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Atores Sociais nas Dinâmicas de Desenvolvimento Territorial Sustentável: O Caso da ASSHORTI

Autoria: Jaqueline Rossato, Marie-Anne Stival Pereira e Leal Lozano, Hans Michael van Bellen

RESUMO Com o objetivo de compreender e analisar o papel da Associação dos Horticultores da Área da Infraero de Imperatriz no Maranhão [ASSHORTI] sob as dinâmicas de desenvolvimento territorial sustentável e como ela pode contribuir para o desenvolvimento sob a perspectiva ambiental e territorial, o presente artigo apresenta conceitos e características acerca do desenvolvimento sustentável e da participação dos atores sociais e seus processos de articulação para o desenvolvimento territorial. O interesse por este estudo se deu pela importância do papel desempenhado por este tipo de organização como exemplo e formação de uma sociedade mais justa econômica, social e ambientalmente. Para tanto, espera-se contribuir para o desenvolvimento do Projeto Cinturão Verde e da ASSHORTI, e instigar a construção de novos estudos relacionados ao tema, para que os produtores e parceiros possam potencializar suas ações sociais, econômicas e ambientais em prol do desenvolvimento sustentável. As orientações metodológicas incluíram levantamento bibliográfico e coleta de dados a partir de entrevistas com o Presidente da Associação, e com os gestores e colaboradores do Projeto Cinturão Verde, e observação de campo. Trata-se de um estudo de cunho exploratório e descritivo, de abordagem qualitativa. Por meio das análises dos dados, pode-se observar que o Projeto Cinturão Verde possui um grande potencial econômico baseado na agricultura familiar e a ASSHORTI parece cumprir com parte do seu papel de articulador e protagonista de um desenvolvimento territorial sustentável, estabelecendo condições mais favoráveis para a produção e distribuição, além de fomentador de uma melhor qualidade de vida para os produtores. Há, portanto, mecanismos evidentes de articulação entre a ASSHORTI e os demais atores envolvidos no território, com alto grau de interação para as questões sociais, econômicas e ambientais, ainda que exista participação parcial dos produtores, falta de capacitação efetiva e fragilidade nas estruturas institucionais (profissionais qualificados, infra-estrutura e recursos humanos). Podemos concluir que o Projeto Cinturão Verde é um modelo de desenvolvimento bem sucedido e pode servir como exemplo para outras regiões, até mesmo para futuros projetos de ocupação de terras ociosas ao redor dos aeroportos. E, a ASSHORTI, como possui forte poder de articulação entre os atores, pode em muito contribuir para a construção de estratégias coletivas que superam de maneira mais efetiva os obstáculos e desenvolvam novas formas de criar e gerir modelos locais de desenvolvimento, contemplando não só a força de seus territórios e de seus capitais sociais, mas também as oportunidades não anteriormente percebidas individualmente.

 

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1. INTRODUÇÃO  

O desenvolvimento sustentável surge como uma necessidade de se restabelecer uma harmonia entre fatores econômicos, sociais e ambientais. A urgência de um novo modelo de desenvolvimento se consolida através das limitações que o modelo economicista, reducionista e unidimensional impõe com seu consumo degenerado e suas práticas predatórias desgastando recursos não-renováveis.

A transição para uma sociedade mais consciente e mais responsável é emergencial. É preciso mudar a maneira de gerir os negócios, o planejamento e o consumo. Dessa maneira, torna-se necessária uma nova forma de se desenvolver socialmente, economicamente e ecologicamente. É preciso ainda escapar do mimetismo cultural imposto na elaboração das alternativas de desenvolvimento, mimetismo esse que desconsidera as diversidades e os potenciais locais - latentes, inutilizados, sub e mal utilizados. É necessário olhar as possibilidades locais, tendo em vista um futuro que sustente a geração atual e as gerações que ainda estão por vir.

É justamente nesse espaço que surge a necessidade de programas que contemplem as reais necessidades da sociedade, inseridos em um ambiente socialmente mais igualitário e também contemplando um desenvolvimento mais justo e harmônico entre as diferentes esferas: Estado, Mercado e Sociedade Civil. Tendo isto, propostas de desenvolvimento sustentável podem se tornar mais plausíveis.

Diante destas questões, o programa de responsabilidade social da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária [INFRAERO] surge propondo melhorias para moradores do entorno do aeroporto de Imperatriz no Maranhão através da produção orgânica de hortaliças e da inserção de agricultores familiares no contexto social. Assim, nasce o Projeto Cinturão Verde, e posteriormente a ASSHORTI (Associação dos Horticultores da Área da Infraero de Imperatriz), que tem como objetivo promover a qualidade de vida dos produtores e geração de renda e trabalho.

Diante disso e sabendo da importância da ASSHORTI para o desenvolvimento do Projeto Cinturão Verde, buscou-se compreender o papel da ASSHORTI sob as dinâmicas de DTS (desenvolvimento territorial sustentável) e como ela pode contribuir para o desenvolvimento sustentável sob a perspectiva ambiental e territorial. Para tanto, espera-se contribuir para o desenvolvimento do Projeto Cinturão Verde, e da ASSHORTI e instigar a construção de novos estudos relacionados ao tema, para que os produtores e parceiros possam potencializar suas ações sociais, econômicas e ambientais em prol do desenvolvimento territorial sustentável.

