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PANORAMA TECNOLÓGICO Agenda Tecnológica Setorial – A T S Complexo Industrial da Saúde M EDICINA R EGENERATIVA Centro de Gestão e Estudos Estratégicos Ciência, Tecnologia e Inovação

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PANORAMA TECNOLÓGICO

Agenda Tecnológica Setorial – ATSComplexo Industrial da Saúde

M E D I C I N A R E G E N E R A T I V A

Centro de Gestão e Estudos EstratégicosCiência, Tecnologia e Inovação

Este texto integra um conjunto de documentos que compõem o projeto Agenda Tecnológica Setorial (ATS),

que inclui:

Panorama Econômico SetorialPanorama Tecnológico Setorial

Relatório Descritivo da Consulta EstruturadaRelatório Analítico da Consulta Estruturada

O material completo está disponível no site da ABDI: www. abdi.com.br

©2016 – Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial – ABDI

Qualquer parte desta obra pode ser reproduzida, desde que citada a fonte.

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REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASILMichel TemerPresidente Interino

MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, DA INDÚSTRIA, COMÉRCIO EXTERIOR E SERVIÇOS Marcos PereiraMinistro

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃOGilberto KassabMinistro

©2016 – Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial – ABDI

Qualquer parte desta obra pode ser reproduzida, desde que citada a fonte.

ABDIAgência Brasileira de Desenvolvimento IndustrialSCN Quadra 1, Bloco D, Ed. Vega Luxury Design Offices, Torre Empresarial A Asa Norte, Brasília – DF CEP 70.711-040 – Tel.: (61) 3962 8700www.abdi.com.br

CGEECentro de Gestão e Estudos EstratégicosSCS Quadra 9, Torre C, 4º andarEd. Parque Cidade CorporateCEP: 70.308-200+55 61 3424-9600

SUPERVISÃOMaria Luisa Campos Machado Leal

SUPERVISÃOMarcio de Miranda Santos

EQUIPE TÉCNICA DA ABDI

Carla Maria Naves FerreiraGerente de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação

Maria Sueli Soares FelipeCoordenadora de Desenvolvimento Tecnológico e Sustentabilidade

Cynthia Araújo Nascimento MattosCoordenadora de Promoção da Inovação

Zil Miranda Assessora Especial

Rodrigo Alves RodriguesAnalista Sênior

Adriana dos Santos GhizoniAssistente de Projetos

ESPECIALISTAS SETORIAIS

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EQUIPE TÉCNICA CGEE

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Lilian M. Thomé Andrade Brandão Assessora

Rogério Mendes CastilhoAssessor

Simone Rodrigues Neto AndradeAssistente Administrativo

COMITÊ TÉCNICO DE ESPECIALISTAS

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COORDENAÇÃO TÉCNICA GERAL

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COORDENAÇÃO TÉCNICA SETORIAL

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Regina Coeli Goldenberg (UFRJ)Panorama Econômico

COORDENAÇÃO DE COMUNICAÇÃO

Simone ZerbinatoCoordenadora de Comunicação Substituta

Rachel MortariEdição/Organização

Maria Irene Lima MarianoRevisão

Rodrigo Martins (Tikinet)Projeto Gráfico

Bruna Orkki (Tikinet)Diagramação

Sumário

1. Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

2. Medicina regenerativa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 92.1. Terapia celular . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 112.2. Bioengenharia de tecidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 162.3. Ensaios celulares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19

3. Terapia gênica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 233.1. Desenvolvimento de vetores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 243.2. Aplicação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25

4. Plataformas de suporte . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 294.1. Insumos e equipamentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 294.2. Técnicas de edição de genoma . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 294.3. Modelos animais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 294.4. Plataforma para condução de ensaios clínicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 304.5. Incentivo de parcerias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30

5. Ameaças . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 335.1. Barreiras regulatórias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 335.2. Propriedade intelectual . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 345.3. Dificuldades de importação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 365.4. Formação de recursos humanos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 375.5. Bioterismo padrão Farma . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37

6. Mapeamento de competências no país . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38

7. Considerações finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41

Referências bibliográficas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43

Lista de Figuras

Figura 1 – Processos da medicina regenerativa e da terapia gênica . . . . . . . . . 8

Figura 2 – Publicações no tema de células-tronco em relação ao total de publicações de cada país em 1996, 2000, 2004, 2008 e 2012 . . . . . 9

Figura 3 – Número de artigos científicos com o termo stem cells nas palavras-chave publicados entre 2011 e 2014 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .10

Figura 4 – Empresas atuantes na área de medicina regenerativa, por país . . . . 10

Figura 5 – Ensaios clínicos com CTs mesenquimais no mundo . . . . . . . . . . . . . 12

Figura 6 – Testes clínicos com CTs adultas no Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

Figura 7 – Número de artigos científicos publicados entre 2004-2014 contendo “BIOMATERIALS and REGENERATIVE MEDICINE” no título, resumo ou palavras-chave por país. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17

Figura 8 – Número de artigos científicos publicados entre 2004-2014 contendo “bioprinting” no título, resumo ou palavras-chave, por país . . . . . . . 18

Figura 9 – Número de artigos científicos publicados entre 2004-2014 contendo “decellularizarion” no título, resumo ou palavras-chave, por país . . . 19

Figura 10 – Publicações utilizando iPSCs em medicina regenerativa (linha roxa), desenvolvimento de fármacos (linha verde), e em outros temas (linha vermelha) . .20

Figura 11 – Setores atuantes na área de terapia gênica . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23

Figura 12 – Ensaios clínicos usando terapia gênica como procedimento . . . . . . 27

Figura 13 – Número de artigos científicos com o termo “gene therapy” nas palavras-chave publicados entre 2011 e 2014 . . . . . . . . . . . . . 28

Figura 14 – Desenvolvimento de parcerias em MR envolvendo empresas privadas e instituições acadêmicas (2004-2014) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31

Figura 15 – Desenvolvimento de parcerias em MR envolvendo as 22 maiores empresas farmacêuticas (2004-2014) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31

Figura 16 – Número de artigos científicos publicados entre 2004-2014 contendo “cell therapy” no título, resumo ou palavras-chave, por instituição brasileira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38

Figura 17 – Número de artigos científicos publicados entre 2004 e 2014 contendo “regenerative medicine” no título, resumo ou palavras chave, por instituição brasileira . . . . . . . . . . . 38

Figura 18 – Número de artigos científicos publicados entre 2004 e 2014 contendo “biomaterials” no título, resumo ou palavras-chave, por instituição brasileira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39

Figura 19 – Número de artigos científicos publicados entre 2004-2014 contendo “bioprinting” no título, resumo ou palavras-chave por instituição brasileira . . 39

Figura 20 – Número de artigos científicos publicados entre 2004-2014 contendo “decellularization” no título, resumo ou palavras-chave, por instituição brasileira . . 40

Figura 21 – Número de artigos científicos publicados entre 2004 e 2014 contendo “gene therapy” no título, resumo ou palavras chave, por instituição brasileira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40

Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Tecnológico

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1. Introdução

Medicina regenerativa (MR) pode ser definida como o processo de produção de células, tecidos ou órgãos funcionais, e a implantação dos mesmos em pacientes, visando repa-rar ou substituir órgãos ou tecidos cujas funções estejam comprometidas por diferentes causas (envelhecimento, doença, lesão, etc.). A MR tem o potencial de solucionar o problema de falta de órgãos para transplante, assim como gerar terapias mais eficientes para doenças/condições como lesão de medula espinhal, infarto do miocárdio, diabetes, doença de Alzheimer, e outras doenças degenerativas.

Células/tecidos gerados para MR podem também ser utilizados em ensaios farmacoló-gicos, para a identificação de novas drogas e para o teste de eficácia e toxicidade des-tas. Apesar de esse uso não se encaixar diretamente na área de MR, ele é de grande importância na área geral de saúde humana, e assim será contemplado neste panorama.

A MR pode ser dividida em três processos distintos: (1) coleta/isolamento das células; (2) cultivo (multiplicação)/diferenciação (no caso de células-tronco pluripotentes) das cé-lulas; e (3) aplicação das células/tecidos no paciente. As células produzidas no proces-so (2) ainda podem ser utilizadas em (i) bioengenharia de tecidos/órgãos (para aplicação no paciente ou para ensaios in vitro), e (ii) ensaios in vitro de eficácia e toxicidade de novas drogas (Figura 1).

Terapia gênica (TG) consiste em estratégias que utilizam ácidos nucleicos (DNA e/ou RNA) como agentes terapêuticos. Em geral, a TG consiste na transferência dos ácidos nucleicos para o interior das células do tecido afetado, onde eles exercerão sua função terapêutica.

Aqui, a TG foi dividida em quatro processos: (4) a construção do vetor; (5) a produção em larga escala e em condições GMP do vetor associado a seu carreador (viral ou não viral); e (6) a aplicação direta no paciente, no que é chamado de terapia gênica in vivo. Além dessa, a terapia gênica pode ser feita in vitro, onde (7) o vetor é aplicado em cé-lulas in vitro, e as células modificadas são então aplicadas no paciente – e aqui terapia gênica e medicina regenerativa se sobrepõem. Assim, as duas estratégias terapêuticas, MR e TG, são também usadas em conjunto.

