empório amazônia 13
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A Amazôniaé nossa?
ISSN
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R$ 10,00
Como o Brasil estáperdendo o controleda região maiscobiçada do planeta
BarcelosViagem ao paraísocenográfico
ModaNo palco danatureza morta
Rio e LisboaAs cidades dedom João VI
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A Empório, em sua 13ª edição, faz uma viagem pela Amazônia para mos-trar aos leitores as potencialidades e fragilidades dessa região ameaçada pelo modelo de desenvolvimento equivocado baseado na pata do boi e na indústria madeireira. As imensas clareiras abertas no meio da selva pela ação predatória do homem expõem o Brasil ao mundo como um país incapaz de gerir o maior patrimônio natural da Terra. O trabalho envolve pesquisa, entrevistas e reportagens especiais que devem servir de documento para análise e reflexão sobre o que pode ser feito para preservar e desenvolver a região. Desde os primeiros religiosos e naturalistas que aqui chegaram, até os tempos atuais, a Amazônia é analisada sobre vários aspectos. Poucos, porém, foram os que se aprofundaram em seu universo preo-cupados em apresentar projetos nos quais o homem seja parte preponderante desse processo. A Empório viaja por rio, terra e ar, das áreas desmatadas no Sul do Estado a Barcelos, paraíso da pesca esportiva e, agora, cenário cenográfico de três longas-metragens ambientados na Amazônia. Ao folhear as páginas desta edição, o leitor pode embarcar no porto de Lisboa, em 1807, ao lado da família imperial em fuga para o Brasil, e passear pelo Rio de dom João VI, rei que fez de uma colônia um país, além de poder visitar a Lisboa de hoje, capital portuguesa que se moderniza impulsionada pelo Merca-do Comum Europeu. Se quiser mais aventura, pode se deixar levar pelo imaginário do artista plástico chileno Roland Stevenson e encontrar o caminho do El Dorado, numa viagem fantástica cercada de perigos e mistérios. O ensaio de moda com Sally Menezes, amazonense de Carauari que co-meça a consolidar uma carreira internacional, tem a peculiaridade de invadir a passarela desmatada em que se transformou grande parte da floresta. Mas, para não dizer que só falamos de florestas, Carlos Ferreirinha mostra produtos sofisticados que estão sendo lançados no país. Ao final dessa leitura, a Empório espera ter contribuído para tornar a Amazônia mais amada e compreendida.
editorial
Os editores
Um novo olharsobre a Amazônia
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CAPA
Foto Márcio AmaralStyling Augusto CarneiroModelo Sally Meneses
DIRETOR DE REDAÇÃOSebastião Reis
reis@emporioamazonia.com.br
DIRETORA EXECUTIVAGeyna Brelaz
geyna@emporioamazonia.com.br
EDITORA EXECUTIVANatália Freire
natalia@emporioamazonia.com.br
CONSULTORCarlos Ferreirinha
ferreirinha@mcfconsultoria.com.br
DIRETOR DE ARTEMarcelo T. Menezes
criacao@emporioamazonia.com.br
PRODUTOR DE MODA E BELEZAGelb Costa
gelb@emporioamazonia.com.br
PUBLICIDADECaio Michiles
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Monyk Bragamonyk@emporioamazonia.com.br
COLABORADORESAndré Viana • Bruno Chateaubriand • Felipe MacielJair Ricciner • Marcelo Guilherme • Tenório Telles
FOTÓGRAFOSAntonio Iaccovazo • Cao Ferreira • Delfim Vieira • Euzivaldo QueirozFabiano Herrera • Fernanda Preto • Maíra Coelho • Márcio Amaral
Mário Oliveira • Paulo Amorim • Ruth Jucá
TRATAMENTO DE IMAGEMcaoptix.com
REVISÃODernando Monteirodamferr@ig.com.br
MARKETING E CIRCULAÇÃOAna Paula Schlickmann
mkt@emporioamazonia.com.br
REPRESENTANTEThiago Lorenzoni
PRESIDENTE E EDITORValdo Garcia
CTP E IMPRESSÃOProl Editora Gráfica Ltda.
DISTRIBUIÇÃO NACIONALLeonardo Da Vinci
Rua Rio Jutaí, 19 • Qd. 35 • N. S. das GraçasConj. Vieiralves • CEP 69.053-020 • Manaus/AMCNPJ 03.207.977/0001-72amazonbest@amazonbest.com.brTel.: (92) 3584.5248 • www.amazonbest.com.br
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COLABORADORES
Paulo AmorimFotógrafo independente, Paulo Amorim é o responsável pelos clicks de Lisboa. Além da Empório, atualmente co-labora com a Agência ImagoPress/ImagoSport (Suiça-Alemanha), Agência Estado (Brasil), El Mundo e Don Balon (Espanha). No Brasil, já passou pelo jornal O Libe-ral e pela revista Veja, sucursal de Belém.
Carlos FerreirinhaO administrador de empresas Carlos Ferreirinha é uma das pessoas que mais bem conhecem o setor de luxo no país. Mesmo se dizendo imune ao poder das marcas, é um profissional bem-sucedido da área. Ex-presidente da Louis Vuitton no Brasil, presta hoje consultoria a empresas como Burberry e Gucci. São dele as dicas de produtos.
Sally MenezesAlta, branca, olhos azuis, ela costuma ser confundida com uma russa. Nada de mais, sobretudo se o engano vem de gente como Kate Moss, super-model inglesa. Amazonense de Carauari, Sally Menezes desfila para estilistas famosos, como Calvin Klein e Vivianne Westwood. Nesta edição, revela sua beleza na capa e editorial de moda.
Felipe MacielFelipe Maciel, 29 anos, é jornalista, com passagem por várias revistas, como Desfile, Manchete e Pais & Fi-lhos, além do jornal Tribuna da Imprensa. Atualmente acumula experiência em assessoria de imprensa. Pela experiência na área cultural, assina a matéria sobre o Rio imperial.
Jair RaccinerHá 21 anos em Portugal, Jair Racciner mostra Lisboa 200 anos depois da fuga da família real. Formado em jornalismo pela ECA/USP, com mestrado em Literatura e Cultura Portuguesas pela Universidade Nova de Lis-boa, trabalha como correspondente para a BBC Brasil e O Estado de S. Paulo.
16Natureza de uma bela paisagemARTE
Lançamentos que ninguém pode perderLETRAS126
Doze anos do Festival de Ópera de ManausCULT116
114O mundo sofisticado de Carlos FerreirinhaLUXO
104 A incrível viagem de Stevenson ao El DoradoGENTE
94Roteiro da velha e moderna LisboaTURISMO
86O Rio imperal da corte de dom João VITURISMO
76Barcelos, paraíso do turismo e do cinemaDESTINO
48Um ensaio na passarela desmatadaMODA
40Quatro décadas de uma Zona FrancaNEGÓCIOS
36General Heleno, comandante do CMAENTREVISTA
24As veias abertas da AmazôniaAMBIENTE
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01Rua Lauro Cavalcante, 231 - Centro • (92) 3233.4545 • hostelmanaus@hotmail.com • Manaus - AM
www.inpa.gov.br • www.ipe.org.br • www.ampa.com.br
U m casarão charmoso no centro histórico de Manaus é
o mais novo empreendimento da rede mundial de al-
bergues da juventude, a Hostelling International. Distante
apenas três quadras do Teatro Amazonas, a hospedaria começa a
ficar conhecida entre mochileiros do mundo inteiro interessados
em explorar esta cidade singular e esticar o passeio à exótica flo-
resta amazônica. Além do bom preço, o lugar se destaca pelo am-
biente familiar. Em um pátio interno coberto por árvores frutíferas,
o visitante pode se deliciar lendo um livro deitado em rede, estilo
ribeirinho. No fim da tarde, a diversão fica por conta de boa música
regada a caipirinha. A bebida é servida no bar do Hostel, que conta
ainda com vista para o Palácio Rio Negro.
Albergue com charme
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VITRINE
M ais um grande passo para conservação e repovoação de
peixes-bois de água doce foi dado no início do mês. Uma
equipe de pesquisadores do Instituto Nacional de Pesqui-
sas da Amazônia (Inpa), do Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPE) e
da Associação Amigos do Peixe-boi (Ampa) fez a primeira soltura de
animais criados em cativeiro no Amazonas. Puru e Anamã moravam
no Inpa desde 1999 e 1995, respectivamente, e foram libertados na
Reserva do Cuieiras, a 60 quilômetros de Manaus, depois de passarem
por uma série de exames. O evento foi acompanhado por crianças,
que aproveitaram para aprender mais sobre a espécie ameaçada de
extinção. Mais peixes-bois devem ser soltos nos próximos anos. Trinta
e três ainda continuam no laboratório do Inpa.
De volta para casa
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O material selecionado e o fino acabamento do artesa-
nato de Novo Airão, no interior do Amazonas, come-
çam a ganhar fama nacional. Em 2006, a cooperativa
de artesãos ligada à Fundação Almerinda Malaquias recebeu o
Prêmio Top 100 do Sebrae. E de lá para cá, só tem aumentado
a produção. Além da marcenaria e do artesanato com madeira,
a associação Nov’Arte agora investe em peças feitas a partir de
papel reciclado. Um destaque do trabalho é a preocupação social
e ecológica. Como o município de Novo Airão tem hoje mais de
80% da sua área dividida em zonas de proteção ambiental, o que
restringe o uso das potencialidades naturais, a Fundação Almerin-
da Malaquias (FAM) surge como uma alternativa, ensinando ao
ribeirinho que só sabia caçar, pescar e extrair madeira, um novo
ofício. A FAM oferece cursos de capacitação, incentiva a educa-
ção básica e o associativismo. A empresa de artesanato funciona
assim: 25% do dinheiro da venda dos produtos se transformam
em capital de giro. Os outros 75% ficam para o artesão, que em-
prega o lucro no sustento da família. A preocupação com o meio
ambiente se traduz no uso de refugos de madeira, recuperados
em vários pontos da cidade ou abandonados na mata. Nem uma
tora de matéria-prima nobre é derrubada.
(92) 3365.1000 • fam@uol.com.br
03Arte social
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Rua Comendador Miguel Calfat, 382 - Itaim • (11) 3045.9006 • São Paulo - SP
Av. do Turismo, 215 - Tarumã • (92) 8818.1202 • adegadepedra.manaus@gmail.com • Manaus - AM
I naugurado há pouco mais de um ano, o restaurante Itaim é a
primeira casa especializada em peixe na grelha do país. Com
ambiente rústico e aconchegante, começa a receber indicações
de revistas especializadas. O cardápio ofecere 18 espécies de pes-
cado preparados tipo churrasco e mais uma variedade enorme
de frutos do mar, risotos e entradas, como a linguiça de tambaqui.
Exemplares de águas doces, como o tambaqui e o tucunaré, aliás,
são preferidos no local. Mas o chef Fabrizio Pellegrino também
inova em pratos como o ceviche de linguado com pipoca, o mini-
hambúrguer de salmão e o abadejo com fonduta de parmesão
e batata sauté (foto). Nota 10 também para o serviço, cordial e
informal, combinando com a casa.
04Churrasco de peixe
05O vinho é prova constante de que Deus nos ama e nos de-
seja ver felizes, já dizia Benjamin Franklin. A célebre frase
cai como uma luva para o Adega de Pedra, empreendi-
mento de cinco amigos que, depois de experimentarem tempora-
da na Europa, resolveram trazer um pouco do Velho Mundo para
Manaus. Inaugurado há quatro meses, o local com cara de taberna
espanhola tem atmosfera alegre e aconchegante, por isso é a nova
sensação entre os enófilos de plantão. Com decoração rústica, inspi-
rada em cantinas mediterrânicas, a adega oferece uma vasta carta de
vinhos finos, espanhóis, argentinos, chilenos e portugueses. Desta-
que para a paella preparada na hora (às quintas-feiras) e para o ba-
calhau servido como tira-gosto (toda sexta), ao som de boa música.
Divino prazer
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06Tropical Hotel Manaus • Av. Cel Teixeira, 1320 - Ponta Negra • (92) 3658.6953 • Manaus - AM
S aborear sorvetes feitos com frutas frescas e selecionadas da
Amazônia já não é privilégio dos paraenses. Manaus, agora,
conta com uma gelateria Cairu. A marca, criada há 45 anos
por uma família de Belém e que virou sinônimo de qualidade, fa-
zendo parte do circuito turístico da cidade, chega ao Amazonas
pelas mãos da empresária Esdras Begéa. A loja no Tropical Hotel
oferece 35 sabores, entre tradicionais (açaí, tapioca e cupuaçu) e
exóticos (mangaba, muruci e uxi). Destaque também para as recei-
tas exclusivas, como a de pavê de cupuaçu (com pedaços de casta-
nha e gotas de chocolate) e o sorvete de bacuri (com castanha e
pão-de-ló). As crianças não foram esquecidas. Para elas, chocolate,
chicletes e céu azul (caramelo).
Sabores exóticos
Rua Almirante Alexandrino, 264 - Largo dos Guimarães - Santa Teresa • (21) 2508.7095 • contato@espiritosanta.com.br • Rio de Janeiro - RJ
Q uem gosta de novas experiências gustativas, não
pode deixar de passar no restaurante Espírito Santa,
no charmoso circuito gastronômico de Santa Teresa,
Rio de Janeiro. A chef Natacha Fink acaba de elaborar um car-
dápio em que apresenta um painel completo e bem atual dos
sabores do Brasil, com pratos e ingredientes típicos de várias
regiões do país. A partir de uma pesquisa sobre a tradição gas-
tronômica brasileira, ela ampliou a variedade de peixes de água
doce (pintado, surubim, dourado) e selecionou mais alimentos
saudáveis, tubérculos como inhame, mandioquinha e batata
doce. E o melhor são os preços, na faixa de R$ 30. Na foto, siri
com banana pacovã.
07Releituras do Brasil
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Serviço Natura de Atendimento ao Consumidor • 0800.115566 • snac@natura.net • www.natura.net
Millennium Shopping - Lojas 202 e 203 • (92) 3659.3714 • Manaus - AM
O Millennium Shopping, em Manaus, disponibiliza mais um
serviço para quem tem pouco tempo para compras e
não abre mão da qualidade. Inaugurou recentemente o
Empório Gaioto, uma espécie de loja de conveniência com bebidas
e alimentos finos. Além dos já tradicionais bacalhau norueguês e
lingüiça de Bragança, é possível encontrar toda a linha de carnes
Bassi e vinhos Chandon, cervejas alemães e americanas e uma farta
carta de queijos, antepastos, geléias e ervas exóticas. A novidade
fica por conta do “espaço sebo”, onde o visitante pode se deleitar
com clássicos da literatura mundial, como Simone de Beauvoir e
Balzac. O empreendimento tem a assinatura de Jurandir Gaioto, que
acumula know-how nos já badalados Mercato e Távola Redonda.
08Compras com estilo
09B asta dar uma volta, passar na padaria ou comprar algo na
farmácia que o resultado é o mesmo: muitas sacolas plásti-
cas para guardar em casa. Essas embalagens causam grande
impacto ambiental, já que são derivadas do petróleo e demoram
em média 450 anos para se decompor. Com o objetivo de mobili-
zar os consumidores, as bolsas de pano, também conhecidas como
eco bags, são a nova aposta do mundo fashion. Na Europa, só se
vai ao supermercado com bolsas assim. Por isso, a Natura lança sua
versão feita 100% com algodão natural. Com o slogan “Esta bolsa
carrega as minhas escolhas”, o produto, além de propor uma refle-
xão sobre o consumo consciente, ainda tem renda revertida para
projetos de melhoria da educação no país.
Sacola reutilizável
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A Prefeitura de Rio Preto da Eva acaba de dar os últimos
retoques na Igreja de Cavaco. Construída em 1968, em
sistema de mutirão, por agricultores riopretenses, a obra
se destaca pela arquitetura de vanguarda assinada por Severiano
Porto. Por falta de manutenção adequada, a capela acabou sen-
do demolida em 2002. Agora, graças a um esforço conjunto das
administrações municipal e federal, o centro ecumênico ressurge
belo, exótico e ainda mais imponente. Severiano Porto autorizou
a reconstrução da planta original nos mínimos detalhes.
A parte externa foi toda feita de cavacos de jaran, com
design que lembra o rabo de um peixe. Já a parte interna foi
erguida com acariquara, ferro e concreto. O piso é ilustrado
por costaneiras (cortes de madeira em círculos), numa espécie
de mosaico. E a mobília também acompanha o estilo pitoresco.
rudimentar. Tanto o púlpito, quanto bancos e cadeiras são de
madeira bruta regional.
Por sua beleza e importância, a obra passa a compor um
complexo turístico com visão panorâmica da cidade. Batizado de
Mirante Francisco Eugênio, em memória a um dos produtores
agrícolas pioneiros do município, o local abriga ainda um forno de
torrar farinha cercado por três esculturas esculpidas em ferro e
concreto – para lembrar as atividades agrícolas principais da co-
lônia – e o “Chafariz da Arquitetura”, que representa a produção
local de matrinxã e tambaqui em cativeiro. O conforto e o lazer
dos visitantes estão garantidos por uma ampla área de estaciona-
mento, banheiros, choperia e loja de souvenir.
Rodovia AM-010 na saída de Rio Preto da Eva • (92) 3328.1646 • vanuzabarroncas@yahoo.com.br
10Capela de cavaco
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ARTE
No banzeiro suave dos rios amazônicos, a fotógrafaFernanda Preto capta os tons do tempo e da paisagem.
