a razão da nossa fé - livro

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Spiritual


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  • Todos os direitos reservados. Copyright 2017 para alngua portuguesa da Casa Publicadora das Assembleias deDeus. Aprovado pelo Conselho de Doutrina. Capa: Wagner de AlmeidaProjeto grfico e editorao: Paulo Srgio PrimatiIlustraes: Filipe SoaresReviso: Lettera EditorialProduo de ePub: Cumbuca Studio CDD: 230- Cristianismo e Teologia CristISBN: 978-85-263-1463-4ISBN digital: 978-85-263-1483-2 As citaes bblicas foram extradas da verso AlmeidaRevista e Corrigida, edio de 1995, da Sociedade Bblicado Brasil, salvo indicao em contrrio. Para maiores informaes sobre livros, revistas, peridicose os ltimos lanamentos da CPAD, visite nosso

    http://www.cumbucastudio.com

  • site:http://www.cpad.com.br. SAC Servio de Atendimento ao Cliente: 0800-021-7373 Casa Publicadora das Assembleias de DeusAv. Brasil, 34.401 Bangu Rio de Janeiro RJCEP 21.852-002 1 edio: Maio/2017

    676sSoares, Esequias.CDD230A razo de nossa f: assim cremos, assimvivemos / Esequias Soares.

    --- Rio de Janeiro: CPAD, 2017.

    160p. : il.; 21cm.

    Bibliografia: p. 158-160.

    ISBN 978-85-263-1463-4

    Assunto. II. Ttulo.

    http://www.cpad.com.br

  • S U M R I O

    Abreviaturas

    Introduo

    Captulo 1: INSPIRAO DIVINA E AUTORIDADE DA

    BBLIACnon e inspirao

    Credibilidade dos textos bblicos

    A Verso dos Setenta

    A traduo para outras lnguas tem a aprovao divina

    Captulo 2: DEUS E A CRIAOA primeira declarao dos credos

    O Deus das Escrituras

    A paternidade e a onipotncia de Deus.

    Bblia x cincia

    Captulo 3: SOBRE A DOUTRINA DA SANTSSIMA

    TRINDADEAs declaraes escritursticas

    Os apologistas.

  • Tertuliano de Cartago

    Orgenes

    Atansio

    Os pais capadcios

    Agostinho de Hipona

    O credo de Atansio ou Atanasiano

    Captulo 4: SOBRE O SENHOR JESUS CRISTOO Jesus das Escrituras

    O Jesus dos credos

    Captulo 5: SOBRE O ESPRITO SANTOO Esprito Santo nas Escrituras Sagradas

    Histria da doutrina pneumatolgica

    Captulo 6: A PECAMINOSIDADE HUMANAComo a Bblia descreve o pecado

    Consequncias do pecado

    As teorias

    Captulo 7: A NECESSIDADE DO NOVO NASCIMENTOReligio

    O novo nascimento

    Captulo 8: A IGREJA DE CRISTOA igreja

    As ordenanas

  • Captulo 9: A NECESSIDADE E A POSSIBILIDADE DE

    TERMOS UMA VIDA SANTASantidade como atributo divino

    Definindo os termos

    A necessidade de uma vida santa

    Modos de santificao

    Captulo 10: AS MANIFESTAES DO ESPRITO

    SANTOO batismo no Esprito Santo

    Defendendo a doutrina pentecostal

    Os dons do Esprito Santo

    Captulo 11: A SEGUNDA VINDA DE CRISTOSinais que precedero a segunda vinda de Cristo

    Cristo voltar

    Captulo 12: O MUNDO VINDOUROO milnio

    O destino dos injustos

    A ressurreio dos mortos

    O juzo final

    O destino dos justos.

    A nova Jerusalm

    Captulo 13: A FAMLIA

  • O conceito de famlia

    Princpios bsicos

    Referncias Bibliogrficas

  • A B R E V I A T U R A S

    ARA Verso de Joo Ferreira de Almeida, Edio Revista e Atualizada no Brasil. Barueri,SP: Sociedade Bblica do Brasil, 2016.ARC Verso de Joo Ferreira de Almeida, Edio Revista e Corrigida. Barueri, SP:Sociedade Bblica do Brasil, 2009.NTLH Nova Traduo na Linguagem de Hoje. Barueri, SP: Sociedade Bblica do Brasil,2009.NVI Nova Verso Internacional. So Paulo, SP: Vida, 2000.NVT Nova Verso Transformadora. So Paulo, SP: Mundo Cristo, 2016.TB Traduo Brasileira. Barueri, SP: Sociedade Bblica do Brasil, 2010.

    ANTIGO TESTAMENTO NOVO TESTAMENTO

    Gn Gnesis Mt Mateus

    x xodo Mc Marcos

    Lv Levtico Lc Lucas

    Nm Nmeros Jo Joo

    Dt Deuteronmio At Atos

    Js Josu Rm Romanos

    Jz Juzes 1 Co 1 Corntios

    Rt Rute 2 Co 2 Corntios

    1 Sm 1 Samuel Gl Glatas

    2 Sm 2 Samuel Ef Efsios

    1 Rs 1 Reis Fp Filipenses

    2 Rs 2 Reis Cl Colossenses

    1 Cr 1 Crnicas 1 Ts 1 Tessalonicenses

    2 Cr 2 Crnicas 2 Ts 2 Tessalonicenses

    Ed Esdras 1 Tm 1 Timteo

  • Ne Neemias 2 Tm 2 Timteo

    Et Ester Tt Tito

    J J Fm Filemon

    Sl Salmos Hb Hebreus

    Pv Provrbios Tg Tiago

    Ec Eclesiastes 1 Pe 1 Pedro

    Ct Cantares 2 Pe 2 Pedro

    Is Isaas 1 Jo 1 Joo

    Jr Jeremias 2 Jo 2 Joo

    Lm Lamentaes de Jeremias 3 Jo 3 Joo

    Ez Ezequiel Jd Judas

    Dn Daniel Ap Apocalipse

    Os Oseias

    Jl Joel

    Am Ams

    Ob Obadias

    Jn Jonas

    Mq Miqueias

    Na Naum

    Hc Habacuque

    Sf Sofonias

    Ag Ageu

    Zc Zacarias

    Ml Malaquias

  • OI N T R O D U O

    s credos e as confisses de f tm sempre as suas explicaes

    complementares e adicionais para tornar o documento cada vez

    mais claro. Esses documentos, como disse McGrath (2005), so

    interpretaes precisas e autorizadas das Escrituras. Isso significa que se

    trata de doutrinas oficiais de uma igreja ou denominao, que norteiam a vida

    religiosa de seus membros.

    Temos o nosso Cremos desde 1969, mas esse documento j existia em formaembrionria logo no princpio de nossa jornada, conforme pesquisa do

    historiador das Assembleias de Deus, Isael de Araujo. O jornal Mensageiroda Paz publicou na edio de maro de 2017 o seguinte: O Cremos era onico documento oficial doutrinrio, mas, a partir de agora, o texto passa a ser

    um extrato da Declarao de F, que so as interpretaes autorizadas dasEscrituras e os ensinos oficiais das Assembleias de Deus no Brasil (p. 7). Na

    verdade, esse texto foi durante todo esse tempo o nico documento oficial que

    expressava os pontos bsicos da nossa f, a nica fonte que mostrava para a

    sociedade aquilo em que cremos.

    O Cremos foi submetido a algumas revises durante esses anos e, porltimo, a uma reviso rigorosa e criteriosa, com acrscimos e cortes. O texto

    foi ampliado de 14 para 16 artigos de f; uns foram adaptados, e outros, que

    tratavam de um mesmo assunto, foram mesclados. Foram includos trs novos

  • artigos, um sobre o Esprito Santo, outro sobre a Igreja e, finalmente, um sobrea famlia; houve tambm a incluso de alguns pontos doutrinrios, ampliando

    alguns artigos j existentes como o Criador de todas as coisas.

    O Cremos, mesmo na sua forma original, serviu como um guia doutrinriobsico para a nossa denominao. No entanto, a exigncia da atualidade pedia

    algo mais. Com a promulgao da Declarao de F na 43 Assembleia Geralda CGADB como o conjunto de crenas e prticas oficiais da nossa

    denominao, o Cremos continua mantendo a sua importncia como umasntese de nossa doutrina, uma viso geral daquilo em que ns cremos e

    daquilo que praticamos. A Declarao de F uma coletnea de crenas eprticas da Igreja, estruturadas de forma simples e sistemtica, que mostra

    para a sociedade aquilo que ns cremos. Trata-se de um documento de

    extraordinria importncia na vida da Igreja, pois serve como sumrio

    doutrinrio da Bblia para ajudar irmos e irms na compreenso das

    Escrituras. A Declarao de F serve tambm para proteger a Igreja contra as

    falsas doutrinas.

    Nenhum tema de uma confisso de f se esgota em si mesma. Essa a razo

    de um estudo mais detalhado de cada artigo de f. O livro A razo da nossa f Assim cremos, assim vivemos, que o leitor tem em mos um comentriobblico, teolgico e histrico de cada ponto doutrinrio do Cremos, que visa auma compreenso mais ampla das nossas crenas e prticas.

  • A

    C A P T U L O 1

    Bblia est traduzida atualmente para 2.935 lnguas, segundo dados

    da Sociedade Bblica do Brasil (A Bblia no Brasil, n 252 agostoa outubro de 2016, Ano 68, p. 16). Todas essas verses transmitem a

    mesma mensagem dos antigos escritores bblicos. Os orculos divinos

    entregues a eles foram preservados e esto disponveis para toda a

    humanidade. Sua inspirao divina e sua autoridade fazem dela um livro suigeneris.

  • CNON E INSPIRAOAs palavras cnon e inspirao, s vezes, significam a mesma coisa. O

    termo kann se origina do vocbulo hebraico qneh, cana, que se usavacomo cana de medir (Ez 40.3, 5; 41.8) e originalmente quer dizer vara de

    medir. Na literatura clssica, significa regra, norma, padro. Aparece no

    Novo Testamento com o sentido de regra moral (Gl 6.16). tambm traduzido

    por medida (2 Co 10.13, 15). Nos trs primeiros sculos do cristianismo, o

    termo se referia ao contedo normativo, doutrinrio e tico da f crist. A

    partir do quarto sculo, os pais da Igreja aplicaram as palavras cnon e

    cannico aos livros sagrados, para reconhecer sua autoridade como textos

    inspirados por Deus e instrumentos normativos para a vida e a conduta dos

    cristos, portanto separados de outras literaturas. Eles constituram a partir de

    ento uma lista de livros com autoridade divina, uma biblioteca que a

    nossa medida, a nossa regra de f e prtica. O cnon , assim, a lista de livros

    j definidos e reconhecidos como divinos para a vida e a conduta do cristo.

    Cada um dos livros era reconhecido como inspirado por Deus desde a sua

    origem, mas a coleo desses escritos sagrados s aconteceu posteriormente.

    A inspirao divina chamada de teopneustia, que significa inspirao

    divina da Bblia (Grande Dicionrio Sacconi da Lngua Portuguesa) einspirao divina das Escrituras teoria segundo a qual Deus inspirou aos

    autores bblicos todas as palavras e todas as ideias (Grande e NovssimoDicionrio da Lngua Portuguesa, de Laudelino Freire). O ModernoDicionrio da Lngua Portuguesa, de Michaelis, repete as mesmas palavrasde Laudelino Freire. O termo teopneustia vem da Bblia: Toda Escritura

    divinamente inspirada proveitosa para ensinar, para redarguir, para corrigir,

  • para instruir em justia (1 Tm 3.16) ou Toda a Escritura inspirada por

    Deus e til (ARA). A palavra grega aqui traduzida por inspirada por Deus

    ou divinamente inspirada theopneustos, que vem de theos, Deus, epne, respirar. Isso significa que a Bblia respirada ou soprada porDeus. A construo grega nesse versculo permite ambas as tradues, mas a

    traduo da Almeida Atualizada mais precisa, uma vez que a partcula grega

    kai vem entre os dois adjetivos divinamente inspirada e proveitosa;tambm expressa melhor a inteno do Esprito Santo, pois afirma duas

    verdades sobre a Bblia: a Escritura divinamente inspirada e proveitosa. A

    ausncia do artigo antes de graf em pasa graf teopneustos kaiflimos1 no deixa claro se a construo atributiva, Escrituradivinamente inspirada, ou predicativa, [a] Escritura divinamente

    inspirada.

