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A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR

PRIVADO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO: O CASO DO JAPÃO

Banca examinadora:

Prof.orientador .

Prof .

Prof .

Page 2: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

Este trabalho é dedicado a meu avô, Nilo

Medina Coeli, e a meu bisavô, João de

Andrade Costa, que tanto construíram.

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FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS

ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS DE SÃO PAULO

NILO DE MEDINA COELI NETO

A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR

PRIVADO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO: O CASO DO JAPÃO

Dissertação apresentada ao Curso dePós-Graduação da FGVIEAESP,Área de Concentração: Planejamentoe Finanças Públicas, como requisitopara obtenção de título de mestre emAdministração Pública e Governo.

Orientador: Prof. Marcos FernandesGonçalves da Silva

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São Paulo1996

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iv

COELI NETO, Nilo de Medina. A Relação entre o Aparato Institucional,Setor Privado e Desenvolvimento Econômico: o Caso do Japão. São Paulo:EAESPIFGV, 1996. 140 p. Dissertação de Mestrado apresentada ao Cursode Pós-Graduação da EAESPIFGV, Área de Concentração: Planejamentoe Finanças Públicas).

Resumo: ° trabalho apresenta uma nova perspectiva de análise na áreada economia do desenvolvimento, representada pela Nova EconomiaInstitucional (NEI) e por um de seus mais destacados representantes,Douglass C. North (prêmio Nobel, 1993). Esta corrente enfatiza a relaçãoentre regras formais e informais (leis de comércio, constituição federal,normas culturais) e crescimento econômico no longo prazo, destacando arelevância do ambiente em que as mesmas são criadas e no qual têm suaaplicação garantida, o que inclui o governo e os papéis por ele assumidos.A elaboração de tais regras é ainda afetada pelos modelos mentais dosagentes e por falhas do processo político. O resultado final do aparatoinstitucional será um país com altos ou baixos custos de transação, osquais influenciam a organização dos mercados e o crescimento de longoprazo. Utilizando estes conceitos teóricos, este trabalho analisa a políticaindustrial do Japão no período 1945-1990, defendendo a idéia de que oaparato institucional promoveu a eficiôncia econômica e uma trajetóriade longo prazo "favorável ao mercado", mesmo quando o governopraticava medidas protecionistas. Havia uma preocupação central compráticas de mercado e competição, mesmo dentro do aparatogovernamental. A conclusão a que chega a pesquisa a partir do estudo decaso escolhido é que o governo foi extremamente importante em países deindustrialização recente, mas o aparato institucional determinou atrajetória de longo prazo da relação entre setor privado e mercado emcada um deles. Para que possa regular ou interferir no mercado, ogoverno deve ser severamente limitado.

Palavras-chave: instituições, custos de transação, crescimento econômico,desempenho, mercado, política industrial.

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v

"Finalmente, a repúblicaparlamentar, em sua luta contra a revolução, viu-seobrigada a fortalecer, juntamente com as medidasrepressivas, os instrumentos e a centralização do podergovernamental. Todas as revoluções aperfeiçoavamesta máquina ao invés de destroçá-la. Os partidos quese alternavam na luta pelo domínio consideravam aconquista desse imenso edifício do Estado como oprincipal troféu do vencedor (...)É sob o segundo Bouaparte que o Estado parece teradquirido uma total autonomuü. ...)"

(Karl Marx, O Dezoito Brumário de Luís Bonaparte)

"Por último - pode-se dizê-locom segurança a desconfiança contra todogovernante, a inteligência do caráter inútil edesgastante desses combates de fôlego curto, hão delevar os homens a uma decisão inteiramente nova: àabolição do conceito de Estado, à supressão daoposição entre 'privado e público I. Passo a passo, associedades privadas absorvem os negócios de Estado:mesmo o resíduo mais tenaz que resta do antigotrabalho de governar (aquela atividade, por exemplo,que deve assegurar o homem privado contra o homemprivado) acabará um dia por ficar a cargo deempresários privados. O desprezo, o declínio e a mortedo Estado, o desencadeamento da pessoa privada(tomo o cuidado de não dizer: do indivíduo), são aconsequência do conceito democrático de Estado; nissoconsiste sua missão."

(Friedrich Nietzsche. Humano, Demasiado Humano.)

Page 6: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

vi

Agradecimentos.

Ao meu orientador, Prof. Dr. Marcos Fernandes Gonçalves da Silva,

dedico os agradecimentos iniciais. Desde a fase de elaboração da proposta

de dissertação, até o texto final da mesma, ofereceu-me valiosas

indicações quanto à estruturação do trabalho, bibliografia "de fronteira",

estímulo e tempo para discussões. Considero-me privilegiado por ter sido

seu orientando, e por ter seguido os caminhos apontados por seus amplos

conhecimentos.

Sou grato também aos professores Alberto Isao Sugo (FGV-SP),

Dante Mendes Aldrighi (FEA-USP), Ruben Cesar Keinert e Maria Rita

Durand (FGV-SP), pelas sempre oportunas sugestões e indicações. Aos

dois últimos agradeço ainda por terem formado minha banca de

qualificação. À professora Martha Farah sou grato pelas oportunas

informações e textos, oferecidos em seu curso na EAESP-FGV.

Agradeço à FAPESP - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado

de São Paulo, responsável pelo financiament.o deste trabalho.

Finalmente, quero agradecer a meus pais, a Sandra, Marcos, meus

irmãos, Helena, Jairo, Eduardo, e a t.odos que me apoiaram e

incentivaram durante o período derealiznçâo da pesquisa.

Page 7: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

vii

Sumário

Introdução ....8

1. Instituições e desenvolvimento econômico...:15

1.1. Variáveis subjetivas na análise do desenvolvimentoeconômico .... 17

1.2. A abordagem da Nova Economia Institucional (NEI) 281.2.1. Custos de informação e custos de transação 331.2.2. Regras informais. formais e garantia de

imposição ....391.2.3. Mudança institucional e desempenho eéonômico no

longo prazo ....481.3. O papel do governo na NEI.. ..62

2. Japão: instituições, setor privado e "network state" ....76

2.1. Mudanças institucionais: aspectos históricos ....772.2. Instituições e o papel das "redes" ou "networks" ....79

3. Aspectos da política industrial japonesa ....94

3.1. A evolução da política industrial no pós-guerra ....953.2. Tecnologia de ponta e previsão, tecnológica .... 1143.3. Instituições e o caráter da intervenção governamental .... 118

Conclusões .... 129

Abstract .... 134

Bibliografia .... 135

Page 8: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

8

Introdução:

Grande parte do debate acerca da necessidade de reformulação do papel

do Estado em economias de países de industrialização recente envolve o

papel fundamental por ele representado durante este processo. Nesse

sentido, o Estado foi importante por vários motivos, e ainda é importante

(embora por motivos diferentes). Os principais autores da Economia do

Desenvolvimento, no pós-guerra, ressaltam a importância do Estado no

que tange ao planejamento dos setores industriais a serem implantados,

incentivados e protegidos (Rosenstein-Rodan, 1969; Hirschman, 1986;

Furtado, 1968),bem comona possibilidade de alocaçãode crédito de longo

prazo ao setor privado (Rostow,1974).O que procurarei corroborar neste

trabalho é a hipótese de que o processo de intervenção, para que seja

bem-sucedido no longo prazo, deve estar sustentado em um aparato

institucional que incentive o mercado e delimite a ação governamental,

conformando-a de modo específicoàs necessidades do mercado em cada

épocahistórica. Este aparato é necessário para reduzir custos econômicos,

e ao mesmo tempo envolvecustos na sua estruturação.

Em países subdesenvolvidos, as funções governamentais

desviaram-se muitas vezes dos princípios da política de "laissez faire", já

que a indústria nascente necessitava de proteção. Além da atuação no

caso das falhas de mercado tradicionais (incluindoos ciclosde negócios),o

Estado seria empresário e promotor do desenvolvimento, planejando e

eliminando "estrangulamentos" do lado da oferta. Isto ocorreu em vários

países, e de fato alguns deles formaram indústrias nacionais e tornaram-

se competitivos em muitos setores. Mas nem todos experimentaram um

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9

bom desempenho, ou conseguiram mantê-lo de modo sustentado no

tempo. Mesmo em países já desenvolvidos a atuação governamental

começou a ser questionada. Inflação, déficits governamentais e dívida

pública tornaram-se crônicos, e trouxeram o debate acerca da

privatização, desregulamentação e redefinição do papel do Estado. A

Nova Economia Política (Silva, 1990) trouxe à tona a possibilidade de

falhas de governo e de problemas no processorepresentativo (przeworsky,

1990). A própria democracia levanta dúvidas, pois alguns regnnes

autoritários conseguirammelhores "performances"econômicas.

Entre os países que passaram por fases de industrialização, o

Japão aparece como exemplo de forte presença governamental em tal

processo, a partir da Era Meiji (18 -18), e após a destruição provocada

pela Segunda Guerra Mundial (1939-1945).A política industrial no pós-

guerra foi em grande parte ditada pelo MITIl, com resultados favoráveis

em termos de crescimento do produto e competitividade.A relação entre

governo e mercado mostrou-se em grande parte eficiente, o que me

estimulou a escolher este país como estudo de caso. Os principais

questionamentos que me motivaram, entre outros, foram:

(i) o Estado japonês, enquanto organização, foi o único elemento

fundamental responsável pelo desempenho econômicojaponês no pós-

guerra?

(ii) a relação entre Estado e mercado verificada naquele país

sugere que o mercado em países subdesenvolvidos pode ser

1Minist:ty ofIntemational Trade and Industry (Ministério da Indústria eComércio Internacional).

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10

invariavelmente coordenadoou complementadode modoeficiente por um

agente governamental racional, melhorando o desempenho econômico?O

Estado pode, portanto, atuar segundo os interesses do mercado de modo

eficiente? Quais os custos econômicos envolvidos, para que isto ocorra?

Tais custos estariam também relacionados à forma organizacional

específicaque o governopossa assumir?

O objetivo deste trabalho envolve a resposta a estas questões a

partir de um marco teórico que redefine as fontes do desenvolvimento

econômico, e que propõe um modelo de análise que aponta novos

elementos necessários para um desempenho econômicoeficiente. Segundo

os autores que o representam, algumas sociedades já se mostraram

bastante promissoras, experimentando crescimento econômicoextensivo

(gradual e de muito longo prazo, no qual a renda per capita é

estacionária) por algum tempo e surtos de crescimento intensivo (taxas

elevadas de aumento da renda per capita no longoprazo, e níveis de bem-

estar e transformações estruturais). Muitas delas, no entanto, viram tal

processo ser abortado ou interrompido, e voltaram a um estado de

letargia ou apenas de crescimento extensivo.Forças capazes de destruir o

crescimento foram mais fortes do que forças que o impulsionaram.

O aparato institucional de cada país seria o fator determinante de

tais fenômenos, estabelecendo o tipo de incentivos que os agentes

econômicos (públicos e privados) receberão e que irão determinar o

desempenho econômicono longo prazo. Determina ainda as funções do

Estado enquanto organização, e a relação deste com o setor privado. É

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11

esta a visão da Nova Economia Institucional (NE1)2,que envolve autores

comoDouglass C. North (1990, 1991e 1973)e Eric Lionel Jones (1993a,

1993b). Para estes autores, o desenvolvimento econômico através da

história é na verdade um confronto entre agentes econômicos rent-

seeking3 e agentes econômicosprodutivistas ou "market friendly", sem que

haja um resultado necessário e único no longo prazo para todas as

formações sociais. Tais agentes estabelecem as regras do jogo

(instituições) - necessárias em função da incompletude das informações e

do reconhecimento de limitações à racionalidade dos agentes econômicos-

seguindo modelos mentais (Denzau & North, 1994), e de acordo suas

respectivas forças no processo político. Das regras decorrem incentivos

que influenciarão o caráter do crescimento econômico.A luta de "classes"

apontada por Marx e Engels (Marx & Engels, 1993)passa a ser uma luta

entre "grupos", diferenciados apenas pelo fato de serem pró ou anti-

mercado. Esta visão teórica é discutida no primeiro capítulo.

A propensão a crescer, ou o próprio crescimento econômico,é um

fenômeno recorrente (Jones, 1993a:63) na história, e mostra-se presente

em sociedades orientais muito antes da Revolução Industrial inglesa

(idem: 28). Ou seja, é um conjunto de fenômenos passíveis de

generalização em escala mundial, em diferentes países. Expressa a luta

entre crescimento do produto e crescimento populacional, tomando-se

sustentável e intensivo no longo prazo graças a uma série de condições

2A NEI não se confunde, como veremos adiante, com a antiga escola institucionalista norte-americana, representada por T. Veblen, 1. Commons e 1. K. Galbraith, por exemplo. Há autores queressaltam semelhanças e possibilidades de intercâmbio (Rutherford, 1995; Dugger, 1995;Groenewegen, Kerstholt & Nagelkerke, 1995), mas mesmo assim persistem diferenças significativas.Dentro do próprio neoinstitucionalismo ainda há variações.3Rent-seeking (caçador de rendas) pode ser preliminarmente definido como o comportamento de umindivíduo ou grupo de indivíduos que visa a melhora de sua posição às custas do bem-estar social, viamecanismos institucionais e políticos.

Page 12: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

12

prévias e de transformações institucionais que possibilitam o

sancionamento de suas forças propulsoras. Tais condições, no entanto,

não surgem necessariamente ou de forma automática, acompanhando a

evolução dos mercados. Regras sobre comportamento e os incentivos

gerados por elas agem de modo independente ao longo do processo. O

progresso tecnológico também repousa em incentivos. Como ressalta

Jones:

"0 que reduziu o impacto da mudança tecnológica e tornou-a lenta

foi a estrutura social ou política". (1993a:72)

No século XX,após a 11Guerra Mundial, o Japão experimenta um

período de crescimento econômico sustentado, no qual novamente a

atuação do Estado foi essencial. Segundo Jones (1993b: 99) o Estado e

fatores culturais - como também ressalta Morishima (1987) - são os

agentes relevantes deste processo.Fatores culturais são considerados por

North (1990) como parte dos modelos mentais dos agentes, que irão

formar as regras e incentivos aos indivíduos, verdadeiros determinantes

do processo (no caso japonês seriam regras "marhet-friendly"). Apesar de

enfatizar a falibilidade de órgãos estatais como oMITI, Jones observa

(1993b: 100):

"Contudo, é possível que o estado japonês tenha realizado

julgamentos corretos desde a guerra e que isto explique em grande parte o

sucesso do país".

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13

Mesmo que os julgamentos corretos por parte do setor

governamental tenham sido consideradosimprescindíveis para explicar o

crescimento observado, procurarei demonstrar que as regras que

incentivaram o comportamento dos agentes governamentais na tomada

de decisões corretas foi também imprescindível. O exame do modelo

institucionalista trará elementos que permitem levar em conta tais

fatores, antes subestimados ou ignorados pela visão neoclássica

tradicional de desenvolvimentoeconômico.As regras formais (jurídicas,

de cumprimento obrigatório) e informais (valores, costumes, ética,

religião, de cumprimento voluntário) passam a fazer parte do

instrumental de análise. Irão formar o aparato institucional de cada

sociedade e delimitar a atuação dos agentes econômicos,inclusive a do

governo. Ao delimitar estas ações as regras podem adquirir tanto um

sentido favorável ao mercadoe à produçãocomoum sentido contrário aos

mesmos. No primeiro caso, custos de transação - conceito exposto mais

adiante - serão reduzidos, e as trocas fluirão mais facilmente. A estrutura

de direitos de propriedade será protegida, e os agentes serão incentivados

a produzir. No segundo caso, os agentes serão incentivados a buscar

ganhos econômicosde modo desfavorável aos moldes de um mercado

eficiente.

O Estado, além de estar limitado e incentivado pelas regras, deve

garanti-las e fornecê-las através doprocessopolítico(que ocorre dentro do

Poder Legislativo).Na análise da NEI o Estado deve, em primeiro lugar,

proteger os direitos de propriedade, reduzindo custos de transação

(North, 1990; North & Wallis, 1982). Isto será discutido ao final do

primeiro capítulo, quando serão tecidos comentários sobre o papel do

Page 14: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

14

Estado na NEI. Este item prepara o caminho para o capítulo 2, que

estuda aspectos do caráter da intervenção governamental na economia

japonesa.

o padrão de intervenção do governono Japão sofre transformações

ao longo do século :XX,e mostra um caso diferenciado entre os países em

que o estado foi importante para a industrialização. De um estado

"desenvolvimentista" passa a um caráter de estado em "rede" ou "network

state" (Burlamaqui, 1990),o que mostra mudanças em sua relação com o

setor privado e em sua forma organizacional. Este padrão organizacional

pode ser considerado um fator que impulsiona o crescimento e estanca

fatores bloqueadores do mesmo. Definições e características do estado

japonês serão o objeto de análise do segundo capítulo, no qual discutirei

os conceitos mais empregados na análise da relação entre setor público e

privado naquele país. Será interessante observar que o Estado não é

apenas uma "terceira parte imparcial" que protege e garante as regras do

jogo. A influência sobre o jogo, porém, estimula sempre a competição, e é

limitada em grande parte a medidas nesse sentido.

Irei supor, a principio, que elementos institucionais favoreceram

mudanças no padrão de intervenção a partir da ocupação norte-

americana, em um sentido menos autoritário e favorável à competição

econômica,e não mais militarista. Este padrão de intervenção implica em

um governo atuante no sistema econômico, que consegue promover o

consenso e reduzir incertezas, eliminando falhas de mercado. Existe

direcionamento por parte do Estado, mas de formas distintas no tempo e

em um sentido predominantemente "marhet-friendly".

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No terceiro capítulo é feito um estudo de caso, referente aos

aspectos fundamentais da política industrial do pós-guerra praticada no

Japão. Ao longo do estudo será possível destacar a aplicabilidade dos

conceitos trazidos pela análise neoinstitucional, mostrando regras que

balizam a relação entre governo e setor privado no que respeita à

industrialização. O conceito de redes também é avaliado à luz da

evidência surgida no período em questão. Evoluções recentes da política

em alta tecnologia também serão abordadas, corroborando as

características dopadrão de Estado anteriormente exposto.

Finalmente, é feita uma reavaliação das hipóteses do trabalho, em

que procuro elaborar conclusõessobre a conformidadeou não das mesmas

para o estudo de caso escolhido.

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16

1. Instituições e desenvolvimento econômico.

o objetivo deste capítulo será a apresentação do modelo de análise da

Nova Escola Institucionalista (NEl), como qual será possível reavaliar o

processo de desenvolvimento econômico em geral, bem como o caso

específicoda política industrial japonesa no período posterior à Segunda

Guerra Mundial. Para tanto, pretendo inicialmente situar a visão desta

escola em relação a outras visões do processo de desenvolvimento. A

exposição será bastante breve e centrada em análises que enfatizem

aspectos também abordados pela NEI, para que a comparação seja mais

frutífera.

Além dos modelos de crescimento tradicionais, abordarei algumas

visões da Economia do Desenvolvimento, que experimentou notável

progresso após a II Guerra Mundial e que preocupa-se com a questão do

subdesenvolvimento. Em seguida apresentarei o modelo da NEI, que

amplia os limites neoclássicos e examina as condições para que o

crescimento se verifique.

1.1. Variáveis subjetivas na análise do desenvolvimento

econômico.

A relação entre fatores econômicos e não-econômicos têm recebido

tratamento diferenciado ao longo da evolução da análise econômica.

Page 17: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

17

Podemosespecificá-lacomosendo uma relação que envolvebasicamente a

influência recíproca entre fatores objetivos (tecnologia, industrialização,

divisão do trabalho, crescimento do produto) e subjetivos (cultura,

religião, ideologia, direito). Duas correntes de análise são tradicionais

neste tema: a corrente marxista e a weberiana.

No prímeiro caso, há uma ênfase maior em fatores objetivos.

Segundo Marx, a cada modode produção correspondeuma superestrutura

sócio-psicológica, que o mantém e garante (Birnbaum, 1953).É composta

pelas organizações políticas, governamentais e jurídicas, bem comopelo

conjunto de idéias artísticas, .relígiosase filosóficas.Esta superestrutura,

que envolve elementos subjetivos, seria determinada de modo necessário

pelos imperativos do plano material, que envolveria fatores objetivos

relacionados ao modo de produção existente em cada momento histórico.

Ao longo do tempo, a adaptação de valores e idéias às exigências dos

aspectos puramente econômicosseria inevitável, portanto.

A evolução do modo capitalista de produção levaria

inevitavelmente à mudança de valores, idéias e sistemas políticos

tradicionais, de modonecessário. As idéias ou fatores subjetivos possuem

aqui um papel apenas dependente, e poderíamos com base em tais

pressupostos explicar o desenvolvimento econômicoe social de várias

nações através da história. As contradições e males que afetam o sistema

decorrem de fatores objetivos,mais do que de fatores subjetivos.

o problema é que nem todas as formações sociais têm obedecidoa

este padrão. Nem todas experimentaram um processo de industrialização

Page 18: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

18

e crescimento do produto (acumulação de capital) sustentado no tempo, e

nem todas apresentaram rupturas e adaptação automática em suas

"superestruturas" tradicionais em direção a valores capitalistas e a

aparatos institucionais que garantam tais valores. O sistema marxista

não explica como ocorre a mudança no plano das idéias decorrentes da

passagem de um modo de produção a outro (Birnbaum, 1953), o que pode

indicar uma resposta ao problema levantado. Ele supõe que esta

mudança se dá de maneira mecânica, e nem considera a fundo a

possibilidade de que ela não venha a ocorrer. A propriedade privada, tão

bem situada por Marx, pode ser insuficientemente protegida. Neste

último caso, as idéias podem agir de forma independente, obstaculando a

acumulação de capital.

A análise de Max Weber (1992) oferece elementos que nos auxiliam

a preencher estas lacunas. Os novos valores ou idéias correspondentes ao

novo modo de produção devem ser aceitos de modo voluntário, como no

caso da ética protestante, a qual trouxe subsídios à acumulação de capital

através do incentivo à poupança e ao trabalho. Estes valores cumpriram

uma função psicológica, transformando gradativamente a superestrutura

anterior. Como ressalta Birnbaum (1953), a natureza humana não é

"plástica" ou "maleável" e necessita de incentivos que não apenas o uso da

violência ou da coerção.

Fatores subjetivos são também analisados por Schumpeter (1984),

quando este profetiza o fim do,capitalismo, denotando forte influência da

perspectiva weberiana. O racionalismo típico deste sistema leva à crítica

dele próprio, e o seu sucesso econômico sustenta seus destruidores. O

Page 19: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

19

"espírito capitalista" do empresário inovador é minado lentamente por

idéias socializantes e estatizantes, no que o keynesianismo e os

intelectuais teriam papel fundamental. Ao contrário de Marx,

Schumpeter argumenta que o sistema capitalista é vítima de seu sucesso

enquanto sistema produtivo, não sofrendopor esgotamento de mercados

ou novas tecnologias, mas principalmente por fatores ambientais que

levam à destruição de suas instituições (oude sua "superestrutura").

As inovações (novos produtos, novos processos, nova fonte de

matérias-primas) são a raiz do processo de desenvolvimento, que

diferencia-se do crescimento por trazer alterações qualÍtativas que

alteram a estrutura econômicavigente. São levadas ao mercado pelo

empresário schumpeteriano (Schumpeter, 1985),o qual age sob impulsos

de conquista e de construção de um império pessoal. O empresário

necessita de representação política e incentivos, além de valores

subjetivos que aprovem seu comportamento, por parte dos outros

membros da sociedade. O ambiente crescentemente hostil termina por

enfraquecer o espírito empresarial, substituindo-o por valores coletivistas

e socialistas. Os males que afligem o capitalismo são neste caso

subjetivos, e não objetivossomente.

