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Psicologia da Saúde

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    1 Universidade Federal deUberlndia. Av. Par 1720,bloco 2C, CampusUmuarama. 38405-382Uberlndia [email protected] Centro Universitrio doTringulo.

    Sade mental e ansiedade em agentes comunitriosque atuam em sade da famlia em Uberlndia (MG, Brasil)

    Mental health and anxiety in community health agentsin Uberlndia (MG, Brazil)

    Resumo Esta pesquisa, realizada com agentescomunitrios de sade (ACS), objetivou: (1) ava-liar a sade mental em ACS; (2) descrever os even-tos vitais vivenciados no ltimo ano por ACS; (3)averiguar o nvel de ansiedade apresentado porACS; (4) correlacionar sade mental, ansiedade eeventos vitais em ACS. Participaram 116 ACS. Ins-trumentos: questionrio sociodemogrfico, Ques-tionrio de Sade Geral de Goldberg, Escala deEventos Vitais, Inventrio de Ansiedade Trao-Estado. A maioria dos ACS apresentou grau deansiedade moderado e sade mental positiva erelatou ter vivenciado poucos eventos estressan-tes no ltimo ano, embora a maioria tenha tidoproblemas de sade. O fato de estarem presentesnveis de ansiedade, mesmo moderados, sugereuma provvel interferncia de caractersticas es-pecficas da profisso. Entretanto, o fato de a pes-soa identificar subjetivamente a ansiedade e clas-sific-la em um determinado nvel pressupe queesteja usando estratgias de controle, fato esse queauxilia a manter a sade mental.Palavras-chave Agente comunitrio de sade,Sade Mental, Ansiedade

    Abstract The scope of this research, carried outtogether with community-based health workers(ACS) was: (1) to evaluate the mental health ofthe ACS; (2) to describe the vital events in the lastyear of the ACS; (3) to inquire about the level ofanxiety of the ACS; (4) to correlate mental health,vital events and anxiety of the ACS. Participants:116 ACS. Measurements: socio-demographic ques-tionnaire, Goldberg General Health Question-naire, The Life Events Inventory, State-TraitAnxiety Inventory. The majority of the ACS pre-sented a moderate degree of anxiety and positivemental health; they reported having experiencedfew stressful events in the past year, even thoughthe majority had experienced health problems.The fact that most of the ACS reported havingexperienced moderate anxiety levels suggests aprobable interference of specific characteristics ofthe profession. However, the fact that the personssubjectively identified the presence of anxiety andclassified it at a given level presupposes that theyare using control strategies, which is a factor thatassists in maintaining mental health.Key words Community healthcare agent, Men-tal Health, Anxiety

    Marineia Crosara de Resende 1

    Erika Guimares Soares Azevedo 2

    Larissa Ribeiro Loureno 2

    La de Souza Faria 2

    Natlia Fonseca Alves 2

    Natalia Peixoto Farina 2

    Nathlia Coutinho da Silva 2

    Simone Lopes de Oliveira 2

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    Introduo

    O Programa de Agentes Comunitrios de Sade(Pacs) foi criado em junho de 1991, pelo Minist-rio da Sade, visando contribuir para melhorqualidade de vida da populao, investindo maci-amente na educao em sade. O agente comu-nitrio de sade (ACS) parte da equipe Sade daFamlia, atua como elo entre as necessidades desade das pessoas e o que pode ser feito para amelhoria das condies de vida da comunidade1.

    O ACS representa um segmento efetivo dotrabalho em sade e se tornou um novo atorpoltico, devido expanso da Estratgia Sadeda Famlia (ESF), nova denominao do Pro-grama Sade da Famlia (PSF)2, cuja inteno levar a equipe de servios de sade para aesdiretas na comunidade, envolvendo os diversosprofissionais com uma ateno de qualidade aosusurios do programa3.

    Segundo Wai4, a ESF apresentada comopoltica pblica, desenvolvida para promovermudanas no atual modelo de assistncia sa-de do pas, colocando em prtica os princpiosque norteiam o Sistema nico de Sade (SUS),entre eles: integralidade da assistncia, universa-lidade, equidade, participao e controle social,intersetorialidade, resolutividade, sade comodireito e humanizao do atendimento.

