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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO FACULDADE DE HUMANIDADES E DIREITO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO A RELIGIÃO COMO PROCESSO PEDAGÓGICO NO PENSAMENTO DE MEISHU-SAMA: UM DIÁLOGO COM PAULO FREIRE POR LILIA DINELLI Dissertação apresentada em cumprimento par- cial às exigências do Programa de Pós- Graduação em Ciências da Religião da Uni- versidade Metodista de São Paulo, para obten- ção do grau de Mestre, sob a orientação do Prof. Dr. Jung Mo Sung. São Bernardo do Campo Janeiro de 2011

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UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO FACULDADE DE HUMANIDADES E DIREITO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO

A RELIGIÃO COMO PROCESSO

PEDAGÓGICO NO PENSAMENTO DE MEISHU-SAMA:

UM DIÁLOGO COM PAULO FREIRE

POR

LILIA DINELLI

Dissertação apresentada em cumprimento par-cial às exigências do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião da Uni-versidade Metodista de São Paulo, para obten-ção do grau de Mestre, sob a orientação do Prof. Dr. Jung Mo Sung.

São Bernardo do Campo

Janeiro de 2011

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A dissertação de mestrado sob o título “A Religião como um Processo Pedagógico no

Pensamento de Meishu-Sama: um Diálogo com Paulo Freire”, elaborada por Lilia Di-

nelli foi apresentada e aprovada em 14 de março de 2011, perante banca examinadora com-

posta pelos professores Doutores Jung Mo Sung (Presidente/UMESP), Lauri Emílio Wir-

th (Titular/UMESP) e Andréa Gomes Santiago Tomita (Titular/Faculdade Messiânica).

__________________________________________

Prof. Dr. Jung Mo Sung

Orientador/a e Presidente da Banca Examinadora

__________________________________________

Prof. Dr. Jung Mo Sung

Coordenador do Programa de Pós-Graduação

Programa: Pós-Graduação em Ciências da Religião

Área de Concentração: Práxis Religiosa e Sociedade

Linha de Pesquisa: Interfaces da Práxis Religiosa com a Filosofia e as Ciências

Humanas

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A Deus, a Meishu-Sama e a meus antepassados.

Aos meus pais e familiares.

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O real objetivo da educação é formar homens íntegros, isto é, homens que façam da justiça o seu código de Fé e se esforcem para aumentar o bem-estar social,

contribuindo para o progresso e a elevação da cultura.

Meishu-Sama

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Minha mais profunda gratidão à Universidade Metodista de São Paulo e ao Instituto Ecumênico de Pós-Graduação em Ciências da Religião – IEPG.

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AGRADECIMENTOS

À direção da Igreja Messiânica Mundial do Brasil e a seus missionários, que me apoi-aram sempre nos momentos mais difíceis da vida.

À direção da Fundação Mokiti Okada e a seus funcionários, com os quais aprendi a importância de trabalhar em conjunto para a sociedade.

Ao Fernão Capelo Gaivota que encontrei no prof. Jung Mo Sung. Orientador rigoroso, acima de tudo paciente, que me ensinou a “começar a andar nas palavras”.

Aos meus queridos professores e amigos, que eu amo tanto e que me ajudaram a

perceber a magnitude da descoberta do conhecimento.

Á professora Marília G. Godoy, amiga.

Meu agradecimento especial aos autores das obras pesquisadas, pois sem eles não

seria possível aprofundar meus conhecimentos e desenvolver esta pesquisa.

Àqueles que não citei e sabem que foram importantes nesse caminho.

Aos queridos amigos Luci e Vitor (amados), companheiros na “guerra contra a

ignorância”.

MINHA GRATIDÃO

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DINELLI, Lilia. A religião como processo pedagógico no pensamento de Mei-shu-Sama: um diálogo com Paulo Freire. São Bernardo do Campo, 2011. 102 fls. Dissertação (Mestrado em Ciências da Religião – Teologia e História) — Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2011.

SINOPSE

Esta pesquisa busca apresentar contribuições para o campo da relação entre religião e educação, especificamente a concepção da religião como um pro-cesso pedagógico no pensamento de Meishu-Sama, fundador da Igreja Messi-ânica Mundial. O trabalho está dividido em três partes. A primeira apresenta a vida de Meishu-Sama e a história da fundação da Igreja Messiânica Mundial, que ocorreu na primeira metade do século XX no Japão. A segunda estuda a concepção de Meishu-Sama sobre a função da religião e a relação desta com a educação, especialmente no desafio fundamental para a formação do ser hu-mano. A terceira parte estabelece um diálogo entre os pensamentos educacio-nais de Paulo Freire e Meishu-Sama, especialmente em torno do desafio da humanização e das noções de educação bancária e a libertadora dialógica (Paulo Freire) e a “educação morta” e “educação viva” (Meishu-Sama). Neste diálogo é dado destaque à noção de “educação espiritualista” de Meishu-Sama, que considera fundamental criticar a descrença do mundo moderno em relação ao “mundo espiritual”. Para este autor, desconstruir o pensamento materialista e integrar o ser humano na natureza é tarefa tanto da religião co-mo da educação.

Palavras-chave: religião – educação – mundo espiritual – humanização – missão.

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DINELLI, Lilia. A religião como processo pedagógico no pensamento de Mei-shu-Sama: um diálogo com Paulo Freire. São Bernardo do Campo, 2011. 102 fls. Thesis (Master’s Degree in Sciences of Religion – Theology and History) — São Paulo Methodist University, São Bernardo do Campo, 2011.

ABSTRACT

The present research intends to contribute to the relation field between religion and education, specifically the concept of religion as an educational process ac-cording to the thought of Meishu-Sama, founder of the Church of World Mes-sianity. The research is divided into three parts. At first, it presents the life of Meishu-Sama and the history of foundation of the Messianic Church, which oc-curred in the first half of the twentieth century in Japan. In the second part, the concept of Meishu-Sama on the function of religion and its relation with educa-tion is studied, especially in the key challenge for the development of human being. In the third part, a dialogue between the educational thoughts of Paulo Freire and Meishu-Sama is established, especially the challenge of humanizing and notions of banking education and liberating dialogue (Paulo Freire) and “dead education” and “living education” (Meishu-Sama). In this dialogue it is given emphasis to the notion “spiritual education” of Meishu-Sama, who con-siders fundamental to critic the disbelief of the modern world regarding the “spiritual world”. For this author, deconstructing the materialistic thought and integrating the human nature is the task of religion as much as of education.

Key words: religion – education – spiritual world – humanization – mission.

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SUMÁRIO

Introdução _____________________________________________________________ 11

CAPÍTULO I - A VIDA DE MEISHU-SAMA E A HISTÓRIA DA FUNDAÇÃO DA

IGREJA MESSIÂNICA MUNDIAL ________________________________________ 15

1.1 Contexto Sócio-histórico da vida de Meishu-Sama _______________________ 15

1.2 O fundador ________________________________________________________ 22

1.3 O nascimento da Igreja Messiânica Mundial ____________________________ 34

CAPÍTULO II - MEISHU-SAMA E A FUNÇÃO DA RELIGIÃO E DA EDUCAÇÃO

_______________________________________________________________________ 48

2.1 Religião e missão da Igreja Messiânica em Meishu-Sama _________________ 48

2.1.1 Religião como passividade e resignação ______________________________ 50

2.1.2 Religião como pragmatismo (religião da ação) _________________________ 51

2.2 Educação em Meishu-Sama __________________________________________ 55

2.3 Religião como educação em Meishu-Sama ______________________________ 60

2.3.1 Educação espiritualista e a materialista _______________________________ 63

2.3.2 Educação morta e viva ____________________________________________ 65

2.4 Fraternidade entre seres humanos como o objetivo da religião-educação ____ 68

2.4.1 A noção de fraternidade e alteridade _________________________________ 69

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2.4.2 Religião-Educação como caminho de fraternidade ______________________ 70

2.5 Religião e educação e o estado natural dos seres humanos _________________ 72

CAPÍTULO III - DIÁLOGO ENTRE O PENSAMENTO DE MEISHU-SAMA E O

PENSAMENTO DE PAULO FREIRE ______________________________________ 76

3.1 Educação e a dialética da humanização ________________________________ 78

3.2 Educação e práxis para libertação/humanização _________________________ 84

3.3 Educação, fé e religião ______________________________________________ 93

CONSIDERAÇÕES FINAIS ______________________________________________ 98

Referência Bibliográfica _________________________________________________ 108

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INTRODUÇÃO

Em toda minha vida sempre tive grandes sonhos, considerado isso por alguns,

inclusive por minha mãe, como desejos impossíveis. Com dezoito anos conheci a

Igreja Messiânica Mundial e filiei-me a ela, juntamente com minha família.

Passei a prestar trabalho voluntário à entidade e, hierarquicamente, fui ele-

vando minha posição, tornando-me ministro da igreja e professora da arte de ikeba-

na. Paralelamente, trabalhava na Secretaria da Educação e, posteriormente na Secre-

taria da Justiça, onde me aposentei.

Como sempre gostei muito de arte, identifiquei-me de imediato com o pen-

samento de Meishu-Sama, fundador da Igreja Messiânica, e com o valor que ele dá à

arte como veículo para proporcionar alegria e sentido à vida.

Para tanto, busquei em minha experiência de vida, uma leitura complementar

que pudesse preencher a necessidade de conhecimento que havia em meu interior,

fruto de uma formação pautada na educação contemporânea (século XX).

Filha dessa educação, fui formada insatisfeita com o que havia de melhor na

escola pública e assim aprendi o que era certo e o que era errado, e que o educador

era o certo e o educando, o errado. O “dom” do conhecimento, à época, cabia ao pro-

fessor e ao aluno restava ser um mero depositário.

Já nessa fronteira, percebi que havia algo errado ao não se discutir os “por-

quês”. E quando ousava questionar, tinha como resposta “porque sim”. Ora, o prin-

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cipal atributo que diferencia o ser humano do ser animal é sua capacidade de pensar,

raciocinar, refletir. Assim, como se poderia manter essa via de mão única?

Ao extrair do educando a capacidade de diferenciá-lo de um animal, só resta

colocá-lo na jaula e adestrá-lo. Hipoteticamente esse adestramento já vinha sendo

feito pela educação contemporânea.

Por não achar suficiente resposta às minhas questões, optei por fazer o Curso

em Ciências da Religião, por reconhecer nele o instrumento capaz de reunir os cam-

pos da Religião e Educação, campos estes fundantes para a formação do ser humano.

Entendo que, ao desenvolver um estudo comparativo entre religião e educa-

ção, estudando aquela como um processo pedagógico, estou contribuindo para o

campo do conhecimento no discurso que legitima ambas, capaz de fornecer mais

elementos para aqueles que, como eu, acreditam ser este o caminho para a transfor-

mação da sociedade e do individuo.

Decidi estudar a religião em Meishu-Sama, cuja finalidade é tornar o homem

liberto de preconceitos, do sofrimento e da opressão, e a educação em Paulo Freire,

libertadora, que tem como objetivo tornar o homem livre, “dom divino” de Ser Mais.

O objetivo geral da pesquisa é aprofundar a relação entre a religião e a educa-

ção com a finalidade de contribuir para uma compreensão mais ampliada do papel da

religião no mundo de hoje, mostrando as relações intrínsecas entre ambas.

Os objetivos específicos da pesquisa são:

a) compreender a visão de Meishu-Sama sobre o papel da religião na vi-

da das pessoas e na sociedade, em especial a relação entre a religião e a educação.

b) estudar as possíveis contribuições da proposta educacional de Paulo

Freire na compreensão da relação entre religião e educação e na compreensão da

proposta religioso-pedagógica de Meishu-Sama.

No capítulo I, apresentamos um histórico de Mokiti Okada, nome civil de

Meishu-Sama, o contexto sócio-histórico de sua vida, o Japão do século XIX e, em

seguida, o introduzimos como fundador da Igreja Messiânica Mundial, a revelação,

sua vida religiosa e o nascimento da religião e sua história. A trajetória do religioso

desde os momentos de seu nascimento ao deslumbramento de uma vida digna de ser

humana, como humano, sua formação educacional, seu exemplo de vida para os dis-

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cípulos, em meio a guerras e sofrimentos. E o aproveitamento destas dificuldades

como degraus para a superação e a busca na transformação de um mundo melhor.

No segundo capítulo, o tema abordado será a religião como educação em

Meishu-Sama. Para tanto, será apresentado o perfil da religião e a missão da Igreja

Messiânica Mundial, mostrando que Meishu-Sama não está preocupado com a defi-

nição do que é religião, e sim com a missão desta.

Ao falar da missão da religião, ele percebe que a Igreja Messiânica Mundial

vai além do campo religioso, de uma religião. Ele apresenta uma religião que vai

além, abarcando a cultura, a economia, a filosofia, a política e os demais campos de

atividade. Diante disto, mostra que a Igreja Messiânica Mundial é uma religião dife-

rente das tradicionais do Japão, resgatando algumas questões como religião passiva

versus religião ativa, atitude de resignação versus atitude pragmática.

Ao se estudar a religião como educação no pensamento de Meishu-Sama, faz-

se necessário perceber que o objetivo da primeira é formar o ser humano, humano.

Ser humano este que reconhece o outro, nas palavras do religioso, que afirma que só

é possível ser feliz quando se faz a felicidade do outro. Com esta definição, observa-

se que a religião e a educação são fatores fundamentais para a aproximação do ser

humano com a natureza.

A educação que vislumbra a importância de formar homens que tenham ati-

tudes de respeito com a natureza é digna de ser reverenciada como a educação ideal,

posto que esta proposta nos é ensinada pelas religiões, desde os primórdios da cria-

ção do homem como ideal de vida.

No terceiro capítulo, trataremos de uma breve apresentação do educador Pau-

lo Freire, seu pensamento pedagógico e ideal de vida. Neste estudo, consideramos a

educação e a práxis para libertação e a humanização, na obra de Freire. Obra esta de

profundo significado diante de uma sociedade que faz da educação contemporânea

sua tábua de resgate, desconhecendo nela, o quanto é desumana.

Um dos alvos desta pesquisa é possibilitar uma reflexão sobre a obra de Mei-

shu-Sama, que vê a religião messiânica como pragmática e estuda a importância da

práxis, quando afirma existir estudo vivo e estudo morto. Do mesmo modo, a pesqui-

sa remete a uma reflexão sobre a obra de Paulo Freire, que afirma a importância da

educação como práxis e analisa a educação bancária e a educação problematizadora.

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Por fim, estabelecer uma aproximação na educação, fé, esperança e amor de-

senvolvidos por Paulo Freire, que assume estes conceitos, mas não pressupõe Deus e

a religião como meios de atingir o objetivo de tornar o Ser mais humano, e o pensa-

mento de Meishu-Sama que pressupõe a existência de Deus e vê na religião, fé, edu-

cação e crença no mundo espiritual, meios para atingir o verdadeiro objetivo da cria-

ção do ser humano: ser feliz.

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CAPÍTULO I

A VIDA DE MEISHU-SAMA E A HISTÓRIA DA

FUNDAÇÃO DA IGREJA MESSIÂNICA MUNDIAL

1.1 Contexto sócio-histórico da vida de Meishu-Sama

Na segunda metade do século XIX, mais do que a introdução do pensamento ociden-

tal, ocorre no Japão um processo de ocidentalização que atinge aspectos da vida social. A

citação que segue fala dessa ocidentalização: “A ocidentalização do Japão favorece o de-

senvolvimento do racionalismo, na mesma medida em que ameaça a tradição mítica, ocasi-

onando uma crise que vai provocar duas reações opostas: uma, a tentativa de integrar o ra-

cionalismo dentro do esquema mítico, e outra, a de rejeitar (fanaticamente) o racionalismo.

Esta última reação é a que tanta influência exerceu durante a guerra nipo-americana e que se

perdeu no seu fim e com a derrota nacional.” (OSHIMA, 1991, pp. 19-20)

Em meio a esta dualidade nasceu no dia 23 de dezembro de 1882, Mokiti Okada, que

mais tarde assumiria o nome religioso de Meishu-Sama, no bairro de Hashiba, distrito de

Assakussa, no Japão, extremo leste do mundo e, desde sua infância mudou-se dez vezes de

local. Entre elas, nove das vezes foram em direção ao Oeste. Para ele, o significado espiritu-

al de nascer no extremo leste do mundo denotava a crença de que seria o veículo da Luz do

Oriente para o planeta. Culturalmente, no Japão, toda religião, até o Xintoísmo, veio do

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Oeste. Okada acreditava que essa realidade era contrária às leis da natureza, pois nela o Sol

nasce no Leste e se põe no Oeste. Assim, do seu ponto de vista, para que o homem alcan-

çasse a felicidade, era necessário que a luz nascesse no Oriente. A Luz do Oriente.

No Japão, o dia 22 de dezembro é o dia do solstício de inverno no hemisfério norte,

tendo a noite mais longa do ano; e esta data, 23 de dezembro, tinha para a cultura japonesa

da época, um significado espiritual porque é o início do alongamento do dia. Okada inter-

pretou mais tarde que a data do nascimento era um sinal de que tinha recebido a missão de

transformar o mundo, levando-o da “Era da Noite” para a “Era do Dia”, período de saúde,

prosperidade e paz.

Sobre esta interpretação, Okada, escreveu em 1952:

[...]―Luz do Oriente� era uma predição relacionada à minha pessoa. Não haverá quem não se espante ao tomar conhecimento dessa verdade, e poucas pessoas conseguirão aceitá-la de imediato. […] Por isso, tenta-rei me explicar melhor, apresentando provas reais do que estou dizendo.

A primeira prova é o local onde nasci e o trajeto das mudanças que fiz.

Nasci num bairro antigamente denominado Hashiba, situado em Assa-kussa, na cidade de Tóquio. O país chamado Japão, como todos sabem, localiza-se no extremo leste do globo terrestre; acrescente-se que Tó-quio é uma cidade do leste do Japão. O leste de Tóquio é Assakussa, cu-jo leste, por sua vez, é Hashiba, o bairro ao qual me referi há pouco. A leste desse bairro está o rio Sumida. Assim, Hashiba é realmente o leste do leste; em termos mundiais, é o extremo leste do mundo. […] Aos oi-to anos, fui morar no bairro de Senzoku, a oeste de Hashiba; mais ou menos na época em que concluí o curso primário, mudei-me para o bair-ro de Naniwa, em Nihon-bashi, e em seguida, para Tsukiji, em Kyo-bashi; depois fui para os bairros de Oi e Omori, ambos em Ebara; mais tarde, transferi-me para Koji e, a seguir, para Tamagawa, onde existe, atualmente, o Solar da Montanha do Tesouro. Posteriormente, dando um salto bem grande, mudei-me para Hakone e Atami, e, agora, para Quio-to. Assim, troquei de residência dez vezes, e dessas mudanças, excetu-ando-se o bairro de Koji, nove foram para o oeste. Naturalmente, daqui em diante a Luz do Oriente avançará cada vez mais para o oeste; um di-a, é óbvio, chegará à China e, finalmente, à Europa. [...] (1982, pp.29-30, vol. 1)

À época, o rio Sumida era um importante centro de transporte fluvial, local onde às

suas margens se localizava o distrito de Assakussa, principal porto e via de acesso ao co-

mércio. Espaço de fronteiras mesclado por pessoas vindas de diversas regiões do Japão, que

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ali encontravam argumentos para se instalar e sobreviver. Nessa época, produtos como arroz

e verduras eram transportados por via fluvial, em navios com casco reto e raso, e descarre-

gados ao longo de suas margens. Já os navios de grande porte que vinham de Kyoto e Osa-

ka, atracavam em Assakussa, depois de passar pelo porto de Edo (antigo nome da cidade de

Tóquio).

Assakussa foi progredindo por intermédio do grande número de comerciantes e pro-

fissionais, tornando-se o centro recreativo e cultural de Edo, principal cidade do Japão, de-

pois de ser instalada ali, por ordem do governo feudal, uma zona de meretrício. Algo que

sedimentou o progresso da localidade como centro cultural foi a chegada do teatro cabúqui

(teatro tradicional do Japão, originado no século XVII, que tinha como finalidade satirizar

temas religiosos).

Por ser um local de ricas paisagens marcadas pelas estações do ano, posteriormente,

registradas por pinturas, Assakussa tornou-se um local famoso socialmente.

A ocidentalização e a industrialização, aliadas à transição de um país tradicional para

um país aberto a novas proposições, provocaram sérias dificuldades à população.

No período Tokugawa, quinze gerações dominaram o Japão. Considerado como um

dos maiores estrategistas, é atribuída ao imperador Tokugawa a glória de ter mantido a paz

no país por trezentos anos, após séculos de guerra civil. Guerreiro e administrador, estrutu-

rou seu xogunato (1603-1867) de maneira a permitir que seus sucessores pudessem contro-

lar todo o território japonês e garantir a paz interna. Nessa organização, a figura do impera-

dor era simbólica, ficando o governo sob a responsabilidade dos xoguns, em Edo (Tóquio).

Esse poder se sobrepunha às religiões e reprimia as ideias contrárias ao governo. Outro fator

que contribuiu para a permanência no poder, foi o controle de arrecadação de impostos.

Com este rigor, os camponeses se mantinham presos à produção do campo, para atender às

necessidades de seu senhor, dentro de uma hierarquia que finalizava no xogum.

Nessa cadeia, denominadas castas, rigorosos limites foram demarcados quanto às

camadas sociais, permitindo ao indivíduo transitar somente naquela à qual pertencia. Com

isso, em um país manchado pelo sangue, novas propostas eram vistas com muita preocupa-

ção, delimitando o espaço social, tornando-o fixo e hierarquizado.

Para garantir a fidelidade dos senhores das terras, o xogum controlava os direitos,

remanejamento, aumento e diminuição das terras, permitindo a eles administrá-las como

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quisessem. Entretanto, a obediência, os impostos, a lealdade eram fatores pertinentes a essa

relação.

Outra grande forma de controle era que, em anos alternados, estes senhores das ter-

ras iam para a capital e lá ficavam por quatro meses, longe de suas famílias. Quando regres-

savam às suas terras, suas famílias iam para a capital, Edo, e lá permaneciam sob os olhos

do xogum, como garantia (refém), tudo para evitar revoltas e levantes. Isso fazia com que

fossem altos os gastos das famílias, assegurando a condição limitada de dinheiro dos senho-

res das terras. Para o xogum, isso servia como garantia de obediência, já que não havia co-

mo guardar dinheiro para constituir exércitos para o ataque ao xogunato.

Nesta estrutura, o imperador vivia isolado em Kyoto, mantido pelo xogum, que se

colocava no papel de súdito dele. Como o imperador era considerado sucessor na linhagem

divina, qualquer levante contra o xogum indicava uma demonstração clara de rebeldia, em

oposição aos deuses. Contudo, a classe de samurais, diante da calmaria existente no país,

passou a dedicar-se a outro tipo de atividade profissional, como comerciantes, professores,

mantendo-se numa classe privilegiada, abaixo dos senhores de terras, mas sempre fiéis a

eles.

Com o início do comércio pelos mares, e este se tornando muito lucrativo, motivados

pelas novidades trazidas do exterior, a classe de comerciantes começa a prosperar, tornan-

do-se muito poderosa. Revela-se então a elite em busca desses comerciantes para atender à

ânsia de poder. Com isto, surge a classe dos homens de negócios, tendo como valores “ser

obstinado diante dos objetivos, desconfiar de estranhos, trabalhar bastante, agir com parci-

mônia e acumular riquezas”. (SAKURAI, 2008, p. 119) Forte foi essa contribuição para a

revolução individual e para a constituição do “ser japonês”.

Entretanto, a economia ainda era baseada na agricultura, tendo o arroz como referên-

cia para medir riquezas, embora a vida do agricultor fosse bastante difícil na época.

No governo Tokugawa, a família era patriarcal, abrigando os parentes em seu entor-

no, organizadas em sociedades voltadas para o cumprimento de suas regras, tendo como

parâmetro a comunidade, acima da individualidade.

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ESTRATIFICAÇÃO SOCIAL

SOCIEDADE DA ÉPOCA

Nobres e samurais

Classe Mercantil em ascensão

Artesãos

Camponeses

Marginais e intocáveis (pessoas contaminadas)

Ex-samurais

Com o desenvolvimento da rota marítima e a chegada dos europeus, aumentaram as

perspectivas de disputas por maiores negócios, introduzindo elementos de culturas e reli-

giões diferentes, como o cristianismo. Mesmo sendo a entrada de religiosos no país anterior

ao período Tokugawa, foi nele que se manifestaram mais fortemente as diferenças entre as

ordens religiosas: jesuítas x franciscanos, conflito de interesses entre católicos e protestan-

tes, chamando a atenção dos líderes governamentais que se opuseram. De pronto veio a res-

posta.

Em um ato de rejeição, o governo expulsa os comerciantes e estrangeiros, abomina o

cristianismo e, àqueles que se recusam a aceitar as regras, são mortos. Para evitar a sobrevi-

vência do cristianismo, o japonês só podia se considerar budista ou xintoísta.

Nesse período do xogunato, o confucionismo se fortalece dado aos preceitos de obe-

diência, garante a ordem social e se consolida. Embora o budismo já não fosse politicamen-

te tão importante como era antes, com a proibição do cristianismo no país, ele surge com

maior força.

Com a derrubada do governo feudal da Era Tokugawa, (1600 – 1868), depois de du-

zentos e setenta anos, o governo Meiiji (1868 – 1912), que o substituiu, propunha equiparar

Edo às cidades europeias e americanas. Para tanto, iniciou um processo de ocidentalização

implantando a indústria em todas as regiões do país, com o firme propósito de recuperar o

tempo perdido sob o domínio anterior. Era visível a necessidade de transformar a cidade de

Edo em um local de maior progresso, em virtude da pressão que vinha sofrendo por parte de

outros países ocidentais, principalmente dos Estados Unidos da América, no campo indus-

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trial. Começam a surgir neste período novos movimentos religiosos, atendendo às mudanças

sociais que surgem e se aprofundam com o passar do tempo, fazendo com que o país se abra

para o mundo.