Além desta introdução e considerações finais, este artigo apresenta mais três tópicos: o item 2 apresenta o referencial teórico acerca dos conceitos e características de território e desenvolvimento, DTS, atores sociais e os processos de articulação; o item 3 destaca as orientações medológicas deste estudo; o item 4 apresenta a descrição e análise do campo de pesquisa e por fim, são apresentadas as referências bibliográficas utilizadas para embasar artigo. 2. REFERENCIAL TEÓRICO Para sustentar a proposta deste trabalho, faz-se necessário uma pesquisa teórica sustentada em aspectos do contexto que envolve o território e desenvolvimento, DTS e os atores sociais e seus processos de articulação.

 

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2.1 Território e Desenvolvimento

O território pode ser concebido sobre diferentes perspectivas, sendo um termo com concepções distintas e não necessariamente excludentes entre si. Bonnal, Cazella e Maluf (2009), apontam noções de territórios comumente utilizadas: (a) território como unidade de atuação do Estado para controlar a produção de externalidades pela agricultura (uma abordagem político-econômica); (b) território como unidade de construção de recursos específicos para o desenvolvimento econômico (abordagem da economia territorial); (c) território como produto de uma ação coletiva (abordagem sócio-econômica); (d) território como componente fundamental das sociedades tradicionais (abordagem antropológica).

Abramovay (2006, p.60), classifica a noção território como “o caminho para se obter um avanço do estudo do próprio desenvolvimento, já que procura enfatizar a maneira como os diferentes atores – privados, públicos e associativos – se relacionam no plano local”. Dessa forma, o processo de desenvolvimento seria o resultado da maneira como são utilizados os fatores materiais e imateriais disponíveis.

Lipietz (1991), determina três diferentes aspectos para análise de um modelo de desenvolvimento: a organização do trabalho (princípios gerais que governam as organizações internamente), o regime de acumulação (a lógica que determina as condições de produção e as condições de uso social da produção) e o modo de regulação (mecanismos que ajustam comportamentos contraditórios aos princípios coletivos do regime de acumulação). As formas de regulação aliadas com regimes de acumulação em determinado modelo de organização acaba por desenhar um “modelo de desenvolvimento”. Como enfatiza Lipietz (1991, p.28), um modelo, e não o desenvolvimento.

Ainda segundo Lipietz (1991), o modelo fordista de desenvolvimento tão amplamente aplicado no decorrer dos processos de desenvolvimento econômico mundial tem sua lógica fundamentada na alta produtividade, propondo inclusive mecanismos que permitiriam o consumo dos mesmos através da imposição de um crescimento aquisitivo acompanhado da garantia do pleno emprego. Uma maior produtividade significaria maior lucro, que por sua vez representa um maior poder de compra. Um desenvolvimento categoricamente hegemonizado fundamentado essencialmente no progresso tecnológico, no progresso social (representado pelo aumento do poder aquisitivo) e no progresso do estado, colocado como fiador do interesse geral da comunidade

O modo de pensar e gerir o desenvolvimento vive uma época de grandes mudanças (Duran & Thoening apud Andion, 2007): se anteriormente imperava modelos de regulação “cruzada” (com o Estado controlando as agendas locais de desenvolvimento, burocratizando a gestão local e dando pouca importância às coletividades locais), começam a surgir institucionalizações da ação coletiva (onde vários atores e instituições intervém sobre o mesmo problema, com maior comunicação e cooperação), procurando assim novas formas de ação coletiva.

Nas últimas décadas, o debate sobre desenvolvimento vem crescendo, adquirindo em seu contexto novas abordagens e novos enfoques. Segundo Vieira (2006), na década de 1970, as referências relacionadas ao conceito de desenvolvimento se confundiam com a noção de ecodesenvolvimento, sendo marcadas por tendências mimetizadas de maneira acrítica. O foco dos estudos de caso realizados na época enfatizava a criação de sistemas alternativos de planejamento e de gestão, com estratégias participativas endógenas, ecologicamente prudentes e sensíveis às especificidades locais e regionais.

Nos anos de 1980, a ênfase estava na ideologia do neoliberalismo e na sua busca obsessiva por eficiência e competitividade a todo custo. Somente no final da década houve a disseminação do critério de sustentabilidade das políticas públicas, fundada numa idéia de natureza equilibrada. No decorrer da década de 1990 surgiram novas abordagens, novos

 

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aportes conceituais, teóricos e metodológicos testados nos mais diversos contextos regionais, contribuindo na solidificação ética e científica do enfoque do ecodesenvolvimento; dentre os mesmos podemos citar o desenvolvimento viável, a gestão patrimonial de recursos e o desenvolvimento territorial sustentável.

O desenvolvimento enquanto sustentável, segundo Sachs (2007), deve ter como princípio norteador tanto a equidade social, como a prudência ecológica e a eficiência econômica. Assim, o meio ambiente, considerado um dos pilares do desenvolvimento sustentável, deve ser incorporado em todos os níveis de decisão, assim como, em maior ou menor grau, os fatores econômicos e sociais. A necessidade de um novo paradigma que considere a gestão dos recursos naturais aparece como um elemento fundamental de gestão inteligente em busca da sustentabilidade seja em âmbito organizacional, empresarial ou ainda de políticas públicas.

2.2 Desenvolvimento Territorial Sustentável

O desenvolvimento territorial sustentável pode ser entendido como “uma modalidade de política ambiental (...) simultaneamente preventiva e proativa, focalizando a relação sociedade-natureza de uma perspectiva sistêmica” (VIEIRA, 2006, p.296). O homem faz parte do ecossistema, e para tanto se faz necessário metodologias e dinâmicas mais endógenas e participativas, contemplando o homem no meio sócio-ambiental no qual está inserido. Como ressalta Vieira (2006), o enfoque territorial do desenvolvimento exige um movimento efetivo de transferência do poder do espaço nacional para os espaços regionais e locais, assim como necessita de um novo padrão de inter-relacionamento entre as esferas decisórias desses diferentes espaços, compatibilizando a gestão e o planejamento com as especificidades locais de cada um deles, considerando em si, a complexidade inerente aos sistemas vivos e dinâmicos.

