a utopia social do conde de s. bento[2]

35
1 A Utopia Social e Filantrópica do Conde de S. Bento Trabalho de Pesquisa realizado no âmbito da Disciplina Ciência Política Turma 12º D/E Docente responsável José Guilherme Abreu Escola Secundária de D. Dinis Santo Tirso Ano lectivo de 2009/2010 Índice

Upload: dora-ferreira-de-freitas

Post on 19-Jun-2015

690 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

1

A Utopia Social e Filantrópica do

Conde de S. Bento

Trabalho de Pesquisa

realizado no âmbito da Disciplina

Ciência PolíticaTurma 12º D/E

Docente responsávelJosé Guilherme Abreu

Escola Secundária de D. DinisSanto Tirso

Ano lectivo de 2009/2010

Índice

Page 2: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

2

1- Introdução

1.1- Apresentação e agradecimentos, Prof. José Guilherme Abreu

1.2- Enquadramento curricular do tema, Sarah Lotfy e Carla Barbosa

1.3- Utopias e Utopistas Sociais, Bárbara Borralho

1.4- Doutrina Social da Igreja, Andreia Carneiro e Cristiana Monteiro

2- Vida e Obra do Conde de S. Bento

2.1- Dados biográficos, Fábio Pacheco e Diogo Pinheiro

2.2- Acção benemérita e filantrópica, Fábio Pacheco e Diogo Pinheiro

2.3- Nobilitações Régias e Condecorações Civis, Carla Barbosa

3- O Legado do Conde de S. Bento,

3.1- O Testamento do Conde de S. Bento, Ana Raquel Soares e Marta Oliveira

3.2- A obra de José Luís de Andrade, Rui Ribeiro e Pedro Dias

4- Análise da Obra e da Acção do Conde de S. Bento

4.1- Pedagogia e pedagogos sociais, Helena Gomes e Marcelo Carneiro

4.2- O caso de Friedrich Frœbel, Rui Ribeiro e Pedro Dias

4.3- A Fábrica de Fiação de Santo Tirso, Fábio Pacheco e Diogo Pinheiro

5- Ilações finais, Fábio Pacheco, Diogo Pinheiro e Bárbara Borralho

5.1- Síntese,

5.2- Quadro Comparativo

6- Bibliografia

7- Anexos

Page 3: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

3

1. Introdução1.1- Apresentação e agradecimentos:

A ideia de realizar um estudo no âmbito da disciplina Ciência Política sobre o Conde de S.

Bento, resultou da visita que os alunos da turma D/E do 12º ano, em regime de aula,

fizeram à Exposição sobre o Bicentenário do Conde de S. Bento que esteve patente na

Biblioteca da Escola Secundária de D. Dinis, no início do 3º Período.

Havendo previamente estudado as ideologias políticas, nomeadamente aquelas que mais se

debruçaram, durante o século XIX, sobre a “Questão Social”, e que por isso viriam a de-

signar-se “ideologias socialistas”, os alunos foram tomando consciência de que o Conde de S.

Bento era uma personagem que aparentemente se encaixava dentro da noção de “filantropia

social ou patronal” que animava o ideário do chamado “socialismo utópico”.

A existência de habitações e de terrenos de cultivo no interior do recinto da Fábrica de

Fiação de Santo Tirso, fundada por iniciativa do Conde parecia indiciar a presença de refe-

rências flagrantes aos objectivos e métodos preconizados pelos socialistas utópicos, tendo

um aluno da turma referido que aquela fábrica lhe fazia lembrar um “Falanstério”.

Pensei então que seria pedagogicamente interessante organizar uma pesquisa no sentido de

tentar apurar, se possível, da consistência, ou não, da hipótese formulada.

Entre outros aspectos que a seguir se enunciarão, tal objectivo era desde logo uma opor-

tunidade adequada para ensaiar os passos da aplicação do método científico no desenvolvi-

mento da investigação em Ciências Humanas, pois a formulação de hipóteses e a sua verifi-

cação constituem passos metodológicos de importância capital para o ensaio de estudos

cientificamente conduzidos, pois mesmo que a hipótese se viesse a manifestar como refu-

tável ou inconfirmável, ainda assim ter-se-ia avançado na boa direcção no que concerne à

aquisição e desenvolvimento de boas práticas, na organização da pesquisa e do estudo.

E foi isso, apenas, o que se fez. Não foi uma resenha biográfica sobre o Conde de S. Bento.

Não foi uma descrição das obras que ficaram a dever-se à acção benemérita do Conde,

embora na pesquisa todas elas se encontrassem implicadas.

Em vez disso, o estudo visou analisar o pensamento e a acção de alguns dos mais repre-

sentativos utopistas, filantropos e socialistas cristãos do século XIX, tipificar algumas linhas

de acção e verificar depois se essas mesmas linhas coincidiam ou se compatibilizavam com

a linha de acção do Conde de S. Bento.

Para tanto, a turma foi dividida em sete grupos de dois alunos cada, mais outro de um

aluno, correspondendo estes oito grupos ao tratamento de outras tantas temáticas, funci-

Page 4: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

4

onando como subtemas do tema global, de tal forma que o trabalho final resultou do

concurso de todos esses subtemas, visando o esclarecimento possível da questão inicial.

Numa primeira fase, os alunos partiram à procura da informação necessária ao apuramento

dos factos, cabendo aqui dirigir uma palavra de agradecimento ao Doutor Álvaro Moreira

do Museu Abade Pedrosa, pelas facilidades dadas de requisção de bibliografia especializada

e pela cedência do restante material e informação concedida. Da mesma forma importa

agradecer ao Dr. Nuno Olaio do Centro Cultural de Vila da Aves, pelo envio de material

muito detalhado sobre o monumento/estátua de homenagem ao Conde de S. Bento, Assim

como importa agradecer também aos responsáveis e funcionários da Misericórida de Santo

Tirso e da Biblioteca Municipal, pelo apoio e informações prestadas.

Sintetizando, com este trabalho pretendia-se:

1. Aplicar e desenvolver conhecimentos adquiridos no âmbito do currículo de Ciência Política2. Aprofundar conhecimentos sobre a História e a Sociedade da Comunidade 3. Integrar o estudo da Realidade Local no âmbito do conhecimento da Realidade Geral4. Familiarizar os alunos com as rotinas de investigação em Ciências Humanas

Relativamente ao formato do resultado final da pesquisa, privilegiou-se a apresentação

sucinta e sintetizada, resultante da análise directa das fontes e do apuramento dos factos,

tendo sido pedido aos alunos para condensarem a informação obtida em tabelas, por forma

a que da análise dessas tabelas estes poderem retirar as necessárias ilações.

