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A Roma antiga e seu Poder Militar II- 1 PARTE I VISÃO GERAL DA ROMA ANTIGA

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Parte I do estudo sobre o Poder Militar da Roma Antiga

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A Roma antiga e seu Poder Militar

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PARTE IVISÃO GERAL DA ROMA ANTIGA

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SUMÁRIO

Prefácio II-05Capítulo 1 - A Itália pré-romana e os etruscos II-07Capítulo 2 - A fundaão de Roma ii-09Capítulo 3 – Os reis de Roma II-11Capítulo 4 – A sociedade real II-13Capítulo 5 – O início da República II-14Capítulo 6 – O conflito das ordens II-16Capítulo 7 – A expansão romana na Itália II-18Capítulo 8 – A confederação romana na Itália II-20Capítulo 9 – O cenário internacional às vésperas da expansão romana II-22Capítulo 10 – Cartago e a Primeira Guerra Púnica II-23Capítulo 11 – A Segunda Guerra Púnica (ou a guerra de Aníbal) II-26Capítulo 12 – Roma no Mediterrâneo oriental II-30Capítulo 13 – Esclarecendo o nascimento do Império romano II-32Capítulo 14 – O “conquistador capturado” – Roma e o helenismo II-34Capítulo 15 – O governo da República romana, Parte I - O Senado e os magistrados II- 36Capítulo 16 - O governo da República romana, Parte II – Assembléias populares e administrações provinciais II-39Capítulo 17 – As pressões do Império II-41Capítulo 18 – Os irmãos Graco II-43Capítulo 19 – Mário e Sulla II-45Capítulo 20 – “As regras da realeza de Sulla” II-47Capítulo 21 – O desfazimento da legislação de Sulla II-49Capítulo 22 – Pompeu e Crassus II-51Capítulo 23 – O Primeiro Triunvirato II-53Capítulo 24 – Pompeu e César II-55Capítulo 25 – “A dominação de César” II-58Capítulo 26 – A vida social e cultural no final da República II-60Capítulo 27 – Antônio e Otaviano II-62 Capítulo 28 – O Segundo Triunvirato II-64Capítulo 29 – Otaviano emerge como supremo II-66Capítulo 30 – A nova ordem de Augusto II-68Capítulo 31 – A sucessão imperial II-71Capítulo 32 – A dinastia Júlio-Claudiana II-74Capítulo 33 – O imperador no mundo romano II-76Capítulo 34 – A crise do terceiro século II-78Capítulo 35 – A forma da sociedade romana II-80Capítulo 36 – Escravidão romana II-82Capítulo 37 – A família II-84Capítulo 38 – A mulher na sociedade romana II-86Capítulo 39 – Um Império de cidades II- 89Capítulo 40 – Entretenimento público, Parte I – Os banhos romanos e as corridas de bigas II-91Capítulo 41 – Entretenimento público, Pate II – Jogos gladiatoriais II-93

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Capítulo 42 – O paganismo romano II-96Capítulo 43 – O surgimento do cristianismo II-100Capítulo 44 – A restauração da ordem II-102Capítulo 45 – Constantino e o final do Império romano II-105Capítulo 46 – Pensamentos sobre s “queda” do Império romano II-108

Apêndice 1 – Cronologia II-110Apêndice 2 – Glossário de expressões e termos pertinentes à Roma antiga II-118

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PREFÁCIO

Por que estudar a Roma Antiga? A herança de Roma Antiga é enorme. A influência que Roma exerceu sobre as idades posteriores, como ilustrado pelos Grand Tours que foram realizados desde a Renascença através do século XIX, foi profunda e contínua.

O legado romano para o mundo moderno, em várias esferas, é inestimá-vel. De Roma herdamos, entre outras coisas, uma reverência pelas leis. A Igre-ja Católica Romana é outra importante manifestação de Roma no mundo moderno.

As imagens e temas da história romana e sua cultura continuam a influenciar a cultura moderna. Roma é uma história interessante de se estudar devido aos seus pa-drões de mudança. A cultura popular moderna continua a ser dominada pelas imagens e temas extraídos do mundo pagão romano: o assassinato de Julius Caesar; o incêndio de Roma por Nero; e os combates de gladiadores até a morte, ante o clamor das multidões.

A sociedade romana mudou muito no decorrer de sua longa duração: evoluiu de uma monarquia para uma República, para depois voltar para uma monarquia; ela mudou do paganismo a um império cristão; e, culturalmente, evoluiu de um lugar rústico e bruto para um outro sofisticado e helenizado.

O longo período de sobrevivência de Roma, juntamente com os seus processos de mu-dança, tornam a história de Roma, mais dinâmica e variada do que qualquer outro Estado antigo.

Nesta série de capítulos subsequentes serão delineados os pricipais eventos da história romana nas esferas políticas, militares e sociais. Um pou-co de atenção também será dado aos assuntos culturais, onde pertinente.

Por “Roma antiga”, entende-se um período que medeia de cerca de 1.000 AC a 500 DC. O estudo foca, especialmente, o período por volta de 300 AC a 300 DC. A antiguidade tardia (300 a 500 DC) é tratada apenas brevemente, enquanto que o período bizantino (300 a 1453 DC) não foi enfocado. Em termos geográficos, examinaremos a expansão de Roma, desde uma pequena aldeia na encosta de uma colina com vista para o rio Tibre, até o colosso que dominou a bacia do Mediterrâneo e o noroeste da Europa por um milênio.

A história antiga não é como a história moderna, que a maioria das pessoas conce-bem como uma história “típica” — uma combinação de fatos sobre o passado e a interpre-tação desses fatos. A história antiga sofre uma escassez relativa de evidências (provas).

Fig 01 – O arco de Septimius Severus no Forum romano

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O corpo da antiga evidência disponível para nós é finita, bem conhecida, desigual e muitas vezes contraditória. Isso faz com que o estabelecimento de fatos básicos exija um esforço muito maior e mais difícil do que na história moderna.

Devido à escassez de evidências, a abrangência da interpretação torna-se extre-mamente ampla na história antiga. O corpo circunscrito às provas antigas fica sujeito a interpretações e reavaliações constantes. Frequentemente, resumem-se, meramente, a concorrentes reconstruções e interpretações, sem nenhuma maneira clara para se decidir entre eles. Existem poucas respostas “corretas” para os problemas pertinentes à história antiga. Mas é precisamente isso o que a torna um empreendimento tão fascinan-te e emocionante.

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Capítulo 1A ITÁLIA PRÉ-ROMANA E OS ETRUSCOS

Os romanos não foram os primeiros povos a habitar a península itálica. Também não fo-ram as primeiras pessoas a se tornarem poderosas ou influentes dentro da península italiana.

A geografia da Península Itálica ofereceu muitos benefícios para seus habitan-tes. A península é bem regada e bem dotada com recursos naturais. Os Alpes no nor-te e os Apeninos balizam o centro da Itália, fornecendo-lhes nascentes, córregos e rios mais do que suficientes para abastecer os habitantes. Os maiores rios da Itália e que serão objeto das questões em causa, são os rios Pó e Arno no norte e o Tibre na Itália central. A natureza montanhosa do país garantiu uma abundância em ma-deira e minérios para os italianos antigos, além de pasto para as ovelhas e cabras.

As planícies da península são férteis. As três principais planícies da Itália são as do vale do rio Pó no norte, a planície do Lácio, em torno de Roma e a Campânia, perto de Nápoles. A Campânia, em particular, com seu solo vulcânico, seu clima agra-dável e suas termas naturais, estava destinada a tornar-se um local popular de prazer para a elite romana. A planície do Lácio, na extremidade norte, onde corre a calha do rio Tibre e o sítio de Roma, está rodeada pelo mar a oeste e por montanhas a leste.

Uma série de baixas colinas (colinas Albanas) está localizada no centro da pla-nície. Todas estas planícies são férteis. Na época da expansão romana na Itália, todas elas foram habitadas por pessoas que ali se estabeleceram para praticar a agricultura.

Com exceção dos colonizadores gregos e etruscos, a Itália pré-romana foi habi-tada por povos tribais não urbanizados. As culturas tribais da Itália pré-romana são de difícil estudo. A arqueologia mostra que a Itália teve habitantes humanos tão cedo quanto a idade da pedra. As fontes literárias ficam disponíveis somente no Século V AC, mo-mento em que as culturas tribais, imediatamente pré-romanas da Itália, já existiam há 500 anos ou mais. A situação antes de 400 AC, portanto, é muito difícil de reconstruir

Fig 02 - Monte Vesúvio, a fonte da fertilidade do solo vulcânico da Campania.

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A Itália tribal pré-romana era um mosaico de línguas e culturas. A arqueologia e a linguística são nossas principais avenidas para estudar este período: duas chaves arqueo-lógicas são os estilos de enterros e a cerâmica e, pelo menos, 40 línguas e dialetos foram determinados. Uma ampla divisão parece ter existido entre os agricultores que se estabele-ceram nas planícies e seus vizinhos ameaçadores, que tinham as montanhas como moradia.

A situação em 400 AC era a que se segue, do norte para o sul: os gaule-ses celtas tinham o controle do vale do Pó; os etruscos ficavam para o sul; depois vi-nham os romanos e os latinos; os oscos e samnitas controlavam a Itália central e partes da Campânia; e, finalmente, os gregos que eram encontrados no sul. Os gre-gos e os etruscos eram culturas urbanizadas. As colônias gregas na Itália estavam localizadas centradas em cidades costeiras, notadamente em Nápoles e Tarento.

Os etruscos também eram um povo urbanizado e muito influenciados pe-los gregos (i.e., helenizados). As origens dos etruscos não são claras. Nenhu-ma literatura etrusca sobreviveu; houve contos romanos, mais tarde, sobre eles, mas, de uma maneira geral, eles são estudados através da arqueologia, que men-ciona fontes gregas e inscrições sobreviventes na sua língua mal-compreendida.

Eles podem ter sido migrantes provenientes do Mediterrâneo Oriental. Mais pro-vavelmente, eles eram uma cultura nativa italiana (chamada Villanovan) que se tornou urbanizada por volta de 800 a 700 AC, talvez através do contato com os gregos. Eles não eram um povo unificado politicamente mas foram muito influenciados na Itália. Eles tinham uma chamada Liga das Doze Cidades, que muitas vezes entravam em guerra umas contra as outras. Eles eram unidos pela língua e pela religião, e estas cidades, ocasionalmente, poderiam trabalhar em conjunto. Originalmente, foram governadas por reis, e muitas cida-des etruscas tornaram-se oligarquias, governadas pelos conselhos das principais famílias.

A natureza do controle etrusco na Itália não é clara. Eruditos anteriores imagi-naram a existência de uma espécie de Império etrusco na Itália, que se estendia des-de o vale do pó até a Campânia. Esse império entrou em colapso nos séculos V e IV AC, em razão da resistência dos gregos no sul e das incursões dos gauleses ao nor-te. Mais recentemente, tem sido proposto que havia uma esfera mais solta da in-fluência etrusca, predominantemente no plano cultural; não houve nenhum Império Etrusco. Este debate afeta como os historiadores leram o início da história de Roma, particularmente a questão da Roma Etrusca, sob a égide dos reis do passado.

Os etruscos foram absorvidos pelos romanos, mas eles influenciaram, fortemen-te, a cultura romana. As principais áreas da influência etrusca sobre os romanos esta-vam na religião e na arte de governar, mas também na arquitetura. Do final do Século III ACD em diante, os etruscos foram completamente absorvidos pelo Estado romano, e pela era dos imperadores, quando eles deixaram de existir como um grupo cultural distinto.

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Capítulo 2A FUNDAÇÃO DE ROMA

Mais tarde, os romanos preservaram dois contos sobre a origem de seu povo e da sua cidade. Ambos são conhe-cidos para a maioria das pessoas. Uma delas envolve os gêmeos Rómulo e Remo. A outra envolve o herói troiano Enéias.

A história de Rômulo e Remo — sua fuga da morte como infantes e sua fundação de Roma — tem característicos elementos folclóricos que suge-rem ser a origem de Roma muito antiga. Já a história de Enéias, como funda-dor de Roma, por outro lado, deriva de uma fonte helenizada, que remete às len-das gregas, mas é provavelmente mais velha do que muitos têm assumido ser.

Nesta história, Enéias, o único sobrevivente de Tróia, teria vagado pelo Mediterrâneo antes de se estabelecer na Itália em Lavínio, onde fundou uma cidade. As duas histórias foram unidas em uma única tradição que tornou Romulus e Remo como descendentes de Enéias. Assim, Enéias teria fundado o povo romano e Rômulo e Remo fundaram a cidade de Roma.

Evidências arqueológicas sugerem que o assentamento em Roma começou no iní-cio de 1.500 AC, mas não oferece qualquer evidência que contradiga, substancialmente, as lendas antigas. O local de Roma era vantajoso; ele dominava o vale do rio Tibre, próxi-mo a uma ilha existente no curso d’água. De lá, poder-se-ia controlar o tráfico de norte a sul entre a Etrúria e o Lácio e, de leste a oeste, o tráfico desde o interior até a costa litorâ-nea. Era montanhosa, defensável e bem regada. Os sinais de início de habitação humana (ou seja, fragmentos de cerâmica) datam de cerca de 1.500 AC, com o primeiro assenta-mento permanente, como indicado por túmulos, tendo sido fundado em cerca de 1.000 AC

Originalmente e até o Sec VIII AC, Roma foi uma série de pequenas aldeias separa-das e assentadas nas colinas vizinhas; provas desses assentamentos foram encontradas. Em algum momento — as datas são impossíveis de se estabelecer — estas comunidades se uniram em uma única comunidade, e Roma, como uma entidade, nasceu. Espetacula-res achados no Monte Palatino, em Roma, na década de 1.930, revelaram restos de ca-banas de madeira que datariam de meados do Sec. VIII, cerca de 750 AC. Mais tarde, os romanos mantiveram uma cabana no Palatino que chamaram de “Cabana de Romulus”.

Fig 03 – Uma estátua de bronze de Romulus e Remo, os lendários fundadores de

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Dito isto, depreende-se que arqueologia também não confirma as lendas fundadoras de Roma. As evidências arqueológicas precisam ser interpretadas para fazerem sentido. A presença de centros de adoração abraçando Enéias em Lavínio não prova a lenda de Enéias; provavelmente é o resultado da fama da lenda, e não o vice-versa. A coincidência entre as ca-banas palatinas e a data tradicional da fundação de Roma, por outro lado, também não prova a lenda de Rômulo. Na verdade, o povoado do qual as cabanas fariam parte, data de 1.000 AC.

A evidência arqueológica é muda; ela não pode provar o que lendário mas, oca-sionalmente, pode refutá-la. Ao final, a arqueologia sugere um padrão de início de assentamento em Roma, que se tornou mais complexo no Século VIII e a concen-tração posterior daquelas comunidades em uma única, algum tempo depois (um pro-cesso denominado synoikism). Portanto, a questão das fontes para que entenda o iní-cio do período da história romana é uma consideração importante a se ter em mente.

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Capítulo 3OS REIS DE ROMA

Todas as nossas fontes são unânimes em informar que Roma, inicialmente, foi governada por reis. Elas dizem terem sido sete os reis de Roma, o primeiro tendo sido Rômulo, o fundador de Roma.

Os sete reis do chamado Período Régio (753 a 509 AC) foram, em ordem, Rô-mulo, Numa Pompilius, Túlio Hostílio e Ancius Marcius (os latinos ou reis sabinos), seguidos por Tarquinius Priscus, Servius Tullius e Tarquínio, o soberbo (os dois Tar-quinios eram etruscos). Cada rei tinha um conjunto de histórias anexado a ele.

As fontes disponíveis referentes ao período do historiador Tito Lívio são escassas. Tito Lívio teve acesso aos agora perdidos relatos escritos por escritores anteriores; todos, no entanto, eram de um período muito posterior ao período régio. Houve, ainda, várias lendas a respeito. Algum material arquivístico e epigráfico pode ter sobrevivido para Tito Lívio, mas não para nós. Histórias de famílias também preenchem a questão. Para o estudioso moderno, o material comparativo, proveniente de outras monarquias de mais cedo é meio de investigação disponível, bem como a arqueológica da precoce Roma.

A operação da realeza romana foi notável. Os reis não eram hereditários, pois eram escolhidos por uma eleição realizada entre um Conselho de Nobres (o Senado). Entre cada governança dos reis, um interrex exercia o cargo. Os reis tinham autoridade so-bre as três áreas de governo: assuntos militares, a administração da justiça e a religião.

A existência dos reis não se encontra em dúvida, mas a historicidade dos reina-dos, individualmente, é muito mais problemática. Há pouca dúvida sobre se Rômulo, um dos fundadores de Roma, foi também seu primeiro rei, de acordo com a tradição.

Material existente na biblioteca do Congresso dos Estados Unidos. dão total veracidade ao período régio; os antigos escritos, como fontes, são unânimes sobre a sua existência. A mais antiga conhecida pedra com inscrição em latim, encontrada em uma pedra preta no Fórum Romano, datada do Sec. VI AC, menciona a existên-cia de um rei (rex). Uma análise comparativa com outras civilizações (grega, etrusca, etc.) sugere que reis governaram, regularmente, as primeiras comunidades arcaicas.

Fig. 04 - Rômulo, um dos fundadores de Roma, tam-bém foi seu primeiro rei, de acordo com a tradição.

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Os detalhes, no entanto, são muito mais questionáveis. Muito poucos reis governam por muitos anos (sete reis em 245 anos). As histórias que cercam os reis são dramas morais ou contos etiológicos, mais do que relatos históricos.

Até mesmo os nomes de alguns reis levantam algumas suspeitas. A evi-dência arqueológica sugere o período de cerca de 625 a 500 AC como o perío-do régio de Roma. Este pode ter sido o verdadeiro período dos reinados romanos.

Os últimos reis de Roma são tradicionalmente vistos como etruscos, mas esta visão tem sido contestada recentemente. A visão tradicional era de que os etruscos conquistaram Roma, daí a existência de reis etruscos. Mais recentemente, esta visão tem sido contestada, em face de ter havido, apenas, uma influência estrusca em Roma, e não uma dominação polí-tica. Roma permaneceu predominantemente latina, com famílias etruscas lá ganhando influ-ência, como o fizeram em outros lugares, mas não houve em Roma nenhum período etrusco.

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Capítulo 4A SOCIEDADE REAL

A sociedade real de Roma era tipicamente arcaica. Ela foi dominada por latifundiários aristocra-tas, e parece que ela existiu desde o início de uma separação entre homens livres e escravos. Parece, tam-bém, que a sociedade romana foi escravagista desde muito cedo, assim como a maioria das sociedades.

Abaixo dos aristocratas dominantes na sociedade real de Roma ficavam aque-les amarrados por laços de favor e obrigação. Dentro da população nascida livre, a distinção mais ampla existente era aquela existente entre o cidadão e o estrangeiro. Todos os cidadãos foram agrupados em unidades que foram chamadas de tribos. Ini-cialmente, havia três tribos, mas nos séculos posteriores, elas atingiram um total de 35. Um dos deveres principais da cidadania era o serviço militar no Exército romano que, naquela data, lutava usando a formação de falange, o que ocorrera já desde o início. Tal como aconteceu com as sociedades contemporâneas na Grécia, a cidadania foi li-derada, principalmente, por famílias aristocráticas latifundiárias. Todas as famílias, ao que parece, foram agrupadas em clãs (gens, gentes). Os também chamados ci-dadãos romanos refletem a primazia existente dos gens na ordem familiar e social.

As famílias proeminentes e as famílias comuns estavam ligadas por um sis-tema chamado de clientela. Um patrono que concedisse favores e geralmen-te ajudava um cliente, em troca deveria dele receber apoio, lealdade e respeito. A clientela ajudou a compensar a estratificação horizontal da sociedade romana. No en-tanto, nem todas as classes ou pessoas estavam envolvidas no sistema de clientela.

É possível que nesta precoce data tenha surgido a primeira ordem social. Na so-ciedade romana, uma order era um nível social, uma situação de status. A primeira ordem a surgir, parece ter sido a do patriciado. Os patrícios eram definidos pela sua data de nascimento e pelos seus nomes; eles constituíam o mais privilegiado grupo dentro da aris-tocracia romana. As circunstâncias que cercam o surgimento dos patrícios são obscuras; várias reconstruções foram apresentadas por estudiosos modernos, mas não ficou claro se foi ou não uma outra a ordem social, a dos plebeus, que existiu neste período inicial.

A política no âmbito do sistema do governo régio era controlada mais pelos aris-tocratas do que pelos reis. Os reis eram escolhidos entre os membros do Senado e eram ratificados pelo povo (ou seja, os cidadãos masculinos adultos) reunidos em as-sembleia. O status do Senado, neste período inicial, também não é claro; pode até ter sido um conselho ad hoc de conselheiros do rei. As pessoas eram agrupadas em uni-dades de votação chamadas de cúria, e reuniam-se em uma assembleia chamada as-sembleia curiata (comitia curiata). Houve paralelos a isso na Grécia e em outras culturas arcaicas. A principal função da assembleia curiata era a de ratificar a escolha do Se-nado de um novo rei e de, oficialmente, conferir-lhe o poder de comando (imperium).

Uma breve consideração da dita Constituição Servian (nomeada após Servius Tullius) ilustra muitos dos problemas em se lidar com o período régio. Muitos dos re-cursos do sistema são claramente anacrônicos, mas alguns podem datar do perí-odo régio. A dificuldade situa-se na determinação daquilo que se fazia, realmente.

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Capítulo 5O INÍCIO DA REPÚBLICA

Segundo a tradição romana, o início da República enfrentou alguns desafios imedia-tos, que foram superados por determinados tipos de personagens maravilhosos que tive-ram a fibra moral para identifica-los, enfrenta-los, e levar a República a um novo amanhecer.

Conforme a tradição romana, a República foi fundada após um ato atroz que estimulou um golpe de estado. Tarquínio, o soberbo, último rei de Roma, foi um go-vernante pobre que promulgou várias políticas que eram impopulares. Seu filho, foi Sextus Tarquinius, originado da estuprada Lucretia, esposa de um homem nobre, que posteriormente se suicidou. Foi esse evento que provocou um golpe de estado.

Um amigo da família do marido de Lucretia, L. Junius Brutus, ajudou a família irada da mulher morta a organizar a resistência contra Tarquínio, o soberbo; muitos membros do clã de Tarquínio também fizeram parte da trama. Tarquínio foi forçado a abandonar Roma. Um complô para restaurar a monarquia levou Brutus a ter que executar seus próprios filhos.

Assistido por Lars Porsenna, rei de Chiusi, nas proximidades de Roma, Tar-quínio tentou recuperar a cidade pela força das armas, mas não conseguiu. Um ata-que subsequente de Porsenna aos latinos falhou na Batalha de Aricia (506 AC), e ele se retirou para Chiusi. Outros registros da antiga tradição informam que os roma-nos se entregaram à Porsenna que, então, impôs um tratado humilhante a Roma.

Estudiosos modernos trataram este ciclo de histórias de maneiras diferentes; ne-nhum deles as aceitou como elas se apresentavam. As histórias são, à primeira vista, típicas do início da história de Roma: romântica, heroica e didática. Os eruditos modernos vêem-se com uma variedade de reconstruções alternativas de eventos, tais como a lei-tura sobre a expulsão de Tarquínio no contexto da minguante potência etrusca na Itália no Século V AC. A transição da monarquia para a República não foi um evento único, dramático, mas sim um processo lento, que se estendeu até meados do Século V AC. A história de Lucretia, por outro lado, na verdade não é improvável, dado aos aconteci-mentos pessoais comparáveis em outras dinastias reais, e que tiveram grandes conse-quências políticas. Segundo a alternativa tradição antiga, talvez Porsenna tenha tomado Roma e abolido a monarquia, antes de se retirar depois de Aricia. No final, porém, a evidência é muito mais confiável, para se ter certeza sobre o que aconteceu em detalhes.A jovem República começou a desenvolver o seu governo, e sua forma evo-luiu ao longo dos séculos. Os primeiros anos são, sem surpresa, pouco claros.Os reis foram substituídos por dois magistrados, chamados cônsules (ou pretores). As listas consulares posteriores (fasti) seguem todo o caminho de volta para 509 AC, mas há algumas suspeitas de que os primeiros nomes sejam interpolações poste-riores. Desde o início da República, os cônsules compartilharan o poder com os co-legas, com mandato limitado (eleições anuais). Havia duas assembleias populares (comitia curiata e comitia centuriata). Em tempos de grande emergência, um ditador poderia ser instalado por seis meses para lidar com a situação de emergência. O di-tador nomeado o segundo em comando era chamado o Mestre do Cavalo (magis-ter equitum). Os deveres do antigo rei, agora, foram atribuídos aos magistrados e aos sacerdotes, o mais importante dos quais era o pontifex maximus; havia, também, um rex sacrorum, provavelmente uma encarnação puramente religiosa do antigo rei.

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A ordem dos plebeus pode ter surgido na República precoce. Anos mais tar-de, os plebeus eram compostos por todos aqueles que não eram patrícios. Inicial-mente, no entanto, os plebeus podem ter sido uma ordem restrita de cidadãos, talvez os mais pobres e menos influentes, homens com sua própria agenda sócio-política.

As famílias ricas só aparecem sendo juntadas à plebe mais tarde, quando os plebeus se tornaram uma força política e social a ser reconhecida, no contexto do Conflito das Ordens.

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Capítulo 6O CONFLITO DAS ORDENS

Um conflito sócio-político começou muito cedo na história da República e continuou durante a melhor parte de dois séculos afora, e foi considerado pelos romanos como o elemento que, de fato, moldou sua República de forma decisiva.

As fontes escritas para este Conflito das Ordens o retratam de forma sim-plista, mas uma leitura atenta pode revelar, no entanto, ainda que palidamen-te, algumas das questões genuínas que geraram os conflitos. As fontes posterio-res que sobreviveram, para as lermos, também não são sem problemas, mas são utilizáveis, no entanto. Nossas fontes retratam tal conflito como sendo de ordem in-teiramente política, e elas parecem refletir posteriores padrões de comportamento para este início de período. Apesar dos problemas das provas, o contorno do conflito é suficientemente claro, mesmo que os detalhes estejam mais abertos a perguntas.

As nossas fontes posteriores focam uma questão causídica — o acesso ao sis-tema político. Esta questão parece, no entanto, ter surgido apenas mais tarde. O per-dão da dívida e, em particular, da escravidão por dívida, foi apenas um problema ini-cial. A plebe também exigiu a reforma judicial e a codificação das leis para impedir o tratamento arbitrário depositado nas mãos dos aristocratas. Havia um desejo de refor-ma em distribuir os territórios recém conquistados também entre os cidadãos mais po-bres. O conflito, então, foi realmente uma série de lutas sobre diferentes questões. As nossas fontes posteriores têm simplificado este quadro consideravelmente complexo.

O conflito das ordens dominou a política romana no início da República. Os patrícios dominaram o sistema político romano no início da República, embora os plebeus não ti-vessem sido delas excluídos, como demonstram as listas consulares (fasti). Em algum mo-mento de meados do Século V, o “fechado” patriciado não admitira famílias adicionais nas suas fileiras. O patriciado, mesmo fechado, então dominava a política. Assim, outra ame-aça de conflitos deu-se no sentido de se reabrir o acesso ao sistema político para os não--patrícios. Mas mesmo antes do fechamento do patriciado, já havia sinais de problemas.

Em 494 AC, os plebeus se separaram de Roma, uma vez que suas demandas para a reforma econômica e social não foram cumpridas. Os plebeus exigiram o per-dão da dívida, particularmente o da escravidão por dívida, e o fim do tratamento ar-bitrário existente nas mãos dos aristocratas. Isto sugere que a plebe foi, originalmen-te, composta pelos elementos mais pobres da sociedade. Eles deixaram Roma e formaram seu próprio Estado paralelo, sobre o Janículum, uma colina vizinha. O Esta-do plebeu foi modelado com base na República principal dominada pelos patrícios: ti-nha um Conselho (o concilium plebis); tinham eleito oficiais (tribunos da plebe e ae-diles da plebe); formou-se um instrumento para resoluções chamado plebiscita.

Os plebeus estavam, agora, firmemente estabelecidos como uma força na política ro-mana. Mas não está claro como, exatamente, a primeira secessão foi trazida ao final de nos-sas fontes. Sabe-se, contudo, que posteriores secessões da plebe forçaram uma reforma.

Uma crise em 451-449 AC girou em torno da demanda dos plebeus para codificação das leis. Uma Comissão dos Dez (decemviri) foi criada para elaborar um código de leis, mas ela tentou subverter a República e o seu próprio governo. O chefe do comitê era Appius Clau-dius. Em resposta, a plebe se separou novamente, o Comité dos Dez foi deposto e Roma teve seu primeiro código de lei escrito, a Lei das Doze Tábuas, em 449 AC. Como resultado, o estado plebeu ganhou o reconhecimento da República e foi, por isso, a ele assimilado.

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Novas magistraturas foram criadas para atender tanto os plebeus como os patrícios. Um cônsul por ano iria ser plebeu. Curul aediles (dos patríciaos) foram criados para coincidir com os aediles da plebe. Uma nova magistratura, o pretor, foi aberta para ambas as ordens.

As demandas plebeias por terra, o perdão das dívidas e a igualdade políti-ca continuaram nas décadas que se seguiram, e a plebe foi parcialmente bem su-cedida em vê-los reconhecido. Em 367 AC, a parte principal do conflito das ordens tinha acabado, mas o epílogo veio somente em 287 AC, quando uma lei (a Lex Hor-tensia) tornou a plebiscita obrigatória para todos os cidadãos, patrícios e plebeus.

A natureza da classe dirigente romana também foi transformada pelo con-flito. Com o fechamento do patriciado em cerca de 450 AC, os não patrícios ri-cos juntaram forças com a plebe. Isso transformou o movimento plebeu em uma entidade socialmente diversificada, com diferentes objetivos: a plebe rica queria acesso ao sistema político, os mais pobres queriam reformas sócio-econômicas.

A resolução do conflito e a admissão da plebe no sistema político criaram uma classe dominante de patrícios-plebeus, que ficoui largamente despreocupada pelas de-mandas do povo para a reforma. Em 287 AC, a distinção entre patrícios e plebeus tornou--se socialmente maior do que politicamente significativo. Novas linhas de estratificação social começaram então a surgir, mas elas ficaram atadas à expansão imperial romana.

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Capítulo 7A EXPANSÃO ROMANA NA ITÁLIA

A expansão romana na Itália pode ser dividida em três fases. Na primeira, há um longo período empenhado em se ganhar o controle sobre seus vizinhos imediatos, os latinos. … Em seguida, os romanos voltaram sua atenção à Itália central. … E então, finalmente, Roma deslocou-se para o sul e ganhou o controle sobre as colônias gregas.

Durante os primeiros quatro séculos de sua existência, Roma viu-se ocupada em ganhar o controle sobre o Lácio. Os primeiros negócios de Roma com seus vizi-nhos latinos estão envoltos em obscuridade, mas eles mostram-se variados e comple-xos. As fontes para a expansão inicial de Roma não são, de fato, fortes; pelo contrá-rio, elas estão cheias de contos heroicos e patrióticos que serviram de modelo para o bom comportamento das gerações posteriores. A partir da Terceira Guerra Sam-nita em diante, no entanto, nossas fontes melhoram, consideravelmente. Elas re-tratam os reis que misturam guerra e diplomacia nas suas relações com os latinos.

A transição da monarquia para a República enfraqueceu a posição romana, mas a vitória romana sobre os latinos na Batalha do Lago Regillus, em 499 AC, re-cuperou a situação. O Tratado de Cássio (Foedus Cassianum), em 493 AC, estabele-ceu uma nova relação entre Roma e os latinos, que formaram a chamada Liga Latina.

O esboço do Tratado parece claro, mas os detalhes não o são. Foi uma aliança militar (estabelecimento de um pacto de não agressão, amigos em comum e inimigos na divisão igual dos despojos de guerra). Os romanos deveriam comandar qualquer força conjunta.

Mas não está claro se Roma era um membro da Liga La-tina ou se o Tratado foi um acordo bilateral entre Roma e a Liga.

Os requisitos de defesa contra as contínuas incursões dos povos tribais das monta-nhas, no vizinho Lácio, reforçou a posição de Roma entre os latinos. Os équos e volscos, moradores das montanhas tribais, lançaram ataques anuais sobre o Lácio entre cerca de 500 e 440 AC, ocasiões em que Roma e os latinos resistiram às incursões realizadas.

No decurso do Século V, Roma tinha começado uma série de conflitos com Veii, uma poderosa cidade etrusca ao norte do rio Tibre. Em 396 AC, os romanos captu-raram Veii e levaram todos os despojos para si próprios. Quando os latinos estavam prestes a lutar com os romanos, em razão do seu tratamento, um desastre golpeou os romanos vindo do norte. Os invasores gauleses da região do vale do rio Pó, co-nhecida como Gália Cisalpina, derrotaram uma força combinada de romanos e lati-nos em Allia, em 390 AC, e capturaram Roma. Os romanos lutaram para expulsar os gauleses, mas estes permaneceram. A invasão gaulesa humilhou os romanos, mas não parece ter minado sua posição global. As incursões romanas na Etruria e no Lá-cio continuaram até 338 AC, quando os romanos derrotaram uma força combinada de latinos e reformularam a Liga Latina em proveito das suas próprias necessidades.

As Guerras Samnitas ocorreram em uma escala maior do que quaisquer outras guerras lutadas anteriormente por Roma, e a vitória romana nos conflitos assegurou o poder romano sobre toda a Itália central. Os samnitas eram adversários formidáveis. Eles eram uma federação de povos tribais que viviam nas montanhas da região central da Itália.

Compreendidos como homens guerreiros, eles eram, em verdade, uma so-ciedade guerreira que valorizava a habilidade marcial. Inicialmente, eles fizeram um pacto de não agressão com Roma, mas as incursões samnitas sobre a Campa-nia obrigaram os seus habitantes a apelar para que Roma s ajudassem, 343 AC.

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O que se seguiu à Primeira Guerra Samnita (343 – 41 AC) terminou com a renova-ção do Tratado Romano-Samnita.

A usurpação do poder romano nas fronteiras samnitas causou a Segunda Guerra Samnita, uma luta épica que durou mais de 20 anos. Os romanos tinham continuado a es-tender sua influência para as regiões periféricas de Samnium, quando a guerra eclodiu em 326 AC e durou até 304 AC. Foi uma grande luta que testou os romanos em resolver proble-mas perante catástrofes como a de Caudinas em 321 A.C. Por meio de uma combinação de diplomacia e operações militares, os romanos cercaram os samnitas em sua pátria monta-nhosa e os forçaram a uma rendição. O antigo tratado Romano-Samnita foi renovado, mas o poder romano, agora, havia se estendido profundamente no antigo território Samnita.

Com o fim da Segunda Guerra Samnita, os italianos livres não poderiam ain-da ter ilusões sobre quem os romanos estavam, finalmente, apontando. Os confli-tos chamados de Terceira Guerra Samnita (298 – 290 AC) foram, na verdade, a úl-tima posição da Itália livre em face da expansão romana. Embora provocada pela assistência romana às pessoas atacadas pelos samnitas, a Terceira Guerra Samni-ta tornou-se um conflito pan-itálico. Uma coligação de samnitas, etruscos, úmbrios e gauleses lutou contra os romanos em Sentinum em 295 AC, a maior batalha ainda lu-tada em solo italiano. A vitória romana levou à incorporação dos samnitas na adminis-tração romana da Itália em 290 AC. Os romanos eram agora, os dominadores da Itá-lia central, ainda que algumas operações de limpeza continuassem por várias décadas.

O conflito romano com a colônia grega de Tarento levou à invasão de Pirro, o primei-ro estrangeiro inimigo Roma. Tarento, pressionada pela expansão romana, pediu ajuda ao rei Pyrrhus de Epirus. Pirro invadiu a Itália em 281 AC, com um exército de 25.000 homens e 20 elefantes. Comandando um exército bem equipado e bem treinado na formidável for-mação em falange macedônica, Pirro derrotou os romanos duas vezes, em 280 e 279 AC.

Após uma campanha infrutífera na Sicília, Pirro retornou ao continen-te italiano em 275 AC e lutou contra os romanos até quando houve uma para-lisação em Benevento em 275 AC. Em seguida, Pirro se retirou para seu rei-no, deixando Roma dona de tudo na Península Itálica, ao sul do vale do rio Pó.

A expansão de Roma na Itália realizou importantes ramificações para a po-lítica, a sociedade e a cultura romanas. A autoridade do Senado foi grandemen-te aumentada. Originalmente um órgão consultivo composto pelos mais ricos e mais influentes romanos, após a época da invasão de Pirro, o Senado tornou-se a entidade política dominante no Estado romano. Isto foi uma consequência das batalhas constantes, que concederam prêmios aos comandantes experientes.