Também a Escola Institucionalista tradicional norte-americana,

comona análise de T. Veblen, aponta a importância de fatores subjetivos

como o hábito, formado por padrões culturais. Sugere desse modo

limitações ao modelodo "homemeconômicoracional" (Rutherford, 1995)e

rejeita a hipótese de escolharacional, limitada ou não.

Page 20: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

20

o velho institucionalismo analisa as instituições ou regras em seus

aspectos puramente sociais. A motivação dos agentes sociais não é

econômica,mas ocorre em razão de status, ideologia e poder (Rutherford,

1995). Mesmo diferindo na análise, veremos que a Nova Economia

Institucional (NEI) também ressalta a importância de fatores não-

econômicos para a continuidade do crescimento. O determinismo

puramente cultural e social é então substituído pelo pressuposto de

racionalidade limitada, mantendo-se a hipótese de escolha racional.

Ambas as escolas concordam quanto à limitação do modelo econômico

neoclássico tradicional de racionalidade ilimitada, mas a NEI visa

ampliar os alcances domesmo.

O auto-interesse e a hipótese de maximização das satisfações

individuais são preservados pela NEI, que visa formalizar com seu

auxilio a relação entre instituições e desempenho econômico. As

instituições são analisadas desta vez sob o ponto de vista puramente

econômico, no que podemos denominar análise objetiva de fatores

subjetivos. Dada a nova hipótese, em um modeloneoclássico,de limitação

de informações e de capacidade cognitiva dos agentes, as "instituições

importam" (North, 1990),e afetam diretamente o custo de realização das

trocas econômicas.Nesse sentido, não há uma relação necessária entre

instituições e eficiência econômica,pois os incentivos estabelecidos pelas

regras podem levar a padrões predatórios de atividade, ou a trocas não-

produtivas. Neste ponto, há semelhaça com a análise de Veblen

(Rutherford, 1995),que apontava possíveis trajetórias de predação ou de

produção. A força do hábito e não de uma escolha racional (limitada),

Page 21: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

21

porém, guiava os agentes, em um processo de causalidade cumulativa

(Rutherford,1995: 447).

A amplitude crescente das trocas e da variedade dos bens

transacionados através da história levou à crescente impessoalidade das

transações, segundo North (1990). A impessoalidade leva à incerteza,

dada a racionalidade limitada e assimetria de informações, o que elevou

os custos de transação. Regras informais, formais e o governo surgiram

como redutores de tais custos, mas a percepção de sua necessidade

não foi uniforme, no que as ideologias e modelosmentais representam um

papel relevante, comoveremos nos próximositens.

Após a Segunda Guerra Mundial, ganha definição a Economia do

Desenvolvimento comodisciplina da Ciência Econômica,com a evolução

das contas nacionais e comparações entre países desenvolvidos e

subdesenvolvidos (Souza, 1993). O keynesianismo coloca a participação

do governo no ambiente econômico em termos distintos da tradição

clássica e neoclássica, enfatizando a necessidade de políticas anti-cíclicas.

Em países não industrializados as funções governamentais se ampliam

ainda mais, quando teóricos do subdesenvolvimento enfatizam a

necessidade de planejar a industrialização, alocando recursos a setores-

chave e criando empresas estatais quando necessário, conforme as teses

da ComissãoEconômicaPara a AméricaLatina - CEPAL (Souza, 1993).O

protecionismoe a estratégia de substituição de importações visam formar

e proteger indústrias nacionais nascentes.

\..

Page 22: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

22

Os teóricos do subdesenvolvimento divergem quanto ao papel

central do governo enquanto produtor. Alguns autores como Furtado

(1967) defendem investimentos públicos em infra-estrutura e a criação de

estatais, enquanto R. Campos (Souza, 1993)prefere o capital estrangeiro

como produtor, sendo função governamental apenas o planejamento

indicativo.

A concepção teórica de crescimento e desenvolvimento econômico

nestas vertentes desenvolvimentistas refere-se à intensificação do uso de

capital, através da industrialização. O governoé essencial na alocação de

crédito, infra-estrutura e determinação de setores a serem privilegiados.

A acumulação de capital e o crescimento da renda per capita decorreriam

necessariamente de tais políticas, não existindo referência a fatores de

ordem subjetiva.

Os fatores subjetivos também são tomados como dados ou estão

fora da análise de vários modelos da Economia do Desenvolvimento.

Como destaca Hirschman (1986), ela visava construir um "novo edificio

teórico", dada a "inaplicabilidade" dos conceitos da economia tradicional

aos países subdesenvolvidos. Este autor considera que existe a

possibilidade de ganhos mútuos entre "centro" e "periferia", caso haja

uma política desenvolvimentista adequada.

Entre as teses iniciais do subdesenvolvimento estava a do

subemprego rural (Lewis, 1954),que enfatizava o excesso de mão-de-obra

no campo em países não industrializados, o que pressionava os salários

para baixo. O governo deveria arregimentar este segmento da população

Page 23: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

23

através de uma "política de investimentos públicos planificados"

(Hirschman, 1986:57). Com isto o crescimento poderia ser equilibrado

(Rosenstein-Rodan, 1969; Nurkse, 1969) ou desequilibrado (tese de

Hirschman). No primeiro caso o governo alocaria recursos para

investimentos em vários setores industriais, em que cada um utilizaria o

mercado do outro. Para Hirschman seria mais proveitoso concentrar

reursos em setores específicos,a partir dosmais básicos. Isto traria maior

atrativo para o "espírito empresarial" que todo país teria, potencialmente

(Hirschman, 1986:51).

É oportuno lembrar o modelode fases do crescimento econômicode

W.W.Rostow(1974) que, como o de Marx, é bastante determinista ou

teleológico. Todo país passaria por quatro fases: sociedade tradicional,

transição ou pré-decolagem, decolagem e alto consumo de massa. Os

países desenvolvidos atingiram a etapa final, com crescimento auto-

sustentado e sem que o sistema tenha tido um final "catastrófico".Outros

países seguirão as mesmas etapas, podendo encontrar-se em qualquer

uma delas.

O estágio que trata das pré-condiçõesé interessante por destacar

tanto fatores econômicoscomo não-econômicoscomo essenciais para a

"decolagem"posterior (Rostow,1974).O aumento da taxa de investimento

faria com que o estoque de capital crescesse a taxas superiores ao

crescimento demográfico.Para que isto ocorresse, deveria haver progresso

na agricultura e geração de recursos naturais e formação de capital fixo

(infra-estrutura). Mas as condições puramente econômicas não seriam

suficientes. Mudanças sociais deveriam preparar o caminho para o

Page 24: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

24

desenvolvimento, devendo existir liderança empresarial (com liberdade

de agir de modo capitalista) e também motivação política (ausência de

nacionalismoe protecionismo).

As críticas a Rostowenvolvemo determinismo da chegada a uma

fase de crescimento auto-sustentado (o qual pode ser revertido) e o

pressuposto de que países subdesenvolvidostêm estágios "tradicionais"

semelhantes àqueles pelos quais passaram os que já se industrializaram

(Colman & Nixson, 1981: 52). Diferenças culturais podem explicar

diferentes estágios tradicionais (Souza, 1993: 201) entre países.

Gerschenkron (1966)também oferecesubsídios para críticas, ressaltando

diferenças de caráter histórico quanto à rapidez do crescimento e

mudanças da estrutura organizacional e produtiva. As políticas

governamentais também variaram, assim comofatores ideológicos.

Hoselitz (1960) oferece uma interpretação sociológica do

desenvolvimento que traz importantes elementos da análise

schumpeteriana. Lembra que a EscolaNeoclássicadeixa de lado relações

sempre constantes entre teoria e política econômicas, preocupação

fundamental do período clássico, ou da Economia Política. A Economia

Pura abstrai consideraçõespolíticas e considera as "motivaçõeshumanas"

e o "ambiente cultural" como dados. Passou a "desprezar as mudanças

sociais e políticas que acompanham o processo de crescimento econômico"

(idem:24).

Destaca a necessidade de mudar os "valores sociais" para que

ocorra crescimento, e busca uma teoria geral que englobe mudanças

Page 25: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

25

econômicase sociais em conjunto. Dada a diversidade de culturas entre

nações, não basta uma teoria específica do capitalismo ocidental

(Hoselitz, 1960:27). O autor procura abstrair elementos não-econômicos

específicosde países distintos, visando obter generalizações. Para tanto

emprega o conceito de T. Parsons (Hoselitz, 1960: 30) de "variáveis-

padrão", determinantes do produto social. As três variáveis em questão

seriam meritocracia, universalismo e especialização. Os elementos

opostos, contrários ao crescimento econômico, são respectivamente o

status ou tradicionalismo, o auto-interesse particularista e a não-

especialização.Os três princípios devemser buscados em conjunto, pois a

especialização pode ser determinada por normas de tradição ou

particularismos.

A elite governante de um determinado país, segundo Hoselitz,

poderia impor interesses particularistas ao restante da população. Seriam

"barreiras à mudança econômica" (Hoselitz: 44-5). A percepção das

possibilidades e beneficiosdo crescimentopor estas elites, portanto, seria

fundamental. Colocanoplanejamento, portanto, uma importância crucial

para a mudanças. A influência de Schumpeter relaciona-se ao foco no

comportamento empresarial inovador, como fonte de mudança. Tal

comportamento baseia-se nas três variáveis-padrão acima citadas, que

trariam a aceitação de grupos marginalizados que seriam inovadores

(judeus, por exemplo).

40 autor cita como exemplo a URSS (hoje ex-URSS) para mostrar como o planejamentogovernamental pode levar à adaptação a novos padrões de produção através da "autoridade"(Hoselitz, 1960: 48).

Page 26: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

26

A NEI, como veremos adiante, também estabelece diferenças

fundamentais entre diferentes países que possuam distintos conjuntos de

regras de convivência social e econômica. Não há um caminho necessário

pelo qual todos os países deverão passar, e tais regras são condição

necessária para o crescimento sustentado de longo prazo. Aproxima-se

nesse sentido das análises de Hoselitz e Gerschenkron, mas destaca

outras variáveis em um modelo econômico que envolve fatores não-

econômicos. Busca ainda ser geral, com aplicabilidade a qualquer país em

qualquer época, mas em um modelo distinto.

Por último, gostaria de abordar alguns aspectos da Teoria da

Dependência, na versão de Cardoso & Faletto (1970). Estes autores

criticam a análise tipológica ou de "fases" do desenvolvimento,

ressaltando que as peculiaridades históricas e culturais são relevantes no

processo. A mudança econômica e social envolve relações entre grupos,

em correlações de forças distintas de país para país segundo evoluções

históricas distintas, e não há um vínculo necessário entre

desenvolvimento econômico e social. Este último só seria obtido se o

desenvolvimento econômico não fosse "dependente'"; o que é tomado como

um dado para os países subdesenvolvidos. Neste caso o país além de

desenvolvido deixaria de ser "periférico". A análise de cada conjunto de

"singularidades" irá ao final mostrar como a "dependência" varia segundo

tempo e lugar.

Elites ou grupos locais que desejem manter privilégios ou copiar

padrões externos de consumo (efeito-demonstração) podem impor seus

5A "independência" envolveria crescimento com base no mercado interno. O protecionismo evitaria,portanto, relações desiguais de poder entre os países.

Page 27: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

27

interesses (Cardoso & Faletto, 1970: 22) e gerar pressões sobre a

poupança interna e sobre a balança comercial. A ação de grupos pode

bloquear o crescimento, portanto. É necessário visualizar o tipo de

integração social existente, que condiciona o desenvolvimento, e que se

desdobram em relações internas de classe. Estas relações de classe

internas condicionam as relações externas do país, ou o tipo de vinculação

à economia mundial. Geralmente haveria uma funcionalidade entre as

mesmas, e o subdesenvolvimento não aparece como uma anomalia, mas

como parte do sistema econômico mundial de "exploração" e dominação.

Os interesses e valores são sempre interesses de classe, ligados portanto a

fatores puramente econômicos, e o objetivo é analisar a base sociológica

da estrutura econômica, que garante a dominação.

A primeira diferenciação em relação à NEI seria a própria questão

da "dependência". A preocupação maior de Cardoso & Faletto (1970) é a

verificação de uma hipótese adicional à de crescimento econômico: a

existência ou não de dependência. Para a NEI esta questão não se coloca

(poderia ser um falso problema) pois a preocupação básica refere-se a

condicionantes não-econômicos do crescimento em geral, e não do que se

defina como "crescimento dependente". Os autores colocam que é possível

haver maior "autonomia", embora o mercado econômico se desenvolva

menos (citam o exemplo de Cuba pós-Revolução). A questão não

respondida, e que a NEI visa responder é: por quê houve menos

desenvolvimento do mercado, e quais os condicionantes não-econômicos

deste fato? Houve um "trade-oft" entre medidas que segundo os autores

reduziram a "dependência" e desempenho econômico, mas por quê isto

ocorreu?

Page 28: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

28

o jogopolítico entre grupos (e não necessariamente entre classes) é

bastante importante para a NEI, comoveremos a seguir. De fato, grupos

políticos de interesse conseguem eventualmente impor interesses

contrários à eficiência de mercado, mas isto se dá em razão de falhas no

processo político (ou democrático) e não porque servem a interesses

externos da economia mundial, "como é natural" (Cardoso & Faletto,

1970: 29). Não há esta funcionalidade porque a "dominação" não é

tomada comodada.

1.2.A abordagem da Nova Economia Institucional (NEI).

A seguir irei expor a abordagem da NEI, situando-a como um aparato

teórico que visa rever alguns pressupostos da economia neoclássica ao

mesmo tempo em que a completa, utilizando seu instrumental de análise.

Comojá foi apontado acima, seu objetivobásico é chegar a uma teoria

bastante geral que relacione mudança institucional e desempenho

econômico,passível de aplicação a qualquer país, e que reconheça desta

maneira as "peculiaridades" históricas e culturais de cada sociedade,

integrando-as à análise.

o modelo neoclássico tradicional de crescimento econômico (ou

acumulação de capital) toma comodadas as instituições que possibilitam

a existência e o bom funcionamento dos mercados, sendo bastante útil

para descrever relações entre certas variáveis estritamente econômicas

sob um aparato institucional ideal. O crescimento neste modelo pode

Page 29: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

29

ocorrer de maneira extensiva ou intensiva. No primeiro caso, não ocorre

aumento na renda per capita de determinado país no longo prazo. Na

ausência de progresso técnico, e sob o pressuposto de rendimentos

decrescentes, os fatores de produção - terra e capital - são utilizados de

acordo com o ritmo do crescimento da força de trabalho, de maneira

extensiva. O longo prazo, portanto, aponta a chegada de um estado

estacionário. O modelo de Robert Solowé bastante representativo desta

visão, englobando todas estas relações (Solow,1956;Sachs, 1993:561-70).

Caso haja incremento nas quantidades per capita utilizadas de

capital ou terra, o nível de renda per capita irá crescer no longo prazo. O

mesmo ocorre em caso de aumento de produtividade de um ou mais

fatores (incluindo o trabalho), o que pode ser gerado por várias fontes

(North & Thomas, 1973: 1-2). Podemos destacar as inovações

tecnológicas, investimento em capital humano ou educação, redução dos

custos de informação no mercado, e economias de escala geradas por

maiores mercados ou mercados mais distantes. Estas inovações trazem

ganhos de produtividade e elevaçãono nível de renda per capita. A vinda

de um estado estacionário é postergada, nestas condições. É possível

mensurar empiricamente as parcelas do crescimento atribuíveis a cada

fator, como capital e trabalho. A parte não explicada pelos fatores é

atribuída ao progresso tecnológico (educação, pesquisa e

desenvolvimento).

Nos dois casos apresentados acima ocorre crescimento intensivo, o

que pode ser chamado de desenvolvimento econômico na visão neoclássica.

A renda e o produto devem crescer no longo prazo a um ritmo maior do

Page 30: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

30

que o ritmo de crescimentopopulacional.Os indicadores relevantes são os

indicadores per capita. O crescimento extensivo é apenas um estado

estacionário, letárgico, em que o crescimento da renda per capita não se

sustenta no longoprazo.

A perspectiva da NEI redefine este conceito de desenvolvimento e

alarga o campo de estudos neoclássico, buscando explicar algumas

questões de modomais satisfatório. Algumas sociedades necessitaram de

algo além de fatores puramente econômicospara que se mantivessem na

rota de crescimento contínuo e intensivo. Como destacam North &

Thomas (1973:2):

"Nós nos permitimos imaginar: se tudo que é requerido para o

crescimento econômico são investimentos e inovações, por quê algumas

sociedades não alcançaram este resultado tão desejável?"

As restrições ao crescimento na perspectiva neoclássica são dadas

apenas pela tecnologia e pelos fatores de produção, não havendo restrição

organizacional ou institucional (North, 1990: 132).Porém, a disparidade

entre diferentes países e a persistência de formações econômicas

ineficientes não são apenas uma questão de investimento em tecnologia,

de investimento em capital fisico e em capital humano. Um aparato

institucional favorável passa a ser um pré-requisito indispensável, pois os

incentivos ao crescimentonão são "dados".

A necessidade de uma organização institucional favorável ao

crescimento e ao financiamento eficiente de uma economia implica

Page 31: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

31

redefinir as fontes do crescimento econômicotradicionais enumeradas

pela visão neoclássica. Estas passam a ser uma consequência de um

ambiente institucional favorável, que propicia incentivos aos agentes

econômicos.

"Osfatores que listamos (inovações, economias de escala, educação,

acumulação de capital, etc.) não são causas do crescimento; eles são o

crescimento". (North & Thomas: 1973:132)6

o aumento do nível de renda per capita propiciado pela mudança

tecnológica possui outras fontes. O progresso tecnológico,por exemplo,

acaba sendo uma manifestação, e não uma causa fundamental. Os

incentivos aos agentes individuais devemlevar a taxa de retomo privada

de um certo empreendimento ao nível da taxa de retomo social. Caso isto

não ocorra, deve haver uma terceira parte capturando a diferença.

Alguém acaba recebendo beneficios ou arcando com custos indevidos.

Caso os custos privados sejam maiores do que os beneficios sociais, a

atividade não será empreendida. O agente trouxe beneficios à sociedade e

não recebeu (ou sabe que não irá receber) um valor equivalente. Isto

decorre do aparato institucional que regulamenta os direitos de

propriedade.

As considerações acima formuladas mostram que o crescimento

econômicode longo prazo possui fontes que não são apenas objetivas ou

materiais (capital, terra, trabalho, tecnologia), mas engloba também

fontes que estabelecem um aparato institucional favorável à produção

6Grifo do autor.

Page 32: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

32

incentivos aos agentes, e que podemos denominar fontes subjetivas.

Estas, ''por interferirem no sistema de motivações que direcionam o

comportamento dos agentes, são as variáveis mais importantes dentro do

processo em questão" (Silva, 1994).

As fontes subjetivas são as regras do jogo econômico que incluem

valores culturais e pessoais, e o que podemosdenominar capital ético. O

conjunto de valores que incentivam o trabalho e a parcimônia atuam,

nesta perspectiva, comoum fator deprodução(Silva, 1994).

Tais fatores não-econômicos são relevantes e podem ser

considerados fonte do processo de crescimento econômicoem razão de

aceitarmos o pressuposto de que trocar envolve custos relacionados a

fatores não-econômicos. O mercado é uma rede de contratos e trocas de

bens e de direitos de propriedade, sendo o crescimento um processo de

trocas contínuas no tempo. Se assumirmos que há imperfeições na

realização destas trocas em função de limitações informacionais e

imperfeições na delimitação das regras de direitos de propriedade,

podemosadmitir que as trocas podemnão ocorrer,ou que ocorramem um

sentido não favorável ao pleno desenvolvimento dos mercados e de

inovações. Há custos, como veremos a seguir, que surgem em função

destas limitações e incertezas, e que influenciam o comportamento dos

agentes econômicos.

r

Page 33: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

33

1.2.1. Custos de informação e custos de transação.

As hipóteses neoclássicas para explicar o comportamento econômicodos

agentes nas trocas econômicas envolvem a busca de maximização da

utilidade esperada por cada indivíduo, em que:

a) o objeto da escolha é claramente definido, de forma objetiva e

unívoca;

b) os indivíduos são capazes de realizar os cálculos acerca da

melhor alternativa, que irá maximizar sua satisfação.

Uma estrutura competitiva eficiente estabelece prêmios e punições

aos agentes econômicos, sendo um estímulo para a eliminação de

informações incompletas. Os arranjos dentro domercado são rápidos. Não

há falta de informações sobre o bem envolvido na troca e sobre outras

alternativas de escolha. Qualquer incerteza sobre o comportamento do

outro agente não se colocano modelo,pois a informação sobre a troca já é

considerada completa. Ambas as partes envolvidas na troca agem,

portanto, de maneira perfeitamente racional. Estes são os fundamentos

microeconômicosde modelosde crescimentocomoo de Solow,apresentado

acima.

O pressuposto comportamental adotado por North (1990),

diferencia-se desta visão. No modeloda NEI o comportamento humano é

mais complexodo que o previsto na teoria neoclássica.A tese colocada em

dúvida é a de que o processo cognitivo dos agentes lhes dá modelos .,"

Page 34: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

34

verdadeiros sobre seu campo de interesse, e de que eles recebem a

informação "que leva à convergência dos modelos a princípio divergentes"

(1990: 17), convergência esta em direção aos parâmetros do mercado

eficiente. Os modelos subjetivos divergem de indivíduo para indivíduo e

na verdade não há convergência. Mais ainda, mudanças no

comportamento dos agentes influenciam a mudança institucional e sua

direção.

A motivação individual pode envolver o altruísmo e restrições

auto-impostas (restrições éticas), e não apenas a maximização racional do

bem-estar individual. Domesmomodo,um comportamento não-produtivo

também é possível. A eficiência máxima e o comportamento produtivo

previstos no modelo anterior não é verificada automaticamente no mundo

real, mas é na realidade dependente de algumas circunstâncias não-

econômicas.O mercado apresenta fricções e incertezas, e North cita dois

fundamentos microeconômicosbásicos que evidenciam esta afirmação:

a) a capacidade limitada de processar, organizar e utilizar

informações pelos agentes econômicos - os sinais transmitidos pelas

instituições são absorvidos de maneira distinta;

b) a incerteza quanto ao comportamento econômicoda outra parte

envolvida na troca, ou quanto ao ambiente em que se dá a transação.

Os agentes são limitados em obter e processar informações. Há

incerteza e informações incompletas sobre os bens envolvidos na troca e

sobre o comportamento possível da outra parte envolvida na troca. Por

Page 35: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

35

isto, existem custos de informação no mercado, e surge a questão da

assimetria informacional. A assimetria ocorre porque as partes

envolvidas na transação possuem informações incompletas. O comprador

nunca tem informação completa sobre todos os atributos do bem e se eles

irão satisfazer suas preferências. Há incerteza sobre o comportamento do

vendedor, que pode estar sonegando informações sobre o produto. Do

mesmo modo, o vendedor possui informações incompletas sobre o

comprador, e não sabe se este efetuará de fato o pagamento.

