a soja: histÓria, tendÊncias e virtudes - história, tendências... · soja 30 funcionais &...

13
SOJA 28 FUNCIONAIS & NUTRACÊUTICOS A SOJA: HISTÓRIA, TENDÊNCIAS E VIRTUDES A SOJA: HISTÓRIA, TENDÊNCIAS E VIRTUDES

Upload: ngoanh

Post on 08-Nov-2018

248 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: A SOJA: HISTÓRIA, TENDÊNCIAS E VIRTUDES - história, tendências... · SOJA 30 FUNCIONAIS & NUTRACÊUTICOS que eram plantas rasteiras que se desenvolviam ao longo de rios e lagos

SOJA

28

FUN

CIO

NA

IS &

NU

TRA

CÊU

TIC

OS

A SOJA: HISTÓRIA,TENDÊNCIAS E VIRTUDES

A SOJA: HISTÓRIA,TENDÊNCIAS E VIRTUDES

Page 2: A SOJA: HISTÓRIA, TENDÊNCIAS E VIRTUDES - história, tendências... · SOJA 30 FUNCIONAIS & NUTRACÊUTICOS que eram plantas rasteiras que se desenvolviam ao longo de rios e lagos

SOJA

29

FUN

CIO

NA

IS &

NU

TRA

CÊU

TIC

OSHistória da soja

A mais antiga referência sobre soja seria atribuída aoimperador chinês Shennong ou Shen-nung, também conhecidocomo o Imperador Yan ou, ainda, o Imperador dos Cinco Grãos.É um lendário imperador chinês e herói cultural da mitologia chinesaque, acredita-se, deve ter vivido há cerca de 5.000 anos atrás. Seunome significa, literalmente, o Fazendeiro Divino. Consideradocomo pai da agricultura chinesa, é tido como responsável por terensinado aos antigos a prática da agricultura, mostrando comocultivar grãos para evitar matar animais. Segundo a lenda, teriaexperimentado pessoalmente centenas de ervas, medicinais e

O uso da soja na alimentação varia muito ao redordo mundo, sendo ele mais comum no continenteasiático que nos países ocidentais. Os vegetarianose outros fervorosos adeptos apresentam comoargumento fundamental seu uso milenar na Chinae no Japão, porém se esquecem que os povosdesses países consomem principalmente derivadosfermentados e costumam comer bastante peixes evegetais, enquanto que nas nações ocidentaisconsome-se muito mais derivados processadosassociados a uma dieta rica em carnes e pobreem vegetais. Ademais, nos países orientais a sojanão é usada para substituir carne, frango ou peixe,mas sim, como complemento da dieta alimentarnormal, a qual, mais uma vez é bom frisar, é ricaem verduras e peixes. O objetivo do presente artigonão é discutir as virtudes da soja, mas sim deexpor, de forma sucinta, suas propriedadesnutritivas e tendências de consumo.

venenosas, para averiguar seus efeitos e valor médico. O livro quereúne os achados de Shen-nung foi compilado no final da épocada dinastia Han Ocidental (206 a.C. – 24 d.C.), ou seja, algunsmilhares de anos após a época que Shen-nung supostamenteexistiu, e lista várias ervas médicas em função do tipo epropriedades. Essa obra é considerada como a primeirafarmacopéia chinesa. O chá, que age contra os efeitos nocivos decerca de 70 outras plantas também é considerado descoberta deShen-nung; a lenda chinesa data essa descoberta em 2.737 a.C.Foi também chamado, como mencionado acima, como Imperadordos Cinco Grãos: arroz, cevada, soja, trigo e milheto.

A soja que hoje cultivamos é muito diferente dos seus ancestrais,

Page 3: A SOJA: HISTÓRIA, TENDÊNCIAS E VIRTUDES - história, tendências... · SOJA 30 FUNCIONAIS & NUTRACÊUTICOS que eram plantas rasteiras que se desenvolviam ao longo de rios e lagos

SOJA

30

FUN

CIO

NA

IS &

NU

TRA

CÊU

TIC

OS

que eram plantas rasteiras que sedesenvolviam ao longo de rios e lagos. Suaevolução começou com o aparecimentode plantas oriundas de cruzamentosnaturais entre duas espécies de sojaselvagem que foram domesticadas emelhoradas por cientistas da antiga China.Como é provável que muitas tentativastenham sido realizadas até que a soja fossedomesticada com êxito, parece razoávelsituar a domesticação da soja no final daépoca da Dinastia Shang (1766 a.C. - 1122a.C), ou seja, provavelmente, no século XIa.C. A soja foi “domesticada” na parteoriental da China do Norte, hoje chamadaKaoliang, região de cultivo de trigo deinverno.

A partir da sua origem no Norte daChina, a soja expandiu-se de maneira lentapara o Sul da China, Coréia, Japão eSudeste da Ásia. Pelo fato da agriculturachinesa, na época, ser muito introvertida,a soja só chegou à Coréia e desta aoJapão entre 200 a.C. e o século III d.C.

No Ocidente a soja apareceu no finaldo século XV e início do século XVI, com achegada dos navios europeus à Ásia.Permaneceu como curiosidade nos jardinsbotânicos da Inglaterra, França eAlemanha durante os quatro séculos quese seguiram. Foi somente no século XVIIIque pesquisadores europeus iniciaramestudos do feijão da soja como fonte deóleo e nutriente animal, e no início do séculoXX passou a ser cultivada comercialmentenos Estados Unidos. Na segunda décadado século XX, o teor de óleo e proteína dogrão começou a despertar o interesse dasindústrias mundiais. Ent retanto, astentativas de introdução comercial docultivo do grão na Rússia, Inglaterra eAlemanha fracassaram, provavelmente,devido às condições climáticasdesfavoráveis.

No entanto, foi a partir do final daPrimeira Guerra Mundial, em 1919, que aoleaginosa passou a ter um destaqueefetivamente internacional. Na oportu-nidade, a cultura começou a ganhar espaçonos Estados Unidos da América, a ponto deser criada uma associação em torno de todaa cadeia da soja, a hoje conhecida ASA(American Soybean Association), a qualcomeçou a operar em defesa da soja, commais propriedade, em 1921.

No Brasil, foi cultivada pela primeiravez na Estação Agropecuária deCampinas, em 1901. O grão chegou depoiscom maior intensidade com os primeirosimigrantes japoneses em 1908 e foiintroduzida oficialmente no Rio Grande doSul em 1914. Porém, a expansão da soja noBrasil aconteceu nos anos 70, com ointeresse crescente da indústria de óleo e ademanda do mercado internacional.

Soja: usos e hábitosalimentares

Cerca de 85% da colheita mundial desoja é processada para produzir o óleo eos resíduos da extração, torta, no caso daprensagem, farelo, no caso de extraçãopor solvente, usados na preparação derações para animais; de 4% a 5% dessesresíduos da extração do óleo sãoreprocessados em farinhas e proteínas parauso alimentício.

