diplomacia publica
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS
DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS
BERNARDO SFREDO MIORANDO
DIPLOMACIA PÚBLICA NO BRASIL:
ESTUDO SOBRE A IMAGEM INTERNACIONAL BRASILEIRA
Porto Alegre
2010
BERNARDO SFREDO MIORANDO
DIPLOMACIA PÚBLICA NO BRASIL:
ESTUDO SOBRE A IMAGEM INTERNACIONAL BRASILEIRA
Trabalho de conclusão submetido ao Curso de
Graduação em Relações Internacionais, da
Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS,
como quesito parcial para obtenção do título de
Bacharel em Relações Internacionais.
Orientador: Prof. Dr. Paulo Gilberto Fagundes
Visentini
Porto Alegre
2010
BERNARDO SFREDO MIORANDO
DIPLOMACIA PÚBLICA NO BRASIL:
PROMOÇÃO DA IMAGEM NACIONAL NO GOVERNO LULA I (2003-2006)
Trabalho de conclusão submetido ao Curso de
Graduação em Relações Internacionais, da
Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS,
como quesito parcial para obtenção do título
Bacharel em Relações Internacionais.
Aprovado em: Porto Alegre, 10 de dezembro de 2010.
____________________________________
Prof. Dr. Paulo Gilberto Fagundes Visentini - orientador
UFRGS
____________________________________
Profa. Dra. Analúcia Danilevicz Pereira
FAPA / ESPM
____________________________________
Profa. Dra. Jacqueline Angélica Hernández Haffner
UFRGS
Para meu pai,
um brasileiro com conhecimento e orgulho de seu país
―Caminhando pela noite de nossa cidade
Acendendo a esperança e apagando a escuridão
Vamos, caminhando pelas ruas de nossa cidade
Viver derramando a juventude pelos corações
Tenha fé no nosso povo que ele resiste
Tenha fé no nosso povo que ele insiste
E acorda novo, forte, alegre, cheio de paixão
Vamos, caminhando de mãos dadas com a alma nova
Viver semeando a liberdade em cada coração
Tenha fé no nosso povo que ele acorda
Tenha fé em nosso povo que ele assusta
Caminhando e vivendo com a alma aberta
Aquecidos pelo sol que vem depois do temporal
Vamos, companheiros pelas ruas de nossa cidade
Cantar semeando um sonho que vai ter de ser real
Caminhemos pela noite com a esperança
Caminhemos pela noite com a juventude‖
Milton Nascimento e Fernando Brant, Credo
―Trincheras de ideas valen más que trincheras de piedra."
José Martí
Resumo
O presente trabalho tem como objetivo proporcionar um esboço para o estudo da
diplomacia pública no Brasil. Para tanto, fundamenta-se na teoria construtivista das relações
internacionais e discute o conceito de soft power. Em seguida, revisa a literatura existente acerca
da diplomacia pública e o estado do desenvolvimento de uma teoria a seu respeito. Aborda então
a diplomacia brasileira, seus conceitos fundamentais e sua história, enfatizando o Primeiro
Governo Lula. Focando este período, analisa a prática da diplomacia pública no Brasil.
Palavras-chave: Diplomacia Pública; Política Externa Brasileira; Primeiro Governo Lula;
Construtivismo; Soft Power
Abstract
This paper aims at providing a draft for the study of public diplomacy in Brazil. To
achieve this goal, it bases itself upon the constructivist theory of international relation and
discusses the concept of soft power. Afterwards, it reviews the existing literature on public
diplomacy and the current stage of development of a theory on the theme. Then, it brings up the
Brazilian diplomacy, its underpinning concepts and its history, emphasizing the First Lula
Government. Focusing on this period, it analyzes the diplomatic practice of public diplomacy in
Brazil.
Key words: Public Diplomacy; Brazilian Foreign Policy; Fist Lula Government;
Constructivism; Soft Power
SUMÁRIO
Introdução.............................................................................................................................8
1. Fundamentação Teórica......................................................................................................16
1.1 A Perspectiva Construtivista na Teoria das Relações Internacionais.................................17
1.2 O Conceito de Poder Brando (Soft Power) nas Relações Internacionais...........................23
2. Diplomacia Pública.............................................................................................................30
2.1 A Diplomacia Pública como Instrumento de Política Externa...........................................32
2.1.1 Tipos de Diplomacia Pública..............................................................................................36
2.1.2 A Nova Diplomacia Pública...............................................................................................40
2.2 O Estudo da Diplomacia Pública........................................................................................45
3. Diplomacia Pública no Brasil.............................................................................................48
3.1 A Identidade Internacional do Brasil..................................................................................49
3.1.1 Paradigmas da Política Externa Brasileira..........................................................................50
3.1.1.1 Período Agro-Exportador...................................................................................................51
3.1.1.2 Período Desenvolvimentista...............................................................................................52
3.1.1.3 Período Neoliberal..............................................................................................................54
3.1.2 Tradição Diplomática na Expressão da Imagem Brasileira................................................55
3.2 Iniciativas de Diplomacia Pública no Governo Lula I (2003-2006)..................................58
3.2.1 O Ministério das Relações Exteriores e a Diplomacia Pública..........................................60
3.2.2 Ações de Diplomacia Pública.............................................................................................65
3.2.3 Balanço das Iniciativas.......................................................................................................72
Considerações Finais..........................................................................................................74
Referências..........................................................................................................................76
8
Introdução
O século XX testemunhou algumas tentativas do Estado brasileiro de se alçar a um novo
patamar de poder e representatividade no sistema internacional. Assim foi com a ―equidistância
pragmática‖ de Getúlio Vargas, durante a Segunda Guerra Mundial, fazendo uso da conjuntura de
restrição aos centros capitalistas para auferir ganhos econômicos e desejando sentar-se, ao fim do
conflito, ao lado da nação vencedora; com a Política Externa Independente de Jânio Quadros e
João Goulart, na busca por um caminho de autonomia na ação internacional durante a constrição
ideológica da Guerra Fria; e com os sonhos do Brasil, grande potência, urdidos pelos governos
militares sob a inspiração da geopolítica de Golbery do Couto e Silva. Nenhum desses projetos,
porém, traria um avanço de sua posição periférica no mundo capitalista. Ao almejar a conquista
de maior capacidade de ação externa, os estadistas não levaram em consideração o déficit de
coesão da sociedade que deveria constituir a força-motriz de tais desenvolvimentos.
Neste século, os imperativos da política externa brasileira continuam sendo definidos pela
busca do desenvolvimento. Porém, a visão atual deste conceito engloba mais do que a expansão
dos alicerces ―duros‖ que formam o poder de uma nação, como a capacidade econômica, os
recursos territoriais, a dimensão demográfica e as forças armadas. Inclui a capacidade de utilizar
esses recursos para proporcionar ao seu povo uma capacidade de vida digna, abarcando não
somente a provisão dos meios materiais de subsistência, mas também o direito à informação e à
participação na vida pública, planejando o futuro do país. Certamente, os temas armamentistas e
o enfoque securitário ainda permanecem importantes tópicos da agenda externa de um Estado que
deseja ter voz nos mais altos foros de concertação internacional. Entretanto, são as posturas
adotadas com base na preocupação social que vêm se apresentando como um diferencial da ação
brasileira frente aos seus interlocutores estrangeiros, rendendo prestígio e legitimidade.
De fato, após décadas de estagnação econômica e reestruturação política, o Brasil parece
agora estar pronto para entrar em um nova fase na sua relação com o mundo. Mais do que a
simples vontade política de seus dirigentes, é hoje um desejo da sociedade civil brasileira que a
nação assuma um papel de liderança. Para tanto, deve dispor de todas as ferramentas ao seu
alcance e mesmo desenvolver aquelas que ainda não sejam amplamente exploradas por sua
Chancelaria. Entre elas, destaca-se a diplomacia pública, tema central em torno do qual o trabalho
será articulado.
9
O trabalho proposto aspira a constituir um esboço teórico que sirva como estímulo ao
estudo da diplomacia pública no Brasil e, ao mesmo, tempo, possa proporcionar uma visão
recente da política externa nacional. Dada a carência de material existente sobre este tema
específico, será abordado inicialmente o conceitual relativo à diplomacia pública, sobrepondo-o
posteriormente ao escopo da pesquisa: a política externa brasileira contemporânea. A intenção é
formular uma abordagem experimental a partir do cruzamento dos dois tópicos. Com isso, busca-
se relevar as questões ligadas à diplomacia pública nos dados apurados sobre a atuação
internacional brasileira durante o Primeiro Governo Lula, nos anos de 2003 a 2006.
Seguindo estes objetivos gerais, há uma série de etapas específicas que cumpre percorrer
para abordar o tema proposto. O estudo de um fenômeno das relações internacionais deve estar
ancorado em um marco teórico que sustente seu entendimento. No caso desta pesquisa, adota-se a
óptica construtivista, e se revisa o conceito de soft power para dar início ao tratamento do tema da
diplomacia pública, indicando os estudos já existentes sobre o assunto. Assim, a análise dos
conceitos que fundamentam o construtivismo situa os elementos constituintes da diplomacia
pública na teoria das relações internacionais.
A revisão da teoria construtivista também pode servir à posterior análise dos paradigmas
de política externa que conformam os objetivos e as linhas de ação da diplomacia brasileira.
Considerando o histórico da ação externa nacional, facilita-se o entendimento e a caracterização
da experiência diplomática do período estudado, buscando nele as manifestações da diplomacia
pública e as formas pelas quais este conceito se relaciona com a realidade brasileira
contemporânea. Com tal observação, verifica-se de que forma a ideia de diplomacia pública está
presente e é utilizado na formulação da política externa brasileira.
A maneira mais fortuita de procurar reflexos de ações brasileiras de diplomacia pública na
colocação do país na sociedade internacional é focar as iniciativas levadas a cabo pelos diversos
órgãos do governo brasileiro com o objetivo de promover a imagem internacional do país,
tomando conhecimento de seu planejamento e desempenho. A partir de então, torna-se possível
avaliar a experiência brasileira recente na utilização da diplomacia pública, e apontar perspectivas
de utilização desta ferramenta na construção de política externa no Brasil, sempre buscando uma
posição mais favorável para o país no cenário internacional.
A consecução dessas tarefas se dá tendo em mente as hipóteses de que a diplomacia
pública é um instrumento eficiente de construção de poder, e de que o Brasil tem grande
10
potencial para desenvolvê-la, e pode fazer maior uso do soft power no planejamento de sua
projeção internacional. Considera-se, ademais, que a experiência do Primeiro Governo Lula pode
demonstrar que o país se encontra em um momento e uma situação em que pode auferir
significativos benefícios do cultivo de uma diplomacia pública robusta.
Cabe, portanto, verificar a suposição de que há diversas iniciativas de diplomacia pública
no Brasil, mas elas não são consideradas com a devida seriedade, já que não se reconhece sua real
importância. Da mesma maneira, são hipóteses deste trabalho que não existe, ao contrário do que
acontece em outras áreas, uma política unificada, objetiva e coesa de promoção da imagem do
Brasil junto a públicos estrangeiros; e que a diplomacia pública é um conceito jovem e proveitoso
e, por isso, merece maior discussão, havendo pouca literatura sobre o assunto, especialmente no
Brasil.
A temática da diplomacia pública ainda é pouco difundida no Brasil. O conceito é pouco
utilizado na literatura nacional e somente nos últimos anos tem encontrado alguma projeção,
ainda que muitas vezes não seja apropriadamente compreendido. Não obstante, sua apreensão
pelo vocabulário político brasileiro pode ser muito oportuna, uma vez que serve como
fundamento para organizar, interpretar e planejar uma série de atividades que podem facilitar a
consecução dos objetivos nacionais de inserção internacional.
Muitos dos fenômenos e acontecimentos das recentes relações internacionais do Brasil já
foram assinalados por muitos estudiosos, e discutidos repetidas vezes, mas poucos foram
analisados sob o prisma da diplomacia pública ou mesmo da teoria construtivista. Uma potência
média que deseje afirmar seu papel de liderança não pode deixar de recorrer a um de seus meios
de maior potencial de projeção no panorama internacional. Uma nação que queira deixar sua
posição periférica e se tornar um respeitado polo de poder deve considerar a utilidade e a
necessidade de agir sobre as mentalidades que conformam a estrutura da sociedade internacional,
pondo em movimento suas forças profundas.
Estudar a história do Brasil rumo ao Governo Lula não se trata apenas de uma
oportunidade de utilizar o apelo de fatos recentes para despertar maior interesse sobre o assunto.
Proporciona a possibilidade de refletir sobre um ponto de inflexão histórico em que se retomam
traços que serviram de fundamento à ação internacional do Brasil ao longo de sua história, mas
que estiveram dormentes em administrações anteriores. Esses elementos, que serão revisados,
deram novo fôlego à diplomacia nacional.
11
A abertura de novos escritórios de representação do Estado brasileiro no exterior, a
expansão do pessoal empregado pelo Ministério de Relações Exteriores e a redefinição das metas
e posições de negociação do país nas instâncias internacionais são alguns fatos que indicam a
ocorrência de mudanças. Essas transformações têm repercutido no meio acadêmico, onde foram e
são objeto de diversas análises e despertam avaliações divergentes. Por um lado, alguns
observadores opinam que as ações do Brasil são marcadas pela pretensão e pela devoção
ideológica, sem considerar os fatores estratégicos ou as consequências concretas. Por outro, os
executores e formuladores da política externa defendem que apenas se recupera o orgulho pátrio
de uma nação que esteve oprimida por décadas de derrotismo. Analistas que concordam com este
ponto de vista destacam a importância do redimensionamento das ambições nacionais às
ampliadas capacidades brasileiras e da reestruturação da agenda às evoluções pelas quais passa a
sociedade brasileira.
O uso, como ponto focal, de um momento histórico cujo início e final são nítida e
instantaneamente percebidos não só por especialistas, mas pelo público em geral — o Primeiro
Governo Lula — também contribui para uma abordagem científica da diplomacia pública. Por
definição, este tipo de diplomacia lida com a subjetividade, já que se nutre da capacidade de
influência dos Estados sobre outros atores, e para entender e descrever tal processo de forma
apropriada é necessário procurar distância e imparcialidade que seriam mais difíceis de atingir
com a utilização de periodizações menos objetivas.
Dessa maneira, a pesquisa tem a intenção de servir àqueles interessados pelas relações
internacionais como uma introdução à discussão da diplomacia pública através do caso brasileiro
e de oportunizar nova perspectiva aos observadores da política externa brasileira. Busca-se, ao
interpretar dados do Primeiro Governo Lula, trazer a teoria da diplomacia pública à realidade
brasileira de forma relevante e proveitosa.
A pesquisa a ser desenvolvida é de natureza aplicada na medida em que busca
compreender as especificidades da diplomacia pública para lançar nova luz sobre a interpretação
da ação externa brasileira, esboçando assim um quadro teórico que permita novos
desenvolvimentos nesta área. Ela se utiliza do suporte de teorias já existentes acerca das relações
internacionais para investigar a diplomacia pública no Brasil, e especialmente sua situação entre
2003 e 2006. Seu caráter básico reside na tentativa de inserir a experiência brasileira em
teorizações já existentes em torno da diplomacia pública para propor uma conceituação
12
apropriada à realidade nacional. Tem, portanto, caráter exploratório, visando a proporcionar
maior entendimento da temática, ao mesmo tempo em que investiga hipóteses nela baseadas.
Na reflexão desenvolvida durante o trabalho, encaminha-se um entendimento dialético,
investigando fenômenos através de sua ação recíproca e de suas contradições inerentes, que
exigem soluções. Tal método fornece uma perspectiva dinâmica e totalizante da realidade ao
enfocar a mudança dialética que se opera na sociedade doméstica ou internacional de acordo com
as ações dos atores, entendendo que os fatos não podem ser considerados fora do contexto social,
político e econômico em que ocorrem.
Permite, assim, apontar as tendências inerciais da sociedade internacional de preservação
de uma governança excludente, dirigida por forças que agridem os próprios fatores dos quais se
nutrem. Possibilita, ademais, contrapor a esse movimento autodestrutivo as tentativas dos atores
de melhorar sua situação, contestando essa ordem ou operando de acordo com ela. Presta-se, não
obstante, a entender que se trata de uma estrutura socialmente construída e que existe não por ser
a manifestação de um axioma natural e imutável, mas por ter sido composta dessa forma e ser
constantemente reafirmada pelos poderes hegemônicos. Assim, para além das fundamentações
materialistas marxianas, corrobora também a abordagem construtivista.
Também serão utilizados aportes indutivos, conforme se concentra na experiência do
Primeiro Governo Lula como representativa da série de outros governos que o precederam e o
seguirão, demonstrativa das possibilidades de projeção do país, respeitando-se sua relação com os
meios e as condições do período. Considera-se que o Brasil tem peculiaridades que fazem
necessário o conhecimento de uma realidade peculiar antes de aplicar a teoria desenvolvida no
exterior e partir a generalizações instrumentais a propor e analisar iniciativas de diplomacia
pública.
Articulam-se, assim, argumentos dialéticos e indutivos, sustentando uma perspectiva
construtivista segundo a qual, ao defenderem seus interesses na sociedade internacional, os atores
fortalecem ou oprimem as relações que conformam os países a suas respectivas posições de
domínio ou subordinação, cooperação ou conflito. São as ideias resultantes da indução, portanto,
que orientarão as práticas que interferirão no movimento dialético de reafirmação-erosão da
ordem internacional.
O método de procedimento adotado será o monográfico, através do qual é possível
realizar o estudo de um caso em profundidade, de forma a permitir seu conhecimento amplo e
13
detalhado. Acredita-se que o tópico da diplomacia pública no Primeiro Governo Lula pode ser
representativo de outros, contribuindo para outras análises. Nele se encontram variáveis que são
comuns a outros casos e se aplicam alguns conceitos já bastante difundidos nas pesquisas de
relações internacionais. Porém, serão aplicados na área pouco exploradas da diplomacia pública e
de forma restrita aos anos de 2003-2006, permitindo maior precisão ao trabalho.
Nesse método se insere uma pesquisa qualitativa, como indicador do funcionamento das
estruturas da sociedade internacional. Entende-se que há relações entre sua realidade objetiva e a
subjetividade dos atores que não podem ser traduzidas em números. Não serão usados, portanto,
métodos e técnicas estatísticas, mas se abordará os fenômenos pertinentes de maneira descritiva,
com foco no significado dos processos que os compõem. Pretende-se assim compreender
dinâmicas que fazem parte de uma situação complexa, a execução da diplomacia pública, nos
marcos particulares do Brasil, apresentando contribuições à reflexão acadêmica e política e à
revisão de conceitos que encerram germes de mudança do meio internacional.
A variável independente deste estudo é, por excelência, a diplomacia pública, neste caso
especificamente a brasileira, influindo na variável dependente que vem a ser o poder brando do
país, o Brasil, no meio internacional, sustentada por sua reputação e sua credibilidade. Desta
forma, tenta-se avaliar os efeitos da utilização da diplomacia pública na imagem internacional do
Brasil e na construção de sua capacidade de influência sobre o ambiente externo por modos não
relacionados ao emprego de poder duro. Trata-se, portanto, de variáveis não quantificáveis.
Para evitar a consideração de relações espúrias, cabe ressaltar que a diplomacia pública
não é a única variável atuante sobre o soft power brasileiro, e que se busca determinar apenas a
sua contribuição para a construção dessa capacidade. Não se considera, portanto, que qualquer
alteração no poder brando do país se deva a esforços de diplomacia pública, pois pode resultar de
outras variáveis que não são o foco desse estudo, como seria o caso, por exemplo, de avanços
tecnológicos, da apreciação estrangeira de marcas particulares nacionais, e mesmo dos reflexos
da ação de outros atores internacionais.
Assim, não se espera que a variável independente determine a variável dependente — isto
é, que ela seja sua condição suficiente, ou mesmo uma condição necessária — mas simplesmente
se entende que nela influi de maneira capital. A pesquisa se organiza na busca de conexões e
implicações não causais, mas suficientemente precisas para se estabelecer que a influência da
14
diplomacia pública no poder brando é uma força a se considerar na formulação da política
externa brasileira.
