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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
A UNIVERSIDADE DO SÉCULO XXI:
CONCEPÇÕES, FINALIDADES E CONTRADIÇÕES
SUELY FERREIRA
Goiânia-GO2009
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SUELY FERREIRA
A UNIVERSIDADE DO SÉCULO XXI:
CONCEPÇÕES, FINALIDADES E CONTRADIÇÕES
Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás como requisito para a obtenção do título de Doutor em Educação. Área de Concentração: EducaçãoLinha de pesquisa: Estado e Políticas Educacionais.Orientador: Prof. Dr. João Ferreira de Oliveira.
Goiânia-GO2009
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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)GPT/BC/UFG
Suely, Ferreira.A universidade do século XXI[manuscrito]: concepções,
finalidades e contradições / Suely Ferreira. - 2009. 305 f.
Orientador: Prof. Dr. João Ferreira de Oliveira.Tese (Doutorado) – Universidade Federal de Goiás,
Faculdade de Educação, 2009. Bibliografia.
Inclui lista de siglas.Apêndices.
1. Reforma universitária. 2. Políticas educacionais 3.Ensino superior 4. Universidades e faculdades – Séc. XXI. I. Titulo.
CDU: 378.014.3
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A UNIVERSIDADE DO SÉCULO XXI:
CONCEPÇÕES, FINALIDADES E CONTRADIÇÕES
Tese defendida no Curso de Doutorado em Educação da Faculdade de Educação da
Universidade Federal de Goiás, para obtenção do grau de Doutor, em 21 de dezembro de
2009, pela Banca Examinadora constituída pelos seguintes professores:
_____________________________________________________Dr. João Ferreira de Oliveira - UFG (Presidente)
______________________________________________________Dr. Belmiro Gil Cabrito - UL
_____________________________________________________Dr. Afrânio Mendes Catani - USP
_____________________________________________________Mário Luiz Neves de Azevedo - UEM
____________________________________________________Dr. Luiz Fernandes Dourado - UFG
Goiânia2009
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A Deus, pela inspiração e por colocar em meu caminho pessoas que me auxiliaram e
apoiaram nesta jornada.
Aos meus pais, Afonso e Alzeni, que tanto me ensinaram e ainda continuam a fazê-lo.
Ao Arnaldo, meu companheiro, pelo apoio ao longo de mais um desafio e, inclusive, pelo
incentivo e compreensão durante minha estada em Lisboa, sem o qual teria sido impossível
vivenciar essa importante etapa do doutorado.
A Raquel, minha filha, por irradiar a luz e a força que me encoraja a crescer tanto pessoal
como profissionalmente e, inclusive, por sua imensa capacidade de compreensão, de
participar das caminhadas e de me apoiar em todas elas.
A meu orientador, João Ferreira de Oliveira, por sua confiança e generosidade, por sua
criteriosa orientação acadêmica e por me ensinar a pesquisar, a ultrapassar limites e a
concretizar a realização desta tese.
S U M Á R I O
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LISTA DE SIGLAS.................................................................................................................08
RESUMO.................................................................................................................................12
INTRODUÇÃO........................................................................................................................14
CAPÍTULO I - ESTADO, MUNDIALIZAÇÃO DO CAPITAL, EDUCAÇÃO SUPERIOR E
UNIVERSIDADE NO CONTEXTO DO SÉCULO XXI: CRISE, CONTRADIÇÕES E
REDEFINIÇÕES......................................................................................................................36
1.1 A Educação superior no contexto da reestruturação produtiva do capitalismo.................36
1.1.1 Cenário da educação superior na Europa: Processo de Bolonha...............................40
1.1.2 Cenário da educação superior na América Latina e Caribe: a terceira reforma .......44
1.1.3 Cenário da educação superior no Brasil: reforma a partir dos anos de 1990............51
1.2 Neoliberalismo, Estado, globalização e educação..............................................................53
1.3 O Estado frente ao processo de globalização.....................................................................56
1.3.1 O redesenho das funções do Estado e das políticas educacionais face às novas
exigências da transnacionalização da educação................................................................65
1.3.2 As reformas educacionais em curso: uma nova regulação social............................77
1.4 A crise da Universidade: a redefinição de suas finalidades ..............................................81
CAPÍTULO II - OS MODELOS UNIVERSITÁRIOS, O PROCESSO DE BOLONHA E A
NOVA UNIVERSIDADE NA UNIÃO EUROPEIA...............................................................96
2.1 Antecendentes históricos....................................................................................................96
2.1.1 Três modelos clássicos europeus de universidade...................................................100
2.1.2 Modelos universitários norte-americanos...............................................................109
2.2 Criação do Espaço Europeu do Ensino Superior..............................................................115
2.3 O ensino superior a serviço do mercado?.........................................................................121
2.4 A universidade na perspectiva da Estratégia de Lisboa...................................................130
2.5 As novas finalidades da universidade no contexto da União Europeia............................133
2.5.1 Mobilidade, deslocalização e aprendizagem ao longo da vida................................140
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2.6 Está em curso a construção de um novo modelo de universidade na União Europeia?...145
CAPÍTULO III - A REESTRUTURAÇÃO DA UNIVERSIDADE PÚBLICA NO BRASIL E
A (RE)CONSTRUÇÃO DAS SUAS FINALIDADES SOCIAIS.........................................154
3.1 O ensino superior e a universidade tardia brasileira: concepções e fins..........................154
3.2 A reforma da educação superior a partir da década de 1990 - a redefinição dos modelos e
dos fins da universidade no Brasil..........................................................................................171
3.2.1 A reforma da educação superior no governo Fernando Henrique Cardoso
(1995-2002): diretrizes e bases para um novo modelo?...................................................173
3.2.1.1 Os impactos das diretrizes do Banco Mundial nas políticas para educação superior
..........................................................................................................................................187
3.2.2 A reforma da educação superior do governo Lula: qual o modelo?........................195
3.2.2.1 Universidades antigas e novas no Brasil: o processo de reconfiguração das
finalidades sociais.............................................................................................................228
3.2.2.2 A criação de novas “universidades” brasileiras no contexto da integração regional
e internacional da educação superior................................................................................238
CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................................244
REFERÊNCIAS ....................................................................................................................258
APÊNDICES..........................................................................................................................283
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LISTA DE SIGLAS
ABC - Academia Brasileira de Ciências.
ABE - Associação Brasileira de Educação.
AFI - Programa de Apoyo Fiscal Indirecto.
AGCS - Acordo Geral do Comércio e Serviços.
ANDIFES - Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior.
ANDES-SN - Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior.
APEC - Fórum de Cooperação Econômica da Ásia-Pacífico.
BM - Banco Mundial.
BI - Bacharelado Interdisciplinar.
BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento.
CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior.
CCI - Centro Comum de Investigação.
C&T - Ciência e Tecnologia.
CPLP - Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.
CEPAL – Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe.
CERI - Centre for Educational Research and Innovation.
CNRS - Centre National de la Recherche Scientifique.
CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.
CONSEPE - Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão.
CRUB - Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras.
CNI - Confederação Nacional da Indústria.
CRES - Declaração da Conferência Regional de Educação Superior na América Latina e
Caribe.
CUIB – Conselho Universitário Iberoamericano.
CYTED - Programa Ibero-americano de Ciência e Tecnologia para o Desenvolvimento.
EAD - Sistema de Educação à Distância.
ECTS - Sistema Europeu de transferência de Créditos.
ESE - Ensino Superior Europeu.
EEES - Espaço Europeu de Ensino Superior.
EECC - Espaço Europeu Comum do Conhecimento.
EEI - Espaço Europeu de Investigação.
ECVET - Sistema Europeu de Créditos para a Educação e Formação Profissional.
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Enade - Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes.
Enem - Exame Nacional do Ensino Médio.
Enic - European Network of Information Centres.
Enlaces - Espaço de Encontro Latino-Americano e Caribenho de Educação Superior.
Erasmus - European Action Scheme for the Mobility of University Student.
EUA - European University Association.
EURASHE - European Association of institucions in higher education.
ESIB - The national unions of students in Europe.
ENQA - European Network for Quality Assurance in Higher Education.
Eures - Serviço Europeu de Emprego.
Euraton - Comunidade Europeia da Energia Atômica.
Fapesp - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo.
FAI - Fundações de Apoio Institucional.
FHC - Fernando Henrique Cardoso.
FMI - Fundo Monetário Internacional.
Fies - Financiamento do Estudante do Ensino Superior.
FFCL - Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras.
GATS - General Agreement on trade in Services.
IES - Instituições de Ensino Superior.
IF - Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia.
IEL - Instituto Euvaldo Lodi.
Ifes - Instituições Federais de Ensino Superior.
IMEA - Instituto Mercosul de Estudos Avançados.
I&D - Inovação e Desenvolvimento.
IESALC - Instituto Internacional da UNESCO para a Educação Superior na América Latina e
no Caribe.
ITA - Instituto Tecnológico de Aeronáutica.
KWNS - Keynesian Welfare National State.
LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.
MEC - Ministério da Educação.
MPF - Ministério Público Federal.
NARIC - National Academic Recognition Information Centres.
NAFTA - Associação Norte Americana de Comércio Livre.