Andion (2007), interpreta o desenvolvimento como um fenômeno construído no tempo e no espaço pelos diversos atores que compõem os sistemas de ação no território, redefinido a noção de ator para analisar a dinâmica do desenvolvimento desses territórios, empregando para isso o uso da teoria de estruturação de Giddens. Tal teoria, segundo a autora, considera o ator como um agente competente agindo num contexto específico, com capacidade de transformar seu ambiente e de refletir sobre seus atos - o ator consegue estabelecer seus objetivos para fazer o que faz e é capaz de expressá-los de forma discursiva, determinando significados para sua ação.

O ator é concebido então como um agente plural, capaz de refletir sobre seus atos, dotado de diversas racionalidades e agindo dentro de um contexto específico. É flagrante a importância do ator na gestão dos recursos naturais. Obviamente, o meio ambiente, “per si” não pode ser gerido, cabendo a nós, indivíduos ou sociedade, tentar gerir a nós mesmos, nossos processos produtivos e de sustentação energética e material que afetam, de forma positiva ou negativa o meio ambiente.

É fundamental colocar em prática dispositivos de formação dos atores e de assistência técnica aos projetos, que sejam flexíveis e que possam intervir de maneira contínua na criação de atividades para ajudar a maturação do “terreno”, além disso, o apoio técnico e o de formação devem também permitir às atividades alcançar um bom nível de qualidade, o que vai lhes dar credibilidade e gerar empregos e riquezas (SAUVAGE, 1996).

Vieira (2006), afirma que o trabalho de fundamentação teórica das dinâmicas de desenvolvimento territorial sustentável não atingiu um patamar de maturidade considerado suficiente para fazer justiça às duras exigências colocadas pela crise recorrente das teorias e das práticas de desenvolvimento na transição para o novo milênio.

 

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Ainda assim, reforça Vieira (2006), que um dos principais desafios a serem confrontados pelos planejadores e gestores de políticas públicas ambientais de corte preventivo-proativo, norteadas pelo enfoque de desenvolvimento territorial sustentável, é a gestão da complexidade envolvida na reorganização transdisciplinar-sistêmica das comunidades científicas e na criação de sistemas de planejamento cada vez melhor articulados à evolução da pesquisa ecológico-humana.

Assim, torna-se necessário um novo tipo de gestão de recursos, “centrado no fortalecimento da resiliência socioecológica e que compõe elementos centrais como: combinação de diferentes tipos de conhecimento, utilização de enfoques participativos para criar novas opções de regulação, monitoramento do processo em diferentes escalas, desenvolvimento de enfoques flexíveis e procura sempre intervir com base em feedbacks regulares de dinâmica ecossistêmica” (VIEIRA, 2007).

Para isto, a ciência e o conhecimento local podem ser utilizados de maneira complementar, tendo em vista a melhoria dos processos de tomada decisão no campo do planejamento e da gestão, complementa Berkes (1996). E ainda sob esta ótica, Vieira (2007), afirma que isto nos leva a sugerir que esta temática deveria ser enfocada mediante a pesquisa participativa, transformando as comunidades em parceiras efetivas de um processo cooperativo de criação de conhecimentos – ao invés de continuar insistindo em considerá-los como meros “objetos” de pesquisa acadêmica convencional.

2.3 Os Atores Sociais e os Processos de Articulação

As dinâmicas territoriais podem ser compreendidas como resultado das interações entre componentes econômicos, sociais, ambientais e espaciais de um território, refletindo-se então como características próprias dos territórios (LEVY & LUSSAUT citado por BONNAL, CAZELLA & MALUF, 2009). Abramovay (2006), sintetiza tal reflexão e coloca a idéia de território comumente ligada às ações ali desenvolvidas, onde estes estariam sendo determinados pelos seus mecanismos de interação social. Para o autor, para se compreender dado território é necessário se analisar as instituições ao redor das quais se organiza a interação social localizada.

Abramovay (2006), argumenta ainda que a estrutura das relações locais não são forças condicionantes do desenvolvimento desse dado território; muito mais que isso, o autor diferencia o papel dos atores ao afirmar que os mesmos não são meros reprodutores das estruturas em que estão inseridos, e sim que estes tem a capacidade de alterar a correlação de forças dentro de um determinado campo, impondo um novo modelo de relacionamento com base em sua cooperação. É preciso então “não apenas compreender a maneira como os atores se inserem em determinada realidade, mas também como adquirem o poder de alterar as relações de forças aonde os seus papéis são desempenhados” (ABRAMOVAY, 2006, p.62).

Neste sentido, Pecquer (2006), estrutura o território de tal maneira que o mesmo deixa de ser apenas um espaço pré-delimitado pelos projetos e pelas dinâmicas de desenvolvimento regidas pelas autoridades locais para se consagrar como conseqüência de um processo de articulação, construção e de delimitação efetuado pelos atores que são reagrupados conforme a exigência de resolução de seus problemas produtivos. O autor ressalta que os diferentes grupos de atores podem ter motivos distintos para se reagruparem, tendo em vista a obtenção de determinado benefício que cada membro será contemplado.

