ação improbidade gilso cherubin - construção - app [06.2014.00000019-8]

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO 2ª VARA CÍVEL - COMARCA DE XANXERÊ O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, pelo Promotor de Justiça titular da 2ª Promotoria de Justiça de Xanxerê, com fundamento nos arts. 127 e 129, III da Constituição da República, na Lei nº 8.429/92 e no art. 5º da Lei nº 7.347/85, e nas informações colhidas no Inquérito Civil nº 06.2013.00004222-9, propõe AÇÃO CIVIL PÚBLICA CUMULADA COM AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA em face de: GILSO CHERUBIN, ex-diretor de políticas ambientais de Xanxerê, brasileiro, casado, engenheiro agrônomo, inscrito no CPF sob o nº 645.933.719-53, RG nº 1.789.961, residente na Avenida Brasil, 789, ap. 204, Xanxerê.

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Ação de improbidade contra diretor de políticas ambientais por emissão de declaração de conformidade falsa.

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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO 2ª VARA CÍVEL - COMARCA DE XANXERÊ

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA

CATARINA, pelo Promotor de Justiça titular da 2ª Promotoria de Justiça de

Xanxerê, com fundamento nos arts. 127 e 129, III da Constituição da

República, na Lei nº 8.429/92 e no art. 5º da Lei nº 7.347/85, e nas

informações colhidas no Inquérito Civil nº 06.2013.00004222-9, propõe AÇÃO

CIVIL PÚBLICA CUMULADA COM AÇÃO DE IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA em face de:

GILSO CHERUBIN, ex-diretor de políticas ambientais de

Xanxerê, brasileiro, casado, engenheiro agrônomo, inscrito no CPF sob o nº

645.933.719-53, RG nº 1.789.961, residente na Avenida Brasil, 789, ap. 204,

Xanxerê.

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1. Objetivo da ação

Esta ação de improbidade administrativa cumulada com ação civil

pública tem por objetivo obter provimento jurisdicional que declare a ocorrência

de ato de improbidade administrativa que causou dano ambiental e contrariou

os princípios da administração pública praticado pelo requerido em dezembro

de 2012, aplicando as sanções cabíveis e condenando-o ao ressarcimento dos

danos ambientais apurados.

2. Síntese do inquérito civil público

No curso de regular inquérito civil público, o Ministério Público

identificou que a Família Somensi (Fabiano, Felipe e Leiva Somensi) construiu

residência de recreação na Linha Passo Trancado, interior de Xanxerê, em área

de preservação permanente.

Tal construção, conforme se observa pela Planta de Locação e

Quadro de Áreas anexa (anexo 1), invadiu a área de preservação permanente,

que no local é de 30 metros, reduzindo-a em até 10 metros em alguns pontos.

Identificou o Ministério Público três responsáveis pela construção

irregular: a) os proprietários; b) o arquiteto responsável pela obra; b) e o aqui

requerido, à época Diretor de Políticas Ambientais, por conta da emissão de

falsa declaração acerca da legalidade da obra.

Como se pode observar da Declaração (anexo 2) apresentada

pelos proprietários à Iguaçu Energia S.A., Gilso Cherubin falsamente atesta que

a construção está de acordo com "as diretrizes do uso do solo do Município",

permitindo assim a conclusão da construção com ares de legalidade.

Diante da tríplice responsabilidade, optou o Ministério Público, por

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questão de justiça, em dividir a indenização pelos danos ambientais de acordo

com a responsabilidade de cada um. À Família Somensi caberiam os custos da

demolição; o arquiteto arcaria com parte dos danos ambientais estimados; o

Diretor de Políticas Ambientais arcaria com outra parte.

Os representantes da Família Somensi celebraram regularmente

compromisso de ajustamento de condutas com o Ministério Público, ocasião em

que se comprometeram a demolir a construção nos locais em que houve

invasão da área de preservação permanente.

O arquiteto responsável pela obra, o senhor Nereu Roque

Vaccaro, igualmente celebrou compromisso de ajustamento de condutas,

ocasião em que se comprometeu a pagar os danos ambientais decorrentes de

sua conduta, estimados, para efeito de composição extrajudicial1, em R$

3.000,00.