Houve um grande crescimento econômico, como reflexo de um cresci-mento populacional; houve mais construções em Roma, como também um au-mento em bens de luxo disponíveis; também aconteceu um aumento do núme-ro de escravos, e assim por diante. Houve, ainda, uma mudança cultural, sob a forma de maiores contatos com os etruscos e, especialmente, com os gregos.

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Capítulo 8A CONFEDERAÇÃO ROMANA NA ITÁLIA

O que fez com que os romanos fossem considerados notáveis, foi a maneira como eles evoluíram aparentemente bastante no início de sua carreira no imperialismo, usando um método de uso do privilégio ao compartilhar seus territórios.

Os romanos desenvolveram, no início de sua história, um sistema de privilégio ao partilhar com as comunidades aliadas ou afins, o que diferiu do tratamento geralmente duro que os antigos vencedores impunham aos seus inimigos derrotados. Embora as ori-gens do sistema sejam obscuras, parece que os romanos puderam, sob certas condições, estender os privilégios da cidadania para outras comunidades. Por volta do Século III AC, surgiu um status secundário de cidadania — uma situação de cidadania sem o direito de voto (uma falta de direitos de participação política, chamada civitas sine suffragio).

Os romanos também iniciaram uma política de colonização no início de sua história, e a fundação de colônias tornou-se uma importante ala diplomática da expansão romana na Itália. As colônias romanas foram fundadas nos territórios recém conquistados e em locais estrategicamente importantes. As colônias foram inicialmente compostas por roma-nos e latinos, os primeiros sendo o maior grupo. Os colonos gostaram do que veio a ser chamado de direitos latinos (ius municipia), que era uma espécie de cidadania romana restrita. A fundação romana das colônias foi realizada em tempo de paz, mas podia ser provocativa, como quando ela contribuiu para a eclosão da Segunda Guerra Samnita.

. Quando o poder romano expandiu-se, os romanos desenvolveram outros graus de estatuto comunitário (por exemplo, as colônias duplas). Começando com Tusculum em 381 AC, os romanos desenvolveram um estatuto comunitário abaixo da colônia, chamado de municipium. Os direitos e status de um municipium no início do período não são claros, mas em períodos posteriores o municipium era composto por cidadãos locais cujas clas-ses dominantes, sozinhas, foram admitidas à cidadania romana.

Abaixo do municipium e especialmente no sul da Itália, os romanos estabeleceram Estados-Tratado (foederatae civitates), que gozavam apenas dos privilégios estipulados em seus tratados com Roma.

A desenvolvida Confederação da Itália permitiu aos romanos dividir e conquistar os povos da Itália,o que oferecia grandes benefícios para os romanos. A forma final da Confederação, como ela tinha evoluído ao longo dos séculos, classificou o assunto comu-nidades em uma variedade de relações de status bilaterais com Roma. A forma final da Confederação foi o seguinte: no topo ficavam as colônias de cidadãos romanos (optima iure); em seguida vinha o das colônias latinas (ius Latii); a municipia ficou abaixo das colônias latinas e, por fim vinham as tratado-Estado (foederatae civitates). Dentro desse regime, os romanos poderiam promover ou rebaixar comunidades dependendo das cir-cunstâncias. Eventualmente, esses status poderiam ser conferidos pelo Senado romano a qualquer comunidade (por exemplo, status colonial ou latino, que podia ser concedido para as comunidades já existentes).

Estes acordos bilaterais efetivamente dividiram os italianos entre si. Em alguns ca-sos, os acordos eram bilaterais entre Roma e as comunidades sujeitas, incentivando os moradores a procurar Roma para seu bem-estar. As comunidades adjacentes poderiam usufruir de seu status amplamente divergente com Roma, mitigando a sua capacidade de agir em conjunto contra Roma.

O sistema também provia Roma de um grande repositório de mão de obra militar.

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Seja qual fosse o status da comunidade em questão, o fornecimento de tropas para o exército era uma exigência universal. Roma poderia, portanto, impor o direito básico da cidadania — o serviço militar — sem ser obrigado a, em troca, ofertar os privilégios da ci-dadania. Assim, cerca de metade do Exército romano veio dos Estados da Confederação romana da Itália.

Este sistema precoce de administração dos territórios conquistados teve várias con-seqüências importantes, a longo prazo. Passou a desempenhar um papel vital na facilita-ção da expansão exterior romana, em virtude da enorme mão de obra que Roma poderia contar em qualquer situação. Em tempos de crise, ele ofereceu segurança à Roma, como quando Pirro não conseguiu separar os aliados de Roma da Confederação ou durante a Segunda Guerra Púnica. Quando uma versão alterada da Confederação foi extendida para além da Itália, foi para formar a base para a estabilidade e longevidade do posterior Império Romano.

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Capítulo 9O CENÁRIO INTERNACIONAL ÀS VÉSPERAS DA

EXPANSÃO ROMANA

As pessoas naquela época não deram muita atenção ao crescimento do poder romano. Parecia ter sido uma coisa muito regional. “Isso iria afetar as pessoas de Itália, mas na Turquia e na Síria as pessoas se consideravam bastante seguras”. Quão erradas esla estavam.

O Mediterrâneo oriental era o lar de uma civilização que remontava a 3.000 anos. Egito, Síria, Ásia Menor (Turquia), e Grécia, todos tiveram longas heranças de um Esta-do organizado e urbanizado. A situação na região em cerca de 270 AC era em si própria complexa.

As conqistas de Alexandre, o Grande, tinham criado um reinado helenístico naquela região, mas a conquista da Persia foi segida por um enorme tumulto nas terrras orientais. Após sua morte, os generais de Alexandre competiram entre si, inicialmente, para o con-trole do império, mas, mais tarde, por aquilo que eles poderiam controlar com segurança. O resultado foi um equilíbrio de poder entre os três reinos helênicos, mutuamente anta-gônicos, governados por descendentes dos generais de Alexandre: No Egito governou a dinastia ptolemaica; na Síria governaram os Seleucidas; e na pátria macedônica governa-ram os Antigônidas.

Nas zonas-tampão entre esses principais estados, reinos e federações menores surgiram. as ligas dos Aetolian e dos Achaean, que dominaram a Grécia continental; o reino de Pérgamo Attalid governou no noroeste da Ásia Menor; e a ilha-Estado de Rodes era sua própria entidade. Esses estados helenísticos eram sofisticados e encontravam-se, constantemente, em competição uns com os outros. Os Estados menores sobreviviam aliando-se aos mais poderosos, ou jogando de um lado e do outro.

Neste cenário internacional complexo, a ascensão de Roma, na Itália não foi um grande evento. A maior parte desses Estados importantes e históricos deu pouca atenção à ascensão de Roma. Houve, no entanto, duas exceções: Carthago é relatado por ter feito três tratados com Roma em 509, 348, e 306 AC Esses tratados, particularmente o mais re-cente, são contestados, mas eles parecem ter sido projetados para proteger os interesses cartagineses na Itália. Em 273 AC, a dinastia ptolomaica no Egito declarou amizade com Roma, uma resposta clara ao fracasso de Pirro na Itália. Isso garantiu a sobrevivência do Egito ptolomaico até 31 AC.

Houve poucos indícios, por volta de 270 AC, de que Roma estava à beira de con-quistar toda a bacia mediterrânica, o que ela faria em pouco mais de 100 anos. As su-perpotências, à época, eram o Egito e a Síria, a leste e a oeste de Cartago. Roma tinha alguma capacidade naval, mas não era uma grande potência naval. Em verdade, Roma tinha apenas uma marinha de defesa costeira e tinha até lutado algumas batalhas navais, mas não podia ser comparada com as outras potências grandes, incluindo Rhodes e, especialmente, Cartago. Cartago tornou-se, portanto, o primeiro adversário da expansão de Roma.

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Capítulo 10CARTAGO E A PRIMEIRA GUERRA PÚNICA

A ascensão de Roma a uma posição dominante em geral, pode ser divididos em duas fases. A primeira, no Mediterrâneo Ocidental, voltada, especificamente para a cidade de Cartago. Na segunda, ela volta sua atenção para a altamente desenvolvido civilização helenista e a metade do Mediterrâneo Oriental, durante o período que se inicia em torno de 200 AC

A ascensão de Roma a uma posição dominante em toda a bacia mediterrânea di-vidiu-se em duas grandes fases. Primeiro vieram os conflitos com Cartago que levaram Roma a controlar todo o Mediterrâneo ocidental. Em segundo lugar veio o envolvimento complexo de Roma nos assuntos dos reinos helenísticos no oriente.

Cartago era uma antiga cidade fenícia administrada por uma oligarquia mercantil. Localizada onde hoje fica a moderna Tunísia, a cidade teve uma longa história de envolvi-mento no Mediterrâneo ocidental. Segundo a tradição, Cartago foi fundada em 814 AC por comerciantes fenícios. Localizada em um excelente porto, tendo um continente fértil e uma população empreendedora, a cidade, rapidamente, ascendeu a uma posição de poder.

Por volta do Século VI AC, feitorias cartagineses podiam ser encontradas ao longo de todo o norte de África, no oeste da Sicília, na Sardenha, na Córsega e na Espanha. Conflitos com as colônias gregas da Sicília, especialmente Siracusa, foram frequentes nos quinto e quarto séculos AC No momento em que os romanos tinham conquistado o continente italiano, uma espécie de equilíbrio de poder foi obtido na Sicília, com Siracusa dominando a metade oriental da ilha e Cartago a metade ocidental. Cartago manteve seus interesses no exterior por meio de uma diplomacia apoiada por uma grande frota e por exércitos de mercenários.

Originalmente liderada por um governador, a autocracia de Cartago tinha, cedo, dado lugar a uma oligarquia de famílias dominantes. Como na oligarquia republicana ro-mana, dois juízes (suffetes) eram eleitos anualmente, mas não havia um conselho como o Senado romano. Uma característica incomum era uma corte permanente, composta de 104 membros vitalícios, que escrutinizavam os assuntos profissinais dos generais e dos almirantes.

O governo cartaginês era impulsionado pelas preocupações com os lucros e os benefícios, o que o diferia muito da motivação romana. Cartago funcionava como se fosse uma grande empresa, com os cidadãos obtendo uma participação nos lucros do comércio. Os cartagineses recorriam à guerra, quando necessário, mas dava preferência aos meios pacíficos de resolução de potenciais conflitos. Em contraste, os romanos eram motivados por considerações sóciopolíticas de lealdade para com os amigos e aliados e de manu-tenção das aparências.

A Primeira Guerra Púnica começou pequena e de forma acidental, mas evoluiu para uma luta titânica pelo controle da Sicília. A faísca que acendeu a Primeira Guerra Púnica foi mínima. Aventureiros italianos, chamados de Mamertinos, tomaram a cidade siciliana oriental de Messina e, quando pressionados por Siracusa, recorreram primeiro a Cartago e depois a Roma. A humilhação da frota cartaginesa e o deslocamento dos romanos para a Sicília fizeram com que os cartagineses enviassem tropas para a Sicília para esmagar os Mamertinos. Este caso levou Roma e Cartago a um conflito aberto.

O curso da guerra desenvolveu-se em três fases. A primeira (264-260 AC) viu os exércitos romanos e púnicos (cartagineses) brigando nas terras da Sicília. A façanha das

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armas romanas em tomar de assalto e capturar Agrigentum em 262 AC intimidou os car-tagineses, que evitaram se engajar com as legiões romanas em uma batalha terrestre, o que gerou um “lance de bola parada” para o restante da guerra.

A frustação romana em relação à habilidade púnica de poder reabastecer a Sicília por mar levou à segunda fase da guerra, travada no mar Tirreno e na África (260-255 AC). Os romanos construíram uma enorme frota em poucos meses e a colocaram no mar em 260 AC, derrotando os cartagineses na Batalha de Mylae. A invasão romana da África do Norte, em 256 AC terminou com uma emboscada e a derrota da força romana em 255 AC, que foi seguida, pouco depois, pela destruição da frota romana em uma tempestade ao largo da Sicília.

A terceira e última fase da guerra foi travada na Sicília e nos mares próximos (255-241 AC). Os cartagineses lutaram a maior parte desta fase da guerra sob a forma de uma campanha de guerrilha, a partir de suas bases inexpugnáveis nos montes Eryx e Hercte no oeste da Sicília. Ambos os lados também disputaram o controle das bases navais da Sicília.

O pensamento cartaginês, baseado no custo-benefício, dificultava o seu esforço de guerra e, em 241 AC, quando enfrentaram uma nova frota romana nas Ilhas Aegates, eles foram completamente derrotados. Os cartagineses se renderam e os romanos lhes impuseram termos pesados: os romanos exigiram uma enorme indenização de guerra e impediram Cartago de se aproximar da Sicília.

A Primeira Guerra Púnica teve importantes ramificações para Roma e para Carta-go. Roma obteve vários benefícios, como resultado da sua vitória. Eles haviam sido atra-ídos para fora da península italiana e, então, passaram a possuir sua primeira província ultramarina, a ilha fértil da Sicília. Eles, agora, também passaram a possuír a maior frota existente no Mediterrâneo. Eles, então, se aproveitaram de sua frota e da fraqueza púnica para anexar a Sardenha e a Córsega em 238 AC, ainda invadindo a tradicional esfera da atividade cartaginesa. A tenacidade e a determinação romanas tinham se mostrado apa-rente para todos.

A derrota dirigiu Cartago para novas pastagens. O fechamento dos mares em tor-no Sicília e da Itália levou Cartago para o ocidente. Entre 241 e 220 AC, os cartagineses esculpiram um pequeno império na Espanha. Em certos círculos cartagineses, a vitória ro-mana tinha sido muito amarga — uma pílula difícil de engolir —, e um conflito ainda maior estava a surgir a partir desta circunstância.

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Capítulo 11A SEGUNDA GUERRA PÚNICA

(OU A GUERRA DE ANÍBAL)

Carthaginian expansion in Spain proved to be the spark for the second major confl ict between Rome and Carthage, the Second Punic War, which took a very different course from the fi rst one.

Enquanto Cartago encontrava-se ativa na Espanha, a atenção roman foi desviada para o mar Adriático e para o vale do rio Pó. As atividades de pirataria ao longo da costa leste italiana levaram Roma a conduzir operações militares na Ilíria no Adriático oriental. Em 229 AC, a região foi declarada um protetorado romano. Para bloquear outra incursão gaulesa na Itália, a partir da Gália Cisalpina, os romanos invadiram a região em 225 AC e a anexaram como uma província em 220 AC.

A expansão cartaginesa na Espanha foi a faísca que acendeu a Segunda Guerra Púnica. Sob uma liderança capaz, os cartagineses ganharam o controle de grande parte do leste da Espanha por volta de 220 AC, um fato finalmente notado pelos romanos.

O principal líder cartaginês era Amílcar Barca, um veterano das campanhas sici-lianas na última fase da Primeira Guerra Púnica. Ele, supostamente, abrigava um ódio intenso por Roma. Amílcar Barca era o pai de Aníbal Barca.

Fig 05 - A Segunda Guerra Púnica levou à aniquilação de Cartago.

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Em algum momento em meados de 220 AC, os romanos e os cartagineses chega-ram a um acordo sobre as esferas da influência na Espanha, de acordo com o relato de Políbio. Os detalhes desse Tratado de Ebro são contestados. Cartago empreendeu todo seu esforço para estender seu poder ao norte do rio Ebro. Se os romanos se comprome-teram a não interferir ao sul deste rio, isto não está explicitado em nossas fontes, mas o fato é que os romanos tomaram sob sua proteção a cidade de Sagunto, que ficava ao sul do rio Ebro. Não está claro quando se chegou a este acordo com Sagunto; não se sabe se foi antes ou depois do acordo de Ebro.

Aníbal tinha estado em comando na Espanha desde 221 AC A guerra foi declarada em 219 AC, na sequência do ataque de Aníbal a Sagunto e a rejeição, por parte de Carta-go, a um ultimato dos romanos para entregá-lo para julgamento.

A Segunda Guerra Púnica foi travada simultaneamente em vários teatros de opera-ções, e estendeu os recursos de ambos os lados para além dos seus limites. Os romanos prepararam-se para uma repetição da Primeira Guerra Púnica. Em Aníbal, no entanto, os romanos enfrentariam um dos maiores gênios militares da história. Aníbal assumiu a iniciativa e invadiu a Itália a partir do norte, forçando os romanos a brigar por sua própria sobrevivência.

Hannibal marchou com seu exército ao longo dos Pirineus, através do território hostil no sul da França, e atravessou os Alpes, chegando na Itália na primavera de 218 AC, pegando de surpresa os romanos. Depois de derrotar uma pequena força romana em Ticinus, Aníbal esmagou um grande exército romano em Trebia, em 218 AC No ano seguinte, ele emboscou e destruiu um exército consular no lago Trasimeno, na Etruria.

Diante dessa crise, os romanos declararam como ditador, Q. Fabius Maximus, que adotou táticas Fabianas para lidar com Aníbal durante o resto de 217 AC. Os novos cônsu-les em 216 AC defenderam a realização do esmagamento de Aníbal com um único golpe. Um exército consular combinado, com cerca de 80.000 homens, lutou contra o exército púnico em Canas, em 216 AC A derrota resultante foi a pior jamais imposta, anteriormente, sobre o Poder Militar romano, e pior, ela deixou a própria Roma aberta aos ataques de Aníbal.

Aníball, no entanto, não pode levar para casa a sua vantagem. Os romanos não negociaram uma paz, como se poderia esperar. Os aliados romanos da região central da Itália ficaram firmes e não fugiram de Aníbal. Aníbal não tinha equipamentos de sítio e nenhum apoio local para pressionar um cerco a Roma. Apesar de seus sucessos espe-taculares iniciais, as subsequentes campanhas de Aníbal na Itália (216-203 AC), foram, apenas, um pouco mais que irritante para os romanos, cujas atenções estavam desviadas para outro lugar.

Os romanos estavam lutando, simultaneamente, contra forças cartaginesas na Es-panha e na Sicília. O objetivo romano erao de impedir um reforço para Aníbal. As campa-nhas foram difíceis e marcadas por várias derrotas dos romanos mas, eventualmente, os romanos prevaleceram em ambos os teatros.

Siracusa ficou tolamente alinhada com Aníball depois da batalha de Canas, que foi vencida em 211 AC, quando a Sicília foi assegurada por Roma. Asdrúbal, irmão de Aníbal, conseguiu sair da Espanha e tentou seguir para a Itália, mas foi derrotado e morto na ba-talha de Metaurus em 207 AC.

O surgimento de P. Cornelius Scipio no lado romano resultou em vitória para os romanos. Vitorioso na Espanha, o jovem Scipio (Cipião) advogava a realização de uma

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invasão da África para chamar Aníbal para fora da Itália. Apesar da intensa oposição, ele ganhou o debate e levou uma grande força para a África em 204 AC. À vista disso, Aníbal deixou a Itália no ano seguinte para defender sua terra natal, sendo, então, derrotado na batalha de Zama, em 202 AC, após o que Cartago se rendeu..

Os termos de rendição impostos por Roma a Cartago foram muito mais severos que os do final da Primeira Guerra Púnica: Cartago viu-se ibrigada a pagar uma pesada indenização de guerra, além da cessão de territórios cartagineses na Espanha e, na Áfri-ca, grandes extensões do território púnico foram concedidos ao reino nativo da Numídia (a Argélia moderna), agora um aliado romano. A Marinha cartaginesa foi limitada a somente 10 navios. Como Aníbal tinha sido poupado, ele foi perseguido pelos romanos pelos próxi-mos 20 anos, até que ele foi forçado a cometer o suicídio em 182 AC

A Segunda Guerra Púnica teve várias conseqüências importantes para Roma. Ela revelou muito sobre a mentalidade romana; para os cartagineses, ela levou sua pária à sua aniquilação final.,

Os romanos tinham se tornado os mestres do Mediterrâneo ocidental. Em 196 AC, Roma formou duas novas províncias na Espanha, a partir das antigas explorações pú-nicas lá existentes. Roma seria ocupado pelos próximos dois séculos na conquista do resto da Península Ibérica. Interesse romana no sul da França aumentou; Roma iria ficar ocupada com a manutenção de uma rota terrestre aberta para suas novas possessões espanholas. O controle dessa região foi assegurada até 180 AC Acima de tudo, a guerra destacou a tenacidade romana em face da adversidade e a “mão de ferro” que os romanos mantiveram na Itália através de uma Confederação cuidadosamente construída.

Carthago perdeu tudo e acabou sendo destruída pelos romanos. Em 149 AC, em um dos episódios mais vergonhosos da história romana, os romanos empreenderam uma luta com Carago e a sitiou. Os cartagineses se mantiveram por três anos, mas a cidade

Fig 06 – Aníbal (182 AC), o legendário cartaginês.

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caiu e foi destruída em 146 AC O sítio permaneceu vago durante um século.

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Capítulo 12ROMA NO MEDITERRÂNEO ORIENTAL

[Políbio] ficou motivado, ele nos diz, a escrever sua história sobre Roma, especificament, para abordar a questão como os romanos conseguiram o que ele considerava ser um feito notável, a conquista do que ele entendia ser todo o mundo civilizado, em um espaço de pouco mais de 50 anos.

Para os contemporâneos, o surgimento de Roma no palco civilizado, foi um evento desconcertante, dado à sua velocidade e sucesso, como eles mesmos devem ter perce-bido.

Pouco mais de 50 anos decorreram entre o primeiro movimento de Roma para o leste e o fim do Século III AC, até sua perda de poder e do controle sobre toda a extensa região por ela dominada. Políbio, um refém grego em Roma, em meados do segundo sé-culo, foi solicitado a escrever a sua história sobre Roma, dado à necessidade de explicar estes eventos. Seus contos foram e são de um valor inestimável, e é a nossa fonte escrita mais antiga existente sobre a história romana.

Em três guerras, os romanos assumiram e derrotaram o formidável reino da Ma-cedônia Antigônida. A Primeira Guerra Macedônia (215-204 AC) foi travada enquanto a Segunda Guerra Púnica ainda estava em andamento. Após Canas (216 AC), Filipe V da Macedônia fez um pacto com Aníbal, uma vez que ele acreditava que o poder romano na Itália tinha sido quebrado. Para evitar que Filipe ajudasse Aníbal, os romanos enviaram uma pequena força contra ele e fomentaram guerras locais no norte da Grécia. A guerra resultou em pouco mais do que uma série de escaramuças. Ela chegou a um fim nego-ciado em 204 AC, no entanto, as ações realizadas pelos macedônios reforçaram a deter-minação dos romanos, para quem Filipe, então, tinha sido identificado como um inimigo.

A Segunda Guerra Macedônia (200-196 AC) foi travada nas montanhas do norte da Grécia e viu o rei helenístico ser humilhado pela derrota em Cynoscephalae. Os aliados romanos no leste, Pergamum e Rhodes, recorreram à Roma contra Filipe e o rei selêucida Antíoco III, que tinha assinado um pacto de não-agressão entre si. Apesar de estar exaus-ta após a Segunda Guerra Púnica, os romanos enviaram uma força para a Macedônia.

Após vários anos de manobras do tipo “gato-e-rato”, os exércitos se enfrentaram, por acidente, em Cynoscephalae em 197 AC, quando os macedônios foram redondamen-te derrotados. A paz negociada viu a Macedônia ficar limitada entre a Grécia e o mar Egeu. Mais importante ainda, os romanos, agora, passaram a ser considerados os verdadeiros protetores dos gregos, uma posição reforçada pela retirada completa das tropas romanas da região em 194 AC

A Terceira Guerra Macedônia (172-168 AC) significou o fim da dinastia antigônida na Macedônia. O filho de Filipe e sucessor, Perseus, abandonaram a postura complacente do seu pai na direção dos romanos, e começaram a se infiltrar na Grécia e no mar Egeu. Os esforços diplomáticos para evitar uma crise fracassaram, e a guerra eclodiu em 172 AC

Depois de três anos de manobras, os romanos e os macedônios entraram em con-fronto em Pydna, no norte da Grécia. Perseus foi completamente derrotado e deposto, e o seu reino foi dividido em quatro repúblicas. Quando estas repúblicas se revoltaram contra um pretendente antigônida em 150 AC, Roma interveio e anexou o antigo reino como uma província (146 AC). Neste ano, Roma destruiu Corinto, para punir os rebeldes gregos li-vres. Os romanos, a esse momento, já tinhma uma presença permanente no Mediterrâneo

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oriental.Enquanto os conflitos com a Macedônia continuavam, os romanos também derrota-

ram os sírios selêucidas e se tornaram os donos do Mediterrâneo oriental.. Apesar da declaração romana de uma Grécia livre, em 196 AC, muitos gregos ainda

estavam desconfiados das intenções finais de Roma. Desiludida com a hegemonia roma-na, em 193 AC, a Liga Aetoliana convidou Antíoco III da Síria para libertar a Grécia. Os romanos já estavam desconfiados de Antíoco por causa de seu pacto com Filipe e do asilo dado à Aníbal na sua corte.

Quando Antíoco desembarcou na Grécia em 192 AC, ele foi recebido pelas armas romanas, sendo expulso completamente em 190 AC. Os romanos contra-atacaram na Ásia em 189 AC e, embora em menor número, numa proporção de um para três, eles der-rotaram uma força selêucida maciça na batalha de Magnésia, nesse ano. O general roma-no Scipio Africanus foi, mais uma vez, vitorioso sobre um inimigo mais poderoso. Antíoco foi forçado a pagar uma vasta indenização, e a Síria foi impedida de operar na Ásia Menor.

Em 168 AC, os rodianos tentaram mediar entre Roma e Perseu da Macedônia. Uma suspeita romana foi despertada, e Rhodes foi arruinada por um único decreto do Senado. No mesmo ano, Antíoco IV, epifânio da Síria, tentou invadir o Egito ptolomaico, mas foi re-pelido por uma embaixada desarmada do Senado romano. Como resultado, das Guerras Macedónias e Selêucidas, Roma, por volta de 160 AC, ganhou o controle tanto do Medi-terrâneo oriental como do ocidental. O poder romano era tão grande, que poderia ser exer-cido, sem violência, sobre Estados inteiros. A simples amaça de uma confrontação com suas legiões, agora, era o suficeiente para fazer tremer reis e os chefes dos seus exercito.

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Capítulo 13ESCLARECENDO O NASCIMENTO DO

IMPÉRIO ROMANO

Os romanos não ganharam o seu império apenas apertando as mãos das pessoas e beijando bebês. Eles o ganharam através de batalhas como vimos, lutadas, anteriormente. Eles lutaram batalha após batalha, guerra após guerra, em novas e mais distantes potências estrangeiras e, sempre, incrivelmente vitoriosa.

Os romanos ganharam seu império em virtude de seu poderio militar superior e das grandes reservas de mão de obra. O Exército romano da República era uma muito boa máquina de combate. Não era um exército permanente, mas em vez disso, ele era levan-tado ad hoc. Ele era composto por cidadãos-soldados organizados em legiões e por tropas aliadas sob o comando de generais romanos. O serviço militar era um dever da cidadania, em que cada soldado, porém, deveria ter o seu próprio equipamento.

A legião era uma unidade de combate independente que possuía um efetivo de cerca de 4.500 soldados de infantaria, subdivididos em unidades táticas chamadas maní-pulas, num total de 30 por legião. Cada manípula era composta de duas centúrias, cada uma comandada por um centurião. As tropas eram divididas por idade e equipamento em três classes de manípulas (10 por classe por legião).

Na batalha, o exército romano era um oponente formidável e taticamente maleável. O exército entrava em combate com a formação chamada de acies triplex. Carregava so-bre o oponente mediante ordem, primeiro lançando duas saraivadas de javelins antes de se envolver em combate aproximado, quando se servia das suas espadas curtas (gladius). Devido à organização em manipulas e centúrias, o Exército romano era mais flexível no decorrer do combate do que o eram os outros exércitos antigos.

Em razão da sua organização em manípulas e centúrias, o Exército romano era mais flexível em combate do que os outros exército da Antiguidade.

Detalhe da Colina de Trajano, que mostra as tropas romanas em combate.

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O Exército era caracterizado por sua rígida disciplina e pela devoção ao dever. Os acampamentos de marcha são uma boa identificação da disciplina romana. Os acampa-mentos possuíam “layouts” idênticos; neles, cada soldado sabia perfeitamente sua lo-calização e podiam se alimentar e descansar antes de entrar em ação no dia seguinte. Havia um série de recompensas e punições tanto para encorajar os legionários à um bom desempenho, como dissuadi-los de fugir.

Por fim, a Confederação da Itália concedeu aos romanos o acesso às vastas reser-vas de mão de obra (recrutamento) que os seus adversários não poderiam igualar.

As antigas explanações variam quanto a razão pela qual os romanos conquistaram o mundo então conhecido, como eles o fizeram. Políbio apresentou uma série de razões para o sucesso romano, mas a explicação mais abrangente foi o da “roda da fortuna” no grande esquema das coisas empregadas. Mas havia duas razões mais imediatas: o Exér-cito romano era praticamente invencível, e o Estado romano era estável e equilibrado, o que permita que os romanos se concentrassem na luta contra seus oponentes.

Para os romanos, o seu Império parecia ser a ordem natural das coisas. Eles acredi-tavam que o poder de seus deuses e a devoção ao Estado romano resultariam no sucesso e na extensão do seu Império. Houve algumas noções vagas das suas qualidades admi-ráveis (justiça, lealdade, trabalho duro, e frugalidade) que impulsionaram o nascimento do seu Império. O último ponto de vista, por vezes, chegou perto de uma noção de civilização de todo o mundo.

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Capítulo 14“O CONQUISTADOR CAPTURADO” – ROMA E O HELENISMO

Para começar, há que se dizer, desde já, que a helenização de Roma não foi um processo simples que começou em “X” AC e terminou em “Y” AC. Foi um processo longo e complicado que não tem um começo claro real e também qualquer final claro.

A helenização começou bem antes do Século III AC. O apreço romano pela cultura grega começou cedo, e a definição de seu início está perdida para nós. Não há datas de início ou de término para o processo de helenização de Roma; foi um complexo processo de aculturação.

Os etruscos, profundamente helenizados, foram, provavelmente, o precose meio de contato romano com a cultura grega. A história de Enéias, firmemente enraizada na lenda grega, ilustra este fato. No quarto e terceiro séculos, os romanos mudaram-se para o sul da Itália, onde encontraram, pela primeira vez, as cidades-estados gregas em Nápoles, Tarento, e em outros lugares. O envolvimento romano no Mediterrâneo oriental, no entan-to, apressou o processo de helenização.

Políbio (cerca de 200-118 AC) ilustra a situação existente em meados do Século II AC. Políbio foi um estadista grego nascido em Megalopolis, no Peloponeso. Ele era um grego tipicamente urbano e educado, que estava caminhando para a proeminência da Liga Achaeana. Após a Batalha de Pydna, ele foi denunciado aos romanos e preso, sem julgamento, na Itália por 16 anos.

Políbio não foi refém em nosso entendimento. Ele iniciou um relacionamento com P. Cornelius Scipio Aemilianus, filho do general vitorioso em Pydna, e por isso, ele perma-neceu em Roma, como um “convidado” de Cipião. Seu tratamento e posição não foram atípicos para os milhares de gregos que vieram para Roma como escravos naqueles anos, acelerando o processo de helenização.

Existem vários sintomas da helenização de Roma nos séculos terceiro e segundo. A educação romana mudou, e uma verdadeira literatura latina surgiu. Livius Andronicus, um meio-grego de Tarento, atuou como mentor para os filhos de um senador romano líder no final do século III AC Andronicus traduziu a Odisseia de Homero para o latim e compôs trabalhos literários gregos em latim; desse modo ele começou a história da literatura latina.

Autores latinos subsequentes demostraram uma crescente familiaridade com o uso dos gêneros e modos de expressão gregos. Alguns precoces autores romanos compu-seram, em grego, como Q. Fabius Pictor, o primeiro historiador romano. A ascensão da literatura romana foi facilitada pela helenização das práticas educativas romanas do ter-ceiro século em diante. Muitos tutores e professores em Roma eram gregos. Sob suas influências, a tradicional “prática educacional” romana deu lugar a uma outra, helenizada, essencialmente focada na educação.

Embaixadores e intelectuais gregos começaram a vir a Roma e a proferir palestras públicas. Carnéades de Cirene, chefe da Academia de Atenas, deslumbrou as classes superiores romanas com a sua retórica e a sua arte educacional em meados do Século II.

Asclepiades da Bitínia ascendeu a um alto patamar como médico e médico-confe-rencista cerca de 130-100 AC. A arte e a arquitetura romana tornaram-se helenizadas. Os romanos premiaram obras de arte gregas e originais ou cópias delas circularam am-plamente. A arquitetura romana pública passou a ser menos etrusca, passando a utilizar,

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em sua maioria, madeira, tijolos de barro e pedras lisas. Os generais romanos bem-suce-didos começaram a construir templos em estilo grego com um novo meio: o mármore. Os edifícios públicos posteriores em Roma tornaram-se mais e mais elaborados e luxuosos.

A reação romana a tal processo foi mixada e complexa. Muitos romanos, exuberan-temente, abraçaram a sofisticação da cultura e da língua grega. Os aristocratas romanos, como se sabe, aprovaram a vestimenta, a linguagem e os hábitos gregos. Quanto às or-dens inferiores o seguimento ou não a tal exemplo não fica claro.

Houve também uma contra-reação tradicionalista, simbolizada por Marcus Porcius Cato, o Censor (234-139 AC). Cato era de Tusculum, fora de Roma; ele ganhou desta-que como um estadista, soldado e escritor. Ele valorizava as antigas tradições de Roma: severidade, seriedade, dedicação ao dever militar, trabalho duro, frugalidade, e assim por diante. Publicamente, ele protestou contra a helenização. Cato educou seu próprio filho na forma tradicional. Ele havia expulsado Carneades de Roma por minar os valores tradi-cionais. Ele, particularmente, odiava os médicos gregos. Mas, privadamente, ele estava muito familiarizado com a língua e a cultura grega. E ele exibia um conhecimento íntimo da literatura grega que ele mesmo condenava. Ele escreveu obras em um estilo de latim rústico que, conscientemente, contrastava com a sofisticada linguagem grega.

Em suma, a helenização de Roma não deve ser simplificada como um processo de mão-única havido a partir de um determinado período de tempo e que terminou em outro. Foi um processo longo e complicado.

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Capítulo 15O GOVERNO DA REPÚBLICA ROMANA,

PARTE I – O SENADO E OS MAGISTRADOS

A forma do governo romano, a forma da República, era, em parte, um produto da natureza dos próprios ro-manos. Eles eram muito dicotômicos em suas perspectivas. Eles eram inovadores, adaptáveis, e pessoas dinâmicas, mas eram, também extremamente conservadores.

O governo republicano romano não era baseado em uma constituição escrita. Esta evoluiu ao longo do tempo, mas existia desde 150 AC.

O Conflito das Ordens e a expansão romana ajudaram a moldar a evolução do regime de governo e criaram um Estado plebeu paralelo, que foi amalgamado durante a República no início do terceiro século AC

O regime de governo era um produto da mixagem da inovação e do conservado-rismo romanos. A expansão romana na Itália e para além dela também influenciaram na formação da República. O regime de governo refletia a natureza dicotômica dos roma-nos: ao mesmo tempo inovadores e altamente conservadores das tradições antigas (o mos maiorum, ou o caminho dos antepassados). Esta mixagem romana da inovação e do conservadorismo gerou um sistema altamente complexo de administração, repleto de redundâncias.

As duas alas do governo eram constituídas de reuniões de cidadãos e de servido-res executivos (magistrados). A assembléia dos cidadãos existia sob duas vertentes: o Senado e as assembléias populares. A maioria dos servidores romanos ficava adida ao Senado, sendo eles denominados magistrados. Dois conjuntos de servidores, no entanto, ficavam adidos a uma das assembléias populares: os tribunos e os aediles da plebe. A maioria dos magistrados romanos era eleita pelo voto popular e ocupava o mandato por um ano.

O Senado era o corpo proeminente do Estado romano, em razão da tradição e das circunstâncias, e não por virtude de qualquer poder legal. Sua função era de caráter con-sultivo, expresso através dos senatus consulta (decretos) como resultado das questões debatidas e que se prestavam a uma orientação para os magistrados. Mas o Senado não tinha poder legal para aprovar leis.

As origens do Senado são obscuras, mas sua proeminência foi desenvolvida em resposta à expansão de Roma e suas constantes guerras com os vizinhos e Estados es-trangeiros na Itália e além dela. Originalmente era composto exclusivamente por líderes experientes e educados e por generais, mas por volta de 150 AC, passou a ser formado por ex-magistrados e pelos homens mais ricos e influentes das famílias mais proeminen-tes de Roma. Enquanto a expansão de Roma estava em andamento, os aconselhamentos do Senado foram cuidadosamente considerados.