OCDE - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico.
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Oesp - Organizações de Ensino Superior Privado.
OEI - Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura.
OMC - Organização Mundial do Comércio.
ONU - Organização das Nações Unidas.
ONGs - Organizações Não Governamentais.
P&D - Pesquisa e Desenvolvimento.
PDI - Plano de Desenvolvimento Institucional.
PDE - Plano de Desenvolvimento da Educação.
PME - Pequenas e Médias Empresas.
ProUni - Programa Universidade para Todos.
PIB - Produto Interno Bruto.
PROSUL - Programa Latino-Americano e Apoio às Atividades de Cooperação em Ciências e
Tecnologia.
Reuni - Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades
Federais.
PT - Partido dos Trabalhadores.
QEQ - Quadro Europeu de Qualificações.
RIAQUES – Rede Iberoamericana para a acreditação da Qualidade da Educação Superior.
SD - Suplemento do Diploma.
SESI - Serviço Nacional da Indústria.
SENAI - Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial.
SINAES - Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior.
SBPC - Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência.
SWPR - Schumpeterian Workfare Posnational Regime.
TIC - Tecnologias de informação e Comunicação.
UE - União Europeia.
USAID - United States Agency for International Development.
UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.
USP - Universidade de São Paulo.
UB - Universidade do Brasil.
UFABC - Universidade Federal do ABC.
Unifal - Universidade Federal de Alfenas.
UFGD - Universidade Federal da Grande Dourados.
Unilab - Universidade da Integração Luso-Afro-Brasileira.
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UDF - Universidade do Distrito Federal.
UEG - Universidade Estadual de Goiás.
UFCSPA – Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre.
UNILA - Universidade Federal para a América Latina.
UFBA - Universidade Federal da Bahia.
UFAM – Universidade Federal do Amazonas.
UFCE - Universidade Federal do Ceará.
UFFS - Universidade Federal da Fronteira do Sul.
Uniam - Universidade Federal da Integração da Amazônia Continental.
UFMT - Universidade Federal do Mato Grosso.
UFMG - Universidade Federal de Minas Gerais.
UFPA - Universidade Federal do Pará.
UNIPAMPA - Universidade Federal do Pampa.
UFPE - Universidade Federal do Pernambuco.
UFRB - Universidade Federal do Recôncavo da Bahia.
UFRGS - Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro.
UFTM – Universidade Federal do Triângulo Mineiro.
Ufersa - Universidade Federal Rural do Semi-Árido.
UFVJM - Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri.
UFT - Universidade Federal do Tocantins.
UTFPR - Universidade Tecnológica Federal do Paraná.
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RESUMO
FERREIRA, Suely. A universidade do século XXI: concepções, finalidades e contradições. 2009. 305f.Tese (Programa de Pós-Graduação em Educação) - Faculdade de Educação, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2009.
Esta investigação insere-se na linha de pesquisa Estado e Políticas Educacionais do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Goiás e teve como objetivo discutir a construção das novas concepções e papéis sociais que estão sendo requeridos para a universidade pública mediante a reforma da educação superior no Brasil (1995-2008) e do Processo de Bolonha na União Europeia (1999-2008). Resguardadas as devidas especificidades do contexto brasileiro e europeu, o interesse da pesquisa direcionou-se para a universidade como uma instituição social, tendo em vista as novas solicitações que lhe são demandadas pelo Estado, sociedade e mercado e que vêm moldando as suas finalidades sociais. Desde as últimas décadas do século XX, os fins sociais tradicionais da universidade passaram a ser postos em questão, sofrendo críticas diversas, o que tem colocado em debate a necessidade da reestruturação dessa instituição, de modo a que venha assumir novos papéis sociais em consonância com as aceleradas transformações decorrentes da reestruturação produtiva do capital. Assim, no cenário de grande acirramento pela competitividade global e da mundialização do capital, de transformações conjunturais aceleradas pela acumulação flexível, frente ao processo de financeirização da economia e da revolução técnico-científica-informacional (HARVEY, 2006; CHESNAIS, 1996; SANTOS, 1997; LOJKINE, 1995), surgem ao mesmo tempo, articuladas a esse processo, novas demandas econômicas, políticas, sociais e culturais, e discutem-se as novas relações do Estado, do mercado e da sociedade civil com a universidade pública e suas finalidades. O processo de internacionalização da educação superior vem possibilitando a introdução de novos agentes, regulamentações, institucionalidades, demandas para a formação acadêmica e produção do conhecimento, acarretando importantes transfomações para as universidades. Para desenvolver o estudo, optou-se pela investigação teórica, documental e por uma análise macrossocial das reformas da educação superior no Brasil e na União Europeia. Nesse percurso, utilizou-se da pesquisa bibliográfica de estudos produzidos sobre o tema no âmbito brasileiro (OLIVEIRA, 2000; CUNHA, 2004; COÊLHO, 2004; SGUISSARDI, 2008; DIAS SOBRINHO, 2007; AMARAL, 2008; DOURADO, 2008; GOMES, 2008; dentre outros) e no contexto europeu (PACHECO, 2003; CHARLE et al., 2004; BARROSO, 2005; ANTUNES, 2007; MAGALHÃES, 2006; DALE, 2008; dentre outros). Realizaram-se coleta e análise de documentos produzidos pelos governos brasileiros e no âmbito da União Europeia, que normatizam e orientam o processo de reforma no Brasil e Europa; de documentos elaborados por organismos transnacionais e por entidades da sociedade civil, além de documentos produzidos e disponibilizados pelas instituições de ensino superior do Brasil e da União Europeia em seus endereços eletrônicos respectivos. A pesquisa mostra que o processo de reestruturação da educação superior, tanto no Brasil quanto na União Europeia, iniciado na década de 1990, vem acarretando significativas mudanças na identidade, na concepção, nos critérios de relevância e de pertinência social, o que tem possibilitado certa naturalização das novas finalidades sociais e das novas formas de conceber as universidades mais afinadas com as demandas da globalização produtiva e dos interesses competitivos dos estados nacionais.Palavras-chave: Universidade. Reformas. Finalidades sociais.
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ABSTRACT
FERREIRA, Suely. The University of Twenty-first Century: conceptions, aims and contradictions. 2009. 305s. Thesis. (Post-graduate Program in Education). - Faculdade de Educação, Universidade Federal de Goiás, Goiânia-Go, Brazil, 2009.
This investigation is inserted in the research line State and Educational Policies of the Post-graduate Program in Education of the Universidade Federal de Goiás, Brazil, and had as aim to discuss the building of new social conceptions and roles requested to public universities by the reformation of Brazilian higher education (1995-2008) and by the Bologna Process in European Union (1999-2008). Watching the particularities of both Brazilian and European contexts, the interest of the research was driven to university as a social institution face to face the new requests put by State, by society and by the market which have been shaping its social aims. Since the last decades of twentieth century, the traditional social aims of the university came to be under questioning, suffering several censures, which has been putting in argument the need of restructuring this institution in order to arrogate new social roles according to the accelerated transformations due to productive rebuilding of capital. In this manner, in a scenery of great wrangling for global competition and of globalization of the capital, the accelerated transformations provoked by the flexible accumulation, face to the process of financiering of the economy and by the technical-scientific revolution (HARVEY, 2006; CHESNAIS, 1996; SANTOS, 1997; LOJKINE, 1995), new social, cultural, economic and political requests emerge linked to this process and the new relationship of State, market and civil society to the public university and its aims. The process of internalization of higher education has been becoming possible the introduction of new agents, regulations and requests to the academic formation and to the production of knowledge, what causes important transformations to the universities. For the realization of the study, was chosen the documental theoretical investigation joined to a macrossocial analysis. In this trajectory, has been used the bibliographic research on studies produced about the theme within Brazilian ambit (OLIVEIRA, 2000; CUNHA, 2004; COÊLHO, 2004; SGUISSARDI, 2008; DIAS SOBRINHO, 2007; AMARAL, 2008; DOURADO, 2008; GOMES, 2008; among others) and within European context (PACHECO, 2003; CHARLE et al., 2004; BARROSO, 2005; ANTUNES, 2007; MAGALHÃES, 2006; DALE, 2008; among others). Documents produced by Brazilian governments and within the ambit of European Union which regulate and guide the process of reformulation in Brazil and Europe have been collected and analyzed. Furthermore, documents elaborated by transnational organisms and by institutions of the civil society as well as documents produced and made disposable by institutions of higher education in Brazil and in European Union have been collected and analyzed too. The research shows that the process of restructuring the higher education in Brazil as well as in European Union, begun in the nineties of the last century has been causing significant changes in the identity, in the conception, in the relevance and social pertinence criteria of the universities, what has been making possible some naturalization of the new social aims and of the new forms of conceiving them more gotten along with the requests of the productive globalization and of the competitive interests of the national states. Keywords: University. Reformations. Social aims.
