizada entre população-
instituição, que está inserida em um contexto contraditório e bastante complexo
“onde o caminho entre o espaço permitido e o espaço conquistado é o profissional
que faz” (Martinelli, 1999). As instituições como componentes do real, também
devem ser desvendadas. É preciso conhecer os objetivos institucionais
historicamente determinados, suas relações internas e externas, seu processo
histórico e suas contradições, os possíveis espaços ou “brechas”, a identificação dos
aliados, seu poder de decisão em nível de Estado e sua política da atuação, são
aspectos fundamentais a serem desvendados e mediados, junto à população, para
que fundamentem estratégias de ação.
A lei Orgânica da Assistência Social (lei nº. 8.742/93), Seção II Das Diretrizes
Art. 6º preconiza: As ações na área da assistência social são organizadas em sistema descentralizado e participativo, constituído pelas entidades e organizações de assistência social abrangidas por esta Lei, que articule meios, esforços e recursos e por um conjunto de instâncias deliberativas compostas pelos diversos setores envolvidos na área.
Essa lei é mais uma forma de subsidiarmos, enquanto assistentes sociais,
nossa prática social em uma perspectiva de cidadania e participação, buscando
sempre encontrar o protagonismo dos sujeitos com os quais trabalhamos.
Trabalhamos com as diversas políticas sociais entre elas a da assistência social e da
saúde, nessas políticas já está estabelecido o controle social, na perspectiva da
constituição de 1988, como um mecanismo necessário ao desenvolvimento dessas
políticas. O controle social, numa primeira concepção (antes da constituição de
1988), é o controle do Estado sobre a sociedade em favor dos interesses da classe
dominante por meio de políticas sociais para amenizar os conflitos de classe. Nessa
visão o Estado fica restrito a administrar os interesses e demandas da classe
dominante. No livro Manifesto do Partido Comunista, de 1848, Marx diz que o Estado
é como um comitê que serve para gerenciar os negócios da burguesia (1983).
As instituições estatais através de programas sociais buscam o controle
social. A partir da constituição de 1988, temos uma nova concepção de controle
social que é o “controle da sociedade sobre as ações do Estado”. A sociedade
organizada deve participar das políticas públicas, através de diversos conselhos
58 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
deliberativos para exercer o controle social. Dessa forma, nos aproximamos do que
Gramsci denominava de Estado ampliado, como espaço contraditório de interesses
de classe. Apesar de representar hegemonicamente os interesses da classe
dominante, o Estado incorpora, também, demandas das classes populares (Correia,
2002, p.120-121). O novo conceito de controle social nasce do campo contraditório
das políticas sociais, o Estado controla a sociedade ao mesmo tempo em que há
algum espaço para suas demandas num verdadeiro jogo de forças e interesses, por
vezes, bem antagônicos. Neste sentido o controle social envolve a capacidade que a sociedade civil tem de interferir na gestão pública, orientando as ações do Estado e os gastos estatais na direção dos interesses da maioria da população. Conseqüentemente, implica o controle social sobre o fundo público (Correia, 2002, p.121).
Os conselhos gestores são ilustrativos do lugar de participação
institucionalizada, a população tem espaço para defender seus interesses,
influenciar e controlar os rumos das políticas sociais. É preciso ter cuidado para
esse espaço não se tornar de consenso entre Estado e conselhos no desenho de
políticas públicas de acordo com expansão do capital, realizar cortes públicos,
privatizar e focalizar tais políticas, conforme alerta Correia (2002). Os assistentes
sociais devem estar atentos e qualificados para realizar essa discussão, tanto com
gestores quanto com a própria população, a fim de favorecer a real democracia e o
processo social da participação.
É importante compreender que a “descentralização e democratização” não
são sinônimos – nem elementos inseparáveis, tanto os que querem o Estado mínimo
quanto aqueles que defendem políticas sociais podem demandar por
descentralização. Por vezes ocorre um “divórcio entre descentralização do Estado e
a democratização da gestão pública”. Por exemplo, quando a municipalização é
proposta repassando os encargos de serviços das instâncias estadual ou federal
para esfera municipal, sem repassar os recursos financeiros necessários para
subsidiar as políticas.
Se não houver a criação de uma estrutura para a capacitação de conselheiros
e entidades de usuários, como um processo contínuo de formação e de troca de
informações para inserir uma agenda de lutas nessa área, há um risco da qualidade
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 59
do debate e do embate não acontecer da forma necessária. Por isso, será
imprescindível o trabalho permanente de educação e politização popular, através de
mecanismos de coletivização e espaços de discussão em grupos.
Segundo nos previne Raichelis (2000, p.132), não se deve afirmar a prática
conselhista como panaceia para o enfrentamento de todas as dificuldades do
aprofundamento dos processos democráticos. Necessário se faz levar em conta que
os conselhos não são o único conduto de controle social no âmbito das políticas
sociais, há outros mecanismos que vão sendo criados pela própria população.
A questão C está errada ao afirmar que a segunda afirmativa sobre a
democracia seja falsa, pois a mesma é fundamental no exercício profissional. O
profissional que trabalha na perspectiva do processo social da participação e da
democracia precisa aprender, no cotidiano de seu serviço à população, a reconhecer
o protagonismo da mesma. Saber valorizar o reconhecimento da política da
população, de sua capacidade de resistir, de lutar, de criar estratégias de
resistências, de se rebelar, mesmo vivenciando situações de grandes sofrimentos, é
preciso reconhecer esse sofrimento e as alternativas de superação do mesmo.
Um fator que pode fortalecer as relações das comunidades é algo estratégico
como a possibilidade de perceber a constante relação entre o global e o particular,
ao mesmo tempo em que se dá ênfase à dinâmica dos bairros, dos territórios, não
se perde a perspectiva da política da cidade. Por exemplo: o AS promover um
grande seminário de encontro entre diferentes territórios. O Serviço Social, ao lidar com as múltiplas e diversificadas expressões da questão social e políticas públicas correspondentes, tem tido uma inserção privilegiada nesse âmbito. No Brasil, é da maior importância o trabalho que vem sendo realizado por assistentes sociais especialmente na esfera da seguridade social: nos processos de sua elaboração, gestão, monitoramento e avaliação, nos diferentes níveis da federação. Destaca-se, ainda, a atuação dos assistentes sociais junto aos conselhos de políticas – com saliência para os Conselhos de Saúde e de Assistência Social nos níveis nacional, estadual e municipal [...] (Iamamoto, 2008, p.198).
O trabalho na área social que leva em conta a imprescindibilidade da
participação popular, também, leva em consideração aquilo que Potyara (2002)
denomina de “necessidades humanas básicas x mínimos sociais”. Nesse sentido, os
60 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
objetivos do controle social nas diferentes políticas sociais devem estar voltados e
priorizando o atendimento às necessidades humanas básicas (natural, social,
política e cultural) e não apenas aquilo que é mínimo. Um exemplo aqui para ilustrar
essa questão, poderia ser pensar na situação das pessoas com deficiência que
tiveram historicamente suas demandas atendidas apenas pelas áreas da assistência
social, educação e saúde, como se as demais áreas das vidas das pessoas com
deficiência inexistissem.
Sposati (2002, p.49-52) faz uma crítica interessante em relação à exigência
de políticas sociais complexas em Estados que sequer instalaram os modos
tradicionais das políticas sociais. No processo social atual ocorre a exigência e
demanda por uma nova geração de políticas socais sem que tenha sido assentada
uma velha geração. As demandas dos movimentos sociais ultrapassam a realidade
das políticas, o perfil tradicional das políticas por necessidades setoriais (saúde,
habitação, educação, etc.) é interpelado por demandas, por direitos específicos de
novos segmentos: mulheres, idosos, crianças, jovens, etnias, homoafetividade,
pessoas com deficiência, drogadição, população em situação de rua, etc. No que a
autora chama de “regulação social tardia” ocorre, portanto, um deslizamento das
responsabilidades nacionais para as locais no campo social. [...] é preciso, pois, no âmbito dos esforços com vistas ao conhecimento da realidade humana, praticar, intencional e sistematicamente, uma dialética entre as partes e o todo, o conhecimento das partes fornecendo elementos para a construção de um sentido total, enquanto o conhecimento da totalidade elucidará o próprio sentido que as partes, autonomamente, poderiam ter (Severino, 1989, p.17).
Para finalizarmos nossa reflexão em torno da questão da participação voltemos
a Correia (2002) que nos indica que descentralização pressupõe partilha de poder,
seja da esfera federal para a estadual e municipal, seja no âmbito do Estado para
sociedade civil. Nesse processo estão implicadas, tanto as transferências de
competência quanto ao planejamento e tomada de decisões como a compatibilização
de recursos para implementação dos serviços. Outro aspecto fundamental trabalhado
pela autora (Correia, 2002) e a discussão em torno do fundo público – o controle
social só pode acontecer de fato sobre as políticas públicas, se houver, por parte dos
setores organizados, a participação na definição da alocação de recursos, pois a
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 61
política social se desenha de acordo com a utilização desse fundo. Por toda reflexão
feita até então, reafirma-se que a questão E esteja errada, pois, considera que as
duas afirmativas acima sejam falsas, viemos mostrando até então justamente o
contrário, ou seja, o quanto essas duas afirmativas são verdadeiras.
Referências
COLETÂNEA DE LEIS. CRESS SER. Gestão 1996-99. POA: CRESS 10ª região, 1997. CORREIA, Maria Valéria Costa. Que Controle Social na Política de Assistência Social? In: Serviço Social e Sociedade: cidade, proteção e controle n.º 72, ano XXIII. São Paulo: Cortez, 2002. FILHO, Nylson Paim de Abreu (org.). CONSTITUIÇÃO FEDERAL, CÓDIGO PENAL e CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. 4ª Edição. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2003. IAMAMOTO, Marilda Villela. Serviço Social em Tempo de Capital Fetiche: capital financeiro, trabalho e questão social. 2ª. ed. São Paulo: Cortez, 2008. KOGA, Dirce. Cidades entre territórios de vida e territórios vividos. In: Serviço Social e Sociedade: cidade, proteção e controle n.º 72, ano XXIII. São Paulo: Cortez, 2002.
62 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 23
No planejamento de uma ação profissional inserida numa política pública de saúde,
no que se refere aos benefícios a serem concedidos aos usuários, o que o
assistente social deve considerar prioritariamente?
(A) A universalidade dos direitos. (B) A parceria entre Estado e sociedade civil. (C) O poder aquisitivo dos usuários. (D) Os recursos técnico-institucionais. (E) Os serviços imediatamente disponíveis. Gabarito: Questão A
Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdos avaliados: SUS; Princípios doutrinários; direitos sociais
Autora: Esalba Maria Silveira
Comentário: No planejamento de uma ação profissional inserida numa política pública de
saúde, no que se refere aos benefícios a serem concedidos aos usuários, o
assistente social deve considerar prioritariamente a universalidade dos direitos. A
universalidade tem sido considerada na ciência política como uma noção
relacionada ao campo do direito, mais especificamente ao campo dos direitos
humanos (MATA, 2008). Ou seja, os direitos que são comuns a todas as pessoas,
como um direito positivo que visa à manutenção da vida individual e social no
mundo moderno. Constitui-se como um dos princípios fundamentais do Sistema
Único de Saúde (SUS) e está inscrita na Constituição Federal brasileira desde
1988. Esse princípio doutrinário aponta para o rompimento com a tradição
previdenciária e meritocrática do sistema de saúde brasileiro, que conferia
unicamente aos trabalhadores formais, por meio da contribuição previdenciária, o
acesso às ações e serviços de saúde. Com a instituição do SUS, a saúde tornou-
se um direito de qualquer cidadão brasileiro, independente de raça, renda,
escolaridade, religião ou qualquer outra forma de discriminação, e um dever do
Estado brasileiro em prover esses serviços. A saúde é direito de todos e dever do
Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 63
risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e
serviços para sua promoção, proteção e recuperação (Brasil, 2005, p. 39). A
universalidade é o princípio que organiza e dá sentido aos demais princípios e
diretrizes do SUS na garantia do direito à saúde de forma integral, equânime,
descentralizada e com participação popular (MATTA, 2007).
A universalidade é um valor a ser fortalecido e defendido como um projeto
emancipatório de sociedade. É nessa perspectiva que a ideia de uma construção
social da universalidade permite a sua “desnaturalização” e a valorização de suas
dimensões histórica, política e cultural.
(B) A alternativa é incorreta
O planejamento das ações do assistente social prioritariamente deve ser
pautado pela universalidade dos direitos.
(C) A alternativa é incorreta
O argumento para afirmar que essa alternativa é incorreta, está entre outros,
num dos princípios do Código de Ética dos Assistentes sociais que diz:
“posicionamento em favor da eqüidade e justiça social, que assegure universalidade
de acesso aos bens e serviços relativos aos programas e políticas sociais, bem
como sua gestão democrática”. Conclui-se que não deve ser considerado
prioritariamente para concessão de benefícios o poder aquisitivo dos usuários, tendo
em vista o princípio da universalidade no SUS.
(D) A alternativa é incorreta
A alternativa é incorreta, porque limitar o planejamento das ações aos
recursos técnico-institucionais pode ser incompatível com o princípio da
universalidade.
(E) A alternativa é incorreta
A alternativa é incorreta, considerando que o sistema de saúde deve centrar
suas ações nas reais necessidades de saúde da população e articular ações
intersetoriais com as demais políticas sociais que intervêm nas condições de vida da
população, como é o caso da habitação, do saneamento, das condições de trabalho,
da educação, assistência, previdência, acesso à terra, etc.
64 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
Referências
CEFFS. Código de Ética Profissional dos Assistentes Sociais. Disponível em: http://www.cfess.org.br/arquivos/CEP_1993. Acesso em 4/5/2010. COSTA, M. D. H. O Trabalho nos Serviços de Saúde e a Inserção dos(as) Assistentes Sociais. Disponível em: http://www.fnepas.org.br/pdf/servico_social_saude/texto2-7. Acesso em 4/5/2010. MATTA, G. C. Princípios e Diretrizes do Sistema Único de Saúde. In: MATTA, G. C.; PONTES, A. L. de M. (Org.). Políticas de Saúde: organização e operacionalização do Sistema Único de Saúde. Rio de Janeiro: EPSJV/Fiocruz, 2007. PEREIRA, Isabel Brasil; LIMA, Júlio César França. Dicionário da educação profissional em saúde. 2ª.ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: EPSJV, 2008. PINHEIRO, R.; MATTOS, R. A. (Orgs.). Construção Social da Demanda: direito à saúde, trabalho em equipe e participação e os espaços públicos. Rio de Janeiro: IMS, Uerj, Cepesc, Abrasco, 2005.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 65
QUESTÃO 24
“Ao reconhecer a saúde como resultante das condições de vida, a obtenção de
dados sobre as condições econômicas, políticas, sociais e culturais passa a fazer
parte do conjunto dos procedimentos necessários à identificação e análise dos
fatores que intervêem no processo saúde/doença.” MOTA, A. E. et alli, org. Serviço Social e saúde. Formação e trabalho
profissional. S. Paulo, Cortez, 2006.
A partir desse texto, pode-se afirmar que, no planejamento de sua intervenção numa
política de saúde, o Assistente Social deve, prioritariamente,
(A) apoiá-lo no exame abrangente das condições de vida dos usuários. (B) fundamentá-lo no conhecimento das representações culturais dos usuários. (C) embasá-lo em práticas e técnicas médicas, jurídicas e antropológicas. (D) justificá-lo a partir da história familiar e de vida dos usuários. (E) legitimá-lo mediante pesquisas sobre serviços de alta complexidade. Gabarito: Questão A
Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da resposta correta.
Conteúdos avaliados: política de Saúde
Autora: Maria Isabel Barros Bellini
Comentário: A resposta correta é a letra A: apoiá-lo no exame abrangente das condições
de vida dos usuários.
Considerado por muitos como o “pai da medicina”, além de ser uma figura
muito importante na história da saúde, Hipócrates (460 a.C. - 377 a.C.), apesar de
ter vivido no século IV a.C., anunciava, já naquela época, que o tipo de vida
influenciava na saúde dos indivíduos. Cerca de dois séculos após, no século XVI, o
médico e alquimista, suíço-alemão, Paracelso alertava quanto à importância das leis
físicas da natureza e fenômenos biológicos no conhecimento do organismo humano.