Neste panorama, será discutido o estado da arte no mundo e no Brasil dos diferentes processos envolvidos na MG e TG, e os desafios para os próximos cinco a 15 anos.

8Complexo Industrial da SaúdeMedicina Regenerativa

Figura 1 – Processos da medicina regenerativa e da terapia gênica

Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Tecnológico

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2. Medicina regenerativa

Uma forma de se avaliar o avanço da área de medicina regenerativa é medir a quanti-dade relativa de publicações científicas envolvendo células-tronco em cada país (Figura 2). Por esse critério, Singapura, Itália e Estados Unidos têm mais de 1,5% de toda a sua produção científica dedicada ao tema. O Brasil, apesar de estar à frente de Índia e Rússia, tem pouco mais de 0,5% de sua produção científica dedicada a células-tronco, valor abaixo da média mundial de 1%.

Figura 2 – Publicações no tema de células-tronco em relação ao total de publicações de cada país em 1996, 2000, 2004, 2008 e 2012

Fonte: Scopus. Adaptado de Research Trends Issue 36, Mar. 2014 Obs.: A linha pontilhada azul representa a média mundial.

Em termos absolutos, a produção científica brasileira medida por número de artigos cien-tíficos publicados se compara com a da Rússia e a da Índia (Figura 3).

10Complexo Industrial da SaúdeMedicina Regenerativa

Figura 3 – Número de artigos científicos com o termo stem cells nas palavras-chave publicados entre 2011 e 2014

Fonte: Scopus (Julho/ 2014)

Outra forma de se avaliar a posição de um país em medicina regenerativa é pela quanti-dade de empresas atuantes na área. Por este critério, os Estados Unidos apresentam posição de grande destaque, com 35% das empresas, enquanto o Brasil não tem posi-ção significativa neste cenário (Figura 4).

Figura 4 – Empresas atuantes na área de medicina regenerativa, por país

Fonte: Biotechgate Global Database (dados de novembro de 2014)

As primeiras células a serem utilizadas em MR foram as derivadas da medula óssea, que dão origem ao sistema hematopoiético – as células-tronco (CTs) hematopoiéticas, utilizadas desde a década de 1950 nos chamados transplantes de medula óssea para o tratamento de doenças hematopoiéticas (por exemplo, leucemias). A partir do final dos anos 1990, células-tronco de outras origens passaram a ser identificadas e estudadas como fonte potencial de tecido para a regeneração de outros órgãos/tecidos.

Uma vez isolada, uma determinada população celular em geral deve ser expandida para gerar um número suficiente de células para terapia. Além disso, as células pluripotentes devem

Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Tecnológico

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ainda ser diferenciadas nos tipos celulares específicos de acordo com a aplicação desejada. O cultivo/diferenciação celular para fins de uso em seres humanos deve ainda ser feito de acordo com boas práticas de manufatura – ou, do inglês, condições GMP (good manufactu-ring practices) –, o que representa um desafio adicional de infraestrutura e processos.

Atualmente, as principais classes de células utilizadas em MR são: (a) CTs hematopoiéti-cas; (b) CTs mesenquimais; (c) CTs pluripotentes; (d) CTs tecido-específicas; e (e) células geradas por reprogramação direta. Além dessas, (f) subfrações celulares também podem ser usadas como agente terapêutico. A seguir, apresentaremos o estado da arte e as perspectivas da área de MR, segundo os diferentes tipos celulares e processos utilizados.

2.1. Terapia celular

a) CTs hematopoiéticas são as células que dão origem a todos os tipos celulares que compõem o sangue, incluindo as do sistema imunológico. Elas são encontradas na medula óssea e no sangue do cordão umbilical e placentário de recém-nascidos, e são utilizadas no tratamento de mais de 50 doenças, de acordo com o National Marrow Pro-gram dos Estados Unidos, entre elas as leucemias e outras doenças do sangue (ver lista completa em: <https://goo.gl/pky6Xz>).

A obtenção de células hematopoiéticas – punção da medula óssea, ou coleta do sangue do cordão umbilical e placentário de recém-nascidos – é uma tecnologia relativamente simples e dominada no mundo e no Brasil.

Por outro lado, a expansão de CTs hematopoiéticas, particularmente as derivadas do sangue do cordão umbilical e placentário (SCUP), ainda é um desafio. Essa expansão resolveria a questão da quantidade limitada de células coletadas em cada amostra. Isso por sua vez permitiria o transplante com maior segurança de adultos com uma única amostra de SCUP, em vez das duas que em geral são necessárias. Além disso, a ex-pansão das células e o consequente uso de uma única unidade de SCUP acarretariam uma redução significativa dos custos dos transplantes, que em adultos é atualmente feito com duas unidades de SCUP.

CTs hematopoiéticas derivadas do SCUP já são expandidas in vitro, e no momento exis-tem dois ensaios clínicos de fase 1 e fase 2, nos Estados Unidos (NCT00343798) e na França (NCT01034449), respectivamente, avaliando a coinfusão de células expandidas com células não manipuladas em pacientes com diferentes malignidades hematológicas. No Brasil, não há nenhum grupo expandindo CTs hematopoiéticas para uso clínico. Isso pode ser devido às dificuldades do procedimento, ou simplesmente por não haver gru-pos de pesquisa interessados neste tema no país.

b) CTs mesenquimais são isoladas de diversos tecidos, incluindo medula óssea, tecido adiposo, placenta e veia do cordão umbilical. Essas células se diferenciam in vitro em células de gordura, osso e cartilagem. O isolamento de CTs mesenquimais de medula

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óssea, tecido adiposo, placenta e veia do cordão umbilical é um procedimento já bem es-tabelecido, inclusive no Brasil. Além de grupos de pesquisa, empresas privadas realizam os procedimentos de isolamento e criopreservação dessas células, oferecendo esse serviço comercialmente.

CTs mesenquimais vêm sendo expandidas em condições GMP no mundo e no Brasil há alguns anos. Uma busca no site <HTTP://www.clinicaltrials.gov> usando mesenchymal stem cells como forma de intervenção, em 14 de julho de 2014, identificou 390 estudos clínicos em andamento usando CTs mesenquimais de diferentes fontes (medula óssea, veia do cordão umbilical, tecido adiposo) para o tratamento de variadas condições – le-são de medula espinhal, cirrose hepática, doença de Parkinson, cardiopatias, diabetes tipo I, entre outras (Figura 5).

Figura 5 – Ensaios clínicos com CTs mesenquimais no mundo

Fonte: <www.clinicaltrials.gov> (Julho/ 2014) Obs.: Dos 11 ensaios na América Latina, nove são no Brasil e dois no Chile

Porém, os efeitos terapêuticos das CTs mesenquimais para a maioria das doenças testa-das até hoje não foi significativo, com exceção das doenças autoimunes, como diabetes tipo I, esclerose múltipla e doença do enxerto versus hospedeiro (DECH) – de fato, a ação imunomoduladora das CTs mesenquimais já é bem reconhecida, e explorada nes-ses tipos de doença; e das doenças envolvendo regeneração óssea e de cartilagem, tecidos naturalmente derivados de CTs mesenquimais.

No Brasil, vários estudos clínicos com CTs mesenquimais derivadas de medula óssea estão em andamento, e essas células são expandidas em condições GMP principal-

Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Tecnológico

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mente nos Centros de Tecnologia Celular (CTCs) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) de Salvador, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) e do Hemocentro da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto (Figura 6). Este último explora a ação imunomoduladora das CTs mesenquimais em diabetes tipo I e na doença do enxerto versus hospedeiro.

Figura 6 – Testes clínicos com CTs adultas no Brasil

Fonte: <www.clinicaltrials.gov> (Dez. 2012). (Adaptado de Pereira, 2013)

Em comparação à sua produção científica (Figura 3), o Brasil tem um número relativa-mente alto de ensaios clínicos em desenvolvimento, apontando para um viés de pesquisa clínica em detrimento de pesquisas básica e pré-clínica na área no país.

c) CTs pluripotentes possuem a capacidade de se diferenciar em células de todos os órgãos/tecidos do corpo humano, e são obtidas a partir de: (i) embriões humanos, que dão origem às CTs embrionárias (ou human embrionic stem cells – hESCs) (Thomson et al., 1998); (ii) reprogramação de células adultas, dando origem às CTs de pluripotência induzida (inducent pluripotent stem cells – iPSCs), método desenvolvido em 2007 no Japão (Takahashi et al., 2007); ou (iii) transferência nuclear, ou clonagem terapêutica (nuclear transfer-hESCs – NT-hESCs) (Tachibana et al., 2013).

Vários países, incluindo Estados Unidos, Suécia e Singapura, já geraram hESCs em condições adequadas para uso clínico (em condições de boas práticas de manufatura – GMP). O Brasil possui o arcabouço legal para a pesquisa com embriões humanos (Lei

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no 11.105, de 25 de março de 2005 – Lei de Biossegurança). Porém, apesar de existir um grupo que já estabeleceu diferentes linhagens de hESCs no país, estas não foram estabelecidas em condições GMP, só sendo utilizáveis em pesquisa não clínica. Este grupo, do Instituto de Biociências da USP, está atualmente investindo na infraestrutura laboratorial para a derivação de linhagens de hESCs em condições GMP.

