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1 A Universidade Pública e as Novas Entradas e Bandeiras Ariel LEVY Mes tr ando de Admi ni s tr ação, F acul dades I B ME C, I B ME C, R i o de Janei r o, R J B r as i l . Antonio Freitas de ARAUJO Jr. Mes tr ado de Admi ni s tr ação, F acul dades I B ME C, I B ME C, R i o de Janei r o, R J B r as i l .

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A Universidade Pública e as Novas Entradas e Bandeiras Ariel LEVY Mestrando de Adminis tração, Faculdades I BMEC, I BMEC, Rio de Janeiro, RJ Bras i l. Antonio Freitas de ARAUJO Jr . Mes trado de Adminis tração, Faculdades I BMEC, I BMEC, Rio de Janeiro, RJ Bras i l.

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A Universidade Pública e as Novas Entradas e Bandeiras Resumo Este trabalho pretende analisar uma alternativa à política de ensino público no Brasil , por meio de uma abordagem desenvolvimentista, de reciprocidade social. O modelo educacional proposto busca levar em consideração o ambiente macro-econômico e social bem como as limitações do sistema educacional vigente. A história mostra os padrões de desenvolvimento territorial e geográfico nas Américas, sempre ligados a busca de recursos que não se modifica e pode-se observar nas propostas a vinculação destes à perspectiva de desenvolvimento. Por fim, discutir-se à escolha da universidade como rota principal de destino do ensino público e suas conseqüências na distribuição de renda. Palavras- Chave: Políticas educacionais; Desenvolvimento; universidade pública; distribuição

de renda

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A UNIVERSIDADE PÚBLICA E AS NOVAS ENTRADAS E BANDEIRAS Introdução

A importância dada à educação no Brasil , ainda é muito menor do que percebemos em outros países. Num discurso que Allan Greenspan, presidente do Federal Reserve, o banco central americano, fez no dia 11 de março de 2004, perante o Comitê de Educação e Força de Trabalho da Câmara dos Deputados dos EUA, ele afirma que um elemento decisivo para a criação de oportunidades que permitirão a efetiva participação na economia mundial é o oferecimento de rigorosa educação e treinamento contínuo a todos os membros da sociedade. E continua, informando que as pesquisas sobre geração de riqueza, realizadas tanto em países desenvolvidos quanto em desenvolvimento, mostram a importância do conhecimento e das habili dades da população, interagindo sob o domínio da lei, na definição da renda dos trabalhadores. Os trabalhadores deveriam receber uma educação cada vez mais técnica, desenvolver habili dades que os permitissem enfrentar os constantes desafios tecnológicos. Greenspan deixou claro aos congressistas naquela ocasião, que os trabalhadores com melhor educação têm tido um aumento significativo de renda nos Estados Unidos (Costa, 2004).

No Brasil , segundo dados do UNICEF 1.8 milhões de crianças ainda estão fora das salas de aula. Registramos ainda a triste marca de 4,2 milhões de estudantes evadidos das escolas. Um estudante brasileiro demora cerca de 10,2 anos para terminar as 8 séries do Ensino Fundamental, situação agravada pelas altas taxas de repetência. Entre as causas para esses baixos níveis de escolaridade está, além da falta de qualidade das escolas, o baixo poder aquisitivo da população. Na realidade, a escola pública não é inteiramente gratuita, pois manter um filho estudando induz a gastos com uniforme, material escolar, transporte e até mesmo alimentação (Pierre,2004; Unicef; MEC).

O déficit educacional no país toma proporções impressionantes, 67% dos brasileiros foram considerados analfabetos funcionais em recente pesquisa realizada pelo Ibope. Outros 8% são analfabetos completos. Apenas 25% dos brasileiros entre 15 e 64 anos são capazes de ler, entender o que estão lendo e escrever corretamente. Aproximadamente 60% da população não chegou a receber oito anos de estudo. Estima-se que o baixo nível educacional dos brasileiros cause perdas de produtividade de US$ 6 bilhões por ano ao País. (Costa, 2004).

Quando se considera os dados de ensino universitário, a situação é não é melhor segundo o IBGE, somente 3,43% dos brasileiros possuem curso superior. Entre a população com idade superior a 25 anos, apenas 6,8% são formados. Apenas 0,4% desta população possui mestrado ou doutorado. O agravo desta situação dá-se no reconhecimento do baixa qualidade da educação básica, onde o dempenho escolar dos estudantes está bastante abaixo do ideal (Pacheco,2004; Araujo e Luzio,2004). O mesmo autor afirma que a solução passa pela participação da universidade brasileira em uma ampla mobili zação que deverá envolver os governos municipais, estaduais e federal, avaliando e definindo políticas que consolidem uma escola pública democrática e de qualidade.

Ao se observar a condução da política de educação do país, e sua associação ao desenvolvimento, pode –se assinalar a vocação de um sistema voltado desde sua concepção a tarefa hercúlea de proporcionar ensino superior a todos. Tarefa ambiciosa e desproporcional às reais condições e do atual estágio de nosso desenvolvimento social, cuja permanência aprofunda ainda mais o hiato na distribuição de renda e no provimento de oportunidades igualitárias a todos na sociedade.