Corroborando com este pensamento, Delgado, Bonnal e Leite (2007) contrastam que, juntamente com os atores cuja visibilidade é indiscutível, coexistem outros que precisam ser identificados, uma vez que podem ser estratégicos em diversas dimensões - apoio financeiro ou material, fornecimento de uma linguagem “adequada”, por meio da qual se exprimem

 

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necessidades locais e se produz articulação de redes de apoio que tiram situações de sua particularidade etc.

Neste sentido, a forte influência da participação dos atores fortalece o sistema de gestão dos recursos naturais no longo prazo e sua proximidade com o "território”, no curto prazo, torna sua participação fundamental, tendo em vista seu conhecimento que muito contribui para a melhoria dos processos de tomada decisão no campo do planejamento e da gestão. Putnam (2000), aponta o uso do capital social como mecanismo aglutinador de ações públicas, mecanismo esse capaz de estruturar os programas de desenvolvimento territorial. Paro o autor, o capital social é definido por características da organização social (tais como os sistemas, as normas e a confiança) que facilitam as ações coordenadas, contribuindo também para o aumento da eficiência da sociedade. Putnam (2000) reforça ainda que, o capital social colabora para a cooperação espontânea, aumentando não somente a confiança entre os envolvidos, mas também os proveitos mútuos de que ambos poderão se beneficiar. Afinal, quanto mais se confia, mais se tem confiança. A partir do momento que relações recíprocas de confiança são estabelecidas, abre-se a possibilidade de estabelecimento de dinâmicas territoriais de desenvolvimento realmente eficazes. Quando os atores (governamentais ou não) ganham a possibilidade de confiar uns nos outros, e na medida em que o uso dessa confiança é incrementado e acaba se demonstrando resultados efetivos e benéficos para todos os envolvidos, o capital social desses atores que se correlacionam torna-se ferramenta audaz para o desenvolvimento sustentável daquele território em questão.

O mesmo autor atribui o sucesso dos distritos industriais italianos, historicamente reconhecidos por seu capital social, ao uso dessa confiança mútua, assim como pela cooperação de seus participantes e do forte senso de dever cívico ali presente. Acredita que quanto maior for o nível de confiança de uma dada sociedade, tanto maior a possibilidade de existir cooperação, gerando assim um incremento na própria confiança geral; e ainda, o capital social tende a ser algo cumulativo e a reforçar-se mutuamente, gerando assim círculos virtuosos de cooperação, confiança, reciprocidade, civismo e de bem-estar coletivo.

O capital social pode ser fundamental na construção de estratégias coletivas, ou ainda, as estratégias coletivas podem representar normas e valores - capital social - de um determinado conjunto de organizações distintas, que acabam por embutir algum nível de uniformidade em suas ações. Astley and Fombrun (1983), definem as estratégias coletivas como uma forma específica de organização adotada em distintas unidades individuais, de modo que se transformem em uma coletividade com algum grau de unicidade entre si. Os autores acreditam que essas estratégias coletivas nada mais são do que respostas sistêmicas de um conjunto de organizações que colaboram entre si procurando absorver a variação apresentada pelo ambiente inter-organizacional em que estão inseridas.

Estratégias coletivas funcionam não simplesmente porque somam conhecimentos locais, mas também porque constroem capital social dentro das dinâmicas territoriais e das interações organizacionais de determinado território. As estratégias coletivas procuram transformam conjuntos em coletivos, e ainda que de diferentes maneiras, esses coletivos podem permitir que as organizações inseridas consigam superar de maneira ainda mais efetiva os obstáculos insurgentes, construindo assim modelos locais de desenvolvimento, contemplando não só a força de seus territórios e de seus capitais sociais, mas também as oportunidades não anteriormente percebidas individualmente. 3. ORIENTAÇÕES METODOLÓGICAS

Com o intuito de compreender e analisar criticamente o papel da ASSHORTI sob as

dinâmicas de desenvolvimento territorial sustentável e como ela pode contribuir para o

 

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desenvolvimento sob a perspectiva ambiental e territorial, o presente artigo apresenta conceitos e características acerca do desenvolvimento sustentável e da participação dos atores sociais e seus processos de articulação para o desenvolvimento territorial.

A revisão da literatura surgiu da importância que o DTS tem na sustentabilidade do sistema social e do planeta. O critério de escolha por estudar o papel da ASSHORTI sob as dinâmicas de DTS e como ela pode contribuir para o desenvolvimento sustentável se deu pela importância do papel desempenhado por este tipo de organização como exemplo e formação de uma sociedade mais justa econômica, social e ambientalmente. A coleta de dados foi realizada em duas etapas. A primeira etapa consistiu na análise da literatura sobre território e desenvolvimento, DTS, atores sociais e seus processos de articulação, buscando conhecer os estudos existentes sobre o tema. Na segunda etapa, foram coletados os dados a partir de entrevistas com os gestores e colaboradores envolvidos no Projeto Cinturão Verde e o Presidente da Associação, e observação de campo. A partir destes dados, foram realizadas as análises da literatura e dos dados e evidencias das considerações acerca das limitações e potencialidade de desenvolvimento sustentável sob as dinâmicas de DTS da ASSHORTI. Cabe ressaltar que por se tratar de um determinado caso, a impossibilidade de generalização dos resultados para outras organizações torna-se limitada.

Quanto aos fins, a pesquisa tem natureza exploratória e descritiva. Exploratória porque segundo Gil (1994), é desenvolvida com o objetivo de proporcionar visão geral, de tipo aproximativo, acerca de determinado fato. O estudo é também descritivo, pois tem como “objetivo primordial a descrição das (...) relações entre variáveis (GIL, 1994, p.45)”.