Somente 10% são usados diretamentepara alimentação humana (tofu, miso,natto, leite de soja, etc.), principalmente naÁsia, e os 5% restantes são usados comosementes ou para alimentação dos animaisnas próprias fazendas produtoras.

O óleo de soja é principalmentedirigido para o consumo humano; umaparte dele é usada para a produção debiodiesel, proporção que está em francocrescimento nos Estados Unidos.

O padrão de consumo de derivados desoja varia amplamente ao redor do mundocom a Ásia utilizando a soja principalmenteno preparo de alimentos t radicionaisfermentados, enquanto que no mundoocidental a maior parte da soja usada emalimentos é na forma de proteínas,incorporada nos processos de produção dederivados cárneos e outros. A Soyatech,empresa norte-americana de consultoria eeditora do Soya & Oilseed Bluebook, estimaque as nações asiáticas sejam responsáveispor 95% do consumo mundial de soja naforma de alimentos. Esse alto consumo naÁsia é fruto de uma longa tradiçãoalimentícia, padrões de alimentação emétodos de produção sui generis. Mesmoassim, matematicamente, o consumo diretode soja para alimentação humana no mundoocidental não representa muito mais do que0,5% da produção mundial de soja.

Como pode ser visto no Quadro 1, ospaíses asiáticos consomem, de longe,muito mais soja que as nações ocidentais.Em Taiwan, por exemplo, o consumo percapita é estimado em 19,15 quilo/ano e,no Japão, em 7,73 quilos/ano, enquantoque nos Estados Unidos o consumo é de0,33 quilo/ano. O consumo médio anualper capita a nível mundial é de 2,4 quilos,o que equivale a cerca de 6,5 gramas desoja por dia, ou ainda, 2,4 gramas deproteína de soja per capita por ano.

Ainda convém ressaltar que os paíseseuropeus não consomem o produto.

Alimentos à base de soja na Ásia.Alimentos à base de soja na Ásia.Alimentos à base de soja na Ásia.Alimentos à base de soja na Ásia.Alimentos à base de soja na Ásia.Em toda a Ásia, a soja é utilizada emuma ampla variedade de alimentostradicionais e alguns mais modernos. NoJapão, por exemplo, o tofu é o alimentoà base de soja mais consumido; presenteem virtualmente todas as refeições, deuma forma ou de outra, o tofu está nasopa de miso (misoshiru em Japonês)servida no almoço ou frito, cru, cozidoem sopas ou em molhos, cozido a vapor,recheado com diferentes ingredientes, oufermentado como picles, nas out rasrefeições. Também é consumido emsobremesas e em outras preparaçõesalimentícias. O leite de soja teve umrápido crescimento inicial, porém seuconsumo caiu em meados dos anosoitenta; estava voltando agora de formabastante promissora devido ao novointeresse por alimentos e bebidasfuncionais e as fortes alegações nutricio-nais com relação à soja. O nat to, outroproduto à base de soja fermentada, éhistoricamente muito prezado pelosjaponeses, pelo seu formato e saborúnicos, bem como por suas qualidadesde afinação e depuração do sangue. Omiso, mais um produto fermentado, éconsumido diariamente por muitosjaponeses, em caldos de sopas, molhospara saladas e coberturas de alimentos.

Na China, ao lado do também muitopopular tofu, existe o tofu fermentado, oyuba (nata que se forma em cima do leitede soja depois da fervura, e depois seca),o leite de soja e uma variedade deespecialidades regionais, tais como osmacarrões de soja, por exemplo. EmTaiwan, a arte de substituir carnes e peixestem alcançado patamares sem igual com

Page 4: A SOJA: HISTÓRIA, TENDÊNCIAS E VIRTUDES - história, tendências... · SOJA 30 FUNCIONAIS & NUTRACÊUTICOS que eram plantas rasteiras que se desenvolviam ao longo de rios e lagos

SOJA

31

FUN

CIO

NA

IS &

NU

TRA

CÊU

TIC

OS

Foi em 1919, que a oleaginosa passou a ter um destaqueefetivamente internacional, a cultura começou a ganharespaço nos EUA, e foi criada a associação em torno de

toda a cadeia da soja, a hoje conhecida ASA.

Page 5: A SOJA: HISTÓRIA, TENDÊNCIAS E VIRTUDES - história, tendências... · SOJA 30 FUNCIONAIS & NUTRACÊUTICOS que eram plantas rasteiras que se desenvolviam ao longo de rios e lagos

SOJA

32

FUN

CIO

NA

IS &

NU

TRA

CÊU

TIC

OS

pseudo-carne de vaca, frango e peixe, feitasa partir de proteínas de soja, yuba, glútene tofu! Na Indonésia, o tempeh é o alimentoà base de soja mais popular, sendovendido em milhares de barracas equiosques através do país inteiro. Otempeh é um alimento fermentado a partirde sementes de soja branca, com um aromade nozes e uma textura densa e ligeiramentecarnuda. Constitui um alimento forte, comum sabor mais intenso que outros derivadosda soja. A ação das enzimas durante afermentação faz com que as sementessejam mais digeríveis, enquanto o micélioque é utilizado para envolvê-las fornecevaliosas vitaminas do complexo B de

origem vegetal. É fabricado diariamente pormuitas pessoas que compram a sojainoculada na véspera e tem, assim, no diaseguinte, um tempeh fresco, pronto paraser vendido nas barracas.

Em toda a Ásia, ao lado do tofu e deoutros alimentos de caráter regional, o leitede soja processado e embalado temganhado importância crescente nos últimosanos e é hoje um grande negócio em HongKong, na Coréia, na Malásia, emCingapura, na Tailândia e no Vietnã.

Alimentos à base de soja na Europa.Alimentos à base de soja na Europa.Alimentos à base de soja na Europa.Alimentos à base de soja na Europa.Alimentos à base de soja na Europa.O consumo de alimentos derivados de sojana Europa é quase que insignificante, sendoa maior parte de seu uso concentrado

em produtos alternativos para a carne ederivados lácteos. Nesses países detradição culinária apurada e onde comernão significa meramente satisfazer umanecessidade f isiológica, a soja temencontrado pouquíssimos adeptos. Oconsumo de leite de soja e produtosalternativos a carne é particularmenteimpor tante no Reino Unido, onde apopulação de vegetarianos é propor-cionalmente maior. Certa aceitação doleite de soja ocorre também na Bélgica,onde está localizado o maior produtoreuropeu deste produto. O tofu é razoavel-mente conhecido na Europa inteira, masestá longe de ser tão popular quanto osprodutos alternativos a carne e laticínios.Aliás, visto a riqueza de tipos de queijosexistente no Velho Continente, quem iaquerer um queijo de soja? Até o óleo desoja não goza de muita preferência.

