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EDUCAÇÃO DO CAMPO: UMA TRAJETÓRIA PECULIAR EM TERRAS
PARAENSES
Adair Rosa Pereira/UFPA- Abaetetuba/ [email protected] da Silva/UFPA – Abaetetuba /[email protected]
Elisia Melo Lopes/UFPA- Abaeteteba/[email protected] Rita Duarte de Oliveira/UFPA-Abaetetuba/[email protected]
RESUMO
O estudo objetiva analisar experiências desenvolvidas na Educação do campo no Pará através de uma pesquisa bibliográfica como forma de contribuir para a discussão dos direitos da população camponesa à educação formal pública, gratuita e de qualidade, como o estabelecido pela lei 9394/96. Porém, a falta de uma política educacional voltada à realidade camponesa leva ao distanciamento entre as necessidades educacionais dos camponeses e o objetivo proposto na legislação em vigor. Diante dessa realidade, faz-se necessário pesquisar a realidade da educação do campo paraense.
Palavras- chave: Educação do campo, experiências, políticas públicas
EDUCACIÓN DEL CAMPO: UN TRAYECTO PECULIAR EN TIERRAS PARAENSES
Adair Rosa Pereira/UFPA – Abaetetuba/[email protected] da Silva/ UFPA – Abaetetuba / [email protected]
Elisia Melo Lopes/UFPA- Abaeteteba/[email protected] Rita Duarte de Oliveira/UFPA-Abaetetuba/[email protected]
RESUMEN
Este estudio tiene el objetivo de analizar experiencias desarrolladas en la Educación del Campo en Pará por una pesquisa bibliográfica como forma de contribuir para la discusión de los derechos de la población campesina a la educación formal pública, gratuita y de calidad, como el establecido por la ley 9394/96. Sin embargo, la falta de una política educacional destinada a la realidad campesina lleva al alejamiento entre las necesidades educacionales de los campesinos y el objetivo propuesto en la legislatura vigente. Frente a esta realidad, resulta necesario pesquisar la realidad de la educación del campo paraense.
Palabras llave: Educación del Campo. Experiencia. Políticas públicas.
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Rural Education: The Peculiar Trajectory Concerning Land in Pará State
Adair Rosa Pereira/UFPA- Abaetetuba/ [email protected]
Deusinaldo da Silva/UFPA – Abaetetuba /[email protected]
Elisia Melo Lopes/UFPA- Abaeteteba/[email protected]
Mara Rita Duarte de Oliveira/UFPA-Abaetetuba/[email protected]
Abstract:
The objective of this study is to analyze experiences that have been developed around rural education (Educação do Campo) in the state of Pará. Through a critical literature review, my intent is to contribute to discussions concerning the rights of peasant populations, particularly with respect to free, public and quality education as established in Law 9394/96. I note how the lack of educational policy oriented around the particular nature of peasant realities creates a gap between these populations’ needs and the objectives found within the legislation. Given this reality, it is necessary to further study rural education in the state of Pará.
Key-Words: Rural Education, Educação do Campo, Experiences, Public Policies
1. Introdução
Mesmo diante das imposições sócio-culturais, econômicas e históricas à população
do campo e dos diversos mecanismos de reprodução social apresentados pelas políticas
implementadas no meio educacional rural, numa tentativa de homogeneizar a educação,
desvalorizando as diferenças históricas e culturais construídas dentro dos processos
educativos e que se desencadeiam no interior das relações sociais, não podemos deixar de
lembrar o alerta de Arroyo ao afirmar que há outra pedagogia em marcha (1995, p.80), em
que a história das lutas entre as classes sociais não se limitam à luta pelo poder, mas se
constituem impulsionadoras da história da humanidade que não aguardam passivamente seu
destino, mas ao contrário: articulam-se em torno de suas lutas para garantir seus direitos, sua
dignidade e sua participação democrática na sociedade.
Deste modo, as classes hegemônicas, através dessas políticas educacionais, se
revestem de outra roupagem na tentativa de continuar no controle da oferta da escolarização.
Porém, os movimentos sociais, opositores a essas classes, conscientes de seu poder de
articulação, empunham bandeiras de lutas por uma educação alternativa que se materialize
2
em uma pedagogia da resistência.
Frente a essa realidade, o desafio posto, tem sido pensar em uma educação do
campo, em uma escola do campo, que visualize as mudanças sociais e consiga acompanhá-
las, ao mesmo tempo em que possibilite a formação omnilateral1, vinculando o saber
universal às experiências de vida dos (as) educandos (as), para que se tornem sujeitos
participativos, dialógicos, humanizados e capazes de estabelecer os alicerces de uma nova
ordem social.
Deste modo, mais recentemente as transformações sociais e a revitalização dos
movimentos ligados à luta do campo, influenciaram significativamente na definição de novas
diretrizes para a educação básica do campo, essas se referem desde a oferta da escolarização
a seu financiamento. Encontramos na década de 90 um novo formato de educação destinada
ao meio rural2. O governo federal, através de parceria com os vários ministérios e com
movimentos ligados à luta do campo, lançou vários programas e projetos para a educação do
campo. Esses são conquistas históricas desses movimentos que sempre estiveram à frente de
seu tempo na luta pela democratização do ensino no Brasil. Entretanto, é preciso estar alerta
para que tais conquistas não sejam transformadas em instrumento de cooptação e controle do
estado sobre a ação da sociedade civil organizada.
Como fruto dessas lutas contemporâneas no campo educacional nasceu às diretrizes
para a construção do projeto popular para as escolas do campo, ao mesmo tempo em que se
fortalecem as iniciativas já existentes da Pedagogia da Alternância3, todas vinculadas a um
projeto maior de sociedade e ao mesmo tempo fundamentadas na legislação da educação
brasileira, que como conquista dessa luta histórica dos movimentos sociais e das organizações
governamentais e não governamentais, conseguiram garantir o reconhecimento da
singularidade, da importância e contribuição da educação do campo para o desenvolvimento
social.
1 Desenvolvimento pleno da capacidade intelectual e física, sem perder de vista a reflexão crítica.2 Para nós a expressão meio rural não dar conta da complexidade do mundo rural e de suas populações por isso no decorrer deste trabalho, em especial em nossas considerações finais, optaremos pela expressão do campo, para designar todos os processos inerentes a essas populações.3 A Pedagogia da Alternância permite aos jovens (alunos) alternarem período de vida de estudo e trabalho na escola e com a família na propriedade rural (lote), integrando assim escola, família e comunidade. Portanto, o alvo a ser atingido nesta concepção pedagógica é a formação global/integral da pessoa, levando em considerações as dimensões: intelectual-profissional, humano-social e ético-espiritual. (Projetos pedagógicos da EFA-Marabá, 2002).
3
Nesse contexto da legislação brasileira atual, não poderíamos de abordar os aspectos
importantes e relevantes para a educação do campo, trazidos pela Nova Lei de Diretrizes
e Bases da Educação (LDB 9394/96) em seu artigo 26, especificando a necessidade de
uma base comum e da formação ampla do cidadão que possa contemplar as características
regionais e locais da sociedade brasileira, o que ajuda na construção e na apropriação de
saberes universais inerentes à formação humana, em que o (a) educando (a) tenha condições
de transitar dentro dos espaços coletivos, quer urbanos, quer rurais.
O artigo 28 refere-se com clareza à oferta de educação básica para a população do
campo, respeitando-se às peculiaridades das regiões e afirmando que se deve priorizar a
construção de metodologias e a elaboração de conteúdos curriculares apropriadas à realidade
dos (as) alunos (as), incluindo-se a preocupação com a adequação do calendário escolar
de acordo com a realidade agrícola sazonal, sócio-econômica e cultural das populações do
campo.
