a tog a - ufrgs · tapete de porto alegre às pressas em função da copa do mundo, a vila...

12
A Toga Jornal dos estudantes da Faculdade de Direito da UFRGS www.ufrgs.br/caar CENTRO ACADÊMICO ANDRÉ DA ROCHA Avenida João Pessoa, 80 - térreo (51) 3308.3598 [email protected] Porto Alegre, junho de 2011 - Nº 2 - Ano LXIII Distribuição gratuita Tiragem: 1.000 exemplares Samba, jazz e suas raízes culturais p. 11 MÚSICA Michel Villey e os direitos que seriam do homem RESENHA p. 10 Semestre teve agenda cheia na Faculdade EVENTOS ACADÊMICOS p. 8 União estável homossexual é reconhecida pelo STF CONTRACAPA p. 6 REUNI Chocolatão O projeto de expansão de vagas previsto para sair do papel em 2012 na Faculdade de Direito Por que a expansão deve começar com professores temporários Embargada: é a situação atual da obra do novo prédio p. 4 Varrida para debaixo do tapete de Porto Alegre às pressas em função da Copa do Mundo, a Vila Chocola- tão, composta principalmen- te por catadores e recicla- dores, tem sua comunidade desestruturada e sofre com problemas sociais não solu- cionados.

Upload: phungnhan

Post on 16-Dec-2018

217 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: A Tog a - UFRGS · tapete de Porto Alegre às pressas em função da Copa do Mundo, a Vila Chocola-tão, composta principalmen-te por catadores e recicla-dores, tem sua comunidade

A To g aJornal dos estudantes da Faculdade de Direito da UFRGS

www.ufrgs.br/caar

CENTRO ACADÊMICO ANDRÉ DA ROCHAAvenida João Pessoa, 80 - térreo

(51) [email protected]

Porto Alegre, junho de 2011 - Nº 2 - Ano LXIII Distribuição gratuita Tiragem: 1.000 exemplares

Samba, jazz e suas raízes culturaisp. 11

MÚSICA

Michel Villey e os direitos que seriam do homem

RESENHA

p. 10

Semestre teve agenda cheia na Faculdade

EVENTOS ACADÊMICOS

p. 8

União estável homossexual é reconhecida pelo STF

CONTRACAPA

p. 6

REUNI

Chocolatão

O projeto de expansão de vagas previsto para sair do papel em 2012 na Faculdade de Direito

Por que a expansão deve começar com professores temporários

Embargada: é a situação atual da obra do novo prédio

p. 4

Varrida para debaixo do tapete de Porto Alegre às pressas em função da Copa do Mundo, a Vila Chocola-tão, composta principalmen-te por catadores e recicla-dores, tem sua comunidade desestruturada e sofre com problemas sociais não solu-cionados.

Page 2: A Tog a - UFRGS · tapete de Porto Alegre às pressas em função da Copa do Mundo, a Vila Chocola-tão, composta principalmen-te por catadores e recicla-dores, tem sua comunidade

A TOGA - Junho de 20112

A Toga

EXPEDIENTE

Jornal dos estudantes da Faculdade de Direito da UFRGS - Nº 2 - Ano LXIII - Junho de 2011

Editora de jornalismo: Mariana Medeiros Lenz

Comissão Editorial: Alexandre Chwartzmann, Ihana Guerra, Mariana Medeiros Lenz, Rafael Xavier - “TAGA”, Thiago Calsa Nunes.

Diagramação: Mariana Medeiros Lenz

Tiragem: 1.000 exemplares

A Toga é uma publicação promovida pelo Centro Aca-dêmico André da Rocha (CAAR). Os textos assinados são de responsabilidade de seus autores.

Fundado por Nicanor Luz e José J. Dall-agnol, em maio de 1949.

Colaboraram nesta edição:

Alexandre ChwartzmannBruno Bastos BeckerBruno Hermes LealDanilo KnijnikDenise DornellesEduardo Kowarick HalperinFranco ErgangIhana GuerraMariana Medeiros LenzMariana PargendlerMariana TadewaldRafael Xavier – “TAGA”Thiago Calsa Nunes

EDITORIAL

DIRETORIA EXECUTIVA DO CENTRO ACADÊMICO ANDRÉ DA ROCHA

Gestão Mãos Unidas, Mentes Abertas

Presidência: Elis Marina BarbieriVice-Presidência: Guilherme JantschSecretaria-Geral: Nathalia Beduhn SchneiderSecretaria Acadêmica: Leonardo Serrat de Oliveira RamosTesouraria: Gustavo Saling dos Santos

Coordenação da Revista Res Severa Verum Gau-dium: Laura Marazita LottiSecretaria de Ensino, Pesquisa e Extensão: Ailime Pureur Macedo, Felipe da Costa De-Lo-renzi, Laura Damo da Cruz.Secretaria de Relações Institucionais: An-dré Silva Gomes, Fernanda Stragliotto Bonotto, Francisco Ponzoni Pretto, Patrícia Vilanova Becker.Secretaria de Eventos Acadêmicos: Bruno Bi-tencourt Pedroso, Eduardo Kowarick Halperin, Luciano Zordan Piva, Paula Molina Leal, Rafael Xavier - “TAGA”.Secretaria de Cultura: Aline Gabrielle Renner, Augusta Vezzani Diebold, Clarissa Cerveira de Baumont, Lucas do Nascimento, Mariana Kuhn de Oliveira.Secretaria de Comunicação: Arthur Amaral Reis, Mariana Medeiros Lenz.Secretaria de Integração: Daniela Gonsalves da Silveira, Fernando Polidori Rios, Pedro Con-zatti Costa.Secretaria de Assuntos Internacionais: Aline Oliveira Vaccari, Gabriela Souza Antunes.Secretaria de Esportes: João Thiago Campos Lopes, Lucas de Mattos Ribeiro, Marcio Furtado.

Comissão Editorial, junho/2011

Por falar em expansão...

Aproveitando o assunto trazido à pauta pelo REUNI – ampliação de vagas na Faculdade de Direito – o jornal A Toga começa a traçar sua própria expansão. Entretanto, se o REUNI obje-tiva expandir-se internamente, esta publicação arrisca colocar um pé para fora do seu “Casteli-nho” na João Pessoa. Assim, a edição de junho está sendo distribuída não apenas na UFRGS, mas em outras universidades de Porto Alegre e em locais de circulação de estudantes de Direi-to, além de escritórios e ONGs com interesse específico nas reportagens publicadas.

Se é a primeira vez que você folheia A Toga, esperamos que goste da leitura e volte às nos-sas páginas em breve. Fica o convite também para que ajude a construir a próxima edição, em setembro, enviando textos ou imagens para o e-mail [email protected] e acompanhando no sítio www.caar.ufrgs.br a publicação do edital de chamamento de material. Bem-vindo!

Em compasso com acontecimentos re-centes, publicamos nesta edição de junho duas reportagens que merecem destaque por sua ampla repercussão social. A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que possibilitou a união estável homossexual e um problema para o qual a maioria fecha os olhos: a remoção da Vila Cho-colatão e o consequente impacto na existência da comunidade que há cerca de 30 anos habitava o centro de Porto Alegre, perto do prédio da Justiça Federal.

A Toga conta também com a estreia do espaço REUNIão, que propõe discutir a fundo a (provável) implantação do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Uni-versidades Federais (REUNI) na Faculdade de Direito, prevista para 2012. Na primeira reporta-gem da série, um panorama coloca o Programa em evidência do ponto de vista tanto nacional quanto “local”.

Como não poderia faltar, também fizemos a cobertura dos eventos ocorridos na Casa ao longo do mês de maio, entre eles, a vinda do Ministro do STF Gilmar Mendes para a Aula Inaugural promovida pelo CAAR, a Aula Magna com o Ministro do STJ Paulo de Tarso Sanseve-rino e as II Jornadas de Responsabilidade Civil.

Da perspectiva de dentro da Faculdade, A Toga apresenta também entrevistas com o recém--nomeado vice-diretor da Faculdade de Direito, professor Danilo Knijnik, e com a ex-aluna da Graduação, recentemente Doutora pela UFRGS e por Yale, professora Mariana Pargendler.

3 faculdade de direitoProfessor Danilo Knijnik fala sobre REUNI, universidade pública e seus planos no novo cargo de vice-diretor

4 sociedade

6 reunião (1)REUNI em foco na Faculdade de Direito: qual é o plano para o ano que vem?

8 eventos acadêmicosMês de maio foi de Salão Nobre lotado e nós acompanhamos tudo de perto

9 entrevistaA carreira profissional inspiradora de Mariana Pargendler

10 resenhaLe droit et les droit de l’homme, de Michel Villey

11 direito e economiaLivre concorrência e um exemplo brasileiro

Vila Chocolatão:deletada do mapa

contracapa Uniões estáveis homossexuais e a decisão do STF

BRUNO BASTOS BECKER

THIAGO CALSA NUNES

MARIANA MEDEIROS LENZ

RAFAEL XAVIER - “TAGA”EDUARDO KOWARICK HALPERIN

direitoUm olhar sobre os direitos humanos

RAFAEL XAVIER - “TAGA”

FRANCO ERGANG

BRUNO HERMES LEAL

músicaAs origens do jazz e do samba

MARIANA TADEWALD

THIAGO CALSA NUNES

IHANA GUERRA

• ALEXANDRE CHWARTZMANNAcadêmico do 2º ano manhã

Imagem:

Page 3: A Tog a - UFRGS · tapete de Porto Alegre às pressas em função da Copa do Mundo, a Vila Chocola-tão, composta principalmen-te por catadores e recicla-dores, tem sua comunidade

A TOGA - Junho de 2011 3

Novos ares na Casa do Velho AndréFACULDADE DE DIREITO

O senhor se formou aqui na Faculdade de Direi-to em 1994. Como é ser estudante e agora pro-fessor? Eu diria que nunca me senti distante da Fa-culdade. A verdade é que, uma vez aqui alunos, nos vinculamos definitivamente a esta casa. De modo que daqui nunca me despedi. E hoje, ser professor é ao mes-mo tempo uma honra, um orgulho e um dever de gra-tidão, pois credito à Faculdade toda minha formação.