No século XIX, ainda que não tivesse sido cunhada a denominação “saúde do
trabalhador”, Engels apontava que as condições de vida e os ambientes de trabalho
na Inglaterra influenciavam o processo de saúde dos trabalhadores. Portanto, as
66 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
condições de vida, de trabalho e a organização social participam de forma
consistente nos processos de saúde e doença, fato que tem sido observado no
decorrer dos séculos.
No Brasil, por décadas a saúde foi concebida como um processo individual,
delegando aos indivíduos a capacidade e responsabilidade por manter-se
saudável ou adoecer, o meio ambiente, as condições de vida não eram elementos
contemplados como determinantes nos processos de saúde-doença. O conceito
ampliado de saúde, firmado na Constituição Federal de 1988 e tema da Reforma
Sanitária, compôs a pauta do movimento de democratização, em que participaram
vários segmentos da sociedade em busca, na área da saúde, da construção de
uma consciência sanitária e de um sistema de saúde democrático,
descentralizado, único e universal. Na 8ª Conferência Nacional de Saúde de 1986
constituiu-se o espaço no qual essas conquistas e o Sistema Único de Saúde –
SUS – consolidaram-se.
A partir daí a concepção ampliada de saúde passou a pautar as ações em
saúde que evoluíram de um modelo curativo para um modelo integral de atenção à
saúde. Nessa perspectiva, as condições de vida, de trabalho, as relações de
sociabilidade, as redes de pertencimento, o acesso a educação de qualidade, a
segurança, estão diretamente implicadas na construção de processos de saúde-
doença e devem ser o fundamento no planejamento de ações em saúde. Configura-
se a integralidade em saúde, a qual se caracteriza pela [...] articulação e sintonia entre as estratégias de produção da saúde, a ampliação da escuta dos trabalhadores e serviços de saúde na relação com os usuários, quer individual e/ou coletivamente, de modo a deslocar a atenção da perspectiva estrita do seu adoecimento e dos seus sintomas para o acolhimento de sua história, de suas condições de vida e de suas necessidades em saúde, respeitando e considerando suas especificidades e suas potencialidades na construção dos projetos e da organização do trabalho sanitário (MS, 2006, p.10).
A inserção do assistente social na área da saúde pressupõe a atividade de
planejamento, sendo observado por alguns autores que essa é uma das
atividades de concentração juntamente com ações de caráter emergencial
assistencial, educação, informação e comunicação em saúde, assessoria,
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 67
mobilização e participação social (COSTA, 2006). Portanto, tendo em vista os
elementos discutidos, o assistente social deve, ao realizar o planejamento,
considerar as condições econômicas, políticas, sociais e culturais expressas nos
modos de vida, condições de trabalho, condições de habitação, cultura, lazer,
acesso a educação e acesso a serviços, para que esse planejamento se
constitua em uma ferramenta balizadora de uma ação competente que responda
as necessidades e as demandas postas pela realidade. No planejamento, os
modos de viver devem ser entendidos na perspectiva do coletivo para além de
uma perspectiva centrada no indivíduo, também não podem ser entendidos
apenas como [...] exercício da vontade e/ou liberdade individual e comunitária. Ao contrário, os modos como sujeitos e coletividades elegem determinadas opções de viver como desejáveis, organizam suas escolhas e criam novas possibilidades para satisfazer suas necessidades, desejos e interesses pertencem à ordem coletiva, uma vez que seu processo de construção dá-se no contexto da própria vida (MS, 2006, p.7).
As demais alternativas estão incorretas pelas razões a seguir:
(B) fundamentá-lo no conhecimento das representações culturais dos usuários.
Estabelece como único foco as representações culturais dos usuários e não
inclui os aspectos econômicos, políticos, sociais, etc.
(C) embasá-lo em práticas e técnicas médicas, jurídicas e antropológicas.
Estabelece como foco elementos médicos, jurídicos e antropológicos, não
incluindo outros elementos importantes no planejamento e que compõe a formação
do assistente social.
(D) justificá-lo a partir da história familiar e de vida dos usuários.
A história familiar e de vida é uma ferramenta que compõe a metodologia da
pesquisa qualitativa e é utilizada para conhecimento de realidade do usuário e
articulação com o contexto social mais amplo. Outras ferramentas e técnicas
poderão compor o planejamento.
(E) legitimá-lo mediante pesquisas sobre serviços de alta complexidade.
O foco de pesquisa, “serviços de alta complexidade”, não possibilita
conhecimento sobre a realidade do usuário e sim sobre “serviços de alta
complexidade”.
68 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
Referências
COSTA, Maria Dalva H. da. O trabalho nos serviços de saúde e a inserção dos assistentes sociais. In: MOTA, A. E. et all., (org.) Serviço Social e saúde: formação e trabalho profissional. São Paulo: Cortez, 2006. FLEURY, S. A questão democrática na saúde. In: FLEURY, S. Saúde e democracia: a luta do CEBES. São Paulo: Lemos, 1997. PAIM, Jairnilson. Reforma Sanitária: contribuição para a Compreensão e Crítica. Salvador: EDUFBA; Rio de Janeiro: Fiocruz, 2008. FLEURY, Sonia; BAHIA, Lígia; AMARANTE, Paulo (Org.). Saúde em Debate: fundamentos da reforma sanitária. Rio de Janeiro: Cebes, 2008. MIOTO, Regina Célia; NOGUEIRA, Vera Maria R. Sistematização, planejamento e avaliação das ações dos assistentes sociais no campo da saúde. In: MOTA, A. E. et alli. (org.) Serviço Social e saúde: formação e trabalho profissional. São Paulo: Cortez, 2006. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Lei Orgânica da Saúde de nº. 8.080/90 e Lei complementar de nº. 8.142/90. 2ª. ed. MS — Assessoria de Comunicação Social. Brasília, 1991.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 69
QUESTÃO 25
As pesquisas no campo das ciências históricas têm, no centro do debate
metodológico, para a interpretação e transformação da realidade social, a secular
questão da relação objetividade x subjetividade. Neste debate são freqüentes as
afirmações como as apresentadas a seguir:
I − O estudo da realidade social exige a mesma neutralidade requerida ao físico, ao químico e ao biológico.
II − Os fenômenos sociais devem ser considerados da mesma forma que os fenômenos da natureza.
III − O modelo social-darwinista da “sobrevivência” dos mais “aptos” serve para explicar a sociedade.
IV − As ciências históricas têm especificidades metodológicas: seus objetos são transitórios e atravessados por interesses de classes.
V − A visão de mundo das classes sociais condiciona a produção acadêmica das ciências sociais.
Estão corretas, apenas, as afirmações
(A) I e II (B) I e V (C) III e IV (D) IV e V (E) I, II, III e IV Gabarito: Questão D
Tipo de questão: Escolha combinada com indicação da resposta correta
Conteúdos avaliados: As pesquisas no campo das ciências históricas
Autoras: Idilia Fernandes
Comentário: A questão D é a correta pelo fato de que na afirmação 4 se coloca que as
ciências históricas têm especificidades metodológicas: seus objetivos são transitórios
e atravessados por interesses de classes. Da mesma forma a afirmação 5 demonstra
que a visão de mundo das classes sociais condiciona a produção acadêmica das
ciências sociais. Essa afirmação implica em percebermos que a visão de mundo das
classes sociais condiciona a produção acadêmica nas ciências sociais.
70 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
Não Há neutralidade nas ciências humanas, pois são atravessadas pela
subjetividade dos sujeitos e por valores humanos que vão perpassar os projetos de
pesquisa. Não se pode dizer que o estudo da realidade social exige a mesma
neutralidade requerida ao físico, ao químico e ao biológico, como está colocado na
afirmação 1. Por outro lado, não se pode afirmar que os fenômenos sociais devem
ser considerados da mesma forma que os fenômenos da natureza, conforme
afirmação 2. Dessa forma a questão A e B estão erradas.
No processo de desvendamento do cotidiano, busca-se conhecer o
significado do vivido, de cada fato singular experienciado pelos sujeitos de uma
coletividade. Procura-se apreender como se constrói o seu viver histórico, pois, no
conjunto, na articulação de significados dados a esse viver, se expressa e constrói o
modo de vida, a cultura de uma comunidade. É preciso conhecer os significados
atribuídos pelos sujeitos para que se possam estabelecer mediações com a prática
profissional. Os aspectos singulares, que se dão na interação coletiva, devem ser
entendidos de forma relacionada com o universo maior, a cultura, a estrutura
econômica, os condicionantes da mídia. São múltiplos os aspectos que estimulam
ou condicionam seres singulares a atitudes repetidas, aspectos que ultrapassam a
esfera individual e dizem respeito a um contexto mais amplo e mais complexo. O
processo de desvendamento desse real deve pressupor a conscientização de
múltiplos fatores para interpretá-los globalmente, em suas articulações.
A afirmação 3 não está correta ao dizer que modelo social-darwinista da
“sobrevivência” dos mais “aptos” serve para explicar a sociedade. Sendo assim, as
questões C e E estão erradas. Charles Darwin criou uma tentativa de explicar a
diversidade de espécies de seres vivos através da evolução. Sua teoria defende a
ideia de que no mundo sobrevive o mais forte, por isso há a evolução. Não se deve
dizer, entretanto, que existem características sociais que determinariam que uma
pessoa é superior à outra e, que as pessoas seriam umas mais aptas do que as
outras para viver em sociedade. Se isso fosse verdade estaríamos desconsiderando
os processos socias, nos quais são criadas as desigualdades de condições, com as
quais o sujeito se encontra limitado por questões da estrutura social e não por méritos
e deméritos pessoais. Não é adequado aplicar a “teoria das espécies” ao mundo
social, pois a biodiversidade difere da diversidade da condição humana.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 71
O saber popular está expresso no que é dito e no que não é dito, no aparente,
mas igualmente no que está encoberto. O investigador da área social deve procurar
compreender e interpretar, em conjunto com a população, os fenômenos vividos e
apresentados no real.
Esse processo de descoberta vai sendo mediado pelo profissional que busca
estabelecer as conexões com contextos mais amplos. Trabalhar no processo de
conscientização dos indivíduos, ao mesmo tempo em que também nos
conscientizamos a partir deles, deve ser a base do movimento reflexivo e investigativo
na área histórico-social. Segundo Paulo Freire “[...] este e não outro parece ser o
papel do Trabalhador Social que optou pela mudança” (Freire, 1979, p. 60).
O diálogo é um instrumento importante de trabalho, pois através dele se pode
pensar com a população o entendimento do real e atividades de contraponto. Essas
atividades apresentam sentido oposto ao desenvolvimento de programas pré-
determinados, cuja população não participa de sua construção, trazendo seus reais
interesses e o rico conteúdo do seu “saber feito”. Da mesma forma, na pesquisa na
área social as entrevistas semiestruturadas, de teor qualitativo, dão um tom mais
humano à relação entre sujeito e objeto.
Considerando a pluralidade de significados, da sociedade de nosso tempo
atual, onde a ciência, a arte, a política, a filosofia, e tudo o mais é plural, não se
pode falar em uma ciência única, nem de um sentido absoluto para filosofia, nem na
política com um corpo único de relações de poder ou de um sentido único para arte.
Não estamos com isso fazendo uma apologia ao pluralismo científico, apenas
constatando a diversidade dos significados que os sujeitos dão aos diversos setores
da vida. No cotidiano da moda de vestir, por exemplo, temos a convivência de várias
décadas na presente década, o que era moda nos anos 50, permanece com a moda
dos anos 60, 70, 80 nos anos 90, 2000 e assim por diante.
No campo da sexualidade, predominam as relações heterossexuais, mas em
convivência com muitos casais homoafetivos que assumem a relação de forma
pública, com ampla discussão da sociedade sobre a possibilidade da união civil
entre as diferenças de orientação sexual, discussão que atualmente o Brasil vem
fazendo. Diante dessa diversidade toda, se poderá falar de neutralidade nas
ciências humanas?
72 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
Tendo em vista a pluralidade, a diversidade, a imensa complexidade da
conjunção de tantas forças singulares significantes, não deixamos de considerar,
também, que a unidade faz parte da diversidade. O único coexiste no múltiplo,
portanto, falaremos de um sentido para o Serviço Social de nosso tempo, que não
tem a pretensão de se considerar único. Um sentido que faz parte da pluralidade,
compondo a unidade, que em última instância não deixa de ser um sentido próprio
àquilo que é da área social, diferentemente de outras áreas do saber.
A atividade humana é atividade prática, na prática se dá a relação sujeito –
objeto, o objeto só faz sentido como produto real da atividade. O sujeito ativo, em
sua atividade prática, transforma o mundo, que só pode ser transformado de forma
prática. Dessa forma, o sujeito, numa concepção marxiana, objetiva sua
subjetividade, dá concretude a seu projeto pensado pela consciência, realiza a
passagem do subjetivo para a objetivação do seu ser, se realiza como sujeito,
através de sua atividade prática, de seu trabalho concreto não alienado. Os animais só constroem de acordo com os padrões e necessidades da espécie a que pertencem, enquanto o homem sabe produzir de acordo com os padrões de todas as espécies e como aplicar o padrão adequado ao objeto. Assim, o homem constrói também em conformidade com as leis do belo. [...] A atividade vital consciente distingue o homem da atividade vital dos animais [...] O trabalho alienado inverte a relação, pois o homem, sendo um ser auto-consciente, faz de sua atividade vital, de seu ser, unicamente um meio para sua existência (Marx, 1983, p. 96 ).
A elaboração feita por Marx da categoria Práxis é central em sua teoria do ser
social, que se firma no pressuposto de uma unidade entre sujeito e objeto, bem
como, nas relações entre homem e natureza. A prática humana vai dar um caráter
antropológico à natureza e ao objeto, ao mesmo tempo vai caracterizar uma relação
de conhecimento, chamada de “relação cognoscitiva sujeito-objeto”, segundo Vázquez (1997, p. 143). O sujeito na construção de seu mundo estará em constante
relação de aprendizagem, na manipulação e transformação da natureza. Em um
sentido marxiano produzir é projetar-se, objetivar-se no mundo dos objetos, e
converter a natureza em uma natureza humanizada para os sujeitos. Nesse sentido,
para Marx o trabalho é parte constitutiva do ser, de sua realização pessoal, da
construção de sua identidade de ser social.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 73
Remeter-nos a uma análise permanente das implicações (afetivas, históricas, profissionais, etc.), desmontando e questionando as construções da ideologia neutralista do acadêmico e profissional é sinalizar que as instituições não existem fora das práticas dos sujeitos, dos nossos corpos. Sendo assim, podemos concluir que as relações que estabelecemos com os acontecimentos, com os encontros no cotidiano estão permanentemente atravessando e produzindo subjetividades (Duarte, 1995, p.45).
O cotidiano de cada individualidade está imerso em um conjunto de fatores
sociais, foram constituídos no conjunto da sociedade e, por isso, influenciam a
individualidade de cada um. O conjunto da sociedade está historicamente
condicionado pela estrutura social econômica. Essa estrutura é permeada por
relações desiguais e opressoras entre os indivíduos. A autonomia de cada um é
relativa, devido às relações já estruturadas no conjunto. Necessário se faz
considerar a imbricação que há na relação entre o indivíduo e a sociedade na
ciência que produz o saber e na prática profissional que articula esse saber em seu
desenvolver cotidiano.
Referências
DUARTE, Marco José de O. Formação Profissional e Produção de Subjetividade: contribuição de uma análise micropolítica. In: Cadernos de Comunicação. CBSS, Bahia, 1995. DUARTE, Newton. A Individualidade Para–Si: contribuição a uma teoria histórico-social da formação do indivíduo. 2ª. ed. São Paulo: Autores Associados, 1999. FREIRE, Paulo. Educação e Mudança. São Paulo: Paz e Terra, 1979. MARX, Karl. Manuscritos Econômicos e Filosóficos de 1844. In: Conceito Marxista do Homem. Apêndice: manuscritos econômicos e filosóficos de 1844 Karl Marx. 8ª ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1983. VÁZQUEZ, A. Sánchez. Filosofia da Praxis. Tradução de Luiz F. Cardoso. 4ª. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.
74 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 26
“A assessoria à gestão das políticas sociais tem sido demandada por diferentes
sujeitos [...] que atuam nesta esfera. Expressa reconhecimento da capacidade
profissional dos Assistentes Sociais no domínio da temática. É resultado do trânsito,
como afirma Netto (1992), da atuação profissional exclusivamente pautada na
execução terminal das políticas sociais para uma atuação profissional competente
na gestão da totalidade do processo da política social, incluindo as suas dimensões
de formulação, de gestão, e de sua operacionalização”. BRAVO, M. I. S. e MATOS, M. C., orgs. Assessoria, Consultoria & Serviço Social.