Tempo passado
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Por Sebastião ReisFotos Fernanda PretoAMBIENTE
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AmazôniaAlém dos olhos do satélite
V ista de cima, em sua imensidão verde, a floresta amazônica parece eterna e intocável. Difícil acreditar que um dia, sob a ação devas-tadora do homem, ela possa deixar de existir, substituída por um imenso descampado. Mas é exatamente isso que está acontecendo. O processo de desmatamento na região avança celeremente. A repercussão internacional é preocupante. Interesses comerciais bra-sileiros estão sob ameaça diante do descontrole da região. Aonde vamos parar? O que fazer?
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A revelação do desmatamento recorde no segundo se-
mestre de 2007, feita a partir de imagens de satélite do
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), é apenas
uma ponta do prejuízo. Entre agosto e dezembro de 2007 foram
derrubados 3.235 quilômetros quadrados de floresta. Vale salientar
que os satélites – a 500 quilômetros de altura – detectam apenas
o corte raso de árvores deixando de lado as queimadas. O corte
seletivo – aquele em que os madeireiros derrubam somente árvores
com valor econômico – também foge à sua percepção. Nesses casos,
a cobertura vegetal parece intacta, mas o estrago embaixo é terrível.
Pesquisadores que atuam na Amazônia defendem o que cha-
mam de “verdade terrestre”, ou seja, um trabalho que mostre cla-
ramente o tamanho dessa agressão ao maior patrimônio natural da
humanidade. Sob a copa das árvores, há áreas imensas desmatadas.
É preciso identificá-las e agir para que a Amazônia e sua imensa
biodiversidade sejam preservadas.
Unir crescimento econômico com preservação ambiental é
uma equação que exige esforço do governo para ser elucidada.
Em seu artigo “O preço da riqueza”, de grande repercussão no
país, a jornalista Miriam Leitão, de O Globo, escreve exatamente
sobre isso. Mostra que os números positivos da economia coin-
cidem com o aumento do desmatamento na Amazônia. Ela lem-
bra que o Brasil pulou, em poucos anos, de sexto para maior
produtor de carne do mundo; que, em 1991, o país produziu 56
milhões de toneladas de grãos, e no ano passado, 133 milhões de
toneladas, e virou um dos maiores produtores mundiais de grãos.
É também o mais competitivo produtor de biocombustível. “O
sucesso do agronegócio brasileiro, porém, não pode ser nossa
tragédia”, alerta Miriam Leitão.
Com base no estudo chamado “Acertando o alvo”, do Institu-
to do Homem e Meio Amazônida (Imazon), Imaflora e Amigos da
Terra, a jornalista foi atrás do destino dessa madeira ilegal. Informa
que 86% da madeira retirada da Amazônia são consumidos no Bra-
sil, sendo 20% apenas no Estado de São Paulo. Só os 14% restantes
seguem para exportação. Um dos instrumentos que alimentam a
indústria do desmatamento na região é a facilidade de crédito a ju-
ros baixíssimos a agricultores, proporcionada por instituições como
o Basa. Quanto mais crédito, mais desmatamento. De acordo com
o estudo, os juros para empresas estiveram entre 26% e 34% ao
ano. Os pecuaristas pagavam de 5% a 9%. No Pronaf, 1% a 4%. A
matemática é simples: se o preço dos produtos cai no mercado, o
desmatamento acompanha essa tendência. Se o preço aumenta, o
desmatamento também aumenta.
Como se sabe, a Amazônia é uma das áreas mais subpovoadas
do planeta. Por isso, denominada “Deserto Verde”. As dificuldades
de fiscalização nesse mundo de ninguém são campo fértil para
pecuaristas e agricultores que necessitam de imensas áreas des-
campadas para “plantar” seus negócios. Essa que é a maior região
florestal e hidrográfica do mundo vem sendo comida pelas bordas,
de fora para dentro, numa zona geográfica que vai do sudeste do
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“Asfaltar a BR-319 é trazer o arco dodesmatamento para dentro do Amazonas”
No sul de Lábrea (AM), na fronteira com Rondônia, 150 serrarias clandestinas operam 24 horas por dia desmatando a floresta. Três mil e quinhentos caminhões trafegam diariamente pela Amazônia transportando madeira.
Philip Fearnside
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Milhares de hectares de floresta desaparecem para dar lugar a imensos campos destinados à cultura da pecuária e da soja
Acre ao centro-oeste e sul do Pará - passando pelo sul e leste do
Amazonas e a ponta norte do Mato Grosso. Nessa área - segundo
estudos do Imazon - existem 95.355 quilômetros de estradas não-
oficiais, ou endógenas.
São aproximadamente 2 milhões de hectares devastados por
ano. Espécies desconhecidas de árvores também desaparecem na
esteira desse processo. Hoje, olhando para trás, seria impossível
ver a medicina sem produtos importantes retirados da Amazônia,
como a tubocurarina, substância ativa do curare, veneno de fle-
cha usado pelos índios para entorpecer a caça ou matar inimigos,
e seus derivados, que integram a lista dos principais anestésicos
usados pela indústria farmacêutica multinacional. A Europa livrou-
se do terror da malária graças a Quina (Cinchona spp), de onde
se origina o Quinino, outra droga retirada da região, usada por
Napoleão para proteger seus homens de infecções e estender
seu império. Não é difícil prever que muitas outras substâncias im-
portantes para a humanidade e ainda desconhecidas do homem
estejam desaparecendo em meio à insanidade do desmatamento
irrefreável. Acredita-se que apenas 1% da biodiversidade amazôni-
ca tenha sido estudada de maneira científica.
Parte dessa riqueza desconhecida trafega todos os dias pela
Amazônia transportada por três mil e quinhentos caminhões. Uma
das molas propulsoras desse movimento é a propina paga em pos-
tos de fiscalização ou o anonimato acobertado por estradas clan-
destinas, como a que corta o extremo leste do Amazonas ligando
o município de Parintins ao Pará numa imensa linha no meio da
selva. A área, recém-descoberta e ainda pouco conhecida, já foi
classificada de crítica pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e
dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
Para o pesquisador do Inpa Philip Fearnside, segundo cientista
mais citado no mundo nos últimos dez anos, de acordo com o
Science Citation Index, os países precisam pagar pelos benefícios
ecológicos originados na floresta, para garantir a qualidade de vida
do caboclo e a preservação da Amazônia. Segundo ele, o Programa
de Aceleração do Crescimento (PAC) será um forte instrumento
de incentivo ao desmatamento na região.
A floresta exerce um papel importante como reguladora do
fluxo de chuvas, de temperatura e para evitar o agravamento do
efeito estufa por meio do seqüestro de carbono, que quando li-
berado na atmosfera em forma de gás carbônico provoca esse
fenômeno de conseqüências imprevisíveis para o mundo. Enfático,
Fearnside afirma que o aquecimento global, se não for contido,
poderá acabar com a floresta até 2080.
Para se ter uma idéia da importância da floresta amazônica
para o clima no planeta, basta saber que ela lança um volume enor-
me de água, quase equivalente ao fluxo do rio Amazonas, de volta
ao ar por meio das folhas das árvores e cai como chuva em outros
lugares. São liberados algo em torno de sete trilhões de toneladas
de água anualmente na atmosfera, pela evapotranspiração, e seus
rios descarregam 20% da água doce despejada nos oceanos pos
todos os rios existentes. O que acontece aqui tem conseqüências
lá. É essa região – último grande reduto de riquezas científicas do
mundo – que se encontra ameaçada pelo próprio homem. Faça-se
chuva e sol, menos escuridão.
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Jardim do Éden
Ilust
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erre
ira
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A Amazônia, maior extensão de florestas e rios do mundo,
paraíso da biodiversidade e região vital para o equilíbrio
do ecossistema, tem sido decantada e devastada em pro-
sa e verso. Defendê-la, é obrigação de todos, assim como o fez,
num ato que beirou à paixão cega e à insanidade, o português
Pedro de Rates Hanequim. Vinte anos no Brasil foram suficientes
para que ele visse a região de árvores verdes e frondosas como o
Jardim do Éden, Paraíso Terreal, morada de Adão e Eva, lugar onde
se encontrava a Árvore da Vida. Verdade ou delírio, não importa.
Aos olhos de quem vê e se apaixona cegamente por esse univer-
so verde, é exatamente isso. O destino desse homem foi morrer
afogado e queimado, em 1744, em Portugal, por crime de heresia
e apostasia, sem jamais abrir mão de sua verdade.
Para o escritor Euclides da Cunha, autor de “Os Sertões”, que
percorreu a região como chefe da comissão mista brasileiro-perua-
na de reconhecimento do Alto Purus para a demarcação de limites
entre os dois países, a Amazônia é o “Jardim do Paleolítico”. Em “O
Inferno Verde”, extraído de sua obra “Um Paraíso Perdido - Ensaios
Amazônicos”, o autor “consegue ver a Amazônia como um último
capítulo do Gênese”, conforme descreve o historiador Artur Cézar
Ferreira Reis na apresentação do volume. Qualquer semelhança
bíblica com Pedro de Rates Hanequim, não é mera coincidência.
É que a Amazônia desperta fascínio até mesmo em quem ja-
mais pisou em seus limites. Foi o caso do escritor Arthur Conan
Doyle, que localizou nesta região, mais precisamente no topo do
Monte Roraima, o cenário de sua ficção científica “Mundo Perdido”.
A exemplo de Conan Doyle, o francês Júlio Verne também
nunca veio à Amazônia, mas se inspirou na região em seu livro
“A Jangada. Oitocentas léguas pelo Amazonas”, lançado em 1881.
Ele se baseou em relatos de naturalistas que estiveram na região,
como Agassiz, Bates, Humboldt, Spix, Martius, d’Orbigny, Condami-
ne, Alexandre Rodrigues Ferreira e sua “Viagem Filosófica”, além de
alguns iluministas. Verne antecipava em sua obra a importância da
Amazônia para o mundo e o interesse que despertaria em virtude
das potencialidades de sua natureza ainda escondidas.
Outros, mesmo morando longe, decidiram mergulhar numa aven-
tura perigosa por esse lugar mágico e misterioso. Foi o caso do ex-pre-
sidente dos Estados Unidos, Franklin Roosevelt. Decepcionado por não
ter sido reeleito para o terceiro mandato, Roosevelt decidiu realizar uma
expedição à Amazônia. Aos que tentaram convencê-lo do contrário, o
ex-presidente simplesmente disse que a aventura era sua última chance
de ser um garoto. “Já vi e desfrutei a vida tanto quanto qualquer outro
homem que eu conheça. Tive minha cota completa, e se for preciso que
eu deixe meus ossos na América do Sul, estou plenamente pronto para
isso”, afirmou Roosevelt, determinado a enfrentar os próprios limites.
Roosevelt era um aventureiro contumaz, daqueles que não se
deixam abater facilmente. Mas não precisou deixar os ossos por
aqui. Contraiu malária e teve a perna quase quebrada pela ponta
de uma pedra. Mesmo assim, insistiu em desafiar o rio da Dúvida,
que acabara de ser descoberto pelo marechal Cândido Rondon.
Era um rio traiçoeiro, de corredeiras e quedas d’água.
Canoas e suprimentos foram levados pelas águas; homens se
perderam pelo caminho. Roosevelt resolveu desistir, para não pre-
judicar a expedição. Seu filho Kermit, que cometeria suicídio anos
depois, no Alasca, assumiu o lugar. O rio da Dúvida se transformou
em rio Roosevelt. Mas, sem dúvida, nenhum presidente brasileiro
conhece a Amazônia como Roosevelt conheceu.
Um dos maiores observadores do homem da região foi o na-
turalista britânico Alfred Russel Wallace, que viajou pelo Brasil com
seu colega Henry Bates entre 1835 e 1844 e explorou o Amazo-
nas e o rio Negro de 1848 a 1852. Após essa viagem, ele passou a
pensar mais profundamente na teoria da origem das espécies. Em
1958, Wallace estabeleceu a teoria da seleção natural por meio da
luta pela existência, base da Teoria do Evolucionismo, de Charles
Darwin, tão combatida pela Igreja Católica.
O alemão Haraldi Ludwig Sioli, iniciador da Ecologia Tropical
do Instituto Max-Planck de Limnologia, da Alemanha, e que durante
17 anos estudou as águas dos rios amazônicos, concluiu que é pre-
ciso “aprender a reconhecer a diversidade das formas, que juntas
fazem o ecossistema para aumentar a beleza do mundo...”. Sioli
acrescenta: “Essa foi a principal coisa que aprendi aqui na Amazônia,
e eu sou muito grato por todos esses anos que passei na Amazônia,
onde estive por 17 anos de minha vida e onde eu era uma pes-
soa completamente diferente daquela que saiu da Alemanha”. Para
quem deixou seu país durante a 2ª Guerra Mundial e voltou para
encontrar uma Alemanha diferente daquela onde vivera, retornar à
Amazônia foi como reencontrar a liberdade.
A história das pesquisas na Amazônia tem em Humboldt um
precursor. A expedição científica iniciada por ele em 1799 foi consi-
derada a mais importante do século XIX. Autor de “Hiléia Brasileira”
- expressão que usou se referindo à imensa floresta tropical-, Hum-
boldt e seu colega Aimé Bompland percorreram 10 mil quilômetros
pelas Américas enfrentando todos os tipos de adversidades, desbra-
vando uma região inóspita e pouco conhecida.
A Amazônia foi servida e se serviu desses homens da ciência.
Alguns, como Langsdorf, perderam a memória, outros foram aco-
metidos de graves enfermidades, mas nenhum deles passou em vão
por aqui. O legado dos primeiros pesquisadores – de Humboldt aos
cientistas atuais – serviu para mudar a concepção do mundo sobre
essa região rica e selvagem. (S.R)
32
Pesquisa pede
socorro
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33
E les são institutos de referência em pesquisas na Amazônia,
detêm vasto conhecimento sobre a região e têm papel im-
portante na preservação da floresta. Só precisam de ajuda.
Inpa, Emílio Goeldi e Mamirauá enfrentam hoje uma barreira que
vai além do imenso desafio de pesquisar o desconhecido. Têm
pouco dinheiro e número limitado de profissionais.
É em função desse quadro histórico de penúria que os três ór-
gãos nacionais de pesquisa perdem espaço para o exército de pes-
quisadores estrangeiros que fazem da Amazônia sua área de estudo
e conhecimento. Setenta por cento do conhecimento gerado em
pesquisas científicas na região são dominados por estrangeiros. Deter
conhecimento é ter poder. E os gringos estão léguas à frente de nós.
Para os três principais institutos nacionais de pesquisas que
atuam na Amazônia (Inpa), Instituto de Desenvolvimento Susten-
tável Mamirauá e Emílio Goeldi – o maior problema é a falta de
doutores para realizar os trabalhos de pesquisa na região.
Em 1952, quando foi anunciado o projeto de criação do Inpa,
a previsão era de que o instituto contasse com 940 pesquisado-
res. Em 2008, a realidade é outra. São apenas 130 doutores, dos
quais 30 bolsistas que estão indo embora. O orçamento deste ano
aumentou de R$ 17 milhões para R$ 31 milhões, mas é preciso
investir em pessoal. “O Inpa precisa de gente para a área científica,
precisamos de pessoas para criar informação, para não viver de
informação”, afirma o diretor Adalberto Luiz Val.
O quadro de pessoal é um drama para o Inpa num momento
em que se multiplicam as demandas sobre a região. “Temos uma infra-
estrutura e uma tradição de informações prontas para serem utiliza-
das, mas faltam doutores para toda a região”, afirma Luiz Val. Com lápis
e papel na mão, o diretor do Inpa conclui um estudo sobre a realidade
das pesquisas científicas no Brasil. Segundo ele, no país existem 3.854
cursos de pós-graduação em nível de mestrado e doutorado.
Desses, 1.309 cursos voltados somente para doutorado. Nos
nove Estados da Amazônia brasileira são 185 programas, dos quais
39 em nível de doutorado. “Se fôssemos considerar o PIB desses
Estados, de 8%, e o investimento proporcional, deveríamos ter 307
cursos de pós-graduação”, observa Luiz Val.
O Brasil forma, em média, 7,6 doutores por curso em um ano.
Os 39 cursos de doutorado na Amazônia formam 238 doutores
por ano. “Mesmo que conseguíssemos contratar esses doutores,
não teríamos como atender às demandas por informação na re-
gião. “Não temos doutores, não temos programas de graduação,
não conseguimos formar doutores. O decreto de criação do Inpa
está sendo ignorado”.
Sobre o desmatamento na Amazônia, que considera uma ques-
tão de segurança nacional, acredita que a instituição pode ter um
papel mais efetivo para a preservação da floresta. Basta ter os recur-
sos necessários. Sem estrutura, a tendência é “ficar vendo paisagem”.
“Temos alternativas para aproveitar áreas degradadas”, garante.
Os investimentos em ciência e tecnologia na Amazônia repre-
sentam apenas 0,27% do PIB brasileiro. Para as outras regiões, 1%.
As dificuldades do Inpa em função do orçamento limitado são tão
grandes que o instituto encontra barreiras para certificar produtos
cosméticos de higiene e limpeza amazônicos. “Não temos profis-
sionais suficientes”, justifica Val.