• BRUNO BASTOS BECKERAcadêmico do 5º ano manhã

Até o mais desatento lei-tor já percebeu que a Casa do Velho André vem passando por grandes mudanças. A saída de renomados professores, os con-cursos para novos professores, a efervescência de projetos de estudo, pesquisa e extensão, o temido REUNI e até os lendá-rios ares-condicionados. Todos esses fatores nos mostram que, em alguns anos, nossa Faculda-

Já estamos no terceiro mandado do Professor Sérgio Porto à direção da Faculdade e, nas últimas eleições, houve somente uma chapa concorrendo. Como surgiu o seu interesse para participar da Direção? De minha parte, julguei que poderia colaborar com nosso Diretor, Prof. Sérgio José Porto, no âmbito administrativo, como já vinha fazendo na Chefia do Departamento de Ciências Penais. Os colegas apoiaram e resolvi aceitar o desafio. Os encargos administrativos para o bom funcionamento de uma unidade da UFRGS, como a Faculdade de Di-reito, são maiores do que se pode imaginar, e, na medida do possível, espero contribuir neste plano. Sinceramente, acho que o Prof. Sérgio Porto está fazendo uma revolução silenciosa na Faculdade, respeitando o passado, mirando o futuro e preparando a instituição para novos e mais am-biciosos horizontes. Sinto-me gratificado de poder, jun-tamente com outros colegas, fazer parte desse processo.

A implementação do REUNI na a Faculdade de Di-reito vem causando polêmica entre os estudantes. Qual sua opinião sobre o projeto? O REUNI precisa ser discutido com a participação de todos os interessa-dos. Sem dúvida, este é um processo intrinsecamente complexo. De todo modo, eu vejo a questão a partir de três premissas: em primeiro lugar, trata-se de uma opor-tunidade ímpar de expansão do ensino público gratuito e, portanto, da Faculdade de Direito, que, em mais de 100 anos de existência, nunca experimentou semelhan-te processo. Em segundo lugar, essa implantação, ob-viamente, tem pré-requisitos e contrapartidas que bem conhecemos. Não se faz REUNI sem meios. Na me-dida em que sejamos providos desses meios, continuo achando a idéia positiva e muito boa para a Faculdade. Por fim, há um terceiro aspecto com o qual não podere-mos transigir: a manutenção da qualidade do ensino. Se tivermos meios e pudermos implantá-lo com qualidade, o REUNI, a meu juízo, é muito benvindo.

Mas e o próximo vestibular? Como está o processo de contratação de novos professores? E quando será fi-nalizada a construção do novo prédio? Essas são ques-tões que deveremos tratar no âmbito da implantação do REUNI. Nesse momento, temos uma sistemática, que ainda precisa ser compreendida em toda extensão, consis-tente nos professores temporários, que precederão vagas de efetivos necessários ao REUNI. Não fosse pelo REU-NI, os Departamentos não seriam contemplados com os temporários e, mais tarde, como se espera, com novos docentes. Com relação à questão da infraestrutura, é um dos elementos da questão, mas o fato é que a Faculdade já enfrentou dificuldades em momentos anteriores com

Uma matéria da última edição de A Toga questionou a lista do ENADE que situava nossa Faculdade como a melhor do país. Como o senhor avalia este resultado? Eu não tenho dúvida sobre a qualidade de nossa instituição. Essa qualidade não é produto de uma causa isolada, mas decorre da conjugação de vários fatores, dentre os quais a qualidade dos alunos e dos docentes. É claro que todos conhecemos muito bem os problemas do dia a dia, as carências da Universidade Pública e da própria Faculdade. Eu acredito que quando A Toga questionou o resultado do ENADE, enfocou aspectos legítimos e pertinentes, mas vale uma reflexão: os problemas identificados não são privilégio de nossa Faculdade! Um passar de olhos pelas mais diversas instituições de ensino, públicas e privadas, nacionais e estrangeiras, mostra que também as melhores, são melhores por força de um conjunto de fatores e que ali há vários defeitos e problemas. A vida é assim mesmo! Portanto, julgo que o resultado do ENADE é legítimo, espelha a qualidade da Faculdade, de seus alunos e docentes, o que não invalida a necessidade de corrigir falhas e suprir carências.

No Brasil atual, as Universidades sofrem com a falta de verbas. Na sua opinião, qual é o papel da Universidade Pública na sociedade, como o senhor pretende estimular atividades como a Extensão? O ensino universitário gratuito está garantido na Constituição Federal e deve ser considerado dogma com o qual não se pode transigir. O papel da educação e, portanto, da Universidade, é incomensurável. Não haverá desenvolvimento econômico sustentável, não haverá superação da pobreza e das desigualdades sociais sem passar pela educação, que é, sim, dever do Estado. Eu diria, portanto, que, garantindo um ensino de excelên-cia e qualidade, a Universidade se insere no amplo contexto de superação das desigualdades sociais. E não nos enganemos: acredito que todos os alunos desta Faculdade sabem valorizar, especialmente num país que ainda tem tanto a construir, o que o Estado lhes está proporcionando: ensino público, gratuito e de qualida-de. E, com toda franqueza, não é pouca coisa. É algo de que podemos, ou melhor, de que até devemos ter grande orgulho. E nesse mesmo contexto eu vejo as atividades de extensão. Elas não apenas permitem uma interação com a sociedade, mas, também, estimulam o espírito crítico de todos os participantes da vida aca-dêmica, ou seja, discentes, docentes e comunidade em geral. Sobre projetos pessoais, antecipo apenas que estou elaborando um curso de extensão, talvez permanente, que denominei de “Os leading cases do processo penal comparado”. O projeto se encontra em fase de elaboração e estará pronto em breve. Infelizmente, as atividades administrativas acabam atrasando projetos pessoais, mas em breve espero poder concluí-lo. E, por óbvio, prosseguirei com minhas tarefas junto ao PPGDir.

de não será mais a mesma. (Pelo menos, não tão quente!)

Nomeado Vice-Diretor há pouco mais de um mês, eis que surge o Professor Danilo Knijnik como uma nova figu-ra para auxiliar no comando da Instituição. Graduado e Mes-tre pela UFRGS, Doutor pela USP, é, desde 2008, Professor Adjunto do Departamento de Ciências Penais. Nesses quase três anos, vem demonstrando muita dedicação acadêmica e respeito aos alunos. Além de ter

suas aulas sempre cheias, ain-da acumulou cargos de Chefe de Departamento, Diretor do SPPP (Estágios) e de Profes-sor do PPGDir. Ao substituir o respeitado Professor Tupi-nambá, o Professor Danilo já demonstra grande disposição para, junto com o Prof. Sérgio Porto, encarar os desafios dessa nova empreitada. Em uma pro-veitosa entrevista, o Professor discorreu sobre algumas ques-tões polêmicas e sobre o futuro da Egrégia.

relação a suas instalações físicas e logrou superá-las. Não creio que agora seja diferente.

Olhando para a Direção da Faculdade, na sua opinião, o que está bem e o que ainda precisa melho-rar? Bem, de saída, os alunos são muito bons! Isso, aliás, é reconhecido pela sociedade como um todo. Também o corpo docente. Não nos esqueçamos: aqui, os professores ascendem por concurso público de provas e títulos. É uma sistemática que qualifica e distingue a Universidade Pública, e isso acaba criando um círculo virtuoso. Ainda, acho que ponto alto de nossa instituição é o seu espírito democrático e colegiado: todos participam, têm voz e voto. E são muitos os servidores dedicados, que prestam um grande serviço, muitos com grande sacrifício pessoal. Mas é fato que sofremos com deficiências orçamentárias, infraestru-turais e com a falta de docentes. É justamente aí, aliás, que volta a questão do REUNI, pois ele pode ser uma oportunidade para suprir a Faculdade com novos quadros, melhor infraestrutura e condições de trabalho.

Diante das atuações do CAAR e dos Representantes Discentes, qual sua opinião sobre a diferença de pesos entre os votos dos docentes, dos discentes e dos funcionários? Eu vejo a representação discente como uma característica vibrante de nossa Faculdade. Na última formatura do direito noturno, de cuja turma tive a felicidade de ser paraninfo, destaquei esse aspecto característico da casa, que é a ampla partici-pação dos discentes em todas as instâncias de decisão. Quando eu digo todas, são todas mesmo: Comissões, Departamentos, Conselhos etc. E digo mais: pela minha experiência, embora possam surgir divergências – e são naturais – a representação discente, de forma geral, exerce o direito de voz e de voto com responsa-bilidade. Acredito que tentamos todos tomar nossas deliberações seguindo a boa razão, o interesse público e o melhor para a Faculdade, e não a partir do peso que tal ou qual representação possa ter. Portanto, o peso da representação de cada categoria é algo perfeitamente passível de revisão, mas desde que deliberemos sob o império do melhor argumento, creio que está garantido um funcionamento democrático da Unidade.

Uma última mensagem aos estudantes... Os cinco anos que passamos aqui representam um momento importante de nossas vidas. Portanto, valorizem esse momento. Guardo na memória os dias em que, como aluno, estive aqui. Confesso que essas lembranças às vezes se confundem com as experiências do presente. Posso estar enganado, mas, no mais das vezes, só percebemos a importância desses anos retrospectivamente, com o passar do tempo. Mas a vida, mais cedo ou mais tarde, nos faz conscientes dessa realidade.

Foto: Bruno Bastos Becker

Page 4: A Tog a - UFRGS · tapete de Porto Alegre às pressas em função da Copa do Mundo, a Vila Chocola-tão, composta principalmen-te por catadores e recicla-dores, tem sua comunidade

A TOGA - Junho de 20114

SOCIEDADE

• THIAGO CALSA NUNESAcadêmico do 5º ano manhã

A vila ChocolatãoA vila localizada no centro

de Porto Alegre, identificada pelo nome de Chocolatão devi-do ao prédio vizinho da Receita Federal, foi extinta no último mês de maio. Por sua grande visibilidade social, sob os olhares dos prédios da Justiça Federal e Tribunal Regional Federal da 4ª Região, a comunidade que foi uma das precursoras na movi-mentação para ocupação popular de áreas urbanas para moradia se tornou alvo para servir de pro-paganda a interesses políticos.

Desde o ano de 2009 atua na vila o Grupo de Assessoria Justiça Popular, integrante do Serviço de Assessoria Jurídi-ca Universitária da UFRGS, buscando através da educação popular articular soluções para a vida dos moradores, habitando o lugar em precárias condições, servindo de testemunho da luta do povo do Chocolatão. Contudo, uma outra articulação do poder público capitaneada pela Prefeitura de Porto Alegre também atuou de forma a evitar qualquer realização para a vila que não tivesse seu objetivo traçado: Remover a comunidade e fazê-la um exemplo para outras remoções. Desta forma, como se poderá ver, a preocupação com os moradores em si sempre foi secundária.

