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A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR
PRIVADO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO: O CASO DO JAPÃO
Banca examinadora:
Prof.orientador .
Prof .
Prof .
Este trabalho é dedicado a meu avô, Nilo
Medina Coeli, e a meu bisavô, João de
Andrade Costa, que tanto construíram.
FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS
ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO DE EMPRESAS DE SÃO PAULO
NILO DE MEDINA COELI NETO
A RELAÇÃO ENTRE O APARATO INSTITUCIONAL, SETOR
PRIVADO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO: O CASO DO JAPÃO
Dissertação apresentada ao Curso dePós-Graduação da FGVIEAESP,Área de Concentração: Planejamentoe Finanças Públicas, como requisitopara obtenção de título de mestre emAdministração Pública e Governo.
Orientador: Prof. Marcos FernandesGonçalves da Silva
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iv
COELI NETO, Nilo de Medina. A Relação entre o Aparato Institucional,Setor Privado e Desenvolvimento Econômico: o Caso do Japão. São Paulo:EAESPIFGV, 1996. 140 p. Dissertação de Mestrado apresentada ao Cursode Pós-Graduação da EAESPIFGV, Área de Concentração: Planejamentoe Finanças Públicas).
Resumo: ° trabalho apresenta uma nova perspectiva de análise na áreada economia do desenvolvimento, representada pela Nova EconomiaInstitucional (NEI) e por um de seus mais destacados representantes,Douglass C. North (prêmio Nobel, 1993). Esta corrente enfatiza a relaçãoentre regras formais e informais (leis de comércio, constituição federal,normas culturais) e crescimento econômico no longo prazo, destacando arelevância do ambiente em que as mesmas são criadas e no qual têm suaaplicação garantida, o que inclui o governo e os papéis por ele assumidos.A elaboração de tais regras é ainda afetada pelos modelos mentais dosagentes e por falhas do processo político. O resultado final do aparatoinstitucional será um país com altos ou baixos custos de transação, osquais influenciam a organização dos mercados e o crescimento de longoprazo. Utilizando estes conceitos teóricos, este trabalho analisa a políticaindustrial do Japão no período 1945-1990, defendendo a idéia de que oaparato institucional promoveu a eficiôncia econômica e uma trajetóriade longo prazo "favorável ao mercado", mesmo quando o governopraticava medidas protecionistas. Havia uma preocupação central compráticas de mercado e competição, mesmo dentro do aparatogovernamental. A conclusão a que chega a pesquisa a partir do estudo decaso escolhido é que o governo foi extremamente importante em países deindustrialização recente, mas o aparato institucional determinou atrajetória de longo prazo da relação entre setor privado e mercado emcada um deles. Para que possa regular ou interferir no mercado, ogoverno deve ser severamente limitado.
Palavras-chave: instituições, custos de transação, crescimento econômico,desempenho, mercado, política industrial.
v
"Finalmente, a repúblicaparlamentar, em sua luta contra a revolução, viu-seobrigada a fortalecer, juntamente com as medidasrepressivas, os instrumentos e a centralização do podergovernamental. Todas as revoluções aperfeiçoavamesta máquina ao invés de destroçá-la. Os partidos quese alternavam na luta pelo domínio consideravam aconquista desse imenso edifício do Estado como oprincipal troféu do vencedor (...)É sob o segundo Bouaparte que o Estado parece teradquirido uma total autonomuü. ...)"
(Karl Marx, O Dezoito Brumário de Luís Bonaparte)
"Por último - pode-se dizê-locom segurança a desconfiança contra todogovernante, a inteligência do caráter inútil edesgastante desses combates de fôlego curto, hão delevar os homens a uma decisão inteiramente nova: àabolição do conceito de Estado, à supressão daoposição entre 'privado e público I. Passo a passo, associedades privadas absorvem os negócios de Estado:mesmo o resíduo mais tenaz que resta do antigotrabalho de governar (aquela atividade, por exemplo,que deve assegurar o homem privado contra o homemprivado) acabará um dia por ficar a cargo deempresários privados. O desprezo, o declínio e a mortedo Estado, o desencadeamento da pessoa privada(tomo o cuidado de não dizer: do indivíduo), são aconsequência do conceito democrático de Estado; nissoconsiste sua missão."
(Friedrich Nietzsche. Humano, Demasiado Humano.)
vi
Agradecimentos.
Ao meu orientador, Prof. Dr. Marcos Fernandes Gonçalves da Silva,
dedico os agradecimentos iniciais. Desde a fase de elaboração da proposta
de dissertação, até o texto final da mesma, ofereceu-me valiosas
indicações quanto à estruturação do trabalho, bibliografia "de fronteira",
estímulo e tempo para discussões. Considero-me privilegiado por ter sido
seu orientando, e por ter seguido os caminhos apontados por seus amplos
conhecimentos.
Sou grato também aos professores Alberto Isao Sugo (FGV-SP),
Dante Mendes Aldrighi (FEA-USP), Ruben Cesar Keinert e Maria Rita
Durand (FGV-SP), pelas sempre oportunas sugestões e indicações. Aos
dois últimos agradeço ainda por terem formado minha banca de
qualificação. À professora Martha Farah sou grato pelas oportunas
informações e textos, oferecidos em seu curso na EAESP-FGV.
Agradeço à FAPESP - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado
de São Paulo, responsável pelo financiament.o deste trabalho.
Finalmente, quero agradecer a meus pais, a Sandra, Marcos, meus
irmãos, Helena, Jairo, Eduardo, e a t.odos que me apoiaram e
incentivaram durante o período derealiznçâo da pesquisa.
vii
Sumário
Introdução ....8
1. Instituições e desenvolvimento econômico...:15
1.1. Variáveis subjetivas na análise do desenvolvimentoeconômico .... 17
1.2. A abordagem da Nova Economia Institucional (NEI) 281.2.1. Custos de informação e custos de transação 331.2.2. Regras informais. formais e garantia de
imposição ....391.2.3. Mudança institucional e desempenho eéonômico no
longo prazo ....481.3. O papel do governo na NEI.. ..62
2. Japão: instituições, setor privado e "network state" ....76
2.1. Mudanças institucionais: aspectos históricos ....772.2. Instituições e o papel das "redes" ou "networks" ....79
3. Aspectos da política industrial japonesa ....94
3.1. A evolução da política industrial no pós-guerra ....953.2. Tecnologia de ponta e previsão, tecnológica .... 1143.3. Instituições e o caráter da intervenção governamental .... 118
Conclusões .... 129
Abstract .... 134
Bibliografia .... 135
8
Introdução:
Grande parte do debate acerca da necessidade de reformulação do papel
do Estado em economias de países de industrialização recente envolve o
papel fundamental por ele representado durante este processo. Nesse
sentido, o Estado foi importante por vários motivos, e ainda é importante
(embora por motivos diferentes). Os principais autores da Economia do
Desenvolvimento, no pós-guerra, ressaltam a importância do Estado no
que tange ao planejamento dos setores industriais a serem implantados,
incentivados e protegidos (Rosenstein-Rodan, 1969; Hirschman, 1986;
Furtado, 1968),bem comona possibilidade de alocaçãode crédito de longo
prazo ao setor privado (Rostow,1974).O que procurarei corroborar neste
trabalho é a hipótese de que o processo de intervenção, para que seja
bem-sucedido no longo prazo, deve estar sustentado em um aparato
institucional que incentive o mercado e delimite a ação governamental,
conformando-a de modo específicoàs necessidades do mercado em cada
épocahistórica. Este aparato é necessário para reduzir custos econômicos,
e ao mesmo tempo envolvecustos na sua estruturação.
Em países subdesenvolvidos, as funções governamentais
desviaram-se muitas vezes dos princípios da política de "laissez faire", já
que a indústria nascente necessitava de proteção. Além da atuação no
caso das falhas de mercado tradicionais (incluindoos ciclosde negócios),o
Estado seria empresário e promotor do desenvolvimento, planejando e
eliminando "estrangulamentos" do lado da oferta. Isto ocorreu em vários
países, e de fato alguns deles formaram indústrias nacionais e tornaram-
se competitivos em muitos setores. Mas nem todos experimentaram um
9
bom desempenho, ou conseguiram mantê-lo de modo sustentado no
tempo. Mesmo em países já desenvolvidos a atuação governamental
começou a ser questionada. Inflação, déficits governamentais e dívida
pública tornaram-se crônicos, e trouxeram o debate acerca da
privatização, desregulamentação e redefinição do papel do Estado. A
Nova Economia Política (Silva, 1990) trouxe à tona a possibilidade de
falhas de governo e de problemas no processorepresentativo (przeworsky,
1990). A própria democracia levanta dúvidas, pois alguns regnnes
autoritários conseguirammelhores "performances"econômicas.
Entre os países que passaram por fases de industrialização, o
Japão aparece como exemplo de forte presença governamental em tal
processo, a partir da Era Meiji (18 -18), e após a destruição provocada
pela Segunda Guerra Mundial (1939-1945).A política industrial no pós-
guerra foi em grande parte ditada pelo MITIl, com resultados favoráveis
em termos de crescimento do produto e competitividade.A relação entre
governo e mercado mostrou-se em grande parte eficiente, o que me
estimulou a escolher este país como estudo de caso. Os principais
questionamentos que me motivaram, entre outros, foram:
(i) o Estado japonês, enquanto organização, foi o único elemento
fundamental responsável pelo desempenho econômicojaponês no pós-
guerra?
(ii) a relação entre Estado e mercado verificada naquele país
sugere que o mercado em países subdesenvolvidos pode ser
1Minist:ty ofIntemational Trade and Industry (Ministério da Indústria eComércio Internacional).
10
invariavelmente coordenadoou complementadode modoeficiente por um
agente governamental racional, melhorando o desempenho econômico?O
Estado pode, portanto, atuar segundo os interesses do mercado de modo
eficiente? Quais os custos econômicos envolvidos, para que isto ocorra?
Tais custos estariam também relacionados à forma organizacional
específicaque o governopossa assumir?
O objetivo deste trabalho envolve a resposta a estas questões a
partir de um marco teórico que redefine as fontes do desenvolvimento
econômico, e que propõe um modelo de análise que aponta novos
elementos necessários para um desempenho econômicoeficiente. Segundo
os autores que o representam, algumas sociedades já se mostraram
bastante promissoras, experimentando crescimento econômicoextensivo
(gradual e de muito longo prazo, no qual a renda per capita é
estacionária) por algum tempo e surtos de crescimento intensivo (taxas
elevadas de aumento da renda per capita no longoprazo, e níveis de bem-
estar e transformações estruturais). Muitas delas, no entanto, viram tal
processo ser abortado ou interrompido, e voltaram a um estado de
letargia ou apenas de crescimento extensivo.Forças capazes de destruir o
crescimento foram mais fortes do que forças que o impulsionaram.
O aparato institucional de cada país seria o fator determinante de
tais fenômenos, estabelecendo o tipo de incentivos que os agentes
econômicos (públicos e privados) receberão e que irão determinar o
desempenho econômicono longo prazo. Determina ainda as funções do
Estado enquanto organização, e a relação deste com o setor privado. É
11
esta a visão da Nova Economia Institucional (NE1)2,que envolve autores
comoDouglass C. North (1990, 1991e 1973)e Eric Lionel Jones (1993a,
1993b). Para estes autores, o desenvolvimento econômico através da
história é na verdade um confronto entre agentes econômicos rent-
seeking3 e agentes econômicosprodutivistas ou "market friendly", sem que
haja um resultado necessário e único no longo prazo para todas as
formações sociais. Tais agentes estabelecem as regras do jogo
(instituições) - necessárias em função da incompletude das informações e
do reconhecimento de limitações à racionalidade dos agentes econômicos-
seguindo modelos mentais (Denzau & North, 1994), e de acordo suas
respectivas forças no processo político. Das regras decorrem incentivos
que influenciarão o caráter do crescimento econômico.A luta de "classes"
apontada por Marx e Engels (Marx & Engels, 1993)passa a ser uma luta
entre "grupos", diferenciados apenas pelo fato de serem pró ou anti-
mercado. Esta visão teórica é discutida no primeiro capítulo.
A propensão a crescer, ou o próprio crescimento econômico,é um
fenômeno recorrente (Jones, 1993a:63) na história, e mostra-se presente
em sociedades orientais muito antes da Revolução Industrial inglesa
(idem: 28). Ou seja, é um conjunto de fenômenos passíveis de
generalização em escala mundial, em diferentes países. Expressa a luta
entre crescimento do produto e crescimento populacional, tomando-se
sustentável e intensivo no longo prazo graças a uma série de condições
2A NEI não se confunde, como veremos adiante, com a antiga escola institucionalista norte-americana, representada por T. Veblen, 1. Commons e 1. K. Galbraith, por exemplo. Há autores queressaltam semelhanças e possibilidades de intercâmbio (Rutherford, 1995; Dugger, 1995;Groenewegen, Kerstholt & Nagelkerke, 1995), mas mesmo assim persistem diferenças significativas.Dentro do próprio neoinstitucionalismo ainda há variações.3Rent-seeking (caçador de rendas) pode ser preliminarmente definido como o comportamento de umindivíduo ou grupo de indivíduos que visa a melhora de sua posição às custas do bem-estar social, viamecanismos institucionais e políticos.
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prévias e de transformações institucionais que possibilitam o
sancionamento de suas forças propulsoras. Tais condições, no entanto,
não surgem necessariamente ou de forma automática, acompanhando a
evolução dos mercados. Regras sobre comportamento e os incentivos
gerados por elas agem de modo independente ao longo do processo. O
progresso tecnológico também repousa em incentivos. Como ressalta
Jones:
"0 que reduziu o impacto da mudança tecnológica e tornou-a lenta
foi a estrutura social ou política". (1993a:72)
No século XX,após a 11Guerra Mundial, o Japão experimenta um
período de crescimento econômico sustentado, no qual novamente a
atuação do Estado foi essencial. Segundo Jones (1993b: 99) o Estado e
fatores culturais - como também ressalta Morishima (1987) - são os
agentes relevantes deste processo.Fatores culturais são considerados por
North (1990) como parte dos modelos mentais dos agentes, que irão
formar as regras e incentivos aos indivíduos, verdadeiros determinantes
do processo (no caso japonês seriam regras "marhet-friendly"). Apesar de
enfatizar a falibilidade de órgãos estatais como oMITI, Jones observa
(1993b: 100):
"Contudo, é possível que o estado japonês tenha realizado
julgamentos corretos desde a guerra e que isto explique em grande parte o
sucesso do país".
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Mesmo que os julgamentos corretos por parte do setor
governamental tenham sido consideradosimprescindíveis para explicar o
crescimento observado, procurarei demonstrar que as regras que
incentivaram o comportamento dos agentes governamentais na tomada
de decisões corretas foi também imprescindível. O exame do modelo
institucionalista trará elementos que permitem levar em conta tais
fatores, antes subestimados ou ignorados pela visão neoclássica
tradicional de desenvolvimentoeconômico.As regras formais (jurídicas,
de cumprimento obrigatório) e informais (valores, costumes, ética,
religião, de cumprimento voluntário) passam a fazer parte do
instrumental de análise. Irão formar o aparato institucional de cada
sociedade e delimitar a atuação dos agentes econômicos,inclusive a do
governo. Ao delimitar estas ações as regras podem adquirir tanto um
sentido favorável ao mercadoe à produçãocomoum sentido contrário aos
mesmos. No primeiro caso, custos de transação - conceito exposto mais
adiante - serão reduzidos, e as trocas fluirão mais facilmente. A estrutura
de direitos de propriedade será protegida, e os agentes serão incentivados
a produzir. No segundo caso, os agentes serão incentivados a buscar
ganhos econômicosde modo desfavorável aos moldes de um mercado
eficiente.
O Estado, além de estar limitado e incentivado pelas regras, deve
garanti-las e fornecê-las através doprocessopolítico(que ocorre dentro do
Poder Legislativo).Na análise da NEI o Estado deve, em primeiro lugar,
proteger os direitos de propriedade, reduzindo custos de transação
(North, 1990; North & Wallis, 1982). Isto será discutido ao final do
primeiro capítulo, quando serão tecidos comentários sobre o papel do
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Estado na NEI. Este item prepara o caminho para o capítulo 2, que
estuda aspectos do caráter da intervenção governamental na economia
japonesa.
o padrão de intervenção do governono Japão sofre transformações
ao longo do século :XX,e mostra um caso diferenciado entre os países em
que o estado foi importante para a industrialização. De um estado
"desenvolvimentista" passa a um caráter de estado em "rede" ou "network
state" (Burlamaqui, 1990),o que mostra mudanças em sua relação com o
setor privado e em sua forma organizacional. Este padrão organizacional
pode ser considerado um fator que impulsiona o crescimento e estanca
fatores bloqueadores do mesmo. Definições e características do estado
japonês serão o objeto de análise do segundo capítulo, no qual discutirei
os conceitos mais empregados na análise da relação entre setor público e
privado naquele país. Será interessante observar que o Estado não é
apenas uma "terceira parte imparcial" que protege e garante as regras do
jogo. A influência sobre o jogo, porém, estimula sempre a competição, e é
limitada em grande parte a medidas nesse sentido.
Irei supor, a principio, que elementos institucionais favoreceram
mudanças no padrão de intervenção a partir da ocupação norte-
americana, em um sentido menos autoritário e favorável à competição
econômica,e não mais militarista. Este padrão de intervenção implica em
um governo atuante no sistema econômico, que consegue promover o
consenso e reduzir incertezas, eliminando falhas de mercado. Existe
direcionamento por parte do Estado, mas de formas distintas no tempo e
em um sentido predominantemente "marhet-friendly".
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No terceiro capítulo é feito um estudo de caso, referente aos
aspectos fundamentais da política industrial do pós-guerra praticada no
Japão. Ao longo do estudo será possível destacar a aplicabilidade dos
conceitos trazidos pela análise neoinstitucional, mostrando regras que
balizam a relação entre governo e setor privado no que respeita à
industrialização. O conceito de redes também é avaliado à luz da
evidência surgida no período em questão. Evoluções recentes da política
em alta tecnologia também serão abordadas, corroborando as
características dopadrão de Estado anteriormente exposto.
Finalmente, é feita uma reavaliação das hipóteses do trabalho, em
que procuro elaborar conclusõessobre a conformidadeou não das mesmas
para o estudo de caso escolhido.
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1. Instituições e desenvolvimento econômico.
o objetivo deste capítulo será a apresentação do modelo de análise da
Nova Escola Institucionalista (NEl), como qual será possível reavaliar o
processo de desenvolvimento econômico em geral, bem como o caso
específicoda política industrial japonesa no período posterior à Segunda
Guerra Mundial. Para tanto, pretendo inicialmente situar a visão desta
escola em relação a outras visões do processo de desenvolvimento. A
exposição será bastante breve e centrada em análises que enfatizem
aspectos também abordados pela NEI, para que a comparação seja mais
frutífera.
Além dos modelos de crescimento tradicionais, abordarei algumas
visões da Economia do Desenvolvimento, que experimentou notável
progresso após a II Guerra Mundial e que preocupa-se com a questão do
subdesenvolvimento. Em seguida apresentarei o modelo da NEI, que
amplia os limites neoclássicos e examina as condições para que o
crescimento se verifique.
1.1. Variáveis subjetivas na análise do desenvolvimento
econômico.
A relação entre fatores econômicos e não-econômicos têm recebido
tratamento diferenciado ao longo da evolução da análise econômica.
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Podemosespecificá-lacomosendo uma relação que envolvebasicamente a
influência recíproca entre fatores objetivos (tecnologia, industrialização,
divisão do trabalho, crescimento do produto) e subjetivos (cultura,
religião, ideologia, direito). Duas correntes de análise são tradicionais
neste tema: a corrente marxista e a weberiana.
No prímeiro caso, há uma ênfase maior em fatores objetivos.
Segundo Marx, a cada modode produção correspondeuma superestrutura
sócio-psicológica, que o mantém e garante (Birnbaum, 1953).É composta
pelas organizações políticas, governamentais e jurídicas, bem comopelo
conjunto de idéias artísticas, .relígiosase filosóficas.Esta superestrutura,
que envolve elementos subjetivos, seria determinada de modo necessário
pelos imperativos do plano material, que envolveria fatores objetivos
relacionados ao modo de produção existente em cada momento histórico.
Ao longo do tempo, a adaptação de valores e idéias às exigências dos
aspectos puramente econômicosseria inevitável, portanto.
A evolução do modo capitalista de produção levaria
inevitavelmente à mudança de valores, idéias e sistemas políticos
tradicionais, de modonecessário. As idéias ou fatores subjetivos possuem
aqui um papel apenas dependente, e poderíamos com base em tais
pressupostos explicar o desenvolvimento econômicoe social de várias
nações através da história. As contradições e males que afetam o sistema
decorrem de fatores objetivos,mais do que de fatores subjetivos.
o problema é que nem todas as formações sociais têm obedecidoa
este padrão. Nem todas experimentaram um processo de industrialização
18
e crescimento do produto (acumulação de capital) sustentado no tempo, e
nem todas apresentaram rupturas e adaptação automática em suas
"superestruturas" tradicionais em direção a valores capitalistas e a
aparatos institucionais que garantam tais valores. O sistema marxista
não explica como ocorre a mudança no plano das idéias decorrentes da
passagem de um modo de produção a outro (Birnbaum, 1953), o que pode
indicar uma resposta ao problema levantado. Ele supõe que esta
mudança se dá de maneira mecânica, e nem considera a fundo a
possibilidade de que ela não venha a ocorrer. A propriedade privada, tão
bem situada por Marx, pode ser insuficientemente protegida. Neste
último caso, as idéias podem agir de forma independente, obstaculando a
acumulação de capital.
A análise de Max Weber (1992) oferece elementos que nos auxiliam
a preencher estas lacunas. Os novos valores ou idéias correspondentes ao
novo modo de produção devem ser aceitos de modo voluntário, como no
caso da ética protestante, a qual trouxe subsídios à acumulação de capital
através do incentivo à poupança e ao trabalho. Estes valores cumpriram
uma função psicológica, transformando gradativamente a superestrutura
anterior. Como ressalta Birnbaum (1953), a natureza humana não é
"plástica" ou "maleável" e necessita de incentivos que não apenas o uso da
violência ou da coerção.
Fatores subjetivos são também analisados por Schumpeter (1984),
quando este profetiza o fim do,capitalismo, denotando forte influência da
perspectiva weberiana. O racionalismo típico deste sistema leva à crítica
dele próprio, e o seu sucesso econômico sustenta seus destruidores. O
19
"espírito capitalista" do empresário inovador é minado lentamente por
idéias socializantes e estatizantes, no que o keynesianismo e os
intelectuais teriam papel fundamental. Ao contrário de Marx,
Schumpeter argumenta que o sistema capitalista é vítima de seu sucesso
enquanto sistema produtivo, não sofrendopor esgotamento de mercados
ou novas tecnologias, mas principalmente por fatores ambientais que
levam à destruição de suas instituições (oude sua "superestrutura").
As inovações (novos produtos, novos processos, nova fonte de
matérias-primas) são a raiz do processo de desenvolvimento, que
diferencia-se do crescimento por trazer alterações qualÍtativas que
alteram a estrutura econômicavigente. São levadas ao mercado pelo
empresário schumpeteriano (Schumpeter, 1985),o qual age sob impulsos
de conquista e de construção de um império pessoal. O empresário
necessita de representação política e incentivos, além de valores
subjetivos que aprovem seu comportamento, por parte dos outros
membros da sociedade. O ambiente crescentemente hostil termina por
enfraquecer o espírito empresarial, substituindo-o por valores coletivistas
e socialistas. Os males que afligem o capitalismo são neste caso
subjetivos, e não objetivossomente.