Alimentos à base dAlimentos à base dAlimentos à base dAlimentos à base dAlimentos à base de soja na Áfe soja na Áfe soja na Áfe soja na Áfe soja na África.rica.rica.rica.rica.De modo geral, a soja ainda não é muitoconhecida na África. Alguns países usama soja em programas de alimentação paratrabalhadores ou em merenda escolar,devido ao seu custo relativamente baixo ealto valor nutritivo. Na África do Sul, parteatípica com relação ao resto do continente,existe um pequeno mercado para leite desoja embalado; há também uma certa gamade produtos substitutos da carne, não pelasalegações nutricionais, mas sim pelo fatorpreço.

Alimentos à base dAlimentos à base dAlimentos à base dAlimentos à base dAlimentos à base de soja nos Ese soja nos Ese soja nos Ese soja nos Ese soja nos EstatatatatadosdosdosdosdosUnidos.Unidos.Unidos.Unidos.Unidos. Maior produtor mundial de soja esede dos maiores gigantes do ramo, omercado norte-americano para produtosderivados da soja é objeto de investimentosmultimilionários em comunicação paraconvencer uma geração de pessoas ávidaspor saúde e bem-estar que a soja é aresposta para tudo. Óleo de soja, biodiesele farelo são comodities e, para os gigantesdo ramo, é interessante criar novosmercados para produtos de maior valorcomercial.

A evolução do mercado nor te-americano de produtos de soja ocorreu emtrês etapas distintas. A primeira se deu nodecorrer dos anos de 1920, quando osprimeiros grandes defensores dovegetarianismo, como o Dr. John HarveyKellogg, de Battle Creek, MI, mostraraminteresse nas propriedades saudáveis da

QUADRO 1 - CONSUMQUADRO 1 - CONSUMQUADRO 1 - CONSUMQUADRO 1 - CONSUMQUADRO 1 - CONSUMO PER CAPITO PER CAPITO PER CAPITO PER CAPITO PER CAPITA DE SOJA A DE SOJA A DE SOJA A DE SOJA A DE SOJA IN NAIN NAIN NAIN NAIN NATURTURTURTURTURAAAAAPARPARPARPARPARA ALIMENTA ALIMENTA ALIMENTA ALIMENTA ALIMENTAÇÃO DIREAÇÃO DIREAÇÃO DIREAÇÃO DIREAÇÃO DIRETTTTTAAAAA

F F F F Feieieieieijão djão djão djão djão de sojae sojae sojae sojae soja Proteína de sojaProteína de sojaProteína de sojaProteína de sojaProteína de soja

RRRRRankankankankank PaísesPaísesPaísesPaísesPaíses (kg/yr) (g/dia) (36% proteína) (g/dia)

1 Taiwana 19,15 52,46 18,89

2 Coréia do Norte 10,67 29,24 10,53

3 Coréia do Sul 8,79 24,07 8,67

4 Líbia 8,68 23,78 8,56

5 Japão 7,73 21,19 7,63

6 China 7,31 20,03 7,21

7 Indonésia 7,16 19,61 7,06

8 Uganda 4,71 12,91 4,65

9 Nigéria 2,76 7,57 2,72

10 Tailândia 2,34 6,40 2,30

11 Mianmar 1,91 5,22 1,88

12 Iemêm 1,85 5,06 1,82

13 Costa Rica 1,40 3,84 1,38

14 Peru 1,40 3,83 1,38

15 Vietnam 1,27 3,48 1,25

16 Canadá 0,68 1,88 0,68

17 Zimbábue 0,65 1,77 0,64

18 Filipinas 0,51 1,39 0,50

19 Índia 0,41 1,39 0,50

20 Etiópia 0,38 1,04 0,38

21 EUAa 0,33 0,89 0,32

22 Alemanha 0,24 0,66 0,24

23 Egito 0,24 0,66 0,24

24 África do Sul 0,23 0,64 0,24

25 Congo 0,18 0,50 0,18

Média mundial 2,39 6,54 2,36a Soyatech, Inc., estimate.

Fonte: Food and Agriculture Organization (FAO) food balance sheets.

Page 6: A SOJA: HISTÓRIA, TENDÊNCIAS E VIRTUDES - história, tendências... · SOJA 30 FUNCIONAIS & NUTRACÊUTICOS que eram plantas rasteiras que se desenvolviam ao longo de rios e lagos

SOJA

33

FUN

CIO

NA

IS &

NU

TRA

CÊU

TIC

OS

soja. Estudou os eventuais benefícios dedietas ricas em soja para diabéticos e foi oprimeiro a desenvolver e comercializar nosEstados Unidos análogos da carne e delaticínios feitos de soja. Durante essaprimeira fase, os alimentos à base de sojaeram particularmente apreciados pelosmembros, na sua maioria vegetarianos, daIgreja Adventista do Sétimo Dia e outrosgrupos similares, com interesses específicos.

A segunda fase acompanhou aindustrialização da sociedade americana.A farinha de soja tornou-se um componenteimportante na produção de alimentosdurante a Segunda Guerra Mundial, umavez que ocorria certa penúria de carnedecorrente da grande demanda emproteínas e alimentos vindos das forçasarmadas e da interrupção do comércioagrícola nos anos de guerra. Infelizmente,a produção de farinha e proteínas de sojaainda não tinha atingido toda a plenitudede conhecimentos necessários e,conseqüentemente, muitos dos produtos queas utilizavam tinham um off-flavours distintoque os tornavam, no máximo, tolerados,mas não apreciados. A imagem deprodutos à base de soja era a imagem deprodutos de substituição de qualidadeinferior, a serem usados em época de guerraou escassez, mais do que alternativasnutricionais no dia-a-dia, para a carne elaticínios naturais. Nas décadas de 1950 e1960 e na época da escassez de carne,que ocorreu no início dos anos de 1970nos Estados Unidos, várias indústriasalimentícias e processadoras de carneadicionaram proteínas de soja texturizadaspara aumentar os rendimentos. Essasprimeiras adições de proteínas de sojaencontraram muita resistência por partedos consumidores, cujas principais queixaseram relacionadas a sabor, textura e cor.Após essa época, os processadores dealimentos tiveram até de informar o públicoconsumidor que seus produtos nãocontinham nem soja nem cereais. No finaldesta segunda fase, os produtos à base desoja não eram nem bem vistos e menosainda desejados pelos consumidoresamericanos.