Rio de Janeiro, 7 Letras, 2006, p.53-54.
A partir desse texto, é correto argumentar que
(A) a intervenção do Assistente Social em assessoria e consultoria no campo das políticas sociais indica uma redução do campo de ação profissional.
(B) a atuação do Assistente Social em assessorias e consultorias possibilita a conquista de novos espaços ocupacionais, contribuindo para maior visibilidade e promoção da profissão.
(C) assessorias e consultorias contradizem as atribuições privativas do Assistente Social, embora ampliem o seu mercado de trabalho.
(D) assessorias e consultorias ameaçam diminuir a empregabilidade do Assistente Social no espaço público e estatal.
(E) atividades de assessoria e consultoria consolidam a posição do Assistente Social nos limites da execução terminal de políticas.
Gabarito: Questão D
Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da resposta correta. Conteúdos avaliados: Assessoria e Consultoria em Serviço Social
Autora: Ana Lúcia Suárez Maciel e Leonia Capaverde Bulla
Comentário: A resposta correta é a B: “a atuação do Assistente Social em assessorias e
consultorias possibilita a conquista de novos espaços ocupacionais, contribuindo
para maior visibilidade e promoção da profissão”.
Para analisar a questão proposta é preciso partir do reconhecimento da
profissão de Assistente Social como uma profissão inserida na divisão sociotécnica
do trabalho, cujo exercício é livre, no Brasil, se forem observadas todas as
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 75
condições prescritas pela Lei nº 8.662/93 (Brasil 1993), que regulamenta a profissão.
O Assistente Social é, portanto, um profissional liberal, mas, também, tem condições
de exercer funções, estabelecidas em lei, em órgãos de administração pública direta
ou indireta, empresas, entidades e organizações populares. Entre as competências
do profissional, a Lei de Regulamentação da Profissão, nos artigos 4º e 5º, reafirma
o trabalho do Assistente Social como assessor ou consultor (Brasil, 1993). É
importante acentuar, ainda, que a atuação do profissional como assessor ou
consultor ocorre em ambas as modalidades de trabalho: a liberal e a assalariada.
A competência profissional para atuar como assessor ou consultor resulta do
reconhecimento social da profissão, no que se refere a sua capacidade de dar
respostas às demandas sociais, sejam elas decorrentes das instituições
empregadoras e/ou dos próprios usuários dos serviços. Decorre, também, da larga
trajetória profissional na execução de políticas sociais que, a partir da década de 90,
ampliam as possibilidades do exercício profissional, com a incorporação dos
assistentes sociais nas esferas de formulação das políticas sociais.
Soma-se a essa trajetória, a capacidade organizativa da categoria
profissional, expressa pela sua decisiva participação na formulação das políticas
sociais em vigor no País, e a consolidação da profissão como área de
conhecimento, materializada pelo adensamento das produções teóricas no campo
da política social. A qualificação profissional e o patamar das produções acadêmicas
eleva o profissional de Serviço Social à categoria de pesquisador, reconhecido pelas
agências de fomento, como acentua Iamamoto (2008). A partir desse status, ele é
inserido nos comitês de assessores e consultores de instituições como Coordenação
e Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior – CAPES/MEC –, Conselho
Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico – CNPq –, Fundação de
Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul – FAPERGS –; Fundação de
Amparo à Pesquisa de São Paulo – FAPESP – e outras fundações estaduais de
amparo à pesquisa.
Concomitantemente, as substantivas alterações no mundo do trabalho,
especialmente, as alterações no padrão de organização e gestão do trabalho
vinculado ao modelo de acumulação flexível (ANTUNES, 1998) demarcaram um novo
perfil para as profissões. Para assumir esse novo perfil, o profissional foi instigado a
76 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
compreender o processo de trabalho em que estava inserido na sua totalidade e, não
mais, na sua particularidade, tal qual vigorava no modelo taylorista-fordista.
Essa perspectiva impôs ao Assistente Social a necessidade de ampliar a
sua atuação no âmbito das políticas sociais que, historicamente, o colocaram na
esfera da execução terminal, para uma atuação que abrange a formulação, a
gestão, a operacionalização e a avaliação das políticas sociais. Alia-se a essa
alteração no mundo do trabalho a adoção da teoria social crítica na profissão, o
que tem permitido aos profissionais a compreensão dos processos sociais em
uma perspectiva de totalidade. Com isso, esses profissionais habilitam-se para o
trabalho que engloba o planejamento, a execução e a avaliação como uma
unidade indissociável.
Com base nessas considerações, é possível afirmar que as respostas A, C,
D e E são incorretas, acrescentando-se os seguintes argumentos: As atuações no
âmbito da assessoria e da consultoria não indicam uma redução do campo de
ação profissional, pois, evidenciam, ao contrário, uma ampliação do escopo da
atuação da profissão. Essas formas de atuação não contradizem, tampouco, as
atribuições privativas do Assistente Social, visto que a própria Lei de
Regulamentação (BRASIL, 1993) afirma essas atribuições e competências do
profissional, que ampliam o seu mercado de trabalho. Da mesma forma, as
funções de assessoria e consultoria não ameaçam diminuir a empregabilidade do
Assistente Social no espaço público e estatal. As pesquisas existentes na área,
por exemplo, a publicada em 2005, pelo Conselho Federal de Serviço Social
(CFESS, 2005), não indicam que a atuação do profissional nesse âmbito seja
uma ameaça para a empregabilidade da profissão, pois a esfera pública e estatal
se reafirma como a maior empregadora dos profissionais. Finalmente, os
argumentos elencados até o momento indicam que as atividades de assessoria e
consultoria, além de não consolidar a posição do Assistente Social nos limites da
execução terminal de políticas, demonstram que ocorre, justamente, o oposto, ou
seja, a posição profissional se consolida ao ampliar o escopo da sua atuação:
que ultrapassa o âmbito da execução e assume a gestão, o monitoramento e
avaliação das políticas, com vistas à afirmação, à consolidação e garantia dos
direitos dos cidadãos.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 77
Referências
ANTUNES, Ricardo. Adeus ao trabalho? Ensaio sobre as metamorfoses e a centralidade do mundo do trabalho. 5ª. ed. São Paulo: Cortez, 1998. BRASIL. Lei N° 8.662, de 7 de junho de 1993. Dispõe sobre a profissão de Assistente Social e dá outras providências. Brasília, 1993. BRAVO, Maria Inês de Souza; MATOS, Maurílio Castro de (Orgs). Assessoria, Consultoria & Serviço Social. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2006. BULLA, Leonia Capaverde. Origens e profissionalização do Serviço Social no Brasil. In: FLICKINGER, Hans-Georg. Entre caridade, solidariedade e cidadania: história comparativa do Serviço Social Brasil/Alemanha. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2000. CFESS. Assistentes Sociais no Brasil: elementos para o estudo do perfil profissional. Brasília: CFESS, 2005. Disponível em: www.cfess.org.br. Acesso em 15/5/2010. IAMAMOTO, Marilda V. O Serviço Social em tempo de capital fetiche: capital financeiro, trabalho e questão social. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 2008. MACIEL, Ana Lúcia Suárez; FERNANDES, Rosa Maria Castilhos. Requisições para o trabalho dos assistentes sociais. Porto Alegre: Graturck, 2009.
78 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 27
Nas requisições de assessoria e consultoria aos Assistentes Sociais, surgem, hoje,
as demandas das etnias, que travam uma luta permanente pelos seus direitos e pela
promoção da igualdade étnico-racial.
Sobre esse assunto, analise as afirmações a seguir:
A compreensão das questões étnicas exige mais que uma consciência da defesa
dos direitos como um imperativo legal e ético.
PORQUE A implementação de políticas étnicas na perspectiva da soberania alimentar,
organização política e auto-sustentabilidade não pode simplesmente obedecer a
padrões gerais de políticas públicas.
A esse respeito, é possível concluir que
(A) as duas afirmações são verdadeiras, e a segunda justifica a primeira. (B) as duas afirmações são verdadeiras, e a segunda não justifica a primeira. (C) a primeira afirmação é verdadeira, e a segunda é falsa. (D) a primeira afirmação é falsa, e a segunda é verdadeira. (E) as duas afirmações são falsas. Gabarito: Questão B Tipo de questão: Asserção e razão, com indicação da alternativa correta
Conteúdo avaliado: Assessoria, Consultoria e Políticas étnicas Autora: Ana Lúcia Suárez Maciel e Inês Amaro da Silva
Comentário: A resposta correta é a B: “as duas afirmações são verdadeiras, e a segunda
não justifica a primeira”.
Ao analisarmos a questão fica evidente a discussão acerca da relação entre o
processo de assessoria/consultoria e as políticas étnicas no âmbito da atuação do
assistente social.
Inicialmente é importante destacar que a assessoria e a consultoria se
constituem em competências do profissional, conforme a Lei de Regulamentação da
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 79
profissão, com destaque para o Artigo 4º que sinaliza, dentre as referidas
competências, as seguintes: VIII - prestar assessoria e consultoria a órgãos da administração pública direta e indireta, empresas privadas e outras entidades; IX - prestar assessoria e apoio aos movimentos sociais em matéria relacionada às políticas sociais, no exercício e na defesa dos direitos civis, políticos e sociais da coletividade (Lei Nº 8.662/93, Regulamenta a Profissão do Assistente Social).
No exercício dessas competências, o profissional se ancora no Projeto Ético-
Político do Serviço Social que, em um dos seus princípios, ressalta a questão da
diversidade e das diferenças. O princípio refere: “Empenho na eliminação de todas
as formas de preconceito, incentivando o respeito à diversidade, à participação de
grupos socialmente discriminados e à discussão das diferenças” (Código de Ética do
Assistente Social. Resolução CFESS Nº 273, de 13 de março de 1993).
Esses balizamentos legais e éticos são fundamentais para o desenvolvimento
do trabalho profissional e estão, diretamente, associados à atual configuração do
objeto da profissão, pois: Na atualidade, a “questão social” diz respeito ao conjunto multifacetado das expressões das desigualdades sociais engendradas na sociedade capitalista madura, impensáveis sem a intermediação do Estado. A “questão social” expressa desigualdades econômicas, políticas e culturais das classes sociais, mediadas por disparidades nas relações de gênero, características étnico-raciais e formações regionais, colocando em causa amplos segmentos da sociedade civil no acesso aos bens da civilização.4
As questões étnicas são consideradas expressões da Questão Social e
resultam da formação sócio-histórica do Brasil, sendo consideradas como uma
dívida social, tendo em vista o longo período de escravidão e o fato de que as
políticas públicas no nosso país, ainda, precisam abarcar as particularidades dos
grupos que, historicamente, constituíram as minorias sociais e, portanto, se
encontram mais suscetíveis às desigualdades.
4 Disponível em: http://www.fnepas.org.br/pdf/servico_social_saude/texto2-.pdf. Acesso em 5 de maio de 2010.
80 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
As políticas étnicas no Brasil passaram a ser reconhecidas como políticas
públicas, em 2003, quando o governo criou a Política Nacional de Promoção da
Igualdade Racial – PNPIR. A PNPIR tem como objetivo a: Redução das desigualdades raciais no Brasil, com ênfase na população negra, mediante a realização de ações exeqüíveis a longo, médio e curto prazos, com reconhecimento das demandas mais imediatas, bem como das áreas de atuação prioritárias (Decreto Nº 4.886, de 20 de novembro de 2003).
Nesse sentido, o Assistente Social ao atuar como assessor/consultor dos
grupos que compõem as minorias sociais deverá observar além das questões legais
e éticas, pois sabemos que a trajetória histórica de luta e garantia dos direitos
sociais impõe o reconhecimento das particularidades, no caso da pergunta em
análise, das questões étnico-raciais que se retratam na luta dos movimentos que as
representam pela garantia da igualdade étnico-racial.
Assim, retomamos as afirmações feitas com relação à questão formulada: “A
compreensão das questões étnicas exige mais que uma consciência da defesa dos
direitos como um imperativo legal e ético porque a implementação de políticas
étnicas não pode simplesmente obedecer a padrões gerais de políticas públicas”,
pois deve abarcar as lutas dos grupos que as representam. Nesse sentido, a
resposta correta indica que as duas afirmações são verdadeiras, mas que a segunda
não justifica a primeira, pois o que justifica é o caráter de disputa pela garantia da
igualdade racial e não a mera garantia de políticas públicas. E, ainda, as questões
de soberania alimentar, organização política e autossustentabilidade não interferem
nesse processo de disputa, pois a ênfase é na igualdade racial.
Com relação à alternativa A, está incorreta, pois a as duas afirmações são
verdadeiras, mas a segunda não justifica a primeira.
Com relação à alternativa C, está incorreta, pois a primeira afirmação é
verdadeira, e a segunda, também, é verdadeira e não falsa.
Com relação à alternativa D, está incorreta, pois a primeira afirmação é
verdadeira e a segunda, também, é verdadeira.
Por fim, a alternativa E, está incorreta, pois as duas afirmações são verdadeiras e não falsas.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 81
Referências
BRASIL. Decreto Nº 4.886, de 20 de novembro de 2003. Institui a Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial - PNPIR e dá outras providências. Disponível em: http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/protecaoespecial/legislacao Acessado em 5/5/ 2010. Conselho Federal de Serviço Social. Lei Nº 8.662/93. Lei de Regulamentação da Profissão do Assistente Social. ______. Código de Ética do Assistente Social. Resolução CFESS Nº 273, de 13 de março de 1993. IAMAMOTO, Marilda V. As Dimensões Ético-políticas e Teórico-metodológicas no Serviço Social Contemporâneo. São Paulo: Cortez, 2001.
82 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 28
Conforme preconiza o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o Conselho
Tutelar é um órgão permanente, autônomo e não jurisdicional, composto por
representantes eleitos pela comunidade local, que tem a função de zelar pelo
cumprimento dos direitos da criança e do adolescente. Presente neste conselho, o
assistente social vai muito além da execução terminal de políticas sociais. Dentre as
atribuições específicas do Conselho Tutelar, previstas no ECA, aquela que mais
explicitamente exige do assistente social um papel que ultrapassa o que lhe foi
delegado, tradicional e historicamente é:
(A) atender crianças e adolescentes cujos direitos foram ameaçados ou violados; (B) assessorar na elaboração da proposta orçamentária de planos e programas; (C) atender, aconselhar e orientar, quando necessário os pais ou responsável; (D) providenciar e expedir, eventualmente, notificações e documentos similares; (E) requisitar certidões de nascimento e de óbito de criança e adolescente, se
necessário. Gabarito: Questão B
Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da resposta correta.
Conteúdos avaliados: Estatuto da Criança e do Adolescente, Direitos da Infância e
Juventude
Autora: Patricia Krieger Grossi
Comentário: Cabe ressaltar que o Conselheiro Tutelar é eleito pela comunidade e não
necessita ser um profissional do Serviço Social. O Conselho Tutelar foi instituído
pelo ECA (arts.131 a 140) e teve os parâmetros de sua atuação e funcionamento
traçados pela Resolução nº 75 de 22/10/2001 do CONANDA. O Conselho é um
órgão municipal, público, permanente e autônomo, não jurisdicional, de natureza
administrativa, encarregado de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do
adolescente, aplicando as medidas de proteção contra sua ameaça ou violação.
Compõe-se de cinco membros, maiores de 21 anos de idade, eleitos pela
comunidade local para um mandato de três anos, permitida uma reeleição.
(SIMÕES, 2006). Alguns Conselhos Tutelares podem contar com assistentes sociais
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 83
para assessorar e acompanhar o trabalho que desenvolvem na comunidade.
Custódio e Souza (2009, p.2.723) ressaltam que o Conselho Tutelar não deve
substituir o atendimento, por meio de serviços técnicos especializados, de qualquer
rede de políticas públicas como saúde, assistência social, educação, entre outras,
pois “não cabe ao Conselho Tutelar fazer o serviço especializado, mesmo nos casos
em que os próprios conselheiros tenham formação específica”. Entretanto, o
Conselheiro tutelar poderá requisitar serviços especializados de profissionais, como
do Serviço Social, para completar suas observações e análises e fundamentar suas
decisões em relação à aplicação de medidas pertinentes aos pais ou responsáveis,
por exemplo, visando atender as necessidades de cada situação.