O Brasil também domina a tecnologia de geração de hiPSCs, com pelo menos seis gru-pos de pesquisa tendo derivado essas linhagens a partir de células da pele (fibroblas-tos), do sangue periférico e menstrual, e da polpa do dente de leite (USP-SP, USP-RP, Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, Instituto do Coração – InCor). Porém, da mesma forma que as hESCs, essas células não foram derivadas em condições GMP, e assim não são adequadas para uso clínico.

Por sua vez, a técnica de transferência nuclear, já aplicada no país em bovinos, ainda não é utilizada para a produção de CTs pluripotentes humanas. Além de a técnica ser complexa, pois necessita de óvulos humanos, ainda não é claro se as NT-hESs apresen-tam reais vantagens sobre as hiPSCs, cuja obtenção é muito mais simples. Além disso, existe uma incerteza sobre a legalidade do procedimento no Brasil, uma vez que a Lei no 11.105/2005, em seu art. 6º, proíbe “clonagem humana”, sem deixar especificado se é a clonagem reprodutiva ou terapêutica.

CTs pluripotentes já estão sendo expandidas e diferenciadas em cardiomiócitos (Esta-dos Unidos e França), oligodendrócitos (Estados Unidos), células produtoras de insulina (Estados Unidos) e células do epitélio pigmentado da retina (Estados Unidos, Inglaterra, Japão) em condições GMP, adequadas para uso clínico. Além disso, existem atual-mente cinco ensaios clínicos de fase 1 em andamento com células derivadas de CTs pluripotentes, para o tratamento de diferentes formas de degeneração macular (Estados Unidos – NCT01469832; Inglaterra – NCT01691261; Coreia – NCT01674829; Japão – ver <http://www.riken.jp/en/research/labs/cdb/>); lesão de medula espinhal (Esta-dos Unidos – ver <http://asteriasbiotherapeutics.com/>); e insuficiência cardíaca grave (França – NCT02057900).

No Brasil, existe um grupo na UFRJ trabalhando na expansão de CTs pluripotentes em larga escala, porém ainda não foi relatada a expansão em condições GMP. Além disso, não há nenhum grupo produzindo células diferenciadas a partir das CTs pluripotentes ade-quadas para uso clínico – a pouca pesquisa nesta área no Brasil ainda se encontra em fase básica/pré-clínica. Atualmente, no país, a maior parte dos grupos trabalhando com CTs pluripotentes usa hiPSCs derivadas de pacientes com diferentes doenças, no intuito de estudar os mecanismos de patogênese in vitro, ou de triar novas drogas para as respecti-vas doenças nas células diferenciadas a partir das hiPSCs (tópico discutido mais adiante).

d) CTs tecido-específicas são células multipotentes residentes de um órgão/tecido que dão origem aos diferentes tipos celulares que o compõem. Por exemplo, as CTs hema-topoiéticas, encontradas na medula óssea, que dão origem a todos os tipos de células

Agenda Tecnológica Setorial – ATS Panorama Tecnológico

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que compõem o sangue. CTs tecido-específicas já foram isoladas de diversos órgãos, e incluem as CTs neurais (derivadas de cérebro fetal ou adulto), CTs mamárias, CTs car-díacas, CTs intestinais e CTs de pele. No Brasil, não existe atualmente nenhum grupo que domine as metodologias de derivação de CTs tecido-específicas, apesar de alguns grupos trabalharem com CTs neurais produzidas por grupos internacionais.

A expansão de CTs cardíacas em condições GMP é realizada em pelo menos dois pa-íses: no Japão, onde no momento estão sendo testadas em um ensaio clínico de fase 2 para doença cardíaca univentricular (NCT01829750) e fase 1 para cardiomiopatia is-quêmica (NCT00981006); e nos Estados Unidos, onde um ensaio clínico de fase 1 para disfunção ventricular terminou em 2014 (NCT00893360).

Além disso, pelo menos duas empresas nos Estados Unidos produzem CTs neurais de-rivadas de fetos em condições GMP, que atualmente estão sendo usadas em ensaios clínicos: Stem Cells Inc. (Disponível em: <http://www.stemcellsinc.com/>) – lesão de medula espinhal, doenças da retina, duas doenças neurodegenerativas; e NeuralStem (Disponível em: <http://www.neuralstem.com/>) – esclerose lateral amiotrófica, lesão de medula espinhal, derrame isquêmico.

e) Reprogramação direta: Os mesmos princípios utilizados para a reprogramação de uma célula adulta em uma célula de pluripotência induzida são aplicados para a reprogra-mação de células adultas (em geral fibroblastos) diretamente em células de algum tecido específico, como cardiomiócito, hepatócito ou neurônio. Essa metodologia é chamada de reprogramação direta, e desde 2010 é utilizada para a produção de precursores he-matopoiéticos (células do sangue), hepatócitos (células do fígado), e neurônios motores a partir de fibroblastos (células da pele) humanos.

A maior parte dos trabalhos publicados em reprogramação direta é de grupos dos Estados Unidos. Porém, grupos na China, Itália, Canadá, Japão e Inglaterra também já relataram resultados importantes nessa área. No entanto, por enquanto as pesquisas com células geradas por reprogramação direta se limitam a estudos básicos e pré-clínicos. No Brasil não foi encontrado nenhum grupo de pesquisa trabalhando com reprogramação direta.

f) Subfrações celulares: vesículas extracelulares (VE) são uma população heterogênea de vesículas lipídicas celulares, incluindo exossomos, microvesículas e outros, que são excretadas pelas células. Recentemente as VE foram identificadas como mediadoras de informações entre células e veículos para administração de drogas, incluindo ácidos nucleicos. Acredita-se que o conteúdo das VE seriam os agentes responsáveis pelos efeitos parácrinos observados em várias terapias celulares – as células-tronco adminis-tradas exerceriam seu efeito terapêutico através da secreção de VE carregadas com moléculas que promovem a autorregeneração tecidual.

VE podem ser produzidas a partir de células em cultura, e seu conteúdo pode ser manipulado de forma a carregarem moléculas de interesse – desde proteínas recom-

16Complexo Industrial da SaúdeMedicina Regenerativa

binantes até genes e pequenos RNAs (revisto por Lamichhane et al., 2014). Assim, essas estruturas apresentam potencial tanto em medicina regenerativa quanto em terapia gênica.

O uso terapêutico de VE já está em testes clínicos em vários países, para diferentes fins: exossomos derivados de plantas como carreadores de moléculas (a) terapêuticas em câncer de cólon (Estados Unidos), e (b) anti-inflamatórias para efeitos colaterais do tra-tamento de tumores de cabeça e pescoço (Estados Unidos); VE de CTs mesenquimais de sangue de cordão, teoricamente carregando moléculas imunossupressoras, para o tratamento de diabetes tipo I (Egito); VEs como biomarcadores de (a) carcinoma celu-lar induzido por HPV (Estados Unidos), (b) câncer gástrico (Espanha), e (c) doença de Parkinson (Estados Unidos); VE derivadas de células dendríticas como carregadores de antígenos para vacinação contra tumor (França).

No Brasil, foram identificados três grupos, dois da UFRJ e um da USP-São Paulo, que trabalham com VE/exossomos em medicina regenerativa, porém ainda em estágios de pesquisa básica/pré-clínica. Não foi encontrada nenhuma empresa no país que domine essa tecnologia.

2.2. Bioengenharia de tecidos

Bioengenharia de tecidos é uma área multidisciplinar envolvendo cientistas, enge-nheiros e médicos com o propósito de criar substitutos biológicos que reproduzam tecidos para substituir tecidos e órgãos doentes ou lesados. As estratégias de bio-engenharia de tecidos em geral envolvem a aplicação de combinações de materiais biológicos ou sintéticos, células e fatores biologicamente ativos para a formação de um tecido. Este processo pode envolver o crescimento celular in vitro, ou a indução de regeneração tecidual in vivo. Os diferentes tipos celulares utilizados em bioenge-nharia de tecidos são aqueles já descritos para terapia celular. Em particular, o uso de células progenitoras tecido-específicas tem sido o mais comum na bioengenharia de tecidos. Nos Estados Unidos, o centro mais avançado de bioengenharia de te-cidos é o Wake Forest Institute for Regenerative Medicine (Disponível em: <http://www.wakehealth.edu/WFIRM/>).

A seguir serão descritos os outros elementos particulares da bioengenharia de tecidos.

a) Arcabouços biológicos e sintéticos

Os materiais atualmente utilizados na área de medicina regenerativa são predominante-mente baseados em polímeros naturais (incluindo alginato, gelatin, colágeno, quitosan, fibrina e ácido hialurônico – isolados de tecidos animais ou humanos), ou moléculas sin-téticas (polietileno glicol, PEG). O uso de materiais sintéticos ainda é limitado pela baixa biocompatibilidade, produção de toxinas e perda de propriedades mecânicas durante degradação.