Os magistrados adidos ao Senado eram os mais prestigiados oficiais do Estado romano. A manutenção dessa função era baseada no conceito de partilha de poder e baseava-se em dois conceitos importantes: a colegialidade e o mandato limitado. O man-dato limitado da função assegurava que essa autoridade circulasse com frequência; e a colegialidade garantia que cada magistrado tivesse, pelo menos, um colega que tinha poderes de igualdade com ele próprio e, portanto, poderia vetar suas ações. Isso evitava a ameaça de uma autocracia. Uma vez que a República Romana havia sido iniciada como uma reação contra a monarquia, a noção de partilha do poder era o “carro-chefe” central

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da República.Por volta de 150 AC, foi estabelecida uma hierarquia dos servidores (cursus hono-

rum) que, efetivamente, canalizava os candidatos à ascenção aos níveis de responsabili-dade e de autoridade, em uma sequência ordenada:

— Os questores (quaestors) eram os magistrados mais jovens a quem ficavam afetas as tarefas ligadas às finanças; esta função era limitada aos candidatos com, pelo menos, 25 anos de idade; eram eleitos 10, anualmente;

— Os édiles (aediles), eram os magistrados responsáveis pela infraestrutura e ma-nutenção da cidade, como também pelos jogos e entretenimentos do povo; teriam que ter, no mínimo, 36 anos de idade e, anualmente, eram eleitos 4;

— Os pretores (praetores), magistrados com funções judiciais e também militares e que, como requisito, teriam que ser ex-questores e ter, no mínimo 39 anos de idade; anu-almente, eram eleitos 6. Junto com o pretorado vinha a concessão do imperium (comando) das grandes unidades militares.

— Os cônsules eram os principais magistrados anuais, com totais poderes políticos, judiciais e militares. Este ofício limitava-se a ex-pretores, com pelo menos, 42 anos de idade; 2 eram eleitos anualmente.

Além dos magistrados eleitos anualmente, dois outros ofícios existiam: — Os censores (censors) eleitos a cada 5 anos e que detinham a função por 18

meses, e que era limitada a ex-cônsules. Sua responsabilidade estava afeta ao censo dos cidadãos romanos (sua contagem e sua distribuição por classes), à manutenão da moral pública, à revisão do rol dos senadores e a supervisão da coleta de taxas e das constru-ções públicas;

— Os ditadores (dictatores) magistrados eleitos em razão de circunstâncias extra-ordinárias; nestes casos, a constituição regular poderia ser suspensa e um ditador seria nomeado. Este homem tinha que ser um ex-cônsul e deveria ser indicado por um magis-trado. Ele não tinha nenhum par. Era-lhe atribuída uma tarefa específica, que deveria rea-lizada por seis meses ou até que sua tarefa fosse concluída, ou o que ocorresse primeiro Por volta do Século III AC, esta posição, na prática, desapareceu.

Havia, também, as disposições relativas às interrex para organizar as eleições como necessário..

Um magistrado romano tinha que realizar o seu trabalho pessoalmente, e não por delegação. A obediência aos rituais e a aparição pública faziam parte do exercício da ma-gistratura. Em seus deslocamentos utilizavam lictores para o seu transporte, que empu-nhavam as duas varas (fasces) que sustentavam o seu assento. Quanto mais alto o cargo, mais lictores aparecian na comitiva dos magistrados. Os magistrados também realizavam determinadas funções religiosas.

Por fim, o sistema de governo romano era, verdadeiramente, um regime de governo do tipo “cara-a-cara”.

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Capítulo 16O GOVERNO DA REPÚBLICA ROMANA

PARTE II – ASSEMBLÉIAS POPULARES E ADMINISTRAÇÕES PROVINCIAIS

As assembléias populares desempenharam um papel vital na República Romana. Elas eram os corpos qu elegiam todos os servidores do Estado, fossem eles os magistrados ligados ao Senado ou os tribunos eos aeedis da plebe ligados a uma das próprias assembléias populares.

As assembléias eram órgãos soberanos do Estado romano, mas eram organizadas de tal forma a favorecer as famílias influentes de Roma. As assembléias populares roma-nas eram balizadas por três princípios importantes: somente poderiam se reunir quando convocadas oficialmente por um servidor; a votação deveria ser feita por blocos, e não por cidadãos, votação essa que cessava quando a maioria simples tivesse sido alcançada; e não havia o direito a um endereço livre para o seu funcionamento.

Havia quatro assembléias populares. A mais antiga delas era a Assembleía Curiata (comitia curiata) com raízes no Período da Realeza; ela era obscura e largamente redun-dante em meados da República. Era composta de 30 curiae (grupos de cidadãos) que ratificavam as concessões de poder (imperium) concedido aos magistrados.

A Assembleia Centuriata (comitia centuriata) tinha uma organização mais complexa. Suas raízes podem estar no Período da Realeza, e parece ter sido a reunião do corpo do cidadão em seu disfarce militar. Ela era convocada pelo trompete militar e encontrava-se fora dos muros da cidade, no Campus Martius (Campo de Marte), porque nenhum exército poderia entrar em Roma armado. Os cidadãos eram organizados em blocos de 193 eleito-res chamadas centurias, nome, mais tarde, dado às unidades militares.

O acesso dos cidadãos às centúrias dependia de sua riqueza, e aos ricos e mais influentes eram atribuídos mais centúrias do que aos mais pobres; os totalmente destituí-dos de qualquer riqueza (chamados de contagem por cabeça, ‘capite censi’) também eram agrupados em uma centúria.

A votação era procedida a partir das centúrias mais altas até as mais baixas, e parava quando a maioria dos votos era alcançada, de modo que os pobre e os cabeças--contadas raramente conseguiam votar. A Assembleia Centuriata elegia os cônsules, os pretores, os censores, e (se necessário) o interrex; ela poderia legislar especialmente sobre a guerra e a paz; era, ainda, um tribunal de apelação em casos de pena capital; e deveria ser convocada pelos cônsules ou pretores.

O Conselho da Plebe (plebis concilium), ou Assembleia Tribal da Plebe (comitia plebis tributa), era a assembléia do Estado Plebeu incorporado durante a República. Podia ser formada apenas por plebeus e era organizada em 35 blocos de eleitores chamados tribos, determinados geograficamente. A ordem de votação era determinada por sorteio. Ao contrário das outras assembléias, que tinham servidores ligados a ela, ela tinha 10 tribunos e dois aediles da plebe, todos plebeus, eleitos pelo conselho a cada ano, e que convocavam o conselho. Os Tribunos também tinham o direito de vetar qualquer con-venção ou voto de qualquer assembléia popular. Na sequência de uma lei de 287 AC, os plebiscitos (decisões dos conselhos) passaram a ter força de lei. O município tornou-se o órgão legislativo chefe da República.

Em resposta à incorporação do Conselho das Plebes na República, foi criada uma

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Assembleia Tribal do Povo, mais inclusiva (comitia populi tributa), compreendendo não só patrícios como também plebeus. Ela foi inspirada no Conselho da Plebe e era constituída e votada por 35 tribos.

Era convocada pelos cônsules ou pretores e elegia os curule (patrícios), aediles e quaestores a cada ano. Podia legislar sobre as propostas de cônsules e pretores, e reali-zavam ensaios menores.

O sistema de assembleias populares era cheio de redundâncias, reflexo da tensão entre a inovação e o conservadorismo na cultura romana. Novas assembléias foram adi-cionadas quando novas circunstâncias exigiam, mas as antigas não eram abolidas. Em to-das, menos o Conselho da Plebe, as assembléias eram constituídas a partir dos mesmos cidadãos reunidos em diferentes blocos de voto de acordo com a assembléia.

Apesar da sua complexidade, o sistema funcionava bem enquanto a elite e os ple-beus estavam unidos na luta contra os inimigos externos: O Senado convocava, discutia o assunto, votava, e emitia o seu parecer. O assunto era, então, formulado como uma proposta de lei que era discutida em reuniões abertas (contiones). Uma vez que a discus-são terminasse, uma assembléia formal era convocada, com os cidadãos organizados em seus blocos de voto adequados, quando a lei era lida, e a votação era realizada.

A atitude romana para a administração das províncias, em contraste, era caracteri-zada por um desejo de se exercer o máximo de controle com uma menor responsabilida-de. Em 140 AC, Roma tinha apenas oito províncias sob sua administração direta: Sicília, Sardenha, Córsega, Gália Cisalpina, as mais pertas; e mais longe, a Espanha, a África, e a Macedônia. Mesmo dentro das províncias, a administração era notavelmente folgada. A nova província deveria ser estabelecida por meio de uma comissão de 10 senadores que visitavam o território e avaliavam as comunidades nelas existentes. Os Estados livres e os federados obedeciam a um tratado firmado com Roma e eram geralmente isentos de impostos. Os Estados livres e imunes eram isentos de impostos. Os Estados tributá-rios prestavam um tributo anual a Roma. Esperava-se que todos os Estados provinciais fossem obedientes e ordeiros, para pagar impostos quando necessário, e para fornecer homens para o Exército romano.

Inicialmente, os romanos criaram para as províncias novas magistraturas (por exemplo, os novos magistrados para a Sicília, a Sardenha, e Espanha) para poder gover-nar o império crescente. Cada vez mais, no entanto, eles preferiram estender o poder de um titular (imperium) por mais um ano, o que lhe permitia governar uma província como um procônsul ou propraetor, enquanto novos cônsules e pretores assumiam a função. O procônsul ou propraetor era responsável pela manutenção da paz e por verificar se os impostos eram recolhidos; para isso ele tinha uma equipe mínima formada por um questor (para as questões financeiras), representantes (legati), e os amigos que ele levava para ajudá-lo (comites). Este sistema de administração provincial não era supervisionado e ficava, consequentemente, exposto à terríveis abusos..

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Capítulo 17AS PRESSÕES DO IMPÉRIO

O rápido aumento da expansão de Roma na Itália e em todo o Mar Mediterrâneo exerceu certas pressões e influências tanto na política romana como na sociedade romana e preparou o palco para a eventual dissolução de todo o sistema de governo que examinamos até então, a República Romana .

A dominância do Senado foi reforçada pelas guerras de expansão, mas as políticas senatoriais eram facciosas. As guerras de expansão reforçaram bastante a posição domi-nante do Senado, uma vez que as continuadas guerras e os sucessos romanos acabaram por fortalecer a posição política do Senado no Estado romano.

Embora apenas as assembléias aprovassem as leis, tornou-se habitual para o Se-nado ver seus aconselhamentos promulgados como leis. O senso corporativo do Senado do direito ao poder e a liderança ficou mais forte, especialmente nas esferas das finanças e dos negócios estrangeiros, as duas esferas em que a sua supremacia era, praticamente, incontestada.

O Senado tinha uma identidade corporativa forte, mas dentro do próprio Senado havia divisões nítidas. Ele era dominado pelos nobres (nobiles), um pequeno grupo de famílias particularmente poderosas. Os recém-chegados (apelidado de “novos homens”) encontravam um revanchismo feroz. As facções não eram partidos políticos organizados em linhas ideológicas, mas sim em alianças de oportunidade entre homens influentes. Uma facção tinha uma família líder e outras famílias satélites além de apoiadores em dife-rentes graus de influência em torno daquela liderança.

O objetivo da facção era o de ver seus integrantes posicionados nas provedorias de maior prestígio e nos mais altos comandos militares, para bloquear a subida dos adversá-rios. As políticas senatoriais eram, portanto, um negócio pessoal e competitivo.

Alianças dentro das facções poderiam ser formadas e dissolvidas rapidamente. Até certo ponto, os engajamentos estrangeiros eram vistos e utilizados como ferramentas nas constantes lutas entre as facções internas.

O crescimento do império também trouxe pressões sociais e econômicas. Uma nova classe de liderança emergiu. Quando o império cresceu, os empresários obtiveram lucros fora, ao explorarem novos territórios. Por volta de 120 AC, estes homens passaram a ser conhecidos como “cavaleiros romanos” (equites), e essa ordem equestre formou uma nova classe social em Roma. As distinções simplistas entre cavaleiros e senadores baseadas na riqueza ou ocupação não eram convincentes; a situação era mais complexa. Os senadores poderiam tomar parte no comércio e outros negócios, e os equites poderiam possuir enormes quantidades de terra. Alguns senadores eram mais pobres do que os equites. Na realidade, senadores e equites formavam a mesma e ampla classe sócio-eco-nômica; tudo o que os distinguia era a participação na política.

A estratificação da sociedade romana e da política era, agora, muito mais complexa. A classe equestre senatorial constituía a elite do poder. Dentro da classe senatorial, havia divisões entre patrícios e plebeus, nobilis e ordinarius, estabelecidos e novas famílias. Os equestrians se sobrepunham aos senadores, mas não participavam da política. Somente os senadores e os cavaleiros eram elegíveis para assumir um oficio público; um eques que fosse eleito para uma magistratura entrava para o Senado como um novo homem.

Para as classes mais baixas, também houve também mudanças. Para aqueles que não se tornassem ricos, o império era uma bênção mista. Alguns se tornaram soldados e

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passaram a ser mais influentes; outros deixaram suas fazendas e nunca mais voltaram, ou voltaram para elas e as encontraram dilapidadas. Cada vez mais, estes últimos passaram a vender suas fazendas e a seguir para a cidade para se juntar à contagem por cabeça.

Uma crise de recursos humanos estava se formando de meados para o final do Século II AC. Os senadores influentes e os equestrians haviam formado propriedades cada vez maiores, que eles cuidavam às custas do trabalho escravo barato. Os pequenos agricultores despossuídos caíram abaixo do perfil de qualificação para o serviço militar. Começou a faltar mão de obra para o Exército romano.

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Capítulo 18OS IRMÃOS GRACO

Tibério Graco foi motivado por uma única questão à qual ele se apegou e a forçou da melhor maneira possí-vel, mas Caio Graco não. Durante seu período como tribuno, ele trabalhou em cima de uma vasta gama de projetos de lei versando sobre uma grande variedade de assuntos. Ele parece ter sido mais acalorado que seu irmão, mais abertamente antisenatorial.

A Revolução Romana não foi um evento planejado, mas sim uma longa série de eventos interconectados que se estendeu por várias gerações. Ao contrário da Revo-lução Russa, por exemplo, ninguém encena uma revolução só por razões ideológicas. No caso de Roma, pelo contrário, foi uma série de eventos nas esferas nacionais e estrangei-ras que construíram os precedentes para se formar uma espiral cada vez mais violenta de desordem e perturbação. O efeito final desses eventos foi a derrubada da República e a sua substituição pelo governo dos imperadores.

O tribunato de Tibério Graco em 133 AC foi o ponto de partida para a revolução. Graco, um nobre, havia estabelecido o caminho da reforma agrária. Ele estava ciente dos problemas relativos à propriedade das terras e da disponibilidade de mão de obra que re-sultaram no crescimento do Império. Como tribuno da plebe, ele propôs uma lei versando sobre a reforma fundiária, assim criando um maior número de pequenos agricultores que seriam elegíveis para o serviço militar. Uma lei antiga de 367 AC deveria ser revista, a que limitava a quantidade de terras públicas (ager publicus) que qualquer cidadão poderia possuir. Os cidadãos com quantidades excessivas de terras públicas teriam, então, que devolver o excedente para o Estado romano. Os terrenos com isso recuperados seriam, então, distribuídos entre os pobres sem-terra que compreendiam os capite-censi. Embora essa lei fosse desvantajosa para os ricos, Graco obteve apoio no Senado.

A questão da verdadeira motivação de Graco tem sido um assunto de controvérsia acadêmica; diferentes pontos de vista concluem que ele era um verdadeiro reformador que trabalhou para o benefício do Estado, ou que ele era um trabalho revolucionário que visava ganho pessoal ou, ainda, que ele era um político romano com um olho em uma verdadeira necessidade e outra sobre os benefícios para si e seus apoiadores.

O conflito sobre a lei de Graco teve consequências desastrosas. Graco contornou o Senado e propôs a lei para o povo no Conselho Tribal da Plebe. O Senado, em contra partida, contratou outro tribuno, M. Octavius, para vetar o projeto de lei de Graco. Graco respondeu depondo Octavius por plebiscito. Ele colocou em questão um dos conceitos centrais do regime de governo romano: a colegialidade. Sua lei passou, mas o Senado recusou-se a financiar a sua implementação. Graco, em seguida, propôs uma lei para liberar dos impostos a nova província da Ásia (o antigo reino de Pérgamo) para, assim, financiar sua reforma agrária. Desse modo, ele incitou a assembléia popular a pressionar o Senado de forma a manter a situação tradicional do Estado e dos Negócios estrangeiros. Acreditando que o trabalho da Comissão de Terras garantiria a necessária proteção adi-cional, Graco declarou sua intenção de ficar para o tribunato de 132 AC Ele, desse modo, prejudicou outro conceito central do regime de governo romano: o do mandato limitado.

Os senadores alarmados podiam ver na frente deles a perspectiva de um governo por tribunos à frente da assembléia tribal. Quando Graco realizou um comício eleitoral, alguns senadores saíram da casa do Senado e levaram Graco e 300 de seus seguidores

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à morte. O cadáver de Graco, como a de um criminoso comum, foi jogado no Tibre.Quaisquer que tivessem sido os seus motivos ou intenções, o legado de Graco

não foi bom. Ao forçar seu projeto de lei sobre o solo, ele expôs uma fraqueza fatal na maquinaria tradicional de governo republicano: o Senado não tinha poder legal, mas a assembléia tribal o tinha. Outros que desejassem desafiar o Senad tinham, agora, uma nova via de acesso para o poder aberta para eles. E mais importante, uma violência tinha sido utilizada para suprimir Graco, e, assim, ela entrou para a política doméstica romana pela primeira vez.

Os tribunatos de Caio Graco de 123 a 121 AC foram mais abertamente revolucio-nários do que o próprio Tibério Graco tinha sido. Caio Graco não fora motivado por um problema, mas em vez disso, ele propôs uma série de leis sobre várias questões. O obje-tivo dessas leis visava obter o apoio para si mesmo. Caio Graco era mais demagogo do que Tibério Graco e mais antagônico ao Senado. Suas leis parecem ter sido destinadas a angariar apoio para si mesmo, a partir de vários grupos:

• O povo, por meio do fornecimento de grãos baratos, do emprego em projetos de reparação de estradas, e da fundação de colônias ultramarinas para os sem-terra;

• Os cavaleiros, por meio de propostas fiscais e autorização para se sentar em júris em casos de extorsão; e

• Os aliados italianos, por meio de direitos latinos tornando-se totalmente emanci-pados; e os não latinos pela atribuição de direitos latinos.

A questão do status dos aliados tinha emergido como séria no ano de 120 AC, e os romanos estavam relutantes em compartilhar sua cidadania tão amplamente. A proposta de Caio Graco para uma cidadania em massa minou sua popularidade. Em 122, o Sena-do contratou um tribuno, M. Livius Druso, para vencer Caio Graco. Livius ofereceu grãos gratúitos, colônias na Itália, em vez de no exterior, e um melhor tratamento aos exércitos de aliados.

O povo desertou de Caio Graco para Lívio; a tensão aumentou quando seu segundo tribunato chegou ao fim e ele enfrentou uma acusação. Temendo por sua própria seguran-ça, Caio Graco começou a usar guarda-costas armados sub-repticiamente. Quando uma briga irrompeu em uma reunião política, um motim explodiu, em face do que o Senado emitiu um decreto de lei marcial (senatus consultum ultimum). Caio Graco e 3.000 dos seus apoiadores pereceram nas lutas de rua que se seguiram.

Os Gracos tinham desafiado a autoridade do Senado, indicando um novo caminho para o poder em Roma, e pagaram um preço alto por isso. Mas aor suprimi-los por meio da violência, o Senado abriu o caminho para o colapso final da República.

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Capítulo 19MÁRIO E SULLA

Iremos olhar a carreira de Marius e, então, a de Lucius Cornelius Sulla, o próximo protagonista da Império romano, que era um oponente de Marius. . E como suas carreiras foram sobrepostas, então iemos olhar cada um deles, por sua vez.

A política romana tornou-se cada vez mais polarizada, na esteira dos Gracos. Os políticos romanos caíram, cada vez mais, em um dos dois grupos políticos formados. Aqueles que seguiram o novo caminho apontado pelos Gracos foram denominados popu-lares (homens do povo) que favoreciam o uso dos tribunos, da assembléia tribal, e de uma postura antisenatorial para possibilitar o seu avanço.

Em oposição aos populares estavam os auto denominados optimates (os melho-res), que seguiam a forma tradicional, com o Senado dominado para fazer as coisas. Estes grupos baseavam-se mais a métodos do que a uma ideologia, como no sentido moderno.

Nessa oportunidade, C. Marius, uma nova personagem vinda de Arpinum na Itália, ganhou destaque, em virtude de seus espetaculares sucessos militares. Mas o início da carreira política de Marius foi inexpressivo. Ele ganhou fama, inicialmente, ao derrotar os inimigos de Roma, na Numídia. Jugurta, rei do reino aliado da Numídia, tinha estado lutando uma guerra contra Roma desde 111 AC. Jugurta iludiu a derrota através de uma combinação de táticas militares inteligentes e do suborno de comandantes romanos.

Enquanto servia como uma oficial na Numídia, Marius foi elevado para o consulado de 107 AC, sob a promessa de acabar com a Guerra de Jugurta em um ano. Como cônsul pela segunda vez em 105 AC, ele acabou com a guerra e capturou Jugurta.

Mas, na verdade, o oficial que realmente efetuou a captura de Jugurta chamava-se L. Cornelius Sulla. Marius era, agora, o herói militar do povo romano. Em 104-100 AC, ele alcançou uma posição de poder sem precedentes, como resultado da ameaça das tribos germânicas ao norte da Itália. Desde 120 AC que duas tribos germânicas, os Cimbri e os Teutones, tinham deixado suas terras nativas na Dinamarca e mantinham-se vagando perto da fronteira italiana e na Gália. Eles já haviam derrotado três exércitos romanos, quando, em 105 AC, quase esmagou um exército consular em Arausio, na Gália Transal-pina (uma nova província formada em 121 AC).

As lembranças do saque gaulês de 390 AC geraram pânico em Roma, em razão do que Marius foi escalado para o papel de “salvador da pátria”. Em face de três consulados sucessivos (104, 103 e 102), Marius havia criado e treinado um novo exército que esma-gou os Teutones em Aquae Sextiae (Aix-en-Provence) em 102 AC e os Cimbri em Ver-cellae em 101 AC Em 100 AC Marius estava nos píncaros da glória, agora mantendo seus sexto consulado em um período de oito anos. Sua carreira não foi tão acentuada como um político quanto como a de um soldado; Marius foi, então, atropelado por seus adversários no seu sexto consulado em Roma, e retirou-se para a vida privada.

Para efetuar suas vitórias, Marius fez várias reformas militares importantes. Suas reformas contribuíram para a final profissionalização do Exército romano (por exemplo, a padronização das legiões) tornando-o mais eficaz no campo. Em termos de alistamento, no entanto, ele fez uma grande jogada.

Marius alistou e equipou às custas do Estado os homens oriundos da “contagem por cabeça” (capite censi) em Roma. A estes soldados foram prometidas concessões de terras

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quando fossem dispensados do serviço militar.O movimento teve ramificações políticas duradouras que, em grande parte, não

foram realizadas pelo próprio Márius: Ele criou uma tropa de “sem-terras” dependentes do patrocínio de seus comandantes como recompensas pelos serviços prestados. Através das reformas de Marius, o Exército romano tornou-se mais eficiente, mas também mais politizado. Os acontecimentos do sexto consulado de Márius em 100 AC bem ilustram a questão.

Sulla, por seu turno, ganhou proeminência, inicialmente, como um subordinado de Marius mas, mais tarde, como comandante por seus próprios méritos, durante a Guerra Social (91-88 AC). Um patrício, Sulla surgiu sob Marius, mas não tinha amor por ele. Sula tinha servido com Marius nas lutas contra Jugurta, cuja captura ele tinha organizado, e contra os teutões.

Sula era oriundo de uma antiga, mas empobrecida família patrícia, o oposto de Marius. Sula e Márius poderiam, inicialmente, ter se havido em bons termos, mas eles se afastaram em algum momento, possivelmente pela falha de Marius em não reconhecer a captura de Jugurta por Sula.

A questão dos aliados continuou a queimar na década de 90 AC mas incendiou na guerra em 91 AC, quando um tribuno, M. Livius Drusus, preparou-se para aprovar uma lei que garantia aos aliados a cidadania romana, mas ele foi assassinado antes que a lei pudesse ser aprovada.

Em resposta, alguns dos aliados, especialmente os Samnitas e algumas comunida-des sul-italianas, formaram um estado secessionista (Italia) que entrou em guerra contra Roma. Foi um conflito vicioso, mas válido, pois os romanos conseguiram a cidadania para todas as comunidades leais dentro de um ano após o início das hostilidades. Muitos rebel-des, agora, haviam revertido para Roma, mas os samnitas continuaram a lutar.

Esta Guerra dos Aliados (ou “Guerra Social”) durou três anos e viu Marius emergir de aposentadoria para assumir o comando das forças romanas no norte da Itália, enquan-to Sula, como propraetor, obteve o teatro sul do comando.

Embora Mário e Sila tivesem cooperado mutuamente durante a Guerra Social, sua inimizade eclodiu, mais uma vez, no final da guerra, o que lançou a República no abismo de uma Guerra Civil.

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Capítulo 20“AS REGRAS DA REALEZA DE SULLA”

Já vimos o desenvolvimento de uma revolução a partir de raízes relativamente inócuas até uma situação que envolveu níveis crescentes de desordem. Sob Sulla, novas raízes profundas de desordem foram criados e que e racharam o Estado romano.

Com a Guerra Social finda, a inimizade entre Márius e Sula atingiu novos picos que levaram aos piores precedentes, ainda na Revolução Romana. Durante a Guerra Social, um rei oriental ascendeu ao poder, para desafiar a autoridade romana na Ásia; uma com-petição para obter o comando contra ele levou Sula a tomar medidas drásticas.

Mithridates VI Eupator de Pontus era um rei ambicioso que, em 89 AC, aproveitou--se das preocupações romanas na Itália para conquistar a Ásia e levantar a bandeira da revolta grega contra Roma. Em um ato desesperado, o também chamado Vesper Asiático, Mithridates ordenou que todos os romanos e italianos em seu reino fossem mortos em uma única noite. O banho de sangue resultante, segundo alguns relatos, matou mais de 80.000 pessoas.

Tanto Sulla quanto o envelhecido Marius querian o comando das ações contra Mitrí-dates, não só pela glória, com também pela promessa de riqueza que a operação oferecia. Quando feito cônsul em 88 AC, a Sulla foi atribuído tal comando pelo Senado, de acordo com o procedimento tradicional. Marius contratou, então, um tribuno, P. Sulpício Rufus, para assumir o comando para ele pelo voto do povo. A situação ilustra bem a divisão exis-tente entre os optimates (que aceitavam o comando Sulla pelo Senado) e os populares (que daria a Marius o comando escolhido pelo povo).

A reação de Sula e a contra-reação de Marius foram ambas rápidas e violentas, estabelecendo um mau precedente. Sulla seguiu para suas 6 legiões na Campânia e re-cebeu os seus apoios. Ele, então, virou seu exército sobre Roma e colocou Marius para fora da cidade, chamando-o de tirano. Tendo resolvido o caso em Roma e colocando uma recompensa pela cabeça de Marius, Sula foi para o leste para lutar contra Mitridates.

Embora Sula estivesse tentando reforçar um governo tradicional, ao invés de der-rubá-lo, ele tinha realizado o ato mais revolucionário da história romana daqueles tempos: ele tinha marchado um exército romano contra os próprios romanos. Com este precedente agora em jogo, Sulla, sem saber, condenou a República à decadência e aumentou a vio-lência.

Marius fugiu para a África, mas em 87 AC ele voltou para a Itália e juntou forças com um cônsul rebelde, L. Cornélio Cinna e juntos marcharam para Roma para reverter a situação de Sula. Marius, então, vingou-se da cidade que o havia traído, até que Cinna interveio para deter a carnificina e o caos. Declarando-se cônsul pela sétima vez em 86 AC, Marius veio a morrer, poucos dias depois de tomar posse. Sula, a este ponto, voltou do oriente para travar uma guerra total contra os seus adversários na Itália.

Depois de lutar uma difícil e indecisa campanha contra Mitrídates em 88-83 AC, ele voltou a lutar em uma grande Guerra Civil na Itália. Entre 88 e 84 AC, uma situação estra-nha foi obtida: Sulla estava lutando contra uma guerra em nome de uma Roma governada por seus adversários políticos; um confronto era iminente

Depois de concluir uma paz vergonhosa com Mitridates em 85 AC e saquear as cidades ricas do oriente, Sula voltou para a Itália em 83 AC. Sulla lutou e derrotou os seus

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adversários no campo de batalha, até que, em meados de 82 AC, ele foi deixado sozinho no controle exclusivo de Roma e da Itália. Sob sua supervisão, a revolução romana caiu para novas profundezas da depravação.

Depois de sua vitória, Sulla promulgou expurgos em larga escala, chamados pros-crições, ocasião em que ele reviveu o ofício de dictator, já há muito tempo adormecido, embora de forma modificada.

Quando ele entrou em Roma em meados de 82 AC, Sulla começou a executar os seus inimigos (ele havia capturado os Samnitas). Respondendo aos apelos do Senado para um procedimento menos caótico, ele organizou essas execuções como proscrições, que já vinham sendo realizadas por toda a Itália há quase um ano. Sula e seus partidários organizavam as listas dos proscritos. As pessoas que aparecessem na lista poderiam ser mortas por uma recompensa; suas propriedades eram confiscadas e leiloadas a preços baixísimos. Muitos da facção de Sula aproveitaram a oportunidade para acertar velhas contas ou, principalmente, para adquirir os imóveis dos proprietários proscritos.

Algumas vezes durante este período (em 82 ou 81 AC), como já dito acima, Sula foi nomeado ditador, um título que estava fora de uso e estava adormecido desde a Guerra Anibalistica. Mas Sula modificou a ditadura em dois aspectos importantes. Ele não exer-ceria o cargo nos tradicionais seis meses, mas sim durante o tempo que ele quisesse, e ele assumiu como atribuição ditatorial específica, excepcionalmente, a ampla tarefa de formalizar as “as leis escritas e a organização do Estado.” Sulla, em seguida, usou seu novo poder para reformular o governo de Roma.

Como ditador, Sulla estabeleceu uma legislação destinada a voltar o relógio do tem-po para os idos da revolução e a restaurar o governo senatorial tradicional. A legislação de Sula foi claramente destinada a inverter a tendência para o governo dos populares em Roma. Embora audaciosa, a legislação de Sula era reacionária e retrógrada. Ele acabou por amordaçar o tribunato e a Assembleia Tribal: os ex-tribunos foram impedidos de re-alizar qualquer outra função e não poderiam propor qualquer legislação; os plebiscitos passaram a ser objeto de um veto senatorial. Ele reformou o Senado, expulsando muitos de seus membros e instalando os recém-chegados leais a ele. Ele tentou impedir que os comandantes do exército fizessem o que ele tinha feito. Ele também emitiu outros regu-lamentos sobre temas que estavam em repouso já durante muitas décadas, como a sua criação de tribunais permanentes de inquérito ou o endurecimento do cursus honorum. Em 79 AC, o seu programa legislativo foi concluído, ocasião em que Sulla renunciou à sua ditadura e retirou-se para a vida privada. Ele veio a morrer no ano seguinte.

A carreira de Sila é emblemática da revolução romana como um todo. Como pes-soa, Sulla foi uma estranha mistura de mediocridade e brilho, indolência e ação, e placidez e maldade; pensa-se que ele teria sido um sociopata. Sua carreira ilustra a ampla natureza da revolução romana: personalidades operando com visão relativamente estreita e esta-belecendo, assim, precedentes perigosos para o futuro. Sula reagiu a essas circunstân-cias como ele bem entendesse no momento (como por exemplo, marchar sobre Roma); ele deu pouca atenção ao exemplo que ele estava dando para a sociedade romana. Sua tentativa de restauração do governo senatorial foi condenado pelas políticas de poder pes-soais da República, que não poderiam permitir que uma ferramenta tão útil como o tribuno pudesse mentir por muito tempo. Decorrridos nove anos de sua morte, a legislação de Sula tinha sido completamente desfeita, e a Revolução Romana mudou-se para as suas fases finais e mais sangrentas.

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Capítulo 21O DESFAZIMENTO DA LEGISLAÇÃO DE SULA

Ao longo da década de 70 AC, aquela restauração proposta por Sula, a Constituição Sulana, foi desfeita com-pletamente. Em 70 AC, encontrou-se completamente finda.

Imediatamente após a morte de Sulla, os maus precedentes que ele havia estabe-lecido para o futuro se manifesrtaram. Um dos cônsules de 78 AC partiu para uma revolta armada. M. Aemilius Lepidus havia tentado promulgar uma legislação populista, como a restauração do tribunato e a restituição das terras confiscadas aos italianos pelo programa de colonização de Sula.

Lepidus juntou forças com os italianos rebeldes na Etruria e no norte da Itália e mar-chou sobre Roma em 77 AC. O Senado declarou a lei marcial e as forças levantadas por Lepidus foram derrotadas na Batalha da Ponte Mílvia, sendo que Lepidus veio a morrer pouco depois. A insurreição armada que Lépido tinha tentado, foi um presságio do pior que estaria por vir.

A revolta de Lepidus, e aquela de Q. Sertorius na Espanha, ajudaram a trazer Pom-peius Magnus (Pompeu) à proeminência. Pompeu tinha se juntado a Sula quando era um jovem em 83 AC e lutou com sucesso contra os Marianos na África. Ele mostrou sua audácia ao exigir um triunfo para estas ações iniciadas por Sula. Quando Lepidus se re-voltou, a Pompeu — embora não tivesse a idade legal e nunca houvesse exercido uma magistratura — foi concedido o imperium de propraetor e lhe foi atribuído um comando.

Com Lepidus derrotado, Pompeu usou seu exército para “sugerir” ao Senado que lhe fosse dado o comando contra um adversário mais poderoso: Q. Sertorius, na Espanha. Sertorius era um Mariano que tinha organizado, com sucesso, a Espanha em uma provín-cia “anti-Roma”, completa, de cunhagem própria e dotada de um Senado próprio Ele tinha se mantido contra os tenentes de Sula e, agora, via-se reforçado pelos restos do exército de Lepidus derrotado.

Pompeu foi enviado pelo Senado para derrotar Sertorius, contra o qual ele realizou uma campanha dificultosa que durou seis anos (77-72 AC), e que só terminou quando Ser-torius foi traiçoeiramente assassinado por um subordinado com ciúmes. O assentamento de Pompeu na Espanha foi, então, justo, e lá ele ganhou muitos amigos.

Enquanto Pompeu encontrava-se na Espanha, o plutocrata M. Licinius Crassus ga-nhou poder em Roma, particularmente como resultado de uma guerra de escravos no sul da Itália.

Crassus tinha se beneficiado financeiramente das proscrições de Sula, apesar de seu início de carreira ter ocorrido de maneira normal. Crassus era oriundo de uma antiga família patrícia. Ele aumentou muito a sua riqueza através da compra de propriedades dos proscritos e do envolvimento em uma variedade de negócios de risco, tais como o arrendamento de escravos. Ele empregou sua fortuna em vastas operações de suuborno para garantir sua eleição à magistratura, através da qual ele avançou de forma correta. Por outro lado, esses anos em Roma foram relativamente tranquilos, embora eles viessem a provar ser uma calmaria que antecederia uma tempestade.

A revolta de Spartacus propiciou a Crassus a chance da glória militar, mas que foi manchada pela interferência de Pompeu. O afluxo maciço de escravos para a Itália, como resultado do crescimento do império, tinha provado ser problemático para Roma.

Em 135-133 AC, tinha havido uma enorme revolta na Sicília, que exigia que um

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exército consular a suprimisse. Em 73 AC, houve outra grande revolta de escravos, a última na história antiga, que eclodiu em Capua. O líder era um gladiador trácio chamado Spartacus, que havia treinado seu exército para lutar eficientemente e que, impiedosa-mente, saqueou as propriedades ricas, inicialmente na Campânia, e em seguida, em toda a Itália. Os exércitos enviados contra ele foram derrotados, até que Crassus, como pro-praetor em 71, finalmente derrotou Spartacus e, ou devolveu os sobreviventes aos seus proprietários, ou os crucificou ao longo da Via Appia, às portas de Roma.

O sucesso de Crasso, porém, foi prejudicado por Pompeu, que voltou da Espanha, apoiou as operações remanescentes, e reivindicou algum crédito por ter suprimido a re-volta. Crassus, portanto, não tinha o menor amor por Pompeu. Crassus e Pompeu foram ambs tornados cônsules em 70 AC e, em conjunto, viram a dissolução final da Constitui-ção de Sula.

As ações de Pompeu ao retornar da Espanha são instrutivas. Sob o pretexto de aju-dar a acabar com Spartacus, ele manteve o seu exército intacto. Ele, então, acampou seu exército perto de Roma e “pediu” um consulado em reconhecimento pelos seus serviços — apesar destes nunca terem garantido qualquer magistratura a esse ponto. Pompeu era “tão verde” que, quando chegou a ser um magistrado, ele pediu ao estudioso M. Terêncio Varrão que preparasse um manual de aconselhamentos para ele.