    O termo grego pasa, feminino de pas, todo, tudo, cada, afirma que ainspirao das Escrituras plena, total, por isso afirmamos a nossa f na

    inspirao plenria da Bblia. Mas essa crena no se fundamenta apenas

    nisso, e o contexto do Novo Testamento nos deixa vontade nesse sentido.

    verdade que no perodo apostlico a Bblia da Igreja era o Antigo Testamento

    (Lc 24.44). O termo Escrituras, ou Escritura no singular, aparece

    inmeras vezes no Novo Testamento como referncia especfica ao Antigo

    Testamento ou a parte dele e entre elas podemos citar (Mt 21.42; Mc 12.10/Sl

    118.22, 23; Mt 26.56; Mc 15.28/Is 53.12; Lc 4.21/Is 61.1, 2; Lc 24.27).

    A expresso Toda Escritura (2 Tm 3.16) no se restringe apenas ao Antigo

    Testamento; diz respeito tambm aos escritos apostlicos, ou seja, ao Novo

  • Testamento. A Bblia inteira divinamente inspirada, pois a autoridade dos

    profetas e apstolos a mesma. Ambos os grupos de escritores bblicos

    aparecem alternadamente: para que vos lembreis das palavras que

    primeiramente foram ditas pelos santos profetas e do mandamento do Senhor e

    Salvador, mediante os vossos apstolos (2 Pe 3.2). Mais adiante, o apstolo

    Pedro coloca as epstolas paulinas no mesmo nvel nas Escrituras do Antigo

    Testamento: Falando disto, como em todas as suas epstolas, entre as quais h

    pontos difceis de entender, que os indoutos e inconstantes torcem e igualmente

    as outras Escrituras, para sua prpria perdio (2 Pe 3.16). O apstolo Paulo

    considerava os escritos apostlicos no mesmo nvel das Escrituras dos judeus:

    Porque diz a Escritura: No ligars a boca ao boi que debulha. E: Digno o

    obreiro do seu salrio (1 Tm 5.18). H aqui duas citaes. A primeira vem

    da lei de Moiss: No atars a boca ao boi, quando trilhar (Dt 25.4); e a

    segunda no aparece em parte alguma do Antigo Testamento, mas nos

    evangelhos: porque digno o operrio do seu alimento (Mt 10.10); pois

    digno o obreiro de seu salrio (Lc 10.7). A construo grega revela que o

    apstolo est citando o evangelho de Lucas.2 Ambas as frases so chamadas

    de Escritura. Outras vezes Paulo ousa dizer que seus escritos so de origem

    divina (1 Co 7.40; 2 Co 13.3; 1 Ts 4.8).

    Assim, a frase Toda Escritura inspirada por Deus se refere Bblia

    inteira, aos seus 66 livros. A inspirao da Bblia especial e nica. No

    existe na Bblia um livro mais inspirado e outro menos inspirado. Todos tm o

    mesmo grau de inspirao e autoridade.

    A inspirao plenria se refere totalidade dos 66 livros bblicos, e a

    inspirao verbal significa que cada palavra foi inspirada pelo Esprito Santo

    (1 Co 2.13). No somente as palavras, mas tambm as ideias so de origem

  • divina: porque a profecia nunca foi produzida por vontade de homem algum,

    mas os homens santos de Deus falaram inspirados pelo Esprito Santo (1 Pe

    1.21). A palavra grega usada aqui para inspirados o verbo pher, quesignifica tambm mover, movimentar. Os escritores bblicos so homens

    santos que foram movidos pelo Esprito Santo para falarem da parte de Deus.

    A inspirao verbal no elimina a individualidade de cada autor humano.

    Qualquer leitor da Bblia consegue ver sem muito esforo a diferena de

    linguagem e de estilo em cada livro. Essa diversidade se revela ao comparar

    um profeta com outro profeta do Antigo Testamento, ou um apstolo com outro

    apstolo do Novo Testamento. Quem ler os profetas Isaas, Jeremias,

    Ezequiel, Daniel, Oseias, Ams ou os apstolos Pedro, Joo e Paulo pode

    observar com clareza meridiana a peculiaridade na estrutura de raciocnio de

    cada um deles, no seu grau de instruo, no seu convvio, no seu gnio e

    contexto sociopoltico e religioso. Assim, a Bblia revela o aspecto natural da

    individualidade e o aspecto sobrenatural da inspirao.

  • CREDIBILIDADE DOS TEXTOSBBLICOS

    A quantidade enorme de manuscritos antigos, o grande nmero de verses

    em outras lnguas e as citaes da patrstica nos primeiros sculos do

    cristianismo falam por si como prova da autenticidade dos livros da Bblia.

    assunto que nem mesmo os cticos questionam. Nenhuma obra da Antiguidade

    apresenta hoje tantos manuscritos hebraicos, gregos, latinos e em outras

    lnguas. Temos hoje em todo o mundo mais de 25 mil manuscritos bblicos

    produzidos antes do advento da imprensa no sculo XV. Em segundo lugar,

    vem a Ilada, de Homero, com apenas 457 papiros e 188 manuscritos,perfazendo um total de 645 exemplares. Nenhuma obra da Antiguidade mais

    bem confirmada que a Bblia.

    De todas as obras literrias produzidas na Antiguidade, o manuscrito mais

    antigo que sobreviveu apresenta um intervalo de 750 anos entre o tal

    manuscrito e a possvel data de sua autoria. uma obra de Histria, de Plnio,

    o Jovem, historiador romano que viveu entre 61 e 113 d.C. Restaram apenas

    sete manuscritos, e o mais antigo deles datado de 850 d. C. Todos os demais,

    com exceo de Suetnio, tambm historiador romano, com 950 anos de

    intervalo o manuscrito mais antigo e a possvel data de sua autoria, apresentam

    um intervalo superior a mil anos. o caso de Plato, Tetralogias, sete cpias;e Herdoto, Histria, oito cpias, entre outros que no so citados aqui porabsoluta falta de espao (MCDOWELL, 2013, pp. 141, 142).

    As descobertas dos rolos do mar Morto revelam a credibilidade e a

    fidelidade dos textos hebraicos do Antigo Testamento. Com exceo do livro

    de Ester, todos os outros livros do Antigo Testamento esto representados

  • nesses 800 manuscritos. As 11 cavernas de Uaid Qumran trouxeram tona

    cerca 200 manuscritos bblicos, descobertos entre 1947 e 1964, sem contar

    outros manuscritos no bblicos. O primeiro grupo desses manuscritos

    datado entre 250 a.C. e 68 d.C., com manuscritos escritos ainda na grafia

    paleo-hebraica, ou seja, o hebraico arcaico. Julio Trebolle Barrera faz meno

    de alguns deles: quatro de Levtico, dois de Gnesis, xodo e Deuteronmio,

    um de Nmeros e um de J (BARRERA, 1999, p. 263). O segundo grupo

    datado entre 70 e 132 d.C., perodo entre a destruio de Jerusalm e a

    Revolta de Bar-Cochbar, em Yavne, ou Jmnia.

    Muitos desses manuscritos no foram produzidos pelos essnios; muitos

    deles vieram da Babilnia e do Egito. Trata-se, portanto, de textos

    procedentes de vrias pocas e de vrios lugares. Quando o alfabeto paleo-

    hebraico foi substitudo pelo alfabeto quadrtico, os escribas tiveram de fazer

    adaptaes. O rolo do profeta Isaas, por exemplo, datado do ano 100 a.C.

    exatamente o mesmo texto da Bblia Hebraica, exceto por uma diferena de

    apenas 17 letras no captulo 53.

    As inmeras profecias so exclusividade das Escrituras Sagradas e provas

    visveis de sua inspirao e autenticidade. Muitas delas j se cumpriram em

    relao a muitos povos, tanto na Antiguidade como na atualidade. Um exemplo

    a queda de Babilnia: E Babilnia, o ornamento dos reinos, a glria e a

    soberba dos caldeus, ser como Sodoma e Gomorra quando Deus as

    transtornou. Nunca mais ser habitada, nem reedificada de gerao em

    gerao (Is 13.19, 20). Essa profecia foi proferida quando a Babilnia estava

    no apogeu de sua glria. Hoje, no entanto, essa Palavra se cumpre diante de

    nossos olhos.

    A Bblia anunciou de antemo a disperso dos judeus, mas profetizou seu

  • retorno terra de seus antepassados. Depois de cerca de 1.800 anos na

    dispora, os filhos de Israel retornam para sua terra, e em um s dia nasceu

    uma nao (Is 66.8). Essa Palavra diz respeito fundao do Estado de Israel

    logo aps a derrocada do nazismo.

    No possvel enumerar todas as profecias aqui. Mas destacamos as

    profecias sobre reis, como Ciro, rei da Prsia, e Alexandre, o Grande, em

    Isaas 44.28; 45.1 e Daniel 8.21, 22, alm das profecias messinicas

    cumpridas em Jesus, desde o seu nascimento de uma virgem, em Belm,

    conforme Isaas 7.14 e Miqueias 5.2, at a sua ascenso, registrada em Salmos

    24.7-10. Tudo isso faz da Bblia um livro sui generis, que no se assemelha anenhum outro e est acima de qualquer outro j produzido no mundo. A Bblia

    declara a si mesma como a infalvel Palavra de Deus: a palavra de nosso

    Deus subsiste eternamente (Is 40.8) e em fraseologia similar: mas a palavra

    do Senhor permanece para sempre (1 Pe 1.25). o nico livro que se

    apresenta como a revelao escrita do verdadeiro Deus e com um propsito

    definido: a redeno humana.

  • A VERSO DOS SETENTAA Septuaginta a primeira traduo do Antigo Testamento hebraico para o

    grego. O termo Septuaginta vem do latim e significa literalmente

    septuagsimo, tendo sido usado pela primeira vez por Eusbio de Cesareia

    em Histria Eclesistica. Agostinho de Hipona foi o primeiro a cham-la de aVerso dos Setenta, em A Cidade de Deus. O termo Septuaginta umaforma abreviada da expresso latina interpretatio Septuaginta virorum, a

    traduo pelos setenta homens, similar forma grega kat touhebdomkonta, conforme os setenta, ou hoi hebdomkonta, ossetenta, todos usados por escritores cristos do segundo sculo para referir-

    se ao Antigo Testamento Grego. Hoje conhecido tambm pelo nome de

    Verso dos Setenta, Verso de Alexandria e identificado pelos algarismos

    romanos LXX.

    A traduo do Pentateuco do hebraico para o grego aconteceu na metade do

    sculo III a.C., por 72 eruditos judeus enviados de Jerusalm para Alexandria;

    nos sculos seguintes, os outros livros do Antigo Testamento foram traduzidos.

    Foi um empreendimento cultural sem precedentes na histria da civilizao

    ocidental, pois a revelao divina saa do confinamento judaico para se tornar

    universal. Era o pensamento religioso semita disposio do Ocidente numa

    lngua indo-europeia.

    Sua influncia nos escritores do Novo Testamento foi determinante, servindo

    de ponte lingustica e teolgica entre o hebraico do Antigo Testamento e o

    grego do Novo. Tanto os apstolos como os antigos escritores cristos

    encontraram na Septuaginta uma fonte de conceitos e termos teolgicos para

    expressar o contedo e o pensamento cristo. Ela foi usada pelas geraes de

  • judeus helenistas em todas as partes do mundo antigo. Foi a Bblia adotada

    pelos cristos de lngua grega, como disse Agostinho no sculo V: A Igreja

    recebeu a verso dos Setenta como se fora nica e dela se servem os gregos

    cristos, cuja maioria ignora se h alguma outra. Dessa verso dos Setenta fez-

    se a verso para o latim; a usada nas igrejas latinas. Serve, ainda, como

    fonte importante para o estudo da histria da Bblia Hebraica (A Cidade deDeus, livro 18.43).