Obter e processar informações são custos para os agentes, e dão

origem a outro tipo de custos: os custos de transação. Podemos conceituar

tais custos como aqueles necessários à realização das trocas (vendas ou

aluguéis) ou à transferência dos direitos de propriedade (Eggertsson,

1994). São os custos de garantia e proteção destes direitos, envolvendo a

mensuração de todos os atributos do bem ou serviço transacionado, e a

garantia do cumprimento das obrigações (gastos com a elaboração de

contratos e serviços advocatícios, por exemplo). São custos bilaterais,

envolvendo fluxos recíprocos entre os agentes.

A seguir, apresentamos algumas definições de custos de transação,

discutindo ao final a versão de North. Segundo Niehans (1987: 676):

"Custos de transação surgem da transferência da propriedade ou,

mais genericamente, dos direitos de propriedade. Eles são concomitantes

aos direitos descentralizados de propriedade, à propriedade privada e às

trocas. "

Page 36: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

36

Na definição de G. Stigler (citadopor Niehans, 1987):

"(...) os custos do transporte da ignorância à onisciência".

Outra definição é a de Cooter (1987:457):

"Amplamente concebidos, os custos de transação referem-se ao uso

dos recursos requeridos para negociar e garantir acordos, incluindo o

custo de informação necessária para formular uma estratégia de

barganha, o tempo gasto pechinchando, e o custo da prevenção a fraudes,

realizadas pelas partes envolvidas na barganha. "

Exponho também a versão apresentada por Tirole (1992: 29),

relacionada a R. Coase e a O. Williamson. Ambos caracterizam a firma

em termos de contratos de curto e longo prazo, os quais são incompletos.

O contrato só é completo se todas as variáveis forem verificáveis. A

incompletude está ligada aos custos de transação, que são de quatro tipos.

Primeiro, todas as variáveis referentes a uma transação não podem ser

previstas na data do contrato. Mesmose o fossem, o segundo custo seria o

de escrever todas elas no contrato, que seria enorme. O terceiro é o custo

de monitoramento, de verificar o cumprimento dos termos do acordo. O

quarto é o de garantir seu cumprimento obrigatório (enforcement), o que

implica em custos legais. Tirole aponta ainda a situação de inexistência

de contratos, e a simples barganha entre as partes, e de uma forma

intermediária entre esta e o contrato completo. Nesta forma

Page 37: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

37

intermediária há duas possibilidades: uma terceira parte decide os

conflitos ou uma das partes decide (ibid)".

Baron e Kreps (1992) explicamos custos de transação destacando

duas ordens de fatores. A primeira é a racionalidade limitada dos

agentes, que não são capazes de prever tudo o que pode acontecer, e não

podem otimizar sua atuação sem altos custos. A segunda é a tendência ao

oportunismo, que sempre pode ocorrer. Em transações simples isto não

importa, mas passa a ser importante quando as trocas envolvem "tempo,

incerteza e informações privadas". Os custos de transação decorrentes

podem ser ex ante ou ex posto Os custos de negociação e elaboração de

contratos, tentando prever circunstâncias futuras são ex ante,

logicamente. Custos de verificar o cumprimento do acordo, após a

assinatura de um contrato por exemplo, são custos de garantia do

cumprimento obrigatório ou garantia de imposição ("enforcement", e são

ex posto Na mesma categoria enquadram-se custos de adaptação a novas

circunstâncias, ou custos de renegociação.

Finalmente, apresento a versão de Cheung (1987:56), que colocaos

custos de transação como todos aqueles ausentes na economia de

"RobinsonCrusoé":

"(...) custos de transação podem então ser vistos como uma gama de

custos institucionais, incluindo aqueles referentes a informações,

negociação, redação e garantia de contratos, especificação e policiamento

de direitos de propriedade, monitoramento de desempenho, e custos de

7A opinião deste autor sobre custos de transação e governo é exposta no item 1.4.

Page 38: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

38

mudança de arranjos institucionais. Em suma, eles abrangem todos os

custos não diretamente envolvidos noprocesso físico deprodução".

A distinção apontada na definição anterior entre custos de

transação e doprocessodeproduçãoaproxima-sebastante da definiçãode

Douglass North. Os custos de transação irão somar-se aos custos de

transformação do bem (custos que ocorrem no processo de produção),

quando são obtidos os custos totais do mesmo.Nas palavras deste autor

(1990:28):

"Os custos totais de produção consistem nos recursos gastos em

injeções de terra, trabalho e capital para a transformação física dos

atributos de um bem (tamanho, cor, localização, composição química, e

assim por diante) e em transacionar - definir, proteger e garantir os

direitos de propriedade dos bens (direito de usar, direito de auferir renda

do uso de, direito de excluir, direito de trocar). "

Três aspectos dos custos de transação são ainda destacados por

North. O primeiro é o custo de mensurar os atributos fisicos e legais

(características) do bem trocado. Em segundo lugar, há os custos de

policiar e obedecer ao acordo. Finalmente, um desconto (também um

custo de transação) em função da incerteza originadopela imperfeição na

mensuração e garantia legal dostermos de troca. North destaca, portanto,

a mensuração dos custos e uma margem de erro, que é descontada (1990:

62). O erro ocorre basicamente em função da assimetria informacional,

envolvendo o conhecimento parcial do objeto pelo comprador, e o

conhecimento parcial das finanças do comprador pelo vendedor, bem

Page 39: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

39

como a efetividade da punição a desrespeito nos contratos. Ou seja, cada

uma das partes possui uma função de utilidade, que são as seguintes:

a) a função utilidade do vendedor envolve o preço do bem, as

condições de troca, e a segurança em receber o pagamento.

b) a função utilidade do comprador envolve o preço, as condições de

crédito, e as características transferidas dobem.

O último item é bastante importante, pois entre as características

transferidas há algumas fáceis de mensurar e outras não. Os custos fáceis

de mensurar são os direitos legais, a dimensão da propriedade, e suas

características gerais. De dificilmensuração são os custos de manutenção

e conservação, possibilidade de expropriação e segurança quanto a roubo,

por exemplo. O importante é que, segundo o autor, este desconto reflete o

aparato institucional existente.

1.2.2.Regras informais, formais e garantia de imposição.

A questão dos custos de transação e das regras do jogopode ser discutida

a partir da visão de neutralidade do Teorema de Coase. Este é formulado

do seguinte modo:

Page 40: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

40

"(...) a alocação inicial dos direitos não importa de uma perspectiva

de eficiência desde que os custos de transação da troca sejam nulos."

(Cooter,op. cit.: 457)

Na ausência de custos de transação, o que ocorreria com um

número reduzido de partes em negociação, haverá uma solução

cooperativa sem a presença do estado ou alteração dos direitos de

propriedade, e esta solução será eficiente. Como ressaltam Pindyck &

Rubinfeld (1994: 862), a eficiência ''pode ser obtida sem intervenção

governamental quando a externalidade envolve relativamente poucas

pessoas e quando o direito de propriedade é bem especificado" 8. As partes

negociarão os direitos de forma que ambas lucrem. Isto ocorre, conforme

aponta North (1990: 15), em função da competição existente, que traz

informações perfeitas e reduz a defecção. Em seguida, ele mostra a

fragilidade de tal condição:

"(.••) os requisitos informacionais e institucionais necessários para

se atingir tais resultados são estritos".

Os agentes deveriam agir de maneira puramente racional e, o que

é também importante, na situação de altos custos de transação o próprio

mercado induzirá os agentes a procurar mais informações e chegar à

eficiência. Quanto às instituições neste caso: "elas não possuem um papel

independente no desempenho econômico" (1990: 16). A organização

econômicaseria determinada aleatoriamente, ou não haveria organização

institucional alguma, mas apenas o mercado. As escolhas feitas em face

8Estes autores defendem as hipóteses de Coase, citando um exemplo prático de acordo cooperativoentre a cidade de Nova York e o estado de Nova Jersey, em 1987 nos EUA (op. cit.: 866-7).

Page 41: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

41

de custos de transação, porém, determinam modelos de aparatos

institucionais (Cheung, 1987:55-7).

A teoria neoclássica tradicional não levava em conta os custos do

processo de troca, que envolvem os custos de transação. No modelo de

equilíbrio geral walrasiano a rede de trocas é indeterminada, mas a

existência de custos de transação força os agentes a economizar

transações e reduz o volume das mesmas (Niehans, 1987: 677). A perda

de bem-estar é determinada pelos recursos alocados às transações e ao

valor das trocas que não ocorrem.North cita os custos de seguros, custos

bancários, financeiros, advocatícios,contábeis etc. (custos de transação)

como sendo cerca de 45% da renda nacional nos EUA. Estes recursos

destinam-se somente à transação, e não à transformação dos bens (North,

1990:27). Para sua reduzir tais custos, autores comoCoase e Williamson

ressaltam o surgimento da firma (Niehans, 1987: 677). North, por outro

lado, ressalta opapel das regras formais e informais.

Do que foi discutido até agora, podemos destacar dois pontos

básicos para que fique clara a importância das instituições: o

comportamento subjetivo dos agentes e os custos de transação. Regras

bem definidas e que promovam a eficiência tomam-se então necessárias.

No modelo neoclássico, os agentes comportam-se de maneira racional e

não é custoso transacionar. É como se as instituições que promovem e

possibilitam esta situação já existissem. Comosão "dadas" no modelo, não

são importantes e não há razão em estudá-las do ponto de vista

econômico.No entanto,

Page 42: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

42

"Quando é custoso transacionar, instituições importam". (1990: 12)

o modelo neoclássico simplifica a realidade para fins de análise,

mas é possível flexibilizá-lo. A disparidade entre diversas nações e as

formas ineficientes de organização econômica serão melhor explicadas,

como já apontamos acima, e é importante a percepção de que

organizações eficientes são fundamentais para o crescimento. Reduzir ao

máximo os custos de transação toma-se um imperativo. Como destaca

North:

"(...) com custos positivos de transação, as alocações dos recursos

.são alteradas pelas estruturas de direitos de propriedade". (1990: 28)

A assimetria informacional gera custos de transação. Portanto, a

alocação de direitos altera a alocação ótima de recursos. É necessário

agora examinar como as instituições atuam nesse processo e como são

uma extensão do modo pelo qual os agentes processam informações, ou

seja, veremos porque elas "importam", e porque podem ser consideradas

um fator de produção.

Instituições podem ser entendidas comoas "regras do jogo".São as

regras, formais e informais, que limitam o campo de escolha e de atuação

dos agentes dentro de economias de mercado. A incerteza acerca do

comportamento dos agentes, a respeito das características do bem ou ao

cumprimento dos contratos traz a necessidade de regras básicas de ação,

estáveis no tempo, que formem um conjunto restrito de alternativas e

objetivos, e reduzam o campo de situações imprevistas. Com isto,

Page 43: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

43

quantidades menores de recursos serão gastas para evitar desrespeito aos

contratos, reduzindo-se os custos de transação.

''Instituições existem para reduzir as incertezas envolvidas na

interação humana". (North, 1990:25)

Comojá foi apontado, a incerteza e o risco decorrentes de aparatos

institucionais ineficientes desestimularam o crescimento econômico

através da história, tanto ocidental como oriental. O mercado sempre

precisou de regras que o protejessem e estimulassem, à medida em que as

trocas foram se tomando cada vez mais complexas e impessoais, com

menor interação e repetição entre os agentes.

Regras informais ou restrições informais acabam surgindo

espontaneamente. Restrições formais envolvem regras jurídicas e

escritas, ou seja, exigíveis através das leis. Regras informais são

convenções e regras de conduta que apóiam as regras formais, e que

respondem pela maior parte dos atos em sociedade e envolvem aspectos

culturais e éticos (e não são exigíveis por lei). Antecederam

historicamente as regras formais e o próprio estado. Este surge com a

evolução e complexidade das trocas, acentuando o papel das regras

formais e tomando efetivas as restrições informais 9.

As regras informais são o que diferenciamas sociedadesentre si, já

que envolvem aspectos culturais e éticos característicos de cada

9 Padrões éticos possibilitaram o comércio de longa distância quando não existiamestados nacionais modernos que protegessem formalmente os contratos. O ostracismoera a punição a comerciantes desonestos, que não cumprissem os contratos (North, op.cit.).

Page 44: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

44

sociedade. As religiões impuseram padrões éticos que nos ajudam a

compreender o desenvolvimento econômico, como no caso do

protestantismo na Inglaterra e EUA, e do confucionismoem sua versão

Japonesa. A cultura envolve obrigações socialmente transmitidas e

herdadas. Além disso, persistem no tempo e podem sobreviver a

limitações formais.

''A cultura japonesa sobreviveu à ocupação dos E. U.A. após a 11

Guerra Mundial". (North, 1990:36) 10

North lembra evidências antropológicas de que a cultura, ou as

restrições informais que ela contém, envolvesoluções cooperativas (sem a

presença do estado) entre os agentes, sendo do interesse destes preservar

a ordem. Segundo a teoria dos jogos, há a possibilidade de cooperação

quando o jogoé sempre repetido, quando há informaçõescompletas sobre

os outros jogadores e seu passado, e quando há um pequeno número de

jogadores envolvido.Tais hipóteses são irrealistas em um mundo de alta

tecnologia, divisão de trabalho e trocas impessoais, quando geralmente o

oposto é a regra ("Estes extremos antagônicos refletem na verdade os

contrastes da vida real '? A impessoalidade das trocas torna irreal a

hipótese anterior. Os jogos consideram não-coincidentes a busca de

máximo bem-estar e resultados cooperativos sociais. Em problemas

coletivos, porém, a repetição das situações e escolhas ocorrem. Neste

ponto, o autor cita Axelrod (1984), que aponta o surgimento de uma

solução cooperativa sem intervenção estatal.

1<lEsteé o mesmo ponto de vista de Morishima (1989) e outros autores, o que será discutido maisadiante.

Page 45: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

45

"(...) Robert Axelrod descobriu que a estratégia dominante sob estas

condições de um jogo repetido é a estratégia de 'tit-for-tat', em que um

jogador responde em função da ação do outro jogador". (North, 1990: 13)

A cooperação entre muitos indivíduos é problemática pela limitação

do conhecimento em relação ao próximo. North (1990: 15) cita Schofield,

para quem o problema fundamental na cooperação é estabelecer qual o

mínimo de conhecimento sobre crenças e desejos do próximo para prever

seu comportamento. Mesmo assim, como demonstra Axelrod, a cooperação

é possível. Em um jogo com competição e interação sucessivos a

possibilidade de cooperação é muito mais evidente. Os ganhos da

interação superam os beneficios (payoft) da defecção (1990: 56). A

abundância de informações reduzas incertezas e os custos de transação.

Na prática, a formalização das regras e uma terceira parte que garantam

os pactos acaba surgindo, pois as condições ideais apontadas dificilmente

ocorrem.

A cultura envolve um aparato baseado na linguagem, para

codificar e interpretar informações percebidas pelos agentes, e a

cooperação surge de um jogo interativo e do interesse em preservar a

ordem. Neste ponto, North ressalta "uma densa rede social (a dense social

network)" (North, 1990: 55) envolvendo limitações informais à atuação

dos agentes. Este conceito de network ou "rede" é central para este

trabalho, e será amplamente utilizado mais adiante no estudo do padrão

de intervenção do estado e da política industrial na sociedade japonesa.

Page 46: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

46

Regras informais, portanto, surgem de uma solução cooperativa

para evitar conflitos e ambigüidades, especificando de maneira informal

direitos e obrigações. Aumentam, portanto, os ganhos da cooperação,

reduzem os custos da defecçãoe por consequênciaos custos de transação.

A crescente complexidadedas trocas determina um continuum de

regras informais em direção a regras formais de comportamento. Elas

complementam e incrementam a efetividade das limitações informais e

reduzem custos de transação em trocas mais complexas.Podem modificar

e até substituir regras informais, o que está ligado a um processo político

e ao poder de barganha dos agentes envolvidos. Envolvem regras

políticas, como as que constituem o processo democrático. A

democratização a partir de governos absolutistas representou uma

aproximação entre governantes e governados, sendo a instituição do

Parlamento uma forma de facilitar as transações e ação entre os vários

grupos sociais. A democracia, segundo North, facilitou a eficiência do

mercado político, e possui portanto uma lógicaeconômica.

"0 organismo representativo facilita a troca entre as partes. " (1990:

49)

As regras formais envolvem regras políticas e econômicas. As

primeiras referem-se à estrutura hierárquica de poder e à estrutura de

decisões. As regras econômicas envolvem a questão dos direitos de

propriedade e as condições de realização das trocas. Regras sobre

contratos privados também agem nesse sentido. Um exemplo sobre regras

Page 47: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

47

de direitos de propriedade é a proteção gerada por normas sobre patentes,

que incentiva inovações.

A conformação do aparato institucional, no entanto, pode não

obedecer a objetivos de eficiência econômica. Não há certeza quanto ao

tipo de incentivos que serão estabelecidos pelas regras. O poder político

de barganha dos agentes irá determinar, como já citado, quais as regras

formais e informais estabelecidas, ineficientes ou não. É preciso levar em

conta que os agentes que tomam parte na barganha são motivados não

apenas por objetivos racionais, mas também por componentes éticos,

culturais e ideológicos. E as regras institucionais estabelecem os custos de

opção por determinado comportamento e opção ideológica. Nesse sentido:

"Uma vez criadas, as instituições determinam os custos de atuar de

várias maneiras em contextos políticos e econômicos". (North, 1990: vi)

As instituições ou regras informais de uma sociedade, como

padrões culturais, reforçam as regras formais, mas também agem como

resistência a mudanças, o que explica uma evolução incremental e não

descontínua do aparato institucional através do tempo. Instituições

ineficientes, que persistem por muito tempo dependem, para que haja

mudança, apenas dos agentes envolvidos no processo e da força de cada

um dos vetores, que determinam a direção de tal mudança. Segundo

North:

"(...) instituições foram - e são - sempre um conjunto heterogêneo de

normas que induzem aumentos de produtividade e de outras que reduzem

aprodutividade". (North, 1990: 9)

Page 48: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

48

Segundo Olson (1993), a solução cooperativa em sociedades

primitivas, com poucos habitantes, cede lugar a uma solução não

voluntária quando aumenta o número de pessoas envolvidas.Neste caso,

o grupo com maior poder de barganha deve assumir o poder, e a

autocracia acaba sendo mais benéfica a tal grupo do que a anarquia e a

dominação não sistemática. Quando nenhum grupo participante possui

poder decisivo, uma solução democrática que reparta o poder é mais

desejável.

A persistência histórica da ineficiência é de dificil explicação e a

existência de pressões de grupos de "jogadores",e do papel do governo

quando age em interesse próprio são causas possíveis.A possibilidade de

informações incompletas ou o seu processamento de modo inadequado

são fatores que também impedem a percepção da necessidade de

mudanças 11.

1.2.3. Mudança institucional e desempenho econômico no longo

prazo.

11Um exemplo histórico de sucesso econômico em termos de mudança institucional é ocaso da economia norte-americana. A Constituição Federal, a Northuiest Ordinance enormas de incentivo ao trabalho promoveram uma maior eficiência das organizações einvestimentos na agricultura e em educação, em uma alteração gradual do aparato(framework) institucional. O Terceiro Mundo já apresenta exemplos de mudanças oumanutenção de regras não-produtivistas. Oportunidades para atividades redistributivase não produtivas, criação de monopólios, restrição de oportunidades e investimentoirregular em educação são alguns exemplos apontados, e que configuramempreendimentos rent-seeking, conforme a caracterização de Baumol (1990).

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49

A possibilidade de configurações institucionais eficientes ou não trazem à

tona outras questões importantes: a mudança institucional e a trajetória

e desempenho econômicono longoprazo. A afirmação de que a estagnação

e atraso econômicos são explicados pelo aparato institucional traz a

necessidade de entender comotal aparato sofre mudanças, em um sentido

ou outro, ou por quê não as sofre.

o processo de mudança institucional é entendido por North em

uma perspectiva evolucionária. É um processo adaptativo, em que

mudanças nos preços relativos dos fatores, em função do crescimento

populacional ou de mudanças nas preferências dos agentes, por exemplo,

forçam transformações na estrutura institucional 12.

A necessidade de adaptação é uma necessidade de sobrevivência. O

conceito desenvolvido por North é o de eficiência adaptativa (adaptive

efficiency), relacionada coma moldagem da trajetória econômicano tempo

através de regras, de instituições (1990: 80). A sobrevivência é a base da

motivação dos agentes no momento da escolha, no processo decisório. A

base deste processo é, portanto, sócio-biológica:

"Em um modelo sócio-biológico estrito, a maximização do potencial

de sobrevivência motiva o agente". (North, 1990:25)

12A queda drástica da população na grande peste no século XIV, por exemplo, elevou ovalor da força do trabalho e de seu poder de barganha, forçando a queda do valor dasterras e do poder dos senhores feudais (North & Thomas, op. cit.). Mudanças no custodas informações e na tecnologia (inclusive militar) também geram necessidade deadaptar as instituições .

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50

A teoria evolucionária, na visão de um de seus expoentes (Winter,

1987: 614-617), preocupa-se com o processo de acumulação e retenção

seletiva de conhecimentos 13. A inovação produzida pelas empresas está

ligada ao acúmulo e retenção de conhecimentos pelas mesmas. O

conhecimento é quase sempre aprendido gradualmente e transmitido de

geração a geração, sendo que conhecimentos ineficientes também são

transmitidos e perpetuados no tempo.

Quanto ao comportamento do agente econômico,os evolucionistas

preocupam-se com motivações biológicas e culturais. As restrições

informais apresentadas por North (1990) envolvem normas e valores

transmitidos em cada sociedade, possuindo relação direta com o

desempenho econômicopor estabelecer incentivos aos agentes. O caráter

da adaptação de tais normas e regras a mudanças determina trajetórias

de longoprazo, de estagnação ou crescimento.

Duas críticas à ortodoxia neoclássica feitas por Winter revelam o

caráter evolucionista de North, que trata de ambas em sua obra, visando

explicar o mau funcionamento do mercado em alguns casos. São elas

(Winter, 1987:617):

a) os ortodoxos assumem "que a sociedade de algum modo

proporciona garantias perfeitas epouco custosas dos contratos";

13Schumpeter (1984) via o capitalismo como um processo evolucionário e enfatizou aenorme importância das inovações, mas não empregou os conceitos biológicos deherança, transmissão e seleção, conforme destaca Winter.

Page 51: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

51

b) desprezam as redes sociais (social networks) que determinam os

padrões de troca.

North cita evoluçõesrecentes na combinaçãoentre sócio-biologiae

economia. Comenta Jack Hirshleifer, para quem os modelos

evolucionários lidam também com populações, suas micro unidades e

inter-relações entre ambas.

"(...) a evolução da economia de uma nação é o resultado de

mudanças nas relações entre populações de indivíduos, unidades

comerciais, e similares." (North, 1990:20)

North mostra o argumento de que o sistema econômico evolui, e

mesmo seus elementos mais constantes sofrem variações. É feita uma

analogia com a evolução biológica, da sobrevivência de organismos e

reprodução de caracteres, com variações por mutações internas ou

pressões externas. Na economiaevolucionária, trata-se da sobrevivência e

crescimento diferencial de padrões de organização social (North, 1990:

21). Os elementos constantes, neste caso, são representados pela inércia

das tradições sociais, e as fontes de variação são a imitação e a

racionalidade.