Isso representa perda de tempo e dinheiro. Os produtos
só podem ser taxados depois de certificados. O diretor do Inpa
observa que é necessário também analisar os impactos ao meio
ambiente que serão causados pelas hidrelétricas do Jirau e Santo
Antonio, no rio Madeira. Segundo Adalberto Val, até 2050 devem
ser construídas 75 novas hidrelétricas na Amazônia. O impacto am-
biental dessas obras precisa ser avaliado, na sua opinião.
O Museu Paraense Emílio Goeldi, com 141 anos de atividades
na Amazônia, realiza importante trabalho de catalogação e análise
da diversidade biológica e sociocultural da região, sem que para
isso conte com os recursos necessários. A instituição tem um
déficit hoje de aproximadamente 60 pesquisadores, 30 tecno-
34
logistas, 100 analistas e 50 assistentes de nível médio para a
coordenação de Ciência e Tecnologia. “Além disso, o orçamento
precisa crescer 100% e a infra-estrutura de pesquisa e comu-
nicação necessita de manutenção constante”, afirma a diretora
do Museu Goeldi, Ima Célia Guimarães Vieira. Com 53 doutores
em seus quadros, o Goeldi precisa de mais 100 profissionais
desse nível nas diversas áreas de atuação para cumprir suas
metas. O orçamento em 2007 foi de R$ 6 milhões de recursos
do tesouro e em 2008 são previstos R$ 9 milhões, e mais R$ 15
milhões captados de fontes externas.
Sobre o desmatamento na Amazônia, Ima Célia diz que é um
cenário complexo. “Vários atores estão envolvidos nesse processo
e muitas práticas ilegais estão associadas a ele”, afirma. Segundo ela,
análises sobre a situação devem ser feitas com profundidade para
montar programas de combate e controle. “Infelizmente, o que fi-
zemos até agora, exatamente por falta desses estudos complemen-
tares ao anúncio das taxas anuais de desmatamento, foi montar
programas emergenciais”.
A pesquisadora afirma que é importante analisar os tipos de
desmatamento que ocorrem na Amazônia. Primeiro, a eliminação
de floresta por corte raso que, a cada ano, chega ao conhecimento
público com o anúncio da taxa de desmatamento feita pelo Prodes/
Inpe. Depois, os graus de perturbação da floresta associados a der-
rubadas e queimadas em diferentes categorias. “Esse processo é mais
difícil de avaliar e é o mais importante, pois nos dá a possibilidade de
estancar o processo na hora em que está ocorrendo. Nesse aspec-
to, o Inpe vem aperfeiçoando o sistema Deter para esse fim”. Para
evitar mais desmatamentos, Ima diz que se deve equipar os órgãos
de fiscalização e controle federais como o Ibama e o Instituto Chico
Mendes, e fortalecer a ação das secretarias estaduais e municipais
de meio ambiente; tornar efetiva a cobrança de multas ambientais e
cortar créditos e subsídios de empresas que devastam a floresta e
adotam trabalho escravo e grilagem de terras públicas.
Segundo ela, deve-se estar atento à atuação do mercado no
que diz respeito à certificação, tecnologia, crédito direcionado,
a partir de estudos econômicos que indiquem a importância e
o potencial de determinados setores para a sustentabilidade, e
procurar alternativas econômicas de serviços ambientais, cadeias
produtivas alternativas, recuperação de áreas degradadas, dentre
outras ações.
O Museu Goeldi faz a sua parte, mesmo com dificulda-
des, garante a diretora. “Realizamos estudos profundos sobre
a biodiversidade da Amazônia, conhecendo-a e catalogando-a,
além de avaliarmos os impactos de usos da terra sobre a bio-
diversidade, procurando entender as realidades regionais e as
dinâmicas do desmatamento”.
A realidade do Instituto de Desenvolvimento Sustentável Ma-
mirauá não é diferente. Com campo de atuação em pesquisas na
área biológica e social, a instituição estuda, principalmente, a socio-
biodiversidade das florestas amazônicas, sobretudo as do tipo ala-
gadas – várzeas e igapós – sua conservação e seu uso, sustentado
pelas populações visando o desenvolvimento sustentável.
O Instituto Mamirauá conta com apenas cinco doutores e
precisaria de, ao menos, mais 10. Outro problema é a falta de re-
cursos para a contratação de pessoal para o quadro efetivo. O
orçamento é de R$ 6 milhões.
Para os diretores da instituição Ana Rita Pereira Alves e
Helder Queiroz, respectivamente diretora-geral e diretor téc-
nico-científico, o desmatamento na Amazônia é um dos gran-
des problemas que afligem a região, mas não é o único. Apenas
o mais visível. “Infelizmente, é real, ao contrário do que alguns
pensam”, afirma Queiroz. “É resultado da incapacidade da so-
ciedade brasileira de focalizar esforços nessa fase de seu ama-
durecimento para a ocupação ordenada e o uso adequado de
uma área tão sensível para o Brasil, o continente e o planeta”,
acrescenta Ana Rita. (S.R)
35
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36
Fotos Mário Oliveira e arquivoENTREVISTA
O guardiãoda fronteira
37
A frente de um contingente de 25 mil homens e da imen-
sa tarefa de defender 1.200 quilômetros de costa e 11
mil quilômetros de fronteira na Amazônia, o general-de-
exército Augusto Heleno Ribeiro Pereira, 60, chefe do Coman-
do Militar da Amazônia (CMA), tem uma visão crítica sobre o
papel do poder público e das organizações não-governamentais
(ONGs) na região. Tido como uma das mentes mais brilhantes do
Exército Brasileiro, ele defende a mobilização da sociedade em
torno dos interesses nacionais nessa imensa área de selva e rios
que guardam um rico patrimônio biogenético.
Experiente, o general Augusto Heleno está completando seis
meses de Amazônia, tempo suficiente para perceber que ainda há
muito a ser feito. Difícil, segundo ele, é fazer frente ao desafio sem
dispor dos recursos necessários, uma vez que considera o orçamento
das Forças Armadas “reduzido”. O Exército tem déficit de homens,
equipamentos, frota e moradia. Isso sem contar os salários, defasados.
Empregar no Brasil a experiência no comando da Missão das
Nações Unidas para a Estabilização do Haiti (Minustah) é tarefa
quase impossível, segundo o general, em virtude das circunstâncias
e características de cada lugar. No Haiti, comandou 6.250 “capa-
cetes azuis” de 13 países durante 15 meses, contribuindo para a
pacificação de áreas de conflito em locais pobres das principais
cidades do país.
Além de comandante das tropas de coalizão no Haiti, o ge-
neral Augusto Heleno exerceu cargos importantes no Exército,
entre os quais o de chefe de gabinete do comandante do Exérci-
to, chefe do Centro de Comunicação Social do Exército e adido
militar do Brasil na França.
Em entrevista à Empório, o general fala da Amazônia, da situação
do Exército e de suas preocupações em relação ao futuro da região.
Lembrando uma célebre frase do brigadeiro Eduardo Gomes, afrma:
“O preço da liberdade é a eterna vigilância”.
38
O senhor defende uma fiscalização mais rigorosa a respeito da ação das ONGs na Amazônia. Por quê? Existem duas CPIs sobre ONGs. Isso advém de uma série de de-
núncias que vêm sendo feitas. O número estratosférico de ONGs
no Brasil é acima do normal. Boa parte delas atua na Amazônia. As-
susta também a qualidade de recursos, em torno de R$ 30 bilhões,
repassados às ONGs entre 1984 e 2006. Nessa mesma época, o
Exército recebeu R$ 6 bilhões, a quinta parte. Vendo a quantidade
de missões que temos na Amazônia, essa desproporção assusta
um pouco. Acredito que haja ONGs sérias, algumas com papel
preponderante em lugares onde o Estado não cumpre seu papel.
A Amazônia precisa substituir as ONGs por ações governamentais.
Essas ONGs representam uma ameaça para a re-gião? Levantamentos demonstram que existem mais de 200 mil
ONGs no Brasil, das quais mais de 100 mil atuariam na Amazônia
ou estariam voltadas para a região. As ONGs estrangeiras também
se beneficiam de recursos do nosso gover-
no. Em determinados locais, pela natureza
das atividades, começam a atuar em terre-
nos que podem mais tarde ser perigosos
para a segurança nacional. Um dos gran-
des riscos que corremos é essa pregação
de que não somos capazes de cuidar da
Amazônia. É inverdade, mas precisamos
melhorar o procedimento institucional em
relação a esta parte do país. É necessário
transformar palavras em ações, algo que
nos garanta o desenvolvimento institucio-
nal da região.
Muitos defendem a participação do Exército no combate ao des-matamento na Amazônia. O se-nhor é favorável? Em todas as crises desse tipo, o Exército
é lembrado. Gostaríamos que fôssemos lembrados também no
orçamento. Somos formados para adversidades, para crises, somos
preparados para a guerra. Já fomos lembrados para atuar na ques-
tão do desmatamento. Temos uma missão de apoiar em termos
logísticos aqueles que verdadeiramente são responsáveis por frear
ou impedir esse processo de devastação da Amazônia. Pode ser
que sejamos acionados para agir mais efetivamente, mas necessita-
ríamos de recursos enormes.
Como o senhor vê a Amazônia? A Amazônia é um dos
últimos redutos do planeta no qual alguns bens naturais importantes
para o mundo, como a água, os metais nobres, os minérios indispen-
sáveis à alta tecnologia e a biodiversidade são atraentes. Fora o papel
em si da floresta, como a biomassa resguardada de uma forma bri-
lhante. Se considerarmos o que foi feito com as florestas da Europa,
Ásia e Estados Unidos, somos grandes preservadores da natureza.
Hoje, o papel da Amazônia cresceu de forma exponencial.
A Amazônia é um desafio? Até agora, para a sociedade bra-
sileira, tem sido vista como uma coisa distante. Não há uma cons-
ciência nacional de que a Amazônia é nossa. É preciso vê-la como
a um filho que está dentro de casa e precisa de cuidados e da par-
ticipação da sociedade brasileira. Hoje, vejo a Amazônia como uma
evidente ausência do Estado, a ponto de nós, em muitos pontos,
sermos a única presença junto ao caboclo, que faz com que ele se
sinta brasileiro. Basta ver o papel que um tenente, comandante de
pelotão de fronteira, exerce. Ele representa na área em que atua,
além de comandante militar, a figura do delegado, padre, pastor, con-
sultor sentimental, orientador de saúde, dono
da educação, e ele tem na maioria das vezes
somente 24 a 25 anos.
Por que o senhor costuma dizer que a Amazônia é problema não só das Forças Armadas, mas da sociedade brasileira? Tem que ha-
ver convencimento da opinião pública de
que são problemas nacionais, não podem
ser entregues somente às Forças Armadas.
Nós somos o retrato fiel da sociedade.
O senhor acredita que seja real a ameaça de internacionalização da região por países estrangei-ros? Não sou catastrófico, mas precisa-
mos ser realistas e ter consciência de que, se nós permitirmos que
organizações estrangeiras sem nenhuma responsabilidade com o
destino da Amazônia brasileira continuem a desempenhar um pa-
pel preponderante junto a algumas comunidades, principalmente
indígenas, nós podemos ter o desprazer de, em médio prazo, essa
ameaça ser concretizada.
Quais as dificuldades orçamentárias enfrentadas pelo Exército na Amazônia? Além das dificuldades naturais
de uma área onde a infra-estrutura é deficiente, no transporte, na
comunicação, na energia, temos as mesmas dificuldades que nossos
companheiros têm em outras partes, ou seja, orçamento reduzi-
39
díssimo, material obsoleto, sérios problemas de moradia. Temos
quatro mil militares morando de aluguel. Diante de nossos venci-
mentos aviltados, moram em locais incompatíveis. Somente neste
ano, vamos aumentar o efetivo em 2,5 mil militares. Trouxemos
para cá uma brigada de 3,5 mil homens do Rio Grande do Sul, que
foi levada para Tefé, outra de Niterói, deslocada para São Gabriel
da Cachoeira, e uma de Petrópolis, que foi para Boa Vista. No total,
temos 25 mil homens hoje na Amazônia.
O soldado brasileiro é o mais bem preparado para a guerra na selva? Temos o melhor combatente de selva do mun-
do. Isso por dois motivos: nossos oficiais e sargentos possuem curso
de operações na selva do Centro de Instrução de Guerra na Selva,
reconhecido como o melhor do mundo, e os nossos cabos e solda-
dos são da área, conhecem detalhes da vida na selva e levam enorme
vantagem quando são colocados para operar nesse tipo de terreno.
Em grau de prioridade, a Ama-zônia ocupa qual escala para o Exército Brasileiro? Hoje, a priorida-
de um do Exército Brasileiro é a Amazônia,
porque nós sabemos, pelas peculiaridades
da região, que provavelmente a própria
atenção do governo federal vai se voltar
para a região amazônica. Temos mais de
11 mil quilômetros de fronteiras, com sete
vizinhos com os quais dividimos as preo-
cupações no combate aos ilícitos frontei-
riços. Só isso já justificaria a prioridade da
Amazônia.
As Forças Armadas Revolucioná-rias da Colômbia (Farc) represen-tam uma ameaça à região? As Farc
são um problema colombiano muito sério. Temos informações de que
elas não têm nenhuma intenção de tentar usar o território brasilei-
ro como base de operações, não só pelo nosso poder de dissuasão,
como também pela enorme dificuldade que teriam se criassem uma
nova frente de combate. Sei também que, se valendo de meios legais,
as Farc se abastecem logisticamente em algumas cidades brasileiras
próximas à fronteira e até se valem do atendimento médico que nós
disponibilizamos nessa área. Seus integrantes entram no Brasil legal-
mente, como cidadãos colombianos comuns, se valem dos nossos
recursos, retornam e se reintegram à guerrilha.
Há registros de conflitos entre guerrilheiros das
Farc e o Exército Brasileiro? Há algum tempo houve um
conflito entre o Exército Brasileiro e guerrilheiros das Farc no cha-
mado “Episódio do Traíra”, próximo ao 8º Batalhão de Infantaria de
Selva, em Tabatinga. Houve uma reação imediata de nossa parte e,
depois disso, não ocorreu mais nenhum problema.
Como o senhor analisa a questão do tráfico de dro-gas na Amazônia e qual o papel que o Exército pode desempenhar para combater a ação dos narcotra-ficantes? O tráfico de drogas é um dos grandes problemas da
Amazônia e do país inteiro. Com nossos vizinhos assumindo o papel
de produtores, somos compradores e um enorme mercado con-
sumidor também. No caso da Amazônia, avaliamos que a instala-
ção do Sivam/Sipam e a própria Lei de Abate coibiram bastante o
tráfego aéreo de drogas, mas reforçaram o tráfego nas calhas dos
rios penetrantes e navegáveis. São 23 mil quilômetros de rios nave-
gáveis, o que torna a fiscalização bastante difícil. E a falta de recursos
torna a tarefa ainda mais penosa. Tenho me
aproximado demais da Polícia Federal, que
conhece bem o assunto, e acho que temos
de trabalhar em conjunto.
A situação crítica da violência ur-bana no Rio de Janeiro preocupa o Exército? No Rio de Janeiro temos um
processo de deterioração da segurança pú-
blica e onde se repete o fenômeno da Ama-
zônia. O processo começou com a ausência
do Estado. Só houve o estabelecimento
dessas áreas sobre o controle do tráfico nas
favelas porque o poder público não pres-
sentiu que acontecesse. Faltam escolas, saú-
de, segurança permanente, até chegar a esse
ponto. Não é simples a solução. Quando as
ações são deflagradas, a polícia acaba sendo jogada contra a popu-
lação. E o apoio da população é fundamental, seja com informações
confiáveis, seja para reagir à influência daqueles que estão fora da lei.
A experiência no Haiti poderia ser aplicada no Rio de Janeiro? Já me perguntaram sobre isso. Lá, há um contraste
de uma missão de paz respaldada por regras de engajamento mui-
to claras e pelo guarda-chuva das Organização das Nações Unidas
(ONU). Além disso, nas favelas haitianas não há tráfico de drogas, o
que faz com que as gangues não lutem obstinadamente para con-
ter os pontos de venda. O terceiro aspecto é que os contingentes
dos diferentes países cumprem a missão e retornam às suas bases,
40
C riada em 28 de fevereiro de 1967 com o objetivo de es-
tabelecer um pólo de desenvolvimento industrial, comer-
cial e agropecuário no coração da Amazônia - relegada
ao isolamento econômico desde o fim do ciclo da borracha - a
Zona Franca de Manaus chega aos 41 anos comemorando avanços.
A iniciativa dos militares de ocupar a Amazônia para inte-
grá-la era parte de um amplo projeto de desenvolvimento e se-
gurança para a região. Como dizia Getúlio Vargas, no Brasil era
preciso se preocupar com três coisas: aço, petróleo e Amazônia.
Os militares seguiram a recomendação instalando em uma capital
remota, distante de tudo, um distrito industrial alimentado por
incentivos fiscais.
Manaus sem a ZFM era apenas um arremedo da outrora ci-
dade pujante do ciclo da borracha. Prédios abandonados ou em
ruínas, ruas esburacadas, população sem perspectiva, vazio demo-
gráfico. Em se tratando de uma área secularmente cobiçada, permi-
tir que a capital amazonense mergulhasse em profunda decadência
era abrir os flancos de uma região estratégica para o país.