Hitoshi afirma que “A ocidentalização é, pois, a introdução e a recepção do raciona-

lismo científico, experimentalista ou positivista, do naturalismo, do democratismo, do indi-

vidualismo, junto com o espiritualismo cristão e protestante.” (1991, p. 103)

Na região de Assakussa, foi aproveitada a boa situação da navegação fluvial e em

suas margens foram construídas fábricas siderúrgicas. Com isto, os funcionários das empre-

sas e comerciantes foram atraídos para ali viver e uma nova fase do progresso se instalou.

Rio Sumida na Era Meiji

Grandes foram as mudanças nos mais diversos campos e sistemas, sejam eles educacional,

militar, político, transformando a vida do país: a modernização rapidamente chegava e a

estruturação do cotidiano ia se renovando. Aparentemente, o local ia se transformando, a

partir do incentivo governamental à cultura: construção de casas de chá, aquários, cinemas.

Todavia, esse grande progresso não favorecia a todos. Devido às importações da

modernidade, vindas de países possuidores de tecnologia mais avançadas, uma parte do po-

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vo, a maior, não tinha sequer o que comer e sofria muito com isso por todo o país, sobretudo

os agricultores e trabalhadores. A metamorfose que acontece no país faz com que a linha

demarcatória entre solidariedade e individualismo se acentue e provoque um distanciamento

vital nas relações sociais.

A desigualdade e a exclusão eram fontes de diferenças brutais entre a população que

sofria os resquícios de uma sociedade que privilegiava os “bem aventurados” e fazia sofrer

os que mal tinham o que comer. Isso aparecia mais forte no século XIX, diante da conver-

gência da modernidade e do capitalismo. (SANTOS, 1995, p. 2)

Inicialmente, a proposta para tornar o Japão um país rico não tinha como meta prin-

cipal beneficiar o povo. Começa a se observar um traço notadamente ocidental nos diversos

meios da sociedade, modificando a natureza original do país. Sem entender a real situação

em que o país se encontrava, a manifestação do povo que, em princípio foi favorável à der-

rubada do governo feudal, com o passar do tempo se modifica, e surgem as primeiras mani-

festações contrárias ao novo governo, expressando uma insatisfação cada vez maior da po-

pulação. Em contrapartida, essas manifestações geraram um movimento pelos direitos do

povo, em busca de um país mais equilibrado e democrático, liderado por uns poucos intelec-

tuais influenciados pelo Iluminismo ocidental. Para Boaventura S. Santos:

“No sistema mundial cruzam-se igualmente os dois eixos: o eixo sócio-econômico da desigualdade e o eixo cultural, civilizacional da exclusão. O eixo Norte/Sul é o eixo do imperialismo colonial e pós-colonial, só-cio-econômico integrador da diferença. O eixo Leste-Oeste é o eixo cul-tural, civilizacional da fronteira entre a civilização ocidental e as civili-zações orientais: islâmicas, hindu, chinesa e nipônica. Se o imperialis-mo é a melhor tradução do eixo Norte/Sul, o orientalismo é a melhor tradução do eixo Leste/Oeste”. (1995, p. 5)

Neste período, o país se dividia em duas formas de pensar o futuro: uma, plenamente

a favor de ocidentalização esquecendo-se da tradição milenar do país, e outra, ignorando o

progresso dos países ocidentais, mantinha-se presa aos costumes tradicionais, mantendo a

ideia de superioridade do Japão.

Em meio a esta disputa, já se tornava quase impossível reverter os aspectos da oci-

dentalização, com um modelo de tradição tão arraigado. Todavia, se acentua a presença de

fortes movimentos contrários à ideia ocidental, (Cf. Ortiz, 2000, pp. 27-28), e a batalha sur-

gida neste período entre as culturas ocidental e oriental se mantém até os dias atuais, pare-

cendo-nos ser objeto de grandes diferenças, inclusive sociais. Qualquer contato com cultu-

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ras externas, sempre provocou ao país grande sofrimento. Exemplos como o contato com a

cultura Tang (618 – 907), período no qual a China atravessou uma fase de grande prosperi-

dade, inclusive com a descoberta do primeiro relógio mecânico, a bússola e a técnica da

impressão.

É interessante observar que, nesta época na Europa, os livros eram escritos manual-

mente e, na China, a impressão produzia vários exemplares de um mesmo livro. E com a

dinastia Ming (1368 – 1644), que solidificou na China a Marinha e o Exército, consolidando

um período de organização do governo e estabilidade social. Com a expansão da economia,

foi possível estabelecer comércio com os portugueses, espanhóis e holandeses, estendendo-

se até o Japão.

Também o Cristianismo sofreu modificações e adaptação, vivendo um período na

obscuridade, antes de vir à luz na Era Meiji. A introdução deste aconteceu por missionários,

professores cristãos e pelo Exército da Salvação.

Culturas como as que acima citamos, demonstram ser possível a permanência tão

longa de uma forma de governo que tem uma ascensão, uma permanência e uma queda em

meio a diferenças de contribuição para a subsistência do país, não levando em conta a feli-

cidade ou infelicidade do povo.

I.2 O fundador

Em meio a esta situação, nasce o fundador da Igreja Messiânica Mundial, Mokiti

Okada, em Hashiba, Assakussa, localizada às margens do rio Sumida, em 23 de dezembro

de 1882. (L.Oriente, 1982, p.73)

Hashiba, local estrategicamente importante durante a guerra, serviu de campo de

batalhas em muitas ocasiões. As pontes do rio mesmo quando destruídas eram reconstruídas

e vários ancoradouros ao longo do rio eram utilizados para carga e descarga. Em suas mar-

gens, era possível ver diversos casarões e lojas dos “bem afortunados”, à época. Ao cami-

nhar uma quadra para o interior, já se via a real pobreza do povo, em que as mulheres lava-

vam roupas à beira do rio, de quimono, lutando para sobreviver a cada dia.

A família do fundador era composta de cinco pessoas, sendo ele o filho mais novo.

Seu pai era um comerciante de objetos usados e eles moravam em uma casa simples de dois

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cômodos, onde em um, funcionava a loja de objetos. Distante cerca de 1 km ficava o Parque

Assakussa, local público criado na Era Meiiji, onde todas as noites seu pai montava uma

barraca.

A travessia de Hashiba – 1876

Quando não chovia, o pai de Mokiti carregava uma pequena carroça com objetos usados,

enquanto a esposa, com o filho (Mokiti) no colo, ajudava a empurrar o veículo. A cada noi-

te, se nada vendesse, não haveria o que comer no dia seguinte. Devido à miséria que enfren-

tavam, a mãe desnutriu-se e não possuía leite para amamentá-lo, tendo que recorrer ao leite

materno da esposa de um Bonzo (monge), de um templo budista. Vê-se aí a preocupação da

família em formar os filhos da melhor maneira, dadas as condições em que ela se encontra-

va.

Para Maturana:

“Há duas épocas ou períodos cruciais na história de toda pessoa que tem consequências fundamentais para o tipo de comunidade que trazem con-sigo em seu viver. São elas a infância e a juventude. Na infância, a cri-ança vive o mundo em que se funda sua possibilidade de converter-se num ser capaz de aceitar e respeitar o outro a partir da aceitação e do

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respeito de si mesmo. Na juventude experimenta-se a validade desse mundo de convivência na aceitação e no respeito pelo outro a partir da aceitação e do respeito por si mesmo, no começo de uma vida adulta so-cial e individualmente responsável”. (2009, p. 29)

No caso da família Okada, acentua-se nesta citação de Maturana, a preocupação da

mãe de Mokiti em alimentá-lo diante da pobreza pelo qual passavam, tornando-se uma

questão de sobrevivência. Acredita-se que este comportamento já demonstrava um desejo,

cuja finalidade era uma formação mais completa para ele.

Em janeiro de 1889, com a idade de seis anos, Mokiti ingressou na escola Nishi, é-

poca em que se valorizava a educação moral, e o livro adotado tinha o nome de “Lições de

Moral para o Primário”, editado pelo Ministério da Educação.

Ao final do curso primário, a situação econômica da família tornou-se um pouco

mais favorável e ele ingressou na Escola de Belas-Artes. Na época das estações primavera e

verão, a situação tornava-se melhor no Parque, pois as pessoas circulavam entre as barracas,

a olhar os doces, os abajures, enquanto as crianças brincavam. Já no inverno, tudo era bem

diferente. Quase não havia pessoas e o vento que soprava do rio era muito frio.

Com o passar do tempo, a família foi prosperando e no início da Era Meiji, a situa-

ção se modificara. A casa de penhores, estrutura que sustentava a todos da família, foi pro-

gredindo e passou a ocupar uma boa posição nos negócios. Entretanto, no ano de 1851, o

governo passou a controlar de forma mais acirrada a venda de antiguidades, e o bisavô de

Mokiti e chefe da família, Kizaburo, proprietário do comércio, necessariamente devia fazer

parte do sindicato dos penhoristas, tendo que inventariar seus bens. Conta-se que ele possuía

uma índole muito correta e esforçava-se para transmitir isso a seus familiares

Com a proposta de firmar novos horizontes ao país, o governo implementou conside-

rável valor às instituições escolares no século XIX. Em 1886, com a instituição do primeiro

gabinete no Japão, foram aprovadas diversas leis voltadas ao Setor Educacional. Entre elas,

a lei das Universidades Imperiais, a Lei das Escolas Primárias, a Lei das Escolas Ginasiais e

a Lei das Escolas para Formação de Professores. A partir dessa decisão, institui-se o sistema

de livros didáticos, sendo estabelecida a obrigatoriedade do ensino mínimo nas escolas por

oito anos.

Em 30 de outubro de 1890, um decreto imperial sedimentou o método de ensino em

nível nacional, que serviu de exemplo ao povo japonês até o final da II Guerra Mundial.

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No período em que o Japão despontava como um país de futuro (1877-1896), estabe-

leceu-se a estruturação do sistema de ensino como garantia para conduzir a nação ao pro-

gresso. Neste início da Era Meiji, diversas escolas públicas e particulares foram instaladas,

entre elas a Escola Primária Básica Nishin, particular, que foi a primeira escola frequentada

por Mokiti Okada. Nela, ensinava-se a leitura, a escrita e o fazer contas e as aulas eram mi-

nistradas em um templo budista.

Livros didáticos da época

À época, as circunstâncias eram muito difíceis, em que o professor utilizava um cô-

modo de sua casa como sala de aula, reunindo cerca de 50 alunos, em um espaço físico de

cerca de 25 metros quadrados. No livro adotado “Lições de Moral para o Primário”, na pri-

meira página, havia um provérbio do Raiki (antigo livro chinês), que dizia: “Se não lapi-

darmos a pedra, não teremos a vasilha; se o homem não estudar, não conhecerá o Caminho.”

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A mensalidade escolar era muito alta. As péssimas instalações das escolas da época eram

contrabalançadas com o esforço e sentimento dos professores, que procuravam influenciar

os alunos, por meio de sua personalidade.

Contudo, mesmo o ensino sendo obrigatório, observavam-se casos de pessoas que

não levavam seus filhos à escola por não terem condições de mantê-las, já que eles ajuda-

vam em casa, para a sobrevivência da família. Como as leis não eram aplicadas com rigor,

aqueles que não levavam seus filhos à escola por não valorizarem a educação, também não

eram punidos.

Mokiti foi transferido para a renomada escola pública denominada “Escola Primária

Assakussa”, que funcionava dentro do Templo Seigan e fora instaurada por especialistas em

Confucionismo, sendo uma das melhores escolas de Tóquio. Quando da transferência do

Fundador, motivada pela mudança de residência da família, a escola funcionava em um pré-

dio de dois andares, de tijolos. Para a época, esse espaço parecia soberbo.

A Escola Primária

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Sobre esta época, Okada escreveu: “Até os doze ou treze anos eu era uma criança

fraca e doentia e vivia tomando remédios. Consegui terminar o curso primário com muito

sacrifício e, apesar de minha pouca idade, sentia inveja quando via crianças saudáveis. Mas

era interessante como eu tinha bom aproveitamento na escola; sempre estava em primeiro

ou segundo, nunca ficando abaixo”. (s/d, p.104)

A convivência entre as pessoas que habitavam Assakussa era agradável e de apoio

mútuo, não sendo a situação financeira empecilho para dificultar este convívio.

Na cidade, havia diversos templos que ficavam próximos à zona de meretrício, não

sendo isso uma barreira para a existência de harmonia no local. O uniforme dos alunos, à

época, era quimono listrado com uma faixa azul-marinho arroxeado e avental azul-marinho

e tamancos ou sandálias de madeira. Os torneios esportivos eram disputados no pátio do

Pequeno Ueno, pois as escolas possuíam quadras muito pequenas.

Com a ausência de radio e TV, as crianças, quando chegavam da escola, encontra-

vam nas confeitarias da vizinhança alento e diversão. Ali, compravam, com suas pequenas

mesadas, doces e brinquedos baratos para brincar. Menino doente, o fundador, ao invés de

brincar, lia ou desenhava, sob a sombra do portão do templo.

Com a conclusão do segundo nível da Escola Primária de Assakussa, no período de

sete anos, Okada ingressou no curso ginasial. Poucos alunos prosseguiam o estudo, pois a

maioria deles começava a trabalhar logo cedo. Contudo, ele alimentava um sonho de ser

pintor e viver desta arte. Com o apoio do irmão mais velho, nascido dez anos antes dele,

ingressou no Curso Preparatório da Escola de Belas-Artes de Tóquio. Nessa época, a situa-

ção da família já era melhor. A duração do curso era de um ano e após, ingressava-se no

curso normal, com duração de quatro anos.

Com poucos meses de frequência à escola, o jovem começou a ter problemas nos

olhos. Passando a tratar-se em uma clínica oftalmológica e não tendo um diagnóstico defini-

tivo pelos médicos, abandonou a escola oficialmente. Por dois anos não obteve melhora

com o tratamento decidindo abandoná-lo. Em seguida, contraiu pleurisia e foi internado em

um hospital da Faculdade de Medicina da Universidade de Tóquio. Sendo o tratamento gra-

tuito, o paciente precisava servir como experimento aos alunos.

Após se recuperar totalmente e viver durante algum tempo com saúde, foi-lhe diag-

nosticada tuberculose de terceiro grau. Nesta época, Mokiti tinha dezoito anos e sem espe-

rança de cura. A partir do resultado apresentado pelo médico, decidiu que precisava encon-

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trar algum método de recuperação da saúde. Como estava melhor da visão, pintava quadros

e pesquisava em livros. Em um destes, encontrou o método que se tornou a causa de sua

recuperação total, vindo a transformar sua alimentação, substituindo os alimentos de origem

animal por vegetais. É curioso porque a resposta a esse seus sofrimentos ele encontrou em

um velho álbum, onde havia gravuras e descrições sobre plantas medicinais.

Ao atingir a maioridade, aos vinte anos, mesmo bem melhor de saúde, ainda tinha o

corpo físico bastante sensível. Como desejava muito abrir uma loja de antiguidades junta-

mente com seu pai, começou a fazer pesquisas e a observar objetos usados. Nesse período,

Mokiti resolveu dedicar-se à arte de “maki-e” (artesanato em laca), com o propósito de ex-

por as obras de sua autoria na loja que sonhava comprar. Expostas em uma exposição de

belas artes, em Ueno, todas foram vendidas com sucesso. Sendo grande apreciador de arte,

saía com sua mãe indo ao teatro e ao cinema. Isso aconteceu por volta de 1896, quando o

Japão importou o cinema.

Por incentivo do governo, desde a restauração Meiji, o sucesso e o poder passaram a

ser valorizados de forma surpreendente, tendo tais metas se tornado comum ao povo, inclu-

sive surgindo uma revista chamada “Seiko”, cujo significado da palavra é sucesso. Okada,

sentindo-se melhor, passou a dedicar-se à leitura pesquisando principalmente livros que

descreviam a vida de homens de sucesso nos negócios.

Mokiti comentava com a família: “Quando eu subir na vida, vou ajudar os que estão

em dificuldades, pois quero acabar com as pessoas que perturbam a sociedade. É uma ideia

que não sai da minha mente”. (s/d, p. 133)

Entre as leituras favoritas de Mokiti estavam os jornais, um dos principais meios de

acesso à realidade, dentro e fora do país ilha. Entre os jornais publicados, havia um chama-

do “Yorozu-tyohõ” (jornal matutino), que assustava uma boa faixa de pessoas de nível soci-

al superior da sociedade, pois criticava e mostrava fatos ilegais. O diretor desse jornal influ-

enciou muito a vida de Okada, a ponto de ele, mais tarde, interessar-se em administrar um

jornal cuja finalidade era a justiça social. Leitor de filosofia ocidental, encontrou em Henri

Bergson e William James, modelos de identidade com o seu pensamento. Para ele, o “prag-

matismo”, de James e a “filosofia da vida”, de Bergson eram teorias necessárias à vida prá-

tica, sem as quais não era possível viver.

Sobre o Pragmatismo, Mokiti Okada assim escreveria, em 1949:

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“Na mocidade, apreciei muito a Filosofia. Entre as inúmeras teorias fi-losóficas, a que mais me atraiu foi o pragmatismo, do famoso norte-americano William James (1842-1910). [...] O benefício que o pragma-tismo me proporcionou naquela época não foi pequeno. Mais tarde, quando iniciei meus trabalhos religiosos, julguei necessário aplicá-lo à Religião. Isto significa ampliar o campo religioso de modo que abranja a vida em geral. Então, o político não cometeria injustiças, porque, vi-sando a felicidade do povo, promoveria uma boa administração, granje-ando assim, a confiança de todos. O industrial obteria a admiração da coletividade, pois exerceria a profissão honestamente; seus negócios progrediriam com segurança, porque ele mereceria a estima de seus em-pregados, que seriam fieis no trabalho. O educador seria respeitado e te-ria notável influencia sobre seus discípulos, educando-os com bases só-lidas. Os funcionários e os assalariados em geral subiriam de posição, porque a Fé produz bom trabalho. A alma do artista irradiaria de suas obras, com grade elevação e força espiritual, exercendo influencia bené-fica sobre o povo. O ator, no palco, manifestaria nobreza, porque suas representações seriam baseadas na Fé, e os espectadores receberiam o reflexo de seus sentimentos elevados”. (MEISHU-SAMA, 2000, p. 411)

Em outro momento, em 1951, ele discorre:

“Dizem que pragmatismo significa utilidade pratica: creio, entretanto, ser mais adequado aplicar o termo “ativismo” [ ...] Quando falamos em ativismo religioso, temos a impressão de que todas as religiões estejam praticando ações de Fé. Todos conhecem propagandas por escrito, ser-mões verbais, orações, cultos, rituais religiosos, ascetismo e mortifica-ções; infelizmente, porem, as religiões ainda não atingiram a vida prati-ca. Em verdade, não passam de cultura mental. O pragmatismo filosófi-co introduz a Filosofia na vida pratica, acentuando, neste ponto, o cará-ter americano. Pretendo fazer o mesmo, com uma diferença: fundir a Religião e a vida prática, tornando-as intimas e inseparáveis. (idem, p. 412-413)

Sobre Bergson (1859 – 1942), ele diz:

“Segundo minha interpretação, a filosofia de Bergson baseia-se nestes três princípios: “Todas as coisas se movem”, “Teoria da Intuição” e “O eu do momento”. Dentre eles o que mais me impressionou foi a “Teoria da Intuição”, a qual diz o seguinte: “É algo dificílimo ver as coisas exa-tamente como elas são, captar seu verdadeiro sentido, sem cometer o mínimo engano.” Estudemos o porquê dessa afirmativa. Os conceitos formados ela instrução que recebemos, pela tradição, pelos costumes, etc., ocupam o subconsciente humano formando como se fosse uma bar-reira, e dificilmente o percebemos. Tal “barreira” constitui um obstácu-lo quando observamos as coisas. Quando dizemos, por exemplo, que to-das as religiões novas são supersticiosas, heréticas ou falsas, devemos

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esse julgamento a “barreira”, que está servindo de estorvo. A “Teoria da Intuição” encarrega-se de corrigir tais erros, comuns entre os homens. Libertando-os, completamente, de preconceitos, ela os ensina a fazerem uma fiel observação dos fatos. Para isso é necessário ser “o eu do mo-mento”, isto é, fazer com que a impressão instantânea, captada pela in-tuição, corresponda à verdadeira substancia do objeto de observação. O outro principio – “Todas as coisas se movem” - significa que tudo está em eterno movimento. Por exemplo: nós não somos os mesmos de on-tem, nem mesmo o que fomos há cinco minutos atrás; o mundo de on-tem não é o mesmo de hoje. Isso abrange também a sociedade, a civili-zação e as relações internacionais. Esta é a teoria de Bergson aplicada ao campo religioso.” (idem, 2000, pp. 407-408)

Com o falecimento de seu pai, o sonho de comprar a loja de penhores desvaneceu-se.

Um dia, surgiu a oportunidade de ele comprar uma loja de miudezas e, incentivado por sua

mãe, o fez. Denominou a loja de “Korin-do”, homenagem ao célebre pintor japonês e colo-

cou suas obras à venda. Com o sucesso desta e o aumento do movimento na loja, ele preci-

sou contratar mais uma pessoa para ajudar.

Tudo caminhava bem até o acidente em que ele cortou o nervo do dedo indicador da

mão direita e não pode mais trabalhar em maki-ê. Apesar disso, com o progresso da loja, ele

precisou mudar-se para um espaço maior.

Como era muito honesto, trabalhador e solteiro começou a receber propostas para

casar-se. Em 1907, com vinte e quatro anos, casou-se com Taka (dezenove anos). Ela fora

criada por negociantes de arroz e tornou-se grande colaboradora de Mokiti. Em dez anos,

ele tornou-se grande fabricante atacadista de miudezas. O grande sucesso da loja devia-se

às novas propostas e aos objetos negociados. Dizia-se que a moda partia da loja Okada.

Em 1912, faleceu sua mãe, vítima de nefrite, e um novo sofrimento se abate sobre

ele, que via na mãe, uma grande incentivadora. Ainda com a saúde frágil, contrai várias do-

enças, entre elas a que mais o fez sofrer foi a dor de dente que contraiu entre 1914 e 1916.

Eram dores horríveis e insuportáveis, para a qual dentista algum conseguia apresentar solu-

ção. A cura veio por intermédio de um sacerdote da religião Nitirem, que usou um método

desconhecido, resolvendo seu problema.

Com o sucesso nos negócios, a loja Okada foi adquirindo consolidação e respeito,

passando a negociar com empresas de renome.

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Foi nesta época que Okada patenteou um adorno de cabelo que denominou “Diaman-

te Assahi”. Era feito de material simples e barato e o espelho que continha nele, brilhava de

acordo com a luz ambiente. Tal foi o sucesso e os pedidos de todo o país, que a Loja Okada

não dava conta de atendê-los. Então, Okada lança no mercado outro adorno chamado “Pente

Bright”, que obteve o mesmo sucesso do anterior.

Adorno Diamante Assahi

Como homem de negócios, Okada cada vez mais se firmava diante da sociedade ja-

ponesa. Ele não só visava ao mercado interno, como também ao externo, trabalhando inces-

santemente para atender aos pedidos feitos. Na época, dez países tornaram-se compradores

do adorno, inclusive o Brasil.

Com a ocidentalização do Japão, Okada, mantendo-se sempre atualizado, tornava

seus negócios a cada dia mais prósperos, seguindo a filosofia bergsoniana, que ensinava a

importância de se estar sempre atualizado. Os empregados começaram a receber comissão e,

valorizando a empresa, tinham desejo de permanecer ali.

Até próximo dos quarenta anos, Mokiti era ateu, embora acreditasse que o homem

era um ser que precisava de ídolos para adoração e, por isso, ia aos templos para algumas

cerimônias religiosas; por exemplo, em homenagem aos mortos. Contudo, durante as ceri-

mônias, costumava cochilar.

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Para ele, países que possuíam muitas igrejas apresentavam uma decadência, como a

Itália, por exemplo. Ao contrário, países como os Estados Unidos alcançavam grande suces-

so. Mesmo agnóstico, ele contribuía periodicamente com o Exército de Salvação. Questio-

nado por não ser cristão e praticar tal ato, ele respondeu: “O Exército da Salvação ajuda os

ex-presidiários a se recuperarem, transformando homens maus em homens de bem. Por con-

seguinte, se ele não existisse, um ex-presidiário poderia entrar em minha casa para me rou-

bar. Uma vez que ele me livra desse perigo, é natural que eu me sinta agradecido e colabore

com as suas atividades”. (s/d, p. 212)

Com a eclosão da I Guerra Mundial, muitos países europeus sofreram grandes danos.

Para atender suas necessidades, passaram a comprar produtos industrializados dos Estados

Unidos e do Japão, elevando a economia a um patamar bastante alto. Todavia, com o térmi-

no do conflito, a situação tornou-se muito instável. As denúncias de corrupção de militares e

políticos eram constantes, desestruturando e dissolvendo o gabinete do então Primeiro-

Ministro.

Na ânsia de apoiar e de ver melhorar a situação pelo qual o país atravessava, Okada

decidiu juntar dinheiro para fundar um jornal que servisse de veículo de informação do po-

vo.

Em meio a uma vida favorável, Mokiti começa a ver sua vida desmoronar e perde,

de uma só vez, os três filhos e a esposa. Para acumular o valor necessário para a fundação

do jornal, ele aplica o dinheiro que possuía no mercado de ações. Em seguida, o banco que

protegia o negócio faliu repentinamente e tiveram início vinte e dois anos de luta para saldar

as dívidas. Com a perda da família, Okada sentiu necessidade de casar-se novamente e des-

posou Yoshi Ota, que mais tarde se tornou a Segunda Líder Espiritual da Igreja Messiânica

Mundial. Na busca de solução para os negócios, ele, que acreditava ser o homem autossufi-

ciente, bastando viver corretamente, começa a pesquisar as religiões, à procura de respostas

a seus sofrimentos, já que não obtinha racionalmente esclarecimentos para suas perguntas.