Também a Escola Institucionalista tradicional norte-americana,
comona análise de T. Veblen, aponta a importância de fatores subjetivos
como o hábito, formado por padrões culturais. Sugere desse modo
limitações ao modelodo "homemeconômicoracional" (Rutherford, 1995)e
rejeita a hipótese de escolharacional, limitada ou não.
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o velho institucionalismo analisa as instituições ou regras em seus
aspectos puramente sociais. A motivação dos agentes sociais não é
econômica,mas ocorre em razão de status, ideologia e poder (Rutherford,
1995). Mesmo diferindo na análise, veremos que a Nova Economia
Institucional (NEI) também ressalta a importância de fatores não-
econômicos para a continuidade do crescimento. O determinismo
puramente cultural e social é então substituído pelo pressuposto de
racionalidade limitada, mantendo-se a hipótese de escolha racional.
Ambas as escolas concordam quanto à limitação do modelo econômico
neoclássico tradicional de racionalidade ilimitada, mas a NEI visa
ampliar os alcances domesmo.
O auto-interesse e a hipótese de maximização das satisfações
individuais são preservados pela NEI, que visa formalizar com seu
auxilio a relação entre instituições e desempenho econômico. As
instituições são analisadas desta vez sob o ponto de vista puramente
econômico, no que podemos denominar análise objetiva de fatores
subjetivos. Dada a nova hipótese, em um modeloneoclássico,de limitação
de informações e de capacidade cognitiva dos agentes, as "instituições
importam" (North, 1990),e afetam diretamente o custo de realização das
trocas econômicas.Nesse sentido, não há uma relação necessária entre
instituições e eficiência econômica,pois os incentivos estabelecidos pelas
regras podem levar a padrões predatórios de atividade, ou a trocas não-
produtivas. Neste ponto, há semelhaça com a análise de Veblen
(Rutherford, 1995),que apontava possíveis trajetórias de predação ou de
produção. A força do hábito e não de uma escolha racional (limitada),
21
porém, guiava os agentes, em um processo de causalidade cumulativa
(Rutherford,1995: 447).
A amplitude crescente das trocas e da variedade dos bens
transacionados através da história levou à crescente impessoalidade das
transações, segundo North (1990). A impessoalidade leva à incerteza,
dada a racionalidade limitada e assimetria de informações, o que elevou
os custos de transação. Regras informais, formais e o governo surgiram
como redutores de tais custos, mas a percepção de sua necessidade
não foi uniforme, no que as ideologias e modelosmentais representam um
papel relevante, comoveremos nos próximositens.
Após a Segunda Guerra Mundial, ganha definição a Economia do
Desenvolvimento comodisciplina da Ciência Econômica,com a evolução
das contas nacionais e comparações entre países desenvolvidos e
subdesenvolvidos (Souza, 1993). O keynesianismo coloca a participação
do governo no ambiente econômico em termos distintos da tradição
clássica e neoclássica, enfatizando a necessidade de políticas anti-cíclicas.
Em países não industrializados as funções governamentais se ampliam
ainda mais, quando teóricos do subdesenvolvimento enfatizam a
necessidade de planejar a industrialização, alocando recursos a setores-
chave e criando empresas estatais quando necessário, conforme as teses
da ComissãoEconômicaPara a AméricaLatina - CEPAL (Souza, 1993).O
protecionismoe a estratégia de substituição de importações visam formar
e proteger indústrias nacionais nascentes.
\..
22
Os teóricos do subdesenvolvimento divergem quanto ao papel
central do governo enquanto produtor. Alguns autores como Furtado
(1967) defendem investimentos públicos em infra-estrutura e a criação de
estatais, enquanto R. Campos (Souza, 1993)prefere o capital estrangeiro
como produtor, sendo função governamental apenas o planejamento
indicativo.
A concepção teórica de crescimento e desenvolvimento econômico
nestas vertentes desenvolvimentistas refere-se à intensificação do uso de
capital, através da industrialização. O governoé essencial na alocação de
crédito, infra-estrutura e determinação de setores a serem privilegiados.
A acumulação de capital e o crescimento da renda per capita decorreriam
necessariamente de tais políticas, não existindo referência a fatores de
ordem subjetiva.
Os fatores subjetivos também são tomados como dados ou estão
fora da análise de vários modelos da Economia do Desenvolvimento.
Como destaca Hirschman (1986), ela visava construir um "novo edificio
teórico", dada a "inaplicabilidade" dos conceitos da economia tradicional
aos países subdesenvolvidos. Este autor considera que existe a
possibilidade de ganhos mútuos entre "centro" e "periferia", caso haja
uma política desenvolvimentista adequada.
Entre as teses iniciais do subdesenvolvimento estava a do
subemprego rural (Lewis, 1954),que enfatizava o excesso de mão-de-obra
no campo em países não industrializados, o que pressionava os salários
para baixo. O governo deveria arregimentar este segmento da população
23
através de uma "política de investimentos públicos planificados"
(Hirschman, 1986:57). Com isto o crescimento poderia ser equilibrado
(Rosenstein-Rodan, 1969; Nurkse, 1969) ou desequilibrado (tese de
Hirschman). No primeiro caso o governo alocaria recursos para
investimentos em vários setores industriais, em que cada um utilizaria o
mercado do outro. Para Hirschman seria mais proveitoso concentrar
reursos em setores específicos,a partir dosmais básicos. Isto traria maior
atrativo para o "espírito empresarial" que todo país teria, potencialmente
(Hirschman, 1986:51).
É oportuno lembrar o modelode fases do crescimento econômicode
W.W.Rostow(1974) que, como o de Marx, é bastante determinista ou
teleológico. Todo país passaria por quatro fases: sociedade tradicional,
transição ou pré-decolagem, decolagem e alto consumo de massa. Os
países desenvolvidos atingiram a etapa final, com crescimento auto-
sustentado e sem que o sistema tenha tido um final "catastrófico".Outros
países seguirão as mesmas etapas, podendo encontrar-se em qualquer
uma delas.
O estágio que trata das pré-condiçõesé interessante por destacar
tanto fatores econômicoscomo não-econômicoscomo essenciais para a
"decolagem"posterior (Rostow,1974).O aumento da taxa de investimento
faria com que o estoque de capital crescesse a taxas superiores ao
crescimento demográfico.Para que isto ocorresse, deveria haver progresso
na agricultura e geração de recursos naturais e formação de capital fixo
(infra-estrutura). Mas as condições puramente econômicas não seriam
suficientes. Mudanças sociais deveriam preparar o caminho para o
24
desenvolvimento, devendo existir liderança empresarial (com liberdade
de agir de modo capitalista) e também motivação política (ausência de
nacionalismoe protecionismo).
As críticas a Rostowenvolvemo determinismo da chegada a uma
fase de crescimento auto-sustentado (o qual pode ser revertido) e o
pressuposto de que países subdesenvolvidostêm estágios "tradicionais"
semelhantes àqueles pelos quais passaram os que já se industrializaram
(Colman & Nixson, 1981: 52). Diferenças culturais podem explicar
diferentes estágios tradicionais (Souza, 1993: 201) entre países.
Gerschenkron (1966)também oferecesubsídios para críticas, ressaltando
diferenças de caráter histórico quanto à rapidez do crescimento e
mudanças da estrutura organizacional e produtiva. As políticas
governamentais também variaram, assim comofatores ideológicos.
Hoselitz (1960) oferece uma interpretação sociológica do
desenvolvimento que traz importantes elementos da análise
schumpeteriana. Lembra que a EscolaNeoclássicadeixa de lado relações
sempre constantes entre teoria e política econômicas, preocupação
fundamental do período clássico, ou da Economia Política. A Economia
Pura abstrai consideraçõespolíticas e considera as "motivaçõeshumanas"
e o "ambiente cultural" como dados. Passou a "desprezar as mudanças
sociais e políticas que acompanham o processo de crescimento econômico"
(idem:24).
Destaca a necessidade de mudar os "valores sociais" para que
ocorra crescimento, e busca uma teoria geral que englobe mudanças
25
econômicase sociais em conjunto. Dada a diversidade de culturas entre
nações, não basta uma teoria específica do capitalismo ocidental
(Hoselitz, 1960:27). O autor procura abstrair elementos não-econômicos
específicosde países distintos, visando obter generalizações. Para tanto
emprega o conceito de T. Parsons (Hoselitz, 1960: 30) de "variáveis-
padrão", determinantes do produto social. As três variáveis em questão
seriam meritocracia, universalismo e especialização. Os elementos
opostos, contrários ao crescimento econômico, são respectivamente o
status ou tradicionalismo, o auto-interesse particularista e a não-
especialização.Os três princípios devemser buscados em conjunto, pois a
especialização pode ser determinada por normas de tradição ou
particularismos.
A elite governante de um determinado país, segundo Hoselitz,
poderia impor interesses particularistas ao restante da população. Seriam
"barreiras à mudança econômica" (Hoselitz: 44-5). A percepção das
possibilidades e beneficiosdo crescimentopor estas elites, portanto, seria
fundamental. Colocanoplanejamento, portanto, uma importância crucial
para a mudanças. A influência de Schumpeter relaciona-se ao foco no
comportamento empresarial inovador, como fonte de mudança. Tal
comportamento baseia-se nas três variáveis-padrão acima citadas, que
trariam a aceitação de grupos marginalizados que seriam inovadores
(judeus, por exemplo).
40 autor cita como exemplo a URSS (hoje ex-URSS) para mostrar como o planejamentogovernamental pode levar à adaptação a novos padrões de produção através da "autoridade"(Hoselitz, 1960: 48).
26
A NEI, como veremos adiante, também estabelece diferenças
fundamentais entre diferentes países que possuam distintos conjuntos de
regras de convivência social e econômica. Não há um caminho necessário
pelo qual todos os países deverão passar, e tais regras são condição
necessária para o crescimento sustentado de longo prazo. Aproxima-se
nesse sentido das análises de Hoselitz e Gerschenkron, mas destaca
outras variáveis em um modelo econômico que envolve fatores não-
econômicos. Busca ainda ser geral, com aplicabilidade a qualquer país em
qualquer época, mas em um modelo distinto.
Por último, gostaria de abordar alguns aspectos da Teoria da
Dependência, na versão de Cardoso & Faletto (1970). Estes autores
criticam a análise tipológica ou de "fases" do desenvolvimento,
ressaltando que as peculiaridades históricas e culturais são relevantes no
processo. A mudança econômica e social envolve relações entre grupos,
em correlações de forças distintas de país para país segundo evoluções
históricas distintas, e não há um vínculo necessário entre
desenvolvimento econômico e social. Este último só seria obtido se o
desenvolvimento econômico não fosse "dependente'"; o que é tomado como
um dado para os países subdesenvolvidos. Neste caso o país além de
desenvolvido deixaria de ser "periférico". A análise de cada conjunto de
"singularidades" irá ao final mostrar como a "dependência" varia segundo
tempo e lugar.
Elites ou grupos locais que desejem manter privilégios ou copiar
padrões externos de consumo (efeito-demonstração) podem impor seus
5A "independência" envolveria crescimento com base no mercado interno. O protecionismo evitaria,portanto, relações desiguais de poder entre os países.
27
interesses (Cardoso & Faletto, 1970: 22) e gerar pressões sobre a
poupança interna e sobre a balança comercial. A ação de grupos pode
bloquear o crescimento, portanto. É necessário visualizar o tipo de
integração social existente, que condiciona o desenvolvimento, e que se
desdobram em relações internas de classe. Estas relações de classe
internas condicionam as relações externas do país, ou o tipo de vinculação
à economia mundial. Geralmente haveria uma funcionalidade entre as
mesmas, e o subdesenvolvimento não aparece como uma anomalia, mas
como parte do sistema econômico mundial de "exploração" e dominação.
Os interesses e valores são sempre interesses de classe, ligados portanto a
fatores puramente econômicos, e o objetivo é analisar a base sociológica
da estrutura econômica, que garante a dominação.
A primeira diferenciação em relação à NEI seria a própria questão
da "dependência". A preocupação maior de Cardoso & Faletto (1970) é a
verificação de uma hipótese adicional à de crescimento econômico: a
existência ou não de dependência. Para a NEI esta questão não se coloca
(poderia ser um falso problema) pois a preocupação básica refere-se a
condicionantes não-econômicos do crescimento em geral, e não do que se
defina como "crescimento dependente". Os autores colocam que é possível
haver maior "autonomia", embora o mercado econômico se desenvolva
menos (citam o exemplo de Cuba pós-Revolução). A questão não
respondida, e que a NEI visa responder é: por quê houve menos
desenvolvimento do mercado, e quais os condicionantes não-econômicos
deste fato? Houve um "trade-oft" entre medidas que segundo os autores
reduziram a "dependência" e desempenho econômico, mas por quê isto
ocorreu?
28
o jogopolítico entre grupos (e não necessariamente entre classes) é
bastante importante para a NEI, comoveremos a seguir. De fato, grupos
políticos de interesse conseguem eventualmente impor interesses
contrários à eficiência de mercado, mas isto se dá em razão de falhas no
processo político (ou democrático) e não porque servem a interesses
externos da economia mundial, "como é natural" (Cardoso & Faletto,
1970: 29). Não há esta funcionalidade porque a "dominação" não é
tomada comodada.
1.2.A abordagem da Nova Economia Institucional (NEI).
A seguir irei expor a abordagem da NEI, situando-a como um aparato
teórico que visa rever alguns pressupostos da economia neoclássica ao
mesmo tempo em que a completa, utilizando seu instrumental de análise.
Comojá foi apontado acima, seu objetivobásico é chegar a uma teoria
bastante geral que relacione mudança institucional e desempenho
econômico,passível de aplicação a qualquer país, e que reconheça desta
maneira as "peculiaridades" históricas e culturais de cada sociedade,
integrando-as à análise.
o modelo neoclássico tradicional de crescimento econômico (ou
acumulação de capital) toma comodadas as instituições que possibilitam
a existência e o bom funcionamento dos mercados, sendo bastante útil
para descrever relações entre certas variáveis estritamente econômicas
sob um aparato institucional ideal. O crescimento neste modelo pode
29
ocorrer de maneira extensiva ou intensiva. No primeiro caso, não ocorre
aumento na renda per capita de determinado país no longo prazo. Na
ausência de progresso técnico, e sob o pressuposto de rendimentos
decrescentes, os fatores de produção - terra e capital - são utilizados de
acordo com o ritmo do crescimento da força de trabalho, de maneira
extensiva. O longo prazo, portanto, aponta a chegada de um estado
estacionário. O modelo de Robert Solowé bastante representativo desta
visão, englobando todas estas relações (Solow,1956;Sachs, 1993:561-70).
Caso haja incremento nas quantidades per capita utilizadas de
capital ou terra, o nível de renda per capita irá crescer no longo prazo. O
mesmo ocorre em caso de aumento de produtividade de um ou mais
fatores (incluindo o trabalho), o que pode ser gerado por várias fontes
(North & Thomas, 1973: 1-2). Podemos destacar as inovações
tecnológicas, investimento em capital humano ou educação, redução dos
custos de informação no mercado, e economias de escala geradas por
maiores mercados ou mercados mais distantes. Estas inovações trazem
ganhos de produtividade e elevaçãono nível de renda per capita. A vinda
de um estado estacionário é postergada, nestas condições. É possível
mensurar empiricamente as parcelas do crescimento atribuíveis a cada
fator, como capital e trabalho. A parte não explicada pelos fatores é
atribuída ao progresso tecnológico (educação, pesquisa e
desenvolvimento).
Nos dois casos apresentados acima ocorre crescimento intensivo, o
que pode ser chamado de desenvolvimento econômico na visão neoclássica.
A renda e o produto devem crescer no longo prazo a um ritmo maior do
30
que o ritmo de crescimentopopulacional.Os indicadores relevantes são os
indicadores per capita. O crescimento extensivo é apenas um estado
estacionário, letárgico, em que o crescimento da renda per capita não se
sustenta no longoprazo.
A perspectiva da NEI redefine este conceito de desenvolvimento e
alarga o campo de estudos neoclássico, buscando explicar algumas
questões de modomais satisfatório. Algumas sociedades necessitaram de
algo além de fatores puramente econômicospara que se mantivessem na
rota de crescimento contínuo e intensivo. Como destacam North &
Thomas (1973:2):
"Nós nos permitimos imaginar: se tudo que é requerido para o
crescimento econômico são investimentos e inovações, por quê algumas
sociedades não alcançaram este resultado tão desejável?"
As restrições ao crescimento na perspectiva neoclássica são dadas
apenas pela tecnologia e pelos fatores de produção, não havendo restrição
organizacional ou institucional (North, 1990: 132).Porém, a disparidade
entre diferentes países e a persistência de formações econômicas
ineficientes não são apenas uma questão de investimento em tecnologia,
de investimento em capital fisico e em capital humano. Um aparato
institucional favorável passa a ser um pré-requisito indispensável, pois os
incentivos ao crescimentonão são "dados".
A necessidade de uma organização institucional favorável ao
crescimento e ao financiamento eficiente de uma economia implica
31
redefinir as fontes do crescimento econômicotradicionais enumeradas
pela visão neoclássica. Estas passam a ser uma consequência de um
ambiente institucional favorável, que propicia incentivos aos agentes
econômicos.
"Osfatores que listamos (inovações, economias de escala, educação,
acumulação de capital, etc.) não são causas do crescimento; eles são o
crescimento". (North & Thomas: 1973:132)6
o aumento do nível de renda per capita propiciado pela mudança
tecnológica possui outras fontes. O progresso tecnológico,por exemplo,
acaba sendo uma manifestação, e não uma causa fundamental. Os
incentivos aos agentes individuais devemlevar a taxa de retomo privada
de um certo empreendimento ao nível da taxa de retomo social. Caso isto
não ocorra, deve haver uma terceira parte capturando a diferença.
Alguém acaba recebendo beneficios ou arcando com custos indevidos.
Caso os custos privados sejam maiores do que os beneficios sociais, a
atividade não será empreendida. O agente trouxe beneficios à sociedade e
não recebeu (ou sabe que não irá receber) um valor equivalente. Isto
decorre do aparato institucional que regulamenta os direitos de
propriedade.
As considerações acima formuladas mostram que o crescimento
econômicode longo prazo possui fontes que não são apenas objetivas ou
materiais (capital, terra, trabalho, tecnologia), mas engloba também
fontes que estabelecem um aparato institucional favorável à produção
6Grifo do autor.
32
incentivos aos agentes, e que podemos denominar fontes subjetivas.
Estas, ''por interferirem no sistema de motivações que direcionam o
comportamento dos agentes, são as variáveis mais importantes dentro do
processo em questão" (Silva, 1994).
As fontes subjetivas são as regras do jogo econômico que incluem
valores culturais e pessoais, e o que podemosdenominar capital ético. O
conjunto de valores que incentivam o trabalho e a parcimônia atuam,
nesta perspectiva, comoum fator deprodução(Silva, 1994).
Tais fatores não-econômicos são relevantes e podem ser
considerados fonte do processo de crescimento econômicoem razão de
aceitarmos o pressuposto de que trocar envolve custos relacionados a
fatores não-econômicos. O mercado é uma rede de contratos e trocas de
bens e de direitos de propriedade, sendo o crescimento um processo de
trocas contínuas no tempo. Se assumirmos que há imperfeições na
realização destas trocas em função de limitações informacionais e
imperfeições na delimitação das regras de direitos de propriedade,
podemosadmitir que as trocas podemnão ocorrer,ou que ocorramem um
sentido não favorável ao pleno desenvolvimento dos mercados e de
inovações. Há custos, como veremos a seguir, que surgem em função
destas limitações e incertezas, e que influenciam o comportamento dos
agentes econômicos.
r
33
1.2.1. Custos de informação e custos de transação.
As hipóteses neoclássicas para explicar o comportamento econômicodos
agentes nas trocas econômicas envolvem a busca de maximização da
utilidade esperada por cada indivíduo, em que:
a) o objeto da escolha é claramente definido, de forma objetiva e
unívoca;
b) os indivíduos são capazes de realizar os cálculos acerca da
melhor alternativa, que irá maximizar sua satisfação.
Uma estrutura competitiva eficiente estabelece prêmios e punições
aos agentes econômicos, sendo um estímulo para a eliminação de
informações incompletas. Os arranjos dentro domercado são rápidos. Não
há falta de informações sobre o bem envolvido na troca e sobre outras
alternativas de escolha. Qualquer incerteza sobre o comportamento do
outro agente não se colocano modelo,pois a informação sobre a troca já é
considerada completa. Ambas as partes envolvidas na troca agem,
portanto, de maneira perfeitamente racional. Estes são os fundamentos
microeconômicosde modelosde crescimentocomoo de Solow,apresentado
acima.
O pressuposto comportamental adotado por North (1990),
diferencia-se desta visão. No modeloda NEI o comportamento humano é
mais complexodo que o previsto na teoria neoclássica.A tese colocada em
dúvida é a de que o processo cognitivo dos agentes lhes dá modelos .,"
34
verdadeiros sobre seu campo de interesse, e de que eles recebem a
informação "que leva à convergência dos modelos a princípio divergentes"
(1990: 17), convergência esta em direção aos parâmetros do mercado
eficiente. Os modelos subjetivos divergem de indivíduo para indivíduo e
na verdade não há convergência. Mais ainda, mudanças no
comportamento dos agentes influenciam a mudança institucional e sua
direção.
A motivação individual pode envolver o altruísmo e restrições
auto-impostas (restrições éticas), e não apenas a maximização racional do
bem-estar individual. Domesmomodo,um comportamento não-produtivo
também é possível. A eficiência máxima e o comportamento produtivo
previstos no modelo anterior não é verificada automaticamente no mundo
real, mas é na realidade dependente de algumas circunstâncias não-
econômicas.O mercado apresenta fricções e incertezas, e North cita dois
fundamentos microeconômicosbásicos que evidenciam esta afirmação:
a) a capacidade limitada de processar, organizar e utilizar
informações pelos agentes econômicos - os sinais transmitidos pelas
instituições são absorvidos de maneira distinta;
b) a incerteza quanto ao comportamento econômicoda outra parte
envolvida na troca, ou quanto ao ambiente em que se dá a transação.
Os agentes são limitados em obter e processar informações. Há
incerteza e informações incompletas sobre os bens envolvidos na troca e
sobre o comportamento possível da outra parte envolvida na troca. Por
35
isto, existem custos de informação no mercado, e surge a questão da
assimetria informacional. A assimetria ocorre porque as partes
envolvidas na transação possuem informações incompletas. O comprador
nunca tem informação completa sobre todos os atributos do bem e se eles
irão satisfazer suas preferências. Há incerteza sobre o comportamento do
vendedor, que pode estar sonegando informações sobre o produto. Do
mesmo modo, o vendedor possui informações incompletas sobre o
comprador, e não sabe se este efetuará de fato o pagamento.