  • A TRADUO PARA OUTRASLNGUAS TEM A APROVAO DIVINA

    O projeto de traduo das Escrituras dos judeus para a lngua grega num

    perodo em que nem mesmo o cnon estava fixado mostra ser a Bblia um livro

    traduzvel por natureza, sendo ao mesmo tempo o prenncio de milhares de

    lnguas para as quais a Palavra de Deus seria traduzida as primcias de uma

    grande ceifa de verses em todo o mundo. A Bblia completa est traduzida em

    563 idiomas, o Novo Testamento em 1.334 lnguas, e as pores bblicas em

    1.038 lnguas. O total de 2.935 lnguas. So dados publicados pela revista ABblia no Brasil citada acima.

    a vontade de Deus que a sua Palavra seja conhecida por todos os povos e

    naes na sua prpria lngua. Essa aprovao divina reconhecida pelo uso

    do grego na redao do Novo Testamento e pelas inmeras citaes diretas da

    Septuaginta. Isso mostra que no importa a lngua, mas o contedo da

    mensagem. A Septuaginta no transcorrer dos anos veio a ser o Antigo

    Testamento por excelncia dos cristos no vasto imprio romano. Quando a

    LXX foi acrescentada coleo de livros do Novo Testamento era o

    surgimento de um novo livro, a Bblia Crist (SOARES, 2009, p. 56).

    1 Pa/sa grafh. qeo,pneustoj kai. wvfe,limoj.2 Compare (Lc 10.7) com (1 Tm 5.18).

  • O

    C A P T U L O 2

    enfoque do presente captulo a unicidade do Deus Pai Todo-

    poderoso e Criador do universo. A declarao de f dos ateus

    Deus no existe, o oposto da confisso crist. A Bblia no uma

    apologia existncia de Deus; no h nela a preocupao em comprovar que

    Deus existe. A existncia de Deus um fato consumado, uma verdade primria

    que no necessita ser provada, pois Ele transcende existncia. O

    conhecimento humano sobre a existncia do Criador est na prpria intuio e

    razo no interior das pessoas (Rm 1.20, 21; 2.14, 15). A Bblia a nica fonte

    confivel e confirma a experincia humana.

  • A PRIMEIRA DECLARAO DOSCREDOS

    Os principais credos ecumnicos apresentam caractersticas especiais

    existentes em Deus. O Credo dos Apstolos declara: Creio em Deus Pai

    Todo-poderoso, Criador do cu e da terra; da mesma forma o Credo Niceno

    afirma: Cremos em um s Deus, Pai Onipotente, Criador de todas as coisas

    visveis e invisveis; e o Credo Niceno-Constantinopolitano reafirma a

    frmula nicena: Cremos em um s Deus, o Pai Todo-poderoso, Criador do

    cu e da terra, de todas as coisas, visveis e invisveis. Alguns dos antigos

    credos locais dos primeiros cinco sculos da histria da Igreja serviram como

    a base dessas formulaes ecumnicas. Todas essas declaraes a respeito de

    Deus afirmam que Ele um, exceto o Credo dos Apstolos, que Pai

    Onipotente ou Todo-Poderoso e Criador de todas as coisas. Trata-se da

    revelao bblica posta de maneira sistemtica. H nas Escrituras provas

    abundantes que fundamentam essas declaraes dos credos. Muitos outros

    credos regionais dos cinco primeiros sculos dizem a mesma coisa,

    empregando, s vezes, fraseologia similar. So informaes importantes, pois

    falam que o nosso Deus nico, que Pai, que o Todo-poderoso e Criador

    de tudo o que h no Universo. Tais declaraes nada mais so do que

    interpretaes precisas das Escrituras que serviram para proteger a f crist

    do politesmo e da idolatria dos gentios e os cristos das heresias. Isso se

    reveste de uma importncia especial na poca, quando os gnsticos ganhavam

    espao no seio da Igreja.

    O gnosticismo atingiu o apogeu entre 130 e 170 d.C., mas o movimento j

    existia antes. O termo gnosticismo vem do grego gnsis, que significa

  • conhecimento. Trata-se, grosso modo, de um enxerto das filosofias pags

    nas doutrinas vitais do cristianismo. Sua marca registrada era o sincretismo.

    Suas ideias sobre a identidade de Jesus eram estranhas ao Novo Testamento e

    as ideais sobre Deus eram ainda mais exticas. A escola gnstica de Valentino

    (aproximadamente 130-170 d.C.) ensinava a existncia de inmeros seres

    eternos que viviam em perfeita harmonia, sendo o Pai do Universo um deles.

    Nesse modelo gnstico, um dos seres eternos, Sofia, sabedoria em grego,

    teria destrudo essa harmonia ao criar mundos para si, na tentativa de imitar o

    pai do Universo, e o resultado foi sua expulso do reino divino. Essa tentativa

    resultou no demiurgo, do grego demiurgos, arteso, um deus criadorinferior que aparece no dilogo de Plato intitulado Timeu. Para os gnsticos,o demiurgo criou o mundo fsico. Outra linha de pensamento gnstica era de

    Marcio, falecido em 165 d.C. Ele ensinava que o Deus do Antigo Testamento

    era inferior e at mesmo defeituoso; e dizia ainda que no era esse o mesmo

    Deus do Novo Testamento. Na sua mensagem, pregava que Jesus revelou um

    Deus at ento desconhecido, por isso todos os cristos deviam rejeitar tanto o

    Antigo Testamento quanto o seu Deus. Assim, a declarao Creio em Deus

    Pai Todo-poderoso Criador do cu e da terra um ato de adorao a Deus a

    quem damos crdito. A ideia aqui diz respeito quele que governa tudo, que

    controla tudo, para enfatizar o poder e a soberania de Deus em governar todo

    o universo. Isso neutralizava o pensamento marcionita que ensinava ser o

    universo criado e governado por demiurgos, e no pelo grande Deus Jav de

    Israel, revelado no Antigo Testamento. Paul Tillich, telogo luterano e

    filsofo, diz o seguinte sobre as palavras iniciais do Credo dos Apstolos, o

    que, sem dvida, vale tambm para os outros: Deveramos pronunciar essas

  • palavras com grande reverncia, porque, por meio dessa confisso, o

    cristianismo se separou da interpretao dualista da realidade presente no

    paganismo... O primeiro artigo do Credo a grande muralha que o

    cristianismo ergueu contra o paganismo. Sem essa separao a cristologia

    seria mais do que um dos poderes csmicos entre outros, embora, talvez, o

    maior deles (TILLICH, 2004, p. 41).

  • O DEUS DAS ESCRITURASO Deus da Bblia o mesmo Deus dos credos. A diferena est apenas na

    forma de apresentao, no na essncia divina. A Bblia a Palavra de Deus

    para todos os seres humanos; o credo a resposta do homem a Deus. Assim,

    os credos em sua forma embrionria esto presentes na Bblia: Ouve, Israel,

    o SENHOR nosso Deus nico SENHOR (Dt 6.4). Deus um em essncia

    ou natureza, subsistindo por Si mesmo; s o SENHOR Deus: Eu sou o

    SENHOR, e no h outro; fora de mim no h deus... (Is 45.5). Nosso Senhor

    Jesus Cristo ensinou o monotesmo como parte do primeiro de todos os

    mandamentos: ... Ouve, Israel, o Senhor, nosso Deus, o nico Senhor (Mc

    12.29); ... com verdade disseste que h um s Deus, e que no h outro alm

    dele (Mc 12.32); E a vida eterna esta: que conheam a ti s por nico

    Deus verdadeiro... (Jo 17.3).

    O apstolo Paulo declara: Todavia para ns h um s Deus (1 Co 8.6);

    Ora o medianeiro no de um s, mas Deus um (Gl 3.20); Um s Deus e

    Pai de todos, o qual sobre todos, e por todos e em todos (Ef 4.6). Porque

    h um s Deus (1 Tm 2.5). Foi o Senhor Jesus quem revelou Deus aos seres

    humanos por meio da Bblia: Mt 11.27; Jo 1.18).

    O Deus que Jesus revelou o Deus de Israel e isso ele deixou claro ao

    pronunciar o primeiro e grande mandamento: E Jesus respondeu-lhe: O

    primeiro de todos os mandamentos : Ouve, Israel, o Senhor, nosso Deus, o

    nico Senhor. Amars, pois, ao Senhor, teu Deus, de todo o teu corao, e de

    toda a tua alma, e de todo o teu entendimento, e de todas as tuas foras; este

    o primeiro mandamento (Mc 12.29, 30). Essa uma das vrias declaraes

    do Novo Testamento que ensina ser o cristianismo monotesta. A declarao

  • aqui reveladora porque no deixa dvida de que o Deus dos cristos o

    mesmo Deus de Israel, pois Jesus citou as palavras diretamente do Antigo

    Testamento (Dt 6.4-6).

  • A PATERNIDADE E A ONIPOTNCIADE DEUS

    Assim como os antigos credos sintetizam o ensino bblico sobre a unidade

    de Deus e o monotesmo, da mesma forma eles o fazem sobre a paternidade de

    Deus. H abundantes declaraes na Escrituras sobre a paternidade de Deus.

    A figura do pai numa famlia conhecida e compreensvel em todas as

    civilizaes desde a Antiguidade. Aplicada a Deus, torna-se um recurso

    extraordinrio. Em primeiro lugar, porque mostra a doutrina de Deus no

    abstrata (Dt 1.31; Ml 1.6). E no somente isso, pois so os pais que geram os

    filhos e so responsveis por seu bem-estar, sustento, alimentao,

    vestimentas, sade, educao e segurana. Essa manifestao de afeto e

    carinho acontece de maneira natural e ao mesmo tempo misteriosa. a melhor

    e a mais perfeita maneira de ilustrar e explicar o grande amor de Deus pelo

    ser humano.

    A quem se refere expresso Deus Pai Todo-poderoso ou fraseologia

    similar nos antigos credos? Os antigos intrpretes e exegetas tomaram essas

    palavras desde muito cedo em relao especial santssima Trindade: o

    Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo (1 Pe 1.3); porque a este o Pai,

    Deus, o selou (Jo 6.27). Mas Deus como Pai na Bblia tem significado mais

    abrangente. O ttulo Pai no Antigo Testamento se refere aos filhos de Israel,

    denota relao mediante aliana, concerto (Jr 31.9; Ml 2.10), de maneira

    coletiva, a Israel no todo (x 4.22; Os 11.1), s pessoas como seus filhos (Is

    1.2; 30.1; 45.11; Jr 3.22) e ao Ungido Rei, o Messias (2 Sm 7.14; Sl 2.7;

    89.27). No Novo Testamento, frequente a frase o Deus e Pai de nosso

    Senhor Jesus Cristo (Rm 15.6; 2 Co 1.3; 11.31; Ef 1.3) e fraseologia similar

  • (Cl 1.3), e tambm nosso Deus e Pai ou Pai nosso (1 Co 8.6; 1 Ts 3.11,

    13; 2 Ts 2.16), principalmente nas introdues das epstolas paulinas (1 Co

    1.3; Gl 1.4; Ef 1.2; Fp 1.2; Cl 1.2).

    Jesus nos tornou filhos de Deus por adoo, razo pela qual temos a

    liberdade e o direito de cham-lo de Pai (Mt 6.13; Jo 1.12). A palavra

    aramaica abba, aba, ou, literalmente, papai, demonstra uma relao deintimidade dos crentes em Jesus com Deus (Rm 8.15; Gl 4.6). A ideia de que

    Deus o Pai de todos os seres humanos biblicamente vlida por causa da

    criao (At 17.28, 29; Ef 4.6), mas isso no implica relao pessoal ou

    espiritual. No evangelho de Joo, o termo grego patr, pai, aparece 136vezes, e 120 delas se referem a Deus. Nos evangelhos sinpticos, essa

    referncia a Deus bem menor, mas permanece a mesma ideia.

    O ttulo de Pai se diferencia dos demais ttulos e funes de Deus porque

    nunca se aplica a Jesus nem ao Esprito Santo. H uma vasta lista de atributos,

    ttulos, funes e obras de Deus Pai presentes no Filho e no Esprito Santo,

    mas o ttulo de Pai exclusivo ao Deus Pai. Algum pode argumentar sobre a

    profecia messinica que emprega as palavras Pai da Eternidade (Is 9.6). O

    bispo Sablio costumava citar palavra proftica para fundamentar a crena

    unicista de que Pai Filho e Filho Pai. Mas o que a Bblia ensina aqui que

    o Messias, como rei, o principado est sobre os seus ombros, pai do seu

    povo (Is 22.21), e no o Deus-Pai. O Filho Deus igual ao Pai (Jo 5.17, 18;

    10.30), mas no o Pai, seno o Filho do Pai (2 Jo 3).