A Zona Franca superou a fase crítica da montagem de peças,
componentes e produtos semi-acabados e da queda do núme-
Na era dosbiocosméticos
Fotos Euzivaldo QueirozNEGÓCIOS
41
Estado busca novos
A Zona Franca de Manaus passa por um momento positivo de crescimento, embora ainda tenha um longo caminho a percor-rer até o interior do Estado. A opinião é do secretário de Planeja-mento do Amazonas, Denis Minev. O projeto Zona Franca Verde é uma das iniciativas nessa di-reção. “Buscamos aumentar a produtividade do interior em vários segmentos, como óleos, essências, alimentos, madeira e outros pro-dutos florestais”, afirma. A convergência tecnológica, segundo ele, também se mostra como um grande desafio e oportunidade. A cada dia, fica mais difícil di-ferenciar os diversos aparelhos eletrônicos. “Produtos que antes eram separados, agora se encontram juntos; mídias de armazenamento mu-dam. A legislação da Zona Franca precisa acompanhar essas mudanças, sob o risco de nos tornarmos obsoletos com a tecnologia passada”. Outros desafios, na visão de Minev, dizem respeito à mão-de-obra e infra-estrutura. Em virtude do crescimento acelerado, a ZFM vive momento semelhante a um “apagão” de mão-de-obra. “O cres-cimento médio do PIB de cerca de 9% ao ano nos últimos cinco anos tem extrapolado a oferta”. A infra-estrutura ainda deixa a desejar, de acordo com o se-cretário. Nos transportes, o governo anuncia um “novo e moderno” porto em Manaus e uma ponte sobre o rio Negro, o que aumen-taria as possibilidades de crescimento geográfico na chamada região
metropolitana. O aeroporto internacional “precisa ser ampliado para atender maior número de vôos internacionais e carga”. Minev afir-ma que a ligação terrestre de Manaus a Porto Velho pode ser solu-cionada pela BR-319 ou por uma ferrovia. No setor energético, o gás natural é considerado um grande trunfo para se obter estabilidade de corrente e preços mais baixos. Nas telecomunicações, a ampliação de alcance dos celulares com a terceira geração deve ser prioridade nos próximos anos. As Zonas de Processamento de Exportação (ZPE’s), que po-dem ser criadas no Nordeste, preocupam. A expectativa é que elas possam ser desenhadas de tal forma a não competir diretamente com a ZFM. A limitação de vendas no mercado doméstico seria uma boa medida, na opinião do secretário. Buscar alternativas econômicas à Zona Franca de Manaus é outra preocupação do governo. Foram identificadas seis vertentes de desenvolvimento para o Amazonas: Zona Franca, recursos na-turais, turismo, energia, serviços e serviços ambientais. Além da ZFM, que responde por mais de 50% da economia estadual, o governo deve investir nesses outros setores. “O Zona Franca Verde busca o desenvolvimento de forma sustentada dos recursos naturais, que inclui madeira, borracha, produtos de agri-cultura ou extrativismo, peixes, minérios, água, dentre outros”. No turismo, o potencial é enorme, mas essa é uma atividade cuja contribuição é inferior a 2% da economia estadual. No setor energético, o Amazonas “abre uma nova fronteira com a chegada do gasoduto de Urucu, tanto na melhoria na geração de energia quanto no surgimento de novas indústrias”, garante Minev.
ro de empregos, recuperou a competitividade, venceu a barreira
das 100 mil vagas de trabalho, avançou no processo produtivo e
conquistou o pólo de biocosméticos. Seria difícil imaginar o Brasil,
agora, sem esse modelo econômico no meio da selva.
São 450 empresas de diversos setores da indústria - do pólo
de duas rodas ao eletroeletrônico - exportando produtos que em
2007 garantiram um faturamento superior a US$ 20 bilhões. Com
prazo renovado para vigorar até 2023, enfrenta uma guerra fiscal
que parece eterna com São Paulo.
Nesse complexo de indústrias instalado em Manaus, des-
taca-se o pólo de duas rodas, segundo maior do mundo, e o
novíssimo pólo de biocosméticos, que em três anos deve gerar
10 mil empregos, agregando valor de 40% com matérias-primas
regionais.
Um dos novos negócios da ZFM é a TV digital, que substitui
a analógica. Manaus será o pólo dos produtos de consumo da TV
digital. É um avanço que precisaria ser acompanhado por investimen-
tos em tecnologia. A contrapartida, porém, não é a mesma. Tanto a
Universidade Federal do Amazonas, quanto a Universidade Estadual
do Amazonas e o próprio Centro de Biotecnologia da Amazônia en-
setores de desenvolvimento
42
Por André VianaFotos Ruth JucáNEGÓCIOS
Q uando a novela “Rainha da Sucata” foi ao ar, em 1990, até o texto de
Sílvio de Abreu teve de ser refeito, ou mais precisamente, reciclado. É
que a novela estreou no período em que se lançava o Plano Collor.
O autor foi obrigado a adaptar o texto à nova realidade do economês. No Pólo
Industrial de Manaus, o processo de reciclagem não é uma obra de ficção, mas
guarda muitas semelhanças com a novela global em virtude da abrangência do
trabalho de reaproveitamento de resíduos. Não se reciclam textos, mas se reci-
clam papel e muitos outros produtos.
Hoje, no Amazonas, várias empresas trabalham no setor, formando um pool
especializado no tratamento de diferentes tipos de “sucata”. O negócio é tão
lucrativo que saltou de três indústrias, no final da década de oitenta, para dez,
poucos anos depois. O ultimo levantamento feito estima que oito mil pessoas
estejam vinculadas direta ou indiretamente ao processo de reaproveitamento de
resíduo. Esse pool faz com que, a cada dia, menos lixo industrial seja incinerado e
apenas os resíduos orgânicos, depositados no aterro sanitário.
Um dos melhores exemplos é o trabalho feito pela Coplast (maior
empresa de reciclagem da América Latina) com 30 anos de atuação na
Zona Franca de Manaus. Se, na natureza, o químico francês Antoine Lau-
rent Lavoisier (1743-1794) introduziu a máxima de que “nada se cria, nada
se perde: tudo se transforma”, no pólo industrial, o empresário Reginaldo
Pizzonia – pai do ex-piloto de Fórmula 1 Antônio Pizzonia – demonstra
com sua empresa de reciclagem que, no ramo industrial, tudo se cria, nada
deve se perder, tudo pode ser reaproveitado. Desde a descontaminação de
lâmpadas fluorescentes à reutilização do plástico de barbeadores e escovas
de dentes com falhas na fabricação.
Mas, a idéia da implantação de uma indústria de materiais reciclados, a princi-
pio, encontrou resistência. Os resíduos reaproveitados não tinham boa aceitação
no mercado, pois eram freqüentemente associados a materiais de segunda linha.
O setor industrial preferia continuar extraindo do meio ambiente as matérias-
primas para alimentar as fábricas a ter sua marca ligada à “sucata”.
Tudo se cria, nada se perdeReciclar é preciso
43
44
Mas, o tempo passou e o preconceito foi ficando para trás. A questão am-
biental começou a pesar favoravelmente na balança, chegando ao ponto de ser
vetor estratégico para a sobrevivência no mercado.
Só para se ter uma idéia da preocupação de algumas empresas com o rea-
proveitamento de material, entre 60% e 85% dos componentes de um telefone
celular Nokia são recicláveis.
“Qualquer resíduo que há alguns anos seria jogado fora nas fábricas, hoje
é reciclado e tem seu retorno garantido ao mercado, pois além de preservar a
mesma característica e qualidade, é mais barato do que um produto que nunca
foi utilizado”, afirma Rodrigo Pereira, gerente comercial da Coplast.
Uma resina plástica virgem, por exemplo, que custa no mercado R$ 2,70,
quando reciclada, sai por R$ 2,45. Em outros produtos, a economia pode chegar
a 15% ou 20%.
A Coplast domina o mercado brasileiro de reaproveitamento do plástico. E foi
a primeira a obter a técnica de reciclar o isopor, um dos resíduos mais difíceis de ser
trabalhado, além de extremamente nocivo ao meio ambiente. Atualmente, a recicla-
gem do isopor é feita pela Oriente Polímeros, um braço empresarial da Coplast.
O processo de reciclagem plástica é complexo, mas ágil. A empresa tem
capacidade de processar mil toneladas/mês, e está expandindo essa cota em
virtude da demanda do mercado.
Quando um resíduo plástico é coletado de um cliente, ele obedece às seguin-
tes etapas: coleta seletiva (separação dos vários tipos de plástico), classificação, moa-
gem, mistura, extrução (derrame da lava já solidificada), resfriamento, granulação,
embalagem e, finalmente, o produto está pronto para voltar ao mercado.
“A industrialização desse processo nos permite colocar de volta ao merca-
do um produto dentro das especificações exigidas pelas empresas. Hoje, com o
aperfeiçoamento da técnica de reciclagem, não existe diferença entre um material
nunca utilizado e outro que já foi resíduo”, garante Pereira.
Além do plástico e do isopor, outros produtos também são reciclados na
Zona Franca. Papelão, pneu, metais ferrosos e não-ferrosos são tratados pela Rio
Limpo. A sucata ferrosa, pela Cometais. A incineração de resíduos perigosos, não
passíveis de reciclagem, é feita pela Premix. Nesse processo, até computadores
são reciclados e enviados para comunidades do interior.
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Só para se ter uma idéia da preocupação das em-presas com o reaprovei-tamento de material, en-tre 60% e 85% dos com-ponentes de um telefone
Nokia são recicláveis
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Conscientização é isso aí
Além de peças, hoje é muito comum também o aproveitamento de líquidos.
Cada vez mais empresas descontaminam as águas utilizadas no processo indus-
trial para lavar pátios ou molhar jardins. Na verdade, o tratamento de efluentes é
uma obrigação de todas as indústrias sediadas na Zona Franca de Manaus.
No entanto, para a Recofarma – indústria amazonense que fabrica o con-
centrado do refrigerante mais vendido no mundo – esse trabalho é motivo de
orgulho. A empresa, que abastece todo o mercado brasileiro e mais três países
sul-americanos (Paraguai, Venezuela e Colômbia), adotou há sete anos um ousa-
do programa de reaproveitamento de efluentes, e tem conseguido significativos
avanços, como a redução em 52% do consumo de água.
“A preocupação ambiental é uma exigência do presidente mundial da marca,
o irlandês Neville Isdell, sociólogo que, de Atlanta, nos Estados Unidos, dita as
diretrizes para as subsidiárias. Reduzir o consumo de água é uma meta da compa-
nhia, independentemente do custo que isso possa gerar para a empresa”, afirma
Antônio Carlos Pereira, gerente operacional da Recofarma.
A empresa trata 120 metros cúbicos de água diariamente, reutilizando cerca
de 50 metros cúbicos. O restante é reconduzido ao sistema de drenagem da
rede pública. A excelência na qualidade do tratamento dado aos efluentes per-
mite que a empresa se dê ao luxo de criar tambaquis utilizando o produto final
desse processo. “Temos um laboratório químico que analisa a qualidade da água
que será reposta na rede pública, mas fazemos questão de manter esse tanque
de peixe na empresa, uma vez que ele é a prova cabal e deliciosa do sucesso do
nosso serviço”, conta Marcelo Santana.
Por se tratar de uma empresa líder mundial em seu ramo, a fabricante de re-
frigerante também tem procurado mostrar para a população, por meio de ações
conjuntas, o lado positivo de ações ambientais. “Em setembro do ano passado,
fizemos um trabalho de limpeza na Bacia Hidrográfica do Tarumã-Açu. Em apenas
quatro horas, retiramos 3.760 quilos de resíduos nocivos ao meio ambiente”,
informa Daniel Mendonça, gerente de Relações Externas e Comunicação.
Se o desenvolvimento de uma sociedade é proporcionalmente inverso à
quantidade de lixo que ela produz, o trabalho desenvolvido pelas empresas do
Pólo Industrial de Manaus é importante exemplo para tornar arraigado o hábito
de reaproveitar para não poluir.
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Fotos Marcio AmaralMODA
NATUREZAMORTA
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Camisa Reinaldo LourençoHotpant NeonFlor Acervo PessoalCinto CantãoBota Melkzda
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Corpete AlcaçuzSaia Reinaldo Lourenço
Cinto Calvin KleinBota Fause Haten
Flor Acervo Pessoal
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Corpete AlcaçuzSaia Reinaldo LourençoCinto Calvin KleinBota Fause Haten Flor Acervo Pessoal
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Vestido e gola Raia de Goeye
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Blusa, colete e saia Melkzda
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Vestido VivazCasaco Cris BarrosLuva ForumBota Fause HatenCinto e flor Acervo Pessoal
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Vestido e bota MelkzdaCinto Cantão Flor Acervo Pessoal
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Vestido CovenSapato Paula FerberCinto Calvin KleinLuva Forum Meia Calça Acervo Pessoal
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Vestido Bárbara Bela Luva ForumChapéu Acervo Pessoal
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Styling Augusto CarneiroProdução de moda Rafaela OliveiraMake Odyr BarreiraModelo Sally Menezes (Mega)
Casaco SAADVestido Zidi Bota MelkzdaFlor Acervo Pessoal
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Fotos Fabiano HerreraMODA
CONSCIÊNCIA
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Camisa VilCasaco Levi’s
Calça e cinto Sérgio K.Gorro Acervo Pessoal
Mochila Pipe
Máscara Walério AraújoPolo Pipe
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Máscara Walério AraújoTerno, blusa e calça Mário Queiroz
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Jaqueta Alexandre HerchcovitichCalça saruel NCD
Regata HeringMáscara US Army
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Colete e camiseta Sérgio K.Cachecol Acervo Pessoal
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Calça de couro Calvin KleinMoleton V. Rom
Cachecol RipCurlMáscara de gás US Army
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Blusa tricoline VRCalça Fórum
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Calça de penas Walério Araújo
Make RennerProdução Caio Assunção e EduardoImagens Ellen RochaEdição Rafael MenezesModelosAndré Zambam e Alex Voltarelli (Mega)Igor, Raphael e Ismael (Way)Iuri Jasper (Mônica Monteiro)
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Por Sebastião ReisFotos Maíra CoelhoDESTINO
cinematográficoUm paraíso
Imagine entrar numa cidade cenográfica, de ruas estreitas e bem cuidadas, casas pequenas e aconchegantes, uma igreja em estilo colonial do século passado e muita gente "famosa" pe-rambulando por todos os cantos. Barcelos, paraíso natural à margem direita do rio Negro, a 396 quilômetros de Manaus, vem se transformando exatamente nisso: um cenário de filme.
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O pequeno avião bimotor sobe levando tapas do vento. Estamos deixando
Manaus a caminho de Barcelos, paraíso natural situado à margem direita
do rio Negro, a 396 quilômetros da capital em linha reta e 656 quilô-
metros via fluvial. São uma hora e meia de viagem sobre uma região repleta de rios,
igapós, dunas de areias branquíssimas e praias, muitas praias, como um imenso lençol
estendido ao longo do caminho. Nosso destino é um município de 89.572 quilôme-
tros quadrados que abriga o maior arquipélago fluvial do mundo (Mariauá, área de
proteção ambiental com mais de 1.400 ilhas) e consta no Guines Book (Livro dos
Recordes) pela maior extensão de dunas de areia branca de rio do mundo.
Barcelos não é apenas um paraíso turístico, reduto de amantes da pesca es-
portiva, que se deslocam para lá à procura de aventuras e remédio natural anties-
tresse. É também a cidade cenográfica da Amazônia. Andar por suas ruas estreitas
é esbarrar em célebres anônimos, moradores do local que da noite para o dia
ganharam as telas como atores ou figurantes nos longas-metragens “A Festa da
Menina Morta”, produção nacional que marcou a estréia de Matheus Nachtergaele
como diretor e roteirista, “Eclipse Solar”, do diretor austríaco Herbert Brödl, e
“Aviadores”, outra produção do mesmo diretor.
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Dona Iaiá, nome de batismo Maria Ramos de Alencar, 61, é um desses
ilustres moradores do município que ganhou notoriedade por seus papéis
no cinema. Encontramos a atriz numa noite de sábado. Embala-se preguiço-
samente numa cadeira na esquina de uma rua, conversando com amigos e
vendo o tempo passar na bucólica cidade. Estreou em “Curupira”, produção
regional do cineasta Júnior Rodrigues, na qual fazia uma velha cega. Ela era “Vó
dele” e ele, “Curumim dela”, assim avó e neto se tratavam no filme. “Gostei
de trabalhar em ‘Curupira’ porque andava pela floresta, igapós e praias à noite
com fogueira. Foi uma aventura muito boa”, afirma dona Iaiá, que também
gravou “Eclipse Solar”. Sobre o filme “A Lenda da Menina Morta”, que movi-
mentou a cidade, diz que não participou porque o cachê era de R$ 15 por
dia. “Ganho isso costurando”.
Iaiá só viajou o mundo nas telas de cinema. Nasceu em Barcelos e conheceu
duas cidades: Manaus e Letícia, na Colômbia. Ao falar sobre suas perspectivas
como atriz, porém, vai longe: “Te cuida, Fernanda Montenegro!”.
O momento mais esperado por esses artistas caboclos é a estréia dos filmes
em praça pública, na orla da cidade, de frente para o rio Negro. Um cinema im-
provisado em meio à natureza. Todos se vestem como se fossem para uma festa.
Ao final da exibição, são tratados como estrelas. Dona Iaiá não se cansa de dar
autógrafos. Carinhosamente, pega meu caderno de anotações e escreve: “Agra-
deço ao querido amigo”, assinando logo abaixo. Tenho o autógrafo de Iaiá.