Após a Primeira Guerra Mundial, desenvolvia-se, em Tóquio, um intenso movimento

social, mas os movimentos espirituais também estavam sendo bastante ativados. À noite, em

lugares diversos do bairro de Kanda, o Exército da Salvação batia seus tambores; no Tem-

plo Rinsho-in, o dirigente Sugawara, do Templo Kentyo-ji, fazia as pregações nas sessões

de Zen. No edifício Central Budista, todas as noites ouvia-se um sermão. Pode-se chamar de

época próspera para a religião. (Cf. Yamada, 2004, s/p.)

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À procura do caminho da salvação, é provável que o Fundador tenha participado des-

sas reuniões, atento ao que nelas se pregava. (FMO-MOA, s/d, p. 232-233).

Em 1920, converteu-se à religião Oomoto, atraído pela proposta de reformulação do

mundo. Com o sofrimento causado pela morte inesperada de seu sobrinho favorito, afastou-

se da religião, retornando depois de três anos, com o propósito de conhecer mais sobre fe-

nômenos do mundo espiritual.

A loja Okada, que se tornara sociedade anônima, com a crise dos Estados Unidos,

começa a se recuperar com a ajuda dos funcionários. Entretanto, em 1923, um grande ter-

remoto ocasionou danos à loja, sendo que o pior viria com o grande incêndio posterior a

esse terremoto, que matou cinquenta mil pessoas e destruiu mais de quatrocentas mil casas.

Diante de tantas crises, Okada se aprofunda nas pesquisas parapsicológicas e em lei-

turas de livros que discutiam a relação Deus e o homem. Entre os autores lidos, encontram-

se Sir Oliver Lodge e J.S.M. Ward. Por volta de 1924, começaram a acontecer fatos misteri-

osos em sua vida. À medida que passava a compreender mais sobre o livro sagrado da reli-

gião Oomoto, o Ofudessaki, mais se conscientizava de que havia nascido com um destino

incomum.

Em 1926, a luta pela hegemonia política do país retratava a preocupação com a segu-

rança nacional. Qualquer manifestação contra o “espírito nacional” era tratada com extremo

rigor. Nessa época, o imperador Hiroito assume o trono e tem início a Era Showa (1926-

1989), que quer dizer “paz luminosa”. Os mais diferentes problemas agitavam a nação: polí-

tica instável, economia abalada; uma parte do povo interessada em abrir as portas ao Oci-

dente; outra parte, negando esta abertura.

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Livros de Pesquisa Parapsicológica

Para assegurar a supremacia japonesa, o regime militar nacionalista tomou posse do

governo. Paralelamente, o xintoísmo reaviva os rituais de cultos à ancestralidade na busca

de perpetuar o sentimento dos tempos passados. É criado o Conselho de Pesquisa dos Ritu-

ais Xintoístas e o dia da Nova Ásia, com o objetivo de enaltecer o prestígio japonês, diante

de outras nações orientais. Nesta época, Mokiti Okada vivencia uma experiência em estado

de transe, que se prolonga por três meses e escreve cerca de trezentas a quatrocentas folhas

de papel, nas quais constavam previsões. Estes documentos, em função das perseguições às

religiões novas e estrangeiras, precisaram ser queimados. Qualquer ideia que pudesse pare-

cer nova, era vista com muita desconfiança. Em 1928, ele deixa parcialmente a direção da

loja Okada, para dedicar-se às suas pesquisas. Na Oomoto, atingiu cargos de grande confi-

ança e cada vez mais se aprofundava seus estudos.

A loja Okada, movida por sérios problemas financeiros, ia cada vez mais perdendo

seu brilho da época áurea, e levou Okada a perceber que chegava o momento de ele passar a

desenvolver seu trabalho unicamente como religioso.

I.3 O nascimento da Igreja Messiânica Mundial

Entre 1929 e 1930, o fundador Okada começou a dedicar-se à caligrafia e à pintura, a

pedido dos seguidores, apesar das dificuldades da época, como forma de fazer chegar sua

mensagem aos locais mais distantes.

Em 1931, abandona totalmente os negócios e passa a dedicar-se exclusivamente à re-

ligião.

No dia 15 de junho deste mesmo ano, Mokiti Okada subiu o Monte Nokoguiri, a-

companhado de vinte e oito seguidores, e, ao atingir o cume, voltados para o Leste, entoa-

ram a oração Amatsu Norito. No seu entender, mais tarde, compreende que este é o momen-

to em que Deus atribui a ele uma missão especial através da revelação. A seguir, a oração:

ORAÇÃO AMATSU-NORITO Taka ama hara ni kan zumari massu Kamurogui Kamuromi-no-Mikoto motite Sume mi oya Kamu Izanagui-no-Mikoto Tsukushi no himuka no tati hana no odo no awagui hara ni

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Missogui harai tamou toki ni nari masseru Haraido no O okami tati Moro moro no maga koto tsumi kegare o Harai tamae kiyome tamae to maossu koto no yoshi o Amatsu Kami Kunitsu Kami yao yorozu no Kami tati tomo ni Ame no futikoma no mimi furi tatete kikoshi messe to Kashikomi kashikomi mo maossu. MIROKU O OMIKAMI mamori tamae saki hae tamae (bis) OSHIE-MI-OYA-NUSHI-NO-KAMI mamorri tamae saki hae tamae (bis) Kan nagara tamati hae masse (bis)

Tradução da Oração Amatsu-Norito

No elevado e santo Reino dos Céus habitam Os divinos seres Kamurogui e Kamuromi, em palavras confiamos nosso primeiro ancestral na foz estreita de um rio agitado coberto por árvores permanentemente frondosas na região Sul, Estava se purificando com água, ao mesmo tempo em que os espíritos divinos de purificações estavam nascendo. A eles nos pedimos que todo o mal, todos os erros e impurezas sejam dissipados. Nós, o mais humildemente pedimos que eles sejam dispersados e purificados. Nós rogamos a vós, seres divinos, para que ouçam nossas preces, juntamente com todos os seres divinos do céu e da terra e todas as multidões de seres espirituais inferiores. Assim como os cavalos mosqueados (malhados) no céu erguem suas orelhas ao menor som Vós também presteis atenção às nossas orações. Grandioso Deus da Luz! Protegei-nos e abençoai-nos com felicidade Suprema. Nosso venerado pai espiritual, Meishu-Sama! Protegei-nos e abençoai-nos com felicidade Suprema.

Quando Okada, então agnóstico, se aproxima da religião Oomoto, o faz para buscar

respostas aos inúmeros sofrimentos pelos quais vinha passando. As explicações que encon-

trou respondiam suas perguntas e vinham ao encontro do que ele começara a questionar, há

muito: o porquê do sofrimento do homem. A filosofia da religião Oomoto por ser simples,

atendia às suas necessidades da época, tendo lições como:

a) A necessidade de amar a Deus; b) O reconhecimento da existência do mundo espiritual; c) A precedência do mundo espiritual sobre o mundo material; d) A importância de ter uma vida baseada no amor, na fraternidade e na justiça;

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e) A reforma do mundo.

Meishu-Sama e a caligrafia

À medida que aprofundava seus conhecimentos, dentro da organização ia alcançando

destaque e elevando sua posição hierarquicamente, tornando-se chefe da filial em Oomori,

Tóquio.

No entanto, com o tempo, Okada começou a sentir necessidade de aprofundar mais

ainda seus conhecimentos. Um fato que contribuiu para o seu afastamento foi que, na Oo-

moto, só o fundador ou seu sucessor podiam escrever e confeccionar amuletos, considerados

sagrados, para serem entregues aos membros filiados. Contudo, Okada começou a fazê-lo

em sua filial, acarretando problemas com alguns diretores da Oomoto. Chamado pelo co-

fundador Onisaburo, foi-lhe orientado ser mais discreto em suas atitudes.

Em 1934, ele se afasta da religião Oomoto e, em 1935, esta sofre sua mais forte cri-

se. Sob ordem do Ministério dos Negócios Internos, a sede foi totalmente destruída e dis-

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solvida sua formação, tendo a segunda líder e seu esposo ficado aprisionados por seis anos e

oito meses.

Neste mesmo ano, Okada alugou um sobrado, iniciando ali a obra que mais tarde se

tornaria a Igreja Kannon do Japão. Situava-se no centro da cidade imperial e o tratamento

chamava-se tratamento espiritual de digitopuntura no estilo Okada (pressão com os dedos).

Houve necessidade de utilizar essa denominação, pois permanecia forte a vigilância das

autoridades policiais em relação a qualquer nova manifestação religiosa. Já na primeira oca-

sião, quando ele fez a distribuição de folhetos apresentando o tratamento, surgiram proble-

mas junto à polícia local, que o chamou para prestar esclarecimentos, tendo sido o caso en-

cerrado. O tratamento consistia em pressionar com as pontas dos dedos o local doente na

pessoa, enquanto se fazia oração por sua recuperação, que ele chamava de “processo de cura

por meio do Espírito Divino”.

Continuando seu trabalho como preparação para fundar a Igreja Messiânica Mundial,

em um texto, Okada diz:

“O Tratamento Espiritual de digitopuntura no Estilo Okada, iniciado por mim, é uma decorrência da sensibilidade espiritual que repentina-mente me foi atribuída há oito anos por Kannon, o qual me deu um grande poder para curar todo e qualquer tipo de doença. Objetivando cumprir a tarefa de corrigir os erros do mundo e salvá-lo, durante estes anos vim aplicando esse poder nos mais variados tipos de doentes, em número superior a mil. Os resultados alcançados foram verdadeiramente surpreendentes: as enfermidades mais sérias, os casos mais graves, co-mo milagres de Deus, foram completamente curados. (...) Instalei um centro terapêutico em Koji, no centro da cidade imperial, e almejo al-cançar o meu objetivo de salvar o mundo”. (1984, p. 363)

Em 4 de dezembro de 1935, em meio aos preparativos para a fundação da Igreja, es-

creve uma oração chamada “Zenguen-Sandji” (Oração de Louvor), que exalta as caracterís-

ticas de um mundo novo profetizado por ele. Segue a oração:

ORAÇÃO ZENGUEN-SANDJI

Uyauyashiku omonmiruni.

Sesson Kanzeon Bossatsu

konodoni amorasse tamai

Komyo Nyorai to guenji

Ooshin Miroku to kashi

Gusse no mikami to narasse tamaite

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Daisen sanzen sekai no sandoku o me'shi gojoku o kiyome.

Hyakusen man oku i'sai

shujo no dai nengan.

Komyo joraku eigo no jupo sekai o nara shimete

Gofu jiuuno kuruinaku

Fukukase edamu narassu inaki

Miroku no myoo umitamoo

Muryo muhen no daidihini, tenmarasetsumo matsuroite.

Shoaku jahouwa aratamari,

Yasha ryudinmo guedatsu nashi

Shozen bushin kotogotoku

sono kokorozashio toguru nari

Sansen somoku kotogotoku

Sesson no itokuni nabikaite

Kinjutyugyo no suemademo

mina sono tokoroo ezarunashi

massani kore shibi jísso sekainite. Karyobingawa sorani mai

zuiuntenni tanabikeba.

Banka fukuikutini kunji

tahoo bu'to sossori tati.

Hitidoo garanwa kassumi tsutsu koganeno iraka sansanto

hini terieizu koukeiwa,

guenimo tengoku jodo nari.

Gokoku minorite kurani miti

sunadori yutakani amegashita,

iketoshi ikeru moromoro no

eragui niguiwau koegoewa

tsutsu uraurani mitiwatari.

Kunito kunitono sakainaku

hito gussa tatino nikushimiya.

Isakaigoto mo yumeto kie

í'tenshikai oshinabete

jinjino mimuneni idakaren.

Wareraga hibino segyounimo

myotio tamai shinkakuo

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essashime iewa tomissakae.

Yowaiwa nagaku muiyakuni

zentoku koo kassane sasse

fukujukai muryono daikudoku. Taressasse tamae mashimasse to

nennen jushin guezatonshu

kifuku raihai negui moossu.

Miroku Oomikami

mamoritamae sakihae tamae

Miroku Oomikami

mamoritamae sakihae tamae

Oshiye Miyoia nushino kami

mamoritamae sakihae tamae

Oshiye Miyoia nushino kami

mamoritamae sakihae tamae

Kannagara tamatihae mase

Kannagara tamatihae mase

Tradução da Oração Zenguen-Sandji

Meditemos com reverência no Senhor Bodissatwa Kannon que, ao descer do céu à

terra em Komyo Nyorai, transformou-se a seguir em Ooshin Miroku e posteriormente em

Messias. Salvar a todos os seres vivos é o Seu sublime anseio expurgando dos três mundos

os três venenos e as cinco impurezas, para que a luz e o júbilo eterno para sempre se insta-

lem em todos os cantos do mundo. No reino de Miroku gerado por Kannon a desordem não

existe.

Venta a cada cinco dias, chove a cada dez e a brisa é tão suave que nem os galhos

farfalham.

Com Sua grandiosa, infinita e ilimitada misericórdia, que até aos demônios celestes

e aos diabos induz a Lhe prestarem obediência, Ele extingue os vários males e anula as leis

malignas, libertando igualmente os Yashas e os Dragões.

Todos os santos homens, os Budas e os Devas podem, assim, cumprir as suas mis-

sões.

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Os rios e montanhas, as plantas e as árvores recebem copiosas graças de Kannon.

As aves, os animais, os insetos e os peixes podem viver plenamente a sua vida, cada

qual ocupando o seu exato lugar. E o mundo assume, então, o seu verdadeiro aspecto. Por

entre as nuvens de bom presságio a estender-se pelo firmamento voa a ave do paraíso sobre

a terra perfumada na qual milhares de flores exalam a sua fragrância.

Ladeada de grandes templos obnubilados pela distância destaca-se a torre sagrada

com seus muitos tesouros, em cujos telhados de ouro refulgem os raios do sol. Tal é a pai-

sagem do reino dos céus no solo purificado. Fartas colheitas de cereais abarrotam os arma-

zéns, a pesca é abundante e as vozes de todos os seres vivos elevam-se animadas para o céu.

Desapareceram, como por encanto, as divisas entre os países, os ódios e motivos de

disputa entre as raças humanas e a humanidade é abraçada pelo misericordioso peito de

Kannon. O verdadeiro despertar da sabedoria divina é praticado em nosso trabalho cotidia-

no.

A família prospera acumulando atos virtuosos e tem a sua vida prolongada sem re-

médios ou medicamentos.

Concentrado, de todo o coração, de cabeça baixa e corpo curvado, peço humilde-

mente que tais bênçãos chovam do céu, formando um mar de ilimitada bem-aventurança.

Assim seja.

No início de 1935, ele recebeu a qualificação de sacerdote xintoísta, depois de estu-

dar a doutrina e seus rituais, assegurando um título religioso oficial, na tentativa de acaute-

lar-se contra as autoridades, que mantinham o rigoroso controle sobre as novas religiões.

Em 1º de janeiro de 1935, funda a “Dai Nipon Kannon Kai” (Igreja Japonesa de Kannon),

que possuía um estatuto composto de onze artigos, dentre eles:

I. A presente organização tem o objetivo de participar e trabalhar pra a grande obra

de construção do Mundo Luz, desejo de Kannon.

II. A presente tem sua sede provisória no bairro de Koji, quadra 1, no. 1, Distrito de

Koji, na cidade de Tóquio.

III. A presente terá um presidente, dois vice-presidentes, alguns conselheiros, um di-

retor executivo, alguns diretores, e um secretário acumulando o cargo de tesou-

reiro.

À época, ele inaugura quatro filiais e com a grande movimentação e trabalho a

partir da inauguração, começa a ser publicado um jornal chamado Luz do Oriente, com tira-

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gem de três mil exemplares, e uma revista chamada Mundo de Luz, com tiragem de duzen-

tos exemplares. Esse material começa a ser distribuído e vendido de porta em porta por seus

discípulos.

Dentre as novas propostas, ele muda o nome de tratamento para Terapia Japonesa e

publica um livro chamado “Apostila da Terapia Japonesa”, com muita cautela, diante das

autoridades policiais, que não permitiam a fundação de novas religiões. Com isso começa a

capacitar pessoas para a aplicação do método de cura. O curso durava uma semana e era

composto da leitura da apostila e da prática da terapia que foi se modificando, posteriormen-

te recebendo o nome de johrei. Ao concluir o curso, a pessoa recebia um talismã e a qualifi-

cação de terapeuta.

A formação dos primeiros terapeutas, que mais tarde se tornaram os missionários

responsáveis pela difusão da igreja, foi feita pelo próprio fundador e constava de sete aulas,

chamada de curso sobre a Doutrina de Kannon Kai. Com a expansão da igreja, houve neces-

sidade de um espaço maior e, em 10 de outubro de 1935, foi inaugurada a Sede Geral da Dai

Nipon Kannon Kai. Nesta época, o número de fiéis era de seiscentas pessoas e o número de

filiais, onze.

Com o aumento da pressão sobre as religiões Oomoto, Igreja Hito No Miti, Tenri

Hon’ Miti pelas autoridades, era necessário muito cuidado. Nesta ocasião, Okada foi cha-

mado à delegacia para prestar depoimento, tendo ficado varias horas sob intenso interroga-

tório.

Preocupado por conciliar a religião e a técnica medicinal, Okada fundou em 15 de

maio de 1936, a Dai Nipon Kenko Kyokai, com o propósito de separar uma e outra. Esta

nova instituição passou a cuidar do aspecto da saúde e seus membros pagavam “50 sen”,

como taxa de matrícula e mensalidade de “70 sen”.

Com a intensificação da pressão, Okada resolveu pôr um fim aàDai Nipon Kannon

Kai e devotou seu empenho à nova instituição. Deu início a um curso chamado “Curso Es-

pecial de Verão”. Nele era desenvolvida a técnica para tratamento de doenças no Estilo O-

kada. Pressionado pela polícia, que determinou uma ordem de proibição da prática de trata-

mento, tendo que responder a outro interrogatório, parcial e brutal, Okada sai da prisão um

dia depois de ser preso.

Em outra ocasião, Okada foi aprisionado por dez dias, e seu assessor Nakajima Issai,

por oito dias. O motivo real deste aprisionamento era investigar a relação da figura do fun-

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dador com a religião Oomoto. Nessa fase, em revista feita à sua residência, os livros encon-

trados, quadros, documentos da Oomoto, serviram como prova e foram levados à delegacia.

Sem renda, Okada começou a acumular muitas dívidas, tendo que se desfazer de sua casa,

para sustentar a família e seguidores.

Novamente, ele modifica o nome da instituição para Kannon Hyapuku Kai, no Ho-

zan-So, com a finalidade de afastar-se do aspecto religioso. Isso ocorreu em 1936. Aí, passa

a desenhar cem imagens de Kannon e a vendê-las por 50 ienes cada uma, afirmando, dessa

maneira, a expansão da Igreja Messiânica, por meio da arte.

Como o Hozan-So (Solar da Montanha Preciosa) tornou-se pequeno por conta de

muitos seguidores que ali ficavam, ele decidiu construir uma casa e a chamou de Solar da

Contemplação do Monte Fuji. Nesse local, sob forte vigilância da polícia, ele conversava

com seus discípulos. Neste mesmo ano, uma autoridade do Exército o procurou e pediu aju-

da para sua filha doente. Como ele constatou a recuperação da criança, empenhou-se junto à

Secretaria de Saúde do Ministério dos Negócios Internos, ao Superintendente Geral da Polí-

cia Metropolitana e outras autoridades, e, em outubro do ano seguinte, conseguiu autoriza-

ção para funcionamento do tratamento. A exigência da polícia voltou-se para que Okada

escolhesse entre religião e tratamento. Como método de trabalho, ele optou pelo último,

retomando a atividade, com o nome de “Tratamento de Digitopuntura no Estilo Okada”.

Assim transcorria o ano de 1937, época em que a opressão como fenômeno concreto

e histórico marcava fortemente a vida das pessoas, principalmente daqueles que estavam

direcionados a novas proposições. Sendo assim, parecia mais seguro para todos identificar o

trabalho como tratamento.

Muitas foram as pessoas da sociedade que, passando a conhecer o método, se filia-

ram ao fundador, vivenciando experiências a partir de sua própria prática. Embora a vigi-

lância permanecesse acirrada, os seguidores do Mestre Okada arriscavam-se na tentativa de

levar bem-estar a um maior número de pessoas.

O ritmo desenvolvido por ele era muito intenso e preocupava sua esposa. Com o au-

mento do número de pessoas que passaram a frequentar a casa do Fundador para receberem

o tratamento em busca de solução para seus problemas, o círculo de vigilância se fechou,

levando mais uma vez Okada à prisão. Nos anos seguintes, a pressão por parte do governo

tornou-se ainda mais forte, tendo sido criados grupos denominados “grupo de vizinhos”

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(organização de apoio a vizinhos). Estes, controlados pelas autoridades, tinham domínio

maior

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sobre a sociedade e outra vez Okada foi aprisionado. Diante dessa situação, ele foi obrigado

a encerrar suas atividades e, em 1º de dezembro de 1940, finaliza seus trabalhos. Como era

muito bem visto por pessoas influentes, à medida que estas chegavam para receber o johrei,

ele se desculpava, dizendo: “No momento, minhas atividades estão suspensas, e por isso não

posso fazer tratamentos. Se quer mesmo que eu faça, obtenha a permissão da Polícia Metro-

politana e eu o atenderei a qualquer hora.” (Fundação M. Okada, 1982, p.108)

Depois de algum tempo, foi autorizado a ele ministrar johrei a um pequeno grupo de

pessoas, todas do alto escalão político e social do Japão.

Com o passar do tempo, o fundador declarou que deixaria de exercer a terapia, dele-

gando-a a seus discípulos, passando a se empenhar na arte da caligrafia e na formação de

terapeutas. Aqueles que tinham interesse de se filiar, recebiam um símbolo de papel que

continha escrita a palavra “Komyo”, escrita por Okada. Para evitar constrangimento junto à

polícia, o talismã era chamado de “lembrança”. Os meios usados nessa época para encontros

do fundador com seus seguidores eram reuniões feitas em restaurantes, comemorando datas

especiais.

Em 1935, Okada, que já vinha apresentando a importância de uma alimentação sau-

dável por meio de um novo método agrícola, passou a auxiliar os agricultores, ensinando-

lhes o cultivo de produtos. A tentativa de ajudá-los naquela época era grande, pois o sofri-

mento pelo qual passavam condoía seu coração. Ele mudou-se para uma casa onde havia

um grande terreno, onde passou a cultivar alimentos, cuja finalidade era suprir as necessida-

des da família e servidores, já que a situação era extremamente difícil.

Ele iniciou o método de plantação utilizando agrotóxicos e fertilizantes e percebeu

pouco resultado. Decidiu optar pela não utilização do adubo, notando que, apesar de mais

tempo, foram obtidos melhores resultados. Em meados de 1944, acumulando diversas expe-

riências a partir da não utilização de fertilizantes, Okada obteve excelentes resultados, cons-

tituindo a partir daí, o método da Agricultura Natural, assim chamado a contar de 1950.

Mokiti Okada também administrou uma mina de tungstênio e como ela precisava de

um capital grande, havia uma dúvida dos fiéis para saber qual o motivo deste investimento.

Dizia ele ser necessário, em virtude da importância de adquirir fundos para a obra que de-

senvolveria.

Do ano de 1941 até 1943, ele viajou muito levando junto sua esposa, o secretário,

num total de dez pessoas. Nesse período, publicou o livro “A medicina do futuro”. Em se-

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guida, publicou “O problema da tuberculose e a sua solução”, tendo o primeiro sido proibi-

do em 1944, pela polícia. Como o trabalho de divulgação da igreja se intensificou, aumen-

tou também a vigilância policial nos locais onde se ministrava o johrei. Mesmo assim, em

meio à guerra, Okada começou a procurar um local para morar e solidificar as bases da ex-

pansão de seu trabalho missionário. Encontrou na cidade de Atami e Hakone, locais ade-

quados para se estabelecer, com uma natureza muito bela.

Com o término da guerra e a liberdade de culto, as religiões puderam se desenvolver,

desde que respeitassem a ordem pública e os bons costumes. Começa uma política que sepa-

ra o governo da religião e é criada a “Lei das Pessoas Jurídicas de Natureza Religiosa”,

pondo um fim às perseguições religiosas. Com isso, diversas religiões surgem no cenário

nacional japonês.

Era visível a diferença entre a época anterior à guerra e a posterior, observando-se a

rápida mudança que ocorreu no país em tão pouco tempo. Porém, a mentalidade tradicional

permanecia a mesma, trazendo para a atualidade métodos e conceitos antigos.

Okada aguardou durante dois anos a lei se consolidar e a liberdade religiosa se fir-

mar, de acordo com a nova Constituição de 1947.

Ao reformular mais uma vez o sistema, ele faz surgir a Nipon Joka Ryoko Fukyu-kai

(Associação de Divulgação de Terapia Japonesa de Purificação), na qual ocupa a função de

Presidente. Com a expansão da associação por todo o país, aparecem alguns insatisfeitos e

com isso surgem problemas com a polícia, pois ainda havia perseguição desta a entidades

religiosas. Em agosto, Okada institui a Igreja Kannon do Japão.

Em 1948, a nova organização se sedimentou e o “tratamento” passa a chamar-se de

“Johrei”, o “talismã” passou a ter inscrito nele a palavra “Hikari” (Luz), “Komyo” (Luz

intensa) e “Dai Komyo” (Luz muito intensa) e a se entoar a oração “Zenguen-Sanji”. Com a

instituição da entidade como religião, muitas pessoas se desligaram por não se sentirem se-

guras por ser uma religião nova, já que se consideravam membros de uma associação. Ainda

assim, no ano seguinte, o número de fiéis atingiu cem mil. Com o rápido crescimento, e-

mergem por parte de outras novas religiões olhares de desagrado, sendo publicados diversos

artigos em jornais e rádios, notícias sensacionalistas, degradando o nome da igreja.