Resposta A – a resposta A está incorreta, pois tradicionalmente, o assistente
social é um profissional habilitado a intervir nas expressões da questão social, como
pobreza, mendicância, trabalho infantil, abuso sexual e outras formas de violação de
direitos vivenciadas por crianças e adolescentes.
Resposta B – a resposta B está correta, pois a elaboração de proposta
orçamentária de planos e programas vai além da execução terminal de políticas
sociais. Tradicionalmente, era delegado ao assistente social, o atendimento a
indivíduos, famílias e grupos sociais, com um caráter educativo no sentido de
orientar os diferentes segmentos populacionais na busca pelo acesso a seus direitos
sociais, visando a “integração social”. Não ocupava cargos de gestão, assessoria e
consultoria. Portanto, a elaboração de propostas orçamentárias passa a ser uma
tarefa importante dos assistentes sociais como equipe técnica que assessora o
Conselho Tutelar, ultrapassando a visão tradicional do assistente social.
Resposta C – a resposta C está incorreta, pois o atendimento aos pais e
responsáveis faz parte do papel tradicional dos assistentes sociais, pois a família é a
base da sociedade e o Serviço Social sempre teve a centralidade de sua atuação na
família. Isso ocorre desde a investigação de denúncias de maus-tratos e violência na
família, através de visitas domiciliares, elaboração de estudos sociais sobre as
condições econômicas e sociais da família, relações entre os membros, entorno
social, entre outros aspectos. O assistente social, bem como o Conselheiro Tutelar
investiga se a denúncia de maus-tratos é procedente, quem são os envolvidos por
ação ou omissão de cuidados, a gravidade da situação, identificação dos fatores de
84 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
risco, se há necessidade de medidas emergenciais e como proceder para garantir o
bem-estar da criança e adotam as medidas cabíveis. O assistente social busca
articular a rede social no atendimento às demandas apresentadas pela mesma.
Resposta D – a resposta D está incorreta, pois o assistente social é um
profissional habilitado a requisitar a documentação dos usuários para garantir o
acesso a direitos sociais como BPC (Benefício de Prestação Continuada), bolsa
família, aposentadoria, pensão e outros benefícios sociais. Também realiza
notificações de acidentes e violências em crianças, mulheres, idosos, entre outros.
Resposta E – a resposta E está incorreta, pois o assistente social, desde os
primórdios da profissão, costumava requisitar certidões de óbito e/ou nascimento
para providenciar auxílio-funeral, auxílio maternidade, entre outros benefícios sociais
para os usuários.
Referências
ANDRADE, Jorge. Conselhos Tutelares: sem ou cem caminhos?. São Paulo: Veras, 2002. REIS, Jorge Renato dos e LEAL, Rogério Gesta (orgs.). Direitos Sociais & Políticas Públicas. Desafios Contemporâneos. Tomo 9.1ª ed. Santa Cruz: EDUNISC, 2009. SIMÕES, Carlos. Curso de Direito do Serviço Social. Biblioteca Básica do Serviço Social. 2ª ed. Revista e atualizada São Paulo: Cortez, 2006.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 85
QUESTÃO 29
A Constituição Federal de 1988 introduziu conquistas inéditas no campo da proteção
social. Dentre elas, destaca-se a criação de novas modalidades de exercício da
democracia participativa no campo das políticas sociais - os Conselhos de Políticas
e de Direitos na área de assistência, saúde, infância e juventude, entre outras. A
concepção que melhor retrata o potencial destas novas modalidades na luta pela
garantia de direitos é a que toma os Conselhos como instância/espaço de
(A) construção de consensos entre as classes e camadas sociais. (B) afirmação do papel do Estado como agente neutro nos conflitos sociais. (C) promoção da solidariedade e da construção de parcerias entre o público e o
privado. (D) fortalecimento dos governos no enfrentamento das desigualdades sociais. (E) luta e confronto entre projetos societários antagônicos na disputa por
hegemonia. Gabarito: Questão E
Tipo de questão: Escolha simples com indicação da resposta correta
Conteúdos avaliados: Conselhos de Políticas e de Direitos, Controle Social,
Direitos Sociais, Participação social, Projeto Ético-político da Profissão
Autora: Esalba Maria Silveira
Comentário: (A) Alternativa incorreta.
A palavra consenso aponta que essa afirmação está incorreta, pois ela
oferece o sentido de acordo geral entre os membros de um grupo, levando em conta
as preocupações de todos e visa resolvê-los antes que uma decisão seja tomada. A
luta pela afirmação dos direitos é hoje também uma luta contra o capital. Como
afirma Iamamoto (2009), os direitos sociais foram negados durante muito tempo
entre outras alegações, a de que violam o direito individual à propriedade e
estimulam o paternalismo estatal. A lógica do capital expõe a contradição entre
cidadania e classe social. É ainda Iamamoto que refere que a classe social constrói
privilégios e diferenças, impossibilitando que todos possam participar
igualitariamente da produção do patrimônio espiritual e material produzido
86 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
coletivamente. As conquistas passam pelo enfrentamento no reconhecimento dos
direitos e não pelo consenso.
(B) Alternativa incorreta.
A relação Estado-sociedade orientada pelo neoliberalismo evidencia que o
Estado não é um agente neutro. Todavia exige o desocultamento do real, no qual o
poder aparece encoberto por uma racionalidade burocrática e de um discurso de
neutralidade que pode esconder formas de ação pré-traçadas.
(C) Alternativa incorreta.
As instâncias públicas de controle democrático foram propostas num contexto
de mobilização da sociedade civil a fim de buscarem corrigir as históricas injustiças
sociais acumuladas ao longo da história, até então incapazes de universalizar
direitos e cumprindo a tradição de privatizar a coisa pública pelas classes
dominantes. Bravo (2001) afirma que o sentido do controle social inserido na
Constituição é o de participação da população na elaboração, implementação e
fiscalização das políticas sociais. Semionato (2006) destaca que se tem proposto a
mobilização da sociedade civil para assumir ações emergenciais como a distribuição
de alimentos, educação alimentar, entre outros, dentro da perspectiva do
voluntariado. Ela considera que esse tipo de participação dirige-se à contramão da
história, pois a sociedade civil passa a ser vista como o espaço de resolução de
problemas, cujas ações seriam da esfera estatal.
Os conselhos são espaços de vigilância na conquista de direitos e não de
parcerias solidárias. Lembra Yasbeck (2001) que o pensamento neoliberal estimula
a “refilantropização do social” e a transferência pelo Estado para o mercado e
filantropia como alternativa aos direitos sociais.
(D) Alternativa incorreta.
Potyara Pereira (1996) define política pública como "linha de ação coletiva
que concretiza direitos sociais declarados e garantidos em lei". As políticas públicas,
embora sejam de competência do Estado, não representam decisões autoritárias do
governo para a sociedade, mas envolvem relações de reciprocidade e antagonismo
entre essas duas esferas. É mediante as políticas públicas que são distribuídas ou
redistribuídos bens e serviços sociais em resposta às demandas. Todavia a crise do
capitalismo contemporâneo acabou por abrir o caminho para a emergência das
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 87
teses neoliberais de desmontagem do Estado enquanto instância mediadora da
universalização dos direitos e da cidadania, como discute Raichelis (2010). Sendo
assim, o potencial dos Conselhos não se localiza no fortalecimento dos governos,
considerando que ele também reproduz as desigualdades sociais postas pela
sociedade, mas [sim em] identificar as contradições e buscar estratégias para
garantia dos direitos por parte do Estado.
(E) Alternativa CORRETA.
A Constituição de 1988 trouxe a definição de novos processos e regras
políticas capazes de redefinir as relações do Estado com a sociedade, no sentido de
criar uma nova institucionalidade democrática. Requalificou o processo de
participação e passou a reconhecer e acolher a diversidade de interesses e projetos
societários colocados na arena política e social. Souza (2004) refere que a essa
nova modalidade de participação dá-se o nome de “participação social”. A categoria
central da participação social é a “sociedade”. Não mais a comunidade ou o povo ou
grupos excluídos, mas sim o conjunto da sociedade configurado por diversos
interesses e projetos, desenhando a disputa pelo poder do Estado. A participação
social assim entendida tem como objetivo a universalização dos direitos sociais, a
ampliação do conceito de cidadania e a interferência da sociedade no aparelho
estatal, bem como a publicização do Estado e com isso buscou superar as históricas
injustiças sociais acumuladas. (CARVALHO, 1995).
Para melhor entender a alternativa correta, cabe enfatizar que concepções de
publicização e de público comportam variadas e divergentes leituras. Raichelis (2010)
destaca que a esfera pública é o espaço de explicitação de interesses em conflito, de
confronto entre projetos sociais e de luta pela hegemonia. Afirmar que um elemento
constitutivo e inerente à esfera pública é sua ocupação por sujeitos sociais investidos de
representação, que será, tanto mais legítima quanto forem capazes de exercê-la com
autonomia a partir dos interesses sociais que se propõem a representar. Dagnino (2002)
concorre para esse argumento quando diz que enquanto expressão da luta política e da
mobilização da sociedade civil, sob a base de um papel efetivo dos Conselhos Gestores,
faz com que o papel dessas instâncias de controle social da política governamental se
torne efetivamente um espaço de disputa de interesses e projetos políticos diferenciados
e não apenas um espaço de representação virtual da sociedade civil.
88 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
A Constituição para a efetivação dessa concepção, introduziu dispositivos
para descentralizar o poder federal e para a democratização das políticas no sentido
de criação de um novo pacto federativo, sendo o município reconhecido como ente
autônomo da federação, transferindo-se para o âmbito local, novas competências e
recursos públicos capazes de fortalecer o controle social e a participação da
sociedade civil. O controle social como direito conquistado pela Constituição Federal
pretende ampliar a democracia representativa para a democracia participativa de
base. Estão previstas duas instâncias de participação nas políticas sociais: os
conselhos e as conferências (Para reforçar o argumento de que os conselhos são
espaços de luta e confronto entre projetos societários antagônicos, é Bravo (2009)
que destaca que a democracia representativa é uma vitória dos movimentos
organizados da sociedade, mas parcial, uma vez que na sociedade capitalista existe
o domínio da classe capitalista, havendo limite interno, pois as principais decisões
econômicas são tomadas pelo poder privado). Sendo assim os conselhos devem ser
visualizados como lugar do fazer político, como espaços contraditórios, orientado
pela democracia participativa.
Referências
CARVALHO, Antonio Ivo de. Conselhos de Saúde no Brasil: participação cidadã e controle social. Rio de Janeiro: Fase/Ibam, 1995. DAGNINO, E. Sociedade civil e espaços públicos no Brasil. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002. IAMAMOTO, M. V. O Serviço Social na cena contemporânea. In: CEFSS e ABEPSS, Serviço Social: direitos sociais e competências profissionais. Brasília, 2009. PEREIRA, Potyara A. P. A Assistência na Perspectiva dos direitos: crítica aos padrões dominantes de proteção aos pobres no Brasil. Brasília: Thesaurus, 1996. RAICHELIS, R. Democratizar a Gestão Pública das Políticas Sociais: um desafio a ser enfrentado pela sociedade civil. Disponível em: www.fnepas.org.br/pdf/servico_social_saude/texto1 Acesso em 5/5/2010. SOUZA, O. Rodriane. Participação e controle social. In: SALES, M.A; MATOS, M. C.; LEAL, M. C. (orgs) Política social, família e juventude: uma questão de direitos. São Paulo: Cortez, 2004. YASBECK, M. C. Classes Subalternas e Assistência Social. 3ª ed. São Paulo: Cortez, 1993.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 89
QUESTÃO 30
O Artigo 5º, inciso 4º da Lei de Regulamentação da profissão reza: “realizar vistorias,
perícias técnicas, laudos periciais, informações e pareceres sobre a matéria de
Serviço Social”. Pode-se, pois, inferir que esses procedimentos privativos
(A) obrigam os Assistentes Sociais a realizá-los somente após aprovação dos empregadores.
(B) podem ser realizados por outros profissionais, desde que autorizados por Assistentes Sociais.
(C) estão reservados exclusivamente a profissionais que prestaram concurso público.
(D) são cabíveis, apenas, para Assistentes Sociais graduados em universidades públicas.
(E) devem ser realizados, apenas por Assistentes Sociais no pleno exercício profissional.
Gabarito: Questão E
Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da resposta correta. Conteúdo avaliado: Lei de Regulamentação da Profissão e Documentos do CFESS
Autora: Márcia Salete Arruda Faustini e Francisco Arseli kern
Comentário: A alternativa correta é a (E). Devem ser realizados, apenas por Assistentes
Sociais no pleno exercício profissional.
Nessa questão estaremos a discutir alguns elementos que compõe a Lei de
Regulamentação da Profissão nº. 8.662/93. Ela irá dispor da regulamentação do
livre exercício da profissão de Assistente Social em todo o território, demarcando
que esse exercício só poderá ser executado por possuidores de diploma em curso
de graduação em Serviço Social, oficialmente reconhecido, e que somente podem
exercer a profissão aqueles profissionais, regularmente registrados, em seus
Conselhos Regionais, sendo que a designação profissional de Assistente Social é
privativa dos habilitados na forma da legislação vigente. (Lei 8.662/93).
A Lei de Regulamentação apresenta, em seus artigos 4º e 5º, elementos
de indicação acerca das Competências e Atribuições Privativas Profissionais dos
Assistentes Sociais. Cabe destacar a concretude dessa discussão profissional
90 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
que é vivida, cotidianamente, nos espaços de trabalho, a fim de clarear, delimitar
e exercer a construção de conhecimentos, proposições e intervenções
profissionais, eticamente responsáveis, e coadunadas com um trabalho
profissional responsável que, inserido num contexto de profundas e rápidas
transformações sociais, possa ser elemento de reflexão e orientação ao
exercício profissional.
Uma discussão importante sobre questões e debates referentes a
competências e atribuições privativas do assistente social está na obra publicada
pelo CFESS (2002): Atribuições Privativas do Assistente Social em Questão.
Nela, elementos fundamentais à fiscalização profissional, que dizem respeito a
identidade profissional são problematizados, a partir de uma sondagem junto aos
CRESS e ABEPSS que indicou uma discussão significativa, afirmando que As preocupações predominantes confirmam que a discussão não aponta para a revisão da Lei, uma vez que dela não se repreende qualquer incorreção, mas, apenas, aprimorar a reflexão sobre o fazer profissional[...] (CFESS, 2002, p.6).
A questão, acima referida, compõe o artigo 5º, da Lei supracitada. Ela traz,
em si, uma questão fundamental para ser discutida: refere que é atribuição privativa
do assistente social realizar vistorias, perícias técnicas, laudos periciais, informações
e pareceres e, especifica, que estas, referem-se sobre a matéria de Serviço Social
(grifo nosso).
A discussão aponta então para a questão da matéria de Serviço Social. Poderíamos, simplesmente, referir que as atividades acima descritas se
tornam atribuições privativas quando incidem sobre o objeto profissional – sendo
“matéria” – o objeto profissional. Entretanto, nos parece que essa questão exige um
certo aprofundamento reflexivo, tanto que na obra, anteriormente, referida ( CFESS,
2002), há uma discussão realizada por Iamamoto sobre “A questão social como
‘matéria’ do Serviço Social”.
Quando falamos em “competência”, estamos a nos referir a algo que nos
compete, que podemos realizar, temos competência para tal, mas, outros
profissionais também o podem. Entretanto, ao nos referirmos sobre “atribuições
privativas” entramos num terreno particularizado, que diz respeito a algo que nos é
privativo. Por exemplo: a pesquisa é algo para a qual temos competência, ou seja,
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 91
podemos realizar, pois estamos equipados com saberes, conhecimentos,
instrumental, para tal. Entretanto, outras áreas também podem estar equipadas, e
podem atuar nesse campo de trabalho. Já, para realizar o laudo social, por exemplo,
exige que tenhamos conhecimentos específicos para compreender determinações e
possibilidades que estão dando visibilidade a expressões da questão social sobre o
qual o trabalho do Assistente Social está a incidir. Exige, então, conhecimentos
específicos para captar a realidade, habilidades específicas no manejo de
instrumentos, saberes teóricos e metodológicos que reafirmem o sentido ético na
intervenção, clareza política nas mediações que estão sendo acionadas na
realização desse trabalho.