Obter e processar informações são custos para os agentes, e dão
origem a outro tipo de custos: os custos de transação. Podemos conceituar
tais custos como aqueles necessários à realização das trocas (vendas ou
aluguéis) ou à transferência dos direitos de propriedade (Eggertsson,
1994). São os custos de garantia e proteção destes direitos, envolvendo a
mensuração de todos os atributos do bem ou serviço transacionado, e a
garantia do cumprimento das obrigações (gastos com a elaboração de
contratos e serviços advocatícios, por exemplo). São custos bilaterais,
envolvendo fluxos recíprocos entre os agentes.
A seguir, apresentamos algumas definições de custos de transação,
discutindo ao final a versão de North. Segundo Niehans (1987: 676):
"Custos de transação surgem da transferência da propriedade ou,
mais genericamente, dos direitos de propriedade. Eles são concomitantes
aos direitos descentralizados de propriedade, à propriedade privada e às
trocas. "
36
Na definição de G. Stigler (citadopor Niehans, 1987):
"(...) os custos do transporte da ignorância à onisciência".
Outra definição é a de Cooter (1987:457):
"Amplamente concebidos, os custos de transação referem-se ao uso
dos recursos requeridos para negociar e garantir acordos, incluindo o
custo de informação necessária para formular uma estratégia de
barganha, o tempo gasto pechinchando, e o custo da prevenção a fraudes,
realizadas pelas partes envolvidas na barganha. "
Exponho também a versão apresentada por Tirole (1992: 29),
relacionada a R. Coase e a O. Williamson. Ambos caracterizam a firma
em termos de contratos de curto e longo prazo, os quais são incompletos.
O contrato só é completo se todas as variáveis forem verificáveis. A
incompletude está ligada aos custos de transação, que são de quatro tipos.
Primeiro, todas as variáveis referentes a uma transação não podem ser
previstas na data do contrato. Mesmose o fossem, o segundo custo seria o
de escrever todas elas no contrato, que seria enorme. O terceiro é o custo
de monitoramento, de verificar o cumprimento dos termos do acordo. O
quarto é o de garantir seu cumprimento obrigatório (enforcement), o que
implica em custos legais. Tirole aponta ainda a situação de inexistência
de contratos, e a simples barganha entre as partes, e de uma forma
intermediária entre esta e o contrato completo. Nesta forma
37
intermediária há duas possibilidades: uma terceira parte decide os
conflitos ou uma das partes decide (ibid)".
Baron e Kreps (1992) explicamos custos de transação destacando
duas ordens de fatores. A primeira é a racionalidade limitada dos
agentes, que não são capazes de prever tudo o que pode acontecer, e não
podem otimizar sua atuação sem altos custos. A segunda é a tendência ao
oportunismo, que sempre pode ocorrer. Em transações simples isto não
importa, mas passa a ser importante quando as trocas envolvem "tempo,
incerteza e informações privadas". Os custos de transação decorrentes
podem ser ex ante ou ex posto Os custos de negociação e elaboração de
contratos, tentando prever circunstâncias futuras são ex ante,
logicamente. Custos de verificar o cumprimento do acordo, após a
assinatura de um contrato por exemplo, são custos de garantia do
cumprimento obrigatório ou garantia de imposição ("enforcement", e são
ex posto Na mesma categoria enquadram-se custos de adaptação a novas
circunstâncias, ou custos de renegociação.
Finalmente, apresento a versão de Cheung (1987:56), que colocaos
custos de transação como todos aqueles ausentes na economia de
"RobinsonCrusoé":
"(...) custos de transação podem então ser vistos como uma gama de
custos institucionais, incluindo aqueles referentes a informações,
negociação, redação e garantia de contratos, especificação e policiamento
de direitos de propriedade, monitoramento de desempenho, e custos de
7A opinião deste autor sobre custos de transação e governo é exposta no item 1.4.
38
mudança de arranjos institucionais. Em suma, eles abrangem todos os
custos não diretamente envolvidos noprocesso físico deprodução".
A distinção apontada na definição anterior entre custos de
transação e doprocessodeproduçãoaproxima-sebastante da definiçãode
Douglass North. Os custos de transação irão somar-se aos custos de
transformação do bem (custos que ocorrem no processo de produção),
quando são obtidos os custos totais do mesmo.Nas palavras deste autor
(1990:28):
"Os custos totais de produção consistem nos recursos gastos em
injeções de terra, trabalho e capital para a transformação física dos
atributos de um bem (tamanho, cor, localização, composição química, e
assim por diante) e em transacionar - definir, proteger e garantir os
direitos de propriedade dos bens (direito de usar, direito de auferir renda
do uso de, direito de excluir, direito de trocar). "
Três aspectos dos custos de transação são ainda destacados por
North. O primeiro é o custo de mensurar os atributos fisicos e legais
(características) do bem trocado. Em segundo lugar, há os custos de
policiar e obedecer ao acordo. Finalmente, um desconto (também um
custo de transação) em função da incerteza originadopela imperfeição na
mensuração e garantia legal dostermos de troca. North destaca, portanto,
a mensuração dos custos e uma margem de erro, que é descontada (1990:
62). O erro ocorre basicamente em função da assimetria informacional,
envolvendo o conhecimento parcial do objeto pelo comprador, e o
conhecimento parcial das finanças do comprador pelo vendedor, bem
39
como a efetividade da punição a desrespeito nos contratos. Ou seja, cada
uma das partes possui uma função de utilidade, que são as seguintes:
a) a função utilidade do vendedor envolve o preço do bem, as
condições de troca, e a segurança em receber o pagamento.
b) a função utilidade do comprador envolve o preço, as condições de
crédito, e as características transferidas dobem.
O último item é bastante importante, pois entre as características
transferidas há algumas fáceis de mensurar e outras não. Os custos fáceis
de mensurar são os direitos legais, a dimensão da propriedade, e suas
características gerais. De dificilmensuração são os custos de manutenção
e conservação, possibilidade de expropriação e segurança quanto a roubo,
por exemplo. O importante é que, segundo o autor, este desconto reflete o
aparato institucional existente.
1.2.2.Regras informais, formais e garantia de imposição.
A questão dos custos de transação e das regras do jogopode ser discutida
a partir da visão de neutralidade do Teorema de Coase. Este é formulado
do seguinte modo:
40
"(...) a alocação inicial dos direitos não importa de uma perspectiva
de eficiência desde que os custos de transação da troca sejam nulos."
(Cooter,op. cit.: 457)
Na ausência de custos de transação, o que ocorreria com um
número reduzido de partes em negociação, haverá uma solução
cooperativa sem a presença do estado ou alteração dos direitos de
propriedade, e esta solução será eficiente. Como ressaltam Pindyck &
Rubinfeld (1994: 862), a eficiência ''pode ser obtida sem intervenção
governamental quando a externalidade envolve relativamente poucas
pessoas e quando o direito de propriedade é bem especificado" 8. As partes
negociarão os direitos de forma que ambas lucrem. Isto ocorre, conforme
aponta North (1990: 15), em função da competição existente, que traz
informações perfeitas e reduz a defecção. Em seguida, ele mostra a
fragilidade de tal condição:
"(.••) os requisitos informacionais e institucionais necessários para
se atingir tais resultados são estritos".
Os agentes deveriam agir de maneira puramente racional e, o que
é também importante, na situação de altos custos de transação o próprio
mercado induzirá os agentes a procurar mais informações e chegar à
eficiência. Quanto às instituições neste caso: "elas não possuem um papel
independente no desempenho econômico" (1990: 16). A organização
econômicaseria determinada aleatoriamente, ou não haveria organização
institucional alguma, mas apenas o mercado. As escolhas feitas em face
8Estes autores defendem as hipóteses de Coase, citando um exemplo prático de acordo cooperativoentre a cidade de Nova York e o estado de Nova Jersey, em 1987 nos EUA (op. cit.: 866-7).
41
de custos de transação, porém, determinam modelos de aparatos
institucionais (Cheung, 1987:55-7).
A teoria neoclássica tradicional não levava em conta os custos do
processo de troca, que envolvem os custos de transação. No modelo de
equilíbrio geral walrasiano a rede de trocas é indeterminada, mas a
existência de custos de transação força os agentes a economizar
transações e reduz o volume das mesmas (Niehans, 1987: 677). A perda
de bem-estar é determinada pelos recursos alocados às transações e ao
valor das trocas que não ocorrem.North cita os custos de seguros, custos
bancários, financeiros, advocatícios,contábeis etc. (custos de transação)
como sendo cerca de 45% da renda nacional nos EUA. Estes recursos
destinam-se somente à transação, e não à transformação dos bens (North,
1990:27). Para sua reduzir tais custos, autores comoCoase e Williamson
ressaltam o surgimento da firma (Niehans, 1987: 677). North, por outro
lado, ressalta opapel das regras formais e informais.
Do que foi discutido até agora, podemos destacar dois pontos
básicos para que fique clara a importância das instituições: o
comportamento subjetivo dos agentes e os custos de transação. Regras
bem definidas e que promovam a eficiência tomam-se então necessárias.
No modelo neoclássico, os agentes comportam-se de maneira racional e
não é custoso transacionar. É como se as instituições que promovem e
possibilitam esta situação já existissem. Comosão "dadas" no modelo, não
são importantes e não há razão em estudá-las do ponto de vista
econômico.No entanto,
42
"Quando é custoso transacionar, instituições importam". (1990: 12)
o modelo neoclássico simplifica a realidade para fins de análise,
mas é possível flexibilizá-lo. A disparidade entre diversas nações e as
formas ineficientes de organização econômica serão melhor explicadas,
como já apontamos acima, e é importante a percepção de que
organizações eficientes são fundamentais para o crescimento. Reduzir ao
máximo os custos de transação toma-se um imperativo. Como destaca
North:
"(...) com custos positivos de transação, as alocações dos recursos
.são alteradas pelas estruturas de direitos de propriedade". (1990: 28)
A assimetria informacional gera custos de transação. Portanto, a
alocação de direitos altera a alocação ótima de recursos. É necessário
agora examinar como as instituições atuam nesse processo e como são
uma extensão do modo pelo qual os agentes processam informações, ou
seja, veremos porque elas "importam", e porque podem ser consideradas
um fator de produção.
Instituições podem ser entendidas comoas "regras do jogo".São as
regras, formais e informais, que limitam o campo de escolha e de atuação
dos agentes dentro de economias de mercado. A incerteza acerca do
comportamento dos agentes, a respeito das características do bem ou ao
cumprimento dos contratos traz a necessidade de regras básicas de ação,
estáveis no tempo, que formem um conjunto restrito de alternativas e
objetivos, e reduzam o campo de situações imprevistas. Com isto,
43
quantidades menores de recursos serão gastas para evitar desrespeito aos
contratos, reduzindo-se os custos de transação.
''Instituições existem para reduzir as incertezas envolvidas na
interação humana". (North, 1990:25)
Comojá foi apontado, a incerteza e o risco decorrentes de aparatos
institucionais ineficientes desestimularam o crescimento econômico
através da história, tanto ocidental como oriental. O mercado sempre
precisou de regras que o protejessem e estimulassem, à medida em que as
trocas foram se tomando cada vez mais complexas e impessoais, com
menor interação e repetição entre os agentes.
Regras informais ou restrições informais acabam surgindo
espontaneamente. Restrições formais envolvem regras jurídicas e
escritas, ou seja, exigíveis através das leis. Regras informais são
convenções e regras de conduta que apóiam as regras formais, e que
respondem pela maior parte dos atos em sociedade e envolvem aspectos
culturais e éticos (e não são exigíveis por lei). Antecederam
historicamente as regras formais e o próprio estado. Este surge com a
evolução e complexidade das trocas, acentuando o papel das regras
formais e tomando efetivas as restrições informais 9.
As regras informais são o que diferenciamas sociedadesentre si, já
que envolvem aspectos culturais e éticos característicos de cada
9 Padrões éticos possibilitaram o comércio de longa distância quando não existiamestados nacionais modernos que protegessem formalmente os contratos. O ostracismoera a punição a comerciantes desonestos, que não cumprissem os contratos (North, op.cit.).
44
sociedade. As religiões impuseram padrões éticos que nos ajudam a
compreender o desenvolvimento econômico, como no caso do
protestantismo na Inglaterra e EUA, e do confucionismoem sua versão
Japonesa. A cultura envolve obrigações socialmente transmitidas e
herdadas. Além disso, persistem no tempo e podem sobreviver a
limitações formais.
''A cultura japonesa sobreviveu à ocupação dos E. U.A. após a 11
Guerra Mundial". (North, 1990:36) 10
North lembra evidências antropológicas de que a cultura, ou as
restrições informais que ela contém, envolvesoluções cooperativas (sem a
presença do estado) entre os agentes, sendo do interesse destes preservar
a ordem. Segundo a teoria dos jogos, há a possibilidade de cooperação
quando o jogoé sempre repetido, quando há informaçõescompletas sobre
os outros jogadores e seu passado, e quando há um pequeno número de
jogadores envolvido.Tais hipóteses são irrealistas em um mundo de alta
tecnologia, divisão de trabalho e trocas impessoais, quando geralmente o
oposto é a regra ("Estes extremos antagônicos refletem na verdade os
contrastes da vida real '? A impessoalidade das trocas torna irreal a
hipótese anterior. Os jogos consideram não-coincidentes a busca de
máximo bem-estar e resultados cooperativos sociais. Em problemas
coletivos, porém, a repetição das situações e escolhas ocorrem. Neste
ponto, o autor cita Axelrod (1984), que aponta o surgimento de uma
solução cooperativa sem intervenção estatal.
1<lEsteé o mesmo ponto de vista de Morishima (1989) e outros autores, o que será discutido maisadiante.
45
"(...) Robert Axelrod descobriu que a estratégia dominante sob estas
condições de um jogo repetido é a estratégia de 'tit-for-tat', em que um
jogador responde em função da ação do outro jogador". (North, 1990: 13)
A cooperação entre muitos indivíduos é problemática pela limitação
do conhecimento em relação ao próximo. North (1990: 15) cita Schofield,
para quem o problema fundamental na cooperação é estabelecer qual o
mínimo de conhecimento sobre crenças e desejos do próximo para prever
seu comportamento. Mesmo assim, como demonstra Axelrod, a cooperação
é possível. Em um jogo com competição e interação sucessivos a
possibilidade de cooperação é muito mais evidente. Os ganhos da
interação superam os beneficios (payoft) da defecção (1990: 56). A
abundância de informações reduzas incertezas e os custos de transação.
Na prática, a formalização das regras e uma terceira parte que garantam
os pactos acaba surgindo, pois as condições ideais apontadas dificilmente
ocorrem.
A cultura envolve um aparato baseado na linguagem, para
codificar e interpretar informações percebidas pelos agentes, e a
cooperação surge de um jogo interativo e do interesse em preservar a
ordem. Neste ponto, North ressalta "uma densa rede social (a dense social
network)" (North, 1990: 55) envolvendo limitações informais à atuação
dos agentes. Este conceito de network ou "rede" é central para este
trabalho, e será amplamente utilizado mais adiante no estudo do padrão
de intervenção do estado e da política industrial na sociedade japonesa.
46
Regras informais, portanto, surgem de uma solução cooperativa
para evitar conflitos e ambigüidades, especificando de maneira informal
direitos e obrigações. Aumentam, portanto, os ganhos da cooperação,
reduzem os custos da defecçãoe por consequênciaos custos de transação.
A crescente complexidadedas trocas determina um continuum de
regras informais em direção a regras formais de comportamento. Elas
complementam e incrementam a efetividade das limitações informais e
reduzem custos de transação em trocas mais complexas.Podem modificar
e até substituir regras informais, o que está ligado a um processo político
e ao poder de barganha dos agentes envolvidos. Envolvem regras
políticas, como as que constituem o processo democrático. A
democratização a partir de governos absolutistas representou uma
aproximação entre governantes e governados, sendo a instituição do
Parlamento uma forma de facilitar as transações e ação entre os vários
grupos sociais. A democracia, segundo North, facilitou a eficiência do
mercado político, e possui portanto uma lógicaeconômica.
"0 organismo representativo facilita a troca entre as partes. " (1990:
49)
As regras formais envolvem regras políticas e econômicas. As
primeiras referem-se à estrutura hierárquica de poder e à estrutura de
decisões. As regras econômicas envolvem a questão dos direitos de
propriedade e as condições de realização das trocas. Regras sobre
contratos privados também agem nesse sentido. Um exemplo sobre regras
47
de direitos de propriedade é a proteção gerada por normas sobre patentes,
que incentiva inovações.
A conformação do aparato institucional, no entanto, pode não
obedecer a objetivos de eficiência econômica. Não há certeza quanto ao
tipo de incentivos que serão estabelecidos pelas regras. O poder político
de barganha dos agentes irá determinar, como já citado, quais as regras
formais e informais estabelecidas, ineficientes ou não. É preciso levar em
conta que os agentes que tomam parte na barganha são motivados não
apenas por objetivos racionais, mas também por componentes éticos,
culturais e ideológicos. E as regras institucionais estabelecem os custos de
opção por determinado comportamento e opção ideológica. Nesse sentido:
"Uma vez criadas, as instituições determinam os custos de atuar de
várias maneiras em contextos políticos e econômicos". (North, 1990: vi)
As instituições ou regras informais de uma sociedade, como
padrões culturais, reforçam as regras formais, mas também agem como
resistência a mudanças, o que explica uma evolução incremental e não
descontínua do aparato institucional através do tempo. Instituições
ineficientes, que persistem por muito tempo dependem, para que haja
mudança, apenas dos agentes envolvidos no processo e da força de cada
um dos vetores, que determinam a direção de tal mudança. Segundo
North:
"(...) instituições foram - e são - sempre um conjunto heterogêneo de
normas que induzem aumentos de produtividade e de outras que reduzem
aprodutividade". (North, 1990: 9)
48
Segundo Olson (1993), a solução cooperativa em sociedades
primitivas, com poucos habitantes, cede lugar a uma solução não
voluntária quando aumenta o número de pessoas envolvidas.Neste caso,
o grupo com maior poder de barganha deve assumir o poder, e a
autocracia acaba sendo mais benéfica a tal grupo do que a anarquia e a
dominação não sistemática. Quando nenhum grupo participante possui
poder decisivo, uma solução democrática que reparta o poder é mais
desejável.
A persistência histórica da ineficiência é de dificil explicação e a
existência de pressões de grupos de "jogadores",e do papel do governo
quando age em interesse próprio são causas possíveis.A possibilidade de
informações incompletas ou o seu processamento de modo inadequado
são fatores que também impedem a percepção da necessidade de
mudanças 11.
1.2.3. Mudança institucional e desempenho econômico no longo
prazo.
11Um exemplo histórico de sucesso econômico em termos de mudança institucional é ocaso da economia norte-americana. A Constituição Federal, a Northuiest Ordinance enormas de incentivo ao trabalho promoveram uma maior eficiência das organizações einvestimentos na agricultura e em educação, em uma alteração gradual do aparato(framework) institucional. O Terceiro Mundo já apresenta exemplos de mudanças oumanutenção de regras não-produtivistas. Oportunidades para atividades redistributivase não produtivas, criação de monopólios, restrição de oportunidades e investimentoirregular em educação são alguns exemplos apontados, e que configuramempreendimentos rent-seeking, conforme a caracterização de Baumol (1990).
49
A possibilidade de configurações institucionais eficientes ou não trazem à
tona outras questões importantes: a mudança institucional e a trajetória
e desempenho econômicono longoprazo. A afirmação de que a estagnação
e atraso econômicos são explicados pelo aparato institucional traz a
necessidade de entender comotal aparato sofre mudanças, em um sentido
ou outro, ou por quê não as sofre.
o processo de mudança institucional é entendido por North em
uma perspectiva evolucionária. É um processo adaptativo, em que
mudanças nos preços relativos dos fatores, em função do crescimento
populacional ou de mudanças nas preferências dos agentes, por exemplo,
forçam transformações na estrutura institucional 12.
A necessidade de adaptação é uma necessidade de sobrevivência. O
conceito desenvolvido por North é o de eficiência adaptativa (adaptive
efficiency), relacionada coma moldagem da trajetória econômicano tempo
através de regras, de instituições (1990: 80). A sobrevivência é a base da
motivação dos agentes no momento da escolha, no processo decisório. A
base deste processo é, portanto, sócio-biológica:
"Em um modelo sócio-biológico estrito, a maximização do potencial
de sobrevivência motiva o agente". (North, 1990:25)
12A queda drástica da população na grande peste no século XIV, por exemplo, elevou ovalor da força do trabalho e de seu poder de barganha, forçando a queda do valor dasterras e do poder dos senhores feudais (North & Thomas, op. cit.). Mudanças no custodas informações e na tecnologia (inclusive militar) também geram necessidade deadaptar as instituições .
50
A teoria evolucionária, na visão de um de seus expoentes (Winter,
1987: 614-617), preocupa-se com o processo de acumulação e retenção
seletiva de conhecimentos 13. A inovação produzida pelas empresas está
ligada ao acúmulo e retenção de conhecimentos pelas mesmas. O
conhecimento é quase sempre aprendido gradualmente e transmitido de
geração a geração, sendo que conhecimentos ineficientes também são
transmitidos e perpetuados no tempo.
Quanto ao comportamento do agente econômico,os evolucionistas
preocupam-se com motivações biológicas e culturais. As restrições
informais apresentadas por North (1990) envolvem normas e valores
transmitidos em cada sociedade, possuindo relação direta com o
desempenho econômicopor estabelecer incentivos aos agentes. O caráter
da adaptação de tais normas e regras a mudanças determina trajetórias
de longoprazo, de estagnação ou crescimento.
Duas críticas à ortodoxia neoclássica feitas por Winter revelam o
caráter evolucionista de North, que trata de ambas em sua obra, visando
explicar o mau funcionamento do mercado em alguns casos. São elas
(Winter, 1987:617):
a) os ortodoxos assumem "que a sociedade de algum modo
proporciona garantias perfeitas epouco custosas dos contratos";
13Schumpeter (1984) via o capitalismo como um processo evolucionário e enfatizou aenorme importância das inovações, mas não empregou os conceitos biológicos deherança, transmissão e seleção, conforme destaca Winter.
51
b) desprezam as redes sociais (social networks) que determinam os
padrões de troca.
North cita evoluçõesrecentes na combinaçãoentre sócio-biologiae
economia. Comenta Jack Hirshleifer, para quem os modelos
evolucionários lidam também com populações, suas micro unidades e
inter-relações entre ambas.
"(...) a evolução da economia de uma nação é o resultado de
mudanças nas relações entre populações de indivíduos, unidades
comerciais, e similares." (North, 1990:20)
North mostra o argumento de que o sistema econômico evolui, e
mesmo seus elementos mais constantes sofrem variações. É feita uma
analogia com a evolução biológica, da sobrevivência de organismos e
reprodução de caracteres, com variações por mutações internas ou
pressões externas. Na economiaevolucionária, trata-se da sobrevivência e
crescimento diferencial de padrões de organização social (North, 1990:
21). Os elementos constantes, neste caso, são representados pela inércia
das tradições sociais, e as fontes de variação são a imitação e a
racionalidade.
Os agentes da mudança institucional são organizações, políticas e
econômicas,que agem visando certos objetivos, dentro de um conjunto de
oportunidades estabelecidas pelo aparato institucional. Esta é noção de
firma estabelecida por North (1990: 73). As alterações desejadas pelos
agentes acabam sendo incrementais, e não necessariamente eficientes. Os
52
objetivos institucionalmente estabelecidos, em uma ou outra direção,
motivam o agente a adquirir habilidades e técnicas específicas,
transmitidas ou apreendidas na prática. O tipo de conhecimentos
adquiridos, portanto, relaciona-se aos incentivos institucionais. O aparato
institucional é selecionado, e com eles os objetivos e conhecimentos
adquiridos, em uma perspectiva evolucionária. Aos poucos, o
conhecimentopuro é convertidoem conhecimentoaplicado.