A terceira fase iniciou-se no final dosanos de 1970 e foi resultado dacontracultura nascida nos anos 60. Paz eamor, f lores, motivos psicodélicos e

questionamento dos valores tradicionaisamericanos e europeus levaram os jovensda época a um retorno para os valores daterra, pacifismo, vegetarianismo e uma maisequitável dist ribuição dos recursosalimentícios. Neste buraco negro culturalnasceram centenas de pequenas empresas,dedicando-se a produção de alimentos àbase de soja e ensinando o público comousá-los. Segundo a Soyatech, consultoriajá mencionada mais acima, mais de 2.000novos produtos à base de soja apareceramno mercado norte americano durante adécada de 1980. Tofu, tempeh, miso, hotdogs de tofu, hambúrgueres vegetarianos,sorvetes de tofu, leite de soja e outrasalternativas de laticínios tornaram-secomuns nas lojas de produtos naturais evegetarianos. Nesse meio, os jovens dacontracultura cresceram, se casaram ecriaram famílias acostumadas com esses“quitutes”. A americanização dessesprodutos à base de soja acelerou-sequando a WhiteWave Foods Company,hoje sediada em Broomfield, CO, começoua comercializar leite de soja emembalagem gable-top, chamados aqui deTetra Pak, nos balcões refrigerados dossupermercados tradicionais. Até estaépoca, o leite de soja era vendido somenteem lojas de produtos naturais evegetarianos em embalagens assépticasnormais e consumidos por vegetarianos,intolerantes à lactose e pessoas comobjeções éticas ou religiosas ao consumode leite de vaca. Mais tarde, depois daWhiteWave reformular e reposicionar suamarca de leite de soja Silk®, tornando oproduto mais parecido com leite de vaca,as vendas de leite de soja nos EstadosUnidos explodiram, passando de uma cifrade cerca de US$ 124 milhões em 1996, paraUS$ 700 milhões em 2004. Outra datadecisiva no crescimento norte americanodo consumo de produtos com soja foi oano de 1999, quando a FDA (U.S. Foodand Drug Administration) autorizou osprocessadores de alimentos a anunciar queseus produtos eram saudáveis para ocoração se contivessem mais de 6,25gramas de proteínas de soja por porção(se eles também forem com baixo teor degordura). A reivindicação que se podiacolocar na embalagem era: “25 gramasde proteínas de soja por dia, como parte

No Brasil, a sojafoi cultivada

pela primeiravez na Estação

Agropecuária deCampinas, em

1901.

Page 7: A SOJA: HISTÓRIA, TENDÊNCIAS E VIRTUDES - história, tendências... · SOJA 30 FUNCIONAIS & NUTRACÊUTICOS que eram plantas rasteiras que se desenvolviam ao longo de rios e lagos

SOJA

34

FUN

CIO

NA

IS &

NU

TRA

CÊU

TIC

OS

de uma dieta baixa em gorduras saturadase colesterol, pode reduzir o risco dedoenças cardíacas. Uma porção de (nomedo produto) fornece (quantidade) gramasde proteína de soja”. Desde essa época, agama de produtos que incluem proteínade soja tem como único limite aimaginação dos engenheiros de alimentose mercadólogos. Ao lado do leite de soja,produtos que se deram particularmentebem no mercado norte americano são: tofu,barras energéticas, substitutos da carne ealternativas para produtos cárneos.Produtos que estão crescendo são: snacksà base de soja, chips, soja salgada etorrada (como amendoim), massasenriquecidas com soja, pães e cereais.

Com esses produtos, o mercado norteamericano de soyfoods tem crescido deUS$ 1,2 bilhão em 1996, para mais de US$4 bilhões em 2005. Já mostra alguns sinaisde maturidade e sua taxa de crescimentotem diminuído sensivelmente,par ticularmente devido aos ataquesmidiáticos de uma vertente anti-soja contrao consumo imoderado de soja e,particularmente, de seus derivados nãofermentados.

As nuvens negras nofirmamento da soja

Certamente, as estatísticas relativas àspropriedades nutrientes da soja confirmamseu papel como alimento/ingredientesaudável. De acordo com o USDA NutrientDatabase for Standard Reference, 100gramas de grãos de soja fornecem 36,5gramas de proteínas, 227 mg de cálcio,15,7 gr de ferro, 280 gr de magnésio, 704mg de fósforo, 1797 mg de potássio, 4,9mg de zinco, bem como vitaminas A, E, C,B

1, B

2, B

3, B

5, B

6 e ácido fólico. A soja

também contém constituintes bioativos, taiscomo as isoflavonas polifenólicas (200mg/100 gr –principalmente- genisteína edaidzeína) e várias saponinas conhecidaspelos seus efeitos quimioprotetores eantimutagênicos. O equivalente a meiaxícara de tofu fornece 40% dasnecessidades diárias (DV ou Daily Value)de proteínas, 25% da DV de cálcio, 87%(para as mulheres) e 130% (para oshomens) da DV de ferro. Infelizmente, essaverdadeira panacéia milagrosa não foi

suficiente para impedir, nos últimos anos,uma verdadeira inundação da imprensanorte-americana de informações anti-soja.

A soja sofreu seu primeiro forte ataqueem 17 de janeiro de 2006, quando a AHA(American Heart Association) emitiu umpress release declarando que: “A proteínade soja na dieta ou na forma de suplementonutritional apresenta pouco ou nenhumefeito sobre os fatores de risco de doençascardíacas...”. Um relatório revendo 22estudos anteriores mostra somente umaredução de 3% do LDL, e o mesmo relatórioquestiona os efeitos da soja em mulherespós-menopausais.

Essas novas declarações da AHAforam quase o oposto daquelas feitas noano 2000, quando a mesma associaçãosugeriu que a ingestão de proteínas de sojaem uma dieta com baixos teores degorduras saturadas e de colesterol eraprudente.

A nova posição da AHA é tambéminconsistente com relação a uma meta-análise de 23 estudos, publicada em 2005,pelo American Journal of Clinical Nutrition.Essa análise que envolve uma populaçãode 1400 pessoas, mostra uma redução de3,7% do colesterol total, de 5,25% do LDLe de 7,27% dos triglicerídeos, além de umaumento médio de 3% do HDL.

Fora essa inconveniente declaração daAHA, a maior parte dos outros ataquesencontrados na imprensa norte-americanaparece vir de um pequeno grupo deindivíduos focados em promover uma dietarica em laticínios e carnes vermelhas, aWeston Price Foundation.

Fundada em 1999 por Sally Fallon, MA(jornalista, chefe de cozinha, dona de casae ativista comunitária), e pela Dra. MaryGer trude Enig, PhD (bioquímica enutricionista), tem cerca de 50 membrosdiretivos e 200 capítulos disseminadosatravés dos Estados Unidos e outros países.Seus membros diretivos parecem constituiro que se poderia chamar de Who’s Whodos advogados anti-soja, encabeçadospelas duas fundadoras e pessoas tais comoKaayla T. Daniel, PhD e Joseph Mercola,

D.O. O livro Nourishing Traditions, escritopor Sally Fallon e publicado em 2000, foio primeiro a jogar sombra no assunto soja,aler tando para os perigos dovegetarianismo e os problemas com osalimentos modernos (e não os tradicionais,fermentados) à base de soja. O livro TheWhole Soy Stor y: the Dark Side ofAmerica’s Favorite Health Food, da Dra.Kaayla T. Daniel, publicado em 2005,literalmente explode os mitos ligados asoja: não é um alimento saudável, não é asolução para a fome no mundo, não é umapanacéia e, até mesmo, nem comprovouser um alimento seguro!