Nesse aspecto, podemos afirmar que a nova LDB é inovadora, pois reconhece
em seu texto original a diversidade sócio-cultural das populações do campo, assim como
reafirma o direito à igualdade e à diferença, no caput do art. 5º da Constituição Brasileira.
Assim nos parece que tanto a 9394/96 como a Constituição de 1988, tentam em certa medida
romper com a lógica excludente irracional de um projeto educacional até então dirigido a
essas populações, porém os avanços mais significativos ainda não foram incorporados pela
lei, nem tão pouco pelos gestores da educação.
Observamos que tanto o artigo 26º, quanto o artigo 28º da lei 9394/96 avançam, em
nossa análise, no sentido não apenas da reivindicação da escolarização básica do campo, mas
inegavelmente retoma o princípio da inclusão social dessas camadas historicamente alijadas
dos processos decisórios da sociedade contemporânea brasileira.
Quanto à aplicação dos recursos, no § 2º do art. 2º da lei 9394/96 estabelece com
especificidade no atendimento escolar do campo apontando a necessidade de se respeitar a
pluralidade e a diversidade sócio-econômico das regiões brasileiras ao instituir a distribuição
de recursos do Fundo de Manutenção de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e
Valorização do Magistério (FUNDEF) 4.
4 Hoje FUNDEB.4
Entretanto, é preciso lembrar que a lei, apesar de normativamente ter chegado aos
lugares mais recônditos de nosso país, às regiões mais longínquas e agrestes, notamos poucas
alterações no quadro educacional, no que se refere à garantia de espaço físico adequado ao
ensino, valorização docente, adequação dos calendários escolares e conteúdos curriculares
à realidade sócio-cultural das populações do campo. Então, fica patente a necessidade de
estabelecer-se um programa de continuidade que possa sinalizar e garantir os avanços
educacionais propostos pela lei.
2. Educação do campo: processos de construção e disputas
No Brasil as lutas pela terra que se travaram nos anos 80, apresentaram visíveis
transformações no panorama da educação rural e no projeto nacional de reforma agrária.
Essas lutas mobilizaram-se em torno do processo Constituinte de 1988 quando, na
Constituição se especificou o pleno desenvolvimento da pessoa, para o exercício da cidadania
e sua qualificação para o trabalho. Com isso, fez se incorporar o princípio da participação
direta na administração pública e também a criação de conselhos gestores como forma
de controle popular nas definições políticas do país. Segundo Molina, o movimento por
educação do campo traz, em sua origem, a constituição de um novo conceito e significado,
quando nos diz: “o paradigma da educação do campo nasceu da luta pela reforma agrária.
Afirmamos que esta luta cria e recria o campesinato em formação do campo não poderia ficar
restrita aos assentamentos rurais. Era necessária a sua espacialização para as regiões, para as
comunidades de agricultura camponesa” (MOLINA, 2004, p. 67).
Nos anos 90, os povos organizados do campo conseguiram agendar na esfera
pública a questão da educação do campo como uma questão de interesse nacional que se
fizeram ouvir como sujeitos de direitos. Trouxe, desta forma, contribuição para a educação do
campo. Concretizando-se pela lei de diretrizes e bases da educação (LDB 9394/96) que
definiu diretrizes para a construção da educação básica do campo, o que ajudara na
construção e na apropriação de saberes universais inerentes à formação humana, em que o tal
educador (a) procura oferecer uma educação ao meio rural. O modelo de desenvolvimento,
que se encontra no Brasil é apenas como mais um mercado emergente, predominantemente
5
urbano. Enquanto o camponês e o indígena são vistos como espécies em extinção. Então em
1998 se deu a 1º conferência nacional por uma educação básica do campo que surgiu pela
articulação nacional por uma educação do campo, composta pelos membros de secretaria
executiva da conferência UNICEF, UNESCO, CNBB (CPT, CIMI, MEB), MST (ITERRA) e
UNB (GTRA).
Contribuiu na mobilização do povo do campo para a construção de políticas públicas
de educação e na reflexão político-pedagógica partindo das práticas já existentes. Ainda em
1998 surgiu o programa nacional de educação na reforma agrária o PRONERA, INCRA,
MDA que contribuiu para escolarização formal para os trabalhadores rurais assentados rede
de universidades públicas e escolas técnicas, movimentos sociais e sindicais, secretarias
de educação, em todos os estados da federação. No qual desenvolve projetos de pesquisa
e extensão em diferentes áreas do conhecimento rural e melhoria das condições de vida
e qualificação para atuar no desenvolvimento sustentável dos assentamentos. Oliveira
afirma que “muitos programas educacionais foram elaborados com intuito de acompanhar
as inovações no campo político-econômico e social da sociedade brasileira no século XX”
(OLIVEIRA, 2003, p.22).
Com as lutas de fazer sujeito com seus próprios sujeitos, os sujeitos desta história
continuam fazendo história em 2002 se incorpora o grupo permanente de trabalho (GPT) de
educação do campo do MEC. Este grupo surgiu dos grupos do povo do campo que são eles.
Sem-terra, povos da floresta, pescadores, quilombolas, ribeirinhos, extrativistas, assalariados
dos rurais.
Neste mesmo ano de 2002, foi conquistada Diretrizes Operacionais para a educação
básica nas escolas do campo que teve como resolução nº 1/2002 do CNE/CEB é uma
conquista de nossa caminhada. É uma mostra desse triunfo esta no parágrafo único do artigo
2º:
A identidade da escola do campo é definida pela sua vinculação as questões inerentes a sua realidade, ancorando-se na temporalidade e saberes próprios dos estudantes, na memória coletiva que sinaliza futuros, na rede de ciência e tecnologia disponível na sociedade e nos movimentos sociais em defesa de projetos que associem as soluções exigidas por essas questões à qualidade social da vida coletiva do país”. (resolução CNE/CEB 1/2002)
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Destacamos ainda, nas lutas desse movimento o ano de 2004 a criação da secretaria
de educação continuada, alfabetização e diversidade (SECAD) tendo quatro departamentos
principais: educação de jovens e adultos, desenvolvimento e articulação institucional.
Desenvolvimento, avaliação e informações educacionais, educação para a diversidade e
cidadania. Esta última se constituiu por cinco coordenações que são ações educacionais
complementares, diversidade e inclusão social, educação ambiental, educação do campo,
educação indígena. Só a educação do campo mostra eixos para a construção das políticas de a
partir de uma base científica para a superação da dicotomia campo-cidade e articulação entre
educação e desenvolvimento sustentável. Tais eixos da educação do campo serviram também
neste mesmo ano de 2004, para o II plano nacional de reforma agrária com a participação dos
movimentos sociais no qual contribuiu para novas políticas para viabilizar o desenvolvimento
dos assentamentos no qual se deu a prioridade para ações de educação e formação.
2.2. A história da educação do campo em terras paraenses
A construção de sua história a educação do campo tem sido feita principalmente
a partir das experiências das escolas multisseriadas que se concentram na região Paraense.
O grupo de Estudo em Educação Rural na Amazônia-GEPERUAZ aponta que a maioria
destas escolas multisseriadas está em situação precária e precisando de um projeto educativo
construído pela população camponesa, assim como a definição e operacionalização de
políticas públicas,
No caso do Pará, nos deparamos com o segundo maior número de escolas multisseriadas do país. 8.675 escolas, perdendo somente para a Bahia, que tem 14.705 escolas. O mesmo se repete em relação às turmas multisseriadas, que totalizam 11.231 (HAGE, 2006; p.161).