A situação da vila

A Vila Chocolatão é composta em grande maioria por catadores e recicladores de materiais descartados, os quais são coletados nas ruas do centro da cidade. No entanto, o projeto da Prefeitura indicava uma nova

Nova paisagem: a reforma urbana incentivada pela Copa do Mundo prevê a remoção de diversas comunidades, afastando-as dos olhares das áreas nobres da capital

Foto

: GA

JUP

Moradoras e moradores em espera para eleição de associação de catadores

área para a comunidade, que se daria no endereço Avenida Protásio Alves, 9.990, a mais de 10 quilômetros desta área central, o que de início cabe-ria a pergunta: Sendo esta a principal fonte de renda dos moradores, eles não ficariam privados desta atividade na área destinada para a realoca-ção? A resposta é sim, e nisto reside a base de vários dos problemas da comunidade.

No seu trabalho, o GAJUP identificou três fo-cos principais de atuação necessários à comunida-de: (1) Moradia, dadas as condições precárias que se encontravam as casas das

mais de 240 famílias da vila; (2) Geração de renda, visto que se poderiam pensar outros modos de organização que otimizassem a re-ciclagem de lixo e outras formas de renda; e (3) Representatividade, visto que havia uma premente necessidade de reorganizar uma as-sociação de moradores e organizações que pu-dessem dar voz ao conjunto dos moradores.

Desta forma, foram organizadas assem-bléias e eleições para estruturação de uma associação de catadores e uma associação de moradores, além de debater a questão da moradia entendendo-se a outros fatores que não fossem só relativos a ter uma casa, mas aspectos como acesso à saúde e à educação. Esta estrutura da comunidade era algo ne-cessário que independia de qual a sua loca-lização geográfica, se no centro ou em outra região. Contudo, no projeto de realocação da prefeitura, se configuraram em questões se-cundárias. O mais urgente, seguindo o padrão das obras na cidade para a Copa do Mundo, era remover a comunidade, fosse como fos-se. Se atendesse os direitos humanos, melhor.

Page 5: A Tog a - UFRGS · tapete de Porto Alegre às pressas em função da Copa do Mundo, a Vila Chocola-tão, composta principalmen-te por catadores e recicla-dores, tem sua comunidade

A TOGA - Junho de 2011 5

e o exemplo negativoRemoção da comunidade

Como previsto, a remoção se tornou em uma vedete da Prefeitura, rendendo co-merciais na televisão e propaganda ostensiva em jornais como Zero Hora e Diário Gaú-cho (o site ClicRBS desponibilizou aos seus usuários um recurso tecnológico de gosto duvidoso, onde se poderia acompanhar com música clássica a destruição das casas), manipulando fatos e intentando fazer uso político dos acontecimentos. O “Residencial Nova Chocolatão” se mostra assim um so-nho para os moradores que agora possuem uma casa em condições muito melhores que na velha Chocolatão, servindo de modelo e exemplo para outras remoções. Consome--se, assim, a chamada “higienização” urbana das áreas centrais. O pobre destina-se a trabalhar com o lixo nas periferias da cidade.

Apesar das profecias, pouco ilógicas, de que ao final do subsídio de cestas básicas

Acato, aceitoArmas não é precisoPara fazer entenderA Lei, a Ordem, o Progresso

O trator vem e desmontaTentativas de lembrança, possibilidades de família, o nome dos vizinhosDestróiTimes de futebol com goleiro e zaga, discos de vinil e outrosDestroçaFitas-cassete gravadas de momentos, brinquedos de criança mantidos pelo tempo em gerações

Transforma a escavadeiraUma manhã de sábado em noite de quarta ou terçaNa guerra - barulhos de destruiçãoAlternando-se a sussurrosSilêncios que sucedem profundas destruiçõesE somente. Sem nada. Sem ninguém.

Rompem-se os fios elétricos de luzE estouram todos os encanamentosSedimentos dessa ordem antigaA inundar e formar um novo rio

Viajo por este marDe restos da renovação industrialVendendo produtos fósseis de sentimentosFragmentados, partes incompletasO que sobrouCanções de marinheiros em naufrágio

Destruição de uma comunidade• THIAGO CALSA NUNESAcadêmico do 5º ano manhã

Para denunciar estes aspectos não contemplados pelo projeto de realocação da Prefeitura, no final do ano passado o GAJUP contri-buiu para a elaboração de um laudo técnico assinado pela Associação Brasileira de Geógrafos (AGB), que apontava três eixos principais de críticas ao projeto: (1) A realo-cação não contemplava a todas as famílias, de modo que só havia 181 casas para as 240 famílias da comu-nidade; (2) A realocação previa um projeto insuficiente para geração de renda, com a construção de um galpão de reciclagem com lixo a ser

entregue pelo DMLU, que não atenderia a maior parte dos moradores (sendo esta a única possibilidade de trabalho na nova área sem depender de transporte); e (3) a realocação retirava os moradores do cen-tro para residirem em uma área onde não se tem acesso suficiente aos serviços públi-cos, como escolas e postos de saúde, o que havia no centro e atendia a comunidade.

Mesmo com a intervenção do Ministé-rio Público Federal e a tentativa de aplacar estas críticas, a realidade é que havia urgên-cia para o poder público em remover a vila, aproveitando a sua ainda precária organiza-ção comunitária que poderia lhe dar voz efe-tiva no processo. Seduzindo lideranças com vantagens específicas, em maio se iniciou a destruição das casas, transferindo os mo-radores para a nova área, onde receberiam por três meses o auxílio de cestas básicas.

oferecido às famílias nos três primei-ros meses haverá uma série de proble-mas na nova comunidade, a verdade é que estes problemas – conforme previsto pelo laudo técnico da AGB – já acontecem. Há desemprego, visto que as pessoas não conseguem manter a atividade de catador, tam-pouco desempenhar outra função. Faltam escolas e creches, sendo que crianças estão sem aulas. Há “espe-culação imobiliária” sendo que as novas casas populares são vendidas e negociadas entre os moradores, que buscam retornar às áreas centrais. Famílias antes residentes na Chocola-tão, porém “excedentes” no projeto da prefeitura, agora são encontradas em ruas do Centro e da Cidade Baixa, sem nenhuma moradia e lutando pela

A mídia e o Residencial Nova Chocolatão

sobrevivência. Em resumo, os problemas

sociais persistem e as críticas previs-tas ao projeto, embora praticamente ignorados pela prefeitura, se conso-mem e tendem a piorar a situação social – a despeito do que se assiste em propagandas do horário nobre da televisão gaúcha.

Por que então a necessidade urgente de realocação e tão pouco esforço para garantir uma vida digna onde moravam? É preciso estar longe do centro para que se façam medidas sociais, para impedir que pessoas po-bres saiam da periferia? Entre vários motivos que poderiam ser apontados pelos responsáveis da realocação da comunidade, depois de expostos alguns, podemos nos atrever a dizer

que um motivo forte é de que a Vila Chocolatão, onde estava localizada, tinha uma caracte-rística marcante: Sendo pobre, era feia.

Para os olhares dos funcionários públicos dos modernos prédios da justiça ao redor, a vista das casas pobres das famílias do Chocolatão era algo insuperável, que deveria ser afastado deste centro de decisões jurídicas. O jornal A Toga, sendo produzido pelos es-tudantes de Direito da UFRGS, traz, portanto, a reflexão: Antes de querermos mudar o que nos aparece frente aos olhos, será que não é necessário que tente-mos modificar o nosso olhar?

Mais, ô mon couer, entends le chant des matelot!Stephan Mallarmé

Foto

: GA

JUP

O trabalho de coleta e reciclagem de lixo é a principal fonte de renda da Vila Chocolatão

Page 6: A Tog a - UFRGS · tapete de Porto Alegre às pressas em função da Copa do Mundo, a Vila Chocola-tão, composta principalmen-te por catadores e recicla-dores, tem sua comunidade

A TOGA - Junho de 20116

REUNIREUNIão

• MARIANA MEDEIROS LENZAcadêmica do 2º ano manhã

A Toga inaugura nesta edição de junho o espaço REUNIão, para falar de um assunto que desde 2007 bate na porta da Facul-dade de Direito da UFRGS: o REUNI. A porta está em vésperas de ser aberta e dar passe livre a diversas transformações na Facul-dade e no dia a dia dos estudantes. Com isso em vista, o jornal se propõe a destinar suas páginas, a começar por esta, para a discussão dos problemas e das possíveis soluções que enfrenta-remos – ao que tudo indica – nos próximos anos.

Nesse primeiro REUNIão, construiu-se um panorama de

todos os capítulos da elaboração do projeto, capítulos de uma novela que começou a se desenrolar quando a maioria de nós ainda pensava na escolha do curso no vestibular. Esses capítulos nos fazem entender como chegamos até aqui e pensar o que vem pela frente. Prepare-se: a viagem é longa.

Criação do Programa em contextoA história do REUNI co-

meçou antes mesmo de ele ser criado pelo Decreto 6.096. Seis anos antes, em 2001, foi aprovado o Plano Nacional da Educação (PNE – Lei nº 10.172/2001), que, norteado pelos objetivos gerais de elevar o nível de escolaridade da popu-lação, melhorar a qualidade da educação e reduzir as desigual-dades sociais relativas ao acesso e à permanência em institui-ções de ensino, estabeleceu 295 metas a serem atingidas em 10 anos, prazo que se esgotou no final do ano passado. Atualmen-te, aguarda aprovação o projeto de lei que estabele o PNE para os próximos 10 anos (2011-2020) e que repete algumas me-tas não alcançadas pelo plano anterior no período proposto.

Uma delas é aumentar a oferta de educação superior para incluir pelo menos 33% dos brasileiros entre 18 e 24 anos. Constatou-se que o Brasil apresenta um dos índices mais baixos de acesso à universidade (tanto pública quanto privada): menos de 12% da população de 18 a 24 anos estava matriculada em 2001 na educação superior – número distante de outros países da América Latina, como Venezuela (26%), Chile (20,6%) e Bolívia (20,6%). Paralelamen-te, a taxa de conclusão média

dos cursos superiores também é insatisfató-ria, alcançando cerca de 60%, o que significa que, dentre os aproximadamente 12% dos jo-vens que acessam a universidade, pouco mais da metade sai de lá com um diploma na mão.