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“O Plano Nacional de Educação estabeleceu, para cada nível educacional, um ‘diagnóstico’ , ‘diretrizes’ e ‘objetivos e metas’ . Nas diretrizes específicas para a educação superior e para a regularização de seu sistema, destaca-se a ênfase dada aos processos de avaliação. Como princípio geral, afirma-se, no Plano, que ‘nenhum país pode aspirar a ser desenvolvido e independente sem um forte sistema de educação superior’ .(o grifo é nosso) O Plano define diretrizes para a regulação do sistema; entende que é necessário ‘planejar a expansão com qualidade, evitando-se o fácil caminho da massificação’ . Nesse sentido, reconhece a importante ‘contribuição do setor privado, que já oferece a maior parte das vagas na educação superior e tem um relevante papel a cumprir’ . Mas é feita a ressalva de que o setor privado deve respeitar os ‘parâmetros de qualidade estabelecidos pelos sistemas de ensino’ ” .(Sinaes ,2003). Pelo exposto acima, fica claro que, de acordo com o atual modelo, acredita-se que para

atingir um grau satisfatório de desenvolvimento o país deva conduzir os estudantes como um todo ou pelo menos em sua maioria ao ensino superior. Entretanto, a impossibili dade do setor público lidar com a tarefa é reconhecida, ao conclamar o setor privado a participar na oferta de vagas à educação superior.

No âmbito deste modelo, os jovens estudantes são treinados a buscar sua colocação numa instituição de ensino superior desde o ensino fundamental, sendo este apontado pelo seu gestor, no Plano Nacional de Educação, como seu objetivo principal.

Assim pode-se inferir que estando todo o modelo focado em seus objetivos, sua gestão do ensino estará igualmente focada, faz-se necessário questionar os reais objetivos de um sistema de educação, principalmente num país em desenvolvimento.

O objetivo do presente trabalho é trazer um novo modelo de sistema de educação que privilegie outras rotas que não a educação superior. A universidade pública neste modelo estará vinculada a reciprocidade social.

Em sua primeira seção, o trabalho traz considerações sobre os conceitos comumente atribuídos à função da educação. Na seqüência, examina os objetivos sociais da educação. Na terceira seção, será discutida a ideologia e o modelo vigente, para então na próxima seção estudar o modelo educacional brasileiro. Na quinta seção serão abordados os conceitos que evidenciam o real desenvolvimento na sociedade brasileira. A sexta seção apresenta as propostas para o sistema de educação, seguindo-se a discussão sobre o conceito de reciprocidade social e seu efeito, as novas entradas e bandeiras. Finalizando nas conclusões. O conceito de educação

Pode-se começar reproduzindo a discussão formulada por Chaves (2003), na conceituação de Educação.

“ "Educação é direito de todos", "educação é investimento", "a educação é o caminho do desenvolvimento", etc. Mas o que realmente será essa educação, em que tanto se fala? Será que todos os que falam sobre a educação usam o termo no mesmo sentido, com idêntico significado? Dificilmente. É a educação transmissão de conhecimentos? É a educação preparação para a cidadania democrática responsável? É a educação o desenvolvimento das potencialidades do indivíduo? É a educação adestramento para o exercício de uma profissão? As várias respostas, em sua maioria conflitantes, dadas a essas perguntas são indicativas da adoção de conceitos de educação diferentes, muitas vezes incompatíveis, por parte dos que se preocupam em responder a elas. Este fato, por si só, já aponta para a necessidade de uma reflexão sistemática e profunda sobre o que seja a educação, isto é, sobre o conceito de educação.” (Chaves, 2003) A educação é um processo envolvido com o desenvolvimento das pessoas desde o

nascimento até a morte (Lacerda, Komosinski e Pacheco,1998; Mitter 2002). Mitter (2002) mostra que a educação é a própria chave da condição humana, em vez de um simples fator

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produtivo. Em sua abordagem, o autor destaca os valores e a identidade, analisa os desafios, a modernidade da educação e salienta o declínio dos sistemas sociais que falharam na tarefa de ajustar sua educação às mudanças tecnológicas, econômicas, políticas e culturais. Vygotsky (apud Moll ,1996) considera a educação não apenas central para o desenvolvimento cognitivo, mas a quintessência da atividade cultural. Ou seja, considera a capacidade para ensinar, e para se beneficiar da instrução, um atributo fundamental dos seres humanos. Assim educação vai além do desenvolvimento do potencial do indivíduo, traduzindo-se na expressão histórica e do crescimento da cultura humana, a partir da qual o homem emerge. Objetivos sociais da educação

A educação traz o objetivo de conhecer seus próprios limites (Ribeiro Nunes, 2003). Para permitir a expansão dos limites, o educador reconstrói por meio da reflexão teórica e da depuração prática, a sua tomada de consciência, do seu pensar e agir na educação, e as possibili dades que pode propiciar ao outro (Keim, 2003).