Entretanto, ao assumir a “matéria” do Serviço Social como objeto, estamos
diante de algo bastante complexo: a questão social na contemporaneidade.
A questão social, como vai referir Iamamoto (2002, p.26), expressa [...] desigualdades econômicas, políticas, culturais das classes sociais, mediatizadas por disparidades nas relações de gênero, características étnico-raciais e formações regionais, colocando em causa amplos segmentos da sociedade civil no acesso aos bens da civilização. Dispondo de uma dimensão estrutural, ela atinge visceralmente a vida dos sujeitos numa luta aberta e surda pela cidadania (Iani,1992), no embate pelo respeito aos direitos civis, sociais e políticos e aos direitos humanos.
Assim, a perspectiva de lidar com a matéria do Serviço Social no tempo
presente, traz a mesma complexidade que diz respeito a lidar com nosso objeto de
intervenção. Como estamos concebendo, apreendendo e lidando com a questão
social e suas expressões, numa “profissão que é historicamente determinada, isto
é, construída no seio de relações sociais mais amplas”, como destacam Brites e
Sales (2000, p.21).
Nesse sentido, a contemporaneidade, no processo de produção e reprodução
das relações sociais, se vê marcada por profundas e radicais transformações. As
crises do sistema capitalista imputam novas formas de organização da vida social; a
reestruturação produtiva impacta nas formas de organizar e gerenciar do capital; as
mudanças significativas na relação Estado-sociedade civil, ancoradas na lógica
neoliberal. Mudanças importantes que impactam na economia e na política, mas
também nas formas de sociabilidade. (Iamamoto, 2002).
92 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
Todos esses elementos desdobram-se em impactos no cotidiano do trabalho
de várias profissões. A reestruturação produtiva que atende a preceitos neoliberais
condiciona a redefinição de espaços e possibilidades de inserção profissional; a
progressiva mercantilização do atendimento das necessidades sociais, que
acompanham a privatização das políticas sociais (op. Cit., p.36) vão rebater
profundamente na concepção e no acesso dos serviços sociais que [...]deixam de expressar direitos sociais, metamorfoseando-se em atividade de outra natureza, inscrita no circuito de compra e venda de mercadorias, em detrimento dos direitos sociais de cidadania que, em sua necessária dimensão de universalidade, requer a ingerência do Estado (idem).
A criminalização, a moralização, a fragmentação da questão social são
elementos importantes como desdobramentos desse contexto. A questão social que
nasce imbricada “na própria natureza das questões sociais capitalistas”, apresenta
hoje, “novas roupagens, novas expressões em decorrência dos processos históricos
que a dimensionam na atualidade, aprofundando suas contradições.” (ibidem, p.28).
Isso significa que a matéria do Serviço Social, está a sofrer profundas
reconfigurações. E está a exigir dos profissionais uma vigilância crítica no sentido da
apreensão nos diferentes espaços de trabalho, da identidade comum de suas
diversas expressões.
Sendo assim, a questão de origem deste texto (o Artigo 5º, inciso 4º da Lei
de Regulamentação da profissão que refere “realizar vistorias, perícias técnicas,
laudos periciais, informações e pareceres sobre a matéria de Serviço Social [...]
devem ser realizados, apenas, por Assistentes Sociais no pleno exercício
profissional”) reforça a importância do sentido do trabalho ser bem apropriado
pelos assistentes sociais, pois só ele(a) poderá realizar as atividades acima
descritas e seu conteúdo deve ser pleno de direção ética, claro, teoricamente,
competente, metodologicamente, e capaz de articular elementos técnicos e
políticos para a garantia da direção social profissional.
Nesse contexto o Projeto Ético-Político, coletivamente, construído nas últimas
décadas, e que se vê expresso no Código de Ética Profissional (1993), na Lei de
Regulamentação da Profissão (1993) e nas Diretrizes Curriculares (1996), reafirma a
direção social do trabalho profissional no sentido de enfrentamento a questão social
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 93
em suas expressões cotidianas, que articulem a luta pela defesa de direitos num
tempo em que os mesmos são cotidianamente ameaçados no mundo do trabalho.
Essa atribuição privativa nos convoca a responsabilidades do trabalho profissional,
num contexto contraditório, que superem mecanismos que reforçam a exclusão, os
individualismos, e a mistificação das relações sociais.
As alternativas (A), (B), (C) e (D) não respondem a questão enunciada, à
medida que, suas afirmações não guardam coerência com o enunciado: a atribuição
privativa do Assistente Social não pode ser determinada pelo empregador; o
Assistente Social não tem ingerência para designar outros profissionais a
atividades especificas; qualquer espaço profissional pode demandar vistorias,
perícias técnicas, laudos periciais, informações e pareceres; qualquer profissional
graduado regularmente tem os mesmos direitos e deveres.
Referências
ABESS/CEDEPSS. Proposta básica para o projeto de formação profisssional. In: Revista Serviço Social e Sociedade: o serviço social no século XXI. São Paulo: Cortez, ano XVII, nº 50, p.143-171, abril. 1996. BRASIL. Lei de Regulamentação da Profissão de Assistente Social. Lei nº. 8.662/93. BRITES, Cristina e SALES, Mione. Ética e Práxis Profissional. 2ª.ed. Brasília: CFESS, 2000. CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. Código de Ética do Assistente Social. Brasília, 1993. CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. Atribuições Privativas do Assistente Social em questão. Brasília: CFESS, fev.2002. IAMAMOTO, Marilda. Projeto Profissional. Espaços ocupacionais e trabalho do assistente social na atualidade. In: CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL. Atribuições Privativas do Assistente Social em questão. Brasília: CFESS, fev.2002. p.13-49.
94 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 31
O ECA, no seu artigo 121, indica que a internação constitui-se em medida privativa
de liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à
condição peculiar de pessoa em desenvolvimento. Nesse sentido, ao elaborar um
estudo social, cabe ao assistente social que trabalha com um adolescente:
I − indicar medidas que o punam de forma correta;
II − preservar a sua permanência próximo à sua família;
III − garantir a preservação dos seus direitos sociais;
IV − indicar plano de trabalho durante a sua permanência na Instituição
V − monitorar o trabalho de outros técnicos. São corretos apenas os itens:
(A) I, II e III.
(B) II, III, IV.
(C) II, IV e V.
(D) III, IV e V.
(E) I, II, III e IV.
Gabarito: Questão B
Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da resposta correta. Conteúdo avaliado: Direitos da Infância e Juventude Autora: Patricia Krieger Grossi
Comentário: Alternativa A: a questão A está incorreta, pois o estudo social não visa
“indicar medidas que punam o adolescente de forma correta”, pois o objetivo da
medida socioeducativa é a reinserção social do adolescente e a responsabilização
pelo ato infracional praticado e não a mera punição, dentro da lógica retributiva do
sistema de justiça (item I).
Alternativa B: A questão correta é a Alternativa B, pois o estudo social
elaborado pelo assistente social que trabalha com adolescentes em conflito com a lei
busca analisar a situação familiar para que essa família participe do processo de
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 95
execução de medida socioeducativa de privação de liberdade. Os vínculos familiares
devem ser preservados e fortalecidos durante o processo de internação do
adolescente em conflito com a lei para que este possa ter garantido o direito à
convivência familiar e comunitária. Está previsto no ECA (art.94), entre as obrigações
das entidades de privação de liberdade, “diligenciar no sentido do restabelecimento e
da preservação de seus vínculos familiares”. Entre as atribuições do assistente social
que intervém com essa demanda, encontra-se a elaboração de um plano de
atendimento individualizado para cada adolescente que está cumprindo medida com o
objetivo de estabelecer ações, visando a autonomia, responsabilidade e novo projeto
de vida. Na Fundação de Atendimento Sócio-educativo de Porto Alegre (FASE), por
exemplo, esse plano é conhecido por PIA (Plano Individualizado de Atendimento).
Em relação às preservações dos direitos sociais dos adolescentes, mesmo
privados de liberdade, estes têm direito a condições adequadas de habitabilidade,
educação, atividades culturais, esportivas e de lazer, assistência religiosa àqueles
que desejarem, segurança, cuidados médicos, psicológicos, odontológicos,
farmacêuticos, higiene, vestuário e alimentação adequadas. Esses direitos sociais
devem ser garantidos, atendendo à condição peculiar de desenvolvimento do
adolescente e na perspectiva de sujeito de direitos, conforme estabelece os
parâmetros do SINASE (Sistema Nacional de Atendimento Sócio-educativo).
Alternativa C: Essa alternativa está incorreta, pois não cabe ao assistente
social monitorar o trabalho de outros técnicos (ref. Item 5). O assistente social
trabalha em equipe interdisciplinar, no sentido de estabelecer objetivos comuns em
relação ao plano de atendimento ao adolescente, dentro da especificidade de cada
profissional.
Alternativa D: Está incorreta, pois o item 5 não procede (vide explicação
acima).
Alternativa E: está incorreta, pois o item 1 não procede, pois a medida
privativa de liberdade não tem o caráter punitivo e sim um caráter socioeducativo.
Referências
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº. 8.068/90. BRASIL. Sistema Nacional de Atendimento Sócio-educativo. SINASE. Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Brasília: DF: CONANDA, 2006.
96 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 32
Nas Diretrizes Gerais para o Curso de Serviço Social, aprovadas pela Assembléia
Nacional da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social, em
1996, as múltiplas expressões da “questão social” figuram como objeto de trabalho
do Assistente Social, nas mais variadas dimensões da realidade social. A realização
de estudos socioeconômicos, de acordo com o que postulam as diretrizes, orienta-
se por uma perspectiva teórico-metodológica crítica. À luz da orientação teórica
adotada pelas Diretrizes, seria legítimo sustentar que a direção social dos estudos
socioeconômicos deve ser parametrizada pela perspectiva
(A) da desintegração familiar e comunitária. (B) da disfunção social de indivíduos e grupos. (C) da má distribuição de renda. (D) da exclusão social. (E) das desigualdades criadas pela sociedade capitalista. Gabarito: Questão E Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da resposta INCORRETA.
Conteúdos avaliados: Diretrizes da ABEPSS e Questão Social
Autor: Jane Cruz Prates
Comentário: A questão refere-se às Diretrizes Curriculares para o Curso de Serviço Social,
aprovadas pela ABEPSS, em 1996, quando as múltiplas expressões da questão
social passam a configurar o objeto de trabalho do Assistente Social, nas mais
variadas dimensões da realidade social. A realização de estudos socioeconômicos
orienta-se por uma perspectiva teórico-metodológica crítica. Após essas afirmações
é questionado se à luz da direção teórica, orientada pelas Diretrizes, seria legítimo
sustentar que a direção dos estudos socioeconômicos deve ser parametrizada por
diferentes perspectivas apontadas nas alternativas de reposta.
O documento ABESS/CEDEPS que sistematiza as Diretrizes Curriculares
enfatiza a categoria trabalho e as mediações necessárias para um “atento
deciframento das refrações da questão social no cotidiano da vida social”
(ABESS/CEDEPS, 1996, p.5). Para tanto, a interpretação da dinâmica societária
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 97
deve incluir, segundo o documento: leitura da conjuntura (as mudanças no mundo
do trabalho, a globalização da economia e a política neoliberal), análise institucional,
conhecimento acerca das demandas sociais, da realidade brasileira, das
características dos excluídos e de suas representações, bem como das políticas
sociais, em especial da Política de Assistência Social.
O documento destaca que a questão social se expressa em suas refrações e
que por outro lado os sujeitos engendram formas para o seu enfrentamento. No
entanto, ressalta que “sua gênese está na maneira com que os homens se
organizam para produzir num determinado momento histórico e que tem
continuidade na esfera da reprodução social” (idem p.12). E a produção e
reprodução social, “são movimentos inseparáveis na totalidade concreta de
condições de vida, de cultura e de riqueza.”
Portanto, a abordagem da questão social consiste na apreensão do processo como totalidade, reproduzindo o movimento do real em suas manifestações universais, particulares e singulares, em seus componentes de objetividade e subjetividade, em suas dimensões econômicas, políticas, éticas, ideológicas e culturais, fundamentado em categorias que emanam da teoria crítica (p.12-13).
Diz ainda o documento que [...]a tradição marxista empreende, desde Marx e Engels até os dias de hoje, um esforço explicativo acerca da questão social, já que o que está subjacente às suas manifestações concretas é o processo de acumulação do capital, produzido e reproduzido com a operação da lei do valor, cuja contraface é o crescimento relativo da pauperização (p.13).
A primeira alternativa de resposta afirma que os estudos devem ser
parametrizados pela “desintegração familiar e comunitária”. Essa afirmativa está
pautada numa leitura positivista, que tem por objetivo identificar “situações-
problemas” para intervir no sentido de “adaptar sujeitos e grupos considerados
desintegrados”, além de não representar as mais variadas expressões da questão
social, não reconhece o seu contraponto, os processos de resistência
implementados pelos sujeitos sociais para enfrentar suas repercussões.
É importante destacar que a questão social não resulta “da desintegração
familiar ou comunitária”, mas do conjunto de desigualdades provocadas pelo
98 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
desenvolvimento capitalista que se contrapõe ao trabalho, enquanto expressão e
condição necessária ao desenvolvimento humano, em qualquer forma de sociedade.
Portanto, mesmo desconsiderando processos de desintegração, a avaliação das
condições e modo de vida de famílias e comunidades descontextualizados de uma
leitura mais ampla, que contemple a totalidade, não seriam suficientes para
fundamentar a elaboração dos estudos propostos. Por outro lado análises que
desconsideram as particularidades também não abarcam as múltiplas determinações
que conformam a realidade social. A articulação entre ambas as perspectivas que são
complementares é que possibilitam a elaboração de estudos que efetivamente possam
desvendar a realidade social e sobre ela apresentar estratégias de enfrentamento.
A alternativa B se assemelha a primeira, direcionando o foco de análise a
“disfunções sociais”, portanto orienta-se pela mesma vertente paradigmática
anteriormente pontuada, o que contraria os fundamentos que norteiam as
Diretrizes Curriculares, pautadas nas contribuições da teoria marxiana, como
mencionado anteriormente.
A alternativa C afirma que os estudos socioeconômicos devem ser
parametrizados pela má distribuição de renda. Em que pese ser este um
componente fundamental ao processo de análise, pois a concentração de renda é
uma consequência do modo de produção capitalista, o que contribui sobremaneira
para o acirramento das desigualdades sociais, não é suficiente para explicar as
múltiplas determinações que caracterizam as expressões da questão social.
A pobreza, esclarece Yazbek (2004), “é uma face do descarte de mão de obra
barata que faz parte da expansão capitalista”. O capitalismo contemporâneo com
seus impactos destrutivos traz como marcas à população empobrecida, entre tantas
mazelas, o desemprego, a saúde precária, a moradia insalubre, a alimentação
insuficiente, “os limites da condição de vida dos excluídos e subalternizados [...], o que
também expressa “o quanto a sociedade pode tolerar a pobreza e banalizá-la” (p. 35).
Na mesma perspectiva a resposta D afirma ser a exclusão social o foco de
análise desses processos, também insuficiente para explicitá-lo na medida em que o
capitalismo exclui e inclui precariamente de acordo com suas necessidades e
interesses, mascarando a realidade social e ocultando as mazelas provocadas pelo
seu desenvolvimento.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 99
Por fim, a resposta E afirma que os estudos devem se direcionar ao
desvendamento das desigualdades criadas pela sociedade capitalista. Logo, essa é
a resposta correta na medida em que abarca, tanto aspectos relativos a distribuição
de renda, formas diversas de exclusão e inclusão precária, o acesso limitado ou
interditado a bens e serviços a grandes contingentes populacionais, fragilidades,
violências, entre outras expressões que resultam do binômio exploração-
acumulação que caracterizam o modo de produção capitalista, ampliando
progressivamente as desigualdades sociais que precisam ser desocultadas pelos
estudos socioeconômicos.
Referências
ABESS/CEDEPS – Diretrizes gerais para o Curso de Serviço Social. Rio de Janeiro, novembro, 1996. IAMAMOTO, Marilda. A questão social no capitalismo. Revista Temporalis nº 3, Brasília: ABEPSS, 2004. PEREIRA, Potyara. Questão social, Serviço Social e direitos da Cidadania. In: Revista Temporalis, nº. 3. Brasília: ABEPSS, 2004. YAZBEK, Maria Carmelita. Pobreza e exclusão social: expressões da questão social no Brasil. In: Revista Temporalis, nº 3. Brasília: ABEPSS, 2004.