Crassus regiu, não desafiando o comportamento ameaçador de Pompeu, mas sim o imitando. Crassus acampou seu exército perto de Roma e solicitou o seu próprio consu-lado. Os sabidamente conhecidos inimigos, portanto, tornaram-se cônsules em 70 AC e encenaram uma reconciliação pública. Os restantes elementos inconvenientes da legisla-ção de Sula, finalmente foram, então, removidos.

Os tribunais foram tirados do controle exclusivo do Senado e divididos entre os se-nadores, os cavaleiros, e o misterioso tribuni aerarii. O Senado foi purgado por censores amigáveis (o primeiro em 17 anos); muitos dos expulsos tinham sido indicados por Sula. O tribunato foi restaurado em sua plenitude, como antes das reformas de Sula.

A motivação de Crassus e Pompeu em fazer tudo isso era, sem dúvida, a maximiza-ção de suas opções futuras, com o propósito de manipular o sistema em benefício próprio.

Sob a constituição sulana, eles só poderiam fazer acordos com o Senado; já com aquela extinta, eles poderiam fazer uso dos tribunos e também do povo.

O início das carreiras de Crassus e Pompeu mostrou que a legislação de Sula es-tava condenada. A tentativa de Sula em fazer voltar o relógio e restaurar a supremacia do Senado havia falhado. A política romana havia se tornado demasiado cruel para permitir que uma ferramenta tão útil como o tribunato não fosse utilizada. O mais importante era que a própria carreira de Sula propiciava que uma indicação elevada a alturas vertigino-sas poderia ser alcançada com o apoio militar. O fato é que Lepidus, abertamente, além de Crassus e Pompeu, mais enigmaticamente, caracterizaram lideranças de mau agouro para o futuro.

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Capítulo 22POMPEU E CRASSUS

Os esforços de Crassus para bloquear a enorme popularidade de Pompeu, que, no decurso da década de 60 AC subiu a novas alturas por trás de vários desenvolvimentos em assuntos externos, trouxe em cena um jogador novo e muito capaz no teatro político da revolução romana: Gaius Julius Caesar

Os eventos em negócios estrangeiros na década de 60 AC. levaram ao surgimento de Pompeu como um herói militar popular. Mithridates de Pontus tinha sido deixado fora de ação por Sula em 83 AC. E ele começou uma nova guerra na Ásia em 75 AC

Apesar dos melhores esforços dos generais de Roma, a guerra ainda se arrastava em 67 AC. A guerra de Mithridates na Ásia exacerbou o problema da pirataria no Medi-terrâneo, que acabou por selecionar Pompeu para solucioná-lo, com uma concessão de poderes sem precedentes.

Para reforçar a sua posição, Mithridates trabalhou na liga com os piratas da Cilícia, cujas atividades já haviam atingido uma intensidade alarmante, ameaçando o fornecimen-to de grãos da própria Roma. O povo ficou agitado e um tribuno, A. Gabinius, propôs uma lei que conferia um vasto imperium a Pompeu para resolver o problema da pirataria.

A lei foi aprovada; Pompeu deveria possuir um imperium infinitum (poder não limi-tado a uma única província) sobre todos os governadores locais em todo o Mar Mediterrâ-neo, todas as suas ilhas, e até 50 milhas para o interior.

A concessão do imperium foi por três anos, para lidar com os piratas. Pompeu tam-bém foi nomeado para supervisionar a entrega dos grãos de Roma por cinco anos.

Pompeu realizou a comissão de três anos em três meses, tratando os piratas com clemência e estabelecendo-os como comerciantes e agricultores na Cilícia. Com os pira-tas derrotados, Pompeu teve seu enorme imperium transferido para a Ásia, para que ele pudesse findar a guerra contra Mitrídates. Tecnicamente, o imperium de Pompeu teria caducado com a derrota dos piratas.

Fig 07 - Gaius Julius Caesar (100–44 AC).

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O tribuno, C. Manilius, propôs uma lei em 66 AC transferindo o imperium de Pompeu para todo o Oriente Médio, para resolver os assuntos lá pendentes. Com a lei aprovada, Pompeu dedicou os próximos quatro anos para derrotar Mitrídates e reorganizar toda a situação geopolítica no leste romano.

Em seu arranjo dos assuntos orientais, Pompeu comportou-se como um monarca absoluto: formou novas províncias, ajustou as existentes, realizou alianças e negociou tra-tados, tudo por sua própria autoridade. Em 63 AC, as ações de Pompeu no leste estavam no final, e ele estava pronto para voltar para Roma.

Crassus moveu-se o melhor que pôde para conter o enorme poder e a grande popularidade de Pompeu. Enquanto Pompeu estava sendo coberto com glória, no leste, Crassus dava o melhor de si para minar sua posição em Roma. Crassus apoiou várias medidas destinadas a limitar ou prejudicar a posição de Pompeu e fortalecer a sua própria. Ele, inclusive, apoiou a carreira de um habilidoso jovem nobre, Gaius Julius Caesar.

Com acesso aos cofres de Crasso, César avançou até o cursus in proper order e, em 63 AC, ele ganhou tanto o pretorado como a posição de Pontifex Maximus, o tempo de vida do sumo sacerdócio de Roma, que lhe conferia um enorme prestígio em seu histórico. O retorno de Pompeu, agora, era iminente. Muitos se lembraram do que tinha acontecido quando do advento do retorno de Sula do leste há 20 anos.

Uma tentativa de golpe de Estado em 63 AC destacou comoa política romana havia se tornado instável. L. Sérgio Catilina (Catilina), um malfeitor que por três vezes não tinha conseguido ganhar a eleição para o consulado, resolveu desencadear uma insurreição armada. Houve alguma suspeita de que Crassus estivesse por trás da trama, como mais uma tentativa de minar Pompeu, mas isso parece improvável.

Cícero, um dos cônsules de 63 AC, descobriu o plano de Catilina, e orquestrou uma oposição a ele, e supervisionou a execução de vários dos conspiradores em Roma, em 5 de Dezembro. Catilina, enquanto isso, tinha juntado o seu exército na Etrúria, mas foi mor-to em batalha, quando o seu exército foi derrotado no campo. Todo o episódio diz muito sobre o quanto a República romana tinha se tornado instável, como resultado de 70 anos de uma política revolucionária.

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Capítulo 23O PRIMEIRO TRIUNVIRATO

Parecia que César era o chefe em Roma, quando propôs que Pompeu fosse trazido de volta e que juntasse forças com eles; e que Crassus, velho rival de Pompeu e ex-patrono de César, também fosse chamado para o negócio. Este foi um arranjo político informal que a maioria dos estudiosos modernos se referem como o Primeiro Triunvirato.

O retorno de Pompeu do leste não foi marcado pelo despotismo e pelas proscrições que muitos temiam. A oposição no Senado, liderada por um grupo de conservadores sob M. Porcius Cato, havia forçado Pompeu e Crassus a uma aliança política inquieta, com César como “cimento”. Pompeu retornou à Itália em 62 AC, dissolveu seu exército, e en-trou na cidade como um cidadão privado.

Qualquer alívio que as pessoas sentiram foi de curta duração, uma vez que o Se-nado, prontamente, começou a obstruir a matéria de duas exigências básicas de Pompeu: terra para seus veteranos e ratificação de seus assentamentos orientais. Ao fazê-lo, o Senado estava seguindo a orientação de Crassus, como também dos conservadores lide-rados por M. Porcius Cato (às vezes chamado Cato o mais novo), o grande avô do censor Cato. Agora que o trabalho de seu herói tinha sido feito, a multidão mostrou pouco entu-siasmo pela tentativa de Pompeu contornar o Senado por meio de um tribunato.

Quando César retornou do seu governo na Espanha, em 60 AC, ele também en-frentou um Senado recém obstinado e viu serem bloqueados seus pedidos de um triunfo e um consulado. Esta oposição realmente trouxe resultados terríveis para a República. César se aproximou de Pompeu e propôs uma aliança contra o Senado; César também trouxe consigo Crassus, seu antigo patrão. Os três homens mais poderosos, cruéis e sem escrúpulos do Estado romano estavam, agora, trabalhando juntos, e eles tramaram para que César fosse eleito cônsul para 59 AC. O historiador M. Terêncio Varrão descreveu este acordo como “a besta de três cabeças.”

A existência do Triunvirato foi manifestada no consulado de César, que foi marcado pela violência, pela intimidação e pela legislação para beneficiar a si mesmo, a Pompeu e a Crasso. Por exemplo, ele prendeu Cato e, basicamente, prorrogou o mandato do Se-nado. Em conjunto com um tribuno, P. Vatinius, César como cônsul orquestrou uma cam-panha de favorecimento legislativo de concessões para si e para os seus companheiros de triunvirato.

César atribuíu a si mesmo um comando de cinco anos nas Gálias Cisalpina e Tran-salpina e na Ilíria; ele, com isso, comandava cinco legiões, quando terminou seu consu-lado. Pompeu assitiu a criação de uma lei que beneficiava com terras seus veteranos, como também a ratificação de seus assentamentos orientais. Crassus ganhou várias leis rentáveis, particularmente em relação às declarações de impostos da Ásia. Todas estas medidas foram aprovadas por meio de violência e intimidação.

As reuniões que trataram da aprovação do projeto de lei de terras de Pompeu ofe-recem uma boa ilustração dos métodos de César. Em face da oposição de seu colega no consulado, M. Calpurnius Bibulus, César convocou uma reunião popular para questionar Bibulus em sua oposição. César, então convocou outra reunião e convidou Crassus e Pompeu para falarem sobre os méritos do projeto de lei da terra. Na noite anterior à vota-ção, os seguidores de César ocuparam o Fórum e, enquanto a votação era realizada, eles impediram Bibulus e três tribunos de fazerem seu caminho para o pódio para interceder seus vetos.

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Bibulus e seus colegas foram maltratados, os fasces consulares foram quebrados, e o próprio Bibulus foi manchado com esterco. O grupo teve de fugir para um santuário de Júpiter para buscar refúgio contra a multidão. Na esteira desses acontecimentos, Bi-bulus ficou em casa pelo resto de seu consulado; na verdade, ele fivou lá, cercado. Como resultado, César passou a ter “rédea livre” para se comportar como ele bem entendesse.

Seguindo seu consulado em 59 AC, César assumiu seu comando de cinco anos na Gália Cisalpina e utilizou tal posição para realizar uma guerra em grande escala no res-tante da Gália. Esta guerra, que durou 10 anos, não teve o mandato do Senado, mas foi, isto sim, uma guerra de conquista pessoal que visava a glória pessoal de César. Foi uma conquista militar notável, é bem verdade, que viu César transportar as forças romanas além do Reno, na Germãnia, e através do Canal Inglês na Bretanha.

Até o final da guerra, em 49 AC, César tinha adicionado todo o território da moderna França e partes das atuais Suíça, Holanda e Alemanha ao Império Romano. As conquis-tas de César também levaram a cultura mediterrânea urbanizada para o norte da Europa em uma base permanente e, como tal, teve um efeito profundo sobre a história europeia subsequente.

As campanhas de César na Gália são descritas em detalhe, de forma convincente, em seus próprios comentários, um modelo de prosa latina concisa, clara e precisa que foi muito admirado pelos contemporâneos. Os comentários também serviram como propa-ganda política para César, transmitindo a sua glória militar.

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Capítulo 24POMPEU E CÉSAR

O governo de Claudio - 57 e 58 AC - deve ser bem visto, porque ele demonstra algo das tensões que existiam entre os triúnviros, especialmente entre Pompeu e César.

As conquistas de César na Gália causaram algumas tensões dentro do Triunvira-to, agora a força dominante na política romana interna. As tensões dentro do Triunvirato foram exploradas pelo Senado, em uma tentativa de colocar uma cunha na aliança. A carreira de P. Cláudio Pulcher é ilustrativa. Cláudio era um tribuno em 58 AC. Por meio de uma proposta de medidas populares apoiadas pela intimidação e pelo banditismo, ele governou Roma. Ele teria sido descoberto como um dos membros do acampamento de César, mas isso é, apenas, parcialmente verdadeiro.

. Depois de ganhar ascendência sobre a multidão, Clláudio atacou Pompeu. Pri-meiro, Cicero, como apoiador de Pompeu, foi banido em 58 AC Em seguida, foi a vez dos capangas de Clláudio ligados ao próprio Pompeu. Pompeu por seu turno, organizou sua própria gangue de bandidos sob T. Annius Milo, que basicamente disputaram com o grupo de Clláudio ao longo dos próximos cinco anos. No entanto, em 57 AC, Pompeu restaurou a ordem e estabilizou a entrega dos grãos de Roma, tornando-se, assim, o triunviro ascen-dente em Roma. Todas estas circunstâncias aumentaram as tensões no triunvirato, então explorada por uma facção conservadora (auto-intitulada de optimates) no Senado que, liderados pelo Cato e Cícero, começou a fazer “lobby” visando a chamada e o julgamento de César por seu comportamento como cônsul em 59 AC

César convocou uma reunião na cidade de Luca, bem dentro de sua província, em 56 AC, para resolver estas tensões. Nesta reunião, vários acordos importantes foram alcançados. Caesar, cuja conquista da Gália não estava completa, teve seu comando prorrogado por mais cinco anos.

Fig 08 - Cicero (106–46 AC), orador e estadista romano.

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Para equilibrar este movimento, a Pompeu foi dado um comando de cinco anos na Espanha, com a dispensa de exercê-lo através de legados. Ng Chafi de glória militar para coincidir com a de seus colegas, Crasso tem um cinco anos de comando na Síria. Crasso e Pompeu estavam a ser cônsules em 55 aC

Estes acordos demonstram o poder do triunvirato: os três grandes fez essas de-cisões entre si, sem qualquer referência ao Senado. A maioria das medidas foram então forçado através por meio de tribunos e votos populares. Para evitar um atrito entre seus colegas, a Crassus também fi atribuído um comando de cinco anos na Síria. Crassus e Pompeu tornarma-se cônsules em 55 AC

Estes arranjos demonstram o poder do triunvirato: das decisões que aqueles três grandes faziam entre si, sem qualquer referência ao Senado. A maioria das medidas foi, então, forçada à aprovação por meio dose tribunos e dos votos populares.

Eventos em 54-49 AC levaram o Triunvirato ao fim, deixando César e Pompeu en-frentando um contra o outro, e, eventualmente, levando à guerra civil. Primeiro, em 54 AC, quando Julia, filha de César e esposa de Pompeu, morreu no parto.

O elo marital entre Pompeu e César foi quebrado, e não foi renovado. Também em 54 AC, Crassus partiu para ganhar a glória militar, atacando o vizinho Império Parta, na fronteira oriental de Roma.

Localização do Império Parta

Subestimando grandemente as capacidades militares da cavalaria das forças, Crasso conheceu a derrota e a morte na Batalha de Carrhae, em 53 AC. Sua morte deixou César e Pompeu sozinhos no Triunvirato.

Em 52 AC, a situação em Roma atingiu um novo nadir. Lutas de rua entre Cláudioo e Milo efetivamente bloquearam o governo e viu Claudio ser assassinado e a casa do Senate ser queimada até desabar, acendendo incêndios generalizados em Roma. Um se-natus consultum optimum (decreto final do Senado) foi declarado, e Pompeu foi nomeado cônsul único para o ano, para restaurar a ordem, o que ele fez por meio da força.

Os optimates exploraram a crescente racha entre César e Pompeu e forçou uma guerra civil em 49 AC Nos anos 52 a 49 AC, as chamadas dos optimates para a acusação de César cresceram de forma mais estridente. Explorando o caráter vacilante de Pompeu

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e o seu recente bom trabalho em nome do Estado, os optimates manipularam a situação, para que passasse a acreditar que ele era o protetor da tradição contra a ameaça de do-minação cesariana.

Enquanto não se mostrar abertamente hostil ao seu suposto aliado, Pompeu, no en-tanto, pouco fez para bloquear os movimentos contra César durante estes anos. Quando seu comando na Gália se aproximava do fim, César enfrentaria sua extinção política, e, possivelmente, seu assassinato, nas mãos de seus inimigos, caso ele retornasse a Roma como um cidadão privado.

César tentou negociar um fim para o impasse existente, mas os optimates bloquea-ram todos os seus movimentos. Em dezembro de 50 AC, César emitiu sua oferta final: ele e Pompeu abandonariam seus comandos simultaneamente.

O Senado votou 370-22 a favor do movimento, isolando assim o elemento ultracon-servador. Para não ficar atrás, os optimates se posicionaram a favor de Pompeu mobilizar suas legiões e salvar a República. Em resposta, César deslocou suas legiões para perto da Itália. Apesar das várias tentativas de última hora para evitar a guerra civil, em 10 de janeiro de 49 AC, César cruzou o rio Rubicão, que marcava a fronteira entre a Itália e a sua província. Ao assumir tal atitude, César declarou guerra ao Estado. A maior de todas as guerras civis de Roma havia começado.

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Capítulo 25“A DOMINAÇÃO DE CÉSAR”

Em primeiro lugar, devemos considerar César no poder e, isso foi feito ... uma guerra civil generalizada entre César e Pompeu e seus apoiadores, partidários do elemento conservador no Senado, isto é, todos aqueles que reco-nheceram que César representava algo diferente, algo novo em seu meio, um homem que foi criado para governá-los todos como um autocrata.

A guerra civil de 49-45 AC foi equivalente a uma guerra mundial romana em face da sua extensão por toda a parte, onde o gênio militar de César brilhou.

Apesar de estar em desvantagem numérica, César e sua famosa “velocidade de deslocamento” (celeritas) levou Pompeu e os optimates para fora da Itália em 49 AC, e para o leste, em direção à base de poder de Pompeu.

Depois de romper um cerco em Dyrrhachium, Pompeu moveu-se para o leste e foi engajado por César em Pharsalus, no norte da Grécia, em 48 AC. Apesar de estarem em uma grande desvantagem numérica, as legiões de César, experientes, esmagaram seus oponentes. Revendo a carnificina no rescaldo da batalha, César comentou: “Foram eles que quizeram assim.” Pompeu fugiu do campo de batalha e se dirigiu mais para leste para continuar a luta. Parando no Egito, no entanto, ele foi vergonhosamente assassinado por um reclamante local do trono de Ptolomeu.

Tendo perseguido Pompeu até o Egito, lá, César viu-se envolvido em uma política dinástica, quando ficou retardado em Alexandria, durante o inverno de 48-47 AC. Foi nesta oportunidade, também, que César começou seu caso de amor com Cleópatra, uma das protagonistas da contenda dinástica egípcia; ela era uma mulher capaz e ambiciosa.

O caso gerou um filho, Cesário, nascido em 47 AC. Em seguida, César lutou contra os renegados locais simpatizantes de Pompeu na Ásia, África e Espanha, derrotando to-dos em seu caminho. Em 47 AC, ele suprimiu uma revolta nativa na Ásia, em cinco dias, dando origem a seu famoso ditado “Veni, vidi, vici” (“Eu vim, eu vi, eu venci”). Em 46 AC, ele lutou a Batalha de Thapsus na África, derrotando os pompeianos, decisivamente. Na sequência desta derrota, o líder dos optimates, Cato, suicidou-se em Utica, na África.

No ano seguinte, 45 AC, César esmagou outro dos exércitos de Pompeu em Mun-da, na Espanha. A batalha de Munda marcou o final da Guerra Civil. Embora bolsões de resistência a César e seus sucessores continuassem ainda por uma década, depois de Munda, César passou a ser o mestre incontestado do mundo romano.

Como meio de legitimar sua posição constitucional, César demonstrava um des-prezo para as formas tradicionais e sensibilidades conservadoras. César decretou uma política de poupar seus adversários capturados (Clementia), que foi uma manobra política perspicaz para colocá-los, sempre, em obrigação com ele. Ele colocou alguns de seus ad-versários assim poupados em cargos de responsabilidade em seu novo regime (como C. Cassius Longinus, que se tornou pretor em 44 AC). Mas quando César começou a orga-nizar a sua posição oficial no Estado romano, ele revelou uma quase total falta de tato em seu exercício do poder. Ignorando suas associações de ódio com Sulla, César empregou uma ditadura em conjunto com cônsules em administrações de suas próprias escolhas.

Em 49 AC, César foi ditador por apenas 11 dias, o tempo suficiente para organizar eleições consulares e ver-se, ele mesmo, instalado como cônsul de 48 AC. Em 47 AC, ele retomou a ditadura e a manteve, continuamente desde então, até sua morte. Na verdade, ele havia estendido a sua duração de 1 ano para um período de 10 anos em 46 AC, aém

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de uma estabilidade vitalícia em fevereiro de 44 ACAfora esse uso irregular das provedorias republicanas, César exibia em suas pala-

vras e ações pouca preocupação para com a opinião conservadora. Ele disse que Sulla “não sabia seus ABCs”, quando ele desistiu da ditadura, sinalizando, assim, a sua inten-ção de governar como ditador por tanto tempo quanto pudesse. Ele declarou ser a Re-pública uma mera palavra sem forma ou substância. Em uma ocasião, ele cumprimentou os senadores sentados como um déspota. O Senado, em resposta, agiu com servilismo abjeto, votando-lhe honras, inclusive, de deificação.

Em 44 AC, o infame incidente da oferta da coroa ocorreu, que foi tomado, por mui-tos, como um sinal de que o objetivo final de César era a realeza para si. Como ditador, César baixou uma massa de legislação sobre várias questões, mas nada disso era des-tinado a regularizar a sua posição ou a combater os males fundamentais do Estado. Na verdade, César estava planejando outra grande empresa militar contra os partos, quando o desastre chegou em março de 44 AC

Alarmado pelo comportamento abertamente autocrático de César, um grupo de no-bres, cerca de un 80 membros talvez, liderados por C. Cassius Longinus conspirararam para assassinar o tirano. O ato foi realizado em 15 de março (os “Idos de Março”), de 44 AC. Mas o foco limitado dos chamados Libertadores mostrou o seu maior erro.

Em uma reunião do Senado, no teatro de Pompeu, César foi cercado por um grupo de conspiradores e teve seu corpo perfurado ao pé da estátua de Pompeu por 23 facadas. Declarando o tirano justamente morto, os conspiradores fugiram da cena, acreditando que tinham restaurado a liberdade à República. Os eventos que se seguiram servram para provar que eles tinham cometido um grande erro.

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Capítulo 26A VIDA SOCIAL E CULTURAL NO FINAL DA REPÚBLICA

Apesar de sua tumultuada vida política, o final da República foi um momento de grande mudança social e cultural. Uma das características da vida social que podemos ver neste período que é muito acentuada é um enorme aumento na riqueza e na ostentação da elite governante romana.

A nobreza romana experimentou um rico aumento da arte e da arquitetura, ex-pressas de forma luxuosa tanto nos edifício públicos, como nos privados, enquanto os pobres pareciam ficar mais pobres ainda A grande riqueza da elite romana neste período é mostrada por diversas fontes. Os comentários de Plínio abordam o grande aumento no luxo da arquitetura doméstica no início do Século I AC. O número de moradias rústicas de propriedade da elite aumentou perceptivelmente. Pompeu construiu um teatro de pedra luxuoso, com jardins adjacentes e pórticos, em 55 AC. César e Pompeu patrocinaram es-petáculos públicos luxuosos.

Em contrapartida, as condições de vida dos pobres pioraram quando a população e a heterogeneidade étnica da multidão cresceram durante este período. A população de Roma em 50 AC, razoavelmente, podia ser estimada em um milhão, a maior concentração urbana da Europa pré-industrial. A diferença existente entre o rico e o pobre — um cons-tante parâmetro na sociedade romana — foi um fator inerente à instabilidade da República tardia, quando havia uma gama de homens ambiciosos de poderem ser recrutados para o serviço das armas.

A diversidade étnica da população, por seu turno, contribuiu para a cultura do pe-ríodo, em todos os níveis da sociedade. A helenização, agora, encontrava-se mais ou menos completa e, quando Roma se encontrou no centro da riqueza e do poder, por todo o Mediterrâneo, a cidade encontrava-se na rota natural dos “experts” em todos os campos do conhecimento humano de então. Uma grande quantidade de gregos artistas veio para Roma, principalmente após as campanhas de Sulla na Ásia. Seus trabalhos acabaram sendo copiados pelos romanos. Além disso, numerosos outros artistas, pensadores, mé-dicos, professores e filósofos migraram para Roma neste período. A carreira do médico Asclepíades da Bithynia é um exemplo do fato.

Na área da literatura, o final da República viu o surgimento de vários autores que utilizaram o modelo grego para expandir os limites do modelo latino até então em uso.

A elite romana era rotineiramente educada em grego, como também, em latim, fre-quentemente por escravos gregos em casa, e por professores gregos nas escolas de retórica. Varios autores proeminentes do periodo utilizavam modelos gregos em seus tra-balhos.

O poeta Catulo usou as elegias de Callimachus para produzir uma poesia intensa-mente pessoal, de uma espécie previamente desconhecida em latim. O historiador ate-niense Tucídides formulou um estilo “staccato”, bastante inquieto para a composição das obras históricas contemporâneas.

Lucrécio escreveu um poema longo, em que expôs a filosofia materialista grega do epicurismo em verso, ampliando o vocabulário latino.

A vida e a carreira de Marcus Tullius Cicero oferecem várias ilustrações da vida social, cultural e política do final da República. Cícero era nativo de Arpinum, uma cidade a sudeste de Roma, que veio para a cidade para começar a ser educado. Como qualquer jovem, ele abrigou ambições pela vida pública, mas acabou escolhendo a oratória e os

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tribunais, em vez do exército e da glória militar, como seu caminho para a proeminência.Depois de vários processos judiciais de alto nível, Cícero ganhou a atenção da

nobreza e cresceu através do cursus na ordem correta. O auge de sua vida política foi al-cançado em 63 AC, quando, como cônsul, ele suprimiu a conspiração de Catilina. Quando era jovem, Cicero ansiava pela sua aprovação total pela antiga nobreza romana, mas não conseguiu recebê-la, apesar de ter adotado os seus valores políticos conservadores.

A enorme produção literária de Cícero revela, plenamente, o seu gênio. Cícero es-creveu dezenas de discursos, tanto políticos como forenses; ele também compôs tratados sobre vários assuntos e elaborou uma volumosa correspondência que ele nunca teve intenção de ver publicada. Além dos discursos, que eram o “pão com manteiga” de sua vida pública, todas as obras literárias de Cícero foram compostas ou em seu tempo livre, ou durante seus períodos no ostracismo político.

A correspondência de Cícero fornece a fonte mais completa que a história tem para os eventos havidos na história de Roma, oferecendo um comentário quase que diário dos acontecimentos. Como resultado, os 20 anos abrangidos por suas cartas são os mais bem documentados em toda a história romana;

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Capítulo 27ANTÔNIO E OTAVIANO

Octavian, realmente, uma entidade inexperiente desconhecida, e pelo fato de ter sido adotado por César, al-guns dos seus apoiadores e membros da família sentiram que sua vida estava em perigo, quer junto dos Libertadores ou de um ciumento Marco Antônio

Os Libertadores não haviam formulado nenhum plano sobre o que fazer quando César estivesse morto, e isso deu à facção de César a oportunidade de se organizar. Os Libertadores pareciam acreditar que a República iria renascer, tal qual a primavera, ou como uma Fênix, das cinzas da tirania de César. Eles não fizeram planos para alienar os partidários de César, agora liderados por Marco Antônio, o braço direito de César. Eles também não fizeram nenhum movimento para garantir um apoio militar ou popular mais amplo. Preocupados pela recepção mal-humorada da máfia de sua liberdade recém-con-quistada, os Libertadores retiraram-se para o Capitólio, amedrontados.

Quando a confusão começou a morrer e os cesarianos perceberam que não eram alvos de assassinato, Marco Antônio tomou a iniciativa sobre os assassinos inertes. Ele encenou uma verdadeira cena de teatro no funeral de César, no centro de Roma, no Fó-rum. Alii ele proferiu um discurso inflamado em que revelou a vontade de César, em que o ditador havia deixado 300 sestércios para cada cidadão romano da cidade.

Estas ações, combinadas com a visão patética do cadáver massacrado do seu herói, levou a multidão a um motim, em face do que os libertadores foram forçados a fugir da cidade todos juntos. Com os Libertadores expulsos, Antônio ficou soberano no cam-po cesariano. O testamento de César, no entanto, continha uma surpresa para Antônio e colocou em jogo um homem que viria a surgir como o primeiro imperador de Roma, Octavian. Além de vários legados à multidão, César designou, em seu testamento, seu sobrinho-neto, C. Octavius, como seu filho adotivo. C. Octavius, de apenas 18 anos de idade em março 44 AC possuía origens obscuras para as normas dos nobres romanos; ele encontrava-se afastado de Roma, estando na Ilíria, treinando para se juntar à campanha parta planejada por César, quando ele soube de sua adoção por seu tio, razão pela qual ele agiu com grande ousadia e viajou para Roma para reivindicar sua herança.

Agora, com o nome de C. Júlio César Octavian (doravante chamaremos de Otavia-no), o jovem reuniu-se com Antônio para reivindicar sua herança. Antônio agiu com um pressa imprudente e esnobou o jovem de forma insitada o que se revelou um erro. En-quanto isso, o Senado vacilava e as tensões entre os Libertadores e Antônio irromperam em um conflito aberto.

A confusão existente no Senado ficou evidenciada pelo perdão simultâneo dos Li-bertadores e a ratificação de todos os atos de César. Antonio e os Libertadores pareciam estar chegando a um entendimento, na medida em que o Senado havia atribuído coman-dos tanto para os membros da conspiração como para os cesarianos, igualmente. A atri-buição de comandos a Antônio ecoaram no Senado como uma estratégia de Antônio para favorecer a si mesmo, dando-se a si próprio as províncias da Galia Cisalpina e da Gália Transalpina, além de Macedônia.

A indicação do Senado de Antônio para a Gália Cisalpina, tinha sido realizada em razão da recusa oferecida pelo conspirador D. Brutus, quando ele considerou ilegítima a alegação de Antônio sobre ele. Antônio, em seguida, marchou contra Brutus e o cercou em Módena, em sua própria província. Antônio, então, realizou um deslocamento contra

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Otaviano, após ter tentado acusá-lo de insinuações forjadas. Em resposta, Otaviano le-vantou duas legiões dentre os veteranos de seu tio na Itália, uma força que logo foi aumen-tada pelas deserções em massa havidas entre as tropas de Antônio.

A luta pelo poder nos dois lados agora já havia evoluido entre os libertadores e os cesarianos, por um lado, e entre Antôno e Otaviano, dentro do campo cesariano, por ou-tro. A ineficácia do Senado ficou no meio. No âmbito de Módena, o Senado ficou do lado de Brutus, seu nomeado para a Gália Cisalpina, e ordenou que os cônsules de 43 AC o aliviassem do cerco promovido por Antônio.

Por instigação de Cícero, o Senado conferiu o status de propraetorian a Otaviano, atribuindo-lhe a tarefa de ajudar os cônsules a dissuadir Antônio, tornando-se, assim, um dos que lutaram contra os assassinos de seu tio. Ambos, Cícero e Senado viam Antônio como a maior ameaça à liberdade da República e pareciam ter acreditado que poderiam usá-lo para, depois descarta-lo.

Em uma luta fora de Módena, Antônio foi superado e retirou-se para sua província na Gália Transalpina. Mas dentro de algumas semanas, ele já havia retornado com uma força enorme organizada na Espanha e na Gália e ocupou a Gália Cisalpina, sem oposi-ção.

Otaviano havia ajudado Brutus em Mutina, mas ele se recusou a cooperar com ele, mais tarde, e retornou para Roma, na expectativa de uma apreciação positiva e recompen-sas vindas do Senado; mas ao invé disso, ele foi esnobado pela alta corte romana.

Tendo declarado Antônio um inimigo público, o Senado honrou os Libertadores e es-nobou Otaviano, com resultados desastrosos. Decimus Brutus recebeu o triunfo, Antonio foi posto fora da lei e Otaviano foi ignorado.

Otaviano, então, marchou com seu exército sobre Roma, no final de 43 AC, e a ocupou. Ele estabeleceu as eleições consulares que o privilegiaram como cônsul, mesmo com 20 anos de idade. Ele formalizou sua richa com os Libertadores por ter sua anistia do ano anterior revogada. Longe de descartar Otaviano, o Senado, agora, teve de apoiar a sua autocracia militar desenfreada. Mas Otaviano percebeu que sua ascendência era temporária e voltou sua mente para estabelecer uma posição mais segura .

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Capítulo 28O SEGUNDO TRIUNVIRATO

Segundo Triunvirato foi o período em que Otaviano e Antônio deram-se as mãos e formaram um só corpo para dominar o Estado romano – efeticamente, uma junta militar. Eles decisivamente, aniquilaram os Libertadores na metade leste do Império e, então, eles dividiram o Imperio Romano entre eles e começaram a governar suas partes.

A posição de Otaviano no início do outono de 43 AC era precária. Marco Antônio estava arregimentanto enormes forças em ambas as Gálias. Expulsos de Roma e da Itália, os libertadores fugiram para o oriente, para ali organizar suaa resistência à dominação republicana cesariana. Para fortalecer a sua posição, Otaviano remendou suas ligações com Antônio e, em conjunto com outro líder cesariano, M. Aemilius Lépido, eles formaram o Segundo Triunvirato. Juntos, eles marcharam suas forças combinadas sobre Roma.

O Segundo Triunvirato diferiu significativamente do primeiro. O seu domínio foi for-malizado através de uma lei aprovada por um tribuno, P. Tito, em 27 de novembro de 43 AC. De acordo com esta lei, Antônio, Lépido, e Otaviano foram nomeados triumviri rei pu-blicae constituendae consulari potestate (Conselho de três com poderes consulares para a organização do Estado) por um período de cinco anos. Na verdade, os três formaram uma junta militar com poderes ditatoriais.

O Segundo Triunvirato dominou a política romana durante a próxima década. Mas, como já acontecera no triunvirato antecessor informal, a relação entre os novos triúnviros foi tensa. Em razão da falta de dinheiro para pagar suas tropas, o primeiro ato do novo Triunvirato foi o de instigar proscrições dos suspeitos na cidade e na Itália. Milhares mor-reram e tiveram suas propriedades confiscadas.

A vítima líder destas proibições foi Cícero, que tinha apoiado Otaviano contra An-tônio no caso de Módena. Ele havia realizado ataques devastadores contra Antônio em suas oratórias no Senado; os discursos, chamados Philippics, sobreviveram. Antônio não esqueceu a inimizade de Cícero, e Otaviano concordou em ter seu ex-apoiador proscrito.

Perseguido enquanto fugia para a costa, Cícero foi decapitado no dia 7 de de-zembro. Sua cabeça e mãos foram pregadas na plataforma do orador (rostra), no Fó-rum Romano, o lugar onde Cícero tinha realizado muitos dos seus famosos discursos. O triunvirato também orquestrou a deificação de seu líder morto, C. Julius Caesar, e iniciou a construção de seu templo no Fórum Romano. Otaviano, agora, podia reivindicar a as-cendência divina. Ele imediatamente acrescentou divi filius (filho de um deus) para sua nomenclatura.

Os triúnviros, em seguida, viraram-se contra os libertadores. Estes estavam cons-truindo forças significativas na Grécia e no Oriente. Antônio e Otaviano seguiram para o oriente com suas forças combinadas e encontraram os exércitos republicanos em Filipos, em setembro de 42 AC

Em duas batalhas relacionadas, os republicanos foram superados, e Cassius e Bru-tus, os líderes da conspiração, cometeram o suicídio. (Notadamente, Otaviano era um jovem doente, e ele ou lutou pouco, ou não teve nenhum papel de relevo nestas vitórias.)

Os cesarianos estavam, agora, supremos no mundo romano, mas as tensões den-tro do Triunvirato surgiram quase que imediatamente. Quando o triunvirato havia sido for-mado, a Lépido tinha sido atribuído um território menor na África, por isso ele ficou, efeti-vamente, marginalizado como jogador.

Na sequência de Filipos, Antônio deslocou-se mais para o oriente, uma vez que este

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era o lugar onde ficava a maioria dos territórios que lhe haviam sido atribuídos. Otaviano, por seu turno, permaneceu na Itália. Otaviano, no entanto, tornou-se impopular em face de sua atitude arrogante e das maciças confiscações de terras para assentar seus veteranos (apenas 11 das 45 legiões cesarianas deveriam permanecer sob seu exército).

O caso obscuro da Perusia mostrou como eram tensas as relações entre Antônio e Otaviano. Em 41 AC, o irmão de Marco Antônio, L. Antonius, e sua mulher, Fulvia, fo-mentaram uma insurreição armada contra Otaviano na Itália. O envolvimento de Marco Antônio é discutível, mas as próprias ações falam sobre a relação percebida entre os dois principais triúnviros. Otaviano moveu-se contra Antonius e Fulvia e os cercou em Perusia. Antonius foi poupado, mas Otaviano ordenou que os conselheiros de Perusine fossem executados, tornando-se, então, ainda mais impopular na Itália.