Quanto aos meios, trata-se de uma pesquisa bibliográfica, que segundo Jung (2004, p.160), objetiva “conhecer as diversas formas de contribuições científicas existentes que foram realizadas sobre determinado assunto ou fenômeno”.

Os dados foram tratados qualitativamente. O caráter qualitativo é visto nesta pesquisa porque ela é fundamentalmente interpretativa, ou seja, analisa dados para identificar um determinado tema, permitindo fazer uma interpretação e chegar a conclusões sobre seu significado oferecendo mais perguntas a serem feitas. “O pesquisador tem a função de filtrar os dados através de uma lente pessoal (CRESWELL, 2007)”. 4. DESCRIÇÃO E ANÁLISE DO CAMPO DE PESQUISA Para fins de análise, este espaço apresenta o Projeto Cinturão Verde, vinculado ao Programa Aeroportos Solidários, desenvolvido pela INFRAERO e o caso da ASSHORTI.  

4.1 A INFRAERO e o Projeto Cinturão Verde Localizado na cidade de Imperatriz no Maranhão, o Projeto Cinturão Verde surge como um programa que contempla as reais necessidades dos agricultores familiares da região, inserindo-os em um ambiente socialmente mais igualitário, com acesso às questões referentes à cidadania e educação.

Segundo relatórios e pesquisas do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Maranhão [SEBRAE/MA] (2008), a partir da década de 80, houve uma forte migração de famílias da zona rural para a periferia da cidade de Imperatriz em busca de novas oportunidades, visto que as terras estavam sendo cultivadas com pastagens, já com uma boa parte sendo mecanizada, o que tirava a oportunidade de trabalho e ocupação da mão-de-obra das localidades rurais remanescentes.

Segundo Freitas (1999), a falta de sustentabilidade da maioria dos sistemas de cultivo no Maranhão não deve ser atribuída excepcionalmente a uma suposta ineficiência tecnológica e econômica do processo produtivo agrícola, mas, também (e, talvez, principalmente), à

 

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concentração de terras nas mãos de uma minoria de latifundiários, que acabam por aumentar a restrição ao acesso às terras.

Associado a isto, o crescimento da cidade e o desenvolvimento das atividades de comércio e serviços, o setor agrícola passou a ser restrito aos fundos de quintais. Segundo Duarte (2008), a chamada agricultura de subsistência, com destaque para a horticultura. Existia um substancial distanciamento entre os produtores e nenhuma organização formal.

É justamente nesse espaço que surge a necessidade de programas que contemplem as reais necessidades dos agricultores ali fixados, e é nesse contexto agrário que surge o Programa Aeroportos Solidários, desenvolvido pela INFRAERO, propondo melhorias para aqueles agricultores moradores do entorno do aeroporto de Imperatriz no Maranhão. O Projeto Cinturão Verde tem como objetivo principal proporcionar melhorias na produtividade, comercialização e organização dos pequenos produtores de hortaliças e o desenvolvimento da cidade de Imperatriz.

Cinturão verde é uma faixa de terra ao redor das cidades destinada ao cultivo de produtos hortifrutigranjeiros, ou seja, uma área destinada para a produção dentro das cidades, cabendo à administração municipal designar o local mais apropriado para esta área verde. São áreas destinadas exclusivamente a esse tipo de cultura e é proibido construções de edifícios. Formam-se pelo conjunto de produtores, quase sempre pequenos e, vale ressaltar, que estes movimentos não se caracterizam como cooperativas.

Bento e Oliveira (2001, p.1) definem o Projeto Cinturão Verde como um programa de incentivo a agricultura familiar, tendo como foco a oferta de uma maior qualidade nas hortaliças folhosas orgânicas aos consumidores, eliminando o uso de produtos químicos e fornecendo alimentos saudáveis, ajudando também na melhor ocupação da terra e na geração de renda para os agricultores familiares.

Especificamente no caso da cidade de Imperatriz, no Maranhão, o projeto Cinturão Verde consiste na divisão da área ociosa do sítio aeroportuário em 45 lotes de 10 a 20 mil metros quadrados, conforme Figura 1, que são ocupados por famílias para o desenvolvimento da agricultura e a produção, totalmente orgânica, é vendida individualmente ou conjuntamente por intermédio da associação de produtores (INFRAERO, 2005).

Figura 1. Planta baixa da área do Projeto Cinturão Verde Fonte: DUARTE, R. B. A. (2008). História de Sucesso: agronegócios: horticultura / coordenadora nacional de projetos Casos de Sucesso. Brasília: SEBRAE.

A INFRAERO é uma empresa pública de direito privado com patrimônio próprio, autonomia administrativa e financeira. Possui uma área de aproximadamente 3.000.000 metros quadrados na área urbana da cidade de Imperatriz. Por meio do Programa Aeroportos Solidários, que objetiva o desenvolvimento sustentável das comunidades do entorno dos aeroportos, foi realizado um levantamento das necessidades da comunidade local e identificou-se a prática do trabalho agrícola envolvendo pequenos agricultores, que segundo Duarte (2008), eram moradores de bairros carentes, em uma área localizada no entorno do

 

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aeroporto. A partir de então, em 2001, iniciaram-se estudos para verificar o que poderia ser feito para melhorar a produtividade, a comercialização e, conseqüentemente, a qualidade de vida daqueles pequenos agricultores e de suas famílias. Assim, nasce o Projeto Cinturão Verde, com o apóio do SEBRAE/MA e da Prefeitura de Imperatriz.