Diversas manifestações contra a instituição demonstraram a insatisfação de determi-

nados grupos, ocasionando novas investigações, inclusive pelas tropas de ocupação. Final-

mente, em setembro de 1949, as investigações foram encerradas. Nessa época, a utilização

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de defensivos agrícolas era grande, causando muitos males às pessoas e por esse motivo

houve interrupção em sua fabricação.

Caligrafia do Fundador

“Kômyô” (Luz Intensa)

Na década de 50, começa o Japão a se reerguer como nação, a partir da assinatura do

Tratado de Paz de São Francisco, que põe fim à ocupação.

Em 4 de fevereiro de 1950, é instituída a Igreja Messiânica Mundial, em meio a sé-

rios problemas: o falecimento do grande discípulo de Okada, Issai Nakajima, o grande in-

cêndio que destrói parte da cidade de Atami e a nova prisão dele. Desta feita, Okada fora

preso para esclarecer dúvidas sobre uma investigação de sonegação de impostos. Em suas

palavras:

“A Igreja Kannon do Japão, fundada como entidade religiosa em 30 de agosto de 1947, e a Igreja Miroku (Deus) do Japão, fundada em 30 de outubro de 1948, estão dissolvidas a partir de agora. Com base em um novo projeto, essas duas entidades surgem unidas sob o nome de Sekai

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Meshiya Kyo (Igreja Messiânica Mundial), neste dia 4 de fevereiro de 1950, dia do início da primavera.” (Kyusei, no. 48, 1950)

A partir daí, durante três anos, a Igreja Messiânica sofreu perseguições religiosas por

parte de autoridades da polícia federal.

Sobre esse assunto, são palavras de Okada:

“Só em agosto de 1947 a nossa Igreja Messiânica Mundial foi fundada como entidade religiosa e começou a desenvolver suas atividades aber-tamente. Ate então, a pressão por parte das autoridades era intensa, e por isso, como é do conhecimento de todos, ela vinha desenvolvendo a terapia popular sob a denominação “terapia de purificação japonesa”. Todavia, entre as pessoas que não tinham fé, a cura das doenças não era absoluta, e por esse motivo, dependendo da pessoas, eu fazia com que ela orasse diante da imagem de Kannon pintada por mim. Tal procedi-mento era aceito pelas autoridades, que, desde antigamente, diziam não ser problema esse tipo de fé. A esse ponto as autoridades detestavam as religiões novas... Felizmente, o mundo tornou-se democrático e foi permitido a liberdade e matéria de Religião. Desde então, pudemos de-senvolver livremente as nossas atividades como organização religiosa. Na época, as pessoas que poderiam ser consideradas como membros e-ram apenas de duzentas a trezentas”. (Fundação Mokiti Okada, 2000, p.135).

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CAPÍTULO II

MEISHU-SAMA E A FUNÇÃO DA RELIGIÃO E DA

EDUCAÇÃO

O objetivo deste capítulo é apresentar o pensamento de Meishu-Sama sobre a mis-

são da Igreja Messiânica e o papel e a importância da educação. Vamos ver como ele con-

cebe a religião como um processo pedagógico e a dimensão religiosa da educação. Desta

forma, vamos procurar aprofundar uma nova abordagem sobre a relação entre a religião e a

educação.

2.1 Religião e missão da Igreja Messiânica em Meishu-Sama

“...Deus enviou o Mestre Meishu-Sama, fundador da Igreja Messiânica Mundial, com a suprema missão de realizar o Seu sagrado objetivo de salvar toda a humanidade. Por conseguinte, visando à concretização do Mundo Ideal, de eterna paz, perfeitamente consubstanciado na Verdade-Bem-Belo, empenhando-nos em fazer sempre o melhor, erradicando a doença, a pobreza e o conflito, as três grandes desgraças que assolam este mundo.” (M. Sama, 2000, p.29)

Para Meishu-Sama a finalidade da criação do homem é estabelecer um mundo onde

não haja doença, pobreza e conflito, local onde o ser humano possa usufruir de saúde, pros-

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peridade e paz. Para ele, esse local tem o nome de Paraíso Terrestre, lugar projetado pelo

Criador desde os primórdios.

Segundo Meishu-Sama, Deus criou o homem com a finalidade de servir como veícu-

lo para a consumação do propósito divino. Ele não estava preocupado em estudar o que era

a religião, e sim apresentar os motivos que o levaram a fundar uma filosofia de vida que

educa o homem a tornar-se próspero, saudável e pacífico. Para Meishu-Sama, o mais impor-

tante era justificar o porquê da criação da Igreja Messiânica Mundial e qual sua finalidade.

Uma das posições que Meishu-Sama critica em uma religião é o cerceamento na

conduta de alguns dirigentes, como cita: “(...) a respeito da liberdade em Religião, que pro-

mover vantagens para a Igreja em detrimento dos fieis, cerceando sua vontade, é um abuso

que atinge as raias do absurdo”. (2000, p. 164)

Para ele, “A verdadeira felicidade consiste em viver-se uma vida paradisíaca, em que

a matéria esteja salva juntamente com o espírito”. (2000, p. 165) Ele entende como verda-

deira religião aquela que possui como base o amor amplo, universal. Qualquer restrição

contrária ao objetivo da religião, que para ele é eliminar conflito e promover paz, foge à

essência desta.

Em suas palavras: “Acredito que a Igreja Messiânica Mundial foi criada para corres-

ponder a esse propósito [criação de uma cultura nova e inédita].” (2000, p. 68) Para ele, a

religião messiânica foi instituída com o propósito de atingir os vários campos da sociedade,

contribuindo com a reestruturação da cultura, conduzindo o homem à compreensão da causa

de sua própria criação.

Quando Meishu-Sama cita:

“...a nossa Igreja é uma religião que abarca todos os campos da ativida-de humana e que poderia ser denominada Empresa Construtora do Novo Mundo. Entretanto, como isso pareceria fachada de alguma construtora civil, o jeito é chamá-la, por enquanto, Igreja Messiânica Mundial. O objetivo dessa organização religiosa é o progresso e desenvolvimento da civilização conciliando a ciência material e a ciência espiritual.” (2000, p. 19)

Ele quer dizer que a ciência material é a ciência responsável pela composição física

do homem, enquanto a ciência espiritual abrange o lado do pensamento, sentimento e espíri-

to. Em seus dizeres:

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“...pela Ciência Espiritual que estou propondo, é possível reconhecer a existência

de Deus e, ao mesmo tempo, responder a indagações sobre problemas como a vi-

da após a morte, a reencarnação, a verdade sobre o Mundo Espiritual, os fenô-

menos de encosto e incorporação e outras questões relativas ao Mundo Desco-

nhecido, que chamo também de Mundo Intemporal.” (2000, p. 89)

2.1.1 Religião como passividade e resignação

Para Meishu-Sama, dentro da perspectiva de entender a religião como algo dinâmi-

co, há religiões que não acompanham o progresso do mundo contemporâneo e se sujeitam a

se manter passivas diante dos acontecimentos mundiais sem se manifestarem sobre os mes-

mos; isso leva a sociedade a desconfiarem delas.

Para Streck, “as igrejas parece estarem geralmente muito mais interessadas em man-

terem a fidelidade institucional de seu rebanho do que promover um real crescimento da fé,

o que poderia implicar uma série de dificuldades para a instituição”. (1998, p. 47) Pode-se

entender esta afirmação, como a religião se posicionando, e ao fazê-lo, toma partido.

Ao partir desse pressuposto, se expõe, contraindo simpatia ou não, daqueles que a

observam e seguem. Trata-se aqui, de fazer constatações e considerações sobre a posição

adotada. Ao abraçar essa perspectiva, a religião cria gradativamente sinais de fortalecimento

ou enfraquecimento, na construção de sua identidade.

Streck acrescenta que “basta considerar a extensão dos sacrifícios a que se dispõem

os indivíduos – negando até mesmo suas necessidades mais fundamentais para seu bem es-

tar, inclusive a própria sobrevivência – por conta de sua pertença a uma confissão religio-

sa”. (1998, p. 53)

No entanto, ao ignorar o que acontece no mundo e, ao se tornar apática às manifesta-

ções do mundo contemporâneo, a religião “se protege” da exposição às críticas e se insere

no “jardim da resignação”, fazendo das afirmações conflituosas, um desafio para Deus. Ao

remeter aos “cuidados do Absoluto”, ela se isenta, resigna-se, deixando entrever nas entreli-

nhas o que cada um venha a compreender dentro de sua percepção.

Desde tempos remotos, é uma constante a preocupação de grandes líderes religiosos

em formar seres humanos educados a partir de um modelo próximo ao conceito de perfei-

ção. Não é pouco o esforço para tentar esta aproximação, sem conseguir grandes resultados.

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O “Mundo de Miroku”, anunciado por Buda, o “Reino dos Céus”, profetizado por Cristo, a

“Agricultura Justa”, orientada por Nitiren, o “Pavilhão da Doçura”, ideal da religião Tenrik-

yo, o “Paraíso Terrestre” referido por Meishu-Sama, local onde não existe doença, pobreza

e conflito, são profecias ainda não concretas.

Ao repensar a religião e observar o mundo citado por diversos lideres, é possível le-

vantar a seguinte questão: qual o tipo de educação que está sendo levado às comunidades e

é trabalhado nas religiões, na tentativa de alcançar tais mundos?

Para o ser humano, que no seu cotidiano enfrenta dificuldades como fome, frio, con-

flito e doença, que tipo de abordagem seria mais conveniente para levá-lo à reflexão e acei-

tação dessas situações, tornando-o parte do universo dinâmico, no qual está inserido? Como

enfrentar estes fantasmas que apavoram sua existência no universo?

2.1.2 Religião como pragmatismo (religião da ação)

“O que pretendemos não se restringe apenas à Religião. Nosso objetivo é dar a mais alta diretriz ao campo da Medicina, da Agricultura, da Ar-te, da Educação, da Economia, da Política, enfim a tudo quanto diz res-peito ao homem. Em suma, queremos colocar a teoria em prática, de maneira que a Fé seja vivida no nosso dia-a-dia (sic)”. (M. Sama, 2000, p. 182)

Meishu-Sama via a necessidade de se introduzir na religião o pragmatismo como

método para se alcançar evolução. Segundo ele, desde cedo admirador de Filosofia, reco-

nhecia no pragmatismo uma teoria capaz de ser aplicada e apresentar resultados altamente

benéficos. São dele as palavras:

“James achava que a exposição meramente teórica da filosofia constitui apenas uma espécie de distração; para ele, a filosofia só era válida se fosse colocada em ação. Acho interessante a sua teoria, cujo realismo autêntico é característico dos filósofos americanos. Aderi, portanto, às suas ideias e me esforcei por adotá-las em meu trabalho e na vida coti-diana. [...] Mais tarde, quando iniciei meus trabalhos religiosos, julguei necessário aplicá-lo à religião. Isto significa ampliar o campo religioso de modo que abranja a vida em geral”. (2000, p. 411)

Para Meishu-Sama, nesta proposta reside um autêntico modelo de prática, a partir do

exemplo/modelo. Em meio à vida cotidiana, internalizar o processo de pragmatismo torna

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possível algo básico a ser definido como “exemplo do ser social”, pois este modelo serve

como inspiração a ser seguido. Este processo pode se manter permanente, tendo em vista

aquele que o aplicou tornar-se um exemplo de busca a aprender e a se integrar.

Com este método aplicado, a socialização/internalização tornar-se-ia um modelo cul-

tural a ser seguido, o que provocaria alterações significativas sociais. A coerência dessa

aplicabilidade traria benefícios ímpares ao processo educacional e religioso.

Admirador de William James (1842-1910), Meishu-Sama percebeu que a aplicação

do pragmatismo na religião ampliava o universo religioso, pois combinava teoria e prática,

surgindo dessa unilateralidade, harmonia. “O pragmatismo filosófico introduz a Filosofia na

vida prática, acentuando, neste ponto, o caráter americano. Pretendo fazer o mesmo, com

uma diferença: fundir a religião e a vida prática, tornando-as íntimas e inseparáveis”. (2000,

p. 413)

Ao reduzir a religião à salvação do espírito, poderá correr-se o risco de retirar de seu

conteúdo a esperança de melhor futuro, pois ao imaginar que problemas financeiros, de con-

flitos, não terão solução, levará o indivíduo a se desencantar pela vida. Pelos menos, para

aqueles que têm fé. A compreensão de que existe esperança em qualquer situação terá que

ser reinterpretada e entendemos ser por meio da linguagem da educação religiosa, retirando

o homem contemporâneo da prisão onde está retido. Meishu-Sama diz que “a primeira con-

dição para salvação da humanidade é, antes de mais nada, alcançar a saúde. Por esse moti-

vo, a meta de nossa religião é formar indivíduos e sociedades saudáveis.” (2000, p. 16)

Segundo o líder religioso, para se atingir a saúde, será necessário uma releitura da

visão atual que o homem tem de saúde.

Aqui, Meishu-Sama afirma ser a saúde o fator fundamental para o desenvolvimento

do homem e, que sem ela pouco ele conquistará; por essa razão, as preocupações com a sa-

úde iam além de uma alimentação comum, com uma reeducação alimentar para tornar o

homem mais saudável. Em certa ocasião, o segundo filho homem mais velho de Okada,

Mihomaro, disse: “Eu também tinha um organismo frágil e sempre recebia Johrei. Parale-

lamente, meu pai fez experiências dando-nos de comer apenas legumes e verduras, a mim e

a meus irmãos; dessa forma, ele comprovou como uma pessoa se torna forte e saudável com

esse tipo de alimentação”. (L. Oriente, 1982, p. 333)

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O Fundador, a família e seguidores

Para Meishu-Sama, a noção de saúde vai além de uma visão “materialista” ou orga-

nicista da saúde e inclui a dimensão relacional, como o amor.

“Notem que a maior parte das enfermidades humanas surge na negação do amor. Adoecemos se não nos querem, se nos rejeitam, se nos negam ou se nos criticam de uma maneira que nos parece injusta. Podemos até mesmo adoecer de câncer, porque a dinâmica fisiológica tem a ver com a dinâmica emocional”. (MATURANA, 2009, p. 85)

Essa afirmação aproxima-se do pensamento de Meishu-Sama, que vê a relação entre

o aspecto material e o espiritual no ser humano.

Voltando ao tema do objetivo e a missão da Igreja Messiânica, Meishu-Sama diz

também que:

“O nosso objetivo, no entanto, é cultivar os nobres sentimentos dos ho-mens, possibilitando-lhes oportunidade para se distanciarem, de vez em quando, da sociedade infernal de hoje em dia e visitarem terras paradi-síacas, que os envolvam nos ares celestiais de Verdade, Bem e Belo, fa-zendo-os sentir-se no estado de suprema alegria. Assim, evidencia-se

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necessidade da construção do protótipo do Paraíso Terrestre para o ho-mem contemporâneo”. (M. Sama, 2000, p. 162)

Com isso, para o religioso, o homem ao libertar-se de pensamentos e sentimento ru-

ins e ao ter contato com a arte, inicia um processo de modificação em seu interior substitu-

indo hábitos ruins por bons.

Ele afirma que “A condição básica para a sua concretização [Paraíso Terrestre] é

substituir o espírito restrito pelo universal, ou melhor, desenvolver uma superatividade cul-

tural que abranja todos os setores: Religião, Ciência, Política, Economia, Arte, etc.” (2000,

p.193) Ao se considerar absoluta, a religião se apodera da verdade, e, discrimina as outras

como secundárias ou inferiores. Há exemplos na história que mostram que, quando as reli-

giões são utilizadas como bandeira pela política, provocam desgraças prodigiosas: o xinto-

ísmo na II Guerra Mundial, no Japão, as Cruzadas, na Europa.

Todavia, segundo Meishu-Sama, as religiões tradicionais argumentam ser necessário

voltar às origens de quando foram fundadas, retornar aos berços dos fundadores. Isso acon-

tece porque houve afastamento dos princípios eleitos pelo instituidor da religião, provocan-

do um desequilíbrio entre a cultura e o progresso. De fato, ao notar a estagnação no número

de pessoas que se tornam religiosos, vê-se que uma das causas é a incapacidade da religião

acompanhar o progresso da cultura.

Para Meishu-Sama: “O correto, por conseguinte, é nos adequarmos à época em que

vivemos, utilizando-nos de todos os recursos que a civilização moderna nos oferece. Se a

religião se basear unicamente nos métodos antigos, obviamente não conseguirá atingir seus

verdadeiros objetivos”. (2000, p. 161)

Para ele, a religião deve desenvolver-se e cumprir rigorosamente os ensinamentos de

seu fundador; entretanto, não deve deixar à margem outros fatores que compõem o ser soci-

al. Para ele, “a missão da verdadeira religião é dar orientações no sentido de melhorar, cada

vez mais, a vida do homem atual”. (2000, p. 195)

Ao desdobrar a interpretação dessa frase de Meishu-Sama, tem-se que a missão da

verdadeira religião ou o encargo atribuído a ela por seu fundador é educar no sentido de

promover cada vez mais o progresso na vida do ser humano contemporâneo. A educação se

faz fortemente presente pela importância de orientar as pessoas, no caminho a percorrer. Ela

tem como função estudar a origem, mas também o compromisso de responder e educar o ser

humano contemporâneo.

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Com isso, o método mais eficaz para estudar uma religião é conhecer o que ela apre-

senta em sua doutrina, como diz:

“Para que a fé seja autêntica, ela deve ser professada sem ferir o bom senso. Palavras e atos excêntricos devem ser vistos com desconfiança; entretanto, as pessoas geralmente dão muito crédito a tais coisas. É pre-ciso muita cautela. Religiões egocêntricas, fechadas, que não mantêm relações com outras e que se isolam socialmente, também não são dig-nas de confiança. A Fé é verdadeira quando não prejudica a lucidez e, ao mesmo tempo, desenvolve a consciência de que sua missão é salvar a humanidade”. (2000, p. 369)

2.2 Educação em Meishu-Sama

Uma das críticas que Meishu-Sama fez da educação do seu tempo é que ela tinha

embutida dentro de si uma proposição que os filósofos chamam de “realismo ingênuo”, isto

é, acreditam naquilo que veem, aquilo que existe. Com isso não se questionam as razões do

que existe, o que está por detrás da aparência e nem as possibilidades de mudança, pois não

conseguem ver a realidade além do que existe e é visto. Esse comportamento é bastante na-

tural da trajetória humana porque é expressão do senso comum. Meishu-Sama critica essa

postura da educação, que ele chama de “educação materialista” dizendo: “O fato se deve à

educação materialista que desde o berço lhes veio sendo ministrada. Nossa missão é conver-

tê-los, isto é, reeducá-los. (2000, p. 201)

Para ele, ao se criar uma visão unilateral do que acontece ao redor do indivíduo,

também se cria a possibilidade de tornar suas decisões absolutas, encarando-as como verda-

des. Ao surgir esse comportamento deixa-se de reconhecer o que se apresenta ao mundo.

Consequentemente, enfrenta-se uma educação de mão única, em que o educador é proprietá-

rio do conhecimento.

A ambiguidade de possíveis olhares sobre o mesmo problema é ignorado, prevale-

cendo “o que o professor ensinou como verdade absoluta”. Visto sob este formato, é retira-

do do educando a capacidade de obter uma consciência crítica.

A educação tradicional transmite ao indivíduo uma concepção sofisticada do que é o

mundo ao redor dele. As determinantes do processo de conhecimento fazem parte da ampli-

tude no qual o cidadão está inserido. Estando ele “capacitado” pelo conhecimento adquiri-

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do, torna-se outra pessoa, que participará nos mais diversos campos da sociedade, como

elemento de reprodução do conhecimento.

Meishu-Sama denomina como “escola tradicional” esta escola onde o processo edu-

cativo é desenvolvido tendo como premissa a repetição do que aprendeu em sua formação.

Como uma das decorrências do papel do educador é projetar no educando seus conhecimen-

tos, tem-se na educação tradicional e, portanto, repetitiva, a criação de um sistema vertical

de ensino, em que, como dissemos anteriormente, o educador é o detentor do conhecimento

e o educando, simples receptor.

De acordo com Mizukami: “...é um ensino caracterizado por se preocupar mais com

a variedade e quantidade de noções/conceitos/informações que com a formação do pensa-

mento reflexivo.” (1986, p. 14) Quando se tem reduzido o termo Educação, se é necessário

ressignificar a palavra como “espaço aberto a integração nos mais diversos campos de co-

nhecimento”.

Para Paulo Freire, “...a educação se torna um ato de depositar, em que os educandos

são os depositários e o educador o depositante.” E prossegue: “Eis aí a concepção ‘bancá-

ria’ da educação, em que a única margem de ação que se oferece aos educandos é a de rece-

berem os depósitos, guardá-los e arquivá-los.” (1983, p. 66)

Para o educador Paulo Freire, a educação bancária torna o educando simples objeto

de repetição e não sujeito da ação. Na formação deste, não existe o livre pensar, mas sim o

livre repetir. Qualquer menção à criticidade é coibida diante da manutenção da falsa forma

de educar.

Meishu-Sama diz que “nossa missão é extirpar do homem essa irracionalidade, trans-

formando-o em verdadeiro ser pensante, numa verdadeira obra de reforma humana” (2000,

p. 58) A irracionalidade a que Meishu-Sama se refere é o lado violento do homem contem-

porâneo que ele chama de animalesco, como diz “ ...já não é possível eliminar o caráter a-

nimalesco do homem através da educação materialista. O ensino ministrado até hoje, como

se pode ver pelos seus resultados, não passa de uma técnica para encobrir esse caráter”.

(2000, p. 49)

Ao fazer essa afirmação, ele define qual o trabalho atribuído ao religioso, qual seja,

desenvolver sua capacidade de compreender sua missão, por meio da educação e se trans-

formar em um ser capaz de ser exemplo. Como diz, um ser isento de doença, pobreza e con-

flito. Para essa completude, a intervenção da educação contribui muito, pois por intermédio

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dela, esse homem pode atingir todos os benefícios inerentes ao ser humano, como saúde,

prosperidade e paz.

Para Carl Rogers, o “ensino centrado no aluno” propõe relações interdinâmicas e seu

resultado vai além da expectativa, desenvolvendo a personalidade do educando, libertando-o

do “cabresto” e conduzindo-o ao conhecimento, desenvolvendo sua capacidade de reflexão.

Deste modo, o professor torna-se um hábil e criativo personagem na história da for-

mação do educando. Não parte dele a construção do conhecimento, mas sim do conteúdo

das experiências construídas pelo aluno, em que ele se torna o mediador do processo. Afi-

nal, o indivíduo é a partir das experiências por ele vividas nas relações, experiências estas

adquiridas no espaço que habita, um ser em permanente transformação.

Segundo Morin: “A missão da educação para a era planetária é fortalecer as condi-

ções de possibilidade da emergência de uma sociedade-mundo composta por cidadãos pro-

tagonistas, consciente e criticamente comprometidos com a construção de uma civilização

planetária”. (Educar na era planetária, 1981, p. 98)

Para compreender o papel do cidadão “sujeito” é necessário oferecer a ele possibili-

dade de manifestar seu pensamento, apresentar suas críticas e opinião. Ao fazê-lo, este ho-

mem se compromete com o mundo e se torna parceiro da construção de um mundo melhor

para todos.

Para Mizukami, “o homem é considerado como uma pessoa situada no mundo. É

único, quer em sua vida interior, quer em suas percepções e avaliações do mundo. A pessoa

é considerada em processo contínuo de descoberta de seu próprio ser, ligando-se a outras

pessoas e grupos.” (1986, p.38)

Como seres sociais, há necessidade de se estar junto, partilhar ideias, falar/ouvir,

buscar reciprocidade, o que não acontece hoje, na educação tradicional. No aprendizado se

faz necessário, para se atingir outras formas de saberes, perceber de onde possivelmente

nascerá o educando capaz de enxergar, no outro, a si mesmo.

Ao compreender a dinâmica do sistema educacional atual, se é possível perceber as

necessidades de alteração deste, que está engessado, para aquele, que é transformador, co-

meça-se por fazer uma única pergunta: Por quê?

Este questionamento contribui para a “desaprendizagem” dos exemplos, antes dito

como perfeito e sinalizados como eficazes, limitadores do processo de descobertas do co-

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nhecimento. Antes, dominadores, modelos teóricos capazes de definir o “certo e o errado”.

Ao experienciar novos modelos, o indivíduo percebe que os resultados necessariamente não

são os mesmos. Contudo, por estar inserido no processo que massifica e é determinante do

conhecimento, se faz mudo, torna-se conivente com este e, mais tarde, o reproduz. A repeti-

ção, como parte da educação sistêmica, contribui muito para a sustentação da educação tra-

dicional.

A ausência de programas capazes de permitir que o indivíduo pense, questione, dis-

cuta, alimenta o processo de repetição, mesmo que os estudantes tenham os meios acima.

Nas últimas décadas tem-se visto uma pequena alteração no alimento de expectativa,

quanto à educação contemporânea e já se percebe uma preocupação mais acentuada quanto

ao processo educacional e seus resultados. Resultados estes desastrosos, bastando para isso

certificar-se do alto índice de reprovação nas escolas. Não se espera que a mudança aconte-

ça a curto prazo, mas gradualmente, através de experiências adquiridas pelos próprios indi-

víduos, dentro do sistema educacional.

Estabelecer critérios para criar determinantes responsáveis por suprir a capacidade

de pensar do educando, modela o resultado, reafirmando a proposta da educação formal.