Até hoje, na América do Sul, este tema não despertou a atenção de grande número de
analistas. No que diz respeito ao Brasil, poucas foram as referências encontradas na produção
científica nacional. Quando mencionada, a diplomacia pública é tratada de forma marginal e
confusa, sem maiores esclarecimentos. Esse fato reitera a já mencionada necessidade de estudar
tal tema, especialmente por um ângulo atual, propositivo e relevante, buscando identificá-lo e
teorizá-lo de acordo com as experiências brasileiras contemporâneas.
O Governo Lula, por sua contemporaneidade, é outro tema que não encontra tratamento
extensivo na literatura brasileira de relações internacionais. Contudo, estão disponíveis diversos
artigos em periódicos científicos, capítulos de livros, editoriais e trabalhos acadêmicos que focam
o período sob diferentes pontos de vista teóricos. Para os fins deste estudo, são de especial
interesse as obras que tratam da busca de novas formas de relacionamento interestatal e da
conquista de novas áreas de atuação na sociedade internacional, avanços estes baseados em novos
eixos de cooperação, recuperação do poder nacional de barganha, composição e gestão de
alianças, coalizões e blocos internacionais, seja através da participação multilateral ou da
aproximação bilateral, conforme o novo planejamento diplomático de um país que busca afirmar
sua importância entre seus pares e revisar as práticas e estruturas internacionais até então
vigentes.
Partindo do material disponível para a análise desses tópicos, a estrutura proposta para a
articulação deste trabalho se compõe de introdução, seguida por três capítulos, e de considerações
finais. Com esta Introdução apresentando suas linhas gerais, seguem-se seções de discussão
baseada na literatura com a proposição de seu uso para estudar a diplomacia pública no Brasil. O
primeiro capítulo proporcionará uma fundamentação teórica, trazendo à discussão o
construtivismo como teoria das relações internacionais guiando o estudo, bem como a
conceituação do poder brando como meio de projeção no cenário internacional, e identificará os
meios pelos quais os dois elementos podem ajudar a explicar a realidade brasileira. O segundo
capítulo buscará estabelecer um panorama da atual discussão acerca da diplomacia pública,
definindo-a como tema de pesquisa a partir de sua prática por burocracias especializadas no seio
do Estado, que a empregam para aumentar a efetividade de sua política externa. O terceiro
capítulo fará uso do referencial estabelecido nas seções anteriores para encontrar o emprego da
15
diplomacia pública ao longo da história da política externa brasileira, na defesa de objetivos
estratégicos que orientaram a ação do país frente a diferentes conjunturas. Será possível então
verificar a persistência ou a conversão desses preceitos no planejamento externo do Governo
Lula, mediante a análise dos trabalhos dos principais órgãos do Estado brasileiro que
desempenham funções de diplomacia pública e a interpretação da forma como foram recebidas
suas iniciativas e dos resultados obtidos. Por fim, o trabalho será revisado em suas contribuições
e conclusões, formulando as considerações finais.
16
1. Fundamentação Teórica
A diplomacia pública é uma função estatal que objetiva angariar novos níveis de poder
suave à capacidade de ação externa de um país. Embora o conceito de soft power tenha nascido e
esteja vinculado historicamente à vertente neoliberal-institucionalista da teoria das relações
internacionais, este estudo buscará explorá-lo sob uma óptica diferente. O conceito é de
importância fundamental para que o estudo das relações internacionais no Brasil explore novas
possibilidades de ação diplomática e lance nova luz a antigas práticas do país, mas a teoria
liberal, como um todo, encontra limites bem claros na sua capacidade de explicação da realidade
brasileira.
Ao contrário das previsões liberais, o final da Guerra Fria não consolidou uma vitória dos
traços democráticos do modelo norte-americanos, mas sim a crua prevalência da organização
econômica de molde capitalista em quase todo o globo. Para o Brasil, que luta desde sua
constituição como nação para se inserir em uma ordem mundial caracterizada pela injustiça e
pela exploração, esse evento não trouxe consigo a garantia de uma época de maior respeito aos
estatutos legais, nacionais ou internacionais, e aos direitos humanos que tais dispositivos devem
resguardar. Tampouco marcou uma era de fortalecimento das instituições multilaterais ou de
maiores incentivos à cooperação internacional, em que os Estados deveriam agir cada vez mais
de acordo com os interesses societários de sua população. O que se observou, de fato, foi que a
liberalização e o fortalecimento dos fluxos internacionais, de ideias, tecnologias ou capital,
somente serviu à confirmação de uma estrutura de dominação e ao agravamento das
desigualdades nela implícitas.
De fato, no Brasil, o discurso liberal serviu para legitimar políticas dóceis de
subordinação às diretrizes de mecanismos multilaterais que não se comportaram como arautos de
uma nova ordem de paz e cooperação, mas serviram aos interesses de Estados mais poderosos
que foram capazes de impor seus interesses aos pares mais fracos. Este fenômeno, porém,
apresentou diferenças em relação a outros ciclos de ascendência interestatal testemunhados pela
sociedade internacional em séculos anteriores. A dimensão do discurso, da influência ideológica,
ganhou mais espaço em relação ao emprego de recursos de força bruta. De forma menos violenta
e não menos eficaz, a potência dominante conseguiu levar as nações periféricas a acatar seus
17
planos lançando mão de seu poder suave, no que parece demonstrar uma superação da lógica
realista que até então predominava como explicação da mecânica internacional.
A explicação da realidade brasileira aponta para um aporte teórico que responda a
questões não trabalhadas satisfatoriamente pelas principais teorias das relações internacionais, o
realismo e o liberalismo. Os fatores até então explorados levam a considerar a utilização da teoria
radical-crítica, de inspiração marxista como sendo de maior proveito para a compreensão da
realidade brasileira. Esta perspectiva, que busca refletir sobre as condições históricas e materiais
subjacentes à desigualdade, porém, aponta reformas radicais de alcance global como as únicas
soluções efetivas para tal estrutura perversa. A consolidação dessas transformações requereria a
alteração dos Estados nacionais conservadores hoje existentes e da ordem opressora em que se
relacionam pela via revolucionária. Entretanto, isso só seria possível com um fortalecimento dos
novos movimentos sociais de contestação além do a mesma teoria consideraria factível ao levar
em conta os mesmos fundamentos históricos e materiais que condicionam a situação atual com o
peso e a irredutibilidade com que esta própria abordagem os trata.
Esta breve discussão apenas toca a superfície do debate que caracteriza a teoria das
relações internacionais, e não cabe a este trabalho estabelecer conclusões mais sólidas a esse
respeito. Todavia, a partir da ciência do valor das diferentes formas de interpretar as relações
internacionais, este estudo vem buscar inspiração em uma nova corrente teórica, que não seja
necessariamente uma mediana entre as correntes tradicionais, mas uma alternativa a elas.
Considerando a importância dos aportes teóricos fornecidos por essas linhas de pensamento,
recorre-se à relativamente recente teoria construtivista. Ela será abordada como foco inicial deste
capítulo, passando-se então à análise do conceito de soft power, ou poder brando.
1.1 A Perspectiva Construtivista na Teoria das Relações Internacionais
O construtivismo entrou para os estudos de relações internacionais na década de 1980,
propondo a essencialidade da abordagem dos fenômenos sociais — essencialmente em suas bases
culturais e caracteres contingentes — para a compreensão da realidade internacional. De fato, tal
interpretação resulta da inserção de décadas de debates sociológicos na disciplina de relações
internacionais nos anos finais da Guerra Fria. Suas raízes envolvem os trabalhos de autores
18
anteriores ao construtivismo, a exemplo de Karl Deutsch, cuja abordagem sociológica,
enfatizando a comunicação social e as transações sociais, teve grande influência em formulações
posteriores.
Como bem descreve Antônio Jorge Ramalho da Rocha,
―A agenda construtivista parte da perspectiva de que a realidade internacional não pode ser
entendida da mesma maneira que a realidade natural ou física, visto que parte dos elementos
que a constituem (sua ontologia) resulta de relações sociais, as quais, por sua vez, dependem,
em grande medida, das percepções dos agentes, do modo como eles apreendem normas e, ao
aceitá-las ou desafiá-las, constroem suas identidades (ROCHA, 2002, p. 213)‖.
Esta perspectiva fornece bases que estimulam a interpretação da diplomacia pública, uma
forma de comunicação e intercâmbio entre Estado e grupos sociais estrangeiros, como exercício
capaz de fazer evoluir as relações internacionais, consideradas em constante construção pelos
agentes. Analisar as estruturas como passíveis de mudança pela ação internacional não serve
apenas de alento à expectativa brasileira de ampliar sua voz no debate internacional, mas permite
identificar de que maneiras um Estado pode agir de forma a fazer ecoar seu discurso entre
audiências maiores, de forma mais profunda.
Para promover esse entendimento, o construtivismo aborda a realidade social e incorpora
as ciências sociais, bem como a dinâmica pela qual ambas contribuem para sua formação mútua,
a partir de três diferentes níveis (ADLER, 2005). Primeiramente, situa-se como instância
metafísica relativa à realidade que os cientistas buscam interpretar e ao conhecimento com o qual
procedem a essa interpretação, apresentando-se como um possível ―paradigma de paradigmas‖.
Em segundo lugar, constrói sobre esta base uma teoria social sobre o papel do conhecimento e
dos agentes que o utilizam na constituição da realidade social, tratando de temas como a
intersubjetividade e o contexto social, a coconstituição de agentes e estruturas, e o papel de
normas e autoridade na natureza da sociedade. Por fim, o construtivismo é uma perspectiva
teórica e empírica das relações internacionais que, apoiada nos outros dois níveis, advoga que a
teoria e a pesquisa nesta disciplina devem ter como pilares epistemologia e ontologia sociais.
Neste sentido, a postura construtivista vê a política internacional, mais do que como uma
realidade objetiva e irreversível, como uma estrutura socialmente construída. A organização
humana é definida, sobretudo, pela forma como são propostas, defendidas e partilhadas as ideias
e é a partir delas, e não da pura natureza material, que se constroem identidades e interesses
humanos (WENDT, 1999). Assim, observa-se as constelações políticas não como os frutos
19
diretos das forças materiais ou da qualidade do julgamento humano, que gerariam a melhor ou a
única configuração possível em um dado momento histórico, mas da forma em que o discurso, na
defesa dos interesses de grupo, moldou o desenvolvimento dos fatores existentes. Há espaço,
portanto, para a construção de uma realidade mais humana, e ela passa pelo estudo e pela
regeneração da interação social.
Tal ênfase nas ideias, todavia, é alvo de crítica de outras tradições, a exemplo de autores
realistas. Segundo Robert Gilpin:
―Ideias são obviamente importantes, mas o mundo é composto de muitos limites poderosos
como os econômicos e tecnológicos, que restringem a sabedoria e a aplicabilidade de certas
ideias e construções sociais. Qualquer teoria que procure entender o mundo deve, a exemplo do
liberalismo, do marxismo de do realismo, buscar integrar tanto ideias e forças materiais
(GILPIN, 2001, p. 20).‖1
Essa observação, válida em alguns casos, pode se basear no fato de as correntes
construtivistas preponderantes se recusarem a optar por um enfoque exclusivamente objetivista
ou mesmo subjetivista. Seus teóricos, no entanto, adotam o pragmatismo, isto é, supõem a
necessidade de ajustar suas ideias sobre a verdade conforme os desdobramentos da experiência.
Utilizam-se de um pragmatismo realista, isto é, reconhecem que embora representações do
mundo natural e social sejam sempre feitas de um ponto de vista e, portanto, constituam
interpretações, há no entanto uma realidade material além das interpretações humanas, os fatos
sociais emergem da atribuição de significado coletivo a uma realidade material pré-existente
(ADLER, 2005).
As mais críticas destas correntes seguem os aportes de Jurgen Habermas em suas teorias
sociais da ―ação comunicativa‖ e da ―democracia deliberativa‖. Segundo este filósofo, o principal
interesse cognitivo dos cientistas sociais deveria estar na emancipação. Sua teoria trata da
reconstrução dos interesses emancipatórios na teoria e na prática, e de como os processos
democráticos deliberativos ajudam as pessoas a se libertarem da comunicação distorcida.
Estas são ideias que devem estar presentes em ações de diplomacia pública propostas pelo
Brasil — incluindo-se aí desde eventos de promoção da imagem exterior até acordos de
cooperação cultural e tecnológica —, na tentativa de comunicar aos públicos estrangeiros, de
forma clara e sincera, os princípios da atuação brasileira. Conforme se altera o cenário
1 Tradução livre do original em inglês.
20
internacional, deve-se buscar, a exemplo do Estado brasileiro, o imperativo do desenvolvimento e
a consecução dos interesses nacionais. A busca do crescimento, porém, precisa se pautar pela
moral defensora da emancipação do homem de seus direitos fundamentais, utilizando o
fortalecimento cotidiano da democracia doméstica para exportar esses valores a outros povos,
ampliando o poder de atração e a legitimidade brasileiros.
Os construtivistas críticos se interessam, portanto, pelo poder emancipatório do
conhecimento. Os esforços por um melhor entendimento dos mecanismos que fundamentam a
ordem social e política também são um ato reflexivo voltado à emancipação da sociedade. Aqui é
possível entender o processo libertador como ocorrendo tanto no nível do indivíduo como do
Estado, ou seja, tanto dos indivíduos estrangeiros alcançados pelo conhecimento difundido pela
diplomacia pública dos brasileiros quanto do próprio Brasil, que ao comunicar e defender seus
valores e interesses no exterior pode superar os obstáculos que ainda restringem sua ação na vida
internacional.
O redirecionamento do foco da explicação causal e da previsão para a compreensão dos
fenômenos e de seu potencial transformador, característica fundadora da teoria construtivista,
ganhou impulso com a obra de Alexander Wendt. Os textos que introduziram tais propostas
foram desenvolvidos ao final dos anos 1980, mesma época de ascensão do conceito de poder
suave. Tais estudos chamam atenção para a necessidade de se questionar a relação entre as
estruturas e os agentes internacionais.
Na definição de Wendt, o construtivismo é uma teoria estrutural do sistema internacional
que considera os Estados como a unidade principal de análise da política internacional, e as
estruturas-chave no sistema interestatal como mais intersubjetivas do que materiais. Ainda,
propõe que os interesses e as identidades dos Estados são construídos, na maior parte, por essas
relações sociais, e não fornecidos de modo exógeno ao sistema, pela natureza humana ou pela
política doméstica. Dessa forma, embora conserve o estadocentrismo de outras abordagens, o
construtivismo se preocupa com a forma pela qual estruturas e instituições internacionais ajudam
a constituir os agentes como sujeitos investidos de poder e capazes de interagir significativamente
uns com os outros.
Todavia, o aspecto construtivista que mais pode contribuir nos termos deste estudo é a
recusa do credo de que o sistema internacional é uma estrutura atomística de Estados em
condição de anarquia impermeável à mudança. Mesmo para os liberais, que acreditam poder
21
modificá-la pela cooperação, ou para os radicais, que buscam alterá-la pela revolução, permanece
o entendimento da anarquia como característica inerente do meio internacional, fundamental à
teoria realista. Entre os construtivistas, a conduta intencional, particularmente a que objetiva
mudar a estrutura, goza de maior atenção e legitimidade teórica (GRIFFITHS, 2004). Neste
aspecto, pode-se inserir o planejamento e a execução de uma diplomacia pública voltada para a
redefinição do papel brasileiro na sociedade internacional: reconhece-se a forma pela qual os
Estados podem não apenas reproduzir a estrutura, mas transformá-la potencialmente.
É apenas a ação humana que exemplifica, reproduz e transforma as instituições e as
restrições estruturais da vida social. Da mesma forma, os Estados não existem sem conexaão com
as estruturas que os cercam, mas, ao mesmo tempo, essas estruturas dependem de sua
reprodução, e possível transformação, pelos primeiros. Conforme elabora Wendt, as estruturas
sociais possuem uma dimensão inerentemente discursiva, no sentido de que são inseparáveis das
razões e compreensões que os agentes trazem em suas atitudes. Essa qualidade discursiva não
significa que as estruturas sociais são redutíveis ao que os agentes pensam que estão fazendo,
uma vez que os agentes podem não entender os antecedentes ou as implicações estruturais de
suas ações. Mas quer dizer que a existência e a operação das estruturas sociais dependem da
compreensão de si mesmo.
Por isso, o construtivismo sugere que as estruturas que não podem ser diretamente
observadas também são reais, que os agentes procedem com base nos significados que os objetes
têm para eles, e que os significados são construídos socialmente. Wendt aponta que se deve dar
tanta prioridade às representações dominantes das relações internacionais na compreensão da
conduta do Estado quanto à distribuição de forças materiais entre os Estados, sejam elas
militares, políticas ou econômicas. Mais importantes do que os fatos crus das distribuições
materiais de um ou outro fator, são a interpretação e o significado que os próprios agentes lhes
designam. Ora, é sobre essa dimensão perceptiva que atua a diplomacia pública, conduzindo o
entendimento que outros atores fazem de um Estado, no caso, o Brasil.
Além de Wendt, que talvez seja o mais conhecido teórico do construtivismo, outro
importante articulador desta corrente é Nicholas Onuf. Foi Onuf quem, de fato, cunhou o termo
―construtivismo‖ em 1987. Sua obra ressalta o papel ativo do indivíduo. Ele não seria apenas um
ator, agindo no mundo, mas um agente, agindo sobre o mundo, e estando, portanto, intimamente
ligado à mudança, promovendo-a ou resistindo a ela. A instrumentalidade é uma condição social,
22
e é apenas como entes sociais que os seres humanos podem viver e agir no mundo (ONUF,
2002).
A diplomacia é uma interação social que, ao conectar Estados, promove acordos que
definem sua conduta. Embora não seja capaz de mudar diretamente a ação de um país —
redirecionando-a —, a diplomacia pública age em sua base, ao intercambiar e modificar visões de
mundo. É possível entender esse processo nas palavras de Onuf, para quem a linguagem tem uma
função constitutiva:
―Enquanto cada um de nós vive em um mundo inteiro que é unicamente nosso, nós partilhamos
nossos mundos ao falar sobre eles para outras pessoas. Os mundos de que falamos só podem ser
representações parciais e altamente seletivas do que vemos. Nós tornamos essas representações
mais ou menos compatíveis ao dizer um ao outro não apenas o que vemos (ou queremos que
vejam), mas também o que queremos que façam, e por que deveriam fazê-lo. Falar sobre
mundos é sempre um ato normativo. Ao falar, limitamos o número de mundos que somos
capazes de identificar coletivamente (ONUF, 2002, p. 121).‖2
Essa perspectiva é válida tanto para pessoas para nações, no diálogo de cada qual com
seus pares. Onuf lembra que, pela série de regras e códigos de conduta — em sua maioria não
escritos — que operam neste último nível, os Estados sobrevivem em uma forma que pouco
mudou nos últimos dois séculos, a despeito das mudanças na vida cotidiana. Eles são o produto
de uma construção social histórica de lutas e progresso material, mas existem apenas em relação
formal um com o outro, e as maneiras pelas quais podem se relacionar são limitadas. O autor
interpreta a reprodução social dos Estados:
―Forma é a chave, uma vez que demos a esse mundo sua formalidade e, por conseguinte, seus
limites. Ficam excluídos todos os tipos de relações sociais que têm efeitos diretos e duradouros
em uma escala global ou quase global. Inversamente, um mundo que abarcasse a maior parte
destas relações teria de relegar os Estados a um segundo plano. Várias outras instituições
tomariam a dianteira, e o número de agentes aos quais pertenceria esse mundo aumentaria
drasticamente (Idem).‖3
Daí se pode depreender o desafio dos Estados contemporâneos, entre eles o brasileiro:
conduzir uma diplomacia forte, de modo a assegurar sua resistência e sua primazia na condução
dos embates internacionais que lhe são pertinentes. Ao mesmo tempo, a construção dessa força
2 Tradução livre do original em inglês.
3 Tradução livre do original em inglês.
23
não pode — e esta é uma questão normativa — continuar a conduzi-los com a exclusão da maior
parte dos agentes sociais que o compõe, nem ignorar os grupos equivalentes existentes no seio de
outros Estados. Tratar de forma atenciosa e inteligente o crescimento e o fortalecimento da
sociedade civil — doméstica, estrangeira e internacional — é uma oportunidade de agir sobre as
estruturas internacionais no sentido de trazer mais democracia ao sistema e angariar maior poder
brando para si.