    Nesse sentido, a ESF pretende: (1) melhoraros indicadores de sade da populao atendida;(2) estabelecer a organizao dos servios de sa-de, criando um sistema de referncia; (3) criarvnculo de responsabilidade entre as famlias e osprofissionais de sade; (4) atender um maiornmero de famlias de forma integral, resoluti-va, direcionada ao diagnstico de seus proble-mas de sade; (5) acompanhar melhor os pro-blemas de sade da comunidade; (6) melhorar aorganizao dos sistemas locais de informaoem sade; (7) ter maior resolutividade nas aesde sade, atravs do trabalho desenvolvido emequipe5. O atendimento prestado na unidadebsica de sade ou no domiclio por uma equipede profissionais, composta por um mdico ge-neralista, um enfermeiro, um ou dois auxiliaresde enfermagem e por ACS, podendo contar ain-da nas equipes profissionais com nutricionistas,fisioterapeutas, psiclogos, farmacuticos, den-tre outros6.

    Entre as principais atribuies do ACS, esto:(1) realizar mapeamento de sua rea; (2) cadas-trar as famlias e atualizar permanentemente essecadastro; (3) identificar indivduos e famlias ex-postos a situaes de risco; (4) identificar rea de

    risco; (5) orientar as famlias para utilizao ade-quada dos servios de sade, encaminhando-as eat agendando consultas, exames e atendimentoodontlogico, quando necessrio; (6) realizaraes e atividades, no nvel de suas competncias,na rea prioritria da Ateno Bsica; (7) realizar,por meio de visita domiciliar, acompanhamentomensal de todas as famlias sob sua responsabili-dade; (8) estar sempre bem informado, e infor-mar aos demais membros da equipe sobre a situ-ao das famlias acompanhadas, particularmenteaquelas em situaes de risco; (9) desenvolveraes de educao e vigilncia sade, com nfasena promoo da sade e na preveno de doen-as; (10) promover a educao e a mobilizaocomunitria, visando desenvolver aes coletivasde saneamento e melhoria do meio ambiente, en-tre outras; (11) traduzir para a ESF a dinmicasocial da comunidade, suas necessidades, poten-cialidades e limites; (12) identificar parceiros e re-cursos existentes na comunidade que possam serpotencializados pela equipe4.

    necessrio treinar os ACS para realizaremprocedimentos tcnicos como medida de peso ealtura de crianas, verificao do estado de vaci-nao delas, alm de desenvolverem atividadeseducativas visando implementao de procedi-mentos saudveis nas pessoas da comunidade,especialmente no que se refere a hbitos higini-cos e alimentares, entre outras aes. Nesse pon-to, imprescindvel o desenvolvimento e/ou in-corporao de novas tecnologias em sade, sobpena de comprometimento na qualidade e efeti-vidade das aes desenvolvidas7.

    Menegolla et al.8 descrevem que as maioresdificuldades encontradas pelos ACS no seu dia adia so: a falta de entendimento da populaoquanto ao seu trabalho; o nmero elevado depessoas da comunidade a serem atendidas; omedo; as limitaes quanto resolutividade dosproblemas da comunidade; a falta de organiza-o, de companheirismo e de coleguismo da equi-pe multidisciplinar; e a negativa de alguns profis-sionais da equipe em realizar a visita domiciliar.

    Para Broock Neto et al.9, o trabalho dos ACSganha o reconhecimento dos membros da co-munidade, que so conscientes do trabalho queos agentes levam a zonas isoladas, onde no che-ga ningum de outra instituio e falta ainda de-finir algumas regras como formao, funo eautonomia, inclusive revendo a contrataotemporria que causa instabilidade e inseguran-a diante do futuro.

    Sabe-se que a escolha de residentes dos pr-prios bairros de atuao do usurio outro fa-

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    tor gerador de estresse; que os ACS so mora-dores do mesmo bairro onde atuam, comparti-lhando o mesmo contexto social e cultural e ummesmo universo lingustico dos usurios. Essapartilha facilitaria a identificao de fatores res-ponsveis ou intervenientes no adoecimento daspessoas do bairro, assim como o desenvolvimen-to de estratgias mais eficazes no mbito da ade-so s recomendaes mdicas7.