A medida que essas nuvens negrasvinham pairando através da mídia demassa, muitos especialistas em saúdevieram defender a soja, acusando aimprensa de exagerar e sensacionalizar osefeitos negativos da soja. Declarações demédicos famosos, como os Drs. DeanOrnish e James McDougall, atenuaram oimpacto das declarações anti-soja,lembrando aos consumidores a grandequantidade de estudos e trabalhoscientíficos confirmando os inúmerosbenefícios da soja. Outros especialistasvoltaram a confirmar o uso terapêutico dasoja em câncer de mama, menopausa,infer tilidade masculina, osteoporose esíndrome pré-menstrual (PMS).

É interessante observar que a maioriados cientistas concordam, tal como a Dra.Kaayla T. Daniel, que o calor e processa-

O livro O livro O livro O livro O livro The Whole Soy Story: the DarkThe Whole Soy Story: the DarkThe Whole Soy Story: the DarkThe Whole Soy Story: the DarkThe Whole Soy Story: the DarkSide of America’s Favorite HealthSide of America’s Favorite HealthSide of America’s Favorite HealthSide of America’s Favorite HealthSide of America’s Favorite Health

FoodFoodFoodFoodFood, da Dra. K, da Dra. K, da Dra. K, da Dra. K, da Dra. Kaayla Taayla Taayla Taayla Taayla T. Daniel,. Daniel,. Daniel,. Daniel,. Daniel,publicado em 2005.publicado em 2005.publicado em 2005.publicado em 2005.publicado em 2005.

Page 8: A SOJA: HISTÓRIA, TENDÊNCIAS E VIRTUDES - história, tendências... · SOJA 30 FUNCIONAIS & NUTRACÊUTICOS que eram plantas rasteiras que se desenvolviam ao longo de rios e lagos

SOJA

35

FUN

CIO

NA

IS &

NU

TRA

CÊU

TIC

OS

mento eliminam da soja muitos de seusefeitos inibidores de proteases (tripsina);também mencionam que uma grandequantidade de outros alimentos saudáveis,como grãos, legumes e vegetais comoespinafre, por exemplo, contêm quanti-dades variáveis de inibidores de tripsina.

O que essa tentativa de descrédito comrelação a soja teria a ver com o Dr. WestonAndrew Price? Nada. O Dr. Weston A. Price(1870-1948) foi um dentista e nutricionistaamador que proclamava que as doençasmodernas (cáries dentárias, dores decabeça e muitas outras) não aconteciamem culturas com dietas tradicionais, semalimentos industrializados, baseadas em ...carnes e laticínios. A Weston A. PriceFoundation nasceu para propagar as

pesquisas do Dr. Weston A. Price, as quaisrecomendavam uma dieta baseada emcarnes vermelhas e laticínios muitos anosantes das pesquisas científicas relacionareste tipo de dieta com doençascardiovasculares, câncer e outrosdistúrbios! Em 2003, o Departamento deCiências Nutricionais da Tufts Universityfez uma avaliação da qualidade dasinformações difundidas em websites: owebsite da Weston A. Price Foundationrecebeu a qualificação de unacceptable.O comentário a respeito foi o seguinte:“parece que selecionam estudos obscuros,ou fora do contexto atual, e usam fatosnão-documentados de suas própriaspublicações...”. A Tufts University tambémobservou que a posição da Weston A. Price

Foundation a respeito da alimentaçãoinfantil com leite de vaca puro é totalmentedesencorajada pela American Academy ofPediatrics. Não se trata, então, de umainstituição avalizada para emitircomentários anti-soja.

Quando a The Solae Company decidiuretirar, no início de 2005, uma petição juntoa FDA de reivindicação de benefícios/propriedades da soja com relação aprevenção de câncer, os membros daWeston A. Price Foundation, mais uma vez,deturparam o fato ao seu favor. Narealidade, conforme comentários do Dr.Greg Paul, diretor de Saúde & Nutriçãoda The Solae Company, a petição foiretirada para ser melhorada a luz de novose recentes estudos, para dar-lhe maior

As estatísticas relativas às propriedades nutrientes da sojaconfirmam seu papel como alimento/ingrediente saudável.

Page 9: A SOJA: HISTÓRIA, TENDÊNCIAS E VIRTUDES - história, tendências... · SOJA 30 FUNCIONAIS & NUTRACÊUTICOS que eram plantas rasteiras que se desenvolviam ao longo de rios e lagos

SOJA

36

FUN

CIO

NA

IS &

NU

TRA

CÊU

TIC

OS

chance de sucesso. Em particular, o Dr.Greg Paul menciona que existem algumassimilaridades entre as reivindicaçõesrelativas a soja vs. câncer e aquelasapresentadas para o chá verde vs. câncer.Assim, os 60 estudos que confirmam a forteevidência de uma relação entre consumode soja e uma diminuição do risco dedesenvolvimento de cer tos tipos decânceres, nos quais a The Solae Companyestava se apoiando, estão sendocomplementados e fortalecidos a luz denovas pesquisas. No devido tempo, umanova petição, reestruturada de forma amelhor atender a sistemática de análise daFDA, deverá ser reapresentada.

A forte ligação epidemiológica entrecâncer de mama e populações que sãograndes consumidoras de soja foi confirmadaem diversos estudos e possíveis influênciasgeográficas foram eliminadas em um estudode 2002 com 1095 mulheres asiáticasamericanas do Condado de Los Angeles. Oestudo confirmou que mulheres que comeramsoja quatro vezes por semana ou mais durantesua adolescência e fase adulta tinham 50%menos probabilidade de desenvolver umcâncer da mama.

Mais recentemente, o Journal of theAmerican Medical Association apresentouum estudo da University of Texas que indicaque, comendo alimentos que contenhamfitoestrógenos, reduz o risco de desenvolvercâncer dos pulmões, mesmo em fumantes!

Outra ataque sensacionalista contra asoja está relacionado a presença dehemaglutina, substância que promove acoagulação, levando os glóbulos ver-melhos do sangue a se aglutinarem. Essascélulas aglutinadas não são capazes deabsorver corretamente o oxigênio paradistribuí-lo nos tecidos corporais e nãopodem ajudar a manter uma boa saúdecardíaca. Essas afirmações foram recen-temente rechaçadas por uma pesquisademonstrando a habilidade das isofla-vonas da soja em reduzir a agregaçãoplaquetária e aglutinação sangüínearelacionadas com infar to e ataquecardíaca. Esse estudo randomizado, duplo-cego e cont rolado com placebo foiconduzido em uma amostra de 29 mulheresem estado pós-menopausal e com idademédia de 53 anos. Foi efetuada porpesquisadores do Instituto de Nutrición y

Tecnología de los Alimentos, da Universidadde Chile, e conclui que as isoflavonas desoja daidzeína e genisteína diminuem adensidade do receptor TxA2, o que reduzo risco de trombogênese.