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INTRODUÇÃO
Nas últimas décadas do século XX e no início dos anos 2000 têm-se observado
mudanças substantivas nas concepções e nos papéis das universidades. Pensar sobre esse
movimento dialético que envolve tanto os aspectos internos como externos das universidades,
remete a situá-la não somente no contexto nacional, mas no cenário da internacionalização da
educação superior. Esse nível de ensino vem ganhando significativa centralidade nas agendas
de diferentes países e dos organismos multilaterais bem como vem sendo sistematicamente
estudado, principalmente pelos países hegemônicos e pelas entidades internacionais, fato que
levanta a importância de os países em desenvolvimento discutirem o movimento de
transformação dos seus sistemas de ensino superior em articulação com o processo de
reestruturação produtiva do capital em âmbito global.
A universidade, objeto deste trabalho, tem sido chamada, ao longo da sua
trajetória, a cumprir determinados papéis em consonância com a história e com o
desenvolvimento social e político dos países em que se localizam, uma vez que originam-se
na sociedade e nelas se enraízam, podendo ser compreendidas somente na sua relação de
interioridade com a sociedade (COÊLHO, 1980b). A universidade e a educação superior,
fenômenos históricos e sociais, sofrem, portanto, “mudanças e cumprem papéis dinâmicos,
respondendo às demandas que lhes são feitas nas mais diversas circunstâncias históricas”
(DIAS SOBRINHO, 2004, p. 705). Nessa perspectiva, nas últimas décadas do século XX, a
universidade passou a ser posta em questão no que toca a suas finalidades sociais, sofrendo
críticas severas e colocando em debate a necessidade de que se readequem e assumam novos
papéis sociais consonantes com as aceleradas transformações decorrentes da reestruturação
produtiva do capital e da própria reconfiguração dos estados em vários países do globo,
sobretudo a partir dos anos 1980. Esse processo vivenciado pela universidade vem sendo
cunhado como crise da instituição. Porém, desde sua origem, a universidade sempre pareceu
estar à espera de uma nova reforma,“Universitas semper reformanda”(CHARLE E
VERGER, 1996, p. 57), uma vez que é parte de uma realidade concreta e suas finalidades
devem ser compreendidas mediante as necessidades da sociedade,
nascidas de suas próprias transformações num mundo em constante mutação e crise. Essa percepção faz pensar também que a universidade, como parte de uma realidade histórico-sociocultural, deve ser por sua própria natureza o espaço de culturas diversas, de diferentes visões de mundo. Assim sendo, os conflitos nela existentes deveriam situar-nos no plano da busca de elementos
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novos e melhores para a instituição, e não naquele dos interesses pessoais ou das atitudes de dominação e imposição (FÁVERO, 2003, p. 179).
A crise mais recente da universidade articula-se com a crise da sociedade frente
ao processo da mundialização do capital, que requer novos ajustes em todos os planos, quais
sejam, no econômico, no político, no social, no cultural, no ideológico. Nesse processo, vêm
sendo redefinidos os papéis do Estado e, consequentemente, das políticas educacionais,
atingindo as universidades públicas. Nesse movimento, essa instituição social vive uma crise,
que, no contexto deste trabalho, será entendida em uma perspectiva mais ampla, ao conceber
que este conceito é também ideológico, pois transmite a idéia da negação dos conflitos e das
contradições inerentes à própria universidade. Coêlho afirma que
a idéia de crise da universidade cria em toda a chamada comunidade acadêmica o sentimento de possuirmos todos os mesmos interesses, de se estar no mesmo barco, de se dirigir ao mesmo porto. As diferenças, as contradições presentes também na universidade são, pois, dissolvidas por esse discurso que reconhece os conflitos para sutilmente assimilá-los, [...] negá-los. [...] Conduz à aceitação de um poder salvador que garantiria a identidade da universidade - a restauração da harmonia e da ordem supostamente definidoras da universidade. [...] Não podemos nos esquecer de que também historicamente o discurso da crise sempre foi um discurso conservador [...]. Universidade “sem crise” seria aquela [...] sem crítica, sem reflexão, sem liberdade (1980a, s/p).
A história e a dinâmica das universidades, dos seus modelos e finalidades nos
mostra sua inserção na “tessitura complexa e contraditória da sociedade, em relações de
mútuas interatuações” e, portanto, que os seus problemas “não dizem respeito somente a ela.
São problemas de toda a sociedade” (DIAS SOBRINHO, 2005b, p. 164). A universidade, por
estar intrisecamente articulada com a sociedade, na qual está inserida, é uma instituição por
“excelência que produz, amplia, aprofunda, expressa e transmite, de modo rigoroso e crítico,
o saber, a cultura, as ciências, as técnicas, a filosofia, as letras e as artes, em todas as
dimensões (COÊLHO, 2004, p. 27). Tais finalidades vêm historicamente possibilitando o
avanço da ciência, a produção do saber teórico e prático, a evolução da formação humana e da
sociedade. Porém, a universidade é,
ao mesmo tempo, o lugar da autoperpetuação do bloco histórico através da concentração do saber e da competência profissional nas mãos dos setores hegemônicos, mas também um espaço de criticidade e de debate, certamente condicionado pelos parâmetros da função coercitiva do Estado, mas onde essa hegemonia pode ser em maior ou menor grau resistida, denunciada e combatida (COELHO, 1980b, p. 3).
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Portanto, a universidade, ao exercer papéis fundamentais na e para a sociedade,
não é uma instituição isolada. Ela foi sendo constituída historicamente no contexto do campo
científico e educacional, articulando-se, todavia, a uma realidade concreta, situada no tempo e
no espaço, integrada às instituições com as quais relaciona, aos valores vigentes da sociedade
em que está inserida. Nessa investigação entende-se que a universidade constitui-se como
uma instituição social por expressar as características próprias das instituições: historicidade,
exterioridade, objetividade, força coercitiva e autoridade moral (BERGER e BERGER, 2004).
Chauí (2001) discute a universidade como instituição social por entender que a sociedade é o
seu princípio e sua referência normativa e valorativa; por percebê-la inserida na divisão social
e política e na busca da definição da sua universalidade (imaginária ou desejável) para
responder às contradições impostas por essa divisão. Assim, a universidade questiona sua
própria existência, seu papel e seu lugar no interior da luta de classes. Coêlho mostra que,
como instituição social específica, a universidade.
afirma sua diferença e autonomia em relação à sociedade, ao Estado, às demais instituições, às organizações, aos partidos políticos, às empresas, aos movimentos sociais e aos sindicatos, dos quais, em virtude de sua natureza, não depende. Expressa, de modo autônomo e crítico, os conflitos inerentes à existência e à transformação da sociedade e da cultura, à criação de direitos, à invenção e realização da igualdade, da democracia e da justiça, à formação humana, ao cultivo do pensamento, do ensino, da pesquisa, do trabalho acadêmico e da produção intelectual, atividades essencialmente autônomas e livres. Sociedade e universidade são, portanto, permeadas e divididas, de ponta a ponta, por conflitos. Imaginar, acreditar que a existência da universidade não encerra conflitos é negar a natureza mesma da sociedade, da produção intelectual e da universidade (2004, p. 28).
As articulações entre universidade, sociedade e Estado na história dessas
instituições mostram-se complexas. A universidade medieval necessitou submeter-se à igreja
para autorização de criação, funcionamento e manutenção financeira e, ao mesmo tempo,
recebeu privilégios legais e econômicos superiores aos poderes dos municípios, das dioceses,
dos principados e dos Estados, como nos mostram Charle e Verger (1996). A universidade
espelhava-se no modelo das corporações feudais e tinha como um dos seus fins reafirmar a
doutrina católica-cristã, como também, logo, a nobreza e os reis perceberam sua importância
para suas pretenções políticas e territoriais bem como as grandes cidades comerciais
interessaram-se pelo seu papel de formar funcionários públicos e de absorver os potenciais
estudantes locais (RÜEGG, 1996a). A universidade medieval caracterizou-se como instituição
internacional de grande importância cultural, de difusão de idéias, produtora de conhecimento
e formadora da elite. A partir do século XV, os príncipes começaram a autorizar e fundar
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universidades, requerendo para as mesmas novos papéis sociais, ou seja, deveriam constituir-
se em centros de formação profissional a serviço dos Estados e contribuir para a elaboração da
ideologia nacional e monárquica na formação dos Estados Nacionais (CHARLE; VERGER,
1996). Entre os séculos XV a XVIII, as universidades sofreram críticas e passaram por uma
crise atribuída à sua dificuldade de adaptar-se aos novos papéis; constatação de que grande
parte das descobertas da revolução científica dos séculos XVII e XVIII não saíram de dentro
das universidades; perda do espaço quanto ao monópolio da produção do conhecimento e
formação das elites; presença do significativo desemprego de pessoas letradas; insatisfação
em relação ao ensino e à qualidade. A partir do século XVII são fundadas, fora das
universidades, várias escolas especializadas que tinham um campo do saber especializado e
objetivavam a aplicação prática, relegando a investigação científica e a educação geral. Os
novos requerimentos da sociedade moderna (século XVI e XVIII) impulsionaram um
profundo processo de transformação nas universidades por meio da expansão, diferenciação e
profissionalização (FRIJHOFF, 1996; RÜEGG, 1996a). No século XIX, as universidades
modernas são chamadas a atender às demandas da promoção social dos indivíduos, da
formação das elites, da consolidação dos estados nacionais, do progresso científico e
econômico nacional e internacional. Frijhoff assinala que, apesar das diversas demandas
exigidas ao longo da sua história, “a universidade tem assimilado constantemente as
mudanças de forma e função exigidas por seus utentes membros da sociedade, mas tem
preservado o seu sentimento de identidade inviolada” (1996, p. 42).