Os pesquisadores dessa área sempre se mobilizaram por esta educação que é
“abandonada” pelos poderes públicos. Sendo que, os documentos legais afirmam que
educação é um compromisso público e social e que é um direito de todo cidadão brasileiro.
7
Por outro lado há uma forte luta pela elaboração de políticas educacional para
o campo do Pará com as contribuições de Fórum e seminário que fortalece as lutas e
organização povo campesino. E essas contribuições fazem parte da história da Educação do
Campo do Pará como revela Hage:
Elaborações das políticas educacionais para o campo do Pará têm fortalecido a atuação do Fórum Paraense de Educação do Campo, que desde 2004, tem se colocado com mais intensidade nesse processo na Amazônia. (HAGE, 2005, P.3.)
Os movimentos sociais e as organizações políticas existentes na região
Amazônica defendem políticas públicas para um desenvolvimento rural com qualidade social
as populações, e principalmente os trabalhadores do campo que se denominam agricultores,
as famílias, indígenas, quilombolas, extrativistas ribeirinhos e pescadores como afirma Hage
que o:
III Seminário Estadual congregado Entidade da sociedade civil, movimentos sociais, instituições de ensino, Pesquisa, Órgãos Governamentais de fomento ao desenvolvimento e da área educacional da sociedade Paraense, que buscam defender implementar, apoiar, fortalecer políticas publicas estratégias de educação do campo e desenvolvimento rural com qualidade social para todos cidadãos paraenses,sobre tudo para população do campo aqui entendidas como: agricultores as famílias, indígenas, quilombolas, extrativistas, ribeirinhos e pescadores.(HAGE, 2005, p.3).
Uma das contribuições que foi tecida na construção da história da educação
do campo na região Paraense é o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária
(PRONERA), que vem se destacando com seus saberes específicos desde alfabetização de
jovens e adultos até a formação acadêmica que tem como parceira Universidade do Pará. Essa
experiência é fruto dos anseios da luta do movimento da educação do campo que homens,
mulheres jovens e crianças sejam os seus próprios sujeitos de suas histórias. Como afirma
Oliveira.
8
MST também desenvolve em parceria com a Universidade Federal do Pará o programa nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA) que se estende desde alfabetização de jovens e adultos a formação acadêmica de nível superior dos educadores e educadoras do MST, além de escolas de ensino fundamental difundidas nos acampamentos e assentamentos (OLIVEIRA, 2003, p.8).
Um novo jeito de envolver e fazer a educação do campo, de ser pessoa e sentir que a
educação é seu direito. Na região de Marabá (Pará), também vem se construindo a história da
construção da sociedade Paraense. Contribuindo através da Escola Família Agrícolas (EFA)
que contribui com a educação dos jovens agricultores desta região. No qual foi criada pelos
sindicalistas e jovens agricultores na organização de projetos que levou a realização do I
encontro de jovens camponês dos STRs da FATA/CAT. Como afirma Oliveira.
O projeto de educação para jovens agricultores da região de Marabá-Pá surgiu em outubro de 1993, no I encontro de jovens camponês dos STRs da FATA/CAT [.] foi criada uma comissão de articulação para implantação da Escola Família Agrícola (EFA), formada por sindicalistas e jovens agricultores. (OLIVEIRA, 2003, P.8)
A experiência da escola família agrícola (EFA) na região de Marabá contribui para
educação do campo para compreender que a realidade do educando e família é de grande
importância para o desenvolvimento humano e no processo de da aprendizagem no qual este
ser se sente responsável de contribuir no processo organizacional em que vive e sente também
consciente de seu papel de cidadão na sociedade. Sendo consciente de seu papel de cidadão
ele terá conhecimento. E com este conhecimento ele se torna pessoa dialógica e crítica de sua
realidade onde vive. Como diz Oliveira,
A associação de famílias profissionais e entidades, que juntas buscam a promoção do desenvolvimento do meio rural através da educação, utilizando a Pedagogia da Alternância. O objetivo principal da EFA é promover o desenvolvimento sustentável do meio rural, estimulando o espírito de solidariedade através da formação do (a) jovem agricultor (a) que, possuidor de um saber universal, possa contribuir para esse desenvolvimento, fortalecendo a identidade do agricultor familiar e revitalizando as práticas culturais desses sujeitos na sua realidade local. (OLIVEIRA, 2003, p.42)
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Vale ressaltar que MST sendo a precursora da educação do campo se estalou no Pará
destes 1984 formalmente e que tinha como características facilitar a violência em que nesse
período a luta era denominada posseira como revela Manaças em sua entrevista.
O MST existe formalmente desde 1984, e veio para o Pará já dentro de um esforço nacional do movimento, então recém-constituído. Nesse período, no Estado, já existiam lutas pela terra, de forma espontânea. O que caracterizava os conflitos aqui era a luta posseira, para a garantia da sobrevivência: uma família, o lote e a arma. A violência foi uma das características fundantes do Pará. A disputa pelo território. (MANAÇAS, 2002)
Em dezembro, o presidente Lula assinou um decreto autorizando o Instituto Nacional
de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) a desapropriar uma fazenda no município de
Rio Maria, no sudoeste do Pará. A medida representa a segunda vez no Brasil que uma área
é declarada para fins de Reforma Agrária levando-se em consideração o descumprimento da
função social no aspecto da preservação ambiental. O decreto do governo foi uma sinalização
muito positiva, alinhado com uma bandeira histórica dos movimentos sociais, mas ainda
incipiente diante do desafio que temos na região amazônica.
A história da educação do campo vem se construindo uma democratização.
Movimentos sociais como o MST vem se dedicando a questão da educação. Em busca de
democratização da educação, os movimentos têm lutado não só por construção de escolas,
mas também a busca plena de uma educação de qualidade.
O MST, junto com outros movimentos sociais, resolveu, nos últimos dez anos, se dedicar muito à questão da educação. Mas isso vai além da construção de escolas. Nós acreditamos que nenhuma comunidade camponesa conseguirá se desenvolver com plenitude se não houver uma democratização do acesso à educação (MANAÇAS, 2002).
A luta por uma educação de qualidade que possa ir além da construção de escolas,
passa pela organização de propostas educacionais adequadas. Daí a necessidade das
Universidades terem participação, seja pesquisando ou elaborando propostas capazes de
reconhecer a peculiaridade da educação do campo. Ou seja, encontrar “modelos específicos”
para a educação do campo. Por isso a necessidade de debates, pesquisas, estudos, mas que
deve ser lembrado isso tudo tem sido fruto de conquistas desses movimentos sociais, segundo
Manaças:
Então resolvemos construir uma proposta dentro deste tema. E para isso tomamos medidas como pressionar as universidades a reconhecerem a educação do campo
10
como um modelo de educação específico. Esses debates recentes na universidade sobre a educação no campo, que inclusive têm sido alvo de pesquisas, estudos e formulações, foram uma conquista dos movimentos sociais. ((MANAÇAS, 2002).
No Pará encontra-se a maior escola do campo do Brasil. Situada no assentamento
Palmares, com mais de 517 famílias. Segundo Manaças, o ensino é de qualidade, e a
infraestrutura da escola muito boa, atingindo quase dois mil alunos. O assentamento Palmares
está localizado no município de Parauapebas e contemplam aulas de primeiro e segundo
graus:
Aqui no Pará, por exemplo, conseguimos construir, no assentamento Palmares, no município de Parauapebas - um assentamento de 517 famílias - a maior escola do campo no Brasil. São quase dois mil alunos, com aulas para o primeiro e segundo graus. O ensino é de qualidade e a infraestrutura da escola muito boa (MANAÇAS, 2002).