Os advogados anti-soja usamamplamente esses avisos emitidos pordiversos governos como sendo umaconfirmação dos perigos de disrupçãoendócrina em crianças. É nos Estados Unidosque ocorre a maior incidência de criançasalimentadas com produtos formulados comsoja; cerca de 36% (aproximadamente 1,4milhão por ano) das crianças recebem, emalgum momento, alimentos formulado à basede soja. Em 2004, o Journal of Nutritionpublicou uma análise relativa a 56 relatórios,a maior parte deles examinando os efeitosda soja sobre as crianças e seudesenvolvimento. Nutrição, taxas decrescimento, taxas de hospitalização,desenvolvimento do aparelho reprodutor,neurofisiológico, do sistema imune eendócrino foram todos examinados. Essaanálise conclui que enquanto as formulaçõesà base de soja para crianças têm passadopor melhorias contínuas para assegurar suatotal segurança alimentícia, não seencontrava nenhuma evidencia conclusiva,tanto em populações animais quantohumanas, que uma alimentação à base desoja tenha gerado efeitos adversossignificativos e que todos os relatórios clínicosdisponíveis comprovam um crescimento edesenvolvimento normal em adultos que foramalimentados quando crianças, com fórmulasinfantis à base de soja.

Mais ilustrativa ainda é um estudo deacompanhamento da Universit y ofPennsylvania –School of Medicine, datadade 2001, que entrevistou em profundidade ecomparou 811 adultos (238 dos quaisconsumiram fórmulas infantis à base de sojaquando crianças) e não encontrou nenhumaconseqüência de saúde significativadecorrente de uma dieta infantil baseadaem soja.

Em resumo, a controvérsia quanto aosbenefícios da soja tem tirado bastantefôlego do crescimento que vinhaconhecendo o mercado dos produtosderivados da soja, nos Estados Unidos.Para muitos existem hoje dúvidas que nãoexistiam antes, mas, de forma geral, aindústria da soja continua crescendo,

embora em um ritmo que não tem mais osfamosos dois dígitos que vinha tendo atéentão.

Os componentesda soja

A composição do grão de soja podevariar bastante dependendo da variedade edas condições de crescimento, mas um grãotípico contém de 35% a 40% de proteína,15% a 20% de gordura, 30% de carboidratos,10% a 13% de umidade e cerca de 5% deminerais e cinzas (ver Quadro 2).

A proteína de soja. A proteína de soja. A proteína de soja. A proteína de soja. A proteína de soja. Contém os oitoaminoácidos essenciais para a saúdehumana, porém até recentemente admitia-se que a proteína de soja tinha qualidadeinferior a muitas proteínas de origem animal.Essas conclusões eram baseadas em ummétodo antigo de se calcular a qualidadede proteínas, a taxa de eficiência protéica(TEP) ou, em inglês, PER (Protein EfficiencyRatio), calculado a par tir da taxa decrescimento de ratos medidos em testeslaboratoriais. Acontece que os ratosnecessitam 50% mais metionina - um dosaminoácidos encontrados na soja - que oshumanos, tornando, assim, esse métodoinapropriado para avaliar a qualidadeprotéica da soja para consumo humano.Assim, a WHO e a FDA passaram a adotaroutro método para avaliar a qualidadeprotéica chamado de PDCAAS (ProteinDigestibility Corrected Amino Acid Score)ou pontuação de aminoácidos corrigidapela digestibilidade de proteínas. OPDCAAS é baseado em um método depontuação de aminoácidos, comparandoo per fil de aminoácidos do alimentoprotéico de teste ao padrão deaminoácidos de dois a cinco anos de idadeda FAO/WHO. Esse padrão é usadoporque ult rapassa os padrões denecessidade em aminoácidos de criançasmais velhas e adultos. O aminoácido maislimitante é usado para determinar apontuação de aminoácidos não corrigida,e esse número multiplicado peladigestibilidade do alimento é o PDCAAS.Nenhuma proteína pode ter um PDCAASmaior que 1,0 e, usando esse método, asproteínas de soja geralmente recebem umapontuação entre 0,95 e 1,00.

O óleo dO óleo dO óleo dO óleo dO óleo de soja.e soja.e soja.e soja.e soja. Comparado com

Page 10: A SOJA: HISTÓRIA, TENDÊNCIAS E VIRTUDES - história, tendências... · SOJA 30 FUNCIONAIS & NUTRACÊUTICOS que eram plantas rasteiras que se desenvolviam ao longo de rios e lagos

SOJA

37

FUN

CIO

NA

IS &

NU

TRA

CÊU

TIC

OS

outros cereais e grãos, a soja contém umamaior quantidade de gordura. Nocomposto lipídico extraído do produtomacerado e que representa 14% a 20% dacomposição nutricional da soja, encontra-se a predominância de poliinsaturados(58%), monoinsaturados (23%) e poucaparticipação de saturados (15%). O óleode soja é amplamente utilizado na indústriaalimentícia, na dietoterapia hospitalar e noconsumo domiciliar, possui altaconcentração de ácidos graxos linoléicos(51%). Ademais, contém até 8% de ácidoα-linolênicos, que é um ácido graxoOmega-3, o qual é geralmente consideradocomo benéfico na diminuição dos riscosde doenças cardíacas.

Carboidratos e fibras.Carboidratos e fibras.Carboidratos e fibras.Carboidratos e fibras.Carboidratos e fibras. A soja contém

um mix de carboidratos solúveis e insolúveisque, juntos, constituem cerca de 30% desua composição nutricional. Os principaiscarboidratos solúveis são açúcares:stachiose, raf inose e sucrose. Juntos,representam cerca de 1/3 dos carboidratostotais da soja, mas, novamente, esse valorpode variar dependendo do tipo de soja edos fatores ou condições de crescimento.A rafinose e stachiose, os principaisaçúcares complexos da soja, sãointeressantes porque não são digeridos ouusados diretamente como nutrientes pelocorpo humano, mas são usados comonutrientes pela bifidobactéria bifidus nointestino delgado. Esse tipo de f loraintestinal é considerado importante para asaúde humana. Acredita-se que sua

presença pode reduzir a incidência decâncer do cólon e outros distúrbiosintestinais; por outro lado, quando abactéria se decompõe, ocorre a geraçãode um subproduto. As moléculas não hidroli-sadas são fermentadas anaerobicamentepor alguns microorganismos presentes nocólon, e o processo libera gases como oCO

2, H

2, CH

4 e traços de H

2S, gerando

desconforto e flatulência. Os carboidratosinsolúveis, ou fibras dietéticas, vêmprincipalmente da parte externa da cascae das paredes celulares estruturais do grãoe são compostas de celulose, hemicelulosee pectina. Esses compostos contribuem aoaspecto global de saudável da soja, já queo consumo diário de adequadasquantidades de fibra dietética pode reduziros riscos de doenças cardíacas e câncer,bem como melhorar o funcionamento dotrato intestinal.