Na tentativa de mudar esse quadro e alcançar as outras diversas metas propostas pelo PNE, foi elaborado o Plano de De-senvolvimento da Educação (PDE), que engloba diversas ações voltadas à educação básica, superior e profissional e tecnoló-gica, entre elas, o REUNI, o Programa de Apoio a Planos de Reestru-turação e Expansão das Univer-sidades Federais, criado em 2007.

O fim imediato do REUNI é ambicioso: aumentar as vagas de ingresso nas univer-sidades federais, especialmente no perío-do noturno, e reduzir a evasão, elevando a taxa de conclusão média dos cursos para 90% (índice só exibido atualmente pelo Japão) e a relação de alunos por professor para 18.

A partir dessas diretrizes, ficou a cargo de cada universidade a decisão de aderir ou não ao programa e, em caso positivo, elabo-rar seu próprio plano de expansão, que tem um prazo de cinco anos após o seu início para ser implementado. Esse plano “indivi-dual” da instituição determina, por exemplo, quantas vagas serão oferecidas a mais e em quais cursos, quantos professores será preci-so contratar e se haverá necessidade de in-vestir em infraestrutura. Às instituições par-ticipantes, o Ministério da Educação (MEC) destina, então, recursos financeiros referen-tes à expansão, observando que o acréscimo de verba não pode ultrapassar 20%, nos cin-co anos da reestruturação, das despesas or-çamentárias já previstas para a universidade.

• ALEXANDRE CHWARTZMANNAcadêmico do 2º ano manhã

Imagem:

Proposta de adesão da UFRGS Seis meses depois de o programa ser institutído pelo governo federal,

a UFRGS decidiu aderir ao REUNI, em votação no Conselho Universitário (CONSUN) ocorrida em outubro de 2007 que contou com manifestações, do lado de fora da reitoria, de estudantes contra e a favor à proposta. Entre as críticas, estava principalmente a falta de diálogo com a comunidade acadê-mica na construção do projeto enviado ao MEC, além da preocupação com a manutenção da qualidade do ensino.

1.446 novas vagas nos cursos de graduação presenciais (aumen-to de 33%), por meio da criação de novos cursos e da ampliação de cursos existentes.

Recursos de R$ 223 milhões, distribuídos nos cinco anos de imple-mentação (2008-2012), para custeio e investimento em equipamen-tos, material permanente e obras.

Manutenção da relação alunos/professor acima de 18/1 (a relação da UFRGS já era de 19,18, ou seja, superior à meta fixada pelo REUNI).

Aumento da taxa média de conclusão de curso de 65% para 80%.

410 novos professores (aumento de 19,6%), maioria em regime de dedicação exclusiva e com doutorado.

360 novos técnicos-administrativos (aumento de 15%).

R$

Metas da Universidade (2008-2012):

Contrapartida solicitada ao MEC:

Page 7: A Tog a - UFRGS · tapete de Porto Alegre às pressas em função da Copa do Mundo, a Vila Chocola-tão, composta principalmen-te por catadores e recicla-dores, tem sua comunidade

A TOGA - Junho de 2011 7

REUNIão

Na

Facu

ldad

e de

Dir

eito

...

O assunto “REUNI” foi do go-verno federal à UFRGS, e da UFR-GS às suas unidades, aterrisando pela primeira vez na Faculdade de Direito em reunião do Conselho da Unida-de (CONSUNI), agosto de 2007. Na ocasião, formou-se uma comissão para elaborar o projeto de amplia-ção das vagas no curso de Ciências Jurídicas e Sociais. A comissão con-cluiu que, para contemplar os ob-jetivos estabelecidos pelo REUNI, deveria haver duplicação das vagas do período diurno e triplicação das vagas do noturno, realizada com a mudança do curso de anual para se-mestral (duas entradas de aprovados no vestibular por ano). Consideran-

do a meta nacional de manter a proporção de 1 professor para 18 alunos, chegou-se ao cálculo da ne-cessidade de 11 professores novos. Mas houve (e há) controvérsia...

O CAAR, à época, realizou As-sembleia Geral sobre o assunto, e os estudantes definiram seu posiciona-mento a favor da implementação do REUNI na Faculdade de Direi-to, mas com ressalvas. Entre elas, o acréscimo de 30 professores, e não somente 11. No entanto, mesmo que emenda tenha sido aprovada na reunião do CONSUNI seguinte, não foi incorporada ao projeto encami-nhado à reitoria. E ficamos com 11.

A outra necessidade imedia-

Então, qual é o plano?

O começo da implantação do REUNI na Faculdade de Direito era esperado para 2009.

2012

No início de 2011, novos acontecimentos fizeram balançar a previsão de implantação do REUNI no ano que vem. O corte de R$ 50 bilhões no orçamento do governo federal teve participação de R$ 1 bilhão do orçamento do Ministério da Educação, que caiu dos R$ 72,8 bilhões pre-vistos para R$ 71,8 bilhões.

A partir desse anúncio, a estimativa era de que as uni-versidade federais perdessem até 10% da verba de custeio, como afirmado pelo secretário de Educação Superior do MEC, Luiz Cláudio Costa, em reunião na Andifes (Asso-ciação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Nível Superior). Porém, o medo que o corte tenha impacto no financiamento do REUNI é afastado pela diretora do Departamento de Cursos e Projetos Acadêmicos (DCPA) da UFRGS, Denise Dornelles, que coordena a expansão:

– “Apenas rubricas do orçamento das universidades, como passagens e diárias, foram afetadas. Os recursos do REUNI já estão aprovados desde 2007”.

ta, além dos professores, para o aumento de vagas, é a infraestru-tura. O prédio do Direito, como bem sabemos, não comporta muito mais alunos do que os que já o frequentam, nem pode pas-sar por reformas estruturais, pelo fato de ser tombado pelo patri-mônio nacional. Para passar, por-tanto, por esse obstáculo, o plano de expansão do Direito requer 25 salas de aula, além de auditório e salas multimídia, dentro no pré-dio novo que deve ser constru-ído ao lado do atual (ver abaixo), e que será dividido com outros cursos. No projeto desse prédio não há, por exemplo, biblioteca.

1º semestre70 vagas - Direito Diurno70 vagas - Direito Noturno

2º semestre70 vagas - Direito Diurno70 vagas - Direito Noturno

2013 Número de turmas ingressantes por ano(com 70 alunos cada):

201120122013

1º semestre70 vagas - Direito Diurno70 vagas - Direito Noturno

2º semestre70 vagas - Direito Diurno140 vagas - Direito Noturno (atualmente)

1º semestre 2º semestre

Depois, 2010. Agora, a data prevista é 2012.

Percalços no começo do ano levantam novas dúvidas

Expansão deve ocorrer com professores temporários

O governo encaminhou em 2011 que as vagas docentes ainda necessárias para o REUNI sejam ocupadas, até segunda ordem, por professores temporários. A justifi-cativa é que as primeiras vagas do programa para professores perma-nentes, aprovadas em 2007 e 2008, já foram utilizadas, e os Ministérios da Educação e do Planejamento ainda não se acertaram para enviar projeto de lei ao congresso pedindo a criação de mais cargos docentes efetivos, processo que deve demo-rar, pois depende de todos os trâmi-tes no legislativo. Segundo o MEC, a espera pelos efetivos prejudicaria instituições com expansão em an-damento, situação que exigiu uma opção emergencial.

– “A contratação de professo-res substitutos não se trata de me-dida paliativa, mas sim de uma so-lução para os futuros processos de expansão que poderão transcorrer respeitando o calendário acadêmi-co, enquanto se aguarda a tramita-ção de Projeto de Lei de criação de cargos para dar sustentabilidade aos Programas”, informou o secretário de Educação Superior do MEC, Luiz Cláudio Costa.

Assim, no dia 14 de junho des-te ano, foi aprovada no Senado a Medida Provisória nº 525, proposta

pelo governo, que modifica a Lei 8.745 para autorizar a contratação de profes-sores temporários pelas universidades em expansão – ou seja, um caso espe-cífico para o REUNI. A MP 525 tam-bém aumenta o percentual permitido de professores substitutos de 10% para 20% do número de professores efeti-vos da instituição.

O contrato de docente temporário é parecido com o do substituto: dura 1 ano, prorrogável para 2. As diferenças: o substituto entra no lugar de um pro-fessor efetivo, em razão de vacância, afastamento ou licença; o temporário é contratado em uma vaga à parte, adi-cional. Ainda, os professores tempo-rários são pagos pela própria universi-dade, e não diretamente pelo governo federal, como explicou a PROGRAD (Pró-Reitoria de Graduação).

No Senado, a oposição fez críti-cas a essa medida do MEC. Uma delas atenta para o fato de que, para a con-tratação de professores temporários e substitutos, não se exige concurso pú-blico, bastando o processo seletivo sim-plificado. Também se questiona quais consequências a ampliação do número de professores temporários traria para as outras bases do tripé acadêmico, uma vez que o tempo limite de dois anos na universidade dificulta o desen-volvimento pelo docente de um grupo de pesquisa ou de extensão.

Obra do prédio novo atrasa com embargoParalelamente à discussão

sobre os professores, a infraestru-tura também enfrenta empecilhos. Conforme informações da Prefei-tura da UFRGS no Campus Cen-tro, a construção do novo prédio ao lado da Faculdade de Direito está parada desde maio devido a embargo. Contatada pelo jornal A Toga, a construtora MTK, respon-sável pela obra, diz que o problema está praticamente resolvido e que aguarda manifestação do Ministério do Trabalho. Por enquanto, não há previsão exata de retorno das obras e, portanto, de término do prédio, que seria utilizado pelo Direito a partir do segundo semestre do ano

que vem, pelas turmas ingressantes em 2012/2.

O problema das obras atinge diversas outras unidades da UFRGS. No Campus do Vale, por exemplo, o novo prédio que atenderá aos cursos de Engenharia ainda é só tapume e poeira, devido a problemas com licenciamento ambiental. Denise Dornelles, diretora do Departamen-to de Cursos e Projetos Acadêmicos (DCPA), relata que o problema da construção e ampliação dos prédios não são os recursos, que já estão com a Universidade desde 2007. Ela aponta a burocracia e as exigências da Prefeitura de Porto Alegre como responsáveis pelo atraso.