    Compreender sade como autonomia impli-ca uma dimenso poltica libertadora e emanci-patria, que coloca o profissional de sade, emespecial o ACS, diante da necessidade de enfrenta-mento dos processos que determinam as doen-as e o sofrimento das populaes. Esto intrin-secamente ligados s dinmicas de explorao ede excluso de camadas inteiras da populao,expostas fome, misria, falta de saneamentobsico e a trabalhos extremamente insalubres eopressores, determinantes de sofrimentos fsicose mentais10, o que pode gerar ansiedade.

    A ansiedade abrange sensaes de medo, sen-timentos de insegurana e antecipao apreensi-va, contedo de pensamento dominado por ca-tstrofe ou incompetncia pessoal, aumento deviglia ou alerta, um sentimento de constriorespiratria levando hiperventilao e suas con-sequncias, tenso muscular causando dor, tre-mor e inquietao e uma variedade de descon-fortos somticos consequentes da hiperativida-de do sistema nervoso autonmico11.

    A ansiedade pode surgir como resposta doindivduo aos eventos externos ou ser gerada in-ternamente, por medo ou insegurana. Pode ain-da advir do sistema de defesa ante uma ameaareal ou imaginria. Pessoas ansiosas se deixamperturbar facilmente, maximizando efeitos ne-gativos de eventos externos e apresentando pou-ca motivao para mudanas por no se senti-rem confortveis, apresentando dificuldades emcontrolar suas emoes e reaes, podendo agirde forma improdutiva no dia a dia12, prejudi-cando seu estar no mundo e seu trabalho.

    Nesse sentido, este artigo prope-se a conhe-cer a sade mental, os eventos vitais e o nvel deansiedade em ACS, atravs dos seguinte objeti-vos: (1) avaliar a sade mental em ACS; (2) des-crever os eventos vitais vivenciados no ltimoano por ACS; (3) averiguar o nvel de ansiedadeapresentado por ACS; (4) correlacionar sademental, ansiedade e eventos vitais em ACS.

    Mtodo

    Participou desta pesquisa uma amostra de con-venincia composta por 116 agentes comunitri-os de sade que atuam no Programa Sade daFamlia (PSF) nos bairros Cana, Morada Nova,Jardim das Palmeiras, So Jorge e Laranjeiras,em Uberlndia (MG). A Tabela 1 mostra os da-dos sociodemogrficos.

    A pesquisa foi realizada nos bairros indica-dos pela Coordenao Geral do PSF. Os partici-pantes foram convidados a participar e infor-mados sobre os objetivos da pesquisa, o cartervoluntrio da participao e a garantia de sigilodos dados individuais. O critrio de incluso dosACS foi se dispor a participar da pesquisa. Fo-ram feitas entrevistas com os ACS por alunastreinadas do ltimo ano do curso de psicologiado Centro Universitrio do Tringulo, nos locaisde trabalho deles, a partir de um protocolo quelevantou os seguintes dados de autorrelato:

    (1) Questionrio sociodemogrfico: contendodados de identificao, tais como idade, sexo,estado civil e escolaridade;

    (2) Questionrio de Sade Geral de Goldberg13: um teste psicolgico que foi desenvolvido com

    Tabela 1. Distribuio de frequncia dascaractersticas sociodemogrficas dos sujeitos(n=116).

    Varivel

    SexoFemininoMasculino

    Idade18-2526-3233-3940-46> 47

    Estado civilCasadoSolteiroVivoSeparado

    Escolaridade1 grau incompleto1 grau completo2 grau incompleto2 grau completo3 grau incompleto3 grau completo

