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A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO COMO SEGREGAÇÃO SOCIOESPACIAL: UM ESTUDO ACERCA DOS RESIDENCIAIS EXCLUSIVOS E DOS RESIDENCIAIS POPULARES NA CIDADE DE ARAPIRACA AL Fernando José da Silva 1 Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL) - [email protected] Rosa de Lima Medeiros Neta 2 Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL) Fernando José da Silva 3 Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL) - [email protected] GT2: ESTADO, TERRITÓRIO E POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO RESUMO A segregação consensualmente é um problema social, produto dos problemas econômicos, políticos e espaciais. A violência, pobreza, desemprego, são gerados pela lógica da acumulação capitalista que ao produzir o espaço urbano dá forma a desigualdade social. O Estado cria conjuntos residenciais por meio do programa Minha casa Minha vida e ao mesmo tempo os abandona, havendo a falta de atuação do mesmo, dando a entender que há uma espécie de expulsão dessas pessoas das centralidades. Noutro ponto, as relações que induzem ao agravamento do problema da violência são alimentadas pelo medo, pelo preconceito, que traz como solução a construção de locais separatistas de classes. Este trabalho tem a finalidade de analisar essas forças tomando como lócus a cidade de Arapiraca/AL, ancorado no viés teórico das discussões e análises de autores como Carlos (2015), Souza (2005), Volochko (2015). PALAVRAS-CHAVE: Desigualdade social. Acumulação capitalista. Violência. INTRODUÇÃO Arapiraca é o segundo maior município de Alagoas, em termos populacionais segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em 2010. Possuindo uma população na casa dos 181.481 habitantes, é detentora de uma concentração demográfica expressiva, nos modos operantes do processo urbano, surgem então, problemáticas que dificulta o convívio social, necessitando de reflexões, como no caso do fenômeno “segregação socioespacial”. 1 Discente do curso de Geografia da Universidade Estadual de Alagoas UNEAL, Campus III - Palmeira dos Índios. Membro do Grupo de Pesquisa e Extensão em Geografia e Meio Ambiente. 2 Mestre em Geografia, docente do curso de Geografia da Universidade Estadual de Alagoas UNEAL, Campus III - Palmeira dos Índios. Líder do Grupo de Pesquisa e Extensão em Geografia e Meio Ambiente. 3 Discente do curso de Geografia da Universidade Estadual de Alagoas UNEAL, Campus III - Palmeira dos Índios. Membro do Grupo de Pesquisa e Extensão em Geografia e Meio Ambiente.

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A PRODUÇÃO DO ESPAÇO URBANO COMO SEGREGAÇÃO SOCIOESPACIAL:

UM ESTUDO ACERCA DOS RESIDENCIAIS EXCLUSIVOS E DOS RESIDENCIAIS

POPULARES NA CIDADE DE ARAPIRACA – AL

Fernando José da Silva1

Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL) - [email protected]

Rosa de Lima Medeiros Neta2

Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL)

Fernando José da Silva3

Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL) - [email protected]

GT2: ESTADO, TERRITÓRIO E POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO

RESUMO

A segregação consensualmente é um problema social, produto dos problemas econômicos, políticos e

espaciais. A violência, pobreza, desemprego, são gerados pela lógica da acumulação capitalista que ao

produzir o espaço urbano dá forma a desigualdade social. O Estado cria conjuntos residenciais por

meio do programa Minha casa Minha vida e ao mesmo tempo os abandona, havendo a falta de atuação

do mesmo, dando a entender que há uma espécie de expulsão dessas pessoas das centralidades. Noutro

ponto, as relações que induzem ao agravamento do problema da violência são alimentadas pelo medo,

pelo preconceito, que traz como solução a construção de locais separatistas de classes. Este trabalho

tem a finalidade de analisar essas forças tomando como lócus a cidade de Arapiraca/AL, ancorado no

viés teórico das discussões e análises de autores como Carlos (2015), Souza (2005), Volochko (2015).

PALAVRAS-CHAVE: Desigualdade social. Acumulação capitalista. Violência.

INTRODUÇÃO

Arapiraca é o segundo maior município de Alagoas, em termos populacionais segundo

o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em 2010. Possuindo uma população

na casa dos 181.481 habitantes, é detentora de uma concentração demográfica expressiva, nos

modos operantes do processo urbano, surgem então, problemáticas que dificulta o convívio

social, necessitando de reflexões, como no caso do fenômeno “segregação socioespacial”. 1 Discente do curso de Geografia da Universidade Estadual de Alagoas – UNEAL, Campus III - Palmeira dos

Índios. Membro do Grupo de Pesquisa e Extensão em Geografia e Meio Ambiente. 2 Mestre em Geografia, docente do curso de Geografia da Universidade Estadual de Alagoas – UNEAL, Campus

III - Palmeira dos Índios. Líder do Grupo de Pesquisa e Extensão em Geografia e Meio Ambiente. 3 Discente do curso de Geografia da Universidade Estadual de Alagoas – UNEAL, Campus III - Palmeira dos

Índios. Membro do Grupo de Pesquisa e Extensão em Geografia e Meio Ambiente.