A conquista da Educação é vista como necessária e de suma importância para
qualificar os assentamentos. Sabem que a conquista da educação representa conhecimento,
isso contribui para a melhoria nos assentamentos e na organização de suas lutas. Significa
mais consciência sobre suas conquistas e a necessidade de continuar em busca de uma
qualidade de vida melhor, sabendo que estão em um dos Estados mais violentos do Brasil, em
relação aos conflitos no campo.
Nós percebemos o reflexo das conquistas na área da educação nas famílias e sabemos de sua importância para agregar conhecimento a nossa luta e qualificar os assentamentos. [...] A história do MST no Pará é marcada por muitas dificuldades. É o Estado mais violento do Brasil em relação à questão dos conflitos no campo. Só nos últimos anos, foram mais de 600 assassinatos. Portanto, a atuação de um movimento social como o MST acaba sendo marcada por muita violência também. Em 1998, nós perdemos dois dirigentes, o Fusquinha e o Doutor. Em 1996, perdemos 19 trabalhadores rurais no massacre de Eldorado do Carajás. São marcas muito dolorosas em nossa história (MANAÇAS, 2002).
O anseio por uma educação de qualidade tem feito os movimentos sociais buscarem
junto às Universidades cursos que sejam importantes para a realidade do campo tais como:
agronomia, pedagogia, letras, integrando conhecimento científico com a vida no campo. Com
isso também se tem buscado o desenvolvimento social, saúde integrada com o meio ambiente.
Porém, o MST conseguiu construir assentamentos de referência no desenvolvimento da vida social, da escola, da educação, com saúde de qualidade integrada ao meio ambiente - e não somente aquela voltada a dar o remédio para quem está doente. [...] Nós conseguimos conquistar formação. A academia se abriu para o MST. Criamos, junto com a Universidade Federal do Pará (UFPA), três cursos: um de Agronomia, um de Pedagogia e agora uma turma de Letras, para agregar conhecimento científico
11
à vida no campo (MANAÇAS, 2002)
A luta por uma educação do campo além de outras coisas deve enfatizar a
necessidade de uma consciência social. E isso vai alem de escolas construídas, de números
de salas. Na verdade, se confunde com a própria vida, a conquista de qualidade de vida, a
alimentação, o meio ambiente, a liberdade. Essa ainda é a pauta presente: violência no campo,
trabalho escravo, crimes ambientais, falta de alimentos, má distribuição das terras e das
riquezas.
3. Considerações finais
O que temos visto no Brasil é que as camadas populares foram alijadas do processo
decisório sobre seus próprios destinos e isso ainda está distante de ser mudado. Todavia,
encontramos resistências de alguns segmentos sociais que atuam no campo e que reclamam
uma maior participação no direcionamento do país para a superação de suas dificuldades
sociais, estabelecendo vínculos entre si e se organizando em torno do bem comum.
Para alterar essa realidade é preciso a defesa e a construção de um projeto
de educação de qualidade, que resgate a dignidade social das camadas populares, tão
marginalizadas e desprovidas de suas condições básicas de sobrevivência. Em outras palavras,
acenamos para uma proposta de educação básica que assuma, de fato, a identidade do campo,
não só como ajuda efetiva no contexto específico de um novo projeto de desenvolvimento no
campo (Conferência Nacional por uma educação básica no Campo, 1998, p. 29).
A educação, especialmente aquela que deve se processar na realidade do campo
deve ser entendida como meio de apropriação e possibilidade de criação de conhecimentos
para os indivíduos através do domínio da leitura e da escrita inclusive, gerando um cidadão
capaz de inserir-se criticamente no universo social da própria leitura e da escrita, agindo numa
perspectiva transformadora.
Assim, para motivar nossas proposições no universo do possível, já elucidamos
vários projetos em curso e outros já realizados em décadas anteriores, entre os quais a Escolas
Família Agrícola (EFAs), as escolas dos assentamentos e acampamentos do Movimento dos
Trabalhadores Sem Terra (MST), Casas Familiares Rurais (CFR´s) e o Programa Nacional de
Educação na Reforma Agrária (PRONERA).
12
Essas experiências são marcadas pela compreensão de que é urgentemente preciso
uma escola voltada para a realidade daqueles que habitam o campo, em igualdade social
de oferta de escolarização e de qualidade de ensino. E é assim que se vão construindo tais
iniciativas no contínuo devir dos processos históricos e sociais, sem se desconsiderar, é claro,
a realidade desses grupos.
E é com base na crença de dar continuidade à transformação social e à cultura
popular, que os movimentos sociais insistem em fazer, em construir, a história e celebrar seus
compromissos com as lutas das populações do campo.
Acreditamos que não basta à otimização do acesso à escolarização básica, mas
é necessário afiançar (e acima de tudo) os investimentos em projetos educacionais que se
articulem melhor com as comunidades as quais devam beneficiar e não as marginalizando, em
nenhum momento, dos processos decisórios.
Eis aí o porquê da importância das experiências exemplificadas anteriormente,
porquanto constituem contribuições fundamentais para uma escola do campo, emancipatória,
reivindicativa e singular. Uma escola que seja um espaço político e pedagógico ao mesmo
tempo, em que o tempo-escola e o tempo-comunidade se equacionem, onde professores e
professoras assumam uma identidade cultural que lhes pertence e que os (as) educadores
(as) desenvolvam práticas alternativas de ensino que desmonte a linguagem da lógica da
dominação (GIROUX E MACLAREN, 1995, p.140).
Uma ação docente-discente que abarque a dimensão cotidiana da escola, em
que os sujeitos escolares atribuam sentido às suas vidas através das complexas formas
históricas, culturais e políticas e não apenas as incorporem, mas que sejam capazes de
produzi-las (GIROUX E MACLAREN, 199, p.145).
A escola deve ser um lugar gostoso (ASSMANN, 2000, p. 23) e ao mesmo tempo
um espaço criativo para que os sujeitos escolares possam construir novos conhecimentos.
O conhecimento só emerge em sua dimensão vitalizadora quando tem algum tipo de
ligação com o prazer. (ASSMANN, 2000, p.30). Somente quando prazer e conhecimento
estabelecem ligações, é que a aprendizagem flui, e não como um amontoado de coisas que
vão se reunindo, mas como um saber histórico com a marca do aprendiz.
Nesse longo caminho, cheio de obstáculos e descontruções, é imprescindível uma revisão
radical de valores, uma crítica ao modelo pedagógico que esteve e ainda está instituído em nossas
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escolas e na realidade educacional de Rondon do Pará.
E muito mais do que essa revisão radical de valores, é ainda necessário restabelecer
parâmetros decisórios acerca dos projetos destinados às escolas, vislumbrando-se a elaboração de um
projeto educacional coletivo, em parceria com todos os sujeitos envolvidos (alunos (as), professores
(as), comunidade rurais e técnicos).
Estamos nos referindo a um projeto de educação rural que não seja apenas um programa a
ser implementado nas zonas rurais, mas que, fundamentalmente, desponta em suas próprias estruturas
devido às necessidades e perspectivas das populações rurais. (PETTY et al, 1981, p.34).
Fazer uma escola do campo possível, uma escola que leve em conta as
peculiaridades e carências dos (as) aluno(as) e a elas se adapte nas metodologias, nos
conteúdos e na organização do processo pedagógico (ARROYO, 1991, p.27), e que, ao
mesmo tempo, reconheça e valorize o significado social das manifestações culturais e
atenda aos interesses coletivos daqueles que dela possam e querem se beneficiar é tarefa dos
movimentos sociais atrelados à luta campesina.