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Figura 7 – Número de artigos científicos publicados entre 2004-2014 contendo “BIOMATERIALS and REGENERATIVE MEDICINE” no título, resumo ou palavras-chave por país

Fonte: Scopus (Julho/2014)

b) Bioimpressão

Impressão de órgãos é definida como a biofabricação aditiva de construções de teci-dos em 3-D assistida por computadores. Atualmente, a impressão de órgãos inteiros ainda não é possível, porém já é possível a impressão de construções orgânicas que não necessitam de vascularização, assim como de minitecidos que reproduzem a biologia do tecido original para testes farmacológicos (ver organs-in-chip).

A bioimpressão envolve pelo menos seis etapas: (1) aquisição de imagem do tecido danificado e sua vizinhança para guiar o desenho do tecido a ser bioimpresso; (2) estra-tégia do desenho; (3) seleção dos materiais (polímeros sintéticos ou naturais, ou matriz descelularizada); (4) seleção das células (células diferenciadas, pluripotentes ou multipo-tentes); (5) bioimpressão (a jato de tinta; por microextrusão; ou assistida a laser); e final-mente, (6) a aplicação (que pode envolver períodos de maturação in vitro; implantação; uso em teste de fármacos).

Os componentes do processo de bioimpressão incluem os equipamentos e os reagen-tes. Esses últimos podem ser divididos em células e as chamadas biotintas, que for-necem os sinais físicos e bioquímicos que formam um meio ambiente adequado para a sobrevivência das células. Os mesmos materiais utilizados como arcabouços (descritos acima) podem ser utilizados em bioimpressão, contanto que sejam compatíveis com o processo de bioimpressão.

Do ponto de vista do desenvolvimento de tecidos para aplicação clínica, no curto prazo teremos tecidos bidimensionais como pele. Em seguida, tubos ocos como vasos sanguí-neos, traqueias, uretras entrarão em uso clínico. Um pouco mais complexos serão os ór-gãos ocos, como a bexiga e o estômago, e finalmente os mais complexos serão os órgãos sólidos, com complexa vascularização e enervação (revisto por Murphy e Atala, 2014).

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Finalmente, a bioimpressão in vivo também começa a ser realizada em modelos animais. Essa estratégia envolve a impressão de células e materiais diretamente no paciente.

Figura 8 – Número de artigos científicos publicados entre 2004-2014 contendo “bioprinting” no título, resumo ou palavras-chave, por país

Fonte: Scopus (Julho/2014)

c) Descelularização/recelularização de órgãos

A descelularização de órgãos e tecidos visa à obtenção de um arcabouço biológico não imunogênico que possa dirigir/promover recelularização in vivo ou in vitro. A estratégia possui o potencial de produzir órgãos como fígado, coração, bexiga e rins in vitro, a par-tir de órgãos animais descelularizados e recelularizados ex-vivo com diferentes tipos de células.

Tecidos descelularizados derivados de suínos e bovinos são atualmente utilizados na construção de válvulas cardíacas e outras estruturas vasculares. No Brasil, a empresa Braile Biomédica domina esta tecnologia. Estratégias semelhantes estão sendo desen-volvidas para a regeneração de outros órgãos e tecidos.

Recentemente, um ensaio clínico nos Estados Unidos mostrou eficácia e segurança do uso de bexiga de porco descelularizada para a regeneração de grandes defeitos musculares in vivo. O arcabouço promoveu a regeneração muscular, incluindo vascularização e enervação do tecido, mesmo sem a adição de células exógenas (Sicari et al., 2014).

Um grande desafio na área é a recelularização dos arcabouços – além da identificação dos tipos celulares adequados, é ainda necessário o desenvolvimento de biorreatores que mantenham as células vivas ex-vivo até o órgão/tecido ser completamente recelula-rizado e então transplantado no paciente.

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Figura 9 – Número de artigos científicos publicados entre 2004-2014 contendo “decellularizarion” no título, resumo ou palavras-chave, por país

Fonte: Scopus (Julho/2014)

2.3. Ensaios celulares

O uso de células-tronco pluripotentes em ensaios celulares tem o potencial de melhorar e acelerar vários processos do desenvolvimento de novos fármacos. Especificamente: triagem e descoberta de novas drogas, e avaliação pré-clínica de eficácia e toxicidade de novas drogas. Essa aplicação das células-tronco, em particular das hiPSCs, se iniciou logo com o surgimento da técnica de reprogramação celular em 2007, e em 2012 repre-sentava 11% das publicações mundiais com essas células (Figura 10).

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Figura 10 – Publicações utilizando iPSCs em medicina regenerativa (linha roxa), desenvolvimento de fármacos (linha verde), e em outros temas (linha vermelha)

Fonte: Scopus. Adaptado de Research Trends Issue 36, mar. 2014

A partir de células-tronco pluripotentes, é possível a geração de quantidades teoricamen-te ilimitadas de células diferenciadas específicas, com homogeneidade e reprodutibilida-de fundamentais em ensaios in vitro. Uma vez estabelecida, a estratégia deve permitir a triagem de um maior número de compostos em menos tempo e a um custo menor do que é possível com os métodos atuais. Além disso, a possibilidade de se realizar as triagens primárias em células humanas provavelmente levará a uma redução no número de drogas promissoras que falham em testes clínicos de fase 2/3 devido a diferenças biológicas entre animais e humanos.

a) Triagem de toxicidade e eficácia de novas drogas: o desenvolvimento de ensaios celulares para uso no desenvolvimento de novas drogas envolve duas principais etapas: (1) a geração do tipo celular de interesse em larga escala; e (2) o desenvolvimento de ensaios celulares in vitro capazes de identificar fenótipos celulares que recapitulem o fenótipo in vivo. Atualmente, empresas como GE e Pfizer estão investindo em validar alguns desses ensaios, principalmente com cardiomiócitos e neurônios humanos de-rivados de células-tronco pluripotentes, para identificar em fase pré-clinica compostos cardiotóxicos ou neurotóxicos. Outros grupos já obtiveram algum sucesso em validar ensaios de hepatotoxicidade em hepatócitos derivados de células-tronco pluripotentes, mostrando que são tão preditivos quanto ensaios com hepatócitos humanos primários derivados de cadáveres (Szkolnicka et al., 2014).

Os ensaios chamados high content screening (HCS) analisam simultaneamente diferen-tes parâmetros celulares, como, por exemplo, no caso do desenvolvido pela empresa GE para prever cardiotoxicidade, fluxo de cálcio, capacidade contrátil e integridade das mito-côndrias em cardiomiócitos humanos expostos a diferentes compostos. No país existem alguns grupos com os equipamentos necessários para HCS – incluindo-se grupos no LNBio-Campinas, UFRJ (CENABio) e Hemocentro da Faculdade de Medicina de Ribei-rão Preto da USP –, investindo no desenvolvimento desses ensaios celulares. Essas plataformas tecnológicas possuem uma capacidade produtiva em geral não esgotada por

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um único grupo de pesquisa. Assim, elas deveriam ser disponibilizadas para mais grupos interessados no desenvolvimento de ensaios celulares.

A tecnologia de geração de hiPSCs permite a geração de células-tronco pluripo-tentes com genomas de interesse, como, por exemplo, a partir de indivíduos com doenças específicas com componentes genéticos. Essas células por sua vez são um modelo in vitro da doença em que potencialmente é factível se estudar os meca-nismos moleculares da mesma (como discutido anteriormente), e triar novas drogas. Por exemplo, um grupo na UFRJ gerou hiPSCs de um paciente com esquizofrenia e identificou alterações mitocondriais em neurônios derivados daquelas células. A partir da identificação de um fenótipo celular desses neurônios “doentes”, eles po-derão realizar a triagem de bibliotecas de compostos para descobrir aquele(s) que reverta(m) o fenótipo celular in vitro. Estes serão novos candidatos a serem testa-dos como drogas para esquizofrenia.

Este tipo de estratégia está sendo amplamente explorada no mundo todo, e grandes painéis de hiPSCs de diferentes doenças humanas (Alzheimer, autismo, doença cardí-aca, Parkinson, distrofia muscular, entre outras) vêm sendo gerados e disponibilizados para a comunidade científica (revisto em Sterneckert et al., 2014). É importante notar que a geração das hiPSCs é a etapa menos complexa desses processos. Os grandes desafios são (1) identificar um fenótipo celular associado especificamente à doença, e (2) desenvolver ensaios celulares para detectar o fenótipo e sua reversão, de forma a se poder usar o modelo celular para a triagem de um grande número de compostos. No Brasil, vários grupos dominam a técnica de geração de hiPSCs, mas ainda precisamos investir no desenvolvimento de: (1) produção em larga escala e em condições de boas práticas laboratoriais de células diferenciadas; e (2) ensaios celulares e HCS.

b) Eficácia/toxicidade individual/populacional. Finalmente, outra aplicação das hiPSCs em testes de drogas é em medicina personalizada. A resposta diferencial a medica-mentos entre indivíduos poderá ser avaliada in vitro em hiPSCs derivadas de pacientes, ajudando assim na determinação da droga mais eficaz/menos tóxica para aquele indiví-duo específico. Além disso, o teste de medicamentos em células de um grande número de indivíduos de uma mesma população poderá ser usado como um ensaio pré-clínico importante antes de serem iniciados ensaios clínicos de fase 1. Neste sentido, na USP está sendo construída uma biblioteca de hiPSCs de participantes do Estudo Longitudinal da Saúde do Adulto (ELSA), que poderá representar a população brasileira para esses chamados “ensaios clínicos in vitro”.

c) Órgãos-em-chips. Para melhor reproduzir in vitro a fisiologia de órgãos huma-nos, alguns grupos estão desenvolvendo os chamados órgãos-em-chips (organs-in--chips). Essa tecnologia envolve o cultivo de diferentes tipos celulares de um deter-minado órgão em um microdispositivo com configuração tridimensional desenhada para reproduzir a arquitetura in vivo mais fielmente do que culturas bidimensionais de células. Ainda nesses “chips”, é possível se aplicar forças tensionais às células, e

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diferentes atmosferas que simulam a fisiologia in vivo. Por exemplo, um chip de pul-mão possui uma camada de células pulmonares separada por uma membrana porosa de outra camada de células de epitélio de capilares. A camada de células pulmonares está exposta ao ar, enquanto a de capilar está exposta ao meio e cultura, simulando a organização dessas células no órgão in vivo. Além disso, o microdispositivo é flexí-vel e pode ser inflado ritmicamente, simulando também as forças contráteis às quais as células do pulmão são submetidas in vivo.