Para Teixeira “a história de todos os países que floresceram e se desenvolveram é
a história da sua cultura e a história de sua cultura é, hoje, a história das suas universidades”
(1953, p.101). Essas instituições são, portanto, expressões do grau de desenvolvimento das
sociedades em que estão localizadas. Elas variaram consideravelmente em antigüidade,
continuidade e qualidade de ensino e de investigação e, mesmo assim, “é possível detectar
algumas características comuns” (GIEYSZTOR, 1996, p. 107), independentemente do seu
contexto nacional. Assim, na história das universidades sempre existiram modelos distintos e
expectativas diversas das suas finalidades sociais que expressaram projetos científicos,
culturais, ideológicos, técnicos, sociais diferentes; elas relacionaram-se com as classes
dominantes e com o poder instituído das sociedades em que estavam inseridas e, apesar de
não existir uma concepção única de universidade e de suas características serem tecidas
historicamente em determinado tempo e, ou, espaço, conseguiram alcançar certa identidade
universal. Assim, pode-se afirmar que a solidariedade e a cooperação são seus valores
intrínsecos (DIAS SOBRINHO, 2004); a autonomia é uma condição essencial para sua
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existência e realização do seu sentido e finalidade (COÊLHO, 2004); traduz-se no lugar onde
se reflete sobre a universalidade do saber (COÊLHO, 1980b). Portanto, a universidade forjou
ao longo da sua existência, sua identidade histórica, apesar de ter assumido diversos papéis,
estruturas, organização, tamanho e, as suas especificidades assumidas nas diversas
sociedades, ao longo dos séculos, não anularam a sua identidade construída na sua relação
com a sociedade, com a igreja, com o Estado e até com o mercado1.
Trindade cita Matteuci para mostrar que a universidade, apesar de “diversamente
organizada dentro da sociedade por condições geográficas e históricas, é a instituição
autônoma que, de modo crítico, produz e transmite a cultura por meio da pesquisa e do
ensino” (2004, p. 839 - grifado no original). Historicamente, o ensino superior tem-se
desenvolvido como um sistema de educação pós-secundária que apresenta características
diferentes conforme os países, ou seja, a oferta exclusiva do ensino universitário ou de um
sistema misto com ensino universitário e não-universitário (politécnico, tecnológico,
seqüencial, college etc.). A complexidade da organização dessas instituições públicas ou
privadas tem possibilitado a oferta de cursos com durabilidade e certificação variada para
clientelas distintas e com diferentes padrões de prestígio social, demonstrando que não existe
consenso sobre quais deveriam ser os papéis sociais da educação superior, uma vez que
questões
epistemológicas, éticas, ideológicas, políticas, culturais, técnicas e de outras naturezas imprimem complexidade a esse fenômeno. Dissenso e contradições são inerentes aos fenômenos sociais, e não seria diferente na educação. [...] Nenhuma concepção de educação superior se isenta de visões de mundo e idéias de sociedade ideal (DIAS SOBRINHO, 2004, p. 705).
No que se refere a universidade, Coêlho nos mostra que, em vez de
1Rüegg afirma que a universidade é a “única instituição europeia que preservou os seus padrões fundamentais, o seu papel social e as suas funções básicas ao longo da história” e que “nenhuma outra instituição europeia se expandiu pelo mundo inteiro nos mesmos moldes em que fez a universidade europeia na sua forma tradicional” (1996a, p. 1) É fato que essa instituição conseguiu manter características particulares desde a sua origem medieval como: os graus acadêmicos (bacharel, mestre e doutor), a duração média dos cursos, a tradição da reunião das quatro faculdades medievais (artes, direito, medicina e teologia), a não submissão aos poderes externos (autonomia) e o chamado corporativismo. Amaral (1998) cita o estudo realizado por Kerr sobre as instituições do mundo ocidental que foram estabelecidas em 1520 e que, ainda hoje, conservam de forma reconhecível seus papéis sociais sem interrupções. Nesse estudo foram levantadas cerca de oitenta e cinco instituições, sendo que setenta delas, eram universidades. Amaral, diante dessa constatação, levanta a questão: “o que haverá de extraordinário que permite a sobrevivência destas setenta universidades que ainda hoje estão nos mesmos lugares, ocupando alguns edifícios, com professores e alunos desempenhando as mesmas tarefas e com formas de governo análogas quando, no mesmo período, muitas outras instituições, em princípio mais poderosas desapareceram? A chave do segredo reside no facto de as instituições universitárias lidarem com o saber; nas instituições de ensino superior, o saber é descoberto, conservado, aperfeiçoado, transmitido e aplicado e daí resultam algumas das características mais importantes das universidades que lhes permitem, igualmente, resistir com êxito a mudanças que lhes sejam impostas do exterior” (1998, p. 193).
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harmonia, integração, unanimidade, consenso, homogeneidade e unidade, o que existe na sociedade - e na universidade como expressão é uma das dimensões da existência social - são cisões e conflitos que atravessam sua existência de um lado ao outro, de modo que, em qualquer área, tema ou aspecto da sociedade e da universidade, há pessoas que defendem, e outras que constestam, determinados valores, idéias e práticas, enfim, os que aceitam, desejam e esperam manter a atual forma de existência da sociedade, da cultura, da humanidade e da universidade, e os que a ela se opõem e lutam para superá-la, transformá-la radicalmente (2004, p. 29).
Nas últimas décadas do século XX, o papel social da universidade ganha
centralidade, na medida em que lhe é exigida nova relevância social na e para a sociedade da
economia do conhecimento, expressão propalada que assume a perspectiva de que sociedade e
economia devem estar assentadas no conhecimento como estratégia de competitividade, tanto
no cenário local como no regional e no internacional2. Trindade adverte que atualmente
estamos “submetidos a um processo de mundialização diante do qual temos que abandonar
qualquer projeto de Nação soberana e que a sociedade do conhecimento ou da informação
seria a única referência válida para o futuro da educação superior” (2004, p. 822). Assim, a
existência da universidade em si mesma, não bastaria mais, como fator da sua legitimação
social e que “a forma como hoje é discutido o papel do ensino superior tem sido
significativamente influenciada por considerações econômicas” (TEIXEIRA, 2009, p. 09), na
medida em que a ciência e a educação superior passaram a ser consideradas como fatores de
produção e “parte integrante da economia, mercadorias ou quase mercadorias, em países
centrais, da periferia e da semiperiferia” (SGUISSARDI, 2006a, p. 1035). Esse novo contexto
vem desafiando as universidades, mais uma vez, a adaptar-se. Os seus traços constitutivos,
como a de ser uma comunidade de professores e alunos; a relação orgânica das faculdades de
diversas áreas do conhecimento; a autonomia; a livre discussão de ideias; a perspectiva de
pensar a longo prazo e a produção do conhecimento científico desatrelado das demandas
imediatas da sociedade; a relação dialógica do professor-aluno mediante aulas presenciais,
seminários, debates; o monópolio de outorgar diplomas; dentre outras características, foram,
de certa forma, preservados ao longo da sua história. As prioridades e alternâncias de ênfases
nos fins sociais das universidades relacionam-se com as necessidades dos grupos econômicos,
2Frigotto explica a utilização da retórica da economia do conhecimento, nas últimas décadas, como uma premissa ideológica que escamoteia que a “crescente incorporação de capital morto com a ciência e tecnologia, como forças produtivas diretas, e a ampliação do desemprego estrutural e de um contingente de trabalhadores supérfluos, as noções de sociedade do conhecimento, de qualidade total, cidadão produtivo, competências e empregabilidade indicam que não há lugar para todos e o direito social e coletivo se reduz ao direito individual (2007, p. 1138). Trindade também alerta que no início desse século determinadas instituições internacionais ao “forjar os conceitos de ‘sociedade do conhecimento mundializada’ e da educação como ‘bem publico global’, sinalizam o rompimento com qualquer projeto de inserção nacional soberana no processo (2004, p. 836).
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políticos, culturais hegemônicos de determinado momento histórico, bem como da correlação
de forças das diversas frações das classes sociais e demonstram que os conflitos e as
contradições são intrísecos a história das universidades.
No período correspondente ao que se inicia no século XIX e se estende até
aproximadamente a metade do século XX, as universidades, tiveram como ideais
universitários, os modelos napoleônico e humboldtiano, principalmente3. Atualmente,
verifica-se no campo da educação superior, sobretudo em países desenvolvidos ou em
desenvolvimento, um sistema complexo, diversificado, flexível e híbrido de modelos de
instituições de ensino superior que surgem em consonância com as diversas demandas da
sociedade. O modelo da universidade de pesquisa, autônoma e com liberdade de ensino,
representado, mais contemporaneamente, na articulação ensino, pesquisa e extensão, que tem
por base a concepção de Humboldt, sofre inúmeras críticas por não conseguir atender às
novas solicitações exigidas pelo Estado e mercado em tempos de globalização econômica.