    Ser todo-poderoso o mesmo que ser onipotente (Sl 91.1). Esse atributo

    exclusividade divina, no Deus trino e uno. Os credos comeam reconhecendo

    esse atributo no Deus Pai: Creio em Deus Pai Todo-poderoso. A expresso

  • Todo-poderoso um dos nomes de Deus no Antigo Testamento (Gn 17.1; x

    6.3), e a ideia nos antigos credos de poder fazer todas as coisas, tudo o que

    deseja (Is 46.10). A onipotncia ad extra est limitada somente pelanatureza ou essncia do prprio Deus e por nada externo a ele; por exemplo,

    Deus no pode mentir (Tt 1.2). Isso no deve ser interpretado como limite

    de seu poder; antes, trata-se da sua essncia, pois ele mesmo a Verdade. Os

    cristos reconhecem que Deus pode todas as coisas: Porque para Deus nada

    impossvel (Lc 1.37).

  • BBLIA X CINCIANo verdade que a cincia contradiz a Bblia e vice-versa. necessrio

    saber o que realmente cincia e se os pressupostos cientficos so realmente

    cientficos. Se o resultado dessa investigao for positivo, resta ainda saber se

    o pensamento teolgico realmente bblico ou se no est fundamentado numa

    falsa interpretao das Escrituras. Um exemplo clssico disso so as

    descobertas cientficas de Galileu Galilei, que contrariavam a interpretao da

    Igreja Catlica, e no a Bblia, pois o papa achava que apenas o Sol e a Lua se

    moviam, e no a terra, com base na interpretao dada passagem do dia

    longo de Josu (Js 10.12-14).

    Os cientistas j investigaram diversas reas do saber humano: astronomia e

    cosmologia, biologia e gentica, paleontologia e geologia, mtodos de datao

    geofsica e hidrodinmica. Por que um nmero considervel deles rejeita

    completamente o evolucionismo? Muitas coisas no currculo escolar na rea

    de cincias naturais precisam ser revistas, segundo um nmero considervel

    de cientistas.

    Toda a criao louva a Deus seres espirituais, racionais e irracionais e

    toda a natureza (Sl 148.2-12). Os ateus no adoram nem louvam a Deus; acham

    que no precisam dele e no participam da adorao a Deus. A existncia de

    Deus um fato; trata-se de uma verdade primria que no precisa ser provada.

    Seria insulto inteligncia humana dizer a algum que um relgio

    simplesmente apareceu do nada, como resultado do acaso. O Salmo 19 mostra

    que o Universo, por si s, comprova a existncia de Deus (Sl 19.1-6). As

    coisas visveis de Deus so claramente vistas como recursos que Deus deixou

    para que o ser humano reconhea a existncia do Criador: para que eles

  • fiquem inescusveis (Rm 1.20). Ser que eles pensam que, negando a

    existncia do Criador, escaparo da condenao eterna? Se for isso, esto

    enganados. A nica salvao o Senhor Jesus Cristo (Jo 14.6; At 16.31).

  • A

    C A P T U L O 3

    Trindade a unio de trs Pessoas o Pai, o Filho e o Esprito Santo

    em uma s Divindade, sendo iguais, eternas e da mesma

    substncia, embora distintas, sendo Deus cada uma dessas Pessoas.

    Essa doutrina um mistrio porque vai alm da razo, mas no contra a razo,

    como disse acertadamente Norman Geisler: conhecida apenas pela

    revelao divina, portanto no assunto da teologia natural, mas da

    revelao (GEISLER, 2001, p. 834). A Bblia declara textualmente que existe

    um s Deus verdadeiro e, ao mesmo tempo, afirma com a mesma clareza e de

    maneira direta que Jesus Deus, mostrando nele todos os ttulos divinos, com

    seus atributos, funes e obras de Deus. E, com o Esprito Santo no

    diferente; a Bblia revela a sua divindade plena. Houve no passado quem

    defendesse o tritesmo, mas a Igreja nunca reconheceu tal ensino; antes, refutou

    e combateu essa ideia. O mistrio consiste tambm no fato de o Deus dos

    cristos revelado nas Escrituras ser trino e uno sem comprometer o

    monotesmo judaico-cristo.

  • AS DECLARAES ESCRITURSTICASA Trindade uma doutrina com slidos fundamentos bblicos e, mesmo sem

    conhecer essa terminologia, os cristos do perodo apostlico reconheciam

    essa verdade. Essa doutrina est implcita no Antigo Testamento, pois h

    declaraes que indicam claramente a pluralidade na unidade de Deus (Gn

    1.26; 3.22; 11.6, 7; Is 6.8). Apesar da nfase da doutrina monotesta como o

    shem: Ouve, Israel, o SENHOR, nosso Deus, o nico SENHOR (Dt6.4) reafirmada pelo Senhor Jesus (Mc 12.29), o Antigo Testamento mostra

    que a unidade de Deus no absoluta. O Novo Testamento revela que essa

    pluralidade se restringe ao Pai, ao Filho e ao Esprito Santo (Mt 28.19; 1 Co

    12.4-6; 2 Co 13.13; Ef 4.4-6; 1 Pe 1.2).

    H ainda vrias passagens tripartidas no Novo Testamento que revelam a

    Trindade (Lc 24.49; Rm 1.1-4; 5.1-5; 14.17, 18; 15.16, 30; 1 Co 6.11; 2 Co

    1.20, 21; Gl 3.11-14; Ef 1.17; 2.18-22; 3.3-7, 14-17; 1 Ts 5.18). Alm das

    declaraes bblicas apresentadas aqui, h outras evidncias contundentes que

    fundamentam essa doutrina. Cada uma dessas Pessoas chamada

    individualmente de Deus e Senhor. O Deus do cristianismo um (Gl 3.20),

    mas as Escrituras ensinam tambm que o Pai Deus, o Filho Deus e o

    Esprito Santo Deus. A Bblia aplica o nome Deus ao Pai sozinho (Fp

    2.11), da mesma forma ao Filho (Jo 1.1) e ao Esprito Santo (At 5.3, 4); e, na

    maioria das vezes, com referncia Trindade (Dt 6.4). Isso tambm ocorre

    com o Tetragrama (as quatro consoantes do nome divino YHWH), que se

    aplica ao Pai sozinho (Sl 110.1), ao Filho (Is 40.3; Mt 3.3) e ao Esprito Santo

    (Ez 8.1,3). No entanto, aplica-se tambm Trindade (Sl 83.18). Salta vista

    de qualquer leitor da Bblia a divindade plena e absoluta de cada uma dessas

  • Pessoas. Foi assim que o Esprito revelou a unidade na Trindade.

    As palavras de Jesus sobre a sua prpria identidade e as suas aes revelam

    a sua deidade absoluta. O mesmo pode ser dito sobre as obras e as

    declaraes a respeito do Esprito Santo. O Deus revelado nos evangelhos

    trino e uno. A maneira como essa verdade revelada em Mateus, Marcos,

    Lucas e Joo era perfeitamente compreendida pela gerao apostlica. Por

    essa razo, no havia questionamento sobre a triunidade de Deus. Quando o

    Senhor Jesus apaziguou a tempestade, seus discpulos questionaram: Quem

    este que at o vento e o mar lhe obedecem? (Mc 4.41). Eles sabiam que

    somente Deus possui esse poder (Sl 65.7; 89.9).

    O ensino do Senhor Jesus e de seus apstolos expressava a f em um s

    Deus, mas ao mesmo tempo eles ensinavam a deidade absoluta do Pai, do

    Filho e do Esprito Santo. A Bblia revela a triunidade de Deus sem necessitar

    de definies teolgicas, e o destinatrio imediato de cada texto bblico

    compreendia com clareza meridiana a unidade na Trindade e a Trindade na

    unidade.

    No havia ainda necessidade na poca de uma confisso de f elaborada,

    pois essa linguagem era suficiente para a compreenso dos primeiros cristos.

    At mesmo os opositores da f crist, s vezes, entendiam esse discurso. Jesus

    disse certa vez: Meu Pai trabalha at agora, e eu trabalho tambm (Jo 5.17).

    Os judeus incrdulos entenderam essa mensagem e por essa razo procuraram

    matar a Jesus, porque dizia que Deus era seu prprio Pai, fazendo-se igual a

    Deus (Jo 5.18). Esse modo de pensar dos apstolos era compreensvel aos

    primeiros cristos e no havia necessidade de explicaes adicionais. No h

    evidncia no Novo Testamento de algum questionando essa verdade.

    A expanso do cristianismo no vasto imprio romano era geogrfica e

  • intelectual (Rm 15.19; Cl 1.6). A pregao do evangelho passou a se defrontar

    com as diversas tradies gregas e romanas (At 16.21; 17.18-22). Mas a

    maneira de pensar desses movimentos culturais e intelectuais exigia

    formulaes teolgicas precisas e racionais na comunicao da verdade crist,

    somando-se a isso o surgimento de seitas e heresias como ebionitas, gnsticos,

    monarquianistas e arianistas, entre outros. E a simples repetio de passagens

    bblicas j no era mais suficiente. Isso exigia da liderana da Igreja

    definies teolgicas racionais.

  • OS APOLOGISTASNo que diz respeito Trindade, os pais da Igreja nos sculos 2 e 3 no

    tinham uma ideia clara sobre a doutrina, exceto Tertuliano. O conceito

    trinitariano de Orgenes mostrou-se insatisfatrio. Havia muitos conceitos

    diversificados sobre o Logos,3 e a doutrina do Esprito Santo nem sequer

    entrou nos debates antes de Niceia.

    Os primeiros pais da Igreja que antecederam o Conclio de Niceia sabiam

    pelos escritos do Novo Testamento e pela experincia das igrejas, a maioria

    fundada pelos apstolos ou por algum vinculado a eles ou mesmo seus

    sucessores, que os primeiros cristos cultuavam a Jesus e reconheciam o

    senhorio de Cristo e do Esprito Santo. Suas explicaes no eram muito

    claras, pois os primeiros escritores cristos aps o perodo apostlico no

    tinham uma compreenso mais avanada sobre a essncia divina.

    Os apologistas e os escritores do sculo II no discutem a Trindade em seus

    escritos, embora a frmula Pai, Filho e Esprito Santo, de forma vaga e

    imprecisa, aparea com frequncia. Justino, o Mrtir (100-165), diz que o

    ministro de culto louva e glorifica ao Pai do universo atravs do nome de seu

    Filho e do Esprito Santo, e pronuncia uma longa ao de graas (IApologia 65.3). Atengoras de Atenas, numa apologia em favor doscristos acusados de atesmo, dirigida ao imperador Marco Aurlio em 177,

    apresenta as primeiras articulaes teolgicas da Trindade: Quem no se

    surpreender ao ouvir chamar de ateus indivduos que admitem um Deus Pai,

    um Deus Filho e um Esprito Santo, que mostram seu poder na unidade e sua

    distino na ordem? (Petio em Favor dos Cristos, I.10).

  • Irineu de Lio, falecido no ano 202, foi discpulo de Policarpo de Ismirna,

    por sua vez discpulo do apstolo Joo. A regula fidei, regra de f, ocredo usado na Igreja de Lio (uma cidade na atual Frana) no tempo de

    Irineu, diz o seguinte: Com efeito, a Igreja espalhada pelo mundo inteiro at

    os confins da terra recebeu dos apstolos e seus discpulos a f em um s

    Deus, Pai onipotente, que fez o cu e a terra, o mar e tudo quanto nele existe;

    em um s Jesus Cristo, Filho de Deus, encarnado para a nossa salvao; e no

    Esprito Santo (Contra as heresias, livro I 10.1). Mais adiante, ele declara:Sua Palavra e sua Sabedoria, seu Filho e seu Esprito, esto sempre junto

    dele... Sua Sabedoria, isto , o Esprito, estava com ele antes que o mundo

    fosse feito (Contra as heresias, livro IV 20.1, 3). Irineu diz ainda em outraobra: Sem o Esprito Santo impossvel ver o Verbo de Deus e sem o Filho

    ningum pode aproximar-se do Pai, porque o Filho o conhecimento do Pai e

    o conhecimento do Filho se obtm por meio do Esprito Santo. Mas o Filho,

    segundo a vontade do Pai, ministra e dispensa o Esprito a quem quer,

    conforme, como o Pai quer (Demonstracin de la PredicacinApostlica, 7).