Só assim será possível escrever outra história da educação do campo no Pará, uma
história que ainda está por ser feita. Enfim, a proposição que defendemos é que só podemos
fazer uma educação verdadeiramente emancipadora, em uma perspectiva (r)evolucionária,
apenas se sonharmos (com paixão e utopia) na construção de uma escola rural, fruto da
identidade cultural dos grupos sociais que estão no campo, na qual a riqueza cultural esteja
aliada à riqueza tecnológica, possibilitando, desta maneira, a formulação de um saber-cultura
que permita a realização pessoal e humana dos sujeitos do campo.
4. Referenciais:
ARROYO, Miguel (Org.). Da escola carente à escola possível. São Paulo: Edições Loyola 1991.
________. O direito do trabalhador à educação In: MINAYO, Carlos. Trabalho e Conhecimento: Dilemas na educação do trabalhador. et. al. 3ª edição. São Paulo: Cortez, 1995. p. 75 a 92
BRANDÃO, Carlos Rodrigues: o que é educação: Carlos Rodrigues Brandão. –33 Ed- são Paulo: brasiliense. 1005- coleção primeiros passos: 2001.
Brasil. [Constituição (1988)]. – Rio de Janeiro: FAE, 1989.
CHIZZOTTI, Antônio. Pesquisa em ciências humanas e sociais, 6ª Ed. São Paulo: Cortez 2003.
14
FREIRE, Paulo. Extensão ou comunicação? Tradução de Rosisca Darcy de Oliveira / prefácio de Jacques Chonchol. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977. 93 p. (O Mundo, Hoje, y, 24)
ASSMANN, Hugo. Reencantar a educação: Rumo à uma sociedade aprendente. 4ª edição. Petrópolis (RJ): Vozes, 2000.
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Consulta:
Amazônia.org.br
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MANAÇAS, Ulisses. MST protesta contra impunidade no massacre de Carajás. htpp://www.oliberal.com.br 18/04/2002 – acesso 21/04/2010.
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Formulário de Parecer sobre Artigo
Caro (a) Parecerista,
Encaminhamos, em anexo, o artigo inscrito para publicação em 02 livros da Educação do Campo.
Título do Trabalho:
1. Círculo Temático: Estado, Movimentos Sociais e Políticas Públicas em Educação do Campo
QUESITOS BÁSICOS:
1) Título do trabalho adequado ao assunto tratado no Resumo( ) Muito Bom ( ) Bom (X ) Regular ( ) Insuficiente
2) Resumo coerente na argumentação teórica e nas informações apresentadas( ) Muito Bom ( ) Bom (X ) Regular ( ) Insuficiente
3) Trabalho pertinente em relação à área da Educação do Campo( )Muito Bom (X ) Bom ( ) Regular ( ) Insuficiente
4) Relevância e pertinência do trabalho com relação ao Círculo Temático( )Muito Bom ( ) Bom (X ) Regular ( ) Insuficiente
5) Consistência teórica e metodológica( )Muito Bom ( ) Bom ( ) Regular ( X) Insuficiente
6) Correção e clareza lingüística na construção do Resumo( )Muito Bom ( ) Bom ( ) Regular ( x) Insuficiente
7) Avaliação final: ( X ) Aprovado ( ) Não aprovado
Parecer sobre o Resumo (quando não aceito justificar brevemente)
Aprovado c/ restrição (REGULAR) em função de necessidade de revisão do texto devido: a) aplicação inadequada das normas da ABNT; b) clareza linguística porque o texto exige revisão em termos de pontuação, concordância e clareza devido apresentar ausências de palavras que impossibilitam compreensão do texto; articulação entre texto e citação direta; ausência de unidade nas referências; resumo não contém objetivo claro, metodologia, resultados e conclusões; introdução não especifica tema, problema, objetivo, metodologia e síntese dos tópicos tratados;
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ausência de clareza no campo teórico Daí necessidade de revisão pelos autores em função da relevância do tema
Local: Belém/Pará. Data:22/09/2010
Nome do(a) Avaliador(a): MARIA MARIZE DUARTE
Instituição do(a) Avaliador(a): UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ
Solicitamos o envio de seus pareceres até o dia 08 de setembro.
Agradecemos a sua colaboração,
Coordenação do Evento
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PRESSUPOSTOS A CONSTRUÇÃO DE UMA NARRATIVA-RIO
Mara Rita Duarte5
Tânia Sarmento-Pantoja6
Pra chegar até aqui onde estou bote mundo, bote mundo
atravessado de cabo- a- rabo. Nem se fala de distâncias,
de rumos, caminhos e lonjuras. Se o senhor viesse só de
lancha ou de canoa, andando por riba d’água, acho que
nunca que chegava. Pra chegar aqui o senhor deve ter
mergulhado bem no fundo. Mergulhado tempos, outros
tempos. Deve ter atravessado mundos, outros mundos. E
desses mergulhos, deve ter boiado muitas vezes quase sem
fôlego, se afogando sempre, morrendo-vivendo, vivendo-
morrendo, mas buscando sempre.
Benedicto Monteiro
A epígrafe acima é um fragmento do romance A terceira margem, do escritor paraense
Benedicto Monteiro. É mais especificamente trecho da fala de um dos seus protagonistas-
narradores, o ribeirinho Miguel dos Santos Prazeres. Miguel é um desassossegado. Isso
porque recusa ser aprisionado por qualquer que seja o veículo do encarceramento: seja
o Estado coercivo, seja o mundo capitalista-produtivo, sejam os afetos. Nada o engessa.
É também um ser com consciência profunda da sua identidade e da sua história e como
5 Doutora em Educação. Professora da Universidade Federal do Pará. Ministrou as disciplinas Tecnologias Informática e Educação e Avaliação educacional para o Curso Pedagogia das Águas.6 Doutora em Estudos Literários. Professora da Universidade Federal do Pará. Foi coordenadora pedagógica do Curso Pedagogia das Águas, de 2007 a 2008.
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amazônida e como ribeirinho um amante delicado e atencioso da Água, elemento que sem
dúvida é o seu elo com o mundo e com o outro a quem se reporta. Esse encantamento do
ribeirinho com o meio elementar em que vive interpõe-se no diálogo com a alteridade e é o
princípio movedor da narrativa em que ele, enquanto ribeirinho, se coloca na e pela sua fala.
É, portanto, pela linguagem e com a linguagem que Miguel difere da alteridade.
A epígrafe se faz assim provocativa e a propósito do pensar sobre as relações entre
memória, ressentimento, identidade e potências transformativas. O fazemos considerando
uma experiência específica na área de educação, cujas motivações serão delineadas mais
adiante. A atividade foi realizada com alunos da Universidade Federal do Pará, ingressos
nesta IES no ano de 2007, pertencentes a uma turma implantada a partir do Programa
Nacional da Reforma Agrária (PRONERA), a turma Pedagogia das Águas, como ficou
conhecida desde sua institucionalização. O manuseio das categorias ressentimento, memória,
identidade, visou fundamentar e favorecer as relações entre indivíduo e territorialidade.
MEMÓRIA E RESSENTIMENTO: UMA RELAÇÃO DE DESASSOSSEGO
Para Pierre Ansart (2004, p. 15) o estudo do ressentimento franqueia a necessidade de
associar os afetos e as práticas sociais e políticas que permeiam a insurgência de tais afetos.
Por isso, debruçar-se sobre o ressentimento requer subsídios oriundos da psicologia social,
da psicologia, da política e da psicologia da história. Para estudar o ressentimento é “preciso
considerar os rancores, as invejas, os desejos de vingança e os fantasmas da morte, pois
são exatamente estes sentimentos e representações designados pelo termo ressentimento”.