"Os incentivos que são construídos dentro de um aparato
institucional possuem o papel decisivo de dar forma ao tipo de
habilidades e conhecimentos que são rentáveis (skills and knowledge that
pay of!). "(North, 1990:78)
Jones (1993a, 1993b)sistematiza uma visão da história comouma
batalha entre forças produtivistas e forças rerü-seeking, O crescimento é
um fenômeno recorrente na história, e a industrialização seria apenas
uma de suas manifestações ou um sintoma, cujospré-requisitos materiais
e subjetivos foram construídos gradualmente no tempo. Avanços técnicos
ocorreram cumulativamente em sua maior parte, antes da Revolução
Industrial, e o crescimento extensivo, mesmo sem implicar em um
aumento de renda e produto per capita, pode estabelecer as condições
para um crescimentomais intensivo 14.
Na questão do estímulo à iniciativa individual, North & Thomas
(1973) citam o exemplode prêmios oferecidosem vários países, no século
XIV, para quem conseguisse um invento que possibilitasse o cálculo da
14 Aspectos históricos sobre o Japão serão discutidos no capítulo 2.
53
longitude. Os beneficios sociais seriam enormes, mas os beneficios
privados não, pois não existiam direitos sobre a propriedade intelectual.
Caso existissem, a tecnologia da época não tomaria possível exigir
pagamentos de todos que utilizassem o aparelho. A invenção de uma
espécie de cronômetro que toma possível o cálculo ocorreu muito tempo
mais tarde. Os direitos de propriedade também eram insuficientemente
protegidos em relação à pirataria. Apenas quando o comércio
internacional e as navegações sofreram grande expansão tomou-se
viável gastar recursos para eliminar completamente tais práticas. No
início,pagava-se propinas.
Outro exemplo histórico a respeito da importância dos direitos de
propriedade refere-se à Espanha. O rei Felipe II recebia tributos das
guildas tradicionais de pastores de ovelhas, e permitia que estes
utilizassem qualquer espaço no interior do país para a condução e
pastagem dos animais. Isto desestimulava a atividade agrícola produtiva,
pois as plantações poderiam ser destruídas. Pagamentos de propinas aos
pastores levariam os agricultores ao problema da "carona" (free-rider),
pois muitos seriam beneficiados e não pagariam nada. Com isto, os
direitos de propriedade não eram plenos, e o rei preferia um ganho
imediato a ganhos bem maiores no futuro, que viriam de impostos sobre
os agricultores (North & Thomas, 1973:5).
A trajetória e desempenho'econômicoda Inglaterra em comparação
à Espanha mostra-nos como aparatos institucionais distintos
determinaram caminhos de eficiência no primeiro caso e ineficiência no
último. Dentro da Espanha, o reino comerciale próspero de Aragão cede o
54
poder central a Castela, envolvida em guerras internas e contra os
mouros. Nobres e membros da Igreja Católica ganharam poder,
formando-se uma monarquia centralizada e burocrática. Com as revoltas
na Holanda e queda do fluxo de metais das Américas, ocorreram
falências, confiscos, tributação desmedida e direitos .de propriedade
menos efetivos. Comerciantes mouros e judeus foram expulsos e houve
controle de preços agrícolas. Em um século (XVII), a inércia de uma
trajetória ineficiente derrubou a Espanha da posição de maior potência
mundial. Houve o despovoamento do interior, estagnação das
manufaturas, colapsodo comérciode Sevilha como NovoMundo, guerras
permanentes e uma crise fiscal.
A criação do Parlamento inglês limitou o comportamento rent-
seeking da dinastia Stuart, e assegurou direitos de propriedade mais
efetivos e um sistema judiciário mais imparcial. O Banco da Inglaterra e
o sistema fiscal pregavam oequilíbrioorçamentário. O governotinha uma
base financeira sólida, havia um mercado de capitais, direitos de
propriedade assegurados, patentes, fim de restrições mercantilistas e
abertura a mercados internacionais.
A perspectiva institucional busca, portanto, evidências empíricas e
históricas, que explicam o fenômeno do atraso, e da persistência do
atraso. Para cada mudança tecnológicalevantada pela teoria neoclássica
comofonte de crescimento econômicohá instituições correspondentes, que
a originam. A possibilidade de formar companhias de capital acionário
gera economias de escala; prêmios e patentes encorajam inovações; letras
de câmbio, a abolição da escravidão e os "cercamentos" elevaram a
55
eficiência dos fatores; e a criação de companhias de seguros reduz
imperfeições de mercado, geradas por assimetrias informacionais. O
importante é que as instituições soframsempre as adaptações necessárias
a novas configurações de direitos de propriedade (North & Thomas,
1973).
Há casos, no entanto, em que os direitos de propriedade podem não
ser devidamente protegidos ou definidos,por duas razões básicas (North
& Thomas, 1973:5):
a) insuficiência tecnológica:não é possível evitar o problema da
"carona" 15 e tomar obrigatórioocumprimento de obrigações;
b) custos de criar e garantir os direitos de propriedade são maiores
que os beneficiossociais.
Nesta perspectiva, é possívelentender sociedadesque permanecem
letárgicas, ou aquelas em que ocorreram surtos de crescimento e em
seguida viram tal trajetória ser interrompida. A pobreza no Terceiro
Mundo e a ineficiência econômica em vários países podem ser
manifestações de organizações institucionais ineficientes. Não é vital
analisar apenas por que os países crescem,mas também por que eles não
crescem.
Além de North (1990), North & Thomas (1973) e Jones
(1993a;1993b), Baumol (1990) oferece exemplos históricos de como as
150 problema do "carona" ou "free-rider" ocorre quando um agente recebe beneficios sem pagar poreles, o que é realizado pelos consumidores.
56
regras do jogo podem motivar os agentes econômicosem três direções
básicas: empreendimentos produtivos, improdutivos e destrutivos. O
modelo schumpeteriano que prevê apenas empreendimentos produtivos
em inovações é expandido, de forma a englobar um espírito empresarial
não necessariamente voltado para o crescimento do produto social. O
empresário visa elevar sua riqueza pessoal e prestígio, mas pode fazê-lo
através de comportamento rent-seehing. Não basta haver um conjunto de
empresários em um dado país, mas é importante atentar para as regras
que determinarão a alocação dos mesmos em empreendimentos
produtivos ou improdutivos 16.
Além de altos custos de transação, o comportamento subjetivo dos
agentes que entram na barganha pode ser uma ameaça ao
desenvolvimento.Ideologiaspodemnão estar orientadas para a eficiência
adaptativa apontada por North, que implica em induzir inovações,
adquirir conhecimentose técnicas e suportar riscos e atividades criativas
(North, 1990: 81). Motivações culturais, ideológicas e éticas agem no
processo de escolha, e as instituições determinam o custo de cada opção.
Um exemplo dado pelo autor seria o de que a estabilidade no emprego
reduz o custo de opções ideológicas ineficientes (North, 1990: 42). O
capital institucional e ético acumulado' torna-se, portanto, uma fonte
subjetiva de crescimento (Silva, 1994), podendo evitar trajetórias rent-
seeking e ainda reduzir custos de transação.
16 Baumol (op. cit.) cita o caso da China medieval, por exemplo, em que altos burocratasgovernamentais desfrutavam de grande prestigio e em que toda propriedade pertenciaao monarca, sem garantia de direitos privados. Apesar do fluxo de inventos do períodoSung (960-1270 d.c.) não houve estimulo para a indústria e atividade individual.
57
Regras formais, informais e o modo de tomá-las cumpridas
estimulam a eficiência, portanto, quando encorajam a mobilidade de
fatores, aquisição de habilidades, produção ininterrupta, transmissão
rápida e barata de informações, e a criação de tecnologias. Podem,
contudo, encorajar também barreiras à entrada, restrições monopolistas,
e impedir o fluxo barato de informações (North, 1990:65). A estabilidade
proporcionada pelas regras de atuação é condição necessária mas não
suficiente para o crescimento (op.cit.: 84).
É interessante apontar o conceito de equilíbrio institucional
estabelecido por North. Nesta situação simplesmente não há adaptação
alguma, pois a relação custo-beneficiodos agentes envolvidosno processo
não a estimula:
"Equilíbrio institucional seria uma situação em que, dado o poder
de barganha dos jogadores e o conjunto de relações contratuais que
formam as trocas econômicas totais, nenhum dos jogadores julgaria
vantajoso despender recursos na reestruturação dos acordos." (North,
1990:86)
Mudanças nos preços relativos, portanto, levam à reestruturação
dos termos do acordo estabelecido, quando os agentes percebem ganhos
políticos ou econômicos.Para isto pode ser necessário alterar as regras
que fundamentam a troca, sendo neste caso alteração das restrições
formais. Em caso de restrições informais ocorreuma erosão e substituição
contínua de padrões comportamentais e convenções ultrapassados ou
ineficientes. Neste processo, são despendidos recursos, quando são
58
percebidas as oportunidades e ganhos de alteração, na formação de
organizações intermediárias, ou mediadoras, que realizem a mudança e
seus beneficios. São grupos de interesse (lóbis), comitês políticos,
associações comerciais, por exemplo (1990: 87). Os recursos canalizados
para tais grupos aumentam coma maior intervenção do governo,e podem
dar margem a empreendimentos reni-seehing. Neste caso, a trajetória de
crescimento pode ser comprometida.
o processo de mudança é incrementaI, ocorrendo de maneira
evolutiva. Alterações descontínuas ocorrem, mas não são a regra.
Guerras, revoluções, conquistas e desastres naturais geram
descontinuidades, além de revoluções, as quais geram alterações nas
restrições formais existentes (não necessariamente nas informais).
Quanto às revoluções:
"0 resultado através do tempo tende a ser uma reestruturação das
restrições em geral - em ambas as direções - de forma a produzir um novo
equilíbrio que está longe de ser revolucionário." (North, 1990:91)
Em seguida à caracterização de North a respeito da mudança
institucional, resta-me examinar outros dois pontos básicos em sua
análise: a trajetória da mudança e a relação entre instituições e
desempenho econômico.
Sobre o pnmeiro ponto, já apontei suas colocações acerca da
possibilidade de uma trajetória ineficiente. Na perspectiva evolucionária
as instituições ineficientes deveriam ceder lugar às eficientes, mas North
59
aponta que isto pode não ocorrer. No caso, o país em questão veria seu
processo de crescimento interrompido, e tal situação talvez forçasse uma
mudança institucional positiva. Tal ajuste, entretanto, nunca é imediato,
dados os custos de transação.
North aponta Marx como pioneiro na análise institucional,
mostrando o vínculo entre relações de produção e forças produtivas, entre
o estado da tecnologia e os direitos de propriedade correspondentes.
Restrições da natureza determinavam a organização institucional
humana, ou sua "superestrutura". Sua crítica à visão marxista é a de que
os incentivos à atividade produtiva são dados no modelo, e este aponta de
maneira teleológica uma determinada trajetória, que toma-se
"necessária". North nega um happy end como algo "necessário" (North,
1990: 132).Domesmomodoargumenta Schumpeter:
'~ maioria das civilizações desapareceu antes de ter tido tempo de
encher por completo a medida de sua promessa." (Schumpeter,1984: 171)
Configuraçõesinstitucionais ineficientes podem durar no tempo da
mesma forma que tecnologias ineficientes duram no tempo. Quando duas
tecnologias diferentes competem, a menos eficiente pode vencer caso haja
uma descontinuidade e avanço em sua pesquisa, terminando por ser
monopolista. Esta adquiriu rendimentos crescentes e predominou. Altos
custos fixos que geram escala, efeitos de aprendizado, coordenação e
expectativas adaptativas, cumulativas de sucesso são fatores que auto-
reforçam a tecnologia ineficiente. Toma-se dificil abandoná-la (North,
1990:94).
60
A competiçãoentre tecnologiasé na verdade uma competiçãoentre
organizações que as detém. Por isto é que retornos crescentes e mercados
imperfeitos são forças de mudança institucional. Os altos custos fixos das
tecnologias são análogos ao alto custo de implantação de aparatos
institucionais. As oportunidades estabelecidas pelas regras geram efeitos
de aprendizado nas organizações. Contratos geram o efeito de
coordenação. Surgem regras informais a partir das formais, que ampliam
seu alcance. Regras sobre trocas e contratos estáveis influenciam as
expectativas adaptativas, reduzindo incertezas. Deste modo, surge o que
North denomina trajetória de dependência (path dependence). Há uma
inércia no caminho da eficiênciaou da ineficiência 17.
A trajetória resultante, porém, não é algo irreversível, ou
inevitável. As escolhas dos agentes podem revertê-la. Há apenas uma
tendência, conforme aponta o autor. Configurações ineficientes também
apresentam rendimentos crescentes, inclusive pela elaboração de modelos
subjetivos que racionalizam tal concepção,comono caso da CEPAL e da
Teoria da Dependência na América Latina!". Neste ponto, é interessante
lembrar a concepção de Schumpeter (1984) a respeito do papel dos
intelectuais na destruição das instituições protetoras do sistema
capitalista, promovendoidéias e organizando o movimentooperário.
"Uma vez definido o rumo de uma trajetória de desenvolvimento, a
rede de externalidades, o processo de aprendizado das organizações, e a
17 Um exemplo histórico é a Northwest Ordinance, que no século XVIII estabeleceu atrajetória de crescimento dos EUA no século XIX (North, op. cit.: 98).18Como já comentei no item 1.1, a Teoria da Dependência (Cardodo & Faletto, 1970) prega a"autonomia" como sendo fundamental para eliminar a "dependência", o que envolve voltar-se para omercado interno e praticar o protecionismo. A ampliação do comércio com nações maisdesenvolvidas fatalmente levaria à exploração e, se houvesse crescimento, seria dependente.
61
modelização subjetiva historicamente derivada dos problemas reforçam
este rumo. " (North, 1990:99)
Concluindo a análise do modelo institucional de Douglass North,
chegamos à questão do desempenho econômico. Seu objetivoé ressaltar a
necessidade de uma teoria dinâmica da mudança, incorporada à teoria
neoclássica, que possibilite analisar o desempenho econômicono longo
prazo. A importância e o lugar das instituições foram já bastante
analisadas aqui, restando apenas a necessidade de mais algumas
observações,e de apontar elementos que discutirei no próximo item, que
trata dopapel do governo.
É importante a discussão a respeito do regime democrático de
governo. A democracia aumenta a eficiência do mercado político,
facilitando a interação entre representantes e representados, através da
redução dos custos de transação. Mesmoassim, imperfeiçõesexistentes no
mercado político contribuem para o fato de que poucos países se
aproximaram do modelo neoclássico de crescimento, já que a política
molda as regras econômicas(North, 1990: 110).Política e economia estão
decisivamente interligadas, e regimes democráticosnão são garantia de
crescimento.SegundoNorth:
"Os países do Terceiro Mundo são pobres porque as restrições
institucionais definem um conjunto de benefícios a atividades
políticas/econômicas que não encorajam a atividade produtiva". (North,
1990)
62
o desempenho de longo prazo está vinculado às mudanças
institucionais incrementais que ocorremao longo da história de um país.
Países desenvolvidospreservaram o aparato que estimula o crescimento
ao longo destas mudanças. A política evita a destruição deste aparato
assim comoparece ser o único instrumento de reversão de uma trajetória
ineficiente.
1.3. O papel do governo na análise institucional.
Até agora foi possível elencar os principais conceitos da NEI, que serão
utilizados no restante do trabalho. Foi visto que a principal função das
instituições ou regras do jogo consiste em reduzir custos de transação, e
incentivar as trocas produtivas. As regras informais são de adesão
voluntária, geralmente por força de costumes e tradição, mas não são de
exigência obrigatória. No caso das regras formais, características de
mercados complexos, há a necessidade de obrigatoriedade no
cumprimento, bem comode penalidades no caso de infrações. Os conflitos
que por ventura houverem necessitam de um juiz, que seja o mais
imparcial possível e garanta o cumprimento das regras dojogo:oEstado.
North (1990)destaca esta importante função pública, ressaltando a
dificuldade em se formatar um aparato governamental que forneça
garantia de cumprimento ("enforcement")das regras de modo imparcial.
A proteção às regras de direito de propriedade e incentivo ao sistema de
63
mercado apresentam oscilações de acordo com o tempo e lugar, o que
demonstra esta difiiculdade.
o que podemos inferir da NEI acerca do papel do estado refere-se,
portanto, à definição e proteção de regras, no que destacamos três
aspectos:
a) O estado determina regras formais, VIa decretos do Poder
Executivo e leis através do Poder Legislativo (inclusive a Constituição);
b) O estado traz a garantia de cumprimento ("enforcement")
através do Poder Judiciário;
c) O sentido da atuação do estado nos casos "a" e "b", na forma de
seus integrantes (políticos e burocratas), é determinado por regras já
existentes, incluindo a Constituição, podendo estas ser tanto formais
(regras de direito administrativo) como informais (dados da cultura
específica do país em questão ou da cultura administrativa existente).
Mudanças institucionais podem eventualmente alterar este sentido ou
trajetória.
O governo, portanto, determina e é determinado por regras, de
maneira distinta de acordo com tempo e lugar. O que a análise da NEI
nos oferece é um modelo que possibilite destacar qual o lugar do aparato
estatal no mesmo, com resultados em termos de redução ou não de custos
de transação. Mostra um padrão "ideal" de intervenção, devendo os casos
distintos do mesmo ser objeto de análise institucional.
64
Uma extensão das conclusões da NEI pode ser feita no estudo de
países de industrialização tardia ou recente, nos quais o estado
desempenhou funções que ultrapassam o tipo "ideal" até aqui descrito. O
caso do Japão pode ser aqui incluído, pois nele o estado teve atuação
marcante a partir do início do processo de industrialização, no século XIX.
De posse do instrumental dos capítulos anteriores, resta-nos analisar o
papel do estado para que tenhamos um aparato analítico que sirva de
referencial para o estudo da política industrial japonesa.
O que é apontado pela NEI é que nem todos os países conseguiram
sustentar seu crescimento no longo prazo. O caso dos países
subdesenvolvidos ou de industrialização tardia seria um exemplo deste
fato, e de como variou o padrão de intervenção estatal. Muitas vezes
países verificaram surtos de rápido crescimento, mas o mesmo não se
manteve. Meu intuito ao estudar o caso japonês não é mostrar que o
estado naquele país representou apenas e tão somente o tipo "ideal" da
NEI ou dos neoclássicos tradicionais, mas sim qualificar seu padrão de
intervenção de acordo com os conceitos da NEI, para que possamos
abstrair a trajetória dominante gerada pelo aparato institucional
existente.
Przeworsky (1990) elenca três trajetórias possíveis quanto ao
padrão de intevenção governamental. O governo pode intervir agindo
segundo (i) os interesses do povo; (ii) interesses próprios ou (iii) interesses
do capital. No primeiro caso, o governo é "agente perfeito do público", no
segundo é autônomo em relação à sociedade, servindo aos interesses de
65
burocratas e políticos. No último caso serve de maneira instrumental e
necessária aos interesses docapital produtivo e dos capitalistas.
o primeiro caso depende de condições bastante restritivas, e
desenvolvimentos recentes em Ciência Política e em Economia Política
mostram problemas na identificação entre opinião pública e resultados
em eleições parlamentares. A ação de grupos de interesse pode levar à
aprovação da vontade de gruposminoritários.
No segundo caso, os interesses do capital não são atendidos, e a
organização burocrática age em interesse próprio. É instrumental apenas
a este grupo social, sendo autônoma em relação à burguesia, sendo esta
uma tese de origem marxista. O Estado sempre recebe influências de
grupos sociais, mas o grupo que consegue predominar são aqueles que
compõea máquina governamental. (przeworsky, 1990:50).
A NEI colocaa possibilidade da autonomia, na medida em que não
determina um único sentido para as intervenções e papel do governo. O
marxismo; como bem coloca Przeworsky (1990:51), enfatiza o governo
instrumental ao capital como sendo a regra, e não a exceção.A NEI já
prefere explicar várias circunstâncias de subdesenvolvimento justamente
pelo fato de a instrumentalidade não ocorrer (além de enfatizar grupos
sociais e não classes). Os direitos de propriedade não são necessariamente
protegidos do mesmo modo em épocas e lugares distintos. Como aponta
Jon EIster (cit. por Przeworsky, 1990:55):
66
"Marx nunca teve êxito em provar que o Estado em uma sociedade
capitalista deve ser um Estado capitalista".
o terceiro caso,portanto, é tão raro quanto os dois anteriores.
A NEI aponta funções ao governo (e à democracia) que o tomam
instrumental ao capital e à eficiência dos mercados. O "juiz imparcial"
seria a principal delas, além da imposição de regras formais. Nesse
sentido, o aparecimento dos estados nacionais está relacionado à
crescente complexidade das trocas através da história, o que gerou um
processo de mudanças institucionais, A visão tradicional de estágios de
crescimento, em que a contínua especialização e divisão do trabalho
acompanham a expansão dos mercados, North acrescenta o elemento
institucional, definindo o papel das regras que apóiam e estimulam o
mercado (1990: 118-30).
O comérciode pequena escala que ocorria em pequenas vilas auto-
suficientes era totalmente baseado em restrições informais. As trocas
ocorriam a baixos custos de transação, pois havia grande interação entre
os agentes, que não eram muitos. A baixa divisão do trabalho implicava
em altos custos de transformação. A violência era a forma de coação, ou
seja, o poder de polícia era privado e não havia uma terceira parte como
árbitro imparcial. Estas são as características predominantes na
antigüidade.
Na Europa medieval ocorre o crescimento dos mercados, o que
eleva os custos de transação, pois o número de agentes envolvidos
67
aumenta e as trocas são mais impessoais, havendo pouca interação.
Recursos já devem ser utilizados para mensuração de atributos das
mercadorias e para garantir o cumprimento dos contratos. Não há ainda
uma estrutura política e hierárquica formal. Restrições informais e redes
sociais ainda predominam, como valores éticos, advindos de preceitos
religiosos e códigos comerciais de conduta, com punições como o
ostracismo.
o autor ressalta a questão do agenciamento, em que os
comerciantes devem enviar parentes ou homens de confiança a mercados
longínquos. Há o risco de defecção e de roubos, a necessidade de medir o
desempenho, maior com o volume das mercadorias. A garantia do
cumprimento dos contratos em regiões distantes era extremamente dificil.
Instituições como pesos e medidas, unidades de conta, métodos contábeis,
e proteção de regiões por nobres possibilitaram as trocas.
o desenvolvimento do mercado de capitais e das manufaturas leva
a uma ordem política e jurídica coercitiva, no surgimento dos governos
nacionais. Fica patente o continuum de regras informais a regras formais.
Laços pessoais e o risco do ostracismo não são suficientes para limitar o
comportamento dos agentes. Há uma transição de códigos de conduta e
ações voluntárias para a garantia fornecida pelo governo. Olson (1993), já
citado, concorda com a passagem de ações voluntárias para não-
voluntárias, destacando que o governo não surge de um "contrato"
voluntário, criticando North a este respeito. North, porém, ressalta em
sua obra o surgimento do governo como uma etapa posterior à de regras
informais e voluntárias. Além disso, coloca a questão da barganha entre
68
grupos políticos, e da trajetória e mudança institucional como
dependentes do poder de barganha. Ou seja, o governo pode assumir
configurações contrárias a vários grupos sociais, de acordo com a
configuração dopoder político.