Importan no entanto dizer que o desenvolvimento deste estudo deparou-se com problemas

que contrariaram a obtenção de conclusões esclarecedoras, desde logo começando pela

carência de estudos de raiz que pudessem fornecer os dados que a sua realização exigia,

pois a figura do Conde de S. Bento ainda não se encontra estudada pela literatura especia-

lizada com a profundidade que este trabalho requeria, uma vez que como é óbvio essa

investigação não pode ser realizada no âmbito de estudos de nível secundário.

Importará aguardar que a investigação especializada investigue melhor esta curiosa figura

da filantropia social portuguesa. Uma figura que não é única, pois a mesma se enquandra

no âmbito do painel de “brasileiros de torna viagem” que enriquecidos com os negócios do

Eldorado brasileiro, e não deixando descendência legítima, regressam endinheirados à

Pátria, onde doam em Testamento parte muito significativa dos seus bens, servindo as

Misericórdias locais de zeladores e administradores de um património que por vezes chega

a ser avultado, como sudece com o Conde de Ferreira, que de melhor (e primeiro) irá

definir os contornos identificadores da figura do afortunado “brasileiro-e-benemérito”

Page 5: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

5

1.2- Enquadramento curricular do tema:

O trabalho sobre a Utopia Social do Conde de S. Bento, realizado no âmbito da disciplina de

Ciência Politica insere-se, de acordo com o programa da disciplina, em moldes gerais, no que

diz respeito ao desenvolvimento de aptidões e conhecimentos de fundo, como se refere:

“Finalidades:

1. Proporcionar conhecimentos básicos relativos a vida política, quer em geral, quer especificamente em Portugal

2. Potenciar o desenvolvimento de uma perspectiva crítica sobre o mundo e sobre a vida em sociedade.”

Relativamente a metas específicas de aprendizagem, o mesmo programa refere:

“Objectivos gerais

Do domínio cognitivo:

Compreender a complexidade política, articulando-a com a sociedade, com a economia e com a evolução das mentalidades.

Do domínio socioafectivo:

Desenvolver a capacidade de trabalhar em grupo e individualmente;

Assumir opiniões próprias, de forma esclarecida e fundamentada;

Desenvolver as capacidades de argumentação e reflexão.

Competências relativas ao saber fazer:

Ler e interpretar diferentes tipos de documentos relativos aos temas da disciplina;

Construir textos fundamentados e coerentes;

Utilizar técnicas de pesquisa, de tratamento e de apresentação de informação;

Competências relativas ao saber ser:

Colaborar de forma responsável nas tarefas propostas;

Adoptar atitudes de tolerância, de solidariedade, de cooperação e de não-discriminação;

Tematicamente, o trabalho inseria-se no currículo de Ciência Política, como se segue:

“Unidade II – As Ideias Politicas no Quadro do Estado Moderno

2.3 – As ideologias políticas

2.3.2 – As principais correntes ideologicas: Socialismo.”

Sobre os métodos de abordar e desenvolver o tema o Programa refere:

“Gestão do tema

Partindo de um conceito simples de ideologia política, estendida como conjunto de valores colectivos orientados para a acção, deverão ser reconhecidas as principais correntes ideológicas no quadro constitucional.

Os alunos deverão identificar o socialismo e os seus pensadores de referência, nomeadamente, os utopistas Robert Owen, Charles Fourrier e o Conde de Saint-Simon.”

Page 6: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

6

1.3- Utopias e Utopistas Sociais:

O Socialismo surge de início como uma continuação do período do Iluminismo, em

França, no século XVIII e teve de conectar-se às ideias base que já existiam. No entanto a

fonte verdadeira do socialismo reside nas condições económicas, na consciencialização para

os antagonismos entre as classes existentes na sociedade moderna – as que têm e as que

não têm, assalariados e burgueses – e a anarquia existente.

Se nos referirmos ao socialismo num sentido amplo podemos incluir quase tudo o que se

opões ao individualismo, ou seja, a todas as doutrinas e teorias que se ocupem

primordialmente do sector social, do conjunto de relações humanas dando preponderância

aos aspectos individualistas. Em comum aos vários movimentos socialistas ao longo dos

tempos surge a preocupação em melhorar a sociedade, tornando-a mais justa e igualitária,

combatendo tudo o que se opusesse a esse ideal.

Os primeiros socialistas – catalogados para a posteridade como “utópicos” – são bastante

diferentes dos que se seguiram. As suas teorias eram muito incoerentes em certos aspectos

mas que, apesar disso, não podem ser consideradas como simples “utopias”. No entanto,

geralmente, não passavam disso, de formulações teóricas. Este primeiro pensamento

socialista influenciava alguns sectores da sociedade mas não o movimento operário (mais

tarde denominado de “proletariado” propriamente dito; “o socialismo e o movimento

operário não sabiam encontrar-se”.

O pensamento dos socialistas utópicos foi formulado, no início, por Saint-Simon, Charles

Fourier, Louis Blanc e Robert Owen. No século XIX, com o capitalismo a desenvolver-se

desde a Revolução Industrial, aumenta nas cidades o número de operários a trabalhar para

receberem baixos salários. As críticas ao liberalismo resultam da constatação de que a livre

concorrência não trouxe o equilíbrio prometido e esperado, instaurando, pelo contrário

uma ordem injusta e imoral.

Os diversos teóricos do socialismo possuem diferentes ideias e propõem soluções distintas,

porém é possível reconhecer algumas semelhanças entre elas:

Tentam reformar a sociedade com a ajuda e boa vontade de todos;

Todas as tentativas não ultrapassam uma tendência fortemente filantrópica e paternalista: melhoria de alojamentos e higiene, aposta na educação através da construção de escolas, aumento dos salários, redução de horas de trabalho…

Seguidamente, recorrendo a um quadro, passo a apresentar os principais socialistas

utópicos que iniciaram movimentos em prol desse mesmo socialismo nos seus países:

Page 7: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

7

Page 8: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

8

Page 9: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

9

Page 10: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

10

Após uma leitura atenta de todas estas características dos principais socialistas utópicos, é

impossível, no âmbito deste trabalho, não estabelecer algumas comparações relativamente à

obra social levada a cabo pelo Conde de S. Bento. A diferença mais notória entre eles

reside sobretudo na religião, uma vez que o Conde de S. Bento era um devoto enquanto

Fourier, por exemplo, critica a religião.