Vitaminas e minerais.Vitaminas e minerais.Vitaminas e minerais.Vitaminas e minerais.Vitaminas e minerais. A soja é rica emvitaminas, minerais e outros valiososfitoquímicos. Os principais compostosminerais da soja são: o potássio, o sódio,o cálcio, o magnésio, o enxofre e o fósforo.Aqui, mais uma vez, convém salientar queessa composição em minerais irá variarsignificativamente dependendo do tipo desoja, das condições de crescimento e,particularmente, do tipo de solo. Emborao grão de soja não seja considerado comouma fonte muito rica de vitaminas contribuiao bem-estar nut ricional global. Asvitaminas hidrossolúveis encontradas nasoja são a tiamina, riboflavina, niacina,ácido pantotênico, biotina, ácido fólico,inositol e colina. Parte integral da lecitina,a colina é conhecida pelos cientistas háanos e tem sido chamada “a mais novavitamina”. A National Academy of Sciences(NAS), dos Estados Unidos, a reconheceucomo um nutriente essencial em 1998. É oúnico componente dietético na categoria

QUADRO 2 - COMQUADRO 2 - COMQUADRO 2 - COMQUADRO 2 - COMQUADRO 2 - COMPOPOPOPOPOSIÇÃO DA SOJASIÇÃO DA SOJASIÇÃO DA SOJASIÇÃO DA SOJASIÇÃO DA SOJA

MineraisMineraisMineraisMineraisMinerais VitaminasVitaminasVitaminasVitaminasVitaminas Fibra Alimentar *Fibra Alimentar *Fibra Alimentar *Fibra Alimentar *Fibra Alimentar *Energia Umidade Proteínas Lipídios Carboidratos Cinzas Ca P Fe Na K Mg Zn Cu A E B1 B2 Niacina Solúveis Não Totais

Açucares H20 Solúveis

fibras H20

Kcal g/100g g/100g g/100g mg/100g ug/100 g u/100g mg/100g g/100g

417 11,0 38,0 19,0 23,0 | 4,0 5,0 240 580 9,4 1,0 1900 220 3200 980 12 1,80 0,83 0,30 2,2 1,8 15,3 17,1

* A fibra alimentar é constituída pelo teor das fibras propriamente ditas e pelo teor dos carboidratos insolúveis

Fonte: KAWAGA, 1995 - KAGAWA, A. ed. Standard table of food composition in Japan. Tokyo: University of Nutrition for women, 1995. p. 104-105.

Page 11: A SOJA: HISTÓRIA, TENDÊNCIAS E VIRTUDES - história, tendências... · SOJA 30 FUNCIONAIS & NUTRACÊUTICOS que eram plantas rasteiras que se desenvolviam ao longo de rios e lagos

SOJA

38

FUN

CIO

NA

IS &

NU

TRA

CÊU

TIC

OS

de vitamina a ser reconhecido como tal. ANAS recomenda que os homens consumam550 mg por dia, e as mulheres, 425 mg. Acolina pode afetar positivamente odesenvolvimento cerebral -incluindo amemória por toda a vida- saúdecardiovascular, função hepática edesenvolvimento reprodutivo. Nos EstadosUnidos, desde 2001, a FDA autoriza osprocessadores de alimentos a colocaralegações específicas para a colina; paraa alegação no rótulo de “Boa fonte decolina”, um alimento ou suplemento precisaconter 55 mg de colina por porção, e 110mg por porção para fazer a alegação de“Excelente fonte de colina”. Esses níveis sãode 10% e 20%, respectivamente, da ingestãoadequada (550 mg) de colina estabelecidapelo Comitê de Avaliação Científica deIngestões Dietéticas de Referência doConselho de Alimentos e Nutrição, partedo Instituto de Medicina Americano daAcademia Nacional de Medicina.

As vitaminas lipossolúveis são asvitaminas A e E. A provitamina A (beta-caroteno) está presente em maioresquantidades no grão de soja não maduro(verde) do que no grão já maduro, seco.Os tocoferóis presentes no óleo de sojatêm dois papéis importantes; primeiro, avitamina E é um elemento importante danutrição humana, embora suas proprie-

dades bioativas tenham sido estudadas emprofundidade nos últimos anos e asalegações quanto aos benefícios que traza saúde continuem não comprovadas.Segundo, os tocoferóis são antioxidantese, como tais, sua presença no óleo de sojafreia o processo de degradação do óleo.

IsofIsofIsofIsofIsoflavonas.lavonas.lavonas.lavonas.lavonas. Ao lado das vitaminas evegetais que a soja - como qualquer outrovegetal - tem, contém também umavariedade de substâncias não nutritivasbiologicamente ativas. Certamente, érazoável pensar que, juntos, essescomponentes (nutrientes e não nutrientes)são responsáveis pelos hipotéticosbenefícios à saúde que os alimentos à basede soja propiciam.

Porém, várias evidências sugerem queuma categoria em particular de compo-nentes - as isoflavonas - é responsável pormuitos destes benefícios, embora a proteínaseja necessária no caso de redução deíndice de colesterol.

As isoflavonas são classificadas comofitoestrógenos porque ligam-se à receptoresde estrógeno, mas são moléculasextremamente complexas que não somentediferem do estrógeno como tambémapresentam propriedades não hormonaispotencialmente importantes. Ademais, emcomparação com os receptores α deestrógeno, as isoflavonas se ligam e ativam,

preferencialmente, os receptores β deestrógeno (ERβ). Essa ligação preferencialdas isoflavonas com os ERβ contribuiprovavelmente à evidência, sugerindo queas isof lavonas funcionam comomoduladores seletivos de receptores deestrógeno.

As propriedades de “parecido comoestrógeno” (“estrogen-like”) das isoflavonasfizeram com que estejam sendo vistascomo possíveis alternativas a terapiahormonal convencional e, por esta razão,muitas mulheres atravessando a fase damenopausa estão sendo atraídas pelosalimentos à base de soja.

As isoflavonas são também conside-radas f itoestrógenos ou estrogêneosvegetais, porque apresentam configuraçãoquímica e efeitos similares sobre o corpohumano que os estrógenos, a grandediferença é que os efeitos estrogênicos dasisof lavonas de soja são muito(provavelmente cerca de 10.000 vezes)mais fracos que a hormona estrógenahumana.

As isoflavonas estão presentes emmuitos vegetais, porém o grão de soja é oúnico alimento comumente consumido quecontém quantidades nutricionalmenterelevantes dessas moléculas (ver Figura 1).

As isof lavonas são compostospertencentes ao grupo dos flavonóides,

Page 12: A SOJA: HISTÓRIA, TENDÊNCIAS E VIRTUDES - história, tendências... · SOJA 30 FUNCIONAIS & NUTRACÊUTICOS que eram plantas rasteiras que se desenvolviam ao longo de rios e lagos

SOJA

39

FUN

CIO

NA

IS &

NU

TRA

CÊU

TIC

OS

que se caracterizam por apresentarestrutura polifenólica, com dois anéis debenzeno (A) ligados a um terceiro anel (B)na posição do carbono 3. As isoflavonascompreendem as agliconas daidzeína,genisteína e gliciteína, os respectivosβ-glicosídios e os conjugados malonil-glicosídios e acetil-glicosídios. A genisteínatem mostrado indícios promissores naprevenção e no tratamento de cânceres da

próstata e das mamas. Embora a gliciteínarepresente somente 5% a 10% dasisoflavonas da soja, estudos recentessugerem que ela possa ter umaestrogenicidade e biodisponibilidade muitomaior que a genisteína ou a daidzeína.