O aqui requerido, todavia, negou-se a compor extrajudicialmente

com o Ministério Público, ensejando a propositura desta ação para que o ilícito

não permaneça impune e para que os danos ambientais que lhe são de

responsabilidade sejam indenizados.

3. Atos de improbidade – danos ambientais

O requerido Gilso Cherubin, diretor da Secretaria de Políticas

Ambientais, conforme apurado no curso do inquérito civil público, declarou

falsamente que "a construção existente na área de terra do sr. Fabiano

Somensi, na Linha Passo Trancado, interior do município de Xanxerê, está fora

da bacia de captação de águas do Município para abastecimento ao público e

está de acordo com as diretrizes do uso do solo do município, sendo

que deverá respeitar as leis ambientais vigentes para a implantação da

1 Em que as partes renunciam cada qual a parcela do direito, havendo, portanto, considerável diminuição do valor.

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construção e atividade" (anexo 2).

Tal documento é materialmente falso, porque, conforme se lê do

art. 84, III, "a", da Lei Municipal nº 2.920/2006, que instituiu o Código de

Zoneamento de Ocupação e Uso do Solo do Município de Xanxerê, a área de

preservação permanente, ao longo de rios na área rural de Xanxerê, é de 30

metros para cursos d´água de até 10 metros de largura, justamente o caso dos

autos.

A mesma Lei de Diretrizes do Uso do Solo de Xanxerê também

prevê a seguinte regra: "Art. 147 - É vedada a descaracterização, a edificação e

o parcelamento do solo nas áreas de preservação permanente, nas áreas de

proteção especial e quando a legislação a determinar nas áreas de

preservação".

Tais regras não são novidade, já que também o Código Florestal

Nacional (Lei nº 12.651/2012) prevê a mesma área de preservação

permanente: "Art. 4º Considera-se Área de Preservação Permanente, em

zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei: I - as faixas marginais de

qualquer curso d’água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros,

desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de: a) 30 (trinta)

metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura".

O dolo na expedição do documento é evidente, na medida em

que, sob a aparente reserva implícita de que "deverá respeitar as leis

ambientais vigentes para a implantação da construção e atividade", na prática

declara expressamente que "a construção existente na área de terra do sr.

Fabiano Somensi [...] está de acordo com as diretrizes do uso do solo do

município", quando tal fato é inverídico, já que a construção invadia área de

preservação permanente em até 10 metros.

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Note, Excelência, que tal declaração foi entregue aos proprietários

para que a apresentassem à concessionária de energia elétrica para permitir a

ligação à rede de construção com grave irregularidade ambiental. Como se

sabe, havendo dúvida, deve a concessionária exigir declaração do órgão

competente quanto à ocupação de áreas de preservação permanente, o que foi

realizado pela Iguaçu Energia S.A., razão maior da declaração emitida pelo

requerido Gilso Cherubin.

Art. 27. Efetivada a solicitação de fornecimento, a distribuidora deve cientificar o interessado quanto à: [...] II – necessidade eventual de: [...] d) apresentação de licença ou declaração emitida pelo órgão competente quando a extensão de rede ou a unidade consumidora ocuparem áreas protegidas pela legislação, tais como unidades de conservação, reservas legais, áreas de preservação permanente, territórios indígenas e quilombolas, entre outros (Resolução Normativa nº 414/2010, Aneel2).

Em assim agindo, Gilso Cherubin expediu documento que conferiu

ares de legalidade à construção irregular invasora de área de preservação

permanente edificada pela Família Somensi, agindo não só contra o Meio

Ambiente, mas contra o princípio da legalidade, na medida em que desafiou os

arts. 83 e 147 da Lei de Diretrizes do Uso do Solo de Xanxerê (Lei nº

2.920/2006), infringindo o art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa. Deve,

portanto, ser submetido às sanções do art. 12, III, da Lei nº 8.429/92.

Sua conduta também causou dano ambiental, na medida em que

a construção teve sequência e foi inclusive conectada à rede de energia

elétrica, com o aterramento parcial e com edificação na área de preservação

permanente, dano que deve ser arbitrado, no entender do Ministério Público,

em no mínimo R$ 15.000,00.