Os agentes da mudança institucional são organizações, políticas e

econômicas,que agem visando certos objetivos, dentro de um conjunto de

oportunidades estabelecidas pelo aparato institucional. Esta é noção de

firma estabelecida por North (1990: 73). As alterações desejadas pelos

agentes acabam sendo incrementais, e não necessariamente eficientes. Os

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52

objetivos institucionalmente estabelecidos, em uma ou outra direção,

motivam o agente a adquirir habilidades e técnicas específicas,

transmitidas ou apreendidas na prática. O tipo de conhecimentos

adquiridos, portanto, relaciona-se aos incentivos institucionais. O aparato

institucional é selecionado, e com eles os objetivos e conhecimentos

adquiridos, em uma perspectiva evolucionária. Aos poucos, o

conhecimentopuro é convertidoem conhecimentoaplicado.

"Os incentivos que são construídos dentro de um aparato

institucional possuem o papel decisivo de dar forma ao tipo de

habilidades e conhecimentos que são rentáveis (skills and knowledge that

pay of!). "(North, 1990:78)

Jones (1993a, 1993b)sistematiza uma visão da história comouma

batalha entre forças produtivistas e forças rerü-seeking, O crescimento é

um fenômeno recorrente na história, e a industrialização seria apenas

uma de suas manifestações ou um sintoma, cujospré-requisitos materiais

e subjetivos foram construídos gradualmente no tempo. Avanços técnicos

ocorreram cumulativamente em sua maior parte, antes da Revolução

Industrial, e o crescimento extensivo, mesmo sem implicar em um

aumento de renda e produto per capita, pode estabelecer as condições

para um crescimentomais intensivo 14.

Na questão do estímulo à iniciativa individual, North & Thomas

(1973) citam o exemplode prêmios oferecidosem vários países, no século

XIV, para quem conseguisse um invento que possibilitasse o cálculo da

14 Aspectos históricos sobre o Japão serão discutidos no capítulo 2.

Page 53: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

53

longitude. Os beneficios sociais seriam enormes, mas os beneficios

privados não, pois não existiam direitos sobre a propriedade intelectual.

Caso existissem, a tecnologia da época não tomaria possível exigir

pagamentos de todos que utilizassem o aparelho. A invenção de uma

espécie de cronômetro que toma possível o cálculo ocorreu muito tempo

mais tarde. Os direitos de propriedade também eram insuficientemente

protegidos em relação à pirataria. Apenas quando o comércio

internacional e as navegações sofreram grande expansão tomou-se

viável gastar recursos para eliminar completamente tais práticas. No

início,pagava-se propinas.

Outro exemplo histórico a respeito da importância dos direitos de

propriedade refere-se à Espanha. O rei Felipe II recebia tributos das

guildas tradicionais de pastores de ovelhas, e permitia que estes

utilizassem qualquer espaço no interior do país para a condução e

pastagem dos animais. Isto desestimulava a atividade agrícola produtiva,

pois as plantações poderiam ser destruídas. Pagamentos de propinas aos

pastores levariam os agricultores ao problema da "carona" (free-rider),

pois muitos seriam beneficiados e não pagariam nada. Com isto, os

direitos de propriedade não eram plenos, e o rei preferia um ganho

imediato a ganhos bem maiores no futuro, que viriam de impostos sobre

os agricultores (North & Thomas, 1973:5).

A trajetória e desempenho'econômicoda Inglaterra em comparação

à Espanha mostra-nos como aparatos institucionais distintos

determinaram caminhos de eficiência no primeiro caso e ineficiência no

último. Dentro da Espanha, o reino comerciale próspero de Aragão cede o

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54

poder central a Castela, envolvida em guerras internas e contra os

mouros. Nobres e membros da Igreja Católica ganharam poder,

formando-se uma monarquia centralizada e burocrática. Com as revoltas

na Holanda e queda do fluxo de metais das Américas, ocorreram

falências, confiscos, tributação desmedida e direitos .de propriedade

menos efetivos. Comerciantes mouros e judeus foram expulsos e houve

controle de preços agrícolas. Em um século (XVII), a inércia de uma

trajetória ineficiente derrubou a Espanha da posição de maior potência

mundial. Houve o despovoamento do interior, estagnação das

manufaturas, colapsodo comérciode Sevilha como NovoMundo, guerras

permanentes e uma crise fiscal.

A criação do Parlamento inglês limitou o comportamento rent-

seeking da dinastia Stuart, e assegurou direitos de propriedade mais

efetivos e um sistema judiciário mais imparcial. O Banco da Inglaterra e

o sistema fiscal pregavam oequilíbrioorçamentário. O governotinha uma

base financeira sólida, havia um mercado de capitais, direitos de

propriedade assegurados, patentes, fim de restrições mercantilistas e

abertura a mercados internacionais.

A perspectiva institucional busca, portanto, evidências empíricas e

históricas, que explicam o fenômeno do atraso, e da persistência do

atraso. Para cada mudança tecnológicalevantada pela teoria neoclássica

comofonte de crescimento econômicohá instituições correspondentes, que

a originam. A possibilidade de formar companhias de capital acionário

gera economias de escala; prêmios e patentes encorajam inovações; letras

de câmbio, a abolição da escravidão e os "cercamentos" elevaram a

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55

eficiência dos fatores; e a criação de companhias de seguros reduz

imperfeições de mercado, geradas por assimetrias informacionais. O

importante é que as instituições soframsempre as adaptações necessárias

a novas configurações de direitos de propriedade (North & Thomas,

1973).

Há casos, no entanto, em que os direitos de propriedade podem não

ser devidamente protegidos ou definidos,por duas razões básicas (North

& Thomas, 1973:5):

a) insuficiência tecnológica:não é possível evitar o problema da

"carona" 15 e tomar obrigatórioocumprimento de obrigações;

b) custos de criar e garantir os direitos de propriedade são maiores

que os beneficiossociais.

Nesta perspectiva, é possívelentender sociedadesque permanecem

letárgicas, ou aquelas em que ocorreram surtos de crescimento e em

seguida viram tal trajetória ser interrompida. A pobreza no Terceiro

Mundo e a ineficiência econômica em vários países podem ser

manifestações de organizações institucionais ineficientes. Não é vital

analisar apenas por que os países crescem,mas também por que eles não

crescem.

Além de North (1990), North & Thomas (1973) e Jones

(1993a;1993b), Baumol (1990) oferece exemplos históricos de como as

150 problema do "carona" ou "free-rider" ocorre quando um agente recebe beneficios sem pagar poreles, o que é realizado pelos consumidores.

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56

regras do jogo podem motivar os agentes econômicosem três direções

básicas: empreendimentos produtivos, improdutivos e destrutivos. O

modelo schumpeteriano que prevê apenas empreendimentos produtivos

em inovações é expandido, de forma a englobar um espírito empresarial

não necessariamente voltado para o crescimento do produto social. O

empresário visa elevar sua riqueza pessoal e prestígio, mas pode fazê-lo

através de comportamento rent-seehing. Não basta haver um conjunto de

empresários em um dado país, mas é importante atentar para as regras

que determinarão a alocação dos mesmos em empreendimentos

produtivos ou improdutivos 16.

Além de altos custos de transação, o comportamento subjetivo dos

agentes que entram na barganha pode ser uma ameaça ao

desenvolvimento.Ideologiaspodemnão estar orientadas para a eficiência

adaptativa apontada por North, que implica em induzir inovações,

adquirir conhecimentose técnicas e suportar riscos e atividades criativas

(North, 1990: 81). Motivações culturais, ideológicas e éticas agem no

processo de escolha, e as instituições determinam o custo de cada opção.

Um exemplo dado pelo autor seria o de que a estabilidade no emprego

reduz o custo de opções ideológicas ineficientes (North, 1990: 42). O

capital institucional e ético acumulado' torna-se, portanto, uma fonte

subjetiva de crescimento (Silva, 1994), podendo evitar trajetórias rent-

seeking e ainda reduzir custos de transação.

16 Baumol (op. cit.) cita o caso da China medieval, por exemplo, em que altos burocratasgovernamentais desfrutavam de grande prestigio e em que toda propriedade pertenciaao monarca, sem garantia de direitos privados. Apesar do fluxo de inventos do períodoSung (960-1270 d.c.) não houve estimulo para a indústria e atividade individual.

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57

Regras formais, informais e o modo de tomá-las cumpridas

estimulam a eficiência, portanto, quando encorajam a mobilidade de

fatores, aquisição de habilidades, produção ininterrupta, transmissão

rápida e barata de informações, e a criação de tecnologias. Podem,

contudo, encorajar também barreiras à entrada, restrições monopolistas,

e impedir o fluxo barato de informações (North, 1990:65). A estabilidade

proporcionada pelas regras de atuação é condição necessária mas não

suficiente para o crescimento (op.cit.: 84).

É interessante apontar o conceito de equilíbrio institucional

estabelecido por North. Nesta situação simplesmente não há adaptação

alguma, pois a relação custo-beneficiodos agentes envolvidosno processo

não a estimula:

"Equilíbrio institucional seria uma situação em que, dado o poder

de barganha dos jogadores e o conjunto de relações contratuais que

formam as trocas econômicas totais, nenhum dos jogadores julgaria

vantajoso despender recursos na reestruturação dos acordos." (North,

1990:86)

Mudanças nos preços relativos, portanto, levam à reestruturação

dos termos do acordo estabelecido, quando os agentes percebem ganhos

políticos ou econômicos.Para isto pode ser necessário alterar as regras

que fundamentam a troca, sendo neste caso alteração das restrições

formais. Em caso de restrições informais ocorreuma erosão e substituição

contínua de padrões comportamentais e convenções ultrapassados ou

ineficientes. Neste processo, são despendidos recursos, quando são

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58

percebidas as oportunidades e ganhos de alteração, na formação de

organizações intermediárias, ou mediadoras, que realizem a mudança e

seus beneficios. São grupos de interesse (lóbis), comitês políticos,

associações comerciais, por exemplo (1990: 87). Os recursos canalizados

para tais grupos aumentam coma maior intervenção do governo,e podem

dar margem a empreendimentos reni-seehing. Neste caso, a trajetória de

crescimento pode ser comprometida.

o processo de mudança é incrementaI, ocorrendo de maneira

evolutiva. Alterações descontínuas ocorrem, mas não são a regra.

Guerras, revoluções, conquistas e desastres naturais geram

descontinuidades, além de revoluções, as quais geram alterações nas

restrições formais existentes (não necessariamente nas informais).

Quanto às revoluções:

"0 resultado através do tempo tende a ser uma reestruturação das

restrições em geral - em ambas as direções - de forma a produzir um novo

equilíbrio que está longe de ser revolucionário." (North, 1990:91)

Em seguida à caracterização de North a respeito da mudança

institucional, resta-me examinar outros dois pontos básicos em sua

análise: a trajetória da mudança e a relação entre instituições e

desempenho econômico.

Sobre o pnmeiro ponto, já apontei suas colocações acerca da

possibilidade de uma trajetória ineficiente. Na perspectiva evolucionária

as instituições ineficientes deveriam ceder lugar às eficientes, mas North

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59

aponta que isto pode não ocorrer. No caso, o país em questão veria seu

processo de crescimento interrompido, e tal situação talvez forçasse uma

mudança institucional positiva. Tal ajuste, entretanto, nunca é imediato,

dados os custos de transação.

North aponta Marx como pioneiro na análise institucional,

mostrando o vínculo entre relações de produção e forças produtivas, entre

o estado da tecnologia e os direitos de propriedade correspondentes.

Restrições da natureza determinavam a organização institucional

humana, ou sua "superestrutura". Sua crítica à visão marxista é a de que

os incentivos à atividade produtiva são dados no modelo, e este aponta de

maneira teleológica uma determinada trajetória, que toma-se

"necessária". North nega um happy end como algo "necessário" (North,

1990: 132).Domesmomodoargumenta Schumpeter:

'~ maioria das civilizações desapareceu antes de ter tido tempo de

encher por completo a medida de sua promessa." (Schumpeter,1984: 171)

Configuraçõesinstitucionais ineficientes podem durar no tempo da

mesma forma que tecnologias ineficientes duram no tempo. Quando duas

tecnologias diferentes competem, a menos eficiente pode vencer caso haja

uma descontinuidade e avanço em sua pesquisa, terminando por ser

monopolista. Esta adquiriu rendimentos crescentes e predominou. Altos

custos fixos que geram escala, efeitos de aprendizado, coordenação e

expectativas adaptativas, cumulativas de sucesso são fatores que auto-

reforçam a tecnologia ineficiente. Toma-se dificil abandoná-la (North,

1990:94).

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60

A competiçãoentre tecnologiasé na verdade uma competiçãoentre

organizações que as detém. Por isto é que retornos crescentes e mercados

imperfeitos são forças de mudança institucional. Os altos custos fixos das

tecnologias são análogos ao alto custo de implantação de aparatos

institucionais. As oportunidades estabelecidas pelas regras geram efeitos

de aprendizado nas organizações. Contratos geram o efeito de

coordenação. Surgem regras informais a partir das formais, que ampliam

seu alcance. Regras sobre trocas e contratos estáveis influenciam as

expectativas adaptativas, reduzindo incertezas. Deste modo, surge o que

North denomina trajetória de dependência (path dependence). Há uma

inércia no caminho da eficiênciaou da ineficiência 17.

A trajetória resultante, porém, não é algo irreversível, ou

inevitável. As escolhas dos agentes podem revertê-la. Há apenas uma

tendência, conforme aponta o autor. Configurações ineficientes também

apresentam rendimentos crescentes, inclusive pela elaboração de modelos

subjetivos que racionalizam tal concepção,comono caso da CEPAL e da

Teoria da Dependência na América Latina!". Neste ponto, é interessante

lembrar a concepção de Schumpeter (1984) a respeito do papel dos

intelectuais na destruição das instituições protetoras do sistema

capitalista, promovendoidéias e organizando o movimentooperário.

"Uma vez definido o rumo de uma trajetória de desenvolvimento, a

rede de externalidades, o processo de aprendizado das organizações, e a

17 Um exemplo histórico é a Northwest Ordinance, que no século XVIII estabeleceu atrajetória de crescimento dos EUA no século XIX (North, op. cit.: 98).18Como já comentei no item 1.1, a Teoria da Dependência (Cardodo & Faletto, 1970) prega a"autonomia" como sendo fundamental para eliminar a "dependência", o que envolve voltar-se para omercado interno e praticar o protecionismo. A ampliação do comércio com nações maisdesenvolvidas fatalmente levaria à exploração e, se houvesse crescimento, seria dependente.

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61

modelização subjetiva historicamente derivada dos problemas reforçam

este rumo. " (North, 1990:99)

Concluindo a análise do modelo institucional de Douglass North,

chegamos à questão do desempenho econômico. Seu objetivoé ressaltar a

necessidade de uma teoria dinâmica da mudança, incorporada à teoria

neoclássica, que possibilite analisar o desempenho econômicono longo

prazo. A importância e o lugar das instituições foram já bastante

analisadas aqui, restando apenas a necessidade de mais algumas

observações,e de apontar elementos que discutirei no próximo item, que

trata dopapel do governo.

É importante a discussão a respeito do regime democrático de

governo. A democracia aumenta a eficiência do mercado político,

facilitando a interação entre representantes e representados, através da

redução dos custos de transação. Mesmoassim, imperfeiçõesexistentes no

mercado político contribuem para o fato de que poucos países se

aproximaram do modelo neoclássico de crescimento, já que a política

molda as regras econômicas(North, 1990: 110).Política e economia estão

decisivamente interligadas, e regimes democráticosnão são garantia de

crescimento.SegundoNorth:

"Os países do Terceiro Mundo são pobres porque as restrições

institucionais definem um conjunto de benefícios a atividades

políticas/econômicas que não encorajam a atividade produtiva". (North,

1990)

Page 62: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

62

o desempenho de longo prazo está vinculado às mudanças

institucionais incrementais que ocorremao longo da história de um país.

Países desenvolvidospreservaram o aparato que estimula o crescimento

ao longo destas mudanças. A política evita a destruição deste aparato

assim comoparece ser o único instrumento de reversão de uma trajetória

ineficiente.

1.3. O papel do governo na análise institucional.

Até agora foi possível elencar os principais conceitos da NEI, que serão

utilizados no restante do trabalho. Foi visto que a principal função das

instituições ou regras do jogo consiste em reduzir custos de transação, e

incentivar as trocas produtivas. As regras informais são de adesão

voluntária, geralmente por força de costumes e tradição, mas não são de

exigência obrigatória. No caso das regras formais, características de

mercados complexos, há a necessidade de obrigatoriedade no

cumprimento, bem comode penalidades no caso de infrações. Os conflitos

que por ventura houverem necessitam de um juiz, que seja o mais

imparcial possível e garanta o cumprimento das regras dojogo:oEstado.

North (1990)destaca esta importante função pública, ressaltando a

dificuldade em se formatar um aparato governamental que forneça

garantia de cumprimento ("enforcement")das regras de modo imparcial.

A proteção às regras de direito de propriedade e incentivo ao sistema de

Page 63: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

63

mercado apresentam oscilações de acordo com o tempo e lugar, o que

demonstra esta difiiculdade.

o que podemos inferir da NEI acerca do papel do estado refere-se,

portanto, à definição e proteção de regras, no que destacamos três

aspectos:

a) O estado determina regras formais, VIa decretos do Poder

Executivo e leis através do Poder Legislativo (inclusive a Constituição);

b) O estado traz a garantia de cumprimento ("enforcement")

através do Poder Judiciário;

c) O sentido da atuação do estado nos casos "a" e "b", na forma de

seus integrantes (políticos e burocratas), é determinado por regras já

existentes, incluindo a Constituição, podendo estas ser tanto formais

(regras de direito administrativo) como informais (dados da cultura

específica do país em questão ou da cultura administrativa existente).

Mudanças institucionais podem eventualmente alterar este sentido ou

trajetória.

O governo, portanto, determina e é determinado por regras, de

maneira distinta de acordo com tempo e lugar. O que a análise da NEI

nos oferece é um modelo que possibilite destacar qual o lugar do aparato

estatal no mesmo, com resultados em termos de redução ou não de custos

de transação. Mostra um padrão "ideal" de intervenção, devendo os casos

distintos do mesmo ser objeto de análise institucional.

Page 64: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

64

Uma extensão das conclusões da NEI pode ser feita no estudo de

países de industrialização tardia ou recente, nos quais o estado

desempenhou funções que ultrapassam o tipo "ideal" até aqui descrito. O

caso do Japão pode ser aqui incluído, pois nele o estado teve atuação

marcante a partir do início do processo de industrialização, no século XIX.

De posse do instrumental dos capítulos anteriores, resta-nos analisar o

papel do estado para que tenhamos um aparato analítico que sirva de

referencial para o estudo da política industrial japonesa.

O que é apontado pela NEI é que nem todos os países conseguiram

sustentar seu crescimento no longo prazo. O caso dos países

subdesenvolvidos ou de industrialização tardia seria um exemplo deste

fato, e de como variou o padrão de intervenção estatal. Muitas vezes

países verificaram surtos de rápido crescimento, mas o mesmo não se

manteve. Meu intuito ao estudar o caso japonês não é mostrar que o

estado naquele país representou apenas e tão somente o tipo "ideal" da

NEI ou dos neoclássicos tradicionais, mas sim qualificar seu padrão de

intervenção de acordo com os conceitos da NEI, para que possamos

abstrair a trajetória dominante gerada pelo aparato institucional

existente.

Przeworsky (1990) elenca três trajetórias possíveis quanto ao

padrão de intevenção governamental. O governo pode intervir agindo

segundo (i) os interesses do povo; (ii) interesses próprios ou (iii) interesses

do capital. No primeiro caso, o governo é "agente perfeito do público", no

segundo é autônomo em relação à sociedade, servindo aos interesses de

Page 65: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

65

burocratas e políticos. No último caso serve de maneira instrumental e

necessária aos interesses docapital produtivo e dos capitalistas.

o primeiro caso depende de condições bastante restritivas, e

desenvolvimentos recentes em Ciência Política e em Economia Política

mostram problemas na identificação entre opinião pública e resultados

em eleições parlamentares. A ação de grupos de interesse pode levar à

aprovação da vontade de gruposminoritários.

No segundo caso, os interesses do capital não são atendidos, e a

organização burocrática age em interesse próprio. É instrumental apenas

a este grupo social, sendo autônoma em relação à burguesia, sendo esta

uma tese de origem marxista. O Estado sempre recebe influências de

grupos sociais, mas o grupo que consegue predominar são aqueles que

compõea máquina governamental. (przeworsky, 1990:50).

A NEI colocaa possibilidade da autonomia, na medida em que não

determina um único sentido para as intervenções e papel do governo. O

marxismo; como bem coloca Przeworsky (1990:51), enfatiza o governo

instrumental ao capital como sendo a regra, e não a exceção.A NEI já

prefere explicar várias circunstâncias de subdesenvolvimento justamente

pelo fato de a instrumentalidade não ocorrer (além de enfatizar grupos

sociais e não classes). Os direitos de propriedade não são necessariamente

protegidos do mesmo modo em épocas e lugares distintos. Como aponta

Jon EIster (cit. por Przeworsky, 1990:55):

Page 66: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

66

"Marx nunca teve êxito em provar que o Estado em uma sociedade

capitalista deve ser um Estado capitalista".

o terceiro caso,portanto, é tão raro quanto os dois anteriores.

A NEI aponta funções ao governo (e à democracia) que o tomam

instrumental ao capital e à eficiência dos mercados. O "juiz imparcial"

seria a principal delas, além da imposição de regras formais. Nesse

sentido, o aparecimento dos estados nacionais está relacionado à

crescente complexidade das trocas através da história, o que gerou um

processo de mudanças institucionais, A visão tradicional de estágios de

crescimento, em que a contínua especialização e divisão do trabalho

acompanham a expansão dos mercados, North acrescenta o elemento

institucional, definindo o papel das regras que apóiam e estimulam o

mercado (1990: 118-30).

O comérciode pequena escala que ocorria em pequenas vilas auto-

suficientes era totalmente baseado em restrições informais. As trocas

ocorriam a baixos custos de transação, pois havia grande interação entre

os agentes, que não eram muitos. A baixa divisão do trabalho implicava

em altos custos de transformação. A violência era a forma de coação, ou

seja, o poder de polícia era privado e não havia uma terceira parte como

árbitro imparcial. Estas são as características predominantes na

antigüidade.

Na Europa medieval ocorre o crescimento dos mercados, o que

eleva os custos de transação, pois o número de agentes envolvidos

Page 67: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

67

aumenta e as trocas são mais impessoais, havendo pouca interação.

Recursos já devem ser utilizados para mensuração de atributos das

mercadorias e para garantir o cumprimento dos contratos. Não há ainda

uma estrutura política e hierárquica formal. Restrições informais e redes

sociais ainda predominam, como valores éticos, advindos de preceitos

religiosos e códigos comerciais de conduta, com punições como o

ostracismo.

o autor ressalta a questão do agenciamento, em que os

comerciantes devem enviar parentes ou homens de confiança a mercados

longínquos. Há o risco de defecção e de roubos, a necessidade de medir o

desempenho, maior com o volume das mercadorias. A garantia do

cumprimento dos contratos em regiões distantes era extremamente dificil.

Instituições como pesos e medidas, unidades de conta, métodos contábeis,

e proteção de regiões por nobres possibilitaram as trocas.

o desenvolvimento do mercado de capitais e das manufaturas leva

a uma ordem política e jurídica coercitiva, no surgimento dos governos

nacionais. Fica patente o continuum de regras informais a regras formais.