Foto

: Mar

iana

Med

eiro

s Len

z

Em Conse-lho Geral de

Representantes (CGR) em abril deste ano, os RDs da Facul-dade de Direi-to decidiram posicionar-se contra a implantação

do REUNI com professores temporários.

Esse também é o entendimento adotado pelo CAAR, após reunião de

gestão.

Page 8: A Tog a - UFRGS · tapete de Porto Alegre às pressas em função da Copa do Mundo, a Vila Chocola-tão, composta principalmen-te por catadores e recicla-dores, tem sua comunidade

A TOGA - Junho de 20118

EVENTOS ACADÊMICOS

Mari Lenz me pediu para contarEm tom de prosaMeus momentos com o GilmarEnquanto ele esteve nesta cidade maravilhosa

Mas estou sem inspiraçãoOlhando pela janela os passari-nhosE como pra mulher bonita não se diz nãoResolvi fazer estes versinhos

Na sala VIP do aeroportoO Prof. Saldanha comentavaSobre certos resultados do des-portoO qual o Pelé jogava

Neste momento irrompe na salaO Ministro Gilmar MendesAo telefone ele falavaCom sua esposa, Sra. Mendes

Extremamente apaixonadoSe despediu da sua cônjugeExtremamente emocionadoChamou o Prof. Saldanha de longe

-Cezinho, como você está?-Estou bem e você?-Tanta coisa pra falar!-Tanto tempo sem se ver!

Mais tarde na jantaMuita seriedade no começoMas depois da primeira FantaTivemos aprendizados que não têm preço

O nível da discussão era inacredi-távelEra tão linda quanto uma flor de lisApenas era comparávelÀ beleza da Elis

Da constituição alemãAo nobre esporte bretãoConversou-se como se não hou-vesse amanhãAo sabor de um costelão

Mas havia amanhãE ele começava cedo!Às 7 horas da manhãAcordei sem medo

Fui ao hotel do GilmarEle estava muito contente

Por duas grandes amigas encontrarQue tomaram café com a gente

Não teve nada de sinistroPelo contrário, foi sensacionalA oportunidade de perguntar para o ministroSe ele preferia leite desnatado ou integral

Fui com ele de escoltaCom vários segurançasDeram poucas voltasNas nossas andanças

Olhem só que coisa louca!Ofereci a ele um Halls muito po-tenteO ministro botou quatro na bocaE parecia muito contente

Na hora da palestra, entretanto,No momento de falarO Halls preto mostrou o seu en-cantoE água o ministro não parava de tomar

Falou espetacularmenteNão foi nada tacanhaQuem também foi efervescenteForam os Profs. Humberto e Salda-nha

Em relação ao Humberto,Quero fazer um apelo, aliás,Vindo dele um show é certoPortanto, no te vás!

Ao se despedir do GilmarUma agradável coincidênciaEstava chegando o Paulo BrossardCom toda sua inteligência

Vou fazer o registroEle conversou com o GilmarEx-ministro com ministroQue papo espetacular!

Gilmar Mendes se despediuDo eterno professor da casaEntrou no carro e sumiuCaso contrário ele se atrasa

Sem querer encher linguiçaO Prof. Humberto falou uma verda-de de destaque:“No jogo da justiça,O Ministro Gilmar é um craque.”

Só para matarA curiosidade que posso ter dei-xadoO favorito do Ministro GilmarÉ o leite desnatado.

Versinhos indecorosos

No último mês de maio, nossa faculdade justificou o polêmico título do MEC de “Melhor Direito do Brasil”, pelo menos no que diz respeito a eventos acadêmicos. Apoiados ou organizados inteiramente pelo CAAR, os eventos, além de contarem com nomes de destaque nacional e internacional, foram excelentes oportunidades para se ampliarem os horizontes internos do Castelinho, destacando, assim, âm-bitos do estudo jurídico que necessitam de uma melhor abordagem na Faculdade.

Maio de Eventos• RAFAEL XAVIER - “TAGA”Acadêmico do 3º ano manhã

Nos dias dia 05 e 06, o evento “Temas Atuais de Direito Societário” contou com os melhores professores de Direito Empresa-rial do Brasil, como o Prof. Dr. José Alexandre Tavares Guerreiro (USP) e o Prof. Dr. Calixto Salomão Filho (USP), juntamente com o novo Chefe do DIR02, Prof. Dr. Carlos Klein Zani-ni. O grande destaque da ocasião, porém, foi o Prof. Dr. Henry Hansmann, Professor da Yale Law School, que realizou uma excelente pales-tra envolvendo Law and Economics. O evento foi um espetacular estímulo ao estudo e ao de-senvolvimento de atividades ligadas ao direito societário.

Dia 06, à noite, ocorreu a Aula Magna da Faculdade, com o ex-aluno da Casa, Mi-nistro Paulo de Tarso Sanseverino. O Ministro abordou brilhantemente o tema “Dano Moral na Jurisprudência do STJ”. Trouxe um método absolutamente interessante para o estabeleci-mento do quantum indenizatório nos casos de danos extrapatrimoniais, fazendo analogias com o método de aplicação da pena; implementan-do, assim, um diálogo entre áreas que parecem, a priori, distantes e contribuindo, desta forma, com uma poderosa ferramenta para os julgados.

Entre os dias 17 a 19, a II Jornada de Responsabilidade Civil trouxe uma sema-na de profícuas discussões no âmbito jurídico que está, cada vez mais, centralizando o debate no Direito Privado. Pudemos contar com ex-celentes exposições, não só de professores lo-cais, como a Profa. Me. Joséli Fiorin Gomes e o Prof. Dr. Eugênio Facchini Neto, como também com professores de destaque nacional, como o Prof. Dr. Anderson Schreiber (UERJ) e o Prof. Cristiano Zanetti (USP). No final do evento, o CAAR prestou uma homenagem sur-presa à Professora-organizadora, Vera Maria Jacob de Fradera, pelo período em que figurou como Chefe de Departamento do DIR02.

Fomos brindados, enfim, com um eletri-zante debate: a “Aula Inaugural do CAAR”, ocorrida dia 21, teve como título “Limites e Possibilidades da Atuação do Poder Judiciário no Estado Democrático de Direito”. A aula tratou-se de uma ótima explanação do ex-pre-sidente do STF, Ministro Gilmar Mendes sobre o papel do Judiciário em hipóteses de omissões Constitucionais, na qual citou decisões emble-

máticas do Supremo. O Professor da casa, Dr. Humberto Ávila, fez feno-menal exposição crítica sobre ativis-mo judicial como uma “espécie de exercício desrespeitoso de um poder relativamente à função típica de-sempenhada por outro poder”. Por fim, outro professor da Casa, Prof. Dr. Cezar Saldanha de Souza Júnior trouxe uma proposta de união dos poderes de administração e juris-dição em uma mesma Instituição, colocando como exemplo elucida-tivo de sucesso a história da Justiça Eleitoral. O debate organizado pelo CAAR, foi, sem dúvidas, uma das melhores experiências nos últimos anos no âmbito do Direito Público na Faculdade.

O segundo semestre tem ótimas perspectivas: a terceira edição do “Criminologia Cultural e Rock!”, as já tradicionais “Jornadas de Proces-so Civil”, as inovadoras “Jornadas de Direito Penal”, e um evento sobre a “Parte Geral do Direito Civil”, que prometem movimentar a Egrégia.

Estes grandes eventos, que po-dem ser caracterizados como ativi-dades de extensão, servem, ademais, tanto como suporte ao ensino – que se mostra defasado em nossa Insti-tuição, à medida que a própria ava-liação do MEC que colocou a Casa como melhor faculdade de Direito do Brasil apontou que se mostra, ao mesmo tempo, uma das piores no que diz respeito ao critério “di-dático-pedagógico”, avaliado pelos alunos (veja edição de abril de A Toga) – quanto como incrível estímulo à pesquisa.

Atendendo ao tripé acadêmico, assim, tais eventos erigem a Facul-dade a um importantíssimo posto--centro de discussão – certamente a referência que muitos dos servi-dores, professores e, a maioria dos alunos, principalmente, espera que nosso Castelinho efetivamente seja.

Foto

: Mar

iana

Med

eiro

s Len

zAula Inaugural teve a presença do Ministro Gilmar Mendes

Eduardo Halperin, responsá-vel pelos contatos que trouxeram Gilmar Mendes à Faculdade, fez as “honras da Casa” enquanto o Ministro estava aqui e conta como foi, de maneira, digamos, não convencional...

• EDUARDO KOWARICK HALPERINAcadêmico do 2º ano manhã

Page 9: A Tog a - UFRGS · tapete de Porto Alegre às pressas em função da Copa do Mundo, a Vila Chocola-tão, composta principalmen-te por catadores e recicla-dores, tem sua comunidade

A TOGA - Junho de 2011 9

DIREITO

O conteúdo do Direito é essencialmente ético. Cria-se a regra, como uma forma de instrução ética, que, com a previsão de san-ção, vira norma. Quando institucionalizada pelo Estado, chama-se de Lei. Entende-se ética aqui, como o conjunto de valores-condições necessários e desejáveis para a convivência e o bem-estar dos indiví-duos e do coletivo.

Em primeiro momento, a ética de cada povo e cultura parece muito distintas e inconciliáveis. Porém, elas tendem a se assemelha-rem entre si, quando assumem uma forma racionalizada e doutrina-da, com consistência lógica e filosófica, afastando-se dos desvios do ocultismo ou dos costumes. Por isso, não é de se estranhar que con-cepções como liberdade,igualdade e solidariedade sejam tão comuns no mundo inteiro, teoricamente falando.

Adotar um sistema normativo, somente com base na sua ori-gem, fonte e legitimidade, não é suficientemente seguro. Os regimes nazi-fascistas foram perfeitamente legitimados pelas maiorias e pelo Estado. É preciso construir o Direito tendo um conteúdo referencial mínimo e universalizável.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 foi uma tentativa de universalização ética. Apesar de a proposta ter sido bas-tante pretensiosa, ela foi acima de tudo muito nobre. Não teve ne-nhum voto contra, e é o documento traduzido no maior numero de línguas. Porém, por ser uma declaração e não um tratado, tem a gran-de dificuldade de não ter grande eficácia legal. Entretanto, os Tribu-nais Penais Internacionais são os que mais o valorizam como norma.