Há a necessidade de uma terceira parte que garanta os contratos,
mas esta trajetória, comojá ressaltado, pode não culminar em eficiência
econômica.O governo absolutista era ambíguo, pois era também fonte de
incertezas, comotributação desmedida em face de crises fiscais. Comojá
apontado, a limitação do poder absoluto a partir da Inglaterra no século
XVII aumenta a eficiência domercadopolítico, e também do econômico.
Tanto Olson como North destacam a harmonia dos elementos
constitutintes do regime democrático com os elementos que estimulam o
crescimento. A eficiência políticaaumenta com organismos
representativos, reduzindo custos de transação, ao mesmo tempo em que
a incerteza acerca dos direitos de propriedade e liberdades individuais é
menor quando a sociedade não está sujeita a ações autocráticas do
governo. Tais regras incentivam a iniciativa produtivista (Olson, 1993;
The Economist, 1994).
Com a especialização crescente cada vez mais recursos e
trabalhadores são canalizados para as transações (North, 1990: 121),
como nas atividades de comércio, finanças, bancos, seguros, e de
coordenação. As mudanças organizacionais foram inovações, que
incrementaram a mobilidade dos fatores, reduziram custos de transação,
e dividiram riscos.
69
A partir da análise do contexto de ongem do governo, a visão
institucional chega a uma definição:
'Podemos, como uma primeira aproximação, enxergar o gouerno
simplesmente como uma organização que provê proteção e justiça em troca
de receita. Isto é, nós pagamos ao goverrw para que ele estabeleça e
garanta os direitos de propriedade". (North & Thomas, 1973: 6)
Estabelecida esta definição, alguns pontos devem ser examinados.
O primeiro diz respeito ao gouerno como redutor de custos de transação. O
segundo diz respeito aos fatores que levam o governo a agir reduzindo
custos de transação, mas em uma trajetória favorável ao crescimento.
Algumas funções governamentais caracterizam-se pela
indivisibilidade no consumo, como no caso da defesa nacional e justiça.
North lembra que grupos voluntários não substituem o governo nestes
casos, pela possibilidade de comportamento free-rider. A garantia dos
direitos de propriedade, com a extensão e complexidade das trocas, é uma
função tipicamente governamental. Porém, a atuação do governo pode
estancar o crescimento, sendo dificil delimitá-la, mesmo quando sabemos
que é imprescindível. Por isto, o autor formula a seguinte pergunta:
"Se não podemos viver sem o estado, não podemos viver com ele, do
mesmo modo. Como fazer com que o estado aja como uma terceira parte
imparcial?" (North, 1990: 58).
70
A dúvida sobre a intervenção correta por parte do governo diz
respeito ao segundo ponto acima levantado, ou seja, a quais fatores levam
o governo e a sociedade nele representada a seguir determinado rumo. O
governo "faz diferença", mas tal diferença depende, na visão institucional,
de dois fatores: das restrições informais e doprocesso político, e dos custos
de transação envolvidos neste. As instituições determinam o desempenho
no longo prazo, mas estes dois fatores determinam o rumo da eficiência
(North, 1990: 137-8). Duas conclusões são possíveis:
a) o crescimento têm ocorrido historicamente dentro de aparatos
institucionais coercitivos (não há anarquia em países desenvolvidos);
b) o poder coercitivo estatal têm sido empregado historicamente de
maneira não favorável ao crescimento.
As restrições informais são as regras e padrões de comportamento
que moldam a maior parte de nossas atividades diárias, como vimos
acima. O desenvolvimento das trocas gerou a necessidade de regras
formais que assegurassem sua vigência, e gerou a necessidade do próprio
governo. Valores transmitidos culturalmente são parte destas regras, e
podem trazer noções de incentivo ao trabalho, honestidade e integridade.
Estes elementos dispensavam uma terceira parte no início, mas hoje
convivem com ela. A ideologia também atua como regra informal e molda
nossos padrões de percepção da realidade. A resistência a uma mudança
nas regras do jogo, como em uma alteração de regras formais
(constituição) origina-se de valores culturais ou ideológicos, que podem
trazer modelos subjetivos errôneos de interpretação.
71
o processopolíticopode trazer falhas na questão da representação,
dados os custos de transação em sociedades complexas nas quais é
utilizada a regra da maioria. Haveria uma distância entre eleitores e
eleitos, e surgem grupos de interesse para forçar alterações e preservar
regras. Tais grupos reduzem custos de transação, aproximando os agentes
de seus representantes políticos.Nesse sentido, a política é uma arena de
"transações multi laterais" (Niehans, 1987: 678). O governo irá agir de
acordo com decisões políticas, sendo vital aprimorar o processo de
decisões e de relação entre o governoe o setor privado. Aomesmo tempo,
comoressalta Tirole (1992: 113-4),o governopode agir em favor do setor
privado e dos consumidores em casos de informação imperfeita
"facilitando a aquisição de informação", aumentando o bem-estar e
eliminando custos de informação e transação. Isto também ocorre através
de regras que garantem direitos e deveres em caso de contratos
incompletos (emvendas simples).
Antes do governo, "redes" sociais complexas balizavam as relações
econômicas,estabelecendo regras. A questão que pretendo levantar neste
trabalho é que o próprio processo político, que envolve as decisões do
governo e as relações deste com o setor privado, também envolve estas
"redes", que nada mais são do que restrições informais, estabelecidas
também por grupos de interesse. Isto gera ainda maior flexibilidade das
regras, que irão adaptar-se a necessidades mutáveis. As "redes" e o
governo são capazes de gerar uma interação regularizada entre os
agentes. É interessante apontar aqui a posição de Cooter (1987: 459),
autor que critica a posição de Coase de uma tendência à cooperação no
72
setor privado, e admite uma posição especial para o governo, que será
lembrada nos próximos itens:
"(...) o papel do governo de lubrificar acordos privados, mais do que
de formular comandos, é muito favorecido na compreensão econômica
atual da regulação. "
Alguma forma de regulação através de redes e interações multi
laterais pode ser vantajosa. É importante examinar os componentes
culturais e éticos destas redes em cada sociedade, e entender como elas
podem reduzir custos de transação e incentivar o crescimento.
"Se as economias realizam os ganhos do comércio por criarem
instituições relativamente eficientes, éporque sob certas circunstâncias os
objetivos privados daqueles que detém o poder de barganha para alterar
as instituições produzem soluções institucionais que mostram ser
eficientes ou que culminam em soluções eficientes." (North, 1990: 14)
North afirma que o aparato institucional age como um fator de
produção. O governo, dentro deste aparato, também deve ser um fator de
produção. Ele é capaz de "lubrificar" o mercado, e reduzir custos através
de interação contínua. O rumo da interação, contudo, permanece a cargo
do processo político, e das restrições informais existentes.
Retomando a problemática levantada por Przeworsky (1990),
concluímos que segundo a NEI o governo atende a duas ordens de
interesse: (i) interesses da riqueza produtiva pública ou privada e
73
(ii) interesses da riqueza improdutiva pública ou privada. Os
interesses são sempre privados, sendo a palavra "público" utilizada para
bens e serviços coletivos, mas que ao final são do interesse privado que os
recebe. A riqueza produtiva pública envolve a supressão das falhas de
mercado, ou o fornecimento de bens e serviços nos quais o mercado não
opera ou opera de modo insatisfatório (educação básica e capital humano,
por exemplo). A riqueza produtiva privada é atendida pela proteção e
garantia de direitos de propriedade, tributação eficiente, infra-estrutura,
etc. A riqueza improdutiva pública envolve atender a interesses de
burocratas e legisladores sem que haja agregação de valor ao produto
social, e a riqueza improdutiva privada envolve a ação de lóbis, barreiras
alfandegárias, etc.
A classificação de Przeworsky seria então inserida nestes dois
campos. O "governo do povo" pode abrigar tanto a trajetória produtiva
quanto a improdutiva, não sendo então utilizado. O "governo do capital"
pode ser tanto produtivo quanto improdutivo, e o governo autônomo pode
enquadrar-se no caso da riqueza pública negativa. A riqueza pública
produtiva seria de interesse do capital produtivo. A autonomia é
considerada prejudicial, em nosso entendimento, devendo ocorrer apenas
em relação aos interesses da riqueza improdutiva. Ao atender à riqueza
produtiva, o governo estará sendo instrumental, portanto (a própria
aplicação imparcial ou autônoma da justiça é instrumental, nesse sentido,
segundo aNEl).
A trajetória resultante acaba estando vinculada aos modelos
mentais (e valores neles embutidos) seguidos pelos agentes e grupos
74
SOCIaIS(North & Denzau, 1994). Tais valores e modelos são forçados à
mudança de acordo com mudanças tecnológicas e necessidade de redução
de custos de transação (comono surgimento do governo, acima apontado).
Tal mudança, contudo, não é necessária, segundo a NEI.
A forma organizacional do governo pode refletir o "estado das
artes" existente, efetivando do modo mais eficiente os objetivos
governamentais. A implementação eficiente de objetivos depende desta
forma, que apresenta baixos custos de transação ao mesmo tempo em que
os reduz no setor privado. 19
A preocupação de Przeworsky (1990) é relativa às barreiras ao fim
do capitalismo, como se ele já devesse ter acabado. Podemos argumentar
que ele assume várias formas e graus de acordo com as instituições,
modelos mentais e tecnologia existentes, hegemônicas no jogo político. O
capitalismo, como ressaltou Schumpeter (1984), não é de todo
indestrutível, e formas degenerativas do mesmo podem perdurar em
equilíbrio (como deduzimos de North, 1990).
19sresser Pereira (1989) aponta um padrão cíclico para a intervenção governamental, segundo asnecessidades do sistema econômico. Sua organização e produtos oferecidos implicam em maior oumenor intervenção, variando através da História. Atua emfalhas de mercado, na indústria nascente,bem-estar, políticas macroeconômicas e de P&D. A disfuncionalidade e reversão cíclica surgemquando tais limites são ultrapasssados e o governo age contra o mercado. A medida deste ponto deinflexão não é, contudo, fornecida pelo autor, bem como o paradigma teórico de análise. Sob o pontode vista neoclássico e neoinstitucional, podemos adotar a medida de custos de transação, a qualdetermina o ponto de disfuncionalidade. Outra diferença seria quanto ao determinismo. O cicloimplica em regularidade ou recorrência nos acontecimentos, o que não existe na NEI. Nesta, há ojogo entre fatores objetivos e subjetivos, mais aleatório do que necessário. Os diferentes momentostecnológicos, nesta perspectiva, levam a diferentes custos de transação e padrões de intervenção. Acada momento histórico, portanto, há um ótimo de intervenção, mesmo que falhas de governo(processo político) ou modelos mentais não impliquem na chegada ao mesmo. A disfuncionalidaderefere-se tanto ao conteúdo (o que ele oferece) quanto à forma. O mercado econômico e o mercadopolítico desenvolvem-se paralelamente, mas não de forma necessariamente harmônica.
75
A hipótese do governo como um fator de produção será examinada
no capítulo seguinte, em que buscarei caracterizar o padrão de
intervenção governamental na sociedadejaponesa. Dentro de um aparato
institucional favorável ao crescimento formado historicamente, o Japão
chega no século XXa um modelo de governo que impulsiona e protege o
mercado, reduzindo custos de transação e eliminando incertezas. O
governo japonês acaba sendo instrumental à riqueza produtiva, em um
sentido "market-friendly". Utilizando os conceitos obtidos até o momento
a partir da análise institucional, procurarei demonstrar esta hipótese.
76
2. Japão: instituições, setor privado e network state.
o capitalismo no Japão suscita dúvidas e constrangimentos àqueles que
acreditam na economia de livre mercado. Afinal, a presença do governo e
de seus ministérios é fortemente observada e sentida em vários âmbitos, e
a coordenação entre setor público e privado é também um traço
significativo daquele país. A relação público-privado existente gera
denominações como"Japan Incorporated" e "capitalismo organizado", que
buscam uma diferenciação em relação ao ocidente, e um meio-termo entre
uma economia de mercado e uma economia centralmente planificada.
Diferenças existem, mas minha hipótese é de que o mercado funciona
comonunca, graças a um aparato institucional que oprotege e estimula, e
que fez com que a atuação, do governo (e do MITI, na questão da política
industrial) fosse limitada às falhas de mercado.
As diferenças, comoexaminarei agora, residem nas instituições, ou
seja no próprio aparato institucional. Como foi apontado no capítulo
anterior, as instituições são as regras do jogo, formais e informais, que
moldam o campo de atuação e escolha dos agentes. A cultura japonesa
possui padrões característicos e regras informais que nos ajudam a
entender o desempenho econômico do país, e isto o diferencia,
obviamente, de qualquer nação ocidental. Este fator - as regras informais
- será levado em conta comoum diferencial, e envolvem a cultura, a ética,
e padrões informais de conduta. Regras formais envolvendo normas sobre
direitos de propriedade e estímulos a inovações, sobre o processo político e
77
sobre a forma de interação público-privado também explicam grande
parte da diferença.
Todos estes fatores "lubrificam"o mercado, e reduzem custos de
transação. Grande parte das relaçõesformais e informais entre o governo
e o setor privado, que parecem indicar dirigismo e controle, são na
verdade regras que facilitam as transações e a cooperação, reduzindo
custos e assimetrias informacionais. O mercado político torna-se mais
eficiente, contribuindo para a eficiência do mercado econômico. A
capacidade institucional (WorldBank, 1993) para intervir é, portanto,
uma característica japonesa.
A seguir, apresento aspectos históricos sobre a evolução
institucional japonesa, estabelecendoa importância das regras formais e
informais no desenvolvimentodaquele país. Em seguida, mostro como
tais regras levaram a uma configuraçãoespecífica quanto ao padrão de
intervenção governamental.
2.1. Mudanças institucionais: aspectos históricos.
As relações entre instituições e desempenhomostram que o crescimento
sustentado é um processo gradual, que exige um aparato de regras
formais e informais favorável.O casojaponês é um exemplode que forças
institucionais não produtivistas foram superadas (Jones, 1993a). O
crescimento intensivo, que implica em aumentos na renda per capita,
78
antecede a RevoluçãoMeiji (1868),já ocorrendono shogunato Tokugawa
(1600-1868), sendo que fatores institucionais e políticos contribuíram
para este processo. O processo como um todo antecede este último
período, quando já havia aumento na produtividade agrícola, crescimento
populacional e a formaçãode classes médias.
É rejeitada a visão de que nesta época havia apenas um estado
feudal estacionário (Jones, 1993a:36),já havendo vitalidade empresarial,
produtividade crescente, urbanização e modernização. A política da era
Tokugawa libera forças de mercado. O absolutismo diminui após 1650, os
samurais perdem prestígio etornam-se comerciantes. De 1600 a 1650 a
produção agrícola quase dobrou, e a população cresce apenas 45%.
Aumenta a fronteira agrícola e a difusão de inovações técnicas, surgindo
manufaturas de brinquedos, vernizes, guarda-sóis e calçados. Em 1850 o
padrão de vida era superior ao da Inglaterra. Como exemplo de regras
informais ou fontes subjetivas é possível destacar a ética de matiz
confucionista, que possui elementos calvinistas, como frugalidade,
educação, diligência e racionalidade (Morishima, 1987).
Mudanças nas regras do jogo ocorrem a partir de 1850, com
pressões para a abertura comercial (Jones, 1993b). Na abordagem
institucional, a mudança das regras depende do poder político das partes
envolvidas, e no caso do Japão houve controvérsias acerca da abertura
(Morishima, 1987). Ao final, os grupos favoráveis à abertura e
modernização foram vitoriosos, mas sempre com o objetivo de competir
em pé de igualdade como ocidente.
79
Na Restauração Meiji de 1868 já haviam as condições
institucionais necessárias para o crescimento,estruturadas no shogunato
Tokugawa, envolvendo garantia de contratos, altos níveis tecnológicos,
altos Índices de alfabetização,e alta produtividade na agricultura.
o governo teve papel importante no incentivo à industrialização,
mas nunca houve planejamento central (Jones, 1993b).Após deter de 40
a 50%do total de investimentos no país, de 1868a 1910,o governoiniciou
um processo de privatização, estimulando o mercado através de maior
concorrência internacional. Apósa 11Guerra, vigorou a ética de trabalho
e baixo consumo,o que estimulou ocrescimentoda poupança nacional.
A industrialização da Era Meiji foi uma das formas de crescimento
experimentadas, na qual ° governo foi extremamente importante. O
Japão, portanto, já vinha construindo um aparato institucional de
incentivo ao crescimento a partir do século XVII, sem o qual não é
possível entender o crescimento atual, que será examinado neste
trabalho.
2.2. Instituições e o papel das "redes".
As regras formais e informais balizam a relação entre governo e setor
privado dentro de uma trajetória de eficiência.A ética da cooperação é
sempre presente, e caracteriza a relação público-privado. O
comportamento da burocracia ministerial é um exemplo interessante e
80
comrepercussões em termos de elaboração de políticas, e será destacado a
seguir. No capítulo seguinte, examinaremos como a política industrial
confirma os elementos aqui apresesntados.
Segundo Richardson & Flanagan (1984) podemos distinguir dois
períodos em relação ao processo de elaboração de políticas
governamentais: um período de controle que dura até meados da década
de sessenta e um período de persuasão a partir daí. A persuasão
significava ministérios com maior independência, liberalização do
comércioexterior (em 1962),e decisõesmenos arbitrárias, com a criação
de comitês de coordenação e grupos de discussão (formais e informais).
Comoressaltam os autores, desenvolveram-se:
"(...) atitudes cooperativas desenvolvidas através de relações
duradouras e laços pessoais profundos entre grupos de interesse e oficiais
do governo".
Através desses canais consegue-se a articulação - formulação e
expressão através de canais de comunicação- e a agregação - combinação
de interesses em torno de propostas específicas - entre governo e
empresas. Esta mudança será analisada com mais detalhes, mas já
identificamos a questão da maior interação entre os agentes, tanto do
governocomodo setor privado, e a questão-chave da cooperação.
A forma cooperativa de relação é também inferida da análise de
Aolri (1988). Para este autor, é possível distinguir três visões básicas
81
sobre o papel da burocracia governamental no Japão: burocracia racional,
adversária e pluralista.
A primeira versão afirma que a burocracia contribui para o
desempenho econômico como um agente independente dentro do processo
político-econômico. Sendo racional, pode ser líder (é a versão "Japan
Inc."), ou complementar ao mercado, criando expectativas consensuais e
fundamentos para investimentos das firmas que sejam consistentes no
nível de políticas macroeconômicas. A política industrial visa incentivar
a indústria nascente e a tomá-la competitiva internacionalmente. Um dos
mecanismos básicos é a criação de cooperativas, para investimentos em
pesquisa e desenvolvimento (P&D).
A visão da burocracia governamental como adversária é típica de
autores neoclássicos tradicionais, que pregam a não intervenção total, e
um "estado-mínimo". A burocracia possui a tendência de tomar-se
autoritária com o tempo, passando a ser uma adversária do setor privado.
A última versão, da burocracia pluralista, pode ser sintetizada na
seguinte afirmação:
"Não é claro quem de fato possui o poder real de tomada de decisões
nas organizações japonesas. "(Aoki, 1988: 268)
Há no Japão uma tríade entre a burocracia ministerial, o PLD
(partido Liberal-Democrata) e grandes corporações privadas. As versões
anteriores apenas enfatizam o poder da burocracia ou do PLD. A
82
característica fundamental, porém, é o pluralismo, e o papel dual da
burocracia, inserido em um certo ambiente institucional. A burocracia
pode agir como:
a) regulador racional semi-autônomo("policymaker");
b) quase-agente representante de interesses específicos.
A burocracia não é monolítica racional ou auto-sustentada, mas
uma multitude de entidades: ministros, agências e departamentos. Cada
entidade possui uma esfera própria de ação, havendo também relações
intra-burocráticas. Além disso, as duas funções acima apontadas são
interligadas, pois cada burocrata leva seus representados do setor privado
à elaboração de políticas.
Três ministérios, de Finanças (MOF),Assuntos Internos (MHA)e o
Ministério da Indústria e Comércio Internacional (MITI) disputam os
melhores candidatos aprovados nos exames para o funcionalismo público.
O progresso na carreira é rápido e há a perspectiva de trabalhar no setor
privado ou em corporaçõespúblicas após a aposentadoria. O burocrata é
considerado então um "amakudari" ("descendente dos céus"). Além da
especialização, possuem uma rede de ligações e canais de comunicação
informais que formaram durante a carreira, o que os torna valiosos.
Agem como "interfaces", ou elos de ligação, entre os ministérios e as
corporaçõesprivadas (Aoki,1988).
83
o PLD recruta os "amakudari" para a Dieta, preferindo os agentes
vindos do MOF e do MHA. As associações de indústrias recrutam os
vindos doMITI e doMOF (op.cit.). Os burocratas na ativa os respeitam e
estabelecem ligações (sem subordinação), visando também formar uma
reputação própria. Outro mecanismo importante no Japão são os zohu,
grupos informais de membros do PLD na Dieta, agrupados para assuntos
de cada ministério. Estes parlamentares possuem influência junto aos
ministérios e são importantes para a a provação de projetos de lei. Os
recursos de cada ministério dependem, segundo Aoki, dos fundos fiscais e
financeiros alocados; da ação dos "amakudari", que propagam suas
políticas ao setor privado; e da ação dos "zoku"na Dieta. Neste ponto, é
importante o efeito de sua atuação e performance junto ao público,
devendo o ministério então fazer um balanço entre interesses específicose
interesses públicos.
Os conflitos de interesse são arbitrados através de coordenação
intra-burocrâtica, e não por barganha direta e aberta entre os grupos. A
barganha social torna-se assim quase-social, o que caracteriza o
pluralismo administrado. Este começa a tomar forma a partir dos anos
sessenta, em que surgem novos grupos com novas demandas sociais,
conformejá apontaram Richardson & Flanagan (1982).
Um tipo de entidade burocrática tem funções claramente
delineadas, e são os "genkyoku" (departamentos originários), que
regulamentam e ao mesmo tempo representam interesses (o "Machinery
and Information Industry Bureau" do MITI relaciona-se com a
"AutomobileIndustrial Association",por exemplo). Há um segundo tipo
84
de burocracia que orienta departamentos responsáveis pela coordenação
("coordination offices"),planejamento e orçamentação. Na orçamentação,
o "Budget Bureau" pertencente ao MOF é o órgão coordenador, e no
planejamento da "Economic Planning Agency" (EPA), há um
"CoordinationBureau".
Abarganha na orçamentaçãonão é multilateral, mas submetida ao
arbítrio de um órgão de coordenação,o "BudgetBureau" (Aoki, 1988: 275-
6) No planejamento econômico,o papel principal do "Planning Bureau" é
mediar interesses e o consenso para metas e estabilidade
macroeconômicas(op.cit.:276-7).