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Para tanto, estudos na área da Geografia, sobretudo Geografia Urbana, revelam que as

cidades brasileiras passam ao longo do tempo por processos de crescimento desordenado,

principalmente, cidades centrais de uma região, como aparenta ser Arapiraca – AL, um lugar

central do Agreste alagoano. Apresenta certa concentração industrial e serviços comerciais,

tratando-se da segunda maior força produtiva do estado no qual está inserida.

O presente estudo revela a cidade como berço da segregação socioespacial, fenômeno

caótico, consequência do modo como o seu espaço urbano é produzido. O modelo

acumulativo de riqueza e poder, de acordo com a forma como a prefeitura trabalha, ou seja,

aliada aos interesses do capital, cria uma morfologia urbana, como discute Carlos (2011), que

revela de um lado

(...) os centros de poder e de realização da acumulação, e de outro,

contraditoriamente, as periferias segmentadas e caóticas (como expressão da lógica

capitalista), nos quais o narcotráfico, como novo e poderoso setor da economia,

redefine as estratégias da vida. Dessa forma, na metrópole o fenômeno urbano,

enquanto prática sócio-espacial, Se realiza como segregação, o que revela a

imposição do uso produtivo do espaço ao uso improdutivo, delimitando os contornos

da cidadania (CARLOS, 2011. p.85).

São características essas, ressaltadas pela autora que revelam importantes fatores

constituintes da dinâmica dos acontecimentos que se presencia atualmente. A marginalização

em sentido radical gera a segregação forçada, o crime presente nesses locais, principalmente a

partir do tráfico de drogas se torna constante, e se apresenta de forma assustadora nos

chamados residenciais populares. A indústria do crime, ao oferecer empregos e serviços aos

marginalizados vai ganhando força na disputa com o Estado, como solução, quem possui

certo status social se isola em Residenciais exclusivos induzidos pelo medo, preconceito, e

pela propaganda. A partir dessa perspectiva serão trabalhados os principais residenciais

populares e exclusivos presentes no espaço urbano da cidade de Arapiraca-AL.

1 METODOLOGIA

Esta análise consiste no conceito tratado por Carlos (2011, p. 9) que faz uso no Brasil

do método baseado em Marx e Lefebvre, pelo qual se discute o espaço urbano “num

movimento dialético que o definiria como condição, meio e produto da ação humana”.

Espaço que transformado em mercadoria pelo sistema capitalista causa problemas urbanos

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que refletem no cotidiano das pessoas, como o caso da separação das pessoas visando um

único objetivo, o lucro.

Esse fenômeno acaba refletindo na vida pública, principalmente, quando fragiliza a

democracia e o poder de participação, tirando dos cidadãos, em sua maioria, a oportunidade

de escolha. Os residenciais populares apontam em muitos aspectos para a falta de poder de

participação das pessoas, como enumera Carlos (2013) ao tratar da

(...) segregação vivida na dimensão do cotidiano (onde se manifesta concretamente a

concentração da riqueza, do poder e da propriedade) apresenta-se, inicialmente,

como diferença, tanto nas formas de acesso à moradia (como a expressão mais

evidente da mercantilização do espaço urbano), quanto em relação ao transporte

urbano como limitação às atividades urbanas (como expressão da separação do

cidadão da centralidade), bem como através da deterioração/cercamento/diminuição

dos espaços públicos (como expressão de estreitamento do espaço público)

(CARLOS, 2013. p. 96).

Como ressalta a autora, delimitam-se os acessos entre o ter e não ter moradia de

qualidade, serviços essenciais como educação, saúde, segurança. Além disso, as pessoas

menos favorecidas, por assim dizer, tendem a perderem cada vez mais poder de decisão no

que se refere às dinâmicas de produção do espaço, a cada dia observa-se pela configuração da

cidade que as obras ditas púbicas, são realizadas em parceria com interesses capitalistas,

marca de uma parceria entre capital e estado, proveniente de interesses individualistas, que

acarretam certo empobrecimento da cidadania como um horizonte de participação

democrática.

Noutro ponto do contexto urbano os residenciais exclusivos, como revela Souza

(2008)

(...) representa uma fuga e não um enfrentamento construtivo. Como tal não passa de

uma peseudo-solução. Se de uma parte, os “condomínios exclusivos” prometem

solucionar os problemas de segurança de indivíduos e famílias de classe média ou da

elite, de outra parte deixam intactas as causas da violência e da insegurança que os

nutrem (SOUZA, 2008. p. 73).