1.2 O Conceito de Poder Brando (Soft Power) nas Relações Internacionais
O conceito de soft power4 apareceu pela primeira vez na obra de Joseph Nye, em 1990,
descrevendo uma dimensão de poder dos Estados que até então não recebia muita atenção, muitas
vezes tratada como ―a segunda face do poder‖. Para o autor, a natureza do poder muda de forma
mais dinâmica na era global da informação e os líderes devem prestar mais atenção ao seu lado
brando, isto é, aquele que influencia o comportamento de outros sem recorrer à coação, mas
obtendo os desenvolvimentos desejados por meio da sedução e da cooptação.
Nye propõe a seguinte definição de soft power:
―É a habilidade de conseguir o que se quer através da atração, e não da coação e de pagamentos.
Ele surge da atratividade da cultura, dos ideais políticos e das políticas de um país. Quando suas
políticas são vistas como legítimas, o poder brando se eleva. (NYE, 2004, p. X)‖5.
O poder de atração de uma nação diminui a necessidade de empregar meios coercitivos
para obter condutas favoráveis de seus pares e gera cooperação com base na sintonia de interesses
e ideais, orientados pelos sensos de justiça e dever. Esta sintonia, é claro, não ocorre naturalmente
entre dois países de valores díspares e preferências distintas, e a posição que capitaliza admiração
em um cenário pode se desfazer quando o contexto se modifica — o poder está sempre ligado ao
4 Embora o conceito tenha já vinte anos, sua difusão formal no Brasil é irregular, sendo que muitos
pesquisadores utilizam o termo na sua forma origina, em inglês, contrapondo-o a hard power, que, quando traduzido,
é freqüentemente chamado de ―poder duro‖. Algumas traduções nomeiam soft power como ―poder suave‖ e outras,
como ―poder brando‖. Neste estudo, intercambiam-se as nominações sem prejuízo de significado.
5 Tradução livre do original em inglês.
24
contexto em que uma relação se dá. O poder brando, portanto, reside na capacidade de moldar as
preferências dos atores, influindo na agenda internacional (Idem).
O poder suave não é apenas um sinônimo de influência, uma vez que esta pode ser obtida
com o uso do poder duro, seja pelo uso de força militar, seja pelo uso de recursos econômicos,
por ameaça ou suborno. Ele envolve a capacidade de persuadir e mobilizar públicos pelo
argumento e, sobretudo, de atrair, obtendo, pela atração, a aquiescência. Os recursos de soft
power, portanto, são aqueles capazes de gerar tal atração, e podem ser abordados pela forma
como conseguem afetar as preferências dos atores, o que por sua vez pode ser medido através de
pesquisas de opinião e sondagens de grupos de interesses.
Nye ressalta a associação entre poder duro e poder brando, uma vez que ambos se guiam
pelo propósito de alcançar um objetivo afetando o comportamento de outro agente. Distinguem-
se de fato pelo grau de tangibilidade dos recursos e natureza dos comportamentos. Esses
comportamentos variam em um espectro que vão do poder de comando ao poder de cooptação,
seguindo da coação à indução econômica, para chegar à definição de agendas e então à pura
atração. Contudo, o poder duro pode gerar atração através de mitos de invencibilidade e o poder
de comando é capaz de estabelecer instituições que mais tarde serão marcos de legitimidade. A
potência econômica pode ser usada de forma dura, em sanções e subornos, mas também tem sua
face branda quando atrai atores que admiram o progresso produtivo e o bem-estar material de um
país.
Porém, o soft power não é dependente do hard power. Os Estados podem gozar de uma
reverência política maior do que se suporia pela medida de sua força militar e financeira quando
seu interesse nacional está alinhado a causas humanitárias, de ajuda econômica e manutenção da
paz. O poder brando também pode ser potencializado com a participação estruturante nas
instituições internacionais. Nye conclui que:
―Quando os países legitimam seu poder aos olhos dos outros, encontram menos resistência à
sua vontade. Se a cultura e a ideologia de um país são atrativas, os outros o seguirão de melhor
grado. Se um país pode moldar regras internacionais que sejam consistentes com seus interesses
e valores, suas ações provavelmente parecerão legítimas aos olhos dos outros. Se ele utilizar
instituições e seguir regras que encorajem outros países a canalizar ou limitar suas atividades de
25
acordo com sua preferência, não precisará incorrer em tantos gastos com induções e coações.
(NYE, 2004, p. 10-11).‖6
É por isso que, ao longo da história, os impérios buscaram estabelecer e manter o domínio
com mais recursos do que o poder militar, recorrendo à influência cultural e à persuasão política.
Para Peter van Ham, a maioria dos impérios buscou a dominação mais do que o controle direto e
completo dentro de seus territórios e dependências. O grande desafio das potências imperiais é
converter poder duro em suave, tornar o medo em respeito e transmutar o terror em legitimidade.
O poder imperial estaria baseado em um misto do componente militar e da legitimidade advinda
de ideologia e religião. Como um fenômeno que envolve poder, interesses econômicos e ideias
culturais e religiosas, a força imperial de uma nação tem também de estar ligada à imagem da
chegada do ―progresso‖. Assim,
―Embora o poder militar (‗duro‘) tenha sido instrumental na construção de impérios, o poder
‗suave‘ de legitimidade, credibilidade, superioridade cultural, e dominação normativa
relacionada, foi essencial para manter o controle. Pode-se argumentar que tanto o Império
Britânico como o Soviético caíram em declínio porque perderam legitimidade junto a seu
próprio povo (VAN HAM, 2005, p. 48).‖7
Mesmo não tendo ambições imperiais, países como o Brasil devem estar atentos a
conjunturas críticas, nas quais é necessário e ao mesmo tempo mais fácil às elites promover
ideias diferentes sobre a ordem política e ao papel de seu Estado em uma nova constelação de
potências. Nestes momentos, iniciativas que levem a uma nova visão sobre o país são
especialmente importantes, pois podem substanciar em real um poder que até então era
meramente potencial. Este seria o caso do Brasil, segundo Cristina Pecequilo, para quem:
―O Brasil, portanto, possui poder potencial que não consegue se converter em poder real,
permitindo que outros agreguem valor e consigam domínio a partir de seus recursos, deixando,
além disso, muitos dos recursos potenciais sem exploração (PECEQUILO, 2004, p. 58).‖
Esta realidade, que a autora constata a partir da análise de recursos naturais e duros como
biodiversidade e produção de matérias-primas, é também perceptível no caso de recursos suaves.
Os três pilares do soft power listados por Nye — cultura, ideais políticos e políticas — são
respaldados pela configuração sócio-política do Brasil. Com suas tradições populares, folclore e
6 Tradução livre do original em inglês.
7 Tradução livre do original em inglês.
26
produção artística de grande diversidade e qualidade, o país é capaz de atrair a atenção de outros
povos, que podem passar a identificar seus interesses com os dos brasileiros ao perceberem os
ideais de democracia e desenvolvimento do país, que se manifestam na persecução de políticas
externas de progresso, concertação e reforma igualitária das instituições internacionais.
O desenvolvimento de novas tecnologias e a consequente abertura de novos canais de
comunicação com públicos estrangeiros tornam possível ao Brasil se utilizar da diplomacia
pública para converter em real seu poder brando potencial. Como à época da constituição das
grandes potências imperiais, a informação segue hoje sendo uma forma de poder. Porém, no
mundo contemporâneo das telecomunicações instantâneas, uma parcela muito maior da
população global tem acesso a esse poder. Como descreve Nye,
―Avanços tecnológicos levaram a uma redução dramática no custo de processar e transmitir
informação. O resultado é uma explosão de informação, e isso produziu um ‗paradoxo da
abundância‘. Abundância de informação leva à escassez de atenção. Quando as pessoas são
sobrecarregadas pelo volume de informação que as confronta, é difícil saber em que se
concentrar. A atenção, e não a informação, torna-se o recurso escasso, e aqueles capazes de
distinguir a informação válida do ruído de fundo ganham poder (NYE, 2004, p. 106).‖8
Os Estados passam a necessitar, então, de outra fonte suave de poder: a credibilidade, que
se torna crucial para cativar públicos estrangeiros. Informes sobre eventos ocorridos em outros
países podem levar públicos nacionais a pressionarem seus representantes por uma resposta,
influindo assim no planejamento da política externa. Diferentes versões dos fatos levam a
diferentes reações, e a atração pode se tornar repulsa se a postura de um agente for arrogante e
brutal, traindo os valores que diz defender e comprometendo a mensagem que deseja passar a
seus pares.
A reputação se torna ainda mais importante do que era no passado, e embates políticos se
dão com base na afirmação ou na contestação da confiabilidade das informações prestadas por
um ator. A todo momento, a disputa política passa a ter como pano de fundo a competição entre
agentes por maior credibilidade. A capacidade de influência de um país no cenário internacional
depende, portanto, na sua capacidade de conduzir e promover sua política externa de forma
aberta e coerente, aceitável aos olhos dos estrangeiros. Nye afirma que:
8 Tradução livre do original em inglês.
27
―Sob as novas condições da era da informação, mais do que nunca, uma ‗venda sutil‘ se prova
mais eficaz do que uma ‗venda forçada‘. Sem a credibilidade nacional fundamental, os
instrumentos da diplomacia pública não podem transformar recursos culturais no poder brando
da atração. A efetividade da diplomacia pública é medida por mentalidades mudadas (conforme
demonstrado em entrevistas ou pesquisas de opinião), e não em dólares gastos ou rótulos
sofisticados (NYE, 2008, p. 101).‖9
Para este autor, o poder brando é mais difícil de manejar do que as forças econômicas e
militares que compõem o poder duro, já que muitos de seus recursos fundamentais se encontram
fora do controle dos governos, e os seus efeitos dependem da aceitação da audiência receptora. O
soft power atua de forma indireta, moldando o ambiente em que se dão as negociações políticas, e
pode levar anos para produzir os resultados desejados.
Estas ideias são reforçadas por autores como David Molina Rabadán e Marcela Iglesias
Onofrio, que buscam aprofundar o entendimento desse funcionamento com a proposição do
estudo da noopolitik e da noosfera como paradigmas apropriados ao estudo das evoluções
contemporâneas da diplomacia pública. A noosfera, ademais da esfera da informação, abarca
também a soma de ideias, mitos, crenças, atitudes que o homem produz ao agregar dados e os
analisar. É um espaço global de opiniões e discussões intelectuais, emotivos e imaginários, a
arena por excelência de abordagem do “paradoxo da abundância‖.
A noopolitik se compõe de políticas que dão primazia ao soft power, aos atores não-
estatais e aos interesses compartilhados. Busca a cooperação dentro de um marco ético definido
por atores orientados por fins comuns, propensos a partilhar informação e balancear
responsabilidades, organizados em redes de aliados vitais para a segurança. Para os autores,
―Da mesma forma que o poder brando, a noopolitik visa a atrair, persuadir, cooptar e influir nas
percepções da opinião pública; busca ter a habilidade de conduzir as interações externas em
termos de conhecimento para o qual se requer uma estratégia de informação que adquira a
posição de matéria de segurança nacional e que se centre na ‗balança de conhecimento‘,
diferente da tradicional ‗balança de poder‘ (MOLINA RABADÁN & IGLESIAS ONOFRIO,
2006, p. 8-9).‖10
9 Tradução livre do original em inglês. Aqui, ―venda sutil‖ e ―venda forçada‖ são termos utilizados como
aproximações das expressões soft sell e hard sell, respectivamente.
10 Tradução livre do original em espanhol.
28
A óptica dualista proposta por Nye, porém, recebeu também críticas, como as de Javier
Noya. Este autor contesta a separação teórica entre poder duro e poder brando, argumentando que
não se trata de recursos vindos de diferentes tipos de fontes, mas sim de maneiras diversas de
aplicar um mesmo fator. Noya argumenta que o poder brando é subsidiário do poder duro —
parte das mesmas bases, mas é exercido de forma branda:
―O poder brando não é um tipo de poder, mas qualquer recurso, incluindo as capacidades
militares, pode ser brando na medida em que esteja socialmente legitimado para um fim. Isto
faz com que o aspecto da percepção se torne um elemento-chave. (NOYA, 2005, p. 2).‖11
Sua crítica aponta que a teoria de Nye não distingue a capacidade dos agentes de
determinar os interesses nacionais desde a sua raiz da capacidade de mudar as estruturas de
incentivos embasadas nos mesmos interesses dados. Falta à formulação de Nye, ainda, estipular
as diferentes formas pelas quais se pode materializar tal capacidade, que pode ser mais racional
ou emocional, por dedução ou sedução. Noya justifica a necessidade dessa distinção expondo que
há uma espécie de poder brando que anula a vontade das pessoas, enquanto outra dá margem à
argumentação racional.
Para o autor, o poder suave não deve ser considerado como sobreposto ao poder duro, mas
como uma continuação do mesmo mediante meios distintos. Com base no trabalho de Janice
Bially Mattern, ele demonstra que a atração se constrói sócio-linguisticamente através da disputa
entre formas de representação da realidade, no mícronível das estruturas comunicativas, através
do tipo de discurso que se articula. Ao trabalhar com a maneira como o confronto de diferentes
visões de mundo leva à modificação da sociedade internacional, Noya aproxima a teoria liberal
do soft power das abordagens construtivistas das relações internacionais. Conforme o autor,
―Melhor do que poder brando, propomos denominá-lo ‗poder simbólico‘. Desta maneira, a
questão também se traslada ao terreno subjetivo e se destaca que o reconhecimento é a variável-
chave. A percepção e (des)legitimação é parte essencial do poder. Um recurso se traduz em
poder na medida em que seja reconhecido como tal e seja considerado legítimo (NOYA, 2007,
p. 150)‖12
.
Apesar das críticas que faz à abordagem que Nye proporciona à questão do soft power,
Noya considera que este é um conceito de grande importância, sem uma teoria à altura de suas
11
Tradução livre do original em espanhol.
12 Tradução livre do original em espanhol.
29
implicações políticas. A maior parte dos autores que aborda o poder brando considera que nunca
foi tão importante e urgente desenvolver uma teoria acerca dele. Apesar disso, ainda são poucas
as pesquisas que buscam medir seus efeitos e estipular seu alcance. Para tanto, seria necessário
pesquisar a forma como as audiências estrangeiras recebem as mensagens de um país — seja
através do intercâmbio cultural, da proclamação de ideais ou de concertação política em
instâncias multilaterais arenas internacionais — e como se adaptam a elas. Eis uma área de
grande interesse para a diplomacia pública e com a qual os formuladores de política externa no
Brasil muito podem aprender.
30
2. Diplomacia Pública
O termo ―diplomacia pública‖, pouco difundido no Brasil, pode despertar dúvidas
naqueles que com ele se deparam. Afinal, se a diplomacia é uma tarefa levada a cabo
fundamentalmente pelo Estado13
, não é, toda ela, pública? De fato, a diplomacia pública é assim
chamada não pela sua origem, mas pelo seu destino: seria justo chamá-la de ―diplomacia para
públicos‖, pois trata-se de uma diplomacia voltada para comunicação com diferentes segmentos
sociais através de atos públicos.
Conforme apurado por Nicholas Cull, a acepção moderna do termo ―diplomacia pública‖
foi delimitada em 1965 pelo norte-americano Edmund Gullion, diretor da Fletcher School of Law
and Diplomacy na Tufts University e oficial aposentado do serviço exterior. Ao estabelecer o
Edward R. Murrow Center of Public Diplomacy, Gullion publicou a seguinte definição:
―A diplomacia pública lida com a influência de atitudes públicas na formação e na execução de
políticas externas. Ela engloba dimensões das relações internacionais para além da diplomacia
tradicional; o cultivo pelos governos da opinião pública em outros países; a interação de grupos
de interesses privados em um país com outro; a notificação dos negócios estrangeiros e de seu
impacto nas políticas; a comunicação entre aqueles cujo trabalho é a comunicação, como
diplomatas e correspondentes internacionais; e o processo de comunicação intercultural.‖14
Ainda segundo Cull, Gullion não foi o primeiro a usar a expressão, mas o redefiniu para
substituir o conceito de propaganda, que acumulara conotações demasiado negativas. A forma
―diplomacia pública‖ foi usada amplamente durante a Primeira Guerra Mundial para descrever
uma série de novas práticas diplomáticas que ia desde pronunciamentos alemães, passando pela
declaração pública de condições para a paz, até a visão idealista do presidente norte-americano
Woodrow Wilson de uma sociedade internacional assentada sobre ―pactos públicos de paz,
alcançados abertamente‖ — conforme os catorze pontos que enunciara em um discurso de 1918.
À época, muitos autores preferiam o termo “open diplomacy”, ou ―diplomacia aberta‖,
mas o uso de ―diplomacia pública‖ seguiu em uso, marcado pelo viés idealista wilsoniano, na
retórica dos internacionalistas do entre-guerras, experimentando um declínio com a Segunda
13
A diplomacia também pode ser exercida por outras instâncias do poder público, como governos sub-
nacionais, sendo então denominada paradiplomacia, e por atores privados da sociedade, como empresas, sendo
designada como diplomacia empresarial.
14 Gullion, apud CULL (2006, p. 1). Tradução livre do original em inglês.
31
Guerra Mundial. Reemergindo no pós-guerra, a ideia de diplomacia pública representava então
uma comunicação aberta e a declaração de intenções pelos governante junto ao público
doméstico e externo, de forma coerente. Esse sentido, estimulado pela constituição da
Organização das Nações Unidas (ONU), encontrava também críticos, que advogavam o retorno a
uma diplomacia sigilosa, conduzida em particular entre representantes governamentais.
Através da década de 1950, a expressão ―diplomacia pública‖ passou a ser identificada
com o campo de informação internacional e propaganda. Não era uma simples mudança de
utilização, senão uma consequência das transformações por que passava a prática diplomática e
seu entendimento. Eventos diplomáticos significativos passavam a ser reconhecidos como atos
explícitos de atuação pública, como bem demonstrariam os líderes dos Estados Unidos, John
Kennedy, e da União Soviética, Nikita Kruschev.
Com a aproximação entre a prática pública da diplomacia e a propaganda, Edmund
Gullion estendeu o significado que até então se atribuía à diplomacia pública para dar a ela um
novo sentido, servindo como alternativa a um termo que rumava à infâmia. A expressão
―diplomacia pública‖ conforme a definição de Gullion se difundiu na década de 1960 porque
havia uma demanda concreta por um conceito assim — em Washington. A United States
Information Agency (USIA) precisava de uma alternativa à passividade de ―informação‖ e à
conotação manipulativa de ―propaganda‖. A simbiose foi tal que em 1999, quando da absorção
da USIA pelo Departamento de Estado, o Murrow Center for Public Diplomacy se tornou o
Murrow Center for International Information and Communications (CULL, 2006).
O conceito, porém, vingou, e tinha já ultrapassado os limites de uma única agência ou das
fronteiras estadunidenses. Durante os anos 1990, ganhou novas audiências entre os analistas de
política exterior de outros países. Foi, porém, após os atentados de 11 de setembro de 2001 que a
diplomacia pública retornou com mais força às discussões sobre política internacional nos
Estados Unidos, e recebeu novo ímpeto para adentrar os cálculos estratégicos de novos Estados.
A necessidade de um instrumento que estabelecesse uma comunicação positiva entre o Ocidente
e os habitantes do Mundo Islâmico levou a uma reavaliação da área, que no Brasil ainda passa
largamente desconhecida.
A popularidade ascendente da diplomacia pública foi, na maior parte do tempo, uma
resposta direta ao declínio da imagem nacional nas percepções estrangeiras. A maior parte das
iniciativas de diplomacia pública de sucesso nasceu da necessidade. Foram reações e não produto
32
do planejamento visionário de um serviço exterior preocupado com os relacionamentos com
audiências estrangeiras como um novo desafio para a prática diplomática. A busca de
desenvolvimento é uma forte motivação econômica para empregar a diplomacia pública
(MELISSEN, 2005). A crescente projeção brasileira no cenário internacional coloca, portanto, o
desenvolvimento de técnicas eficazes de diplomacia pública como uma tarefa premente para o
fortalecimento da política externa.
2.1 A Diplomacia Pública como Instrumento de Política Externa
Por mais que a o debate sobre a diplomacia pública continue profundamente marcado pela
experiência americana e seja incipiente no Brasil, práticas de promoção da imagem externa,
propaganda e atividades que hoje são rotuladas de diplomacia pública são tão antigas quanto a
própria diplomacia. A comunicação oficial voltada a públicos estrangeiros não é um fenômeno
recente nas relações internacionais, e pode ser rastreada até os tempos bíblicos.