    Justino, o Mrtir, e Irineu de Lio evitam afirmar de maneira explcita que o

    Esprito Santo Deus, mas reconhecem a sua divindade, como se v nos

    exemplos citados. Nenhum deles escreveu sobre o Esprito Santo, mas este

    mencionado com frequncia ao lado do Pai e do Filho. Nessas construes

    trinitrias, o Esprito Santo aparece no mesmo nvel do Pai e do Filho e com

    qualificaes divinas plenas, sem, contudo, afirmar de maneira direta que ele

    Deus. O que comum a todos os pais da Igreja, nesse perodo, a crena na

    triunidade de Deus. Todos eles defendiam uma f trinitariana, ainda que o

  • conceito desse trinitarianismo no seja satisfatrio.

  • TERTULIANO DE CARTAGOTertuliano de Cartago, uma cidade do norte da frica (155-224), advogado

    romano de formao intelectual estoica convertido ao cristianismo, tornou-se

    conhecido como o Pai do cristianismo latino. Ele refutou os monarquianistas

    modalistas, um grupo que no negava a divindade do Filho nem a do Esprito

    Santo, mas, sim, a distino destas Pessoas, de modo diametralmente contrrio

    ao ensino das igrejas desde os dias apostlicos. Seus principais representantes

    foram Noeto, Prxeas e Sablio.

    Noeto era natural de Esmirna e ensinava que Cristo era o prprio Pai, e o

    prprio Pai nasceu, sofreu e morreu. Cipriano (200-258 d.C.), bispo de

    Cartago, chamou a heresia de Noeto, num tom jocoso, de patripassionismo

    (Epstola 73), do latim Pater, Pai, e passus, de patrior, sofrer.Prxeas foi discpulo de Noeto, e a sua doutrina reacendeu no norte da frica

    em 213, atravs de um dos discpulos de Prxeas, quando Tertuliano comeou

    a sua refutao em Contra Prxeas, texto contendo captulos. Tertulianopolemizou com esses monarquianistas, dizendo: Prxeas fez duas obras do

    diabo em Roma: expulsou a profecia e introduziu a heresia; afugentou o

    Paracleto e crucificou o Pai (Contra Prxeas, I). O bispo Sablio foi oprincipal expoente do modalismo; ele ensinava que o Pai, o Filho e o Esprito

    Santo no eram trs Pessoas distintas, mas apenas trs aspectos do Deus

    nico. Nos tempos do Antigo Testamento, o Pai se manifestou como

    Legislador. Nos tempos do Novo Testamento, este Pai era o mesmo Filho

    encarnado e tambm fazia o papel de Esprito Santo como inspirador dos

    profetas.

  • Foi no combate ao sabelianismo que Tertuliano trouxe uma formulao

    trinitria melhor e mais compreensvel. dele o termo Trindade, trinitasem latim. Ele foi responsvel pela criao de 509 novos substantivos, 284

    novos adjetivos e 161 verbos na lngua latina (McGRATH, 2005, p. 375).

    Sua explicao sobre o Pai, o Filho e o Esprito Santo em uma s divindade

    preserva o monotesmo sem comprometer a deidade absoluta das trs Pessoas

    da Trindade. a unidade na Trindade e a Trindade na unidade.

    Todos so de um, por unidade de substncia, embora ainda esteja oculto o

    mistrio da dispensao que distribui a unidade numa Trindade, colocando em suaordem os trs, Pai, Filho e Esprito Santo; trs contudo, no em essncia, mas emgrau; no em substncia, mas em forma, no em poder, mas em aparncia, poiseles so de uma s substncia e de uma s essncia e de um poder s, j que de um s Deus que esses graus e formas e aspectos so reconhecidos com onome de Pai, Filho e Esprito Santo (Contra Prxeas, II Grifo nosso).

  • Tres autem non statu sed gradu, nec substantia sed forma, nec potestate sedspecie, unius autem substabtiae et unius status et unius potestatis, quia unus Deusex quo et gradus isti et formae et species in nomine Patris et Filii et Spiritus Sanctideputantur (Adversus Praxean, II).

    Tertuliano apresenta aqui uma breve interpretao da natureza divina

    conforme revelada nas Escrituras e no testemunho das igrejas desde a era

    apostlica. a primeira frmula, trinitria que atravessou os sculos. O que

    ele escreveu aqui vale ainda hoje, apesar das diversas pontas soltas que

    precisaram ser amarradas posteriormente, mas a sua estrutura da Trindade na

    unidade e da unidade na Trindade mantida em Orgenes, Atansio, nos pais

    capadcios, em Hilrio de Poitiers e em Agostinho de Hipona, entre outros.

    O termo mostra o esforo de Tertuliano para provar que a trplice

    manifestao revelada na histria salvfica compatvel com a unidade

  • substancial de Deus. O Pai, o Filho e o Esprito Santo so da mesmasubstncia, mas essa essncia divina uma s; a diferena est nas formas,

    graus e aspectos. Ele emprega o termo latino, unus, ou o seu derivado,unicus, para o verdadeiro Deus do cristianismo. Faz isso na tentativa deafastar a ideia de tritesmo, acusao feita por seus opositores

    monarquianistas. Ele usa ainda outra palavra, unitas, derivado do verbounire, que significa a unidade interna e orgnica da natureza divina...Unitas, portanto, o abstrato do termo unus, ou seja, um por natureza,uniforme, unificado, sem necessidade de ser reduzido unidade

    aritmtica (MORESCHINI, 2008, pp. 205, 206). Assim, a unidade na

    Trindade e a Trindade na unidade so uma defesa do monotesmo judaico-

    cristo. Essa primeira formulao trinitria foi muito til, e as igrejas do

    Ocidente se valeram dela por muito tempo sem alterao do texto, apesar de

    suas limitaes. inegvel a contribuio de Tertuliano para a poca, mas

    muitas perguntas que ficaram sem respostas foram solucionadas no Oriente a

    partir de Atansio e dos pais capadcios.

    Tertuliano escreveu em latim. A substncia, substantia em latim, significaem si substncia, ser, realidade de uma coisa, essncia. Isso quer dizer

    coisa subjacente, material ou espiritual, de coisas, aquilo que existe

    (MULLER, 1993, p. 290). O seu equivalente grego hipstase ou ousa.Hipstase a forma de existir; o termo vem de duas palavras gregas: hypo,sob, e istathai, ficar. E ousa significa essncia, ser. A essncia aqualidade do ser, o qual faz o ser precisamente o que ele . Exemplo: a

  • essncia de Pedro, Paulo e Joo sua humanidade; a essncia de Deus

    deidade ou divindade (MULLER, 1993, pp. 105, 106). Mas a palavra latina

    usada para essncia nessa declarao de Tertuliano status, condio,qualidade. Todos esses termos filosficos aparecem nas controvrsias

    cristolgicas, trinitrias e pneumatolgicas, e a grande dificuldade de

    compreenso est na falta de preciso na definio dessas palavras. O que

    Tertuliano chama aqui de graus, formas e aspectos, ele passa a chamar de

    persona, Pessoa, ou personae, no plural, mais adiante (ContraPrxeas, XII), ao mostrar a unidade na Trindade no relato da Criao (Gn1.26, 3.22).

    Tertuliano foi o primeiro a usar o termo Pessoa para os membros da

    Trindade. Uma substncia e trs Pessoas. O vocbulo Pessoa inadequado

    para aplicar s trs identidades distintas da Trindade. Os pais capadcios

    evitaram usar esse termo para identificar o Pai, o Filho e o Esprito Santo na

    Trindade. Em vez de falar em trs Pessoas da Trindade, eles as identificavam

    como trs hipstases.

  • ORGENESOrgenes o principal representante no Oriente, antes de Niceia. Por que

    no dizer que ele foi o fundador da teologia oriental? Orgenes nasceu em 185,

    em Alexandria, Egito, e morreu em Tiro, onde foi torturado at a morte em

    254, por causa de sua f em Jesus. Alexandria j era um grande centro cultural

    mesmo antes do surgimento da Igreja. O cristianismo prosperou nessa cidade,

    que veio a ser um dos importantes centros cristos da Antiguidade. A escola

    de Alexandria foi fortemente influenciada pelo neoplatonismo, escola

    filosfica fundada por Amnio Saccas (175-242), de quem Orgenes foi

    discpulo.

    Orgenes foi um grande defensor da f crist, mas o seu pensamento

    teolgico, sobretudo sobre a Trindade, apresenta forte afinidade com a

    filosofia neoplatnica defendida por Plotino, principal expoente do

    neoplatonismo, discpulo de Saccas e colega de classe de Orgenes. O prprio

    Orgenes admite essa influncia quando afirma que a ideia da existncia de um

    Pai e de um Filho de Deus era comum tambm a muitos pagos, sendo que o

    Esprito Santo exclusividade dos cristos (Tratado sobre osPrincpios, livro I 3.1). O que Tertuliano veio chamar de personae daTrindade, Orgenes chamava de hipstase. Esse termo foi consagrado

    posteriormente pelos pais capadcios para identificar o Pai, o Filho e o

    Esprito Santo individualmente. Como Tertuliano, Orgenes tambm

    discordava dos modalistas no fato de confundir as trs Pessoas da Trindade.

    O que mais grave no trinitarianismo de Orgenes a ideia da condio de

    inferioridade do Filho em relao ao Pai. Ele afirma que o Filho e o Esprito

  • Santo tambm so divinos (Patrologia grega 2.3.20), mas diz em outrolugar que essa divindade secundria (Contra Celso 5.39) e considera o

    Esprito Santo criatura do Logos: o mais honorvel de todos os seres trazidos

    existncia pela Palavra, o principal em ordem de importncia, dentre todos

    os seres que tiveram origem no Pai por meio de Cristo (In Johan 2.10.75apud KELLY, 2009, p. 95). Segundo os crticos de Orgenes, ele ensinavaque o poder do Pai maior do que o do Filho e do Esprito Santo, e o poder

    do Filho maior do que o do Esprito Santo. Isto est numa carta endereada

    a Mena, patriarca de Constantinopla (536-552). Essa informao aparece

    numa epstola de Jernimo a Avito. Orgenes exerceu grande influncia no

    Oriente por mais de 100 anos. Observe-se que o historiador da Igreja, Eusbio

    de Cesareia foi influenciado pelo pensamento de Orgenes. Ele mesmo fundou

    uma escola teolgica nessa cidade de Cesareia e permaneceu l durante 20

    anos. Eusbio assimilou tambm essa doutrina subordinacionista de Orgenes,

    pois escreveu: Como os orculos dos hebreus classificam o Esprito Santo

    em terceiro lugar depois do Pai e do Logos (Preparatio Evangelica,XI.21.1).

  • ATANSIO comum ouvir representantes das seitas antitrinitarianas dizerem que a

    doutrina da Trindade de origem pag e foi imposta por um imperador pago

    no Conclio de Niceia em 325. Esses argumentos das organizaes contrrias

    f trinitria so falsos. O Conclio de Niceia no tratou da Trindade; a

    controvrsia foi em torno da identidade Jesus de Nazar.

    Os credos anteriores ao sculo IV eram de carter local e estavam

    relacionados ao batismo na preparao catequtica; sua autoridade procedia

    da igreja local de onde o documento se originou. So os chamados credos

    sinodais. O Credo Niceno a primeira frmula publicada por um conclio

    ecumnico e a primeira a possuir status de valor universal em sentido legal.O documento resultado da chamada controvrsia ariana, que comeou no ano

    318 em Alexandria, no Egito. O confronto girava em torno da identidade do

    Senhor Jesus Cristo e a questo era sobre a sua deidade e igualdade com o

    Pai.

    O documento aprovado em Niceia tornou-se ponto de partida, ao invs de

    ponto de chegada. A controvrsia prosseguiu por duas razes principais: a

    volta do arianismo e a indefinio sobre a identidade do Esprito Santo. O

    Conclio de Constantinopla em 381 reconheceu e ampliou o texto da frmula

    teolgica aprovada em Niceia em 325. O tema do Conclio de Niceia ser

    analisado no captulo seguinte.