2 http://www.aneel.gov.br/cedoc/ren2010414.pdf

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Registre-se que o arbitramento é a melhor postura a ser adotada

pelo Judiciário nestes casos, conforme doutrina e jurisprudência3, já que as

perícias para liquidação da sentença costumam ser mais caras que o próprio

dano em si, além de não serem minimamente fidedignas, já que não há

critérios científicos para tanto (como saber o valor de uma árvore nativa

derrubada?).

4. Direito Lesão aos Princípios Improbidade Administrativa art. 11

A conduta praticada configura o ato de improbidade do art. 11 da

Lei nº 8.429/92: “Constitui ato de improbidade administrativa que atenta

contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que

viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às

instituições”.

Ao emitir, na qualidade de Diretor de Políticas Ambientais,

declaração materialmente falsa, que informava estar a construção de acordo

com as diretrizes do uso do solo do município, agiu frontalmente contra o

princípio da legalidade, que exigia postura completamente diversa: negar a

emissão da declaração, vistoriar a área e autuar o construtor e os proprietários

pela infração, exigindo deles a recuperação da área degradada, o que não foi

realizado em momento algum.

3 “Condenação em dinheiro. A aferição do quantum indenizatório nas ações coletivas com a finalidade de reparação do dano difuso ou coletivo é questão de difícil solução. Poderão ser utilizados os critérios de arbitramento ou de fixação da indenização com base no valor do lucro obtido pelo causador do dano com sua atividade. É possível a cumulação da indenização por danos patrimoniais e morais (STJ 37; CDC 6º VI)" (JÚNIOR, Nelson Nery e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação civil extravagante em vigor. São Paulo: Malheiros. 5ª ed. p. 1529).

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5. Sanções

Além da indenização pelos danos ambientais, a conduta enseja a

aplicação das sanções previstas no inciso III do art. 12 da Lei nº 8.429/92. Eis

as sanções aplicáveis ao caso: “ressarcimento integral do dano, se houver,

perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos,

pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida

pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios

ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por

intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três

anos”.

6. Dano ambiental

De acordo com o art. 14, §1º, da Lei nº 6.938/85, "[...] é o

poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou

reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua

atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para

propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio

ambiente".

Por poluidor entende-se "a pessoa física ou jurídica, de direito

público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade

causadora de degradação ambiental".

Gilso Cherubin foi diretamente responsável pela atividade

causadora de degradação ambiental, na medida em que, além de emitir

declaração falsa permitindo ser a edificação considerada "legal", omitiu-se no

seu dever de autuar a construção e determinar, como autoridade ambiental

municipal, a execução imediata de integral projeto de recuperação da área

degradada.

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6. Pedidos

Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE

SANTA CATARINA requer:

a) a autuação da inicial, nos termos do procedimento previsto na

Lei de Improbidade Administrativa (mais amplo que o da Lei da Ação Civil

Pública);

b) a notificação do demandado, para a defesa preliminar, nos

termos do artigo 17, § 7º, da Lei nº 8.429/92;

c) a notificação do Município de Xanxerê (art. 2º e do art. 3º da

Lei nº 8.429/92) para que, querendo, se manifeste, e para que apresente cópia

da folha de pagamento de Gilso Cherubin relativamente ao mês de dezembro

de 2012 (data da expedição da declaração falsa);

d) o recebimento da inicial e a citação do requerido para,

querendo, contestar o feito, observado o procedimento previsto na Lei nº

8.429/92;

e) a produção de prova testemunhal, pericial e documental que

porventura for necessária;

f) a condenação do requerido a indenizar os danos ambientais, a

serem arbitrados em R$ 15.000,00, e às seguintes sanções (Lei de

Improbidade Administrativa): f1) pagamento de multa civil de até cem vezes a

remuneração do agente; f2) proibição de contratar com o Poder Público ou

receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente,

ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo

prazo de três anos; f3) suspensão dos direitos políticos por até cinco anos.

g) a condenação do requerido em custas, despesas processuais e

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honorários advocatícios (estes conforme art. 4º do Decreto Estadual nº

2.666/04, em favor do Fundo de Recuperação de Bens Lesados do Estado de

Santa Catarina).

Dá-se à causa o valor de R$ 20.000,00.

Xanxerê, 21 de outubro de 2013

Eduardo Sens dos SantosPromotor de Justiça

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