A educação é uma forma ou um tipo de comunicação, por meio da qual se acredita que, em uma determinada cultura o índividuo nasce, cresce e aprende a se mover, absorvendo seus valores, assimilando seus significados e forjando com eles mais que um mundo, uma "visão de mundo” (Lara, 2003). É nesse mundo de valores e de significados que existem e são "humanos” . Ou seja, a educação é essencialmente comunicação mediada pela cultura, traduzida pela proximidade de objetivos entre a consciência individual e as consciências humanas.

O principal objetivo da educação é o desenvolvimento e a participação de cada membro da sociedade, de forma que os indivíduos e grupos exerçam seus direitos de uma vida ativa e produtiva na sociedade (Vigotsky, apud Moll ,1996; Nicácio e Goulart, 2003; Schumacher,1973 apud Mello et al 2002).

Freire (apud Gómez 2003) defende que o desenvolvimento do grupo, ou sociedade, se apóia nos objetivos e transformações do indivíduo. A reflexão sobre o assunto se remete à busca da posição de equilíbrio, no atendimento das necessidades da sociedade. No equilíbrio as demandas de todos devem estar satisfatoriamente atendidas. Portanto, faz entender que o desenvolvimento passa pela obtenção do grupo de maioria, de um novo “status quo” . O desenvolvimento ou condução a uma nova posição traz a mudança dos objetivos individuais para os objetos de progressão social como alavancas dos estágios de mudança e sucesso na sociedade. O que de fato se experimenta é a condição da instabili dade, da busca constante, já que qualquer avanço no conhecimento provoca novas demandas e em especial no campo da educação. O conceito se sobrepõe às fronteiras, estando presente no pensamento de todos os povos. O texto da Unesco que se segue mostra esta expectativa de constante aprimoramento na formação dos indivíduos tornando a convivência um eterno exercício de educação. A Unesco considera a educação como principal variável do desenvolvimento social, na busca de uma cultura de paz, de justiça social e da exclusão da pobreza, bem como da prevenção de conflitos (UNESCO,1990).

Esta discussão facilmente se estenderia em muito sobre os diversos conceitos, e ainda poderia-se estudar as ciências sociais sobre o ponto de vista da educação. A compreensão destas diferentes concepções conduzem a filosofia da educação, sua formação e interferência na formulação das ações e tendências, traduzidas na citação que se segue:

“O ponto de vista da educação permite-nos compreender os problemas filosóficos no lugar em que eles surgem e crescem, no seu lugar próprio, lá onde o “sim” e o “não” exprimem uma oposição prática. Se se vir na educação, a formação das tendências fundamentais, intelectuais e afectivas, que têm por objecto a natureza e os nossos semelhantes, podemos chegar ao ponto de definir a filosofia como a teoria geral da Educação” ( Dewey, apud Reboul, p. 328).

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Por fim, deve -se enfatizar que a educação tem por finalidade igualar as oportunidades de crescimento cultural e conhecimentos práticos que levarão os indivíduos ao sucesso social. Basso (1999) defende que tais oportunidades serão igualitárias, não pela imposição de igualdade de rendas, mas pela igualdade de oportunidades propiciadas pela educação. Organizando o exposto, segue-se o quadro, elaborado com base apenas nos conceitos já examinados.

Objetivos da educação segundo diversos teór icos e acadêmicos Inclusão e integração social Chaves, Basso,Freire Manutenção da cultura Vygotsky; Moll; Chaves Desenvolvimento social e individual Dewey,Reboul, Basso, Vigotsky Manutenção da liberdade Dewey;Reboul,; Unesco Transformação do indivíduo Ribeiro Nunes; Dewey;Vygotsky; Freire

Quadro I – objetivos da educação (fonte: próprio autor)

À guisa de síntese, pode-se concluir que a educação tem por objetivos a inclusão e integração social, a manutenção da cultura, o desenvolvimento social e individual, a manutenção da liberdade e a transformação do indivíduo capacitando-o a agir e pensar e modificando sua realidade.

A ideologia dominante e o modelo vigente

Como se viu, Lara (1976;1985;1987;2003) afirma que a finalidade da educação é o desenvolvimento humano ou humanização, ou seja, uma contínua e crescente libertação da situação através da conscientização entendida como tomada de consciência dos fatores que limitam ou tolhem o ser humano: os naturais ou determinantes e os culturais ou condicionantes.

Ribeiro Nunes (2003) aponta como fator de marginalização a dificuldade dos indivíduos de acompanhar o movimento da sociedade em constante mutação. A vasta gama de transformações promovida pela crescente invasão tecnológica nos campos cultural, econômico, social e científico torna o convívio complexo e colabora intensivamente na geração de uma profusão de universos que se misturam em múltiplas variações.

A análise do relacionamento entre educação e sociedade, sob a ênfase do conteúdo educacional, pode-se atribuir a mediação do conteúdo educacional à cultura, posto que se concebe o termo de forma ampla, podem portanto, co-existir valores opostos dentro de uma mesma cultura. Uma sociedade pluralista, que apresenta várias classes, como é o caso do Brasil , freqüentemente tem valores diferentes, que podem chocar-se, sendo mister questionar que direção deve tomar o sistema educacional? E que conteúdos valorizar? Um sistema único ou uma variedade de sub-sistemas?