A partir da observação da cidade, se tem contato direto com o cotidiano, no caso

Arapiraca - AL. Lugar onde é possível presenciar diariamente características que mostram na

prática a teoria debatida, a qual se encaixa para com a realidade vivida, sentida e presenciada.

Como ferramentas de pesquisa recorre-se ao uso do aplicativo Google Maps, e da observação

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de Web Sites locais que tratam dos residenciais populares e exclusivos. Análises essas de

grande valia para o enriquecimento da pesquisa desenvolvida.

2 RESULTADOS E DISCUSSÕES

As materialidades presentes na composição do espaço urbano da cidade de

Arapiraca/AL revela a segregação, vale destacar os Residenciais exclusivos. Por exemplo, o

Condomínio Ouro Verde (Figura:1) localizado no bairro Arnon de Melo, Residencial Espace

(Figura: 2) localizado no bairro Caititus e Residencial Morumbi localizado no bairro Baixa

grande.

Fig. 1. Condomínio Ouro Verde, observa-se o portão de entrada, portador de uma mureta de proteção.

Fonte: Google Maps (2017).

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Fig. 1. Residencial Espace, representado pela vegetação, outra jogada do mercado imobiliário, além das outras

características, que agem por dar qualidade de vida, segurança etc.

Fonte: uninvestouroverde.com.br

Fig. 3. Residencial Morumbi. Na paisagem denota-se a materialidade representada pela mureta de proteção,

seguida de cercas elétricas e toda uma forma de isolamento da cidade.

Fonte: Google Maps (2017)

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Com base na análise das empresas produtoras desses habitats, percebe-se uma

propaganda que faz uso dos problemas sociais, por meio do discurso que utiliza o medo, a

insegurança, a beleza e o glamour, na tentativa de induzir as pessoas a viverem nessas

cercanias. Oferece-se ainda segundo a propaganda, qualidade de vida, num local construído

para cidadãos “privilegiados”.

Esse mercado utiliza, principalmente, a sensação de insegurança da vida urbana dada

às características da produção desses espaços. Sua materialidade é constituída por muros com

cerca elétrica, na portaria há muretas de proteção com guarda armada e câmeras por todos os

lados e sistema de alarme. As pessoas que residem nesse tipo de local tendem a só sair para

seu deslocamento em meio ao urbano, dentro de carro blindado.

No mapa da violência de 2016, o município de Arapiraca aparece na 18ª (décima

oitava) posição da lista dos 150 municípios mais violentos do Brasil, segundo alguns critérios

demográficos (a lista considera apenas os municípios que possuem população superior a

10.000 habitantes). Arapiraca está inserida para Waiselfisz (2016) entre aquelas localidades

dos

(...) novos pólos de crescimento no interior dos estados ou em estados sem tradição

desenvolvimentista. Consolida-se, durante a década de 1990, um processo de

desconcentração econômica que origina a emergência de novos polos atrativos de

investimentos, força de trabalho, migrações e oferta de emprego. Somado a esse

processo, as deficiências e insuficiências do aparelho do Estado e da segurança

pública contribuem para a atração da criminalidade e da violência nesses novos

pólos (WAISELFISZ, 2016. p. 41).

Esses problemas criam desconforto, ao passo de geram no cotidiano o que Souza

(2008) denomina em uma de suas obras, de “Fobópole”, seria o medo da metrópole, medo

constante de possível agressão física, assalto, da violência de uma forma geral.

Outra faceta do mercado imobiliário é a produção do espaço urbano das periferias por

meio do programa Minha Casa Minha Vida, que visa à tentativa de reversão do problema da

falta de moradia para a população. No entanto, para autores que tratam da cidade como um

negócio, no qual se insere cada vez em maiores dimensões o mercado imobiliário, através

desse meio que parece belo e solidário, o

(...) Estado viabiliza a reprodução imobiliária e financeira facilitando a valorização e

produção de fragmentos espaciais de áreas metropolitanas periféricas e assegurando

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a continuidade das estratégias privadas. A condição de pobreza e em parte de déficit

habitacional é então amarrada pelo estado à acumulação capitalista, que fica assim

cada vez mais encarregada da produção da urbanização (VOLOCHKO, 2015. p.

113).

Sabe-se ainda que o programa Minha Casa Minha Vida se torna muito lucrativo para

essas empresas do ramo imobiliário. Por meio de contratos públicos as famílias pegam

financiamento com a Caixa Econômica Federal, de acordo com suas rendas, certa quantia.