Antônio deslocou-se para o oeste em 41-40 AC, e uma guerra civil entre ele e Ota-viano parecia iminente. Em uma reunião em Brundisium em 40 AC, no entanto, as diferen-ças foram resolvidas e a atribuição de territórios foi refinada.:

Otaviano ficou com todo o ocidente do império, e Antônio com todo o oriente e Lépi-do foi confirmado na África. Antônio era casado com a irmã de Otávio, Otavia, já que Fulvia morrera pouco após o caso Perusine.

Pelos próximos quatro anos, o triunvirato viu-se envolvido, principalmente, com as-suntos pertinentes às suas respectivas metades do império. O Triunvirato, então foi reno-vado, Lépido foi empurrado para fora, e Otaviano e Antônio concentraram sua atenção em suas próprias esferas de competência. Em 37 AC, o triunvirato foi novaente renovado por mais cinco anos, com Lépido ainda escondido na África. Sextus Pompeius, filho de Pompeu, tinha organizado uma espécie de reino pirata na Sicília e Sardenha, que exigiu de Otaviano 4 anos para subjugá-lo.

Após a derrota de Sextus Pompeius em 36 AC, Lépido fez o seu movimento e tentou conquistar a Itália e a Sicília, mas foi facilmente derrotado por Otaviano. Lépido foi destituído de seu poder triunviral e foi “aposentado” em uma cidade litorânea perto de Roma. Antônio, enquanto isso, estava ocupado no leste com campanhas ineficazes contra os partos. Ele estabeleceu sua base em Alexandria e herdou a aliança de Caesar com a rainha ptolomaica, Cleópatra.

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Capítulo 29OTAVIANO EMERGE COMO SUPREMO

Foi no despertar desta vitória em 31 AC que Otaviano ente deu que deveria criar todo um novo sistema de governo, conhecido como o principado, assim inaugurado uma nova era da história, muitas vezes chamado o período imperial romano, ou o império.

Nos cinco anos que se seguiram a 36 AC, Otaviano se reinventou como o salvador das tradições do ocidente e lançou uma campanha de propaganda contra Antônio. Vendo o amplo apoio que ele tinha atraído na sua luta contra Sextus Pompeius, Otaviano de-terminou-se a mudar sua imagem política e a buscar bases para seu poder, que não as militares. Ao fazê-lo, Otaviano mostrou que ele já estava pensando, a longo prazo, sobre como o Estado romano poderia ser reorganizado e tornado estável uma vez mais.

Em um notável conluio político, ele começou a posicionar-se como o defensor das tradicionais maneiras ocidentais romanas. Ele fez isso, principalmente, para retratar Antô-nio como um déspota estrangeiro que tinha projetos ambiciosos sobre o Império Romano como um todo. O comportamento de Antônio foi jogado diretamente nas mãos de Otavia-no, particularmente o evento de 34 AC conhecido como “As doações de Alexandria”.

Antônio e Cleopatra viviam abertamente como um casal, em Alexandria, apesar de Antônio ser casado com Octavia. Em 34 AC, para comemorar suas vitórias contra os par-tos, Antônio encenou um concurso no ginásio em Alexandria. Nestas “Doações de Alexan-dria”, Antônio e Cleópatra apareceram entronizados com seus três filhos e Cesário, filho de Julo César com Cleópatra. Cesário foi aclamado como Rei dos Reis, Cleópatra como Rainha dos Reis. O ocidente do Império Romano foi dividido entre Antônio e Cleópatra e seus três filhos, e Cesário foi aclamado o verdadeiro filho de César, um desafio direto à base da legitimidade de Otaviano. Tendo em conta estes fatores, Antônio e Otaviano co-meçaram a se preparar para a guerra.

Depois de uma guerra diplomática de palavras em 33-32 AC, a guerra civil, quando veio, gerou um anticlímax. Antônio e Octaviano tiveram reações muito diferentes para o lapso e não renovação do Triunvirato em 33 AC. Antônio comportou-se como se o lapso não tivesse ocorrido, e ele continuou a usar o título de triúnviro até sua morte. Em contra-partida, Otaviano abandonou o título e, tecnicamente, reverteu seu status para o de um cidadão privado. No entanto, usando os tribunos e intimidações, ele manobrou, com su-cesso, a eleição dos côsules para 33 AC, ambos apoiados Antônio, e dirigiu os partidários de Antônio no Senado para fora da Itália.

Em 32 AC, Otaviano revelou o conteúdo do testamento de Antônio, que chocou a opinião pública no Ocidente. Antônio havia declarado Cesário o verdadeiro herdeiro de César; Antônio ambém manifestou seu desejo de ser enterrado ao lado de Cleópatra. Sur-giram rumores de que Antônio estava destinado a movimentar a sede do governo romano para a Alexandria e instalar Cleópatra como rainha dos romanos, dessa forma virando a maré da opinião pública contra Otaviano. A Itália, e em breve, as províncias ocidentais, fizeram um juramento de fidelidade a Otaviano, juramento esse que se tornou a base da reivindicação de Otaviano à liderança do Ocidente. Em consequência, Antônio não teria legitimidade legal aos olhos dos romanos.

Os dois líderes se moveram umu contra o outro no verão de 31 AC, mas a guerra, declarada contra Cleópatra, terminou rapidamente. Os exércitos e a frota de Antônio se deslocaram para a Grécia e acamparam em Actium, no mar Adriático. Otaviano, por seu

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lado, deslocou-se para combater o oponente com 30 legiões e cerca de 600 navios. Sob o comando direto de M. Vespasianius Agripa, um dos principais apoiadores de Otaviano, desde o início de sua carreira em 44 AC, a frota de Otaviano esmagou a Marinha combi-nada de Antônio e Cleopatra na baía de Actium, em 2 de setembro de 31 AC. As forças terrestres não foram envolvidas naquela oportunidade. Na esteira de Actium, Antônio e Cleópatra fugiram de volta para o Egito, perseguidos por Otaviano. Suas tropas ou capitu-laram ou desertaram, em massa, para o lado de Otaviano.

Quando Otaviano cerrrou sobre Alexandria em 30 AC, Cleópatra cometeu o suicí-dio, sendo seguida, pouco depois, por Antônio. Cesário foi assassinado, mas as crianças de Antônio com Cleópatra foram poupadas. Otaviano, então, anexou o Egito como uma província, terminando, assim, a história da última e mais longa duração dos reinos helenís-ticos. Otaviano também ganhou o acesso à vasta riqueza dos Ptolomeus, permitindo-lhe, então, para pagar suas tropas com o dinheiro arrecadado.

Em 29 AC, sua vitória estava completa e Otaviano encontrava-se, agora, no con-trole exclusivo de todo o mundo romano. Otaviano voltou para Roma como um herói e começou o longo processo de reorganização do Estado. Seu surgimento como único go-vernante também levou ao fim a Revolução Romana.

Olhando-se para trás, ao longo da história da Revolução Romana, entende-se ser uma difícil tarefa a de se determinar quando a República deixou de existir. A melhor visão é a de que não houve um momento definitivo de quando a República terminou, mas houve, isto sim, um processo de ineficácia gradual que viu mais e mais poder concentrado nas mãos de indivíduos e de chefes de exércitos, em vez de nas de homens legalmente eleitos e de magistrados devidamente nomeados. A República, em seguida, não fez nada mais além de tombar imperceptivelmente. Um governo de uma cidade-Estado, simplesmnete, havia se mostrado incapaz de governar um império.

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Capítulo 30A NOVA ORDEM DE AUGUSTO

De certa forma, o sistema de governo que Augusto desenvolveu não foi realmente escrito; mas tabém não saltou para fora de sua cabeça durante a noite. Ele també não se sentou com um grupo de cônsules e, em seguida, o refigiu e o apresentou ao povo romano. Pelo contrário, era uma série de acordos que são, freqüentemente, chamados de “assentamentos constitucionais” pelos estudiosos modernos.

Ao longo de seu longo reinado, de 31 AC até 14 DC, Otaviano reorganizou o Estado romano. Após um período inicial, seguinte à batalha de Actium, Otaviano, gradualmente, organizou o Estado romano em novas bases e colocou-se em sua cabeça. O desenvolvi-mento da nova ordem foi um processo evolutivo de tentativas e de erros, ajustes e refina-mentos, que duraram quase 30 anos. Por volta de 2 AC, Otaviano, foi rebatizado Augusto; em 27 AC, ele havia restabelecido o cambaleante Estado romano por um virtuoso sistema governamental que foi denominado de Principado.

Em sua criação do Principado, Augusto estava especialmente preocupado com a prevenção de mais uma guerra civil, e em levar a estabilidade para o Estado romano, como também de evitar o destino de seu pai adotivo, César.

Desde 31 até 27 AC, Otaviano manteve o consulado continuamente, e parece que teria invocado o juramento de 32 AC como a melhor fonte de sua legitimidade. A partir de 27 AC, ele começou a regularizar a sua situação de uma forma mais sistemática. Houve várias fases no desenvolvimento da sua posição e de sua evolução

Fig 09 - Augusto (63 AC.– 14 DC), o primeiro Imperador de Roma.

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Entrando no Senado, Otaviano anunciou sua aposentadoria da vida privada. Em uma cuidadosamente encenada peça de teatro político, os senadores suplicaram-lhe para reconsiderar o exposto. Depois de alguma hesitação, Otaviano finalmente concordou e aceitou um pacote de poderes e honras que o colocou no comando do Estado romano. Ele foi renomeado Imperator Cesar Augusto, um nome repleto de significado simbólico. Ele aceitou para si a maior província de todas as regiões do império com as tropas lá estacio-nadas (com exceção da África), que ele governou com uma subvenção de proconsulare imperium (autoridade provincial governamental, válida apenas fora de Roma) por 10 anos. As outras províncias do Império permaneceram sob a autoridade do Senado, regido não pelo legados de Augustus, mas por procônsules do Senado.

Este assentamento colocou Augusto à testa de todas as legiões de Roma, adminis-tradas através de legados pessoalmente nomeados e confiáveis, assim evitando a ame-aça de comandantes do exército em provocar uma guerra civil. O Imperium de Augusto, no entanto, só foi eficaz fora da Itália. Dentro Itália, ele continuou a manter o consulado anualmente. Em 23 AC, em face de sua doença e, talvez, em resposta a uma conspiração contra sua vida, Augusto foi o palco do Segundo Acordo Constitucional, um refinamento do primeiro. Nesse arranjo, o Imperium de Augustus foi tornado Maius (maior), permitindo que ele interferisse em qualquer província do império.

Dentro da Itália, a Augusto foi concedida a tribunicia potestas (poder de tribuno) du-rante cinco anos. Esse poder lhe deu todas as prerrogativas de um tribuno da plebe sem monopolizar o consulado

O sistema de governo de Augusto sofreu um novo refinamento depois de 23 AC, mas as suas características essenciais, permaneceram em vigor naquele ano. Augusto era um membro de todas as faculdades sacerdotais de Roma, e tornou-se um sumo sa-cerdote (pontifex maximus) em 12 AC. O exército, agora formado por uma força profis-sional permanente, com cerca de 28 legiões estacionadas nas fronteiras do Império, fez um juramento de lealdade para com ele, pessoalmente. Ele foi declarado isento de certas convenções e lhe foram concedidos determinados privilégios. Ele recebeu inúmeros títu-los honoríficos, sendo que o mais revelador veio em 2 AC: “Pai da Pátria” (Pater Patriae). Este título colocava todo o Império Romano em um relacionamento com Augusto análogo ao de chefe de uma família.

As várias características do novo sistema exigem uma atenção. Todos os poderes e títulos de Augustos foram, oficialmente concedidos a ele, voluntariamente, tanto pelo Senado como pelo povo de Roma. Os poderes geminados de imperium maius nas provín-cias e potestas tribunicia na Itália concedeu a Augusto uma via de acesso para todas as regiões do império e todas as asas da administração. As formas republicanas familiares e tradicionais foram mantidas: os cônsules continuaram a ser eleitos, os encontros senato-riais foram mantidos, e os votos populares tomados. Em essência, Augusto foi enxertado no topo das velhas instituições republicanas.

Augusto foi o mais discreto em seu exercício do poder. Ele se referia a si mesmo pelo inofensivo título de princeps (o primeiro dos cidadãos), e não pelo de um ditador ou, pior, pelo de rei. Todo o sistema passou a ser denominado, por isso, de Principado.

Ele consultava o Senado sobre todos os negócios funcionais e tratava os senadores com cortesia e respeito. Ao invés de usar diretamente seus poderes legais, ele preferia ter seus desejos promulgados através da qualidade pessoal intangível da auctoritas (que é intraduzível, mas mais ou menos equivale a prestígio, influência, autoridade e capacidade, tudo a uma).

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Em última análise, no entanto, a posição de Augusto tinha sido ganha pela força das armas, e sua autoridade baseava-se nas espadas do exército, agora sua força de combate pessoal.

O documento notável chamado de “As realizações do deificado Augusto (Res Ges-tae Divi Augusti) nos permite ler um resumo de sua carreira política e posição no Estado romano.

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Capítulo 31A SUCESSÃO IMPERIAL

O Principado trouxe muitos benefícios para o Império Romano, mas tinha uma falha. Em sua essência, ele tinha sido gerado pela natureza do próprio princeps. Este problema geraria o problema da sucessão.

Para a maioria dos habitantes do império, o Principado foi uma grande melhoria da caótica República. Ele conseguiu trazer a paz e um bom governo para o Império Romano. Augusto marcou o início de um período de paz e de prosperidade sem precedentes na história da Europa, antes ou depois; esta Pax Augusta, ou Pax Romana, perdurou por quase 200 anos. Sob Augusto e o Principado, a administração provincial era centralizada e os governadores eram responsabilizados diretamente pelo imperador. Os dias dos exorbi-tantes proconsuls que “ordenhavam” suas províncias para financiar a competição política doméstica haviam terminado. Augusto havia criado o primeiro exército profisssional do mundo de então, empregando extensamente o voluntariado de jovens, fazendo crescer um exército capaz de defender, com vontade, as fronteiras de Roma.

Na sequência de Actium, Augusto desmobilizou todas as 60 legiões existentes, mantendo apenas 28 delas sob seu comando. Ele empregou o restante para expandir as fronteiras de Roma até os rios Danúbio e Reno. As legiões, em seguida, foram esta-cionadas ao longo das fronteiras, longe de Roma, sob o comando de legados escolhidos pessoalmente por Augusto (Legati Augusti). Era um exército de 28 legiões formadas por cidadãos romanos e um número semelhante de tropas auxiliares (os não-romanos) que somavam cerca de 300.000 homens. Houve também uma massa de empreendimentos culturais, legislativos, sociais e econômicos nesse período que não cabe serem examina-dos aqui. Para a maioria dos habitantes do império, em seguida, o Principado de Augusto trouxe a paz, prosperidade, bom governo e estabilidade.

A despeito de todas as suas virtudes, o Principado tinha uma falha em seu núcleo: o problema da sucessão. Tecnicamente, o principado foi um pacote de poderes votados exclusivamente para a pessoa de Augusto, e que deveria deixar um lapso com sua morte. O artifício utilizado para expressar a sua posição dominante, em termos republicanos, tradicionais e não ameaçados, acabaram causando um problema para Augusto. Uma vez que ele era uma espécie de super-magistrado, sua morte levaria, tecnicamente, ao fim do Principado, com o governo tendo de reverter para o Senado, e os magistrados anuais. Dado ao caos experimentado na República tardia, no entanto, tal reversão só traria uma ameaça definitiva: a guerra civil.

Augusto tinha determinado cedo que o Principado seria essencial para a paz e a estabilidade do Império e que deveria continuar após sua morte. Mas Augusto não mais poderia designar como sucessor um cônsul ou mesmo um pretor; fazendo isso, ele estaria expondo a natureza autocrática do Principado a um modelo muito primitivo. Portanto, a questão do que estava para acontecer com a morte de Augusto era um problema sério.

Como qualquer bom romano, Augusto nutria aspirações para sua família, e sua resposta à questão da sucessão deveria favorecer os membros de sua própria família com vários sinais de preferência. Suas maquinações sobre a sucessão durante seu longo reinado são labirínticas e exigiria um próximo estudo de sua árvore de família para ser totalmente compreensível. Portanto, nós tratamos seu sistema em termos amplos e utili-zando exemplos ilustrativos.

Vários indicadores foram usados para marcar os príncipes de sua família como

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potenciais futuros imperadores; em ordem de significância ascendente, aos príncipes po-deriam ser concedidos privilégios legais para ficarem durante anos nas altas provedorias além mesmo da idade legalmente prescrita (por exemplo, seu sobrinho Marcelo); aos príncipes poderiam ser atribuídos comandos militares importantes (por exemplo, Tiberio, Gaius Caesar); os príncipes que não eram membros da família imediata de Augusto po-deriam ser trazidos a ela ou através do casamento com sua única filha natural, Julia, ou por meio da adoção direta pelo próprio Augusto (por exemplo, Marcelo, Agripa, Tibério através do casamento; ou Caio e Lúcio César ou Tibério através adoção); aos príncipes poderia ser dada uma quota do imperium de Augusto ou, em última análise, o seu poder tribuno para se tornar co-imperador virtual (por exemplo, Agripa e Tibério). Por meio deste último arranjo, um novo imperador já estaria instalado, antes mesmo da morte de Augusto, garantindo, assim, uma transição suave.

Dado ao carácter indireto das indicações preferenciadas por Augusto, o problema da sua sucessão provou ser o fator mais desestabilizador do reinado de Augusto, bem como o dos imperadores subsequentes.

A designação de 5 príncipes ao longo do longo reinado de Augusto sugeriu para alguns que “mãos escondidas” estavam manipulando a adesão de um deles..

Fig 10 - Augustus inaugurou a Pax Ro-mana, um período de paz e prosperi-dade sem precedentes na história da Europa antes ou depois dele.

Augustus havia marcado cinco homens como seus sucessores: Marcelo (d.23 AC), Agripppa (d. 12 AC), Gaius (d. 2 DC) e Lucius (d. 4 DC.) César, e Tibério (que eventual-mente sucedeu Augusto em 14 DC). A incerteza sobre a sucessão conduziu a uma con-corrência dentro da casa imperial, quando os príncipes e os seus apoiadores brigavam por uma posição no procedimento de favorecimento por Augusto. Por fim, Tibério, que era filho natural de um casamento anterior da esposa de Augusto, Lívia, foi quem se tornou o próximo imperador.

Os rumores surgidos sobre Livia fornecem uma ilustração das questões envolvidas.

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Uma vez que muitos dos candidatos favorecidos de Augustus tinham que morrer para permitir que Tiberio tivesse sucesso, alguma suspeita caiu sobre Livia como tendo livrado a casa imperial de todos os obstáculos existentes à adesão de seu filho. A mais nefasta de todas é a sugestão de que, apesar dos seus mais de 50 anos de casamento, ela final-mente envenenou Augusto para limpar o caminho para Tibério. Esses rumores são, sem dúvida exagerados, e Livia pode ser absolvida na maioria das alegações, mas elas não podem ser descartadas completamente. Mais importante ainda, é o fato que mostra como o problema da sucessão imperial era considerado desestabilizador, mesmo pelos próprios romanos. E os Imperadores futuros serão confrontados com os mesmos problemas, como veremos.

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Capítulo 32A DINASTIA JULIO-CLAUDIANA

A dinastia Júlio-Claudiana se estendeu desde 14 DC, com a morte de Augusto no dia 19 de agosto do mesmo ano, através de 68 DC, no verão daquele ano, com a derrubada do Nero.

A família de Augusto foi a primeira e mais bem documentada dinastia do período imperial romano. Entre outras fontes, os Anais de Tácito (escrito cerca de 120 DC) e as biografias de Suetônio permitem-nos uma visão mais próxima e detalhada destes Julio--Claudianos. Tácito, um senador de mente Republicana, escreveu seus Anais com uma inteligência incisiva e a sagacidade de uma corte. Suetônio, um secretário equestre do serviço imperial, escreveu biografias picantes dos Césares, desde Júlio César até Domi-ciano. Sua obra é menos útil do que a de Tácito, mas ainda assim tem seus benefícios.

A dinastia Júlio-Claudiana governou de 14 a 68 DC e engloba quatro imperadores. Tibério (de 14 a 37 DC), que era enteado de Augusto, e um maníaco-depressivo, cujo reinado foi impopular, mas geralmente bem sucedido. O reinado de Gaius, também co-nhecido como Calígula (de 37 a 41 DC), que era sobrinho-neto de Tibério, e seu governo foi uma catástrofe absoluta. O jovem ou foi corrompido pelo poder absoluto ou ficou louco e foi o primeiro imperador a ser assassinado. Claudio (de 41 a 54 DC) era tio de Calígula. Ele governou bem e eficientemente, mesmo sendo impopular com as classes dominan-tes. Nero (de 54 a 68 DC), era enteado de Claudio e filho adotivo; seu governo foi outro desastre. Ele passou seu tempo em atividades ociosas enquanto perseguia sua família e os membros da elite. Uma revolta do exército o derrubou no verão de 68 DC, o que levou ao fim dessa dinastia.

A história detalhada desta família é digna de um curso em si mesmo. Assim, toma-mos três incidentes exemplares para ilustrar a transformação do Principado de Augusto em um sistema mais abertamente autocrático, e que continuou a enfrentar o problema da sucessão.

A carreira e a morte do prefeito pretoriano Sejano (14 a 31 DC) ilustra os problemas e perigos do governo por um só homem. Tibério assumiu, desajeitadamente, a púrpura imperial em 14 DC. Ele já estava na faixa dos 54 anos e era propenso à depressão e ao humor negro. Entre 14 e 23 DC, L. Aelius Sejanus, o comandante da Guarda Imperial, insinuou-se na confiança e amizade de Tibério e, com isso ganhou um enorme poder e influência como resultado.

Em 26 DC, Sejanus ajudou a convencer Tiberio a se retirar de Roma para a ilha de Capri na Baía de Nápoles. Desde então e até sua queda em 31 de outubro, Sejanus foi, virtualmente, o próprio imperador. Ele orquestrou o desaparecimento da família de Germa-nicus, o príncipe que Augusto tinha marcado para suceder Tibério na terceira geração do Principado. O objetivo de Sejanus parece ter sido o de se posicionar junto a Tibério, assim como Agripa tinha sido com Augusto: o forasteiro confiável trazidos para o seio da família e que fez o sucessor.

Por volta de 31 DC, Sejanus parece ter tido sucesso, quando a ele foi prometida a mão de uma princesa imperial. Realizado o imperium, ele foi tornado cônsul com Tibério, e faltava apenas o poder tribunician para ser instalado como co-imperador.

Mas Tibério, aparentemente ciente das maquinações de Sejano, de repente se transformou em seu protegido e ordenou que o prendessem. Seguiu-se uma purga e uma

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caça às bruxas em que toda a família de Sejanus, e muitos dos seus apoiadores foram as-sassinados. Sua carreira mostra que chegar muito perto do imperador era, de fato, muito perigoso.

A morte de Calígula e a ascensão de Cláudio revelaram que a República estava realmente morta e insinuaram a verdadeira base da autoridade imperial.

Calígula foi assassinado por membros da sua própria guarda em 24 de janeiro de 41 DC. Na confusão que se seguiu, o Senado se reuniu para discutir o futuro. Na primeira reunião houve quem falasse em se restaurar a República. Logo, porém, vários senadores começaram a propor que seriam os próximos princeps.

Enquanto o Senado se reunia e discutia a situação, a Guarda Pretoriana escolheu seu próprio imperador: Cláudio, tio recluso e livresco de Calígula. Na noite de 24/25 de ja-neiro, tensas negociações ocorreram entre os guardas em seu acampamento e o Senado; a desordem parecia iminente. No entanto, todo o apoio militar ao Senado tinha evaporado e Cláudio foi forçado a uma confirmação como Imperador pelos senadores relutantes. Todo este incidente mostra que os 72 anos de governo dos Césares efetivamente mata-ram a República e lançaram alguma luz sobre a base essencialmente militar do governo imperial.

A derrubada de Nero em 68 DC finalmente revelou a verdade: o exército fazia ou quebrava imperadores. Nero foi em grande parte desinteressado pelos assuntos adminis-trativos.

Ele passou a maior parte de seu reinado escrevendo poesia ruim e desempenhando no palco. Ele também perseguiu os membros de sua família que ele via como uma ame-aça ao seu poder, indo tão longe a ponto de matar sua própria mãe, quando ela interfe-riu, indevidamente, em seu exercício do poder supremo. Desgostosos, vários senadores conspiraram sua queda, mas foram descobertos em 65 DC, com resultados previsíveis.

Uma revolta do exército havida na Espanha, três anos depois, no entanto, revelou--se decisiva: Nero melodramaticamente desesperou-se e tirou a própria vida no verão de 68 DC. O idoso governador da Espanha Mais Próxima, Sulpício Galba, tornou-se impera-dor quando foi proclamado como tal por suas tropas. Uma vez que Nero havia eliminado todos os possíveis sucessores tidos como seus rivais, a dinastia Júlio-Claudiana morreu com ele.

Foi, portanto, o exército, e não um complô senatorial em Roma, que derrubou Nero, ficando assim revelado a todos a verdadeira natureza do principado: a autocracia militar.

Várias características marcantes da natureza do poder imperial em Roma são re-veladas nestes incidentes. A sucessão continuou a ser um fato desestabilizador, como já revelado pela carreira de Sejanus, pela proposta feita pelos senadores após a morte de Caio que seria o próximo imperador, e pela morte de Nero. O perigo de ficar muito perto da fonte do poder ficou claro na morte de Sejanus. A base militar de poder imperial foi de-monstrada por ocasião da ascensão de Cláudio e revelada pela queda de Nero.

Na esteira da morte da dinastia Julio-Claudiana, houve uma rodada de guerras civis em 69 DC, quando governadores imperiais lutaram pelao manto púrpura. A dinastia seguinte a governar Roma, a Flaviana (69 a 96 DC), foi estabelecida no poder pela força das armas.

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Capítulo 33O IMPERADOR NO MUNDO ROMANO

O período abrangido por este capítulo é, basicamente, o compreendido a partir da queda dos Julio-Claudia-nos, em 69 DC, até o estabelecimento da dinastia Severa no final do segundo e início do terceiro século DC

O colapso da dinastia Júlio-Claudiana e as guerras civis de 69 DC estabeleceram o padrão para a história do Principado. Ao longo da história do Principado, o problema da su-cessão determinou um padrão particular de eventos. Sucessivas dinastias presidiram pe-ríodos de estabilidade, mas cada uma das dinastias colapsou em meio a uma guerra civil.

Após a Julio-Claudiana veio a dinastia Flaviana (69 a 96 DC), instituída por Vespa-siano, um general da legião do Danúbio. Os Flavianos foram seguidos pelos Antoninos ou Dinastia Adotiva (98 a 180 DC). Os Severos (193 a 235 DC) seguiram-se aos Antoninos.

Entre as dinastias, guerras civis foram travadas ou ameaçadas. O colapso da dinas-tia dos Flavianos em 96 DC viu um velho senador, Nerva, ser escolhido como imperador, mas quando as legiões do Reno começaram a resmungar, Nerva adotou seu comandante, Trajano, como seu filho e sucessor e, assim, conseguiu eliminar a guerra civil de modo an-tecipado. Trajano foi o primeiro dos imperadores adotivos (98-180 DC), uma dinastia sem filhos, determinada por adoção e não por laços de sangue, que presidiram o maior período do império em termos de poder, paz e prosperidade.

O último dos imperadores adotivos (ou Antoninos), foi Marco Aurelio, que reverteu a situação à sucessão sanguínea e foi seguido por seu filho, Commodus, que governou desastrosamente.

O assassinato de Commodus em 192 DC foi seguido por longos anos de instabili-dade, quando três grupos de exércitos lutaram para colocar seus comandantes no trono. Eventualmente, L. Septímio Severo, o governador da província do Danúbio, na Pannonia, venceu e estabeleceu a dinastia Severa (193 a 235 DC).

Quando não havia, claramente, um sucessor, marcado pelo amplo padrão da his-tória imperial, o caos se instalava e, então, aflorava o já conhecido problema sucessório.

Seria tedioso rever cada reinado imperial em detalhes, então, decidiu-se por adotar uma análise temática da posição do imperador no mundo romano.

O Principado tornou-se cada vez mais autocrático com o passar do tempo (cf. Se-vero, um general estudoso).

Qando as lembranças da República desbotaram e as pessoas se acostumaram aos imperadores, as sutilezas do sistema de Augusto caiu fora.

O processo já estava bem encaminhado no período Julio-Claudiano, mas no perío-do dos Severos, a natureza abertamente militar do Principado ficou além de qualquer dú-vida (cf. conta Cassio de Dio). Os Imperadores asseguravam seu governo, acima de tudo, agradando o exército e mantendo o controle sobre ele; se isso não fosse feito, poderia ocorrer um desastre (por exemplo, Galba ou Pertinax).

As últimas palavras de Severo foram “paguem bem os soldados; desprezem o res-tante”. O surgimento do gênero literário de panegírico ilustra esse processo. Mais ilustra-tivo ainda é a propagação do culto imperial oriental tingido, a adoração dos mortos e, por vezes, a vida dos imperadores como deuses.

Enquanto no poder, o imperador era inatacável e poderia gastar seu tempo como melhor lhe aprouvesse. Imperadores esforçados e conscientes passavam os dias lidando com os principais assuntos do Estado, ou mesmo com os suplicantes comuns e os peticio-

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nários; os Imperadores dissolutos ou preguiçosos ocupavam-se com deboche ou jogo. Tal como os magistrados republicanos, esperava-se que os imperadores desempenhassem as suas funções em pessoa, por isso, um governo cuidadoso iria gastar um tempo con-siderável lidando “cara-a-cara” com embaixadas e embaixadores, audiências, oitivas de petições, liderando exércitos, visitando províncias, e atendendo, pessoalmente, a outros assuntos de Estado. Os maus imperadores simplesmente ignoravam tudo isso. Em um certo sentido, era isso que um imperador fazia.

É um ponto discutível até onde havia qualquer política imperial, e em que grau os imperadores determinavam tal política, e se em tudo. Algumas tarefas eram vistas como um comportamento imperial esperado, tais como prédios públicos em Roma, fornecimento de suprimentos para a cidade, e outros atos de generosidade. Todos os imperadores, bons ou maus, participavam de tais atividades. No entanto, a opinião acadêmica está dividida sobre a extensão do controle imperial sobre a política, e até mesmo se havia essa tal política.

O contraste existente entre Trajano e Adriano, ou o peripatético Adriano e o acomo-dado Antonino Pio, parece sugerir que os imperadores eram os orientadores do emprego da força e os principais decisores políticos em execução no Império. Em contrapartida, a manutenção bem-sucedida da ordem, mesmo quando os maus imperadores estavam ignorando os assuntos do Estado sugere o oposto. A melhor visão é a última, que enten-de que o império corria por si próprio, a nível local e que os imperadores energéticos ou preguiçosos poderiam ir e vir e afetar o curso dos acontecimentos ou não, conforme eles bem entendessem. O imperador era, em essência, uma figura muito remota para a grande maioria das pessoas que viviam no Império. A maioria das pessoas nem sabia o nome do imperador; as suas preocupações eram esmagadoramente locais.

Os únicos meios de remoção de um imperador do poder eram o assassinato ou a rebelião. Nenhum imperador foi retirado do poder ex-officio ou por exigência do Senado. E tambem, nenhum imperador se aposentou voluntariamente. Se insatisfatórios, os impera-dores somente poderiam ser removidos pela força.

Ao longo deste período, a administração das províncias continuou a ser muito eficaz e bem sucedida. Elas beneficiaram ao máximo o regime imperial. A paz e a boa ordem geraram o único período mais longo da Europa de estabilidade unificada. A reordenação promovida por Augusto da administração provincial foi o seu legado mais bem-sucedido para o período imperial.

Os governadores nomeados pelos imperadores e responsáveis perante eles, ten-diam a governar por cerca de 4 a 5 anos (a duração exata pode variar). As principais preocupações das autoridades centrais foram a manutenção da paz e da boa ordem e da cobrança de impostos estaduais. Em todos os outros aspectos, os municípios locais corriam com os seus próprios assuntos, como será visto mais tarde.

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Capítulo 34A CRISE DO TERCEIRO SÉCULO

Severus Alexander fez o seu melhor com a situação que ele enfrentou e passou algum tempo na metade oriental do império lutando contra os inimigos daquela parte do mundo. Ele foi assassinado por suas tropas ... e como resultado deste evento, a dinastia Severa entrou em colapso.

A crise do Século III DC foi o produto de fatores externos e internos. O fator externo foi uma mudança na natureza dos inimigos de Roma, fora do império. Ao longo dos rios Reno e Danúbio, grupos de tribos previamente fragmentados, amalgamaram-se durante o Século II DC, em grandes e agressivas confederações, capazes de formarem vastos exércitos.

Ironicamente, essas confederações tribais eram, em parte, o produto da influência cultural romana. As tendências agressivas da cultura tribal germânica foram amplificadas nessas confederações. Ao longo do Reno e do Danúbio, os romanos, agora, viram-se em face dos Francos, dos Alamanni, e dos Macromanni em vez das unidades tribais menores múltiplas do passado.

Além disso, a pressão da migração dos hunos para o oeste, para fora das estepes da Ásia Central, causou um efeito dominó que exerceu uma grande pressão sobre as fronteiras de Roma. Novas tribos, até então desconhecidas para os romanos, começa-ram a aparecer nas ou perto das fronteiras do império, notadamente os Godos vindos da Polônia. Algumas dessas tribos realizaram grandes incursões sobre o Império romano no Século III DC. Em 253 DC, os Francos, com talvez uns 200 mil homens, derramaram-se sobre o Reno e passaram os próximos cinco anos assombrando a Gália e a Espanha. Em 265 DC, os Godos fizeram uma invasão marítima da Ásia Menor e da Grécia e saquearam Atenas, Corinto, e Olympia, para o horror do mundo civilizado.

Ao longo da fronteira oriental de Roma, o reino Parta, cambaleante, enfraquecido pelas invasões romanas sob Trajano e Septímio Severo, finalmente cedeu, em 230 DC, para os unficados e agressivos Sassânidas persas. Clamando pelo território do antigo reino persa de Ciro e Dario, os Sassânidas invadiram as províncias romanas orientais em vigor, sob o comando do seu vigoroso rei Shapur I (242 a 272 DC). A então capital oriental de Roma, Antioquia, caiu para os Sassânidas em 260 DC e, talvez, em outra ocasião antes disso. O imperador Valeriano foi capturado em batalha pelos Sassânidas no mesmo ano e morreu prisioneiro deles.

O fator interno, por sua vez, correspondeu à grave incerteza gerada pelo problema da sucessão. A usurpação contínua e desafiadora dos imperadores dominantes impossi-bilitou os romanos de responderem a essas ameaças externas. Nestes anos, os exércitos romanos lutaram entre si tão freqüentemente quanto eles o fizeram contra os Godos ou os Persas. Os fatores internos e externos reagiram uns contra os outros para gerar a crise, e os eventos que resultaram no cerco e na captura de Valeriano em 260 DC e no reinado subsequente de seu filho, Gallienus, ilustram, perfeitamente, a natureza dessa crise.

O resultado da crise foi a fragmentação do Império romano em três unidades meno-res sob regimes localizados que poderiam lidar mais eficazmente com as ameaças vindas de fora do império.

Na Gália, o general que, finalmente, expulsou os Francos em 258 DC, declarou-se imperador. C. Latinius Postumus repeliu as hordas saqueadoras dos francos para o outro lado do Reno e foi declarado imperador por suas tropas. Os governadores da Espanha e

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da Bretanha transferiram sua fidelidade a Postumus, que declarou o Império das Provín-cias da Gália (Imperium Galliarum).

Uma vez que as autoridades centrais mostravam-se impotentes para agir, as pro-víncias ocidentais foram efetivamente separadas do Império Romano e, então, formaram seu próprio Estado, que ficou com o seu próprio senado, seus imperadores, seu exército, e sua política externa por 12 anos. No Oriente, a dependência romana de Palmyra emer-giu como um defensor das fronteiras lá existentes e logo foi destacada das autoridades centrais.

Sob o Rei Odenathus e, mais tarde, sua esposa Zenobia, Palmyra primeiramente garantiu as fronteiras orientais de Roma a partir do território dos Sassânidas e, em segui-da, anexou o território para si. Ao contrário do Imperium Galliarum, este era um Estado reconhecidamente menos romano e, por volta de 270 DC, ele controlava a Síria, o Egito e grande parte da Ásia Menor.