Panizzi explica que
pela intercomunicação, os efeitos da globalização alcançam os processos produtivos de bens e serviços, desde a sua forma de produção, intrumentos e tecnologia, até a sua organização estrutural, interna e externa, sua gestão, com estratégias e parâmetros de qualidade, e distribuição, local e global. Aqui, assume relevância o tipo de pessoa e de profissional que os sistemas assim organizados passam a requerer. Dessa forma, a homogeneização que atinge o conjunto das relações chega, também, como uma exigência às instituições universitárias. Se reflete nas características de programas de ensino, currículos, estratégias e objetivos de relações com os diferentes agentes sociais e econômicos. Enfim, na oferta de cursos, nas linhas de pesquisa e nos diferentes parâmetros de avaliação. A partir da intensificação desse processo, a universidade é chamada uma vez mais a se transformar. A questão é: para quê, como, em que direção, e, especialmente, a partir de que concepção de educação, de universidade e de formação profissional (2006, p. 4).
À medida que os modelos clássicos ou tipologias ideais, sobretudo europeus de
universidade, passam a ser considerados obsoletos, quais modelos universitários vêm sendo
construídos para emulação das universidades? Refletir sobre as finalidades e papéis das
3Pode-se verificar que a partir dos modelos napoleônico (francês) e de Humboldt (alemão), a universidade “ampliou seu relacionamento com a sociedade, com o Estado e com o mercado, ora para acentuar a reprodução no campo social, ora para formular ou vincular-se a projetos de transformação social” (OLIVEIRA, 2000, p. 59). No modelo napoleônico, a universidade passa a ter um alto grau de centralização e controle estatal; afirmação do ensino público, leigo e padronizado; distinção entre universidades que priorizam o ensino (formação especializada e profissionalizante) e as “grandes escolas” que focam a pesquisa e a formação profissional de alto nível; as faculdades organizam-se isoladamente, distanciando-se do modelo de universidade orgânica. No modelo humboldtiano, a universidade assumiu como ideal, “a unidade entre pesquisa e ensino; a busca científica como infinita; a autonomia da ciência; a relação autônoma, porém integrada, entre Estado e universidade; a interdisciplinaridade; a cooperação entre professores e entre professores e alunos” (OLIVEIRA, 2000, p. 62).
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universidades para o século XXI constitui-se em grande desafio para os investigadores desse
campo, ao se considerar que a universidade possui uma natureza institucional própria, com
objetivos e finalidades específicas, complexas e distintas de outras instituições, por desvelar
tensões múltiplas e conflitos do seu lugar na sociedade, ao relacionar-se tanto com a
sociedade civil quanto com a sociedade política. Somem-se a isso, as atuais transformações
em curso da reestruturação produtiva do capital, os novos papéis assumidos pelo Estado e
suas consequências para as políticas educacionais. A análise deste trabalho parte do
pressuposto que a universidade é parte constituída e constituinte de um projeto dentro de uma
sociedade dividida em classes, frações de classes e grupos sociais desiguais.
As mudanças nas últimas décadas do século XX, na universidade, no Estado e no
mercado vêm promovendo alterações substantivas na forma de conceber a universidade e o
exercício das suas finalidades nessa relação. Novas temáticas sobre os novos desafios que a
educação superior deverá enfrentar fazem presente no debate internacional, mas, devido ao
recorte e limitação desta pesquisa, a análise proposta ficará circunscrita às transformações nas
finalidades sociais da universidade. Dourado, Oliveira e Catani levantam como preocupações
atuais:
a ampliação da demanda e a expansão e interiorização da educação superior, as necessidades de uma demanda cada vez mais diversificada; os objetivos e funções da educação superior no século XXI; o lugar da universidade no mundo virtual das novas tecnologias da informação e da comunicação; o papel das ciências sociais na análise da problemática mundial; a integração/unidade entre pesquisa e ensino; a eficiência, a qualidade, a competitividade e a equidade dos sistemas; as mudanças nos perfis profissionais e no processo formativo; o papel da educação continuada na formação permanente; a autonomia das ciências e a liberdade acadêmica; a interdisciplinaridade; as relações das universidades públicas com o Estado e o setor produtivo; o impacto da mundialização do capital nos planos e programas; o financiamento da educação superior; a relação entre investigação e tomada de decisões no campo da educação superior, entre outros (2003, p. 21).
No cenário de grande acirramento pela competitividade global e da mundialização
do capital, de transformações conjunturais aceleradas pela acumulação flexível do capital
frente ao processo de globalização do capital financeiro e da revolução técnico-científica-
informacional que vem permitindo, de forma revolucionária, a circulação do conhecimento e
a difusão da sua produção e aquisição (HARVEY, 2006; CHESNAIS, 1996; SANTOS, 1997;
LOJKINE, 1995) surgem ao mesmo tempo, articuladas a esse processo, inúmeras novas
demandas econômicas, políticas, sociais e culturais, e discutem-se as novas relações do
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Estado, do mercado e da sociedade civil com a universidade pública e suas finalidades, ou
seja, a universidade administrada passa a ser compreendida como
locus da formação de profissionais [...]. Compete à universidade contribuir significativamente com a produção de mais-valia relativa, ou seja, ela deve formar profissionais e gerar tecnologias e inovações que sejam colocadas a serviço do capital produtivo. Nessa ótica capitalista, só é produtiva a universidade que vincula sua produção às necessidades do mercado, das empresas e do mundo do trabalho em mutação, ou seja, subordina sua produção acadêmica formal e concretamente às demandas e necessidades do mercado e do capital. Tal lógica tem implicações efetivas no campo universitário, ao minar as bases da universidade como espaço privilegiado de produção do conhecimento (DOURADO, OLIVEIRA, CATANI, 2003, p. 19-20) (Grifos nossos).
Os documentos produzidos pelo Banco Mundial e pela UNESCO nas últimas
décadas vêm tecendo críticas e levantando problemas sobre a situação do ensino superior em
inúmeros países: baixa relação aluno/professor nas universidades públicas; subutilização das
instalações físicas; duplicação desnecessária de programas e carreiras; altas taxas de evasão e
repetência; soma excessiva de recursos destinados a assistência estudantil; formação de
profissionais destoantes das necessidades do mercado de trabalho; orientação intelectualizada
e superespecializada; foco no acadêmico em detrimento da redução do seu isolamento da
sociedade; uso de tecnologia defasada em relação à indústria; custos financeiros crescentes e
altos, dentre outros (AMARAL, 2008b). Os problemas levantados traduzem-se na crise da
educação superior no contexto dos “dogmas da eficiência, da eficácia, competência e da
excelência do privado e do mercado; da diferenciação institucional e da competitividade
empresarial; da ciência na condição de mercadoria e da minimização e centralização do
Estado” (SILVA JÚNIOR, 2003, p. 75). Nesse cenário de novas exigências, desafios e
tensões colocados para os sistemas de ensino superior de inúmeros países, torna-se importante
a discussão dos novos papéis esperados para esse nível de ensino que surgem no contexto da
chamada crise da universidade. Panizzi chama a atenção para que, na sociedade
atual, no espaço no qual predomina a valorização do conhecimento, não só como elemento constitutivo do ethos social e coletivo, mas também como parâmetro de ascendência e poder, o que se constata é uma profunda modificação da educação, na sua gênese constitutiva como um bem público e patrimônio social. Ficam evidentes, também, as consequências desse processo na modificação da instituição promotora desse bem público, a universidade, que entra, assim, e cada vez de forma mais profunda, em crise (2006, p. 8) (grifos nossos).
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Alguns autores vêm estudando o contexto da crise da universidade. Chamamos a
atenção para as análises de Santos (2004) que descreve a presença de três crises nessa
instituição: a crise de hegemonia, que surgiu em função da contradição dos seus papéis
tradicionais (produção da alta cultura e do pensamento crítico para a formação das elites) com
as novas finalidades que lhe são exigidas (formar mão de obra qualificada para atender ao
mercado). À medida que a universidade não conseguiu atender com eficácia essa nova
exigência do desenvolvimento capitalista, o Estado e os agentes financeiros passaram a
procurar alternativas fora da universidade para atender às suas demandas. Já a crise de
legitimidade nasceu em função da limitação do acesso da população à universidade, que
permaneceu restringida ao atendimento da elite. Por sua vez, a crise institucional derivou do
embate entre a autonomia da universidade frente à definição de seus objetivos, de seus valores
e a pressão para que ela se submeta aos padrões de eficácia e de produtividade das
organizações empresariais. Panizzi explica a crise da universidade utilizando a mesma
nomenclatura designada por Santos (hegemonia, legitimidade e institucional). Em relação à
crise de hegemonia, verifica-se que a universidade deixa de ser o único locus da produção do
conhecimento científico e humanista destinado as lideranças bem como perdeu o monopólio
no que diz respeito aos aspectos operacional e instrumental no atendimento às demandas
atuais, igualando-se nesses aspectos a outras instituições. No tocante à crise de legitimidade, a
universidade sente dificuldade de manter o rigor teórico, do método, da razão, da
sensibilidade para oferecer a sociedade respostas às questões ontológicas, sociais e de justiça
e a crise institucional reflete as lutas de reivindicação tradicionais: financiamento, autonomia,
gestão (2006, p. 8-9). No final do primeiro mandato do governo de Fernando Henrique
Cardoso (1995-1998), Ristoff (1999) descreveu a crise da “universidade brasileira”, como
sendo de financiamento, de elistimo e de modelo4. Sobre a primeira, o autor se reporta à falta
de recursos financeiros e de prioridade para esse nível de ensino; a crise de elitismo relaciona-
se à existência ainda muito restrita do acesso de jovens de 18 a 24 anos ao ensino superior; e,
em relação à crise de modelo, o autor levanta a questão sobre qual deveria ser a função da
educação superior, que, na sua análise, remete a múltiplos fins. Ainda discute que a adoção do
modelo único assentado no ensino, pesquisa e extensão não atende as atuais demandas de
4Mediante a crise instalada na universidade, inúmeros pesquisadores brasileiros vêm buscando compreender este momento crítico, ao chamar a atenção por meio de metáforas nos títulos dos trabalhos publicados quanto à necessidade da construção de um debate sobre os rumos da educação superior: universidade cativa, o naufrágio da universidade, a universidade em ruínas, a universidade de pesquisa em tempo de descontentamento, a universidade sitiada, a metamorfose da universidade, a universidade em ruínas na república dos professores, dentre outros.