De seguida apresento um quadro com os aspectos em comum entre os socialistas utópicos

e as obras sociais do Conde de S. Bento:

Page 11: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

11

Page 12: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

12

Por uma análise atenta do quadro é possível notar que a obra social do Conde de S. Bento

é bastante semelhante ao que era defendido e apregoado por Robert Owen. A preocupação

com a educação e com a garantia de emprego às pessoas de forma a melhorar a sociedade

são pontos importantes e fulcrais. Muita da acção benemérita do Conde é em tudo idêntica

ao pensamento socialista. Contudo é de louvar que o Conde de S. Bento foi para além da

Utopia e transformou em realidade a educação, a agricultura, a indústria e a religião na

antiga vila (agora cidade) de Santo Tirso.

Page 13: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

13

1.4- A Doutrina Social da Igreja:

No século XIX, o desenvolvimento da ideologia socialista estabeleceu-se como suporte de

pensamento político entre diversos movimentos operários. As revoluções e os protestos

colocavam os trabalhadores como personagens munidos de uma visão política contrária

aos pressupostos que explicavam o sistema capitalista. Desta maneira, o ideal da luta de

classes deixa de ser uma mera interpretação para figurar vários eventos da época.

Atenta a estas transformações, a Igreja Católica decidiu reunir os seus principais dirigentes

para discutir as questões envolvendo a relação entre burguesia e proletariado. Ao mesmo

tempo, deve-se destacar que essa mesma preocupação ligava-se ao conteúdo ideológico de

muitos movimentos que pregavam explicitamente o fim das manifestações religiosas. A

ideia da crença religiosa como coisa prejudicial começava a preocupar os clérigos.

No ano de 1891, o papa Leão XIII publicou a encíclica Rerum Novarum. Segundo este

documento, o papa estabelecia a sua expressa oposição à luta entre classes defendida pela

doutrina marxista. Em seu lugar, o líder máximo da Santa Sé colocava a religião como um

instrumento capaz de arrefecer as desigualdades no mundo. Dessa forma, a moral e o

amor cristão de empregados e empregadores poderiam ser ponto fundamental para que a

justiça social fosse alcançada.

Com o tempo, vários cristãos fortaleceram a sua preocupação para com os problemas de

cunho político e social. No século XX, o envolvimento da Igreja com esses temas

aprofundou-se quando o Concílio Vaticano II (1962 - 1965) reafirmou o papel social e

político a ser exercido pelo cristão. Nessa mesma época, o movimento da chamada

Teologia da Libertação fez com que muitos clérigos e fiéis realizassem projetos sociais e

organizassem discussões políticas no interior das paróquias.

Actualmente, muitos representantes mais conservadores da Igreja defendem que o

envolvimento dos católicos devem restringir-se apenas aos assuntos de ordem espiritual.

Paralelamente, também pode-se ver que o próprio comportamento religioso

contemporâneo veio a desarticular essa associação entre fé e política. Hoje em dia, a busca

pelo conforto material imediato e o ideal de salvação individual contribuíram para que a

“igreja politizada” perdesse seu espaço.

Na encíclica Rerum Novarum, o Papa reconhece a gravidade das questões sociais

provocadas pelo capitalismo, pelo que só os valores cristãos poderiam corrigir esses males

sociais. Mas, ao mesmo tempo, ele colocou-se contra quaisquer alternativas igualitárias,

revolucionárias, ao afirmar que "a teoria socialista da propriedade colectiva deve

Page 14: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

14

absolutamente repudiar-se como prejudicial àqueles membros a que se quer socorrer,

contrária aos direitos naturais dos indivíduos, como desnaturando as funções do Estado e

perturbando a tranquilidade pública." (Rerum Novarum, n. 7) No entender dos teóricos do

socialismo cristão, o cristianismo tem em si mesmo valores socializantes, pelo que o

capitalismo é reconhecido como contrário aos valores da fé cristã.

A par do enquadramento da doutrina da Igreja, pode ainda falar-se de socialismo cristão,

que é um movimento político de esquerda que defende simultaneamente ideais cristãos e

socialistas. Os millitantes deste movimento advogam que o socialismo e o cristianismo

estão ambos interligados e são compatíveis um com o outro.

O socialismo de matriz cristã, comumente denominado pelos católicos de Movimento

Social Cristão ou Movimento Cristão Social, teve o seu início em meados do Século XIX,

nas obras de vários doutrinários cristãos (ex: Henri de Saint Simon, Lamennais, Albert de

Mun, Frederick Denison Maurice, Charles Kingsley, Thomas Hughes, Frederick James

Furnivall, Adin Ballou e Francis Bellamy). Estes escritores propunham um socialismo

novo, baseado nos ideais do cristianismo, oposto à luta de classes e ao ateísmo, mas

preocupado com as reivindicações das classes pobres e trabalhadoras, propondo um

governo mais justo e uma sociedade mais equilibrada. Este novo socialismo, afastado do

materialismo marxista, defende as organizações sindicais, as lutas dos trabalhadores em

prol de melhores condições de trabalho e de vida e a justiça social.

O socialismo cristão desenvolveu-se, mais tarde nos círculos católicos, como um ramo ou

variante progressista da catolicismo social no qual o socialismo cristão ganhou muita força

após a encíclica "Rerum Novarum" do Papa Leão XIII, que em oposição ao socialismo de

Proudhon e, mais tarde, ao marxismo ou socialismo científico, mas opondo-se também e

de igual modo ao capitalismo, o catolicismo social recusa a luta de classes, promove a

colaboração entre patrões e trabalhadores e prega a aplicação da doutrina católica e a

intervenção do Estado para corrigir os males criados pela industrialização, criando uma

maior justiça social e uma distribuição mais equitativa da riqueza produzida e pretendia

assim constituir uma resposta cristã para a questão social alternativa à corrente dominante

da Associação Internacional dos Trabalhadores (depois Internacional Socialista).

Em Portugal o socialismo cristão teve inicio com a AC Acção Católica, de onde sairam

mais tarde lideres do MDP/CDE e na JOC Juventude Operária Católica, actualmente está

no Portugal Pró-Vida.

Page 15: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

15

Os principais aspectos desta temática encontram-se condensados na seguinte tabela:

Corrente Autor Ideias Exemplos Obras

Catolicismo

social

Freiherr von Ketteler

Defendeu os direitos da Igreja frente ao Estado Alemão.

Reivindicou o aumento de salários, férias, redução da carga horária de trabalho e eliminação do trabalho infantil.

Fundou as ordens religiosas de irmãos da escola e das irmãs daescola, para trabalhar nos estabelecimentos educativos que tinha criado.

Trabalhou para instituir orfanatos e para resgatar lares. Em 1851 fundou a Congregação das Irmãs da Divina Providência.

A questão operária e o cristianismo(1864)

Socialismo cristão

Frederick Denison Maurice

Acredita que a política não deve ser separada da religião

Admirador das ideias de Robert Owen

Em 1848, fundou uma escola superior para mulheres.