É possível ainda estabelecer uma relação isomôrfica entre a
burocracia governamental e a firma no Japão (op.cit.: 278-82). Opapel de
arbitramento, da gerência da resolução de conflitos intra-organizacionais
é similar. Na firma japonesa não há separação clara entre especialização
(unidades) e controle (gerência). A demarcação das funções é flexível
(rotatividade), trazendo autonomia e soluçõesrápidas a menores custos. A
burocracia também experimenta rotatividade entre os ministérios, sendo
preparada para absorver vários interesses e com maior conhecimento e
autonomia. A coordenação na firma também não é hierárquica e
centralizada, mas semi-horizontal. A sintonia fina das necessidades de
cada unidade é feita diariamente por manifestações das próprias
unidades via "kanban", havendo os pedidos aos subcontratantes "just in
time" (rápida adaptação a flutuações de demanda, redução de
desperdícios, mostra estrangulamentos, reduz gerentes etc.). Na
coordenaçãointer-ministerial também não há controles hierárquicos, mas
85
um órgão coordenador. este facilita o arbitramento de interesses e a
coordenação horizontal. Hierarquias amplas geram distorção de
informações, e sua redução reduz custos de informação e de transação.
Na burocracia governamental, contudo, não há tanto interesse em
repartir conhecimentos, como é o caso na firma, sendo este um capital
político. A acumulação deste também depende da contribuição ao bem-
estar social,para o que contribui a cooperação.
A orientação do processo político pode ser promocional ou
administrativa. No primeiro caso, recebe-se e promove-se demandas
alterando relações de poder entre os grupos sociais. No segundo caso, a
absorção e o arbítrio ocorrem dentro das regras estabelecidas. O
"pluralismo administrado" é compatível com o primeiro caso conseguia
absorver demandas sem reduzir beneficiosde outros.
A flexibilidade institucional japonesa é exemplificada pela cnse
fiscal ocorrida a partir dos anos 70. Houve redução do pluralismo,
visando-se reduzir dotaçõesorçamentárias entre os ministérios. Em 1981
é formado um Conselho de Reforma Administrativa, visando-se um
governo pequeno e eficiente. Há menos pluralismo, mas permanece a
coordenação, para alocar recursos e resolver disputas entre ministérios
sobre áreas novas de atuação. Em 1985, cria-se a "Management and
Coordination Agency". Para o combate ao corporativismo cria-se o
"Admnistrative Inspection .Bureau", vinculado à "Agency of
Administrative Affairs". Fica clara a adaptação das regras a alterações
ambientais, o que já definimos no primeiro capítulo com o conceito de
86
eficiência adaptativa de North. O :MITI muda também sua atuação,
tornando-a mais voltada à elaboração de políticas industriais genéricas,
do que a atender a interesses específicos, como veremos no próximo
capítulo.
Os mecarusmos institucionais descritos até agora indicam
diferenças importantes em relação ao planejamento econômico japonês. O
padrão de intervenção governamental, portanto, acaba sendo singular e
sugere uma nova denominação. O que procurarei demonstrar é que este
padrão não implica em rever os mecanismos de mercado, e sim torná-lo
mais eficiente. O pluralismo administrado acima descrito e a flexibilidade
institucional reduzem custos de transação através de uma maior
interação entre os agentes. Ao mesmo tempo, há organizações e regras
que levam a um compromisso com a eficiência. A eficiência adptativa
evidencia-se ainda pela mudança no padrão de intervenção
governamental ocorrido no pós-guerra.
O conceito de "network state", ou "estado em rede" (Burlamaqui,
1990) é bastante adequado ao governo no Japão. A formação deste padrão
distinto de intervenção está ligado à inflexão ocorrida na maneira de
elaborar e implementar políticas públicas (incluindo política industrial) a
partir da década de sessenta, que já apontamos acima. O pluralismo
administrado que caracteriza a burocracia é um dos elementos desta
forma de governo. O padrão anterior é o de "development state", ou estado
desenvolvimentista, que também teve sua versão latino-americana.
87
o modelo de development state é relacionado à burocracia
weberiana presente nas grandes corporações(Evans, 1993).É um estado
essencial para a "empresa capitalista de grande escala", e para a
acumulação de capital. Os burocratas públicos operam de forma
competente e coerente aos objetivos corporativos, em uma organização
meritocrática. Em seu momentohistórico, comodestaca Evans (1993: 116)
operou-se "a construção de uma estrutura sólida e competente como um
pré-requisito necessário ao funcionamento do mercado". Nos países
subdesenvolvidos, o estado supriu deficiências de capital, de capacidade
empresarial e assumiu riscos, preparando o crescimento posterior. A
infra-estrutura econômica e industrial básica é criada com participação
do governo, através de créditos, empresas estatais e políticas de proteção
à indústria nascente.
As funções básicas dodevelopment state são (Evans, 1993: 117):
a) extrair excedente;
b) fornecer bens públicos;
c) fomentar expectativas empresariais de longo prazo, concedendo
incentivos e assumindo riscos;
d) implementar ajustes econômicose transformações industriais.
Mecanismos de interação como setor privado que sempre existiram
no Japão em função das instituições informais existentes irão tornar o
88
estado "simultaneamente um network e um development state"
(Burlam aqui, 1990). A última forma cumpre uma missão básica na etapa
de industrialização e crescimento iniciais. O "network" é vital para etapas
posteriores de redefinição da ação estatal, frente a constantes mudanças
tecnológicas. A redefinição de algumas funções desenvolvimentistas, após
o período de ocupação norte-americana, torna possível diferenciar os dois
padrões, que deixam então de ser simultâneos.
Como destaca Okimoto (1988), o estado japonês teve que legitimar
sua interferência na busca do consenso, utilizando padrões culturais de
harmonia, lealdade (Morishima, 1988), e da primazia do coletivo sobre o
individual. Mas o segredo de sua eficiência reside no direcionamento
voluntário do setor privado a seus objetivos. Mesmo que canais de
comunicação já existissem no governo desenvolvimentista, esta seria uma
característica própria de outro padrão. Como destaca Okimoto (1988:
314):
"Talvez o Japão possa ser caracterizado como um estado 'network',
'relacional' ou 'societário" no sentido de que opoder do governo é unido ao
do setor privado (the government power is interwined with that of the
private sector). O poder do governo depende da sua capacidade de
trabalhar de maneira efetiva com o setor privado, com cada lado se
esforçando para levar em conta as necessidades e objetivos do outro. Desde
modo, o poder político no Japão é exercido através de um processo
complexo de interação entre os setores público e privado, envolvendo um
sutil dar e receber, sem uma confrontação aberta que resulta na imposição
forçada da vontade de um lado em detrimento da do outro. "
89
A definição de Okimoto permite relacionar esta forma de
intervenção com o instrumental teórico definido ao longo do primeiro
capítulo. A interação seria um dos aspectos, que reduz custos de
transação e reduz incertezas. A cooperação,em uma forma produtiva e
que estimule a competição,também é caracterizada pela política do gioe-
and-tahe itit-for-tat de Axelrod,1984).
São funçõesbásicas do network state (Burlamaqui, 1990):
a) coordenar em última instância;
b) impulsionar o crescimentoeconômico;
c) estabilizar expectativas;
d) consolidarpactos.
o ambiente institucional envolve canais de comunicação ou
"redes", como o Japan Import-Export Bank, JETRO - Japan External
Trade Organization, grupos de estudos pl políticas públicas, comitês do
MITI, e outros, entre setor público e privado, onde procuram-se
mecanismos extra-mercado de pré-conciliação das decisões. Há sempre a
tentativa de adequação, via mecanismos políticos e institucionais, entre
objetivos das grandes empresas e objetivos e ações estatais. O Estado
pode ser capaz, como ressalta Jones (1993b: 110), de direcionar a
economia através do ciclo do produto, havendo "direcionamento pelo
governo sem rigidez".
90
As redes ou canais de comunicação com o setor privado levam à
caracterização de Evans de autonomia inserida do governo (este autor
ainda não diferencia o estado desenvolvimentista do network). Os
conceitos que embasam sua afirmação são os seguintes (1993: 136):
a) coerência corporativa interna: os burocratas aderem aos
objetivos da organização e não a metas individuais. Caracterizam-se pela
meritocracia na escolha de seus funcionários. São burocráticos, e não pré-
burocráticos e patrimonialistas, e procuram impor as forças de mercado;
b) autonomia inserida: o estado é autônomo, mas estabelece redes
de comunicação como setor privado, para negociar metas e políticas.
O sucesso do development state traz em si seu desaparecimento,
pela maior independência do setor privado quanto à obtenção de recursos.
Segundo Evans, isto ocorre porque a característica básica de autonomia
inserida do estado desaparece, e o mesmoperde seu domínio sobre o setor
privado.
"(...) a autonomia inserida tem sido, numa extensão surpreendente,
seu próprio coveiro." (Evans, 1993: 137)
Aqui, no momento histórico em que tal situação se verifica, surge a
redefinição do padrão de intervenção - com a reconstrução do estado - em
um padrão de network state. Neste, continua a haver interação com o
setor privado, mas em uma relação de simbiose e não de direção estatal.
Ocorre uma adequação de objetivos entre setor público e privado, em que
91
objetivos privados são facilmente absorvidos e implementados pelo
estado, mas em que este ainda impõe coordenação e discute objetivos de
política industrial, e conciliando suas decisões às do setor privado. O
pluralismo administrado é uma de suas características, e a simbiose não
implica em uma total submissão do governo ao setor privado, mas indica
que este representa seus interesses de uma maneira bastante efetiva, e
há uma busca de conciliação de interesses públicos e privados.
A questão polêmica levantada pelo conceito de simbiose diz
respeito à delimitação entre espaço público e privado. Tanto Burlamaqui
como Evans concluem que ela deixa praticamente de existir. Minha
hipótese é de que isto é uma tendência, muito significativa, mas ainda
não pode ser tomado como algo absoluto. A flexibilidade institucional
necessita de autonomia para rever trajetórias e evitar rumos ineficientes
gerados por pressões de burocratas, tanto públicos e privados, como ficou
evidenciado na questão da reforma fiscal e administrativa. Burlamaqui
afirma que as "redes" acima citadas evoluem e tornam o estado apenas
um "complemento funcional" ao sistema econômico (1990: 11). A contínua
inserção do estado ao sistema destrói sua autonomia. O governo é
funcional no sentido de que age como um fator de produção,
impulsionando o mercado, mas as instituições ainda guardam autonomia,
o que mostra-se necessário.
A simbiose com o setor privado é evidenciada pelo fato de que o
governo usa e direciona o ambiente competitivo, sem controles gerenciais
diretos. Ao mesmo tempo, é presente no sistema econômico, já que não
deixa questões-chave ao livre jogo do mercado, mas há controle da
92
expansão da burocracia governamental (1990: 14-15). Como destaca
Pempel, quanto à questão da reforma administrativa (1982:8):
'~o contrário, a atenção foi concentrada primariamente na redução
do tamanho e do custo da burocracia nacional. Como resultado, o Japão
foi a única potência no mundo industrializado a controlar o crescimento
da burocracia nacional por mais de uma década".
As características de network surgem paralelamente ao
desenvolvimentismo,constituindo-senaquelas citadas acima. Para que se
consolidem pactos, decisões e expectativas, foram indispensáveis os
canais informais de comunicação entre setor público eprivado. Em âmbito
interno, laços entre funcionários do governo surgem por terem
frequentado as mesmas escolas, e pela identidade corporativa e eficiência
weberiana existente. As regras informais reforçam as formais. Como
salienta Evans:
"Todas as decisões sobre o Estado japonês enfatizam o caráter
indispensável de sistemas informais, tanto internos como externos, ao
funcionamento do Estado. "(1993: 123)
A quase totalidade dos primeiros-ministros japoneses já ocupou
cargos nos ministérios do Poder Executivo (Burlamaqui, 1990: 11).
Mecanismos extra-mercado, como os apontados acima, confirmam a
afirmação de Evans (1993: 124) de que "a política industrial japonesa
depende fundamentalmente dos laços que vinculam o MITI e os maiores
grupos industriais.
93
A seguir examinaremos a evolução da política industrial no pós-
guerra, praticada pelo MITI. As hipóteses de atuação em "rede" e a
questão do pluralismo administrado poderão ser comprovadas, bem como
os conceitos da análise institucional. Ao final, poderemos estabelecer
conclusões acerca do papel das regras institucionais e sobre o caráter da
intervenção governamental.
94
3.Aspectos da política industrial japonesa.
Neste capítulo irei abordar a evolução da política industrial japonesa,
destacando as regras que nortearam sua implementação a partir do final
da ocupação do país, após a 11 Guerra Mundial (lIGM). A visão de
Johnson (1992) nos diz que a alta qualidade da burocracia governamental
e seu comprometimento com o crescimento e industrialização explicam o
desenvolvimento japonês, mas esta é apenas parte da resposta. A
argumentação que apresentarei sugere que a atuação governamental não
foi fruto apenas das adversidades enfrentadas, pois outros países também
enfrentaram circunstâncias adversas e não se desenvolveram da mesma
forma. Aspectos institucionais favoreceram a atuação eficiente do estado-
desenvolvimentista, bem como o próprio comprometimento da burocracia
com o desenvolvimento.
A versão de que valores culturais são os responsáveis pelo sucesso
do Japão, promovendo o consenso, é descartada por Johnson (1992: 8),
que prefere destacar motivações situacionais como causas. Estas seriam:
desenvolvimento tardio, falta de recursos, necessidade de comerciar e
restrições ao balanço de pagamentos. Outros países subdesenvolvidos, no
entanto, enfrentaram as mesmas circunstâncias com desempenho
inferior. A visão de que aspectos institucionais, como regras formais e
informais de comportamento, não são relevantes, deixa de lado fatores
normativos que podem determinar a trajetória de crescimento de longo
prazo de um país (North, 1990). Sob as mesmas circunstâncias, países
com aparatos institucionais distintos seguirão trajetórias distintas.
95
o que procuro destacar é que não basta destacar a coordenação dos
investimentos pelo governo e suas agências, ou mesmo admitir a
cooperação entre setor público e privado como sendo possível. É preciso
admitir as regras de atuação que estão por trás dos agentes e que limitam
e direcionam a ação dos mesmos, e reconhecer que o aparato por elas
formado não se encontra em todos os países com o mesmo sentido. Há pré-
requisitos para uma intervenção mais ativa e eficiente do governo, sem os
quais esta torna-se apenas possível, mas pouco provável.
3.1.A evolução da política industrial no pós-guerra.
A política industrial envolve dois aspectos: microeconômico e
macroeconômico (Johnson, 1992: 28). No primeiro caso encontram-se as
políticas de racionalização: das empresas (novas técnicas,equipamentos,
reduções de custos, gerenciamento); do meio-ambiente (transportes e
localização industrial); do conjunto industrial (aparato para a
cooperação); e da estrutura industrial (alcançar níveis superiores de
competitividade). No último aspecto estão as políticas que transformam a
proporção entre os setores primério, secundário e terciário, e entre
indústrias capital ou trabalho-intensivas. Em países subdesenvolvidos o
mercado por si não levaria a resultados eficientes.
o governo japonês interviu de forma ativa no sistema econômico,
através do MITI. A industrialização ocorreu sob seus auspícios e
coordenação, embora o caráter da intervenção tenha mudado com as
96
circunstâncias. De um caráter desenvolvimentista o estado japonês passa
a ganhar um caráter mais regulatório, quando sua industrialização é
amadurecida.
o estado regulador edita as formas e regras sobre questões
econômicas. Estabelece os incentivos à atividade econômica e garante os
direitos de propriedade. Em países subdesenvolvidos a intervenção é mais
direta, como produtor ou através de políticas industriais, configurando o
estado desenvolvimentista. O estado não só estabelece regras básicas, mas
também promove metas específicas e setores industriais específicos. Há
uma estratégia para a formação e transformação da estrutura industrial.
No primeiro impera a racionalidade de mercado, e no segundo o
planejamento racional-? ganha força (Johnson 1992: 18-9).
O desenvolvimentismo foi a característica básica do estado japonês
a partir da Era Meiji (desde 1868), passando pelo militarismo dos anos 30
e 40 e pela era de crescimento rápido dos anos 50 e 60. Nos anos 70 o
caráter apenas regulador toma-se mais forte, sendo que já na década
anterior ocorrem pressões para uma mudança nesse sentido.
A colaboração com o setor privado têm início na Era Meiji
(Johnson, 1992), em que o estado favorece empresas privadas na
aquisição de tecnologia. Os requisitos eram comprometimento com as
metas nacionais fixadas pelo governo e comprometimento com o poder
militar "país rico e forte militarmente". Antes da I1GMjá surge, portanto,
uma regra básica para os agentes: competitividade internacional. Os
20 Johnson diferencia planejamento racional de planejamento ideológico (países socialistas).
97
impérios industriais privados durante a era militarista eram os
"zaibatsu", protegidos pelo governo. De 1900 a 1930 há uma fase de
liberalização, interrompida pelo poder crescente dos militares a partir de
1926. Neste ano inaugura-se uma fase de controle burocrático, que
perdura até 1945.
Após a IIGM, com a ocupação norte-americana, ocorrem mudanças
institucionais. A cooperação continua a existir entre empresas e governo,
mas há a desfamiliarização e modernização dos "zaibatsu". A iniciativa de
planejamento é da burocracia, que concedia acesso a recursos, beneficios
tributários, aprovação de importação de tecnologia e de "join ventures",
em troca do cumprimento das metas por ela indicadas (não havia
obrigatoriedade formal). Também era utilizada a autorização para a
formação de conglomerados bancários, o que caracteriza os "keiretsu".
o esforço maior deste período foi a reconstrução dos setores de aço,
ferro e carvão (Kagami, 1995: 125). Importações de petóleo dirigiam-se
para a indústria de carvão,que então fornecia para a de aço e ferro. Havia
racionamento de mercadorias e crédito, e controle de preços. Em 1948 o
conselheiro norte-americano J. M. Dodge propõe extingüir controles
governamentais e subsídios, bem como buscar um orçamento equilibrado.
Em 1949 foram adotadas políticas de:f1acionistas e recessivas,
ainda sob a ocupação aliada (Johnson, 1992). Foram feitos cortes ao
Banco de Reconstrução Financeira (BRF), fonte de capital para indústrias
prioritárias. Com a Guerra da Coréia (1950-1954) os EUA compram
munição, caminhões, uniformes, equipamentos de comunicação e outros
98
produtos do Japão. Foi o "boom" de 1952-3. Há então escassez de capital
para os investimentos necessários, e monta-se uma estrutura financeira
especial, o "overloaning".
A política de "sobreempréstimos" ou "overloaning" era dupla: a
garantia governamental dos empréstimos feitos pelas empresas aos
bancos privados ("city banks"); e os bancos estatais (como o "Japan
Development Bank") de último recurso. Empresas emprestam dos bancos
além de sua capacidade de pagamento, e estes "sobreemprestam" do
Banco do Japão. Este possuía poder indicativo, sendo os empréstimos
supervisionados pelo MITI. O crédito seletivo toma-se então um
instrumento importante para os projetos de crescimento. Além disso, a
estrutura montada leva aos "keiretsu", conglomerado que envolve
normalmente um grande banco, várias empresas industriais, e uma firma
comercial que importa matérias-primas e bens não existentes no país
(Johnson, 1992). Diferem dos "zaibatsu" por não terem estrutura familiar
e por competirem mais entre si.
Johnson ainda destaca que a estrutura do conglomerado bancário
toma os gerentes menos sujeitos à vontade dos acionistas, podendo então
buscar objetivos de longo prazo ao invés da lucratividade de curto prazo.
No longo prazo importaria a conquista de mercados externos, qualidade e
desenvolvimento do produto. Cada empresa buscava o acesso a um banco,
e redes de contato facilitavam o crédito (op. cit.: 205). Os bancos também
dependiam das empresas. Com o aval do governo e conseqüente redução
de riscos há mais espaço para que os bancos concorram pela sua parcela
de depósitos e empréstimos (Johnson, 1992).
99
Após a Guerra da Coréia o Japão resolveu limitar a política de
"sobreempréstimos" e substituir o Banco de Reconstrução. O Comando
Aliado vetou que este continuasse a ter recursos não-orçamentários.Em
1950 foi criado o que viria a ser o Export-Import Bank of Japan, que
facilitou importações designadas pelo MITI. O "Japan Development
Bank" (JDB) foi criado em 1951, tendo atuação limitada pelos aliados
para evitar alta de preços.Deveria financiar equipamentos de longoprazo
em operações de alto risco, e operava em sintonia com o "Enterprises
Bureau" do MITI. Com o fim da ocupação em 1952 o JDB ganha maior
autonomia. Recursos são ainda canalizados pelo sistema de poupanças
postais em 1953 para um orçamento de investimentos, o "Fiscal
Investment and Loan Plan". Este foi controlado apenas pela burocracia
até 1973.
A partir de 1951 o governo priorizá os setores de aço, carvão,
construção naval, fibras sintéticas e fertilizantes químicos, que
apresesntavam altos custos de produção (Kagami, 1995: 126).O JDB e o
"Export-Import Bank of Japan" (EXIMBank) canalizavam recursos para
os mesmos. O JDB financiava projetos de infra-estrutura e plantas de
geração de eletricidade e transporte marítimo. O EXIMBank priorizava a
construção naval.
Um aspecto importante, ainda do período da ocupação, foram os
cortes na burocracia estatal, sendo que 10.000 funcionários foram
demitidos entre 1949e 1951,e o MITI passa a ter 3.257 funcionários em
1952contra 13.822em 1949(Kagami, 1995).O MITI torna-se "mais coeso
e enxuto", e a senioridade passa a ser critério para a estabilidade.
100
o "Enterprises Bureau" edita um plano para a racionalização
industrial em 1949, bem como o "Industrial Rationalization Council".
Este órgão é característica bastante relevante da economia japonesa e
mostra os antecedentes do "estado em rede" ("network") posterior. Possuía
45 comitês e 81 subcomitês, reunindo executivos, burocratas do MITI e
acadêmicos, ligando governo e empresas (Johnson, 1992: 216). Propôs
reformas gerenciais, elevação de produtividade e controle de qualidade
(conceitos absorvidos dos EUA).
o "Management Committee" divulgou junto à imprensa e
empresários idéias sobre gerência e administração científica, através de
publicações e conferências. O autor destaca nos anos 50 o "boom" da
administração científica. As idéias, portanto, auxiliaram a unir objetivos
e atitudes dos agentes econômicos.
A Lei sobre o Capital Estrangeiro ou Foreign Capital Law (FCL) é
de 1950 e trouxe ao MITI o poder sobre as importações. Produtos
acabados que competiam com os nacionais eram preteridos em favor de
bens de tecnologia moderna e maquinaria. A estratégia era fornecê-los a
preço baixo e buscar licenças de patentes, "know-how", e "join ventures".
O licenciador estrangeiro submetia-se ao "Foreign Investment
Committee", para licenciar tecnologia, adquirir ações, e emprestar ou
dividir patentes (Johnson, 1992). A FCL foi editada pelo Comando Aliado,
e o Japão lutou para que suas estratégias fossem possíveis (Johnson,
1992: 217).
101
o MITI ainda edita a "Enterprises Rationalization Promotion Law"
em 1952, concedendo subsídios para a instalação de máquinas e
equipamentos, testes e amortização de investimentos em P&D.
Compromete os governos locais e o governo central a investir em infra-
estrutura, reduzindo custos de produção (Johnson, 1992: 218). Neste ano
termina a ocupação aliada.