Os saltos tecnológicos que influenciaram tantos aspectos da vida social trouxeram
também transformações no potencial dessas práticas. Assim foi com a invenção da imprensa no
século XV, alterando a escala possível de comunicação oficial com audiências estrangeiras e de
promoção da cultura nacional através do texto impresso. No século XX, o advento das rádios
internacionais permitiu às potências europeias manter laços culturais e linguísticos com seus
concidadãos no exterior e controlar as informações que chegavam às colônias. Além disso, a
exploração destes recursos para a propaganda bélica levou forças como fascismo, comunismo e
capitalismo democrático a batalhar nas ondas curtas por ―corações e mentes‖ de públicos
estrangeiros (Idem).
Ao contrário da propaganda utilizada por ditaduras em tempos de guerra, a diplomacia
pública é um exercício de persuasão civilizada, caracterizando-se pela disseminação de
informação pelas democracias em tempos de paz. É um instrumento a serviço da política exterior,
e se baseia na premissa de que as opiniões, atitudes e comportamentos dos cidadãos de outros
países importam aos governos, dado seu impacto nas políticas econômica e exterior e, por
conseguinte, nos interesses nacionais (NOYA, 2007).
33
Apesar de atividades típicas de comunicação com audiências estrangeiras terem sempre
sido parte da prática diplomática histórica como um todo, há diferenças entre a diplomacia
pública e a diplomacia tradicional. A primeira tem sempre como alvo a opinião pública em geral
e, por isso, trabalha com informações transparentes e publicizadas. A segunda, dirigida a
segmentos específicos da sociedade estrangeira, especialmente elites políticas e econômicas e
autoridades do governo, trabalha com informações muitas vezes sigilosas, longe dos olhos do
povo. No dizer de Jan Melissen:
―A distinção básica entre diplomacia tradicional e diplomacia pública é clara: a primeira trata
de relacionamentos entre representantes dos estados, ou outros atores internacionais; enquanto a
segunda mira o publico geral em sociedades estrangeiras, bem como indivíduos, organizações e
grupos não-oficiais mais específicos (MELISSEN, 2005, p. 5).‖15
Essas diferenças, porém, não constituem uma oposição, mas uma complementaridade. A
diplomacia pública prepara o terreno para atos diplomáticos tradicionais: quando um governo
propõe a outro ações e estratégias, a opinião pública e as elites deste já terão informação a
respeito, e vários atores poderão aceitar tais iniciativas. Para a promoção e coordenação da
diplomacia pública, por sua vez, é fundamental a existência da infra-estrutura diplomática
tradicional, ou seja, de uma embaixada que conte com diplomatas devidamente credenciados.
Para o efetivo desempenho de suas funções, esses profissionais devem estar conectados à
sociedade civil, e estabelecer laços com lideranças locais e formadores de opinião.
A diplomacia pública é uma parte da diplomacia como um todo que abre oportunidades
para contatos entre pessoas que podem se converter em vínculos oficiais, mas também leva a
criação de redes informais. Ela é, portanto, capaz de forjar vínculos e canais de comunicação
entre os países que se preservam mesmo quando as relações diplomáticas formais se deterioram,
congelam ou mesmo se rompem. Nestes momentos de crise das relações bilaterais, ativam-se as
ligações entre cidadãos e grupos civis organizados, que não dependem do suporte governamental
para funcionar, e seguem interligando sociedades de dois ou mais países em atrito. Essas
sociedades, reconhecendo a importância do convívio pacífico entre si, trabalharão junto aos seus
governos pela retomada das relações normais.
Assim, políticas de diplomacia pública levam a cabo tarefas de informação, educação e
cultura, essenciais para atingir seu objetivo de influenciar o comportamento de um governo
15
Tradução livre do original em inglês.
34
estrangeiro de forma indireta. Seus programas devem esclarecer os cidadãos estrangeiros quanto
às posições que o país adota e as perspectivas de colaboração, gerando atitudes favoráveis. É
importante lembrar que, ao dialogar com audiências externas, a autocrítica é imprescindível. O
emissor não pode se furtar a escutar a opinião pública do outro país, mas explorar o diálogo para
chegar à compreensão mútua (NOYA, 2007).
Entretanto, não se pode cair na visão ambiciosa e mecanicista de que atividades de
diplomacia pública são essencialmente voltadas para fazer com que a opinião pública estrangeira
apoie as decisões dos líderes políticos locais que se coadunem com os objetivos de política
externa do país emissor. Tal abordagem expõe a diplomacia pública às contradições e
descontinuidades da política externa, sujeita a mudanças abruptadas devido a trocas de governo.
Se ela estiver ligada intimamente a objetivos muito específicos de política exterior, corre o risco
de se tornar contraprodutiva e cair em descrédito quando a política externa executada for
percebida como ineficaz e fracassar. Em tais circunstâncias, a diplomacia pública se torna um
ponto fraco e deixa de ser útil como um instrumento cuja característica distintiva é a habilidade
de alcançar espaços e audiências que a diplomacia tradicional não alcança (MELISSEN, 2005).
A comunicação promovida precisa estar sempre baseada em políticas e ações reais, e
integrada a elas de forma estratégica. A diplomacia pública não pode ser tratada como uma fase
final da política exterior e da diplomacia, como a mera divulgação de fatos consumados. Ela deve
agir desde o processo de formulação, analisando audiências e possibilitando ajustes nos planos de
ação, para corrigir equívocos e localizar eventuais dificuldades.
Entender o público estrangeiro se torna mais premente em um momento em que cresce a
importância da opinião pública internacional. Os avanços na educação a nível global — tanto no
número de pessoas que recebem algum tipo de instrução formal quanto no grau de instrução que
cada pessoa recebe — levam o cidadão médio a se tornar mais capaz de entender as questões de
política internacional e, portanto, mais críticos. As estruturas internacionais, por sua vez,
encontram cada vez mais questionamentos e aumenta o anseio por mudanças. Em conjunturas
críticas com tal horizonte de incerteza, abre-se mais espaço para que os agentes apresentem novas
visões de futuro. Países como o Brasil ganham voz ao se mostrarem capazes de gerir contextos
adversos e apresentar soluções para problemas que afligem a sociedade internacional como um
todo.
35
Para ocupar posições de destaque nas redes de cooperação, o Brasil precisa garantir a
confiança dos demais países, e a conquista de prestígio internacional passa por cuidados com a
imagem projetada. Esta tarefa só pode ter sucesso completo quando mobiliza todos os níveis do
Estado e da sociedade: se um Estado não for capaz de conferir um nível mínimo de bem-estar aos
seus cidadãos, não sendo atrativo do lado de dentro das fronteiras, não pode esperar que os
públicos externos venham a admirá-lo (NOYA, 2007). Por isso, os avanços alcançados no
Governo Lula I em termos de redução da pobreza e melhorias na distribuição de renda são um
fator importante a angariar prestígio para o Brasil.
Políticas inclusivas de educação e tecnologia se constituem em prioridades na medida em
que as sociedades atuais são sociedades do conhecimento, em que os cidadãos têm mais acesso à
informação sobre todos os assuntos, incluindo as relações internacionais. De fato, a política
internacional se torna cada vez mais importante para os eleitores, influenciados não apenas pelos
dados que podem obter na internet, mas também pelo ambiente midiático que os envolve. Dar
maior destaque a uma diplomacia pública que trabalhe junto a esses eleitores mais informados
constitui uma espécie de revolução nos assuntos diplomáticos.
A evolução das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) traz novos desafios ao
fazer diplomático, exigindo competências no trabalho com a noopolitik. A diplomacia pública,
em particular, precisa prestar atenção na forma como a facilidade e a rapidez do acesso à
informação por seus públicos reduz as vantagens comparativas dos peritos e assessores
governamentais no trato dos fatos internacionais, ressaltando o papel de atores não-estatais e
aumentando as expectativas de participação dos cidadãos. Faz-se necessário revisar a forma
tradicional de decidir e implementar políticas. Por outro lado, abrem-se novos horizontes aos
gestores das relações exteriores na exploração de campos potenciais como a diplomacia digital.
Devido à crescente importância da internet e sua relação custo-benefício, é vital explorá-la
para ampliar a comunicação dentro de governos e entre estes e outros atores. O conteúdo das
mensagens difundidas pelo serviço exterior e o formato pelo qual estas informações são
divulgadas estão ligados integralmente. Quando o formato permite às audiências entender o
conteúdo com mais facilidade, a mensagem pode ser mais efetiva. A evolução dos formatos da
informação faz com que os conteúdos sejam progressivamente mais acessíveis, compreensíveis e
úteis.
36
A ligação entre conteúdo e formato nunca foi tão crucial como agora, quando a internet se
torna a principal plataforma de comunicação. Um número crescente de ministérios de assuntos
exteriores já utilizam a internet para publicar, obter, analisar e partilhar informação.Talvez seja
ainda mais interessante perceber a forma pela qual a internet é usada para fins de deliberação e o
papel da audiência doméstica. Uma parte importante da diplomacia pública como diálogo é o
intercâmbio de percepções e opiniões. Dar voz à opinião pública doméstica e estrangeira é
democratizar a formulação da política externa, envolvendo a sociedade civil no processo
decisório (GONESH & MELISSEN, 2005; COWAN & ARSENAULT, 2008).
2.1.1 Tipos de Diplomacia Pública
Brian Hocking distingue entre três abordagens utilizadas pela diplomacia pública
contemporânea para definir o que é o público que a norteia e onde ele se encaixa na prática
diplomática. Uma primeira visão encara o público estrangeiro como um alvo a ser influenciado
para pressionar seu governo a adotar uma postura favorável ao Estado emissor, através dos canais
da política interna. A influência exercida pelos públicos estrangeiros sobre os tomadores de
decisão pode ser conduzida pela manipulação da opinião pública efetuada através da mídia. Esse
ponto de vista vê ainda os cidadãos estrangeiros como instrumentos políticos a serem utilizados
para influenciar indiretamente a opinião pública doméstica.
Outra perspectiva, de força crescente, define a diplomacia pública como uma diplomacia
que parte dos públicos mais do que é direcionada a eles. Indivíduos e grupos, fortalecidos pelos
recursos resultantes da revolução das TICs — a internet, em particular —, tornam-se
participantes diretos na construção da política internacional e, através da sociedade civil global
que hoje emerge, podem operar de forma independente ou através dos governos nacionais.
Finalmente, há a variante que vê o púbico não como um alvo como a base da atividade
diplomática, mas como um consumidor da diplomacia, reflexo da mobilidade global e de forças
como turismo e terrorismo. O crescimento do turismo de massa expandiu a medida que as
pessoas se encontram com diplomatas e ampliou a importância dos serviços consulares, que por
muito tempo foram considerados uma peça inferior na engrenagem da representação diplomática.
A forma como os governos lidam com seus cidadãos no exterior se tornou um assunto sensível,
37
sujeito à atenção da imprensa. O terrorismo testa as mesmas habilidades, algumas vezes ao seu
limite. Quando cidadãos são pegos em atos de violência ou sequestrados na promoção de algum
objetivo político, crescem as demandas a que devem atender os ministérios de relações exteriores
e suas redes diplomáticas.
Javier Noya, por sua vez, cita a existência de várias ―escolas‖ de diplomacia pública, que
se diferenciam pelos meios que empregam e pelos conteúdos que promovem. Quanto à forma de
atuação, uma escola ―dura‖ se centra na informação política e na propaganda, trabalhando a curto
prazo para disseminar notícias sobre o governo do país e sua ação exterior. Ela se utiliza de meios
de efeito rápido, como televisão, rádio e imprensa para propagar um conteúdo eminentemente
político que serve aos interesses do governo ao defender suas políticas e pontos de vista.
A esse modelo se contrapõe uma escola ―branda‖, que busca resultados a prazos maiores,
baseando-se na comunicação cultural. Ela apresenta a seus públicos não somente assuntos
políticos, mas principalmente a diversidade de aspectos que compõem seu país. Os meios de que
lança mão tem, por conseguinte, ação mais lenta e efeito mais difuso, tais como o ensino do
idioma nacional, o intercâmbio acadêmico, o financiamento de estudos e de centros de pesquisa e
a promoção de exposições, espetáculos e outros eventos.
Em relação aos conteúdos, a diferença se dá entre uma diplomacia pública ―realista‖ ou
―particularista‖ e outra de caráter mais ―idealista‖ ou ―universal‖. Enquanto a primeira foca a
defesa do interesse nacional particular, a segunda promove valores universais como a
democracia, os direitos humanos e a paz (NOYA, 2007). Tal distinção, porém, se encontra mais
entre cada ação de diplomacia pública de um mesmo país do que entre as condutas de dois países
diferentes.
Afinal, quando uma nação busca se caracterizar no debate mundial pela defesa de um
tema específico, mas de interesse para a humanidade, como o meio ambiente, ela também deseja
associar sua imagem à daquele assunto, para lograr maior projeção e influência, e estar presente
sempre e quando discussões ambientais forem promovidas. Da mesma forma, poucos países
apresentam sua política externa como destinada exclusivamente à promoção dos interesses
nacionais. A maior parte deles costuma ocultá-los sob o discurso de que com sua consecução,
todo o planeta será beneficiado.
Dificilmente um Estado empregará apenas um lado da diplomacia pública, e nações com
mais recursos certamente se utilizarão de todos os meios de projeção que estiverem ao seu
38
alcance. Já países que não disponham de um orçamento tão vultoso, como o Brasil, precisarão se
focar nas formas de promoção de sua imagem que constatarem ser mais efetivas e coerentes, e
que possam ser elaboradas desde o início em conjunto com todas as estratégias de inserção
internacional. Optar por uma fórmula mais fácil ou barata não é necessariamente vantajoso: a
diplomacia pública é sempre mais profícua quando desenhada especificamente para potencializar
a política externa que deverá promover.
Com relação à dimensão temporal, a diplomacia pública trabalha em três diferentes
frentes, cada uma dedicada a alcançar seus objetivos dentro de um período próprio. A curto
prazo, procede-se a gestão de notícias, executada por profissionais da comunicação lotados no
Ministério das Relações Exteriores ou ligadas ao próprio gabinete de governo. Buscando reforçar
as metas de política externa de longo prazo, esses profissionais precisam preparar respostas a
cenários hipotéticos para que, em situações de crise ou outros desenvolvimentos abruptos, possa-
se dar à comunidade internacional um retorno coerente com a promoção de interesses do país.
Nessa atividade, é fundamental a capacidade de manejar de relações públicas e com os meios de
comunicação social, reagindo com agilidade em um horizonte de horas ou dias.
A médio prazo, a comunicação estratégica tenta influenciar as agendas e temas em que se
baseiam os canais de informação, promovendo atividades e eventos que geram notícias para
aumentar a visibilidade e melhorar a visão que se tem do país. Esse setor exige uma planificação
que cubra semanas ou meses, mas permita o uso da criatividade para projetar e pôr em prática
atividades capazes de competir pela atenção da opinião pública estrangeira.
Por fim, a longo prazo, busca-se a construção de relações e vínculos duradouros com os
públicos de outros países. Trata-se de relações de interesse estratégico que se formam em torno
de temas sócio-culturais, através das quais possa haver um conhecimento mútuo dos valores de
diferentes povos. As redes construídas inspiram mais confiança quando são construídas por
organismos e instituições que não sejam automaticamente identificadas com o núcleo do poder.
Igualmente, são mais eficazes quando participam de sua articulação profissionais com
experiência na organização de grupos da sociedade civil, incluindo-se aí desde sindicalistas a
assessores empresariais.
Para Nicholas Cull, a diplomacia pública é uma forma pela qual um ator tenta gerir o seu
ambiente internacional se comprometendo com um público estrangeiro. Acerca deste
comprometimento, o autor indica cinco componentes da diplomacia pública, todos voltados para
39
o fim último de gestão do entorno internacional de um Estado. O primeiro é a escuta, pelo qual se
recolhe e se classifica dados sobre m público e suas opiniões no estrangeiro, fazendo uso deles
para redirecionar políticas públicas ou ajustar o enfoque mais amplo da diplomacia pública. O
segundo é o lobby diplomático, o uso de uma atividade de comunicação internacional para
promover uma política pública em particular, uma ideia ou interesses específicos deste ator na
mente de um público estrangeiro. O terceiro, a diplomacia cultural, divulga os recursos e
conquistas culturais de uma nação no exterior e facilita a transmissão cultural no estrangeiro. O
quarto, a diplomacia de intercâmbio, consiste em enviar cidadãos ao exterior e aceitar em
reciprocidade cidadãos estrangeiros para um período de estudos ou de aclimatação. O último
deles, a transmissão internacional de notícias, utiliza as tecnologias de rádio, televisão e internet
para se envolver com públicos estrangeiros (CULL, 2009).
Como se vê, a relação com a mídia é uma parte fundamental da diplomacia pública,
tornando necessária sua gestão através de contatos permanentes, e não apenas em momentos de
crise. Para além das conjunturas críticas, é um trabalho de médio e longo prazo. Para tanto, são
recursos importantes: conferências de imprensa; divulgação de documentos não apenas sobre
política exterior, como também sobre assuntos de arte e entretenimento; compilação e difusão
entre a imprensa de notícias sobre o país; entrevistas de personalidades nacionais a jornalistas
estrangeiros; conferências e atos motivados por celebrações e tópicos emergentes; e,
ocasionalmente, financiamento de publicidade ou encartes em publicações de grande circulação.
Por outro lado, a diplomacia pública requer um maior conhecimento qualitativo do meio
local para desenvolver suas atividades do que outras áreas da diplomacia. Os profissionais da
diplomacia pública devem se especializar em regiões particulares. Isso é importante para uma
avaliação bem abalizada dos efeitos de programas de informação sobre a opinião pública, que por
ser maleável e instável, é um complexo objeto de análise. Ao interpretar os efeitos de suas
atividades na sociedade estrangeira, os profissionais devem conhecer os fatores exógenos, fora de
seu controle, que podem impactar as atitudes de audiências estrangeiras.
É possível utilizar as embaixadas para estabelecer um sistema de medição que, ao definir
suas estratégias de diplomacia pública, estabelecem uma escala de prioridades e objetivos claros
e mensuráveis, como aumentar as exportações e as visitas oficiais. Embora não seja uma política
dura, a eficiência da diplomacia pública pode ser medida quantitativamente a partir de dados
como: o número de artigos e editoriais favoráveis ao país publicados pela mídia estrangeira no
40
período analisado; a porcentagem de bolsistas de um programa de intercâmbio que chegam a
posições de influência em sua terra natal; e a mudança que se pode produzir na imagem que os
estrangeiros têm do país após a visita a uma exposição ou evento que divulgue aspectos de sua
sociedade e cultura no exterior.
As ferramentas que se pode manejas para implantar uma cultura de medição em toda a
cadeia de comando diplomática envolvem pesquisas sobre a imagem do país entre a população
geral, bem como de satisfação com uma exposição ou ato organizado ou patrocinado pela
embaixada, e entrevistas em maior profundidade com lideranças locais. Também é preciso
acompanhar o reflexo destas atividades na imprensa estrangeira, incluindo artigos de opinião,
tiragem e exemplares vendidos de livros nacionais traduzidos. Outras medições que se pode
conduzir são o impacto e a audiência alcançados por campanhas em rádio, televisão e internet, e
alunos matriculados em um instituto oficial de idiomas.
Noya recupera as análises do instituto britânico Foreign Policy Centre, para expor cinco
princípios que devem reger as ações de diplomacia pública. O princípio da magnificação supõe
que todo investimento em um evento deve ser acompanhado por um investimento idêntico na
comunicação do evento. Segundo o princípio da mutualidade, cada proposta que atenda aos
interesses do país emissor deve ser acompanhada por outra que responda aos anseios do país
receptor, de modo que seja possível estreitar os laços em cada uma das ações. De acordo com o
princípio da validação por terceiras partes, deve-se prestar a máxima atenção aos principais
ícones de sucesso no país de destino para copiar a fórmula de seu êxito. O princípio emocional,
por sua vez, recomenda que para cada produto ou evento em que se transmita informação ou se
apresentem argumentos a favor da postura do país, utilize-se outro que apele à emoção e as
paixões da audiência para transmitir a mensagem. Finalmente, o princípio da atividade postula
que para cada representação do passado deve-se apresentar um elemento dinâmico que remeta ao
futuro (NOYA, 2007).