Em 1854, criou uma escola para trabalhadores.

The Kingdom of Christ (1838)

Robert Owen

Defende que a iniciativa privada tem um papel fundamental a desempenhar no processo de melhoria das condições de vida das pessoas, de superação da desigualdade social e econômica.

Construiu, em Lanark, casas melhores para seus empregados, construiu uma escola e ainda montou, em sua empresa, um armazém onde as mercadorias poderiam ser adquiridas a um preço mais justo. Reduziu a jornada de trabalho para dez horas diárias, recusou-se a con-tratar crianças com idade inferior a dez anos.

A New View of Society (1813)

Report to the County of Lanark (1829),

The New Moral World (1834)

Page 16: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

16

2- Vida e Obra do Conde de S. Bento

2.1- Dados biográficos

O Conde de São Bento, Manuel José Ribeiro, que nasceu em Santo Tirso em 2 de Agosto

de 1807 e ali morreu em 26 de Março de 1893, filho de Domingos José Ribeiro e de sua

mulher D. Rosa Maria Martins.

Embarcou para o Brasil com 11 anos de idade, depois de receber alguma instrução

elementar na escola de sua terra. O navio porém foi assaltado por piratas e o jovem só com

muita dificuldade conseguiu regressar a Portugal, depois deste primeiro malogro.

Ajudado pelo seu conterrâneo Manuel Luís de Paiva, teve como empregado da casa do

comendador José Bento da Silva, seu primeiro patrão.

Até 1832 andou à procura de fortuna por algumas cidades do Baixo Amazona (Santarém e

Alenquer), regressando a Santa Maria de Belém, onde se fixou na casa de José Pais de

Sousa ate 1837, ano em que se estabeleceu por conta própria.

Em 1874, numa das suas visitas a Portugal, já 67 anos, não mais voltou ao Pará, instalando-

se definitivamente na vila de Santo Tirso.

Auxiliado pelo seu sobrinho José Luís de Andrade liquida a sua casa comercial no Brasil e

transfere para Portugal a grande fortuna que possuía.

Um ano depois do seu regresso, 1875, era agraciado com a Comenda de Nossa Senhora da

Conceição de Vila Viçosa.

Por Decreto-Lei de 20 de Janeiro de 1881 foi Comendador Ribeiro agraciado com o título

de Visconde de São Bento.

No princípio de 1882 adquiriu o novo titular a casa e a quinta do mosteiro de Santo Tirso.

As «Quintas do Mosteiro, de Dentro e de Fora» são hoje ocupadas pela Escola Agrícola do

seu nome, que o Conde de São Bento após as ter comprado, doou à Santa Casa da

Misericórdia com o fim de ali instalar um Asilo Agrícola.

A 3 de Janeiro de 1886 foi inaugurado na vila o edifício para uma ampla escola de ambos

os sexos mandada construir e mobilar pelo Visconde de São Bento.

Por Decreto de 6 de Maio de 1886 foi o Visconde de São Bento elevado a Conde.

Page 17: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

17

Em 9 de Agosto de 1890 foi concedida ao Conde de São Bento a medalha de ouro de

Instrução Nacional.

O Conde de São Bento cedeu todo o terreno que o hoje é ocupado pelo Parque D. Maria

II (anteriormente tinha o nome e de Praça Conde de São Bento).

É nesta praça a poente que encontramos o edifício que o Conde mandou construir para o

Hospital da Misericórdia e, como tal, serviu o concelho durante longos anos.

Os seus sentimentos filantrópicos levaram-no a dotar aquela vila com grandes benefícios:

fundou uma escola e um hospital, custeando o respectivo funcionamento, restaurou a

capela do Senhor dos Passos, assegurou as despesas do culto, e cedeu vastos terrenos da

sua quinta à Câmara Municipal da vila para abertura de novas ruas.

Construiu a Fábrica de Santo Tirso, a primeira empresa industrial desta vila, garantindo

trabalho para 40 operários tirsenses.

Por outro lado, teve também preocupações religiosas, tendo feito uma série de benefícios à

Igreja de Santo Tirso, bem como a reedificado a Capela do Senhor dos Passos.

No dia 26 de Março de 1893, faleceu o Conde de São Bento que residia numa casa de

azulejos situado no Campo 29 de Março, actual Praça Conde de São Bento.

O Conde de São Bento repousa no jazigo que lhe foi mando erigir por seu sobrinho e

herdeiro José Luís de Andrade e que se acha colocado ao meio do claustro da igreja.

Fora da Vila a sua actividade também foi meritória: reconstruiu a igreja de Santiago da

Carreira (V. N. de Famalicão) e da matriz de Santiago dos Arcos; mandou construir as

capelas de Santa Cristina, de Santiago de Bougado e de Nossa Senhora das Dores, na

Trofa, etc..

Tem um monumento em Santo Tirso, com estátua, inaugurado em 1892 e foi dado o seu

nome à Escola Pratica de Agricultura, na mesma vila.

O título de Visconde foi-lhe concedido em 1881 por D. Luís, e o mesmo monarca elevou-

o a Conde em 1886.

Page 18: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

18

Súmula dos dados

1807

Manuel José Ribeiro, Conde de São Bento, nasceu na Quinta de Poldrães, em S. Miguel das Aves, Concelho de Santo Tirso a 2 de Agosto de 1807, e morreu emSnato Tirso, no dia 26 de Março de 1893. Era filho de Domingos José Ribeiro e de sua mulher D. Rosa Maria Martins, ambos de origem modesta.

1818 Embarcou para o Brasil com 11 anos de idade

1832

Procurou fortuna por algumas cidades como Santarém e Alenquer, regressando a Santa Maria de Belém, onde se instalou em casa de José Pais de Sousa ate 1837.

1874 Instalou-se definitivamente na vila de Santo Tirso.

1874

Auxiliado pelo seu sobrinho José Luís de Andrade liquidou a sua casa comercial no Brasil e transferiu para Portugal a sua grande fortuna.

1875 Agraciado com a Comenda de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa.

1881 Por Decreto-Lei de 20 de Janeiro de 1881 o Comendador Ribeiro foi agraciado com o título de Visconde de São Bento por D. Luís.

1882 Adquiriu a quinta do mosteiro de Santo Tirso.

1886

Em 3 de Janeiro foi inaugurado na vila um edifício para uma ampla escola de ambos os sexos mandada construir e mobilar pelo Visconde de São Bento.