As disposições da Lei Anti-monopólio (AML) contrárias às
restrições de produção ou vendas, colusões para fixação de preços e
constituição de "holdings" não foram respeitadas. Criou-se a "Fair Trade
Commission" (FTC).
Na década de 50, a indústria japonesa não era competitiva
internacionalmente, e o MITI julgava a competição uma "barreira" ao
desenvolvimento. Tentou minimizar a "Antimonopoly Law" (AML), e o
confronto com a FTC era freqüente (Hiroshi, 1986). Na segunda metade
da década, foram priorizadas indústrias de "fibras sintéticas, plásticos,
petroquímica, eletrônica e maquinaria". Importações com alta tecnologia
eram encorajadas (Kagami, 1995: 127).
Em 1952 o MITI obtém um instrumento de controle, o orçamento
de comércio exterior. Pode prejudicar a importação de empresas que não
cumpra seus "conselhos" informais. Argumenta que conselhos informais
não estão incluídos na AML (Johnson, 1992: 225), e acaba reformando a
lei em 1953, possibilitando a cooperação, limitação da produção de
indústrias deprimidas, reduzir custos, compartilhar tecnologias e
promover exportações. Em 1958 tenta extingüir a AML, mas o ano
102
seguinte marca0 fim da era de maior poder do MITI (1952-1961),
marcada pela Guerra da Coréia e pela recessão de 1954. Em 1955 é criado
o Partido Liberal Democrata (PLD).
É importante ressaltar ainda uma estrutura voltada para as
exportações, envolvendo o "Suprema Export Council" (1.0 ministro, MITI,
Min. Finanças, Banco do Japão e líderes empresariais) e a "Japan
External Trade Organization" (JETRO). Este órgão era um "serviço de
inteligência" e visava principalmente difundir informações (op.cit.: 230)
acerca das necessidades dos mercados externos. Importantes custos de
transação foram reduzidos, facilitando as trocas para o Japão, que à
época não conseguia informar-se sobre tarifas e especificações. A JETRO
passou a operar em 55 países. Inicialmente financiado por empresários,
foi absorvido pelo MITI em 1954, passando a ser um instrumento de
política.
Os EUA e países ocidentais exigem a abertura do mercado japonês
em 1959 na conferência do GATT, em Tokyo. As pressões externas e
também internas iniciam um processo de liberalização em 1960.
Na década de 50, portanto, Johnson destaca três fatores para
explicar o crescimento: um "consenso popular" sobre metas nacionais;
uma "herança organizacional" que remonta às relações cooperativas entre
governo e empresas na segunda metade dos anos 20; e uma "manipulação
institucional" desde a dominação aliada e a Guerra da Coréia, como a que
estabelece os "keiretsu". O consenso é fruto das circunstâncias, da
destruição pela I1GM. A cooperação como herança surge da falência do
103
dirigismo e da auto-organização, da similaridade da formação educacional
e da migração de burocratas para o setor privado e para a política
("amakudari"). O autor destaca que tais fenômenos são singulares mas
não são apenas "bens culturais" (Johnson, 1992: 239-40).
A visão institucionalista, que baseia este trabalho, mostra que as
regras de comportamento formais ou informais são importantes. As
últimas envolvem valores culturais e éticos característicos de cada
sociedade, que podem reduzir custos de transação e facilitar as trocas e a
cooperação entre os indivíduos. O que é peculiar no Japão é justamente a
redução de tais custos em função de valores cooperativos já existentes, o
que Chandler (citado por Johnson, 1992: 238) denomina "estruturas
sociais" explícitas ou implícitas. Estas estruturas não surgiram
momentaneamente, mas já constituíam o "capital ético" (Silva, 1994) da
sociedade japonesa, formado através do tempo.
A partir de 1955, com a criação do PLD, os políticos passam a
incrementar seu poder em relação aos burocratas. Estes foram
preponderantes primeiro na versão militar de 1932 e depois como
burocratas econômicos. O processo político passou a ser mais importante,
e disputas internas da burocracia geravam buscas por apoio político.
Em 1959 importações de têxteis (lã e algodão) foram liberalizadas e
formou-se o "Cabinet Council on the Advancement of Trade
Liberalization" em 1960. Este prepararia a liberalização para outras
indústrias. Um plano é adotado e em 1963 cerca de 80% da economia
passaria pelo processo (Johnson, 1992: 251). De 1960 a 1965 as
104
exportações mais do que dobraram, mostrando competitividade. Um
plano de crescimento é formulado no gabinete, e o :MITI investiga a
competitividade dos setores industriais em relação aos EUA e países
europeus através do "Industrial Structure Investigation Council", em
1961. A conclusão do conselho era que, apesar do bom nível de
competitividade, a estrutura da indústria deveria ser modificada.
As pequenas e médias empresas são primovidas através de lei
especial, em 1963, dando incentivos fiscais para modernização de
equipamento e absorver tecnologia (Kagami, 1995: 128). Em 1967 é
criada a "Agency for Promotion of Small and Medium-Sized Industries"
para monitorar o processo.
o :MITI propõe reduzir competidores, aumentar o tamanho das
restantes e controlar o aumento da capacidade instalada, ou seja, pregava
fusões e cartéis de coordenação de investimentos. O conselho sobre
estrutura industrial é integrado ao conselho de racionalização (de 1949).
Em 1963 o diretor do "Enterprises Bureau" defende a "administração por
incentivos", em que a direção é determinada pelo governo, e a
implementação das políticas é feita voluntariamente pelo setor privado.
Na definição de Johnson (1992: 256):
"Enquanto problema político, administração por incentivos vem a
significar comitês de burocratas, industriais e financistas em cooperação,
que concordariam a respeito de taxas de investimentos, promoveriam
colusões, desencorajariam novas firmas a entrar nesses setores, e em geral
105
tentariam construir uma estrutura industrial comparável à dos EUA e
Alemanha Ocidental, as duas fontes externas de referência. "
A política industrial foi reformulada, portanto, em função da
inevitabilidade da liberalização. A competitividade foi o objetivo principal
estabelecido. O MITI convoca seus oficiais com experiência no Mercado
Comum Europeu, em política internacional e em política industrial
(Johnson, 1992: 257). Em 1963 o MITI consegue apoio para o que viria a
ser a "Special Measures Law for the Promotion of Designated Industries",
com duração já limitada em cinco anos. Visava elevar a competitividade
de alguns setores: aço, automóveis e petroquímica, e o principal
instrumento para isso seriam comitês reunindo burocratas públicos e
privados e do setor bancário. Promove isenções tributárias e legaliza a
"cooperação" frente à AML.
A lei foi submetida à Dieta, mas não foi votada, pois o PLD e o
gabinete não se empenharam para isso. Houve resistência da comunidade
bancária e de empresários, opostos ao MITI. O nacionalismo deste impôs
condições na concessão de um empréstimo de uma empresa a uma
empresa japonesa da cidade de Osaka, do "keiretsu" do Sanwa Bank.
Exigiu a substituição da presidência da empresa e o controle do
empréstimo. A comunidade empresarial da região tornou-se adversária do
MITI.
Em 1964 o Japão enfrenta uma recessão, gerada por fatores como a
incerteza pós-liberalização, entrada de importações e capacidade ociosa
em função de excesso de investimentos dos "keiretsu". O MITI consegue
106
implementar políticas cooperativas através da orientação administrada
("guidance"),um mecanismo informal. O autor não concorda que é fruto
de uma cultura específica,mas podemosdizer que esta facilita o processo.
Com a perda do poder explícito dos anos 50 os mecanismos informais
seriam os únicos instrumentos restantes (a "SpecialMeasures Law" não
foi aprovada). O relacionamento entre governo e setor privado é forte
desde os anos 30, a burocracia é respeitada e tida comorepresentante do
interesse nacional. Houve coordenação de investimentos e de produção
(petroquímca, têxteis sintéticos) bem como a promoção de fusões
(encorajadas por créditos doJDB).
A neutralidade é pré-requisito para o bom funcionamento do
sistema, para que não haja suspeitas de "captura" pelos agentes
regulados (os protestos maiores contra esta política viriam nos anos 70).
Nos anos 60 houve a suspeita de que o MITI teria prejudicado a
Sumitomo, empresa privada do setor de aço, e favorecido as estatais do
setor (eram 2 estatais e 4 privadas). A Sumitomo havia cumprido as
metas de exportação e não queria reduzir sua produção para sustentar os
preços. Acaba cedendo, e o MITI promove a fusão das duas estatais na
Japan Steel, em 1970.
Na década de 60, portanto, teve início a abertura gradual da
economiajaponesa, antes fechada e comcontatos como exterior mediados
pelo governo (Johnson, 1992: 238). Em 1980 a FCL foi abolida e
completou-sea abertura. Regras formais, comoo controle do orçamento de
comércio exterior, foram substituídas por regras informais de política
industrial.
107
Como demonstram Levy & Spiller (1994), a existência de regras
informais aceitas pelos agentes torna desnecessário editar leis formais
detalhistas, quando analisam a regulação do setor de telecomunicações
em alguns países. Este é o caso do Japão:
"(...) o sistema econômico japonês repousa em uma base legal - mas
normalmente em leis curtas e genéricas, sendo a 'Special Measures Laui'
um bom exemplo. "(Johnson, 1992: 273)
Quando a "guidance" assume o papel principal entre os
instrumentos à disposição do MITI, o estado desenvolvimentista sofre
uma evolução. Segundo Johnson, seria uma continuação do mesmo, mas a
caracterização de "network" é mais apropriada. As relações e a interação
entre os agentes torna-se a essência da política do MITI. Com a
internacionalização contínua haveria ainda mais reivindicação de
autonomia pelo setor privado.
Como destaca o Banco Mundial (World Bank, 1993: 182), oMITI
realiza audições junto às partes interessadas e forma um grupo de
pesquisa. Este prepara um relatório que é enviado ao conselho
correspondente. Neste são feitas as negociações pelos representantes
autorizados dos agentes envolvidos. Após a opinião do conselho os
resultados são tornados públicos e submetidos à Dieta, e só terão sucesso
se hover consenso prévio no conselho. Este aspecto é o que Burlamaqui
(1990) denomina "pré-conciliação das decisões".
108
A partir de 1965 o MITI passa por uma cnse de identidade.
Enfrenta problemas como poluição industrial, revoltas contra a
"guidance", acusações de corrupção, inflação, políticas de localização
industrial (geravam ora despovoamento, ora superpopulação), e danos
nas relações com os EUA. Em meados dos anos 70, oMITI
"(..) redefiniú com sucesso sua missão, mudou seu pessoal, deu a si
uma nova estrutura, e livrou-se de parte de sua herança que não era mais
relevante - e tudo isso enquanto reafirmava os elementos que o Japão
ainda necessitava. " (Johnson, 1992: 275)
A liberalização no Japão, é necessário dizer, foi gradual e seletiva,
primeiro em indústrias em que a competição era mais favorável. Metade
da participação teria que ser japonesa, em caso de "join-ventures".
Algumas indústrias liberadas tinham setores ligados a componentes
vitais não liberados para a competição. O MITI fiscalizava a introdução
de tecnologia estrangeira no Japão, e sempre procurava difundi-la.
Embora fosse completada apenas no final da década de 70, no caso
japonês os próprios empresários reconhecem que era uma medida
necessária, para evitar um possível isolamento.
Entre 1968 e 1969 os nacionalistas da "velha guarda" perdem
posições para burocratas mais jovens, que serviram no exterior e
conheciam a cultura do comércio internacional e as novas indústrias de
alta tecnologia (substitutas das indústrias do aço, química e têxtil).
Seriam "nacionalistas cosmopolitas" (Johnson, 1992: 281), mais
109
adequados a uma econorma industrializada e a um ambiente de
globalização.
Como já apontado, a liberalização foi gradual e precedida por
fusões, como no caso do aço. Os protestos contra a fusão das duas grandes
estatais fez com que a FTC (Fair Trade Commission) refizesse as regras
para a mesma, o que levaria a uma configuração mais eficiente. As
estatais foram obrigadas a desligar-se de algumas subsidiárias que lhe
trariam controle sobre os preços do setor (Johnson, 1992: 282). A
. liderança de preço foi evitada. Pela primeira vez a decisão foi tomada
obrigatória pelo poder Judiciário, que ouviu a FTC, acadêmicos, empresas
do sertor e consumidores e indústrias relacionados, bem como oMITI.
Este enviou depois burocratas para a Japan Steel, o que gerou sérios
protestos. Em 1969 a Mitsubishi faz um acordo com a Chrysler (EUA),
sem consultar o MITI. O governo acelerou a liberalização do setor para
1971, e a empresa americana vendeu carros japoneses nos EUA. A
liberalização partiu do setor privado, portanto, que acabou favorecido com
a injeção de capital.
Por volta de 1971 burocratas do MITI mostram-se favoráveis a um
modelo de orientação por parte do setor industrial privado. A diferença
seria o abandono de políticas de caráter microeconômico (definidas acima)
em favor de medidas macroeconômicas. Em 1971 o "Industrial Structure
Council" propõe o incentivo a indústrias "conhecimento-intensivas" como
a de computadores, "software", consultoria industrial, maquinaria
controlada por circuito integrado, e outras. Edita ainda padrões para
população e poluição, e de condições de trabalho. Sofre uma reforma
110
organizacional pouco antes do choque do petróleo, em 1973. O
"Enterprises Bureau" torna-se o "Industrial Policy Bureau", com divisões
para estrutura industrial e comportamento empresarial. É criado o
"Machinery and Information Industries Bureau".
O choque do petróleo gerou nova força ao MITI, enquanto preços e
produção precisaram de acompanhamento. Em 1974 a indústria de refino
e distribuição de petróleo sofre auditoria da FTC, que aponta a existência
de um cartel ilegal de preços. A indústria diz que agia sob orientação do
MITI. Há um processo judicial de acusação, com base na AML (pela
primeira vez). Nos anos 80 o processo foi concluído e a política de
"guidance" para restringir a produção foi proibida. A FTC ganha poderes
para destruir cartéis e reduzir preços, desmantelar "holdings" e para
iniciar processos relativos a abusos de preços, sob forte evidência.
Nos anos 60, portanto, houve o que North conceituou como
eficiência adaptativa. A economia crescia a altas taxas e tornava-se
competitiva. Pressões externas levaram à liberalização do comércio
internacional, o que acirrou a competição. O MITI revê sua política de
guidance e muda sua visão da AML, vendo nela a seguinte função:
"(...) protegendo a função da competição em estimular a atividade
industrial eficiente e a criatividade e inovação dentro da empresa fI.
(Hirosbi, 1986: 57)
O período anterior foi visto como necessário para tornar a indústria
competitiva, mas a flexibilização teria que ocorrer. Burocratas do setor
111
público e da FTC, e economistas passaram a exigir mudanças, assim como
entidades de proteção aos consumidores. Nas vezes em que oMITI
tentava a guidance ocorriam resistências.
"(...) o papel da política industrial deveria ser reexaminado de
modo a facilitar na maior extensão possível as operações efetivas do
mercado". (Hiroshi, 1986: 58)
Kagami (1995: 128) também ressalta que a influência do MITI se
enfraquece com a expansão do setor privado e com a abertura, e o órgão
passaria a preferir diretrizes gerais a controles diretos.
No início dos anos 70 a "crise de identidade" do MITI, gerada pela
crítica à sua política de guidance e pelo fim da industrialização pesada
(Torres Filho, 1991), leva o ministério a concentrar sua atuação no que
respeita ao fomento de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) em áreas de
fronteira. Os setores privilegiados são: equipamento industrial, eletrônica
de informação e aviação e energia nuclear. O MITI também atua junto a
setores "deprimidos", e na resolução de atritos comerciais internacionais
(Johnson, 1992).
As indústrias que mais sofreram com o choque do petróleo foram as
intensivas em energia, como aço e ferro, química e de papel, sendo que a
automotiva e eletrônica sofreram menos. As indústrias passaram a
buscar mercados mais conhecimento-intensivos (Kagami, 1995: 128).
112
A cooperaçãopermanece comoprincipio junto ao MITI, comono ato
de 1978 intitulado "Stabilization of Designated Depressed lndustries". As
indústrias de alumínio, construção naval e têxtil sofreram com a
competição de outros países do Leste Asiático, e o governo concedeu
crédito para equipamentos e autorizou cartéis. Entre os fatores que
influenciaram a mudança estão o crescimento e maior autonomia das
empresas, as políticas mais voltadas para o consumidor, a liberalização
do comércio e de investimentos e - destacando agentes do processo - a
ação da FTC e de economistas e acadêmicos (Hiroshi, 1986). As idéias
tiveram, portanto, seu lugar.
A eficiência adaptativa é apreendida também a partir desta
afirmação de Hiroshi (1986:59):
"(...) a política industrial do MlTI tem sido forçada a tornar-se
mais flexível para enfrentar as condições econômicas em transformação e
suas necessidades. "
A crítica à "administração orientada" e sua informalidade é feita
também por Haley (1986: 122), que mostra a tendência à manipulação e
manobras pela ausência de controles formais. Mais uma vez, destaca-se a
importância da FTC.
Cartéis e fusões são as mais polêmicas, sendo combatidas pela
FTC. Os estímulos de proteção em produtos de risco comosemicondutores,
aço, automóveis, computadores e outros surtiram efeito, e estimularam a
competição e os investimentos. Em outros setores cartelizados, no
113
entanto, o desempenho piorou, como nas indústrias têxtil, petrolífera e
petroquímica (Haley, 1986: 72).
o resultado é que a política inicial de incentivo às indústrias
nascentes foi correta, mas a flexibilização posterior (eficiência adaptativa)
evitou o fracasso, ocorrido sempre que a competição não foi estimulada. O
governo é acima de tudo um agente racionalizador e coordenador das
mudanças necessárias, adaptando linhas gerais de atuação para o setor
privado.
Como destaca Torres Filho (1991: 144), a ação do governo não inibe
a racionalidade privada, substituindo-a por uma racionalidade pública,
mas compatibiliza as duas formas através da busca do consenso. O
governo ''potencializa a ação dos agentes privados criando formas
particulares de coordenação" (idem: 143). A hipótese defendida neste
trabalho é a de que a atuação racional do governo implica em redução dos
custos de transação nos setores em que tais custos se apresentam
elevados, e que a forma de atuação necessária para atingir este objetivo
envolve a formação e manutenção de redes (networks) que facilitam a
cooperação entre as empresas. A dependência e proximidade com o MITI e
a elaboração de uma estratégia comum era mais acentuada em setores de
alta tecnologia.
As regras do jogo alteram-se em favor da eficiência e da
concorrência, portanto, e limitam a ação do burocrata do governo. A
"guidance" do MITI seria utilizada apenas no interesse público, e os
abusos seriam evitados (Johnson, 1992: 301). A proposta para política
114
industrial de 1974 gira em torno do conceito de "economia de mercado
orientada por planos". Decisõesde investimento e gastos comPesquisa &
Desenvolvimento (P&D) seriam observados pelo "Industrial Structure
Council".
A indústria de computadores recebeu incentivos desde a década de
60, em que o MITI formou "keiretsu", licenciou tecnologia e conteve a
competição internacional. O acima citado "Machines and Information
Industries" iniciou um aparato para "previsão tecnológica".As indústrias
do futuro seriam a de semicondutores, ferramentas computadorizadas,
robôs e bens de consumo com eletrônica avançada. Nestes mercados a
liberalização só ocorreria em meados da década seguinte.
No final dos anos 70 o Japão atingiu as metas dos burocratas do
pós-guerra, competindo comos EUA e Europa Ocidental (Johnson, 1992:
302).
3.2. Tecnologia de ponta e previsão tecnológica.
Os setores de tecnologia de ponta apresentam, segundo Torres Filho
(1991: 171)as seguintes características:
a) necessidade de aplicaçãocontínua de tecnologias "intensivas em
ciência", em processo e em produto. A sofisticação é acelerada nas
tecnologias de fronteira, e de alto conteúdo científico. Os diferentes
115
setores deixam de ser "de fronteira" ou passam a sê-lo de acordo com os
investimentos em P&D.
b) geram externalidades e linkages significativos na matriz
industrial. A política privilegia estas características.
c) concentram e irradiam novas tecnologias, sendo as "indústrias
do futuro".
Podemos citar ainda outra característica importante referente à
alta tecnologia, elencada por Bidault & Fisher (1994: 381):
d) envolve altos custos de transação, quando é transferida de um
agente a outro (através de licenciamentos, por exemplo). A incerteza
quanto à sua funcionalidade só é perfeitamente eliminada após a
implantação, e sempre existe a possibilidade de oportunismo por parte do
comprador ou do vendedor. As redes mantidas pelas empresas podem
reduzir tais custos.
Os gastos privados com P&D cresceram na década de 70, em
relação aos gastos públicos, mas o governo ainda exerce papel ativo em
P&D. O Sistema Nacional de Informações visa difundir novos paradigmas
tecnológicos, através de uma "teia de relações científicas, tecnológicas,
educacionais e industriais" (Torres Filho, 1991: 177).
Uma questão chave refere-se ao aparato administrativo
governamental. A pesquisa básica é responsabilidade do Ministério da
116
Educação e pela Agência de Ciência e Tecnologia tScience and Technology
Agency - STA). A pesquisa aplicada e desenvolvimento são incentivadas
pelo MITI e pela Agência para Ciência e Tecnologia Industrial (Agency for
Industrial Science and Technology - AIST).
Os setores considerados high-tec são o de informação
(semicondutores, computadores e telecomunicações), novos materiais, e
biotecnologia. De consumidor o Japão passa a ser gerador de tecnologias,
a partir do início dos anos 70, sendo que o investimento em ciência básica
ganha vulto em meados dos anos 60.
A previsão tecnológica é a base das políticas de longo prazo do
MITI (IEDI, 1994). Vinculado à STA existe no Japão o Instituto para
Tecnologias Futuras (lnstitute for Future Technology - 1FT). Este elege
áreas específicas e realiza ampla divulgação dos resultados encontrados.
O 1FT fornece diretrizes de pesquisa para a Pesquisa Exploratória de
Tenologia Avançada (Exploratory Research of Advanced Technology -
ERATO), que promove o desenvolvimento das tecnologias futuras. O
Centro de Informação para Ciência e Tecnologia do Japão (Japan
Information Center for Science and Technology - JICS) é um centro de
informação tecnológica que participa do processo. A AIST é responsável
pela tecnologia quando chega-se a um estágio próximo da aplicação
industrial.
O resultado da previsão tecnológica realizada pelo 1FT, ERATO,
JICS e AIST é consolidado em um programa de longo prazo denominado
Tecnologia Básica para Indústrias Futuras (Basic Technology for Future
117
lndustries - BTFI). Nos anos 80 é composto por novos materiais,
biotecnologia e aparelhos eletrônicos.
Há, portanto, um papel relevante para o governo em uma área que
envolve altos riscos e incertezas. A consolidação de informações visa
atender a necessidades do setor privado, sendo função do MITI
"coordenar a interação entre firmas e institutos de pesquisa" (lEDI, 1994:
12). O ministério elabora diretrizes, vincula as entidades interessadas e
concede suporte financeiro. A interação ocorre entre:
a) indústrias (grupos de empresas e associações);
b) universidades;
c) governo (MITI);
d) institutos de pesquisa.