    Atansio (300-373) foi um dos principais defensores da f nicena nos anos

    que se seguiram ao Conclio de Niceia. Ele polemizou com os arianos em

    defesa da divindade do Filho; sua discusso era cristolgica em sua obra

    Contra os arianos; e ele refutou tambm os tropicianos4 e os

  • pneumatomacianos,5 em defesa da divindade do Esprito Santo, em

    Epstolas a Serapio sobre o Esprito Santo. A cristologia deAtansio estava enraizada no homoousianismo, termo grego derivado dehomoosios, que significa ser da mesma substncia, da mesmaessncia, usado no Credo Niceno ao declarar que o Filho consubstancial

    com o Pai ou da mesma substncia do Pai, homoosion t patr, emgrego. Na poca de Atansio, o pensamento neoplatnico e origenista estava

    bem sedimentado no Oriente, de modo que essas ideias aparecem na teologia

    atanasiana, mas o seu conceito de Trindade era nos termos de

    consubstancialidade e sem o subordinacionismo de Orgenes (Epstola aSerapio, livro I 14.4, 28.1).

    Atansio foi claro e direto ao afirmar que o Esprito Santo consubstancial

    com o Pai e com o Filho. Cirilo de Jerusalm (315-386), contemporneo de

    Atansio, refutava as heresias de sua gerao em favor da Trindade

    (Catequese, XVI.3).

  • OS PAIS CAPADCIOSA Capadcia aparece no Novo Testamento (1 Pe 1.1). Os pais capadcios

    deram continuidade defesa da ortodoxia nicena. Eles, como Atansio,

    escreveram em grego. So eles Baslio de Cesareia, Gregrio de Nissa e

    Gregrio de Nazianzo. Eles contriburam de maneira especial na formulao

    definitiva da Trindade. E precisaram definir os termos flutuantes ousa ehipstases na linguagem trinitria. Empregavam o mesmo termohipstase empregado por Orgenes para designar as Pessoas da Trindade.

    Em vez de usar substncia divina nica, falavam em uma ousa em trshipstases. A essncia da doutrina deles que a nica Divindade existesimultaneamente em trs modos de ser ou hipstases (KELLY, 2009, p. 199).

    Como Atansio, eles defendiam o homoosios do Filho e do EspritoSanto. Neles est o clmax do desenvolvimento da doutrina da Trindade.

    Baslio de Cesareia (330-379), cidade da Capadcia, hoje na Turquia,

    combateu os antigos arianos, os neoarianos, os semiarianos e os

    pneumatomacianos. Escreveu no ano 373 uma refutao aos argumentos do

    maior expoente do arianismo radical, o arianista anomoeano de nome

    Eunmio: Contra Eunmio; escreveu tambm Sobre o EspritoSanto, uma defesa a doxologia: Glria seja ao Pai, com o Filho, juntamentecom o Esprito Santo. Como Atansio, Baslio tambm colocava o Esprito

    Santo no mesmo nvel do Pai e do Filho na frmula batismal de Mateus 28.19.

    Evitando termos filosficos, procurava usar uma linguagem prxima da

    linguagem bblica. Ele no emprega o termo homoosios, mas defende a

  • Trindade em outras palavras: Como o Pai um e um o Filho, assim tambm

    um o Esprito Santo (Tratado sobre o Esprito Santo, 18.45).Gregrio de Nissa (335-394) era o irmo mais moo de Baslio. Ele

    escreveu Sobre a Trindade, continuao da obra Contra Eunmio,de autoria de seu irmo. Gregrio de Nissa refutou a doutrina tritesta do

    heresiarca Ablbio na obra Sobre No Trs Deuses. Ablbioconsiderava o Pai, o Filho e o Esprito Santo trs Deuses. Gregrio de Nissa,

    como os seus companheiros, defendia a ideia de que a unidade da ousa, ouDivindade, procede da unidade da ao divina desvendada na revelao

    (KELLY, 2009, p. 201). Do rico epistolrio de Baslio, contendo 366

    epstolas, na de nmero 189, Gregrio de Nissa, seu irmo, escreve: Uma

    atividade individual do Pai, do Filho e do Esprito Santo, em nenhum aspecto

    diferente para qualquer que seja a Pessoa, somos obrigados a inferir uma

    unidade de natureza a partir da identidade de atividade; pois o Pai, o Filho e o

    Esprito Santo cooperam na santificao, na vivificao, na consolao, e

    assim por diante.

    Gregrio de Nazianzo (329-389) combateu os mesmos opositores de seus

    companheiros Baslio e seu irmo Gregrio de Nissa: Eunmio e os

    pneumatomacianos. Escreveu com elegncia e clareza sobre a Trindade e,

    especialmente, sobre o Esprito Santo, por meio de epstolas, poemas e

    sermes. As Oraes Teolgicas ou Discursos Teolgicos sonumerados de 27 a 31, que correspondem respectivamente da primeira

    quinta Orao. Para ele, a divindade existe indivisa em Pessoas divididas

    (Discurso 31.14). Gregrio de Nazianzo dizia que o Pai se distingue por

  • no ter sido gerado, agennsa, ingnito, no-gerado; o Filho, por tersido gerado, e o Esprito Santo por ser enviado, procedente (Discursos,31.8). Ele defende a doutrina da Trindade com muita propriedade e vigor e ao

    mesmo tempo responde aos sabelianistas e aos tritestas (Discurso 31.9).Gregrio de Nazianzo defendia a ideia de que as Escrituras aplicavam todos

    os ttulos e atributos pertencentes a Deus Filho e ao Esprito Santo. E no

    somente isso, mas tambm chamou a ateno para o fato de que a palavra

    santo aplicada ao Esprito no era resultado de nenhuma fonte externa, mas

    era algo prprio de sua natureza. Segundo Paul Tillich, foi Gregrio de

    Nazianzo quem criou a frmula definitiva da doutrina da Trindade (TILLICH,

    2004, p. 92). Mas esses telogos capadcios deixaram ainda uma ponta solta,

    a questo da filioque, a dupla processo do Esprito Santo.

  • AGOSTINHO DE HIPONAAgostinho (354-432) reconhecido como um dos maiores gnios teolgicos

    de todos os tempos. Hipona era uma cidade do norte da frica. J. D. N. Kelly

    disse que Agostinho deu tradio ocidental sua expresso madura final

    (KELLY, 2009, p. 205). Ele escreveu entre 399 e 419 De Trinitate, Sobrea Trindade, obra contendo 15 captulos produzidos em 16 anos, 209 sobre o

    tema no qual meditou a vida inteira. Agostinho respondia s indagaes sobre

    o assunto que as pessoas lhes traziam. No livro I, captulo 7, de ATrindade, citando alguns exemplos, ele explica o significado das palavrasde Jesus: o Pai maior do que eu (Jo 14.28), e no captulo seguinte, ele

    esclarece as palavras do apstolo Paulo sobre a sujeio do Filho ao Pai (1

    Co 15.28).

    O bispo de Hipona resgata a frmula bsica de Tertuliano sobre a unidade

    na Trindade e a Trindade na unidade. Nos livros I-IV, ele defende a sua

    consubstancialidade com base nas Escrituras. A doutrina das relaes das

    Pessoas da Trindade, umas das caractersticas peculiaridade de Agostinho

    aparece nos livros V-VIII. Em seguida, nos livros IX-XIV, ele argumenta que

    se pode conhecer algo da natureza divina pela compreenso da verdade e pelo

    conhecimento do sumo bem pelo amor justia. O livro XV a concluso de

    seu pensamento.

    Agostinho preserva a consubstancialidade do Filho e do Esprito Santo com

    o Pai e a unidade nas trs hipstases: O Pai, o Filho e o Esprito Santo

    perfazem uma unidade divina pela inseparvel igualdade de uma nica e

    mesma substncia (Trindade, livro I 4.7). A expresso grega usual nos pais

  • capadcios man ousan, treis hypostseis,6 uma ousa, trshipstases, mas Agostinho no via diferena entre ousa e hipstase.Assim preferia o uso de uma substncia, trs Pessoas, mesmo reconhecendo a

    limitao da linguagem humana para descrever a revelao (Trindade, livroV 9.10b).

    Na doutrina de Agostinho o subordinacionismo fica descartado e a unidade

    da santssima Trindade em trs Pessoas distintas mantida: No so,

    portanto, trs deuses, mas um s Deus, embora o Pai tenha gerado o Filho, e

    assim, o Filho no o que o Pai. O Filho foi gerado pelo Pai, e assim, o Pai

    no o que o Filho . E o Esprito Santo no o Pai nem o Filho, mas somente

    o Esprito do Pai e do Filho e pertence unidade da Trindade (Trindade,livro I 4.7b). Isso foi estruturado em forma de credo posteriormente, no

    chamado Credo de Atansio. Esse credo agostiniano de ponta a ponta

    (KELLY, 2009, p. 206). Isso se evidencia ainda mais em sua obra (ADoutrina Crist, I.5).

    O trinitatismo de Agostinho apresenta algumas dificuldades como tem

    acontecido tambm nos demais pais da Igreja que escreveram antes dele.

    Alguns desses pontos so comentados por um intelectual russo da igreja

    Ortodoxa, que analisa tambm as principais ideias trinitrias e

    pneumatolgicas da patrstica. Seu nome Sergui Bulgkov.7 Ele analisa

    tambm o trinitariasmo de Agostinho. O Oriente e o Ocidente sempre tiveram

    as suas diferenas: A teologia do Ocidente, no sculo IV, segue seu prprio

    caminho, paralelo ao Oriente, ainda que independente deste. Por outro lado,

    suas relaes, a causa de uns conhecimentos lingusticos insuficientes e de

  • razes histricas gerais, foram remotas. Por essa razo no de estranhar que

    seus caminhos divirjam justamente a partir do sculo IV (BULGKOV, 2014,

    p. 85).

    As crticas a Agostinho so vrias, entre elas o fato de o bispo de Hipona

    no proceder a partir da Trindade das hipstases como os capadcios, seno

    da unidade da ousa, ou essncia. Paul Tillich diz que Agostinho interessou-se muito mais pela unidade de Deus do que pelas diferentes hipostseis,pelas trs personae, em Deus. Ele um desses responsveis pelainclinao contempornea para aplicar o termo persona a Deus, em vez deaplic-lo individualmente ao Pai, ao Filho e ao Esprito Santo (TILLICH,

    2004, p. 129). Bulgkov afirma que a unidade da Santssima Trindade nas

    trs hipstases est garantida justamente por essa unidade de substncia

    (2014, p. 85).

    A outra crtica ao fato de Agostinho considerar a Trindade como o amor;

    trata-se de uma anlise que ele faz entre a Trindade e a vida pessoal humana:

    Esto as trs realidades (amans, quod amatur et amor), aquele queama, o que amado e amor (Trindade, livro VIII 10.14). Bulgkov dizque essa ideia original de Agostinho completamente estranha teologia

    oriental: Esta imagem trinitria do amor, aplicada Santssima Trindade, a

    complica mais introduzindo nela o elemento mente, pois em Agostinho a

    Trindade anloga memria, inteligncia e vontade (2014, p. 88). Ele

    emprega o conceito da Trindade para descrever Deus analogicamente como

    Pessoa. Sendo Pessoa, portanto, unidade, todos os atos de Deus para fora (ad

  • extra) so sempre atos da Trindade toda, at mesmo a encarnao(TILLICH, 2004, p. 129). Essa talvez seja a contribuio mais original de

    Agostinho.

    Sobre o sujeito das teofanias registradas no Antigo Testamento, segundo

    Agostinho, elas podem ser atribudas s vezes ao Pai, ora ao Filho e tambm

    ao Esprito Santo, ou ainda aos trs (Trindade, livro II caps. 14-34).Bulgkov (2014) argumenta que telogos orientais como Gregrio de

    Nazianzo se negam a aceitar nessas teofanias hipstases separadas, mas como

    manifestaes do nico Deus que est na santssima Trindade.

    Agostinho diz que as diferenas no esto em seu ser, mas nas relaes que

    se expressam nos nomes de cada Pessoa. Bulgkov apresenta nas suas

    observaes a questo da filioque, a qual Agostinho parece ser favorvel. Otermo vem do latim e significa e do Filho, com respeito processo do

    Esprito Santo. As igrejas orientais sustentam que esse termo, que aparece no

    Credo Niceno-Constantinopolitano e no Credo de Atansio, no autntico,

    mas uma glosa inserida posteriormente no texto que resultou no primeiro

    Cisma da Igreja, ruptura do Oriente com o Ocidente em 1054.