Difícil na cidade é encontrar quem não fez figuração num dos filmes, seja
aparecendo rapidamente ou envolvido no meio da multidão. Mas também há
famosos te esperando na esquina. Dar de cara com o ator Matheus Nachtergaele
(“Central do Brasil”, “Auto da Compadecida” e “Cidade de Deus”) é comum.
Desde que se apaixonou por Barcelos, nunca deixou de visitá-la. Comprou um
terreno na cidade. É cidadão barcelense.
Os moradores têm uma relação próxima com astros da TV. Durante a fil-
magem de “A Lenda da Menina Morta”, a equipe comandada por Nachtergaele
ficou três meses na cidade. A sede dos Correios foi transformada em restaurante
pela prefeitura para atender os visitantes. Na festa de despedida, no sítio de João
Enecy, assessor do prefeito, os atores Matheus, Daniel de Oliveira (o “Cazuza”),
Beth Goulart, Jackson Antunes, Cássia Kiss, Dira Paes, dentre outros, se divertiram
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até altas horas. “Foi uma noite inesquecível”, conta Enecy. A noite serviu também
para gravações das últimas cenas.
Um dos artistas surpreendeu a cidade ao sair à noite de cuecas à procura
de algo para comer. Caiu nas graças do hospitaleiro e bem-humorado povo de
Barcelos. Seria a festa dos paparazzi.
Barcelos é a terra onde, segundo a lenda, viveu o índio Ajuricaba, herói que
se lançou acorrentado às águas para não ser levado a Belém pelos portugueses.
Não é difícil encontrar por lá descendentes de índios, dos barés aos tukanos, hoje
serventes de pedreiros, agricultores ou funcionários de repartições e, em dias de
gravações, figurantes.
A busca pelo aparelho celular no bolso é inútil. O costume nos faz lembrar
do telefone móvel e ouvir o toque dele em todos os lugares. Pura ilusão. Em Bar-
celos não existe sinal de telefone celular. É relaxar e gozar, como disse a ministra
Martha Suplicy em pleno auge da crise na aviação. No caso dela, total infelicidade.
No nosso, suprema felicidade. Lá vem Bebeto, o astro de “Curupira”, neto de Iaiá.
Nessa noite, despido do papel de artista. Empurra um carrinho cheio de bugigan-
gas. O “Curumim dela”, agora, é vendedor de rua. Vida que segue.
Gerôncio Rosa Silva Lima Filho, 30, o “Curupira” do filme, fora das telas é
presidente da Associação dos Serradores e dos Mototaxistas e dono de uma
serraria. Uma entidade no filme e nas funções. Laurienne Gomes, 20, atriz que
participou dos três longas-metragens rodado na cidade, pode ser encontrada
na Wikipédia, a enciclopédia livre da internet, e no bairro Jorge Teixeira, periferia
de Manaus, para onde se transferiu a fim de completar seus estudos. Passa o dia
na Escola Agrotécnica, na Zona Leste da cidade. O lugar é tranqüilo, cercado de
árvores por todos os lados, assim como um pedaço de sua cidade natal. Barcelos
pulsa. As pessoas sempre têm um motivo para se encontrar.
Aniversário é local certo para ver todo mundo reunido. O promotor Cláudio
Sampaio, baiano, uma das principais autoridades da cidade, afirma, feliz: “Conheço
muita coisa no Amazonas, mas igual a Barcelos, nada”. É fim de temporada. Os
turistas partiram, os atores famosos embarcam de volta para suas cidades. Barcelos
continua, para receber a volta das águas subindo ladeira acima, encobrindo praias e
levando uma beleza para trazer outra, a do imenso espelho refletindo a cidade. As
pessoas passam, o município fica, a contemplar passado, presente e futuro.
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Cidade Ornamental
COMO CHEGARHá vôos duas vezes por semana (quarta e domingo) partindo de Manaus.
A única empresa que faz a rota atualmente é a Trip (92. 3652-1263).
Barcos regionais partem do porto de Manaus (92. 2123-4350) de duas
a três vezes por semana.
INFORMAÇÕESPrefeitura Municipal: 97. 3321-1200 • 3321-1115
Central de Atendimento ao Turista (CAT): 97. 3321-1201
Barcelos, a 396 quilômetros de Manaus, primeira capital do Estado do
Amazonas, é o terceiro maior município do mundo, só perdendo para Altamira
(PA) e Kiev, na Rússia. São mais de 122 mil quilômetros quadrados de extensão,
com 24.700 habitantes.
A economia do município está apoiada no extrativismo, principalmente da
piaçava, do peixe ornamental e, nos últimos anos, em atividades turísticas, na qual
a pesca esportiva se sobressai.
Barcelos tem uma festa que, pela grandiosidade, características e participa-
ção popular, lembra o festival de Parintins. É o Festival do Peixe Ornamental. Os
grupos de dança Cardinal e Acará Disco – nomes dos principais peixes de ex-
portação – se enfrentam no último fim de semana de janeiro na arena do Centro
Mariauá, apelidado de “piabódromo”.
A rainha do evento é a bela Rafaela Raíssa Avelar, 15, que sonha ser modelo.
Os olhos de onça e a beleza cabocla impressionam. Tem atitude. Posa para as len-
tes da fotógrafa Maíra Coelho como se isso fosse a coisa mais natural do mundo.
O olhar fixo, desafiador, se sobressai.
Barcelos tem hotel de selva de padrão internacional, o Rio Negro Lod-
ge. Toda essa atividade de turismo funciona no verão, de outubro a março.
Depois disso, o rio sobe e o turismo entra em declínio. É a época em que os
peixes fogem para os igapós. “Queremos transformar esses seis meses nos
quais não existe atividade turística para que, também no inverno, exista algu-
ma atividade, como caminhadas na selva e rota dos igapós”, afirma o prefeito
Valdeci Raposo e Silva, 55.
O município foi incluído entre os 65 principais roteiros turísticos do país.
O objetivo do Ministério do Turismo é alcançar nesses roteiros um padrão
internacional de qualidade nos serviços prestados. No Amazonas, foram sele-
cionados Manaus, por ser a capital, Parintins, em virtude do festival folclórico, e
Barcelos. Dos 65, foram selecionados dez para serem trabalhados inicialmente.
Barcelos está entre eles.
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Por Felipe MacielTURISMO
O velho ditado popular já dizia que quem nasceu para rei
nunca perde a majestade. A máxima cai como uma luva
para o Rio de Janeiro, que celebra os 200 anos da chega-
da da família imperial portuguesa à cidade. A então modesta capital
da maior e mais importante colônia portuguesa não lembrava nem
de perto a pujança das metrópoles européias. Com ruas acanhadas,
sem calçamento e saneamento básico, de casas simplórias com ape-
nas um pavimento e nenhuma ornamentação, a cidade era também
pouco atraente, em virtude da incipiente vida cultural.
Por isso mesmo, a transferência da corte para o Brasil pode ser
considerada o marco civilizatório brasileiro. O Rio de Janeiro passou
por sua primeira grande transformação política, econômica, urbana e
cultural, tornando-se digna de centro do Império ultramarino portu-
guês. Passados dois séculos da excepcional fuga dos Bragança e da
corte lusa para a colônia na América, no ímpeto de escapar da invasão
das tropas de Napoleão, o Rio de Janeiro perdeu a coroa e o status de
palco das decisões políticas. Entretanto, a cidade, como naqueles tem-
pos, continua a ser a caixa de ressonância do que acontece no país. A
antiga capital imperial não ostenta o glamour de outrora, mas os ecos
do passado permanecem nos símbolos da única cidade das Américas
a sediar o poder político de uma dinastia européia.
Para apresentar o Rio dos tempos de dom João VI, que só
retornou a Portugal em 1821, deixando para trás uma nova ci-
dade e um país às vésperas da independência, e também sugerir
um roteiro do Rio “imperial” de hoje, a revista Empório convidou
Bruno Chateaubriand, jornalista e produtor de eventos. Acostuma-
Rio majestoso,mesmo sem coroado a receber celebridades, ele é uma referência de bom-gosto e
sofisticação. Perguntamos a Chateaubriand que lugares ele considera
majestosos no Rio de hoje e quais os endereços fundamentais para
reconstruir a história de um período em que a cidade era habitada por
um rei bonachão e vacilante e uma rainha de origem espanhola, que não
nutria um pingo de simpatia pelo calor e provincianismo dos trópicos.
“Segui um critério histórico para compor esse roteiro. São lu-
gares que estão diretamente associados ao início do século XIX,
onde a vida na corte se desenvolveu”, afirma o jornalista, para em
seguida justificar as escolhas dos locais “imperiais” do Rio atual. “O
que destaco são as belezas naturais: as praias do Leblon, Ipanema
e Copacabana, o Pão de Açúcar, o Corcovado e o Jardim Botânico.
Sei que são clichês, mas nenhuma metrópole mundial foi tão bem
servida nesse ponto como o Rio de Janeiro. As praias, as montanhas,
as lagoas superam qualquer endereço elegante que pudesse citar”.
Morador da avenida Atlântica, vizinho ao Copacabana Palace,
endereço mais internacional do Brasil, Chateaubriand está acostu-
mado a conviver com o jet set e a freqüentar lugares dignos de reis
e rainhas. O jornalista buscou eleger ícones urbanos diretamente
relacionados ao cotidiano da família real e do séqüito de nobres,
que disputavam ardorosamente os títulos nobiliárquicos que os
distinguissem do restante da plebe.
A antiga nobreza imperial, impecavelmente vestida à moda
européia, exibia seus trajes importados de boutiques francesas ou
adquiridos na rua do Ouvidor. Os nobres circulavam pelo Passeio
Público, primeiro ponto de encontro da cidade, nas proximidades
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da Lapa, e na praça XV, nos arredores do Paço Real, atual Paço
Imperial, onde as decisões administrativas da colônia eram tomadas
pelo monarca. Freqüentavam a missa da Igreja de Nossa Senhora
do Carmo da Antiga Sé, que, durante a estada do dom João VI no
Brasil, foi a capela real da cidade e também o local onde o príncipe
regente foi aclamado rei de Portugal, Brasil e Algarves, em 1818.
A cidade, acanhada, contava à época com apenas 46 ruas. Seus
domínios alcançavam os bairros da Glória e do Catete, ao sul, e do
Catumbi, Rio Comprido e São Cristóvão, ao norte. Foi justamente
no casarão na Quinta da Boa Vista, em São Cristóvão, cedido pelo
próspero comerciante Elias Antônio Lopes, que dom João fixou
residência no ano seguinte à chegada ao Brasil. Carlota Joaquina
manteve o mesmo hábito dos tempos em Lisboa, quando já não
dividia o mesmo teto com o príncipe regente, preferindo morar
em outro endereço, no atual Flamengo, bem distante do marido.
São justamente esses os locais citados por Bruno Chateaubriand
como fundamentais para compreender a dinâmica da aventura dos
monarcas portugueses em solo brasileiro. A esses símbolos histó-
ricos, o jornalista acrescentou o Jardim Botânico, que permanece
como um dos cartões-postais da cidade, e o convento de Santo
Antônio, no largo da Carioca.
Bruno ressalta também a estrutura criada às pressas para “civili-
zar” o Rio de Janeiro em função do baixo orçamento que a colônia
dispunha para o desenvolvimento próprio. Praticamente da noite para
o dia, a cidade se transformou. Primeiro, com a abertura dos portos
às nações amigas imposta pela Inglaterra, e na seqüência com o sur-
gimento da imprensa régia, de instituições político-administrativas, da
Casa da Moeda, do Banco do Brasil, das Academias Real da Marinha,
de Belas Artes e de Medicina, da Real Biblioteca Pública e do Jardim
Botânico. Outro aspecto importante foi a missão de artistas franceses,
entre eles Debret, Taunay e Montigny, encarregados de ilustrar a nova
capital do Império, aproximando-a dos centros europeus.
“Se a família não tivesse vindo para o Brasil, provavelmente
seríamos como nossa vizinha América espanhola, repartida em di-
versas repúblicas, só que falando português. Foi o pulso firme de
uma monarquia local que impediu o esfacelamento do território
durante a Independência”, acredita.
De lá para cá, o Rio mudou. Deixou de ser capital do Império
e posteriormente da República. Seu eixo elegante também passou
por drásticas transformações. Sem a pompa do passado, assumiu a
vocação praieira que consagraria a cidade. O banho de mar - que
não era difundido no século XIX, sendo somente indicado para
tratamento de doenças - e a vida social guiada pela orla, são novi-
dades do século XX.
Copacabana, um grande areal até a década de 30, só se con-
sagraria “Princesinha do mar” no pós-guerra, enquanto Ipanema só
assumiria o papel de musa a partir da década de 60. A expansão
pela porção litorânea da cidade passou a guiar o crescimento urba-
no. Na década de 80, seria a vez de a Barra da Tijuca viver o boom
imobiliário, que dura até hoje. Mas aí, o Rio já tinha abandonado
havia muito tempo a influência européia para assumir o sonho de
vida yankee, com avenidas retas e shopping centers.
Bruno Chateaubriand em um dos lugares que considera ponto de visitação obrigatório no Rio de Janiero: o Jardim Botânico
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O Palácio da Ilha Fiscalsediou o último baile dacorte portuguesa no Brasil
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Entre os lugares do Rio imperial e do contemporâneo destacados pelo jornalista e
promoter Bruno Chateubriand, somente o Jardim Botânico é citado nas duas ocasiões. Cria-
do pelo então príncipe regente em junho de 1808, o Jardim de Aclimação, logo denominado
Real Horto, foi idealizado para abrigar espécies exóticas da flora, em especial do Oriente.
O local, embrenhado na floresta, encontrava-se bem distante do burburinho da cidade,
próximo à Fábrica de Pólvora, no antigo Engenho de Cana-de-Açúcar de Rodrigo de Freitas.
Entre as várias espécies introduzidas, nenhuma chama mais a atenção que as palmeiras im-
periais, plantadas desde 1809. Atualmente, as árvores seguem firmes no cenário, enfileiradas,
emoldurando a paisagem e atraindo a atenção de quem passa pelo caminho.
Passear pelo interior do grande horto florestal reserva belas surpresas que remon-
tam ao passado imperial. Em meio às árvores, pode-se ver o portal em estilo neoclássico
da antiga Academia de Belas Artes, projetado por Grandjean de Montigny, em 1821. O
mesmo arquiteto ergueu no Centro, em 1819, o prédio que abriga a atual Casa França-
Brasil, considerado um dos poucos remanescentes do período neoclássico na cidade.
Atualmente, o Jardim Botânico abriga uma coleção com cerca de oito mil espécies
da flora nacional e de várias partes do mundo, além de área remanescente de Mata
Atlântica. Segundo o jornalista, o que chama a atenção é o fato de temas tão atuais, como
biopirataria e biodiversidade, já estarem presentes no Brasil do século XIX. “Acho o Jar-
dim Botânico fascinante e uma de nossas heranças mais importantes, principalmente em
função da questão ambiental, que predomina no mundo contemporâneo. É um lugar do
Rio imperial que se mantém, ainda hoje, tão atual”, defende.
Para o jornalista, o Rio dispõe de excelentes opções urbanas de lazer. Chega a citar
o Antiquarius e o Le Pré Catelan como bons restaurantes e recomenda visita ao mu-
seu Histórico Nacional e ao museu de Arte Contemporanea de Niterói, planejado pelo
premiado arquiteto Oscar Niemeyer. No entanto, é a paisagem natural que fascina o
estrangeiro desde o Descobrimento até os dias de hoje.
Bruno indica uma caminhada, com direito a banho de mar e água de coco, pelas praias
do Leblon e Ipanema, demarcadas pelo morro Dois Irmãos e pela pedra do Arpoador. A
orla de Copacabana, ao lado, é também indispensável pela beleza de seu contorno. Sugere
a subida ao Corcovado, recentemente eleito uma das sete maravilhas do mundo moderno,
pelo trenzinho, que corta o morro em meio à floresta ainda preservada, e o passeio no
bondinho do Pão de Açúcar, que oferece uma das vistas mais deslumbrantes da cidade.
“É na orla que o carioca dita moda. Essa é a característica primordial do carioca. Em qual
cidade grande do mundo, as pessoas andam pela rua como estivessem à beira-mar?”, explica
o jornalista, que só lamenta o descaso dos governos com a conservação da memória histórica.
“Somos um povo com pouca auto-estima. Não fomos ensinados a amar nossa his-
tória. Ao contrário, temos a cultura do desprezo pelo passado. Estamos num ano de
comemoração e pouca coisa acontece para nos lembrarmos da importância da chegada
da família real, quando na verdade só passamos a existir de fato em 1808”, conclui.
O jardim de dom João
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Roteiro do Rio históricoPaço Imperial
Edifício em estilo colonial na atual praça XV, construído em 1733, foi o centro de acon-
tecimentos políticos, festas e cerimônias reais do período joanino no Brasil. O Paço Real,
hoje conhecido como Paço Imperial, era a sede de despacho do vice-rei na ocasião da
chegada do príncipe regente. Foi cedido a dom João para se tornar sede do Império.
Passou ao longo da história por diversas intervenções arquitetônicas. Atualmente o es-
paço é utilizado para mostras e exposições de arte.