No Brasil de hoje, Chaves (2003) preconiza a existência de um sistema educacional único que gradativamente se diferencia em sub-sistemas e que permite mobili dade horizontal (entre os sub-sistemas) e vertical (entre os sub-sistemas de um nível e os de outro nível). Este fato faz com que o sistema educacional enfrente sérios problemas e dificuldades para levar em conta esta divergência de valores, e, conseqüentemente, de conteúdos considerados valiosos e de concepções de quais devam ser os objetivos educacionais específicos a serem promovidos.

Nosso propósito não é examinar quais conteúdos devem ser considerados valiosos, já que a pluralidade de valores é evidente, mas demonstrar o espaço para propostas de investigação do sistema, de sua compreensão, da crítica de sua estrutura e conteúdos para que se possa realmente

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investir-se no caráter educacional. Neste sentido, deseja-se reforçar a necessidade de ampliação de influências no sistema educacional. Charlot (1979) afirma que a educação tem cunho político, na medida em que transmite sob sua forma explícita ou por intermédio dos modelos de comportamento e dos ideais, idéias políticas e notadamente as da classe dominante. Fica evidente que sendo uma minoria, pertencente a classe dominante, que administra e organiza os subsistemas e enfim o sistema educacional, terá esta o objetivo de manter o “status quo” , perpetuando privilégios, preparando uma elite como “os futuros donos do poder” , enquanto ao restante da população resta o conforto da posição de fracasso, ao ingresso na casta e à conseqüente posição de dominados.

Longe de atribuir as mazelas do sistema unicamente a seus gestores, nas palavras do ex- ministro Cristovam Buarque: “Pior do que abandonar a educação é fingir que está educando.” (O Globo, 10/09/2003). Ao questionar o acesso, é preciso também questionar que educação o educador levará ao educando: com que objetivos e que metas? Caso contrário, o propalado acesso corre um sério risco de tornar-se apenas acesso à estatística de índices e não acesso à educação. E se assim for, o sistema educacional estará reproduzindo as características descritas por Charlot(1979), ou evidenciando a intencionalidade dura de que se educa os indivíduos não por suas capacidades, talentos ou dotes, mas sim em função das proporções de mão-de-obra, de quadros, de dirigentes que a sociedade estabelecida calcula como necessários ao seu funcionamento e à sua reprodução (Snyders, 1981). O que se busca é dada a divisão do trabalho vigente na ordem econômica internacional, preparar a sociedade, em especial as classes menos favorecidas, a sobrepujar as dificuldades e desafios do futuro. O modelo educacional brasileiro

O caráter eletista da educação brasleira tem origem no período colonial. As iniciativas adotadas no sentido de formar um sistema educativo tinham seus objetivos atrelados aos interesses da coroa portuguesa. Sua estrutura visava basicamente a consolidação das fronteiras geográficas, preocupada em impedir as iniciativas emancipadoras, com forte cunho centralizador. Apesar de por vezes influenciada pelas idéias da Revolução Francesa, ou vindas dos E.U.A. estas iniciativas e suas reformas tanto no período colonial, como na República, refletiam os interesses da oligarquia, sem preocupação ou direcionamento à formação de uma cidadania educacional. A descentralização do ensino primário (hoje fundamental) para as províncias ocorre por desinteresse da elite, e não como um planejamento de sua importância ao desenvolvimento. Já a educação superior sempre fez parte das preocupações da elite dominante, com os direitos desta camada resguardados em todas as reformas (Christófaro,2003).

Somente com a aceleração do processo de urbanização na década de 1920, aparece a organização de sistemas de ensino voltados para a ampliação da escolaridade obrigatória da população, numa tentativa de demonstrar a igualdade de oportunidades a educação. A tarefa do ensino secundário ficava para as escolas particulares e religiosas, cujo enfoque era o preparatório para os cursos profissionais superiores. Já o ensino de ofícios, cujos primeiros regulamentos datam de 1826 (Machado apud Christofáro, 2003) era de caráter fragmentário e dispersivo, se diferenciava da escola secundária em seus objetivos e público alvo, seguindo o Decreto N° 7566/1909, expressa com nitidez o“papel” a ser cumprido pelo ensino técnico e o “ lugar” que ocupará na sociedade:

__"considerando que aumento constante da população das cidades exige que se facilit e às classes proletárias os meios de vencer as dificuldades sempre crescentes da luta pela existência;

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__considerando que para isto se torna necessário não só habilit ar os filhos dos desfavorecidos da fortuna com o indispensável como fazê-los adquirir hábitos de trabalho profícuo, que os afastarão da ociosidade, escola do vício e docrime; __considerando que um dos primeiros deveres do Governo da República é formar cidadãos úteis à Nação". (Decreto N° 7566/1909)

O Estado assumia, como se constata, que o ensino técnico estava dirigido às camadas "desfavorecidas" da população.” (Cristófaro, 2003). O descaso com a preparação dos cidadãos de baixa renda, permanesce mesmo após a aprovação em 1927 de um projeto que definia o ensino profissional como obrigatório na escola secundária. (GARCIA,2002), a oposição das classes dominantes, (Christófaro, 2003) não permitiu que o mesmo fosse executado, tornando-se letra morta.