  • O CREDO DE ATANSIO OUATANASIANO

    O Credo de Atansio contm 44 artigos de f, e a sua data cerca do ano

    500. tambm conhecido como Quicunque, quem quer que seja, todoaquele, expresso latina com a qual o Cedo comea: Quincunque vultsalvus esse, Todo aquele que quer ser salvo. Os antigos manuscritos efragmentos que vo do sculo 7 ao 9, dos quais Kelly enumera 14 (KELLY,

    1964, p. 16), apresentam ttulos variados e entre eles: Fides sanctiAthanasii episcopi Alexandriae, A f do santo Atansiobispo de Alexandria. O texto foi redigido por um autor annimo no sulda Frana por volta do ano 500. O nome de Atansio est vinculado obra

    porque ela expressa o pensamento que Atansio manifestou durante a sua vida

    em defesa da f nicena. Citamos aqui apenas os seis primeiros artigos.

    1 Todo aquele que quer ser salvo, antes de tudo, deve professar a f crist.8 2 A

    qual preciso que cada um guarde perfeita e inviolada ou ter com certeza deperecer para sempre. 3 A f crist esta: que adoremos um Deus em trindade, etrindade em unidade. 4 No confundimos as Pessoas, nem separamos a substncia.5 Pois existe uma nica Pessoa do Pai, outra do Filho, e outra do Esprito Santo. 6Mas a deidade do Pai, do Filho e do Esprito Santo toda uma s: glria igual e amajestade coeterna.

    Os credos ecumnicos so trinitrios na sua forma, estrutura e contedo, mas

    o Credo de Atansio emprega o termo Trindade de maneira direta: que

    adoremos um Deus em Trindade, e Trindade em unidade (artigo 3); nessa

  • Trindade, no existe primeiro nem ltimo (artigo 25); tanto a unidade na

    Trindade como a Trindade na unidade deve ser adorada (artigo 27); quem

    quiser ser salvo, deve pensar assim a respeito da Trindade (artigo 28).

    Esse Credo o mais longo de todos os credos ecumnicos. A estrutura do

    texto est dividida em cinco partes: a) introduo (artigos 1, 2); b) definio e

    exposio da doutrina da Trindade (artigos 3-27); c) afirmao de que todoaquele que quiser ser salvo precisa aceitar a viso de um Deus trino e uno

    conforme definio do Credo (artigos 28, 29); d) fala sobre a encarnao doVerbo, enfatizando particularmente o ensino da Igreja sobre Jesus como

    perfeitamente divino e perfeitamente humano (artigos 30-37); e) reafirmaodo ensino dos credos anteriores, como o Credo dos Apstolos e o Credo

    Niceno-Constantinopolitano dos apstolos. Em resumo, retoma a linguagem do

    Credo Niceno-Constantinopolitano sobre a esperana crist (artigos 30-43) e

    finaliza reafirmando a introduo: Esta a f universal: a menos que um

    homem creia fiel e firmemente, no pode ser salvo (artigo 44).

    Os artigos 3-6 parecem uma contradio quando falam em no confundir as

    Pessoas e ao mesmo tempo defendem essa ideia, concluindo que o Pai, o Filho

    e o Esprito Santo possuem uma mesma deidade. Isso uma resposta aos

    sabelianistas, que confundem as Pessoas, e aos arianistas, que separam as

    Pessoas. Na atualidade, a resposta se dirige aos movimentos Voz da Verdade e

    Tabernculo da F, entre outros, que tambm confundem as Pessoas; e tambm

    s testemunhas de Jeov, que separam a substncia.

    3 O termo grego logos , em si mesmo, de cunho filosfico e se traduz dediversas maneiras como palavra, razo, pensamento, expresso. Herclito(540-475 a.C.), um dos filsofos pr-socrticos, dizia que o Logos era um

  • princpio divino que governava o universo e impedia que o mundo, emconstante mutao, se tornasse o caos. O apstolo Joo mostra aos gregosque o Logos Deus e pessoal, aparecendo em nossas verses da Bbliacomo o Verbo (Jo 1.1), o Senhor Jesus Cristo (Jo 1.14).

    4 Os tropicianos eram uma seita do Egito; o nome vem de tropos, figura.Atansio assim o denominou por causa da exegese figurada deles. Elesdiziam ser o Esprito Santo um anjo e uma criatura.

    5 Os pneumatomacianos surgiram depois dos tropicianos. O termopneumatomachoi, de pneuma, esprito, e machomai, falar mal, contra,eram os opositores do Esprito. O nome foi dado por Atansio ao gruporeligioso liderado por Eustquio de Sebaste (300-380), que no aceitava adivindade do Esprito Santo.

    6 Mi,an ouvsi,an, trei/j u`posta,seij.7 Sergui Bulgkov (1871-1944), cristo ortodoxo reconhecido como um dosgrandes telogos russos do sculo 20, alm de filsofo e economista.Lecionou em Livny, Rssia, e em Paris e foi autor de diversos livros. Em suaobra sobre o Esprito Santo, escrita originalmente em russo e intitulada TheComforter, em ingls e El Parclito em espanhol, ele apresenta uma anlisehistrica da pneumatologia, envolvendo tambm a doutrina da Trindade.

    8 O termo crist em f crist, fides catholica, em latim (artigos 1, 3, 44) a verso dada aqui. O vocbulo grego kaqoliko,j (katholiks) universal,geral, de onde vem a palavra latina catholica, significa literalmente, deacordo com o todo, pois o substantivo composto de kat e de (holos). Apreposio grega, kat, significa tambm, conforme, de acordo, segundo, ea palavra holos, todo, inteiro, completo. Foi Incio, bispo de Antioquia(70110), que empregou o termo para designar a Igreja com o sentido degeral, universal. Mas, o sentido exato do termo perdeu-se com o tempo ehoje tem outro significado. A expresso, fides catholica, no diz respeito Igreja Catlica Romana de hoje.

  • O

    C A P T U L O 4

    tema sobre a verdadeira identidade de Jesus de Nazar algo

    palpitante e ao mesmo tempo oportuno. So milhes de seres

    humanos que ainda no conhecem o verdadeiro Jesus dos

    evangelhos. Muitas pesquisas criteriosas foram realizadas sobre a vida e a

    obra de Jesus ao longo dos sculos; no entanto, Ele continua sendo a

    personagem mais controvertida e mais importante da Histria. Jesus tema de

    filmes, msicas, livros, poesias, pinturas e teatros como ningum. Sua histria

    est traduzida em 2.935 lnguas. Ele revelou seu poder sobre o reino das

    trevas, sobre Satans e sobre o inferno (Mc 5.7-13); sobre as enfermidades e

    sobre a morte (Mt 10.8); sobre o pecado e sobre a natureza (Jo 8.46; Mt 8.26,

    27). Seus discpulos chegaram a perguntar: Que homem este? (Mt 8.27). O

    prprio Jesus perguntou certa vez: Quem dizem os homens ser o Filho do

    homem? (Mt 16.13). A resposta certa depende da revelao divina porque

    no foi carne e sangue quem to revelou, mas meu Pai, que est no cu (Mt

    16.17); E ningum pode dizer que Jesus o Senhor, seno pelo Esprito Santo

    Santo (1 Co 12.3).

  • Desde os primeiros sculos do cristianismo, houve tentativa de resposta

    para essa pergunta, mas, sem a revelao divina, ningum capaz de acertar.

    Os grandes heresiarcas do passado fracassaram como os gnsticos: Simo de

    Samaria, Saturnino, Basisides, Cerinto, Marcio e Valentino, entre outros; os

    monarquianistas: dinmicos como Tedoto de Bizncio, o Curtido, e Paulo

    de Samosata; modalistas, Noeto, Prxeas e Sablio; rio, Apolinrio, os

    monofisitas Eutique e Jac Baradeus. Os discpulos deles ainda esto por a.

    O Esprito Santo j havia falado de antemo por meio do ministrio do

    apstolo Paulo a respeito dos pregadores de um Jesus estranho aos evangelhos

    (2 Co 11.4).

  • O JESUS DAS ESCRITURAS

    A sua divindadeA Bblia afirma textualmente e com todas as letras que Jesus o verdadeiro

    Deus, o mesmo Deus Jav de Israel:

    O Filho chamado Deus Forte (Is 9.6); Jav, Justia Nossa ou O SENHOR,

    Justia Nossa (Jr 23.6); e o Verbo era Deus (Jo 1.1); Tom respondeu, e disse-lhe: Senhor meu, e Deus meu! (Jo 20.28); e dos quais Cristo, segundo a carne, oqual sobre todos, Deus bendito eternamente. Amm (Rm 9.5); Que, sendo emforma de Deus, no teve por usurpao ser igual a Deus (Fp 2.6); enriquecidos daplenitude da inteligncia, para conhecimento do mistrio de Deus Cristo (Cl 2.2);Porque nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade (Cl 2.9);Aguardando a bem-aventurada esperana e o aparecimento da glria do grandeDeus e nosso Senhor Jesus Cristo (Tt 2.13); Mas, do Filho diz: Deus, o teutrono subsiste pelos sculos dos sculos, cetro de equidade o cetro de teu reino(Hb 1.8); Simo Pedro, servo e apstolo de Jesus Cristo, aos que conoscoalcanaram f igualmente preciosa pela justia do nosso Deus e Salvador JesusCristo (2 Pe 1.1); E sabemos que j o Filho de Deus vindo, e nos deuentendimento para conhecermos o que verdadeiro; e no que verdadeiro estamos,isto , em seu Filho Jesus Cristo. Este o verdadeiro Deus e a vida eterna (1 Jo5.20); Eis que vem com as nuvens, e todo o olho o ver, at os mesmos quetranspassaram; e todas as tribos da terra se lamentaro sobre ele. Sim. Amm. Eusou o Alfa e o mega, o princpio e o fim, diz o Senhor, que , e que era, e que hde vir, o Todo-poderoso (Ap 1.7, 8).

    As Escrituras mostram diversas vezes o Senhor Jesus ao lado do Pai,

    revelando assim a sua divindade:

  • Graa e paz de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo (Rm 1.7); todavia,para ns h um s Deus, o Pai, de quem tudo e para quem ns vivemos; e um sSenhor, Jesus Cristo, pelo qual so todas as coisas, e ns por ele (1 Co 8.6);Mando-te diante de Deus, que todas as coisas vivifica, e de Cristo Jesus, que diantede Pncio Pilatos deu o testemunho de boa confisso (1 Tm 6.13); Conjuro-te,pois, diante de Deus e do Senhor Jesus Cristo, que h de julgar os vivos e osmortos, na sua vinda e no seu Reino (2 Tm 4.1).

    O Senhor Jesus possui os mesmos nomes e ttulos divinos, como Jav dos

    Exrcitos e Criador. Jesus o mesmo Deus Jav dos Exrcitos. Quem esse

    Rei da Glria? O SENHOR dos Exrcitos, ele o Rei da Glria (Sl 24.10).

    Este salmo transcende um marco nacional. um salmo proftico que fala

    sobre o retorno de Cristo sua glria, na sua ascenso. o cntico dos anjos e

    a festa de recepo do Filho de Deus, pois Ele voltou vitorioso ao cu. O

    Novo Testamento chama Jesus de o Senhor da Glria (1 Co 2.8). As

    portas e entradas eternas (Sl 24.7) se referem s portas do cu que se

    abriram para receber o Rei dos reis, e isso se cumpriu em Atos 1.9-11. Isaas

    6.3 diz que a terra est cheia da glria de Jav dos Exrcitos; entretanto, o

    Novo Testamento diz que esse Jav Jesus. Compare Isaas 6.3, 10 com Joo

    12.40,41. O v. 40 uma citao de Isaas 6.10, e o v. 41, de Isaas 6.3. Assim,

    a Bblia ensina que Jesus o Deus-Jav dos Exrcitos.

    Jesus o mesmo Jav. Jesus chamado de Jav Justia Nossa (Jr 23.5, 6).