Quinta da Boa Vista
Localizada no bairro de São Cristóvão, Zona Norte do Rio, integram suas dependências
um parque público, o Jardim Botânico do Rio de Janeiro e o Museu Nacional do Brasil,
instalado no antigo Paço de São Cristóvão, num palácio de estilo neoclássico, utilizado
como residência da família imperial.
Igreja Nossa Senhora do Carmo (Antiga Sé)
Transformada em capela por dom João em 1808, a igreja em estilo rococó, com orna-
mentos e talhas em dourado, foi palco de importantes eventos históricos, como a sagra-
ção de dom João VI e a coroação de dom Pedro I e dom Pedro II. Os membros da família
imperial nascidos no Brasil foram batizados nessa igreja. Perdeu o título de catedral em
1977. Atualmente em reforma, será reaberta ao público em 8 de março de 2008.
Convento de Santo Antonio
Erguido no morro de Santo Antônio, trata-se de um dos mais antigos complexos arqui-
tetônicos coloniais do Rio de Janeiro. Sua origem remonta a 1592. A imagem de Santo
Antônio está intimamente ligada à resistência da cidade às investidas francesas, uma vez
que os portugueses recorreram ao santo para pedir proteção. Em 1810, dom João se
impressionou com a história e promoveu a imagem do santo a sargento-mór, conferindo-
lhe um bastão cravejado de pedras preciosas.
Passeio Público
Inaugurado na segunda metade do século XVIII, o primeiro logradouro público da cidade
do Rio de Janeiro foi inspirado no Passeio Público de Lisboa. O desenho do espaço foi
incumbido ao escultor e arquiteto Mestre Valentim, que projetou o parque seguindo o
modelo francês. O Passeio recebeu ornamentações, com destaque para o chafariz de
mestre Valentim e o belo portão de acesso forjado em ferro, destacando o brasão com
as armas reais e as efígies de dona Maria I, rainha de Portugal à época.
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Das cinzas à modernidade
Por Jair RaccinerFotos Paulo AmorimTURISMO
E ntrar em Lisboa é como mergulhar na história do Brasil, voltar
ao passado, ver onde tudo praticamente começou desde que
a família imperial e sua corte abandonaram Portugal, em 29
de novembro de 1807, e partiram rumo a sua colônia sul-america-
na fugindo de Napoleão Bonaparte. Um episódio espetacular que,
para muitos, significou extremo ato de covardia e, para outros, um
belo drible em Bonaparte, imperador francês que teve a coragem
de admitir depois, em suas memórias, referindo-se a dom João VI:
“Foi o único que me enganou”. Esse fato serviu para mudar a his-
tória de Portugal e do Brasil.
Hoje, mais de 200 anos depois, a capital portuguesa – na con-
dição de cidade mais rica do país e segundo centro econômico da
Península Ibérica, atrás apenas de Madri – convive entre o antigo e o
moderno. Portão de entrada para a Europa, Lisboa tem o poder de
reagir às dificuldades, como ocorreu após ter sido destruída por um
terremoto, em 1755, ressurgindo bela e imponente com a chamada
arquitetura pombalina, marcada por obras modernas, sem perder, po-
rém, traços importantes de seu passado.
No período em que a família imperial deixou Portugal de um
dia para o outro, pegando a população de surpresa antes da che-
gada das tropas francesas, o país era um dos mais atrasados da Eu-
ropa. No livro “1808”, o jornalista Laurentino Gomes escreve que
ainda vigorava o regime de monarquia absoluta, ou seja, o rei tinha
poder total, ao contrário de países como Inglaterra e Holanda, em
que a realeza perdia espaço para os grupos representados no Par-
lamento. Portugal era um país extremamente católico e avesso às
idéias inovadoras que transformavam a ciência, a indústria e abriam
espaço aos ideais republicanos.
Naquela manhã em que Portugal amanheceu sem suas refe-
rências de comando, num total vazio de poder, a população sentiu-
se órfã, à mercê dos franceses que batiam à porta. O país havia sido
entregue à própria sorte. “Portugal era um país pequeno, rural e
atrasado, incapaz de romper com os vícios e tradições que o pren-
diam no passado, dependente de mão-de-obra escrava, intoxicado
pela riqueza fácil e sem futuro da produção extrativista de suas
colônias”, observa Laurentino Gomes.
O outrora país pujante, senhor dos mares, “nem de longe lem-
brava a metrópole vibrante dos tempos de Vasco da Gama e Pedro
Álvares Cabral”. Segundo o autor de “1808”, os sinais de decadên-
cia estavam por todo lado. “Lisboa, a capital do império, havia muito
tinha sido ultrapassada por suas vizinhas européias como centro
irradiador de idéias e inovações...”.
A queda do governo de Sebastião José de Carvalho e Melo,
o Marquês de Pombal, responsável pela reconstrução e moder-
nização de Lisboa após o terremoto de 1755, seguido de mare-
moto e incêndio, que matou entre 15 mil e 20 mil pessoas, só
serviu para interromper o processo de mudanças arquitetônicas
e urbanísticas na capital portuguesa. Mas, apesar das profundas
crises em que mergulhou, Portugal emergiu forte. Em seu últi-
mo ato, quando de sua inserção no Mercado Comum Europeu,
entrou em processo de modernização, fato que tem se mostra-
do irreversível.
Para conhecer melhor essa cidade mais rica de Portugal, dona
de um PIB per capita superior à média européia e com uma econo-
mia baseada em serviços, Empório fez um passeio pelos melhores
pontos turísticos da capital. Embarque nesse roteiro.
Lisboa
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Para conhecer um pouco da Lisboa que foi deixada pela
corte de dom João VI no final de 1807, uma primeira sugestão é
ir ao Chafariz del-Rei, conhecido como Chafariz de Fora. Quando
foi edificado, no século XIII, situava-se do lado de fora das mura-
lhas da cidade, voltado de frente para o rio e era o local aonde
os barcos vinham “fazer aguada”, ou seja, carregar água para as
longas viagens transatlânticas.
No final do século XIX, a parte na frente do chafariz ganhou um
aterro. Atualmente, no lugar onde antes havia barcos, apenas passam
carros. À sua direita ou esquerda saem inúmeras ruelas que entram no
bairro de Alfama, que é o que restou da Lisboa medieval.
Alfama tem como característica as ruas que serpenteiam pela
encosta acima, até o Castelo de São Jorge, sem largura suficiente
para que passe um carro. Em alguns lugares se encontra um ou
outro palacete, mas a maior parte das casas são de tamanho re-
duzido, com portas que não chegam a 1,5 metro de altura, muitas
ainda não têm água encanada e não há uma data que marque a
sua construção. Há 15 anos, uma reforma de uma casa encontrou
uma parede construída no século VIII - sem materiais adequados, o
construtor tinha posto o resto de uma bota para vedar o buraco
entre duas pedras. É a região em que mais se pode ouvir o fado, a
música típica da cidade.
O próximo passo é uma construção do final do século XVIII,
que ainda não estava completa quando a corte embarcou para o
Brasil: a praça do Comércio. Com um formato em U, é hoje sede
de três ministérios. Os prédios foram edificados depois do terre-
moto de 1755, para ser o palácio real, e mantêm a mesma cor com
que foram pintados originalmente.
Na época em que dom João VI ocupava o lugar de regente
do reino, a praça era considerada uma das mais belas da Europa.
Um dos principais documentos sobre esse período é o livro de
memórias de Laure Permon, esposa do general francês Junot – que
comandou a primeira invasão francesa a Portugal e que nos dois
anos anteriores tinha sido embaixador francês no país.
Permon, que inspirou Balzac para escrever seu mais famoso
livro, “A Mulher de 30 Anos”, e por quem se apaixonaram Vitor
Hugo e Almeida Garret, comparou a praça do Comércio com a
capital francesa: “Não há nada em Paris, mesmo atualmente, tão
belo como os cais que bordejam esta parte da margem”. O único
reparo que ela fez ao local foi à estátua de dom José, que conside-
rou horrível e ainda hoje ali está, no centro da praça.
Do lado direito da praça, na esquina com a rua da Prata, vale a
pena visitar o café e restaurante Martinho da Arcada, que teve en-
tre os seus clientes fiéis Fernando Pessoa. Na lateral esquerda, fica a
Sala Ogival da ViniPortugal, onde se pode provar gratuitamente (de
terça a sábado, das 11h às 19h) vinhos portugueses de qualidade,
muitos deles pouco conhecidos fora do país.
Na época da viagem da corte para o Brasil, a praça era uma
construção recente. O antigo palácio real, que ficava exatamente
naquele local, tinha sido destruído pelo terremoto de 1755. Per-
mon conta que 50 anos depois ainda se sentia o cheiro de queima-
do e dos corpos em putrefação.
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O metrô que liga a estação da Baixa-Chiado ao Campo Grande foi inaugurado em 1997
Vista frontal da praça do Comércio, também conhecida como Terreiro Paço. Ao fundo, Alfama, e ao alto o Castelo de São Jorge
Foto
Cao
Fer
reir
a
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Museu de Arte Antiga
Até meados do século XIX, a forma de chegar ao centro de Lisboa era de
barco. As casas dos nobres ficavam às margens do rio e muitas delas tinham em-
barcadouros particulares. A partir de 1870, com a construção de linhas de trem, o
beiradão foi aterrado. Restaram as escadas que iam das casas aos embarcadouros,
como se vê junto ao Museu Nacional de Arte Antiga, que fica na rua das Janelas
Verdes (uma lei municipal obriga todas as janelas das casas dessa rua a serem
pintadas dessa cor).
O museu (aberto de 3ª a domingo, das 10h às 18h) era a antiga residência
dos Condes de Alvor, que foi construída no tempo do reinado de dona Maria
I, a louca, mãe de dom João VI. Atualmente, conta com o maior acervo do país
(mais de 40.000 obras de arte). Um dos quadros mais importantes é a Tentação
de Santo Antão, de Hieronimus Bosch. Também não se deve perder a vista do
seu jardim sobre o rio Tejo. A cafeteria do museu pode ser uma boa indicação
para o almoço.
Basílica da Estrela
Trata-se da primeira igreja do mundo dedicada ao Sagrado Coração de
Jesus. Em estilo tardo barroco, ela surgiu de uma promessa de dona Maria I,
que embarcou à força para o Brasil em 1807. Ela tinha prometido construir
uma igreja caso tivesse um filho varão. Foi atendida e a construção começou
em 1779. No entanto, o príncipe morreu de varíola dois anos antes de a obra
ficar pronta.
Inicialmente, deveria ser um novo centro para a cidade de Lisboa. Mas o
conjunto, nunca ficou completo. Segundo Laure de Permon, influenciada pelo
inquisidor-mor, quando não estava com seus ataques de loucura, dona Maria dava
todo o dinheiro que podia para a basílica da Estrela, deixando o governo sem
meios para atender outras necessidades.
Palácio das Necessidades
Este palácio, atualmente sede do Ministério das Relações Exteriores de Por-
tugal, era no começo do século XIX um convento onde estudavam os filhos dos
nobres. Foi escolhido como residência pelo duque de Wellington, que comandou
as tropas que expulsaram os franceses de Portugal.
Sua biblioteca foi a sede das primeiras Cortes Constituintes de Portugal,
poucos anos depois da Independência do Brasil. Hoje, apenas se pode visitar a
igreja e o jardim, que tem o nome de Tapada das Necessidades (aberto todos
os dias das 9h às 18h).
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Foto
Cao
Fer
reir
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Palácio da Ajuda e Queluz
Apesar de ter o seu palácio na praça do Comércio, não era ali que vivia a
família real. Com medo de que mais um terremoto arrasasse a cidade, depois da
destruição geral de 1755, os reis optaram por ficar numa construção no bairro
da Ajuda. Segundo Laure de Permon, a construção era chamada pela população
de “real barraco” - grande parte era de madeira e nunca chegou a ficar pronta.
Hoje, apesar de uma parte do prédio continuar inacabada, alí funciona o Palácio
Nacional da Ajuda, onde se encontra uma biblioteca com os livros que permane-
ceram em Portugal quando a corte foi para o Brasil – os livros que embarcaram
são a base da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Há também um museu - com
utensílios, móveis, quadros e jóias que pertenceram à família real – (aberto das
10h às 18h, fecha às terças).
Pouco antes da viagem da família real para o Brasil, um incêndio atingiu o
Palácio da Ajuda. A corte passou a morar no Palácio de Queluz, a 12 quilômetros
de Lisboa (funciona das 11h às 17h30 e fecha às terças). Seus salões contrastam
no luxo e opulência com as linhas sóbrias da cidade reconstruída após o terre-
moto. É o melhor exemplo da arquitetura rococó portuguesa e constuma ser
comparado ao Palácio de Versalhes, da França.
Parque das Nações
Para contrapor a visita à Lisboa que restou da época em que a corte em-
barcou para o Brasil, vale a pena conhecer a parte mais moderna da cidade. O
grande destaque é o Parque das Nações, um antigo bairro industrial (a cinco
minutos do aeroporto) recuperado para a Expo 98.
Dotado de moderna infra-estrutura urbana, o complexo é a cidade imagina-
da transformada em realidade. Além de surpreendentes jardins temáticos, ali se
encontram obras de alguns dos mais importantes arquitetos da atualidade, como
o espanhol Santiago Calatrava ou o português Siza Vieira.
O Pavilhão do Conhecimento, ou Centro Interativo de Ciência e Tecnologia,
apresenta várias exposições regularmente, permitindo ao visitante um contato
direto com as mais diversificadas experiências científicas e tecnológicas.
Pode-se visitar também o Oceanário de Lisboa – o segundo maior aquário
oceânico do mundo, povoado por 15.000 animais e plantas de mais de 450 espécies.
Para os notívagos, também não faltam opções. Situado à beira-rio, o bairro
tem uma agitada vida noturna, com dezenas de bares e restaurantes no Passeio
da Pimenta. Sugerimos uma visita ao Cassino de Lisboa.
E que tal apreciar a paisagem? Nas imediações do parque há um teleférico de
mais de mil metros com vista privilegiada para o rio Tejo. Eis uma boa dica para encer-
rar a viagem. O visual arrebatador costuma ficar gravado na memória dos visitantes.
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Por Sebastião ReisFotos Mário Oliveira e acervo pessoalGENTE
DO EL DORADO ÀS VIRGENS DO SOL
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As pesquisas na Amazônia foram aventuras fantásticas, com fugas, doenças e naufrágios
E le é branco, loiro, olhos azuis, tem vida dupla e gosta de aventuras peri-
gosas em lugares remotos. Qualquer semelhança com Indiana Jones, per-
sonagem de Harrison Ford no célebre filme de Steven Spielberg, é mera
coincidência. Se na tela dos cinemas, um é o pacato professor de arqueologia
Henry Jones Júnior, que se transforma em aventureiro destemido ao enfrentar
nazistas na disputa pela Arca da Aliança e o Santo Graal, na selva amazônica, o
outro é o artista plástico e pesquisador chileno Roland Stevenson, 73, que garan-
te ter descoberto o El Dorado.
Há 30 anos, esse homem mais respeitado no exterior do que no Brasil por
suas teorias polêmicas a respeito da origem do homem amazônida, luta para
comprovar a existência da cidade mítica de ouro que no século XVI os explora-
dores espanhóis acreditavam existir. Passou vários meses na selva à procura do
caminho conhecido dos incas, enfrentando todos os tipos de perigo, de uma onça
pintada em seus calcanhares a índios macus com flechas envenenadas que o fize-
ram se lembrar de seus tempos de maratonista. Correu das 7h às 20h, deixando
para trás parte de seu equipamento. Só não abandonou a mochila. Isso, sem con-
tar os seis naufrágios e as seis malárias. Mas, garante, valeu a pena. “O problema é
que os espanhóis buscavam uma cidade de ouro e, na verdade, tratava-se de uma
fonte aurífera localizada entre o Pico da Neblina, no Amazonas, e Roraima”.
Roland Stevenson chegou a Manaus em 1973 para trabalhar como pu-
blicitário. A experiência no excursionismo, ainda no Chile, o fez apaixonar-se
por aventuras. Gastou parte das economias em expedições, mas não se ar-
repende. Prepara-se para fazer nova viagem, dessa vez à procura das Virgens
do Sol, que segundo ele fugiram dos espanhóis após a captura de Atahualpa,
imperador inca, e se transformaram nas guerreiras amazonas, ou icamiabas,
“mulheres sem homens, mulheres sem maridos ou ainda mulheres escondidas
dos homens”.
Não serão poucos os que vão voltar a chamá-lo de louco. “Os brasileiros
são muito preconceituosos com o meu trabalho, mas é triste ver que, em função
desse desinteresse, quase todos os estudos na Amazônia são feitos por estran-
geiros”, desabafa.
A visão do El Dorado só existia para os espanhóis, observa Stevenson. “Os
índios não conheciam esse nome, mas sim uma região natural de onde vinha o
ouro”. Segundo ele, todas as tribos da bacia do rio Uaupés, no alto rio Negro,
próximo à Cabeça do Cachorro, contam que soldados incas vinham buscar ouro
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Pinturas de Roland Stevenson: o caminho pré-colombiano por onde incas carregavam “insetos” de ouro e um ataque de índios ao aventureiro
em Roraima por um caminho de um metro e meio de largura. A cada 20 quilô-
metros dessa estrada, havia os postos de descanso dos viajantes, os chamados
Tambos. “Localizei oito desses Tambos na bacia do Uaupés. Esse caminho ia direto
para o Pico da Neblina, mas foi engolido pela mata”. Num desses lugares, Steven-
son descobriu o petroglifo de uma lhama.