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forma integral, que, na sua opinião, constituem-se em três: necessidade de garantir o avanço
autônomo do conhecimento desatrelado das demandas imediatistas; necessidades do Estado,
de promover projetos de desenvolvimento e de mão-de-obra altamente qualificada; e a
necessidade dos indivíduos de buscarem novas oportunidades para suas vidas de acordo com
os seus interesses.
Nos anos 1980 e 1990, iniciou-se um processo de questionamento da produção
universitária, surgindo novos mecanismos de controle da qualidade, acompanhados de novas
exigências econômicas requeridas pelo mercado5. A partir da década de 1980, nos países
hegemônicos e na década de 1990, nos países periféricos, originou-se uma nova “lógica de
regulação institucional (ancorada na idéia de autonomia avaliada) e a inversão na lógica do
serviço educativo, que passou a ser orientado pela demanda social e do mercado”
(KRAWCZYK, 2008, p. 43), processo esse que permitiu o atrelamento das políticas para
educação superior às políticas econômicas, modificando seus objetivos, ao menos no plano
ideal, de promover um modelo de desenvolvimento econômico nacional para os interesses
particulares do mercado. O sistema científico tende a ficar cada vez mais subjugado às
injunções políticas das nações e aos parâmetros econômicos, estratégicos e militares. A
finalidade da ciência transforma-se de atividade interessada “na interpretação crítica dos
fenômenos físicos e sociais para tornar-se uma atividade de caráter utilitário, fomentada e
controlada por interesses econômicos” (SILVA; BERALDO, 2008, p. 311). Nesse novo
contexto, conhecimento e poder “se interpenetram na sociedade contemporânea em todos os
níveis, da esfera pública ao mercado, recolocando o problema do público nas universidades e
afetando sua missão social” (TRINDADE, 2000, p. 127). O documento do Banco Mundial,
intitulado Construir sociedades de conocimiento: nuevos desafios para la educación
terciária, defende uma nova visão para as universidades:
¿desaparecerán o se renovarán las instituciones terciarias tradicionales? Los cambios trascendentales que están ocurriendo en el entorno mundial están franqueando las fronteras temporales y espaciales tradicionales de la educación terciaria, tanto en los países de la OCDE como en las naciones en desarrollo y transición. La dimensión temporal se ve alterada por el requerimiento del aprendizaje continuo, mientras que las barreras espaciales están cayendo derribadas por las nuevas tecnologías informáticas y
5Silva Júnior lembra que os estudos de Popkewitz sobre as reformas educacionais estadunidenses dos anos de 1980 sobre a base das reformas educacionais dos anos de 1960, demonstram pontos de identidade e expressão com a especificidade histórica da reforma brasileira da década de 1990 e com as reformas dos anos de 1980 no hemisfério norte. Sobre as reformas da década de 1980, estudos informam que apesar das nuances de cada país, existem características semelhantes como, por exemplo, nos estudos de Laville na França e de Gimeno Sacristán na Espanha que indicam que o “movimento reformista educacional é parte das mudanças sociais demandadas pela universalização do capitalismo” (SILVA JÚNIOR, 2003, p. 62).
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comunicación. A estos retos se les puede percibir en todo lugar como graves amenazas o como excelentes oportunidades para la educación terciaria. La hegemonía de las instituciones terciarias clásicas, en especial las universidades, ha sido definitivamente impugnada y, sin lugar a dudas, la diferenciación institucional se acelerará todavía más y producirá una mayor variedad de configuraciones y modelos institucionales, incluyido el surgimiento de una gran cantidad de alianzas, nexos y asociaciones no solo en el seno de las instituciones terciarias sino entre unas instituciones y otras, e incluso más allá del sector de la educación terciaria. Sin embargo, en cualquier panorama del que se trate, las universidades tradicionales seguirán desempeñando un papel muy importante tanto en los países industrializados como en los países en desarrollo, sobre todo en lo que concierne a formación e investigación avanzadas, pero sin duda tendrán que sufrir transformaciones significativas instadas por la aplicación de las nuevas tecnologías educativas y la presión de las fuerzas del mercado (2003, p. 79 -grifos nossos).
Nesse contexto, o setor econômico passou a ocupar o espaço universitário ditando
a produção e o controle do conhecimento, modificando a relação entre esses dois setores,
relação que se restringia, anteriormente, ao atendimento da demanda por profissionais
capacitados para o mercado de trabalho. As novas demandas do Estado e da sociedade
pressionam as universidades para desenvolverem fins que sejam considerados relevantes, na
medida em que sejam úteis para o desenvolvimento social e econômico e, assim, possam
prestar contas à sociedade. Os tradicionais critérios científicos e culturais tendem a ser
relegados a um segundo plano. Teixeira afirma que a análise econômica sobre a educação
vem promovendo uma reformulação no modo como são concebidas as IES, devido aos efeitos
econômicos e sociais da sua atividade. Para o autor,
as instituições de ensino superior são um objeto de análise econômica devido a um conjunto de fatores. De um lado, o ensino superior tem efeitos importantes ao nível individual e social. Por outro, essas instituições utilizam um volume de recursos significativo (e crescente) e por isso há uma questão de custo de oportunidade. Pelo fato de despendermos recursos no ensino superior, estamos a reduzir os recursos disponíveis para outras atividades. Desse modo, o sistema superior não é alheio ao tipo de questões que constituem o cerne da análise econômica [...] (TEIXEIRA, 2009, p. 12)
Estão em disputa na sociedade civil e política várias concepções de universidade e
de educação superior para o século XXI6. Para Dias Sobrinho, está posta fundamentalmente a
disputa de duas concepções, uma em que a educação superior é considerada uma instituição
que “produz conhecimento e forma cidadãos para as práticas da vida social e econômica, em
benefício da construção de nações livres e desenvolvidas” e, no outro extremo, a visão da
educação superior “como função da economia e dos interesses individuais e privados”(2004,
6Sobre o conceito de sociedade civil e política consultar: Gramsci (1978); Coutinho (2005).
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p. 704). Para Parra (1999) estão em debate três visões distintas de universidade: a) retorno a
suas origens medievais, recuperando sua integridade acadêmica, moral e a busca da verdade
como sua finalidade última; b) impulsionadora das transformações sociais, econômicas e
políticas; e, c) instrumento do crescimento local, regional e nacional mediante sua
aproximação com o mercado, ressignificando seu papel de produtora e transmissora do
conhecimento como bem social para sua transformação em mercadoria. No embate de
concepções e fins para as universidades surgem defesas da modernização/reestruturação da
universidade, que deveria reunir capacidade para adaptação às mudanças e riscos derivadas da
sociedade da economia do conhecimento. As universidades, nesse olhar, deveriam ter como
parâmetro um modelo orientado pela inovação e pelo empreendedorismo (AUDY, 2006).
Surgem defesas da universidade empreendedora e universal, capaz de oferecer serviços
múltiplos. A reestruturação da universidade passa, então, por sua nova capacidade de
transformar o conhecimento em valor econômico e social e, logo, de demonstrar sua
relevância social. Sguissardi (2006a, 2006b) critica esses novos modelos de universidade
denominando-os modelos de ocasião: universidade neoprofissional, heterônima, competitiva,
“universidade mundial do Banco Mundial” ou de modelo anglo-saxônico. Cabe dizer que
apesar da tendência notória da aproximação da universidade com o mercado, não existe
concepção absoluta,
dadas as possibilidades de hibridismo, nem isenta de tensões, como sempre ocorre nos âmbitos sociais e, por isso, ideológicos. A economia é uma dimensão imprescindível da vida humana, a ser adequadamente desenvolvida pela educação. O papel da educação como motor da economia deve também ser levado em conta. Entretanto, a economia não pode se desbordar na economização da vida humana (DIAS SOBRINHO, 2004, p. 709).