2.1.2 A Nova Diplomacia Pública
Para grande parte dos teóricos da diplomacia pública, as transformações do contexto
internacional tornam necessária a revisão do repertório de ações ao qual recorrem os profissionais
41
das relações internacionais, abrindo caminho para uma nova diplomacia pública (NDP). Essa
renovação se faz necessária devido à formação de um novo entorno diplomático, que exige mais
ênfase na cultura.
Este entorno é conformado pela expansão da democracia pelo mundo, mas também pelos
movimentos populistas, e pela resultante necessidade dos governos de garantir sua continuidade
com o paio da opinião pública. No campo econômico, a globalização obriga os países a competir
uns contra os outros para exportar seus produtos ou atrair investimentos e turistas ao seu
território.
O despontar de uma opinião pública global ligada à diluição da fronteira entre política
doméstica e política exterior, ao mesmo tempo em que a interdependência faz com que os debates
em um país avancem imediatamente para outros. Contribuem para este fenômeno a revolução das
TICs, o caráter global dos problemas enfrentados pelos Estados contemporâneos e a proliferação
de instâncias multilaterais de discussão e decisão. Todos esses fatores tornam imperativo
convencer outros países da validade da política exterior que se pretende implementar (Idem).
Assim, a NDP se mostra importante não apenas no relacionamento com Estados
―avançados‖ e poderosos, ou mesmo com o mesmo nível de desenvolvimento, mas também com
aqueles emergentes, subdesenvolvidos ou com instituições que ainda não se orientam plenamente
pelos valores da modernidade. Todavia, para tanto, os países ocidentais devem aceitar que se trata
de um diálogo entre iguais, em que há diferenças legítimas de valores, baseadas na especificidade
das distintas civilizações humanas e na perda do monopólio da verdade pelo Ocidente. Isso
inclui, é claro, o ―Outro Ocidente‖ representado pela América Latina e instrui países como o
Brasil, que tiveram de reconstruir sua forma de diálogo internacional, não apenas com países
mais fracos, mas também com os de maior poder16
. Pode haver valores comuns a todos os
Estados, mas há também aqueles que não o são. Onde não pode haver entendimento cultural, é
preciso buscar a confiança como resultado de uma relação sincera e recíproca. Sobre a base de
experiências e iniciativas partilhadas é que se pode avançar em conjunto.
O novo entorno diplomático exige estratégias diplomáticas com enfoque em redes no
nível micro-social, tomando como referência o capital social e envolvendo associações e
16
A esse respeito, o compositor Chico Buarque relata, a respeito da política exterior adotada no Governo
Lula: ―É um governo que fala de igual para igual: não fala fino com Washington e não fala grosso com a Bolívia e o
Paraguai e, por isso mesmo, é respeitado no mundo inteiro (BUARQUE, apud SALME & ANDREONI, 2010)‖.
42
temáticas de interação social que podem ser geridas pela diplomacia pública a partir de uma
embaixada ou instituto cultural. Na construção da confiança que supera as barreiras culturais, a
base deve estar constituída não por discursos e palavras, mas pela prática da colaboração em
projetos e ações concretas. Tais ações, por sua vez, têm de se orientar por princípios de
reciprocidade da comunicação e não podem ocultar as relações de poder, as assimetrias de poder
e de recursos, mas apresentá-las de modo autocrítico. Ademais, a NDP supõe contato intenso com
coletivos informais, não-governamentais (Idem).
A democratização do acesso à informação transformou os cidadãos em observadores
independentes e participantes assertivos na política internacional, e os novos temas da agenda
diplomática aumentam o peso de grupos de indivíduos, mesmo aqueles de organização pouco
estruturada. O aumento da participação de atores não-estatais nas últimas décadas, a influência
crescente de movimentos de protesto transnacionais e a ascensão de novos meios de comunicação
restringiram a margem de manobra da diplomacia oficial. Atores não-oficiais se mostraram
extremamente ágeis e capazes de angariar apoio em uma velocidade que intimida as burocracias
tradicionais da política exterior. O público em geral se revela um público ainda mais difícil para
os diplomatas. Públicos estrangeiros não tendem a seguir regras acordadas, nem costuma ter
metas claramente definidas. Muitos diplomatas se desconcertam com os aspectos elusivos e
imprevisíveis dos grupos de interesse em sociedades civis estrangeiras, o que concretiza o desafio
percebido na prática da diplomacia pública (MELISSEN, 2005).
Ao basear sua ação na cooperação com estes coletivos sociais, a nova diplomacia pública,
baseada no diálogo, supõe uma mudança de paradigma em toda a política exterior. Para alcançar
o diálogo é preciso vencer a desconfiança que despertam os atores governamentais e
diplomáticos, bem como as instituições políticas como um todo. A credibilidade dos atores não-
estatais aumenta à medida que são percebidos como agentes independentes, e inclusive críticos,
dos governos de seus países de origem. Os interlocutores devem ser idealmente equivalentes aos
grupos da sociedade com os quais se quer comunicar.
A longo prazo, os diplomatas seguirão tendo um papel importante junto a certo tipo de
interlocutores: agentes governamentais, elites políticas e econômicas. Mas para se relacionar com
outros grupos deverão se tornar gestores da diplomacia pública que administrem o capital social
das redes informais compostas por atores como organizações não-governamentais (ONGs),
universidades, movimentos sociais e partidos políticos, facilitando os contatos e o diálogo entre
43
eles. Esse trabalho pode ser potencializado com a ajuda de agentes da sociedade civil do país
emissor e o emprego de redes locais do país receptor. Trata-se de dar voz a todos os setores
sociais relevantes para a política exterior, e não apenas àqueles assim reconhecidos formalmente.
A NDP envolve uma ―gestão de redes‖. As embaixadas se convertem em gestoras de
relações e intercâmbios entre partidos, associações, peritos dentro da sociedade em que
trabalham, mas também entre sociedade, por exemplo, quando se trata de promover o
desenvolvimento — meta máxima da política exterior brasileira. É uma diplomacia da vida
cotidiana, mais atenta à dimensão micro, às relações e grupos informais, que ao macro, às
grandes instituições e aos grandes veículos de comunicação de massa. Funciona no nível de
pessoa a pessoa, em um contexto de crescente visibilidade do indivíduo comum na prática
diplomática, especialmente nas áreas de relações consulares e diplomacia pública.
Se a diplomacia pública original é hierárquica, com um único emissor, o Estado, no topo e
receptores na base, com fluxos de informação direcionados de cima para baixo, a nova
diplomacia pública é heterárquica e polícêntrica. Seu objetivo é a promoção da comunicação e da
confiança entre os atores. Supõe transferir o foco da comunicação estratégica para a construção
estrutural de relações de longo prazo, sobre redes sociais, envolvendo pessoas e organizações.
Enfim, a NDP é uma diplomacia proativa, muito diferente da tradicional. Se esta trabalha pela
estabilidade e continuidade, aquela age com vistas à mudança. As tensões na ordem mundial em
vigor a tornam insustentável, e ensejam o tipo de ação reformista que a nova diplomacia pública
propõe.
Dependendo das circunstâncias, esses ―dois mundos‖ da diplomacia pública podem se
cruzar, sobrepor, colidir e cooperar. O sistema tradicional centrado nas relações
intergovernamentais, que monitora as interações entre os ambientes de política doméstica e
internacional, filtrando informações e presidindo os contatos internacionais sofre pressões para se
transformar. Esse impulso vem não apenas das alterações que se operam no contexto externo em
que se insere, mas também de dentro dos Estados — vem da própria sociedade, que demanda
uma difusão na maneira como a diplomacia é conduzida através dos canais burocráticos.
Dar maior destaque à sociedade civil implica fomentar redes cada vez mais necessárias
com o aumento da complexidade dos ambientes-alvo das políticas governamentais, buscando
promover a comunicação e a confiança. Tais redes são conjuntos de relacionamentos
relativamente estáveis, de natureza não-hierárquica e interdependente, ligando vários atores que
44
partilham interesses comuns em relação a uma determinada política e que intercambiam recursos
para a consecução destes interesses, reconhecendo que a cooperação é o melhor meio para atingir
fins comuns (HOCKING, 2005).
Esse tipo de instituições internacionais descentralizadas tem a vantagem de encontrar
barreiras transacionais menores do que aquelas enfrentadas por tomadores de decisão individuais,
além de ser capaz de direcionar informações relevantes para onde elas terão maior efeito.
Também promove colaboração e aprendizagem e acelera a aquisição e o processamento do
conhecimento. Conforme a agenda a que se destinarem, essas redes variarão em escopo e
composição: os governos, ao buscarem a organização de atores da sociedade civil, que
contribuem com sua legitimidade e seu conhecimento in loco dos problemas e das demandas
populares, podem também recorrer a empresas privadas interessadas na temática em questão para
obter suporte material e financeiro.
A maior atenção prestada à diplomacia pública por autoridades de diversos países pode
ser vista como uma consequência da crescente importância do poder brando nas relações
internacionais, ou ainda como resultado de mudanças mais amplas na prática diplomática, em
direção a maior transparência e colaboração transnacional. A NDP é, portanto, mais do que um
instrumento técnico de política externa. Ela se torna de fato parte do tecido dinâmico das relações
internacionais (MELISSEN, 2005).
No cenário global contemporâneo, a diplomacia assume uma nova forma de desempenhar
seu papel milenar: trabalhar nas fronteiras culturais como um exercício interpretativo e conectivo
— como um agente de compreensão. Mais do que agir como gestora da informação, tomando
para si o controle das interações entre os públicos doméstico e estrangeiro, a diplomacia passa a
ser definida por sua capacidade de contribuir à articulação de cidadãos mobilizados para a
promoção do interesse público (HOCKING, 2005). Assim, o papel do diplomata se redefine
como o de facilitador da criação e gerenciamento de redes — e segue sendo o de promotor do
interesse nacional, apenas mais próximo das pessoas a quem tal interesse diz respeito.
45
2.2 O Estudo da Diplomacia Pública
A importância crescente da diplomacia pública se reflete na sua constituição como um
campo acadêmico. Embora este processo não esteja consolidado nos Estados Unidos e não tenha
se instalado de fato no Brasil, é preciso considerar alguns aspectos dos estudos disponíveis a
respeito do tema para ensejar a construção uma base para pesquisas que possam contribuir para a
formulação da política externa brasileira e para a sociedade como um todo.
Investigando os motivos de tais limitações, Bruce Gregory considera que a diplomacia
pública é um conceito em evolução, cujo significado é contestado pelos diferentes autores que se
referem a ela. Por isso não há consenso acerca de suas fronteiras analíticas, tornando difícil
definir os contornos de um campo acadêmico que seja amplamente aceito. A literatura existente
foca a história da diplomacia pública como um instrumento de poder do Estado, e é dominada
pelos escritos de praticantes técnicos e defensores de políticas correlacionadas. A pesquisa
acadêmica e as publicações universitárias que dariam substância a uma área de estudo são raras,
pouco visíveis.
Até recentemente, os acadêmicos pouco tiveram a dizer sobre a diplomacia pública, mas
há um extenso registro de estudos em uma gama de disciplinas que dão suporte à diplomacia
pública. Entre elas, figuram campos que experimentaram grandes desenvolvimentos durante a
Guerra Fria, como antropologia cultural, psicologia social, pesquisa de opinião pública, estudos
de mídia e comunicação política. Somam-se estudos mais recentes em diplomacia, poder e
governança, teoria da identidade e abordagens construtivistas. A produção acadêmica
construtivista, em especial — com sua ênfase em ideias, cultura, normas, identidade e crenças
partilhadas —, fornece aportes quanto a estratégias dos atores políticos, forças e limitações de sua
diplomacia pública.
O autor advoga uma maior colaboração entre estudiosos e praticantes no desenvolvimento
de um campo de estudo, com base em duas considerações. Primeiramente, ideias, guerra,
globalização, tecnologia, pressão política e normas profissionais moldam a pesquisa prática e
acadêmica em relações internacionais. Em segundo lugar, o trabalho de estudiosos e praticantes
da diplomacia pública progrediu largamente em âmbitos separados. Recentemente, contudo,
acadêmicos têm prestado mais atenção à diplomacia pública, e mais técnicos estão reconhecendo
46
o valor da academia. Essas tendências abrem caminho para ensino, pesquisa e prática profissional
em um campo acadêmico emergente.
Diferenças à parte, Gregory propõe uma definição convergente da diplomacia pública a
ser usada em estudos:
―É um termo que descreve formas e meios pelos quais Estados, associações de Estados, e atores
não-estatais compreendem culturas, posturas e comportamentos; constroem e gerem
relacionamentos; e influenciam opiniões e ações para levar adiante seus interesses e valores. É
usado por atores políticos para entender as conseqüências de escolhas políticas, estabelecer
agendas públicas, influenciar o discurso na sociedade civil e construir consenso para estratégias
que requerem um balanço de custos, riscos e benefícios. (GREGORY, 2008, p. 276)‖17
.
Esse tipo de definição aponta para as dimensões constitutivas da diplomacia —
representação, comunicação, reconhecimento e negociação —, nas quais se operam
transformações que chamam a atenção dos estudiosos interessados em pesquisas sobre sua
natureza e seu futuro. Quando o espaço social deixa de ser completamente mapeado em termos
de instâncias territoriais, distâncias e fronteiras, a diplomacia passa a abarcar uma variedade de
agentes que não se limita aos agentes do serviço exterior.
Praticantes têm a experiência em primeira mão. Muitos têm um entendimento matizado
dos eventos e culturas organizacionais que os acadêmicos frequentemente acham difícil alcançar.
Ao mesmo tempo, a proximidade pode ser uma desvantagem. As obras de alguns profissionais
são essencialmente diários de carreiras individuais. Outros usam suas publicações como veículo
para estender suas disputas burocráticas ou para defender instituições em que trabalharam e
políticas que aplicaram. Mas há aqueles que fornecem uma análise perceptiva informada pela
experiência e com algum distanciamento do tema, e há também estudiosos cujas carreiras
incluem passagens pelo serviço público.
Estes pesquisadores têm de dar conta das mudanças da nova diplomacia pública e na
diplomacia em geral. Diminui a importância das mensagens escritas e em papel, enquanto se
tornam mais relevantes o plano de fundo em que se dão as interações, a linguagem corporal, sons
e imagens mediados por meio eletrônico. Também ganha mais destaque a necessidade humana de
ser ouvido, não apenas pelo próprio governo, mas também por lideranças estrangeiras.
17
Tradução livre do inglês. Grifos do autor.
47
Advogando a necessidade do diálogo no estudo e na projeção da diplomacia pública,
Geoffrey Cowan e Amelia Arsenault chamam a atenção para pesquisas na área da comunicação
que demonstram a importância de ouvir. Líderes que dialogam com suas audiências encontram
maior receptividade a suas mensagens. Igualmente, os autores defendem maior ênfase à
colaboração na teoria e na prática diplomática. Enquanto estudos de resolução de conflito
frequentemente ressaltam os benefícios da colaboração, na literatura há poucas análises dos
benefícios que a diplomacia pública pode usufruir de projetos cooperativos e colaborativos
envolvendo membros de diferentes nações. Dessa forma:
―Em suma, estudiosos e praticantes de diplomacia pública podem prestar maior atenção a
colaborações internacionais, não apenas como plataformas para a diplomacia pública, mas
como aquilo que algumas vezes pode ser a forma mais importante de diplomacia pública.‖
(COWAN & ARSENAULT, 2008, p. 22).‖18
Qualquer que seja o princípio orientador adotado, é possível e desejável tratar a
diplomacia pública como um campo acadêmico emergente, alcançando um consenso sobre uma
base analítica. Sobre esta base é possível trabalhar um corpo substancial de produção acadêmica e
literatura prática, com benefícios para o aprendizado, intercâmbio de conhecimento e exercício
profissional.
18
Tradução livre do inglês. Grifos dos autores.
48
3. Diplomacia Pública no Brasil
A execução de uma diplomacia pública supõe que os planejadores de política externa
conferem importância à opinião dos públicos estrangeiros — como também do público doméstico
— nas matérias de relações internacionais. Esse posicionamento, contudo, é uma tendência
recente no Brasil. Como expõe Henrique Altemani de Oliveira,
―A maior parte dos pesquisadores brasileiros aponta, quase com unanimidade, para o papel
preponderante do Estado na definição e implementação da política externa brasileira, estando a
sociedade civil, com pequenas exceções, fora desse processo (OLIVEIRA, 2005, p. 2).‖19
Quando se observa o processo doméstico de formulação da política externa, percebe-se
que o Ministério das Relações Exteriores tem desempenhado um papel central na orientação
estratégica brasileira de inserção internacional. Sua capacidade para tanto, todavia, depende da
existência de aprovação, ou aceitação, pela sociedade brasileira das políticas que leva a cabo. A
anuência histórica decorre do foco histórico da agenda da política externa no desenvolvimento.
Assim, embora não ocorra uma participação popular nos processos formuladores da política
externa, o Itamaraty goza de legitimidade e reconhecimento social.
Por outro lado, a instituição dos serviços diplomáticos também afastou historicamente o
cidadão comum da política externa, levando a uma despolitização dessa área na maior parte do
tempo. Mas o fator burocrático não é o único responsável por uma relativa desvinculação da
política externa da dinâmica política domestica. A natureza das questões que, majoritariamente,
compuseram a agenda externa, assegurou igualmente ao MRE influência decisiva no trato destas
questões.
Hoje, porém, com a crescente complexidade do debate internacional, torna-se necessário
incluir no diálogo setores sociais que antes se encontravam excluídos do processo de
planejamento. A sociedade brasileira, por sua vez, torna-se mais dinâmica e melhor articulada e
19
Grifos do autor. Uma ressalva a essa afirmação pode ser encontrada no artigo de Shiguenoli Miyamoto,
para quem: ―Algumas vezes as perspectivas podiam ser coincidentes, mas não era o que se verificava na maior parte
dos casos, cada um procurando defender seus próprios interesses e grupos, com maneiras distintas de ver o mesmo
problema. Em grande parte, as diferenças de posturas dessas instâncias vão marcar a atuação da política externa
brasileira de maneira não uniforme, muitas vezes contraditórias com fortes choques, onde cada setor discursa e age
independentemente do outro, defendendo interesses e posturas completamente distintos (MIYAMOTO, 2009, p.
29).‖
49
vários de seus segmentos demonstram um legítimo desejo de exercer uma influência mais direta
na ação externa de seu país. Esse tipo de transformação ocorre também em outros lugares do
mundo, e é instrumental a uma nação que deseja se projetar no cenário internacional a capacidade
de dialogar com audiências estrangeiras desejosas de participação nas decisões que darão forma
às estruturas internacionais.
É preciso que o Itamaraty, órgão responsável pela condução de negociações dessa
magnitude, não somente enfatize a renovação institucional, mas também torne mais flexíveis e
compreensivos seus canais de comunicação com a sociedade civil e o setor privado, tanto
nacionais como estrangeiros. Investigar quais foram os passos dados nesse sentido no Governo
Lula I requer que se tenha em mente alguns aspectos fundamentais da história da política exterior
do Brasil, bem como da identidade internacional brasileira.
3.1 A Identidade Internacional do Brasil
A tarefa principal da política externa é traduzir necessidades internas em possibilidades
externas, aumentando o poder de controle de uma sociedade sobre seu destino. A política externa,
como política pública, passa por uma avaliação dos meios de realizar o bem comum da
coletividade nacional. Essa avaliação tem de se basear em uma visão de identidade nacional, que
por sua vez se constitui em função da vida internacional, na interação com outros agentes.
Os Estados e governos são, portanto, instâncias públicas de intermediação da vida
doméstica, intercedendo entre instituições políticas estatais e uma população que, num território,
compartilha um repertório de bens econômicos, conhecimentos técnicos e científicos, de
informação e cultura; e da vida externa, intermediando entre esta sociedade e o mundo. Daí que a
diplomacia, como política pública, aja numa relação dialética entre o ―eu‖ e o ―outro‖ (LAFER,
2007).