    N

    10313

    27332227

    7

    6940

    52

    1121677

    91

    %

    88,7911,21

    23,2828,4518,9723,28

    6,03

    59,4834,48

    4,311,72

    0,8610,3413,7966,38

    7,760,86

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    o propsito de identificar o perfil sintomtico desade metal de pessoas com distrbios psiqui-tricos no extremados. De tipo self-report, cons-ta de sessenta itens, que avaliam cinco fatores(1estresse psquico; 2desejo de morte; 3des-confiana no desempenho; 4distrbios do sono;e 5distrbios psicossomticos), aos quais o su-jeito deve responder atravs de escala de tipo Li-kert de quatro pontos, em que as alternativaspodem variar um pouco em razo do teor dapergunta. Permite avaliar a severidade de distr-bios psiquitricos no psicticos e serve comomeio de identificao de casos potenciais dessesdistrbios na populao geral no clnica. Osprotocolos com 10% ou mais de questes norespondidas devem ser considerados nulos; istoequivale a seis questes no respondidas. Commenos de 10% de questes no respondidas,podem ser aproveitados. Verificou-se alta con-sistncia interna para QSG total (=0,948), es-tresse psquico (=0,882), desejo de morte(=0,838), desconfiana no desempenho(=0,879), distrbios do sono (=0,868) e dis-trbios psicossomticos (=0,813).

    (3) Escala de Eventos Vitais14: composta poruma lista de acontecimentos importantes na vidade uma pessoa em que o sujeito deve indicar assituaes pelas quais passou nos ltimos dozemeses. Os eventos vitais so trabalho: aposenta-doria, mudana de trabalho, dificuldades comchefia, perda de emprego e reconhecimento pro-fissional; perda de suporte familiar: morte de al-gum da famlia, morte de um amigo e morte deum cnjuge; famlia: doena na famlia, separa-o, casamento, gravidez, nascimento na fam-lia, reconciliao na famlia; mudana no ambi-ente: mudana de escola, mudana de casa, mu-dana no nmero de pessoas morando em casa;outros: acidentes, perdas financeiras, dificulda-des sexuais, problemas de sade, dvidas, mu-dana de hbitos pessoais, mudana de ativida-des recreativas, mudanas de atividades religio-sas, mudanas de atividades sociais (=0,614).

    (4) Inventrio de Ansiedade de Trao-Estado(IDATE)15: foi proposto por Spielberg, sendocomposto por duas escalas de autoavaliao dedois conceitos de ansiedade: trao e estado deansiedade. A escala do trao de ansiedade veri-fica a personalidade do indivduo ante as situa-es potencialmente ameaadoras ao longo davida. A escala do estado de ansiedade observaum estado transitrio (momentneo), em quesentimentos desagradveis de tenso e a varivelintensidade dependem da situao vivida. Cadaescala tem vinte itens, com a possibilidade de res-

    posta graduada de um a quatro pontos. A avali-ao dos resultados feita somando-se os pon-tos (mximo de oitenta pontos) de acordo comos critrios estabelecidos pelo autor. A classifica-o de gravidade : mais de trinta pontos, ansie-dade moderada; e mais de cinquenta pontos,ansiedade grave. Foi utilizada anlise dos valoresde ansiedade estado para comparar os grupos,por representar os sintomas de ansiedade nomomento da avaliao (transversal) (=0,828).

    Resultados

    Sade mental

    Atravs do QSG, foi possvel verificar que osACS apresentam sade mental positiva (mdia1,75; DP=0,39), j que quanto mais prximo de1 maior a sade mental, e quanto mais prximode 4 maior o distresse. Na Tabela 2, possvelverificar a sade mental por domnios avaliados.

    Ansiedade traos

    Na avaliao de ansiedade, a mdia encon-trada foi de 41,41 (DP=6,02), sendo que 75,0%pontuaram entre 31 e 50, indicando um grau deansiedade moderado, e 17,24% pontuaram em50, indicando que essas pessoas apresentam graude ansiedade grave.

    Eventos vitais experienciados no ltimo ano

    Com relao aos eventos estressantes viven-ciados no ltimo ano, os participantes relataramter passado por 5,16 eventos em mdia(DP=3,01), sendo que a maioria relatou ter tidoproblemas de sade (58,6%) (Tabela 3). Apenas3,90% relataram no ter passado por nenhum

    Tabela 2. Mdia por fator do QSG.