O interesse dos espanhóis pelo El Dorado surgiu após a captura de Atahual-
pa ao norte do Peru, em Cajamarca. Eles exigiram do imperador inca um quarto
cheio de ouro. Ruminháui, coletor de ouro do norte do império inca no Equador,
foi incumbido de buscar parte desse produto, numa viagem de cem dias ao lugar
misterioso. Ao retornarem, ele e seus homens, foram abordados por índios que
queriam abrir as caixas para ver o que continham. Era a primeira vez que isso
acontecia, porque, de acordo com a lenda, era proibido abrir as caixas sob pena
de o Sol se apagar. Como o Sol era Atahualpa, agora refém dos espanhóis, os
índios se consideravam desimpedidos. E ficaram admirados com o que viram:
“insetos de ouro”. “Essas peças deviam ser trabalhadas por ourives em Roraima
e no Amazonas”, acredita Stevenson.
De volta ao Peru, Ruminháui não encontrou mais os espanhóis. Atahualpa
havia sido assassinado. Do carregamento em ouro, nunca mais se teve notícias.
Foi escondido em lugar incerto e não sabido. Tempos depois, Ruminháui foi cap-
turado e torturado por soldados de Francisco Pizarro para revelar a localização
do El Dorado. “Disse que, para chegar às minas, tinha de caminhar 70 dias. Fiz os
cálculos entre o local onde os incas estavam e o destino”, conta Stevenson.
Somente nove anos depois, Gonzalo Pizarro, irmão de Francisco Pizarro,
resolveu percorrer o caminho, que já se encontrava fechado pela floresta. “Ele
estava atrás do El Dorado e das Virgens do Sol, as moças mais lindas do império
inca”, diz Stevenson. “Quatro mil índios cofane, antecessores dos tucano, foram
forçados a acompanhá-lo, abrindo caminho”.
Setenta dias de viagem naquele trecho, de acordo com o pesquisador, dão
exatamente nas terras do Pico da Neblina. “Eu, pessoalmente, andei por esse ca-
minho pré-colombiano pensando que tinha sido feito por garimpeiros. Pesquisas
mostram que era o caminho do El Dorado”.
Gonzalo Pizarro chegou lá, mas não encontrou a cidade de ouro porque, na
verdade, tratava-se de uma fonte aurífera.
Roraima, afirma Stevenson, era uma imensa região submersa repleta de lagos,
como o Parime. É para lá que o aventureiro chileno pretende ir, na certeza de que as
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Virgens do Sol chegaram na serra do Parime por volta de 1503, escondendo-se dos
espanhóis. “Lá, não existem vestígios, mas sim evidências. Está cheio de índios de olhos
azuis e verdes. São descendentes das Virgens do Sol e espanhóis”, garante Stevenson,
referindo-se aos yanomami, que, na sua opinião, não são uma raça pura.
Sobre os estudos que indicam a origem desses índios brancos de olhos claros,
Stevenson diz que não procedem. Para o jornalista Karl Brugger, descendiam de
refugiados alemães da 1ª Guerra Mundial. “Ele desconhecia que, desde 1758, os
yanomâmis eram conhecidos na Venezuela como ‘Guaribas Brancos’. Portanto, já
possuíam essa característica física ao menos dois séculos antes da 1ª Guerra.”
O escritor Jacques de Maieu considerava os “índios brancos” descendentes dos
vikings e oriundos de Tiahuanaco, civilização que se desenvolveu junto ao lago
Titicaca, entre Bolívia e Peru. Em seu livro “Uma luz nos mistérios amazônicos”,
Stevenson diz que Maieu comete um erro cronológico de quase mil anos em
relação ao início do desenvolvimento de Tiahuanaco e às incursões vikings na
América. E acrescenta: “Os indígenas de rosto mongolóide que predominaram na
Amazônia até fins do século XV nada tinham de nórdicos”.
De suas aventuras, Stevenson guarda em seu escritório reportagens e uma
preciosidade: a coroa dentada com oito pontas de uma borduna, arma inca, en-
contrada na região do suposto El Dorado. “Imagina quanto uma peça dessas,
autêntica, não valeria num museu lá fora?”, indaga. “Encontramos cinco dessas
coroas em pontos diferentes, tudo em área de garimpo”.
O pintor-pesquisador diz que não se sente realizado. “A Amazônia é muito
grande, uma região desconhecida. A história ainda está por ser revelada”. Refle-
tindo sobre as dificuldades que encontra para realizar suas pesquisas e ter seu
trabalho reconhecido, questiona: “Quanto tempo o brasileiro vai demorar para
perceber que o lago Parime existiu? Está seco, hoje, mas o nível da água está
marcado em 400 quilômetros de serra, parte dela na região da Raposa Serra do
Sol, área de conflitos na disputa por ouro”.
Stevenson discorda dos que afirmam que a região foi um deserto. “Como isso
aqui foi um deserto se tiraram toneladas de concha marinha de onde existia o lago?”
Em sua aventura quase solitária, esse chileno sonhador só tem uma certeza:
vive na Amazônia os melhores anos de sua vida.
No ateliê em Manaus, onde coleciona fotos, mapas e histórias
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As índiasmais belas do mundo Não existem no mundo índias mais lindas do que as de Roland Stevenson.
Esse artista plástico chileno que se transforma em aventureiro, nas horas vagas, é
conhecido não somente pelo conjunto da obra, mas também por ter sido pre-
cursor do silicone. Basta dar uma olhada em seus quadros para observar que, há
tempos, antes de se falar sobre o milagre das próteses de silicone implantadas em
mamas, ele já pintava índias “siliconadas”, com seios duros apontando para cima.
Stevenson busca inspiração nas lendas amazônicas e na natureza para seus qua-
dros, que se confundem com a própria pesquisa que faz na região. São esses
trabalhos em tela que lhe garantem financiar as pesquisas. Ou seja, uma obra
alimenta a outra. “Cansei de pedir financiamentos para meus trabalhos. Pago tudo
com o que ganho com os quadros”, afirma.
Embora não seja um pesquisador formado, Stevenson acredita que se dife-
rencia dos demais estudiosos da história na Amazônia por ser um anatomista fi-
sionômico. É considerado o pioneiro no uso da técnica de investigação conhecida
como “morfologia somática”.
Ele diz que, por ter passando a vida inteira retratando feições, pode enxer-
gar coisas que “uma mente comum é incapaz de ver”. O rosto de um indígena,
segundo ele, conta todo seu passado, migrações, miscigenações e climas nos luga-
res onde morou. O pesquisador brasileiro, de acordo com Stevenson, baseia-se
apenas na glotologia, ciência que estuda comparativamente as diversas línguas,
considerando suas origens e formação.
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Por Marcelo GuilhermeFotos DivulgaçãoTURISMO
do que ‘reservado’ Um hotel mais
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Uacari-branco, espécie ameaçada de extinção, endêmica de Mamirauá
P roporcionar a turistas o contato direto com a natureza
sem agredir o meio ambiente e gerar renda para a po-
pulação local é o objetivo da Pousada Uacari. Localizada
a 600 quilômetros da capital amazonense, próximo ao municí-
pio de Tefé, ela se destaca pela concepção ecológica. O conjunto
de sete estruturas flutuantes foi desenhado visando o mínimo
impacto ambiental, com instalação de tecnologias apropriadas,
como a coleta de água da chuva, energia solar e sistema de filtra-
gem de dejetos.
A experiência é simplesmente sem igual. Acordar e olhar o
rio da varanda do quarto, fazer caminhadas na mata, ter conta-
to com animais exóticos e apreciar um dos pores-do-sol mais
lindos do mundo são só algumas das vantagens de pernoitar
no Uacari. O empreendimento está dentro da Reserva de De-
senvolvimento Sustentável de Mamirauá, um dos santuários
ecológicos mais importantes do planeta (com 1,12 milhão de
hectares de florestas de várzea), e está inserido em um projeto
de conservação pioneiro no Brasil.
A missão principal é gerar renda para as comunidades locais,
fortalecer a organização e capacitação comunitária e criar incen-
tivos para que essas comunidades promovam a conservação dos
recursos naturais da área. “A Pousada Uacari gera renda por meio
da compra de produtos e serviços e dos seus lucros, que são divi-
didos entre o sistema comunitário de vigilância e as comunidades
locais, que investem parte dos lucros em projetos para a melhoria
da qualidade de vida dos comunitários”, explica Nelissa Peralta, co-
ordenadora do Programa de Ecoturismo do Instituto Mamirauá.
O lugar é bastante reservado. Por se tratar de uma área de con-
servação ambiental, só é possível chegar lá comprando um dos paco-
tes de ecoturismo, ou seja, desembolsando de US$ 550 a US$ 1.000,
por três, quatro ou sete dias de hospedagem na Uacari. As vagas
são poucas, no máximo para 20 pessoas. “Recebemos pedidos de
centenas de turistas, mas isso iria impactar o ambiente. Só pode-
mos receber pequenos grupos por vez”, acrescenta Nelissa.
A viagem tem início em um avião que sai de Manaus até Tefé
(uma hora de vôo), se estendendo em uma voadeira ou lancha de
motor por mais uma hora e meia. Durante a cheia, de maio a julho,
as águas do Solimões e do Japurá inundam a reserva, formando os
igapós, as famosas florestas submersas, transformando a visita em
uma grande aula, já que os turistas visitam as famílias ribeirinhas e
aprendem muito sobre a Amazônia.
Outro ponto alto são as atividades de observação da fauna
e da flora. No período seco (setembro a março), o visitante pode
deslumbrar um grande espetáculo de peixes e seus predadores,
concentrados num menor volume de água. Milhares de aves aquá-
ticas também migram para os lagos da reserva, onde outros pre-
dadores, como o jacaré-açu e o boto côr-de-rosa, se concentram
para se alimentar devido a grande abundância de peixes na área. As
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trilhas podem ser percorridas a pé, em pequenos grupos acompa-
nhados pelo guia local.
Já no período de abril a agosto, o nível da água sobe alagando
toda a área. As trilhas desaparecem sendo percorridas só em cano-
as com capacidade para dois turistas e um guia. O visitante estará
mais perto das copas das árvores, dividindo espaço com bromélias,
insetos e pequenos répteis. Há também ótimas chances de encon-
tros com guaribas (que acordam o visitante com seus concertos
matinais), uacaris-branco, macacos-de-cheiro e preguiças, além de
muitas espécies de aves e animais aquáticos como o pirarucu.
Enfim, não é por acaso que o guia de viagem Lonely Planet
(2002) considera a Reserva Mamirauá um dos melhores luga-
res para observação da fauna em toda a Amazônia. A magnitu-
de desse paraíso ecológico exige dos futuros visitantes, além de
consciência ecológica, um arsenal de material fotográfico e muito
espírito de aventura.
Simplicidade e conforto
Em Uacari, o visitante desfruta de conforto, mas sem o
luxo de um hotel cinco estrelas. A pousada tem um flutuante
central com recepção, restaurante, bar, sala de TV, sala de apre-
sentações, e uma piscina de água natural. Há também serviço de
lavanderia disponível. Cada uma das dez suítes possui varanda
com vista para a floresta, chuveiro com água quente e duas
camas de solteiro (king size). As acomodações são teladas e
cobertas com palha.
A pousada funciona com pensão completa, ou seja, são ofe-
recidas três refeições ao dia. O cardápio é da cozinha brasileira,
com a valorização de produtos e pratos típicos da Amazônia, com
muito peixe fresco, frutas e sucos regionais (não servem carne
vermelha).
COMO CHEGARA cidade de Tefé é o portão de entrada para a Reserva
Mamirauá. Você chega até lá de avião ou barco partindo
de Manaus. Consulte o porto (92. 3621-4316) ou a em-
presa Rico Linhas Aéreas (www.voerico.com.br). De Tefé,
você segue de barco para Uacari. São 90 minutos de via-
gem na voadeira da própria pousada.
RESERVASTelefones: 97. 3343-4160 • 8116-1349
http://uakarilodge.com.br
ecoturismo@mamiraua.org.br
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Carlos Ferreirinha
LUXO
Por dentro do luxo
Conhecida por seus prestigiosos leilões, a Sotheby’s está presente no Brasil com seu braço dedicado ao mercado de luxo imobiliá-rio. Com seu novo conceito de comercialização de imóveis, a Brasil Sotheby’s surpreende e encanta seus clientes. Veja esta casa no Rio de Janeiro. Fronteira entre a arquitetura humana e a natureza intoca-da, ela foi construída em um condomínio fechado na pedra da gávea com uma vista de tirar o fôlego. O mar logo abaixo da casa, dá aos seus moradores a sensação de estar em um navio.
Se o assunto é luxo, do tradicional ao sócio-ambiental, nada melhor do que escrever sobre lançamentos do mundo sofisticado nas páginas de Empório. É aqui, neste espaço, que estarei com vocês em todas as edições desta revista que vem se consolidando como uma das gratas surpresas do mercado editorial brasileiro. Vamos falar sobre o novo luxo, que passa, por exemplo, por ações sócio-ambientais responsáveis.
O Brasil vem surpreendendo pelo movimento aspiracional e vibran-te no segmento calçadista. Excelentes trabalhos desenvolvidos por designers, que têm despertado a atenção do mundo. Alguns es-pecialistas internacionais têm chamado nossas criações de “sapatos de personalidade”. A novidade do momento é a marca sensação do circuito fashion europeu que chega somente agora no mercado brasileiro, a Miezko, produzida no sul do país. O luxo traduzido em exclusividade, design arrojado e obsessão por detalhes.
MIEZKO
SOTHEBY’S
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Brastemp You. Depois de surpreender o mercado brasileiro com refrigeradores “personalizáveis”, a Brastemp lançou no final do ano passado o Fogão You, que permitirá ao consumidor expressar o seu lado B... exercendo sua criatividade e gerando a oportunidade de montar um eletrodoméstico só seu. Em eras de individualização, customização e exclusividade... o Fogão You encanta.
A Urban Mobility é uma linha revolucionária de acessórios de luxo da Puma, marca responsável pela transformação do sportswear em fashion e que recentemente foi comprada pelo poderoso grupo Gucci. Feita de couro Nappa, macio, branco e com estilo jacarandá é inspirada nos desenhos industriais. Um novo conceito na catego-ria. Uma assinatura vanguardista da Puma.
Cadmo light, uma das mais novas peças de decoração feitas por Karim Rachid para a Artemide, é uma luminária de quase 2 metros inspirada no desdobra-mento de uma folha, sendo seu corpo de aço laqueado de branco. Sua versão mais exclusiva é feita em vidro preto soprado, estando disponível no Brasil apenas sob encomenda. Karim Rachid está presente na arquitetura, design de móveis, roupas, celulares e objetos que criou para grandes marcas como Prada, Umbra, Armani e Melissa. Essa peça é vendida com exclusividade pela La Lampe, representante oficial da Artemide no Brasil.
LA LAMPE
PUMA
BRASTEMP
A famosa joalheria brasileira, H. Stern, põe o Brasil no seleto mercado mundial de jóias de luxo, sendo, nesses últimos anos, presença constante em premiações internacionais, vestindo Angelina Jolie, Ashley Judd, Sharon Stone e Eva Longoria. Esta linha é denominada Red Carpet, e promete muito para o ano de 2008!
H. STERN
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Por Marcelo GuilhermeFotos Antonio IaccovazoCULT
pura ousadiaUm festival de
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D epois de 11 anos vencendo barreiras, consagrando mitos, recrutando
talentos e acreditando no impossível, o Festival Amazonas de Ópera
chega a sua 12ª edição levando Manaus ao status de primeira cidade
em produção lírica do Brasil e a colocando entre as dez mais importantes do
mundo no segmento. Se há bem pouco tempo era impossível imaginar que o tão
suntuoso Teatro Amazonas, após 90 longos anos de jejum, voltasse a produzir e
montar óperas – aliás, motivo de seu nascimento em 1881 (oficialmente inaugu-
rado em 1886) – hoje, a efervescência cultural porque passa Manaus nos faz crer
em um futuro de explendor.
Em pouco tempo, o Festival Amazonas de Ópera se transformou no maior
do gênero da América Latina, criando expectativa durante os meses de abril e maio
nos antigos e novos amantes da arte lírica. Instituições como a Orquestra Amazonas
Filarmônica, Coral do Amazonas, Orquestra Jovem da Floresta Amazônica, grupos do
Centro Cultural Cláudio Santoro e Corpo de Dança do Amazonas foram criadas ou
revitalizadas apostando em novos talentos, que na verdade formam o recheio desse
grande projeto musical, iniciado em 1997 e que fez com que o Teatro Amazonas
abrisse suas portas para uma longa e promissora temporada de clássicos.
Montagens como Carmem” (Georges Bizet), “La Traviata” (Guiseppe Verdi) e
“O Barbeiro de Sevilha” (Gioacchino Rossini) – com a orquestra e o coral do Teatro
Bolshoi de Minsk e o Coro Sinfônico do Amazonas – ficaram eternizadas na memória
dos amazonenses desde a abertura do festival. Mas não foi simples dar continuidade
ao projeto. A dificuldade para manter tão imponente estrutura era óbvia, já que
solistas, regentes e produtores da estréia eram, em sua maioria, estrangeiros, entre
russos, suíços e argentinos, além de brasileiros do eixo Rio-São Paulo. Definitivamente,
Manaus não tinha mão-de-obra capacitada para tão arrojada missão.