1886 Por Decreto de 6 de Maio de 1886 o Visconde de São Bento foi elevado a Conde por D. Luís.

1890 Em 9 de Agosto foi concedida ao Conde de São Bento a medalha de ouro de Instrução Nacional.

1892 Foi inaugurado em Santo Tirso um monumento com a sua estátua.

1892

O seu nome foi dado à Escola Prática de Agricultura de Santo Tirso que passou a designar-se: Escola Profissional Agrícola Conde de S. Bento

1893 Morreu em Santo Tirso em 26 de Março de 1893.

Page 19: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

19

2.2- Acção benemérita e filantrópica

Para dar conhecimento das acções de beneficência por parte do Conde de S. Bento, as

mesmas foram divididas por três tabelas. A primeira tabela refere as doações feitas fora do

país, nomeadamente no Brasil. A segunda refere as acções beneméritas feitas em Portugal

excluindo as doações relativas a Santo Tirso, pois estas encontram-se se na tabela posterior.

Após a análise da primeira tabela, podemos concluir que a quantia mais elevada dirige-se às

meninas pobres e órfãs assim como às viúvas, mas, se efectuarmos o somatório das

quantias restantes entregues a hospitais e afins, podemos concluir que, em conjunto, este

tipo de instituições recebe aproximadamente metade de todos estes donativos.

Na segunda tabela verificamos uma panóplia de destinatários que variam entre hospitais,

regiões do Norte de Portugal e centros de caridade (também no norte). Mais uma vez se

verifica uma maior preocupação com os hospitais e estabelecimentos de caridade, facto este

que se comprova pela maior quantia a estes atribuídas.

Na terceira e última tabela verificamos que, em relação às outras freguesias, Santo Tirso

recebe mais obras de beneficência (apenas em número o podemos confirmar visto que não

foram encontrados valores monetários). Verificamos também que, a maioria das obras e

subsídios destinaram-se a fins religiosos.

Page 20: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

20

3. O Legado do Conde de S. Bento

3.1- Testamento do Conde de S. Bento

«Em nome de Deus Amen. Eu Manoel José Ribeiro, estando de

perfeita saúde e em perfeito juízo e não sabendo quando Deus terá

determinado que findem meus dias de vida me deliberei fazer o meu

testamento e última vontade que é como se segue. (…) Declaro que

tenho vivido no estado de solteiro e nunca tive filhos (…) não tenho

herdeiro algum a quem por direito compita a minha herança (…)»

Testamento do Conde de S. Bento, In,

Manoel José Ribeiro fez parte do grupo de muitos portugueses que voluntariamente emi-

graram para o Brasil e, depois de longos e árduos anos de trabalho, conseguiu finalmente

voltar de lá com a sua valiosa fortuna.

Fez várias tentativas para conseguir atingir o seu objectivo sendo que, das primeiras vezes

que embarcou, para além dos barcos onde viajava serem de fraca envergadura, ou

encontraram piratas que lhes roubaram ou depararam-se com tempestades.

Visto ter uma fortuna com muitos números, o Conde São Bento quis escrever o

testamento um pouco mais cedo pois não queria que esse dinheiro caísse nas mãos erradas

e o seu trabalho durante anos fosse feito para depois não honrar o esforço.

A sua fortuna teve vários destinatários sendo que, para além do seu sobrinho, José Luiz

d’Andrade, que ficou com o remanescente da fortuna (não sabendo nós ao certo o valor

desta quantia) os seus bens foram muito bem distribuídos por hospitais, igrejas,

estabelecimentos de caridade e pessoas carenciadas (pobres, doentes, viúvas e meninas

pobres e escravos).

Na nossa opinião, o alto da sua herança foi o facto de ter concedido liberdade a todos os

seus escravos e, para além da liberdade, a remuneração monetária por anos de sofrido

trabalho. Mas a sua herança tem muito que se lhe diga.

A sua herança incidiu mais sobre os hospitais, sendo que no total cerca de 32.000$000

foram dirigidos para estes estabelecimentos; seguidos das pessoas carenciadas às quais

contribui com aproximadamente 28.000$000 (este valor inclui o valor doado aos

estabelecimentos de caridade); as igrejas que contou com um valor estimado em

Page 21: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

21

24.500$000; mas também deixou umas pequenas quantias para o Governo Português, para

a sua casa comercial e deixou algumas quantias no banco para ficar a render para o seu

herdeiro.

Podemos observar que, apesar de estar muitos anos no Brasil, e de ter sido este o país que

o pôs numa situação económica bastante avantajada, não esqueceu nunca as suas origens

sendo que a maior parte dos destinatários da sua herança se encontram em Portugal e,

maioritariamente, se não um todo, no norte do país.

O Conde São Bento nomeou três pessoas para a sua herança: 1º- José Luiz d’Andrade

(sobrinho); 2º- Sr. Dr. Augusto Thyago Pinto; 3º- Sr. Victor Rodrigues d’Oliveira. O Conde

de São Bento decidiu nomear três herdeiros pois, se quando o Conde morresse, o seu

primeiro herdeiro também já se encontrasse morto, a sua herança passaria para o segundo e

se o mesmo tivesse acontecido com este, passaria para o terceiro. O seu verdadeiro

herdeiro foi a sua primeira opção, o seu sobrinho, que soube honrar a memória do tio e

continuar com a sua obra.

É também de salientar que, à morte do seu herdeiro, José Luiz d’Andrade, todo o seu

dinheiro passa para corporações religiosas e estabelecimentos de caridade à escolha do

herdeiro.

Page 22: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

22

Destinatários Bens Observaçõe

José Luiz d’Andrade Casa comercial Sócio da casa comercial

Casa comercial 400$000 Fundos da casa comercial

Governo Português 30$000 Inscrições do Governo Português

Bancos Algumas quantias A vencer juros. Quando o Conde morrer passa tudo para nome do herdeiro.

Destinatários Bens Observações

Todos os seus escravos, tanto de homens como de mulheres

Liberdade Um ano depois de morrer (ao do seu herdeiro)

Escravos 100$000 Retirado do dinheiro da herança e sendo que 100$000 era por escravo

Missas Retirado do dinheiro da herança (25dias pela sua alma e 25 dias pela alma dos avós)

Igrejas 500$000 Esmolas

Pobres 400$000 4$000 para cada pobre sendo que estes são escolhidos pelo herdeiro

Hospital dos Lazaros 8.000$000 Melhoramentos

Destinatários Bens Observações

Doentes do hospital dos Lazaros

40$000 Para cada doente

Hospital da caridade de Santo Tirso

4.000$000 …

Meninas pobres e honestas e viúvas nas mesmas

circunstâncias

16.000$000 As esmolas serão de 500$000 sendo que estas são à escolha do herdeiro

Hospital da Ordem Terceira de São Francisco

4.000$000

Igreja de Senhor de Matosinhos

8.000$000 …

Senhor Bom Jesus de Braga 8.000$000 Obras

Destinatários Bens Observações

Igreja São Torquato 8.000$000 Obras

Hospital de Santo António - Porto 12.000$000 …

Hospital da Trindade - Porto 4.000$000 …

Estabelecimentos de caridade - Porto 12.000$000 Este dinheiro será distribuído por estes sendo escolhidos pelo herdeiro