A grande infelicidade da carta foi o contexto do seu surgimento: guerra fria. Os países capitalistas centrais não puderam garantir suas exigências. Vio-lações e intervencionismos, principalmente sobre países periféricos (3º mundo), foram comuns du-rante todo esse período, seja em conflitos armados (Vietnã) ou com a instituição de regimes ditatoriais (Chile).

Os socialistas também não foram tão bem su-cedidos, principalmente, quanto a violações da liber-dade individual. Mas, é preciso admitir, que cumpri-ram melhor as exigências de mínimo existencial e igualdade entre seus cidadãos, apesar de não terem os níveis de bem-estar econômico das classes mé-dias dos países capitalistas. Na declaração há uma predominância de direitos relativos à liberdade indi-vidual, por isso, talvez, a desconfiança dos votos de abstenções pelos países soviéticos, na Assembléia de 1948.

Acabada a guerra fria, havia uma grande expec-tativa sobre a implementação efetiva dos Direitos Humanos, porém, uma nova concepção político--econômica veio a frustrar tais esperanças: o neoli-beralismo. Aumentou a miséria no mundo e as desi-gualdades sociais tornaram-se ainda maiores. Surgiu

a “guerra contra drogas” que viola os direitos humanos até hoje. A concepção de ser huma-no se reduziu a cálculos atuarias e utilitaristas submetidas às demandas do mercado.

Além de tudo isso, o Direito ganhou um contorno positivista, formalista e imperativo, afastando-se de seu conteúdo, interpretado sob um viés legalista e privatístico, tendo argumentações freqüentes como: “reserva do possível”, “autonomia da vontade”, “li-berdade contratual”, “direitos sociais como normas programáticas”, etc. O neoconstitu-cionalismo surgiu como contraponto a essa concepção, renovando a interpretação legal e processual.

Os Direitos humanos são a segurança deôntica do direito internacional e é referen-cial principiológico de direito constitucional de muitas nações (inclusive o nosso). É o parâmetro valorativo para qualquer pretensa norma jurídica. Além disso, servem de ban-deira política de luta por direitos em todos os cantos do mundo. É o melhor de Direito que temos hoje, justamente por ser fundamental-mente humano.

O Direito é humano• FRANCO ERGANGAcadêmico do 3º ano noite

Doutora pela UFRGS e pela Universidade de Yale. Este é o título que a ex-aluna de Gradua-ção, atualmente Professora da Fundação Getúlio Vargas em São Paulo, Mariana Pargendler obteve no dia 06 de maio em defesa de tese no Salão Nobre da Faculdade.

A Profa. Mariana Pargendler, desde a épo-ca da Graduação já se sobressaía: cumulou dois destaques em Salões de Iniciação Científica da

Qual foi a sensação de voltar a falar em casa na defesa da tese no dia 06 de Maio? Senti uma grande emoção e uma enorme responsabilidade com essa Egrégia Faculdade que tanto contribuiu para a minha formação acadêmica e pessoal. A última e única vez em que eu havia tido a oportu-nidade de falar no Salão Nobre antes foi por ocasião da defesa de minha monografia de láurea no fim de 2004. O retorno à casa para a defesa de tese de Doutorado trouxe à tona boas memórias dos tempos de graduação e todo o carinho, admiração e gratidão que tenho por essa instituição.

Como surgiu a ideia da elaboração do trabalho em co-tutela UFRGS & Yale? A ideia surgiu de uma conversa com a professora Judith Martins--Costa, minha orientadora em iniciação científica durante a graduação e mentora desde então. Após ouvir a descrição de meu projeto de tese de Doutorado em Yale, que trata da história das sociedades anônimas no Bra-sil, a professora Judith sugeriu que eu considerasse a viabilidade de uma co-tutela com a UFRGS, que tem já uma sólida tradição em colaborações com universidades internacionais. Como havíamos imaginado, essa coo-peração entre Yale e UFRGS, instituições inseridas em diferentes culturas jurídicas e tradições acadêmicas, foi extremamente valiosa para o trabalho.

Como foi o período de adaptação nos EUA? O primeiro desafio quanto à adaptação se deu por ocasião do semestre em que estudei na Universidade do Texas em Austin, como parte de um convênio com a UFRGS finan-ciado pela CAPES, quando eu ainda cursava a graduação. Então, quando cheguei a Yale para o LL.M., eu já havia passado pelo período inicial de compreensão do sistema jurídico norte-americano e dos métodos de en-sino lá utilizados.

Quais as principais diferenças entre o sistema de ensino jurídico e, principalmente, entre os alunos de Yale e os da UFRGS? Diferente-mente do Brasil e da maioria dos outros países no mundo, o curso de Direito nos Estados Unidos é sempre pós-graduação. Isso significa que os

alunos chegam ao curso um pouco mais velhos e já carregam consigo uma formação sólida em outras áreas do conhecimento, tais como economia, filosofia e ciência política. Em razão disso, a interdisciplinaridade no ensino e na pesquisa em Direito é muito mais marcante nos Estados Unidos. Há também a diferença de que lá os alunos se dedicam integralmente aos estudos du-rante o curso, já que apenas nas férias podem realizar estágios, o que inevitavelmente aumenta o nível de exigência e a qualidade dos debates. Porém, os alunos da UFRGS são muito capazes, sérios e empreendedores e, assim, acabam por se destacar nas melhores instituições de ensino do mundo.

Quais foram/são seus maiores incentivos acadêmicos? O meu maior incentivo sempre foi o amor pelos livros e o prazer da descoberta e da formulação do conhecimento inerente à pes-quisa científica. A par disso, um jovem professor de Direito no Brasil de hoje tem diante de si o grande desafio e responsabilidade de contribuir para o aperfeiçoamento de nossas instituições jurídicas e acadêmicas, que são fundamentais para que o país obtenha o grau de desenvolvimento econômico e social almejado e consolide o seu papel crescente na ordem internacional. Isso se dá tanto pela ênfase na pesquisa jurídica de qualidade – que deixe de apenas repetir o que já foi dito aqui ou alhures e passe a formular soluções originais para a nossa realidade – como pela adequação dos métodos e do conteúdo do ensino às necessidades do mercado e da sociedade no século XXI.

O que você recomenda aos atuais estudantes de graduação para seguirem uma trajetória de sucesso? É importante ter em mente que a trajetória profissional de fato se inicia já nos bancos da Faculdade. Eu recomendaria aos atuais estudantes que tirem o máximo proveito do privilégio de ser aluno da UFRGS, estudando muito e aproveitando as excelentes oportunidades ao seu redor. A UFRGS conta com ótimos professores e com um ambiente de iniciação cientí-fica diferenciado. Eu também sugeriria o estudo de línguas estrangeiras e de outras disciplinas, como economia. O mais importante, porém, é buscar fazer o que se gosta e se dedicar a isso com afinco. Somos privilegiados nesse sentido, pois o Direito é um campo fascinante.

Certamente gostaríamos de ter a oportunidade de ter você como professora na Faculdade. Você pensa em voltar para lecionar na UFRGS? Seria sem dúvida uma grande honra. Quem sabe um dia...

ENTREVISTAComeço e volta à UFRGS• RAFAEL XAVIER - “TAGA”Acadêmico do 3º ano manhã

Foto

: Arq

uivo

pes

soal

Universidade (2002 e 2004); recebeu o prêmio “Jovem Pesqui-sador” (2002) também pela UFRGS; enquanto em intercâmbio à Universidade do Texas (2004), recebeu o “Dean’s Achieve-ment Award”; e finalizou o curso com Láurea Acadêmica, sen-do a primeira colocada na turma de 2005. Tão logo concluída a graduação, realizou Mestrado (LLM) na Universidade de Yale (2006) e, finalmente, obteve, em maio, o título de Doutora pela UFRGS e pela Universidade americana, com conceito máximo em uma ilustre banca formada por grandes Professores de Di-reito Societário e Economia.

A Toga teve a honra de conversar com a Professora sobre sua brilhante trajetória acadêmica:

Page 10: A Tog a - UFRGS · tapete de Porto Alegre às pressas em função da Copa do Mundo, a Vila Chocola-tão, composta principalmen-te por catadores e recicla-dores, tem sua comunidade

A TOGA - Junho de 201110

RESENHA

Este pequeno escrito pretende rememorar e contextualizar o livro “Le droit et les droits de l’homme” escrito por Michel Villey (1914-1988) em 1983. Para tal escopo, pretende-se situar his-toricamente o pensamento desse autor, o qual se caracterizou pela incomum síntese de horizontes científicos: tran-sitava com liberdade entre Filosofia, História, Direito e Filologia.

O pensamento de Michel Villey (doravante, M.V.) já foi contextualiza-do em certo renascimento do Direito Natural no pós-guerra - em conjunto com Leo Strauss (1899-1973), Gustav Radbruch (1878-1949) em sua matu-ridade, bem como John Finnis (1940)1 -, caracterizando-o como “antimoder-nista”2. Esse último termo é justificado por alguns críticos em razão de uma influência não declarada de Heidegger sobre M.V., na exata medida em que consideravam, ambos, a modernidade como um declínio, o último avatar da história de um esquecimento de origens3.

Com efeito, é possível identificar em M.V. uma proposta de descentra-lização do pensamento jurídico, uma revolução copernicana ao contrário: do homem à “ordem das coisas”, basea-

Michel Villey e os direitos que seriam do Homem• BRUNO HERMES LEALMestrando e bolsista do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Advogado.

da em um complexo conceito de “harmonia cósmica”4. A pecha de “anti-humanismo jurídico”5, contudo, é recusada por M.V., ao menos nessa acepção maniqueís-ta que aprisiona os cientistas do Direito em uma grade neces-sariamente alternativa daqueles que são a favor ou contra as hecatombes cometidas durante a 2ª Guerra Mundial. Nosso autor reivindica, em prol de seu livro, um tratamento científico-univer-sitário6, para o qual será neces-sário desprender-se de qual-quer engajamento apriorístico, tendo por objetivo um exercício verdadeiramente construtivo--filosófico: desempenhar uma correção dessa linguagem difusa, a qual permite, em detrimento do discernimento científico, que “os direitos do Homem só tenham amigos”7.