A concentração de isoflavonas nosgrãos de soja é geneticamente controladae influenciada pelas condições ambientais,sendo a temperatura durante o desenvol-

vimento do grão o fator mais importante; asoja plantada em regiões com temperaturasmédias de 20oC apresentam concentraçãomédia de isoflavonas de 147,8 mg/100 g(FTAbyara) e 180,1 mg/100 g (IAS 5) e,quando plantadas em regiões comtemperatura média de 25oC apresentam73,5 mg/100 g e 85,5 mg/100 g,respectivamente (ver Figura 2).

A presença e a concentração das

A soja que, no mundo ocidental, atépouco tempo atrás servia para produziróleo e alimentar animais, tornou-se em

pouco tempo a coqueluche dosnutricionistas do século XXI.

Page 13: A SOJA: HISTÓRIA, TENDÊNCIAS E VIRTUDES - história, tendências... · SOJA 30 FUNCIONAIS & NUTRACÊUTICOS que eram plantas rasteiras que se desenvolviam ao longo de rios e lagos

SOJA

40

FUN

CIO

NA

IS &

NU

TRA

CÊU

TIC

OS

isoflavonas nos produtos à base de sojadepende das condições de processamento,principalmente a temperatura de tra-tamento do material. De forma geral, sãoos produtos de soja menos processadosque apresentam os maiores níveis deisoflavonas: farinha de soja integral, tofu eleite de soja. Produtos não-fermentados têmconcentrações de isoflavonas duas a trêsvezes maiores que produtos fermentados,entretanto, a distribuição dos constituintesdifere nestes dois grupos: produtosfermentados apresentam predominante-mente agliconas, enquanto os produtosnão-fermentados apresentam maioresconcentrações de β-glicosídios.

O grão de soja contém aproxima-damente 1,2 a 3,3 mg de isoflavonas (porgrama de peso seco), e cada grama deproteína em alimentos tradicionais à basede soja é associada com cerca de 3,5 mgde isoflavonas; mas, como já mencionado,o processamento pode afetar grandementea quantidade total e o perfil de distribuiçãodas isof lavonas em suas formasconjugadas (malonil, acetil e β-glicosídeos)e agliconas. O tratamento com etanol 60%praticamente não altera o per f il dedistribuição do concentrado protéico e de

seu sobrenadante. Tratamentos com ácidopromovem hidrólise, aumentando o teor dasisoflavonas agliconas. As maiores perdasde isoflavonas nos processos estudadosocorrem nos sobrenadantes: 90% paraprocesso de obtenção de concentradoprotéico, com etanol 60%; 52% para oprocesso de obtenção de isolado protéico,e 47% para o processo de obtenção deconcentrado protéico isoelétrico. O teorde isoflavonas na maioria dos alimentos àbase de soja varia de 100 a 300 mg/100 g(ver quadro 3).

ConclusõesÉ interessante observar como um

produto que, no mundo ocidental, atépouco tempo atrás somente servia paraproduzir óleo e, com o bagaço, alimentaranimais, e mesmo assim com ressalvas,tornou-se em pouco tempo a coqueluchedos nutricionistas do século XXI. Em poucomais de 30 anos, a soja ganhou imensodestaque, pois alguns estudos apontamuma série de potenciais benefícios para asaúde. Não se pode, porém, esquecer ofato que estão presentes na soja dois gruposde inibidores de proteases e que algunsestudos demonstram que o tratamento

térmico pode não ser suficiente para ainativação completa desses antinutrientes.Esses inibidores podem afetar adigestibilidade da proteína e a absorção ebiodisponibilidade de alguns minerais,como o ferro, por exemplo. Também nãose pode dizer, sem as devidasconsiderações, que a soja é consumida hámilhares de anos pelos povos asiáticos; sim,é consumida, porém na maioria dos casosna forma de produtos fermentados (natto,miso, tempeh, molhos, tofu e leite de sojafermentados) e, como parte de uma dietaalimentar rica em vegetais, ou seja,totalmente diferente das dietas ocidentais.

Os avanços tecnológicos queocorreram no processamento da sojaeliminaram total ou parcialmente osantinutrientes e é indiscutível que asisoflavonas são altamente benéficas paraa saúde. O que também deve-se ter emmente são os interesses econômicosgigantescos que estão em jogo e o fatoque é muito mais interessante fazer crescera demanda dos derivados de re-processamento - após extração de óleo -,para consumo humano, do quesimplesmente repassar tortas e farelos parao mercado de nutrição animal.

QUADRO 3 - CONTQUADRO 3 - CONTQUADRO 3 - CONTQUADRO 3 - CONTQUADRO 3 - CONTEÚDO EM ISOFLEÚDO EM ISOFLEÚDO EM ISOFLEÚDO EM ISOFLEÚDO EM ISOFLAAAAAVVVVVONAONAONAONAONAS (PESO AS (PESO AS (PESO AS (PESO AS (PESO AGLICONA) DE ALGUNS ALIMENTOGLICONA) DE ALGUNS ALIMENTOGLICONA) DE ALGUNS ALIMENTOGLICONA) DE ALGUNS ALIMENTOGLICONA) DE ALGUNS ALIMENTOSSSSS

AlimentosAlimentosAlimentosAlimentosAlimentos Conteúdo em isofConteúdo em isofConteúdo em isofConteúdo em isofConteúdo em isoflavonaslavonaslavonaslavonaslavonas(((((NutNutNutNutNutrient Database Numberrient Database Numberrient Database Numberrient Database Numberrient Database Number))))) AmosAmosAmosAmosAmostttttrasrasrasrasras (mg/1(mg/1(mg/1(mg/1(mg/100 g d00 g d00 g d00 g d00 g de porção comese porção comese porção comese porção comese porção comestível)tível)tível)tível)tível)

MédiaMédiaMédiaMédiaMédia MínimoMínimoMínimoMínimoMínimo MáximoMáximoMáximoMáximoMáximo

TofuFirme (16126) 6 24,7 7,9 34,6Regular (16427) 4 23,6 5,1 33,7Sedoso (16162) 2 27,9 23,8 32,0

Natto (16113) 5 58,9 46,4 87,0

Leite de soja (16120) 14 9,7 1,3 21,1

Miso (16112) 7 42,6 22,70 89,2

Tempeh (16114) 6 43,5 6,9 62,5

Grãos torradas e salgados, 7 128,4 1,66 201,9

aperitivo/amendoim (16111)

Grãos, cozidos (16109) 1 54,7 NA NA

Proteína isolada de soja (16122) 14 97,43 46,5 199,3

Proteína concentrada de soja 3 102,1 61,2 167,0(lavada em água) (99060)

Proteína concentrada de soja 5 12,5 2,1 31,8(lavada em álcool) (16121)

Fonte: U.S. Department of Agriculture, Washington, D.C. (ht tp://www.nal.usda.gov/fnic/foodcomp/index.html).