A partir de 1930, a disseminação dos ideais de construção democrática sugere a expansão da escola pública, gratuita e para todos, como resposta às questões de unidade. Nos debates do pós guerra, registra-se uma característica que marca a evolução da gestão educacional no país. A educação seria o caminho da consolidação democrática, devendo realizar a unidade na diversidade, na riqueza das experiências regionais e na resposta às demandas mais significativas da comunidade (Garcia, 2002). Durante o regime militar pouco avança sob o ponto de vista educacional, já que não havia liberdade de discussão de vários temas, e pouco se fazendo em prol de uma emancipação educacional.

A constituição de 1988, em seu artigo 211, traz o escopo federativo para a educação, tomando o conceito de rede de ensino como mais apropriado para o conceito de sistema e invocando a colaboração. Com a LDB (Lei de diretrizes e Bases da Educação Nacional) fica mais detalhada a participação de cada uma das instâncias de poder educacional.

O modelo permanece, apesar dos esforços em transformá-lo de forma a traduzir os anseios da maioria da população, com políticas regionais que buscaram até impor cotas raciais, de forma a favorecer grupos da população, conforme pode-se constatar na apreciação da controversa lei das cotas raciais imposta à UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) durante a gestão Garotinho (Folha de São Paulo, 08/02/2003). Independente de se acreditar, nesta forma de se resolver a desigualdade de oportunidades, exposta no modelo atual, fica evidenciada sua notoriedade por parte dos governantes e legisladores.

Para Pinotti (1999), a origem dos problemas da educação brasileira é conseqüência da estrutura social, dos desmandos políticos e de um modelo equivocado de gestão para o país. Propõe o autor ainda que a solução destes problemas passa pela adoção de um processo moderno de educação.

No processo de evolução histórica, podemos identificar a forte presença do componente territorial no estilo de gestão educacional que permeia todas as preocupações de estudiosos, políticos e administradores educacionais. (Garcia, 2002) A evidência do real desenvolvimento social brasileiro

A sociedade não pode medir seu desenvolvimento apenas através de índices ou estatísticas, verdadeiras apologias aos dogmas descritos por classes dominantes. Seu desenvolvimento dá-se na real tradução das melhorias de condição de vida observadas através de pesquisas acadêmicas, cujo interesse puramente científico demonstra os fatos. E assim, as mais recentes pesquisas apontam para melhoria da renda e empregabili dade, quando da conclusão do

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ensino médio. Ainda que estes estudos devam ser vistos com ressalvas quanto a limitação de sua territorialidade, suas conclusões são importantes contribuições para o norteamento das políticas públicas quanto ao ensino e ao desenvolvimento social. Uma destas pesquisas conclui que a partir do ensino médio incompleto verifica-se um aumento dos salários médios numa progressão geométrica (Balassiano, Seabra e Lemos, 2003). Portanto, para melhoria da distribuição de renda, sugere-se traçar objetivos quanto ao ensino médio como meta principal de educação a maioria da população.

Ao analisar o porquê desta ocorrência, se verifica que salário é o preço do trabalho pago a indivíduos empregados, tal preço estará sujeito à lei da oferta e procura. Assim se poderia inferir que para as mesmas condições da economia, dada as necessidades das tarefas desempenhadas, ou melhor das competências exigidas nos empregos, há escassez de indivíduos com formação no ensino médio, o que se traduz numa elevação do preço. Por outro lado, ao imaginar que remuneração pode ser vista num escopo mais amplo, associando o conceito também àqueles que trabalham por conta própria ou informalmente, então neste caso são provavelmente as competências já desenvolvidas neste estágio de formação que propiciam estas oportunidades de melhoria de renda (Balassiano, Seabra e Lemos, 2003). Os resultados acima mencionados são expostos com clareza no quadro abaixo, onde são evidenciados os resultados de remuneração média por escolaridade , em número de salários- mínimo, na região metropolitana do Rio de Janeiro.

Remuneração Média por Escolar idade no Mercado Formal de Empregos da Região Metropoli tana do Rio de Janeiro – 1999

Escolar idade níveis

Remuneração Média (em S.M.)

Analfabeto, inclusive o que, embora tenha recebido instrução, não se alfabetizou 1 3,94

Até a 4ª série incompleta do 1º grau ou que tenha se alfabetizado sem ter freqüentado escola regular 2 4,27

Com a 4ª série completa do 1º grau 3 3,51 Da 5ª à 8ª série incompleta do 1º grau 4 3,43 Primeiro grau completo 5 3,74 Segundo grau incompleto 6 4,36 Segundo grau completo 7 5,91 Superior incompleto 8 9,95 Superior completo 9 17,26

GERAL 6,10

Quadro II - Fonte: Balassiano, Seabra e Lemos, 2003 A análise da utili zação do conceito de empregabili dade, como dimensão do

desenvolvimento e inserção social, justifica-se a partir da necessidade de sentir-se útil , e transcende as questões individuais e organizacionais (Morin, Tonelli e Pliopas,2003), e a qualquer modelo econômico. No modelo capitalista esta necessidade do trabalho está fundamentalmente representada pela empregabili dade, e evidenciada no caso brasileiro pela pesquisa sintetizada no quadro abaixo:

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O Trabalho como dimensão do desenvolvimento e inserção social Dimensão Quanto ao quesito Um trabalho tem sentido se...