Laços pessoais e o risco do ostracismo não são suficientes para limitar o

comportamento dos agentes. Há uma transição de códigos de conduta e

ações voluntárias para a garantia fornecida pelo governo. Olson (1993), já

citado, concorda com a passagem de ações voluntárias para não-

voluntárias, destacando que o governo não surge de um "contrato"

voluntário, criticando North a este respeito. North, porém, ressalta em

sua obra o surgimento do governo como uma etapa posterior à de regras

informais e voluntárias. Além disso, coloca a questão da barganha entre

Page 68: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

68

grupos políticos, e da trajetória e mudança institucional como

dependentes do poder de barganha. Ou seja, o governo pode assumir

configurações contrárias a vários grupos sociais, de acordo com a

configuração dopoder político.

Há a necessidade de uma terceira parte que garanta os contratos,

mas esta trajetória, comojá ressaltado, pode não culminar em eficiência

econômica.O governo absolutista era ambíguo, pois era também fonte de

incertezas, comotributação desmedida em face de crises fiscais. Comojá

apontado, a limitação do poder absoluto a partir da Inglaterra no século

XVII aumenta a eficiência domercadopolítico, e também do econômico.

Tanto Olson como North destacam a harmonia dos elementos

constitutintes do regime democrático com os elementos que estimulam o

crescimento. A eficiência políticaaumenta com organismos

representativos, reduzindo custos de transação, ao mesmo tempo em que

a incerteza acerca dos direitos de propriedade e liberdades individuais é

menor quando a sociedade não está sujeita a ações autocráticas do

governo. Tais regras incentivam a iniciativa produtivista (Olson, 1993;

The Economist, 1994).

Com a especialização crescente cada vez mais recursos e

trabalhadores são canalizados para as transações (North, 1990: 121),

como nas atividades de comércio, finanças, bancos, seguros, e de

coordenação. As mudanças organizacionais foram inovações, que

incrementaram a mobilidade dos fatores, reduziram custos de transação,

e dividiram riscos.

Page 69: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

69

A partir da análise do contexto de ongem do governo, a visão

institucional chega a uma definição:

'Podemos, como uma primeira aproximação, enxergar o gouerno

simplesmente como uma organização que provê proteção e justiça em troca

de receita. Isto é, nós pagamos ao goverrw para que ele estabeleça e

garanta os direitos de propriedade". (North & Thomas, 1973: 6)

Estabelecida esta definição, alguns pontos devem ser examinados.

O primeiro diz respeito ao gouerno como redutor de custos de transação. O

segundo diz respeito aos fatores que levam o governo a agir reduzindo

custos de transação, mas em uma trajetória favorável ao crescimento.

Algumas funções governamentais caracterizam-se pela

indivisibilidade no consumo, como no caso da defesa nacional e justiça.

North lembra que grupos voluntários não substituem o governo nestes

casos, pela possibilidade de comportamento free-rider. A garantia dos

direitos de propriedade, com a extensão e complexidade das trocas, é uma

função tipicamente governamental. Porém, a atuação do governo pode

estancar o crescimento, sendo dificil delimitá-la, mesmo quando sabemos

que é imprescindível. Por isto, o autor formula a seguinte pergunta:

"Se não podemos viver sem o estado, não podemos viver com ele, do

mesmo modo. Como fazer com que o estado aja como uma terceira parte

imparcial?" (North, 1990: 58).

Page 70: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

70

A dúvida sobre a intervenção correta por parte do governo diz

respeito ao segundo ponto acima levantado, ou seja, a quais fatores levam

o governo e a sociedade nele representada a seguir determinado rumo. O

governo "faz diferença", mas tal diferença depende, na visão institucional,

de dois fatores: das restrições informais e doprocesso político, e dos custos

de transação envolvidos neste. As instituições determinam o desempenho

no longo prazo, mas estes dois fatores determinam o rumo da eficiência

(North, 1990: 137-8). Duas conclusões são possíveis:

a) o crescimento têm ocorrido historicamente dentro de aparatos

institucionais coercitivos (não há anarquia em países desenvolvidos);

b) o poder coercitivo estatal têm sido empregado historicamente de

maneira não favorável ao crescimento.

As restrições informais são as regras e padrões de comportamento

que moldam a maior parte de nossas atividades diárias, como vimos

acima. O desenvolvimento das trocas gerou a necessidade de regras

formais que assegurassem sua vigência, e gerou a necessidade do próprio

governo. Valores transmitidos culturalmente são parte destas regras, e

podem trazer noções de incentivo ao trabalho, honestidade e integridade.

Estes elementos dispensavam uma terceira parte no início, mas hoje

convivem com ela. A ideologia também atua como regra informal e molda

nossos padrões de percepção da realidade. A resistência a uma mudança

nas regras do jogo, como em uma alteração de regras formais

(constituição) origina-se de valores culturais ou ideológicos, que podem

trazer modelos subjetivos errôneos de interpretação.

Page 71: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

71

o processopolíticopode trazer falhas na questão da representação,

dados os custos de transação em sociedades complexas nas quais é

utilizada a regra da maioria. Haveria uma distância entre eleitores e

eleitos, e surgem grupos de interesse para forçar alterações e preservar

regras. Tais grupos reduzem custos de transação, aproximando os agentes

de seus representantes políticos.Nesse sentido, a política é uma arena de

"transações multi laterais" (Niehans, 1987: 678). O governo irá agir de

acordo com decisões políticas, sendo vital aprimorar o processo de

decisões e de relação entre o governoe o setor privado. Aomesmo tempo,

comoressalta Tirole (1992: 113-4),o governopode agir em favor do setor

privado e dos consumidores em casos de informação imperfeita

"facilitando a aquisição de informação", aumentando o bem-estar e

eliminando custos de informação e transação. Isto também ocorre através

de regras que garantem direitos e deveres em caso de contratos

incompletos (emvendas simples).

Antes do governo, "redes" sociais complexas balizavam as relações

econômicas,estabelecendo regras. A questão que pretendo levantar neste

trabalho é que o próprio processo político, que envolve as decisões do

governo e as relações deste com o setor privado, também envolve estas

"redes", que nada mais são do que restrições informais, estabelecidas

também por grupos de interesse. Isto gera ainda maior flexibilidade das

regras, que irão adaptar-se a necessidades mutáveis. As "redes" e o

governo são capazes de gerar uma interação regularizada entre os

agentes. É interessante apontar aqui a posição de Cooter (1987: 459),

autor que critica a posição de Coase de uma tendência à cooperação no

Page 72: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

72

setor privado, e admite uma posição especial para o governo, que será

lembrada nos próximos itens:

"(...) o papel do governo de lubrificar acordos privados, mais do que

de formular comandos, é muito favorecido na compreensão econômica

atual da regulação. "

Alguma forma de regulação através de redes e interações multi

laterais pode ser vantajosa. É importante examinar os componentes

culturais e éticos destas redes em cada sociedade, e entender como elas

podem reduzir custos de transação e incentivar o crescimento.

"Se as economias realizam os ganhos do comércio por criarem

instituições relativamente eficientes, éporque sob certas circunstâncias os

objetivos privados daqueles que detém o poder de barganha para alterar

as instituições produzem soluções institucionais que mostram ser

eficientes ou que culminam em soluções eficientes." (North, 1990: 14)

North afirma que o aparato institucional age como um fator de

produção. O governo, dentro deste aparato, também deve ser um fator de

produção. Ele é capaz de "lubrificar" o mercado, e reduzir custos através

de interação contínua. O rumo da interação, contudo, permanece a cargo

do processo político, e das restrições informais existentes.

Retomando a problemática levantada por Przeworsky (1990),

concluímos que segundo a NEI o governo atende a duas ordens de

interesse: (i) interesses da riqueza produtiva pública ou privada e

Page 73: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

73

(ii) interesses da riqueza improdutiva pública ou privada. Os

interesses são sempre privados, sendo a palavra "público" utilizada para

bens e serviços coletivos, mas que ao final são do interesse privado que os

recebe. A riqueza produtiva pública envolve a supressão das falhas de

mercado, ou o fornecimento de bens e serviços nos quais o mercado não

opera ou opera de modo insatisfatório (educação básica e capital humano,

por exemplo). A riqueza produtiva privada é atendida pela proteção e

garantia de direitos de propriedade, tributação eficiente, infra-estrutura,

etc. A riqueza improdutiva pública envolve atender a interesses de

burocratas e legisladores sem que haja agregação de valor ao produto

social, e a riqueza improdutiva privada envolve a ação de lóbis, barreiras

alfandegárias, etc.

A classificação de Przeworsky seria então inserida nestes dois

campos. O "governo do povo" pode abrigar tanto a trajetória produtiva

quanto a improdutiva, não sendo então utilizado. O "governo do capital"

pode ser tanto produtivo quanto improdutivo, e o governo autônomo pode

enquadrar-se no caso da riqueza pública negativa. A riqueza pública

produtiva seria de interesse do capital produtivo. A autonomia é

considerada prejudicial, em nosso entendimento, devendo ocorrer apenas

em relação aos interesses da riqueza improdutiva. Ao atender à riqueza

produtiva, o governo estará sendo instrumental, portanto (a própria

aplicação imparcial ou autônoma da justiça é instrumental, nesse sentido,

segundo aNEl).

A trajetória resultante acaba estando vinculada aos modelos

mentais (e valores neles embutidos) seguidos pelos agentes e grupos

Page 74: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

74

SOCIaIS(North & Denzau, 1994). Tais valores e modelos são forçados à

mudança de acordo com mudanças tecnológicas e necessidade de redução

de custos de transação (comono surgimento do governo, acima apontado).

Tal mudança, contudo, não é necessária, segundo a NEI.

A forma organizacional do governo pode refletir o "estado das

artes" existente, efetivando do modo mais eficiente os objetivos

governamentais. A implementação eficiente de objetivos depende desta

forma, que apresenta baixos custos de transação ao mesmo tempo em que

os reduz no setor privado. 19

A preocupação de Przeworsky (1990) é relativa às barreiras ao fim

do capitalismo, como se ele já devesse ter acabado. Podemos argumentar

que ele assume várias formas e graus de acordo com as instituições,

modelos mentais e tecnologia existentes, hegemônicas no jogo político. O

capitalismo, como ressaltou Schumpeter (1984), não é de todo

indestrutível, e formas degenerativas do mesmo podem perdurar em

equilíbrio (como deduzimos de North, 1990).

19sresser Pereira (1989) aponta um padrão cíclico para a intervenção governamental, segundo asnecessidades do sistema econômico. Sua organização e produtos oferecidos implicam em maior oumenor intervenção, variando através da História. Atua emfalhas de mercado, na indústria nascente,bem-estar, políticas macroeconômicas e de P&D. A disfuncionalidade e reversão cíclica surgemquando tais limites são ultrapasssados e o governo age contra o mercado. A medida deste ponto deinflexão não é, contudo, fornecida pelo autor, bem como o paradigma teórico de análise. Sob o pontode vista neoclássico e neoinstitucional, podemos adotar a medida de custos de transação, a qualdetermina o ponto de disfuncionalidade. Outra diferença seria quanto ao determinismo. O cicloimplica em regularidade ou recorrência nos acontecimentos, o que não existe na NEI. Nesta, há ojogo entre fatores objetivos e subjetivos, mais aleatório do que necessário. Os diferentes momentostecnológicos, nesta perspectiva, levam a diferentes custos de transação e padrões de intervenção. Acada momento histórico, portanto, há um ótimo de intervenção, mesmo que falhas de governo(processo político) ou modelos mentais não impliquem na chegada ao mesmo. A disfuncionalidaderefere-se tanto ao conteúdo (o que ele oferece) quanto à forma. O mercado econômico e o mercadopolítico desenvolvem-se paralelamente, mas não de forma necessariamente harmônica.

Page 75: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

75

A hipótese do governo como um fator de produção será examinada

no capítulo seguinte, em que buscarei caracterizar o padrão de

intervenção governamental na sociedadejaponesa. Dentro de um aparato

institucional favorável ao crescimento formado historicamente, o Japão

chega no século XXa um modelo de governo que impulsiona e protege o

mercado, reduzindo custos de transação e eliminando incertezas. O

governo japonês acaba sendo instrumental à riqueza produtiva, em um

sentido "market-friendly". Utilizando os conceitos obtidos até o momento

a partir da análise institucional, procurarei demonstrar esta hipótese.

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76

2. Japão: instituições, setor privado e network state.

o capitalismo no Japão suscita dúvidas e constrangimentos àqueles que

acreditam na economia de livre mercado. Afinal, a presença do governo e

de seus ministérios é fortemente observada e sentida em vários âmbitos, e

a coordenação entre setor público e privado é também um traço

significativo daquele país. A relação público-privado existente gera

denominações como"Japan Incorporated" e "capitalismo organizado", que

buscam uma diferenciação em relação ao ocidente, e um meio-termo entre

uma economia de mercado e uma economia centralmente planificada.

Diferenças existem, mas minha hipótese é de que o mercado funciona

comonunca, graças a um aparato institucional que oprotege e estimula, e

que fez com que a atuação, do governo (e do MITI, na questão da política

industrial) fosse limitada às falhas de mercado.

As diferenças, comoexaminarei agora, residem nas instituições, ou

seja no próprio aparato institucional. Como foi apontado no capítulo

anterior, as instituições são as regras do jogo, formais e informais, que

moldam o campo de atuação e escolha dos agentes. A cultura japonesa

possui padrões característicos e regras informais que nos ajudam a

entender o desempenho econômico do país, e isto o diferencia,

obviamente, de qualquer nação ocidental. Este fator - as regras informais

- será levado em conta comoum diferencial, e envolvem a cultura, a ética,

e padrões informais de conduta. Regras formais envolvendo normas sobre

direitos de propriedade e estímulos a inovações, sobre o processo político e

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77

sobre a forma de interação público-privado também explicam grande

parte da diferença.

Todos estes fatores "lubrificam"o mercado, e reduzem custos de

transação. Grande parte das relaçõesformais e informais entre o governo

e o setor privado, que parecem indicar dirigismo e controle, são na

verdade regras que facilitam as transações e a cooperação, reduzindo

custos e assimetrias informacionais. O mercado político torna-se mais

eficiente, contribuindo para a eficiência do mercado econômico. A

capacidade institucional (WorldBank, 1993) para intervir é, portanto,

uma característica japonesa.

A seguir, apresento aspectos históricos sobre a evolução

institucional japonesa, estabelecendoa importância das regras formais e

informais no desenvolvimentodaquele país. Em seguida, mostro como

tais regras levaram a uma configuraçãoespecífica quanto ao padrão de

intervenção governamental.

2.1. Mudanças institucionais: aspectos históricos.

As relações entre instituições e desempenhomostram que o crescimento

sustentado é um processo gradual, que exige um aparato de regras

formais e informais favorável.O casojaponês é um exemplode que forças

institucionais não produtivistas foram superadas (Jones, 1993a). O

crescimento intensivo, que implica em aumentos na renda per capita,

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78

antecede a RevoluçãoMeiji (1868),já ocorrendono shogunato Tokugawa

(1600-1868), sendo que fatores institucionais e políticos contribuíram

para este processo. O processo como um todo antecede este último

período, quando já havia aumento na produtividade agrícola, crescimento

populacional e a formaçãode classes médias.

É rejeitada a visão de que nesta época havia apenas um estado

feudal estacionário (Jones, 1993a:36),já havendo vitalidade empresarial,

produtividade crescente, urbanização e modernização. A política da era

Tokugawa libera forças de mercado. O absolutismo diminui após 1650, os

samurais perdem prestígio etornam-se comerciantes. De 1600 a 1650 a

produção agrícola quase dobrou, e a população cresce apenas 45%.

Aumenta a fronteira agrícola e a difusão de inovações técnicas, surgindo

manufaturas de brinquedos, vernizes, guarda-sóis e calçados. Em 1850 o

padrão de vida era superior ao da Inglaterra. Como exemplo de regras

informais ou fontes subjetivas é possível destacar a ética de matiz

confucionista, que possui elementos calvinistas, como frugalidade,

educação, diligência e racionalidade (Morishima, 1987).

Mudanças nas regras do jogo ocorrem a partir de 1850, com

pressões para a abertura comercial (Jones, 1993b). Na abordagem

institucional, a mudança das regras depende do poder político das partes

envolvidas, e no caso do Japão houve controvérsias acerca da abertura

(Morishima, 1987). Ao final, os grupos favoráveis à abertura e

modernização foram vitoriosos, mas sempre com o objetivo de competir

em pé de igualdade como ocidente.

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79

Na Restauração Meiji de 1868 já haviam as condições

institucionais necessárias para o crescimento,estruturadas no shogunato

Tokugawa, envolvendo garantia de contratos, altos níveis tecnológicos,

altos Índices de alfabetização,e alta produtividade na agricultura.

o governo teve papel importante no incentivo à industrialização,

mas nunca houve planejamento central (Jones, 1993b).Após deter de 40

a 50%do total de investimentos no país, de 1868a 1910,o governoiniciou

um processo de privatização, estimulando o mercado através de maior

concorrência internacional. Apósa 11Guerra, vigorou a ética de trabalho

e baixo consumo,o que estimulou ocrescimentoda poupança nacional.

A industrialização da Era Meiji foi uma das formas de crescimento

experimentadas, na qual ° governo foi extremamente importante. O

Japão, portanto, já vinha construindo um aparato institucional de

incentivo ao crescimento a partir do século XVII, sem o qual não é

possível entender o crescimento atual, que será examinado neste

trabalho.

2.2. Instituições e o papel das "redes".

As regras formais e informais balizam a relação entre governo e setor

privado dentro de uma trajetória de eficiência.A ética da cooperação é

sempre presente, e caracteriza a relação público-privado. O

comportamento da burocracia ministerial é um exemplo interessante e

Page 80: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

80

comrepercussões em termos de elaboração de políticas, e será destacado a

seguir. No capítulo seguinte, examinaremos como a política industrial

confirma os elementos aqui apresesntados.

Segundo Richardson & Flanagan (1984) podemos distinguir dois

períodos em relação ao processo de elaboração de políticas

governamentais: um período de controle que dura até meados da década

de sessenta e um período de persuasão a partir daí. A persuasão

significava ministérios com maior independência, liberalização do

comércioexterior (em 1962),e decisõesmenos arbitrárias, com a criação

de comitês de coordenação e grupos de discussão (formais e informais).

Comoressaltam os autores, desenvolveram-se:

"(...) atitudes cooperativas desenvolvidas através de relações

duradouras e laços pessoais profundos entre grupos de interesse e oficiais

do governo".

Através desses canais consegue-se a articulação - formulação e

expressão através de canais de comunicação- e a agregação - combinação

de interesses em torno de propostas específicas - entre governo e

empresas. Esta mudança será analisada com mais detalhes, mas já

identificamos a questão da maior interação entre os agentes, tanto do

governocomodo setor privado, e a questão-chave da cooperação.

A forma cooperativa de relação é também inferida da análise de

Aolri (1988). Para este autor, é possível distinguir três visões básicas

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81

sobre o papel da burocracia governamental no Japão: burocracia racional,

adversária e pluralista.

A primeira versão afirma que a burocracia contribui para o

desempenho econômico como um agente independente dentro do processo

político-econômico. Sendo racional, pode ser líder (é a versão "Japan

Inc."), ou complementar ao mercado, criando expectativas consensuais e

fundamentos para investimentos das firmas que sejam consistentes no

nível de políticas macroeconômicas. A política industrial visa incentivar

a indústria nascente e a tomá-la competitiva internacionalmente. Um dos

mecanismos básicos é a criação de cooperativas, para investimentos em

pesquisa e desenvolvimento (P&D).

A visão da burocracia governamental como adversária é típica de

autores neoclássicos tradicionais, que pregam a não intervenção total, e

um "estado-mínimo". A burocracia possui a tendência de tomar-se

autoritária com o tempo, passando a ser uma adversária do setor privado.

A última versão, da burocracia pluralista, pode ser sintetizada na

seguinte afirmação:

"Não é claro quem de fato possui o poder real de tomada de decisões

nas organizações japonesas. "(Aoki, 1988: 268)

Há no Japão uma tríade entre a burocracia ministerial, o PLD

(partido Liberal-Democrata) e grandes corporações privadas. As versões

anteriores apenas enfatizam o poder da burocracia ou do PLD. A

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82

característica fundamental, porém, é o pluralismo, e o papel dual da

burocracia, inserido em um certo ambiente institucional. A burocracia

pode agir como:

a) regulador racional semi-autônomo("policymaker");

b) quase-agente representante de interesses específicos.

A burocracia não é monolítica racional ou auto-sustentada, mas

uma multitude de entidades: ministros, agências e departamentos. Cada

entidade possui uma esfera própria de ação, havendo também relações

intra-burocráticas. Além disso, as duas funções acima apontadas são

interligadas, pois cada burocrata leva seus representados do setor privado

à elaboração de políticas.

Três ministérios, de Finanças (MOF),Assuntos Internos (MHA)e o

Ministério da Indústria e Comércio Internacional (MITI) disputam os

melhores candidatos aprovados nos exames para o funcionalismo público.

O progresso na carreira é rápido e há a perspectiva de trabalhar no setor

privado ou em corporaçõespúblicas após a aposentadoria. O burocrata é

considerado então um "amakudari" ("descendente dos céus"). Além da

especialização, possuem uma rede de ligações e canais de comunicação

informais que formaram durante a carreira, o que os torna valiosos.

Agem como "interfaces", ou elos de ligação, entre os ministérios e as

corporaçõesprivadas (Aoki,1988).

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83

o PLD recruta os "amakudari" para a Dieta, preferindo os agentes

vindos do MOF e do MHA. As associações de indústrias recrutam os

vindos doMITI e doMOF (op.cit.). Os burocratas na ativa os respeitam e

estabelecem ligações (sem subordinação), visando também formar uma

reputação própria. Outro mecanismo importante no Japão são os zohu,

grupos informais de membros do PLD na Dieta, agrupados para assuntos

de cada ministério. Estes parlamentares possuem influência junto aos

ministérios e são importantes para a a provação de projetos de lei. Os

recursos de cada ministério dependem, segundo Aoki, dos fundos fiscais e

financeiros alocados; da ação dos "amakudari", que propagam suas

políticas ao setor privado; e da ação dos "zoku"na Dieta. Neste ponto, é

importante o efeito de sua atuação e performance junto ao público,

devendo o ministério então fazer um balanço entre interesses específicose

interesses públicos.

Os conflitos de interesse são arbitrados através de coordenação

intra-burocrâtica, e não por barganha direta e aberta entre os grupos. A

barganha social torna-se assim quase-social, o que caracteriza o

pluralismo administrado. Este começa a tomar forma a partir dos anos

sessenta, em que surgem novos grupos com novas demandas sociais,

conformejá apontaram Richardson & Flanagan (1982).

Um tipo de entidade burocrática tem funções claramente

delineadas, e são os "genkyoku" (departamentos originários), que

regulamentam e ao mesmo tempo representam interesses (o "Machinery

and Information Industry Bureau" do MITI relaciona-se com a

"AutomobileIndustrial Association",por exemplo). Há um segundo tipo

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84

de burocracia que orienta departamentos responsáveis pela coordenação

("coordination offices"),planejamento e orçamentação. Na orçamentação,

o "Budget Bureau" pertencente ao MOF é o órgão coordenador, e no

planejamento da "Economic Planning Agency" (EPA), há um

"CoordinationBureau".

Abarganha na orçamentaçãonão é multilateral, mas submetida ao

arbítrio de um órgão de coordenação,o "BudgetBureau" (Aoki, 1988: 275-

6) No planejamento econômico,o papel principal do "Planning Bureau" é

mediar interesses e o consenso para metas e estabilidade

macroeconômicas(op.cit.:276-7).