Para o autor, a política externa de um país radica em seu ponto de vista sobre mundo seu
funcionamento, expondo ainda que:
―Esse ponto de vista pode ter, como é o caso do Brasil, uma dimensão de continuidade,
explicável em função do impacto de certos fatores de persistência da inserção do país na vida
internacional. Tais fatores de persistência estão ligados ao que Renouvin e Duroselle qualificam
de ‗forças profundas‘, que oferecem indispensáveis elementos para explicar, de forma mais
50
abrangente, iniciativas, gestos e decisões governamentais. No caso brasileiro, entre estes fatores
cabe destacar o dado geográfico da América do Sul; a escala continental; o relacionamento com
os muitos países vizinhos; a unidade linguística; a menor proximidade, desde a Independência
em 1822, dos focos de tensão presentes no centro do cenário internacional; o tema da
estratificação mundial e o desfio do desenvolvimento. Estes fatores de persistência contribuem
para explicar traços importantes da identidade internacional do Brasil, ou seja, o conjunto de
circunstância e predicados que diferenciam a sua visão e os seus interesses, como ator no
sistema mundial, dos que caracterizam os demais países (LAFER, 2007, p. 20).‖
Um agente de importância fundamental na construção da identidade internacional do
Brasil é o Ministério das Relações Exteriores, com sua ação contínua no tempo, ao se afirmar
como uma instituição permanente da nação, com a autoridade e a memória necessárias para
representar os interesses brasileiros. Dele partem as propriedades burocráticas e a coerência na
condução da política externa, através de uma tradição diplomática que conjuga linhas de
continuidade com inovação na asserção da identidade brasileira.
3.1.1 Paradigmas da Política Externa Brasileira
A identidade brasileira, interpretada como elemento explicador das tendências e
mudanças na política externa, é composta por cinco componentes: o legado histórico, o contexto
regional, a inserção assimétrica como potência média, o vetor desenvolvimento nos objetivos da
política externa e o processo de abertura exterior desde 1990 (CERVO, 2003b; CERVO, 2008;
LAFER, 2007). A identidade nacional brasileira é determinada pelas características multi-étnicas
e multiculturais da sociedade, bem como por sua heterogeneidade e desigualdade sócio-
econômica.
Dessa identidade se origina o legado histórico da diplomacia brasileira, caracterizada
como universalista e contrária a qualquer tipo de segregação, como pacifista e orientada para
coexistência das diferenças, e como direcionada para as soluções jurídicas, reconhecendo o
domínio da lei internacional. Tais parâmetros de comportamento se alteraram muito pouco com a
sucessão de diferentes regimes e governos. Eles geram a percepção de um país sereno, dando ares
de simpatia e benevolência nas relações internacionais.
51
3.1.1.1 Período Agro-Exportador
A primeira tarefa da diplomacia brasileira, durante o breve Primeiro Reinado (1822-1831)
foi lograr o reconhecimento da sua independência, lançando bases para uma soberania e uma
autonomia efetivas. Durante o Período Regencial (1831-1840), quando se consolidou o Estado
brasileiro, bem como durante o Segundo Reinado (1840-1889), a monarquia brasileira fez
grandes esforços para modelar e assegura o território nacional, eliminando ameaças à sua
integridade e delimitando suas fronteiras mediante acordos com os países vizinhos.
Durante mais de um século, o aparato estatal manteve o projeto de uma economia aberta,
exportando produtos primários e importando bens industriais. Esse modelo era conveniente a um
Estado que era usado para servir aos interesses dos grupos sócio-econômicos hegemônicos.
Embora fosse uma monarquia constitucional, o Brasil não diferia das repúblicas latino-
americanas quanto ao modelo liberal de inserção internacional. Entre a chegada da corte
portuguesa ao Rio de Janeiro em 1808 e a expiração do tratado comercial com a Inglaterra em
1844, a política externa da não esteve subordinada ao paradigma de portas abertas, com o qual os
países capitalistas europeus impunham seus interesses e o domínio de sua sociedade internacional
sobre a periferia.
Uma manifestação contra essa subordinação dos interesses nacionais e do processo de
tomada de decisão ocorreu na década de 1840, quando um projeto nacional com certo grau de
autonomia foi formulado. Esse projeto seguiu guiando as relações internacionais do país até o fim
do regime monárquico, mas não afetou a essência do paradigma liberal-conservador vigente no
período, consonante com a divisão internacional do trabalho.
Até cerca de 1860, a imagem de seus vizinhos como Estados mal geridos contribuiu para
produzir uma auto-imagem do Brasil como um país equipado com instituições modernas. Essas
imagens de si e dos outros foram transferidas da diplomacia monárquica para a republicana e se
aprofundaram durante a gestão do Barão do Rio Branco no Ministério das Relações Exteriores,
de 1902 a 1912. Portanto, fortaleceu-se a ideia de um Brasil superior a seus vizinhos em termos
de força e civilização. Estes países, concluiu-se, deveriam ser bem tratados, especialmente porque
eles tinham pouca significância na vida nacional brasileira. Essa é a chamada cordialidade
52
oficial, que é cultivada até hoje como um parâmetro do comportamento diplomático brasileiro
para com os países próximos.
O comportamento externo do Brasil assumiu caracteres ambíguos devido à sua condição
de potência média. Ela criou subserviência durante a expansão da sociedade internacional
europeia sob a égide do capitalismo na primeira metade do século XIX. Durante a segunda
metade do mesmo século, as elites conservadoras que governavam o país formularam os
objetivos da política externa e os atingiram com notável coerência e racionalidade de direção. O
país resolveu o problema de abastecimento de mão-de-obra abandonando o trabalho escravo e
incentivando a imigração livre. Também resolveu pacificamente suas questões fronteiriças e
superou o sistema de tratados desiguais que havia firmado com as grandes potências à época de
sua independência.
A Primeira República (1889-1930), implementou outra variável desse paradigma, a
diplomacia da agro-exportação. O regime republicando reduziu ainda mais a definição de
interesse nacional, atando-o aos objetivos dos grupos sócio-econômicos dominantes. A crise de
1929 afetou profundamente as exportações de bens primários, e o regime unilateral de portas
abertas se mostrou inviável nas novas conjunturas internas e externas.
3.1.1.2 Período Desenvolvimentista
Paradoxalmente, a crise mundial do capitalismo mergulhou a América Latina em um
processo de rápida modernização, acolhido com entusiasmo pelos novos líderes políticos. Desde
o primeiro governo de Getúlio Vargas (1930-1945), o desenvolvimento se tornou o vetor da
política externa. Após assegurar a soberania territorial e demarcar suas fronteiras, o
desenvolvimento do território surgiu como a terceira função histórica sucessiva da diplomacia
brasileira. A mudança drástica em direção ao desenvolvimento nacional pode ser explicada
menos pela ruptura do regime político e mais pela sucessão de grupos sociais dirigentes. As
antigas elites da economia primária perderam poder para uma nova liderança urbana com uma
visão moderna se seus interesses e das relações internacionais.
53
A divisão do mundo em blocos antagônicos facilitou o trabalho dessas novas elites. Elas
negociaram sua adesão à guerra alheia em troca de fatores como assistência à industrialização,
crédito à exportação e investimentos privados. Até a erupção da Segunda Guerra Mundial, a
América Latina abrira suas economias à competição internacional. A mudança foi mais
perceptível no processo decisório. Os governos da região tentaram imitar as grandes potências,
utilizando a ação unilateral para alcançar objetivos externos, que se ligaram aos ganhos internos,
identificados como ganhos de desenvolvimento. Estes, por sua vez, identificaram-se como a
expansão da indústria intermediária.
Assim, podem ser identificados como componentes do novo paradigma de política externa
os seguintes elementos: a ideia de que o processo decisório deve se fundamentar em percepções
adequadas dos interesses nacionais; a noção de que deve-se buscar ganhos recíprocos nas
relações internacionais, através da negociação; o objetivo de superar as desigualdades entre as
nações; e uma visão cooperativa do mundo. A gênese desse paradigma, o do Estado
Desenvolvimentista, trouxe à política externa brasileira, outros parâmetros. Percebeu-se que a
política externa deveria atender a interesses distintos daqueles da fase anterior; que a política
externa deveria suplementar o esforço interno de desenvolvimento, demonstrando uma nova
funcionalidade histórica; e que a eficiência da diplomacia em atingir resultados ligados ao
desenvolvimento dependia da autonomia do processo decisório.
Havia consenso entre intelectuais, diplomatas, militares, políticos, homens de Estado e
líderes de movimentos sociais sobre a disposição da política externa para apiar o projeto de
desenvolvimento nacional. Contudo, o pensamento político brasileiro estava dividido quanto ao
modelo de desenvolvimento a ser adotado. De um lado, estavam os defensores do
desenvolvimento associado às forças do capitalismo internacional; do outro, os advogados de um
processo de desenvolvimento independente, que buscasse a cooperação com os países em
desenvolvimento.
Ao longo do período do paradigma do desenvolvimento, a política brasileira equilibrou as
duas estratégicas externas. O resultado foi a continuidade e a coerência no processo decisório.
Durante a segunda metade do século XX, a diplomacia brasileira de potência média buscou levar
o mundo subdesenvolvido a uma tentativa de reformar a ordem econômica internacional,
confrontando dessa maneira interesses concretos das potências avançadas. Enquanto isso,
54
preocupou-se também em atrair fontes externas de desenvolvimento, como capital, tecnologia e
investimentos estrangeiros.
A continuidade do paradigma do desenvolvimento não foi comprometida pelas rupturas
institucionais do regime político. Essa continuidade, inclusive, é responsável pela manutenção da
autonomia decisória na esfera política, bem com pela criação de um forte núcleo econômico
nacional. Composto por um ideário político híbrido, o desenvolvimento brasileiro se abriu às
forças do capitalismo internacional, todavia mantendo autônomo o processo decisório interno. A
diplomacia pôde então exibir um nacionalismo apropriado: universalista, cooperativo e não-
ideológico.
A transição do regime militar para o governo civil em 1985 aparentemente não afetou a
política externa, especialmente porque essa transição era preparada desde 1974 através do
processo de ―abertura política‖. O que se pôde perceber foi a continuidade e a racionalidade do
processo desenvolvimentista inaugurado em 1930, que foi marcado pela forte presença do Estado
e que durou até ao advento dos governos neoliberais de Fernando Collor de Mello e de Fernando
Henrique Cardoso na década de 1990.
3.1.1.3 Período Neoliberal
A mudança de paradigma da política externa brasileira que levou ao abandono da
estratégia do desenvolvimento não resultou de uma mudança de regime, pois de 1990 em diante
ela ocorreu dentro do regime democrático. A introdução de um novo paradigma não foi uma
invenção do setor político brasileiro, mas, sobretudo, uma adesão a um consenso regional.
Externamente, o colapso do socialismo, o triunfo da economia de mercado e as ilusões da
globalização levaram as elites da América Latina a considerar que era também conveniente
acabar com a experiência do Estado Desenvolvimentista. Internamente, a crise causada pela crise
da dívida externa na década de 1980, seguida pela recessão econômica e pela inflação
descontrolada, foi interpretada como uma consequência do paradigma vigente.
Os governos neoliberais viram a supremacia do mercado e o enxugamento do Estado
como consequências lógicas da democratização. Devido à abertura indiscriminada da economia, a
mudança na política externa brasileira na década de 1990 aprofundou as dependências estruturais
55
do país em relação ao exterior. A experiência dos anos 1930, com a qual a mudança de paradigma
provocou um avanço significativo em termos de desenvolvimento nacional, não se repetiu na
década de 1990 sob a efígie do neoliberalismo. Durante o período neoliberal, o governo
introduziu uma estratégia de desarticulação do aparato nacional, permitindo sua apropriação e
controle pelos grupos capitalistas transnacionais.
A noção de interesse nacional se tornou estéril, uma vez que essas decisões refletiam os
interesses dos países desenvolvidos. Em menor medida, o governo Cardoso preservou a
influência de certos princípios e intenções vigentes na fase anterior, e semeou outro paradigma de
comportamento externo, o do Estado Logístico, reproduzindo timidamente o comportamento de
países avançados, que continuam a defender seus interesses na era da globalização.
As duas administrações, de Collor e de Fernando Henrique, foram dominadas pelo
objetivo da abertura externa, em contraste com a política de desenvolvimento reclamada pela
opinião pública. Seu fracasso explica a eleição, pela primeira vez no Brasil, de um governo de
esquerda em 2002, disposto a rever o modelo de desenvolvimento do momento, que substituíra o
papel primário do Estado pelas forças de mercado. Durante a campanha eleitoral que elegeu Luis
Inácio Lula da Silva, o argumento central, que convenceu a opinião pública, foi a crítica ao
modelo neoliberal. Este modelo, ao aumentar a exclusão social no Brasil e a dependência do país
em relação aos recursos estrangeiros, provocou a ânsia por um projeto definido de nação, que
passasse pela revisão do papel brasileiro na sociedade internacional, deslocando a nação da
subserviência ao protagonismo.
3.1.2 Tradição Diplomática na Expressão da Imagem Brasileira
A política externa pressupõe a existência de um projeto nacional. O nexo de influência de
uma mudança de regime é estabelecido quando uma nova elite dominante chega ao poder e
concebe o projeto nacional de maneira distinta, ou, ao menos, pretende modificá-lo ou elevá-lo a
um novo nível. No entanto, a natureza do regime pode ser considerada irrelevante nesse caso. A
formulação da política externa está a encargo de uma instituição cujos quadros não são afetados
por uma troca de regime ou de gabinete. Embora os novos governos possam estabelecer novos
56
objetivos para a política externa, a diplomacia continua seguindo os mesmos parâmetros de
atuação.
A política externa do Brasil esteve fechada em um casulo no qual um corpo diplomático
vivia desde a década de 1960, qualificado profissionalmente por mecanismos de formação e
ascensão funcional. Nas palavras de Celso Lafer,
―[U]ma das funções do Itamaraty no sistema político brasileiro tem sido assegurar um certo
estilo de conduta diplomática com o parte da identidade da dimensão da coerência da atuação
Brasil no plano internacional (LAFER, 2007, p. 140)‖.
Esse corpo profissional detém um legado político e fez com que prevalecesse a
continuidade da política externa sobre as mudanças decorrentes da alternância de governos ou de
regimes políticos. Portanto, no caso do Brasil, é a própria existência de um projeto nacional,
capaz de estabelecer um paradigma, que condiciona a influência do regime político sobre a
política externa e as relações internacionais (CERVO, 2003b).
Com relação aos padrões de conduta adotados pela diplomacia brasileira, Amado Cervo
observa que sua constituição se dá de acordo com princípios e valores relevados pelo Brasil ao
longo de sua história, sedimentando-se e se erodindo conforme as transformações do contexto
internacional. Eles dão previsibilidade à política externa e moldam a ação externa dos governos,
imprimindo uma lógica da racionalidade à política externa que favorece a continuidade em
detrimento da ruptura (CERVO, 2008).
Ainda de acordo com o autor, pode-se identificar alguns princípios fundamentais à
diplomacia brasileira que compõem o seu acumulado histórico e, portanto, moldam a imagem
internacional do Brasil. Desde fins do século XIX, o país tem se pautado por ideais de
autodeterminação, não-intervenção e solução pacífica de controvérsias, que embora tenham
tremulado na década de 1990, fortaleceram-se com o primeiro Governo Lula. Esse
posicionamento defensivo é fortalecido por um padrão mais conservador, presente desde a
independência do país, o juridicismo, que assegura o respeito à ordem jurídica internacional e a
busca por sua estabilidade mediante a subscrição de atos internacionais.
A ambos se segue o multilateralismo normativo que, surgindo na contestação da ordem
mundial bipolar da Guerra Fria, hoje se liga às expectativas por um sistema internacional cujas
regras sejam transparentes, justas e universalmente respeitadas, estabelecidas por meio da
negociação multilateral. A construção de uma convivência equilibrada e pacífica começa pela
57
cordialidade oficial no trato com os vizinhos, valorizada desde o século XIX, e fortalecida pela
forma como o Governo Lula lidou ao minimizar os atritos entre o Brasil e a Argentina, a Bolívia
e o Paraguai.
Ao se propor a elevar as capacidades nacionais na década de 1930, o Estado brasileiro
atribuiu o desenvolvimento como vetor da política externa, paradigma que, enfraquecendo-se na
década de 1990, ressurge no Governo Lula, sob a perspectiva da interdependência e da conexão
com as forças sistêmicas, menos ligado ao Estado. Da orientação das relações internacionais pela
busca do desenvolvimento, procede-se a uma ação externa cooperativa e não-confrontacionista,
que propõe a subordinação da política de segurança aos ganhos da cooperação econômica,
evitando o confronto por razões ideológicas.
A cooperação é fortalecida pelo estabelecimento de parcerias estratégicas com atores
internacionais capazes de contribuir de forma substantiva para o crescimento nacional. O contato
com possíveis parceiros se guia por realismo e pragmatismo, não se limitando o Brasil a operar
nos espaços limitados que a ele são atribuídos pelas estruturas internacionais na tentativa de
superar as condições materiais restritivas com astúcia e vontade política.
Todos esses padrões de conduta são marcados pela independência de inserção
internacional, baseada em visão própria de mundo, autonomia do processo decisório e
formulação própria de política exterior. Ela reinterpreta a interdependência de modo a fazer
prevalecer o caráter nacional nas relações entre o doméstico e o exterior. Como bem esclarece a
teoria construtivista, não apenas os condicionamentos externos são influências inevitáveis nas
trajetórias das nações, mas estas também atuam sobre aqueles, e é um propósito brasileiro
dominá-los em proveito próprio.
A apropriada manipulação dos canais diplomáticos é decisiva neste processo, e a
diplomacia pública é capaz de influenciar a forma pela qual os agentes internacionais o percebem
e se dispõem a influir nele. Cabe ao Brasil não apenas o esforço de direcionar as forças sistêmicas
para o fortalecimento de seu poder duro, mas utilizá-las para promover o desenvolvimento social
e a democratização da ordem internacional através da articulação entre indivíduos e sociedades
através das fronteiras.
58
3.2 Iniciativas de Diplomacia Pública no Governo Lula I (2003-2006)
Para entender a diplomacia pública no Governo Lula, é preciso, antes de tudo,
contextualizar as principais orientações da política externa do período. Recorre-se às ideias de
estudiosos que se dedicaram ao estudo das relações internacionais contemporâneas para elaborar
um panorama geral da política exterior do Brasil sob Lula e Celso Amorim. Trata-se de tarefa por
vezes controversa, já que, como ressalta Henrique Altemani de Oliveira:
―[B]oa parte das análises sobre a política externa dos Governos Fernando Henrique Cardoso
(FHC) e de Luiz Inácio Lula da Silva (Lula) ainda está fortemente influenciada pela posição
política ou visão de mundo assumida por esses analistas (OLIVEIRA, 2005, p. 251).‖
Contrastando as realizações do Governo Fernando Henrique Cardoso com os objetivos do
Governo Lula, Amado Cervo constata que a política exterior de Cardoso dirigiu-se nos rumos do
multilateralismo, do regionalismo, da aproximação com a União Europeia e da relação dual com
os Estados Unidos, de submissão econômica e confronto no discurso político. Seus eixos de ação
foram o comércio exterior, desligado da sua função histórica de apoiar o desenvolvimento, a
dependência financeira com busca desesperada por capitais externos, a dependência empresarial e
tecnológica, e a abertura sem estratégia como método de inserção interdependente.
Já a política exterior do Governo Lula apresentaria as seguintes linhas de força:
recuperação do universalismo e do multilateralismo; foco na América do Sul como espaço de
afirmação dos interesses brasileiros; o saneamento das deficiências estruturais com a promoção
de uma inserção independente; e a conservação do acumulado histórico da diplomacia brasileira.