É interessante destacar o Fuzzy Logic Project, envolvendo 77
participantes. Foi realizado em 1989 e envolve um laboratório
independente de pesquisas. É um modelo de organização em rede, que
promove a rápida difusão de informações e reduz custos para as empresas
envolvidas. Tecnologias genéricas de aplicação no longo prazo são
identificadas pela Corporação de Desenvolvimento de Pesquisa do Japão
(Research Development Corporation of Japan - JRDC). Como o
conhecimento é difundido via institutos governamentais, a incerteza
quanto à apropriação e direitos de propriedade intelectual é reduzida. A
118
questão dos custos de transação da alta tecnologia, acima apontada,
encontra desse modo um fator atenuante, graças a um "sistema de
cooperação multi-institucional" 21 (lEDI, 1994: 13).
3.3. Instituições e o caráter da intervenção governamental.
Para o Banco Mundial (World Bank, 1993), a intervenção governamental
pode ser caracterizada como "market-friendly", ou "favorável ao mercado",
no Leste Asiático em geral e também no Japão. A descrição dos
instrumentos de política industrial, porém, revela medidas protecionistas
em determinadas épocas e setores industriais. A corrente revisionista visa
negar o caráter de mercado e afirmar a importância da intervenção
direta.
A visão neoclássica implica em um meio macroeconômico estável e
um aparato legal que promova a competição, doméstica e internacional.
Condena controles de preços e distorções de preços relativos, indicando
investimento em capital humano. Os revisionistas destacam a ocorrência
de políticas industriais e intervenções no mercado financeiro. Segundo o
banco, nenhuma das posições tradicionais explica inteiramente o que
ocorreu no Leste Asiático. Uma intervenção limitada do governo é
necessária, mas sempre deve ser em sentido "favorável ao mercado":
21 É oportuno comparar a forma de relação entre governo e setor privado no Japão e nos EUA, noque se refere à tecnologia. Neste último. o governo age basicamente no incentivo à pesquisa pura,ficando a difusão e a comercialização a cargo do mercado. A interação entre setor público e setorprivado é, portanto, menor (IEDI, 1994b).
119
investimentos em capital humano, clima de competição, abertura
internacional e macroeconomia estável.
A intervenção deve ocorrer apenas onde houver falhas de mercado,
resolvendo problemas de coordenação. A redução de custos de informação
e de transação seria um exemplo, como no caso da previsão tecnológica
acima citado. Há, portanto, um arranjo institucional para a difusão de
informações. O caso japonês mostra ainda a ampla utilização de conselhos
deliberativos, em que a interação entre os agentes é promovida.
"Em contraste à formação de lóbis, nos quais as regras são pouco
transparentes e os grupos buscam, vantagens secretas uns sobre os outros,
os conselhos deliberativos visam estabelecer regras claras para todos os
participantes." (World Bank, 1993: 14)
A concessão de crédito, com juros reduzidos, era direcionada com
base em decisões do MITI e de conselhos deliberativos, e o crédito direto
condicionava-se a critérios de desempenho, o qual era monitorado 22. A
proteção setorial acabava estimulando as exportações.
A concessão de crédito em troca de desempenho internacional
também supria uma falha de mercado ou a inexistência de recursos.
Assimetrias informacionais geram a necessidade de intervenção
governamental (Stiglitz. 1994), reduzindo os riscos. O sistema de
"sobreempréstimos" praticado pelo Japão é um exemplo, conforme
22 O banco afirma que "Esforços em outras regiões para promover indústrias específicas sem umamelhor troca de informações e a disciplina dos mercados internacionais não foram bem-sucedidos.Este têm sido o caso dos programas ambiciosos de política industrial no Brasil e na Índia. (WorldBank, 1993: 22)
120
descrito acima. A informação pode ser considerada um bem público, não-
rival e de consumo coletivo. A geração de externalidades positivas
justifica a intervenção. Os gastos para sua obtenção são fixos e não
aumentam com a quantidade obtida. Ao mesmo tempo, os mercados
informação-intensivos não são competitivos, pOIS as firmas não
competiriam pela mesma informação. Agentes informados podem não
transmiti-la a não-informados (Stiglitz, 1994: 24). A incerteza e o risco
vêm do fato de não se saber se a informação é valiosa antes de que seja
adquirida (Kasper, 1994).
o governo acaba atuando em uma falha de mercado quando
monitora, através do MITI e dos bancos 2:1, o desempenho das empresas,
já que o monitoramento é uma das formas de informar. Compensa,
portanto, uma subalocação de dados (Kasper, 1994: 28-9).
o estado "network" pode promover o crescimento e a produtividade
se os mercados internos forem sempre contestáveis. A interação pode
resultar em colusões e aumento de preços, diminuição da competição e
troca de favores improdutivos. Além da cooperação, o Japão soube
preservar a competição, mesmo que oligopolística.
'~ competição baseada em contestabilidade incluía regras claras e
com cumprimento garantido, eprêmios para os vencedores." (World Bank,
1993: 93)
23 No Japão os conglomerados bancários ("kcirctslI") facilitam o monitoramento.
121
o fato de o MITI ter desencorajado a competição e formado cartéis
em certos momentos gera a crítica à posição do Banco Mundial, de que a
intervenção foi "favorável ao mercado" (Amsden & Singh, 1994; Singh,
1994). A crítica procura destacar que em países em desenvolvimento a
eficiência no curto prazo pode ser substituída pelo conceito de eficiência
dinâmica, no longo prazo. A integração com a economia internacional
deveria ser "estratégica", e não "total". A política industrial deve ser
dinâmica, visando transformação industrial e crescimento rápido (Singh,
1994: 1811).
o Banco Mundial questiona a própria eficácia da política
industrial, sustentando que o sistema econômico perseguiu suas
vantagens comparativas dinâmicas. Singh procura demonstrar que
intervenções coordenadas, consensuais, e a partir de uma estratégia
global podem levar a soluções eficientes no longo prazo, como no caso
japonês (Singh, 1994: 1814-5). O Japão construiu, portanto, vantagens
comparativas em indústrias de aço, refino de petróleo, automóveis,
computadores, e outras. A estru tura industrial do pós-guerra baseada em
têxteis e manufaturas leves não elevaria seu nível de vida em padrões
norte-americanos ou da Europa Ocidental, e seria diferente da resultante
de condições normais de mercado.
A controvérsia sobre a eficácia da política de mudança estrutural
não será discutida em maiores detalhes aqui, mas mesmo admitindo que
tal política tenha sido eficiente deve ser ressaltado que ela repousa sobre
pré-requisitos institucionais que a condicionam. As regras formais ou
informais devem buscar a competição no longo prazo, ainda que no curto
122
prazo haja protecionismo. No Japão foi conectada a metas de exportação e
desempenho, requisitos fundamentais. Com isso o sentido negativo da
medida, ressaltado pelo Banco, acaba sendo compensado. Na questão da
abertura as condições institucionais também a permitiram, mesmo que
gradual e seletiva.
A competição interna também foi estimulada no Japão, de maneira
flexível, dependendo do setor e de seu amadurecimento para competir, no
que concordam o Banco Mundial e os críticos (Singh, 1994: 1817). A
indústria nascente era protegida, mas era estimulada a competir quando
estivesse preparada. Quando seu ciclo de vida terminasse era protegida
novamente, e fusões ou sua reestruturação ainda forçvam-na a competir.
A cooperação eficiente repousa em uma burocracia com forte grau de
independência de políticos e em uma busca do consenso, facilitada por
normas éticas. Ao contrário do que postula Singh (1994: 1820), a
cooperação neste caso não elimina na verdade a competição, mas faz com
que seja obrigatória no longo prazo. A formação de cartéis, já apontada no
item 3.1, também era flexível, tendo duração limitada, e nem todos eram
bem-sucedidos (Singh, 1994: 944). Como ressaltam Amsden & Singh:
/1( ••• ) restrições a importuções poderiam. ter esmagado totalmente a
competição se não fosse pelos padrões de desempenho que as indústrias
protegidas eram forçadas a cumprir pelo governo /I. 24 (Amsden & Singh,
1994: 945)
24 Os autores citam como exemplo o caso da indústria de máquinas-ferramenta. Em troca deproteção tarifária, para os instrumentos com alta elasticidade-renda da demanda e produtividade,deveriam produzir 50% dos produtos com controle numérico computadorizado. (op. cit.: 945)
123
Foi sugerido no capítulo 2 que o governo japonês comporta-se como
um fator de produção, sendo quase sempre funcional ao sistema
econômico. O aparato institucional como o conjunto de regras que limitam
a ação pública e privada seria um fator de produção, e o governo, agindo
através de suas "redes" na política de "guidance" também poderia agir
como tal. O governo como fator de produção é também a abordagem de
Kasper (1994: 6), que utiliza conceitos da análise institucional para
avaliar o desenvolvimento do Leste Asiático, comentando inclusive o caso
japonês.
O governo japonês teria contribuído para a criação de uma infra-
estrutura "hard", relativa a transportes e comunicações, e de uma "soft".
Esta envolve as regras ou o aparato institucional, que estabelece
incentivos à inovação e eficiência e eleva a produtividade dos outros
fatores de produção. A estrutura "soft" não se deprecia com o tempo, mas
torna-se mais eficiente com o uso contínuo.
Kasper ainda argumenta que o compromisso com a liberalização
pode ser mais importante do que o estado atual de proteção (1994: 15), o
que contribui para o debate acima comentado. O compromisso em reduzir
tarifas desestimula grupos de interesse que poderiam querer mantê-las.
O que o governo estimulou no Japão foi a competição oligopolística,
caracterizada por diferenciação do produto, altos custos de transação e
informação, demanda inelástica a preços, e disputa por nichos de
mercado. Competem através de "marketing, inovação de produto e
serviços pós-venda. A contestabilidade de seus mercados foi mais forte do
124
que a atuação política de seus lóbis. Os oligopólios, definidas as regras de
contestabilidade, só obteriam lucros através de inovações.
Apesar de apresentar aspectos institucionais contrários às
disposições mais voltadas ao mercado, como o incentivo do lado da
demanda (subsídios, tarifas, controle de produção), o governo japonês
atuou também do lado da oferta, formando as duas infra-estruturas
citadas. As regras de competição, portanto, estimularam a oferta 25, além
da flexibilidade dos controles da demanda.
A conclusão sobre o caráter da intervenção é que ele não deve ser
apenas um simples observador, e nem um intervencionista ilimitado
(Kasper,1994). O que o governo japonês buscou foi um meio-termo,
suprindo falhas de mercado, estimulando a concorrência onde fosse
necessária, difundidindo informações para auxiliar a competição
internacional, e desestimulando o protecionismo improdutivo. Ele difere
de outros países do Leste Asiático por não ter enfatizado tanto a atração
de fatores móveis de produção (capital, trabalho especializado,
conhecimento e tecnologia), mas por ter incentivado a poupança, a
formação técnica e o espírito empresarial. O governo japonês, com suas
características de "rede" e de autonomia inserida, acabou sendo "favorável
ao mercado" no longo prazo.
Ainda é preCISOressaltar novamente o papel das instituições
informais. Johnson (1992), como já comentado, não aceita valores
culturais ou éticos como fundamentais, preferindo a força das
25 O que não ocorreu na industrialização da América Latina. por exemplo.
125
circunstâncias. Fica claro, porém, que elementos éticos reduzem custos de
transação e podem facilitar a cooperação entre governo e empresas. Ainda
tomam desnecessária a regulamentação detalhista por parte do governo.
Segundo Hiroshi (1986) o papel das regras informais é bastante
expressivo na atitude dos japoneses em relação às leis. O governo foi
moldado de forma militarista e nacionalista desde a Restauração Meiji
(1867-1911) e a herança da "orientação administrativa" é evidente. Os
mecanismos de orientação, porém, eram muitas vezes contatos informais
e comitês internos aos ministérios, que envolviam membros da Dieta (os
zoku). Os projetos de lei vinham de discussões e consultas, o que
caracteriza o pluralismo e as "redes" acima explicadas. A crítica principal
é a falta de transparência de atos que afetam terceiros, o que gerou
pressões para mudanças (Hiroshi, 1986: 60).
Em todos os setores industriais japoneses existem associações que
os representam, o que caracteriza seu coletivismo. O governo orienta os
grupos e não setores individuais, utilizando-os como canais de
comunicação (formais) e fóruns de discussão e negociação. É uma
característica do netuiork state, já apontada.
O grau de importância das restrições informais no Japão é ainda
evidenciado pelas atitudes frente às regras formais e aos contratos. O
senso de coletivismo é forte o suficiente para que conflitos de interesses
sejam resolvidos judicialmente em grau mínimo 2(; (Hiroshi, 1986: 62). A
ambigüidade de muitas leis também existia para dar maior flexibilidade
26 Apenas 13.000 advogados exerciam 11 profissão no Japão em 1986, contra 500.000 nos EUA,aproximadamente.
126
à "administração orientada". Os contratos escritos também não são
considerados importantes, pois os termos devem sempre acompanhar
variações das circunstâncias. A variável ética age em seu lugar.
Tanto Morishima (1982) como Kasper (1994) colocam a
importância do confucionismo para o incremento da produtividade.
Segundo o último, o confuncionismo representou uma verdadeira
inovação institucional quando surgiu, há 2.500 anos atrás. Suas regras
éticas pregam a harmonia, a interação entre as pessoas (coletivismo) e
condenam o oportunismo - inclusive para os governantes (Kasper, 1994).
Prega a atenção à vida terrena e não à uma vida após a morte, no que
assemelha-se ao protestantismo descrito por Weber (1992). A educação,
tradição, disciplina e hierarquia também teriam um papel importante. No
pós-guerra a perseverança. poupança, cooperação e repúdio às falhas
ganham destaque. O governo (desde a era Meiji) acaba assumindo a
liderança e recebendo a fidelidade dos agentes sociais (Morishima, 1987).
A análise institucionaJ demonstra a relevância dos custos de
transação, e foi visto como são amplamente reduzidos no Japão. A
capacidade institucional para praticar políticas governamentais
eficientes, está também ligada a variáveis éticas, portanto.
"Uma sociedade construída em tal entendimento coletivo pode ser
altamente eficaz em poupar custos de transação, e tende a ser mais flexível
ao adaptar sua infra-estrutura institucional a circunstâncias variáveis".
(Kasper, 1994: 14)
127
o caráter de "rede" ou "network" que caracteriza, em minha
análise, o governo no Japão, é destacado por Nakano (1994) como o
paradigma organizacional da economia globalizada. O paradigma
tecnológico refere-se à microeletrônica e a mecânica de precisão, que
tomaram mais flexível o processo produtivo. O Japão soube adaptar suas
instituições de modo a estarem em harmonia com estas transformações,
sendo as mesmas "enxutas e flexíveis" (Nakano, 1994).
As características de cooperação e reciprocidade das "redes" são
fruto de uma interação e conhecimento mútuo, e baseiam-se "em. normas e
valores éticos, dependência mútua e interesses comuns" (Nakano, 1994:
12). Segundo o autor há dois tipos de indústria oligopolista: um em que o
governo estimula a competição oligopolística mas intervém pouco, e um
outro tipo em que a competição é regulada (1994: 18-20), como na
indústria de supercomputadores. São setores de alta tecnologia em que o
governo potencializa os efeitos de P&D, também como destacado por
Torres Filho (1991).
A análise sobre o setor oligopolista em questão mostra uma
convergência com a postura do Banco Mundial (World Bank, 1993), de
que os países devem ter capacidade institucional para intervir. Nakano
parece, portanto, concordar quando afirma:
"Cabe observar, porém, que diferentes governos têm diferentes
capacidades de interuenção, Os governos de alguns países são
consistentemente mais eficientes nesse tipo de ação. Fatores como
estrutura burocrática, tipo de relação~entre setor privado e governo,
128
valores éticos dos empresários, configuração dos grupos de interesse, papel
da justiça e da opinião pública podem determinar a eficácia, ou não, das
intervenções governamentais." (Nakano, 1994: 20)
129
Conclusões:
A hipótese básica deste trabalho é a de que um determinado aparato
institucional existente na sociedade japonesa possibilitou uma cooperação
econômica eficiente entre governo e setor privado. O modelo de análise
adotado, estabelecido pela escola institucionalista, mostra os
componentes de um tal aparato: regras formais e informais, e sua
garantia de cumprimento. Vnriáveis éticas e culturais são consideradas
restrições informais. O papel destas regras é reduzir custos de transação
e facilitar as trocas e o cescimento econômico, caso sejam estabelecidas em
um sentido produtivista. É adotada uma postura weberiana, de que
valores e idéias (fatores subjetivos) são fundamentais para explicar o
progresso material, bem como a sua não ocorrência.
O estudo da política industrial praticada naquele país sugere que
foi adotada uma regra fundamental: competir internacionalmente. Já na
segunda metade do século XIX havia esta preocupação. Para que o
objetivo de tornar-se um país desenvolvido e competir com os demais fosse
atingido era necessário que o pais se industrializasse, que sua estrutura
industrial evoluísse com o tempo. O governo, como em vários países de
industrialização tardia, adotou uma postura desenvolvimentista e
procurou intervir no mercado e transformá-lo. Na década de 50 é criada
uma agência governamental encarregada desta missão: oMITI.
O MITI realizou políticas protecionistas no curto prazo, contra a
concorrência estrangeira, Impôs tarifas protecionistas, concedeu
130
subsídios, formou cartéis e controlou importações. Tais medidas, contudo,
variavam com o tempo e ciclo de vida da indústria selecionada.
Internamente, a contestabilidade dos mercados foi mantida. Havia o
compronusso e o acompanhamento informais das metas de
competitividade. A concorrência oligopolística foi incentivada, e houve
mais racionalidade em um espaço possível de intervenção, pois havia uma
regra clara transmitida aos oligopólios de que a abertura seria realizada,
a partir da década de 60. Fusões e restrições de produção visavam
proteger as indústrias em períodos recessivos ou de maior abertura, mas
foram posteriormente combatidas pelo próprio setor privado. A
intervenção com o tempo foi reavaliada, e o próprio MITI reavaliou suas
funções.
o amplo uso de comitês e conselhos deliberativos caracteriza o
"pluralismo administrado" da burocracia, e torna apropriado o conceito de
"estado em rede". A burocracia foi autônoma o bastante para promover a
industrialização, e a abertura trouxe maior pluralismo e outros grupos
sociais e agentes privados desejaram menos intervenção (além de
demandas sociais, combate à poluição, qualidade de vida, etc.). Esta
passou a existir em setores de alta tecnologia, em que os custos de
informação e transação são altos. O importante é que isto mostra o
caráter flexível das instituições, que se adaptaram a novas
circunstâncias, o que North denomina eficiência adaptativa.
A industrialização bem-sucedida e a reciclagem do papel do
governo e do MITI, no entanto, ocorrem sob um aparato institucional
cooperativista, em que regras éticas confucianas têm seu lugar. Tais
131
regras caracterizam a facilidade de adaptação e os mecanismos
cooperativos da sociedade japonesa, o que outros países não conseguiram
desenvolver. O governo e sua burocracia são eficientes, e souberam
redefinir seus limites, e promover a redução de custos de transação.
Entre as principais conclusões deste trabalho, podemos destacar:
(i) as regras formais e informais favoreceram o crescimento, e o
governo soube monitorar seu cumprimento por parte dos agentes
privados;
(ii) o governo foi limitado através do tempo, limitando-se à correção
de falhas de mercado. Agiu, portanto, como um fator de produção,
promovendo a interação (conselhos) e reduzindo custos de transação. A
produtividade dos agentes econômicos foi aumentada;
(ii) houve eficiência adptativa, na reciclagem do papel do MITI e do
governo, que passou a ser menos impositivo e atendeu as demandas do
setor privado;
(iii) as regras informais, exemplificadas pela ética confuciana,
facilitaram a cooperação e reduziram custos de transação, também
enfatizando a disciplina e o trabalho. A política de "guidance" do MITI -
informal - é um bom exemplo, assim como as "redes" estabelecidas entre
os agentes;
132
(iv) as regras que limitaram durante certo período a abertura
internacional foram compensadas pela exigência de competição interna e
padrões internacionais de desempenho.
(v) as decisões políticas, junto à qualidade e formação similar da
burocracia, favoreceram uma trajetória sustentável de eficiência. A
"inércia" do desenvolvimento foi, portanto, no sentido de mercado.
o compromisso final com a competitividade não deixa dúvidas de
que no longo prazo a intervenção vêm sendo "favorável ao mercado"
naquele país. As regras que sustentam esse compromisso, porém, são de
dificil aprovação consensual dentro de uma sociedade. Como ressalta
Johnson (1992), a cooperação é sem dúvida mais eficiente do que o
centralismo estatal ou o auto-dirigismo, em alguns casos, mas é bem mais
dificil de se conseguir. Por isso, a postura do Banco Mundial é correta
quando ressalta a importância da capacidade institucional para os países
que desejam um governo mais interventor.
Não é suficiente afirmar que o governo poderia melhorar o
desempenho de países em desenvolvimento, já que no Japão houve
intervenção e foi bem-sucedida. É necessário lembrar os mecanismos
institucionais que sustentaram esta intervenção eficiente. Não basta
desejar uma combinação de protecionismo e estímulo à competitividade,
pois esta é uma decisão arriscada e que requer flexibilidade, podendo
muito bem resultar em gigantismo e ineficiência estatal. Uma burocracia
ética e disciplinada aparece como pré-requisito imediato. A sociedade em
133
questão pode cair em uma trajetória inercial de ineficiência, e para
rompê-la seria necessária uma nova correlação de forças políticas.
Dadas estas dificuldades, o Banco elenca proposições normativas
para o governo, que poderiam ser genericamente aplicadas a outros
países. São como "medidas de segurança", contra a expansão desastrosa
do governo na esfera econômica. Prega, na abordagem "favorável ao
mercado" (Singh, 1994): relutância em intervir (a não ser que seja
demonstrado que é melhor intervir); monitoramento como função do
governo (disciplinar o mercado); intervenções feitas de modo transparente
(deixar que as regras governem, mais do que os burocratas).
Tais propostas parecem bastante adequadas a países em
desenvolvimento, nos quais a intervenção sempre ocorre, e também é
necessária. O estudo sobre o Japão demonstra que outros países devem
reavaliar a capacidade institucional existente, ou o aparato institucional.
E, antes de tudo, obter um consenso político para as metas de crescimento
e produtividade.
\
134
Abstract:
The work presents a new point of view on th« fiold of economic development,
represented by the New Institutional Economics (NIE) and one of its most
distinguished representatives, Douglass C. North (Nobel Prize, 1993). This
school enphasizes the relation between formal and informal rules (commercial
laws, federal constitution, cultural norrns) arul long run growth, standing out
the relevance of the environment whoro thoy nr« crcatod and enforced, which
includes the government and the roles assurnod hy him. The making of these
rules is also affected by agent's mental motlols and by failures in the political
processo The final result ofthe institutional frumowork is a country with high or
low transaction costs, which influences th« organization of markets and the long
run growth. Utilizing these theoretical concepts the paper analyzes Japan's
post-1945 industrial policy, showing that tho institutional framework promoted
efficiency and a "market-friendly" path in the long run, oven when government
realized protectionist practices. Thoro wns 11 contral concern with market
practices and competition, even insid« tho governmont apparatus.The conclusion
is that the government was extromely important in Iate-industrialized
countries, but the institutional framowork dotorrninerl the long run path of the
relation between it and the markets. '1'0 rogulato it, the government must be
seriously constrained.
Key Words: institutions, transaction CO:;;1.8, growth, performance, markets,
industrial policy.
135
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