Muitas vezes estes próprios modelos quando aplicados apresentam resultados, por comple-

xos, levando o educando a internalizar seus questionamentos diante do sistema. A isso,

Meishu-Sama chama de pseudoverdade. Em suas palavras:

“Desde tempos remotos fala-se a respeito da Verdade, mas parece que sobre a Pseudoverdade, ou melhor sobre a verdade aparente, ninguém fala. [...] A Verdade e Pseudoverdade existem na Religião, na Filosofia, na Arte e até na Educação”. (2000, p. 34)

Com o afastamento da Verdade, criou-se uma verdade aparente, que Meishu-Sama

chama de pseudoverdade. Segundo ele, o responsável por esse afastamento foi o próprio

homem. Ao dizer isso, ele introduz a ideia de que esse fenômeno foi provocado pelo distan-

ciamento da Natureza. Ao negligenciá-la o homem criou paradoxos interpretativos da ver-

dade.

Contudo, como identificar o que é a Verdade e o que é a Pseudoverdade? Para o reli-

gioso, Verdade é o estado natural das coisas: “Como vemos, a Grande Natureza ensina ao

homem a importância do tempo. Em seu estado original, ela é a própria Verdade, e por isso

serve de modelo a todos os projetos do homem. Eis a condição vital para o sucesso”. (2000,

p. 447)

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Dentro deste princípio, cabe à educação tornar o homem modelo para a sociedade,

contribuindo para sua formação. Uma das propostas principais é educar o ser humano a ser

moral, social e integralmente humano.

Assim, para Mizukami, o propósito da educação é que o aluno desenvolva sua per-

sonalidade e, pelo conhecimento, possa adquirir sua autonomia intelectual, já que a lógica é

construída. Sendo assim, a educação é essencial na formação e desenvolvimento do ser hu-

mano.

Segundo o pensamento de Meishu-Sama:

“Quanto à educação, também está muito distante do seu verdadeiro ca-minho. Seu real objetivo é formar homens íntegros, isto é, homens que façam da justiça o seu código de fé, e se esforcem para aumentar o bem estar social, contribuindo para o progresso e a elevação da cultura. Na situação atual, porém, até mesmo os que se formam nas melhores esco-las superiores praticam crimes e outras ações que prejudicam a socieda-de. Urge fazer algo para modificar essas condições.” (2000, p. 282)

Ao pontuar a reflexão sobre educação, Meishu-Sama apresenta o que para ele é o

principal objetivo dela, ou seja, a justificativa para sua existência é a formação de homens

honestos, capazes de contribuir com ideias, conceitos, projetos para o desenvolvimento da

cultura.

Para Piaget, que vê na educação, um conjunto indissociável:

“... não se pode formar personalidades autônomas no domínio moral se por outro lado o individuo é submetido a um constrangimento intelectu-al de tal ordem que tenha se de limitar a aprender por imposição sem descobrir por si mesmo a verdade: se é passivo intelectualmente, não conseguiria ser livre moralmente”. (1986, p. 69)

Para uma educação alcançar resultados expressivos na formação do educando, é ne-

cessário que provoque questionamentos, desperte nos alunos interesse pela pesquisa, o es-

clarecimento de suas dúvidas, levando-os a buscar novos perfis na compreensão da realida-

de.

Deste modo, a educação deveria promover no aluno o interesse em despertar e ir

mais além. Aprofundar sua capacidade de apreender, de motivação, de análise no contexto

em que está inserido, para conhecê-lo e tornar possível uma vida melhor para todos. É neste

ponto que a observação deve se voltar um pouco para a ética. A educação não é uma sim-

ples maneira de transferir conhecimento para os educandos. É, antes, um método de forma-

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ção, inclusive moral, do indivíduo, um conjunto de atitudes capazes de transformá-los em

um ser social.

Ao pensar escola como meio de aprendizagem, deve-se pensar qual a finalidade da

escola. Que indivíduo estará sendo formado por esta escola? Tornar-se-á um cidadão? Sabe-

rá ele, qual papel é necessário ser desenvolvido como tal, diante ou dentro da sociedade?

Hoje, percebe-se ser bem maior a preocupação quanto à formação do educando

(meio) do que com sua formação moral/cidadã (fim). O homem pode até capacitar-se a de-

senvolver projetos, mas é incapaz de se desenvolver como projeto. Sendo este último, proje-

to de vida saudável, qualidade de vida ideal. O excesso da capacitação do meio faz apagar a

concretude do fim. Poder-se-ia afirmar que tanto meio como fim têm peso e medida.

Ao observar que, seguindo os padrões comuns de aprendizagem, o educando não

obtém resultados tão favoráveis, um questionamento precisa vir à tona. Quais os mecanis-

mos utilizados que não atenderam às necessidades do indivíduo? Ou que padrões de conduta

o cercam fora do espaço escolar? Em qual tipo de vida e relação está o educando inserido?

Para atender às especificações dos meios de aprendizagem parece haver mais estudos do

que na formação para o fim: tornar o ser, cidadão.

2.3 Religião como educação em Meishu-Sama

Para aprofundar o conhecimento é necessário que esteja muito clara qual a finalidade

que se pretende atingir. Qual influencia terá no meio? Quais causas podem provocar um

avanço ou retrocesso nas descobertas deste conhecimento? A diversidade é essencialmente

uma proposta favorável, bem como um fator essencial para a educação.

Para Maturana e Varela, “todo o fazer é saber e todo o saber é fazer”. (1997, p. 27),

sendo indissociável esta ligação. Para Meishu-Sama, quando o conhecimento não é coloca-

do em prática, ele torna-se sem valor, o que no Japão é chamado de cabeça grande e corpo

pequeno. Meishu-Sama afirma que é necessário que este conhecimento tenha como finali-

dade beneficiar muitas pessoas. É possível que não só a explicação seja suficiente, mas que,

além da aplicabilidade, é necessário que seja esclarecido o método para atingir tal conheci-

mento.

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Ao falar disso, a compreensão de Meishu-Sama sobre religião leva a discutir re-

ligião como educação. Ele vê a religião como educação em um processo contínuo para o

aperfeiçoamento do ser humano e, portanto, altera a ideia de religião. Para ele, a própria

religião tem que ser um processo dinâmico e sempre estar recriando. Nesse movimento é

preciso aprofundar a educação inovadora como centro da religião, e um autor que ajuda na

compreensão desse processo é Paulo Freire com sua proposta de educação dialógica, que

realiza a evocação humana da humanização e liberdade, e sobre a qual falaremos no capítu-

lo seguinte.

A tônica dessa nova forma de educação se desenvolve por meio do diagnóstico da

aceitação de outra dimensão do mundo, não reconhecida pela ciência, que Meishu-Sama

chama de mundo espiritual. Ela mostra aspectos interessantes que visam apresentar dados,

no mínimo curiosos, sobre uma possível aproximação entre os campos religioso e educacio-

nal. Para ele, a sugestão dessa reforma educacional tem como finalidade a construção de um

mundo paradisíaco.

Ao defrontar-se com a capacidade do homem tornar-se mais humano, Meishu-Sama

considera que uma das vertentes seja a educação, cujo papel bastante significativo nessa

transição trouxe o homem dos primórdios da história ao estado de desenvolvimento intelec-

tual atual. Contudo, diferentemente da maioria dos autores acima, ele afirma ser necessária

uma educação pautada no reconhecimento da existência de um mundo desconhecido, para

tornar possível enxergar o outro.

As implicações para uma ação possível, ou seja, tirar o homem do nível animal para

o estágio onde ele encontre no outro a si mesmo, passa pela aceitação da existência do mun-

do espiritual. Contudo este método não é tão simples, posto que o homem contemporâneo,

conforme dissemos anteriormente, se curva diante da ciência e a faz senhora de seu domí-

nio, impedindo esta aceitação.

A educação, pois, deve levar o homem progressivamente a desenvolver a sua capaci-

dade cognitiva e instalá-lo em um patamar onde seja possível encarar o outro como seu es-

pelho. A educação espiritualista torna isso possível, disciplinando o homem e conduzindo-o

a uma aprendizagem ampla e integral.

Para Meishu-Sama a educação espiritualista é também uma educação que eleva o ser

humano da condição de animal porque o leva a reconhecer o outro como outros, que leva a

encontrar no outro a si mesmo. Educação espiritualista para ele caracteriza a estrutura para a

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formação do novo homem, habitante de um mundo mais habitável. Assim como a compre-

ensão do meio ambiente, da vida como um todo isenta de doença, pobreza e conflito é pos-

sível.

Evidencia-se no trabalho realizado por Meishu-Sama o forte traço da preocupação

com a educação. Os estudos e pesquisas que fez, mesmo antes de fundar a Igreja Messiâni-

ca, demonstram o quanto para ele era importante corrigir a educação existente e substituí-la

por aquela que acreditava na existência do mundo espiritual. Em suas pesquisas, aparecem

traços nítidos de que caso o homem não tomasse conhecimento dessa realidade, não seria

possível fazer mudanças na sua própria formação. Entretanto, ele deixa muito claro em seus

escritos que o descompasso entre a compreensão do homem que acredita na existência do

mundo espiritual e daquele que não crê, é visível em suas ações. Ele afirma:

“Tem-se como crédulo ou simplório aquele que age com honestidade; entretanto, se a pessoa procede diferente, cai no descrédito social e nas malhas da Lei. [...] O que os homens consideram bem viver e se apres-sam por adotar, é a vida desonesta sob a capa da honestidade. Os me-lhores adeptos dessa filosofia tornam-se os campeões dos bem sucedi-dos, razão por que as pessoas tendem a seguir tais exemplos e o mal so-cial não diminui.” (2000, p. 25)

Meishu-Sama vai além, quando afirma que “a verdadeira religião deve fundamentar-

se no universalismo”. E: “Os fundadores de religião superam os outros homens em honesti-

dade, sendo dotados de um extraordinário sentimento de amor e caridade. São homens san-

tos, modelados pela essência do bem, por arriscarem a própria vida na salvação dos sofredo-

res”. (2000, p. 175)

Ele diz:

“Assim, longos anos após a morte de seus fundadores, a maioria das re-ligiões foram reconhecidas e tiveram suas divindades reverenciadas. Is-so aconteceu devido à alegria que eles proporcionaram ao povo, com seus ensinamentos, e à notável contribuição que trouxeram ao aumento do bem-estar social” (2000, p. 176)

Para ele, além da religião ter como principio a crença na existência do mundo espiri-

tual, é necessário que se caracterize também pela filosofia ampla de ajuda aos necessitados,

sobretudo com o caráter de ampliar seus conhecimentos nos mais diversos campos sociais.

Para isso, ela criará em seus adeptos, a consciência de que é a partir de ver no semelhante a

si próprio, o caminho para a felicidade.

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2.3.1 Educação espiritualista e a materialista

Tendo discorrido anteriormente sobre o significado do conceito da educação espiritualis-

ta em Meishu-Sama, agora é necessário apresentar qual a visão do religioso quanto ao signi-

ficado da educação materialista.

Nas palavras dele:

“O maior erro da Educação é ser totalmente materialista. Estamos can-sados de dizer que, se ela não evoluir juntamente com o espiritualismo, não lhe será possível nem mesmo sonhar em atingir seu verdadeiro ob-jetivo. Entretanto, como esse erro vem de longa data, estamos conscien-tes de que enfrentaremos muitas dificuldades, se tentarmos eliminá-lo bruscamente.” (2000, p. 282)

Para ele, a educação materialista, por acreditar somente no que vê, reduz o ser hu-

mano ao aspecto material da vida e ao egoísmo, ao interesse próprio, não questionando o

sentido da vida. Sobre pessoas formadas por esse tipo de educação, ele afirma:

“Criaturas assim pensam de forma calculada e materialista quando de-param com qualquer sofrimento. No caso de ficarem doentes, por e-xemplo, basta-lhes consultar um médico; em assuntos complicados, bas-ta-lhes pedir ajuda à Lei; a quem não lhes obedece, bastam carões ou castigos. Dessa forma, simplesmente acomodam os problemas. Como acham que, se estiverem bem, não importa como estejam os outros, pro-curam comodidade apenas para si. (2000, pp.156/157)

A proposta de Meishu-Sama, por entender ser muito difícil uma transformação re-

pentina, é aprofundar o conhecimento levando o indivíduo a refletir sobre sua própria con-

duta e decidir por alterá-la. Para isso, é necessário o surgimento de modelos de reflexão que

ressaltem a importância da contribuição de benefícios para a sociedade.

Nesse ponto, a religião para fundamentar a própria existência pode vir a contribuir

com o mundo real, servindo de modelo de reflexão pedagógica.

Entretanto, este critério que coloca em xeque a crença individual não faz parte desta

pesquisa e será deixada àqueles que tenham interesse no assunto.

Ao se adquirir informação, é necessária a compreensão de que ela será agregada ao

conhecimento anterior, em uma rede de estrutura interior, compondo o quadro intelectual na

formação do individuo. Fritjof Capra diz que:

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“[a informação] é uma quantidade, um nome ou afirmação curta que abstraímos de toda uma rede de relações – um contexto, no qual está en-tremeada e que confere seu significado. Estamos tão acostumados com as abstrações que tendemos a acreditar que o significado reside no fragmento de informação em vez de no contexto de onde foi abstraído”. (1996, p.272)

A grande rede de envolvimento que faz a identidade de um grupo, sociedade, mundo

está relacionada com a existência de um único ser. É este ser que, utilizando com proprie-

dade, sua condição de ser livre, torna possível sua relação com o mundo à sua volta. Isso é o

que Paulo Freire chama de tornar-se cidadão do mundo.

O organismo vivo do conhecimento se transforma, à medida que novas informações

o vão compondo. Portanto, qualquer ideia de que a liberdade pode provocar sérias fissuras

na estrutura organizacional não passa de engano, pois uma liberdade orientada por educado-

res conscientes da sua responsabilidade na formação do indivíduo, é perfeitamente possível

e capaz de contribuir para a formação do ser humano, humano.

Sobre isso, Meishu-sama assim se manifesta:

“Como sempre tenho explicado, basta despertar as pessoas da educação materialista que receberam para a educação espiritualista. Em termos mais claros, destruir o pensamento errôneo de que se deve acreditar so-mente nas coisas que possuem forma e desacreditar daquelas que não a possuem. A única maneira de se conseguir isso é fazer com que seja re-conhecida a existência de Deus através do poder da Religião.[ ] Por esse motivo, está demasiado claro que já não é possível eliminar o caráter animalesco do homem através da educação materialista. O ensino mi-nistrado até hoje, como se pode ver pelos seus resultados, não passa de uma técnica para encobrir esse caráter.” (2000, p. 48)

A citação acima mostra que Meishu-Sama vê a necessidade de consolidar a mudança

de uma educação materialista para a educação espiritualista, em que aquela ensina a acredi-

tar no que se vê, e esta ensina a acreditar em uma existência superior. Para ele, só a experi-

ência educacional desenvolvida a partir da consciência da existência de Deus permite forne-

cer bases para uma educação consciente, principalmente do reconhecimento do papel do

outro.

Para o religioso, a noção de que só é possível eliminar a tendência animalesca do

homem por meio da conscientização da existência de um ser superior, indica a impossibili-

dade de sucesso da educação que reduz a realidade ao seu aspecto material. Por essa via, o

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método utilizado até hoje não se apresenta eficaz e, ao contrário, articula instrumentos para

uma dissimulação de atitude.

Em seguida, Meishu-Sama afirma que a dinâmica da crença em coisas que não pos-

suem forma, na educação sistêmica não se firma como propósito principal. Ao contrário,

lugar comum é a crença em tudo que possui forma. Sendo assim, ele propõe para a religião

a educação que vai além e formula propostas de desenvolvimento desta, com a finalidade de

despertar no homem a crença no “invisível”. Ele acredita ser este sistema de aprendizagem

capaz de construir o caráter do homem.

A partir da era industrial, chamada por Russel Ackoff de “Idade da Máquina”, é pos-

sível compreender o significado da repetição introduzida no mundo como “pensamento da

máquina”, estendido como um indisciplinado meio de solução para a aprendizagem. Obvi-

amente, reduz-se o pensar, elevando-o a um estágio de letargia, substituindo pelo processo

repetitivo para adquirir conhecimento. É interessante observar que, à medida que se propa-

gava o avanço da tecnologia industrial, também se tornava cada vez mais significativo o

método de ensino e sua reprodução.

Para o historiador David Tyack:

“Assim como os teólogos do século XVIII podiam pensar em Deus co-mo um construtor de relógios sem ser pejorativos, os engenheiros soci-ais em busca de novas formas organizacionais também usavam as pala-vras ‘máquina’ ou ‘fábrica’ sem investir nelas as associações negativas que evocam hoje em dia” (1974. p.42)

Como resultado, obteve-se uma escola padronizada, que infunde inúmeras experiên-

cias prejudiciais, na medida em que limita o indivíduo, apresentando a ele um sistema apa-

rentemente considerável e pronto. Nesse sistema, o ensino massifica como uma fábrica, não

permitindo ao educando pensar ou questionar, somente repetir, decorar, sem qualquer pro-

posta do novo.

2.3.2 Educação morta e viva

A experiência educacional adquirida na escola contém aspectos diferenciados. Para

Meishu Sama, a noção de educação/estudo se apresenta de duas formas: morto e vivo.

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Para reconhecer o que é educação ou estudo morto, é necessário estabelecer prelimi-

nares. Segundo Meishu-Sama, para entender o que representa a religião, o objeto de conhe-

cimento inerente pressupõe-se ser a práxis. É possível desenvolver uma práxis sem que nela

tenha existido antes um pensar? Uma reflexão?

Uma questão importante, então, parece ser a necessidade de fazer do estudo chamado

por Meishu-Sama de morto, um “local, espaço”, onde haja lugar para a aplicação do conhe-

cimento e a contribuição de seu resultado para a vida do ser humano. Faz-se necessário a-

plicar o conhecimento adquirido para que seu resultado, desenvolvido em forma de experi-

ência, possa contribuir com a sociedade e o mundo.

A distinção do estudo morto, como aquele que é “engavetado” e não aplicado no

cotidiano faz com que se torne de pouco valor, pois se torna inútil. É possível também en-

tender estudo morto como aquele que se reproduz, se faz repetidamente, tornando-se algo

“engessado”, ou o que Paulo Freire chama de educação bancária, que será estudado no capí-

tulo seguinte.

Para Meishu-Sama, a classificação da conceituação de estudo morto e vivo traduz-se

no que ele chama estagnação e evolução. O estudo morto torna-se um ensino engessado, que

não produz transformação no educando, que reduz sua capacidade de pensar, de se comuni-

car e muitas vezes não aplicado. E o estudo vivo é aquele que dialoga, que questiona, que

leva à reflexão e transforma.

A respeito da educação, Seymour Saranson diz: “Quanto mais as coisas mudam,

mais elas permanecem iguais.” (1990, p. s/no.)

Para Saranson, o que determina uma reforma eficaz na educação é tomar distância

da superfície e aprofundar experiência e conhecimento, abandonando a estrutura frágil tra-

zida hoje. Para ele, modificar o pensamento e a interação entre as pessoas é o divisor de

águas para uma educação efetivamente válida.

Para Meishu-Sama, o simples fato de aprender sem qualquer proposta ou objetivo

significa o que chama de estudo morto. Entretanto, aprender com a finalidade de colocar o

conhecimento em prol do beneficio social, a utilização do conhecimento para desenvolver

projetos que enriqueçam o saber e beneficie a sociedade é o que ele chama de estudo vivo.

Haveria muito mais por dizer neste estudo, quando analisamos a partir do pensamen-

to de alguns teóricos em uma interface com o pensamento de Meishu-Sama, fundador da

Igreja Messiânica Mundial, as implicações da condição social do ser humano diante do

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mundo contemporâneo. Para tentar compreender a realidade da educação e apreendê-la,

muitas visões se apresentam, entre elas a de H. Assmann, quando diz:

“Em qualquer ser vivo verifica-se uma unidade entre processos vitais e processos de aprendizagem. Nos animais simbolizadores, as próprias bases biológicas da vida ficaram impregnadas e entrelaçadas com os processos cognitivos. Não há mais como separar o viver do a-prender, que se desenvolvem como processo unificado. Por isso, para o ser humano, não aprender significa não poder sobreviver.” (1998, p. 130)

Meishu-Sama destaca que com o passar do tempo, novas descobertas e teorias foram

surgindo e desaparecendo, sendo recuperado delas, valores de uma nova forma, enquanto

outras desapareceram sem deixar qualquer indício de sua existência. Para ele: “Existem,

contudo, algumas teorias descobertas que se mantêm vivas até hoje, concorrendo para tornar

a sociedade mais feliz. É o tempo que determina o valor de todas as coisas. Por esse motivo,

embora tenhamos plena certeza de que uma teoria seja absolutamente verdadeira, inalterável

e eterna, não podemos saber quando aparecerá outra que a destrua, nem quem o fará”.

(2000, p. 55)

O surgimento de novas descobertas pontuam suas diferenças, à medida que se dis-

tanciam das já existentes. Ou seja, o discurso das novas teorias não se adequam às já exis-

tentes, tornando-se um anúncio do rompimento das formas anteriormente já inseridas no

contexto.

Também nele, nota-se a atenção em fazer uma conexão entre a educação e a vida

prática. Essa aproximação possibilitaria, sem dúvida, um resultado diferenciado, já que as

pessoas se preocupariam mais com a aplicabilidade do que aprenderam em sala de aula e

comprovariam a afirmação do método pedagógico educativo.

Naturalmente seria muito mais atraente e agradável estudar, pois todos teriam acesso

ao conhecimento didático pedagógico e também a comprovação dos resultados obtidos com

sua própria experiência. Sem contar que tal situação aproximaria as pessoas ao frequentar

locais comuns, dialogar e discutir assuntos de interesses comuns e variados.

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2.4 Fraternidade entre seres humanos como o objetivo da reli-

gião-educação

Ao se libertar de si, o indivíduo homem encontra o outro, vê o outro e nesse diálogo

se descobre mais intenso, maior, mais completo. Conforme as palavras de Gadamer: “O que

perfaz um verdadeiro diálogo, não é termos experimentado algo de novo, mas termos en-

contrado no outro algo que ainda não havíamos encontrado em nossa própria experiência de

mundo”. (2002, p. 246)

Ao se negar a conhecer a alteridade, priva-se de conhecer a si mesmo. Para que o

diálogo se estabeleça é necessário reconhecer, na existência do outro, a mesma verdade de

si. Ou, à medida que um se considera proprietário do conhecimento, nega ao outro a oportu-

nidade de se expressar, inexistindo daí o diálogo. O espaço comum desaparece, sendo ocu-

pado pelo desrespeito pelo outro.

Faz parte da conquista do diálogo, o desejo de aprender, tomar conhecimento de co-

mo o outro pensa, suas propostas e sonhos. Quando isso se realiza, surge o acolhimento e

muitas vezes novas perspectivas de olhar, uma nova interpretação diante do momento. “A

diferença deve suscitar não o temor, mas a alegria, pois desvela caminhos e horizontes inu-

sitados para a afirmação e crescimento da identidade. A abertura ao pluralismo constitui um

imperativo humano e religioso.” (TEIXEIRA, 2006, p. 37)

Tem-se em M. Eliade, uma história recontada de H. Zimmer:

“Assim, pois, o verdadeiro tesouro, aquele que põe fim à nossa miséria e às nossas provações, não está nunca muito longe, não é preciso procu-rá-lo num país distante, ele habita enterrado nos recantos mais íntimos da nossa própria casa, que dizer, do nosso próprio ser. Ele está por de-trás do fogão, no centro da dor de vida e de calor que comanda a nossa existência, no coração do nosso coração, mas só se o soubermos esca-var. Mas há, então, o facto estranho e constante de ser somente após uma piedosa viagem a uma religião longínqua, a um país estranho, so-bre uma terra, que o significado desta voz interior, guia de nossa pes-quisa, se poderá revelar a nós. E a este facto estranho e constante vem-se juntar outro, a saber, que aquele que nos revela o sentido da nossa misteriosa viagem interior deve ser, ele próprio, um estranho, possuidor de uma outra crença e de uma outra raça”. (1987, p.144)

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2.4.1 A noção de fraternidade e alteridade

“Sempre afirmei e continuo afirmando: quem deseja ser feliz, deve pri-meiramente tornar feliz seus semelhantes, pois a divina recompensa que disto provém, será a verdadeira felicidade. Buscar a própria felicidade com o sacrifício alheio, é criar infelicidade para si mesmo”. (M. Sama, 2000, p. 370)

No olhar de Meishu-Sama, privilegiar o outro é fator decisivo para se obter a felici-

dade. Concretamente, existem várias maneiras de fazê-lo, o que torna a religião pragmática.

Aplicados de forma constante, os vários campos sociais teriam suas formas modificadas,

inter-relacionando-se com o propósito de beneficiar a todos, com uma metodologia capaz de

atender às necessidades do conjunto.

Esta nova concepção de saber trará uma visão de mundo diferenciada, de considera-

ções sobre a educação ideal. A construção desse novo conhecimento adquirido coaduna

com o chamado ser integral, pois sendo formado continuamente com base na espiritualida-

de, sua competência e habilidades serão concernentes com a formação de um ser mais vol-

tado para o outro, mais capaz de se identificar no outro.

Peter Senge cita uma conversa que teve com Louis van der Merwe e seus colegas

James Nkosi e Andrew Mariti, em seu livro “Caderno de Campo da Quinta Disciplina”, bas-

tante interessante, que nos ajuda a compreender melhor o valor do outro. Diz:

“Entre as tribos do norte do Natal, na África do Sul, o cumprimento mais comum, equivalente a “oi” em português, é a expressão Sawu bo-na, que literalmente significa “eu vejo você”. Se você é um membro da tribo, pode responder dizendo Sikhona, “estou aqui”. A ordem da troca é muito importante: até que você me veja, eu não existo. É como se, ao ver-me, você me conferisse existência. Esse significado, implícito na linguagem, é parte do espírito ubuntu, uma forma de pensar que é co-mum entre os povos nativos da África subsaariana. A palavra “ubuntu” provém do ditado popular Umuntu ngumuntu nagabantu, que, em Zulu, traduz-se literalmente como: “uma pessoa é uma pessoa por causa de outras pessoas”. Se você cresce com essa perspectiva, sua identidade baseia-se no fato de que você é visto, de que as pessoas ao seu redor o respeitam e o reconhecem como pessoa.” (2000, p. 19)

A realidade da interdependência é mostrada como uma definição da existência hu-

mana.