O autor conclui que:
―Da era Cardoso que já faz parte do passado para a era Lula que se inaugura, nossa expectativa
é de trânsito da ilusão kantiana característica das lideranças políticas latino-americanas dos anos
1990 para o jogo do realismo duro das relações internacionais. Traduzindo esse pensamento
para a linguagem paradigmática que recentemente aplicamos à análise da política exterior do
Brasil e de outros países da América do Sul, estamos no ponto de abandonar os parâmetros do
Estado normal, invenção argentina por excelência, importada por Cardoso, sem restabelecer
simplesmente aqueles do tradicional Estado desenvolvimentista brasileiro, porque convém ao
Brasil de hoje evoluir para o que denominamos de Estado logístico, paradigma por meio do
59
qual os países avançados chegaram ao ponto onde se encontram e nele se mantêm (CERVO,
2003a, p. 11).‖
Paulo Roberto de Almeida, por sua vez, argumenta que as diferenças entre as políticas
exteriores de Cardoso e de Lula não estariam tanto no conteúdo, mas sim na forma. Enquanto a
diplomacia sob Lula tomou uma posição mais ―ativa e altiva‖, se comparada à de Cardoso,
buscando aumentar sua voz com um ―ativismo internacional‖, não teria procedido a grandes
alterações nas linhas de ação, que se constituiriam mais em novas roupagens de iniciativas já
lançadas no governo anterior. Embora reconheça o maior destaque atual dado pelo Brasil aos
países do Sul, considera que esta, como outras divergências, estão mais ligadas à ideologia
inerente à origem partidária de Lula do que à reafirmação de um projeto nacional (ALMEIDA,
2004). Ora, em qualquer um dos casos, a maior disposição dos diplomatas brasileiros para falar
em nome de seu país e promover ações de mais alto perfil no exterior são condições que ensejam
o entendimento da diplomacia pública pelos brasileiros.
Uma análise mais recente do desempenho internacional do Governo Lula foi realizada por
Cristina Pecequilo a partir da obra de Paulo Vizentini, Relações Internacionais do Brasil: de
Vargas a Lula. Segundo a autora, a década de 1990 se caracterizou por uma concentração das
relações internacionais brasileiras no eixo vertical, de tendência hemisférico-bilateral, isto é, pela
busca por uma relação especial com os Estados Unidos, com a participação em uma nova ordem
mundial pós-Guerra Fria conforme as diretrizes daquele que se tornava o polo maior de poder
mundial. A definição da estabilidade e da credibilidade, segundo os critérios estadunidenses,
como fontes de um melhor posicionamento no cenário mundial não foi positiva para o Brasil.
Com a alteração, ao final do governo Cardoso, do curso de sua política externa, o eixo vertical
voltado para o Norte começou a dar lugar à América do Sul e aos países emergentes.
Para a autora, a partir de 2003, o poder de barganha no eixo vertical tem se mostrado
crescente, com a atualização e o equilíbrio das dimensões Norte-Sul e Sul-Sul. Assim:
―Lula vem sendo confrontado por inúmeros desafios, corrigindo padrões prévios. Primeiro, a
percepção da fraqueza foi substituída por uma reavaliação do papel do Brasil como potência
média e nação emergente que precisa de uma diplomacia de alto perfil adequada a suas
capacidades e necessidades. A reafirmação dos interesses políticos e econômicos aparece ao
lado de ma agenda social pós-globalização (PECEQUILO, 2008, p.143).‖
A dimensão Sul-Sul é abordada a partir do eixo horizontal, representado pelas parcerias
com grandes Estados periféricos em desenvolvimento e países menos desenvolvidos da África, da
60
Ásia e do Oriente Médio. Ainda segundo Pecequilo, trata-se de uma tendência global-
multilateral, com benefícios potenciais econômicos, estratégicos e políticos. Essa aproximação
gera uma dinâmica complexa de alianças e coalizões que envolvem tanto o eixo horizontal como
o vertical, e em cuja articulação a diplomacia pública poderia desempenhar um importante papel
de construção de confiança e reconhecimento. Isso se comprova com as recentes tentativa do
Brasil de aumentar sua presença nos mercados do Sul marcados pela complementaridade entre
emergentes, a cooperação científica, tecnológica e política, e a conexão com sociedades
estrangeiras através de parcerias em programas sociais.
3.2.1 O Ministério das Relações Exteriores e a Diplomacia Pública
O Ministério das Relações Exteriores é o órgão do Estado brasileiro responsável por
auxiliar o Presidente da República na formulação da política exterior do Brasil, assegurar sua
execução, manter relações diplomáticas com governos de Estados estrangeiros, organismos e
organizações internacionais e promover os interesses do Estado e da sociedade brasileiros no
exterior.
O MRE tem como áreas de competência a política internacional; relações diplomáticas e
serviços consulares; participação nas negociações comerciais, econômicas, jurídicas, financeiras,
técnicas e culturais com governos e entidades estrangeiras; programas de cooperação
internacional e de promoção comercial; e o apoio a delegações, comitivas e representações
brasileiras em agências e organismos internacionais e multilaterais. No trato desses assuntos, o
MRE é incumbido de executar as diretrizes de política exterior; propor linhas de atuação na
condução dos negócios estrangeiros; recolher as informações necessárias à formulação e
execução da política exterior do Brasil; contribuir para a formulação e implementação, no plano
internacional, de políticas de interesse para o Estado e a sociedade em colaboração com
organismos da sociedade civil brasileira; administrar as relações políticas, econômicas, jurídicas,
comerciais, culturais, científicas, técnicas e tecnológicas do Brasil com a sociedade internacional;
negociar e celebrar tratados, acordos e demais atos internacionais; promover os interesses
governamentais, de instituições públicas e privadas, de empresas e de cidadãos brasileiros no
exterior.
61
Do ponto de vista da transmissão internacional de informações, que talvez seja a tarefa
mais básica da diplomacia pública, o principal setor do MRE é o Centro de Apoio à Imprensa
Estrangeira, que funciona sob a Coordenação de Eventos. Suas atribuições incluem tratar do
credenciamento de correspondentes de imprensa estrangeira; facilitar o acesso da imprensa
estrangeira a autoridades nas esferas federal, estadual e municipal, assim como a informações de
seu interesse; fornecer informações sobre a política externa brasileira; e oferecer material de
divulgação preparado pelo Ministério das Relações Exteriores e outros órgãos da administração
direta. São atividades bastante tradicionais e de caráter unilateral, em que os dados são emitidos
pelo Estado e recebidos pela imprensa estrangeira.
Atividades que envolvem um maior diálogo com os públicos estrangeiros são
desempenhadas principalmente por duas das diversas subsecretarias subordinadas à Secretaria-
Geral das Relações Exteriores, a Subsecretaria-Geral das Comunidades Brasileiras no Exterior e a
Subsecretaria-Geral de Cooperação, Cultura e Promoção Comercial. A primeira é responsável por
ouvir não apenas públicos nacionais, mas também estrangeiros, através da Ouvidoria Consular, e
pelo atendimento das comunidades brasileiras no exterior e de estrangeiros, através do
Departamento Consular e de Brasileiros no Exterior (DCB), que abarca a Divisão de Assistência
Consular (DAC), a Divisão de Documentos de Viagem (DDV) e a Divisão de Atos Internacionais
(DAI). A segunda trata de cooperação, assuntos culturais, promoção comercial e cooperação
através da Agência Brasileira de Cooperação (ABC), do Departamento Cultural (DC) e do
Departamento de Promoção Comercial (DPR).
A ABC negocia, coordena, implementa e acompanha os programas e projetos de
cooperação técnica, executados com base nos acordos firmados pelo Brasil com outros países e
organismos internacionais. A cooperação se dá em caráter bilateral e multilateral, em temas como
agropecuária, energia, biocombustíveis, meio-ambiente, tecnologia da informação, governança
eletrônica, defesa civil, urbanismo, transporte saúde, desenvolvimento social, educação e
formação profissional. Todas essas atividades podem ser incluídas na dimensão da diplomacia
pública que se pauta pelo intercâmbio.
A cooperação técnica internacional busca o desenvolvimento, auxiliando um país a
superar restrições e promover mudanças estruturais nos seus sistemas produtivos. Programas
desse tipo permitem transferir conhecimentos, experiências de sucesso e sofisticados
equipamentos, contribuindo assim para capacitar recursos humanos e fortalecer instituições do
62
país receptor. Uma das vertentes segundo as quais é desenvolvida a cooperação técnica no Brasil
é a cooperação recebida do exterior abrange internalização de conhecimentos técnicos
disponibilizados por organismos internacionais, em caráter multilateral, e por países mais
desenvolvidos, em cunho bilateral, dentro da ótica de aceleração do processo de desenvolvimento
nacional. A outra, a cooperação horizontal, está relacionada à diplomacia pública, já que por
meio dela é promovido o adensamento das relações com países em desenvolvimentos e o
estreitamento dos seus laços políticos e econômicos.
O conceito de "parceria para o desenvolvimento", adotado pelo Brasil, consolida a ideia
de a relação de cooperação acarretar, a ambos os lados, compartilhar esforços e benefícios. As
iniciativas propostas são avaliadas à luz do impacto e do alcance sobre as comunidades
receptoras. Esse procedimento implica aprimorar mecanismos de negociação, avaliação e gestão
dos projetos, a fim de enquadrá-los às prioridades nacionais. A cooperação técnica internacional
desperta grande interesse num amplo segmento da sociedade, incluindo setores governamentais,
ONGs e o público em geral, por possibilitar um acesso mais ágil a tecnologias, conhecimentos,
informações e capacitação.
Por sua vez, o Departamento Cultural é outro instrumento da diplomacia pública
brasileira, servindo à dimensão da diplomacia cultural. O DC auxilia a divulgação, no exterior, da
cultura brasileira, e, em particular, da língua portuguesa falada no Brasil. Essas tarefas são
levadas a efeito por suas seis divisões: Divisão de Promoção da Língua Portuguesa (DPLP),
Divisão de Operações de Difusão Cultural (DODC), Divisão de Acordos e Assuntos Multilaterais
(DAMC), Divisão de Cooperação Educacional (DCE), Coordenação de Divulgação (DIVULG) e
Divisão de Promoção do Audiovisual (DAV).
Por meio de suas divisões, o Departamento Cultural negocia acordos, desempenha
atividades de organização e estabelece contatos com vistas à realização de eventos culturais. Com
base em sugestões da rede de Embaixadas e Consulados, uma programação de iniciativas no
exterior é examinada e definida no início de cada ano, levando-se em conta, entre outros fatores,
as prioridades da política externa brasileira. No âmbito das relações bilaterais, cabe ao DC
negociar, nas comissões mistas periódicas, os programas de trabalho para implementação dos
acordos culturais existentes. Também é da sua competência o acompanhamento e a orientação da
rede de Institutos Culturais e Centros de Estudos Brasileiros no exterior e o repasse dos recursos
necessários às atividades de divulgação cultural.
63
A Divisão de Cooperação Educacional atua em três vertentes da cooperação educacional:
a primeira se relaciona com a formação acadêmica de estudantes estrangeiros no Brasil,
sobretudo pelos programas de Estudantes Convênio de Graduação (PEC-G) e de Pós-Graduação
(PEC-PG); a segunda se refere à sistematização das ações de cooperação educacional através de
acordos e outros instrumentos internacionais; e a terceira está voltada ao acompanhamento de
temas educacionais na agenda internacional. Adicionalmente, a DCE colabora com diversas
outras instituições acadêmicas estrangeiras que desenvolvem trabalhos voltados para o estudo de
temas brasileiros. Concede, ainda, auxílio financeiro para os Núcleos de Estudos Brasileiros no
exterior, procurando também contribuir para as atividades desenvolvidas, facilitando
intercâmbios e doações de material cultural.
Nesta área, o DC organiza também uma rede de Leitorados que reúne professores
especialistas em língua portuguesa, literatura e cultura brasileiras, atuantes em conceituadas
universidades estrangeiras, selecionados pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior do Ministério da Educação (CAPES/MEC) e pelas instituições acadêmicas no
exterior. Ao final do Primeiro Governo Lula, havia 40 leitorados em 30 países, distribuídos em
universidades prestigiosas. A expansão da rede de leitorados no mandato seguinte revela o êxito
dessa modalidade de promoção da língua portuguesa e da cultura brasileira, que atinge uma
parcela qualitativa das populações locais, no âmbito das comunidades acadêmicas formadoras de
opinião.
A Coordenação de Divulgação é responsável por disseminar informações sobre a política
externa brasileira no exterior e no Brasil. Compete à DIVULG divulgar, no exterior, aspectos da
atualidade brasileira, em especial, no que se refere a cultura, avanço social, desenvolvimento
industrial, estabilidade econômica e variedade étnica, climática e física. Para tanto, apoia
programas de rádio brasileiros no exterior, bem como elabora e distribui. publicações em vários
idiomas acerca de diversos aspectos da realidade brasileira Esta divisão também mantém,
harmoniza e aperfeiçoa os sítios eletrônicos do Ministério e dos postos no exterior.
A terceira seção subordinada à Subsecretaria de Cooperação, Cultura e Promoção
Comercial é o Departamento de Promoção Comercial e Investimentos. Ao DPR compete atuar na
organização, na direção e na implementação das políticas de promoção das exportações
brasileiras e de captação de investimentos de interesse do País. Ele leva a cabo programas e
eventos que promovem o Brasil e sua capacidade produtiva e tecnológica, associando assim um
64
caráter moderno e dinâmico à imagem do País. Participam também desse processo, as entidades
representativas do setor privado e empresas com participação ativa nos mercados externos.
O DPR é composto de cinco unidades especializadas, sediadas em Brasília: Divisão de
Informação Comercial (DIC), Divisão de Operações de Promoção Comercial (DOC), Divisão de
Programas de Promoção Comercial (DPG), Divisão de Feiras e Turismo (DFT) e Setor de Gestão
Financeira (SGF). No exterior, o DPR conta com Setores de Promoção Comercial (SECOMs),
instalados em Embaixadas e em Consulados.
Em termos de diplomacia pública, as principais ações são desempenhadas pela DPG, ao
organizar políticas de atração de investimento; pela DFT, promovendo a participação de
empresas brasileiras em feiras no exterior, além de acompanhar as atividades dos Setores de
Promoção do Turismo no Brasil em Consulados e Embaixadas; e pela DOC, que organiza
missões comerciais, seminários, rodadas de negócios e eventos promocionais no Brasil e no
exterior; apoia visitas e missões de importadores e investidores estrangeiros ao País; e auxilia a
divulgação de eventos de interesse do empresariado brasileiro. Também é importante a atuação
dos SECOMs, na medida em que são responsáveis pela coleta e pela divulgação de informações
sobre demandas de importação de produtos e oportunidades de negócio; pela atração de
investimentos e pelo apoio à participação de empresários em feiras, em missões e em eventos no
exterior.
A fim de contribuir para a incorporação cada vez maior de novas empresas ao processo
exportador, em 1998, o DPR lançou oficialmente a página virtual BrazilTradeNet (BTN), em que
empresas brasileiras e estrangeiras podem, respectivamente, ofertar e demandar produtos, buscar
oportunidades de negócios e obter informações relativas às atividades executadas no
Departamento. O website foi reestruturado em 2001 e completamente remodelado no início do
Primeiro Governo Lula, em 2003. Trata-se de uma ferramenta típica da nova diplomacia pública,
utilizando-se das novas TICs para promover a formação de redes entre atores privados da
sociedade, neste caso atuando na área comercial e financeira para divulgar a imagem do Brasil e a
qualidade de seus produtos. Na BTN também estão disponíveis informações sobre missões e
eventos empresariais, indicadores econômico-comerciais do Brasil e de outros países, estudos de
mercado para bens e serviços, boletins sobre projetos de obras e concorrências públicas no
exterior, ferramentas de análise de mercados, sistema de busca de eventos e feiras nacionais e
estrangeiras, espaço para demonstração virtual dos produtos de empresas exportadoras, sistema
65
de promoção de investimentos, programas de atuação específicos e uma série de publicações de
comércio exterior e investimentos. Além de sua interface em português, a página oferece a
possibilidade de acesso em língua espanhola e inglesa.
3.2.2 Ações de Diplomacia Pública
Não caberia à escala deste trabalho passar em revista todas as ações de diplomacia pública
levadas a cabo pelo Brasil no Governo Lula I. Embora se trate de um período limitado de quatro
anos, e de uma área específica de atuação, esse campo reúne inúmeras atividades que não são
sempre registradas ou disponibilizada à consulta para análise pelo público externo aos órgãos
governamentais. Ainda assim, há uma grande quantidade de eventos divulgados; estudar cada
uma dessas ações poderia ser o projeto de um núcleo de estudos ou de um observatório, dada a
extensão do material. Portanto, o que se oferece aqui é uma visão geral das iniciativas diplomacia
pública brasileira de 2003 a 2006.
É importante ressaltar que o propósito deste trabalho é estimular o estudo e a prática da
diplomacia pública no Brasil, sem pretensões, em absoluto, de fornecer uma obra definitiva, mas
sim de esboçar um exemplo introdutório para pesquisas do gênero. Aplicar as teorias
apresentadas anteriormente a um período recente, ao mesmo tempo em que desperta atenção e
promove o entendimento do presente, também limita a medida das consequências de longo prazo.
Com estas ressalvas, pode-se passar ao processamento dos dados disponíveis sobre o
assunto. Trata-se de fontes primárias, registros fornecidos pelo próprio MRE e outros órgãos
governamentais, relatando a miríade de ações conduzidas pela diplomacia brasileira no primeiro
mandato de Lula. A classificação de parte dessas ações como diplomacia pública não parte do
governo, mas faz parte do objeto deste estudo, identificando-as através do envolvimento com o
público estrangeiro e pelos princípios que as guiam.
Assim, a fonte primária utilizada é a Resenha de Política Exterior do Brasil, disponível na
página do Ministério das Relações Exteriores do Brasil na internet. A Resenha é uma publicação
semestral do MRE, organizada e editada pela Coordenação de Documentação Diplomática
(CDO) do Departamento de Comunicações e Documentação (DCD). Seu conteúdo abrange
discursos, artigos e entrevistas das principais autoridades governamentais brasileiras em política
66
externa, bem como a relação dos atos internacionais assinados no período e as notas e
comunicados à imprensa. Se esta publicação tem um foco centralizador e Estatal, sendo seu fio
condutor os discursos do Presidente e do Chanceler brasileiros, bem como as atividades de
embaixada, há também outra importante fonte: de caráter mais descentralizado, os informes da
página eletrônica BrazilTradeNet trazem registros de procedimentos consulares, com foco na
divulgação do país e de seus produtos entre sociedades estrangeiras.
A primeira observação resultante da leitura destas fontes é que, conforme a compilação da
Resenha, o número de entrevistas concedidas a jornalistas estrangeiros e de artigos publicados
por autoridades brasileiras na imprensa estrangeira cresce ao longo dos anos. Dessa maneira, no
primeiro ano de governo, são relatadas apenas duas entrevistas à mídia estrangeira e um artigo
publicado no exterior. No ano seguinte, as entrevistas se elevam ao número de onze, e os artigos,
a cinco. Em 2005, vinte entrevistas foram concedidas e foram publicados igualmente cinco
artigos — ainda que um deles tenha sido veiculado em diferentes periódicos de vários países. No
último ano de governo, o total chega a vinte e duas entrevistas e dez artigos.
É importante ressaltar que com a publicação do volume 92 da Resenha, tratando do
primeiro semestre de 2003, foi dado um importante passo rumo à publicização dos atos da
diplomacia brasileira. A série havia sido interrompida em 1996, sendo que as informações
relativas a 2007 foram publicadas apenas em meio eletrônico. Com a retomada da divulgação em
material impresso e documentos eletrônicos disponíveis na internet, deu-se um passo em direção
à preservação da memória diplomática e à difusão do conhecimento e do entendimento da
política exterior brasileira.
Embora não possam ser considerados, em si, atos de diplomacia pública, muitos dos
acordos, tratados, convenções, protocolos e memorandos assinados pelo país entre 2003 e 2006
deram base a ações do gênero. Entre eles, atos de cooperação nas áreas de educação, cultura,
turismo, saúde, tecnologia e ciência da produção que visam ao estabelecimento de redes de
aprendizado entre o Brasil e outros países. Esses documentos, embora prevendo a mediação pelo
poder público, trazem em seu espírito princípios de emancipação dos indivíduos, das sociedades e
das nações, através da instrução formal, do incentivo à capacitação profissional e à reflexão.
Destacam-se entre os signatários países africanos, árabes e latino-americanos, comprovando a
ênfase dada pelo Governo Lula às relações Sul-Sul.