A instituição mais avançada nesta área é o Wyss Institute, em Harvard, Estados Uni-dos (Disponível em: <http://wyss.harvard.edu/viewpage/461/>). Além dos chips de órgãos isolados, eles trabalham na integração destes de forma similar ao que acontece no corpo humano, em um esforço para criar sistemas in vitro para o teste e triagem de novas drogas que melhor simule a biologia in vivo. Esse sistema integrado é chamado de human-on-a-chip.

Em 2011, o NIH criou o programa Tissue Chip for Drug Screening (Disponível em: <http://www.ncats.nih.gov/research/reengineering/tissue-chip/tissue-chip.html>), que em 2012 selecionou 17 projetos em diferentes instituições de pesquisa nos Estados Unidos para a criação de chips tridimensionais com células e tecidos vivos que modelem a estrutura e função de órgãos humanos. Como parte do programa, o Food and Drug Administration (FDA) está estudando como essa tecnologia pode ser utilizada para se avaliar a segurança de novas drogas antes de estudos em humanos.

No Brasil não foi identificado nenhum grupo trabalhando neste tema.

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3. Terapia gênica

Em 2013, foi aprovada a comercialização da primeira terapia gênica pela Comissão Eu-ropeia: Glybera, produzida pela empresa holandesa uniQure. Glybera é um vírus ade-noassociado não replicativo contendo o gene LPL, para o tratamento de deficiência de lipoproteína lípase familial. A empresa atualmente negocia com o FDA a aprovação do Glybera nos Estados Unidos. Apesar de a doença ser rara, a comercialização de uma terapia gênica é um fato histórico, que torna a estratégia confinada a laboratórios por quase 30 anos uma realidade médica.

É ainda interessante notar que, segundo a Biotechgate Global Database, somente 8% das atividades em terapia gênica no mundo são realizadas por organizações públicas ou sem fins lucrativos – a maior parte dos investimentos na área já está na iniciativa privada (Figura 11). Isso reforça o amadurecimento da área, que se aproxima da aplicação médica.

Figura 11 – Setores atuantes na área de terapia gênica

Fonte: Biotechgate Global Database

A terapia gênica envolve: (i) a identificação do gene com atividade terapêutica; (ii) a cons-trução de uma molécula de DNA (o vetor) contendo esse gene e capaz de expressá-lo em níveis terapêuticos e nas células de interesse; (iii) o “empacotamento” do vetor em alguma estrutura que permita seu transporte para dentro do núcleo das células-alvo; e (iv) a administração do vetor empacotado no paciente, no caso da terapia gênica in vivo. Este mesmo vetor empacotado pode ser administrado em células in vitro, e as células transgênicas são então administradas no paciente – esta é a terapia gênica ex vivo.

Inicialmente proposta como uma estratégia terapêutica para doenças mendelianas (ou monogênicas), atualmente a TG vem sendo desenvolvida também para o tratamento de: (i) câncer (por exemplo, vírus contendo genes suicidas direcionados a células tumorais;

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células do sistema imunológico geneticamente modificadas para atacar tumores); (ii) do-enças infecciosas (por exemplo, vacinas gênicas para malária, tuberculose e HIV; célu-las hematopoiéticas geneticamente modificadas para ter resistência ao HIV; microRNAs contra HCV); e (iii) doenças degenerativas (por exemplo, AAV com gene terapêutico para insuficiência cardíaca; lentivírus com gene terapêutico para doença de Parkinson).

A seguir, cada etapa será discutida, apresentando-se o panorama global do estado da arte.

3.1. Desenvolvimento de vetores

Um vetor de TG deve conter o(s) gene(s) terapêutico(s) e sequências promotoras e reguladoras que promovam a sua expressão em nível desejado. Através de técnicas de DNA recombinante, potencialmente qualquer sequência de DNA pode ser produzida. O desafio é determinar a combinação de gene/elementos regulatórios para se obter ex-pressão adequada para o fim terapêutico.

Pode-se resumir que a construção de vetores envolve diferentes conhecimentos bási-cos: genética – para identificar genes que determinam ou influenciam o curso de uma de-terminada doença; biologia molecular – para identificar/desenhar sequências regulatórias para controlar a expressão do gene terapêutico da forma desejada; virologia – para de-senvolver vetores que transfiram o gene terapêutico de forma eficiente para as células; química e física – para desenvolver vetores/carreadores não virais.

a) Virais

A construção gene/elementos-regulatórios pode ser inserida em um genoma viral, substituindo genes patogênicos do vírus. Assim, as partículas virais geradas a princípio não serão patogêni-cas e transferirão o gene terapêutico para as células-alvo com alta eficiência.

Os principais vetores virais para terapia gênica são derivados de retrovírus, adenovírus, vírus adenoassociado (AAV) e lentivírus. Dada a boa eficiência de transdução das célu-las, esses vetores são os mais utilizados em ensaios clínicos em andamento.

É importante notar que não existe um consenso sobre o melhor tipo de vetor viral para terapia gênica. Na verdade, cada um tem vantagens e desvantagens, e o melhor vetor deve ser escolhido de acordo com as características da doença e do órgão/tecido alvo.

b) Não virais

De forma alternativa, a molécula de DNA contendo a construção gene/elementos-regu-latórios pode ser administrada diretamente in vivo, ou utilizando lipídios ou nanopartícu-las para facilitar transfecção e proteger o DNA terapêutico de degradação até que ele entre no núcleo celular.

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Todos os vetores não virais são derivados de plasmídeos, que são os DNAs circula-res presentes nas bactérias. Estes podem ser facilmente manipulados para construir novos vetores, de fácil produção em larga escala. Além disso, como são moléculas neutras quimicamente, a chance de gerar algum efeito colateral é menor entre todos os vetores. No entanto, a eficiência de transfecção in vivo costuma ser menor que vetores virais e a transfecção é limitada para alguns tipos de tecidos/órgãos. Para melhorar a taxa de transfecção in vivo, reagentes químicos (como lipossomas) e dispositivos físicos (como aparelhos de ultrassom e eletroporação) foram criados. O uso destes leva a eficiência de transfecção de vetores plasmidiais ao nível semelhan-te de transdução viral.

c) Pequenos RNAs (shRNA, miRNA)

Mais recentemente, com a descoberta de pequenos RNAs com atividades regulatórias de expressão gênica, principalmente small interfeering RNAs (siRNAs – RNAs de inter-ferência) e micro RNAs (miRNAs), essas moléculas também vêm sendo usadas para fins terapêuticos. Os siRNAs e miRNAs levam à degradação ou ao bloqueio da atividade de mRNAs, assim, os genes expressos em condições patológicas podem ser inibidos com o uso destes RNAs produzidos sinteticamente. Estes RNAs podem ser aplicados direta-mente ao organismo ou em associação com veículos como lipossomas, ou por meio de um vetor, como os usados para terapia gênica clássica.

Um ensaio clínico de fase 1 nos Estados Unidos já avalia o efeito de injeções intra-venais de um miRNA complexado com lipossomos para o tratamento de câncer de fígado (NCT01829971), criado pela empresa Mirna Therapeutics, Inc. Além disso, a empresa Santaris Pharma está conduzindo um ensaio clínico de fase 2 utilizando um microRNA contra o vírus da hepatite C (HCV). A empresa desenvolveu uma nova plataforma de terapia direcionada a RNAs chamada Locked Nucleic Acid (LNA), que consiste na modificação química de RNAs, tornando-os mais estáveis e com maior afinidade ao RNA-alvo.

3.2. Aplicação

a) Carreadores

Carreadores são agentes que levarão o DNA/RNA terapêutico até as células, sendo denominados de vetores. No caso de vetores virais, os genes virais são substituídos por genes terapêuticos para gerar as partículas virais com capacidade de proliferação controlada, para não causar doenças infecciosas. No caso de vetores não virais, os plasmídeos contendo genes terapêuticos são complexados com lipossomos, ou com nanopartículas que facilitam a entrada nas células e também protegem de degradação, desenvolvidas mais recentemente.