Quem exerce o trabalho sente prazer, gosta do que faz É um desafio a ser superado

Satisfação pessoal A pessoa percebe sua contribuição como única e criativa

Remunera financeiramente quem trabalha Permite que algum dia o indivíduo alcance qualidade de vida melhor

Independência e sobrevivência

Dá a sensação de independência financeira e psicológica

Crescimento e aprendizagem

Crescimento profissional / aprendizagem

Fornece identidade a quem exerce A empresa onde a pessoa trabalha é reconhecida

Dimensão individual

Identidade É símbolo de status

Quem exerce percebe o processo do início ao fim Utili dade Tem utili dade para a organização

A pessoa tem oportunidade de relacionar-se com outros

Dimensão organizacional

Relacionamento Álguem da organização dá o reconhecimento

Inserção social Permite inserção social Contribui para a sociedade

Dimensão social

Contribuição social É considerado ético e moralmente aceitável

Quadro III – Fonte: Adaptação de Morin, Tonelli e Pliopas,2003

A conotação positiva apresentada pelos entrevistados ao trabalho e a centralidade do tema na vida das pessoas (ver. Morin, Tonelli e Pliopas,2003) coloca a responsabili dade na sociedade, na atuação de seus legisladores e dirigentes e críticos, de elaborar políticas de educação que permitam a efetiva oportunidade ao emprego ou equivalentes situações de inclusão social. Estas oportunidades não se evidenciam como resultado de empregabili dade a partir do atual sistema de ensino, apesar de não se poder desprezar os investimentos realizados na educação dos trabalhadores, visto que; pode-se ponderar que indivíduos com mais escolaridade não são, necessariamente, mais empregáveis (Balassiano, Seabra e Lemos, 2003).

Entretanto as conclusões apresentadas no estudo devem ser relativadas, conforme alertam os próprios autores, ao examinarem o modelo de relações estruturais proposto por Seabra (apud Balassiano, Seabra e Lemos, 2003) que calcula os efeitos diretos, indiretos e totais das variáveis exógenas, escolaridade e idade, nas variáveis endógenas, salários e empregabili dade. A conclusão dos autores é que:

“O efeito direto de escolaridade em empregabili dade é quase o dobro do de escolaridade em salário, sendo os dois efeitos positivos, o que implica que um acréscimo no grau de escolaridade poderá resultar em um efeito direto positivo maior na taxa de empregabili dade do que no salário do indivíduo” (Balassiano, Seabra e Lemos, 2003). As fontes de desenvolvimento pessoal passam a ser os desafios no trabalho e nos

relacionamentos, existindo três espaços de expressão do indivíduo: o pessoal, o familiar e o profissional (Hall et al apud Balassiano, Ventura e Fontes Filho, 2003). Assim, o objetivo individual de desenvolvimento passa pela criação ou melhor pelo aperfeiçoamento dos papéis desempenhados em cada um destes espaços. Tal evolução permite o sucesso psicológico, representado pelo alcance de um conjunto de expectativas, e a consolidação da identidade expressa como auto-conceito de um indivíduo, a percepção e a avaliação que tem de si mesmo.

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Sintetizando, o desenvolvimento pessoal objetiva no século XXI o sucesso psicológico, aprendizagem contínua, a expansão da identidade, a expansão das competências inclusive as relacionais.

Enfim, isto significa que deve-se priorizar as oportunidades em educação, com o objetivo de criar uma sociedade mais justa, partindo da igualdade de educação e exercício de competências adequadas às reais possibili dades do indivíduo, o que não impõe uma igualdade de posição de riqueza, mas de direitos e deveres (Basso,2003).

Pinotti (1999), defende que o desenvolvimento real de uma sociedade se encaminha na percepção de seus componentes de que seu desenvolvimento pessoal é presente. Este desenvolvimento como visto, passa pela construção e participação numa estrutura mais igualitária na concepção e busca às oportunidades de educação e de trabalho. Por meio destas oportunidades, no processo pedagógico, busca-se desenvolver uma formação para a ética, a cidadania... O que se propõe

O sucesso da continuidade de uma sociedade está na formação de seus novos indivíduos, de sua estrutura moral e ética, de sua unidade familiar, em cujas bases remontam os pilares da sociedade. A educação infantil e fundamental tem papel crucial na determinação e resolução dos conflitos experimentados.