    Os profetas Isaas e Malaquias profetizaram que Joo Batista seria aquele que

    viria ante a face de Jav (Is 40.3; Ml 3.1). Estas palavras foram citadas por

    Zacarias por ocasio do nascimento de Joo: E tu, menino, sers chamado

    profeta do Altssimo, porque hs de ir ante a face do Senhor, a preparar os

    seus caminhos (Lc 1.76). Veja que o nome Senhor est no lugar de Jav,

  • entretanto Joo Batista foi o precursor de Jesus (Lc 3.28). O profeta Ezequiel

    chama o Messias de Jav, Deus de Israel: E disse-me o SENHOR: Esta porta

    estar fechada, no se abrir; ningum entrar por ela, porque o SENHOR

    Deus de Israel entrou por ela: por isso estar fechada (Ez 44.2). Esta

    profecia comeou a se cumprir quando Jesus entrou em Jerusalm. Montado

    num jumento, Ele caminhou no sentido do monte das Oliveiras ao centro da

    cidade, e passou pela Porta Oriental (Ne 3.29), atualmente a Porta Dourada, a

    nica que d acesso direto ao ptio do templo (Mc 11.11). Esta porta, que fica

    no lado oriental de Jerusalm, foi lacrada no ano de 1542 por ordem do sulto

    Suleiman II, o Magnfico, e permanece fechada at hoje. Quem este Jav

    Deus de Israel que entrou por esta porta? Jesus, o profeta de Nazar.

    A Bblia revela tambm a divindade de Jesus e a sua igualdade com o Pai

    nos seus atributos incomunicveis. Jesus eterno; Ele existe desde a

    eternidade e cujas sadas so desde os tempos antigos, desde os dias da

    eternidade (Mq 5.2); Pai da Eternidade (Is 9.6); Jesus Cristo o mesmo

    ontem, hoje e eternamente (Hb 13.8). Ele mesmo declarou ser onipotente: -

    me dado todo o poder no cu e na terra (Mt 28.18); Eu sou o Alfa e o

    mega, o Princpio e o Fim, diz o Senhor, que , e que era, e que h de vir, o

    Todo-poderoso (Ap 1.8). A Bblia mostra que Jesus est acima de todo o

    principado, e poder, e potestade, e domnio, e de todo o nome que se nomeia,

    no s neste sculo, mas tambm no vindouro (Ef 1.21). Jesus mesmo afirmou

    ser onipresente: Porque onde estiverem dois ou trs reunidos em meu nome,

    a estou eu no meio deles (Mt 18.20) e mais: Eis que estou convosco todos

    os dias, at a consumao dos sculos. Amm (Mt 28.20). Ele onisciente,

    pois sabe todas as coisas: Agora, conhecemos que sabes tudo e no precisas

    de que algum te interrogue. Por isso, cremos que saste de Deus (Jo 16.30);

  • Senhor, tu sabes tudo (Jo 21.17); em Cristo esto escondidos todos os

    tesouros da sabedoria e da cincia (Cl 2.2, 3). Jesus o Criador do cu e da

    terra: Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se

    fez (Jo 1.3); porque nele foram criadas todas as coisas que h nos cus e na

    terra, visveis e invisveis, sejam tronos, sejam dominaes, sejam

    principados, sejam potestades; tudo foi criado por ele e para ele (Cl 1.16).

    Alm disso, Jesus transcende a criao; isso significa que ele um ser parte

    da criao, no participa dela: E ele antes de todas as coisas, e todas as

    coisas subsistem por ele (Cl 1.17).

    A sua humanidadePorque h um s Deus, e um s mediador entre Deus e os homens, Jesus

    Cristo homem (1 Tm 2.5). Jesus Cristo o eterno e verdadeiro Deus e ao

    mesmo tempo o verdadeiro homem. Tornou-se homem para suprir a

    necessidade humana. O termo Emanuel traduzido pelo prprio escritor

    sagrado por DEUS CONOSCO (Mt 1.23). Isso mostra que Deus assumiu a

    forma humana e como homem viveu entre ns: E o Verbo se fez carne e

    habitou entre ns, e vimos a sua glria, como a glria do Unignito do Pai,

    cheio de graa e de verdade (Jo 1.14); E todo o esprito que confessa que

    Jesus no veio em carne no de Deus... (1 Jo 4.3). O ensino da humanidade

    de Cristo, no entanto, no neutraliza a sua divindade, pois Ele possui duas

    naturezas a humana e a divina , o que est claramente expresso no seu nome

    Emanuel.

    Jesus foi revestido do corpo humano porque o pecado entrou no mundo por

    um homem e pela justia de Deus tinha de ser vencido por um homem (Rm

    5.12,18,19). Jesus se fez carne, fez-se homem sujeito ao pecado, embora nunca

  • houvesse pecado (Hb 4.15), e venceu o pecado como homem (Rm 8.3). A

    Bblia mostra que todo o gnero humano est condenado; que o homem est

    perdido e debaixo da maldio do pecado (Sl 14.2, 3; Rm 3.23). Todos so

    devedores, e por isso ningum pode pagar a dvida do outro. A Bblia diz que

    somente Deus pode salvar (Is 43.11). Ento, esse mesmo Deus tornou-se

    homem, trazendo-nos o perdo de nossos pecados e cumprindo ele mesmo a

    lei que promulgara (At 4.12; 1 Tm 3.16; Cl 2.14). Quando Jesus estava na

    terra, no se apegou s prerrogativas da divindade para vencer o diabo, mas

    aniquilou a Si mesmo, fazendo-se semelhante aos homens (Fp 2.5-8).

    Os evangelhos revelam atributos caractersticos do ser humano em Jesus,

    como por exemplo:

    Ele nasceu de uma mulher, embora gerado pela ao sobrenatural do Esprito

    Santo. Seu nascimento, contudo, ou seja, o parto pelo qual ele veio ao mundo,

    foi normal e comum como o de qualquer ser humano (Lc 2.6-7);

    Ele cresceu em estatura e em sabedoria (Lc 2.52);

    Ele sentiu sono, fome, sede e cansao (Mt 8.24; Jo 19.28; 4.6);

    Ele sofreu, chorou e sentiu angstia (Hb 13.12; Lc 19.41; Mt 26.37);

    Ele teve me humana, alm de irmos e irms (Mt 12.47; 13.55, 56).

    Ele morreu, embora ressuscitasse ao terceiro dia, passando pelo ardor da

    morte (1 Co 15.3-4);

    Ele deu provas materiais de ter um corpo humano (1 Jo 1.1; Lc 24.39-41);

    Ele foi feito semelhante aos homens, mas sem pecado (Hb 2.17; 4.15).

    Assim como pecado negar a humanidade de Cristo (1 Jo 4.2, 3; 2 Jo 7), da

    mesma forma pecado negar a sua divindade (Rm 10.9), pois Jesus tanto

  • humano como divino (Rm 1.3, 4; 9.5). Como homem, sentia as dores do ser

    humano (Hb 5.18); e, como Deus, hoje supre a necessidade da humanidade

    (Hb 2.17, 18).

    O Filho de DeusO conceito de Pai-Filho, na divindade, no deve ser confundido com o

    processo de reproduo humana nem com o relacionamento pai-filho numa

    famlia natural. Os muulmanos consideram ofensa chamar Jesus de Filho de

    Deus, pois analisam essa relao no plano humano. Eles creem que pregamos

    que Deus teve relaes sexuais com Maria, pois assim interpretam o nosso

    conceito de Filho de Deus. Diz a religio islmica: Originador dos cus e

    da terra! Como poderia ter prole, quando nunca teve esposa, e foi Ele que

    criou tudo o que existe, e Onisciente? (Alcoro, 6.101). Nenhum cristo no

    mundo pensa dessa forma; essa caricatura inveno deles. Jesus chamado

    de Filho de Deus no Novo Testamento porque Ele Deus e veio de Deus.

    Jesus mesmo disse: Eu sa e vim de Deus (Jo 8.42); Sa do Pai e vim ao

    mundo; outra vez, deixo o mundo e vou para o Pai (Jo 16.28).

    Concepo e nascimento virginalO Senhor Jesus foi concebido por obra e graa do Esprito Santo no ventre

    da virgem Maria: [...] lhe apareceu um anjo do Senhor, dizendo: Jos, filho

    de Davi, no temas receber a Maria, tua mulher, porque o que nela est gerado

    do Esprito Santo (Mt 1.20); E, respondendo o anjo, disse-lhe: Descer

    sobre ti o Esprito Santo, e a virtude do Altssimo te cobrir com a sua

    sombra; pelo que tambm o Santo, que de ti h de nascer, ser chamado Filho

  • de Deus (Lc 1.35). A palavra proftica anunciava isso desde o profeta Isaas:

    Portanto o mesmo Senhor vos dar um sinal: eis que uma virgem conceber, e

    dar luz um filho, e ser o seu nome Emanuel (Is 7.14).

    O substantivo hebraico para virgem usado nesta passagem alm. Istotem dado espao para interminveis controvrsias, principalmente por

    eruditos judeus e por telogos cristos modernistas, na tentativa de

    neutralizar a doutrina do nascimento virginal de Jesus. Alguns afirmam que a

    palavra mais apropriada para virgem seria betl, querendo com issodissociar Mateus 1.23 de Isaas 7.14.

    A palavra betl aparece 51 vezes no Antigo Testamento hebraico e traduzida 44 vezes por parthenos na Septuaginta. Ela pode se aplicar a umamulher casada (Jl 1.8), o que no ocorre com o substantivo alm, que s seaplica mulher solteira. W. E. Vine, com base em Joel 1.8, diz que betlnos textos aramaicos tardios era aplicada a uma mulher casada. Isso, portanto,

    traria muita confuso: parece que a eleio da palavra alm foideliberada. Parece que a nica palavra hebraica disponvel que indicaria

    com clareza que aquela a que ele designa no estava casada (VINE, vol. 4,

    1989, p. 248).

    O substantivo alm aparece nove vezes no Antigo Testamento hebraico(Gn 24.43; x 2.8; 1 Cr 15.20; Sl 46 (ttulo, pois a palavra hebraica

    alamth plural de alm); 68.25; Pv 30.19; Ct 1.3; 6.8; Is 7.14). Emdois lugares, a Septuaginta traduziu esse termo pelo vocbulo grego

    parthenos, que significa virgem (Gn 24.43; Is 7.14). A mesma Rebeca

  • que chamada virgem [betl, em hebraico] a quem varo no haviaconhecido, no v. 16 desse mesmo captulo ela chamada de alm. ASeptuaginta foi traduzida por 72 judeus em Alexandria antes do nascimento de

    Jesus.

    Com o surgimento do cristianismo, os cristos pregavam que a concepo e

    o nascimento virginal de Jesus eram o cumprimento de uma profecia do Antigo

    Testamento. Assim comearam as disputas com os judeus: Contra a Igreja os

    judeus sustentavam que Isaas 7.14 no fala de uma virgem (parthenos),mas de uma mulher jovem (neanis). Os cristos respondiam acertadamenteque a traduo parthenos provm de tradutores judeus (BENTZEN, 1968,p. 92).

    Talvez seja essa uma das razes pelas quais as autoridades judaicas

    resolveram revisar a Septuaginta. As verses gregas do Antigo Testamento,

    que vieram aps o cristianismo, substituram parthenos por neanis,jovem. quila era judeu e discpulo do rabino Akiva (morto em 132 d.C.).

    A outra verso a de Teodcio, ou Teodocio, apstata do cristianismo, que

    voltou ao judasmo (final do segundo sculo d.C.); e finalmente a de Smaco,

    que era ebionita (seita judaica que negava a divindade de Cristo), preparada

    em 170 d.C. (FISCHER, 2013, pp. 105, 106). At hoje os israelenses, em

    Israel, usam alm para designar senhorita.Gerard Van Groningen, em sua obra Revelao messinica no

    Velho Testamento, apresenta a seguinte concluso: Um exame dosmateriais disponveis a estudiosos e peritos, como indicado acima, leva-nos

  • segura concluso de que, com base no uso do termo tanto em hebraico quanto

    em ugartico, o termo alm deve ser traduzido por virgem. A Septuagintad pleno apoio a isto, e o testemunho do Novo Testamento (Mt 1.23) d a

    palavra final. Isaas disse e pretendeu dizer virgem (GRONINGEN, 1995, p.

    484).

  • O JESUS DOS CREDOS

    Os gnsticos e demais heresias eheresiarcas

    O monarquianismo foi um movimento que surgiu depois da metade do

    segundo sculo em torno do monotesmo cristo. Os monarquianistas se

    dividiam em dois grupos: os dinmicos, que ensinavam ser Cristo Filho de

    Deus, mas por adoo; e os modalistas, que ensinavam ser Cristo apenas uma

    forma temporria da manifestao do nico Deus. Tertuliano chamou de

    monarquianistas, do grego monarchia, governo exercido por um nicosoberano. Eram os opositores da doutrina do Logos os alogoi, aqueles querejeitavam o Evangelho de Joo.

    Tedoto de Bizncio, o curtidor, discpulo dos alog