26Complexo Industrial da SaúdeMedicina Regenerativa

b) Direcionamento

Um dos desafios da terapia gênica é o direcionamento do vetor para as células/o teci-do de interesse. No caso de AAV, a tendência é a utilização de diferentes sorotipos de AAV com maior trofismo para tecidos específicos, como músculos, hepatócitos ou neurônios. Também pode direcionar vetores acoplando anticorpos ou ligantes que po-dem ser reconhecidos por seus antígenos ou receptores. Já há um produto na fase final de validação – o RexinG, para tratamento de câncer.

Nesta etapa é importante o conhecimento de biologia celular e molecular, para que sejam estabelecidas formas de facilitar a transferência gênica e identificar células-tronco ou progenitoras que possam regenerar o órgão/tecido doente.

c) Produção em larga escala

Segundo Seymour e Thrasher (2012), a produção em larga escala e em condições GMP de partículas virais de terapia gênica é ainda um grande desafio na área. Como o fár-maco é um organismo vivo, a produção e a purificação requerem maiores cuidados em todas as etapas. Além disso, devido a questões de biossegurança, o número de ensaios para controle de qualidade é grande, o que leva ao aumento do custo final do produto. Por outro lado, a produção de vetores não virais nessas condições é mais simples e barata, mas, como requer o uso de maior quantidade, há pesquisas para a produção de vetores menores e mais eficientes de transfecção.

Como a produção de vetores virais para TG tem muitos aspectos técnicos em comum com a produção de biológicos e a produção de células para MR, é fundamental a intera-ção entre os grupos dessas diferentes áreas para se otimizar o desenvolvimento dessa produção no país.

Em resumo, antecipamos que, nos próximos anos, a TG deverá se consolidar como uma estratégia médica da seguinte forma:

• serão desenvolvidos novos vetores virais mais seguros – com menor chance de gerar efeitos adversos quando se inserirem no genoma, e mais eficientes –, com expressão suficiente do gene terapêutico, e com capacidade de direcionar seu car-reador para as células-alvo;

• carreadores virais baseados em diferentes sorotipos de AAV permitirão o melhor endereçamento do gene terapêutico;

• haverá o desenvolvimento de novos carreadores, principalmente baseados em na-nopartículas, o que permitirá o uso de vetores não virais para a TG, propiciando o uso de construções gênicas maiores/mais complexas;

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• pequenos RNAs serão cada vez mais utilizados como agente terapêutico na TG; e

• as técnicas de edição de genoma (TALENs e CRISPR/Cas) serão incorporadas às várias estratégias da TG in vitro, como já descrito por Tebas et al. (2014).

Um panorama global do avanço da área de terapia gênica pode ser feito buscando-se ensaios clínicos envolvendo terapia gênica no site <www.clinicaltrials.gov> (Figura 12). Fica claro que as regiões mais avançadas são Estados Unidos e Europa, vindo em seguida China e Canadá. O Brasil tem registrado somente um ensaio clínico: a terapia gênica para cardiopatia isquêmica avançada com plasmídeo contendo o gene VEGF165, no Ins-tituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul (NCT00744315).

Figura 12 – Ensaios clínicos usando terapia gênica como procedimento

Fonte: <clincaltrials.gov> (Julho/2014)

Pesquisando-se por publicações científicas na área de terapia gênica, percebe-se que a pro-dução brasileira, em números de artigos publicados, também não é significativa (Figura 13).

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Figura 13 – Número de artigos científicos com o termo “gene therapy” nas palavras-chave publicados entre 2011 e 2014

Fonte: Scopus (Julho/2014)

E finalmente, em uma revisão recente sobre a área de TG na América Latina, Linden e Matte (2014) concluem:

Em conclusão, criadores de políticas devem estar cientes de que a terapia gê-nica, uma nova opção terapêutica para a cura de várias doenças, está fadada a se expandir no futuro próximo. Porém, os atuais níveis de investimento nessa tecnologia não serão capazes de promover o avanço de inovação e propriedade intelectual na área de uma forma que alivie o peso social e financeiro de várias condições médicas na America Latina” (grifos da autora deste panorama).1

1 Texto original: “In conclusion, policy makers should be aware that gene therapy, a novel therapeutic option to cure various diseases, is bound to expand in the near future. However, the current levels of investment in this technology are unlikely to boost the advancement of innovation and intellectual property in this field in a way that would ease both the social and financial burden of various medical conditions in Latin America”.

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4. Plataformas de suporte

4.1. Insumos e equipamentos

Praticamente todos os insumos e equipamentos utilizados em medicina regenerativa e terapia gênica são importados, com exceção de equipamentos mais simples. Em parti-cular, insumos de grande consumo, como meios de cultura, se produzidos com qualida-de localmente, facilitariam o desenvolvimento da área, trazendo maior agilidade para os pesquisadores, possivelmente a custos menores.

4.2. Técnicas de edição de genoma

Nos últimos anos foram desenvolvidas técnicas de edição de genomas mais eficien-tes, que permitem não só a deleção de um gene como o reparo de uma mutação es-pecífica. Dentre elas destacam-se as metodologias baseadas em TALENs (Porteus e Baltimore, 2003) e no sistema CRISPR/Cas9 (revisto por Hsu et al., 2014). Essas são técnicas relativamente simples de biologia molecular e celular, que permitem a geração de modelos celulares e de modelos animais. Além disso, mais recentemente a técnica de CRIPR/Cas vem sendo usada em células hematopoiéticas em ensaios clínicos, visando à eliminação do vírus HIV de pacientes infectados (Tebas et al., 2014).

No Brasil, existem pelo menos dois centros de geração de camundongos geneticamen-te modificados: o Laboratório de Modificação do Genoma do LNBio, e o Centro de Desenvolvimento de Modelos Experimentais para Medicina e Biologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Esses centros devem incorporar as novas tecnologias de edição de genoma, de modo a proverem para a comunidade científica modelos mais sofisticados e de forma mais eficiente.

Em busca no banco de dados de artigos científicos da área biomédica PubMed, identifi-cou-se um grupo da UFRJ que utiliza a técnica de engenharia de genoma com TALENs em células em cultura.

4.3. Modelos animais

No Brasil, nos últimos 20 anos houve uma serie de tentativas de criação de centros de geração de modelos animais geneticamente modificados, especificamente camundon-gos. Porém, devido às dificuldades de fixação de pessoal técnico nas universidades públicas e à baixa demanda desses modelos pela comunidade científica, essas iniciativas não tiveram sucesso. Assim, o pesquisador brasileiro não costuma utilizar a ferramenta de geração de modelos animais geneticamente modificados em suas pesquisas, o que pode limitar o impacto desses estudos.

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Como mencionado acima, atualmente existem dois centros de geração de camundongos geneticamente modificados, que devem incorporar as técnicas de TALENs e principal-mente de CRISPR/Cas. Esta última já foi inclusive utilizada para a criação de forma eficiente de animais geneticamente modificados de maior porte, como ratos e macacos (Niu et al., 2014). É fundamental que esses serviços sejam ágeis e eficientes, para que esta ferramenta de pesquisa seja incorporada pela comunidade cientifica brasileira, au-mentando assim o impacto e a relevância de suas pesquisas.

4.4. Plataforma para condução de ensaios clínicos

Para que a medicina regenerativa e a terapia gênica cheguem à clínica, a plataforma de condução para ensaios clínicos será essencial. O Brasil já possui duas plataformas: a Rede Nacional de Pesquisa Clínica, que congrega mais de 32 hospitais públicos, em geral universitários, vinculada ao Ministério da Saúde; e a plataforma de ensaios clínicos EPEC-SUS. Além disso, o país tem experiência na área de ensaios clínicos tanto na tera-pia celular (Figura 4) quanto na área de pesquisa clínica em terapia gênica (por exemplo, o grupo do Dr. Renato Kalil, no Rio Grande do Sul, com testes do gene do VEGF no tratamento de doença isquêmica cardíaca). Em particular, na área de terapia celular, em 2008 os ministérios da Saúde e da Ciência e Tecnologia e o Banco Nacional de Desen-volvimento Econômico e Social (BNDES) investiram mais de R$ 52 milhões por meio de Edital da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) na criação de oito Centros de Tecnologia Celular (CTCs), laboratórios para a produção de diferentes tipos de células--tronco em condições GMP, para uso clínico – pelo menos quatro deles já estavam em funcionamento em dezembro de 2014. Assim, o país tem infraestrutura adequada para a condução de ensaios clínicos nas áreas de terapia celular e gênica.

4.5. Incentivo de parcerias

Cada vez mais academia e indústria precisam colaborar, compartilhando recursos e ex-pertises por meio do estabelecimento de parcerias, para o desenvolvimento de novos produtos. Na área de MR, observa-se uma grande atividade de colaborações globais entre empresas da área e instituições acadêmicas/sem fins lucrativos (Figura 14). Além disso, as grandes empresas farmacêuticas também já estabelecem parcerias em MR, o que indica o crescimento e amadurecimento da área (Figura 15).