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2.4.2 Religião-Educação como caminho de fraternidade

Balada de Ouro Preto

Parei a uma porta aberta para mirar um ladrilho.

Veio de dentro o leproso como quem sai de um jazigo. Caminhava ao meu encontro,

sinistramente sorrindo.

Mas, vi-lhe os braços de líquen, e as duas mãos desfolhadas,

que cauteloso escondia nos fundos bolsos das calças. Chamas de um secreto inferno

em seu sorriso oscilavam.

Fora menos triste a lepra do que o fogo do sorriso E era linda aquela casa com o vestíbulo vazio;

e era alegre aquela porta de claro azulejo antigo.

Ó santos da Idade Média,

descei por esta ladeira parai a esta porta suave,

que de azul toda se enfeita, tocai estes braços fluidos

que vão sendo rosa e areia,

tornai-os firmes e pulcros, com mãos lisas, dedos novos, para que este homem não fite

ninguém mais com os mesmos olhos, e, seja outro o seu sorriso per saecula saeculorum.

Cecília Meirelles

Melhores Poemas (1984, pp.100/101)

Para Meishu-Sama, sendo a religião um processo educativo, ela deve gerar fraterni-

dade entre pessoas, conduzindo-as ao respeito pelo outro, ao amor ao próximo, a entender

este outro como semelhante.

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Denominado humano, tendo princípios com características hipoteticamente superio-

res, ao ser humano foi dada a oportunidade de optar pelo conhecimento da importância da

solidariedade. No caso em tela, Assman e Jung afirmam:

“Quando desejamos o mundo [que nasce do encontro e do reco-nhecimento da dignidade humana] assim, produzimos e passamos a viver dentro de um horizonte de esperança e de utopia. Utopia no sen-tido de desejar e de “ver” um mundo, um lugar, “topos”, que ainda não existe e que talvez nunca venha a existir, mas que dá um sentido as ações que nascem do nosso desejo de um mundo melhor. Este horizonte de utopia e de esperança nascem juntamente com este desejo de vivenciar a sensibilidade solidária para além das relações pessoais, ou em um pequeno grupo, o desejo de que toda a sociedade, toda a rea-lidade seja invadida e “grávida” desta solidariedade mais genuína” (2000, pp. 134/135)

Apesar da dificuldade de disseminar a importância da compreensão do diálogo eu –

outro, com a finalidade da reformulação da educação, é imposto a nós, a importância que

disto advém, diante do quadro que se nos apresenta aos olhos. Proporcionar este incansável

desvelamento e de fundamental importância para o futuro da humanidade, tendo em vista

que valorizar cada um como um todo e respeitar neste todo a particularidade de cada um e

abrir possibilidades para o amanhã, conforme nos apresenta Sung:

“Percorrer este caminho e reconhecer a beleza e o mistério da vida, as suas alegrias e as suas dores, os limites e as possibilidades, e encontrar dentro de cada um de nos e no interior das relações de reconhecimento mutuo com outras pessoas a força para continuar lutando para superar as dificuldades e construir um mundo melhor para todos e todas e encantar-se com a vida, e sentir que, apesar de tudo, vale a pena vi-ver e lutar.” (2007, p. 157)

Meishu-Sama, ao classificar as religiões, diz haver três tipos: nível superior, médio e

inferior. Com isto, quer pontuar que não é suficiente apenas pertencer a uma religião. Como

tal, também na educação existem níveis, sendo importante conhecer a educação que está

sendo desenvolvida no mundo contemporâneo. Não é o bastante ter uma formação educa-

cional; é necessário que se observe qual o tipo de educação é e como vem sendo aplicada

nas escolas.

A pergunta é: o modelo da educação atual atende às necessidades do homem? Faz

dele um modelo de ser humano, portanto alguém que possa servir como exemplo ao outro?

Para Meishu-Sama, o conteúdo a ser inserido nessa educação contemporânea evidencia a

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importância de compreender que “a causa está no caráter animalesco existente no interior

dos homens, o qual recusa a Religião. Ou seja, é porque o mal não gosta do bem. Daí po-

dermos dizer que a educação da atualidade forma as “inteligências” do mal”. (2000, p. 50)

Hoje, na educação contemporânea, exige-se um novo olhar para todo o processo e-

ducativo, principalmente no que diz respeito à formação do ser cidadão, quanto ao seu con-

teúdo. A escolha tornou-se então um processo dinâmico, atuante para o caminho na relação

professor/aluno, em que cada um possa diagnosticar seus pensamentos, palavras e ações

consubstanciados no altruísmo, no diálogo, no respeito ao pensar o outro. Quão seria ideal a

escola onde a educação desenvolvida pudesse nortear o homem na busca de seu objetivo

maior que foi e sempre será – a felicidade.

Na dinâmica humana, ao se pensar em ciência, pode-se observar o quanto do pro-

gresso e o avanço representa o homem contemporâneo. Hoje, este homem não vive mais

sem aparelho celular, sem computador, sem iPod. O fato de não poder viver na sociedade

sem acesso a estes meios de comunicação transforma o homem em um ser dependente da

máquina, como se tratasse de uma relação interpessoal. Nos dias atuais, o homem transferiu

para a máquina o referencial teórico de representante de Deus, ou seja, ele fez da máquina, o

outro. Àquele de que ele depende para sobreviver. Com isso, o homem transformou o outro

em um objeto, com um valor mínimo dentro da vida social.

Morin sinaliza a importância da fraternidade, quando cita: “...temos que voltar a ape-

lar às boas vontades de todos, a solicitar que se associem entre si para salvar a humanidade

do desastre. As boas vontades advirão de todos os horizontes e nelas estarão incluídos os

inquietos, os bastardos, os órfãos, os generosos...” (MORIN, 2000, p. 75) E: “Nela [educa-

ção] encontra-se a missão propriamente espiritual da educação: ensinar a compreensão entre

as pessoas como condição e garantia da solidariedade intelectual e moral da humanidade”

(idem, 2007, p. 93)

2.5 Religião e educação e o estado natural dos seres huma-

nos

“Ultrapassar a grande fase de transição significa ser aprovado no exame divino, e a Fé é o único caminho para obtermos aprovação. As qualificações para ultrapassar essa fase são as seguintes:

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a) tornar-se um homem verdadeiramente sadio, e não apenas na aparência; b) um homem que se libertou da pobreza; c) um homem de paz, que odeia o conflito.” (M. Sama, 2000, p.

14)

Severas críticas foram feitas à Igreja Messiânica Mundial no passado, no Japão, de-

monstrando que esta, enquanto religião, não deveria se submeter a aparentes tratamentos

curativos de doenças, e sim, preocupar-se em “salvar o espírito que há por trás do físico”.

Eis aí o pensamento que reduz a força da religião, limitando-a a um espaço bem menor do

que sua responsabilidade – cuidar do ser de maneira integral, como um todo.

Meishu-Sama afirma:

“Se fizerem uma profunda análise da Igreja Messiânica Mundial, com-preenderão que ela não só é de caráter popular como teórico. Podemos dizer mesmo que é uma Ultra-Religião, inédita para a humanidade. E não é só isso. O que defendemos não se restringe apenas à Religião. Nosso objetivo é dar a mais alta diretriz ao campo da Medicina, da A-gricultura, da Arte, da Educação, da Economia, da Política, enfim, a tu-do quanto diz respeito ao homem.” (2000, pp.181/182)

Para ele, a religião precisa conduzir o homem à consciência da importância de viver

sua fé no cotidiano. É a partir desse exercício que ele entende ser a educação, capaz de in-

troduzir a religião como um método de ensino.

Para Meishu-Sama: “... ter fé, crer naquele Ser Invisível, é o atributo essencial do au-

têntico homem de bem. Estou convencido de que nada, além da Fé, nos poderá salvar dos

conceitos excessivamente desmoralizadores que caracterizam a época atual”. (2000, p. 200)

Ele vê a crença na existência de um ser superior como requisito primordial para uma pessoa

ser considerada como homem do bem. Esse bem como elo fundamental da aproximação do

que chama estado natural das coisas.

Segundo ele: “O desejo de ser simpático, gentil, fiel à profissão, almejar o benefício

e a felicidade do próximo, render graças, manifestar gratidão e esforçar-se no sentido de

agradar a Deus, também são práticas do bem”. (2000, p. 198)

Práticas de boas ações, compaixão, justiça social, amor à humanidade, são vistas

como ações do bem, que ele entende ser o estado natural das coisas. É necessário ensinar

esse tipo de ação ao homem, por parecer ter ele esquecido no mundo contemporâneo. Mui-

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tas escolas estão apenas desempenhando o papel de reprodutores de disciplinas necessárias

para aprovação no final do ano letivo.

Morin descreve a sociedade elitizada como a detentora “de um saber abstrato, parce-

lar e mutilante”. Para ele: “Por tudo isso é que atualmente não podemos confiar na educa-

ção, pois antes de mais nada seria necessário educar os educadores, para que estes pudessem

esclarecer os alunos”. (2000, p. 75)

Para a construção de uma educação mais efetiva é necessário reconhecer que não e-

xistem certezas, mas possibilidades, e que o pensamento humano deve estar preparado para

lidar com estas. Educar para a incerteza é uma necessidade premente, diante da importância

de reformar o pensamento para abri-lo a novas possibilidades. Encarar esse desafio é um

caminho sem volta, diante dos problemas que se apresentam hoje à sociedade.

Se, por um lado, o progresso da ciência coloca em risco a sobrevivência humana,

por outro, a crença de que é possível a construção de novas possibilidades sugere abertura

para o século XXI. Segundo Morin: “E a educação, que é ao mesmo tempo transmissão do

antigo e abertura da mente para receber o novo, encontra-se no cerne dessa nova missão”.

(2007, p. 72)

E acrescenta:

“Por isso, a educação deveria mostrar e ilustrar o Destino mulifacetado do humano: o destino da espécie humana, o destino individual, o desti-no social, o destino histórico, todos entrelaçados e inseparáveis. Assim, uma das vocações essenciais da educação do futuro será o exame e o es-tudo da complexidade humana. Conduziria a tomada de conhecimento, por conseguinte, de consciência, da condição comum a todos os huma-nos e da muito rica e necessária diversidade dos indivíduos, dos povos, das culturas, sobre nosso enraizamento como cidadãos da Terra...” (i-dem, p. 61)

Sobre esta ideia Meishu-Sama diz que: “... a atividade da Igreja Messiânica Mundial,

no plano individual, consiste em salvar o homem da pobreza e contribuir para sua saúde

física e mental; no plano social, sua finalidade é construir uma sociedade sadia e pacífica”.

(2000, p. 22), justificando a importância do homem ser analisado como um ser integral. Se-

gundo sua interpretação, este homem, observadas as diferenças de valores existentes em

cada um, se percebe reconhecido, quando se expressa. Ao se revelar, participa e nisto se

completa.

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No campo da educação, a abordagem para a construção de uma escola onde se a-

prende, começa segundo Meishu-Sama, por um local onde a beleza se faça presente. Seja

pela ordem, limpeza, em ambientes claros e, sendo possível, sempre tendo a presença de

flores. Recriar escolas a partir desse modelo é possível, desde que pessoas estejam dispostas

a reconhecer que não são detentoras de todo o conhecimento. Pragmatizar conhecimento é,

antes de tudo, ser capaz de reconhecer seu próprio limite.

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CAPÍTULO III

DIÁLOGO ENTRE O PENSAMENTO DE MEISHU-

SAMA E O PENSAMENTO DE PAULO FREIRE

No terceiro capitulo aprofundaremos o estudo da relação entre a religião e educação, es-

pecialmente a função humanizadora da educação. Nesse movimento é preciso aprofundar a

educação inovadora como centro da religião, e um autor que ajuda na compreensão desse

processo é Paulo Freire com sua proposta de educação dialógica que realiza a vocação hu-

mana da humanização e liberdade. Educação essa que tem como finalidade tornar o ser

humano um ser liberto dos preconceitos e o leva à capacidade de Ser mais. Do caráter linear

da história da educação, em que a reprodução se tornou método de vida, chamada por Freire

como educação bancária, à educação problematizadora que questiona, faz pensar e liberta,

traçamos um paralelo nesta pesquisa.

Nascido em Recife, Pernambuco, em 19 de setembro de 1921 e falecido em 2 de

maio de 1997, Paulo Reglus Neves Freire é considerado o mais brilhante educador

brasileiro, tendo sua obra ultrapassado as fronteiras do País, tornando-se reconhecido pelo

mundo. Desenvolveu seu trabalho na área da educação popular introduzindo duas vertentes

nele: a escolarização e a formação da consciência.

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De família de classe média, em sua infância sofreu pela fome e pela pobreza ante a

depressão de 1929. Essa vivência tornou-se o alicerce de sua trajetória, na busca por ajudar a

construir uma pedagogia reconhecida no mundo como pedagogia crítica.

Durante toda sua vida lutou pela educação popular, pela assistência educacional aos

mais necessitados, tornando-se inspiração para professores, principalmente na América Latina

e África. Uma de suas primeiras experiências mais marcantes aconteceu no Rio Grande do

Sul, em 1963, quando em quarenta e cinco dias contemplou 300 adultos com o ato de ler e

escrever, desenvolvido por meio de um método de alfabetização por ele criado.

No período do regime militar (1964-1985) sofreu duras perseguições por buscar direi-

tos iguais para todos, tornando-se um agente de subversão aos olhos de alguns, tendo sido

“convidado” a deixar o País, exilando-se. Sua obra fundamentou-se em algumas correntes do

pensamento filosófico como a fenomenologia, o existencialismo cristão, tornando-se modelo

para a sociedade e diversos seguimentos desta, como para teólogos, pedagogos, cientistas

sociais, militantes políticos.

Paulo Freire

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3.1 Educação e a dialética da humanização em Paulo Freire

Em toda obra freiriana, há presente um conjunto composto de seriedade e alegria,

prazer e rigorosidade. Ao dizer que o querer bem é formado de saberes, e estes, formados de

querer bem, Freire desenha a importância que tem a educação para a construção de uma

sociedade melhor para todos.

Para ele, educar é um ato ético. Como dizia: “Gostaria, por outro lado, de sublinhar a

nós mesmos, professores e professoras, a nossa responsabilidade ética no exercício de nossa

tarefa docente. Sublinhar esta responsabilidade igualmente àquelas e àqueles que se acham em

formação para exercê-la. (1996, p.16) Afirmava ser a ética um instrumento de oposição às

injustiças e qualquer atitude injusta deveria ser combatida pela ética. Ele via o ato de indig-

nar-se diante dos desmandos e desfeitos como meio de protesto à violação dos direitos dos

fracos.

Para ele, as características básicas do educador devem ser:

- “amorosidade” – profundo amor ao aluno e ao conhecimento;

- “tolerância” – ser capaz de aceitar a diferença e conviver com ela como um valor

numa postura radicalmente condenatória de qualquer forma de discriminação;

- “aceitação” – de todos aqueles que não possuem o “trato” esperado porque eles cer-

tamente são maltratados pela vida;

- “coerência” – o grande testemunho de lealdade e

- “profissionalismo” – reconquistar o direito de brigar – o que deve mudar é nosso

jeito de brigar, mesmo para ganhar “menos imoralmente para viver menos imoralmente”;

- “lutar por um país menos feio” – porque ninguém nasce para ser feio – a gente se

torna feio ou bonito na medida em que a gente luta com alegria e esperança.

E por fim, o legado da esperança: o educador deve arranjar um jeito de regar todos

os dias sua esperança, como se rega uma tenra plantinha” (trechos de uma das últimas en-

trevistas de Paulo Freire dada ao CENPEC-SP).

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O pensar “à moda freiriana” implica em uma liberdade de promover a educação de

uma forma diferenciada, baseada em princípios de igualdade, de partilhar, de envolvimento,

e, sobretudo, de reconhecimento do outro.

Neste mesmo sentido, a compreensão de Meishu-Sama sobre religião leva a discutir

religião como educação. Ele vê a religião como educação em um processo contínuo para o

aperfeiçoamento do ser humano e, portanto, altera a ideia de religião. Para ele, a própria

religião tem que ser um processo dinâmico e sempre estar recriando. Nesse processo é pre-

ciso aprofundar a educação inovadora como centro da religião.

Se a religião é processo educativo, ela deve gerar fraternidade entre pessoas, na lin-

guagem de Meishu-Sama, restaurar o estado natural nos seres humanos.

A educação contemporânea mostra que, desgastada, não apresenta solução para o sa-

ber, o autoconhecimento. Seria este o momento de se buscar em Paulo Freire uma nova

leitura de vida, uma perspectiva de leitura de mundo diferente da que se faz até hoje? Ao se

tentar conhecer o universo da esperança em Freire, é possível aprender novas oportunidades

para alcançar um futuro diferente. Nele, os sonhos de justiça, paz e solidariedade igualmen-

te são possíveis, a partir da educação que ele propõe.

Sobre este assunto, Meishu-Sama diz:

“... No íntimo de todo ser humano, há uma luta constante entre o bem e o mal. [...] É incompreensível que nem o governo nem os educadores percebam algo tão óbvio. Eles se limitam a suspirar, dizendo que, atu-almente, há muitos crimes inescrupulosos e que a delinquência juvenil aumenta dia a dia. Não conseguem libertar-se de ideias anacrônicas, que cheiram a mofo, e só a muito custo determinam o restabelecimento des-te ou daquele princípio ético ou moral, a reforma de métodos educacio-nais, etc.” (2000, p.211)

A ideia do novo, muito embora assuste, na verdade torna-se uma grande oportunidade

de enfrentar um desafio. A construção desse novo é feita passo a passo, sem ser percebida e,

como diz Freire:

“É preciso ousar, no sentido pleno desta palavra, para falar em amor sem temer ser chamado de piegas, de meloso, de a-científico, senão de anticientífico. É preciso ousar para dizer cientificamente que estuda-mos, aprendemos, ensinamos, conhecemos com nosso corpo inteiro. Com sentimentos, com as emoções, com os desejos, com os medos, com as duvidas, com a paixão e também com a razão crítica. Jamais com esta

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apenas. É preciso ousar para jamais dicotomizar o cognitivo do emocio-nal”. (1993, p.10)

Para Paulo Freire, o homem ao se conscientizar, se liberta e forma, a partir daí, sua vi-

são de mundo. Consciente de seus erros e acertos, muitas vezes dolorosos, assume para si

próprio o perdão/condenação ou louvores. A libertação gera riscos que se fazem necessários

para continuar a caminhada. Caminho este que se constrói, caminhando, adquirindo conhe-

cimento e acumulando experiências no caminhar.

Todo terreno inexplorado requer cuidados, partindo do pressuposto que um passo é

dado após outro, em direção a quê? Ao se fazer consciente, surge dúvidas e, junto com elas,

respostas muitas vezes que não atendem e saciam a curiosidade. Quanto mais a consciência

se revela, mais o sujeito se torna crítico e todo desconhecido gera insegurança. O sujeito

consciente se percebe parte da história, construtor, não observador, e se afirma.

Há também aqueles que, negando a liberdade, por temê-la, se travestem e manipulam

a prisão, em nome da suposta “liberdade”. Ser liberto significa ser consciente de seu papel

diante da sociedade. A manutenção do "status quo" é produto de uma educação reproduzida

há muito tempo, sendo tudo, menos libertadora.

Para Paulo Freire, o homem, ser desconhecido para si mesmo, ao se questionar, se

descobre ignorante: dele mesmo, do universo ao seu redor, enfim das razões de ser um ser.

Ao se questionar, levanta problemas e hipóteses, muitas vezes inseridas na realidade, que

não se lhe apresentam como respostas, mas como novas questões a serem respondidas.

A História se mostra hoje tão ou mais desumana do que em qualquer outro momento

da vida. A partir deste olhar, o homem se acredita parte desta mesma história, reconhecendo

que:

“É também, e talvez, sobretudo, a partir desta dolorosa constatação, que os homens se perguntam sobre a outra viabilidade – a de sua humaniza-ção. Ambas, na raiz de sua inconclusão que os inscreve num permanen-te movimento de busca. Humanização e desumanização, dentro da his-tória, num contexto real, concreto, objetivo, são possibilidades dos ho-mens como seres inconclusos e conscientes de sua inconclusão”. (FREIRE, 1983, p.30)

Para ele, a vocação dos homens é negada em vários campos de atividade e afirmada, a

cada vez que eles se conscientizam da necessidade de lutar pelos seus direitos. A humaniza-

ção e a desumanização são possibilidades e opções inerentes ao homem, como recurso para

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a liberdade ou prisão, embora em ambos os casos o processo se dá por conta do significado

da vocação do ser mais ou ser menos.

A batalha pela desumanização se desenvolve a partir da consciência da importância de

se afirmar como seres para outros. Ou pelos outros. Essa luta se processa no interior do ho-

mem e se expressa em seu comportamento social, a partir da negação da opressão. O outro

só é visto quando cessa a injustiça do ser dominado e passa-se a enxergar o ser dominado. O

saldo desta luta é positivo quando o ser entendido como ser menos, não perpassa a “linha

inimiga” e se torna o opressor, mas quando se percebe o construtor de uma nova história,

fundamentada na dialogicidade.

Paulo Freire

E aí, Freire apresenta a grande tarefa humanista e histórica: libertar opressores e opri-

midos. Segundo ele, “só o poder que nasça da debilidade dos oprimidos será suficientemen-

te forte para libertar a ambos”. (ibidem, p. 31)

É possível encontrar aí uma suposta generosidade, quando o opressor representa um

papel visando a seu próprio interesse. Dissolver este parecer e diminuir a distância até o

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desaparecimento compõe a verdadeira generosidade. Ao se humanizar, o homem estará res-

taurando esta generosidade.

Martins Fontes, poeta santista, médico sanitarista (1884-1937), em um de seus poemas

dizia: “Como é bom ser bom”. Assim, naturalmente.

Identificar o opressor hospedado no oprimido é o primeiro passo para restabelecer a

consciência da humanização na pedagogia libertadora. Tomar consciência que o opressor

está incorporado no oprimido retoma a ideia da dualidade interna existente no oprimido e

restabelece o sentido de desumanização. Baseado em uma reprodução de conhecimento,

muitas vezes o oprimido se percebe opressor diante de circunstâncias existenciais que se lhe

apresentam.

No ideal libertário, o homem vê a possibilidade de se reconhecer como um novo ho-

mem. Todavia este novo homem, sendo ele mesmo, é identificado como opressor, na justa

medida da reprodução de conhecimento.

Assim, este novo homem reproduzindo conhecimento, será o novo patrão e proprietá-

rio, demonstrando a repetição de antigos dogmas – eu mando, você faz. As revoluções apre-

sentam muitos aspectos interessantes dos papéis que se invertem, à medida que o poder é

legitimado.

Paulo Freire apresenta dois aspectos da manifestação do “medo da liberdade”. Para o

oprimido, surge o risco de se tornarem opressores diante da liberdade. Já para os opressores,

se apresenta como a possibilidade de perdê-la.

A liberdade é fator de conquista, uma busca incessante, uma luta permanente pelo

homem que não há tem fora de si, mas internamente. Ela, se conquistada, transforma e ca-

pacita a busca do ser mais. Desta forma, ao iniciar a procura pela liberdade, o homem estará

também buscando se superar.

Toda pedagogia, se libertadora, sempre estará vinculada aos oprimidos. A pedagogia

que parte dos interesses particulares de seus indivíduos, torna-se um instrumento de opres-

são.

Cristovam Buarque diz:

“Iniciada no regime colonial, consolidada em um país dividido e depen-dente, a educação brasileira nunca teve oportunidade de educar-se ela própria. Não teve objetivos que visassem à educação como meta de seu

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povo, e instrumento da construção de uma modernidade que significasse ampliação do horizonte de liberdade.” (BUARQUE, 1991, pp. 54-55)

E:

“A maior parte dos defensores do ensino público concentra seus esfor-ços na luta pela estatização, sem explicitar uma preocupação com a re-forma necessária para transformar a instrução estatal em uma educação a serviço dos interesses públicos e do futuro. Alguns não defendem a necessidade da avaliação, de demissão dos incompetentes e dos irres-ponsáveis, nem um compromisso com a qualidade e a busca de soluções para os problemas do país e do seu povo. Por isso, a educação precisa ser educada.” (ibidem, p. 55)

Diante dessa situação o homem sempre estará diante da cultura de dominação. No

primeiro instante, através de novo olhar do oprimido diante do mundo dominador e no se-

gundo momento, pela queda da estrutura opressora e impositora, tudo a partir da mudança

revolucionária.

O mundo onde se desenvolve a batalha do opressor diante do oprimido é formado de

contradições, onde o oprimido é proibido de ser, sofrendo uma violência, muitas vezes aco-

bertada por uma representação. Interessante observar que enquanto houver opressores have-

rá oprimidos e que estes, ao se manifestarem lutando, substituirão aqueles à violência pela

humanização. E que desta transformação surgirá o homem novo que liberto da opressão,

será capaz de ser mais.

Com esta nova perspectiva de vida, surge o risco de, deixando de ser oprimidos, torna-

rem-se opressores e, em contrapartida, os que antes eram opressores, ao se verem libertos

“dessa responsabilidade”, é possível sentirem-se oprimidos. O fato nasce, diante da necessi-

dade de se manterem com os mesmos privilégios anteriormente adquiridos, diante da opres-

são.