Embora tal construção pos-sa parecer-nos “antimodernista” em um sentido de extempora-neidade pejorativa, dediquemos algumas linhas à maneira como o professor da Université Paris II aborda a temática dos direi-tos do homem, de inegável e premente atualidade. De pronto, M.V. apresenta seu problema e surpreende pela originalidade: “direitos do homem” é expressão instrumental aos advogados, e se nos é impossível simplesmente riscá-la do nosso vocabulário, seria necessário encontrar uma expressão menos inadequada8.

O autor realiza profunda imersão histórica para resgatar a “origem do direito”, proble-matizando a comistão lingüística entre elementos que, no vocabu-lário jurídico, foram marcados pelo timbre da antinomia. Afi-nal, não seria a expressão “direi-tos do homem” – considerados a gênese histórica do primeiro e o caráter excessivamente gené-rico do segundo – um exemplar oxímoro? Para responder a tal questionamento, M.V. propõe a investigação histórica9.

M.V. reputa a Cícero e a seu círculo de amigos, no período da Roma republicana, a elaboração de uma jurisprudência, capaz de deduzir diversos comandos de alguns poucos princípios10. A empreitada, contudo, segundo o autor, consubstanciou pouco mais do que o transplante para o plano prático daquilo que a

contemplação grega, mormente aristotélica, assentara: i) a justiça (dikaiosunè) não é um ideal, produto imaginário, senão um setor da realidade; ii) a expressão “to dikaion” (a abar-car ambos os termos, justo e direito) é carac-terizado pela partilha proporcional de bens exteriores (do que se depreenderia, segundo M.V., a inviabilidade de querer atrelar “li-berdade” ou “saúde” ao termo “direito”)11. Na esteira desse desenvolvimento filosófico, pois, os romanos irão assentar característi-cas precípuas dessa “ars juris” (entre as quais a adstrição ao interior de uma mesma cida-de, daí o “dikaion politikon”), as quais seriam incompatíveis com a pretensão hodierna de universalidade dos direitos do homem12.

No capítulo sexto da obra, M.V. retoma um tema recorrente em sua extensa obra: o direito subjetivo13. Segundo a compreensão do autor, o máximo que se poderia extrair da leitura de Gaio é a definição do direito como uma proporção na distribuição dos bens entre as pessoas14. Não há espaço para os direitos próprios da figura “singular” do “Homem”: a passagem ao “plural” (direitos dos homens) é uma marca do classicismo15.

Essa, em apertada síntese, é a linha de pensamento que levará o autor a concluir pela inexistência, no texto de Gaius, da noção de direito subjetivo enquanto liber-dade individual de agir. A linguagem do jurisconsulto romano foi deturpada pelos tratadistas da Modernidade, já que a siste-mática das Institutas, reflexo que era de uma filosofia realista, não era afeita a abstrações (como direitos reais, direitos pessoais, ou mesmo direitos do homem!)16. O elemento “direito” da famigerada expressão, portanto, considerado em suas primícias originais, não seria compatível com a finalidade atualmen-te requerida pelos juristas que pretendem a defesa do ser humano.

Para mascarar essa deturpação termi-nológica, sem comprometimento com o contexto cultural romano, os tratadistas mo-dernos recorreram a interpretações isoladas e fantasiosas das expressões de “jus natu-rale” (a qual é definida pelo Digesto como conjunto de instituições comuns a todos os seres animados - homens e bestas) e “jus gentium” (expressão próxima a certa moral comum ao Império, destinado a regular determinadas relações comerciais). Fôsse-mos falar de “direito” propriamente dito, a autêntica invenção romana foi o “jus civile”, destinado à partilha dos bens no interior de um grupo político, em frente ao qual nem todos os homens são iguais17. Nenhuma delas, analisa M.V., bem compreendidas, poderia oferecer suporte à magnitude que se quis atribuir aos “direitos do homem”, constituindo uma “falsificação manifesta”18.

Se o termo “direito” não é o mais apro-priado do ponto de vista histórico, o autor busca o fundamento da proteção ao ser humano em raízes teológicas, cujos teóricos principais (entre Tomás de Aquino, Duns Scott e Guillaume d’Occam, e os espanhóis Suarez e Molina), a despeito de algumas di-ferenças teóricas que os separam, exaltaram a sua dignidade à altura e semelhança do Criador. Tal concepção, contudo, não con-duz à derivação direta dos atuais “direitos do homem”. M.V. é categórico ao afirmar que os escolásticos souberam distinguir com precisão um “dominium” decorrente da lei natural e um direito a “proprietas”, criação de um concerto entre os homens, o qual,

novamente, não é comum à natureza humana19.

Se esse aspecto universal dos “direitos do homem” não pode ser derivada dos teóricos escolásticos, M.V. avança mais uma etapa histórica, rumo ao século XVII, quando se instau-ra uma nova religião (progresso da História do Homem sem Deus) à qual corresponde uma nova Trindade (liberdade, igualdade e fraternidade)20. A partir de então, as tentativas de embasamento teórico dos “direitos do homem” são vinculados a um pragmatismo ideológico direcionado a fins bem determinados.

Segundo o nosso autor, tanto o Leviathan hobbesiano quanto o Second Treatise de John Locke têm em comum dois aspectos fundamentais: i) uma reprovável motivação ideologicamente orientada para a fundamentação dos “direi-tos do homem” (o primeiro justificou o absolutismo dos Stuarts ao frisar a anarquia que decorreria do exercício “natural” do direito do Ho-mem à liberdade; o segundo se afinou com a efervescência inglesa de 1689, derivando do direito natural à liberdade um direito à propriedade oponível ao monarca, justificando, pois, a Revolução Gloriosa)21; ii) uma “esplêndida ignorância do Corpus Iuris Civilis”, isto é, a ausência de formação jurídica que justificasse o emprego do termo “right”. A conclusão a que chega destila um niilismo carregado de ironia típica de M.V.: “Os direitos do homem são uma obra de não-juristas”22.

A provocação demons-trada por nosso autor suscita reflexões: estamos nos direito de nos perguntar se o cenário jurídico brasileiro não tem oferecido exemplos suficientes de uma dissociação – para não utilizar o termo “decomposition”, no original - entre os atributos que o advento de uma or-dem jurídico-racional trouxe consigo e o caráter polivalente dos “direitos do homem”. Nas últimas páginas de seu livro, e nas derradeiras linhas desta resenha, é de se considerar que M.V. tenha apontado mais pro-blemas do que soluções23, sem que isso implique a desvalia de suas observações - mormente nos dias de hoje, em que os juristas se deparam cotidia-namente com situações nas quais às políticas públicas se contrapõem direitos subjetivos pretensamente absolutos.

Referências e notas publicadas online em: http://www.caar.ufrgs.br/?p=7117

Na Biblioteca do Direito da UFRGS:342.7 V749d 1998 (original em francês)342.7 V749d-P 2007 (tradução para português)

Page 11: A Tog a - UFRGS · tapete de Porto Alegre às pressas em função da Copa do Mundo, a Vila Chocola-tão, composta principalmen-te por catadores e recicla-dores, tem sua comunidade

O século XX foi dos momentos que mais transformaram a história do ser hu-mano. A partir da consolidação da sociedade industrial, o som de carros e máquinas se tornou uma constante dentro dos grandes centros urbanos, onde a maioria da hu-manidade passava a habitar. E para representar este ritmo frenético e intenso, que só viria a se acentuar com o passar dos anos, sem dúvida era necessária uma nova forma de expressão e representação nas artes, sendo a música privilegiada nessa tentativa.

Com o final da Primeira Guerra Mundial, o centro do mundo se desloca-va para a América (do Norte), para um mundo novo, posto que o velho mun-do dos impérios europeus havia entrado em conflito e em colapso. Ansioso por novidade e ficando evidente a distância que separava o som das cidades da antiga música erudita européia, novas formas de expressão tomaram for-ça no continente descoberto por Colombo e batizado por Américo: A cultu-ra dos escravos que foram trazidos para trabalho forçado ganhou relevo por sua musicalidade e, sobretudo, ritmo acentuado. Era a vez do batuque africano.

O Jazz nascido nas margens do Rio Mississipi é a expressão síntese desse movimento de interação da música européia com a cultura trazida pelos negros africanos. A partir dos working songs, músicas executadas para motivar o traba-lho dos escravos na lavoura, os negros passaram a desenvolver estilos que chega-ram ao Blues e ao Gospel. Mas foi na cidade de New Orleans que a música foi definitivamente liberta pelos ex-escra-vos. A primeira cidade do Mississipi, formada etnicamente pelos antigos donos franceses, imigrantes alemães e irlandeses e massiva imigração for-çada africana, se configurava em uma grande confluência de culturas, a qual se utilizava da música em diversas si-tuações, com bandas marciais para co-memorar nascimentos, celebrar casa-mentos e lamentar enterros e velórios.

Em contato com os instrumen-tos marciais, os negros contratados para tocar nos conjuntos de New Or-leans elaboraram gradativamente um novo jeito de tocar os instrumentos – notadamente os de sopro – com-binando com elementos da música africana, como o que se convencio-nou chamar de swing. De início, essa nova forma de tocar foi batizada de Ragtime (“tempo rasgado”), e que chegou a sua plenitude como estilo no Jazz, que propunha, com muita simplicidade, a liberdade total en-tre os músicos: sobre uma base de swing, improvisar. Estava criada por ex-es-cravos a música da liberdade, a qual enfatiza a criação e a cooperação coletiva.

Poucos gêneros musicais podem estar em comparação à ousadia e à cria-tividade do Jazz. Talvez o único que possa se candidatar é o Samba brasilei-ro, também oriundo de um passado escravocrata, amalgamando a cultura eu-ropéia com elementos da cultura africana. No Brasil, a típica música dos escravos se representa pelo Samba de Roda, no qual todos os participan-tes interagem por meio da dança e do canto. Igualmente à música do Jazz, nas palavras do estudioso Roberto Moura “cada roda de samba é única e ir-repetível”, é a manifestação de um momento eterno, onde se aparta toda a tristeza do mundo exterior para a criação de um pequeno mundo em roda.

O Samba, que teve seu berço na Bahia e importado ao Rio de Janeiro, sobre-tudo desenvolvido no bairro da Lapa, teve seu formato popular definitivo a partir da transformação ocorrida no bairro vizinho, no morro do Estácio de Sá. A par-tir do desejo dos sambistas de querer abrir a roda do quintal e ganhar as ruas do bairro, criaram um bloco de pessoas para cantar e tocar o samba em movimento, podendo tocar e caminhar pelas ruas do Estácio. Para distinguir este samba dos demais, os integrantes do bloco inspiraram-se na presença do bairro da Esco-la Normal e afirmaram que no Estácio moravam os “professores” do samba - sendo o bloco uma verdadeira “escola de samba”. A partir do bloco “Deixa Falar” do Estácio, a primeira escola de samba, estava criado o samba urbano, o samba do Estácio, feito para espalhar o samba para bem além das ruas cariocas.