Como conseqüência das pesquisas e estudos realizados, percebeu-se que os produtores familiares e aquela comunidade careciam de apoio logístico e técnico, incremento e fomento agrícola, e ainda, segundo os estudos realizados pelo SEBRAE e INFRAERO (2008), na ocasião, observou-se que a maioria dos produtores possuía filhos com idade escolar. Portanto, definiam-se ali as ações básicas do Projeto Cinturão Verde, uma que atenderia diretamente os produtores, com cursos, aulas práticas e palestras voltadas para questões produtivas da própria agricultura, e outra que atenderia às famílias dos produtores e a comunidade do entorno do aeroporto, com cursos básicos de informática, noções de inglês e de cidadania.

O Cinturão Verde é um exemplo de que a atividade social é uma via de mão dupla. Ao garantir a geração de renda para os agricultores, a INFRAERO acabou com um problema de segurança no Aeroporto de Imperatriz. Com uma vasta área desocupada, a empresa era freqüentemente surpreendida com arrombamentos da cerca que delimitava o sítio aeroportuário, ocorrências que acabaram a partir da ocupação do terreno pelas famílias. “Os agricultores morando no entorno nos ajudam a fiscalizar a área. E, com isso, alcançamos dois objetivos: a ação social e a segurança do aeroporto” declara Maurício Campos de Oliveira, gerente do Aeroporto de Imperatriz (INFRAERO, 2005).

Com o desenvolvimento do projeto e a motivação de outros novos parceiros, os pequenos agricultores criaram a Associação dos Horticultores da Área da Infraero de Imperatriz (ASSHORTI), que segundo Duarte (2008), a partir de então foi possível a distribuição das áreas para a produção, sob regime de comodato. Esta era a condição fundamental para a permanência dos produtores no projeto.

A partir deste cenário, segundo relatórios da INFRAERO, os agricultores começaram a perceber que certos objetivos só poderiam ser alcançados por meio da ação coordenada de grupos de pessoas, e que individualmente não teriam condições de receber o apoio que estão recebendo. Então, em 2004 foi implantado Centro de Difusão Tecnológica [CDT], com o objetivo de dar apoio às atividades do projeto e com esta aquisição, novas ações de inclusão social foram incorporadas ao projeto, como alfabetização de adultos, inclusão digital e atendimento odontológico.

Atualmente, o CDT é composto por salas de aula, sala de reuniões, sala de informática, consultório odontológico e médico e, laboratório químico, onde são realizadas análises de solo, água, pesquisas de novas tecnologias de plantio e melhoramento genético de frutas, verduras e hortaliças, além de desenvolver medicamentos fitoterápicos. Conta ainda com uma central de beneficiamento da produção, onde é realizada a higienização e embalagem das verduras e hortaliças comercializadas, além de uma sala onde está instalada a sede da ASSHORTI.

O Projeto conta com o apoio de uma rede de parceiros que auxiliam desde a doação de materiais e instrumentos de trabalho à auxílio a crédito financeiro, conforme Figura 2. Segundo Abramovay (2006), para se compreender dado território é necessário se analisar as instituições ao redor das quais se organiza a interação social localizada. Com isso, buscou sintetizar os atores do Projeto Cinturão Verde e suas iniciativas e ações em prol do desenvolvimento dos pequenos horticultores, um projeto que surgiu da intenção de viabilizar a agricultura familiar de forma criativa e rentável.

 

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Figura 2. Atores do Projeto Cinturão Verde Fonte: Própria dos autores.

A INFRAERO de Imperatriz apóia a infra-estrutura necessária ao desenvolvimento de

práticas tecnológicas, além do trabalho nos estornos das atividades como de alfabetização para jovens e adultos, dentista e clinico geral. Já o SEBRAE/MA apóia a realização de ações gerenciais e tecnológicas para a melhoria da produção e da cooperação. Trabalha pelo desenvolvimento sustentável contribuindo para a geração de emprego e renda.

As Instituições de Ensino e Pesquisa apóiam a inserção de tecnologia e pesquisa de solo, de pragas e doenças visando minimizar prejuízos e uso de agrotóxicos no cultivo das hortaliças, viabilizam o atendimento odontológico, principalmente para os agricultores, seus filhos e moradores do entorno do aeroporto, com as ações a serem operacionalizadas pelos membros do Curso de Odontologia. Apóiam ações voltadas para a melhoria da gestão de negócios, além das ações sociais através de cursos de alfabetização e de computação.

A Prefeitura Municipal através da Secretaria da Agricultura, o CDL, CAF, CETCMA, Embrapa, apóiam a realização de ações de inserção de tecnologia e diversificação de culturas, assistência técnica e oferecem suporte a infra-estrutura necessária à produção, seu escoamento e sua comercialização.

Os Bancos Comerciais apóiam e facilitam o acesso ao crédito e as Empresas Privadas atuam de forma bastante ativa na doação de insumos e materiais de trabalho. Os principais Clientes da produção de hortaliças são os supermercados da região, as escolas, creches e consumidores finais.

Com importante papel de articulação e mediador entre os produtores e os demais atores do Projeto, aparece a Asshorti, que tem por objetivo melhorar a cooperação, a produção e a comercialização da produção, utilizando tecnologia, práticas orgânicas e ferramentas de gestão, disseminadas pelas instituições parceiras.  Pode-se verificar que a construção e o desenvolvimento do Projeto Cinturão Verde só foi possível através da mobilização de diversos atores. E como critério de análise do campo desta pesquisa foi analisado o papel da ASSHORTI sob as dinâmicas de DTS e como ela pode contribuir para o desenvolvimento sustentável.