O ensino fundamental está para a educação e para cidadania como o saneamento está para saúde. Esta etapa do projeto educacional pode ser implementada a partir de experiências de sucesso, notoriamente criando indivíduos confiantes e senhores dos processos de mudança e negociadores de conflitos em suas comunidades. E poderia contemplar, além do conteúdo programático, alguns focos prioritários apresentados no quadro abaixo:

Focos da educação fundamental multidisciplinar Os direitos humanos O meio ambiente O desenvolvimento sustentável A compreensão e solidariedade internacionais. O aprendizado a inserção em ambientes de mudanças A base metodológica da construção de pesquisa

QuadroIV – Fonte :do próprio autor

A contemplação destes focos por meio da valorização da família e da adaptação sem sofrimentos as condições de mudanças bem como o estabelecimento do senso crítico conduzirão ao alicerce da inclusão social pela cidadania e pela ética, proporcionando um currículo adequado aos desafios de nosso século. Quando se defende tantas áreas de trabalho com a criança em formação escolar, faz-se ciente que o desenvolvimento cognitivo é limitado a determinada proporção em cada idade, e que o total desenvolvimento cognitivo requer a interação social. (ver. Vygotsky,1978)

No ensino médio, a ênfase deveria ser a empregabili dade, assim além dos conteúdos já relacionados poderiam ser contemplados aqueles que permitissem uma maior adequação ao mercado de trabalho. Esta perspectiva mais realista da sociedade poderia conduzir uma maior parte a percepção de sucesso psicológico, traduzido em condições de participação e integração social.

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A solução aqui proposta requer a criação de uma maior variabili dade de rotas e destinos no sistema, de forma a produzir maior nível de consistência nos resultados. Frigotto (2001), por sua vez, ressalta que nos anos 1960 a leitura economicista da educação remetia a uma perspectiva de integração social na medida em que a tese do pleno emprego era subjacente à valorização do investimento em “capital humano”. A esta observação contrapõe o fato de que, nas circunstâncias atuais, onde a educação formal e a quali ficação são situadas como elementos da competitividade, a reestruturação produtiva e da empregabili dade (Balassiano, Seabra e Lemos, 2003; Frigotto, 2001). Partindo dessa perspectiva, a empregabili dade refere-se à aposta na educação básica e na quali ficação profissional como saídas para a crise de desemprego que afeta boa parte das economias capitalistas na atualidade. Esta aposta pressupõe investimentos em educação e formação profissional que desenvolvam habili dades básicas no plano do conhecimento, das atitudes e dos valores, produzindo competências para gestão da qualidade e, conseqüentemente, para a empregabili dade (Frigotto, 2001).

O modelo vigente deveria, portanto, contemplar uma nova meta prioritária, que satisfizesse aos anseios de desenvolvimento da maioria da população, devendo focar-se como ponto de chegada no ensino médio, profissionalizado. Não com os atuais currículos, mas na extensão já contemplada na lei. Com a contemplação de conteúdos que facilit assem a condição de empregabili dade, que já é demandada pela sociedade por meio do mercado de trabalho e das relações com renda demonstradas anteriormente na revisão temática.

Paulo Freire não cansava de repetir que "antes de aprender qualquer coisa, uma pessoa precisa ler primeiro o seu mundo". E o que significa "ler o seu mundo"? Significa analisar e interpretar os limites e as potencialidades, a correlação de forças históricas e políticas, para se dar o passo necessário e possível.

A evolução do ensino médio passa por uma reordenação de valores, a retirada do sonho, o reencontro com a realidade de uma sociedade melhor preparada para sua realidade. Passa por jovens encaminhados na prática, com uma formação que vai além do puro currículo escolar, habilit ados a seguir na vida acadêmica, mas com a prática voltada aos mercados e oportunidades de carreiras demandadas em suas comunidades e até mesmo por seus interesses próprios. Esta relação entre a escola e o mercado pode ser sintetizada na questão do capital humano, e da funcionalidade dos conteúdos ao mundo do trabalho (Coelho e Delgado, 2003).

As políticas públicas com relação a educação poderiam dirigir-se ao factível ao invés do utópico. Ideal seria promover o ensino superior gratuito a todos, mas na realidade, extrair as condições limitantes, que encontram-se em nossa sociedade. Assim, a solução simplista sempre foi alimentar as estatísticas, levando um maior número de alunos a passar por uma linha de ensino, similar a uma linha de produção, que conduziria ao terceiro grau, como destino obrigatório, mas que na prática atende em verdade um público bastante seleto.

Ao desenvolvimento de nossa sociedade, o ensino de terceiro grau deveria ser uma das oportunidades de construção de uma carreira profissional, e não o objetivo fundamental, relegando os demais a uma espécie de subclasse de cidadãos. Até porque os maiores saltos em relação à concepção de empregabili dade e de renda são dispostos no ensino médio (Balassiano, Seabra e Lemos,2003). Portanto, esta etapa da educação escolar pode ser caracterizada como fundamental para o desenvolvimento pessoal e, por conseguinte, social. As novas entradas e bandeiras

Não se trata de esvaziar a universidade, mas de entender as reais necessidades de nossa sociedade em seu estágio atual de desenvolvimento. Adequar, portanto, as políticas e esforços a

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elementos tangíveis e principalmente exeqüíveis.Em verdade acreditamos estar na universidade a real possibili dade de desenvolvimento de nossa sociedade, mas com um enfoque que em muito difere do atual.