Ambos os estados separatistas ganharam legitimidade e a lealdade das suas popu-lações regionais, permitindo a paz e a segurança que as autoridades centrais não pode-riam oferecer. O Império Romano parecia estar quebrando.

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Capítulo 35A FORMA DA SOCIEDADE ROMANA

Nós vamos deixar o Império Romano nas cordas no Século III DC e fazer uma pausa para examinar uma variedade de aspectos da sociedade e da cultura romana sob uma perspectiva temática.

Nossas fontes, incluindo os escritos de autores como Cícero e Plínio, o Jovem, e as inscrições, nos oferecem uma boa perspectiva sobre este período. A sociedade romana era intensamente hierárquica e dotada de um status consciente. Em linhas gerais, a socie-dade romana foi marcada por hierarquias rígidas de status, determinadas por lei. A divisão mais ampla ficava entre os escravos e os homens livres (a escravidão será detalhada no capítulo seguinte.

Até 212 DC, a grande divisão existente ficava entre o cidadão e o não-cidadão ro-mano. A principal vantagem da cidadania estava na esfera judicial.

Fig 12 - A sala de jantar, ou triclínio, de uma aristo-crática casa romana.

Dentro do corpo de cidadãos, propriamente dito, havia diferentes ordens de status. Os senadores constituíam a classe mais rica e privilegiada. Os equestrians (equites) eram da mesma classe socioeconômica dos senadores, mas eram classificados como um nível abaixo deles. Nos municípios de todo o Império, a aristocracia local, eventualmente, veio a ser definida como uma ordem, chamada dos decuriões. Os comuns ficavam agrupados na ordem da plebe.

Os privilegiados eram, ainda, diferenciados pela perpetuação da classe social dos

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patrícios, pela evolução do “nobre” em oposição aos senadores “ordinários, ou comuns”, pela proximidade dos indivíduos das fontes de influência (como por exemplo, o impera-dor), e assim por diante.

Os diversos graus de status eram fixados e mantidos por lei. As ordens senatoriais, equestres, e decurionais tinham suas qualificações fundadas nas propriedades mínimas exigidas para a adesão. Quanto aos nascidos livres, aos privilegiados (honestiores) e aos não privilegiados (humiliores) estes também eram definidos por lei e tratados como tal no âmbito do sistema judicial.

Além das definições legais, a aparição pública era fundamental ao estabelecimen-to e manutenção do status. O status de um membro da elite era identificável através de símbolos de status, legalmente restritos aos diferentes graus. Assim, os senadores tinham o direito de usar uma toga com uma larga faixa roxa e sentar nos bancos da frente nos espetáculos e eventos públicos; eles também monopolizavam todos os sacerdócios im-portantes em Roma.Já os equestrians usavam uma toga com uma faixa roxa estreita, um anel de ouro, e ocupavam os assentos por trás dos senadores nos espetáculos.

Quando o período imperial passou, títulos honoríficos oficiais também foram arroga-dos a essas ordens, definidas, mais uma vez, por lei. Apenas um senador poderia ser “vir clarissimus” (mais tarde redefinido no Império tardio como “vir spectabilis” e “vir illustris”), enquanto apenas os equestrians poderiam ser denominados “egregius vir” ou “perfectis-simus”.

A usurpação de qualquer um destes símbolos de status era levada muito a sério pelas autoridades (isto é, a elite), e muitas leis — de todo o Imperio ou locais — protegiam seu estrito uso. A centralidade da aparição pública na definição de status era gerada pela natureza não documental do mundo antigo: “você será quem você parece ser”.

As relações entre as classes e as ordens eram definidas pela tradição e pelo patro-cínio (clientela). Dada à natureza hierárquica do sistema, a sociedade romana era perme-ada por noções de respeito e deferência, através de manifestos na “clientela”. Nem todo mundo, porém, era parte de uma relação patrono-cliente e, em geral, as relações entre as classes eram marcadas por hábitos de deferência e precedência. Isto segue um longo ca-minho para explicar como tão poucas famílias conseguiram monopolizar as magistraturas republicanas romanas, apesar da dependência do sistema do voto popular.

Apesar das profundas divisões entre as classes, o sistema funcionou muito bem durante séculos. O melhor modelo para o seu funcionamento não é uma pirâmide, mas sim uma atomista, em que o centro é ocupado pela pessoa de prestígio e influência que é cercada por uma nuvem representante da família e dos dependentes de status variáveis. Os dependentes não estão fixos no lugar, mas disputam proximidade com o homem de influência. Os dependentes podem eles próprios estarem no centro da sua própria comiti-va de dependentes. A topografia das típicas cidades romanas refletem essa ordem social, com as casas dos importantes e dos menos importantes distribuídas uniformemente, ao invés de agrupadas em bairros de alta classe e guetos.

Plínio, o Jovem, afirmou que “nada é mais desigual do que a própria igualdade.” As pessoas que merecem respeito e não o obtém, estão sendo tratadas injustamente. A idéia de igualdade na sociedade não era uma parte do pensamento romano.

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Capítulo 36ESCRAVIDÃO ROMANA

Neste capítulo será examnada a condição dos escravos romanos. Ela é uma característica de todas as socie-dades antigas, e é triste dizer, olhando-se para a ampla história da humanidade, que na maioria das sociedades que estão documentadas, a escravidão tem sido uma particularidade ou característica de muitas delas.

Entre os romanos, assim como na maioria das sociedades humanas ao longo da história, a escravidão era uma norma incontestável. Os romanos aceitavam a escravidão como natural e a considerava como o status de menor grau em sua hierarquia social. A es-cravidão foi uma característica na maioria das sociedades humanas ao longo da história, e Roma não constitui uma exceção. Nenhum habitante do Império Romano está registrado desafiando a escravidão, em princípio. Para os romanos, a escravidão não era determina-da por raça ou por etnia, mas por status.

As ramificações desta situação eram muitas. Qualquer um poderia cair na escravi-dão, por isso havia, muitas vezes, uma distinção racial entre escravo e proprietário. Uma vez escravizado, seria possível revertar a situação e se reintegrar à sociedade como ho-mem livre. A escravidão em Roma também não fora, primariamente, uma questão de ex-ploração do trabalho (como intitulado no modelo marxista), uma vez que os escravos fa-ziam todos os tipos de tarefas humildes, ao lado de pessoas nascidas livres (por exemplo, o trabalho manual), bem como muitas outras tarefas valorizadas e respeitadas pela elite romana (por exemplo, a educação de seus jovens).

Havia cinco fontes de escravos para os romanos. A primeira delas eram os prisionei-ros de guerra que se tornavam escravos. O termo latino para escravo, servus (ou pessoa poupada) deriva dessa fonte de escravidão, uma vez que os prisioneiros de guerra eram, tecnicamente, vítimas de uma batalha e assim deveriam, por direito, serem mortos. As crianças nascidas de escravos, em casa, também eram considerados escravos, denomi-nados vernae.

Aos escravos não eram permitidos casamentos legais, mas eles poderiam formar parcerias, formadas durante a escravidão. Complicações legais surgiam, quando escra-vos e libertos reproduziam (o princípio geral era que, se um dos parceiros era um escravo, a criança também o seria). As crianças não desejadas eram, por vezes, vendidas como escravas ou expostas; se fossem achadas, poderiam ser escravizadas por seus desco-bridores.

O comércio feito além das fronteiras também trouxe escravos para o império. Pa-rece provável que os bens de luxo romanos obtidos fora do Império eram o resultado do comércio de escravos. A pirataria e o banditismo poderiam resultar em pessoas tornadas escravas.

As condições de vida dos escravos, individualmente, variavam consideravelmente e ficavam, sempre, totalmente dependentes dos caprichos do proprietário.Os escravos confiáveis e hábeis que trabalhavam perto de um proprietário poderiam viver confortavel-mente e desfrutar de alguma liberdade de movimento. Os escravos envolvidos em tarefas domésticas tinham uma vida mais mais difícil. Mas em nenhum caso as vidas dos escra-vos romanos deveriam ser glamourizadas; todas ficavam, totalmente, ao sabor de seus proprietários. Um tratamento violento era, muitas vezes, a norma para o escravo, como anedotas revelam.

A sociedade dos escravos era permeada por noções de status quando era tornada

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uma sociedade livre, e essa hierarquia serviu para manter a população escrava dividida contra si mesma. Os escravos que trabalhavam na cidade julgavam-se melhores do que aqueles que trabalham em propriedades rurais de proprietários possuidores de idênticos status aos dos primeiros. Os escravos especializados tinham um senso de superioridade sobre os trabalhadores braçais. Alguns escravos eram nomeados capatazes encarrega-dos de outros escravos (vilici). Essa hierarquia entre os escravos ilustra o quão profunda-mente enraizadas estavam na sociedade romana as noções de status e deferência.

Os romanos ricos poderiam possuir milhares de escravos e, apesar de revoltas de escravos terem sido raras, há sinais, inclusive algumas leis, que mostram que a população livre vivia com algum medo dos escravos, como a lei que exigia que todos os escravos de um agregado familiar fossem executados se um deles assassinasse o proprietário. As revoltas de escravos havidas na Sicília em 135 a 133 AC e a de Spartacus no sul da Itália, em 75 a 73 AC são as únicas duas revoltas organizadas nos registros da história romana. Os escravos, no entanto, teriam de resistir a uma pequena base de punição diária, quando fossem caracterizados por seus proprietários como preguiçosos, pouco confiáveis, enga-nosos, e assim por diante.

É uma característica marcante da sociedade romana o fato de que os escravos libertos se juntaram às fileiras do corpo do cidadão. Os escravos romanos poderiam ser soltos ao sabor de seus proprietários. Os escravos libertados eram denominados liberti (libertos). A liberdade vinha através de um ritual chamado de alforria, cuidadosamente regulado por lei. Muitos donos de escravos libertos os premiaram em seus testamentos, mais como um sinal de sua generosidade e riqueza do que por afeição aos indivíduos envolvidos.

Os escravos libertos se juntavam ao corpo de cidadãos, embora eles ficassem impe-didos de certos direitos (funções públicas, por exemplo) até a terceira geração da alforria. Os libertos se tornavam clientes de seus antigos proprietários, muitas vezes continuando a desempenhar as funções que eles tinham realizado enquanto em servidão. A libertação dos escravos reflete menos a humanidade dos romanos e mais a necessidade de oferecer uma “cenoura” para o escravo fiel, para garantir um bom serviço.

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Capítulo 37A FAMÌLIA

Se você perguntar a um menino de 15 anos de idade, como sua família é, ele pode relatar sobre seus pais, irmãos e irmãs. Em seguida, se fizer a mesma pergunta a um homem de 50 anos de idade, casado e com três filhos, você irá obter uma resposta muito diferente. A palavra “família” em si é flexível tanto entre culturas e até mesmo dentro das próprias culturas.

A família, uma instituição exstente em qualquer sociedade, possuía, na sociedade romana, um conceito amplo que o diferia dos nossos modernos conceitos do que constitui uma família. A palavra em latim familia denota algo muito mais amplo do que a família nu-clear moderna, embora vinculada a essa entidade. A palavra família, em Roma, poderia ser aplicada aos parentes imediatos, aos parentes estendidos, aos dependentes, e até mesmo aos escravos dentro da casa; domus (casa), por sua vez, também erai usado para denotar o que hoje consideramos o local habitado pela “família”.

O fator constitutivo mais fundamental da família romana era a propriedade da terra. Sem terra, no mundo antigo, era-se pobre, e tinha-se, então, de se tornar um inquilino da terra de outra pessoa, vender-se como escravo, ou se juntar à multidão urbana. Portanto, a manutenção e/ou ampliação de propriedades rurais de uma família era uma preocupa-ção primordial. Desde que a terra fosse transferida dentro de uma mesma família, isso garantiria que o patrimônio seria mantido intacto para as gerações futuras. Esta situação não se aplicava, necessariamente, às ordens mais baixas, de modo que o que se segue é, em grande parte, um retrato do que acontecia com as famílias da classe alta.

Entre as famílias de classe alta, os ancestrais (maiores) eram de grande importân-cia (cf. Mos maiorum, os “caminhos dos antepassados,” discutido anteriormente).

A manutenção não só do patrimônio, mas também da reputação da família e do seu status era vital. Tal como os bustos, as máscaras mortuárias feitas em cera (imagines) dos antepassados mortos eram mantidos no santuário da família e levados em funerais para enfatizar a história particular daquela família a serviço do Estado.

A descrição de Políbio de um funeral aristocrático revela muito sobre a ideologia da família e a importância dos antepassados.

A família romana difere da moderna em vários outros aspectos Importantes. As famílias da classe alta raramente eram baseadas em um casamento por amor e afeição mútua, que hoje consideramos como qualidades fundamentais para o sucesso de uma família moderna. Em vez disso, os casamentos eram frequentemente organizados para o benefício social e/ou econômico das famílias que se uniam por meio de um casamento. Os relacionamentos dentro de uma família romana estavam ligados ao status, como em qualquer outro segmento da sociedade romana, e que diferia em razão, apenas, pelas possíveis relações entre marido e mulher, pai e filhos, dona da casa e sogros, escravos, e assim por diante.

As relações entre os membros da família também eram diferentes do que seria de esperar entre as mesmas pessoas nos dias de hoje. As novas bodas não deixavam de formar as suas próprias famílias, mas a noiva se juntava à família de seu marido e se mudava para a casa do sogro. Os escravos eram muitas vezes usados para criar os filhos, e as relações entre as mães e seus filhos eram mais distantes do que consideramos hoje adequado.

Dentro da família romana, o homem mais mais velho (paterfamilias) exercia a au-

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toridade legal completa sobre os membros de sua família. Desde os primeiros tempos até o fim do Império Romano, os direitos legais dos paterfamilias foram afirmados como primordiais. Um pai possuía o poder paternal (patria potestas) e empunhava uma mão orientadora (manus) sobre todas as pessoas que viviam sob o mesmo teto. O mais antigo organismo do direito romano escrito, A Lei das Doze Tábuas, de 449 AC, afirma a respeito deste poder paternal, e ele nunca foi legalmente impugnado.

Em virtude de sua autoridade, os paterfamilias tinham o direito de bater, matar ou vender como escravo qualquer pessoa sob seus potestas. Ele também era dono de todos os bens que ficavam sob o seu agregado familiar, incluindo os de seus filhos, enteados, e netos. A primazia absoluta do paterfamilias é revelada no sistema romano de nomenclatu-ra, em que o nome do pai determinava o de toda a prole.

O pátrio poder passava para o filho mais velho, quando o pai de família morria. As terras e os status poderiam ser objeto de adoção ou da nomeação de um tutor dentre os membros masculinos da família.

As legalidades, no entanto, raramente circunscreviam as realidades sociais e, na atualidade, pais não têm limites colocados sobre o seu comportamento pelas circunstân-cias e tradição. Os poderes potencialmente tirânicos do paterfamílias sobre a sua casa parecem ter sido raramente realizados; mas alguns casos de abuso estão registrados.

Vários fatores serviram para limitar a extensão do poder paternal. A baixa expec-tativa de vida assegurou que os filhos raramente atingissem o auge da vida ainda sob os polegares de seus pais idosos. O costume ditava que, antes de recorrer aos castigos terríveis dos membros da família, os pais deveriam consultar um conselho de família cujas decisões eram socialmente vinculativas. Tabus foram colocados em algumas atividades legalmente dentro do âmbito dos paterfamilias; por exemplo, era socialmente inaceitável bater na esposa. Apesar de sua natureza aparentemente draconiana o sistema de patria potestas parece ter funcionado bem em toda a história romana.

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Capítulo 38A MULHER NA SOCIEDADE ROMANA

Todas as mulheres nascidas livres sob o direito romano requeriam que em todos os momentos de suas vidas estivessem sob a tutela e os cuidados de um homem ou de outro. Naturalmente, as filhas deveriam nascer sob o pátrio poder de seus pais, assim como seus irmãos o tinham sido.

A posição das mulheres na sociedade romana variava de acordo com o seu status, embora houvesse algumas leis e atitudes que se aplicavam a todas as mulheres. Em al-guns aspectos, o estudo das mulheres romanas, independentemente de seus homens, é enganoso, já que as mulheres derivavam seus status da associação com os seus homens e compartilhavam as perspectivas e atitudes de sua classe particular. O status de uma mulher era derivado a partir da referência existente para seus homens: pais, maridos e irmãos. As mulheres compartilhavam as atitudes de sua classe, e não há nenhuma evidên-cia de que a esposa de um cônsul compartilhasse de qualquer sentimento de irmandade com a copeira.

No entanto, certas leis e atitudes eram aplicadas a todas as mulheres, em virtude do seu sexo. Todas as mulheres nascidas livres eram obrigadas a estar sob a égide de um tutor legal para suas vidas inteiras, embora o rigor desta exigência tivesse dissipado ao longo do tempo. Por exemplo, o antigo sistema de casamento (confarreatio), pelo qual a noiva se mudava da manus de seu pai para a do seu marido ou seu sogro, deu lugar a uma espécie menos formal de casamento que não envolvia nenhuma transferência de manus.

Ao contrário de outras sociedades mediterrâneas antigas, as mulheres romanas poderiam possuir e herdar bens e, muitas vezes, foram educadas tão bem como os seus homens. Sob um casamento menos formal, uma mulher poderia manter o controle do dote que ela trouxe com ela para o casamento. No entanto, todas as mulheres eram vistas pe-los homens como sendo mais fracas e menos razoáveis do que os homens, como também naturalmente propensas à promiscuidade.

Essas atitudes provavelmente derivavam da propriedade da terra e da necessidade de se manter as mulheres sob exame minucioso, para evitar a ameaça de filhos ilegítimos e do risco que se seguia ao patrimônio. A situação entre as classes mais baixas, onde ho-mens e mulheres teriam de compartilhar os ônus do trabalho, era, sem dúvida, mais igual, embora não inteiramente igualitária.

Tal como acontecia com os poderes dos pais, as fontes legais somente retratavam uma parte da imagem e não descrevem a vida real. Apesar destas disposições legais, algumas mulheres acumularam grande poder e influência na sociedade romana, especial-mente no final da República e no início do Império. Mulheres republicanas como Cornelia, a mãe dos Gracchi, eram altamente respeitadas e influentes membros da alta sociedade. Sob o Principado, as mulheres imperiais, como Lívia, a esposa de Augusto, ou a sua filha Julia, todas desempenharam papéis importantes na história dos tempos. Todas essas mu-lheres, no entanto, tinham de agir nos bastidores, já que as mulheres estavam oficialmente excluídas da vida pública.

No ideário masculino, os deveres das mulheres romanas estavam na esfera domés-tica, mas uma variedade de fontes mostra, claramente, que as mulheres de substância poderiam desfrutar de altos perfis públicos. Na situação ideal, o lugar da mulher romana era o de encarregada dos assuntos domésticos da família. Uma mulher deixava de ser uma puella ou uma virgo de antes do casamento, para ser uma matrona, após alguns anos

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de casamento e várias crianças. A mulher romana ideal em qualquer idade deveria possuir a qualidade de pudicitia (uma combinação de modéstia, castidade, infidelidade, e fertili-dade), bem como de educação (mas não muito) e afabilidade (mas ela não o devia ser excessivamente). Cornélia foi, em muitos aspectos, uma forma de realização destes ide-ais. As mulheres que cruzassem esses ideais estavam sujeitas ao repúdio pela sociedade em geral, como Clódia ou Sassia, que foram castigadas por Cícero, ou Sempronia, que foi sacrificada por Salústio. Vale a pena notar que ideais análogos também se aplicavam aos homens; quer se dizer com isto que os homens não poderiam fazer o que quisessem, enquanto suas mulheres fossem mantidas em altos padrões.

Fig 13 – O templo das virgens vestais em Roma.

Apesar da natureza essencialmente domestica do ideal, as fontes são claras ao informar que as mulheres poderiam desfrutar de alto perfil público, especialmente no culto religioso.

As mulheres aristocráticas locais poderiam ser proeminentes em seus municípios. Inscrições oficiais, por vezes, homenageiam as mulheres locais, evidentemente, pessoas de importância em suas regiões. Da mesma forma, alguns edifícios públicos em cidades romanas foram erguidos por mulheres, tal como a construção Eumáquia no fórum de Pom-péia, erguida por uma sacerdotisa. Na verdade, eram como sacerdotisas que as mulheres romanas poderia desfrutar de uma vida pública honrada, mais notavelmente as Virgens Vestais em Roma.

Entre as classes mais baixas, a situação era bem diferente. Algumas fontes suge-rem que as mulheres das classes mais baixas gozavam de maior liberdade e igualdade

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do que as mulheres da classe alta. O discurso de Lívio sobre Spurius Ligustinus revela o trabalho duro a que algumas mulheres eram submetidas. Esculturas em relevo e outras fontes mostram mulheres no trabalho ao lado dos homens. Naturalmente, as escravas faziam o mais difícil, sendo objeto, inclusive, de abuso sexual, além das degradações as-sociadas à servidão que compartilhavam com os escravos do sexo masculino.

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Capítulo 39UM IMPERIO DE CIDADES

De muitas maneiras, e algumas vezes até mesmo expressa pelos próprios romanos muito claramente, a cidade era uma manifestação da majestade do Estado romano. Foi, acima de tudo, o centro urbano que representava o que Roma e o Império Romano eram.

A nível local, o Império Romano era executado pelas autoridades municipais. As autoridades imperiais centrais estavam preocupadas com a paz e os impostos; as au-toridades locais tratavam da vida quotidiana dos habitantes do império. Os terrenos não de propriedade do imperador ou do povo romano eram atribuídos às cidades para serem governados. O império, então, parecia uma colcha de territórios municipais, cada um com um centro urbano, um território agrícola e propriedades e aldeias. Cada cidade tinha sua própria cidadania, o que permitiria que se pudesse tomar parte na política local.

As populações das cidades romanas eram geralmente pequenas para os padrões atuais, com uma população girando em torno de umas poucas dezenas de milhares de pessoas. A gradação do status dos municípios foi iniciado pelos romanos quando eles con-quistaram a Itália e acabou quando se alargou por todo o império, criando uma infinidade de colônias, municipios, e cidades tributárias em todos os cantos do império.

Apesar das divergências consideráveis, as administrações municipais tendiam a aderir a um amplo formato republicano. Onde existiram as formas pré-romanas de admi-nistrações municipais, elas foram deixadas no local (especialmente nas cidades de língua grega do leste).

No oeste não urbanizado, no entanto, os romanos estabeleceram cidades e criaram sistemas de governo locais modelados na própria República. Um conselho da cidade era composto de decuriões — ricos notáveis locais, um pouco parecido com os senadores da Roma republicana.

Fig 14 – Uma estrada romana e um arco, na Argélia.

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Havia uma assembléia popular dos cidadãos da cidade que elegiam, anualmente, os magistrados. Os conselhos e magistrados tinham diferentes designações, com base no costume local, mas as formas mais comuns eram a de dois cônsules dos homens-chefes (duoviri) e dois administradores (edis) abaixo deles, todos os quatro eleitos anualmente.

Há também evidências de ditadores locais, questores, prefeitos e censores. Os prin-cipais deveres destas autoridades locais eram o de tratar dos assuntos da cidade e de seu território, resolver as disputas locais e recolher impostos para entregar às autoridades centrais a cada ano. Mesmo com a mudança para o Principado, esta forma republicana da administração local foi mantida intacta.

As cidades restantes pontilhavam o Império Romano e compartilhavam muitos ele-mentos semelhantes; a construção e a manutenção de edifícios públicos eram da respon-sabilidade das autoridades locais e dos ricos cidadãos privados. Usando Pompéia como um exemplo, podemos ter uma idéia da aparência física das cidades romanas. A cidade romana tinha em seu coração um fórum, que era o centro religioso, econômico, político e judicial. Os edifícios associados ao fórum refletiam essas funções.

A cidade também oferece uma variedade de instalações que não estão disponí-veis na zona rural: tabernas, lanchonetes, banheiros públicos e locais de entretenimento e relaxamento. As pessoas viviam em apartamentos ou moradias, dependendo de suas possibilidades. O zoneamento no modelo moderno não era praticado, de modo que os apartamentos, casas, lojas, bares e estabelecimentos públicos de todos os tipos são en-contrados distribuídos uniformemente por toda cidades romanas.

Os edifícios públicos refletem, diretamente, a dignidade da comunidade e, geral-mente, eram erguidoas e mantidoe por funcionários locais e magnatas, como as inscri-ções deixam claro. Este sistema de distribuição da riqueza privada para benefício público foi denominado “euergetism” pelos estudiosos modernos. Euergetism seria um contrato social: as classes superiores forneciam os serviços públicos e os entretenimentos para a população local em troca de aumento do prestígio e status entre ela.

Os centros urbanos prestavam uma variedade de funções para a rústica população de seus territórios, de modo que a cidade seria o sócio sênior no arranjo. O forum da ci-dade ficava onde os “mercados de nove dias” ocorriam. Todas as eleições tinham lugar na cidade. As festas religiosas importantes eram encenadas em templos e no fórum da cidade. Espetáculos, eventos de teatro e outros entretenimentos podiam ser encontrados nas cidades. Os casos (juridicos) eram geralmente ouvidos na basílica perto do fórum.

A primazia das cidades sobre interior era manifestada, fisicamente, pelos aquedutos romanos, que levavam a água desde as fontes locais, até muitas vezes além da cidade, e a canalizava para ser usada no centro urbano.

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Capítulo 40ENTRETENIMENTO PÚBLICO. PARTE I

OS BANHOS ROMANOS E AS CORRIDAS DE BIGAS,

As corridas de biga eram uma forma extremamente popular de lazer público, e que era patrocinadas, em grande forma, por benfeitores do mundo romano. O hábito do banho público, também era comum.

Uma parte essencial do contrato “euergetistic” era a provisão de entretenimentos e conveniências (commoda) para as pessoas. Esta cultura de lazer e entretenimento de massa ao público evoluiu durante o final da República e os períodos iniciais do Império.

Os políticos do final da República e os imperadores depois deles, alimentaram sua popularidade, fornecendo às pessoas atividades de lazer. Estas atividades assumiram várias formas, desde banquetes públicos até a construção de edifícios para a rrealização dos entretenimentos Além dos jogos de gladiadores, que serão examinados no próximo capítulo, duas das formas mais populares de lazer público eram os banhos públicos e as corridas de bigas.

O banho público era um elemento habitual da vida diária, e os banhos tornaram-se um símbolo da civilização romana. Na época de Augusto, o banhar-se em público tornou--se uma característica regular da rotina diária, de modo que os prédios para a reralização dos banhos públicos constituem uma característica distintiva dos edifícios romanos.

A partir de suas origens obscuras, os banhos públicos surgiram em meados e final da República como uma atividade natural da vida social do mundo romano. Eles são mencionados nas peças de Plauto (c. 200 AC). No entanto, seu auge ocorreu sob os im-peradores dos primeiro e segundo séculos DC. Eles foram encontrados em cada tipo de assentamento romano, desde as casas de campo até em fortalezas.

Seus projetos variavam enormemente em seus detalhes, mas os elementos bási-cos estão sempre presentes. Havia uma série de quartos aquecidos através dos quais os banhistas progrediram sequencialmente. Os banhistas compartilhavam os banhos em piscinas aquecidas, onde várias instalações auxiliares estavam disponíveis.

O complexo ritual do banho era uma experiência decididamente sociável e popular. Todo o ritual exiga várias horas para se desfrutar de um circuito completo, e sua natureza pública promovia relaxamento e bem estar.

Na verdade, mesmo que secundáriamente, os aspectos sociais dos banhos gradu-almente tornaram-se a principal razão para a sua popularidade: era ali que os romanos se conheciam, relaxavam, bebiam, fofocavam, juntavam grupos para o jantar e, de um modo geral, se misturavam.

Estas características dos banhos levantam questões interessantes sobre a ope-ração diária da sociedade romana: Será que os homens e as mulheres tomavam banho juntos? O quão higiênico eram os banhos? Será que todas as classes iam aos banhos juntos, ao mesmo tempo? Poderiam ser encontrados escravos lá?

As casas de banhos construídas pelos imperadores em Roma refletem a importân-cia do hábito e os processos de euergetism imperial na capital. A escala e a magnificência impressionante de alguns dos banhos imperiais em Roma revelam, claramente, a centrali-dade do hábito na vida diária. Por exemplo, as Termas de Caracalla e de Diocleciano cuja área abrangia cerca de 30 hectares.

O fato de que os banhos foram construídos às custas do imperador demonstra a importância do euergetism no regime imperial.

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Em todo o Império, as autoridades locais e os benfeitores particulares forneciam termas, ainda que em uma escala menor do que aquelas existentes em Roma, para as suas comunidades. Além dos banhos maiores em Roma e em outros lugares, havia tam-bém banhos nos bairros mais humildes, fornecidos por empresas comerciais.

Fig 15 - A entrada para as Termas de Diocleciano na Piazza della Republica, Roma.

Dos entretenimentos de massa disponibilizados aos romanos, as corridas de biga eram as mais populares; em termos de escala, era o maior evento de entretenimento en-cenado pelos romanos. As corridas de biga eram uma antiga forma de competição, que remontava aos Jogos Olímpicos gregos e além. Os romanos transformaram o esporte em um entretenimento de massa. As corridas de biga ocorriam em grandes circos, em arenas em forma de bala. O Circus Maximus em Roma, tinha quatro andares de altura e poderia acomodar, talvez, uns 200.000 espectadores. Quando as corridas ocorriam, a cidade fica-va praticamente deserta.

As corridas eram cuidadosamente organizadas por equipe e piloto, e as equipes atraíam uma fanática torcida entre a multidão. Os pilotos dos carros eram organizados em quatro equipes, ou facções: branco, verde, azul e vermelho. A corrida regular, contava com três carros de cada facção, embora às vezes apenas um de cada equipe participasse. Os carros em si poderiam ser tracionados por dois, quatro, ou seis cavalos, dependendo da habilidade e da força do piloto para os controlar. As corridas compreendiam sete voltas em torno do circo e tornavam-se violentas, especialmente quando um carro batia, produzindo os “náufragos”, no jargão dos apostadores.

A grande atração das corridas eram as apostas. As facções de corrida atraíam se-guidores fanáticos que poderiam até ganhar proeminência política no período imperial tardio, na metade oriental do Império. As lápides dos condutores de bigas revelam algo da complexidade e fascínio pelo esporte.

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Capítulo 41ENTRETENIMENTO PUBLICO, PARTE II

JOGOS GLADIATORIAIS

O Coliseu em Roma conta, agora, com quase 2.000 anos como um símbolo não apenas da cidade de Roma, mas da antiga civilização que o produziu. Tem, geralmente, evidenciado admiração e apreço pelas pessoas que o visitaram.

O Coliseu é um sítio notável para se visitar, e não é difícil de se perceber o porquê. Tem 170 pés de altura e mede 205 jardas por 170 jardas em seus eixos; 130.000 jardas cúbicas de de pedras cortadas foram usadas em sua construção, junto com dezenas de milhares de toneladas de concreto. Cerca de 300 toneladas de ferro foram usadas para apertar os blocos de pedras cortadas juntas. É um monumento que mantém viva a civili-zação romana, desde que a sua verdadeira função seja colocada para o lado.

É o símbolo imediatamente reconhecível da antiga civilização de Roma dentro da moderna cidade dos dias de hoje. E o gladiador, sem dúvida, é uma das imagens mais marcantes e facilmente reconhecíveis da Roma antiga, uma característica intrigante da vida romana.

O Coliseu de Roma é uma engenharia superlativa e uma realização arquitetônica ímpar, uma verdadeira expressão física do amor romano à escala, beleza e proporção. Sua função como uma arena para a realização de espetáculos de violência inimaginável reflete outro amor dos romanos.

Fig 16 – O Coliseu romano.

Hoje, o gladiador é também uma imagem popular da Roma antiga, mas os estudio-sos têm encontrado dificuldade para explicar o porquê de tais eventos sangrentos terem entusiasmdo os Romanos tão grandemente. Neste capítulo, será examinado o fenômeno dos jogos gladiatoriais e conhecer as explicações modernas para eles.

Os gladiadores tiveram origem na Itália, e chegaram em Roma em meados do ter-ceiro século AC, e tornaram-se imensamente populares no final da República e sob os imperadores. O onde, realmente, os gladiadores apareceram, inicialmente, é uma questão de algum debate, mas o contexto dos jogos fúnebres para os guerreiros tombados no sul da Itália oferece a melhor explicação até o momento. Os primeiros gladiadores a lutar em Roma o fizeram dentro de um contexto funerário: Para homenagear um membro proemi-nente do clã Juniano em 264 AC, seus netos escalaram quatro pares de escravos para lutarem uns contra os outros, diante de seu túmulo. Durante a maior parte de sua história,

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os jogos de gladiadores mantiveram uma qualidade quase que religiosa e comemorativa.A República tardia e o início do Império viram um grande aumento na escala e mag-

nificência dos jogos gladiatoriais, bem como a sua popularidade. Os aristocratas concor-rentes na Revolução Romana usaram os jogos para ganhar popularidade com as massas e, assim, ajudar suas próprias carreiras. Isso porque, ao contrário de muitos dos entre-tenimentos do povo, os jogos gladiatoriais eram fornecidos por um indivíduo (chamado de editor), e não pelo Estado, às custas do público. Políticos progrediram através do seu cursus honorum ao fornecer jogos, às suas próprias expensas.

César e Pompeu encenaram jogos que atingiram um elevado grau de magnificência do espetáculo. César também deu início ao processo que dissociou os jogos gladiatorias das honras fúnebres, ao manter jogos em honra à memória de sua filha, mas nove anos após sua morte real e sepultamento. Os imperadores pegavam esses precedentes para manter tais espetáculos cada vez maiores e mais complicados, como nunca vistos, embo-ra, sempre, a pretexto de alguma ocasião especial ou comemorativa. Nos municípios do império, a encenação dos jogos era o produto do euergetism entre a elite dominante local.

Encenar um espetáculo de gladiadores era uma atividade complexa, e as vidas dos gladiadores não devem ter sido agradáveis. O homem que quisesse ser colocado nos jogos era obrigado a fazer preparativos sérios. O espetáculo era desenvolvido em três partes: a caça ao animal e/ou brigas de animais (venatio) ocupavam a manhã, na hora do almoço, as execuções públicas, por vários meios, eram encenadas. Os gladiadores fecha-vam o show como o evento principal.

Por conseguinte, o editor teria encontrar animais para o venatio, e quanto mais exó-ticos ou ferozes melhor; obter vítimas para as execuções, e utilizar modos interessantes para matá-los; e, finalmente, encontrar tropas de gladiadores de qualidade. A qualidade e a escala dos jogos representavam diretamente a riqueza e as conexões do editor e torna-vam-se os dias mais importantes na vida da sua vida.

A mecânica de empreender os jogos suscitava questões interessantes: será que o editor comprava os gladiadores ou os contratava? Como a escola de gladiadores (ludus) era reembolsada pelas mercadorias danificadas no retorno? Havia um grande negócio para o recolhimento e transporte de animais para exibição? Será que os magistrados ro-manos deliberadamente condenavam as pessoas para a arena, para ajudar um amigo em necessidade de vítimas para execução?

Os gladadores eram treinados em modos específicos de combate. Havia várias fontes de gladiadores. Elas incluíam escravos comprados pelo proprietário de um ludus, pessoas condenadas em tribunal para servirem como gladiadores e, até mesmo, voluntá-rios dentre a população. Uma vez no ludus, o gladiador era designado para uma determi-nada classe de lutador que combinava com sua compleição física e era treinado por um especialista (doctor) no modo de combate. O ludus de Pompéia é um bom exemplo do que parecia uma escola de treinamento.

Os combates de gladiadores não eram, portanto, nenhum mero abate sem sentido, mas sim lutas cuidadosamente pensadas e realizadas entre homens armados para a sua vantagem e desvantagem (por exemplo, o secutor e o retiarius). A vida no ludus deve ter sido incessantemente dura e propositadamente brutal.

O explicar os jogos tem sido um problema para os estudiosos modernos. Algumas características dos jogos sugerem explicações em si mesmas. Os assentos estritos da multidão por posição social sugerem que a arena era uma manifestação da ordem social romana. Os espectadores ficavam sentados por categoria, todos vestindo a roupa oficial

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da cidadania romana, a toga.

Pares-tipos de gladiadores

A destruição na arena de ameaças à ordem humana ou social, sob a forma de caças às bestas e execuções, reforçavam aos espectadores seu próprio poder sobre as forças potencialmente causadoras de distúrbios. A presença do imperador e os apelos populares a ele pela multidão transformavam a arena em um teatro político.

A natureza militar dos jogos sugere que eles eram um veículo para lembrar os roma-nos de seu espírito marcial em tempos de paz. Nenhuma destas observações, no entanto, é suficiente por si só para explicar os jogos.