 

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4.2 O Caso ASSHORTI

A Associação dos Horticultores da Área da Infraero de Imperatriz (ASSHORTI), segundo dados disponibilizados para a elaboração de um projeto junto a órgãos financiadores, é uma entidade civil de direito privado, sem fins lucrativos, com atuação na área do Projeto Cinturão Verde da INFRAERO de Imperatriz, no Estado do Maranhão. Fundada por agricultores familiares, em 16 de Junho de 2002, a ASSHORTI visa, através da cooperação, organizar a produção da horticultura advinda da área pertencente ao Projeto, obtendo ganhos de mercados, maior poder de barganha nas negociações e melhores preços, a fim de beneficiar os produtores, possibilitando uma melhor qualidade de vida e um negócio cada vez mais sustentável.

Segundo Duarte (2008), com o grupo de produtores instituído e organizado, foram iniciadas as ações de orientação e capacitação voltadas à produtividade, tais como técnicas em composto, adubação e controle de pragas. A partir de 2004, várias mudanças ocorreram e o desenvolvimento de uma nova cultura surgiu com o início da prática da agricultura orgânica em substituição à agricultura convencional antes praticada com a utilização de agrotóxicos, insumos químicos e fertilizantes.

A Associação assume o papel de coordenar as ações de proteção ao meio ambiente a partir da articulação com outras organizações. Além de uma questão de proteção do solo e da água, a produção orgânica pode ser vista também sob a ótica da sustentabilidade, alimentos orgânicos têm ocupado posição de destaque no consumo, principalmente por aquela fatia de consumidores conscientes com as questões ambientais. Incorporando o sentido de um sistema orgânico de produção, assuntos como noções de implantação de horta, compostagem, minhocultura, custos, controle alternativo de pragas e doenças, adubação verde, produção de mudas, plasticultura, beneficiamento e comercialização foram abordados e, “a cada atividade desenvolvida, era perceptível a melhoria da auto-estima dos produtores. A todo instante era reforçado o papel deles como empresários de uma empresa-horta, cujo crescimento e desenvolvimento dependiam de todos os cuidados de irrigação e adubação para fortalecer mais o seu negócio a fim de se firmar no mercado local” (DUARTE, 2008, p.12).

Através da investigação de campo, percebeu-se que ainda é muito incipiente as ações da Associação e a participação dos produtores ainda não é algo aceito por todos que pertencem ao Projeto, por entenderem que a Associação exerce um papel de articuladora entre as partes interessadas, por exemplo, entre os produtores e os clientes ou consumidores. Segundo entrevista junto ao Presidente da Associação, não são todos os produtores que participam da Associação, por diversos motivos, destacando-se o fato de alguns produtores acreditarem que é mais lucrativo manter sua produção e comercialização individualmente, uma vez que, sendo um associado, toda negociação e comercialização é de responsabilidade da mesma. Ainda existem os casos dos produtores que são associados e comercializam parte da sua produção fora da gestão da ASSHORTI.

Os produtores associados recebem apoio no desenvolvimento da horticultura, com capacitação e treinamentos promovidos em parceira com o SEBRAE e Universidades, além de participarem de eventos, encontros e feiras que apóiam e sustentam a prática da agricultura orgânica. Usufruem ainda de adubo, sementes e mudas, máquinas e equipamentos pertencentes á Associação, incluindo meio de transporte que auxilia na distribuição dos produtos comercializados. Além disso, são representados na negociação dos produtos, devidamente higienizados, classificados e embalados, durante todo o ano. Outros benefícios evidentes estão relacionados à maneira como os produtores se relacionam internamente, interagindo e trocando experiências, conhecimentos, possibilitando uma melhoria na produção e no processo e fortalecendo assim a geração de renda e de trabalho.

 

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Ganhos como a criação de uma identidade visual para a Associação, resultado de um projeto em parceria com o SEBRAE/MA, o projeto Via Design. Assim a ASSHORTI passou a divulgar e fortalecer sua marca com as embalagens de seus produtos, fortalecendo sua imagem perante a comunidade.

Além disso, segundo Duarte (2008), à medida que o projeto se desenvolvia, mais parceiros se integravam às ações. Ainda em 2004, no Seminário de Horticultura, promovido pelo Consórcio Intermunicipal de Produção da Região Tocantina [Cinpart], Prefeitura de Imperatriz, INFRAERO, Banco do Nordeste e SEBRAE/MA, foi apresentado pelo superintendente da Companhia Nacional de Abastecimento [Conab] de São Luís, o Programa de Alimentação Alternativa, um convênio entre o governo municipal e o governo federal para o fornecimento de alimentos à escolas e hospitais da região, significando para a ASSHORTI uma oportunidade de alavancar a comercialização dos seus produtos e a geração de renda.

E, com todos os esforços direcionados no sustento e desenvolvimento desta “empresa-horta”, outras oportunidades de ganho de mercado foram surgindo e sendo muito bem aproveitadas pelos produtores e associados, como a participação no Programa Compra Local, que segundo Duarte (2008), trata-se de uma iniciativa do governo federal, coordenado pela Conab em parceria com a prefeitura, que busca comprar alimentos dos produtores locais para o abastecimento de instituições públicas, como creches, hospitais e escolas.

Juntando-se a estes fatos, surge também, por meio da Associação, uma negociação com uma grande rede de supermercados da região, gerando uma grande demanda a ser atendida pelos produtores do Cinturão Verde. Neste momento, torna mais evidente algumas deficiências produtivas, administrativas e comerciais, pois tudo que era produzido não era mais suficiente para atender toda a demanda, mesmo sabendo que há terra ociosa disponível.