O ensino universitário, de caráter seleto, em especial sob o enfoque de ensino gratuito. Tal gratuidade deveria conduzir o participante a algum compromisso de reciprocidade com a sociedade.

Assim, não basta quali ficar o pretendente ao ensino universitário quanto a quali ficação de sua bagagem a conteúdos de caráter acadêmico, mas sua disposição de comprometer parte de seus futuros esforços profissionais com a mesma sociedade. Explicando melhor, ao se formar, o jovem profissional ficaria a serviço remunerado em uma espécie de serviço social temporário. Este emprego temporário se daria conforme sua quali ficação em um exame do tipo “provão” ou avaliação curricular que se prestasse a este fim, sendo sua classificação fundamental na determinação do local onde prestaria o serviço.

Como exemplo tome-se um jovem que tenha se formado em administração na Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ. Este jovem viria a trabalhar como administrador recebendo pela função o salário inicial e igual ao mínimo da categoria, por dois anos, vinculado a uma fundação ou a serviço do Estado em um município que até poderá ser diverso do atual de sua moradia, conforme a demanda e sua classificação.

Ao Estado, estaria sendo proporcionada a oportunidade de quadros transitórios quali ficados, sem regime de contratação definitiva, que permitiria atender as demandas da sociedade. Claro está a existência de impedimentos no arcabouço legal da contratação ainda que temporária sem concurso, mas este não é o escopo deste trabalho. A proposta do modelo é que se estaria suprindo as necessidades de contingente ao Estado, na realização de políticas públicas, em contrapartida de seu investimento em educação. Como o contingente de formandos se renova a cada ano, o caráter transitório, não permite a chefia nas funções dos praticantes deste serviço, mas a constante renovação também dificultaria práticas ilícitas nos diversos serviços públicos.

Aos novos profissionais formados, este modelo permitiria a inserção na vida prática como profissional, nas reais atribuições e não em subempregos . Isto poderia em muito diminuir a atual evasão profissional do concluinte de um curso universitário que não encontra emprego. Haja visto, que na atualidade não são raros os profissionais em que a sociedade investiu pesadamente em formação que tem atribuições completamente diversas de suas formações. Tal ocorrência se acentua pesadamente nas camadas menos afortunadas da população em que o ciclo de relacionamentos é menor. Apresentando também uma menor possibili dade de carreiras construídas ou incentivadas por meio de continuidade de relacionamentos familiares tais como médicos , dentistas e advogados, visto que os parentes possuem formação superior.

Neste modelo, àqueles que não desejarem contribuir no serviço social temporário por dois anos, resta a universidade privada. Assim, além de oportunidades igualitárias promove-se o desenvolvimento paralelo do ensino público e privado, e previlegia-se a possibili dade de sedimentação dos conhecimentos e práticas profissionais e sociais nos formandos.

Observa-se que podem haver profissões em que o Estado não tenha projetos suficientes para administração e alocação dos recém formados, então, neste caso poder-se-ia pensar em convênios com empresas de forma a facilit ar a introdução dos mesmos no mercado de trabalho. Considerações finais

A pluralidade de possibili dades decorrentes da proposta em muito há de ser desenvolvida, em estudos posteriores.

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Alguns temas poderiam advir, por exemplo, da fixação de pessoal quali ficado no interior, vez que a mudança de Municípios e quiçá de Estados no caso de universidades federais, contribuiriam para formação de novos relacionamentos e até formação de novas famílias, com origem diversas. Os efeitos seriam sentidos na alocação de capital humano fora das grandes metrópoles. Também poderiam se apresentar oportunidades de melhor qualidade de vida e sucesso profissional aos recém formados (Balassiano, Ventura e Fontes Filho.2003).

Este aspecto nos remete ao título deste artigo, lembrando que no passado, em busca da fortuna se fizeram decisivas as entradas e bandeiras, levando consigo o desenvolvimento e as fronteiras, então geográficas, de nosso país. As Entradas, estavam ligadas a iniciativas do Estado, enquanto as Bandeiras, ao plano privado, ambas destacaram-se pela determinação com que alcançavam seus objetivos, então colonialistas e exploratórios. O modelo propõe uma unificação na utili zação dos recursos de capital humano formados por nossas universidades nos mais variados campos do saber. Embora mantendo a característica inovadora que marcou as Bandeiras, mas com o objetivo desenvolvimentista e integrador. Por meio da alocação destes recursos no interior se promove a real emancipação da sociedade brasileira.

Quem sabe a adoção de um novo conjunto de rotas na educação e a alteração do modelo para universidade pública levará àqueles que buscam a educação, recurso fundamental na era do conhecimento, a estabelecer um novo ciclo de desenvolvimento social. Referências Bibliograficas: BALASSIANO, Moisés; SEABRA, A. Alexandre; LEMOS, Ana Heloisa da C.; Educação,

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