Além do Samba e do Jazz, outras origens musicais contribuíram para a for-mação dos gêneros populares posteriores, mas praticamente todas passam por este movimento de combinação da cultura das antigas metrópoles com a dos escravos que fizeram migrar de um continente a outro. É quase impossível notar hoje na música popular (ou pop) uma produção que não preste tributo às antigas canções dos escravos, os quais sentiram como ninguém o mundo e suas trans-formações. A musicalidade daqueles que eram considerados “primitivos” aca-bou por ser o que iria redefinir todo o gosto musical do futuro da humanidade.

A TOGA - Junho de 2011 11

DIREITO E ECONOMIA

Livre concorrência• MARIANA TADEWALDAcadêmica do 1º ano manhã

A concorrência é imprescindível à economia. Graças a ela, as empresas buscam destacar-se, criando produtos inovadores, redu-zindo preços e aprimorando a qualidade da produção. Além disso, a ausência de concorrência leva a economia a vícios, como abuso do poder de mercado – por meio da limitação da oferta, do aumento dos preços ou da imposição de condições à compra. Por estes moti-vos, deve-se assegurar ao consumidor, por parte do Estado, a opção de relacionar-se com um mercado diferenciado.

• THIAGO CALSA NUNESAcadêmico do 5º ano manhã

MÚSICA

Do Jazz

ao Samba,

o ritmo

da modernidade

A fim de tornar mais tangível a discussão acerca da concorrência, faz-se a análise de um caso das produtoras de cerveja em 2008. Neste ano, a AFREBRAS, a Cervejaria Imperial, a ABRABE (Associação Brasileira de Bebidas) e a Cervejaria Kaiser moveram ação contra a AmBev (pelas marcas Skol e Bohemia, no RJ e no RS, respectivamen-te) pelo lançamento no mercado de um mecanismo anticoncorrencial. Tratava-se de uma garrafa de vidro retornável no volume de 630 ml, 30 ml a mais que o contido na garrafa padrão de compartilhamento, contendo a inscrição da AmBev em auto-relevo. No entanto, a nova garrafa mantinha a cor da outra e tinha acrescidos apenas 0,8cm em sua altura. Se por um lado a diferenciação era praticamente imper-ceptível a um olhar rápido, a logomarca da AmBev era suficiente para acusar por crime de contrafação de desenho industrial e crime contra a marca as concorrentes em caso de uso acidental. Além disso, ao utilizar acidentalmente as garrafas AmBev, o produtor concorrente poderia ser acusado de crime contra o consumo por vender produto em embalagem que não corresponda ao conteúdo.

A difícil diferenciação das garrafas exigia dos comerciantes (principalmente donos de bares, responsáveis, na época, por 75% do mercado do produto) o dispêndio de muito tempo e trabalho, o que obviamente levar-lhes-ia a optar por comercializar apenas uma das marcas. Em 2008, 30% dos pontos de venda comercializavam apenas cervejas da marca AmBev, o que tenderia a aumentar.

A AmBev, em defesa, alegou que a garrafa era uma forma de diferenciação, e que o preço permaneceria o mesmo. No entanto, a heterogeneidade de medidas, a longo prazo, dificultaria a comparação de preços, podendo vir a prejudicar os consumidores.

O CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) decidiu por vetar a produção das garrafas, conforme seu entendi-mento de que esta mudança não constituía inovação, e que pouco se diferenciava das demais garrafas. As empresas não estão privadas de lançaram inovações em seus produtos, e não foi com este argumento que o novo produto da AmBev foi removido do mercado, e sim por ter difícil diferenciação.

Então a livre concorrência não é totalmente livre. Conforme a Constituição, em seu art. 170 e inc. IV, a livre concorrência é um dos princípios da ordem econômica. Contudo, o § 4º do art. 173 estipula que “A Lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros”. Destarte, a liberdade de concorrência limita-se quando surgem abusos de poder, que devem sofrer reparos legais. Livres são os agentes para tomarem iniciativas e integrarem o mercado, o que não significa que o mercado deva ser deixado à própria sorte, sob pena de eliminar a concorrência. O contrário também é danoso, visto que a intervenção excessiva do Estado também comprometeria a atuação dos agentes econômicos.

Page 12: A Tog a - UFRGS · tapete de Porto Alegre às pressas em função da Copa do Mundo, a Vila Chocola-tão, composta principalmen-te por catadores e recicla-dores, tem sua comunidade

A TOGA - Junho de 2011

Dia do Combate à Homofobia: intervenção nos RUs e reunião na Esquina Democrática

• IHANA GUERRAAcadêmica do 1º ano manhã

Em uma sessão que durou mais de 10 horas, iniciada no dia 4 de maio e terminada no dia 5, 10 ministros do Supremo Tribunal Fe-deral (STF) votaram a favor quanto ao reconhecimento da união estável entre pessoas do mesmo sexo. O que levou à decisão foram duas ações diretas de inconstitucionali-dade: uma movida pelo governo do estado do Rio de Janeiro e a outra pela Procuradoria geral da União. A decisão foi tomada por unanimi-dade, já que um dos ministros não votou.

A primeira ação, chamada de Ação Direta de Inconstitucionali-dade (ADI 4277), foi movida pela vice-procuradora geral da República Deborah Duprat e buscava a de-claração da união de homossexuais como entidade familiar, além de todos os direitos que esse reconhe-cimento implica. Já a segunda, era uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 132), de autoria do governo do Rio de Janeiro, cujo governador é Sérgio Cabral. Esta afirmava que o não reconhecimento da união es-tável entre pessoas do mesmo sexo fere direitos fundamentais, como igualdade, liberdade (aqui entra o princípio de autonomia da vontade) e dignidade da pessoa humana, to-dos tidos como princípios na Cons-tituição Federal. A ideia era de que o STF deliberasse juridicamente quanto às ações e seu entendimento fosse seguido, a partir daí, em todos os tribunais.

Dentre os argumentos dos mi-nistros durante a votação estavam basicamente a garantia da liberdade e dos demais direitos fundamentais e a interpretação do Código Civil: a união estável não pressupõe sexos específicos. Além disso, foi abor-dada a questão da evolução das discussões de acordo com a história

(no código napoleônico, a homossexuali-dade era crime; antes década de 70, as mulheres eram tão discri-minadas quanto os homosse-xuais hoje;...) e ainda falaram do preconceito

Uniões estáveis:

No dia 17 de maio, comemorou-se o dia de Combate à Ho-mofobia. Nesse dia, o Serviço de Assessoria Jurídica Universitária (SAJU), através do G8-Generalizando, realizou uma intervenção nos Restaurantes Universitários da UFRGS. Essa intervenção consistia em cartazes colocados nos RUs com a seguinte frase: “Já parou pra pensar que o ‘par perfeito’ pode não servir a mesa de todo mundo?”, fazendo uma analogia com o tradicional feijão e arroz da mesa dos brasileiros e tendo como objetivo introduzir a diversidade sexual no ambiente acadêmico e incentivar o respeito.

Representantes de vários movimentos sociais reuniram--se, também nessa data, na Esquina Democrática no centro de Porto Alegre. O objetivo foi celebrar a exclusão da homossexu-alidade como um dos “problemas relacionados à saúde” em 17 de maio de 1990 e ao mesmo tempo lutar contra a violência e o preconceito.

decisão do STF equilibra essa balança

como crime.Com a decisão, os mais de 60 mil casais cons-

tituídos por pessoas do mesmo sexo existentes no Brasil passaram a ter assegurados judicialmente mais de 112 direitos, sendo que parte desses eram reconhecidos antes apenas para casais heteros-sexuais, dentre eles: herança, pensão alimentícia, comunhão de bens, inclusão em planos de saúde, etc. Até então, a união homossexual era conside-rada apenas um tipo de sociedade pelo código ci-vil, seu rompimento ocasionava apenas os direitos equivalentes a uma quebra de sociedade.

Apesar de o Supremo não haver entrado de forma clara na abordagem dos desdobramentos da votação, dentre os possíveis estão o casamento civil – que é diferente da união estável por pres-supor formalidade ou aprovação – e uma maior facilidade na adoção – que já é permitida a casais homossexuais, mas os heterossexuais ainda detém preferência nesses casos. Ademais, quando se trata de uma instituição privada, como uma empresa ou associação, estas possuem autonomia para decidir se são permitidos ou não esses direitos aos casais até que o caso não seja levado a um tribunal, por exemplo: um clube pode permitir ou não a dependência do parceiro de seu associado; nesse caso, o casal pode entrar na justiça e ganhará mais facilmente a causa.

Desta maneira, a Corte exerceu seu papel no que diz respeito ao poder judiciário do Brasil que, como fez questão de frisar o ministro Celso de Mello, possui um Estado laico e não deve pautar suas decisões em preferências de determinados grupos, independente dos quais sejam. Retratadas as possíveis consequências práticas, resta agora esperar as possíveis mudanças culturais e sociais dessa decisão.

Religiosos contra o Projeto de Lei 122

Ocorreu, no dia 1 de junho, quando mais de 80 mil pessoas reuniram-se em frente ao Congresso Nacional, uma manifestação contra o “PL 122”: projeto de lei que criminaliza a discriminação contra homossexuais. O principal argumen-to contrário é de que ele vai contra a liberdade de expressão, impedindo a crítica.

Com o objetivo de discutir sobre a decisão do STF quanto à união estável, foi realizado na Faculdade de Direito da UFRGS, na noite do dia 13 de junho, um debate que abriu o I Ciclo de Debates Política e Sociedade. Os debatedores foram Roger Rios, juiz federal e professor da Uniritter, e Célio Golin, coor-denador do grupo nuances. Foi abordada a questão jurídica da decisão, sendo feita uma análise crítica dos votos dos ministros, e a social, desde a evolução do debate desse tema no decorrer da história até a forma e os termos usados para a sua abordagem dentro de toda a questão LGBT.

Na Faculdade de Direito: I Ciclo de Debates Política e Sociedade discute o tema

Mais sobre o assunto