No contexto das reestruturações presentes nas universidades, sobretudo a partir da
década de 1990, delineou-se o objetivo desse trabalho, discutir as novas concepções e papéis
sociais que estão sendo requeridas para a universidade pública mediante a reforma da
educação superior no Brasil (1995-2008) e do Processo de Bolonha (1999-2008) na União
Europeia. Resgardadas as especificidades e particularidades dos diferentes contextos,
brasileiro e europeu, o interesse da pesquisa volta-se sobre a universidade como instituição
social e para as novas solicitações que dela são demandadas pelo Estado, pela sociedade e
pelo mercado; como vêm sendo moldadas as novas finalidades sociais e como esse processo
afeta a sua identidade institucional. Para entender esse processo, elegeu-se compreender, e
não propriamente comparar, as duas reformas da educação superior em curso. Apesar das
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significativas diferenças do movimento de reestruturação das universidades na realidade
brasileira (país) e europeia (bloco), verifica-se que os diagnósticos sobre as “ineficiências”
dessas instituições sociais para desempenhar os novos papéis delas solicitados nas últimas
décadas tendem a ser semelhantes, evidenciando um processo de regulação transnacional das
políticas educativas que tendem a sobrepor as instâncias nacionais7. Apesar do estudo
comparado ser um rico instrumento analítico que permite compreeender as semelhanças e as
diferenças de duas realidades distintas que ocupam lugares diferentes na (des)ordem global,
não se optou por essa metodologia. O objetivo da pesquisa não consistiu em analisar as
semelhanças e as diferenças das duas reformas. Parte-se do pressuposto que as reformas
educacionais iniciadas principalmente na década de 1980 na Europa e, 1990 no Brasil,
constituem um processo articulado à mundialização do capitalismo e à reestruturação
produtiva e que não pode ser “pensado como um fato de um único país, pois trata-se de um
movimento mundial, com as especificidades históricas de cada um, que mantém traços de
identidade em todos eles segundo a racionalidade da transição do metabolismo social
capitalista” (SILVA JÚNIOR, 2003, p.71). Portanto, essa investigação centrou-se em
entender o processo de reestruturação das universidades por meio da discussão das
transformações na sua concepção e fins e, para esse estudo, elegeram-se a reforma da
educação superior no Brasil no governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) e no
governo de Lula da Silva (2003-2008) e o Processo de Bolonha na União Europeia
(1999-2008), que é contemporâneo ao movimento brasileiro e de certa forma influencia as
discussões da reforma brasileira8. Para orientar o processo de investigação e de exposição,
levantaram-se as seguintes questões: quais mudanças vêm transformando a identidade
histórica das universidades no Brasil e na União Europeia que implicam a crítica aos papéis
tradicionais dessas instituições? A reforma da educação superior decorrente de Bolonha vem
permitindo a construção de quais modelos e de quais finalidades para as universidades
europeias? A reforma da educação superior no Brasil, iniciada no governo de Fernando 7Sobre o conceito de regulação, sobretudo transnacional, consultar Barroso (2005, 2006a, 2006b). 8No cenário Latino Americano e da construção dos blocos regionais, discute-se a integração dos sistemas de educação superior dos países pertencentes a esse continente por meio da criação do Espaço de Encontro Latino-Americano e Caribenho de Educação Superior. A reforma da educação superior no Brasil, principalmente no governo Lula, vem sendo acompanhada pela discussão da Universidade Nova e da proposta da implantação dos Bacharelados Interdisciplinares, da defesa de uma nova opção flexível de formação universitária na graduação por meio de ciclos e módulos e do incentivo à mobilidade inter e intra-institucional bem como do argumento da necessidade de a educação superior brasileira tornar-se compatível com o modelo norte-americano e com o modelo do Processo de Bolonha. Conferir: Almeida Filho (2006; 2007a). Também, no governo Lula da Silva está-se criando uma nova tipologia de universidades federais no país mediante a fundação de instituções com enfoques na integração regional e internacional. Como exemplos desse tipo de instituição destacam-se: Universidade Federal para a América Latina (UNILA), Universidade Federal da Fronteira do Sul (UFFS), Universidade da Integração Luso-Afro-Brasileira (UNILAB) e Universidade Federal da Integração da Amazônia Continental (UNIAM).
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Henrique Cardoso (1995-2002) e em curso no governo de Lula da Silva (2003-2008)9 vem
permitindo a construção de quais modelos e de quais finalidades para as universidades? Em
que medida o movimento da reforma decorrente de Bolonha vem influenciando a reforma da
educação superior no Brasil?
Para desenvolver o trabalho optou-se por utilizar a terminologia finalidade ou
papéis da universidade para discutir como sua atuação tradicional vem sendo criticada ao
mesmo tempo em que se requerem, para essas instituições, novos papéis ou a ressignificação
das suas práticas. O conceito função e missão da universidade não será empregado pela
autora, apesar de inúmeros documentos pesquisados utilizarem esses dois termos
correntemente, assim como as administrações superiores das universidades. A palavra função
não será utilizada para evitar qualquer aproximação com uma possível interpretação
funcionalista desse termo10. Quanto à missão, também não será empregada, porque se entende
que esse termo denota a adoção de uma linguagem que é própria dos campos religiosos ou
militares, além de ter sido incorporado pelas empresas internacionais e nacionais, no contexto
da reestruturação produtiva do capitalismo, como uma linguagem da administração gerencial
mercadológica. Cabe ressaltar que o termo missão tem sido utilizado corriqueiramente nos
documentos de “Planejamento Estratégico” das universidades públicas e privadas, sobretudo a
partir dos anos de 1990. Na investigação, considerar-se-á como finalidades tradicionais da
universidade, a formação intelectual e profissional, a produção do conhecimento, a criação
artística e cultural, a crítica, a reflexão e a autonomia diante dos constrangimentos dos
poderes instituídos, a liberdade acadêmica e a promoção do desenvolvimento da sociedade.
Entende-se na pesquisa que a relação entre universidade e sociedade e
universidade e Estado não é uma relação neutra, linear, mecânica; pelo contrário, é uma
relação dinâmica, marcada pelo conflito e defesa de diversos interesses em disputa pelas
frações de classe, constituindo-se a universidade como instituição social que traz no seu bojo
projetos, limites, possibilidades, contradições, disputas, conservação e transformação.
Trindade explica que a “universidade, como instituição social, somente realiza plenamente a
sua missão acadêmica e social se mantiver um equilíbrio dinâmico entre qualidade acadêmica,
relevância social e equidade” (2004, p. 839). Assim, ao discutir a redefinição das suas
finalidades, entende-se que a universidade é uma
9O mandato desse governo encerra-se em 2010, porém o recorte temporal dessa pesquisa extende-se até o ano de 2008. 10O estruturalismo-funcionalista compreende a sociedade formada por partes, tendo cada uma delas, suas próprias funções que trabalham em conjunto promovendo a estabilidade social (totalidade orgânica). Se cada parte desempenhar bem suas funções o sistema terá o seu equilíbrio garantido.
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instituição que tem sua origem na sociedade e nela se enraíza [...]. O espaço em que se inscreve e realiza sua praxis é o espaço do social e político, a região da história. Sendo uma manifestação da vida social, a universidade não se estende a, não pode se estender à sociedade (à comunidade), pois não existe fora do social, do econômico e do político, nem mesmo pode estar dentro deles (COÊLHO, 1999, p. 83 - grifos do autor).
O conceito de regulação aplicado à educação superior utilizado nesse trabalho,
sustenta-se nas análises elaboradas por Barroso (2005) que, pode ser sistematizado no que
tange à coordenação dos sistemas educativos como: um processo constitutivo de qualquer
sistema tendo por função garantir tanto o equilíbrio como a transformação; a produção de
regras que norteiam o funcionamento do sistema e o seu (re)ajustamento em função da
diversidade das ações, das posições, dos interesses dos atores envolvidos, possibilitando uma
pluralidade de finalidades e modalidades de regulação; não se trata de um processo único, mas
resultante de múltiplas regulações, podendo tornar imprevisível seus efeitos, apesar do Estado
ser uma fonte fundamental de regulação. O autor chama a atenção ainda que o termo
regulação vem sendo utilizado para apresentar o novo papel regulador do Estado diante das
propostas de modernização da administração pública das práticas tradicionais do controle
burocrático assentadas na intervenção estatal11. Nessa ótica divulga-se que a “regulação”
(mais flexível na definição dos processos e rígida na avaliação da eficiência e eficácia dos resultados) seria o oposto da “regulamentação” (centrada na definição e controlo a priori dos procedimentos e relativamente indiferente às questões da qualidade e eficácia dos resultados) (BARROSO, 2005, p. 727).
Sobre a categoria reforma considera-se que as reformas educacionais não são um
conjunto de ações necessariamente progressistas, mas sim, “objetos das relações sociais”
(POPKEWTIZ, 1997, p. 259). Souza cita Gimeno Sacristán para explicar que os programas
políticos de reforma são “uma mescla nem sempre explícita de intenções e de práticas
pertecentes a essas duas orientações [externa e interna], sem distinguir muito bem as medidas,
os tempos, as resistências, os meios e as estratégias muito diferentes que, em um caso ou em
outro, se requer” (2003, p. 28). Nessa perspectiva, Barroso defende que a complexidade dos
processos de regulação
11Barroso discute que a promoção de novas medidas políticas e administrativas adotadas no contexto da reforma dos Estados em um conjunto significativo de países vem alterando os modos de regulação dos poderes públicos no sistema escolar e vem sendo justificada pelos argumentos: técnico - modernização, desburocratização, combate a ineficiência do Estado; político – “libertar a sociedade civil” do controle do Estado; filosófico e cultural – possibilitar a participação da comunidade, adptar-se ao local; pedagógico – centrar o ensino no aluno (2005, p. 726).