100 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 33
Nas Varas Especiais destinadas a atender jovens em conflito com a lei, o Assistente
Social é requisitado a realizar estudo social para subsidiar o magistrado na aplicação
de medidas sócio-educativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA). A utilização deste instrumental técnico-operativo privativo do assistente social
deve conter a:
(A) posição imparcial do perito para fornecer informações técnicas estritamente relacionadas com a área do Serviço Social.
(B) defesa juridicamente fundamentada dos direitos dos inúmeros sujeitos envolvidos no caso.
(C) interpretação do profissional sobre o modo pelo qual as “expressões da questão social” rebatem no dia-a-dia dos sujeitos.
(D) análise aprofundada dos fatores psicossociais que contribuíram para a ocorrência do delito.
(E) análise profunda do grau de periculosidade do indivíduo e da possibilidade de reincidência do erro.
Gabarito: Questão C
Tipo de questão: Escolha simples com indicação da resposta correta
Conteúdos avaliados: Direitos da Infância e Juventude
Autor: Patricia Krieger Grossi
Comentário: Resposta A – A resposta A está incorreta, pois o assistente social não é um
profissional neutro. Quando este realiza um estudo social, avalia as condições objetivas
e subjetivas relacionadas à situação investigada, dados do entorno social, composição
e relações familiares, histórico de violência doméstica, uso de drogas, entre outros, na
família, rede de apoio social existente, situação da moradia, situação escolar do
adolescente em conflito com a lei e emite um parecer, com base no qual o juiz irá
proferir uma sentença que irá afetar a vida de um indivíduo. O estudo social caracteriza-
se por ser um trabalho técnico científico de natureza ampla que pode ou não exigir a
perícia social. Para Simões (2006, p.505), a elaboração de um estudo social é uma
tarefa complexa e contraditória e desafia os assistentes sociais, pois não se trata
apenas de emitir um parecer sobre um dado técnico, como acontece em uma perícia da
construção civil, acerca de erros de cálculo na construção de um ponto, mas envolve
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 101
uma teia complexa de relações que exige do profissional do Serviço Social uma
apreciação ético-valorativa da conduta das ações das pessoas envolvidas no processo.
Resposta B – A resposta B está incorreta, pois a defesa juridicamente
fundamentada não é atribuição privativa do assistente social e sim, do profissional
do Direito. Ao realizar o estudo social, o assistente social se baseia no seu Código
de Ética profissional, nas legislações atinentes ao caso e também em fundamentos
especificamente assistenciais (art.203 CF e art.2º LOAS) e eventualmente, se julgar
necessário, poderá sugerir o parecer de outros profissionais da área da Psicologia
ou Direito, entre outros (SIMÕES, 2006).
Resposta C – A resposta C está correta, pois o assistente social, através do
estudo social, identifica as expressões da questão social vivenciadas no cotidiano dos
sujeitos sociais, tais como desemprego, pobreza, drogadição, e de que forma estas
obstaculizam o acesso a determinados bens e serviços sociais e que pode ter
contribuído para a ocorrência do ato infracional, bem como as potencialidades da
família, relações do adolescente com os responsáveis, sentimento de pertença ao
grupo, relações com a comunidade, entre outros aspectos, que podem ser fatores
protetivos e contribuir para a reinserção social do adolescente. O estudo social,
portanto, não é apenas resultado de uma observação passiva de condutas pessoais,
mas também exige uma pesquisa documental, visitas domiciliares a família e
colaterais, entrevistas a fim de examinar concretamente as condições objetivas da
situação para emissão do parecer que irá subsidiar o juiz na sua decisão em relação à
melhor medida a ser aplicada ao adolescente em conflito com a lei.
Resposta D – A resposta D está incorreta, pois não cabe ao assistente social
examinar o grau de periculosidade do adolescente em conflito com a lei, sendo
necessário avaliações neurológicas, psicológicas e psiquiátricas sobre
comportamento antissocial e desvio social, para verificar a existência de psicopatias
que resultam em comportamento violento.
Referências CFESS. O Estudo Social em Perícias, Laudos e Pareceres Técnicos. São Paulo: Cortez, 2005. SIMÕES, Carlos. Curso de Direito do Serviço Social. Biblioteca Básica do Serviço Social. 2ª ed. Revista e atualizada. São Paulo: Cortez, 2006. TÜRCK, Maria da Graça Maurer Gomes. Serviço Social Jurídico: perícia social no contexto da infância e da juventude. São Paulo: Livro Pleno, 2000.
102 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 34 A Constituição de 1988, a contra-reforma do Estado e as mudanças do mundo do
trabalho têm exigido do profissional de serviço social brasileiro novas competências
e habilidades profissionais – dentre elas, a de exercer funções de gestão ou direção
em organizações públicas ou privadas. Isso requer o domínio crítico das teorias
organizacionais e das ferramentas gerenciais, bem como a clareza do significado da
direção estratégica do projeto hegemônico no Serviço Social brasileiro. De acordo
com o código de ética profissional em vigor, o exercício profissional, neste campo e
na perspectiva da defesa e do aprofundamento da democracia, deve buscar:
(A) a projeção de uma nova sociedade sem exploração e desigualdade de classe, gênero e etnia.
(B) a eficácia e eficiência por meio da moderna administração gerencial de resultados.
(C) a atenção às necessidades locais em função da municipalização das políticas públicas.
(D) a defesa da liberdade do mercado como princípio regulador das relações econômicas e sociais.
(E) a satisfação das necessidades e demandas sociais nos limites da ordem política liberal.
Gabarito: Questão A
Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da alternativa correta. Conteúdo avaliado: Gestão, projeto ético-político e código de ética
Autora: Gleny Terezinha Duro Guimarães e Anelise Gronitzki Adam
Comentário: A resposta correta é a letra A: “a projeção de uma nova sociedade sem
exploração e desigualdade de classe, gênero e etnia”, considerando que:
No Código de ética dos assistentes sociais, Resolução CFESS, nº. 273, de 13
de março de 1993, o 8º princípio fundamental é a “opção por um projeto profissional
vinculado ao processo de construção de uma nova ordem societária, sem
dominação, exploração de classe, etnia e gênero” e o 11º princípio determina que o
profissional não deve praticar nenhum tipo de discriminação “[...] por questões de
inserção de classe social, gênero, etnia, religião, nacionalidade, opção sexual, idade
e condição física”. (CRESS, 2009, p. 27).
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 103
Considerando esses dois princípios, o assistente social que assume função de
gestão, seja no âmbito público ou privado, deve ter como premissa uma visão crítica
das ferramentas gerenciais, pois na área da administração, a gestão nem sempre
canaliza seus interesses para uma visão democrática em função de estar a serviço de
empresas/corporações cujo objetivo é o lucro, na perspectiva capitalista, sem
considerar muitas vezes, se existe ou não, a exploração de classe, etnia e gênero.
A forma como as ferramentas gerenciais são utilizadas pelos assistentes
sociais, se diferenciam em função do compromisso com o projeto ético-político
profissional, que coloca acima de tudo o compromisso com a classe trabalhadora a
partir da teoria social crítica, especificamente a teoria marxista, com um
direcionamento ideológico e político, a favor da democracia.
As demais alternativas estão incorretas pelas razões a seguir:
(B) – a eficácia e eficiência por meio da moderna administração gerencial de
resultados.
O modelo de gestão empresarial com pressupostos no modelo taylorista das
teorias organizacionais, busca a eficácia e eficiência por meio da moderna
administração gerencial de resultados, esse tipo de modelo pode ser considerado
como gestão contra o social. A gestão contra o social apresenta-se como estratégia tecnológica e instrumental, viabilizadora da qualificação e eficiência do trabalho e organizações do campo social, afirmadores do capital e não da cidadania. (Maia, 2005, p.2)
O profissional do Serviço Social, comprometido com o código de ética e o
projeto ético-político profissional, defende uma gestão social, que se caracteriza,
segundo Maia (2005), por apresentar valores fundantes na democracia e na
cidadania; pressupõe um conjunto de ações, processos sociais e desenvolvimento
social e o lócus principal são as políticas públicas.
A gestão social e o código de ética profissional defendem a cidadania, ou
seja, no terceiro princípio é auferido que “ampliação e consolidação da cidadania, é
considerada tarefa primordial de toda sociedade, com vistas à garantia dos direitos
civis, sociais e políticos das classes trabalhadoras” (CRESS, 2009, p.26).
(C) – a atenção às necessidades locais em função da municipalização das
políticas públicas.
104 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
Essa alternativa seria correta se a pergunta estivesse direcionada para a
gestão municipal que está detalhada na Política Nacional de Assistência Social/2004
e na Norma Operacional Básica do Sistema Único de Assistência social –
NOB/SUAS. Porém, essa alternativa de resposta se torna incorreta porque se refere
especificamente ao código de ética.
Sob o prisma do SUAS, a municipalização das políticas públicas em
decorrência do processo de descentralização, tem se efetivado como elemento
básico da democracia, a chamada “democracia de base territorial” (Arretche, 2008).
Exemplo desse processo é o orçamento participativo, protagonizado na cidade de
Porto Alegre e que legitima uma democracia representativa. Numa gestão
democrática, a municipalização propõe aproximar e delegar a população formas de
participação nas políticas públicas seja através do planejamento, do poder de
decisão, do controle social, entre outras. É necessário considerar que os Conselhos
Municipais desempenham um importante papel para implementar e efetivar o
processo da municipalização.
Sob o prisma do código de ética, a opção de resposta “a atenção às
necessidades locais em função da municipalização das políticas públicas” não se
enquadra como correta, pois o Assistente Social, a partir dos princípios da ética
profissional, não deve buscar apenas os interesses locais. Mas sim, deve ter,
conforme apregoa o quinto princípio, um “posicionamento em favor da equidade e
justiça social, que assegure universalidade de acesso aos bens e serviços relativos
aos programas e políticas sociais, bem como sua gestão democrática” (CRESS,
2009, p.27). Nesse sentido, o código de ética direciona para questões universais e
não municipais.
(D) – a defesa da liberdade do mercado como princípio regulador das
relações econômicas e sociais.
A defesa da liberdade de mercado é pressuposto da lógica neoliberal,
desencadeada a partir dos anos 70, com o advento da reestruturação produtiva
do mercado globalizado, através da livre circulação das mercadorias, enfim, de
um novo modelo que pudesse manter a primazia do capital. O “pacote” neoliberal
se caracteriza pelo modelo de produção toyotista (acumulação flexível) e pelas
novas configurações das relações de trabalho, que passam pela
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 105
desregulamentação dos direitos sociais, precarização das condições de trabalho,
tercerização, flexibilização na produção, inovação tecnológica, enfraquecimento
das organizações sindicais, etc. As consequências maléficas do pacote neoliberal
atingem diretamente os trabalhadores, acirrando as expressões da questão social
através da desigualdade social, exploração do trabalhador, violência,
desemprego estrutural, etc.
A defesa da liberdade enquanto projeto ético-político é o primeiro princípio do
código de ética, que considera o “reconhecimento da liberdade como valor ético
central e das demandas políticas a ela inerentes: autonomia, emancipação e plena
expansão dos indivíduos sociais. (CRESS, 2009,26). Portanto, esse princípio não
ocorre no âmbito da liberdade do mercado como princípio regulador das relações
econômicas e sociais, pois o Serviço Social defende um projeto societário, no âmbito
coletivo, cujo projeto profissional se vincula a um projeto societário que propõe a construção de uma nova ordem social, sem exploração/dominação de classe, etnia e gênero. A partir destas opções que o fundamentam, tal projeto afirma a defesa intransigente dos direitos humanos e o repúdio do arbítrio e dos preconceitos, contemplando positivamente o pluralismo, tanto na sociedade como no exercício profissional (Neto, 2010).
(E) – a satisfação das necessidades e demandas sociais nos limites da ordem
política liberal.
O projeto ético-político profissional está na contramão do liberalismo. Esse
busca a satisfação das necessidades dos trabalhadores e as demandas sociais são
atendidas, desde que se enquadrem nos limites do individualismo. Segundo Vieira,
“o pensamento liberal consagra as liberdades individuais, a liberdade de empresa, a
liberdade de contrato, sob a égide do racionalismo, do individualismo e do não-
intervencionismo estatal na esfera econômica e social” (2004, p. 186).
O segundo princípio do código de ética determina que o profissional esteja na
“defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e do autoritarismo”,
bem como a “defesa do aprofundamento da democracia, enquanto socialização da
participação política e da riqueza socialmente produzida”. (CRESS, 2009, p.27). O
Serviço Social não compactua com a ordem política liberal.
106 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
Referências
ARRETCHE, Marta. Mito da descentralização: mais democracia e eficiência nas políticas públicas? Disponível em http://www4.fct.unesp.br/grupos/gedra/textos/Texto2_2008_MITOS%20DA%20DESCENTRALIZ.pdf. Acessado em 2/5/2010 CRESS – CONSELHO REGIONAL DE SERVIÇO SOCIAL 10º REGIÃO (org). Coletânea de Leis. Porto Alegre: Dacasa e Palmarinca, 2009. NETTO, José Paulo. A construção do projeto ético-político do serviço social. Disponível em: http://www.cpihts.com/PDF03/jose%20paulo%20netto.pdf. Acessado no dia 1º/5/2010. VIEIRA, Evaldo. Os Direitos e a Política Social. São Paulo: Cortez, 2004. MAIA, Marilene. Gestão Social – Reconhecendo e construindo referenciais. In: Revista Virtual Textos & Contextos, nº 4, dez. 2005. Disponível em: http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fass/article/viewFile/1010/790. Acessado no dia 1º/5/2010.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 107
QUESTÃO 35
O Sistema Único da Assistência Social (SUAS) requer, no campo da gestão, uma
atividade permanente de monitoramento e avaliação. O assistente social, também
no exercício da gestão, deve garantir os princípios fundamentais do seu código de
ética – dentre os quais o compromisso com a qualidade dos serviços prestados à
população. Em cada um dos cinco itens abaixo estão indicadas condições que
pretendem corresponder a este princípio.
I − Garantia da atuação de equipes interdisciplinares nos espaços profissionais.
II − Informações orçamentárias socializadas entre gestores, técnicos e usuários.
III − Elaboração de relatórios sistemáticos de avaliação dos serviços, programas e projetos sociais.
IV − Construção de indicadores capazes de expressar as desigualdades de classes.
V − Articulação de rede socioassistencial, ampliando a cobertura dos serviços. Correspondem ao princípio referido as condições
(A) II e V, apenas.
(B) III e V, apenas.
(C) I, II e III, apenas.
(D) I, II e IV, apenas.
(E) I, II, III, IV e V.
Gabarito: Questão E Tipo de questão: Escolha combinada com indicação da resposta correta Conteúdos avaliados: Gestão no SUAS e Código de Ética Autora: Gleny Terezinha Duro Guimarães e Anelise Gronitzki Adam
Comentário: A resposta correta é a letra E: “I, II, III, IV e V”, considerando que:
O Sistema Único de Assistência Social (SUAS) corresponde à política pública
que visa contribuir para efetivar os direitos sociais das populações que mais sofrem
com as desigualdades sociais geradas pelo sistema econômico vigente. O
assistente social possui uma formação acadêmica voltada para, não só
108 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
compreender e analisar essa dinâmica social geradora de desigualdades, mas
fundamentalmente, para intervir nessas realidades de maneira propositiva. A
garantia de acesso aos direitos, principalmente aos direitos sociais, é para esse
profissional uma forma motriz em sua atuação. Todo o sistema de gestão, de
gerenciamento, avaliação e monitoramento dessa política vai ao encontro das
afirmações propositivas do código de ética do assistente social. A formação
acadêmica desse profissional visa, também, qualificá-lo para assumir cargos de
gestão no Sistema Único de Assistência Social – SUAS.
A implementação do SUAS, em todos os municípios do país, requer o
trabalho de inúmeros técnicos com competências das mais variadas. Contudo, a
compreensão da finalidade dessa política pública, não deve se restringir aos
trabalhadores sociais, devendo se estender aos serviços de toda a sociedade. Para
que os objetivos dessa política, que é atender a quem dela precisar, seja alcançado
está previsto a sua avaliação e monitoramento constantes. O assistente social deve
estar capacitado para ocupar as mais variadas áreas de gestão dentro desse
sistema de atendimento à população.
