althusser x foucault

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7/23/2019 Althusser x Foucault http://slidepdf.com/reader/full/althusser-x-foucault 1/5  Althusser x Foucault Para Althusser o sujeito só participa da história sob a determinação das relações de produção e de reprodução de suas formas. A história é um processo sem sujeito: há apenas estruturas ue relacionam um sistema de representação do mundo e as condições reais de exist!ncia" asse#urando dessa forma a manutenção das condições pol$ticas" econ%micas e sociais &i#entes. 'esse sentido" Althusser retoma a definição marxista clássica de (stado" como um aparelho repressi&o ue tem por função afirmar e #arantir o controle da classe dominada e explorada pela classe he#em%nica e dominante" ue detém o poder desse (stado. )as &ai além dessa definição" propondo para além dela o conceito de aparelho ideoló#ico de (stado" ue reprodu* essas mesmas formas e condições fora do +mbito do aparelho repressi&o ,pol$cia" exército-" constituindo o campo da ideolo#ia. aparelho repressi&o do estado (sses aparelhos ideoló#icos reprodu*em a tradição das relações sociais e materiais" das forças produti&as e dos meios de produção" por meio da educação ,fam$lias e escolas-" da reli#ião ,i#rejas-" das leis ,sistema jur$dico-" da pol$tica ,sistema e partidos pol$ticos-" da informação ,imprensa e m$dias-" da cultura ,artes" esportes etc.- e dos salários ,sindicatos e empresas-. /ais or#ani*ações formam um conjunto sistemático ue se articula sobre as práticas materiais" produ*indo o mecanismo de assujeitamento ideoló#ico 0 submetendo o indi&$duo" desde o seu nascimento" a um processo e a um discurso já instalados numa estrutura de localidade espaço1temporal espec$fica. 'essa estrutura" ele deixa de ser ori#em de si próprio para tornar1se um modo de comportamento determinado" moldado e fixado de acordo com ue se espera dele enuanto componente de uma certa classe" numa certa disposição de classes ue se relacionam entre si. A partir da inculcação da tradição &i#orante nauela estrutura 0 feita pelos aparelhos ideoló#icos 0" o indi&$duo antecipadamente absor&e o discurso e passa a repeti1lo"

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7/23/2019 Althusser x Foucault

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 Althusser x Foucault

Para Althusser o sujeito só participa da história sob a determinação das

relações de produção e de reprodução de suas formas. A história é um

processo sem sujeito: há apenas estruturas ue relacionam um sistema de

representação do mundo e as condições reais de exist!ncia" asse#urando

dessa forma a manutenção das condições pol$ticas" econ%micas e sociais

&i#entes. 'esse sentido" Althusser retoma a definição marxista clássica de

(stado" como um aparelho repressi&o ue tem por função afirmar e #arantir

o controle da classe dominada e explorada pela classe he#em%nica e

dominante" ue detém o poder desse (stado. )as &ai além dessa definição"

propondo para além dela o conceito de aparelho ideoló#ico de (stado" ue

reprodu* essas mesmas formas e condições fora do +mbito do aparelho

repressi&o ,pol$cia" exército-" constituindo o campo da ideolo#ia.

aparelho repressi&o do estado (sses aparelhos ideoló#icos

reprodu*em a tradição das relações sociais e materiais" das forças

produti&as e dos meios de produção" por meio da educação ,fam$lias e

escolas-" da reli#ião ,i#rejas-" das leis ,sistema jur$dico-" da pol$tica ,sistema

e partidos pol$ticos-" da informação ,imprensa e m$dias-" da cultura ,artes"

esportes etc.- e dos salários ,sindicatos e empresas-. /ais or#ani*ações

formam um conjunto sistemático ue se articula sobre as práticas materiais"

produ*indo o mecanismo de assujeitamento ideoló#ico 0 submetendo o

indi&$duo" desde o seu nascimento" a um processo e a um discurso jáinstalados numa estrutura de localidade espaço1temporal espec$fica. 'essa

estrutura" ele deixa de ser ori#em de si próprio para tornar1se um modo de

comportamento determinado" moldado e fixado de acordo com ue se

espera dele enuanto componente de uma certa classe" numa certa

disposição de classes ue se relacionam entre si. A partir da inculcação da

tradição &i#orante nauela estrutura 0 feita pelos aparelhos ideoló#icos 0" oindi&$duo antecipadamente absor&e o discurso e passa a repeti1lo"