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do funcionamento do sistema educativo, bem como da dificuldade de prever (e orientar) com um mínimo de segurança e de certeza a direcção que ele vai tomar, tornam bastante improvável o sucesso de qualquer estratégia de transformação baseada num processo normativo de mudança, como são as reformas. De registrar ainda que essa improbabilidade é tanto maior quanto não existe hoje qualquer consenso quanto aos príncipios e normas (no sentido lato) que devem orientar o funcionamento do sistema, nem a sua transformação (2005, p. 735).
O termo flexibilização vem sendo defendido pelas atuais políticas educacionais
como uma importante estratégia de adaptação às mudanças em curso e de propiciar a
modernização das IES e dos seus cursos, devendo estar atentas às demandas da sociedade.
Neste trabalho, esse conceito será entendido como uma interface articulada ao
âmbito econômico e político [...] pois se trata da lógica econômica do mercado e contribui para legitimar o projeto social, determinando que a educação superior deve se transformar em atividade integrada ao processo de caráter mercadológico. [...] O imperativo da flexibilização da educação superior expressa a perda da identidade e do papel social da universidade e o descompromisso com uma formação científico-cultural, fundamentada numa concepção de produção e socialização do conhecimento que afirme seu papel político-pedagógico entre as demandas históricas da sociedade (SILVA, 2008, p.181).
Na investigação partiu-se do referencial da universidade como instituição
produtora e socializadora do saber bem como
um lugar - mas não só ela - privilegiado para conhecer a cultura universal e as várias ciências, para criar e divulgar o saber, mas deve buscar uma identidade própria e uma adequação à realidade nacional. Suas finalidades básicas são o ensino, a pesquisa e a extensão. Ela é a instituição social que forma, de maneira sistemática e organizada, os profissionais, técnicos e intelectuais de nível superior que as sociedades necessitam. Situa-se na esfera da superestrutura, dentro da sociedade civil, mantendo vínculos com a sociedade política e a base econômica. Serve normalmente à manutenção do sistema dominante, mas pode também servir à transformação social. Deve ter ampla autonomia para cumprir as suas finalidades, garantindo o pluralismo de idéias e a liberdade de pensamento (WANDERLEY, 1988, p.11 - grifos nossos).
Também parte-se do pressuposto que os papéis sociais dessa instituição indicam
a totalidade das acções realizadas em respostas às expectativas de conduta que outros dirigem a quem é incumbido de um determinado papel. Estas expectativas baseiam-se em valores para os quais a conduta é dirigida. Estes valores traduzem-se em normas que guiam a conduta socialmente esperada. As expectativas, os valores, as normas são delineados pelos interesses
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explícitos e implícitos dos vários agentes sociais e, frequentemente, são mutuamente contraditórios. Os conflitos são inerentes aos papéis e não é aos papéis das universidades que eles são menos inerentes (RÜEGG, 1996a, p. 3 - grifos nossos).
A pesquisa centrou-se na universidade pública, apesar de que, em alguns
momentos, será utilizada a expressão instituições de ensino de superior (IES), uma vez que a
reforma na educação superior abrange todo o campo universitário e traz à tona a defesa da
diferenciação institucional. No trabalho, buscou-se compreender como o movimento de
reestruturação desse nível de ensino, com ênfase no período de 1995 a 2008, para as
universidades brasileiras e, para as universidades da União Europeia, a partir do Processo de
Bolonha, de 1999 a 2008, vem possibilitando mudanças substantivas na sua identidade
histórica e exigindo a reflexão dos seus papéis sociais. No Brasil e em Portugal12 existe uma
produção significativa de trabalhos que buscam compreender o processo de mudanças que
essas instituições sociais têm sofrido nas últimas décadas, colocando em debate as
possibilidades, as dificuldades e os atropelos por elas vivenciadas13. O ponto de partida para
análise na investigação, no Brasil, inicia-se com o primeiro mandato do governo de Fernando
Henrique Cardoso (1995-1998) e na União Europeia, com a Declaração de Bolonha em 1999.
Entender as novas finalidades e concepções propostas para as universidades no cenário da
sociedade globalizada, marcada pela acirrada competitividade e pela reestruturação produtiva
do capital, frente às novas exigências impostas ao seu modus operandi, sobretudo na sua
forma de atuar, de produzir e de se organizar, torna-se imprescindível, no atual momento
histórico, principalmente, para os interessados na defesa da universidade como um bem
público, como um espaço de crítica e reflexão autônoma e de criação e socialização do saber,
da cultura e das artes.
Definir ou construir um método e uma metodologia de investigação para guiar a
pesquisa implica ter consciência da necessidade de ser coerente com os fundamentos teóricos,
com os objetivos e com a trajetória metodológica a ser assumida na construção do objeto de
pesquisa. Para condução do trabalho, buscou-se orientar pela perspectiva do materialismo
12A autora desta pesquisa realizou um estudo em Portugal na condição de bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), no Programa de Doutorado no País com Estágio no Exterior, na Universidade de Lisboa, no período de janeiro a junho de 2008, sob a orientação do Prof. Dr. Belmiro Gil Cabrito. Durante esse período, teve a oportunidade de conhecer a discussão que os estudiosos portugueses vêm fazendo sobre o Processo de Bolonha.13Alguns autores que estudam esta temática: Pacheco (2003), Charle et al (2004), Antunes (2005, 2006, 2007), Azevedo (2008), Barroso (2005, 2006), Baganha (2005, 2006), Dale (1994, 2001, 2005, 2008), Dias Sobrinho (2004, 2005, 2007), Dourado (2002, 2006, 2008), Salaburu (2007), Magalhães (2005, 2008), Santos (1999, 2004, 2005), Chauí ( 2001), Oliveira (2000), Cunha (2000), Coêlho (2004), Sguissardi (1999, 2006, 2008), Cêa (2006), Siqueira (2006), Silva Júnior (2007), Lima (2007), Amaral (2003, 2008, 2009), Lima, Azevedo e Catani (2008), Krawczyk (2008) entre outros.
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histórico, por defender que o método relaciona-se com uma concepção de realidade e de
mundo e que constituí-se “numa espécie de mediação no processo de aprender, revelar e
expor a estruturação, o desenvolvimento e transformação dos fenômenos sociais”
(FRIGOTTO, 1989, p. 77). Entende-se também no trabalho, o método científico e o objeto de
pesquisa, de acordo com a concepção marxiana, ou seja, a compreensão “do objeto científico
como um real histórico, social e teórico, cujas determinações não podem ser apreendidas
numa relação direta e informada pelo real empírico” (BORBA; PORTUGAL; SILVA, 2008,
p. 19), mas a partir de uma crítica teórica do conhecimento anterior. No processo de
investigação, buscou-se situar e contextualizar o caráter histórico da universidade para a
análise das relações que são tecidas dialeticamente entre universidade, Estado e mercado e
que desvelam traços contraditórios, conflitantes nos processos de transformação/metamorfose
(OLIVEIRA, 2000). Nesse percurso admite-se o princípio de que o método não consegue
apreender todas as determinações de uma dada realidade ou de um fenômeno, admitindo o
caráter relativo, parcial e provisório na busca do conhecimento e entende-se que a “ciência e o
processo científico não são imunes aos embates reais que se dão na sociedade de classe”
(FRIGOTTO, 1989, p. 84) e que, portanto, o trabalho científico não é neutro. Ele parte da
construção de condições existentes, de vivências, de experiências que geram a
problematização da pesquisa e a necessidade do trabalho de reflexão sobre a realidade
empírica e a produção teórica produzida sobre o tema da investigação.
A autora da pesquisa, professora de uma universidade pública14, vivencia o
processo de reestruturação no campo da educação superior e vem acompanhando as
inquietações da comunidade acadêmica frente aos expressivos desafios que estão sendo
enfrentados por aqueles que defendem a educação superior como um bem público, direito
humano universal e a universidade como um espaço de reflexão autônoma e democrática,
sentindo assim, a necessidade de pesquisar esse tema, uma vez que a “reflexão teórica sobre a
realidade não é uma reflexão diletante, mas uma reflexão em função da ação para
transformar” (FRIGOTTO, 1989, p. 81).
Para desenvolver o trabalho optou-se pela investigação teórica, documental e por
uma análise macrossocial das reformas da educação superior no Brasil e na União Europeia15.
14A pesquisadora é professora da Universidade Estadual de Goiás (UEG) desde 2004, atuando na Unidade Universitária de Ciências Exatas e Tecnológicas de Anápolis (UnuCet). 15Sobre a opção de análise na investigação, Brandão ensina que “o mundo da experiência tem uma capacidade inesgotável de recriar e