José Luiz d’Andrade Remanescente …

Page 23: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

23

3.2- A obra de José Luís de Andrade

“1832, Setembro, 25- Nascimento de José Luis de Andrade

Joze filho legitimo de Joaquim Luis e de Maria Roza do Lugar de Villa verde desta freguezia de São

Thomé de Negrellos Nasseo aos vinte e sinco de Setembro de mil e oito Centos e trinta e dous e aos vinte e

Sete do dito mês, e anno eu João Alvares Neto vigario desta Igraja o baptizei Solemnemente com a

imposição dos Santos Olios forão Seos padrinhos Antonio Joze Ferreira solteiro do lugar do Pedraçal, e

Queteria Maria viuva das Pombinhas ambos desta freguezia de São Thomé de Negrellos he neto materno

de Domingos Joze Ribeiro e de Roza Martins do lugar de Poldraens freguezia de São Miguel das Aves

termo de Barcellos e paterno de Antonio Luis e de Maria de Jezus desta freguezia de São Thomé

José Luis de Andrade, sobrinho de Conde S. Bento, recebeu ordens desse mesmo tio para dar aviamento a coisas notáveis que não nos podemos esquecer. Em primeiro lugar doou quatro contos à Junta da Paróquia de santo Tirso, para a recontrução do claustro da igreja que ruira. Este dinheiro foi concedido não só para este efeito como também para alguns melhoramentos da mesma igreja. Os quatro contos seriam pagos ao ritmo das obras e com o encargo de uma comemoração ao aniversário da morte de Conde S.Bento. José Luis de Andrade teve também uma importante contribuição no que toca à ampliação da residência paroquial

Aquando da morte do seu tio, deixando o Conde S. Bento ainda por acabar o mausoléu que se viria a levantar o claustro gótico do mosteiro, José Luis de Andrade decide mandar acabá-lo

Legado de José Luis de Andrade

Relação de Bens

Quinta de Fora e de Dentro, Azenha com três rodas, moinhos novos e casa de moradia, o Rego dos Frades

Fracção da Quinta de Dentro- as Nogueiras- a Norte e Ocidente da Igreja

Salão da Porta Branca

Quarto que fica debaixo da escada que dava servidão para a Sala da Porta Branca

Ala norte do segundo piso do 1ºclaustro

Coelheira

Escadaria para o Salão da Porta Branca, desde a Porta Branca

O Recibo (Sótão)

Page 24: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

24

4. Análise da Obra e da Acção do Conde de S. Bento

4.1- Pedagogia e pedagogos sociais

Jean-Jacques Rousseau

Jean-Jacques Rousseau nasceu em 1712 em Genebra. O seu nascimento coincide com o

século das luzes, sendo por isso um dos filósofos iluministas mais importantes de sempre.

Inspirou diversos movimentos que procuravam a liberdade, pois defendia que todos os

homens nascem livres e que a liberdade faz parte da natureza do homem.

Apesar de ter desenvolvido teorias a diversos níveis, aqui iremos apenas focar as que são

relativas à educação. Para tal, não podemos de deixar de falar na sua obra Emílio. Nesta

obra, Rousseau fala-nos na importância da liberdade na educação, e na necessidade de

oferecer um aprendizado que ensine a evitar a influência da opinião de outros. A educação

deve ser assim, pela e para a liberdade.

Uma curiosidade que não pode deixar de ser referida, é a “ironia” de que, anos antes de

escrever Emílio, Rousseau deixou os seus cinco filhos num orfanato.

Johann Heinrich Pestalozzi

As obras de Rousseau influenciaram mentes em todo mundo.

Johann Heinrich Pestalozzi foi um pedagogo suíço que nasceu na cidade de Zurique em

1746, cuja principal influência foi Rousseau e sua obra Emílio.

Em obras como The Evening Hours of a Hermit (1780) ou Leonard und Gertrud (1781),

Pestalozzi defende que a educação deveria ser feita não só a nível moral, mas também a

nível intelectual, baseando-se na compreensão do mundo da criança. A aprendizagem

deveria ser feita através de experiencias concretas e não através do tradicional método de

ensino, a memorização.

Com a invasão francesa na Suíça, muitas crianças ficaram votadas ao abandono. Em 1798,

Pestalozzi reuniu-as num convento abandonado e educou-as segundo as suas crenças.

Com o passar do tempo, as ideias pestalozianas foram-se difundindo pelo mundo. A

implementação destas na América, foi feita por Joseph Neef, que mais tarde iria leccionar

em New Harmony, o falanstério idealizado por Robert Owen, um famoso socialista

utópico.

Page 25: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

25

Phillipp Emanuel von Fellebnberg

Fellenberg nasceu em 1771, na cidade de Berna no seio de uma família abastada. A

intimidade existente entre seu pai e Pestalozzi, fez com que este fosse a sua principal

influência.

Viajando entre Berna, Paris e Alemanha, começou a aperceber-se da corrupção existente

entre a vida política, o que fez com que se voltasse para a educação dos mais jovens.

Assim em 1799, comprou um terreno em Hoffwyl, perto de Berna, onde criou uma

instituição que seguia os modelos estabelecidos por Pestalozzi. Com isto Fellenberg

pretendia elevar as classes todas ao mesmo nível, e tornar a agricultura não só como a base

da aprendizagem, mas como algo tão digno como a ciência.

Juntamente com a sua mulher, dedicou-se a esta instituição para o resto da sua vida.

Fellenberg acaba por vir a ser considerado como O Melhor Cidadão da Sua Pátria.

Morre em 1844, em Berna.

Page 26: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

26

Quadro Síntese dos Pedagogos Sociais

Jean Jacques Rosseau Johann Heinrich Pestalozzi Phillipp Emanuel von Fellenberg

Nacionalidade Suíça Suíça Suíça

Teorias

Nas suas defende que a educação deve ser pela e para a liberdade, no sentido de criar um ambiente á sua volta propicio ao seu desenvolvimento e reprodução.

Rosseau afirmava que “É necessário oferecer um aprendizado sobre a necessidade e evitar as influências da opinião dos outros”.

John Pestalozzi afirmava que a educação para além de moral, deveria ser intelectual. Pretendia que esta fosse baseada no afecto e na compreensão do mundo da criança, opondo-se assim ao sistema tradicional de aprendizagem através da memorização. Para ele o ensino deveria ser feito através de experiências concretas.