O assistente social, utilizando as suas competências teórico-metodológica,
técnico-operativa e ético-política, possui um diferencial no mercado de trabalho para
ocupar os cargos de gestão dessa política pública e de acordo com as diretrizes do
SUAS, cinco princípios indicam essa condição de gestão, a saber:
Alternativa I – Garantia da atuação de equipes interdisciplinares nos espaços
profissionais;
A complexa dinâmica das relações humanas de trabalho requer dos
profissionais conhecimentos cada vez mais específicos de suas áreas e, ao mesmo
tempo, interação e atualização com os conhecimentos de outras áreas. No capítulo
III – Das Relações com Assistentes Sociais e Outros Profissionais, o art. 10º aufere
como dever do assistente social: “incentivar, sempre que possível, a prática
profissional interdisciplinar”. Esse direcionamento demonstra que, ao se trabalhar
com o social, ou seja, com o ser humano em sociedade, torna-se praticamente
impossível dividi-lo em partes e obter resultados satisfatórios. O profissional sabe
que, se o objetivo for a totalidade dos sujeitos e um atendimento qualificado, a
interdisciplinaridade torna-se fundamental. (CRESS, 2009, p.32).
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 109
O atendimento no SUAS está dividido em baixa, média e alta complexidade,
de acordo com o grau de vulnerabilidade e risco dos seus usuários e comunidades.
No entanto, está previsto que os gestores em todos os equipamentos devem possuir
equipes multidisciplinares – havendo profissionais de áreas distintas para atenderem
à população. O desafio dessas equipes será a conquista de um trabalho
interdisciplinar que garanta qualidade nos atendimentos e na atuação de cada
espaço profissional.
Alternativa II – Informações orçamentárias socializadas entre gestores,
técnicos e usuários;
Outro princípio, não menos importante que o anterior, direciona ao
profissional de serviço social, através de seu código de ética, a socialização e a
democratização das informações referentes à gestão. No artigo 8º do código de
ética, como dever do assistente social, consta “empregar com transparência as
verbas sob a sua responsabilidade, de acordo com os interesses e necessidades
coletivas dos usuários” (CRESS, 2009, p.30). Em uma gestão democrática em que
as decisões e informações são socializadas entre os técnicos, gestores e usuários
as chances de protagonismo da população usuária é muito maior. O tripé –
consciência, liberdade e responsabilidade – também é fomentado e tende a surgir,
como consequência, o fortalecimento da participação da comunidade envolvida
justamente pelo sentimento de pertencimento.
Para o desenvolvimento e gestão dos Centros de Referência de Assistência
Social – CRAS e Centro de Referência Especializada de Assistência Social –
CREAS, é necessário uma gestão nos moldes e princípios democráticos e,
principalmente, com a participação da comunidade é, sem dúvida, o objetivo dessa
política. O profissional do serviço social já tem, no projeto pedagógico de sua
formação, o comprometimento com essa forma de gestão participativa.
Alternativa III – Elaboração de relatórios sistemáticos de avaliação dos
serviços, programas e projetos sociais;
A fim de cumprir as providências exigidas pela Norma Operacional Básica do
SUAS, o gestor deve estar capacitado para a elaboração constante e sistemática de
avaliação de todos os serviços oferecidos à população, bem como dos programas e
dos projetos sociais que permeiam os trabalhos dos profissionais ligados à política.
110 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
Somente com esse instrumento, de fundamental importância, será possível
mensurar e avaliar as rotas da política.
A implementação em todas as regiões do país traz uma dimensão continental
ao SUAS. Assim como o Sistema Único de Saúde – SUS – brasileiro, tornou-se
referência para diversos outros países pelo mundo afora, o SUAS tende a seguir o
mesmo destino. No entanto, a implantação de uma rotina sistemática de produção
dos relatórios de acompanhamento é essencial para a efetividade desse sistema
inovador e ousado.
Alternativa IV – Construção de indicadores capazes de expressar as
desigualdades de classes;
No processo de gestão é necessário avaliar os resultados previstos em cada
ação e no SUAS está previsto uma gestão da informação, monitoramento e
avaliação, dentre os quais é importante construir indicadores capazes de expressar
as desigualdades sociais. Porém, na área social alguns conceitos são abstratos para
serem avaliados e quantificados, pois são expressões da questão social, tais como:
desigualdade social, exclusão social, qualidade de vida, etc. Os indicadores sociais
foram criados para mensurar esse tipo de conceito. [...] os indicadores sociais se prestam a subsidiar as atividades de planejamento público e formulação de políticas sociais nas diferentes esferas de governo, possibilitam o monitoramento das condições de vida e bem-estar da população por parte do poder público e sociedade civil [...] (Jannuzzi, 2004, p.15).
Vários são os tipos de indicadores sociais que expressam as desigualdades
sociais, tais como: demográficos e de saúde; educacionais e culturais; mercado de
trabalho; habitacionais e de infraestrutura urbana; qualidade de vida e meio
ambiente; políticas sociais e de opinião pública; desenvolvimento e pobreza
humana; renda e pobreza.
No que diz respeito ao SUAS a gestão da informação, monitoramento e
avaliação, são imprescindíveis para se efetivar e manter as ações de gestão. As
informações são asseguradas pela REDE-SUAS, na qual se destaca entre outros
itens, o Cadastro Único e o SUAS-WEB.
Alternativa V – Articulação de rede socioassistencial, ampliando a cobertura
dos serviços.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 111
A rede socioassistencial é um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, que ofertam e operam benefícios, serviços, programas, e projetos, o que supõe a articulação entre todas estas unidades de provisão de proteção social, sob a hierarquia de básica e especial e ainda por níveis de complexidade. (Brasil, PNAS, 2005, p. 94)
De acordo com as diretrizes do SUAS, é imprescindível que ocorra ações
para que uma rede socioassistencial seja articulada. Os gestores, tanto da Proteção
Básica quanto da Proteção Especial, implementam essa rede através das
organizações governamentais e parcerias com entidades de Assistência Social
devidamente inscritas no Conselho de Assistência Social.
O trabalho em rede não é algo novo para o assistente social. Articular ações
de outros atores sociais sejam eles: profissionais, instituições ou até pessoas da
comunidade, em busca de atendimento às demandas sociais e institucionais, é algo
que faz parte do cotidiano profissional. Está ligado à suas competências e
atribuições profissionais.
Portanto, é possível afirmar, sem dúvida alguma, que o profissional assistente
social possui competência para trabalhar, nos mais variados níveis de gestão,
previstos no SUAS.
Referências
CRESS – CONSELHO REGIONAL DE SERVIÇO SOCIAL 10º REGIÃO (org). Coletânea de Leis. Porto Alegre: Dacasa e Palmarinca, 2009. JANNUZZI, Paulo de Martino. Indicadores sociais no Brasil: conceitos de estudos socioeconômicos. 3ª. ed. Campinas, São Paulo: Alínea, 2004. Brasil. Política Nacional de assistência Social PNAS/2004 e Norma Operacional Básica NOB/SUAS. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e Secretaria Nacional de Assistência Social, 2005.
112 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 36
Reconhece-se atualmente o papel pedagógico que o supervisor de campo tem na
formação de futuros assistentes sociais empenhados na defesa de direitos. Essa
defesa se traduz pelo compromisso profissional com:
(A) a preservação do bem comum e dos direitos vigentes relativos à propriedade. (B) a elevação da auto-stima dos indivíduos na perspectiva de defesa do
individualismo. (C) o desenvolvimento solidário do país e a preservação da ordem e do bem
comum. (D) o posicionamento em favor da equidade e da justiça social. (E) o respeito à dignidade da pessoa humana, considerada abstratamente. Gabarito: Questão D
Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da resposta correta.
Conteúdo avaliado: o compromisso ético-político do assistente social no exercício
profissional.
Autora: Alzira Maria Baptista Lewgoy
Comentário: A questão 36 apresenta como conteúdo o compromisso profissional vinculado à
defesa de direitos, postura que estabelece uma articulação com o Código de Ética
Profissional (1993), alicerce fundante do projeto ético-político, no qual há a prescrição
de direitos e deveres do assistente social, segundo princípios e valores radicalmente
humanistas, que fundamentam o exercício profissional. Evidencia, ainda, que esse
compromisso está relacionado com o papel pedagógico do supervisor de campo
nesse processo de formação com os futuros assistentes sociais. A alternativa que
melhor corresponde é a D, pela relação e pelo posicionamento em favor da equidade e da justiça social, o que implica a universalidade no acesso a bens e
serviços relativos aos programas e políticas sociais, bem como sua gestão
democrática. Além desse, outros princípios ainda se destacam: o reconhecimento da
liberdade como valor ético central, o que requer o reconhecimento da autonomia,
emancipação e plena expansão dos indivíduos sociais e de seus direitos; a defesa
intransigente dos direitos humanos contra todo tipo de arbitrariedade e autoritarismo; a
defesa, o aprofundamento e a consolidação da cidadania e da democracia, entendida
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 113
como socialização da participação política, da cultura e da riqueza produzida; o
empenho pela eliminação de todas as formas de preconceito e pela garantia do
pluralismo; e o compromisso com a qualidade dos serviços prestados na articulação
com outros profissionais e trabalhadores (CFESS, 2004).
A efetivação desses princípios remete à luta por direitos no campo
democrático popular que acumule forças políticas, base organizativa e conquistas
materiais e sociais capazes de dinamizar a luta contra-hegemônica no horizonte de
uma nova ordem societária, em que o homem seja a medida de todas as coisas. E
os princípios éticos, ao impregnarem o exercício cotidiano, indicam um novo modo
de operar o trabalho profissional, estabelecendo balizas para a sua condução nas
condições e relações de trabalho em que é exercido e nas expressões coletivas da
categoria profissional na sociedade.
Nessa direção, o aparato legal e institucional norteará a intervenção
profissional do supervisor não só do ponto de vista prescritivo, legal, mas também do
ponto de vista pedagógico pela dimensão teórico-ético-política. Essa dimensão
oferece pressupostos para as atividades operativas dos estagiários nas
organizações, direcionando, assim, as competências e habilidades à compreensão
de que o técnico e político são dimensões tratadas de forma unívoca. A Lei nº.
8.662/93 e o Código de Ética Profissional (1993), que dispõem sobre a profissão do
assistente social, são instrumentos imprescindíveis a serem vivenciados diariamente
nos espaços de trabalho (LEWGOY, 2009).
Desse modo, a alternativa A, a preservação do bem comum e dos direitos vigentes relativos à propriedade, apesar de ser um direito fundamental, conforme
o art. 5º da Constituição brasileira de 1988 que arrola a propriedade no conjunto dos
direitos e deveres individuais e coletivos – sendo hoje que a função social é parte
integrante do conceito de propriedade – não se constitui como compromisso
profissional do assistente social, tendo em vista que a perspectiva contida na
resposta A remete a uma compreensão abstrata de propriedade, podendo-se inferir
uma defesa da propriedade privada e consequentemente a defesa de um projeto
societário contrário ao projeto ético-político.
A alternativa B, a elevação da auto-estima dos indivíduos na perspectiva de defesa do individualismo, também não é uma alternativa correta, tendo em
114 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
vista que o Serviço Social brasileiro, nas últimas décadas, redimensionou-se num
forte embate contra o tradicionalismo profissional e seu lastro conservador,
adequando criticamente a profissão às exigências do seu tempo, qualificando-a
teoricamente e fazendo um radical giro na sua dimensão ética e no debate nesse
plano, posicionando-se na direção de reforçar as lutas coletivas e um projeto
societário justo e igualitário.
A alternativa C, o desenvolvimento solidário do país e a preservação da ordem e do bem comum, e a alternativa E, o respeito à dignidade da pessoa humana, considerada abstratamente, não estão corretas, ainda que essas
questões perpassem o exercício profissional e não sejam totalmente contraditórias
ao exercício profissional, porque esses elementos não são fundantes para a
formação e para o exercício profissional, porque não são valores profissionais em si,
mas devem estar atrelados aos princípios fundamentais e dependem da efetivação
deles. Isso porque considerar tais valores desde uma perspectiva abstrata, não
significa necessariamente considerá-los como inexequíveis, mas sua efetivação será
parcial ou serão desenvolvidos de forma desigual, de acordo com as condições
dadas em cada sociedade e em seu desenvolvimento histórico e social. Assim, essa
abstração pode expressar seu movimento de valorização/desvalorização e a
existência, em dado momento histórico, de condições objetivas desfavoráveis à sua
realização. Nessa perspectiva, permanecem como possibilidades que podem ser
resgatadas pelos homens a partir de uma práxis política que se dirija
teleologicamente à sua realização (BARROCO, 2008).
Referências
BARROCO, Maria Lúcia. Ética e Serviço Social: fundamentos ontológicos. 7ª. ed. São Paulo: Cortez, 2008. ______. Ética: fundamentos sócio-históricos. Coleção biblioteca básica/ serviço social: vol. 4. São Paulo: Cortez, 2008. BONETTI, Dilséa et. al. (Orgs.). Serviço Social e Ética: convite a uma nova práxis. 9ª. ed. São Paulo: Cortez, 2008. CFESS. Conselho Federal de Serviço Social. Código de Ética Profissional aprovado em 15 de março de 1993. In: Coletânea de Leis e Resoluções. Assistente Social: ética e direitos. 4ª. ed. Rio de Janeiro: CRESS, 2004. LEWGOY, Alzira Maria Baptista. Supervisão de estágio em serviço social: desafios para a formação e o exercício profissional. São Paulo: Cortez, 2009.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 115
QUESTÃO 37
O estágio supervisionado é uma dimensão extremamente importante na formação
do assistente social, uma vez que permite ao aluno a identificação com a auto-
imagem de um profissional capaz de compreender o significado sócio-histórico do
Serviço Social, a mediação entre interesses antagônicos de classes em suas
relações com o Estado e as demandas profissionais. Assim, o estágio em Serviço
Social deve ser concebido como espaço de:
(A) cumprimento competente e eficaz das rotinas burocráticas presentes nas instituições.
(B) treinamento competente e eficaz das rotinas burocráticas presentes nas instituições.
(C) substituição de profissionais com vínculo formal por jovens prestadores dos serviços.
(D) articulação entre ensino teórico, pesquisa e formação para o exercício profissional.
(E) aplicação, na realidade institucional, dos componentes teórico-metodológicos. Gabarito: Questão D
Tipo de questão: Escolha simples, com indicação da alternativa correta.
Conteúdo avaliado: Concepção de estágio supervisionado em Serviço Social
Autora: Alzira Maria Baptista Lewgoy
Comentário: Nessa questão é solicitada a escolha da alternativa que melhor expresse a
concepção de estágio supervisionado em Serviço Social. A alternativa correta é a D, “articulação entre ensino teórico, pesquisa e formação para o exercício profissional”. Nela se afirma o significado atribuído contemporaneamente à supervisão e ao
estágio, na medida em que pressupõe o projeto político-pedagógico na realidade
profissional, situando ambos no movimento sócio-histórico do Serviço Social ao
romper com a visão endógena da profissão, com a compreensão de um Serviço
Social voltado para si mesmo, espectro também de ruptura no processo de estágio
supervisionado. Envolve, também, contextualizar as transformações societárias que
vêm ocorrendo na atualidade, de que maneira elas perpassam as ações
profissionais do assistente social e quais as novas mediações para a apreensão das
116 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
demandas colocadas à profissão. Esse cenário nos remete a pensar nas alterações
que se processam no interior de cada profissão, no seu corpo teórico e prático e na sua relação com a sociedade mais ampla.
Esse quadro de profundas modificações traz implicações ao processo de
estágio supervisionado, tendo em vista a sua vinculação à formação e ao projeto ético-
político profissional. Sua gênese data do decênio de 1970, no marco das grandes
mobilizações da classe trabalhadora nos diversos países, constituindo-se no projeto
hegemônico da profissão e tendo como referência o rompimento com a herança
conservadora nela presente. Os aspectos indicativos do atual projeto manifestam os
princípios e compromissos assumidos pela profissão com as transformações da
sociedade. Mantendo em sua estrutura básica os eixos fundamentais, ele é
suficientemente flexível sem se descaracterizar, incorporando novas questões,
assimilando problemáticas diversas, enfrentando desafios emergentes.