    Fatores do QSG

    Fator 1 Estresse psquicoFator 3 Desconfiana nodesempenhoFator 5 DistrbiospsicossomticosFator 4 Distrbios do sonoFator 2 Desejo de morteFator geral

    Mdia

    1,871,82

    1,80

    1,741,231,75

    Desviopadro

    0,550,43

    0,52

    0,710,380,39

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    evento estressante no ltimo ano; 56,7% experi-enciaram entre um e cinco eventos; 34,2%, entreseis e oito eventos vitais, e 5,2% relataram entrenove e treze eventos vitais.

    Correlaes entre as variveis

    Atravs do coeficiente de correlao de Spe-arman, verificou-se que quanto maior o nmerode eventos vitais experienciados no ltimo ano,mais estresse psquico (r=0,38356; p

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    interferncia de caractersticas especficas da pro-fisso. O ACS proveniente da prpria comuni-dade onde atua, devendo residir na prpria reade trabalho h pelo menos dois anos, tendo umperfil mais social que tcnico, apresentando ca-ractersticas de solidariedade, iniciativa e lideran-a. Precisa ter disponibilidade de tempo integralpara exercer suas atividades22.

    Silva e Dalmaso23 afirmam que constante-mente os ACS so colocados diante de contradi-es sociais, o que muito pesado, por isso elesfazem determinadas opes, segundo as exign-cias, as recompensas e suas referncias. O traba-lhador, ao se sentir sem alternativa para com-partilhar suas dificuldades, anseios e preocupa-es, tem aumentada sua tenso emocional, oque pode levar ao surgimento da sndrome deburnout e/ou do estresse ocupacional16.

    Segundo Barros et al.24, a ansiedade existen-cial inerente vivncia do ser humano, mas emalguns casos o trabalho parece trazer uma cargade desconforto emocional, levando a um estadode tenso constante. Entretanto, segundo essesautores, o fato de a pessoa identificar subjetiva-mente a ansiedade e classific-la em um determi-nado nvel pressupe que esteja usando estrat-gias de controle, o que auxilia a manter a sademental.

    Nesta pesquisa, os ACS apresentam sademental positiva, podendo ser um indicador desatisfao com o trabalho. A rea da sade ocu-pacional vem oferecendo atribuies de grandeimportncia para o entendimento das repercus-ses do trabalho sobre as questes de sade e debem-estar de profissionais. O conhecimento ad-quirido nessa rea possibilita afirmar que a sa-de mental dos trabalhadores est diretamenterelacionada com aspectos do trabalho. Diantedisso, seria interessante que outros estudos in-clussem os trs segmentos envolvidos na ESF:usurios, familiares e equipe tcnica. Porm, aocomparar a quantidade de estudos realizados noBrasil para cada segmento, percebe-se uma dis-crepncia entre a importncia atribuda entre asinvestigaes realizadas com usurios, familia-res e com os profissionais, em que este ltimoelemento tem sido negligenciado25.

    Nesse sentido, um aspecto importante a serconsiderado o bem-estar, que adquirido peloequilbrio entre as expectativas em relao ativi-dade profissional e concretizao delas, sendoum dos fatores que contribuem para a qualidadede vida. Esta proporcionada pela satisfao decondies objetivas tais como renda, emprego,objetos possudos e qualidade de habitao, de

    condies subjetivas como segurana, privacida-de e afeto, bem como motivao, relaes de au-toestima, apoio e reconhecimento social16.

    Os ACS relataram ter vivenciado poucos even-tos estressantes no ltimo ano, embora a maio-ria tenha tido problemas de sade. A maioriados estudos epidemiolgicos mostra uma asso-ciao entre eventos negativos, depresso e ansi-edade. Os eventos podem ter diferentes impac-tos de acordo com o perodo da vida, e pareceque mais importante que o evento em si a suapercepo. No entanto, o acmulo de eventosparece ser um fator que predispe a pessoa aepisdios depressivos e ansigenos. O resultadodesta pesquisa mostrou que as pessoas que so-freram mais eventos vitais tm mais chance deapresentar transtornos psiquitricos do queaquelas que no vivenciaram eventos estressan-tes no ltimo ano26.