Inspirado por Pestalozzi, amigo de seu

pai, Fellenberg foi um pedagogo suíço

que defendeu o ensino da economia

rural. Para ele o trabalho manual devia

servir ao mesmo tempo à formação

intelectual

Acções

A destacar, a sua obra Emílio publicada em 1762, na qual apresenta as suas teorias sobre a educação.

Com a invasão francesa na Suíça, muitas crianças ficaram abandonadas. Pestalozzi reuniu-os num convento e educou-os segundo os seus ideais.

Criou uma escola em Hoffwyl onde,

além de ensinar economia rural,

praticava a agricultura, e onde tinha uma

carpintaria e serralharia para construção

de instrumentos agrícolas.

Fazia também distribuição de sopa a

todos os necessitados que iam aprender

serviços rurais.

Obras

“Discurso sobre as Ciências e as Artes”;

“Discurso sobre a origem da desigualdade”;

“Discurso sobre a Economia Política”

“Emílio”;

“Do Contrato Social”.

“The Evening Hours of a Hermit”;

“Leonard and Gertrude”;

“How Gertrude Teaches Her Children”

Curiosidades

Apesar de ter tratado o tema da educação, Rosseau abandonou os seus 5 filhos.

As ideias pestalozianas foram implementadas na América por um dos assistentes de Pestalozzi, Joseph Neef, que mais tarde iria leccionar em New Harmony, Indiana.

Foi considerado o melhor cidadão da sua

pátria.

Page 27: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

27

4.2- O caso de Friedrich Frœbel

Vivência

Filho de um pastor protestante, Friedrich Frœbel nasceu em Oberweissbach, no sudeste da Alemanha, em 1782. Adotado por um tio, viveu uma infância solitária, em que se empenhou a aprender matemática e a explorar as florestas perto de onde morava. Após cursar informalmente algumas matérias na Universidade de Jena, tornou-se professor e ainda jovem fez uma visita à escola do pedagogo Johan Heinrich Pestalozzi em Yverdon, na Suíça. Fundou sua primeira escola em 1816, na cidade alemã de Griesheim. Dois anos depois, a escola foi transferida para Keilhau, onde Froebel pôs em prática suas teorias pedagógicas. Em 1826, publicou o seu livro mais importante, “A Educação do Homem.” Em 1851, confundindo Frœbel com um sobrinho esquerdista, o governo da Prússia proibiu as actividades dos jardins-de-infância. O educador morreu no ano seguinte mas, os jardins-de-infância rapidamente se espalharam pela Europa e pelos Estados Unidos.

Método

de

Frœbel

Frœbel considerava a Educação Infantil indispensável para a formação da criança – e essa idéia foi aceite por grande parte dos teóricos da educação que vieram depois dele. O objetivo das actividades nos jardins-de-infância era possibilitar brincadeiras criativas. As atividades e o material escolar eram determinados de antemão, para oferecer o máximo de oportunidades de tirar proveito educativo da actividade lúdica. As brincadeiras previstas por Frœbel eram, quase sempre, ao ar livre para que a turma interagisse com o ambiente. Para Frœbel, era importante acostumar as crianças aos trabalhos manuais. A actividade dos sentidos e do corpo despertariam o “bichinho” do trabalho, que, segundo o educador alemão, seria uma imitação da criação do universo por Deus.

Crença

de

Frœbel

Para Frœbel, a natureza era a manifestação de Deus no mundo terreno e expressava a unidade de todas as coisas. Isso tudo levava ao princípio de que a educação deveria trabalhar os conceitos de unidade e harmonia, pelos quais as crianças alcançariam a própria identidade e a sua ligação com o eterno. A importância do autoconhecimento não se limitava à esfera individual, mas seria ainda um meio de tornar melhor a vida em sociedade. Além do misticismo e da unidade, a natureza continha, de acordo com Frœbel, um sistema de símbolos conferido por Deus. Era necessário desvendar tais símbolos para conhecer o que é o espírito divino e como ele se manifesta no mundo. A criança, segundo o educador, trazia em si a semente divina de tudo o que há de melhor no ser humano. Cabia à educação desenvolver esse “bichinho” e não deixar que se perdesse. . Frœbel adoptava, assim, a ideia contemporânea do "aprender a aprender". Para ele, a educação se desenvolve espontaneamente. De modo geral, a pedagogia de Frœbel pode ser considerada como defensora da liberdade.

Ilações

finais

Frœbel defendia a educação sem imposições às crianças porque, segundo a sua teoria, elas passam por diferentes etapas de capacidade de aprendizagem, com características específicas. Frœbel não fez a separação entre religião e ensino, consagrada actualmente, mas via a educação como uma actividade em que escola e família caminham juntas, outra característica que o aproxima da prática contemporânea.

Page 28: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

28

4.3- Fábrica de Fiação e tecidos de Santo Tirso

1893 Foi nesta data, no dia 26 de Março que o Conde de São Bento morreu e deixou

a sua vontade expressa em testamento da construção de um estabelecimento

fabril na vila de Santo Tirso.

1894 A Santa Casa da Misericórdia de Santo Tirso ficava encarregue de executar a

disposição testamentária referente à construção da fábrica de tecidos na vila

planeada pelo Conde de São Bento.

1896 Iniciou-se a construção da fábrica.

1897 A Fábrica já se encontra em funcionamento, tecendo panos crus, riscados e

fazendas.

1898 Tendo sido oficialmente inaugurada nesta data, as obras da construção da

fábrica prologaram-se até 1900.

1898 A chegada da primeira máquina a vapor que produzia energia suficiente para o

funcionamento de vários teares da fábrica.

1903 Foi alargada a produção ao sector da fiação, adaptando-se posteriormente às

operações de acabamentos e tinturaria.

1900 Instalação de luz eléctrica no perímetro da fábrica.

1906 Este estabelecimento adopta a designação de “Fábrica de Fiação e Tecidos de

Santo Tirso, Lda.”. Com o passar dos anos o número de trabalhadores foi

aumentando consideravelmente. Em meados do século, a fábrica já contava

com cerca de 1500 operários.

1908 D. Manuel II visita a fábrica de Santo Tirso. Esta visita revela a importância que

este estabelecimento tinha alcançado no início do século.

1908 Neste período da industrialização algodoeira do concelho, este estabelecimento

transformou-se numa escola, fornecendo formação aos seus empregados e

servindo de exemplo para a criação de outras fábricas.