Considerar o ressentimento significa ainda “evocar a parte sombria, inquietante e
frequentemente terrificante da história”.
Quem inaugura a noção de ressentimento é Nietzsche em La genéalogie de La
morale. O faz de maneira polêmica, provocativa e enigmática, a partir de três abordagens
complementares: histórica, psicológica e sociopolítica. Historicamente, a pertinência mais
recuada do ressentimento se faz a partir da ação movida pela religião judaico-cristã contra os
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guerreiros aristocratas, que até então detinham o privilégio de poder (exprimir livremente;
realizar a vontade de poder). Várias outras configurações desse tipo são referidas por
Nietzsche (apud ANSART, 2004, p.16) em busca de uma mesma configuração histórica:
a sublevação dos inferiores contra os dominantes, a partir da guerra civil e/ou cultural. O
ressentimento flui substancialmente de uma história dos sentimentos e mais especificamente
de uma história do ódio.
Mas antes disso, os textos platônicos e bíblicos, sem se concentrarem na idéia
de ressentimento, já decantavam inúmeras situações em que o ódio nasce dessa mesma
confrontação entre subalternidade e dominação. Mas o ressentimento não nasce exatamente
do ódio oriundo dos miasmas que tal confrontação prescinde. Nietzsche aposta na
interiorização e denegação desse mesmo ódio. O que ele denuncia é a sublimação e o recalque
desse ódio. E ao mesmo tempo a reorganização e o recondicionamento de seu papel: no lugar
do enfrentamento cru o sentimento de inferioridade passa a ser recalcado e sublimado o ódio
enquanto paixão que lhe é inerente. Esse processo se faz pela transformação do sentimento
de inferioridade em valor positivo: “humildade resignada, a fraqueza disfarçada em amor da
justiça, o ódio “recalcado”” e eventualmente traduzido como ódio de si mesmo.
Diz ainda Nietzsche (apud ANSART, 2004, p. 17) que toda essa sublimação passa a
habitus da civilização judaico-cristã, como parte, senão o núcleo decisivo de uma moral com
inúmeras conseqüências políticas e sociais ao longo da história: “o ressentimento estaria na
base do igualitarismo democrático destruidor, na raiz dos movimentos populares, socialistas e
anarquistas e, em uma só palavra, na origem da decadência das sociedades ocidentais”.
Max Scheler, Robert Merton foram os que trataram do ressentimento
procurando em La généalogie de La morale condições para uma categorização. Scheler
prefere a fenomenologia para revisitar as teses de Nietzsche, elaborando o ressentimento a
partir de três elementos: sentimentos difusos de ódio, inveja e hostilidade; sensação de
impotência “para exprimir de forma ativa estes sentimentos”; e a experiência sempre
renovada de impotente hostilidade. Ressalta-se que essa hostilidade pode estar ao outro ou a
si mesmo. O ressentimento é assim visto como conjunto de “sentimentos” em que ódio e
vingança convivem com um contínuo estado de “impotência rancorosa” (MERTON apud
ANSART, 2004, p.18). Para complementar as definições de Merton, Ansart propõe algumas
20
suplementações: o ressentimento possui formas múltiplas, por isso é difícil reduzi-lo a
essência universal. O ressentimento não é uma peculiaridade apenas dos fracos, inferiores ou
subalternos. Ele está também na sua contraparte ora manifestando-se como ódio, ora como
desprezo, ora como arrogância, ora como orgulho classista ou étnico. Aludindo Nietzsche
Ansart diz que o ressentimento dos “fortes” também se faz pelo recalque dos sentimentos que
o expressam. É o ressentimento do ressentimento.
O ressentimento se apresenta em distintas intensidades variáveis e graduais.
Os sentimentos envolvidos no ressentimento são susceptíveis, quando em processo de
representação, a sofrer influências das ideologias, dos imaginários, das crenças, dos discursos,
dos saberes de um modo geral, assim “o estudo da duração e, eventualmente, das evoluções
dos ressentimentos podem nos remeter à história das imagens, das palavras e dos conteúdos
imaginários” (ANSART, 2004, p.19)
A duração e a conduta dos ressentimentos também perpassam pelos papéis específicos
“desempenhado por certos indivíduos e grupos limitados – porta-vozes, escritores,
líderes carismáticos, seitas e minorias ativas – no interior dos movimentos sociais e das
sensibilidades comuns”. Ansart observa a necessidade de se investigar mais a fundo estes
provocadores de ressentimentos. Inibição, impotência, agressividade, ruminação são alguns
dos modos de expressão do ressentimento, enraizados a partir de sentimentos de raiva e ódio
recalcados e que por estarem recalcados redundam também em impotência.
MEMÓRIA E RESSENTIMENTO: RECONHECIMENTO COMO NARRATIVA
Embora Ricoeur (2007) tenha lançado suspeitas sobre a memória ela permanece
importante quando se trata de pensarmos sobre a categoria “memória coletiva” e suas
implicações para o entendimento de certas condições sociais. Referindo-se a Halbwachs
Ricoeur afirma que as memórias coletivas fortalecem as narrativas construídas em conjunto.
Isso porque memória coletiva e memória individual implicam-se mutuamente. Segundo
Halbwachs (apud POLLAK, 189, p.2) são vários as referências que estruturam a memória
individual colando-a à memória coletiva, dentre as quais os costumes, certas formas de
21
conduta, o modo como cada indivíduo interage em seu círculo social e fora dele. Refletindo
sobre os aspectos epistemológicos inerentes a constituição das memórias Pollak (1989, p.3)
lembra que:
“Na tradição metodológica durkheimiana, que consistem tratar fatos
sociais como coisas torma-se possível tomar esses diferentes pontos
de referência como indicadores empíricos da memória coletiva de um
determinado grupo, uma memória estruturada com suas hierarquias e
classificações, uma memória também que, ao definir o que é comum a um
grupo e o que o diferencia dos outros, fundamenta e reforça os sentimentos
de pertencimento e as fronteiras sócio-culturais”
De acordo com Pollak tanto Halbwachs quanto Durkheim sugerem que a mobilidade
e proximidades entre a memória individual e a coletiva perfazem negociações baseadas em
processos de seletividade. Esta seletividade seria produto das interações entre grupos, entre
o passado e o presente, entre tradição e novidade. Portanto, as referências provenientes
dessas relações que intervém e constituem a memória coletiva de certo modo resultam das
concordâncias advindas do conjunto de memórias individuais que as nutrem. É preciso assim
que “haja suficientes pontos de contato entre ela e as outras para que a lembrança que os
outros nos trazem possa ser reconstruída sobre uma base comum” (HALBWACHS apud
POLLAK, 1989, p.4). Esse caráter é problemático, como bem aponta Pollak, e ganha outros
contornos quando sujeito a atualizações mais contemporâneas:
“Numa perspectiva construtivista, não se trata mais de lidar com os fatos
sociais como coisas, mas de analisar como os fatos sociais se tornam
coisas. Como e por quem eles são solidificados e dotados de duração
e estabilidade. Aplicada à memória coletiva, essa abordagem irá se
interessar portanto pelos processos e atores que intervêm no trabalho de
constituição e de formalização das memórias” (POLLAK, 1989, p.4)
22
Tais considerações a respeito da memória aqui se inserem, como já informado, a
propósito de uma experiência vivenciada com uma turma de graduação em Pedagogia, a
turma é formada por ribeirinhos da várzea e das ilhas do Município de Abaetetuba, fortemente
marcados por uma territorialidade fundada na relação com a água e com o rio, elementos que
permeiam todos os setores da existência do homem Amazônida. Não são apenas sujeitos que
vivem e se relacionam com a água e o rio, são sujeito históricos que se colocaram no palco
da história, como afirma Freire em sua obra Pedagogia do Oprimido (1987). O oprimido se
reconhece sujeito histórico e em sua condição ontológica de ser mais exige a transformação
de sua condição de esquecido e de oprimido na sociedade. Esses jovens e adultos que estão
na turma Pedagogia das Águas, trazem suas histórias de vidas marcadas pelo silenciamento e
pela negação de seus direitos sociais básicos como escola, saúde, moradia, e por isso desejam
ser protagonistas sociais na busca de retomada de sua identidade ribeirinha para reivindicar
os seus direitos usurpados. Porém, há de ser reconhecer que esse processo de retomada de si
mesmo, como identidade social marcada pelo reconhecimento da alteridade é longo, doloroso
e pessoal (NÓVOA, 2005). E não é possível fazê-lo sem a incursão por saberes tradicionais e
enraizados na cultura local.