    Os eventos estressantes podem ser encontra-dos no local de trabalho ou estar ligados a as-suntos pessoais e do meio ambiente, em sentidomais amplo. No primeiro caso, constituem exem-plos s presses de tempo, os conflitos inter eintrapessoais, os aspectos fsicos negativos dolocal de trabalho; no segundo, as preocupaesfinanceiras, os problemas com os filhos, os pro-blemas conjugais, as preocupaes de sade, emrelao ao meio ambiente, ao local onde a pessoareside. Entretanto, deve-se ressaltar que as pes-soas tm diferentes nveis de tolerncia a situa-es estressantes. Algumas so perturbadas porpequenas mudanas ou emergncias, outras soafetadas apenas por estressores de maior mag-nitude ou quando a exposio a eles muito pro-longada. McLean, citado por Savoia14, sugere, noentanto, que pequenos eventos do dia a dia (mi-croestressores) podem agir de maneira cumula-tiva e transformar-se em grandes fontes de es-tresse. Tudo ir depender de como a pessoa en-cara esses eventos e lida com eles.

    Uma relao satisfatria com a atividade detrabalho fundamental para o desenvolvimentonas diferentes reas da vida humana, e essa rela-o depende, em grande escala, dos suportes afe-tivos e sociais que os indivduos recebem duran-te seu percurso profissional. O suporte afetivoprovm do relacionamento com pessoas com asquais possvel compartilhar preocupaes,amarguras e esperanas, de modo que sua pre-sena possa trazer sentimentos de segurana,conforto e confiana. O suporte social aplica-seao quadro de relaes gerais que se estabelecem,naturalmente, entre colegas de trabalho, vizinhose conhecidos, o que tambm pode favorecer o

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    aprofundamento de relacionamentos que, maistarde, venham a fazer parte do suporte afetivo16,27.

    Consideraes finais

    Os ACS compartilham o mesmo contexto sociale cultural e o mesmo universo lingustico de suapopulao atendida, o que facilita a identificaodos fatores ligados ao adoecimento das pessoasda comunidade, bem como o desenvolvimentode estratgias de atuao mais eficazes para apoltica pblica7. Tambm acompanham a situ-ao de sade das famlias de seu bairro, auxili-ando nos cuidados bsicos de sade primria.No entanto, esses profissionais, por viver namesma comunidade em que trabalham, convi-vem com os aspectos positivos e negativos, cer-tamente com mais intensidade do que os outrosmembros da equipe6.

    Martines, citado por Sousa28, investigou oprocesso de sofrimento no trabalho de ACS erelatou que eles tm dificuldades em lidar com oslimites da vida pessoal e o vnculo estabelecidocom a comunidade e se sentem, muitas vezes,

    impelidos a dar respostas em todas as situaes,o que aumenta suas angstias ante a impotnciaao se depararem com seus limites.

    Nesse sentido, seria interessante criar progra-mas institucionais especficos para os ACS, nosquais houvesse um espao de reflexo e escutasobre a definio clara de seu papel e de vnculosque precisam ou no ser estabelecidos, no intui-to de se prevenir o adoecimento mental dos pr-prios agentes, melhorando seu bem-estar e qua-lidade de vida uma vez que Sousa28 afirma quediante de situaes de sofrimento humano de suacomunidade, o ACS tem pressa de resolver o pro-blema porque teme tambm adoecer.

    Pesquisas futuras poderiam incluir anlisesqualitativas para maior reflexo sobre os limitese as possibilidades dessa profisso, bem comoanalisar diferentes construtos entre eles: estra-tgias de enfrentamento, metas de vida, autoesti-ma, senso de controle e de autoeficcia, compa-rao social, espiritualidade e religiosidade, reco-nhecidos como mecanismos de autorregulaodo self, e determinao de como seu trabalho in-fluencia seu dia a dia no sentido de favorecer asade mental.

    Colaboradores

    MC Resende realizou a reviso de literatura, orien-tou a pesquisa e a elaborao do artigo; EGS Aze-vedo, LR Loureno, LS Faria, NF Alves, NP Fari-na, NC Silva e SL Oliveira participaram da coletae anlise de dados e da elaborao do artigo.

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    Artigo apresentado em 07/03/2008Aprovado em 02/02/2009Verso final apresentada em 02/03/2009

    Referncias

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