1990 Encerramento da “Fábrica de Fiação e Tecidos de Santo Tirso, Lda.”.

Page 29: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

29

Fábrica de Fiação e tecidos de Santo Tirso

A “Fabrica de Tecidos de Santo Tirso”, somente tecelagem no início, surge no cruzamento de

interesses de uma burguesia têxtil, dos conhecimentos técnicos da época e da oportunidade

para se construir um estabelecimento fabril na vila de Santo Tirso pela vontade expressa

em testamento, do Conde de S. Bento.

No testamento de Manuel José Ribeiro, Conde de S. Bento o benemérito tirsense deixa um

legado destinado à construção na vila de Santo Tirso de uma fiação de algodão.

Após a sua morte, o seu testamentário José Luís de Andrade, lega todos os bens à Santa

Casa da Misericórdia de Santo Tirso.

Será esta instituição a encarregada de executar a disposição testamentária referente ao

estabelecimento da fábrica. O processo tem início durante o ano de 1894 através de

concurso público.

Do regulamento do concurso constava a obrigatoriedade da nova fábrica empregar 50

trabalhadores, preferencialmente de Santo Tirso e ainda que o investimento da sociedade

no capital social da empresa fosse pelo menos de 20.000$00 reis. Cumpridos estes

requisitos, iniciou-se a construção da fábrica, em 1896.

Em 1897 já se encontra a laborar, tecendo panos crus, riscados e fazendas. Tendo sido

oficialmente inaugurada em 1898 as obras de construção irão prologar-se até 1900. Em

1903 alarga a produção ao sector da fiação, adaptando-se posteriormente às operações de

acabamentos e tinturaria.

Em 1906 este estabelecimento adopta a designação de “Fábrica de Fiação e Tecidos de

Santo Tirso, Lda.”. No final de oitocentos, após poucos anos de funcionamento contava

com 400 trabalhadores, número que viria a crescer, empregando 1500 trabalhadores em

meados do século, alcançando 2000 trabalhadores pouco antes do seu encerramento em

1990.

A fábrica de Santo Tirso recebeu várias visitas ilustres, das quais se destaca a de D. Manuel

II em 1908. Esta visita revela a importância que este estabelecimento tinha alcançado no

início do século.

Fábrica de características modernas neste período da industrialização algodoeira do

concelho, transformou-se numa escola, fornecendo formação aos seus empregados e

servindo de exemplo para a criação de outras fábricas.

Page 30: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

30

Salão de tecelagem – final do séc. XIX

Antigo salão de tecelagem com os teares para produção de riscados e “zephires”. Pode-

se observar um pormenor da linha de eixo que tocava as várias máquinas por

transmissão aérea.

Central termoeléctrica – foto do final do século XIX

A fábrica recorreu desde o início à energia termoeléctrica como fonte privilegiada, para

o funcionamento de várias máquinas. Data de 1898 o primeiro registo de uma máquina

a vapor com destino a este estabelecimento, produzindo antes do virar do século

energia suficiente para o funcionamento de vários teares. Procederá em 1900 à

instalação de luz eléctrica no perímetro da fábrica. Pode-se observar na fotografia a

primeira máquina a vapor de cilindro horizontal.

Page 31: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

31

5- Síntese

Efectivamente, o Conde de S. Bento foi um grande impulsionador e factor de desenvolvi-

mento da vila, actualmente cidade, de Santo Tirso.

Destacou-se pelas diversas acções que efectuou quer a nível social, quer a nível económico.

Desde muito jovem, Manuel José Ribeiro, o Conde de S. Bento, começou por viajar, sendo a

sua primeira viagem efectuada ao Brasil, quando tinha apenas onze anos, depois de receber

alguma formação ou instrução na sua escola.

De facto, a vida fora do país não foi fácil para o jovem, pois foram muitas as adversidades

que lhe foram surgindo ao longo do tempo, desde o assalto ao navio em que embarcava até

às muitas dificuldades que teve para fazer fortuna.

Após 56 anos fora de Portugal, dos quais viajou pelo continente europeu e americano, em

busca de ideais e decerto fortuna, o Conde de São Bento regressou ao seu país e instalou-se

definitivamente na vila de Santo Tirso. Com o auxílio do seu sobrinho, José Luís de

Andrade, transferiu para Portugal a grande fortuna que possuía no Brasil.

Depois de se instalar definitivamente em Santo Tirso, o Conde começou a implementar as

suas ideias e projectos que tinha em mente, fruto dos conhecimentos e experiência

adquirida nas viagens. Assim sendo, começou por adquirir a quinta do mosteiro de Santo

Tirso. De seguida, o Conde mandou construir na vila uma escola prática de agricultura,

planeada e mobilada por si que visava receber órfãos e abandonados do concelho, aos quais

seria ministrado mais tarde o ensino primário agrícola. Em 1892, passou a designar-se

Escola Profissional Agrícola Conde de S. Bento.

O Conde fundou ainda um hospital, restaurou a capela do Senhor dos Passos, assegurou as

despesas do culto, e cedeu vastos terrenos da sua quinta à Câmara Municipal da Vila, para a

construção de novas ruas.

Após a morte do Conde de São Bento, em 1893, foi ainda construída em Santo Tirso uma

Fábrica de Fiação, concretizando-se assim um dos seus objectivos firmados em testamento.

A Santa Casa da Misericórdia foi a instituição que ficou encarregue de executar a

construção da fábrica que foi inaugurada em 1898. Com o passar do tempo a fábrica foi

evoluindo e o número de trabalhadores foi aumentando ano após ano.

Em conclusão, entendemos que o Conde de São Bento teve indubitavelmente um grande

contributo para o crescimento de Santo Tirso, que hoje recorda com grande saudade e

gratidão esta emblemática figura da cidade.

Page 32: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

32

Quadro comparativo entre os Socialistas Utópicos e o Conde de S. Bento

Page 33: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

33

6- Bibliografia:

DIAS, José Amadeu Coelho, O Conde de S. Bento: um avense benfeitor de Santo Tirso. In “Sétimas Jornadas Culturais de Vila das Aves”. Vila das Aves: Fábrica da Igreja de S. Miguel das Aves, 1993.

PEREIRA, Maria Manuela Prior Caldas, Conde de S. Bento, Nome Ilustre de Santo Tirso, S. Tirso, Câmara Municipal, 1984

PIMENTEL, Alberto, Santo Thyrso de Riba d'Ave, Santo Tirso, Club. Thyrsense, 1902

SANTOS, Eugénio dos, (dir.), Os Brasileiros de Torna-Viagem no Noroeste de Portugal. Catálogo da Exposição, Lisboa, C.N.C.D.P., 2000.

Page 34: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

34

ANEXOS

Page 35: A Utopia Social Do Conde de S. Bento[2]

35

Dossier Iconográfico