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Logo nos primeiros anos, um grande esforço foi feito para melhorar a orques-
tra do Amazonas. Profissionais da Rússia, Bulgária e Bielo-Rússia foram recrutados
para reforçar o time de músicos. Os europeus do leste também passaram a lecio-
nar no conservatório local, o Cláudio Santoro, e muitos artistas visitantes deram
aulas para os jovens da cidade, que se preparavam para a carreira de técnicos,
músicos e bailarinos. O trabalho deu frutos. Na 10ª edição, uma ópera foi montada
praticamente com 100% de elenco local: “Gianni Schicchi”, de Puccini. Começava aí
o ciclo de ouro no segmento cultural da cidade.
Do início até hoje, milhares de empregos e ocupações foram criadas em torno
das montagens, movimentando artesãos, marceneiros, costureiras, pintores, técni-
cos de som e luz, entre outros. “No início, era sonho e esperança. Mas desde sua
criação, o festival de ópera já foi considerado um marco para as manifestações
artísticas e lúdicas, promovendo uma verdadeira revolução sociocultural”, comenta
o secretário estadual de Cultura, Robério Braga.
Trajetória de ousadia
O Festival Amazonas de Ópera, além da própria grandiosidade, tem como
característica a inovação. A criatividade está presente desde as obras tradicionais
até as pouco executadas. Logo no segundo ano, em 1998, foi montada pela pri-
meira vez, publicamente, a récita “Alma”, do compositor brasileiro Cláudio Santoro.
O papel-título da jovem prostituta ganhou a voz de Rosana Lamosa, com direção
musical de Nivaldo Santiago. No ano de comemoração dos 500 anos do Desco-
brimento do Brasil, em 2000, a abertura da 4ª edição contou com um show na
Ponta Negra, uma versão de “Il Guarany”, de Carlos Gomes. No ano seguinte, na 5ª
versão do festival, Manaus recebeu duas récitas, de São Paulo e do Rio de Janeiro:
“La Bohème” (Giacomo Puccini), que foi apresentada no paulista Teatro Alfa, e “A
Ópera dos Três Vinténs” (Kurt Weill e Bertolt Brecht), encenada no carioca Centro
Cultural Banco do Brasil (CCBB). “Os Três Vinténs” inaugurou o Teatro da Instalação,
no centro da capital amazonense. “Manon”, que desde a década de 60 não era
montada no Brasil, foi encenada em 2001, exclusivamente para o evento.
De lá para cá foram inúmeras cenas, estrelas, figurinos, enfim, um conjunto
de peças que fez com que Manaus entrasse para a história lírica nacional. “A reali-
zação do festival de ópera, a cada ano, retrata o aperfeiçoamento de uma equipe
unida por um ideal, cujo perfil se aprimora com o intercâmbio proporcionado
pelas grandes produções. Este evento é, com certeza, compartilhado em sintonia
com a comunidade e iniciativa privada, além claro, das ações do governo. Por tudo
isso, acredito que este é um acontecimento que só tende a crescer e se perpetuar
ainda mais, tanto em importância quanto em termos de qualidade junto a todos”,
completa o secretário Robério Braga.
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Roger Waters é presença confirmada no espetáculo do Teatro Amazonas
As mais badaladas de 2008
Este ano, a capital do Amazonas mais uma vez estará respirando ópera, do
dia 15 de abril a 31 de maio. Já na abertura, uma das obras mais aguardadas desta
edição: “Ça-Ira”, de autoria do ex-vocalista do Pink Floyd, Roger Waters. A ópera,
que levou 16 anos para ser escrita, é encenada em três atos e fala sobre a Revolu-
ção Francesa, enfatizando liberdade, igualdade e fraternidade. A idéia é mostrar, por
meio da arte lírica, a preocupação com o conceito dos direitos humanos, estabele-
cido naquele período. Apesar de ser ambientada em 1789, “Ça-Ira” (Algo como ‘Vai
dar certo’) exala um clima de atemporalidade que deve agradar ao público moderno.
“Será a primeira vez que a ópera de Waters terá a montagem que o autor concebeu
originalmente. Em 2005 ela estreou em Roma (Itália) mas em formato de concerto.
Depois disso, foram feitas modificações para os espetáculos que se seguiram, em
Poznan (Polônia) e Kiev (Ucrânia). Mas nada foi igual ao que será apresentado aqui”,
explica o diretor artístico do festival e maestro Luiz Fernando Malheiro.
Destaque também para o clássico de Gian Carlo Menotti, “Maria Golovin”.
Atualmente, a ópera não é encontrada na programação de grandes festivais mun-
diais de música erudita, são raras as apresentações. O libreto gira em torno de uma
narrativa descomplicada – um breve encontro romântico entre o cego e recluso
Donato e a personagem – título da trama, uma mulher casada que vivia na Europa
do pós Segunda Guerra. No entanto, a obra é considerada uma das mais bem
elaboradas pelo compositor. A montagem do 12° Festival Amazonas de Ópera será
luxuosa, com direito a figurinos projetados pelo estilista Christian Lacroix, um dos
nomes mais importantes da alta-costura internacional, com lojas de prêt-à-porter
espalhadas pelas mais importantes capitais do mundo. Defensor de uma moda com
características neo-barrocas, cujos detalhes muitas vezes apontam para sua infância,
intrinsecamente ligada às touradas e ciganos andarilhos, já esteve à frente da direção
artística de “Maisons”, com Emilio Pucci e Christian Dior. Também foi responsável
pela criação dos figurinos para “Carmen”, de Georges Bizet (1838 - 1875) e para a
comédia francesa baseada na mitologia grega, “Phèdre”, de Jean Racine (1639 - 1699).
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12ª Edição
Este ano o 12° Festival Amazonas de Ópera terá 19 concertos e dois recitais.
Dezesseis espetáculos serão pagos (os valores variam entre R$ 5 e R$ 60) e cinco
inteiramente gratuitos. O evento receberá investimentos superiores à ordem dos R$
4 milhões e contará com a participação de 358 artistas, sendo 230 do Amazonas,
102 de outras partes do país e 26 internacionais. Os concertos serão realizados em
alguns dos mais importantes espaços culturais da cidade, como o Centro Cultural
Largo de São Sebastião e o Centro Cultural Palácio Rio Negro, além, claro, do ma-
jestoso Teatro Amazonas. São esperadas 85 mil pessoas para o evento, sendo 9,8 mil
para os espetáculos fechados e mais de 75 mil nos espaços abertos.
Programação
ÇA-IRA (Roger Waters)Teatro Amazonas • 15, 22 e 24 de abril
DAS LIED VON DER ERDE (Gustav Mahler)Teatro Amazonas • 19 e 23 de abril
ARIADNE AUF NAXOS (Richard Strauss)Teatro Amazonas • 17, 20 e 26 de abril
BARROCA (Concerto com trechos de óperas barrocas)Teatro Amazonas • 3 de maio
JOÃO E MARIA (Engelbert Humperdinck)Teatro Amazonas • 4, 6 e 8 de maio
MISSA DE RÉQUIEM (Giuseppe Verdi)Matriz de Nossa Senhora da Conceição • 10 de maio
CONCERTO DO DIA DAS MÃES (Orquestra Experimental da Amazonas Filarmônica)Teatro Amazonas • 11 de maio Congada (Francisco Mignone) Finlândia (Jean Sibelius) Maroquinhas fru-fru (Ernst Mahle)
MARIA GOLOVIN (Gian Carlo Menotti)Teatro Amazonas • 21, 23 e 25 de maio
TURANDOT (Giaccomo Puccini)Largo de São Sebastião • 29 e 31 de maio
12ª Edição
Este ano o 12° Festival Amazonas de Ópera terá 19 concertos e dois recitais.
Dezesseis espetáculos serão pagos (os valores variam entre R$ 5 e R$ 60) e cinco
inteiramente gratuitos. O evento receberá investimentos superiores à ordem dos R$
4 milhões e contará com a participação de 358 artistas, sendo 230 do Amazonas,
102 de outras partes do país e 26 internacionais. Os concertos serão realizados em
alguns dos mais importantes espaços culturais da cidade, como o Centro Cultural
Largo de São Sebastião e o Centro Cultural Palácio Rio Negro, além, claro, do ma-
jestoso Teatro Amazonas. São esperadas 85 mil pessoas para o evento, sendo 9,8 mil
para os espetáculos fechados e mais de 75 mil nos espaços abertos.
Programação
ÇA-IRA (Roger Waters)Teatro Amazonas • 15, 22 e 24 de abril
DAS LIED VON DER ERDE (Gustav Mahler)Teatro Amazonas • 19 e 23 de abril
ARIADNE AUF NAXOS (Richard Strauss)Teatro Amazonas • 17, 20 e 26 de abril
BARROCA (Concerto com trechos de óperas barrocas)Teatro Amazonas • 3 de maio
JOÃO E MARIA (Engelbert Humperdinck)Teatro Amazonas • 4, 6 e 8 de maio
MISSA DE RÉQUIEM (Giuseppe Verdi)Matriz de Nossa Senhora da Conceição • 10 de maio
CONCERTO DO DIA DAS MÃES (Orquestra Experimental da Amazonas Filarmônica)Teatro Amazonas • 11 de maio Congada (Francisco Mignone) Finlândia (Jean Sibelius) Maroquinhas fru-fru (Ernst Mahle)
MARIA GOLOVIN (Gian Carlo Menotti)Teatro Amazonas • 21, 23 e 25 de maio
TURANDOT (Giaccomo Puccini)Largo de São Sebastião • 29 e 31 de maio
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Por Tenório Telles*Fotos Maíra CoelhoLETRAS
memóriaLivros e A vida sem os livros seria impossível. Como viver sem a pre-
sença desse objeto mágico que nos proporciona luz nos
momentos de trevas, paz e sabedoria nas horas de tormen-
to, amizade e consolo quando tudo parece perdido? O livro é um ami-
go fiel e sempre receptivo às nossas interrogações e dúvidas. Nunca
fogem, e nos esperam pacientes nas prateleiras das bibliotecas, sobre
a cômoda. Às vezes são deixados em quartos escuros, mas mesmo
assim ficam à espera de algum leitor em busca de aventuras.
A leitura de um livro é uma experiência libertadora. Somos os
livros que lemos, ou que não lemos. Alguns deles nos marcam pro-
fundamente o ser – nos enriquecem de luz e sabedoria e nos tor-
nam melhores. O livro também é o passaporte para uma viagem
que pode ser definitiva. Ao chegar no mundo dos livros, descobri-
mos que, além da realidade, existem coisas que os olhos não vêem,
e experimentamos sensações indescritíveis de prazer e descober-
tas que fazem de nossas vidas uma aventura feita de encantamento
e compreensão sobre a realidade e os dramas humanos.
A verdade é que os livros ajudam a manter viva a memória das
sociedades – suas personagens e fatos que marcaram-lhe a história.
Prova disso são alguns lançamentos que comentaremos a seguir.
Sobre a presença da família real no Brasil, a partir de 1808, e seus desdobramentos para a sociedade brasileira, o livro do jornalista Laurentino Gomes, “1808”, merece destaque. Não é a toa que há semanas lidera a lista dos mais vendidos do país. A obra é um fascinante relato sobre a fuga da corte portuguesa para o Brasil, sob a pressão das tropas de Napoleão que bloqueavam a Europa, fato esclarecido no subtítulo da obra: “Como uma rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta enganaram Napoleão e mudaram a história de Portugal e do Brasil”. O livro também se difere por mostrar um outro lado de dom João, muito além das chacotas.
“D. Pedro II” é a biografia de uma das personalidades mais expressivas da nossa história. O livro de Murilo de Carvalho traça um perfil humano do imperador Pedro d’Alcântara, como gostava de ser chamado. O relato gira em torno desses dois aspectos da mesma personagem: o rei, que se manteve no poder durante quase cinco décadas, pouco afeito aos rituais e etiquetas da vida cortesã, e o ho-mem, tímido, “que amava as ciências e as letras tanto quanto detestava as pompas do poder”. Trata-se de uma leitura reveladora sobre a personalidade e o caráter do monarca que ajudou a construir as bases do Estado brasileiro.
1808
D. Pedro II
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“A invenção da Amazônia” é um dos mais belos livros que já se escreveu sobre o universo amazônico – costurado com os fios da ciência e da literatura, numa tessitura em que se sobressaem a emoção, a poesia e o rigor científico. A Amazônia sempre despertou o fascínio e o interesse de viajantes e cientistas estrangeiros, o que motivou a elaboração de uma percepção plasmada pelo fantástico, em que sobressai uma região tecida pela imaginação do colonizador europeu. A pesquisa da professora Neide Gondim é reveladora do processo de constituição desse imaginário amazônico, fruto do diálogo dos conquistado-res europeus com o universo regional.
* Tenório Telles é escritor, membro da Academia Amazonense de Letras e autor de “A derrota do mito” e “Poesia e poetas do Amazonas”.
Outro livro que tem suscitado o interesse de leitores e estudiosos da história brasileira é “O príncipe maldito”, em que a escritora Mary Del Priore (coordenadora de “Os senhores dos rios: Amazônia, histó-rias e margens) retrata o trágico destino de Pedro Augusto de Saxe e Coburgo, neto do imperador dom Pedro II. O príncipe foi criado até o início da adolescência como o sucessor natural do trono, mas a sua sorte mudou com o nascimento do príncipe do Grão-Pará, filho da princesa Isabel, a primogênita, com o conde D’Eu, e, portanto, o legítimo herdeiro. Preterido, Pedro Augusto sucumbiu emocionalmente. Sua vida obscura é resgatada neste belíssimo texto de Del Priore.
No âmbito regional, algumas obras, publicadas recentemente, são indispensáveis para compreendermos o processo histórico regional. “O Amazonas na época imperial”, de Antonio Loureiro, é um livro pio-neiro sobre esse período, em que o autor relata e comenta os fatos históricos ocorridos na província do Amazonas, desde a sua instalação até a proclamação da República, em 1889. Embasa sua pesquisa em documentos do cotidiano da burocracia das instituições, como as comunicações dos presidentes da província amazonense e dos líderes da Igreja Católica, para expor o aguçado ambiente social, econômico e político que marcaram a época.
Um dos livros mais importantes da produção acadêmica contemporânea, “A ilusão do fausto”, da pro-fessora Edinea Mascarenhas Dias, é um painel crítico sobre um dos períodos mais importantes do processo de desenvolvimento regional – o fausto da borracha. O mérito do livro não se limita apenas ao rigor da pesquisa, mas especialmente ao fato de ter enfocado o cotidiano dos trabalhadores, nor-malmente esquecidos ou negligenciados pelos pesquisadores oficiais. O romancista Milton Hatoum, na apresentação da obra, ressalta: “ ‘A Ilusão do Fausto’ é um estudo pioneiro sobre uma cidade, Manaus, que foi planejada e construída para atender a uma demanda do capital internacional”.
O príncipe maldito
O Amazonas na época imperial
A ilusão do fausto
A invenção da Amazônia
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Fotos Antonio IaccovazoLETRAS
Uma ficção
A Amazônia é mais uma vez fonte de inspiração para uma
obra ficcional. Agora, o mito da Cidade Encantada é o pon-
to de partida para a novela de Milton Hatoum. Autor de
três obras premiadas (“Relato de um certo oriente”, “Dois irmãos” e
“Cinzas do Norte”), o amazonense estréia no gênero com “Órfãos
do Eldorado”, da Companhia das Letras. Enfrentar o desafio de
enquadrar um de seus projetos nas regras da “Coleção Mitos”, idea-
lizada pela editora escocesa Canongate e publicada por um pool de
editoras em 30 países, não foi fácil para Hatoum, principalmente por
conta da necessidade de concisão. Mas nem bem chegou às pratelei-
ras e o livro já está na lista dos mais vendidos do país.
“Eu esperava que as pessoas se interessassem pela obra prin-
cipalmente por causa do romance ‘Dois Irmãos’, que vendeu muito.
Afinal, muitas pessoas seguem a carreira de um determinado escri-
tor, mas não imaginava que a obra teria toda essa receptividade”,
O novo livro de Milton Hatoum é
uma trama cheia de violência, luxo
e tragédia de uma época que vai da
Cabanagem ao ciclo da borracha
conta Hatoum. “Novela é um gênero que exige um texto despo-
jado e seco, no qual você deixa apenas o osso. Essa limitação me
ensinou a escrecer e eu gostei de ter escrito e, até onde eu sei, os
leitores também gostaram”.
“Órfãos do Eldorado” se passa em uma cidade à beira do
rio Amazonas, onde um visitante procura abrigo à sombra de um
jatobá. Curioso, ele se dispõe a ouvir um velho com fama de lou-
co. E assim segue a trama, cheia de violência, luxo e tragédia na
Amazônia da época da Cabanagem até o fim do ciclo da borracha.
O resultado é um livro com ares de novo, ao focar narrativa no
narrador e na história que este conta, mas que também carrega os
traços de seus livros anteriores. Uma celebração da experiência
individual em um lugar muito específico no Norte do País e que
abarca questões que são do Brasil como um todo e do homem
para além da nacionalidade.
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Foto Ruth JucáIMAGEM
de criançaBrincadeira A sensação de empinar pela primeira vez uma pipa vai além
da imaginação. É como se nossos sonhos invadissem o es-paço para fazer morada. Mesmo que “quedem” ou “guizem” meu pequeno papagaio de papel, não importa. Ele já voou, levando ao vento minha brincadeira de criança.
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