É possível ainda estabelecer uma relação isomôrfica entre a

burocracia governamental e a firma no Japão (op.cit.: 278-82). Opapel de

arbitramento, da gerência da resolução de conflitos intra-organizacionais

é similar. Na firma japonesa não há separação clara entre especialização

(unidades) e controle (gerência). A demarcação das funções é flexível

(rotatividade), trazendo autonomia e soluçõesrápidas a menores custos. A

burocracia também experimenta rotatividade entre os ministérios, sendo

preparada para absorver vários interesses e com maior conhecimento e

autonomia. A coordenação na firma também não é hierárquica e

centralizada, mas semi-horizontal. A sintonia fina das necessidades de

cada unidade é feita diariamente por manifestações das próprias

unidades via "kanban", havendo os pedidos aos subcontratantes "just in

time" (rápida adaptação a flutuações de demanda, redução de

desperdícios, mostra estrangulamentos, reduz gerentes etc.). Na

coordenaçãointer-ministerial também não há controles hierárquicos, mas

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85

um órgão coordenador. este facilita o arbitramento de interesses e a

coordenação horizontal. Hierarquias amplas geram distorção de

informações, e sua redução reduz custos de informação e de transação.

Na burocracia governamental, contudo, não há tanto interesse em

repartir conhecimentos, como é o caso na firma, sendo este um capital

político. A acumulação deste também depende da contribuição ao bem-

estar social,para o que contribui a cooperação.

A orientação do processo político pode ser promocional ou

administrativa. No primeiro caso, recebe-se e promove-se demandas

alterando relações de poder entre os grupos sociais. No segundo caso, a

absorção e o arbítrio ocorrem dentro das regras estabelecidas. O

"pluralismo administrado" é compatível com o primeiro caso conseguia

absorver demandas sem reduzir beneficiosde outros.

A flexibilidade institucional japonesa é exemplificada pela cnse

fiscal ocorrida a partir dos anos 70. Houve redução do pluralismo,

visando-se reduzir dotaçõesorçamentárias entre os ministérios. Em 1981

é formado um Conselho de Reforma Administrativa, visando-se um

governo pequeno e eficiente. Há menos pluralismo, mas permanece a

coordenação, para alocar recursos e resolver disputas entre ministérios

sobre áreas novas de atuação. Em 1985, cria-se a "Management and

Coordination Agency". Para o combate ao corporativismo cria-se o

"Admnistrative Inspection .Bureau", vinculado à "Agency of

Administrative Affairs". Fica clara a adaptação das regras a alterações

ambientais, o que já definimos no primeiro capítulo com o conceito de

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86

eficiência adaptativa de North. O :MITI muda também sua atuação,

tornando-a mais voltada à elaboração de políticas industriais genéricas,

do que a atender a interesses específicos, como veremos no próximo

capítulo.

Os mecarusmos institucionais descritos até agora indicam

diferenças importantes em relação ao planejamento econômico japonês. O

padrão de intervenção governamental, portanto, acaba sendo singular e

sugere uma nova denominação. O que procurarei demonstrar é que este

padrão não implica em rever os mecanismos de mercado, e sim torná-lo

mais eficiente. O pluralismo administrado acima descrito e a flexibilidade

institucional reduzem custos de transação através de uma maior

interação entre os agentes. Ao mesmo tempo, há organizações e regras

que levam a um compromisso com a eficiência. A eficiência adptativa

evidencia-se ainda pela mudança no padrão de intervenção

governamental ocorrido no pós-guerra.

O conceito de "network state", ou "estado em rede" (Burlamaqui,

1990) é bastante adequado ao governo no Japão. A formação deste padrão

distinto de intervenção está ligado à inflexão ocorrida na maneira de

elaborar e implementar políticas públicas (incluindo política industrial) a

partir da década de sessenta, que já apontamos acima. O pluralismo

administrado que caracteriza a burocracia é um dos elementos desta

forma de governo. O padrão anterior é o de "development state", ou estado

desenvolvimentista, que também teve sua versão latino-americana.

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87

o modelo de development state é relacionado à burocracia

weberiana presente nas grandes corporações(Evans, 1993).É um estado

essencial para a "empresa capitalista de grande escala", e para a

acumulação de capital. Os burocratas públicos operam de forma

competente e coerente aos objetivos corporativos, em uma organização

meritocrática. Em seu momentohistórico, comodestaca Evans (1993: 116)

operou-se "a construção de uma estrutura sólida e competente como um

pré-requisito necessário ao funcionamento do mercado". Nos países

subdesenvolvidos, o estado supriu deficiências de capital, de capacidade

empresarial e assumiu riscos, preparando o crescimento posterior. A

infra-estrutura econômica e industrial básica é criada com participação

do governo, através de créditos, empresas estatais e políticas de proteção

à indústria nascente.

As funções básicas dodevelopment state são (Evans, 1993: 117):

a) extrair excedente;

b) fornecer bens públicos;

c) fomentar expectativas empresariais de longo prazo, concedendo

incentivos e assumindo riscos;

d) implementar ajustes econômicose transformações industriais.

Mecanismos de interação como setor privado que sempre existiram

no Japão em função das instituições informais existentes irão tornar o

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88

estado "simultaneamente um network e um development state"

(Burlam aqui, 1990). A última forma cumpre uma missão básica na etapa

de industrialização e crescimento iniciais. O "network" é vital para etapas

posteriores de redefinição da ação estatal, frente a constantes mudanças

tecnológicas. A redefinição de algumas funções desenvolvimentistas, após

o período de ocupação norte-americana, torna possível diferenciar os dois

padrões, que deixam então de ser simultâneos.

Como destaca Okimoto (1988), o estado japonês teve que legitimar

sua interferência na busca do consenso, utilizando padrões culturais de

harmonia, lealdade (Morishima, 1988), e da primazia do coletivo sobre o

individual. Mas o segredo de sua eficiência reside no direcionamento

voluntário do setor privado a seus objetivos. Mesmo que canais de

comunicação já existissem no governo desenvolvimentista, esta seria uma

característica própria de outro padrão. Como destaca Okimoto (1988:

314):

"Talvez o Japão possa ser caracterizado como um estado 'network',

'relacional' ou 'societário" no sentido de que opoder do governo é unido ao

do setor privado (the government power is interwined with that of the

private sector). O poder do governo depende da sua capacidade de

trabalhar de maneira efetiva com o setor privado, com cada lado se

esforçando para levar em conta as necessidades e objetivos do outro. Desde

modo, o poder político no Japão é exercido através de um processo

complexo de interação entre os setores público e privado, envolvendo um

sutil dar e receber, sem uma confrontação aberta que resulta na imposição

forçada da vontade de um lado em detrimento da do outro. "

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89

A definição de Okimoto permite relacionar esta forma de

intervenção com o instrumental teórico definido ao longo do primeiro

capítulo. A interação seria um dos aspectos, que reduz custos de

transação e reduz incertezas. A cooperação,em uma forma produtiva e

que estimule a competição,também é caracterizada pela política do gioe-

and-tahe itit-for-tat de Axelrod,1984).

São funçõesbásicas do network state (Burlamaqui, 1990):

a) coordenar em última instância;

b) impulsionar o crescimentoeconômico;

c) estabilizar expectativas;

d) consolidarpactos.

o ambiente institucional envolve canais de comunicação ou

"redes", como o Japan Import-Export Bank, JETRO - Japan External

Trade Organization, grupos de estudos pl políticas públicas, comitês do

MITI, e outros, entre setor público e privado, onde procuram-se

mecanismos extra-mercado de pré-conciliação das decisões. Há sempre a

tentativa de adequação, via mecanismos políticos e institucionais, entre

objetivos das grandes empresas e objetivos e ações estatais. O Estado

pode ser capaz, como ressalta Jones (1993b: 110), de direcionar a

economia através do ciclo do produto, havendo "direcionamento pelo

governo sem rigidez".

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90

As redes ou canais de comunicação com o setor privado levam à

caracterização de Evans de autonomia inserida do governo (este autor

ainda não diferencia o estado desenvolvimentista do network). Os

conceitos que embasam sua afirmação são os seguintes (1993: 136):

a) coerência corporativa interna: os burocratas aderem aos

objetivos da organização e não a metas individuais. Caracterizam-se pela

meritocracia na escolha de seus funcionários. São burocráticos, e não pré-

burocráticos e patrimonialistas, e procuram impor as forças de mercado;

b) autonomia inserida: o estado é autônomo, mas estabelece redes

de comunicação como setor privado, para negociar metas e políticas.

O sucesso do development state traz em si seu desaparecimento,

pela maior independência do setor privado quanto à obtenção de recursos.

Segundo Evans, isto ocorre porque a característica básica de autonomia

inserida do estado desaparece, e o mesmoperde seu domínio sobre o setor

privado.

"(...) a autonomia inserida tem sido, numa extensão surpreendente,

seu próprio coveiro." (Evans, 1993: 137)

Aqui, no momento histórico em que tal situação se verifica, surge a

redefinição do padrão de intervenção - com a reconstrução do estado - em

um padrão de network state. Neste, continua a haver interação com o

setor privado, mas em uma relação de simbiose e não de direção estatal.

Ocorre uma adequação de objetivos entre setor público e privado, em que

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91

objetivos privados são facilmente absorvidos e implementados pelo

estado, mas em que este ainda impõe coordenação e discute objetivos de

política industrial, e conciliando suas decisões às do setor privado. O

pluralismo administrado é uma de suas características, e a simbiose não

implica em uma total submissão do governo ao setor privado, mas indica

que este representa seus interesses de uma maneira bastante efetiva, e

há uma busca de conciliação de interesses públicos e privados.

A questão polêmica levantada pelo conceito de simbiose diz

respeito à delimitação entre espaço público e privado. Tanto Burlamaqui

como Evans concluem que ela deixa praticamente de existir. Minha

hipótese é de que isto é uma tendência, muito significativa, mas ainda

não pode ser tomado como algo absoluto. A flexibilidade institucional

necessita de autonomia para rever trajetórias e evitar rumos ineficientes

gerados por pressões de burocratas, tanto públicos e privados, como ficou

evidenciado na questão da reforma fiscal e administrativa. Burlamaqui

afirma que as "redes" acima citadas evoluem e tornam o estado apenas

um "complemento funcional" ao sistema econômico (1990: 11). A contínua

inserção do estado ao sistema destrói sua autonomia. O governo é

funcional no sentido de que age como um fator de produção,

impulsionando o mercado, mas as instituições ainda guardam autonomia,

o que mostra-se necessário.

A simbiose com o setor privado é evidenciada pelo fato de que o

governo usa e direciona o ambiente competitivo, sem controles gerenciais

diretos. Ao mesmo tempo, é presente no sistema econômico, já que não

deixa questões-chave ao livre jogo do mercado, mas há controle da

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expansão da burocracia governamental (1990: 14-15). Como destaca

Pempel, quanto à questão da reforma administrativa (1982:8):

'~o contrário, a atenção foi concentrada primariamente na redução

do tamanho e do custo da burocracia nacional. Como resultado, o Japão

foi a única potência no mundo industrializado a controlar o crescimento

da burocracia nacional por mais de uma década".

As características de network surgem paralelamente ao

desenvolvimentismo,constituindo-senaquelas citadas acima. Para que se

consolidem pactos, decisões e expectativas, foram indispensáveis os

canais informais de comunicação entre setor público eprivado. Em âmbito

interno, laços entre funcionários do governo surgem por terem

frequentado as mesmas escolas, e pela identidade corporativa e eficiência

weberiana existente. As regras informais reforçam as formais. Como

salienta Evans:

"Todas as decisões sobre o Estado japonês enfatizam o caráter

indispensável de sistemas informais, tanto internos como externos, ao

funcionamento do Estado. "(1993: 123)

A quase totalidade dos primeiros-ministros japoneses já ocupou

cargos nos ministérios do Poder Executivo (Burlamaqui, 1990: 11).

Mecanismos extra-mercado, como os apontados acima, confirmam a

afirmação de Evans (1993: 124) de que "a política industrial japonesa

depende fundamentalmente dos laços que vinculam o MITI e os maiores

grupos industriais.

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93

A seguir examinaremos a evolução da política industrial no pós-

guerra, praticada pelo MITI. As hipóteses de atuação em "rede" e a

questão do pluralismo administrado poderão ser comprovadas, bem como

os conceitos da análise institucional. Ao final, poderemos estabelecer

conclusões acerca do papel das regras institucionais e sobre o caráter da

intervenção governamental.

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94

3.Aspectos da política industrial japonesa.

Neste capítulo irei abordar a evolução da política industrial japonesa,

destacando as regras que nortearam sua implementação a partir do final

da ocupação do país, após a 11 Guerra Mundial (lIGM). A visão de

Johnson (1992) nos diz que a alta qualidade da burocracia governamental

e seu comprometimento com o crescimento e industrialização explicam o

desenvolvimento japonês, mas esta é apenas parte da resposta. A

argumentação que apresentarei sugere que a atuação governamental não

foi fruto apenas das adversidades enfrentadas, pois outros países também

enfrentaram circunstâncias adversas e não se desenvolveram da mesma

forma. Aspectos institucionais favoreceram a atuação eficiente do estado-

desenvolvimentista, bem como o próprio comprometimento da burocracia

com o desenvolvimento.

A versão de que valores culturais são os responsáveis pelo sucesso

do Japão, promovendo o consenso, é descartada por Johnson (1992: 8),

que prefere destacar motivações situacionais como causas. Estas seriam:

desenvolvimento tardio, falta de recursos, necessidade de comerciar e

restrições ao balanço de pagamentos. Outros países subdesenvolvidos, no

entanto, enfrentaram as mesmas circunstâncias com desempenho

inferior. A visão de que aspectos institucionais, como regras formais e

informais de comportamento, não são relevantes, deixa de lado fatores

normativos que podem determinar a trajetória de crescimento de longo

prazo de um país (North, 1990). Sob as mesmas circunstâncias, países

com aparatos institucionais distintos seguirão trajetórias distintas.

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95

o que procuro destacar é que não basta destacar a coordenação dos

investimentos pelo governo e suas agências, ou mesmo admitir a

cooperação entre setor público e privado como sendo possível. É preciso

admitir as regras de atuação que estão por trás dos agentes e que limitam

e direcionam a ação dos mesmos, e reconhecer que o aparato por elas

formado não se encontra em todos os países com o mesmo sentido. Há pré-

requisitos para uma intervenção mais ativa e eficiente do governo, sem os

quais esta torna-se apenas possível, mas pouco provável.

3.1.A evolução da política industrial no pós-guerra.

A política industrial envolve dois aspectos: microeconômico e

macroeconômico (Johnson, 1992: 28). No primeiro caso encontram-se as

políticas de racionalização: das empresas (novas técnicas,equipamentos,

reduções de custos, gerenciamento); do meio-ambiente (transportes e

localização industrial); do conjunto industrial (aparato para a

cooperação); e da estrutura industrial (alcançar níveis superiores de

competitividade). No último aspecto estão as políticas que transformam a

proporção entre os setores primério, secundário e terciário, e entre

indústrias capital ou trabalho-intensivas. Em países subdesenvolvidos o

mercado por si não levaria a resultados eficientes.

o governo japonês interviu de forma ativa no sistema econômico,

através do MITI. A industrialização ocorreu sob seus auspícios e

coordenação, embora o caráter da intervenção tenha mudado com as

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96

circunstâncias. De um caráter desenvolvimentista o estado japonês passa

a ganhar um caráter mais regulatório, quando sua industrialização é

amadurecida.

o estado regulador edita as formas e regras sobre questões

econômicas. Estabelece os incentivos à atividade econômica e garante os

direitos de propriedade. Em países subdesenvolvidos a intervenção é mais

direta, como produtor ou através de políticas industriais, configurando o

estado desenvolvimentista. O estado não só estabelece regras básicas, mas

também promove metas específicas e setores industriais específicos. Há

uma estratégia para a formação e transformação da estrutura industrial.

No primeiro impera a racionalidade de mercado, e no segundo o

planejamento racional-? ganha força (Johnson 1992: 18-9).

O desenvolvimentismo foi a característica básica do estado japonês

a partir da Era Meiji (desde 1868), passando pelo militarismo dos anos 30

e 40 e pela era de crescimento rápido dos anos 50 e 60. Nos anos 70 o

caráter apenas regulador toma-se mais forte, sendo que já na década

anterior ocorrem pressões para uma mudança nesse sentido.

A colaboração com o setor privado têm início na Era Meiji

(Johnson, 1992), em que o estado favorece empresas privadas na

aquisição de tecnologia. Os requisitos eram comprometimento com as

metas nacionais fixadas pelo governo e comprometimento com o poder

militar "país rico e forte militarmente". Antes da I1GMjá surge, portanto,

uma regra básica para os agentes: competitividade internacional. Os

20 Johnson diferencia planejamento racional de planejamento ideológico (países socialistas).

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97

impérios industriais privados durante a era militarista eram os

"zaibatsu", protegidos pelo governo. De 1900 a 1930 há uma fase de

liberalização, interrompida pelo poder crescente dos militares a partir de

1926. Neste ano inaugura-se uma fase de controle burocrático, que

perdura até 1945.

Após a IIGM, com a ocupação norte-americana, ocorrem mudanças

institucionais. A cooperação continua a existir entre empresas e governo,

mas há a desfamiliarização e modernização dos "zaibatsu". A iniciativa de

planejamento é da burocracia, que concedia acesso a recursos, beneficios

tributários, aprovação de importação de tecnologia e de "join ventures",

em troca do cumprimento das metas por ela indicadas (não havia

obrigatoriedade formal). Também era utilizada a autorização para a

formação de conglomerados bancários, o que caracteriza os "keiretsu".

o esforço maior deste período foi a reconstrução dos setores de aço,

ferro e carvão (Kagami, 1995: 125). Importações de petóleo dirigiam-se

para a indústria de carvão,que então fornecia para a de aço e ferro. Havia

racionamento de mercadorias e crédito, e controle de preços. Em 1948 o

conselheiro norte-americano J. M. Dodge propõe extingüir controles

governamentais e subsídios, bem como buscar um orçamento equilibrado.

Em 1949 foram adotadas políticas de:f1acionistas e recessivas,

ainda sob a ocupação aliada (Johnson, 1992). Foram feitos cortes ao

Banco de Reconstrução Financeira (BRF), fonte de capital para indústrias

prioritárias. Com a Guerra da Coréia (1950-1954) os EUA compram

munição, caminhões, uniformes, equipamentos de comunicação e outros

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98

produtos do Japão. Foi o "boom" de 1952-3. Há então escassez de capital

para os investimentos necessários, e monta-se uma estrutura financeira

especial, o "overloaning".

A política de "sobreempréstimos" ou "overloaning" era dupla: a

garantia governamental dos empréstimos feitos pelas empresas aos

bancos privados ("city banks"); e os bancos estatais (como o "Japan

Development Bank") de último recurso. Empresas emprestam dos bancos

além de sua capacidade de pagamento, e estes "sobreemprestam" do

Banco do Japão. Este possuía poder indicativo, sendo os empréstimos

supervisionados pelo MITI. O crédito seletivo toma-se então um

instrumento importante para os projetos de crescimento. Além disso, a

estrutura montada leva aos "keiretsu", conglomerado que envolve

normalmente um grande banco, várias empresas industriais, e uma firma

comercial que importa matérias-primas e bens não existentes no país

(Johnson, 1992). Diferem dos "zaibatsu" por não terem estrutura familiar

e por competirem mais entre si.

Johnson ainda destaca que a estrutura do conglomerado bancário

toma os gerentes menos sujeitos à vontade dos acionistas, podendo então

buscar objetivos de longo prazo ao invés da lucratividade de curto prazo.

No longo prazo importaria a conquista de mercados externos, qualidade e

desenvolvimento do produto. Cada empresa buscava o acesso a um banco,

e redes de contato facilitavam o crédito (op. cit.: 205). Os bancos também

dependiam das empresas. Com o aval do governo e conseqüente redução

de riscos há mais espaço para que os bancos concorram pela sua parcela

de depósitos e empréstimos (Johnson, 1992).

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Após a Guerra da Coréia o Japão resolveu limitar a política de

"sobreempréstimos" e substituir o Banco de Reconstrução. O Comando

Aliado vetou que este continuasse a ter recursos não-orçamentários.Em

1950 foi criado o que viria a ser o Export-Import Bank of Japan, que

facilitou importações designadas pelo MITI. O "Japan Development

Bank" (JDB) foi criado em 1951, tendo atuação limitada pelos aliados

para evitar alta de preços.Deveria financiar equipamentos de longoprazo

em operações de alto risco, e operava em sintonia com o "Enterprises

Bureau" do MITI. Com o fim da ocupação em 1952 o JDB ganha maior

autonomia. Recursos são ainda canalizados pelo sistema de poupanças

postais em 1953 para um orçamento de investimentos, o "Fiscal

Investment and Loan Plan". Este foi controlado apenas pela burocracia

até 1973.

A partir de 1951 o governo priorizá os setores de aço, carvão,

construção naval, fibras sintéticas e fertilizantes químicos, que

apresesntavam altos custos de produção (Kagami, 1995: 126).O JDB e o

"Export-Import Bank of Japan" (EXIMBank) canalizavam recursos para

os mesmos. O JDB financiava projetos de infra-estrutura e plantas de

geração de eletricidade e transporte marítimo. O EXIMBank priorizava a

construção naval.

Um aspecto importante, ainda do período da ocupação, foram os

cortes na burocracia estatal, sendo que 10.000 funcionários foram

demitidos entre 1949e 1951,e o MITI passa a ter 3.257 funcionários em

1952contra 13.822em 1949(Kagami, 1995).O MITI torna-se "mais coeso

e enxuto", e a senioridade passa a ser critério para a estabilidade.

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100

o "Enterprises Bureau" edita um plano para a racionalização

industrial em 1949, bem como o "Industrial Rationalization Council".

Este órgão é característica bastante relevante da economia japonesa e

mostra os antecedentes do "estado em rede" ("network") posterior. Possuía

45 comitês e 81 subcomitês, reunindo executivos, burocratas do MITI e

acadêmicos, ligando governo e empresas (Johnson, 1992: 216). Propôs

reformas gerenciais, elevação de produtividade e controle de qualidade

(conceitos absorvidos dos EUA).

o "Management Committee" divulgou junto à imprensa e

empresários idéias sobre gerência e administração científica, através de

publicações e conferências. O autor destaca nos anos 50 o "boom" da

administração científica. As idéias, portanto, auxiliaram a unir objetivos

e atitudes dos agentes econômicos.

A Lei sobre o Capital Estrangeiro ou Foreign Capital Law (FCL) é

de 1950 e trouxe ao MITI o poder sobre as importações. Produtos

acabados que competiam com os nacionais eram preteridos em favor de

bens de tecnologia moderna e maquinaria. A estratégia era fornecê-los a

preço baixo e buscar licenças de patentes, "know-how", e "join ventures".

O licenciador estrangeiro submetia-se ao "Foreign Investment

Committee", para licenciar tecnologia, adquirir ações, e emprestar ou

dividir patentes (Johnson, 1992). A FCL foi editada pelo Comando Aliado,

e o Japão lutou para que suas estratégias fossem possíveis (Johnson,

1992: 217).

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101

o MITI ainda edita a "Enterprises Rationalization Promotion Law"

em 1952, concedendo subsídios para a instalação de máquinas e

equipamentos, testes e amortização de investimentos em P&D.