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Figura 14 – Desenvolvimento de parcerias em MR envolvendo empresas privadas e instituições acadêmicas (2004-2014)

Obs.: Azul – empresas privadas; vermelho – instituições acadêmicas; cinza – instituições sem fins lucrativosFonte: Reproduzido de French et al. (2014)

Figura 15 – Desenvolvimento de parcerias em MR envolvendo as 22 maiores empresas farmacêuticas (2004-2014)

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Fonte: Reproduzido de French et al. (2014)

O Brasil não possui uma cultura de colaborações entre a academia e a iniciativa privada, particularmente na área biomédica. É importante o desenvolvimento dessa cultura, com a criação de um arcabouço legal mais claro e facilitador das interações público/privado na área, e com incentivos para o estabelecimento de tais interações.

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5. Ameaças

5.1. Barreiras regulatórias

As áreas de MR e TG são relativamente novas, e por isso ainda com pouca regulamen-tação no país. Aliás, é importante notar que, mesmo nos Estados Unidos, a regulamen-tação de medicina regenerativa ainda está em construção, e o FDA é contestado com alguma frequência sobre as circunstâncias nas quais o órgão tem direito ou não de inter-vir na aprovação de procedimentos com células-tronco.

A pesquisa clínica no país deve ser aprovada pelo sistema CEP-CONEP (Comitê Insti-tucional de Ética em Pesquisa-Comissão Nacional de Ética em Pesquisa). Apesar de atualmente a CONEP estar sobrecarregada, e por isso demorar em suas análises, existe um plano de descentralizá-las, dando maior autonomia aos CEPs locais.

Além disso, a Anvisa regulamenta (a) Bancos de Células Progenitoras Hematopoiéti-cas (medula óssea e sangue de cordão umbilical) (Resolução da Diretoria Colegiada – RDC56/2010); (b) Banco de Células e Tecidos Germinativos (RDC 23/2011); e (c) Centros de Tecnologia Celular (RDC 9/2011). Mesmo assim, existe ainda uma lacuna regulatória na área de MR, ou seja, a regulação é pouco abrangente. Em 2013, a ANVISA criou a Câmara Técnica em Terapias Celulares, que vai colocar em breve uma RDC so-bre o assunto em consulta pública. É fundamental que esta forneça um arcabouço regu-latório bem definido, para que se possa investir com segurança na área de MR.

Especificamente sobre as células-tronco pluripotentes, a Lei no 11.105/2005 (Lei de Biossegurança) determina:

Art. 5o É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrio-nárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento, atendidas as seguintes condições:

I – sejam embriões inviáveis; ou

II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação desta Lei, ou que, já congelados na data da publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir da data de congelamento.

§ 1o Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores.

§ 2o Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisa ou terapia com células-tronco embrionárias humanas deverão submeter seus projetos à apreciação e aprovação dos respectivos comitês de ética em pesquisa.

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§ 3o É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo e sua prática implica o crime tipificado no art. 15 da Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de 1997.

Apesar de na época de sua aprovação a Lei ter possibilitado a pesquisa com células-tron-co embrionárias humanas no país, a redação do item II (sublinhado pela autora) faz com que somente embriões congelados até o dia 24 de março de 2005 possam ser utilizados. Todos os embriões congelados desde então não estão contemplados pela Lei (com exce-ção dos chamados “embriões inviáveis”, mas que são pouco adequados para os fins de terapia celular), e assim não podem ser usados para MR. Além disso, como as técnicas de criopreservação de embriões evoluíram dramaticamente após 2005, grande parte dos embriões disponíveis para pesquisa no Brasil é de má qualidade após o descongelamento.

Com o surgimento das hiPSCs em 2007, essa limitação em relação à disponibilidade de embriões humanos para obtenção de CTs pluripotentes se tornou a princípio menos re-levante. Porém, como ainda não se sabe quais tipos de CTs pluripotentes serão as mais adequadas para MR, deve-se analisar a possibilidade de se rever a limitação do número e qualidade de embriões humanos disponíveis para pesquisa no país.

Uma segunda limitação legal para o pleno desenvolvimento da área diz respeito à pro-dução de CTs pluripotentes por transferência nuclear (NT-hESCs), como já discutido no item 2.1(c). Ao proibir “a clonagem humana”, o art. 6º da Lei de Biossegurança não deixa claro se se refere a qualquer tipo de clonagem humana – reprodutiva e terapêutica –, criando assim uma incerteza legal. É importante notar que ainda não está claro se as NT-hESCs são superiores a outros tipos de CTs pluripotentes a ponto de se justificar o investimento na técnica, que é complexa e necessita da doação de óvulos humanos.

Sugere-se uma consulta à CNTBio para se esclarecer as duas questões: os embriões disponíveis para pesquisa, e a legalidade de se realizar clonagem terapêutica (transferên-cia nuclear) no país.

5.2. Propriedade intelectual

Segundo a Constituição de 1988 (art. 199):

§ 4º A lei disporá sobre as condições e os requisitos que facilitem a remoção de ór-gãos, tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamen-to, bem como a coleta, processamento e transfusão de sangue e seus derivados, sendo vedado todo tipo de comercialização.

E ainda, segundo a Lei de Biossegurança, de 25 de março de 2005:

Art. 5o É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco em-brionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo procedimento, atendidas as seguintes condições:

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(...)

§ 3o É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo e sua prática implica o crime tipificado no art. 15 da Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de 1997.

Isso representa uma incerteza sobre a possibilidade de se comercializar produtos da medicina regenerativa – o que por sua vez é uma grande barreira para o desenvolvimento da área no país.

Em dezembro de 2014, por solicitação da Agência Brasileira de Desenvolvimento Indus-trial (ABDI), o Dr. Raul Lycurgo (‎Consultor Jurídico no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior – MDIC) apresentou um parecer jurídico sobre a ques-tão, separando a “substância humana” inicial (ou o “antecedente”, os órgãos, tecidos e substâncias humanas retiradas do indivíduo) do produto final (o “consequente”, as células ou produtos gerados a partir do processamento do material inicial). Segundo o Dr. Lycurgo, enquanto é claro que o parágrafo 4o do art. 199 veda a comercialização do antecedente, ele não impede a comercialização do consequente. Esse parecer foi apoiado pelo ministro Ayres Britto, que o complementou, dizendo que, na verdade, não só o parágrafo 4º do art. 199 não proíbe, mas autoriza a comercialização! Parágrafos são acessórios ao caput do artigo principal – neste caso, o art. 199, o qual afirma: “A assistência à saúde é livre à iniciativa privada”. Segundo o ministro, não faria o menor sentido a atuação da iniciativa privada na assistência à saúde se não pudesse haver co-mercialização.

Assim, foi sugerido que a ABDI questione a Anvisa sobre o seu entendimento da ques-tão, para que essa insegurança jurídica se esclareça, e assim o ambiente nacional se torne propício para investimentos da iniciativa privada na área de medicina regenerativa.

Outra barreira para o desenvolvimento da área no Brasil diz respeito à propriedade intelectu-al, pois não se podem patentear células no país. Ficamos assim limitados ao patenteamento de processos de manipulação e injeção das células. Essa barreira, porém, é menor, pois a princípio é possível recorrer a mecanismos como os utilizados por bancos de sangue.

O mesmo se aplica para a terapia gênica, uma vez que um gene humano não pode ser pa-tenteado ou comercializado, mesmo sendo só uma parte de um vetor de terapia gênica.

De qualquer maneira, as duas questões, de comercialização e propriedade intelectual, devem ser solucionadas de forma clara, para que o cenário de incertezas jurídicas não impeça o desenvolvimento da área no Brasil.

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5.3. Dificuldades de importação

Apesar de a área estratégica de medicina regenerativa e terapia celular depender quase que totalmente da importação de equipamentos e insumos, o processo de importação ainda é extremamente ineficiente. Um questionário feito por pesquisadores da UFRJ em 2010 revelou que 99% dos cientistas brasileiros dependem de produtos importados para suas pesquisas (Disponível em: <http://pt.scribd.com/doc/41403849/Pesquisa-Impor-tacao-07112010>). Os pesquisadores esperam de um a 24 meses pela chegada dos produtos importados, que, além disso, ficam presos na alfândega, fazendo com que 76% dos entrevistados já tenham tido material perdido durante o processo. Provavelmente por causa de problemas com importação, 90% dos pesquisadores brasileiros dizem já ter mudado os rumos de seus trabalhos ou até mesmo desistido de realizar algum expe-rimento. O programa Importa Fácil do CNPq deveria ter resolvido essa situação, porém, para 91% dos entrevistados, o programa não melhorou esse cenário.

Além da Receita Federal, a Anvisa também vistoria as remessas enviadas do exterior para pesquisadores. Para a liberação da mercadoria, a agência exige uma documentação exten-sa, assinada pelo pesquisador e pelo responsável legal da instituição, reconhecimento de firmas, e o pagamento de uma Guia de Recolhimento da União (GRU), cujo valor depende da natureza e do número de itens da remessa. A documentação tem que ser enviada por correio ao aeroporto de chegada dos produtos – e uma vez lá, a agência demora tempo indeterminado para analisá-la. Todos esses procedimentos atrasam significativamente a liberação dos produtos, que acabam ficando retidos em média mais de uma semana, nem sempre em condições ideais para a manutenção de sua integridade (pode-se ler um relato de caso em <http://asmeninasonline.com/lygiaveiga/eu-nao-aguento-mais/>).