Como fomos, respectivamente, durante certo tempo, coordenadoras pedagógicas
e professoras atuantes na turma, pudemos nos deparar com a pluralidade emanada das
relações entre os membros da turma, entre eles mesmos e os territórios a que se vinculam.
Tais territórios implicam o assentamento, a universidade, o local de trabalho, os espaços de
atuação militante, o trânsito nos meios urbanos etc., com ampla interação trans-territorial.
Um aspecto que sempre foi valorizado nos inúmeros cenários construídos entre
gestores do curso, professores e alunos é o do fortalecimento dessa identidade ribeirinha, a
partir de seu patrimônio cultural tangível e intangível, com vistas a consolidação de posturas
frente ao uso sustentável do lugar de habitação associada a preservação da cultura local, com
a cultura assim sendo entendida como instrumento de fortalecimento da auto-estima. Nesse
sentido, acompanhando o percurso de outros pesquisadores que tem se debruçado sobre as
relações entre identidade, memória e cultura pensamos que:
23
“A valorização da cultura popular contribui para que a sociedade
fortaleça a individuação e a auto-estima diante do Outro, numa busca de
desenvolvimento originário de sua própria criatividade e conforme os seus
valores, porque é por intermédio da cultura que o indivíduo e a sociedade
interagem com o mundo à sua volta” (KASHIMOTO, MARINHO &
RUSSEF, 2010, p.36).
A valorização da cultura é um dado imprescindível nas condições que ora avaliamos,
principalmente no que concerne aos modos de ser, fazer e dizer desses ribeirinhos. Como
afirmado anteriormente, a fragilidade do reconhecimento de si mesmo, como sujeito histórico,
muitas vezes se dá pela dificuldade em construir esse reconhecimento de si a partir de
ressonâncias fundadas no valor da diversidade e singularidades que marcam os ribeirinhos
da região. Tal dificuldade tem apontado em certa medida para a negação dessa identidade em
alguns momentos, quando é possível observar que essa negação se dá pela tentativa de erigir
imagens de si, que são projeções do modelo de um cidadão globalizado, distante do homem
ribeirinho, que vive em um tempo amazônico diferente do tempo socialmente construído no
capitalismo monopolista, instalado nas relações produtivas da sociedade moderna.
O desejo de igualar-se ao outro, o homem moderno preconizado no gosto burguês,
relaciona-se com a projeção cultural amplamente divulgada pela indústria cultural e deseja
colocar a igualdade cultural entre os povos como uma forma de igualdade utilitarista para o
consumo dos bens produzidos na sociedade. No bojo desse processo há de certa maneira uma
suspensão dos ressentimentos, resultantes das violentações e traumas históricos, em prol de
uma contínua atitude conciliatória. Essa propaganda massiva de valores globalizados que
pasteuriza as culturas e sua diversidade têm um impacto muito forte na cultura ribeirinha
amazônica, pois interfere diretamente na forma como tais sujeitos se reconhecem, e definem
sua forma de ser e pensar o mundo que os rodeiam.
Atualmente, as marcas do reconhecimento e do ressentimento tem sido intensamente
apontadas como presenças em todas as esferas da vida social (LEIS, 2002, p.6) e utilizadas
instrumentalmente como forma de estabelecer posições e leituras acerca dos diversos
fenômenos sociais instaurados na modernidade. Apropriar-se sistematicamente dessas
24
marcas a partir do território da “memória subterrânea” com o intuito de confrontar aspectos
constituidores da “memória oficial” e “replicante”, pode favorecer a partir da confrontação
a insurgência do que chamamos aqui de uma “memória restauradora”, capaz de reabilitar o
sujeito com vistas a reconstituição e/ou fortalecimento da sua integridade.
No contexto do nosso objeto de estudo as marcas identitárias negadas se tornam
nebulosas, e consequentemente silenciadas, sulcadas pelas marcas do ressentimento de não ser
como o outro ou por um espelhamento invertido em relação ao outro, nesse caso apreendendo
as marcas da ribeirinhidade de forma pejorativa ou desqualificadamente. A relação nebulosa
com essas marcas está ligada a experiência histórica de preterições e negações pelo
outro, numa relação que é claramente desfavorável a formação de uma imagem positiva do
ribeirinho enquanto tal. Nesse processo os dispositivos que equacionam e movimentam tais
marcas funcionam ao mesmo tempo como engrenagens nas relações de afirmação ou des-
afirmação, relativas à constituição da imagem de si, promovida pelo indivíduo ribeirinho.
Desse modo, uma relação dialética e complexa entre ressentimento e auto-afirmação parece se
instalar, espraiando-se sobre o processo memorialístico no trânsito entre memória individual e
memória coletiva, cuja dimensão é alcançada, obviamente, pela linguagem:
“A memória é constituída por indivíduos em interação, por grupos sociais,
sendo as lembranças individuais resultado desse processo. Ainda que o
indivíduo pense que sua memória é estritamente pessoal, uma vez que ela
pode resgatar acontecimentos nos quais só ele esteve envolvido ou fatos e
objetos que só ele presenciou e viu, ela é coletiva, pois o indivíduo ainda
que esteja só é o resultado das interações sociais. Ele vê o mundo através
de construções coletivas como a linguagem” (ARAÚJO & SANTOS,
2010, p. 97)
A assertiva acima nos faz pensar, então, que estratégias que dessem conta de uma
vivisseção da memória em busca de imagens que pudessem provocar a reflexão sobre o modo
como a imagem de si é construída deveriam estar fundamentadas na insurgência da memória
25
e nos dispositivos de ressentimento. O ressentimento, conforme é possível observar pelo que
diz Ansart entre outros, advém de uma frustração, ao mesmo tempo provocadora e evocadora
do ressentimento e, independemente da origem dessa frustração sempre obriga o indivíduo
a experimentar a diminuição ou o sufocamento de seu valor como indivíduo, engessando a
possibilidade de reação e igualmente de apagamento dos rancores. Por isso, grande parte
dos estudos sobre o ressentimento o tem como um afeto que atravanca reiteradamente as
possibilidades conciliatórias.
Nesse processo, cabe aqui lembrar algo importante para o conhecimento do
ressentimento e que de certa maneira se constitui em um norte para a proposta que ora
apresentamos e que norteou o laboratório realizado com os alunos: para Robert Merton (apud
ANSART, 2004, p.20) a “impotente hostilidade” gerada pelo ressentimento pode ao mesmo
tempo ser transformada em potência criadora de valores. É preciso considerar também,
ainda com Merton, que as forças opositivas oriundas do ressentimento geram identidade,
cumplicidade e solidariedade no interior dos grupos. Interessa-nos, portanto um ressentimento
não-conciliatório, mas cujas potências de ruminação das diferenças sejam desenvolvidas em
prol de um trabalho criativo baseado no reconhecimento, num “cuidado de si”, a partir da
aposta numa memória restauradora, capaz de proporcionar um diferir do outro sem ferir a si
mesmo.