Outras explicações modernas, fundadas em teorias da sociologia, antropologia ou psicologia também têm sido apresentadas. As explicações simplistas e moralizadores de-vem ser evitadas: os romanos não podem ser mostrados como mais maus ou mais cruéis do que os humanos modernos. Um estudioso sugeriu que os jogos enfatizavam o renas-cimento social do gladiador pária por meio do exercício de qualidades romanas louváveis (habilidade marcial, resistência, coragem e masculinidade). Outro os entendia como ali-mento para uma profunda necessidade emocional, através do qual os romanos afastavam o desespero. No entanto, outro sugeriu, ainda, que os jogos eram meros rituais, pelos quais as forças potencialmente causadoras de distúrbios na sociedade eram aproveitadas e encenadas em um ambiente controlado por períodos limitados. Uma idéia muito recente tem sido a de equiparar os jogos gladiatoriais aos fenômenos culturais comparáveis aos de sacrifícios humanos em massa. Parece-nos, contudo, que os jogos eram simplesmente divertimento pois, haja visto que em nossa própria cultura de entretenimento de massa o espetáculo violento e os jogos gladiatoriais não parecem tão estranhos ente si.

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Capítulo 42O PAGANISMO ROMANO

As religiões dominantes da era moderna são religiões éticas, dotadas de fibra mora, dogmas e ensinamentos. Elas são muitas vezes religiões do livro. Os antigos deuses romanos não estavam realmente preocupados com ques-tões morais e questões éticas.

Os deuses pagãos, em última análise, eram os responsáveis pelas forças da na-tureza (vento, sol, tempestades, terremotos, crescimento, etc). Eles também eram asso-ciados com os esforços humanos (nascimento, guerra, sementeiras, colheitas, etc). Em suma, os deuses podiam exercer influência sobre o resultado de qualquer processo que fosse arriscado, incerto, ou incompreensível. Os romanos, portanto, tinham vários deuses, cada um com sua própria província ou conjunto de províncias.

Além das divindades familiares tais como Júpiter (o céu), Vênus (sexo), Netuno (o mar, terremotos e cavalos), ou Marte (guerra), os romanos reconheciam a existência de milhares de divindades menores com esferas mais específicas de influência: Consus (grãos armazenados), Flora (frutas e culturas), e assim por diante. Dentre a gama dos deuses acreditados pelos romanos há de se citar, ainda, o deus Janus de duas faces e o deus Robigus responsável pelo mofo e pela ferrugem.

Árvore genealógica das divindades romanas

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Os deuses romanos eram antropomórficos e estavam sujeitos a toda a gama de emoções humanas: luxúria, ira, engano, arrogância, felicidade, e assim por diante.

Eles poderiam ser vistos ocupando lugares específicos (Jupiter Capitolino, Apollo Palatinus, etc.). Acima de tudo, os deuses exigiam dos humanos reconhecimento e res-peito. Uns demonstravam reconhecimento pela construção para eles de templos e san-tuários, enquanto outro exigia respeito pelo estabelecimento de um rito para o seu culto regular. Já outro exigia sua consulta antes de se embarcar em qualquer empreendimento que envolvesse a sua província. As divindades importantes poderiam ter dias reservados para a sua adoração por uma comunidade como um todo; estes eram os festivais religio-

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sos pagãos.O animismo era, também, uma característica da crença religiosa romana. Como

herdeiros de uma polêmica judaico-cristã contra o paganismo, somos inclinados a zombar de tal sistema de crença como bobo e ridículo. Na verdade, o paganismo era um sistema religioso válido e vital que, durante milênios, ajudou a dar sentido a um mundo caprichoso.

A adoração dos deuses romanos era feita através da prática de um ritual correto, destinado a aplacar as divindades potencialmente hostis, ou buscar o favor daquelas ou-tras potencialmente amigáveis e queridas, para manter a deorum pax, isto é, a paz com os Deuses. Uma vez feito isso, aliviava-se um desagrado divino quando tivesse sido consti-tuído, ou o eliminava antes que surgisse. Esta relação dos romanos com os seus deuses é descrito pelo termo pietas.

Havia três formas de observância ritual. As orações eram, essencialmente, a formu-lação de contratos com as divindades, e que envolviam a seguinte ordem de coisas: pri-meiro invocando a deidade usando o nome e designação correta; depois afirmando a sua solicitação (citando precedentes, se possível); e, finalmente, declarando sua participação no negócio, fazendo promessas para que a solicitação fosse totalmente atendida, e que seria paga quando o deus fizesse a sua parte.

O sacrifício de animais ou plantas, aparentemente, teve suas origens na noção de se alimentar os deuses com as forças da vida. O sacrifício, também, era resguardado por rigorosas observâncias rituais e seguia fórmulas específicas.

O cometimento de um erro em uma oração ou ritual exigiria que ele fosse reiniciado desde o início. Em 176 AC, um erro foi cometido em uma oração durante um festival latino de três dias, e todo o festival teve que ser iniciado novamente.

A adivinhação era procurada para se determinar a disposição dos deuses para qual-quer empreendimento num determinado instante; ele não estaria vendo o futuro. A adivi-nhação tomou várias formas, sendo as mais comuns o augurio (observação dos pássaros) e o haruspicy (o exame das entranhas de vítimas sacrificadas, especialmente o fígado).

Aliada à adivinhação estava a leitura dos sinais dos deuses (prodigia), geralmente ocorrências não naturais ou invulgares.

O favor ou o desfavor dos deuses, e também o sucesso da oração ou ritual, era ma-nifestado no resultado dos próprios esforços. A falha em qualquer empreendimento nor-malmente implicava na busca de explicações religiosas, bem como razoáveis explicações

O desrespeito aos preparativos religiosos antes de se embarcar em um empreen-dimento era um convite ao desastre. Portanto, a religião romana serviu para reforçar a legitimidade do sucesso e confirmar a falha dos vencidos.

O “staff” do chefe religioso da religião romana era proveniente do mesmo estoque dos políticos e generais. Não havia separação entre os negócios religiosos e o Estado. Os quatro principais colégios de sacerdotes em Roma eram gerenciados por senadores, especialmente patrícios. O colégio mais prestigiado era o pontificado, cujo presidente era o sumo sacerdote (pontifex maximus) de Roma; os pontífices mantinham registros de prodigia e, quando eles se revelavam inadequados, consultavam os Livros Sibilinos. Por conseguinte, a elite romana fornecia não só os líderes religiosos, como também os políti-cos e os militares da da sociedade. Além disso, os templos e os cultos específicos tinham seus próprios padres e ministros.

A religião do Estado romano era um negócio bastante sóbrio e digno, desde que fosse enfatizada a aparência pública e a prática ritualística, mas era muito tolerante. Os romanos consideravam como superstição um sistema de crenças que lhes parecia sem

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fundamento, excessivamente emocional, ou fanático. Eles também menosprezavam a mágica, embora ela fosse muito popular entre as massas. A observância da religião, tanto quanto o cumprimento dos cultos estatais deveriam mostrar-se serenos, antigos, tradicio-nais, e dignos.

Dada à sua natureza, a religião romana era acumulativa e tendia a absorver, ao invés de acabar com novas deidades e cultos que ela encontrasse. Em todo o império, os romanos adotaram e adaptaram os cultos que encontraram. O processo é chamado de Interpretatio Romana, e ela viu deuses nativos serem equiparados com as divindades romanas, como Minerva e Sulis na Inglaterra. Os romanos, contudo, ocasionalmente, su-primiam cultos por razões políticas ou sociais. Eles tiveram uma visão negativa do cristia-nismo quando ele surgiu no início do Século I DC.

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Capítulo 43O SURGIMENTO DO CRISTIANISMO

Por volta do final do Século II, em torno de 200 DC, o cristianismo era uma religião minoritária por todos os meios, mas foi bem estabelecida em vários centros urbanos em todo o Império Romano.

Entre os romanos educados, os éticos eram mais guiados pela filosofia do que pelas religiões, como no cristianismo. Na ausência de um elemento fortemente ético em sua religião, os romanos olhavam para a filosofia para vislumbrar suas regras de vida. As principais escolas de filosofia eram todas provenientes do mundo grego, e elas diferiam significativamente no que elas recomendavam como o melhor modo de comportamento.

Mesmo se o Judaísmo do Segundo Templo tivesse sido altamente ritualístico como seus circundantes cultos pagãos, o judaísmo continha um forte componente ético. Embora os romanos considerassem as crenças judaicas como um pouco bobas, eles, no entanto, cortejaram o favor do deus judaico através dos sacerdotes de seu templo em Jerusalém.

Houve alguma perseguição mas, de um modo geral, Roma era tolerante com o ju-daísmo como um outro dos principais sistemas de crença da parte oriental de seu império. Eles podem ter tido uma pequena idéia de que a partir deste grupo religioso, ao invés de ser marginalizado, ele iria surgir como um novo sistema de crença que iria acabar, ativa-mente, com a adoração dos deuses antigos.

A vida histórica de Jesus, dada às suas fontes, é praticamente impossível de ser re-construída. Os evangelhos não são biografias ou histórias de Jesus, mas sim declarações de uma crença religiosa escritas por cristãos para os cristãos; outras fontes existentes são igualmente pouco confiáveis (por exemplo, a de Josephus). Apesar de muitas tentativas modernas para fazê-lo, a reconstrução do histórico Jesus não é realmente possível. No entanto, não há dúvidas de que ele existiu e ensinou na Palestina, fundando um novo mo-vimento religioso no processo. Mas a grande maioria de seu mundo contemporâneo não tomou conhecimento de tal fato.

O maior período de crescimento do cristianismo esteve contido nos segundo e ter-ceiro séculos DC, apesar das ocasionais perseguições por parte das autoridades pagãs. No primeiro século, o cristianismo teve de superar uma grave disputa interna, antes de se espalhar por todo o Mediterrâneo. A vitória de Paulo em uma disputa com Pedro ajudou a definir o cristianismo em sua missão de proselitismo. Pedro queria converter-se judeu antes de se tornar cristão; Paulo discordou, ganhou, e começou a estabelecer comunida-des cristãs ao redor do Mediterrâneo. Até o final do Século II, o cristianismo, embora uma religião minoritária, foi estabelecida em muitas cidades do oriente e muito pouco nas do ocidente.

As perseguições romanas ao cristianismo eram esporádicas, e regionais, e não geradas pela intolerância religiosa pura, mas pelas consequências práticas das crenças cristãs. Os romanos agiram contra outras crenças religiosas que ameaçavam a ordem política (druidismo) ou social (ritos de Baco). Os romanos consideravam o cristianismo subversivo devido ao entendimento de que a recusa dos cristãos em reconhecer seus deuses ameaçava a deorum pax.

As reuniões secretas cristãs à noite pareciam suspeitas. Havia rumores de caniba-lismo (comer carne e beber sangue).

As perseguições romanas de cristãos eram ocasionais, menos motivadas pelo co-ração do que pelas razões políticas. Nero foi quem primeiro começou a perseguição aos

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cristãos, na sequência do grande incêndio de Roma em 64 DC. Após isso, o cristianismo foi proscrito, mas em grande parte deixado sozinho até o Século III DC. Quando os impe-radores romanos enfrentaram tempos de incerteza e procuraram justificar seus regimes frágeis por apelos à legitimação divina, os cristãos ficaram “sob fogos”, sob Décio em 249 DC.

Aquela perseguição durou cerca de 12 anos e foi destinada a manter a deorum pax. A reorganização do Império Romano e o restabelecimento da ordem (que será abordada no próximo capítulo) viu a “Grande Perseguição”, sob Diocleciano, ser iniciada novamente por razões políticas e com duração de 299 a 311 DC. Todas estas perseguições pagãs aos cristãos empalideceram em insignificância se comparadas à perseguição sustentada e sistemática estabelecida pelos cristãos vitoriosos contra ambos pagãos e hereges dentro de suas fileiras.

O sucesso do cristianismo deveu-se a muitos fatores simultâneos, incluindo o au-mento da religiosidade no Império Romano nos segundo e terceiro séculos DC. Estes sé-culos têm sido chamados de a “Era da Ansiedade” por um estudioso; as pessoas estavam olhando para novas formas religiosas para obter conforto em um mundo incerto. A mágica, a superstição, e os oráculos, tudo explodiu em termos de popularidade. A clara manifesta-ção dessa ansiedade está na grande popularidade das religiões misteriosas orientais que criaram os iniciados em um contrato próximo com a divindade (por exemplo, Isis, Mithras, etc.).

Estas religiões eram exclusivas e prometiam grandes recompensas, mas também cobravam pela iniciação. O cristianismo ofereceu mais do que a filosofia ou as religiões de mistério.

O humanismo filosófico exigia uma educação filosófica para ser compreendido, en-quanto o cristianismo não. As religiões de mistério eram caras, enquanto o cristianismo era gratúito.

O cristianismo aceitou “todos os cantos”. Suas doutrinas prometiam um eterno e futuro socorro em troca de um sofrimento presente temporário. A igreja estava bem or-ganizada em células (igrejas), sob a direão de bispos e diáconos locais. Por volta de 300 DC, no entanto, os cristãos compreendiam apenas um punhado da população; no entanto, eles estavam bem estabelecidos, bem organizados e dedicados. O Século IV iria levá-los ao triunfo.

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Capítulo 44A RESTAURAÇÃO DA ORDEM

Pretende-se aqui cobrir o período notável que se estende desde 270 DC até 306 DC ou melhor, o início do Século IV DC, que viu a restauração da ordem no Estado romano. De fato, foi sob o imperador Diocleciano, que basi-camente o Império Romano viu-se restaurado e reinventado numa base inteiramente nova.

A restauração da ordem foi iniciada em 268 DC com Claudio II Gothicus e acelerada sob Aureliano em 270 DC.. Claudio II conseguiu repelir os godos que saqueavam cidades do império para o outro lado do rio Danúbio. Mas Claudio, que era um oficial do Exército da Ilíria, adoeceu e morreu com apenas dois anos de seu reinado.

Aureliano, um homem de ação, reunificou o Império em 270 a 275 DC. Também sendo um oficial do Exército da Ilíria, Aureliano foi declarado imperador após a morte de Cláudio.

Apelidado de manu ad ferrum (mão de ferro), Aureliano era um soldado profissional, cujo reinado foi um turbilhão de ações. Em 271 DC, ele visitou Roma e iniciou a construção das pesadas muralhas que ainda estão de pé, perfazendo um circuito de 12 milhas, com 18 portões e numerosas torres.

Em 272 a 273 DC, Aureliano virou-se contra Palmyra. Depois de campanhas reali-zadas através da Ásia Menor e do Egito, ele fez uma marcha ousada através de 80 milhas em deserto aberto, carregando todas as necessidades do seu exército com ele, e cercou Palmyra. Após sua queda, Palmyra foi poupada de uma destruição completa por ordem de Aureliano. A Rainha Zenobia foi capturada e enviada para Roma, onde, após uma cami-nhada no Triunfo de Aureliano em 274 DC, ela se casou com um senador e viveu seus dias em Tibur (Tivoli), perto de Roma. Quando Aureliano estava retornando para o Ocidente, no entanto, ele soube que Plamyra havia se revoltado e, então, ele voltou e destruiu o lugar totalmente.

Fig 17 – Em 273 DC, Aureliano retoma a Palmyra (a Síria atual) para o Império.

Em seguida a seus sucessos no oriente, Aureliano foi saudado como Restitutor Orientis (Restaurador do Oriente) em suas moedas, e voltou as suas atenções para o Império das províncias gálicas no Ocidente. Uma grande batalha sobre o rio Marne em 274 DC viu Aureliano sair vitorioso. As moedas de Aureliano, agora, o saudaram como

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Restitutor Orbis (Restaurador do Mundo).A morte de Aureliano foi ridícula e emblemática dada à instabilidade da sua idade.

Uma secretária que se sentia ameaçada pela ira de Aureliano forjou a colocação de uma listagem de morte aos oficiais do exército na mão do imperador e revelou o fato aos ofi-ciais.

Sentindo-se condenados, os oficiais assassinaram Aureliano em 275 DC. O idoso senador Tácito governou por apenas seis meses, e foi sucedido por Probus em 276 DC. Probus acabou o trabalho de Aureliano; ele repeliu as invasões bárbaras e fortaleceu as defesas de fronteira do império, mas ele se tornou impopular com as tropas devido aos seus padrões disciplinares rígidos. Os soldados, eventualmente cansados de seus proje-tos de tempo de paz, revoltaram-se, e o mataram em 282 DC.

Uma guerra civil se seguiu à morte de Probus, e o império parecia estar condenado a mais anos de caos. Diocleciano, outro oficial da Ilíria, tornou-se imperador em 284 DC; derrotou os seus adversários, e começou o trabalho de consolidação dos ganhos de Aure-liano e de Probo. Ele estabeleceu o império em novas bases com reformas profundas e foi, também, o primeiro e único imperador a resolver o problema da sucessão metodicamente.

Diocleciano reformou o Principado no Dominato, um abertamente autocrático regi-me militar, com legitimação divina. Sob Diocleciano, o imperador tornou-se a fonte aberta de toda a autoridade, e o ritual da corte imperial tornou-se embutida de pompa e de um cerimonial muito elaborado. Diocleciano era o representante terreno dos deuses, espe-cialmente Júpiter e Hércules, cujas adorações, agora se tornaram os grandes cultos da lealdade imperial. Os cristãos, que se recusaram a participar nesses cultos, foram perse-guidos com uma ferocidade aumentada, durante a “Grande Perseguição”.

Diocleciano estabeleceu a economia e a administração do império em pé de guerra permanente, dividindo as antigas províncias em muitas unidades menores, para facilitar a cobrança de impostos e a emissão de um decreto de preço máximo para manter a infla-ção em baixa. Ele centralizou a organização do Estado romano. Ele reformou o exército, dando uma maior ênfase à cavalaria sobre a infantaria e estabelecendo forças de ataque móveis em pontos estratégicos, perto das fronteiras para enfrentar as incursões bárbaras e persas.

O passo mais revolucionário de Diocleciano, no entanto, foi a divisão e a localização do poder imperial, com o estabelecimento da Tetrarquia, um governo com quatro príncipes. Diocleciano aprendeu muito sobre segurança com os sucessos das jurisdições regionais de Palmyra e do Império das Províncias Gálicas, e ele nomeou seu general-chefe, Maxi-miano, como seu co-imperador. Maximiano, no entanto, teve a sua autoridade limitada ao ocidente, enquanto Diocleciano permaneceu focado no oriente.

Por volta de 290 DC, ficou claro que este sistema tinha sido um sucesso e, por isso, Diocleciano deu um passo adiante. Ele nomeou a si mesmo e a Maximiano como Augusti e nomeou abaixo deles dois imperadores júnior, ou Caesari. Estes césares eram hábeis oficiais do exército: Galerius no oriente sob Diocleciano e Constâncio no ocidente sob Maximiano.

Na Tetrarquia, os césares — não consanguíneos relativos ao Augusti, mas ligados a ele por casamento e adoção — sucederiam o Augusti e então designariam dois césares como substitutos, e assim por diante. A Tetraquia foi a primeira tentativa de um imperador para resolver, de frente, o problema de sucessão. Em termos de ideologia imperial, a Te-trarquia governou como um grupo unido, emitindo decretos em nome de todos os quatro, cada um celebrando os Triunfos dos membros individuais, e assim por diante.

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Uma antiga estátua dos Tetrarcas na Praça de São Marcos, em Veneza, capta per-feitamente o tom do sistema.

Diocleciano criou um sistema estável, mas era um império sob cerco, e a Tetrarquia falhou totalmente. O império de Diocleciano e dos imperadores subsequentes durou dois séculos, mas ficou sob constante pressão, interna e externa. Este Império Romano era um lugar mais obscuro, mais pesadamente tributado, centralmente mais controlado e inteira-mente a serviço do exército, como agente garantidor da sua existência e, na sua cabeça, encontravam-se os distantes, absolutos, e divinamente mandatados monarcas. O Império tardio, a ser examinado mais de perto no próximo capítulo, era um lugar muito diferente daquele de Augusto ou de Adriano. Confiantes nas virtudes do sistema tetrárquico, Dio-cleciano, tornou-se o primeiro imperador romano a se aposentar voluntariamente em 305 DC em um palácio-fortaleza em Split, na Croácia. Ele forçou o co-imperador Maximiano a fazer o mesmo, de modo que o césares Galério e Constâncio subissem como Augusti.

O problema era que Maximiano aposentou-se a seu contragosto, e seu filho, Ma-xentius, sentiu-se desenganado do poder pelo sistema tetrárquico. Em 306 DC, Maxentius conquistou Roma e declarou-se Augustus, com o apoio de Maximiano. Na distante Bre-tanha, Constâncio também tinha morrido em 306 DC, e seu filho natural, Constantino, foi declarado Augustus pelas tropas.

Portanto, em 306 DC, havia quatro homens que reivindicavam o título de Augustus: os dois legítimo ex césares (Flávio Severo e Galério) e dois usurpadores, Maxentius e Constantino. Assim revelou-se a falha fatal da Tetrarquia como um sistema de sucessão: seria necessário que os romanos ignorassem, completamente, as lealdades familiares.

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Capítulo 45CONSTANTINO E O FINAL DO IMPÉRIO ROMANO

Constantino, o Grande, foi, sem dúvida, um dos mais importantes de todos os imperadores romanos, e algu-mas das suas reformas e, particularmente, sua conversão ao cristianismo, definiram o cenário para grande parte da história europeia subsequente.

Constantino estabeleceu um padrão para o governo do final do Império através de uma complexa e prolongada guerra civil contra três rivais, finalmente consolidando seu governo em 326 DC. Ele também realizou diversas reformas notáveis e continuou a utilizar e expandiu a prática de recrutar germanos para o exército.

Claudius II Gothicus havia derrotado os Godos, mas ele recrutou alguns deles em seu exército, uma prática que foi seguida por Probus. Constantino, então, intensificou este processo e fê-lo com mais regularidade. Ele promoveu a cavalaria ainda mais acima da infantaria do exército romano, rebaixando as velhas legiões a pouco mais do que a guar-das de fronteira. Ele continuou a erodir o papel do antigo Senado e a todos, mas aboliu a distinção entre senador e equestre, criando escritórios abertos a ambos.

A burocracia imperial aumentou consideravelmente; uma série de funcionários ago-ra ficava interposta entre os comuns e o imperador. Entre 324 e 330 DC, Constantino fun-dou uma segunda capital no local da cidade grega de Bizâncio, então renomeada Cons-tantinopla. Diocleciano tinha construído sua casa entre os Nicomedians na Ásia e, por isso, houve um precedente parcial paraas ações de Constantino.

Fig 18 – As reformas de Constantino definiram o cenário para a maior parte posterior da his-tória romana e europeia.

No entanto, a criação de uma nova e oficial capital do império gerou um grande movimento que pleiteava a eventual divisão do império em metades oriental e ocidental, cada uma com seu próprio imperador.

Constantino começou o processo de institucionalização do cristianismo como reli-gião oficial do Império romano, mas que já tinha várias e sérias ramificações tanto para o Império como para a própria Igreja. Ao contrário da crença popular, Constantino não fez do cristianismo a religião oficial do Estado romano. O que ele relmente fez foi descriminalizá--la e favorecer o seu lado pessoal acima dos outros cultos. Então, em 313 DC, por meio do Édito de Milão, ele tornou a fé religiosa livre e aberta, liberando os cristãos de séculos de desconfiança. Ele deu terra e dinheiro para a igreja para construir locais de culto e se

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estabelecer.A conversão de Constantino ao cristianismo tem sido objeto de muita especulação

por antigos e modernos, igualmente. Alguns o vêem como uma genuína conversão reli-giosa, como conta a lenda de sua conversão reveladora na véspera da Batalha da Ponte Mílvia em 312 DC. Outros vêem nele um movimento político cínico, para angariar apoio para si mesmo, a partir de todos os meios disponíveis em face de um futuro incerto.

As evidências ficam a favor do último ponto de vista, uma vez que Constantino fez coisas decididamente não-cristãs: ele manteve cultos pagãos; ele se permitiu ser retratado como um deus pagão em suas moedas; e seus monumentos funcionais exaltam as virtu-des do Sol Invictus, Júpiter, Hércules, e outros deuses tradicionais.

Constantino finalmente foi batizado em seu leito de morte, época em que ele tinha ajudado a movimentar o cristianismo desde as suas fringias até o centro principal da prá-tica religiosa romana.

Um dos mais influentes atos de Constantino foi o de interferir em disputas dogmá-ticas cristãs e apoiar a noção da ortodoxia doutrinária. A igreja primitiva era, na verdade, uma série de igrejas que realizavam disputas doutrinárias entre si. Com a nova parceria entre a Igreja e o Estado, tal diversidade de opinião não poderia ser tolerada; as heresias tiveram de ser eliminadas.

Em 317 DC, Constantino enviou tropas para lidar com os hereges Donatist em Car-tago, o que resultou em banimentos e até mesmo execuções; a perseguição ativa dos Donatists continuou até que foi abandonada como mal sucedida em 321 DC. Em 325 DC, Constantino convocou o Concílio de Nicéia, onde cerca de 300 bispos formularam os ele-mentos cardeais do “bem pensamento” do cristianismo, criando uma ortodoxia dogmática que ainda permanece parada no coração do catolicismo romano. No momento em que Constantino morreu em 337 DC, no entanto, o cristianismo não era mais unido doutrinaria-mente, e as heresias floresceram em várias partes do império.

Quando os imperadores subsequentes enfrentaram uma espiral crescente de di-ficuldades, foram realizados inúmeros e diferentes esforços para aliviá-los. Teodósio, o Grande (379 a 395 DC) finalmente dividiu o império em duas metades, oficialmente, em face da continuação dos riscos para a segurança do Império. As incursões bárbaras e persas continuaram no Século IV DC, de modo que alguns imperadores ficaram felizes em governarem sozinhos.

No ano 378 DC, o imperador Valens foi morto junto com seu exército pelos Godos em Adrianópolis, na Trácia. Seu sucessor, Teodósio, finalmente tornou oficial aquilo que tinha sido um arranjo de fato, por algum tempo, quando, em seu testamento, ele dividiu o Império Romano em metades orientais e ocidentais, com os governantes separados um do outro. Infelizmente, os imperadores orientais e ocidentais subsequentes raramente se deram bem e às vezes discutiram sobre os territórios fronteiriços.

Nem o oriente, nem o ocidente puderam resistir à chegada final na Europa dos hunos porcedentes da Ásia, que a dominaram até a morte de seu rei Átila, em 454 DC.

A “barbarização” foi o processo pelo qual os líderes e os povos germânicos vie-ram a desempenhar papéis mais importantes e centrais na vida do império. Enquanto os exércitos romanos ficaram mais fracos em face dos ataques bárbaros mais fortes e mais freqüentes, as autoridades (especialmente no ocidente) estavam inclinados a contratar godos e outros bárbaros para lutar por eles e/ou assentar os potenciais invasores dentro do próprio império.

Mais e mais os alemães se estabeleceram no império em seus próprios termos, não

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absorvendo os costumes romanos, mas vivendo tribalmente dentro do império. Os líderes germânicos também se tornaram mais poderosos na corte, como Stilicho, um formidavel general de Teodósio e Honório, ou Ricimer, que fez quatro imperadores.

Por volta do Século V, alguns imperadores eram meros fantoches de seus con-selheiros militares germânicos. A barbarização também se manifestava no declínio das cidades, a espinha dorsal da civilização romana. A história do falecido império era, então, um obscuro e bastante deprimente quadro. As cidades diminuiram em importância e ex-tensão, e os aristocratas se mudaram para enormes moradias na zona rural.

Ao longo de tudo isso, as disputas religiosas continuaram ininterruptamente nos quarto e quinto séculos DC As autoridades cristãs cada vez mais se empenharam em destruir os cultos pagãos tradicionais. O último imperador pagão de Roma foi Juliano (360 a 363 DC), que tentou reverter os avanços feitos pelo cristianismo. Depois dele, todos os imperadores foram cristãos. Teodósio atacou agressivamente os cultos pagãos e emitiu decretos de intolerância contra eles.

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Capítulo 46PENSAMENTOS SOBRE A “QUEDA” DO IMPÉRIO ROMANO

As fortunas de ambas as metades do império começaram a divergir consideravelmente. A divisão foi levada a cabo para aumentar a segurança do império como um todo. ... Infelizmente, no curso do Século V, esses Estados mostraram-se mutuamente suspeitos e muitas vezes discutiram sobre vários territórios fronteiriços.

O último ato da história do Império romano foi uma série de catástrofes militares. Após a divisão do império em 395 DC, as fortunas das duas metades começaram a di-vergir. Embora realizada para garantir a segurança de ambas as metades, a divisão do império criou dois estados mutuamente suspeitos que, muitas vezes, discutiram sobre os territórios fronteiriços. O oriente permaneceu forte, enquanto o ocidente tornou-se cada vez mais fraco.

Uma sucessão de crianças imperadoras no ocidente, governaram sob o sofrimento de conselheiros militares germânicos (chamado Mestres dos Soldados), terminou em 476 DC, quando o último imperador, Rômulo Augusto, foi deposto e substituído pelo chefe alemão Odoacro. Durante todo esse período, a barbarização continuou e se intensificou, quando tribos germânicas mais e mais (incluindo os Vândalos) mudaram-se para o territó-rio imperial e lá se estabeleceram, muitas vezes com o consentimento do imperador

A carreira de Alarico ilustra os problemas enfrentados pelo ocidente ao longo destes anos. Alarico e seus Visigodos começaram a invadir o império em uma base anual em 396 DC. Os imperadores orientais o subornavam com dinheiro. As vitórias romanas sobre ele em 402 e 403 DC não foram seguidas, e Alarico retornava a cada verão, exigindo seus pagamentos em troca de não praticar nenhum dano.

Por volta de 408 DC, Alarico tinha se assentado nos Balcãs, e ele, então, virou-se para ocidente depois de o império oriental tê-lo pago. Em 409, DC, ele invadiu a Itália, exigindo seu resgate, e foi pago e nomeado Mestre dos Soldados na tentativa feita pelos romanos para trazê-lo para o seu rebanho. Em 410 DC, Alarico cansou da política imperial e soltou seu Godos em Roma por três dias, devastando a cidade pela primeira vez em 800 anos.

A questão do por que Roma caiu, tem sido um dos grandes problemas da história por 500 anos. Tal questão tem gerado inúmeras explicações com diferentes graus de força de convicção. Várias explicações gerais amplas têm sido apresentadas. A noção de au-mento da decadência é popular, mas não é apoiada pelas evidências.

A noção de que o Cristianismo enfraqueceu o império também não vinga, já que o oriente era mais devoto do que o ocidente, mas não caiu.

Uma análise da guerra de classes marxista, bem como a idéia de uma degeneração popular da cultura das elites, são totalmente sem fundamento. De fato, qualquer explica-ção que sobreponha preconceitos modernos às condições antigas (como as teorias de miscigenação racial da eugenia do início do Século XX) é, em grande parte, um disparate.

Explicações gerais específicas também têm sido propostas. As explicações por eventos catastróficos — alterações climáticas, envenenamento por chumbo, esgotamento ecológico, ou despovoamento maciço — têm pouco apoio entre os historiadores moder-nos, apesar de dar ampla publicidade nos meios de comunicação. O aumento da corrup-ção no final do império foi posto como uma causa geral para a queda do império, mas não pode ser provado, especificamente, como uma razão convincente para o colapso havido. As invasões germânicas têm sido responsabilizadas a título definitivo para o colapso do

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ocidente, mas o problema da sobrevivência do império oriental torna as invasões sozinhas insuficientes para explicar a queda.

A seguir, são, mostradas explicações não genéricas e complexas. A tese do império dividido compreende várias formas de divisão no seio do império (cristãos contra pagãos, ricos contra pobres, elevados em relação a humildes, bárbaros contra romanos, etc.) que rasgariam o próprio império em pedaços. O argumento da invasão bárbara, uma vez que é uma explicação geral específica, foi alargada em uma abordagem de análise de sistemas, que vê as incursões bárbaras e as fraquezas internas se alimentando umas às outras, numa espécie de retroalimentação positiva que levou ao colapso.

A explicação para a queda provavelmente deve ser buscada em uma base tão am-pla quanto possível. Uma escola de pensamento em voga, a escola transformacionista, nega a queda completamente, e salienta as continuidades entre o Império Romano tardio e a Europa medieval. É uma abordagem interessante, com muito para oferecer, mas ain-da é difícil de se aceitar, posto que ninguém percebeu o fim da governação romana no ocidente.

Eventos complexos têm razões complexas, e a mais ampla abordagem possível é a mais sábia. Em geral, há de se preferir a aliança com a escola da explicação complexa. Uma abordagem muito ampla é a melhor, de modo que a análise de sistemas oferece o melhor caminho a seguir.

O maior problema existente na queda de Roma reside na explicação do por que o império oriental sobreviveu e o ocidental não. Alguns dos argumentos são de que o oriente tinha fronteiras mais defensáveis; as tropas orientais dependiams menos das tro-pas germânicas e de seus assessores militares; o oriente tinha uma população maior, os impostos eram menos opressivos; havia mais dinheiro; e Constantinopla era praticamente inexpugnável.

Os principais inimigos do oriente, os Persas, eram uma sociedade coesa com os seus próprios problemas internos e poderiam ser tratados com mais facilidade do que as tribos germânicas não urbanizadas que faziam frente com o ocidente. Em última análise, foi o Império Romano do Oriente, que sobreviveu como o Império Bizantino por mais de 1.000 anos e atuou como o principal veículo para a preservação da antiga cultura Mediter-rânea para a era moderna. E mesmo até o fim, as pessoas do reino bizantino se chama-vam romaios (romanos).

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APÊNDICE 1CRONOLOGIA

AC

c. 1200 .............................................Guerra de Tróia; Enéias chega na Itália.c. 1000 .............................................Assentamento no Palatino..c. 800 ...............................................Cabanas no Palatino e no Forum.753................................................... Data tradicional da fndação de Roma por Rô-

mulo e Remo.753–509........................................... Período do Reinado.c. 600 ............................................... Construção da Grande fossa (Cloaca Maxima);

a região do Forum é drenada.510–509........................................... Expulsão de Tarquinius Superbus; estabeleci-

mento da República romana. 509................................................... Primeiro tratado com Cartago.509–31............................................. Período republicano.500–440........................................... Incursões dos Aequi e dos Volsci.494................................................... Primeira Secessão da Plebe.493................................................... Tratado de Cassius entre os romanos e os la-

tinos.449...................................................Secessão dos plebeus; publicação da Lei da

Doze Tábuas.396................................................... Os romanos capturam a cidade estrusca dos

Veii.390 .................................................. Batalha de Allia: Roma é saqueada pelos Gau-

leses.367................................................... Leis de Licinio; os plebeus são admitidos na

magistratura.348...................................................O tratado com Cartago e renovado.343–41............................................. Primeira Guerra Samnita.340–338........................................... Revolta da Liga Latina.326–304........................................... Segunda Guerra Samnita.321................................................... Humilhação romana em Caudine Forks.306................................................... Terceiro tratado com Cartago.298–290........................................... Terceira Guerra Samnita.295................................................... Batalha de Sentinum.287 .................................................. Lei Hortênsia (lex Hortensia): plebiscita de to-

dos os cidadãos.281–275........................................... Invasão de Pirro do Épiro.280................................................... Batalha de Heraclea.279................................................... Batalha de Asculum.275................................................... Batalha de Beneventum.273................................................... Amizade estabelecida com o reino Ptolemaico

do Egito.264–241........................................... Primeira Guerra Púnica.