Entendendo como “direito adquirido”, sentir-se-ão na posição de oprimidos, não reco-

nhecendo em tal situação, o desrespeito aos sofredores. Para eles, só importava a situação

favorável em que viviam, a despeito da sobrevivência alheia, se é que tinham consciência

disso. Dessa dicotomia nasce a violência que, tornando-se hereditária faz o opressor comu-

mente apropriar-se de tudo que o cerca. A ele, parece ser possível tudo comprar, tendo o

lucro como seu foco principal.

Para Jung Mo Sung:

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“Numa sociedade assim, os bens culturais e simbólicos passam a ser fundamentais no processo de acumulação do capital. Com a massifica-ção da produção permitida pela industrialização moderna, houve uma certa democratização no consumo de bens não-duráveis. Assim, a busca pela diferenciação social passou a se dar especialmente através de con-sumo de bens simbólicos.” (SUNG, 2005, p. 77)

Para ele: “Falar em cultura de consumo é falar de uma cultura onde as propagandas

associam estilos de vida e identidades ao consumo de determinadas mercadorias e os meios

de comunicação expressam e veiculam essa forma de ver a vida.” (idem, p. 77)

Para o opressor o ter é condição para ser, desconhecendo ele nisso, o lado oprimido.

Só a ele cabe a humanização. Aos outros, que para eles são coisas, isso pode ser visto como

subversão. Quanto mais o opressor vê o oprimido querendo Ser mais, mais ele tenta contro-

lá-lo e o coisifica, dominando seus objetivos.

O comportamento daquele que se compromete com o povo, há que ser sempre revisto,

pois a quem fizer esta escolha resta cuidar muito bem de sua postura para não cair na arma-

dilha do ser como outros. Afinal, o compromisso de libertação, se não partilhado com o po-

vo, não tem sentido. Este momento tem um significado grande, diante da importância da

renovação, porque requer uma compreensão do comportamento do oprimido, diante do do-

minador.

Enquanto o oprimido não identifica dentro de si o opressor, ele traz para si a respon-

sabilidade da situação, porque hospeda o opressor em seu interior, entendendo a realidade

que vive como “destino”, “foi Deus quem quis”, submetendo-se à exploração do outro.

Nos dizeres de Freire: “Há, por outro lado, em certo momento da experiência existen-

cial dos oprimidos, uma irresistível atração pelo opressor. Pelos seus padrões de vida. Parti-

cipar desses padrões constitui uma incontida aspiração.” (FREIRE, 1983, p. 53)

3.2 Educação e práxis para libertação/humanização

Paulo Freire diz:

“Os oprimidos nos vários momentos de sua libertação, precisam reconhecer-se como homens, na sua vocação ontológica e histórica de Ser Mais. [...] Estamos convencidos, pelo contrário, de que a refle-xão, se realmente reflexão, conduz à prática. Por outro lado, se o mo-

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mento já é o da ação, esta se fará autêntica práxis se o saber dela re-sultante se faz objeto da reflexão crítica”. (1983: p. 57)

Em Freire, a práxis da conscientização se faz presente a partir do referencial subdivi-

dido em: humanização, vocação nata no homem, que encontra empecilhos à sua realização,

advindos da opressão; na afirmação de que pessoas são capazes de mudar sua realidade,

sujeitos transformadores da ação, produzindo novos resultados e na educação, que nunca é

neutra, em que o sujeito se posiciona como ativo ou passivo, dentro de sua realidade.

“[...] não haveria ação humana se não houvesse uma realidade objetiva, um mundo como “não eu” do homem, capaz de desafiá-lo; como tam-bém não haveria ação humana se o homem não fosse um projeto, um mais além de si, capaz de captar a sua realidade, de conhecê-la para transformá-la”. (FREIRE, 2003, p. 40)

Entender a práxis como ação reflexiva mostra a habilidade que o ser humano possui

de entender o seu entorno como local de ação. É só na relação eu-outro que se compreende

o perfeito conceito de práxis. A análise concebida de práxis retém o significado de que este

só se realiza com a transformação. “Existir, humanamente, é pronunciar o mundo, é modifi-

cá-lo. O mundo pronunciado, por sua vez, se volta problematizado aos sujeitos pronuncian-

tes, a exigir deles novo pronunciar. (2003, p. 78)

De tanto sofrerem opressão, os oprimidos aceitam uma condição inferior e fazem do

outro, o dono da razão e superior. A submissão existe a partir da não consciência de ser o-

primido, trazendo a concordância com o sistema. Ao se fazer consciente, ele se percebe ca-

paz de conhecer a liberdade e se rebela. E é neste momento que há necessidade da ação.

Não uma ação simples, como mero desejo de transformar a situação, mas uma ação refleti-

da, reconhecida como práxis.

Quando Freire diz: “Ação e reflexão, de tal forma solidárias, em uma interação tão ra-

dical que, sacrificada, ainda que em parte, uma delas, se ressente, imediatamente, a outra.

Não há palavra verdadeira que não seja práxis. Daí que dizer a palavra verdadeira seja trans-

formar o mundo” (2003, p. 77) quer dizer que a relação ser humano-mundo só se faz enten-

dida quando agente e ação se reconhecem no contexto. Contexto este que se transforma co-

mo reação a ação.

Balbinot cita Freire: “Ação só é humana quando, mais que um puro fazer, é um quefa-

zer”. (2003, p. 40) Para o primeiro:

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“Fica evidente, aqui, que a ação humana, para além da estrutura instru-mental, intenciona o ser mais, ou seja, o ser humano age na sua relação com o mundo e partir de um projeto. A ação humana é, por assim dizer, ao mesmo tempo, uma ação produtiva e uma ação moral. Concebida como práxis, como quefazer, a ação humana não se reduz a uma adapta-ção dos seres humanos ao mundo ou a uma apropriação do mundo pelo ser humano. Ela resulta da imbricação de ambos, de modo a não ser possível, segundo o autor, homens sem mundo nem mundo sem ho-mens”. (2006, p. 127)

Para este diálogo é necessário que seja convidado o oprimido, a fim de que realmente

ele se reconheça homem, se manifeste e traga para a ação a sua reflexão. Ele precisa ser

acreditado como um ser autossuficiente no pensar. Caso isso não seja respeitado, cria-se

uma situação de dominação e a liberdade é ameaçada, transformando a relação em depen-

dência.

A necessidade de o oprimido buscar sua liberdade surge a partir da conscientização de

desejar modificar o estado no qual ele se encontra, através da práxis, ciente de ser sujeito e

não uma “coisa”. Essa mudança é real, verdadeira quando acontece com eles e não para e-

les. Diante da situação que leva o oprimido a refletir sua necessidade de transformar-se, há

aí um caráter pedagógico de formação, de comprometimento, de aceitação, de responsabili-

dade, em que seu papel seja de articulador da realidade, atuante no processo vigente.

Para que se tornem construtores de seu próprio futuro é necessário compreender que

não são mais “coisas”, com a práxis tornam-se homens proprietários de sua reconstrução,

engajados na luta com importantes elementos do que fazer.

Como diz Freire:

[...] os homens são seres da práxis. São seres do quefazer, diferentes, por isto dos animais, seres do puro fazer. Os animais não ‘ad-miram’ o mundo. Imergem nele. Os homens, pelo contrário, como seres do quefa-zer ‘emergem’ dele e, objetivando-o, podem conhecê-lo e transformá-lo com seu trabalho”. (1983, p. 145)

Ao fazer esta afirmação, propõe ser o homem o elemento fundamental para transfor-

mação do mundo. Diferentemente do animal, o homem é capaz de modificar o mundo que

habita, o seu entorno, consciente de que é produtor do seu meio.

Hoje, a relação existente entre educador-educando é coberta de um caráter dissertati-

vo, narrativo, em que as probabilidades de engessar-se são grandes. Os conteúdos progra-

máticos dados em sala de aula, além de desconectados com a vida dos educandos, têm por

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finalidade cumprir o programa pré-estabelecido, lotado de informações em que o depositá-

rio é o educador, e os educandos desempenham o papel de depósitos de conhecimento. A

repetição faz parte desse projeto de indução “do decorar”. Nada é aprendido, mas tudo é

decorado.

Obviamente, este processo é imediatista porque pouco depois é esquecido. No pensa-

mento freiriano:

“Eis aí a concepção “bancária” da educação, em que a única margem de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos, guar-dá-los e arquivá-los. Margem para serem colecionadores ou fichadores das coisas que arquivam. No fundo, porém os grandes arquivados são os homens, nesta (na melhor das hipóteses) equivocada concepção “bancá-ria” da educação. Arquivados, porque, fora da busca, fora da práxis, os homens não podem ser. Educador e educandos se arquivam na medida em que, nesta destorcida visão da educação, não há criatividade, não há transformação, não há saber. Só existe saber na invenção, na reinven-ção, na busca inquieta, impaciente, permanente, que os homens fazem no mundo, com o mundo e com os outros.” (FREIRE, 1983, p. 66)

Do ponto de vista da educação “bancária”, o conhecimento é transmitido do conhece-

dor para o desconhecedor, numa identidade que retrata o educador como o que sabe e o e-

ducando, o ignorante. Ao se engessar estas posições, concretiza-se a realidade da educação

“bancária”. Nela, como depositária de conhecimentos, o educando torna-se um objeto isento

de criatividade, qualidade intrínseca no ser humano. É-lhe destituída a capacidade de pen-

sar, de refletir e até de sonhar, tornando-se ele, um ser imóvel, estagnado. De agentes trans-

formadores que poderiam tornar-se, passam a ser meros observadores, adaptados, passiveis,

diante dos depósitos que lhe são incutidos.

Em um “modo diferente de contar velhas estórias”, do livro Estórias da Casa Velha da

Ponte, Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas (1889-1985), Cora Coralina, escritora, poeti-

sa, no conto A Pedrinha de ‘Briante” diz:

“Com sua boa caridade, deu leitura e educação de pobre ao sobrinho, que se chamava Izidoro, mas atendido por Zidoro. Deu a ele, sobretudo, uma bom catecismo com sua primeira comunhão, missa dominical, guarda dos dias santos, respeito pelos mais velhos e temor de ofensas a Deus. Perdida não foi para ele a escola, apesar de pouco proveito. Era sossegado e lerdo de entendimento. Pela frequência assídua e bom com-portamento, sempre aprendeu com dificuldade, dele e da mestra, o que de mais fácil a escola ensina e transfere a quem mais não alcança. Lei-tura de coisas fáceis, escrita fácil e continhas fáceis.” (1996, p. 32)

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Neste conto, a autora mostra a realidade da educação bancária de P. Freire, reprodu-

zindo o conhecimento diante da realidade do cotidiano das terras de Goiás.

Distante do espírito crítico e da pergunta por quê como instrumento da passividade

mais cômoda, os educandos/oprimidos recebem alimento para esse ficar, porque para o o-

pressor é a garantia da situação dominante.

A educação “bancária” não leva o educando o pensar. Além de ser conveniente a ela,

o espaço ocupado pelo desconhecimento é também salutar o guardar e devolver as informa-

ções repassadas, dificultando a possibilidade do Ser Mais.

Para que uma educação libertadora se efetive, é necessário que ambos, educa-

dor/educando, vençam as barreiras e se reconheçam construtores de uma educação de co-

nhecimento, cada um desempenhando seu papel. Humanizar-se, dominante e dominado é o

perfil da educação que Freire chama de dialógica, portanto problematizadora.

Ao longo da vida, esta educação “bancária” mostrar-se-á improdutiva à formação da

humanização deste ser, o educando. A aproximação de ambos fará a caminhada menos dolo-

rosa na busca do objetivo comum – a libertação e a humanização. Quanto mais o homem

contemporâneo aceitar passivamente e se adequar, mais ele se capacitará a permanecer no

mesmo estágio de letargia que o leva à submissão. E isto é benéfico ao opressor, que mesmo

inconsciente, utiliza métodos capazes de impor avaliações e impedir o conhecimento verda-

deiro. A realidade é que o con-hecimento é com-unicar-se com os outros. É con-struir junto.

É par-tilhar.

Para Freire, a opressão é necrofilia: ao invés de alimentar com o conhecimento, reti-

ram todas as possibilidades de criatividade, induzindo a não experienciar oportunidades que

o levará à liberdade. Ele cita E. Fromm:

“Um modo, responde, é submeter-se a uma pessoa ou a um grupo que tenha poder e identificar-se com eles. Por esta participação simbólica na vida de outra pessoa, o homem tem a ilusão de que, atua, quando, em realidade, não faz mais que submeter-se aos que atuam e converter-se em parte deles”. (FREIRE, 1983, p. 75)

Há por parte dos dominados, uma necessidade de expressar a “rebeldia” oprimida em

seu interior e essa se manifesta, muitas vezes, através de grupos. Estes não são bem vistos,

por quem domina e uma nova onde de repressão surge, com a finalidade de “organizar” a

sociedade.

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Ao se propagar a educação bancária, está se possibilitando a opressão e a formação de

uma sociedade preconceituosa em suas formulações de pensamento, inconsciente de que

deste ato surgirá em algum momento, uma manifestação indesejável à classe dominadora.

Estabelecer preceitos próprios desta é adequar os dominados a seus espaços de domínio

submisso.

O processo de liberdade autêntica, humanizadora, parte do pressuposto da práxis, da

ação refletida que transformará a sociedade, desvinculando o homem dominado da consci-

ência do dominador, por meio da educação libertadora. Educação esta que Freire chama de

dialógica, na qual, educador e educando buscam, por meio da problematização, resposta na

relação cuja finalidade tem um fim comum. Neste momento, se transforma o papel do edu-

cador, que passa a ser educando-educador, em que, ao construir, está se construindo, portan-

to, sendo educado. É válido também para o educando que, enquanto é educado, se educa.

Nos dizeres de P. Freire:

“Assim é que, enquanto a prática bancária, como enfatizamos, implica numa espécie de anestesia, inibindo o poder criador dos educandos, a educação problematizadora, de caráter autenticamente reflexivo, impli-ca num constante ato de desvelamento da realidade. A primeira pretende manter a imersão; a segunda, pelo contrário, busca a emersão das cons-ciências, de que resulte sua inserção critica na realidade.” (FREIRE, 1983, p. 80)

O educando, ao despertar para o desafio, questiona, e aí sim, inicia-se o processo de

descoberta. Descoberta de ver-se reconhecido como sujeito. Sujeito que “pode” opinar, que

“pode” manifestar-se, que “pode” questionar e, finalmente, que “pode” dialogar. Martin

Buber diz “ser gente significa ser o ente que está face a face” é viver e colocar-se “em um

estar com outros”. (BUBER, 1991, p. 60)

Interessante observar que “o estar com outros”, para Buber, parte do princípio da rela-

ção eu – tu. Não há o eu se não houver o tu. E quanto mais se faz consciente disso, mais

aprofunda o sentido e o desejo de buscar o tu. Esse processo de descoberta avança à medida

que interage com o tu e se volta para si, e nisso reconhece-se proprietário da possibilidade

de ser.

Para Freire: “A educação problematizadora se faz, assim, um esforço permanente a-

través da qual os homens vão percebendo, criticamente, como estão sendo no mundo com

que e em que se acham (FREIRE, 1983, p. 82), conscientes ou não do que representam di-

ante ou no mundo.

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Para ele:

“Na verdade, diferentemente dos outros animais, que são apenas inaca-bados, mas não são históricos, os homens se sabem inacabados. Tem a consciência de sua inconclusão. Aí se encontram as raízes da educação mesma, como manifestação exclusivamente humana. Isto é, na incon-clusão dos homens e na consciência que dela tem. Daí que seja a educa-ção um que fazer permanente. Permanente na razão da inconclusão dos homens e do devenir da realidade. Desta maneira, a educação se re-faz constantemente na práxis. Para ser tem que estar sendo.” (Ibidem, pp. 83-84)

Para V. Pinto, a educação, por ser um processo, “é histórica não porque se executa no

tempo, mas porque é um processo de formação do homem para o novo da cultura, do traba-

lho, de sua autoconsciência.” (PINTO, 1991, pp. 34-35)

Ele vê como componente da essência da educação, a historicidade, pois a cada mo-

mento surgem novos elementos para a construção do programa educacional, sendo ele, por-

tanto, inconcluso. O conceito de homem para ele tem um olhar prévio, ou seja, para formar

um homem, e necessário ter um conceito ideal de homem. Nos dizeres de V. Pinto: “A edu-

cação é um processo histórico de criação do homem para a sociedade e simultaneamente de

modificação da sociedade para beneficio do homem.” (ibidem, p. 39)

Daí que sendo um processo que tem início no homem, volta-se para ele mesmo. Isso

faz do mundo o palco onde se desenvolve esse confronto, ora em harmonia, ora em conflito,

ora de retração, ora de expansão deste mesmo homem. Ele avança a cada vez que se consci-

entiza de ser sujeito e retrocede, quando se reconhece coisificado. Mas isso só acontece,

quando ele busca Ser Mais. Quando se percebe capaz de ir além, de questionar, de buscar

emancipar-se diante da dominação.

Utilizar a educação como elemento fundamental para o reconhecimento afetivo à li-

berdade, é fator preponderante na incessante busca do conhecimento mais profundo, com a

finalidade de se atingir a igualdade.

Ao adentrar na discussão sobre a importância do diálogo, temos que o objeto principal

para a existência deste é a palavra. Para a efetivação do diálogo, é necessário que duas par-

tes que o compõem existam como símbolo de práxis: a ação refletida. Para Paulo Freire só a

palavra verdadeira é capaz de transformar o mundo. A utilização da palavra como expressão

do interior da pessoa é capaz de modificar o ambiente e seu entorno.

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Ao abandonar o silêncio, o homem se manifesta e assim fazendo, se posiciona. Esta

atitude e comportamento se refletem em um resultado que o levará a um questionamento e,

por consequência, a uma nova manifestação, surgindo daí o diálogo. Esta atitude é privilé-

gio de todos os homens e como tal, necessita de respeito.

Ao se fazer livre, pela práxis da busca, o homem se defrontará com a necessidade de

lutar ainda mais, para justificar sua posição contra os opressores, defensores da falsa gene-

rosidade. O que Paulo Freire diz na Pedagogia do Oprimido é a pedagogia “que tem de ser

forjada com ele e não para ele, enquanto homens ou povos, na luta incessante de recupera-

ção da humanidade”. (FREIRE, 1983, p. 32)

Para Meishu-Sama, o simples fato de aprender sem qualquer proposta ou objetivo

significa o que chama de estudo morto. Entretanto, aprender com a finalidade de colocar o

conhecimento em prol do benefício social, ele denomina estudo vivo. A utilização do co-

nhecimento para desenvolver projetos que enriqueçam o saber e beneficie a sociedade é o

que ele chama de estudo vivo.

Para a interação do eu-outro é necessário reconhecer a existência do outro como um

ser igual, semelhante, “editado” pelo Criador, como o eu.

Haveria muito mais por dizer neste estudo, quando analisamos a partir do pensamento

de alguns teóricos em uma interface com o pensamento de Meishu-Sama, as implicações da

condição social do ser humano, diante do mundo contemporâneo. Para tentar compreender a

realidade da educação e apreendê-la, muitas visões se apresentam, entre elas a de H. Ass-

mann, quando diz: “A pedagogia nasceu do carinho dos genitores e das ambiências de so-

brevivência e das formas de convivialidade que a espécie humana aprendeu a configurar

para lhe servirem de nichos vitais.” (1998, p. 50)

Segundo Paulo Freire, dentro da dinâmica do eixo ensinar-aprender que só se realiza

pelo diálogo, a finalidade é beneficiar a sociedade como um todo. Para Meishu-Sama, ensi-

nar dentro da compreensão da existência do mundo espiritual é apoiar o processo de orien-

tação do ser, educando com base nos preceitos de seus ensinamentos.

Ao pensar religião como educação, trazemos à baila uma reflexão pouco pesquisada e

apresentamos a nossa reflexão tendo como o ponto de partida os dois objetos da nossa pes-

quisa: o pensamento do religioso Meishu-Sama e do educador Paulo Freire.

Para Meishu-Sama: “Seu real objetivo [a educação] é tornar homens íntegros, isto é,

homens que façam da justiça o seu código de Fé e se esforcem para aumentar o bem-estar

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social, contribuindo para o progresso e a elevação da cultura”. (MEISHU-SAMA, 1995, p.

195) E: “A Religião não é nada mais do que a cristalização do amor de Deus para guiar os

infelizes ao caminho da felicidade.” (ibidem, 2000, p. 25)

Trata-se de ver na religião um processo pedagógico cuja finalidade é a produção de

conhecimento, capaz de transformar o homem em um Ser mais fraterno.

Entender a educação como um processo religioso torna possível desenvolver um “es-

tar junto”, uma aproximação com o outro, para então, torná-lo fraterno. O que Meishu-Sama

chama de estudo morto e estudo vivo, Paulo Freire denomina educação bancária e educação

libertadora.

Em ambos os casos, a nosso ver, religioso e educador se completam, à medida que

buscam, em diferentes campos de conhecimento, discursos que promovam a felicidade do

homem.

Resgatar a educação do caminho que ela vem percorrendo e torná-la humana é uma

proposta que aproxima os pensamentos de Meishu-Sama e Paulo Freire e conduz a pesquisa

ao aprofundamento das ideias destes pensadores.

Para P. Freire:

“A pedagogia do oprimido, como pedagogia humanista e libertadora, te-rá dois momentos distintos. O primeiro, em que os oprimidos vão des-velando o mundo da opressão e vão comprometendo-se na práxis, com a sua transformação; o segundo, em que, transformada a sua realidade o-pressora, esta pedagogia deixa de ser do oprimido e passa a ser a peda-gogia dos homens em processo de permanente libertação.” (FREIRE, 1983, p. 44)

Diante desse desafio, como a religião deve pensar seu processo pedagógico para gerar

o ser humano completo e como o pensamento de Paulo Freire pode ajudar nessa transforma-

ção?

Para Paulo Freire, a educação bancária é a educação da reprodução de conhecimentos

que faz com que o educador não raciocine. Em sua concepção, este método de ensino dese-

duca e reduz o educando a mero receptor do saber. Contudo, a educação libertadora diferen-

temente da bancária, torna o educando um ser pensante, que questiona, portanto, raciocina.

Ou, o que para Meishu-Sama é estudo morto e vivo, para Paulo Freire tem a ver com a

educação bancária e libertadora. Freire via na presença do outro, elemento fundamental para

a ação concreta, portanto para o diálogo.

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Quando Freire diz que ensinar não significa “transferir conhecimento”, mas possibi-

lita oportunidade para a construção deste, afirma que “a certeza” é algo para se refletir. Ou

seja, pode-se tê-la, entretanto, é necessário abrir as portas para novas ideias para discussão.

Nessa afirmação, respeitar o conhecimento do outro, no caso do educando, proporciona no-

vos caminhos ao saber, fundindo uma reflexão conjunta.

Paulo Freire via a educação como uma prática em um tempo e espaço, na escola,

local onde é possível haver diálogo, construção; local apropriado para a busca de reflexão

da importância da práxis e do outro, meios de tornar possível a formação do sujeito.

3.3 Educação, fé e religião

A fé é um item principal para a existência do diálogo, um ingrediente que se encontra

no interior do homem, em sua capacidade de dialogar. Aliás, ela vem antes do diálogo: a fé

nos homens do acreditar que é possível, de ver no outro, a si mesmo, como uma possibilida-

de de construir o conhecimento.

Sung afirma que:

“Se Deus se deixa conhecer pelo ser humano, esse conhecimento irá tornar o ser humano melhor e esse processo de se tornar melhor não po-de ser um simples acúmulo de mais informações que não modifica a sua pessoa, mas sim um caminhar onde o ser humano é o sujeito do seu processo de humanização”. (2006, p. 146)

Ao dizer isso, o autor apresenta um olhar de observador do cotidiano da vida, do

homem comum, onde: “Se uma das finalidades da revelação de Deus é mostrar o verdadeiro

sentido da vida humana, o sentido da vida humana é se humanizar; e o caminho religioso-

espiritual é o caminho pedagógico da aprendizagem desse processo”. (2006, p. 146)

Embora Freire não seja teólogo, ele afirma que a teologia é importante no desenvol-

vimento da humanização, cabendo a ela ter como seu ponto de partida, a antropologia. Ele

diz:

“Tem que estar associada à ação cultural para a libertação, através da qual os homens substituem sua concepção ingênua de Deus, como um mito alienante por um conceito novo: Deus como uma presença históri-ca, que não impede de forma alguma, que o homem faça a história de sua libertação”. (1979, p. 91)

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Quando o homem se torna inativo e pressupõe que Deus cuidará de tudo, Freire diz

que:

“Uma teologia em que a esperança fosse uma espera sem busca, seria profundamente alienante porque estaria considerando o homem como alguém que tenha renunciado à sua práxis no mundo [...] Esta espera nos leva à acomodação, ao “status quo” e encerra um equívoco fatal: a dicotomia absurda entre mundanidade e transcendência.

Desta forma, me faço cúmplice da injustiça, de desamor, da exploração dos homens no mundo e nego o próprio ato de amor com que Deus Ab-soluto limita-se a si mesmo (e somente Ele poderia limitar a Si Próprio) ao valorizar os homens ainda que limitados, inconclusos, inacabados, como seres de decisão, co-participantes de Sua obra criadora. (idem)

Ao ser criado por Deus Absoluto, o homem faz da práxis a realização do desejo des-

te.

Desnecessário é dizer que o diálogo só é possível diante da união de homens que

tenham a mesma proposta ou que partilhem da mesma ideia. Freire diz ser o diálogo “uma

exigência existencial” por ser capaz de tornar possível a mudança, a modificação a partir da

interação com propósitos definidos. Propósitos estes que surgem com a compreensão da

importância da interação entre os seres. Freire chama de “ato de criação”, cujo objetivo

maior é a “conquista do mundo para a libertação dos homens”.