67
Em um contato mais direto com a sociedade, foram organizados seminários abordando
temas como combate à fome, promoção da saúde e difusão da cultura brasileira e da língua
portuguesa pelo mundo. Nos quatro anos, promoções em conjunto com outros órgãos
governamentais, como o Ministério da Cultura e o Ministério da Educação, chamaram atenção
para a relação do Brasil com sociedades estrangeiras. Em 2003, o evento de maior importância na
relação com públicos estrangeiros foi o Fórum Social Mundial, exemplo da constituição de redes
entre sociedades civis organizadas. No ano de 2004, destacam-se iniciativas como o Dia da
Amizade entre Brasil e Argentina e o Fórum Cultural Mundial. Em parceria com o país receptor,
o Ano do Brasil na França, em 2005, obteve grande prestígio cultural. A II Conferência dos
Intelectuais da África e da Diáspora, em 2006, representou um excelente exemplo de diplomacia
pública, abarcando as dimensões do diálogo, do intercâmbio cultural, da geração de fatos
internacionais de educação e afirmação social. O evento também não deixou de constituir um
lobby diplomático junto aos países africanos, cuja contribuição para a cultura brasileira foi
utilizada como base constante para a busca da aproximação política durante o Governo Lula.
Em sua maioria, porém, os eventos organizados foram encontros e seminários
empresarias, em caráter bilateral, sobre as possibilidades de negócios de estrangeiros no Brasil e
de brasileiros no exterior. A esse respeito, são significativos os dados da BrazilTradeNet listando
as ações do DPR, através de embaixadas e consulados. Com relatórios anuais e trimestrais desde
2001, dispõe-se de valioso registro da forma pela qual o MRE procura corresponder aos anseios
da sociedade civil no tocante à inserção competitiva da economia brasileira no mercado mundial.
A partir de 2003, o Ministério das Relações Exteriores implementou inúmeras iniciativas
para responder às crescentes demandas do empresariado nacional. Entre elas, está a organização
de missões, seminários, rodadas de negócios e mostras no exterior. Com registros consolidados
dos três primeiros anos do Governo Lula, pode-se ter uma noção do progresso deste tipo de
atividades20
.
O Departamento de Promoção Comercial continuou em 2003 a fortalecer a cultura
exportadora, dirigindo-se à comunidade acadêmica e de negócios, no Brasil e no exterior. Como
nos anos anteriores, prosseguiram em 2003 os esforços para prover Embaixadas e Consulados
brasileiros com material de qualidade sobre o potencial exportador do País, em idioma acessível
20
Estes dados foram retirados dos relatórios disponíveis na página da BrazilTradeNet, acessíveis pelo
endereço: <http://www.braziltradenet.gov.br/Publicacoes/P/institucionais.aspx>.
68
ao público a que se dirige, bem como sobre as atividades de apoio desenvolvidas pelo Itamaraty
para apoiar as exportações brasileiras.
Adicionalmente, criaram-se novos banners e cartazes para utilização em feiras e outros
eventos no Brasil e no exterior. O programa de feiras, exposições e seminários do Itamaraty
contemplou 55 eventos, dos quais 14 feiras de caráter geral e 41 mostras especializadas nos
seguintes setores, sendo os setores mais promovidos agropecuária e alimentação, turismo e
calçados e artefatos de couro.
Outro instrumento de divulgação, as missões empresariais dedicam-se à prospecção e
encaminhamento de novos negócios, promovendo a imagem do Brasil e credenciando o Itamaraty
como agente privilegiado na promoção do comércio exterior e na atração de investimentos de
interesse do País. As missões realizadas em 2003 envolveram mais de 800 empresários
brasileiros e cerca de 2.700 estrangeiros. Encaminharam negócios estimados em
aproximadamente US$ 1,5 bilhão.
Em 2003, continuou-se a privilegiar missões a mercados novos, ou não-tradicionais, sem
se descurar do incremento das transações com os parceiros tradicionais do Brasil. Foram
realizadas missões empresariais a 21 países – África do Sul, Alemanha, Angola, Argélia,
Austrália, Cuba, Egito, Espanha, Grécia, Índia, Líbano, Líbia, México, Moçambique, Namíbia,
Nova Zelândia, Peru, Portugal, Síria, Venezuela e Vietnã. Em contrapartida, o Brasil recebeu 11
missões empresariais do exterior, que se concentraram nas cidades de Beberibe, Brasília,
Fortaleza, Porto Alegre, Rio de Janeiro e São Paulo.
Em 2004, foram organizadas missões empresariais em apoio a viagens oficiais para o
exterior do Presidente e do Vice-Presidente da República, do Ministro das Relações Exteriores e
dos demais Ministros de Estado. Incluem-se aqui as missões realizadas por entidades
empresariais, governos estaduais e municipais, para os seguintes países: Angola, Moçambique,
África do Sul, Índia, Sri Lanka, México, Peru, China, Japão, Hong Kong, Islândia, Dinamarca,
Noruega, Turquia, Rússia, Cabo Verde, Chile, Gabão, Portugal e Coreia do Sul. O Departamento
procurou fazer coincidir as missões empresariais com feiras comerciais, ou com grandes eventos
de divulgação cultural nos países visitados. Convém ressaltar que as missões empresariais foram
organizadas por meio eletrônico, com utilização das TICs para diminuir gastos.
O DPR também buscou divulgar a vinda dessas missões na comunidade empresarial
brasileira, com o objetivo de arregimentar as empresas de interesse dos visitantes. Além disso,
69
colaborou para a montagem de programas que permitissem aos visitantes contatar o maior
número possível de empresas ou entidades de classe sediadas nas regiões com perfil econômico
compatível com o perfil da missão, bem como representantes da administração pública direta ou
indireta que lhes pudessem prestar informações úteis para sua decisão de fazer negócios no
Brasil. O Departamento buscou ainda incentivar as missões estrangeiras a visitarem feiras
comerciais internacionais realizadas no Brasil.
A Divisão de Feiras e Turismo coordenou a participação brasileira em 49 feiras no
exterior, integrantes do Programa de Feiras, Exposições e Seminários do Itamaraty. Foram 12
mostras de caráter geral e 37 feiras especializadas, sendo que junto aos setores mais prolíficos do
ano anterior, uniu-se o de material e equipamento para construção.
Em 2005, a Divisão de Operações de Promoção Comercial organizou 39 eventos de
caráter econômico-comercial. Prestou apoio a missões estrangeiras que visitaram o Brasil, bem
como viabilizou a realização de seminários e reuniões cujos temas têm recebido grande atenção
da comunidade internacional. Além disso, a DOC organizou programas de visitas de
Embaixadores brasileiros a empresas com interesse ou potencial de negócios nos países em que
estão acreditados.
As missões empresariais por ocasião de visitas presidenciais resultaram na assinatura de
diversos contratos entre empresas/entidades brasileiras e estrangeiras. A DOC também prestou
apoio à vinda de missões estrangeiras de compradores ou de investidores, em parceria com as
embaixadas ou consulados estrangeiros no Brasil ou com entidades brasileiras promotoras das
viagens. O DPR também buscou divulgar na comunidade empresarial brasileira a vinda dessas
missões, com o objetivo de arregimentar empresas julgadas com interesse específico nos contatos
com os visitantes. Além disso, colaborou para a montagem de programas que permitissem aos
grupos visitantes contatar não somente o maior número possível de empresas ou entidades de
classe sediadas nas regiões com perfil econômico compatível com o perfil da missão, mas
também os representantes da administração pública direta e indireta que lhes pudessem prestar
informações para sua decisão de fazer negócios no Brasil.
As missões deram especial foco a mercados novos e não-tradicionais, bem como
buscaram reforçar parcerias comerciais de tradição e que atualmente estavam com baixo volume
de intercâmbio comercial. Além de negócios concretos, as missões serviram para possibilitar ao
empresariado brasileiro prospectar nichos de mercados com pouca presença na pauta de
70
exportações do Brasil. Também propiciaram maior visibilidade às ações de promoção comercial
do Itamaraty, mediante a presença de serviço especializado e tangível às empresas exportadoras.
Em 2005 o Programa de Feiras no exterior contemplou 42 feiras, sendo 19 mostras gerais
e 23 setoriais. A exemplo dos anos anteriores, em 2005 a DFT elaborou o Calendário Brasileiro
de Feiras, instrumento que reúne informações de mais de 150 feiras realizadas no País. Ao longo
do exercício, a participação institucional do DPR ocorreu em 15 destas feiras, representativas dos
setores institucional, agropecuário, cosmético, calçados e couros, médico-hospitalar, moveleiro e
de decoração, tecnologia e de serviços.
Outra atividade de destaque na promoção turística do Brasil desenvolvida pela DFT,
mediante estreita colaboração com a Embratur e com os SECOMs, é a constituição e a operação
dos ―Comitês Descubra o Brasil‖, unidades que congregam operadores de turismo, agências de
viagem e empresas do trade turístico local presentes nos seguintes países da América do Sul:
Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Paraguai, Peru e Uruguai. Em 2005, a Divisão de
Feiras e Turismo acompanhou o desenvolvimento das atividades dos Comitês, tais como a
participação em feiras; a realização de seminários de capacitação, para operadores, e de viagens
de familiarização com os destinos brasileiros, para jornalistas e para operadores locais.
Como se vê, é importante registrar que nem todas as tarefas de diplomacia pública são
conduzidas apenas pelo MRE. Muitas dessas atribuições são assumidas por outros órgãos
governamentais, como o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, o Ministério do
Turismo e a Secretaria de Comunicação da Presidência da República. Esses entes públicos atuam
na promoção da imagem internacional do Brasil, nas áreas de conexão, respectivamente, de
estímulo ao comércio exterior e aos investimentos estrangeiros, de prospecção e atração de
turistas e de divulgação de informações sobre o governo e dados sobre o país. Na área da
formação das ideias, porém, a repartição que atua com maior profundidade é o Ministério da
Educação, frequente parceiro do MRE no estabelecimento de intercâmbios.
Entre suas iniciativas, pode-se destacar a instituição da Comissão para Definição da
Política de Ensino-Aprendizagem, Pesquisa e Promoção da Língua Portuguesa (Colip), em 2005,
com vistas a promover o domínio da língua portuguesa em toda sua amplitude e diversidade
como meio de libertação individual e social, bem como de integração social. Entre seus objetivos,
está a internacionalização do português do Brasil através de políticas de leitorado, publicação de
periódicos sobre a língua portuguesa do Brasil e tradução de textos literários brasileiros para
71
outras línguas. Na produção de ações culturais que promovam e deem visibilidade á identidade e
representação do Brasil linguístico, a Colip prioriza o intercâmbio linguístico e cultural com os
países da América Latina e com países de África, particularmente com os países lusófonos.
Em consonância com as diretrizes formuladas pela Colip, foi criado em dezembro de 2005
o Instituto Machado de Assis (IMA), que deverá formular e coordenar as políticas para a língua
portuguesa no Brasil e no mundo nos eixos de documentação, pesquisa, políticas, difusão e
ensino. Em conjunto com o MRE, o IMA difundirá a língua portuguesa nos países não lusófonos,
em estrangeiros onde vivem minorias brasileiras, por meio de projetos e acordos culturais e em
colaboração com a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), tendo no Instituto
Camões, de Portugal, um parceiro privilegiado.
No Governo Lula, foi continuado e expandido o Programa de Estudantes-Convênio de
Graduação (PEC-G), herdado do Governo Fernando Henrique Cardoso, que oferece
oportunidades de formação superior a cidadãos de países em desenvolvimento com os quais o
Brasil mantém acordos educacionais e culturais. O PEC-G seleciona estrangeiros, entre 18 e 25
anos, com ensino médio completo e proficientes em língua portuguesa, para realizar estudos de
graduação no país. São selecionadas preferencialmente pessoas inseridas em programas de
desenvolvimento sócio-econômico, acordados entre o Brasil e seus países de origem. Os acordos
determinam a adoção pelo aluno do compromisso de regressar ao seu país e contribuir com a área
na qual se graduou.
Somando-se ao PEC-G, foi criado em 2006 o Programa de Estudante-Convênio de Pós-
Graduação (PEC-PG), em nível de mestrado e doutorado, oferecido a estudantes de países em
desenvolvimento. Por meio dele, são oferecidas vagas sem custo de matrícula nem exame de
admissão em Instituições de Ensino Superior brasileiras e oferecidas bolsas mensais. Trata-se de
uma cooperação para a formação avançada, em áreas específicas, de nações em desenvolvimento,
incentivando o intercâmbio de ideias e experiências e enriquecendo o conhecimento dos
professores e estudantes brasileiros com as experiências acadêmicas, culturais e de vivência de
alunos estrangeiros.
72
3.2.3 Balanço das Iniciativas
Embora não haja dados consolidados para o ano de 2006, os relatórios do DCR apontam
para uma dispersão das ações de promoção ao longo do Governo Lula. Enquanto diminuiu a
participação do serviço exterior no assessoramento à participação do empresariado em feiras
internacionais, foram surgindo a cada ano novas iniciativas destinadas a promover
relacionamentos mais profundos e informados, através de seminários e conferências. Isso
demonstra uma crença, por parte do setor público, de que as empresas se tornam mais capazes de
prospectar negócios sem o auxílio constante do governo. Por outro lado, foi dada ênfase crescente
à promoção de áreas econômicas menos tradicionais, com o desejo implícito de abrir novos
espaços para os produtos e serviços brasileiros e diversificar a pauta de importação.
Essas ações de diplomacia pública, porém, demonstram que o Estado brasileiro ainda
entende a promoção de ativos nacionais como uma operação essencialmente econômica, sem
maiores possibilidades de ganhos políticos. A participação em feiras, como atividade principal,
opera desde um ponto final na cadeia de elaboração de processos: procura promover a exportação
a partir de estruturas produtivas já configuradas, oferecendo o nacional sem conhecimento do
estrangeiro. No sentido inverso vão as conferências, missões e seminários, que buscam apreender
a realidade local para embasar a postura que atores brasileiros adotarão em relação ao público-
alvo.
De qualquer maneira, observa-se uma ênfase no lado comercial, em que o público ao qual
se destinam as atividades é um público-consumidor, e apenas pouco a pouco vão surgindo novas
maneiras de estabelecer o diálogo. Portanto, as tendências progressistas não se percebem na
forma, mas na seleção de alvos da diplomacia: mercados emergentes, desejosos dos produtos e
conhecimentos brasileiros para promover seu desenvolvimento.
As ações mais próximas da construção de um poder brando são desenvolvidas nos
compromissos de cooperação técnico-científica e nas parcerias com os Ministérios da Educação e
da Cultura. Ao demonstrar sua capacidade de produzir tecnologia de ponta e sua disposição de
partilhá-la com países de menor desenvolvimento relativo, o Brasil se firma junto a seus parceiros
como um agente da sociedade internacional cujos interesses estão de acordo com as aspirações
dos povos do sul, senão de toda a humanidade. Ainda, difundir a língua portuguesa e a cultura
brasileira estabelece pontes para com as populações estrangeiras, que conhecendo e
73
compreendendo melhor os princípios, costumes e produção cultural do Brasil passam a ter mais
confiança e admiração pelo país. Constata-se, assim, a necessidade de investir na expansão de
programas deste gênero.
Ademais, a pesquisa aponta para a inexistência de registros centralizados sobre a
diplomacia pública brasileira, sendo necessário buscar os dados a partir de cada repartição
pública que possa estar envolvida na área. A própria falta de reconhecimento do conceito de
diplomacia pública no Brasil é um obstáculo a ações mais efetiva. Uma gama tão ampla de
iniciativas, levadas a cabo em áreas tão diversas poderia ser potencializada se houvesse o
reconhecimento de que todas atuam com vistas a um mesmo fim: o fortalecimento do Brasil na
sociedade internacional.
Isto não quer dizer que as tarefas de diplomacia pública precisam ser centralizadas sob
uma única autoridade. Tampouco seria recomendável fazê-lo, uma vez que cada setor do governo
tem a sua área de competência e um entendimento muito mais profundo dos temas de que trata do
que as demais. Mas estas tarefas poderiam ser coordenadas por uma divisão como o
Departamento de Promoção Cultural e de Investimentos, ou o Departamento Cultural do
Ministério das Relações Exteriores, de onde se poderia acompanhar seu desempenho e os frutos
que geram.
74
Considerações Finais
O estudo da diplomacia pública no Governo Lula confirma uma percepção corrente acerca
do Brasil: o país ainda não materializa todo o seu potencial de projeção de poder. Todavia, passos
importantes foram dados neste sentido entre 2003 e 2006. A partir de uma perspectiva humanista,
a diplomacia brasileira sob Lula e Celso Amorim primou pelo desenvolvimento, pela democracia
e diversificação. Enquanto o desenvolvimento tem sido um vetor constante da política externa
brasileira desde a constituição do país, e a busca pela diversificação tenha estado presente em
outros momentos históricos, a caracterização do Brasil como um país essencialmente
democrático se constrói nas duas últimas décadas, e vem se fortalecendo a todo momento.
A força da política externa de Lula está na conjugação destes três elementos na
recomposição da imagem internacional do Brasil como um agente altivo e capaz, desejoso de
influenciar o tão necessário reordenamento das estruturas internacionais. Soube-se equilibrar a
busca pela estabilidade nas relações internacionais com a necessidade de transformações no
sistema internacional através da definição do país como confiável, generoso e criativo.
Estabelecer esse tipo de imagem não é uma tarefa que se possa conduzir apenas tratando
com as autoridades máximas de outras nações, mas precisa ser operada junto às populações de
Estados estrangeiros. No primeiro Governo Lula, esse contato foi menor do que o desejável para
uma ideal inserção do Brasil, mas também atingiu níveis que não se encontraram em governos
anteriores. Foram lançadas sementes para a aproximação da sociedade brasileira de cidadãos
estrangeiros, em um intercâmbio favorável a ambas as partes.
Um aspecto fundamental para a projeção do Brasil no mundo foi a ênfase dada ao
desenvolvimento social, com a promoção da educação, da saúde e da distribuição de renda.
Através da cooperação com outros países, esse movimento ultrapassou as fronteiras nacionais,
possibilitando o avanço no exterior da sociedade civil. Tendo em mente que o interesse nacional
passa também pelo desenvolvimento de seus parceiros, a diplomacia brasileira buscou solucionar
controvérsias com cautela e cordialidade.
Estes progressos, que encontraram continuidade no segundo mandato de Lula, não
constituem, porém, uma obra acabada. Bem o demonstra o estado atual da pesquisa em relação à
diplomacia pública no país. Um conceito que hoje é raramente usado pode ser instrumental na
organização de sociedades, na conexão entre os diferentes povos e na emancipação do cidadão. O
75
poder da informação e da cultura dota o indivíduo do conhecimento de sua realidade e cimenta
uma capacidade crítica para entender e fazer valer seus direitos.
Se o Brasil pretende ter um papel definidor na sociedade internacional, deve adotá-lo
inspirado em sua própria situação doméstica, nas demandas de seu povo. Não pode fazê-lo,
porém, sem conhecer as aspirações e as condições de sociedades estrangeiras, com o respeito de
saber ouvir o que o outro tem a dizer. Não é possível prever o papel que a nação virá a assumir,
mas é fundamental que sua constituição se dê através da participação popular. Esta deve ser uma
participação qualificada, de grupos e indivíduos capazes de propor iniciativas que melhorem sua
qualidade de vida, informadas a partir não apenas da sua experiência particular, mas também do
diálogo com agentes equivalentes de outros países.
Para que esse diálogo aconteça, é importante que o governo atue na articulação de redes
transnacionais que possibilitem à sociedade civil um intercâmbio que vá além da informação
bruta ou de bens materiais, e permita a troca de capacitações técnicas, repertórios culturais, ideias
críticas e visões de mundo. A diplomacia deve ser encarada como mais do que um instrumento do
Estado, operado pelo governo — deve ser um serviço público voltado para proporcionar ao
cidadão a liberdade e a mobilidade que são seus direitos fundamentais.
Neste esforço, todas as dimensões da diplomacia pública precisam ser observadas. A
escuta, na compreensão da cultura e das demandas do outro. O lobby diplomático, na defesa junto
a governos estrangeiros das iniciativas que visam à concretização da democracia e do
desenvolvimento. A diplomacia cultural, que enriquece a experiência humana, e, com lentes
estrangeiras, faz renovar as formas através das quais os povos processam sua realidade. A
diplomacia de intercâmbio, que permite aos estudantes levarem de volta a sua terra natal
conhecimentos antes ausentes e a confiança no país hospedeiro. E, finalmente, a transmissão
internacional de notícias, através qual as pessoas podem se manter informadas e conhecer as
intenções e posturas que outro país assume, e quais seus efeitos na vida cotidiana.
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