Silva et al. (2008), apontam que apesar das facilidades de acesso e dos cursos ministrados no local com freqüência pelos colaboradores e entidade parceiras, 70% dos horticultores têm ensino fundamental e 20% são analfabetos, sendo constatado que a baixa escolaridade reflete diretamente na aplicação das técnicas de cultivo. A pesquisa apontou ainda que apenas 33% dos jovens contribuem no manejo das hortas, isto reflete diretamente no custo da produção, pois quanto menor a mão de obra familiar, menor a área explorada e conseqüentemente menor a renda decorrente dessa produção.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS  

A partir dos dados levantados e o acompanhamento da ASSHORTI, percebeu-se que o território possui um grande potencial econômico baseado na agricultura e que boa parte dos esforços voltados para uma tentativa de desenvolvimento neste território estão relacionadas à composições das famílias, aos valores e costumes, que baseia-se em muito no potencial de capital social daquela região. Além disso, a diversidade de explorações que são consolidadas através da agricultura familiar nos permite afirmar que seria este o espaço ideal para uma agricultura sustentável, que procura não só alavancar o desenvolvimento econômico de seus participantes, mas também uma maior prudência ecológica no uso e manejo do solo e uma maior equidade social, por trazer à tona um contingente de alternativas viáveis à construção dos indivíduos. Pode-se verificar que a construção e o desenvolvimento do Projeto Cinturão Verde só foi possível através da mobilização de atores nos mais variados campos de atuação, tratando especialmente do caso da ASSHORTI, esta parece cumprir com parte do seu papel de articuladora e protagonista de um desenvolvimento territorial sustentável, estabelecendo condições mais favoráveis para a produção e distribuição da produção e fomentadora de uma melhor qualidade de vida para os produtores além de, fortalecer a confiança do grupo e melhorar sua estima.

 

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Entretanto, apesar do significativo papel desempenhado pela Associação, ela não consegue centralizar a produção e comercialização de todos os produtores do Projeto Cinturão Verde, pelo fato dos produtores acreditarem ser mais lucrativo manter sua produção e comercialização de maneira individual, uma vez que, sendo um associado, toda a negociação e comercialização são de responsabilidade da Associação e os lucros são compartilhados. Putnam (2000), aponta o uso do capital social como mecanismo aglutinador para a cooperação espontânea, aumentando não somente a confiança entre os envolvidos, mas também os proveitos mútuos de que ambos poderão se beneficiar. A partir do momento que relações recíprocas de confiança são estabelecidas, abre-se a possibilidade de estabelecimento de dinâmicas territoriais de desenvolvimento realmente eficazes. A falta de confiança existente entre os produtores não associados acaba por enfraquecer o poder de mudança social incubado dentro da Associação. Se todos confiassem uns nos outros e, essa confiança fosse aumentando gradativamente, se tornariam atores mais ativos e parceiros na construção de estratégias coletivas, a ser potencialmente utilizadas na construção de um desenvolvimento territorial sustentável.

A Associação assume ainda o papel de coordenar as ações de proteção ao meio ambiente a partir da articulação com outras organizações. Entretanto, a Associação não tem alcance a todos os atores e, este papel poderia ser assumido por outros atores que fazem parte do Projeto. As instituições de ensino e pesquisa parceiras e a prefeitura poderiam agir de forma mais participativa no processo de conscientização da sociedade local, no sentido de promover a mudança e a cultura “verde”. É evidente que a falta de clareza a respeitos dos conceitos de desenvolvimento, sustentabilidade e meio ambiente, dificultam a criação de procedimentos e políticas mais sólidas enquanto planejamento e gestão, como exemplo a baixa escolaridade dos produtores, representado diretamente na aplicação tanto das técnicas de cultivo quanto na incorporação dos sentidos que envolvem o desenvolvimento sustentável.

Em outras palavras, é necessária a aproximação dos gestores dos recursos naturais com os “interessados” na questão, repensando assim as propostas de desenvolvimento territorial sustentável que visem estimular a capacidade da agricultura familiar em preservar esses recursos. “O desenvolvimento para ser sustentável tem que considerar os limites de seus recursos naturais, assim como os agricultores menos favorecidos” (DO CARMO, 1998, p.235).

Acredita-se que as considerações acerca das potencialidades da ASSHORTI para o desenvolvimento territorial sustentável podem contribuir para que os produtores e parceiros possam potencializar o Projeto Cinturão Verde e a cidade de Imperatriz. Há, portanto, mecanismos evidentes de articulação entre a ASSHORTI e os demais atores envolvidos no território, com alto grau de interação para as questões sociais, econômicas e ambientais, ainda que exista participação parcial dos produtores, falta de capacitação efetiva e fragilidade nas estruturas institucionais (profissionais qualificados, infra-estrutura e recursos humanos).

Podemos concluir, portanto, que o Projeto Cinturão Verde é um modelo de desenvolvimento bem sucedido e pode servir como exemplo para outras regiões, até mesmo para futuros projetos de ocupação de terras ociosas ao redor dos aeroportos. E, a ASSHORTI, como possui forte poder de articulação entre os atores, pode em muito contribuir para a construção de estratégias coletivas que superam de maneira mais efetiva os obstáculos e desenvolvam novas formas de criar e gerir modelos locais de desenvolvimento, contemplando não só a força de seus territórios e de seus capitais sociais, mas também as oportunidades não anteriormente percebidas individualmente.

 

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