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assujeitando1se e reprodu*indo as condições de sua formação e da sua

relação com o resto da sociedade. indi&$duo aceita a interpelação

ideoló#ica e é transformado em sujeito.

s assujeitados comportam1se de acordo com os si#nos ue lhes são

en&iados pelas normas e re#ras da 2consci!ncia c$&ica3 con&eniente 4

ideolo#ia dominante. 5om isso tornam1se auxiliares inconscientes do

processo de exploração 0 a#entes profissionais da ideolo#ia 0

autopoliciando1se e policiando os seus próximos" seriali*ando padrões de

bele*a" de credo" de con&icções e de conduta" entre outros. Assim ocorre

desde a criação do conceito de (stado" ue fixou1se como o centro do poder"

disputado por todas as classes e cujo comando passou alternadamente da

i#reja 4 aristocracia feudal e finalmente 4 bur#uesia capitalista" mas sempre

utili*ando os mesmos procedimentos de coerção ,aparelhos repressi&os- e

manutenção e reprodução das relações de produção ,aparelhos ideoló#icos-.

'a análise de Foucault" auilo ue em Althusser era o poder central

disputado pelas classes 0 o (stado 0 é substitu$do por uma rede assimétrica

de 2relações3 de poderes. poder e seus procedimentos de controle deixam

de ser macrof$sicos para tornar1se microf$sicos" permeando toda a estrutura

social e #arantindo auelas mesmas relações de dominação e he#emonia.

 Apesar do (stado" seu poder e seus aparelhos permanecerem en&ol&idos na

rede" eles perdem sua posição de objeto principal de estudo para dar lu#ar

ao estudo do sujeito" do modo como o ser humano torna1se sujeito e dasrelações de poder entre os di&ersos sujeitos. Foucault des&ia o foco da

análise das formas como determinadas instituições do poder a#em sobre os

indi&$duos" e passa a in&esti#ar as formas de resist!ncia não a essas

instituições" mas 4 técnica de exerc$cio do poder em si. /écnica ue impõe

ao indi&$duo uma subjeti&idade ue ele de&e reconhecer e 4 ual de&e

submeter1se" passando a atuar como ser&içal do poder. ( técnica ue é ummodo de ação de uns sobre outros.

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'ão há" portanto" para Foucault" um poder central e #lobal" mas apenas

o poder 2em ato3" exercido imediata e diretamente não nos indi&$duos" mas

nas microrrelações entre eles" onde há um sujeito no ual a ação se exerce e

um campo de possibilidades no ual ela se inscre&e. 6essa forma" o

exerc$cio do poder passa a ser um modo de ação locali*ada de uns sobre

outros" onde estes t!m sua conduta #uiada por aueles" onde o campo de

atuação destes é #o&ernada e controlada por aueles. Porém essa relação

 jamais é fixa e imutá&el" mas m7ltipla" adaptati&a e in&oluntária. 'ão se trata

mais da luta constante entre uma determinada classe dominante e uma

classe dominada" mas uma rede dissimétrica e dispersa" na ual todos estão

destinados a a#ir sobre as possibilidades de ação" reação e conduta de

todos. 'ão há uma classe coa#ida e outra repressora" não há um confronto"

uma oposição entre poder e liberdade" a liberdade é a própria condição de

possibilidade deste #o&erno dos homens sobre os homens. As relações de

poder se dão justamente na possibilidade ue o homem tem de se deslocar e

escapar delas" no exerc$cio de sua liberdade plena. 8 nesse a#onismo

constante de luta" pro&ocação e incitação ue se insere a prática da

liberdade mesma dos indi&$duos. 2#o&erno3 é a reali*ação técnica desse

exerc$cio da liberdade" a maneira de estruturar o campo de ati&idade

poss$&el do outro" um modo estraté#ico de ação sobre ação" a partir das

diferenças jur$dicas ou tradicionais" de estatuto ou pri&ilé#io" econ%mica"

lin#9$stica ou cultural dos objeti&os perse#uidos dos mecanismos e

sistemas utili*ados dos re#ulamentos e aparelhos dispon$&eis e dos ajustesdas estruturas e procedimentos &i#entes.