Segundo seu site, “Criada pela Lei nº 9.782, de 26 de janeiro 1999, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) é uma autarquia sob regime especial, que tem como área de atuação não um setor específico da economia, mas todos os setores relacionados a produtos e serviços que possam afetar a saúde da população brasileira” (destaque da autora). Porém, os produtos para pesquisa não são para uso em seres humanos, e as-sim a comunidade científica entende que a Anvisa não deve ter ingerência no processo de importação de insumos para pesquisa no país. Uma consulta jurídica formal deve ser feita para se esclarecer este ponto, e assim contribuir para a simplificação do processo de importação de insumos para pesquisa.

Se o país quer seriamente investir nas áreas de medicina regenerativa e terapia gênica, a maior prioridade deve ser dada à resolução da questão de importação de insumos e equipamentos. No cenário atual, não teremos agilidade nem custos competitivos para poder desenvolver a área no Brasil.

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5.4. Formação de recursos humanos

Atualmente os recursos humanos nas áreas de MR e TG são principalmente das áreas biomédicas. Foi proposta por participantes da Rede Nacional de Terapia Celular a cria-ção de um curso de pós-graduação em MR, que incluísse também aspectos de produ-ção em condições GMP e desenho de ensaios clínicos, geralmente não cobertos pelos cursos de pós-graduação.

Uma iniciativa recente neste sentido foi a criação em 2013 do curso de Pós-Graduação (Mestrado e Doutorado) em Oncologia Clínica, Células-Tronco e Terapia Celular, no Hemocentro da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP, com o objetivo de “formar pessoal de alto nível para atuar nestas áreas tanto no campo acadêmico como do setor produtivo e governamental” (Disponível em: <http://ead.hemocentro.fmrp.usp.br/

moodle/course/category.php?id=10>).

5.5. Bioterismo padrão Farma

A falta de produção de animais para experimentação em padrão de qualidade exigido pela indústria médica/farmacêutica, assim como a falta de biotérios de experimentação nos mesmos padrões, é uma das maiores barreiras para a ciência biomédica experimental no país. Uma forma eficiente e relativamente rápida de resolver essa questão seria o país fa-zer um acordo com uma multinacional de produção de animais que se instalasse no país – por exemplo, o Jakson Laboratory ou o Charles River Laboratoty International. Tam-bém é preciso a criação de uma facility de experimentação em animais de médio porte dotada dos melhores recursos de infraestrutura (MRI, PET-SPECT-CT, salas cirúrgicas, salas de hemodinâmica, etc.) e de pessoal qualificado. Atualmente, por não termos essa infraestrutura no país, passamos de ensaios em pequenos roedores diretamente para ensaios clínicos em seres humanos – e isto é inaceitável do ponto de vista regulatório.

O Centro de Criação de Animais de Laboratório da Fiocruz produz animais para experimentação, incluindo primatas não humanos. Porém, atualmente os animais não são de qualidade adequada para pesquisa pré-clinica. Mesmo assim, é um centro com estrutura e co-nhecimento que poderia ser melhorado para atender à necessidade de bioterismo de qualidade no país.

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6. Mapeamento de competências no país

O mapeamento de instituições nacionais com competências nas áreas de MG e TC apresentado nas figuras a seguir foi feito utilizando-se o banco de dados Scopus, baseando-se no número de publicações de artigos científicos contendo determi-nado termo no título, resumo ou palavras-chave, entre 2004 e 2014. Note-se que grupos atuantes nas determinadas áreas, mas ainda sem publicações, não estarão identificados.

Figura 16 – Número de artigos científicos publicados entre 2004-2014 contendo “cell therapy” no título, resumo ou palavras-chave, por instituição brasileira

Obs.: Relação das sete instituições mais produtivas, por ordem: 1. USP; 2. UFRJ; 3. Fiocruz; 4. Unifesp; 5. Unesp; 6. UFRGS; 7. Instituto Butantan.

Figura 17 – Número de artigos científicos publicados entre 2004 e 2014 contendo “regenerative medicine” no título, resumo ou palavras-chave, por instituição brasileira

Obs.: Relação das sete instituições mais produtivas, por ordem: 1. USP; 2. UFMG; 3. UFRJ; 4. Unifesp; 5. Unesp; 6.UFRGS.

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Figura 18 – Número de artigos científicos publicados entre 2004 e 2014 contendo “biomaterials” no título, resu-mo ou palavras-chave, por instituição brasileira

Obs.: Relação das sete instituições mais produtivas, por ordem: 1. USP; 2. Unicamp; 3. Unifesp; 4. UFMG; 5. UFRJ;

6. UFRGS; 7. Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN).

Figura 19 – Número de artigos científicos publicados entre 2004-2014 contendo “bioprinting” no título, resumo ou palavras-chave por instituição brasileira

1. E 2. Centro Tecnologia da Informação Renato Archer; 6. UFRGS; 7. Universidade Estadual de Campinas.

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Figura 20 – Número de artigos científicos publicados entre 2004-2014 contendo “decellularization” no título, resumo ou palavras-chave, por instituição brasileira

1. PUC-Paraná; 5. Instituto de Neurologia e Cardiologia de Curitiba; 7. Cultivo Celular do Núcleo de Enxertos Cardio-vasculares; 8. Hospital de Caridade da Irmandade da Santa Casa de Curitiba; 10. UERJ; 11. UFRGS.

Figura 21 – Número de artigos científicos publicados entre 2004 e 2014 contendo “gene therapy” no título, resumo ou palavras chave, por instituição brasileira

Obs.: Relação das sete instituições mais produtivas, por ordem: 1. USP; 2. Unesp; 3. UFRGS; 4. Unicamp; 5. UFRJ; 6. Hospital das Clínicas de Porto Alegre; 7. IPEN.

Conforme é possível notar pelo volume de publicações, estamos tratando de um univer-so ainda novo, em que a instituição que mais produziu teve cerca de 100 artigos publica-dos em dez anos. Mais importante, os dados indicam que a pesquisa em medicina rege-nerativa é concentrada na região Sudeste, particularmente nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, nas quais se destacam como principais centros de referência a USP e a UFRJ. Fora desse eixo, vale chamar a atenção para os grupos de trabalho no Rio Grande do Sul e em Minas Gerais.

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7. Considerações finais

Nos últimos cinco anos, a área de medicina regenerativa cresceu expressivamente no Brasil, principalmente no que diz respeito a: (1) o início de quatro ensaios clínicos com CTs pluripotentes humanas; (2) o desenvolvimento de CTs tecido-específicas, com ênfa-se nas CTs neurais, que se encontram em testes clínicos para diferentes doenças neu-rodegenerativas; e (3) o desenvolvimento de novos materiais e nanopartículas utilizados como arcabouços para células e em bioimpressão de órgãos. No entanto, no Brasil os ensaios clínicos em terapia celular ainda estão restritos ao uso de CTs mesenquimais. Assim, é importante fomentar pesquisas pré-clínicas em terapia celular com CTs pluri-potentes e CTs tecido-específicas no país. Além disso, é importante também fomentar interações entre grupos multidisciplinares das grandes áreas de engenharia e ciências biomédicas, para um melhor desenvolvimento da área de bioengenharia tecidual, incluin-do a produção de células em condições GMP em larga escala e a bioimpressão de órgãos. Essas mesmas competências serão necessárias para a produção de vetores/partículas para a terapia gênica.

Nesses mesmos últimos anos, principalmente com o advento das hiPSCs, o uso de CTs pluripotentes para o desenvolvimento de fármacos teve também grandes avanços. A indústria farmacêutica atualmente investe no desenvolvimento de ensaios celulares com células derivadas de CTs pluripotentes para a diminuição de tempo e custo de desenvol-vimento de novos fármacos. No Brasil existem alguns grupos acadêmicos investindo no uso de CTs pluripotentes para triagem de fármacos. Além disso, identificamos uma nova empresa, Pluricell, ainda instalada no Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecno-logia (Cietec)-USP, investindo nesta área e com grandes interações com a academia. Mesmo assim, uma maior interação entre diferentes setores dentro e fora da academia promoveria uma aceleração do desenvolvimento da área.

Finalmente, entre os gargalos identificados, a questão da falta de agilidade nas importa-ções de insumos para pesquisa se apresenta como um dos maiores – e talvez de solução menos onerosa para o governo. É fundamental a criação de um arcabouço legal, regula-tório e de infraestrutura para que a ciência e inovação brasileiras possam ter a agilidade fundamental para serem competitivas internacionalmente. Esse tema vem sido discutido há décadas no país, sem que nenhuma mudança significativa tenha acontecido.

Assim, as principais recomendações deste panorama são elencadas a seguir.

1. Solucionar os problemas quanto à importação de insumos para pesquisa.

2. Promover maior interação entre grupos acadêmicos de diferentes áreas e compe-tências para a transformação de pesquisa básica e pré-clínica em pesquisas clínicas nas áreas de medicina regenerativa e terapia gênica.

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3. Promover maior interação entre academia e indústria, para que os resultados das pesquisas gerem produtos.

4. Definir juridicamente a possibilidade de comercialização de materiais biológicos hu-manos envolvidos nas diferentes formas de medicina regenerativa, para que a in-dústria se envolva nessa área no país;

5. Elaborar uma estrutura regulatória clara para o desenvolvimento de produtos nas áreas de terapia gênica e medicina regenerativa.

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