Compromete os governos locais e o governo central a investir em infra-

estrutura, reduzindo custos de produção (Johnson, 1992: 218). Neste ano

termina a ocupação aliada.

As disposições da Lei Anti-monopólio (AML) contrárias às

restrições de produção ou vendas, colusões para fixação de preços e

constituição de "holdings" não foram respeitadas. Criou-se a "Fair Trade

Commission" (FTC).

Na década de 50, a indústria japonesa não era competitiva

internacionalmente, e o MITI julgava a competição uma "barreira" ao

desenvolvimento. Tentou minimizar a "Antimonopoly Law" (AML), e o

confronto com a FTC era freqüente (Hiroshi, 1986). Na segunda metade

da década, foram priorizadas indústrias de "fibras sintéticas, plásticos,

petroquímica, eletrônica e maquinaria". Importações com alta tecnologia

eram encorajadas (Kagami, 1995: 127).

Em 1952 o MITI obtém um instrumento de controle, o orçamento

de comércio exterior. Pode prejudicar a importação de empresas que não

cumpra seus "conselhos" informais. Argumenta que conselhos informais

não estão incluídos na AML (Johnson, 1992: 225), e acaba reformando a

lei em 1953, possibilitando a cooperação, limitação da produção de

indústrias deprimidas, reduzir custos, compartilhar tecnologias e

promover exportações. Em 1958 tenta extingüir a AML, mas o ano

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102

seguinte marca0 fim da era de maior poder do MITI (1952-1961),

marcada pela Guerra da Coréia e pela recessão de 1954. Em 1955 é criado

o Partido Liberal Democrata (PLD).

É importante ressaltar ainda uma estrutura voltada para as

exportações, envolvendo o "Suprema Export Council" (1.0 ministro, MITI,

Min. Finanças, Banco do Japão e líderes empresariais) e a "Japan

External Trade Organization" (JETRO). Este órgão era um "serviço de

inteligência" e visava principalmente difundir informações (op.cit.: 230)

acerca das necessidades dos mercados externos. Importantes custos de

transação foram reduzidos, facilitando as trocas para o Japão, que à

época não conseguia informar-se sobre tarifas e especificações. A JETRO

passou a operar em 55 países. Inicialmente financiado por empresários,

foi absorvido pelo MITI em 1954, passando a ser um instrumento de

política.

Os EUA e países ocidentais exigem a abertura do mercado japonês

em 1959 na conferência do GATT, em Tokyo. As pressões externas e

também internas iniciam um processo de liberalização em 1960.

Na década de 50, portanto, Johnson destaca três fatores para

explicar o crescimento: um "consenso popular" sobre metas nacionais;

uma "herança organizacional" que remonta às relações cooperativas entre

governo e empresas na segunda metade dos anos 20; e uma "manipulação

institucional" desde a dominação aliada e a Guerra da Coréia, como a que

estabelece os "keiretsu". O consenso é fruto das circunstâncias, da

destruição pela I1GM. A cooperação como herança surge da falência do

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103

dirigismo e da auto-organização, da similaridade da formação educacional

e da migração de burocratas para o setor privado e para a política

("amakudari"). O autor destaca que tais fenômenos são singulares mas

não são apenas "bens culturais" (Johnson, 1992: 239-40).

A visão institucionalista, que baseia este trabalho, mostra que as

regras de comportamento formais ou informais são importantes. As

últimas envolvem valores culturais e éticos característicos de cada

sociedade, que podem reduzir custos de transação e facilitar as trocas e a

cooperação entre os indivíduos. O que é peculiar no Japão é justamente a

redução de tais custos em função de valores cooperativos já existentes, o

que Chandler (citado por Johnson, 1992: 238) denomina "estruturas

sociais" explícitas ou implícitas. Estas estruturas não surgiram

momentaneamente, mas já constituíam o "capital ético" (Silva, 1994) da

sociedade japonesa, formado através do tempo.

A partir de 1955, com a criação do PLD, os políticos passam a

incrementar seu poder em relação aos burocratas. Estes foram

preponderantes primeiro na versão militar de 1932 e depois como

burocratas econômicos. O processo político passou a ser mais importante,

e disputas internas da burocracia geravam buscas por apoio político.

Em 1959 importações de têxteis (lã e algodão) foram liberalizadas e

formou-se o "Cabinet Council on the Advancement of Trade

Liberalization" em 1960. Este prepararia a liberalização para outras

indústrias. Um plano é adotado e em 1963 cerca de 80% da economia

passaria pelo processo (Johnson, 1992: 251). De 1960 a 1965 as

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104

exportações mais do que dobraram, mostrando competitividade. Um

plano de crescimento é formulado no gabinete, e o :MITI investiga a

competitividade dos setores industriais em relação aos EUA e países

europeus através do "Industrial Structure Investigation Council", em

1961. A conclusão do conselho era que, apesar do bom nível de

competitividade, a estrutura da indústria deveria ser modificada.

As pequenas e médias empresas são primovidas através de lei

especial, em 1963, dando incentivos fiscais para modernização de

equipamento e absorver tecnologia (Kagami, 1995: 128). Em 1967 é

criada a "Agency for Promotion of Small and Medium-Sized Industries"

para monitorar o processo.

o :MITI propõe reduzir competidores, aumentar o tamanho das

restantes e controlar o aumento da capacidade instalada, ou seja, pregava

fusões e cartéis de coordenação de investimentos. O conselho sobre

estrutura industrial é integrado ao conselho de racionalização (de 1949).

Em 1963 o diretor do "Enterprises Bureau" defende a "administração por

incentivos", em que a direção é determinada pelo governo, e a

implementação das políticas é feita voluntariamente pelo setor privado.

Na definição de Johnson (1992: 256):

"Enquanto problema político, administração por incentivos vem a

significar comitês de burocratas, industriais e financistas em cooperação,

que concordariam a respeito de taxas de investimentos, promoveriam

colusões, desencorajariam novas firmas a entrar nesses setores, e em geral

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105

tentariam construir uma estrutura industrial comparável à dos EUA e

Alemanha Ocidental, as duas fontes externas de referência. "

A política industrial foi reformulada, portanto, em função da

inevitabilidade da liberalização. A competitividade foi o objetivo principal

estabelecido. O MITI convoca seus oficiais com experiência no Mercado

Comum Europeu, em política internacional e em política industrial

(Johnson, 1992: 257). Em 1963 o MITI consegue apoio para o que viria a

ser a "Special Measures Law for the Promotion of Designated Industries",

com duração já limitada em cinco anos. Visava elevar a competitividade

de alguns setores: aço, automóveis e petroquímica, e o principal

instrumento para isso seriam comitês reunindo burocratas públicos e

privados e do setor bancário. Promove isenções tributárias e legaliza a

"cooperação" frente à AML.

A lei foi submetida à Dieta, mas não foi votada, pois o PLD e o

gabinete não se empenharam para isso. Houve resistência da comunidade

bancária e de empresários, opostos ao MITI. O nacionalismo deste impôs

condições na concessão de um empréstimo de uma empresa a uma

empresa japonesa da cidade de Osaka, do "keiretsu" do Sanwa Bank.

Exigiu a substituição da presidência da empresa e o controle do

empréstimo. A comunidade empresarial da região tornou-se adversária do

MITI.

Em 1964 o Japão enfrenta uma recessão, gerada por fatores como a

incerteza pós-liberalização, entrada de importações e capacidade ociosa

em função de excesso de investimentos dos "keiretsu". O MITI consegue

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106

implementar políticas cooperativas através da orientação administrada

("guidance"),um mecanismo informal. O autor não concorda que é fruto

de uma cultura específica,mas podemosdizer que esta facilita o processo.

Com a perda do poder explícito dos anos 50 os mecanismos informais

seriam os únicos instrumentos restantes (a "SpecialMeasures Law" não

foi aprovada). O relacionamento entre governo e setor privado é forte

desde os anos 30, a burocracia é respeitada e tida comorepresentante do

interesse nacional. Houve coordenação de investimentos e de produção

(petroquímca, têxteis sintéticos) bem como a promoção de fusões

(encorajadas por créditos doJDB).

A neutralidade é pré-requisito para o bom funcionamento do

sistema, para que não haja suspeitas de "captura" pelos agentes

regulados (os protestos maiores contra esta política viriam nos anos 70).

Nos anos 60 houve a suspeita de que o MITI teria prejudicado a

Sumitomo, empresa privada do setor de aço, e favorecido as estatais do

setor (eram 2 estatais e 4 privadas). A Sumitomo havia cumprido as

metas de exportação e não queria reduzir sua produção para sustentar os

preços. Acaba cedendo, e o MITI promove a fusão das duas estatais na

Japan Steel, em 1970.

Na década de 60, portanto, teve início a abertura gradual da

economiajaponesa, antes fechada e comcontatos como exterior mediados

pelo governo (Johnson, 1992: 238). Em 1980 a FCL foi abolida e

completou-sea abertura. Regras formais, comoo controle do orçamento de

comércio exterior, foram substituídas por regras informais de política

industrial.

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107

Como demonstram Levy & Spiller (1994), a existência de regras

informais aceitas pelos agentes torna desnecessário editar leis formais

detalhistas, quando analisam a regulação do setor de telecomunicações

em alguns países. Este é o caso do Japão:

"(...) o sistema econômico japonês repousa em uma base legal - mas

normalmente em leis curtas e genéricas, sendo a 'Special Measures Laui'

um bom exemplo. "(Johnson, 1992: 273)

Quando a "guidance" assume o papel principal entre os

instrumentos à disposição do MITI, o estado desenvolvimentista sofre

uma evolução. Segundo Johnson, seria uma continuação do mesmo, mas a

caracterização de "network" é mais apropriada. As relações e a interação

entre os agentes torna-se a essência da política do MITI. Com a

internacionalização contínua haveria ainda mais reivindicação de

autonomia pelo setor privado.

Como destaca o Banco Mundial (World Bank, 1993: 182), oMITI

realiza audições junto às partes interessadas e forma um grupo de

pesquisa. Este prepara um relatório que é enviado ao conselho

correspondente. Neste são feitas as negociações pelos representantes

autorizados dos agentes envolvidos. Após a opinião do conselho os

resultados são tornados públicos e submetidos à Dieta, e só terão sucesso

se hover consenso prévio no conselho. Este aspecto é o que Burlamaqui

(1990) denomina "pré-conciliação das decisões".

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108

A partir de 1965 o MITI passa por uma cnse de identidade.

Enfrenta problemas como poluição industrial, revoltas contra a

"guidance", acusações de corrupção, inflação, políticas de localização

industrial (geravam ora despovoamento, ora superpopulação), e danos

nas relações com os EUA. Em meados dos anos 70, oMITI

"(..) redefiniú com sucesso sua missão, mudou seu pessoal, deu a si

uma nova estrutura, e livrou-se de parte de sua herança que não era mais

relevante - e tudo isso enquanto reafirmava os elementos que o Japão

ainda necessitava. " (Johnson, 1992: 275)

A liberalização no Japão, é necessário dizer, foi gradual e seletiva,

primeiro em indústrias em que a competição era mais favorável. Metade

da participação teria que ser japonesa, em caso de "join-ventures".

Algumas indústrias liberadas tinham setores ligados a componentes

vitais não liberados para a competição. O MITI fiscalizava a introdução

de tecnologia estrangeira no Japão, e sempre procurava difundi-la.

Embora fosse completada apenas no final da década de 70, no caso

japonês os próprios empresários reconhecem que era uma medida

necessária, para evitar um possível isolamento.

Entre 1968 e 1969 os nacionalistas da "velha guarda" perdem

posições para burocratas mais jovens, que serviram no exterior e

conheciam a cultura do comércio internacional e as novas indústrias de

alta tecnologia (substitutas das indústrias do aço, química e têxtil).

Seriam "nacionalistas cosmopolitas" (Johnson, 1992: 281), mais

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109

adequados a uma econorma industrializada e a um ambiente de

globalização.

Como já apontado, a liberalização foi gradual e precedida por

fusões, como no caso do aço. Os protestos contra a fusão das duas grandes

estatais fez com que a FTC (Fair Trade Commission) refizesse as regras

para a mesma, o que levaria a uma configuração mais eficiente. As

estatais foram obrigadas a desligar-se de algumas subsidiárias que lhe

trariam controle sobre os preços do setor (Johnson, 1992: 282). A

. liderança de preço foi evitada. Pela primeira vez a decisão foi tomada

obrigatória pelo poder Judiciário, que ouviu a FTC, acadêmicos, empresas

do sertor e consumidores e indústrias relacionados, bem como oMITI.

Este enviou depois burocratas para a Japan Steel, o que gerou sérios

protestos. Em 1969 a Mitsubishi faz um acordo com a Chrysler (EUA),

sem consultar o MITI. O governo acelerou a liberalização do setor para

1971, e a empresa americana vendeu carros japoneses nos EUA. A

liberalização partiu do setor privado, portanto, que acabou favorecido com

a injeção de capital.

Por volta de 1971 burocratas do MITI mostram-se favoráveis a um

modelo de orientação por parte do setor industrial privado. A diferença

seria o abandono de políticas de caráter microeconômico (definidas acima)

em favor de medidas macroeconômicas. Em 1971 o "Industrial Structure

Council" propõe o incentivo a indústrias "conhecimento-intensivas" como

a de computadores, "software", consultoria industrial, maquinaria

controlada por circuito integrado, e outras. Edita ainda padrões para

população e poluição, e de condições de trabalho. Sofre uma reforma

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110

organizacional pouco antes do choque do petróleo, em 1973. O

"Enterprises Bureau" torna-se o "Industrial Policy Bureau", com divisões

para estrutura industrial e comportamento empresarial. É criado o

"Machinery and Information Industries Bureau".

O choque do petróleo gerou nova força ao MITI, enquanto preços e

produção precisaram de acompanhamento. Em 1974 a indústria de refino

e distribuição de petróleo sofre auditoria da FTC, que aponta a existência

de um cartel ilegal de preços. A indústria diz que agia sob orientação do

MITI. Há um processo judicial de acusação, com base na AML (pela

primeira vez). Nos anos 80 o processo foi concluído e a política de

"guidance" para restringir a produção foi proibida. A FTC ganha poderes

para destruir cartéis e reduzir preços, desmantelar "holdings" e para

iniciar processos relativos a abusos de preços, sob forte evidência.

Nos anos 60, portanto, houve o que North conceituou como

eficiência adaptativa. A economia crescia a altas taxas e tornava-se

competitiva. Pressões externas levaram à liberalização do comércio

internacional, o que acirrou a competição. O MITI revê sua política de

guidance e muda sua visão da AML, vendo nela a seguinte função:

"(...) protegendo a função da competição em estimular a atividade

industrial eficiente e a criatividade e inovação dentro da empresa fI.

(Hirosbi, 1986: 57)

O período anterior foi visto como necessário para tornar a indústria

competitiva, mas a flexibilização teria que ocorrer. Burocratas do setor

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111

público e da FTC, e economistas passaram a exigir mudanças, assim como

entidades de proteção aos consumidores. Nas vezes em que oMITI

tentava a guidance ocorriam resistências.

"(...) o papel da política industrial deveria ser reexaminado de

modo a facilitar na maior extensão possível as operações efetivas do

mercado". (Hiroshi, 1986: 58)

Kagami (1995: 128) também ressalta que a influência do MITI se

enfraquece com a expansão do setor privado e com a abertura, e o órgão

passaria a preferir diretrizes gerais a controles diretos.

No início dos anos 70 a "crise de identidade" do MITI, gerada pela

crítica à sua política de guidance e pelo fim da industrialização pesada

(Torres Filho, 1991), leva o ministério a concentrar sua atuação no que

respeita ao fomento de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) em áreas de

fronteira. Os setores privilegiados são: equipamento industrial, eletrônica

de informação e aviação e energia nuclear. O MITI também atua junto a

setores "deprimidos", e na resolução de atritos comerciais internacionais

(Johnson, 1992).

As indústrias que mais sofreram com o choque do petróleo foram as

intensivas em energia, como aço e ferro, química e de papel, sendo que a

automotiva e eletrônica sofreram menos. As indústrias passaram a

buscar mercados mais conhecimento-intensivos (Kagami, 1995: 128).

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112

A cooperaçãopermanece comoprincipio junto ao MITI, comono ato

de 1978 intitulado "Stabilization of Designated Depressed lndustries". As

indústrias de alumínio, construção naval e têxtil sofreram com a

competição de outros países do Leste Asiático, e o governo concedeu

crédito para equipamentos e autorizou cartéis. Entre os fatores que

influenciaram a mudança estão o crescimento e maior autonomia das

empresas, as políticas mais voltadas para o consumidor, a liberalização

do comércio e de investimentos e - destacando agentes do processo - a

ação da FTC e de economistas e acadêmicos (Hiroshi, 1986). As idéias

tiveram, portanto, seu lugar.

A eficiência adaptativa é apreendida também a partir desta

afirmação de Hiroshi (1986:59):

"(...) a política industrial do MlTI tem sido forçada a tornar-se

mais flexível para enfrentar as condições econômicas em transformação e

suas necessidades. "

A crítica à "administração orientada" e sua informalidade é feita

também por Haley (1986: 122), que mostra a tendência à manipulação e

manobras pela ausência de controles formais. Mais uma vez, destaca-se a

importância da FTC.

Cartéis e fusões são as mais polêmicas, sendo combatidas pela

FTC. Os estímulos de proteção em produtos de risco comosemicondutores,

aço, automóveis, computadores e outros surtiram efeito, e estimularam a

competição e os investimentos. Em outros setores cartelizados, no

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113

entanto, o desempenho piorou, como nas indústrias têxtil, petrolífera e

petroquímica (Haley, 1986: 72).

o resultado é que a política inicial de incentivo às indústrias

nascentes foi correta, mas a flexibilização posterior (eficiência adaptativa)

evitou o fracasso, ocorrido sempre que a competição não foi estimulada. O

governo é acima de tudo um agente racionalizador e coordenador das

mudanças necessárias, adaptando linhas gerais de atuação para o setor

privado.

Como destaca Torres Filho (1991: 144), a ação do governo não inibe

a racionalidade privada, substituindo-a por uma racionalidade pública,

mas compatibiliza as duas formas através da busca do consenso. O

governo ''potencializa a ação dos agentes privados criando formas

particulares de coordenação" (idem: 143). A hipótese defendida neste

trabalho é a de que a atuação racional do governo implica em redução dos

custos de transação nos setores em que tais custos se apresentam

elevados, e que a forma de atuação necessária para atingir este objetivo

envolve a formação e manutenção de redes (networks) que facilitam a

cooperação entre as empresas. A dependência e proximidade com o MITI e

a elaboração de uma estratégia comum era mais acentuada em setores de

alta tecnologia.

As regras do jogo alteram-se em favor da eficiência e da

concorrência, portanto, e limitam a ação do burocrata do governo. A

"guidance" do MITI seria utilizada apenas no interesse público, e os

abusos seriam evitados (Johnson, 1992: 301). A proposta para política

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114

industrial de 1974 gira em torno do conceito de "economia de mercado

orientada por planos". Decisõesde investimento e gastos comPesquisa &

Desenvolvimento (P&D) seriam observados pelo "Industrial Structure

Council".

A indústria de computadores recebeu incentivos desde a década de

60, em que o MITI formou "keiretsu", licenciou tecnologia e conteve a

competição internacional. O acima citado "Machines and Information

Industries" iniciou um aparato para "previsão tecnológica".As indústrias

do futuro seriam a de semicondutores, ferramentas computadorizadas,

robôs e bens de consumo com eletrônica avançada. Nestes mercados a

liberalização só ocorreria em meados da década seguinte.

No final dos anos 70 o Japão atingiu as metas dos burocratas do

pós-guerra, competindo comos EUA e Europa Ocidental (Johnson, 1992:

302).

3.2. Tecnologia de ponta e previsão tecnológica.

Os setores de tecnologia de ponta apresentam, segundo Torres Filho

(1991: 171)as seguintes características:

a) necessidade de aplicaçãocontínua de tecnologias "intensivas em

ciência", em processo e em produto. A sofisticação é acelerada nas

tecnologias de fronteira, e de alto conteúdo científico. Os diferentes

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115

setores deixam de ser "de fronteira" ou passam a sê-lo de acordo com os

investimentos em P&D.

b) geram externalidades e linkages significativos na matriz

industrial. A política privilegia estas características.

c) concentram e irradiam novas tecnologias, sendo as "indústrias

do futuro".

Podemos citar ainda outra característica importante referente à

alta tecnologia, elencada por Bidault & Fisher (1994: 381):

d) envolve altos custos de transação, quando é transferida de um

agente a outro (através de licenciamentos, por exemplo). A incerteza

quanto à sua funcionalidade só é perfeitamente eliminada após a

implantação, e sempre existe a possibilidade de oportunismo por parte do

comprador ou do vendedor. As redes mantidas pelas empresas podem

reduzir tais custos.

Os gastos privados com P&D cresceram na década de 70, em

relação aos gastos públicos, mas o governo ainda exerce papel ativo em

P&D. O Sistema Nacional de Informações visa difundir novos paradigmas

tecnológicos, através de uma "teia de relações científicas, tecnológicas,

educacionais e industriais" (Torres Filho, 1991: 177).

Uma questão chave refere-se ao aparato administrativo

governamental. A pesquisa básica é responsabilidade do Ministério da

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116

Educação e pela Agência de Ciência e Tecnologia tScience and Technology

Agency - STA). A pesquisa aplicada e desenvolvimento são incentivadas

pelo MITI e pela Agência para Ciência e Tecnologia Industrial (Agency for

Industrial Science and Technology - AIST).

Os setores considerados high-tec são o de informação

(semicondutores, computadores e telecomunicações), novos materiais, e

biotecnologia. De consumidor o Japão passa a ser gerador de tecnologias,

a partir do início dos anos 70, sendo que o investimento em ciência básica

ganha vulto em meados dos anos 60.

A previsão tecnológica é a base das políticas de longo prazo do

MITI (IEDI, 1994). Vinculado à STA existe no Japão o Instituto para

Tecnologias Futuras (lnstitute for Future Technology - 1FT). Este elege

áreas específicas e realiza ampla divulgação dos resultados encontrados.

O 1FT fornece diretrizes de pesquisa para a Pesquisa Exploratória de

Tenologia Avançada (Exploratory Research of Advanced Technology -

ERATO), que promove o desenvolvimento das tecnologias futuras. O

Centro de Informação para Ciência e Tecnologia do Japão (Japan

Information Center for Science and Technology - JICS) é um centro de

informação tecnológica que participa do processo. A AIST é responsável

pela tecnologia quando chega-se a um estágio próximo da aplicação

industrial.

O resultado da previsão tecnológica realizada pelo 1FT, ERATO,

JICS e AIST é consolidado em um programa de longo prazo denominado

Tecnologia Básica para Indústrias Futuras (Basic Technology for Future

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117

lndustries - BTFI). Nos anos 80 é composto por novos materiais,

biotecnologia e aparelhos eletrônicos.

Há, portanto, um papel relevante para o governo em uma área que

envolve altos riscos e incertezas. A consolidação de informações visa

atender a necessidades do setor privado, sendo função do MITI

"coordenar a interação entre firmas e institutos de pesquisa" (lEDI, 1994:

12). O ministério elabora diretrizes, vincula as entidades interessadas e

concede suporte financeiro. A interação ocorre entre:

a) indústrias (grupos de empresas e associações);

b) universidades;

c) governo (MITI);

d) institutos de pesquisa.