;ma liberdade exacerbada ori#ina a própria falta de liberdade" pois

torna poss$&el para al#uns a#ir sobre a ação dos outros. ( a tarefa pol$tica

essencial para a exist!ncia social é justamente a análise" a retomada e a

elaboração dessa uestão das relações de poder" pois não existe sociedade

sem tais relações 0 elas estão enrai*adas na malha social" superpondo1seentre si" entrecru*ando1se e anulando1se. homem está sempre 4 espera

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de ue o outro se submeta aos seus interesses" sempre procura proteção

sob as asas de um poder no ual alcance al#uns peuenos pra*eres" uma

maior capacidade de #o&erno" status social e lo#o maior raio de ação sobre

os outros" ainda ue para tal precise obedecer e ser &$tima consciente da

ação alheia sobre ele mesmo. Assim a rede de relações de poder &ai se

formando" cada &e* maior e com menores possibilidades de resist!ncia" pois

não há um 2al&o3 fixo. /odos os n$&eis sociais 0 institucionais e indi&iduais 0

continuam reprodu*indo as formas de assujeitamento e submissão" e

também continuam reprodu*indo as formas de dominação étnica" social e

reli#iosa" inerentes 4s sociedades feudais e as formas de exploração

econ%mica sur#idas a partir do ad&ento do capitalismo.

'o documentário brasileiro 2(stamira3" a mulher cujo nome dá t$tulo ao

filme di* ue as pessoas &ão 4 escola para 2copiar3" para aprender a serem

cidadãos obedientes e resi#nados em casa" na empresa e na sociedade. (m

outro filme" chamado 2A /roca3 ,t$tulo brasileiro tirado do ori#inal 2/he

5han#elin#3-" conta um caso real ocorrido no final da década de <=>?" no

ual uma mãe tem o filho se9estrado e posteriormente encontrado e

de&ol&ido pela pol$cia local. 'ada de absurdo" não fosse o fato da suposta

criança res#atada por um oficial não ser a mesma criança ue foi

se9estrada. A mãe tenta de todas as maneiras pro&ar ue auele menino

não é seu filho" mas a pol$cia" a imprensa e a sociedade como um todo

passam a atribuir 4 mãe o papel de louca e má" por rene#ar o próprio filho.

 Apenas uma ex1professora do menino e um ad&o#ado lhe dão crédito epassam a in&esti#ar o caso. A mãe acaba internada num manic%mio e sendo

&$tima de uma transfer!ncia de culpa onde toda a malha social se &!

en&ol&ida" em peuenas relações a#on$sticas de poder entre os indi&$duos

en&ol&idos ,a mãe" o oficial" a criança" o diretor do manic%mio" o ad&o#ado" o

 jornalista" a professora etc.-. 6uas obras cinemato#ráficas ue denotam bem

o a#onismo das relações de poder e a intransi#!ncia entre o assujeitamentoe as formas de resist!ncia" assim como o preço a ser pa#o por ambos.

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(ssas resist!ncias atualmente não estão restritas a um local ou a uma

forma particular e restrita de #o&erno" nem buscam uma solução 7nica e

final: são trans&ersais" imediatas e #iram em torno da uestão de uem

somos enuanto indi&$duos 0 não abstrata" cient$fica ou administrati&amente"

como meras reproduções de um sistema pré1moldado 0 mas o ue o homem

é em si e para si mesmo" li&re das formas de assujeitamento 4s uais é

submetido desde o nascimento.