O elemento fundante para a existência real do diálogo é o amor – ao mundo e aos ho-

mens. A existência do diálogo só é possível se houver a presença do amor frente aos opri-

midos: o envolvimento em sua causa, o compromisso com sua liberdade. Com amor pelo

mundo, a vida, os homens, é possível dialogar, acrescido da humildade, como fator diferen-

cial para a comunicação.

Freire diz:

“Se alguém não é capaz de sentir-se e saber-se tão homem quanto os ou-tros, é que lhe falta ainda muito que caminhar, para chegar ao lugar de encontro com eles. Neste lugar de encontro, não há ignorantes absolu-tos, nem sábios absolutos: há homens que, em comunhão, buscam saber mais.” (1983, p. 95)

Ao termos o diálogo fundamentado nos sentimentos descritos acima, temos como re-

sultado a confiança mútua, algo inexistente na educação bancária. Qualquer manifestação de

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sentimento onde não haja a verdade pode se tornar passaporte para a antidialogicidade, pos-

to que a confiança gerada não é real, mas sim fruto de uma superficialidade.

Por não estabelecer uma coincidência entre o pensamento e a ação, não gera confian-

ça, portanto não gera esperança, e esta é outro ingrediente muito importante para o diálogo.

O homem histórico foi construído a partir de opiniões divergentes, vendo-nos diferentes,

elementos prioritários para sua própria formação.

O diálogo é gerado a partir do pensamento crítico, que gera o diálogo, que gera comu-

nicação, que gera o pensamento crítico, que se transforma em verdadeira educação que gera

a comunicação. A verdadeira educação deve ser construída reconhecendo o seu destino e a

importância deste estar incluso nesta construção. O diálogo deve permanecer em constante

construção e levar os participantes à reconhecer a importância deste, como fonte incansável

de conhecimento.

A dicotomia que se apresenta diante das duas formas de educação, bancária e problema-

tizadora, fornece um quadro bastante significativo e interessante, em que, quando se agrega

um parecer sobre o pensamento do líder religioso Meishu-Sama, percebe-se um distanciamen-

to:

Educação bancária Educação problematizadora Educação proposta por M.Sama

Oculta razões Revela razões Justifica a realidade, a partir da crença no mundo espiritu-al

Mistifica a realidade Desmistifica a realidade Revela a realidade do ponto de vista da crença na cultura espiritualista

Nega o diálogo Dialoga Dialoga e mostra a religião como um processo pedagógi-co

Assistencializa Criticiza Criticiza e orienta, a partir da espiritualidade

Inibe a criatividade Libera a criatividade Libera a criatividade

Domina Liberta Orienta o caminho do meio, do equilíbrio

Nega a vocação Estimula a reflexão e ação Estimula a reflexão e ação

Ontológica e histórica de humanizar-se

Verdadeira Verdadeira, a partir da espiri-tualidade

Permanente Mudança *

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Fixismo/reacionária Futuridade/revolucionária Futuridade/revolucionária, a partir da idéia da existência de um mundo espiritual

Imersão Emersão Emersão, a partir da espiritu-alidade

* dialoga, onde rompe com a educação que chama de materialista e reformula a importância

da educação consubstanciada na existência da espiritualidade, como menciona:

Freire constrói a reflexão do comum em seus textos, constantemente, alterando-o de

maneira a fornecer ao leitor a consciência da importância do tempo. Este é fator crucial na

reflexão de ideias, sobretudo quanto ao momento dos acontecimentos.

Ao buscar em teorias diferentes novas formas de prática, Freire dá ciência que o en-

trelaçamento entre culturas é o grande poder capaz de transformação. A cultura é a mola

propulsora da renovação do diálogo que propicia as condições necessárias de mudança para

a inclusão.

A produção de conhecimento se faz quando está aliada a ela, a prática. Não a prática

repetitiva, mas novas formas inter-relacionadas com a teoria, reunidas, à medida que se bus-

ca quebrar paradigmas presentes no cotidiano.

Para Meishu-Sama:

“É de pouca utilidade colocar em prática a teoria que nos foi legada a-través da instrução e de biografias e leituras referentes aos exemplos de grandes personagens. A teoria bem formada merece admiração, mas to-dos sabem, por experiência própria, que é difícil pô-la em prática”. (2000, p. 25)

Ao fazer esta afirmação mostra que existe dificuldade em praticar o que é teoria,

mesmo sendo bem formulada. O que parece real é que na tentativa de colocar em prática tal

teoria, quando se reconhece o outro por intermédio do diálogo, tornam-se possíveis a apro-

ximação e a interação, surgindo novas proposituras. Ele também afirma:

“É preciso que surja uma religião universal, que englobe o mundo intei-ro. Deverá ter as características de uma Ultra-Religião, ser tão grandio-sa que toda a humanidade possa crer nela incondicionalmente. Não que-ro dizer que essa religião seja a Igreja Messiânica Mundial, mas a mis-são de nossa igreja é ensinar o meio que possibilitará a realização do Mundo Ideal, ou seja, mostrar como elaborar o plano, o projeto para a construção desse mundo”. (2000, p. 31)

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Do ponto de vista dessa responsabilidade que cabe à Igreja Messiânica, Meishu-

Sama afirma que a missão da religião é educar o homem com a finalidade de torná-lo mode-

lo para a sociedade.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Temas como religião e educação são vistos hoje como distintos, cada um com um

papel definido, a ser desenvolvido. A pesquisa apresentada teve como tema levantar possí-

veis aproximações e distanciamentos entre ambos os campos, equacionando ora um, ora

outro, dentro de seus respectivos momentos.

A referência que serviu como escopo para esta teve como foco principal a obra do

religioso Meishu-Sama, fundador da Igreja Messiânica Mundial, e como coadjuvante, o

maior dos educadores brasileiros, Paulo Freire.

No capítulo I, eu começo por dizer que na segunda metade do século XIX, no Japão,

surgem dois fenômenos: a introdução do pensamento ocidental e um processo de ocidentali-

zação (novas ideias diferentes à cultura local).

Nesse período, nasce Mokiti Okada, que mais tarde assume o nome religioso de

Meishu-Sama, em uma cidade à beira do rio Sumida, importante veículo de acesso ao co-

mércio, chamada Assakussa.

Na época o poder pertencia ao Xogum Tokugawa, que liderou o país por quinze ge-

rações, cerca de trezentos anos. A figura do imperador era simbólica, sendo considerado o

sucessor na linhagem divina. Com o progresso do comércio e as novidades que ele trazia,

surge uma nova elite: a classe de comerciantes, que também começa a lutar pelo poder. A

economia da época ainda se baseava na agricultura, tendo o arroz como referencia para me-

dir riquezas.

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A vida para o povo era muito difícil em termos de religião e o progresso introduz

também culturas e religiões diferentes, como o cristianismo e o protestantismo, que chamam

a atenção do governo, fazendo com que surja uma resposta contrária. Os estrangeiros são

expulsos juntamente com os comerciantes e é abominado o cristianismo. O confucionismo

se fortalece por conta dos preceitos de obediência e o budismo também.

Com a queda do governo Tokugawa, assume o governo Meiiji que inicia um proces-

so de ocidentalização, implantando a industrialização em todo país, por pressão de países

como o EUA. A ideia é recuperar o tempo e levar Edo (Tóquio) a se tornar uma cidade pa-

recida com as europeias e americanas. Surgem novos movimentos religiosos nesse período

levando o país a uma nova fase nos mais diversos campos de atividade.

A diferença entre as classes sociais eram extremas, levando o povo, que em principio

foi a favor da derrubada do governo feudal, a se revoltar, e começam a surgir diversas mani-

festações por todo o país. Além disso, duas correntes se formam: aqueles que eram a favor

da ocidentalização e os mantenedores da tradição.

Nasce o fundador Meishu-Sama em 23 de dezembro de 1882, em Hashiba, Assakus-

sa. Caçula, de família pobre composta de cinco pessoas, morava em uma casa de dois cô-

modos. Em um deles funcionava a loja de objetos usados e toda noite seu pai levava uma

carroça com os objetos para vender em um parque próximo. Dali vinha a sobrevivência da

família.

O pai sempre se preocupou com a saúde frágil de Okada. Com seis anos, este in-

gressa na escola primária, e no final do curso primário a família já se encontra em situação

melhor. Começa o curso ginasial e ingressa no curso preparatório da Escola de Belas Artes,

seu sonho. Na nova escola, no curto tempo tudo ia bem, até surgir problemas na vista. Pre-

cisou abandonar o curso e foi um período de grande sofrimento: problema na visão e pleu-

risia, inclusive sendo internado por conta desta ultima. Recuperado, durante um tempo fica

bem e surge a tuberculose.

Nessa época, desenganado pelo médico, descobre um método para sua recuperação

através da alimentação.

Com a maioridade, decide dedicar-se a arte de maki-ê (pintura em laca) e sonha abrir

uma loja com seu pai. Aprofunda suas pesquisas em leituras e encontra em Bergson e James

uma proximidade com seus pensamentos.

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O pai morre, ele compra uma loja de miudezas com o apoio da mãe e suas obras fa-

zem sucesso. Acidentado no dedo, não pode continuar com a arte. Com o progresso da loja,

ele muda para um espaço maior, casa-se e progride muito.

Morre sua mãe e ele ainda com saúde frágil, adquire diversas doenças. Recuperado e

cada vez mais próspero nos negócios, sempre busca se atualizar. No período da I Guerra

Mundial, ateu, vê sua vida desmoronar, perde sua família, esposa e três filhos. Casa-se no-

vamente e inicia uma busca para respostas a seu sofrimento.

Em 1920, filia-se a religião Oomoto e afasta-se desta pouco depois, a partir do aci-

dente com seu sobrinho. Retorna após três anos, em busca de conhecer mais sobre o mundo

espiritual. Começam as perseguições religiosas, ele deixa a direção da loja e passa a dedi-

car-se às pesquisas religiosas.

Em 15 de junho de 1931, recebe a revelação divina, se afasta da religião Oomoto e

começa os preparativos para fundar o que seria mais tarde a Igreja Messiânica Mundial.

Até a Igreja Messiânica Mundial ter esse formato passou por diversas alterações, di-

ante da perseguição que sofreu. Em 04 de fevereiro de 1950 é instituída a religião messiâni-

ca.

No capítulo II, vemos que Meishu-Sama não estava preocupado em explicar o que

era religião, mas mostrar os motivos que o levaram a fundar uma filosofia de vida que educa

o homem a tornar-se próspero, saudável e pacifico.

Ele via a necessidade do pragmatismo na religião como forma para se alcançar a

evolução. A combinação de teoria e prática ampliava o universo religioso, trazendo benefí-

cios a todos, como ele diz no livro Alicerce do Paraíso.

“O pragmatismo filosófico introduz a Filosofia na vida prática, acentuando neste ponto, o caráter americano. Pretendo fazer o mesmo, com uma diferen-ça: fundir a religião e a vida prática, tornando-as íntimas e inseparáveis”. (2000, p. 413)

Meishu-Sama afirma que quando se limita a religião à salvação do espírito, reduz-se

a oportunidade de ter esperança em um futuro melhor e entende ser através da linguagem da

educação religiosa, a oportunidade de mostrar ao homem novas perspectivas para a vida.

Ele acentua a importância da saúde como fator fundamental para o desenvolvimento

do homem e dá a ela uma dimensão relacional, como o amor. Maturana fala sobre a dinâ-

mica fisiológica e emocional (p.49). Ele menciona a arte como veiculo para transformação

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do homem e afirma que quando a religião se apodera da verdade, discrimina as outras, colo-

cando-as em nível inferior.

Para Meishu-Sama, a missão da verdadeira religião é educar no sentido de levar o

progresso e educar o ser humano para a vida. Ele critica a educação de seu tempo por não

questionar as razões do que existe, chamando-a de materialista. Quando isso acontece, a

educação corre o risco de tornar-se absoluta, tendo o educador a posse do conhecimento.

Ele chama de escola tradicional aquela onde o processo educacional é repetitivo, tor-

nando o educando simples depositário de conhecimento. O que Paulo Freire chama de edu-

cação bancária.

Para Meishu-Sama, o religioso quando se torna consciente de sua missão através da

educação, torna-se modelo para outros, verdadeiro exemplo de saúde, prosperidade e paz.

Ele afirma que o conhecimento construído a partir das experiências dos alunos é a-

quele capaz de apresentar resultados mais eficazes. Diz serem necessárias no aprendizado,

outras formas de saberes para fazer o educando enxergar o outro.

A educação formal oferece margem ao que Meishu-Sama chama de pseudoverdade

(verdade aparente), causada pelo afastamento da verdade. Para ele, cabe à educação tornar o

homem modelo e para isso é necessário formá-lo moral, social e integralmente humano.

Ai, diz ser a educação, o meio, para a formação cidadã, o fim.

Meishu-Sama então discute a religião como educação em um processo contínuo para

o aperfeiçoamento do ser humano e um autor que ajuda nessa compreensão é Paulo Freire.

Este introduz a educação dialógica que realiza a evocação humana da humanização e liber-

dade.

O religioso afirma ser necessária uma educação pautada no reconhecimento da exis-

tência do mundo desconhecido, para que seja possível enxergar o outro. Em sua opinião, a

educação espiritualista torna isso possível, disciplinando o homem em sua conduta.

A educação materialista reduz o ser humano ao aspecto material da vida, não questi-

onando o sentido dela. Nesse sentido, a religião pode contribuir com o mundo real, servindo

de modelo de reflexão pedagógica.

Meishu-Sama apresenta dois tipos de educação/estudo: vivo e morto. Como estudo

vivo, ele justifica a necessidade de se aplicar o conhecimento, do diálogo. E como estudo

morto, aquele que não é aplicado ou que se reproduz, ou ainda sem objetivo.

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Para o pensador, beneficiar o outro é o caminho para beneficiar-se. Sendo a religião

um processo educativo, ela deve gerar fraternidade.

Hoje, temos que o homem não vive mais sem a tecnologia, e, dependente desta, a

torna, o outro.

Ele mostra a importância do ser humano viver a fé no seu cotidiano e entende ser a

educação, capaz de introduzir a religião como um método de ensino. E diz que pragmatizar

conhecimento é, antes de tudo, ser capaz de reconhecer seu próprio limite.

No capítulo III apresentei um pouco de Paulo Reglus Neves Freire, Paulo Freire,

nascido em 19 de setembro de 1921 e falecido em 02 de maio de 1997. Freire desenvolveu

sua obra baseado em dois princípios: a escolarização e a formação da consciência. De famí-

lia de classe média, sofreu muito na infância com a fome e a pobreza, ante a depressão de

1929.

Toda sua vida foi voltada à luta para a educação popular e uma das primeiras e mais

marcantes experiências se deu no Rio Grande do Sul, em 1963, quando, em 45 dias, alfabe-

tizou 300 adultos através de um método criado por ele.

Na ditadura, sofreu severas perseguições por lutar por direitos iguais aos mais neces-

sitados e foi exilado.

Para ele, educar é um ato ético e afirmava ser a ética um instrumento em oposição às

injustiças. Ele dizia que o educador deve arranjar um jeito de regar sua esperança todos os

dias; como se rega uma delicada planta. A educação para Freire era feita de liberdade,

princípios de igualdade, partilhar, envolvimento e principalmente, reconhecimento do outro.

Nesse sentido, Meishu-Sama discute a religião como educação com a finalidade de

aperfeiçoamento do ser humano, alterando assim, a ideia de religião. Sendo a religião um

processo educativo, ela deve gerar fraternidade, restaurando o estado natural no ser humano.

Para Freire, o homem ao se conscientizar, se liberta e cria uma nova visão de mundo.

Para ele, o caminho se faz, caminhando, acumulando experiências.

Freire apresenta a tarefa humanista de humanizar e libertar opressores e oprimidos

que começa por identificar o opressor hospedado no oprimido. Isso dá inicio à consciência

da humanização.

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Para ele, o medo da liberdade apresenta dois aspectos: no oprimido, se apresenta

como o risco de se tornar opressor frente à liberdade, e no opressor, como a possibilidade

de perder esta. Ao conquistar a liberdade, o ser humano se capacita a Ser Mais.

Para o opressor, o ter é condição para ser. Quanto mais o opressor vê o oprimido

querendo Ser Mais, mais tenta controlá-lo, coisificando-o e dominando seus objetivos.

Para Freire, o oprimido busca sua liberdade a partir da conscientização da vontade de

mudar através da práxis. O homem é capaz de modificar o mundo que habita. Isso se dá

através da práxis.

A educação repetitiva que Freire chama de bancária é transmitida daquele que detém

o conhecimento para aquele que não o tem; que é o depositário do conhecimento.

Para Freire, humanizar-se, dominante e dominado é o perfil da educação dialógica,

que chama de problematizadora. Isso acontece quando ele busca Ser Mais, ir além, questio-

nar. Para o educador, só a palavra verdadeira é capaz de transformar o mundo.

Para Meishu-Sama, o ato de aprender sem objetivo, sem colocar em prática o conhe-

cimento, ele chama de estudo morto. E aprender com a finalidade de beneficiar a sociedade,

ele chama de estudo vivo.

O que Meishu-Sama chama de estudo morto e estudo vivo, Paulo Freire denomina

educação bancária e educação problematizadora.

Para Paulo Freire, dentro da dinâmica do eixo ensinar-aprender através do diálogo, a

finalidade é beneficiar a sociedade. Para Meishu-Sama, ensinar dentro da compreensão da

existência do mundo espiritual é apoiar o processo de orientação do ser, educando com base

nos seus ensinamentos.

Resgatar a educação do caminho que ela vem percorrendo e torná-la humana é uma

proposta que aproxima os pensamentos de Meishu-Sama e Paulo Freire. A fé é um item

principal para a existência do diálogo, vindo antes dele, pois é importante acreditar que é

possível ver no outro, a si mesmo, como uma possibilidade de construir o conhecimento.

Entre as considerações a serem feitas observou-se a ausência de bibliografia no cam-

po da religião, neste caso, da religião messiânica. É digno de nota, estar noventa por cento

da obra do religioso Meishu-Sama não traduzida. Em contrapartida, é quase infindável os

escritos no campo da educação.

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Como esta pesquisa se propôs a estudar o pensamento de Meishu-Sama em relação à

educação em uma aproximação com a religião; a sistematização do pensamento pedagógico

da religião e a formação do ser humano, pôde-se buscar nos ensinamentos escritos pelo reli-

gioso as fontes da pesquisa, nos quais ele menciona a religião como um processo pedagógi-

co.

Morin diz que “as culturas devem aprender umas com as outras, e a orgulhosa cultu-

ra ocidental, que se colocou como cultura-mestra, deve-se tornar também uma cultura-

aprendiz. Compreender é também aprender e reaprender incessantemente”. (2007, p. 102) E

que: “dada a importância da educação para a compreensão, em todos os níveis educativos e

em todas as idades, o desenvolvimento da compreensão necessita da reforma planetária das

mentalidades; esta deve ser a tarefa da educação do futuro”. (2007, p. 104)

Já para Meishu-Sama:

“Dizem que a cultura humana progrediu muito, mas o que houve foi apenas progresso da parte material; a parte espiritual, lamentavelmente, progrediu muito pouco. E o que é progresso da cultura? Em verdade, pro-gresso da cultura significa o desenvolvimento paralelo do concreto e do abstrato. Apesar do propalado avanço cultural, o homem até hoje não con-seguiu alcançar a felicidade, e a razão principal é que o progresso se efe-tuou num único sentido”. (2000, p. 72)

E ao dizer isso, afirma que “eu desejo despertar a humanidade imprimindo um extra-

ordinário progresso à cultura espiritual”. (ibidem)

Para ele, mais do que desenvolver uma reforma na mentalidade do ser humano, é

necessário mostrar a existência de um mundo desconhecido, impalpável, que por sê-lo não

significa não existir. Desenvolver um novo olhar de reconhecimento à existência desse

mundo faz parte da visão de uma nova concepção da realidade. Tornar compreensível a e-

xistência desse mundo é uma das tarefas educacionais da religião messiânica.

Para Sung:

“Com a noção de espiritual estou querendo falar da busca pelo sentido mais profundo da vida, da força que nos impele a esta caminhada e nos a-juda a superarmos as dificuldades internas e externas que enfrentamos. As-sim como da experiência gratificante de sentirmos a qualidade infinita e transbordante que caracteriza a nossa subjetividade quando nos encontra-mos “face a face’ com outras pessoas. Uma noção que coloca o foco nas questões mais profundas da nossa vida inclui a dimensão do conhecimento, mas agrega também a noção de desejo que nos impulsiona para a ação” (2007, pp. 19/20)

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Meishu-Sama também afirma que:

“Frequentemente, os indivíduos buscam apenas o próprio progresso e feli-cidade. Por mais elevadas que sejam as suas aspirações, essa atitude indica um indevido amor-próprio e não pode ser muito abençoada por Deus. O verdadeiro objetivo religioso inclui todos os homens. Quando nos esque-cemos de nós mesmos e atentamos para as necessidades dos outros, vive-mos verdadeiramente a nossa fé”. (s/d, p. 95)

A afirmação que Meishu-Sama faz acima, no campo da religião, aproxima-se da i-

deia que Paulo Freire desenvolve no campo da educação – a preocupação com o outro. Um

ato de fé pela fé. O primeiro recorre à fé no homem, mas vai além e transcende ao mundo da

crença na existência do mundo espiritual. O segundo desenvolveu toda sua obra educacional

voltada à crença no homem, na vocação de Ser Mais – a humanização.

Diante disso, outra menção se faz necessária quando Meishu-Sama diz que:

“Deixar tudo nas mãos de Deus não significa deixar as coisas corre-rem sem desempenharmos a nossa parte, na suposição de que Deus fará tudo por nós. Antes, significa não depender apenas do intelecto humano e das nossas convicções, mas procurarmos ser guiados pela Sabedoria Divi-na, em tudo aquilo que fizermos”. (s/d, p. 78)

Novamente aparece aí, outra aproximação do pensamento do religioso e do educa-

dor: o estudo vivo de Meishu-Sama e a educação problematizadora de Paulo Freire. Dife-

rentemente destas, o estudo morto do religioso e a educação bancária do educador mostram

que não se pode deixar a formação do educando sem questionamentos, sem os por quês. A

reprodução engessa e torna o homem uma máquina, sem raciocínio.

Cora Coralina conta em Contas de Dividir e Trinta e Seis Bolos:

“O mestre era o tipo perfeito do pedagogo daquele tempo. Trigueiro, atar-racado, de bigode ralo, falava de soco e nas conversas triviais gostava de empregar termos eruditos. Sempre metido na casimira, bengala de castão de prata, chapéu duro, bem engomado, cadeia de ouro, bom relógio – dizi-am que ensinava bem. Nenhuma admiração causava ali a palmatória numa evidência pedagógica. Fazia parte da disciplina escolar e ninguém via na-quilo nenhum escândalo ou contradição”. (2002, pp. 34/35)

Esta citação mostra que a educação da época evoluiu, abandonando o despotismo e

totalitarismo, confirmando a legitimidade dos direitos humanos. Em contrapartida, ainda

constitui alvo de reestudos para tirá-la da catastrófica situação em que se encontra atualmen-

te.

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Morin diz que “a educação deve promover a ‘inteligência geral’ apta a referir-se ao

complexo, ao contexto, de modo multidimensional e dentro da concepção global”. (2007, p.

39)

Obviamente o tipo de educação contemporânea requer um empenho muito grande

por parte de todos os interessados na busca de uma educação capaz de tornar a sociedade

mais igualitária, mais responsável pelo todo, com o “dom divino” de Ser mais.

O Relatório Delors que estabelece os quatro pilares da educação – aprender a ser, a

fazer, a viver juntos e a conhecer – alerta para as tarefas primordiais da educação, sinalizan-

do a importância de considerar o ato de educar como o mais importante na formação do ser

humano. A ação pedagógica requer mais do que atos repetitivos, sem critérios de novos co-

nhecimentos. O aprender a apreender hoje é um ato de amor, de cuidar, de respeitar o outro.

Assmann e Sung afirmam que:

“Doravante só será possível sonhar com uma sociedade onde caibam todos se também nossos modos de conhecer conduzirem a uma visão do mundo no qual caibam muitos mundos do conhecimento e do comportamento. A educação se confronta com essa apaixonante tarefa de formar seres huma-nos para os quais a criatividade, a ternura e a solidariedade sejam ao mes-mo tempo desejo e necessidade”. (2000, p. 297)

O desenvolvimento da educação contemporânea precisa transformar-se e partir da

consciência que há novas possibilidades de aprendizagem e que vivenciar experiências é o

caminho mais curto para os saberes na formação da vida.

Morin afirma que “conhecer o humano é, antes de mais nada, situá-lo no universo, e

não separá-lo dele.[...] todo conhecimento deve contextualizar seu objeto, para ser pertinen-

te. ‘Quem somos?’ é inseparável de ‘Onde estamos?’, ‘De onde viemos?’, ‘Para onde va-

mos?” (2007,p. 47)

Fica a pergunta para que o futuro responda se for capaz. Finalmente encontrar uma

cultura que estude as culturas, que as respeite, que faça delas, através da educação, um veí-

culo para a formação e a autonomia do ser humano, é o desafio da sociedade do futuro.

Humanizar o homem é antes de tudo, torná-lo humano.

A pesquisa apresentada teve a intenção de mostrar que, para Meishu-Sama, mais do

que desenvolver uma reforma na mentalidade do ser humano, é necessário mostrar a exis-

tência do mundo desconhecido, surgindo dai uma nova concepção da realidade.

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Tornar compreensível a existência desse mundo é uma das tarefas educacionais da

religião messiânica e a mais importante delas.

Meishu-Sama recorre à fé no homem, mas vai além e transcende ao mundo da crença

na existência do mundo espiritual e Paulo Freire desenvolveu sua obra educacional voltada

à crença no homem, na vocação do Ser Mais – a humanização.

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