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262................................................... Os romanos atacam Agrigentum com suceso.260................................................... Vitória naval romana em Mylae.255................................................... Força romana na África é destruída; a frota é

destruída por uma tempestade. 241................................................... Batalha das Ilhas Aegates; A Sicília torna-se a

primeira província romana.241–220........................................... Conquista cartaginesa da Espanha pela família

Barca.229................................................... Estabelecido o protetorado romano sobre a

Illyria.c. 226 ............................................... Tratado de Ebro ; segue-se ou precede a ami-

zade com Saguntum?220................................................... A Gallia Cisalpina passa a ser província roma-

na.219–202........................................... Segunda Guerra Púnica; invasão da Itália por

Aníbal.218................................................... Batalha de Trebia.217................................................... Batalha do Lago Trasimene.216................................................... Batalha de Cannae.215................................................... Filipe V da Macedônia se alia a Aníbal e a Car-

tago.215–204........................................... Primeira Guerra Macedônia.209................................................... Forças cartaginesas na Espanha são derrota-

das.207................................................... Batalha do Rio Metaurus.203................................................... Aníbal deix a Itália.202................................................... Batalha de Zama.200–196........................................... Segunda Guerra Macedônia; os macedônios

são barrados do mar Egeu.197–133........................................... Guerras romanas na Espanha.196...................................................São formadas 2 províncias na Espanha (Ulterior

e Citerior).192–189...........................................Guerra contra Antiochus III da Síria.189................................................... Batalha de Magnesia.172–168........................................... Terceira Guerra Macedônia; a Macedônia é di-

vidida em 4 repúblicas.168................................................... Batalha de Pydna; Rhodes é arruinada por de-

creto.149–146........................................... Terceira Guerra Púnica; revolta na Macedônia.147................................................... A Macedônia é transformada em província da

Macedônia.146................................................... Revolta da Liga dos Achaeanos; Corinto é des-

truída; Cartago é destruída.135–133........................................... Principal guerra dos escravos na Sicília. 133...................................................Tribunato de Tiberius Gracchus; Gracchus and

300 são assassinados; Pergamum é assaltada por Roma.129................................................... Pergamum é transformada em uma província,

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na Ásia.123–121........................................... Tribunatos sucessivos de Gaius Gracchus.121................................................... Primeira passagem de senatus consultum ulti-

mum; G. Gracchus and 3000 seguidores são mortos em lutas de rua.121................................................... A Gallia Transalpina (ou Narbonensis) é trans-

formada em província romana..111–105 ........................................... Guerra Jugurthina na Numidia.107................................................... Primeiro consulado de Marius.105................................................... Batalha de Arausio, a Itália vê-se ameaçada

pelos Címbrios e pelos Teutones.105–102........................................... Consulados sucessivos de Marius (#s 2 a 5).102................................................... Batalha de Aquae Sextiae, os Teutones são

derrotados.101................................................... Batalha de Vercellae, os címbrios são derrota-

dos.100................................................... Sexto consulado de Marius; senatus consultum

ultimum é passado.91..................................................... Assassinato do tribuno M. Livius Drusus.91–88............................................... Guerra Social (Itálica); garantina universal da

cidadania para os aliados. 88..................................................... Sulla marcha sobre Roma; Asiatic Vespers.88–84............................................... Primeira Guerra Mithridatica.87..................................................... Marius e Cinna conquistam Rome.87–83............................................... Cinna controla Roma.86..................................................... Sétimo consulado de Marius; Marius morre (Ja-

neiro).85..................................................... Sulla estabelece o Tratado de Dardanus com

Mithridates.83..................................................... Sulla returna para a Itália; guerra civil.83–81............................................... Segunda Guerra Mithridatica.82–81............................................... Os proscritos de Sulla.82–79............................................... Sulla torna-se ditador “para escrever leis e or-

ganizar o Estado”; fortalecimento da posição do Senado. 78..................................................... Morte de Sulla; revolta de M. Aemlius Lepidus;

Pompeu assume o comando77–72............................................... Pompeu luta contra Sertorius na Espanha.74–63............................................... Terceira Guerra Mithridatica.73–71............................................... Revolta dos escravos de Spartacus.71..................................................... Crassus derrota Spartacus; Pompeu retorna da

Espanha.70..................................................... Consulado de Pompeu e Crassus; a restaura-

ção de Sulla é negada.67..................................................... Lei Gabinian (lex Gabinia) confere imperium infi

nitum a Pompeu.66..................................................... Os piratas são esmagados; Lei Manilian(lex

Manilia) dá a Pompeu o comando contra Mithridates.63..................................................... Morte de Mithridates; Pompeu reorganiza o

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oriente; conspiração catilinaria na Itália.62..................................................... Pompeu retorna para a Itália e se aposenta.60..................................................... César, Pompeu e Crassus formam o Primeiro

Triunvirato.59..................................................... Primeiro consulado de César; legislação favo-

rece os triúnviros.58–49............................................... Caesar conquista a Gália..56..................................................... Conferência dos triúnviros em Luca.55..................................................... Pompeu e Crassus são feitos cônsules; A legis-

lação favorece os trúnviros.54..................................................... Morte de Julia, filha de César e mulher de Pom-

peu.53..................................................... Batalha de Carrhae, Crassus é morto ao invadir

a Parthia.49..................................................... César cruza o Rubicão (10 de janeiro; começa

a Guerra Civil; César é eleito ditator por 11 dias.49–45............................................... Guerra Civil entre César e Pompeu.48..................................................... César é cônsul; Batalha de Pharsalus; César

derrota Pompeu; Pompeu é morto no Egito.47..................................................... Caesar suprime a revolta na Asia (Veni, vidi,

vici).47–44............................................... Períodos sucessivos de ditadura de césar.46..................................................... Batalha de Thapsus na Africa; Cato comete o

suicicio em Utica; a ditadura de César é extendida para 10 anos,46–44............................................... Sucessivos consulados de César.45..................................................... Batalha de Munda na Espanha.44..................................................... César é assassinado (15 de março); Octavius é

adotado por Caesar e é nomeado Otaviano; começa o sítio de Mutina.43..................................................... Otaviano derrota Antônio e conquista Roma,

tornando-se cônsul; Otaviano, Antônio e Lépido formam o Segundo Triunvirato (23 de novembro); proscrições e morte de Cicero (7 de dezembro).

42..................................................... Batalhas em Filipos; os triúnviros derrotam os libertadores.

41..................................................... Guerra Perusina na Itália.40..................................................... Paz de Brundisium entre Antônio e Otaviano.37.....................................................O triunvirato é renovado,36..................................................... Derrota de Sextus Pompeius na Sicília; Lépido

é colocado por fora do Triunviradto.34..................................................... As Doações da Alexandria.34–31............................................... Propaganda da guerra entre Antôno e Otavia-

no.33.....................................................O triunvirato decai; segundo cosulado de Ota-

viano.32..................................................... A Itália e o oriente prestam juramento de fideli-

dade a Otaviano.31..................................................... Batalha de Actium; Otaviano derrota Antônio e

Cleopatra.

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31 AC.– 476 DC .........................,.... Período imperial30..................................................... O Egito é anexado como uma rovíncia romana.27 AC – 14 DC ................................ Reinado de Augusto como o primeiro imoerador

romano,27.....................................................Primeiro Assentamento Constitucional (13 de

janeiro).23.....................................................Segundo Assentaento Constitucional.c. 4 ..................................................Nascimento de Jesus de Nazaré.2.......................................................Augusto é nomeado Pater Patriae (Pai da Pá-

tria).

DC14..................................................... Morte de Augusto (19 de agosto).14–37............................................... Imperador Tiberio.14–68............................................... Dinastia Julio-Claudianana.24–31............................................... Ascensão de Sejanus.c. 30 ................................................. Crucificação de Jesus.37–41............................................... Imperador Gaius (Caligula).41..................................................... Gaius (Caligula), o primeiro imoerador a ser

assassinado.41–54............................................... Imperador Claudio.54–68............................................... Imperador Nero.64..................................................... Grande incêndio de Roma; os cristãos são per-

seguidos, pela primeira vez.66–70............................................... Revolta dos judeus na Palestina.68..................................................... Nero é deposto por uma revolta no exército.68–69............................................... Imperador Galba.69..................................................... Guerra Civil; Ano dos Quatro Imperadores:

Galba (janeiro) Otho (janeiro a abril), Vitellius (abril a dezembro); Vespasiano (dezembro).69–79............................................... Imperador Vespasiano.69–96............................................... Dinastia Flaviana.70..................................................... Jerusalem é saqueada, templos são destruí-

dos.73..................................................... Sítio de Masada.79–81............................................... Imperador Titus.81–96............................................... Imperador Domiciano.96–98............................................... Imperador Nerva, o primeiro dos bons impera-

dores.98–117 ............................................. Imperador Trajano.98–180............................................. Dinastia dos Adotivos (por vezes chama de An-

toninos).106................................................... Formalão da província da Dacia.114–117 ........................................... Guerras orientais de Trajano; 3 novas provín-

cias são formadas.117–138 ........................................... Imperador Adriano; abandono das províncias

orientais de Trajano.

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A Roma antiga e seu Poder Militar

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c. 122 ............................................... Tem início a construção das muralhas de Adria-no.

138–161........................................... Imperador Antoninus Pius.c. 150–200 ....................................... Formação gradual das confederações das tri-

bos germânicas.161–169........................................... Imperador Lucio Verus.161–180........................................... Imperador Marco Aurelio (governa sozinho de

169 a 180).180–192........................................... Imperador Commodus; a sucessão adotiva é

abandonada.192................................................... Commodus é assassinado; Imperador Pertinax

(janeiro a março.193–197........................................... Guerra Civil entre Severo, Clodius Albinus, e

Pescennius Niger.193–211 ........................................... Imperador Septimius Severus.193–235........................................... Dinastia Severa.211–212 ........................................... Imperador Geta (assassinado por Caracalla).211–217 ........................................... Imperador Caracalla.217–218........................................... Imperadorr Macrinus.218–222........................................... Imperador Elagabulus.c. 220 ............................................... Emergência dos Sassanidas da Persia no

oriente.222–235........................................... Imperador Severus Alexander.235–238........................................... Imperador Maximinus.235–285........................................... Crise do Terceiro Século; muitos imperadores

e usurpadores.238–244........................................... Imperadores Gordian I, II, III.244–249........................................... Filipe, o Arabe.249–251........................................... Imperadorr Decio.c. 250–260 ....................................... Perseguição dos cristão por Décio e Valeriano.253–260........................................... Imperador Valeriano.253–258........................................... Os Francos invadem a Gália e a Espanha.253–268........................................... Imperador 258................................................... Declaraçao do Império das Províncias Gpalicas

(Imperium Galliarum); Espanha e Bretanha derrotadas pelo novo Estado.265–268........................................... Assalto dos Godos sobre a Asia Menor e Gré-

cia.268–270........................................... Imperador Claudio II Gothicus.269–270........................................... Palmyra controla a Síria, o Egito e partes da

Ásia Menor.270–275........................................... Imperador Aureliano.273................................................... Derrota de Palmyra.274................................................... O Imperium Galliarum é derrotado; o Império

é reintegrado.275................................................... Aureliano é assassinado por seus oficiais.275–276........................................... Imperador Tácito.276–82............................................. Imperaodor Probo.

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282................................................... Probo é assassinado por seus soldados.282–284........................................... Guerra civil.284–305........................................... Imperador Diocleciano; principais reformas; es-

tabelecimento da Tetrarquia.299–311 ........................................... A “Grande Persegyição” dos cristãos, principal-

mente sob o tetrarca Galerius.305................................................... Diocleciano e Maximiano se aposentam.306................................................... Constantino é declarado Augustus pelas tro-

pas; Maxentius conquista Roma; a Tetrarquia falha.306–337........................................... Imperador Constantino, o Grande (governa so-

zinho de 324 a 337).311 ......................................................Galeriano publica o Édito da Tolerância ao

Cristianismo.312................................................... Batalha da Ponte Milvian; visão de Constanti-

no; Constantino ganha o controle da parte ocidental do império.313................................................... O Édito de Milão tolera todas as formas de cul-

tos.314................................................... Conselho dos bispos em Arelate.317–21............................................. Perseguição dos Donatists na África.324................................................... Fundação de Constantinopla.325................................................... Conselho de Nicaea.330................................................... Constantinopla torna-se a nova capital do Imm-

pério romano.337–361........................................... Imperador Constâncio II.361–363........................................... Imperador Juliano, o apóstolo..364–375........................................... Imperador Valenciano.364–378........................................... Imperador Valens (orientet).375–83............................................. Imperador Graciano.378................................................... Batalha de Adrianople, Valens é morto pelos

Godos.379–395........................................... Imperador Teodóosio, o Grande ganha o con-

trole de todo o império.391................................................... Éditos de intolerância contra o paganismo; o

cristianismo é instituído como religião ofiical.395................................................... O Império é oficialmente dividido no testamento

de Teodósio em parte oriental (sob Arcadius) e ocidental (sob Honorius).c. 395–402 ....................................... Alarico e os Visigodos invadem o oriente.395–408........................................... Ascensão de Stilicho.395–423........................................... Imperador Honório (ocidente).c. 400 ............................................... As cidades e o comércio começam a declinar

no ocidente; tribos germânicas assentam-se, em larga escala, na Galia e ao longo da fronteira do Danúbio.

402–410........................................... Alarico vira-se para a Itália.409...................................................Os Vândalos e outros subjugam a Espanha.410................................................... Saque de Roma por Alarico (23 de agosto); a

Bretanha é abandonada.429...................................................Os Vândalos conquistam a África.

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451................................................... Batalha de Chalons; os Hunos são derrotados.451–453........................................... Átila, o Huno, invade o ocidente..453................................................... Morte de Áttila.455...................................................Os Vândalos saqueiam Roma.455–72............................................. Ascensão de Ricimer.475–476........................................... Rômulo Augusto, o último imperador do oci-

dente.476...................................................Data tradicional da Queda do Império Romano.476–493........................................... Odoaro torna-se Rei (Imperador) da Itália.476–1453......................................... O Império do Oriente sobrevive como Império/

Reino Bizantino.

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APÊNDICE 2GLOSSÁRIO DE EXPRESSÕES E TERMOS PERTINENTES À

HISTÓRIA DA ROMA ANTIGA

Acies triplex (formação de batalha tripartite): A formação típica do Exército romano da República, quando atacando.

Aediles: Os aediles originaram-se de um escritório do Estado plebeu e tornaram-se uma magistratura opcional no cursus honorum regular; quatro aediles eram eleitos anual-mente (seis após as reformas introduzidas no âmbito de César), dois plebeus e dois patrí-cios (os dois últimos denominados “edis curule”). Eles eram responsáveis pelas fábricas exixtentes em Roma, peloo mercado, e pelos jogos públicos. Eles não tinham imperium.

Assembléias: Os agrupamentos de cidadãos romanos que se reuniam para reali-zar tarefas específicas.

Augury: A prática da divinização, por diversos meios, tais como olhar o céu, os pássaros ou interpretando presságios. auspices: The reading of the gods’ attitude toward a project by fi ve means, including looking at the sky, birds, the sacred chickens feeding, or the behavior of four-legged beasts. All public business had to have favorable auspices in order to proceed. Since auspices lasted 24 hours, failure to secure favorable auspices on one day could be reversed the next.

Auxiliaries: Elementos do Exército romano composto de não-cidadãos, distintos dos legionários, que eram cidadãos

Barbarização: Termo usado para expressar a crescente presença e proeminência dos povos germânicos no império ocidental durante o Império tardio.

Boni: (“Os homens bons”): A auto-denominação dos senadores conservadores, que denotava um pensamento correto, homens decentes do Senado que respeitavam as for-mas tradicionais de se fazer as coisas.

Bucellarii: Unidades de soldados do final do Império romano e Império bizantino não apoiadas pelo Estado, mas sim por um governador geral ou individual.

Capitecensi (“Cabeças contadas”): A classe social mais baixa no censo do cidadão romano; ela não possuía propriedade a declarar aos censores, e eram contados por suas cabeças, daí o nome. Eles eram agrupados em uma única centúria na comitia centuriata e votavam por último, a menos que a votação fosse parada, quando a maioria de votos fosse alcançada.

Censors: Dois magistrados eleitos a cada cinco anos para um mandato público de 18 meses. Eles contavam os cidadãos, atribuíam-lhes classes e revisavam os registros dos senadores e a situação da moral pública e, também, faziam os contratos de cobrança de impostos e construção de obras públicas. Eles não tinham imperium.

Centurion: O comandante de uma “centúria” de legionários, formada por 100 ho-mens, originalmente, mas que no período imperial era composta por 80 soldados.

Clientela (“clientelismo”): O sistema social que unia famílias de classes altas e bai-xa por laços oriundos da concessão de favores e de cumprimento das obrigações. Origi-nado no período do Reinado.

Cohort: Unidade operacional do Exército romano. A legião possuía 10 cohorts. O termo é também usado nas unidades independentes e auxiliares.

Colônia: Roma começou estabelecedo, inicialmente, colônias de latinos e de cida-dãos, como um meio de garantir territórios. Eventualmente, a “colônia” tornou-se o mais alto status que uma comunidade (se fundada por Roma ou não) poderia atingir, pelo qual

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todos os habitantes do sexo masculino nascidos livres tornavam-se cidadãos romanos.Comitia (“assembléia”): Termo aplicado às assembléias populares romanas convo-

cadas para a votação sobre uma lei. Havia a Assembleia Curiate (comitia (uriata); Assem-bléia Centuriate (comitia centuriata); Assembléia tribal do Povo (comitia populi tributa); e Assembleia Tribal da plebe (comitia plebis tributa) também conhecida como o Conselho da Plebe (plebis concilium). Todas as votações eram feitas em blocos, como adequados para cada assembleía.

Consul: O magistrado romano mais antigo. Eram eleitos dois a um mesmo tempo para o período de um ano de mandato.

Cursus honorum (“ordenamento das funções”): Ordem sequencial obrigatória das funções públicas na Roma republicana, baseada em critérios de riqueza, idade e experi-ência. A ordem de ascensão era questor (ou tribuno da plebe) => edile (opcional) => pretor => cônsul. Os ex-cônsules poderiam também tornar-se censores ou ditadores, e patrícios, ex-cônsules, poderiam ser eleitso como interreges.

Debt-bondage: O sistema arcaico de garantir mão de obra barata para a aristocra-cia latifundiária. Em troca de subsistência, os cidadãos mais pobres se tornavam servos contratados dos latifundiários. Uma das principais questões que geraram a Luta das Or-dens.

Denarius: Moeda de prata, que valia 4 sestertii.Dictator: Magistratura extraordinária instituída em período de crises. Uma ditadura

era instituída por um magistrado e suspendia o governo normal de Roma. O ditador não tinha nenhum colega, mas nomeava um assistente chamado o Mestre de Cavalaria (ma-gister equitum). Ele ocupava o cargo por seis meses ou até que tivesse completado a sua missão específica. Um ditador tinha o imperium combinado dos cônsules suspensos e, porisso, ele tinha direito a 24 lictors.

Diocese: Uma dos doze grandes unidades administrativas em que as províncias eram agrupadas no final do terceiro século, cada uma dirigida por um vicarius dos prae-torian prefects.

Dominate (< dominus, palavra latina correspondente a mestre, senhor): O termo, às vezes, é aplicado ao sistema autocrático de governo fundada por Diocleciano e também para o período de seu funcionamento (284 a 476 DC). O termo é usado principalmente para distingui-lo do Principado, conforme estabelecido por Augusto.

Donatism: Heresia popular praticada na África durantes os quarto e quinto séculos DC Ele disputou o direito dos “traidores”, os cristãos que cumpriram exigências pagãs para a queima das Escrituras durante a “Grande Perseguição” (299 a 311 DC), para serem membros de pleno direito da Igreja.

Donative: Uma distribuição em dinheiro para marcar uma ocasião especial.Duces: Comandantes militares. No final do império os duces assessoravam os go-

vernadores de províncias e, depois das reformas de Diocleciano, os vicarii das dioceses.Editor: Aquele que organizava os espetáculos de gladiadores, às custas pessoais,

para o entretenimento dos plebeus. Epigrafia: O estudo das inscrições originadas do mundo antigo.Equestrian: Membro de uma ordem originalmente relacionada ao serviço da ca-

valaria, ultimamente, eram cidadãos com uma qualificação de propriedade de 400.000 sestércios. Apesar de não serem elegíveis para o senado romano, os membros da ordem (também conhecida como cavaleiros) desempenharam um papel importante na adminis-tração do império no período imperial, e desempenharam certos cargos-chave, como as

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prefeituras do Egito e na Guarda Pretoriana .Excubitors: Um corpo de guarda do palácio, criado pelo imperador Leo, para com-

pensar a influência dos alemães no exército imperial.Facção: Termo aplicado aos grupos politicamente aliados na política senatorial re-

publicana. Foi aplicada mais tarde para as quatro equipes das corridas de bigas (branco, azul, verde, vermelho) e os seus apoiadores.

Fasces: Pacotes de hastes carregadas pelos liteiros (lictors) como marcas de um imperium do magistrado. Fora de Roma era um machado que simbolizava a capacidade do magistrado para ordenar castigos corporais ou capitais.

Fasti: Listas de cônsules anuais mantidos em Roma e outras cidades, geralmente no fórum. Mais tarde, eventos notáveis foram adicionados em seus anos adequados, fa-zendo sobreviver a fasti (na maior parte das cidades italianas) como testemunhas valiosas para os eventos.

Freedman: Um ex-escravo que teve concedida a sua liberdade. Muitas vezes, o liberto ficava no serviço da casa onde ele tinha sido escravo.

Gallia (Gália): O nome romano para o território controlado pelos celtas na Europa Ocidental. Era dividida em duas partes, a Gallia Transalpina (Gália além dos Alpes), que compreende, hoje, a França, Bélgica, partes da Alemanha, Países Baixos e Suíça; e Gália Cisalpina (Gália aquém dos Alpes), situada no Vale do rio Pó, no norte de Itália. Ambas as regiões, eventualmente, passaram ao controle romano.

Gens (plural, gentes): Normalmente traduzido como “clã”, este termo refere-se aos grupos de famílias aristocráticas que parecem ter sua origem no Período do Renado.

Helenismo, Helenização (< “Hellas,” palavra grega para Grécia): O processo pelo qual as características da cultura grega foram adotadas por outra cultura em uma varieda-de de esferas sociais. A helenização de Roma começou cedo, no Século VI AC, no mais tardar, mas aumentou seu ritmo após o contato direto com o continente grego nos segun-do e terceiro séculos AC.

Imperator: Durante a República, um general vitorioso era aclamado como impe-rator (comandante) por suas tropas. No período imperial os comandantes serviam como legados do imperador e as saudações que se seguiram aos seus sucessos tornaram-se uma prerrogativa do imperador.

Imperium: Originalmente este termo significava o “poder de comando” em um con-texto militar e era conferido a reis e, depois, a cônsules e pretores (e ditadores). Também foi usado para designar a área sobre a qual os romanos tinham o poder de comando e, portanto, passou a significar “império” em um sentido territorial.

Interpretatio Romana (“o significado romano”): O processo usado no paganismo romano para identificar divindades recém-encontradas com divindades romanas já exis-tentes, tais como o púnico Melqart com o Hércules romano.

Interrex (plural, interreges): Magistratura republicana extraordinária eleita quando não havia cônsules em exercício. O Interreges tinha que ser patrício e ocupava o cargo por cinco dias, a fim de realizar as eleições consulares. Eles poderiam ser substituídos após cinco dias por outros cinco dias interrex, num processo contínuo, até que cônsules fossem eleitos. Eles não tinham imperium.

Iuridici: Altos funcionários das províncias, com ampla atividade em matéria de justiça, e que operava de forma independente do governador.

Legate: Termo com três significados comuns: (a) um indivíduo a qem era atribuída uma tarefa particular; (b) o comandante de uma legião; (c) o governador de uma província

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imperial.Legion: A principal unidade operacional do Exército romano, que consistia de entre

5.000 e 6.000 homens, todos cidadãos romanos, sob o comando de um legado nomeado pelo imperador

Lius Latii (direitos latinos): A meia-cidadania conferida por Roma aos aliados mere-cedores e colonos. Os direitos latinos garantianm todos os privilégios e deveres da cida-dania total menos o direito de voto e de elegibilidade oficial (embora a naturalização fosse possível pela movimentação para a própria Roma).

Lictors: Funcionários que carregavam as fasces em público, servindo como cra-chás do imperium do magistrado. O número de lictors refletia o nível relativo de imperium do magistrado seis de cada para os pretores (dois quando em Roma); 12 de cada para os cônsules; e 24 para os ditadores (mas antes de Sila, apenas 12 quando, em Roma).

Ludus: Escola para formação, treinamento e educação dos gladiadores.Magister memoriae (“mestre da memória”): Funcionário importante do final do

império, que elaborava e emitia decisões imperiais e respondia aos apelos.Magister militum (“mestre dos soldados) Um cargo criado por Constantino; o seu ti-

tular era selecionado a partir dos comandantes militares de alta patente dentro do império.Maiores (“mais velhos, ancestrais”): Os ancestrais importantes e influentes da fa-

mílias líderes romanas e do Estado como um todo. O conservadorismo romano freqüen-temente olhava para o mos maiorum (o caminho dos ancestrais) para obter exemplos e orientação

Manumission (“Liberar da autoridade”): A cerimônia usada para se libertar um es-cravo.

Manus (“mão, autoridade”): Um conceito importante nas relações domésticas roma-nas, o termo denota a autoridade representada pela mão e que era inerente aos pais sobre seus dependentes, aos maridos sobre as esposas, aos proprietários sobre os escravos, e assim por diante.

Municipia (“cidade”): Este termo técnico flutuou de significado ao longo dos sécu-los, mas basicamente descrevia uma cidade sob o domínio romano, na qual os habitantes nascidos livres tinham direitos latinos ou, mais tarde, a plena cidadania. Eventualmente ele designava qualquer comunidade auto-dirigida italiana, e certas províncias.

Mistério (cultos/religiões): Seitas predominantemente orientais em que um grupo seleto de iniciados passava por ritos secretos em que foram juravam segredo (daí o nome “mistério”) e entrava, assim, em uma relação especial com a divindade em causa (por exemplo, Mithras, Isis). Foi uma grande rival do cristianismo, e tais cultos tornaram-se muito populares no ocidente nos segundo e terceiro séculos DC

Nomen: O nome pleno do cidadão normalmente tinha três elementos: os praeno-men (identificando o indivíduo; muito poucos estavam em uso geral), o nomen (identifi-cação do clã), e o cognome (identificando uma família dentro de um clã). Nomes extra (normalmente hereditários) poderiam ser acumulados por meio da adoção ou como títulos honoríficos, ou como apelidos.

Oligarquia: “Governo de poucos” geralmentte selecionados com base no nasci-mento (aristocracia) ou riqueza (plutocracia) ou uma combinação dos dois. O nome deriva do grego “oligos” (alguns) e “arche” (liderança).

Optimates (Os melhores homens): Termo aplicado inicial e amplamente aos sena-dores conservadores que favoreciam o papel tradicional do Senado no governo do Estado. Eventualmente, foi aplicado aos conservadores que se opunham a cada afastamento do

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procedimento tradicional.Ordo (ordem): O termo é aplicado às diferentes classes sociais de cidadãos orga-

nizados por status. No longo curso da história romana cinco ordens surgiram: patrício, plebeu, senatorial, equestre, e decurional.

Paterf amilias (“o pai da família”): O chefe legal da família romana, ele era o ho-mem mais velho existente na família e exercia o pátrio poder (o poder paternal) sobre todos os que viviam sob o seu teto.

Pater patriae (“Pai da pátria”): No período republicano este título foi concedido pri-meiro a Cícero para um serviço excepcional para o Estado. Em 2 AC foi conferido a Augus-to, o que foi considerado sua honra mais significativa, mas que ele, inicialmente, recusou. Tibério nunca parece ter aceitado o título oficialmente. Até Caligula teria adiado aceitá-la.

Patrician: Membro de um seleto ramo da aristocracia romana que controlava o poder no início da República. O status só podia ser transmitido dentro da família para a maioria do período republicano, mas como os números caíram, novas concessões de pa-trícios foram feitas por Júlio César e seus sucessores.

Pax deorum: Termo usado para descrever o modus vivendi desejável entre deuses e humanos, e que deveria ser mantido pela observância de um ritual adequado

Período do Reinado: O período em que reis governaram Roma, tradicionalmente datado de 753 a 509 AC,.

Período Republicano: Tradicionalmente datado de 509 a 31 AC, foi um longo pe-ríodo de governo oligárquico governado pelo Senado e por magistrados. É normalmente subdividido em República precoce (abaixo de 2641 AC), Meia-Repúbica (2624 a 133 AC) e República tardia (correspondente à Revolução Romana, 133 a 31 AC)

Plebeian: Originalmente, membro da ordem inferior de cidadãos que não eram pa-trícios. Durante a era imperial houve várias famílias plebéias proeminentes e ilustres.

Plebeian tribune: Magistrado originalmente encarregado de proteger os plebeus contra os patrícios. Durante a República o tribuno era poderoso, por causa de seu direito de veto e de sua iniciativa legislativa, enquanto a pessoa do titular era sagrada. Sob o império diminuiu a importância e o escritório tornou-se um palco de rotina entre o quaestor e pretor.

Pontiff: Membro de uma dos quatro colégios sacerdotais de Roma. O pontifex ma-ximus era o sacerdote sênior.

Pontifex Maximus: O padre principal da Roma pagã.Populares (“Homens do povo”):Termo aplicado aos políticos (geralmente jovens)

que seguiram o exemplo de Tibério e Caio. Graco e que empregavam o tribunato e a assembléia plebéia para implementar sua agenda política. Os populares, portanto, tambo-rilavam sob o apoio de medidas populares (distribuições de terra, grãos mais baratos ou gratuitos, alívio da dívida, etc.) e tendiam a adotar uma postura fortemente anti-senatorial.

Praetor: A segunda mais alta magistratura eleita anualmente no período republica-no. Em 150 AC, originalmente, eles eram assistentes dos cônsules, sendo seis deles elei-tos anualmente, com mais dois adicionados por Sulla. Eles realizavam funções judiciais, políticas e militares. Eles tinham imperium, mas a um nível menor do que o dos cônsules.

Praetorium (Guarda pretoriana): Originalmente, era um destacamento especial de soldados que guardava a tenda do comandante (pretório) em um acampamento do exér-cito. O termo foi adotado para a guarda imperial do imperador em Roma. Foi formada por Augusto e discretamente alojada por Tiberio, em 23 DC, em cidades ao redor de Roma, em um único acampamento nos arredores da cidade. Eles totalizavam de 9.000 a 16.000

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homens, dependendo da inclinação dos imperadores. Eles desempenharam algum papel na política imperial, matando alguns imperadores (por exemplo, Gaius [Caligula]), e ele-vando outros (por exemplo, Claudio, Oto e Didius Juliano). Seu comandante, um prefeito da ordem equestre, poderia ser uma pessoa de grande influência, como foi o caso de Sejanus com Tibério, ou Macrinus, que tornou-se imperador em 217 a 218 DC. A Guarda Pretriana foi dissolvida por Constantino em 312 DC.

Prefect: Este termo significa, basicamente, “a pessoa colocada no comando”, e poderia ter uma gama de aplicações, tanto militar como administrativa. As militares mais significativas eram: (a) o comandante de uma unidade auxiliar ou da frota; (b) o prefeito do acampamento, o segundo-em-comando do legado legionário e comandante das tropas na ausência do legado; e (c) o comandante da guarda pretoriana e do serviço de bombeiros (vigiles). Os prefeitos administrativos chave foram o governador do Egito e o prefeito da oferta de grãos. Todas essas prefeituras eram realizadas por equestrians. A antiga função de prefeito da cidade (praefectus urbi) foi realizada por um senador do nível consular. Até o final de República suas funções eram em grande parte de ritual, mas suas funções fo-ram revividas por Augusto, e foi-lhe dada a responsabilidade pela manutenção da ordem na cidade e o comando da polícia da cidade (as cohortes urbanae); ele era autorizado a exercer a justiça sumária ao lidar com casos criminais menores e gradualmente assumiu a responsabilidade para os casos mais graves. No final do império ele exercia um poder considerável.

Principate: Termo usado para descrever tanto o sistema imperial estabelecido por Augusto, como o período de sua vigência (27 AC a 284 DC).

Proconsul: O governador senatorial de uma província “pública”, escolhido por sor-teio.

Procurator: Um termo altamente flexível. Ele é usado por um agente privado ou ofi-cial de justiça para um determinado assunto. De Claudio em diante, o termo foi usado para os administradores de pequenos distritos como a Judéia. Havia também procuradores que supervisionavam negócios financeiros relativos às propriedades imperiais dentro das províncias, alguns dos quais, eventualmente, assumiram funções administrativas oficiais, como procuradores “provinciais”, em papéis subordinados aos governadores, em ambas as províncias imperiais e no Senado. A posição era mantida por equestrians ou libertos.

Prodigia: Sinais dos deuses, geralmente sob a forma de ocorrências extraordiná-rias ou sobrenaturais.

Propraetor: O governador de uma província com o grau de pretor. Os legados (go-vernadores) de províncias imperiais ocupavam esse posto, só superado pela autoridade consular do imperador.

Protectores: Os soldados que pertenciam a um dos ramos da Guarda Imperial no império tardio, nomeado para o seu serviço em razão de competência comprovada.

Province: O termo inicialmente era previsto para a esfera de competência de um magistrado, mas adquiriu um caráter mais geográfico, definindo territórios externos in-dividuais regidos por Roma. Após o assentamento das províncias externas feito por Au-gusto elas passaram a ser de dois tipos. 1) As províncias “imperiais”, na parte instável do império, que abrigava legiões romanas e eram administradas por governadores nome-ados diretamente pelo imperador; havia, ainda distritos menores que eram governados por equestrians com o posto de procurador (o título de prefeito é habitual mais cedo). O Egito foi uma das principais províncias imperiais em sua própria classe, governada por um prefeito equestre. 2) As províncias “Públicas”, nas áreas mais estáveis, em que, com raras

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exceções não abrigava legiões. As províncias públicas eram governadas por procônsules, homens da classe senatorial eleitos por sorteio.

Publicani (literalmente “homens públicos”): Termo utilizado para designar as com-panhias de (geralmente) membros equestres que compravam contratos públicos deixados pelos censores. Os mais poderosos eram os cobradores de impostos, que competiam por contratos de determinadas regiões, deixando assim abertos a essas regiões abusos generalizados e extorsões.

Quaestor: O mais jovem dos magustrados no cursus honorum. Eram eleitos, anual-mente, 10 deles. Eles tiham obrigações financeiras e não possuíam imperium.

Romanização: Termo dos historiadores modernos para designar o processo de tomada de regiões anteriormente incivilizadas pelos romanos (embora possa ser aplicada também para a adaptação de culturas urbanizadas à maneira romana).

Saecular: Um festival que marcava o fim de uma era (saeculum) e o início de outra. Era realizada em 21 de abril, o aniversário tradicional da cidade.

Senatus: Conselho de assessores aristocratas romanos, primeiro para os reis, em seguida, para os magistrados da República Romana, e finalmente para os imperadores. Suas origens são obscuras.

Senatus consultum (ultimum) (“último decreto do Senado”): Aconselhamento emi-tido pelo Senado para os magistrados; não era juridicamente vinculativo. A decretação final (ultimum) era essencialmente uma declaração da lei marcial. O primeiro deles foi emi-tido em 121 AC em meio aos distúrbios que compuseram a tentativa de C. Graco para um terceiro tribunato e o último foi emitido quando César invadiu a Itália em janeiro de 49 AC.

Sestertius: O mais alto valor da moeda romana em moeda de metal, feita de uma liga de zinco e cobre. Ele é usado pelos romanos como unidade básica para expressar valores monetários, com o símbolo HS.

Toga: A vestimenta pública tradicional dos homens romanos, feito de lã branca e fina. Os meninos usavam o praetexta, uma toga com uma beirada roxa. Por volta dos qua-torze anos, eles colocavam isso de lado para usa uma versão branca lisa, as toga virilis, em uma cerimônia que marcava a transição para a idade adulta. O uso da toga praetexta era retomado por aqueles que entravam nas magistraturas curule.

Tribo: Um agrupamento de cidadãos romanos definidos por localidade (como uma freguesia ou município). Havia originalmente apenas três tribos (daí o nome, derivado dos latim tres, que significa “três”), mas o número de tribos aumentaram com a expansão romana e acabou por ser fixada em 35 (4 urbanas e 31 rurais).

Tribunician authoritas: Os imperadores não exerciam o cargo de tribuno da plebe, mas a eles era garantida a autoridade do tribuno (tribunicia potestas) e sua sacrosantida-de. Essa autoridade foi em muitos aspectos o fundamento da posição imperial, e impera-dores datavam sua ascensão a partir do momento da sua doação.

Tribuno da Plebe: Tecnicamente, não era um magistrado, mas sim um funcionário ligado à Assembleia Tribal da plebe. Seu título deriva da organização tribal desta assem-bléia. Ele tinha que ser plebeu, era sagrado e não podia ser prejudicado enquanto em ofício. Tinha a ele confiada a tarefa de cuidar dos interesses da plebe, e podia convocar sessões de discussão (contiones) ou sessões de votação (comitiae) da plebe. Seu poder mais importante era um veto nas reuniões de todas as assembleias e do Senado e em toda a legislação.

Triumvirato: Termo latino aplicado a qualquer colegiado de três homens com po-deres para realizar alguma tarefa. Foi aplicado (ainda que tecnicamente incorreto) para o

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pacto entre Crasso, Pompeu e César formado em 60 AC (o chamado Primeiro Triunvirato). O Segundo Triunvirato, por sua vez, composto por Otaviano, Marco Antônio e Lépido foi legalmente instituído em 43 AC.

Triumph: A procissão liderada por um comandante, depois de uma grande vitória, através de Roma para o Templo de Júpiter no Monte Capitolino, acompanhado por butim de guerra e prisioneiros de guerra. No período imperial o triunfo ficou restrito aos membros da família imperial.

Triumphal regalia: Os legados do imperador não podiam celebrar os triunfos pes-soais e as suas vitórias eram reconhecidos pelo direito de usar a farda do triumphator.

Vigintiviri: Os titulares dos escritórios menores frequentemente assumidos pelos indivíduos no primeiro degrau de uma carreira administrativa ou política.

Venatio (“a caçada”): Caçada à besta selvagem e/ou brigas de animais, que cons-tituíam a primeira parte do espetáculo de gladiadores.

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