Nessa perspectiva, o processo de estágio supervisionado requer pesquisa,
conhecimento da realidade, dos meios e modos de sua utilização, da prática
acumulada em forma de teoria, contribuindo, assim, para o estabelecimento das
finalidades ou para a antecipação dos resultados e dos objetivos que se pretende
atingir. Ao esclarecer os objetivos, indica ações profissionais, as possibilidades e as
forças sociais participantes. Portanto, tem a possibilidade de permitir que na
formação do aluno, futuro assistente social, aprenda os fundamentos de sua
intervenção profissional e que busque, conscientemente, os meios para alterar as
circunstâncias que põem obstáculos à intervenção profissional.
Nessa direção, é imprescindível a compreensão da concepção de estágio
supervisionado como um espaço afirmativo de formação, que tem como matéria-prima
o processo de aprendizagem. Este vai se assegurando diante da intencionalidade, da
orientação, do acompanhamento sistemático e do ensino, na perspectiva de garantir
ao aluno o desenvolvimento das competências profissionais, a capacidade de produzir
conhecimentos sobre a realidade com a qual se defronta no estágio e de intervir nessa
realidade, operando políticas sociais e outros serviços (LEWGOY, 2009).
Dessa forma, está incorreta a alternativa A, quando vincula a concepção do
estágio supervisionado ao cumprimento competente e eficaz das rotinas burocráticas presentes nas instituições, bem como a alternativa B, que a vincula
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 117
ao treinamento competente e eficaz das rotinas burocráticas presentes nas instituições, reduzindo, assim, o estágio a mero momento de execução de tarefas
para a organização, destituído de componentes teórico-investigativos, em que a
questão da instrumentalidade parece divorciada do aspecto teórico-metodológico do
Serviço Social, que fica dissociado do exercício de uma “competência crítica”
(IAMAMOTO, 1998). Tal competência não pode ser confundida com aquela
estabelecida pela burocracia da organização, segundo a linguagem
institucionalmente consentida e autorizada.
Do mesmo modo, a alternativa C está totalmente incorreta quando atrela a
concepção de estágio à substituição dos profissionais com vínculo formal por jovens prestadores dos serviços. O estágio não é um lugar onde o aluno exerce
o papel de substituto do profissional, mas um espaço em que reafirma sua formação,
não numa condição de empregado, mas de estudante estagiário. O Código de Ética,
em seu artigo 4º, trata do exercício ilegal da profissão, inclusive nos casos de
estagiários que exerçam atribuições específicas, em substituição aos profissionais. A
capacitação do aluno para o enfrentamento dos desafios do exercício profissional vai
sendo articulada na concretude do estágio, à medida que ocorre a compreensão da
unidade entre teoria e realidade e o entendimento de que, nele, a condição do aluno
não é a mesma de muitas instituições, que confundem “estágio” com “emprego” e
“estagiários” com “empregados”. Instala-se aí uma ideia distorcida dessa função,
pelo abuso da utilização de estagiários em situações em que o aprendizado nem
sempre está em primeiro plano. A ausência dessa diferenciação causa equívocos no
processo de ensino-aprendizagem, pois se verifica que a tendência é a identificação
do discente como um profissional a mais, não em processo de formação, uma vez
que é utilizado para prestar serviços institucionais, ampliando o quadro técnico das
organizações, com a justificativa de que é remunerado, servindo de mão de obra especializada barata. Esses elementos favorecem o processo de identificação
distorcido, pois a responsabilidade do estagiário é deslocada de um processo
formativo para o compromisso de responder à política institucional como um
funcionário contratado (LEWGOY, 2009). A capacitação do estagiário para o
enfrentamento dos desafios apontados no processo de estágio supervisionado está
relacionada, de forma indissociável, à compreensão de que esse espaço serve de
118 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
conduto para o enfrentamento do cotidiano profissional como processo educativo,
para não reduzir a formação profissional à instrução e ao adestramento de mão de
obra (CATTANI, 2002).
E, por último, também está incorreta a alternativa E, quando conecta a
concepção de estágio à aplicação na realidade institucional dos componentes teórico-metodológicos, tendo em vista que a legitimidade do processo de
construção de conhecimento da realidade não é dada apenas teoricamente, mas
historicamente. Nesse processo de análise e de ação política, os procedimentos
metodológicos não são aplicados, compreendendo-se a metodologia como o conjunto
de estratégias e táticas que incidem sobre o real, transformando-o. Tais bases
possibilitam as construções metodológicas cuja aprendizagem implica investigação e
confronto com a realidade para entender a agudização no campo das relações sociais
e suas contradições na sociedade capitalista. A dimensão teórico-metodológica
consubstancia-se na interlocução entre história, teoria e método, requerendo, para
tanto, conhecimento que apreenda a realidade em seu movimento dialético, no qual e
por meio do qual se engendram como totalidade as relações sociais que configuram a
sociedade. Além disso, o saber-fazer só tem sentido como parte de um corpo teórico,
não como conjunto de regras preestabelecidas para conhecer alguma coisa, porque a
verdade dos fenômenos não está dada; é uma verdade que se constrói na história dos
fenômenos. A competência profissional é elemento transversal e constitutivo da
formação e do exercício profissional, cujo constructo deve viabilizar uma capacidade
teórico-metodológica e ético-política, como requisito fundamental para o exercício de
atividades técnico-operativas (ABESS/CDEPSS, 1996).
Referências
ABESS/CEDEPSS. Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social / Centro de Documentação e Pesquisa em Políticas Sociais e Serviço Social. Proposta básica para o projeto de formação profissional. Serviço Social & Sociedade. nº. 50. São Paulo: Cortez, 1996. p. 143-171. CATTANI, Antonio David (org.). Dicionário crítico sobre trabalho e tecnologia. 4ª. ed. Petrópolis: Vozes, 2002. IAMAMOTO, Marilda Vilela. O serviço social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 2ª. ed. São Paulo: Cortez, 1998. LEWGOY, Alzira Maria Baptista. Supervisão de estágio em serviço social: desafios para a formação e o exercício profissional. São Paulo: Cortez, 2009.
COMPONENTE ESPECÍFICO
QUESTÕES DISCURSIVAS
120 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 38
Considerada como um direito social a assistência social ocupa hoje um espaço
relevante na agenda do Serviço Social brasileiro. Apresente duas razões para
explicar esse fato, analisando a sua procedência. Tipo de questão: Discursiva
Conteúdo avaliado: Fundamentos da política social e Política Nacional De
Assistência Social.
Autora: Maria Beatriz Marazita
Comentário: Segundo Couto (2009), a Assistência Social no Brasil assume caráter de
política pública a partir da Constituição de 1988 ao compor, juntamente com as
políticas de saúde e previdência, o sistema de Seguridade Social brasileiro. Em
1933, é promulgada a lei Orgânica da Assistência Social (LOAS – Lei nº. 8.742).
O artigo 5º da Lei Orgânica põe como exigência o comando único na
formulação da política da assistência social exercido pelo Estado, ao afirmar que
uma das diretrizes é a descentralização político-administrativa e comando único das
ações em cada esfera de governo, com a primazia da responsabilidade do Estado
na condução da política de assistência. Rompendo, assim, com a forma centralizada
no governo federal na execução de programas sociais. Coloca a necessidade da
esfera municipal ser o executor e formulador da política. Introduz como elementos
necessários à municipalização da política a existência de Conselho, do Plano e do
Fundo Municipal de Assistência Social. Associada a esta, coloca como outra
exigência a participação da população no sistema de paridade, evidenciando a sua
responsabilidade no controle das ações em todos os níveis.
A necessidade do aperfeiçoamento na gestão, qualificando a participação na
efetivação do controle social, são temas relevantes para a efetivação da política de
assistência. O controle deve ser exercido pela sociedade em parceria com o Estado.
Essas mudanças asseguram um novo tipo de prática que coloca em xeque as
formas tradicionais e exige a construção de novas metodologias de trabalho no
campo da Assistência Social, que contribua para o reordenamento institucional
proposto pela Constituição Federal, como princípio de consolidação da cidadania
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 121
plena e o reconhecimento da população excluída dos mínimos sociais, como plenos
cidadãos de direitos. Essa é uma das razões que sustentam a tese de que a
Assistência Social ocupa um espaço relevante na agenda da profissão.
Vivemos em uma sociedade que continua a apresentar desigualdade, agravada
pelas enormes diferenças sociais. Os sistemas de proteção social, ainda que tenham
avançado na conquista de políticas sociais públicas, continuam insuficientes para
responder às demandas colocadas pelas situações de pobreza. Essas demandas
solicitam metodologias capazes de reduzir vulnerabilidades da população e
fortalecimento de suas capacidades. A reflexão sobre metodologias de trabalho social,
garantindo a diversidade de perspectivas teórico-metodológicas, contemplando as
realidades regionais do imenso território brasileiro, constitui hoje, um desafio para o
trabalho social. É a segunda razão para explicar a tese de que a Assistência Social
ocupa hoje um espaço relevante na agenda do Serviço Social brasileiro.
A segunda razão tem sua origem na definição de Pereira (1996) sobre a
concepção de Assistência Social a partir da sua inserção na Seguridade Social,
afiançada como direito e definida como: [...] um tipo particular de política social que caracteriza-se por: a)genérica na atenção e específica nos destinatários; b)particularista, porque é voltada prioritariamente para o atendimento das necessidades sociais básicas; c) desmercadorizável; e d) universalizante, porque, ao incluir segmentos sociais excluídos no circuito de políticas, serviços e direitos, reforça o conteúdo universal de várias políticas sócio-econômicas e setoriais (PEREIRA,1996,P.29).
Para Couto (2009), essa definição recoloca questões centrais para o debate
brasileiro sobre o campo do trabalho assistencial. Reconhece a assistência social
como política pública, direito do cidadão e dever do estado. Aponta para o caráter
genérico da prestação dos serviços e identifica que o atendimento deve ser das
necessidades sociais básicas. E, acima de tudo, traz para a arena política as
demandas de uma parcela importante da população que anteriormente permanecia
invisível.
A partir de 2005, foi aprovada a Política Nacional de Assistência Social –
PNAS – e as Normas Operacionais Básicas, que institui o Sistema Único de
Assistência Social – SUAS – que estabelece como funções da política de
Assistência Social, segundo o PNAS ( Brasil,MDS,2005):
122 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
a) Inserção: inclusão dos destinatários nas políticas sociais básicas proporcionando-lhes o acesso a bens, serviços e direitos usufruídos pelos demais segmentos da população; b) Prevenção: criar apoios nas situações circunstanciais de vulnerabilidade, evitando que o cidadão resvale do patamar de renda alcançado ou perca o acesso que já possui aos bens e serviços, mantendo-o incluído no sistema social a despeito de estar acima da linha de Pobreza; c) Promoção: promover cidadania, eliminando relações clientelistas que não se pautam por direitos e que submetem, fragmentam e desorganizam os destinatários, e d) Proteção: atenção às populações excluídas e vulneráveis socialmente, opercionalizadas por meio de ações de redistribuição de renda direta e indireta.
Segundo Couto (2004, p.176), incorporar a legislação à vida da população pobre brasileira é necessariamente um dos caminhos, embora insuficiente, para incidir na criação de uma cultura que considere a política de Assistência social pela ótica da cidadania.
Para a autora é necessário mais que isso, é preciso recolocar o debate sobre
o espaço da política no campo do acesso ao excedente do capital como forma de
garantir vida digna a todos os cidadãos brasileiros. (Couto, 2006).
Referências
BRASIL. MDS – Política Nacional de Assistência Social NOB/SUAS. Brasília, julho de 2004. CARVALHO, Maria do Carmo Brant. A política da Assistência Social no Brasil: dilemas na conquista de sua legitimidade. In: Revista de Serviço Social e Sociedade. nº. 62, ANO XXI. São Paulo: Cortez, 2000. COUTO, Berenice Rojas e SILVA, Marta Borba. A política de assistência social e o Sistema Único da Assistência Social: a trajetória da constituição da política pública Porto Alegre: EDIPUCRS, 2009. ______. O Direito Social e a Assistência Social na Sociedade Brasileira: uma equação possível? São Paulo: Cortez, 2004. ______. A Assistência social como Política pública: do sistema descentralizado e participativo ao sistema único da Assistência Social-SUAS. In: Capacitação sobre PNAS e SUAS: no caminho da implantação.(Org.) MENDES, Jussara; PRATES, Jane; AGUINSKY, Beatriz. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2006. PEREIRA, P.A. A Assistência Social na perspectiva dos direitos: crítica aos padrões dominantes de proteção aos pobres no Brasil. Brasília: Thesaurus,1996.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 123
QUESTÃO 39
Há várias condições indispensáveis para que o Assistente Social, inserido num
órgão público (estatal), numa empresa ou numa organização da sociedade civil,
conduza a execução de uma política social. Uma das mais importantes dessas
condições diz respeito aos seus deveres e atribuições profissionais. Esclareça como
o Assistente Social pode informar-se com segurança sobre tais deveres e
atribuições e destaque a natureza das fontes que deve utilizar.
Tipo de questão: Discursiva
Conteúdo avaliado: Lei da Regulamentação da Profissão e Código de Ética
Profissional
Autora: Maria Palma Wolff
Comentário: A resposta deve referir-se explícita e diretamente ao conteúdo da Lei de
Regulamentação Profissional (Lei nº. 8.662/93) e do Código de Ética Profissional (1993).
Não há necessidade de remeter às partes pertinentes da Lei e do Código.
Uma resposta completa requer que aluno esclareça que o Código e a Lei são
instrumentos articulados, mas diferentes: um tem base normativa a partir da
categoria profissional, outro é impositivo por mediação do Estado.
124 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
QUESTÃO 40
Trabalhando em um serviço cujos usuários preferenciais são jovens, o Assistente
Social, para orientá-los acerca dos seus direitos, deve recorrer à legislação.
Mencione os dois principais instrumentos legais disponíveis, nesse caso, ao
Assistente Social e destaque a importância de cada um deles. Tipo de questão: Discursiva
Conteúdo avaliado: Estatuto da Criança e do Adolescente
Autora: Maria Isabel Barros Bellini
Comentário: Durante séculos diversas formas de violência contra crianças e adolescentes
foram aceitas e constituíam-se práticas cotidianas. A morte das crianças era aceita e
há registros da existência do “infanticídio tolerado” até o fim do século XVII ainda
que considerado “era praticado em segredo, correntemente, talvez, camuflado, sob a
forma de um acidente: as crianças morriam asfixiadas naturalmente na cama dos
pais, onde dormiam. Não se fazia nada para conservá-las ou para salvá-las” (ARIÉS,
1981, p.17). O não reconhecimento da infância e da adolescência como período do
ciclo de vida do ser humano digno de atenção e cuidado perdurou. Nos século XVIII
e XIX a criança é colocada na centralidade da família a qual também passa a
conviver com maior privacidade, “recolhimento da família longe da rua, da praça, da
vida coletiva, e sua retração dentro de uma casa melhor defendida contra os intrusos
e melhor preparada para a intimidade” (ÁRIES, 1981, p.23).
No Brasil a criança e o adolescente são considerados sujeitos de direito a
partir da Constituição Federal de 1988 que afirma no art. 227: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
ENADE Comentado 2007: Serviço Social 125
Garante assim a prioridade da criança e do adolescente em todas as formas
de acesso e atenção, bem como o direito a convivência aspecto esse fundamental
para a sua formação social e emocional.
Em 13 de julho de 1990 o Presidente da República sancionou a Lei nº. 8.069,
outra vitória na busca de proteção a esses indivíduos, criando o Estatuto da Criança
e do Adolescente que já no seu art. 1º afirma a disposição de legislar sobre a
proteção integral à criança e ao adolescente. Esse documento estabelece o que é
considerado criança e adolescente do ponto de vista legal, seus deveres e direitos.
Referência
ARIÉS, Philippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: Zahar, 1981.
126 Gleny Terezinha Duro Guimarães, Francisco Arseli Kern (Orgs.)
LISTA DE CONTRIBUINTES
Alzira Maria Baptista Lewgoy Ana Lúcia Suárez Maciel Anelise Gronitzki Adam Dolores Sanches Wünsch Esalba Maria Silveira Francisco Arseli Kern Gleny Terezinha Duro Guimarães Idilia Fernandes Inês Amaro da Silva Jane Cruz Prates Leonia Capaverde Bulla Márcia Salete Arruda Faustini Maria Beatriz Marazita Maria Isabel Barros Bellini Maria Palma Wolff Patricia Krieger Grossi
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