Desse modo, avaliamos ser interessante pensar num deslocamento das potências do
ressentimento, vendo-o como possibilidade transformativa, na medida em que opera como
potência de valorização do indivíduo. Apostar nessa possibilidade foi o que fizemos, a partir
das seguintes questões: Como, então, transpor essa possibilidade para as condições em que
nosso objeto estava inserido? Como manusear o engessamento em favor de um movimento
reflexivo, capaz de se não inverter, pelo menos desestabilizar a imagem negativa de si? Era
preciso transformar algo enraizado num desassossego. Era preciso textualizar o incômodo.
Era preciso fazer falar, portanto, as dimensões da territorialidade ribeirinha.
Neste sentido, retomar o debate em torno do protagonismo social e do fortalecimento
da identidade ribeirinha se tornou algo importantíssimo no processo formativo desses
alunos, por isso sentimos a necessidade de proporcionarmos uma atividade provocativa
que possibilitasse a reafirmação da identidade ribeirinha. À atividade colocada em prática
26
para dar conta desses fundamentos e propósitos chamamos de narrativa-rio: um enorme
mosaico repleto de marcas individuais, mas formando uma grande narrativa coletiva, em que
o princípio da integridade perpassa pela idéia de que um todo é constituído de pedacinhos
do diverso. Mas para chegar à narrativa-rio era preciso sensibilizar o olhar sobre si e sobre
a própria territorialidade. Por isso, antecipando a produção do mosaico, foram realizados
encontros com professores de áreas afins, com intuito de despertar essa sensibilização.
Começamos inicialmente com o professor José Guilherme dos Santos Fernandes,
que tem se dedicado ao estudo da cultura em associação com a oralidade, com o objetivo
de discutir a categoria memória e sua relação com a cultura dos sujeitos amazônicos.
Posteriormente, contamos com o professor Augusto Sarmento-Pantoja, que desenvolveu com
os alunos uma oficina provocativa, que associou fundamentos do teatro, trechos de filmes
e literatura, para despertar nos educandos o desejo de discutir e ressignificar sua memória
a partir da exploração de sua vivência ribeirinha. Em seguida, nós, professora Mara Rita e
professora Tânia, propomos aos educandos a construção da narrativa-rio, pela evocação da
memória e escrita da memória em conjunto, mas ao mesmo tempo com expressões individuais
de cada um, através dos elementos mais significativos dessa cultura: água, rio, chuva, amor,
terra, desejo, barro, trabalho, remo, folha, vida e morte, entre outros.
Os alunos foram compondo suas memórias, ou melhor, reescrevendo-as, a partir
desses signos, utilizando recursos como fotografias, poemas, mensagens, palavras soltas,
fábulas, desenhos, racontos, trechos de histórias de vida, depoimentos, elementos esses que
deveriam ser suas produções pessoais, que seriam tecidas em uma memória coletiva que
representasse a identidade social coletiva e ao mesmo tempo individual, como possibilidade
de reconhecimento e retomada da identidade. E da memória do que se é e de como se é.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As reflexões apresentadas pelos alunos relacionam-se muito a vontade de manter-
se nas suas ilhas, apesar das dificuldades, das vontades e desejo de migração. Resistem por
que descobrem entre suas memórias recolhidas e escritas em giz branco, que podem ser mais
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do que reprodutores da ordem social estabelecida, podem ser homens e mulheres livres e
acreditam que “Cada um compõe a sua história, cada um compõe a sua história, carrega em si
o dom de ser capaz e ser feliz” (Almir Sater)
As implicações deste reconhecimento é trazer para cada um a responsabilidade de
tomar para si a responsabilidade de construir outras estratégias de sobrevivência e da própria
vida que desejam para si mesmos.
Esse reconhecimento, ou melhor, a retomada da identidade ribeirinha, associa-se a
todo o processo formativo que foi conduzido dentro do curso Pedagogia das Águas. Isso
claramente demonstrado nas produções dos educandos, na medida em que eles mesmos
percebem muito fortemente a marca identitária ribeirinha, um redizer de sua memória,
ressignificada por novas práticas e saberes que se alia ao saber científico adquirido no espaço
acadêmico.
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NAXARA, M.(Orgs). Memória e (res) sentimento: indagações sobre uma questão
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KASHIMOTO, E. M.; MARINHO, Marcelo & RUSSEFF, I. Cultura, Identidade e
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LEIS, H. R. O ressentimento dos argentinos. Cadernos de Pesquisa Interdisciplinar em
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28
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RICOUER, P. A memória, a história, o esquecimento. Tradução de Alain Françoise e al.
Campinas: UNICAMP, 2007.
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Formulário de Parecer sobre Artigo
Caro (a) Parecerista,
Encaminhamos, em anexo, o artigo inscrito para publicação em 02 livros da Educação do Campo.
Título do Trabalho:
1. Círculo Temático: HISTÓRIA E MEMÓRIA DA EDUCAÇÃO DO CAMPO NA AMAZÔNIA”
QUESITOS BÁSICOS:
8) Título do trabalho adequado ao assunto tratado no Resumo( ) Muito Bom ( ) Bom (X ) Regular ( ) Insuficiente
9) Resumo coerente na argumentação teórica e nas informações apresentadas( ) Muito Bom ( ) Bom ( X) Regular ( ) Insuficiente
10) Trabalho pertinente em relação à área da Educação do Campo( X)Muito Bom ( ) Bom ( ) Regular ( ) Insuficiente
11) Relevância e pertinência do trabalho com relação ao Círculo Temático(X)Muito Bom ( ) Bom ( ) Regular ( ) Insuficiente
12) Consistência teórica e metodológica( X)Muito Bom ( ) Bom ( ) Regular ( ) Insuficiente
13) Correção e clareza lingüística na construção do Resumo( )Muito Bom ( X) Bom ( ) Regular ( ) Insuficiente
14) Avaliação final: ( X ) Aprovado ( ) Não aprovado
Parecer sobre o Resumo (quando não aceito justificar brevemente)
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APROVADO (BOM). OBSERVO NECESSIDADE DE REVISÃO NAS REFERÊNCIAS C/ BASE NA ABNT. NO TEXTO NÃO ESTÁ EXPLÍCITO O RESUMO QUE DEVE CONTER OBJETIVOS, METODOLOGIA, RESULTADOS E CONCLUSÕES. AUSÊNCIA DE INTRODUÇÃO. APONTO NECESSIDADE DE REVISÃO DA ACENTUAÇÃO, GRAFIA DE PALAVRA, ETC. ACREDITO QUE O TEXTO PARA PUBLICAÇÃO DEVERÁ APRESENTAR UNIDADE EM TERMOS DE RESUMO,INTRODUÇÃO, REFERÊNCIAS E CITAÇÕES DIRETAS CONFORME ABNT (espaço simples, fonte 10, etc.)
Local: Belém/Pará. Data:22/09/2010
Nome do(a) Avaliador(a): MARIA MARIZE DUARTE
Instituição do(a) Avaliador(a): UNIVERSIDADE DO ESTADO DO PARÁ
Solicitamos o envio de seus pareceres até o dia 08 de setembro.
Agradecemos a sua colaboração,
Coordenação do Evento
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