É interessante destacar o Fuzzy Logic Project, envolvendo 77

participantes. Foi realizado em 1989 e envolve um laboratório

independente de pesquisas. É um modelo de organização em rede, que

promove a rápida difusão de informações e reduz custos para as empresas

envolvidas. Tecnologias genéricas de aplicação no longo prazo são

identificadas pela Corporação de Desenvolvimento de Pesquisa do Japão

(Research Development Corporation of Japan - JRDC). Como o

conhecimento é difundido via institutos governamentais, a incerteza

quanto à apropriação e direitos de propriedade intelectual é reduzida. A

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118

questão dos custos de transação da alta tecnologia, acima apontada,

encontra desse modo um fator atenuante, graças a um "sistema de

cooperação multi-institucional" 21 (lEDI, 1994: 13).

3.3. Instituições e o caráter da intervenção governamental.

Para o Banco Mundial (World Bank, 1993), a intervenção governamental

pode ser caracterizada como "market-friendly", ou "favorável ao mercado",

no Leste Asiático em geral e também no Japão. A descrição dos

instrumentos de política industrial, porém, revela medidas protecionistas

em determinadas épocas e setores industriais. A corrente revisionista visa

negar o caráter de mercado e afirmar a importância da intervenção

direta.

A visão neoclássica implica em um meio macroeconômico estável e

um aparato legal que promova a competição, doméstica e internacional.

Condena controles de preços e distorções de preços relativos, indicando

investimento em capital humano. Os revisionistas destacam a ocorrência

de políticas industriais e intervenções no mercado financeiro. Segundo o

banco, nenhuma das posições tradicionais explica inteiramente o que

ocorreu no Leste Asiático. Uma intervenção limitada do governo é

necessária, mas sempre deve ser em sentido "favorável ao mercado":

21 É oportuno comparar a forma de relação entre governo e setor privado no Japão e nos EUA, noque se refere à tecnologia. Neste último. o governo age basicamente no incentivo à pesquisa pura,ficando a difusão e a comercialização a cargo do mercado. A interação entre setor público e setorprivado é, portanto, menor (IEDI, 1994b).

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119

investimentos em capital humano, clima de competição, abertura

internacional e macroeconomia estável.

A intervenção deve ocorrer apenas onde houver falhas de mercado,

resolvendo problemas de coordenação. A redução de custos de informação

e de transação seria um exemplo, como no caso da previsão tecnológica

acima citado. Há, portanto, um arranjo institucional para a difusão de

informações. O caso japonês mostra ainda a ampla utilização de conselhos

deliberativos, em que a interação entre os agentes é promovida.

"Em contraste à formação de lóbis, nos quais as regras são pouco

transparentes e os grupos buscam, vantagens secretas uns sobre os outros,

os conselhos deliberativos visam estabelecer regras claras para todos os

participantes." (World Bank, 1993: 14)

A concessão de crédito, com juros reduzidos, era direcionada com

base em decisões do MITI e de conselhos deliberativos, e o crédito direto

condicionava-se a critérios de desempenho, o qual era monitorado 22. A

proteção setorial acabava estimulando as exportações.

A concessão de crédito em troca de desempenho internacional

também supria uma falha de mercado ou a inexistência de recursos.

Assimetrias informacionais geram a necessidade de intervenção

governamental (Stiglitz. 1994), reduzindo os riscos. O sistema de

"sobreempréstimos" praticado pelo Japão é um exemplo, conforme

22 O banco afirma que "Esforços em outras regiões para promover indústrias específicas sem umamelhor troca de informações e a disciplina dos mercados internacionais não foram bem-sucedidos.Este têm sido o caso dos programas ambiciosos de política industrial no Brasil e na Índia. (WorldBank, 1993: 22)

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descrito acima. A informação pode ser considerada um bem público, não-

rival e de consumo coletivo. A geração de externalidades positivas

justifica a intervenção. Os gastos para sua obtenção são fixos e não

aumentam com a quantidade obtida. Ao mesmo tempo, os mercados

informação-intensivos não são competitivos, pOIS as firmas não

competiriam pela mesma informação. Agentes informados podem não

transmiti-la a não-informados (Stiglitz, 1994: 24). A incerteza e o risco

vêm do fato de não se saber se a informação é valiosa antes de que seja

adquirida (Kasper, 1994).

o governo acaba atuando em uma falha de mercado quando

monitora, através do MITI e dos bancos 2:1, o desempenho das empresas,

já que o monitoramento é uma das formas de informar. Compensa,

portanto, uma subalocação de dados (Kasper, 1994: 28-9).

o estado "network" pode promover o crescimento e a produtividade

se os mercados internos forem sempre contestáveis. A interação pode

resultar em colusões e aumento de preços, diminuição da competição e

troca de favores improdutivos. Além da cooperação, o Japão soube

preservar a competição, mesmo que oligopolística.

'~ competição baseada em contestabilidade incluía regras claras e

com cumprimento garantido, eprêmios para os vencedores." (World Bank,

1993: 93)

23 No Japão os conglomerados bancários ("kcirctslI") facilitam o monitoramento.

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o fato de o MITI ter desencorajado a competição e formado cartéis

em certos momentos gera a crítica à posição do Banco Mundial, de que a

intervenção foi "favorável ao mercado" (Amsden & Singh, 1994; Singh,

1994). A crítica procura destacar que em países em desenvolvimento a

eficiência no curto prazo pode ser substituída pelo conceito de eficiência

dinâmica, no longo prazo. A integração com a economia internacional

deveria ser "estratégica", e não "total". A política industrial deve ser

dinâmica, visando transformação industrial e crescimento rápido (Singh,

1994: 1811).

o Banco Mundial questiona a própria eficácia da política

industrial, sustentando que o sistema econômico perseguiu suas

vantagens comparativas dinâmicas. Singh procura demonstrar que

intervenções coordenadas, consensuais, e a partir de uma estratégia

global podem levar a soluções eficientes no longo prazo, como no caso

japonês (Singh, 1994: 1814-5). O Japão construiu, portanto, vantagens

comparativas em indústrias de aço, refino de petróleo, automóveis,

computadores, e outras. A estru tura industrial do pós-guerra baseada em

têxteis e manufaturas leves não elevaria seu nível de vida em padrões

norte-americanos ou da Europa Ocidental, e seria diferente da resultante

de condições normais de mercado.

A controvérsia sobre a eficácia da política de mudança estrutural

não será discutida em maiores detalhes aqui, mas mesmo admitindo que

tal política tenha sido eficiente deve ser ressaltado que ela repousa sobre

pré-requisitos institucionais que a condicionam. As regras formais ou

informais devem buscar a competição no longo prazo, ainda que no curto

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122

prazo haja protecionismo. No Japão foi conectada a metas de exportação e

desempenho, requisitos fundamentais. Com isso o sentido negativo da

medida, ressaltado pelo Banco, acaba sendo compensado. Na questão da

abertura as condições institucionais também a permitiram, mesmo que

gradual e seletiva.

A competição interna também foi estimulada no Japão, de maneira

flexível, dependendo do setor e de seu amadurecimento para competir, no

que concordam o Banco Mundial e os críticos (Singh, 1994: 1817). A

indústria nascente era protegida, mas era estimulada a competir quando

estivesse preparada. Quando seu ciclo de vida terminasse era protegida

novamente, e fusões ou sua reestruturação ainda forçvam-na a competir.

A cooperação eficiente repousa em uma burocracia com forte grau de

independência de políticos e em uma busca do consenso, facilitada por

normas éticas. Ao contrário do que postula Singh (1994: 1820), a

cooperação neste caso não elimina na verdade a competição, mas faz com

que seja obrigatória no longo prazo. A formação de cartéis, já apontada no

item 3.1, também era flexível, tendo duração limitada, e nem todos eram

bem-sucedidos (Singh, 1994: 944). Como ressaltam Amsden & Singh:

/1( ••• ) restrições a importuções poderiam. ter esmagado totalmente a

competição se não fosse pelos padrões de desempenho que as indústrias

protegidas eram forçadas a cumprir pelo governo /I. 24 (Amsden & Singh,

1994: 945)

24 Os autores citam como exemplo o caso da indústria de máquinas-ferramenta. Em troca deproteção tarifária, para os instrumentos com alta elasticidade-renda da demanda e produtividade,deveriam produzir 50% dos produtos com controle numérico computadorizado. (op. cit.: 945)

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123

Foi sugerido no capítulo 2 que o governo japonês comporta-se como

um fator de produção, sendo quase sempre funcional ao sistema

econômico. O aparato institucional como o conjunto de regras que limitam

a ação pública e privada seria um fator de produção, e o governo, agindo

através de suas "redes" na política de "guidance" também poderia agir

como tal. O governo como fator de produção é também a abordagem de

Kasper (1994: 6), que utiliza conceitos da análise institucional para

avaliar o desenvolvimento do Leste Asiático, comentando inclusive o caso

japonês.

O governo japonês teria contribuído para a criação de uma infra-

estrutura "hard", relativa a transportes e comunicações, e de uma "soft".

Esta envolve as regras ou o aparato institucional, que estabelece

incentivos à inovação e eficiência e eleva a produtividade dos outros

fatores de produção. A estrutura "soft" não se deprecia com o tempo, mas

torna-se mais eficiente com o uso contínuo.

Kasper ainda argumenta que o compromisso com a liberalização

pode ser mais importante do que o estado atual de proteção (1994: 15), o

que contribui para o debate acima comentado. O compromisso em reduzir

tarifas desestimula grupos de interesse que poderiam querer mantê-las.

O que o governo estimulou no Japão foi a competição oligopolística,

caracterizada por diferenciação do produto, altos custos de transação e

informação, demanda inelástica a preços, e disputa por nichos de

mercado. Competem através de "marketing, inovação de produto e

serviços pós-venda. A contestabilidade de seus mercados foi mais forte do

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124

que a atuação política de seus lóbis. Os oligopólios, definidas as regras de

contestabilidade, só obteriam lucros através de inovações.

Apesar de apresentar aspectos institucionais contrários às

disposições mais voltadas ao mercado, como o incentivo do lado da

demanda (subsídios, tarifas, controle de produção), o governo japonês

atuou também do lado da oferta, formando as duas infra-estruturas

citadas. As regras de competição, portanto, estimularam a oferta 25, além

da flexibilidade dos controles da demanda.

A conclusão sobre o caráter da intervenção é que ele não deve ser

apenas um simples observador, e nem um intervencionista ilimitado

(Kasper,1994). O que o governo japonês buscou foi um meio-termo,

suprindo falhas de mercado, estimulando a concorrência onde fosse

necessária, difundidindo informações para auxiliar a competição

internacional, e desestimulando o protecionismo improdutivo. Ele difere

de outros países do Leste Asiático por não ter enfatizado tanto a atração

de fatores móveis de produção (capital, trabalho especializado,

conhecimento e tecnologia), mas por ter incentivado a poupança, a

formação técnica e o espírito empresarial. O governo japonês, com suas

características de "rede" e de autonomia inserida, acabou sendo "favorável

ao mercado" no longo prazo.

Ainda é preCISOressaltar novamente o papel das instituições

informais. Johnson (1992), como já comentado, não aceita valores

culturais ou éticos como fundamentais, preferindo a força das

25 O que não ocorreu na industrialização da América Latina. por exemplo.

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125

circunstâncias. Fica claro, porém, que elementos éticos reduzem custos de

transação e podem facilitar a cooperação entre governo e empresas. Ainda

tomam desnecessária a regulamentação detalhista por parte do governo.

Segundo Hiroshi (1986) o papel das regras informais é bastante

expressivo na atitude dos japoneses em relação às leis. O governo foi

moldado de forma militarista e nacionalista desde a Restauração Meiji

(1867-1911) e a herança da "orientação administrativa" é evidente. Os

mecanismos de orientação, porém, eram muitas vezes contatos informais

e comitês internos aos ministérios, que envolviam membros da Dieta (os

zoku). Os projetos de lei vinham de discussões e consultas, o que

caracteriza o pluralismo e as "redes" acima explicadas. A crítica principal

é a falta de transparência de atos que afetam terceiros, o que gerou

pressões para mudanças (Hiroshi, 1986: 60).

Em todos os setores industriais japoneses existem associações que

os representam, o que caracteriza seu coletivismo. O governo orienta os

grupos e não setores individuais, utilizando-os como canais de

comunicação (formais) e fóruns de discussão e negociação. É uma

característica do netuiork state, já apontada.

O grau de importância das restrições informais no Japão é ainda

evidenciado pelas atitudes frente às regras formais e aos contratos. O

senso de coletivismo é forte o suficiente para que conflitos de interesses

sejam resolvidos judicialmente em grau mínimo 2(; (Hiroshi, 1986: 62). A

ambigüidade de muitas leis também existia para dar maior flexibilidade

26 Apenas 13.000 advogados exerciam 11 profissão no Japão em 1986, contra 500.000 nos EUA,aproximadamente.

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126

à "administração orientada". Os contratos escritos também não são

considerados importantes, pois os termos devem sempre acompanhar

variações das circunstâncias. A variável ética age em seu lugar.

Tanto Morishima (1982) como Kasper (1994) colocam a

importância do confucionismo para o incremento da produtividade.

Segundo o último, o confuncionismo representou uma verdadeira

inovação institucional quando surgiu, há 2.500 anos atrás. Suas regras

éticas pregam a harmonia, a interação entre as pessoas (coletivismo) e

condenam o oportunismo - inclusive para os governantes (Kasper, 1994).

Prega a atenção à vida terrena e não à uma vida após a morte, no que

assemelha-se ao protestantismo descrito por Weber (1992). A educação,

tradição, disciplina e hierarquia também teriam um papel importante. No

pós-guerra a perseverança. poupança, cooperação e repúdio às falhas

ganham destaque. O governo (desde a era Meiji) acaba assumindo a

liderança e recebendo a fidelidade dos agentes sociais (Morishima, 1987).

A análise institucionaJ demonstra a relevância dos custos de

transação, e foi visto como são amplamente reduzidos no Japão. A

capacidade institucional para praticar políticas governamentais

eficientes, está também ligada a variáveis éticas, portanto.

"Uma sociedade construída em tal entendimento coletivo pode ser

altamente eficaz em poupar custos de transação, e tende a ser mais flexível

ao adaptar sua infra-estrutura institucional a circunstâncias variáveis".

(Kasper, 1994: 14)

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127

o caráter de "rede" ou "network" que caracteriza, em minha

análise, o governo no Japão, é destacado por Nakano (1994) como o

paradigma organizacional da economia globalizada. O paradigma

tecnológico refere-se à microeletrônica e a mecânica de precisão, que

tomaram mais flexível o processo produtivo. O Japão soube adaptar suas

instituições de modo a estarem em harmonia com estas transformações,

sendo as mesmas "enxutas e flexíveis" (Nakano, 1994).

As características de cooperação e reciprocidade das "redes" são

fruto de uma interação e conhecimento mútuo, e baseiam-se "em. normas e

valores éticos, dependência mútua e interesses comuns" (Nakano, 1994:

12). Segundo o autor há dois tipos de indústria oligopolista: um em que o

governo estimula a competição oligopolística mas intervém pouco, e um

outro tipo em que a competição é regulada (1994: 18-20), como na

indústria de supercomputadores. São setores de alta tecnologia em que o

governo potencializa os efeitos de P&D, também como destacado por

Torres Filho (1991).

A análise sobre o setor oligopolista em questão mostra uma

convergência com a postura do Banco Mundial (World Bank, 1993), de

que os países devem ter capacidade institucional para intervir. Nakano

parece, portanto, concordar quando afirma:

"Cabe observar, porém, que diferentes governos têm diferentes

capacidades de interuenção, Os governos de alguns países são

consistentemente mais eficientes nesse tipo de ação. Fatores como

estrutura burocrática, tipo de relação~entre setor privado e governo,

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128

valores éticos dos empresários, configuração dos grupos de interesse, papel

da justiça e da opinião pública podem determinar a eficácia, ou não, das

intervenções governamentais." (Nakano, 1994: 20)

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129

Conclusões:

A hipótese básica deste trabalho é a de que um determinado aparato

institucional existente na sociedade japonesa possibilitou uma cooperação

econômica eficiente entre governo e setor privado. O modelo de análise

adotado, estabelecido pela escola institucionalista, mostra os

componentes de um tal aparato: regras formais e informais, e sua

garantia de cumprimento. Vnriáveis éticas e culturais são consideradas

restrições informais. O papel destas regras é reduzir custos de transação

e facilitar as trocas e o cescimento econômico, caso sejam estabelecidas em

um sentido produtivista. É adotada uma postura weberiana, de que

valores e idéias (fatores subjetivos) são fundamentais para explicar o

progresso material, bem como a sua não ocorrência.

O estudo da política industrial praticada naquele país sugere que

foi adotada uma regra fundamental: competir internacionalmente. Já na

segunda metade do século XIX havia esta preocupação. Para que o

objetivo de tornar-se um país desenvolvido e competir com os demais fosse

atingido era necessário que o pais se industrializasse, que sua estrutura

industrial evoluísse com o tempo. O governo, como em vários países de

industrialização tardia, adotou uma postura desenvolvimentista e

procurou intervir no mercado e transformá-lo. Na década de 50 é criada

uma agência governamental encarregada desta missão: oMITI.

O MITI realizou políticas protecionistas no curto prazo, contra a

concorrência estrangeira, Impôs tarifas protecionistas, concedeu

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130

subsídios, formou cartéis e controlou importações. Tais medidas, contudo,

variavam com o tempo e ciclo de vida da indústria selecionada.

Internamente, a contestabilidade dos mercados foi mantida. Havia o

compronusso e o acompanhamento informais das metas de

competitividade. A concorrência oligopolística foi incentivada, e houve

mais racionalidade em um espaço possível de intervenção, pois havia uma

regra clara transmitida aos oligopólios de que a abertura seria realizada,

a partir da década de 60. Fusões e restrições de produção visavam

proteger as indústrias em períodos recessivos ou de maior abertura, mas

foram posteriormente combatidas pelo próprio setor privado. A

intervenção com o tempo foi reavaliada, e o próprio MITI reavaliou suas

funções.

o amplo uso de comitês e conselhos deliberativos caracteriza o

"pluralismo administrado" da burocracia, e torna apropriado o conceito de

"estado em rede". A burocracia foi autônoma o bastante para promover a

industrialização, e a abertura trouxe maior pluralismo e outros grupos

sociais e agentes privados desejaram menos intervenção (além de

demandas sociais, combate à poluição, qualidade de vida, etc.). Esta

passou a existir em setores de alta tecnologia, em que os custos de

informação e transação são altos. O importante é que isto mostra o

caráter flexível das instituições, que se adaptaram a novas

circunstâncias, o que North denomina eficiência adaptativa.

A industrialização bem-sucedida e a reciclagem do papel do

governo e do MITI, no entanto, ocorrem sob um aparato institucional

cooperativista, em que regras éticas confucianas têm seu lugar. Tais

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131

regras caracterizam a facilidade de adaptação e os mecanismos

cooperativos da sociedade japonesa, o que outros países não conseguiram

desenvolver. O governo e sua burocracia são eficientes, e souberam

redefinir seus limites, e promover a redução de custos de transação.

Entre as principais conclusões deste trabalho, podemos destacar:

(i) as regras formais e informais favoreceram o crescimento, e o

governo soube monitorar seu cumprimento por parte dos agentes

privados;

(ii) o governo foi limitado através do tempo, limitando-se à correção

de falhas de mercado. Agiu, portanto, como um fator de produção,

promovendo a interação (conselhos) e reduzindo custos de transação. A

produtividade dos agentes econômicos foi aumentada;

(ii) houve eficiência adptativa, na reciclagem do papel do MITI e do

governo, que passou a ser menos impositivo e atendeu as demandas do

setor privado;

(iii) as regras informais, exemplificadas pela ética confuciana,

facilitaram a cooperação e reduziram custos de transação, também

enfatizando a disciplina e o trabalho. A política de "guidance" do MITI -

informal - é um bom exemplo, assim como as "redes" estabelecidas entre

os agentes;

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132

(iv) as regras que limitaram durante certo período a abertura

internacional foram compensadas pela exigência de competição interna e

padrões internacionais de desempenho.

(v) as decisões políticas, junto à qualidade e formação similar da

burocracia, favoreceram uma trajetória sustentável de eficiência. A

"inércia" do desenvolvimento foi, portanto, no sentido de mercado.

o compromisso final com a competitividade não deixa dúvidas de

que no longo prazo a intervenção vêm sendo "favorável ao mercado"

naquele país. As regras que sustentam esse compromisso, porém, são de

dificil aprovação consensual dentro de uma sociedade. Como ressalta

Johnson (1992), a cooperação é sem dúvida mais eficiente do que o

centralismo estatal ou o auto-dirigismo, em alguns casos, mas é bem mais

dificil de se conseguir. Por isso, a postura do Banco Mundial é correta

quando ressalta a importância da capacidade institucional para os países

que desejam um governo mais interventor.

Não é suficiente afirmar que o governo poderia melhorar o

desempenho de países em desenvolvimento, já que no Japão houve

intervenção e foi bem-sucedida. É necessário lembrar os mecanismos

institucionais que sustentaram esta intervenção eficiente. Não basta

desejar uma combinação de protecionismo e estímulo à competitividade,

pois esta é uma decisão arriscada e que requer flexibilidade, podendo

muito bem resultar em gigantismo e ineficiência estatal. Uma burocracia

ética e disciplinada aparece como pré-requisito imediato. A sociedade em

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133

questão pode cair em uma trajetória inercial de ineficiência, e para

rompê-la seria necessária uma nova correlação de forças políticas.

Dadas estas dificuldades, o Banco elenca proposições normativas

para o governo, que poderiam ser genericamente aplicadas a outros

países. São como "medidas de segurança", contra a expansão desastrosa

do governo na esfera econômica. Prega, na abordagem "favorável ao

mercado" (Singh, 1994): relutância em intervir (a não ser que seja

demonstrado que é melhor intervir); monitoramento como função do

governo (disciplinar o mercado); intervenções feitas de modo transparente

(deixar que as regras governem, mais do que os burocratas).

Tais propostas parecem bastante adequadas a países em

desenvolvimento, nos quais a intervenção sempre ocorre, e também é

necessária. O estudo sobre o Japão demonstra que outros países devem

reavaliar a capacidade institucional existente, ou o aparato institucional.

E, antes de tudo, obter um consenso político para as metas de crescimento

e produtividade.

\

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134

Abstract:

The work presents a new point of view on th« fiold of economic development,

represented by the New Institutional Economics (NIE) and one of its most

distinguished representatives, Douglass C. North (Nobel Prize, 1993). This

school enphasizes the relation between formal and informal rules (commercial

laws, federal constitution, cultural norrns) arul long run growth, standing out

the relevance of the environment whoro thoy nr« crcatod and enforced, which

includes the government and the roles assurnod hy him. The making of these

rules is also affected by agent's mental motlols and by failures in the political

processo The final result ofthe institutional frumowork is a country with high or

low transaction costs, which influences th« organization of markets and the long

run growth. Utilizing these theoretical concepts the paper analyzes Japan's

post-1945 industrial policy, showing that tho institutional framework promoted

efficiency and a "market-friendly" path in the long run, oven when government

realized protectionist practices. Thoro wns 11 contral concern with market

practices and competition, even insid« tho governmont apparatus.The conclusion

is that the government was extromely important in Iate-industrialized

countries, but the institutional framowork dotorrninerl the long run path of the

relation between it and the markets. '1'0 rogulato it, the government must be

seriously constrained.

Key Words: institutions, transaction CO:;;1.8, growth, performance, markets,

industrial policy.

Page 135: A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR …

135

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