Esse tipo de mercado, por assim dizer, se torna cada vez mais um elemento que produz a

segregação socioespacial, pois esses condomínios são produzidos de forma estratégica, sendo

construídos onde o terreno é mais barato (consequência da propriedade privada e

principalmente da especulação imobiliária), construindo esses “residenciais populares” em

áreas isoladas da cidade, às vezes tão longe que nem se quer num primeiro momento estão

inseridas no perímetro urbano da cidade. Um exemplo disso é o residencial agreste (Figura:

4) localizado próximo a rodovia AL 115.

Fig. 4. Residencial Agreste, a imagem mostra as casas populares ainda sem os seus moradores, mas já

concretizada as obras.

Fonte: Cadaminuto (2017)

Na cidade de Arapiraca tem-se ainda na figura de residenciais populares, a guisa de

exemplo, os residenciais Brisa do Lago (Figura: 5) e Vale do Perucaba (Figura: 6).

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Fig. 5. Residencial Vale do Perucaba. Uma visão ampla de sua composição material.

Fonte: Diário Arapiraca (2017)

Fig. 6. Residencial Brisa do Lago. Pode-se observar diferença de cor entre as casas, os moradores pintaram por

conta própria, pós-habitação.

Fonte: 7segundos

Percebe-se que há uma diferença grande entres os primeiros residenciais apresentados,

que são exclusivos, e os residenciais populares. Entretanto, essa estratégia se revela como

uma forma de tentar “agradar os dois lados” quando há isolamento, por assim dizer. Centro e

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periferia representados pelo rico e pelo pobre no momento em que subsiste em grande escala

o estereótipo em meio à sociedade, por exemplo, a associação entre pobreza e violência. Nos

dizeres de Rodrigues (2013, p. 151) “O violento é sempre o outro (...) em especial os pobres”.

Comumente os moradores das áreas nobres da cidade se referem a esses residenciais

populares como locais da “mundiça”, ou seja, das pessoas violentas.

Infelizmente a mentalidade generalizante que tem tomado conta das decisões políticas

no espaço urbano está inclinada aos interesses do capital. Afirma-se que é mais interessante

segregar do que integrar e criar uma rede de relação entre “os diferentes”. Para continuar na

mesmice, a saída é por meio da ideologia com uso de seu aparelhamento construir um

discurso regulador das relações sociais. Em outras palavras, separa-se o “joio do trigo”, se

segrega (Residenciais exclusivos), expulsa (Residenciais Populares), portanto

Do ponto de vista do discurso midiático e do senso comum, a associação permanece,

não importando se há ou não categorias analíticas explicativas e se as ciências em

geral, e as sociais em particular, tentam analisar a complexidade dos sentidos da

violência. Um medo dos semelhantes contra os quais se colocam muros, portões,

grades de ferro, câmaras de vigilância, gravações, serviços de segurança privada e

muitas outras formas que parece separar os “bons” dos “maus” (RODRIGUES,

2013. p. 151).

Por essa perspectiva percebe-se que é muito mais fácil apontar culpados, que não

tenham sequer vez e voz para se defender, do que analisar, ir ao fundo, na raiz do problema.

Esse caminho agrava os problemas urbanos, a segregação espacial, mostrada a partir do

cotidiano, desde a moradia, os deslocamentos diários, as sensações da cidade, a agonia de

uma contingência que retroalimenta o medo. A visão inicial do que seria cidade, segundo

Moraes (1999, p. 38) “(...) tentativa humana de produzir um espaço solidário”, tornar-se-á

cada vez mais utópica, dentro das noções capitalistas de sociedade urbana.

Dessa forma, se nota a correspondência com o discurso da segregação socioespacial

atentando-se quando necessário à advertência de Sposito (2013), segundo a autora, para se

caracterizar a segregação socioespacial precisa existir diferenciação radical, pois

(...) só cabe a aplicação do conceito de segregação quando as formas de

diferenciação levam à separação espacial radical e implicam rompimento, sempre

relativo, entre a parte segregada e o conjunto do espaço urbano, dificultando as

relações e articulações que movem a vida urbana (SPOSITO, 2013. p. 64-65).

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Nesse caso, os exemplos, tanto os residenciais exclusivos, como nos residenciais

populares há indícios de segregação socioespacial, os primeiros se isolam, os segundos são

estrategicamente isolados de forma radical da centralidade urbana.

Outro problema são as estratégias de mercado num fundamento capitalista na qual a

lógica é a obtenção do máximo de lucro, assim há uma radical diferenciação quando se

compara em estrutura material os Residenciais populares e os exclusivos. De um lado as

pessoas vivem em estruturas básicas, percebe-se nas imagens apresentadas acima que nos

Residenciais populares as casas são bem pequenas. Como indica Volochko (2015)

Entre as especificidades das obras no “mercado popular” da habitação, e que ajudam

na padronização que se busca atingir, está a simplificação das plantas e da estrutura

geral da obra, das instalações, do acabamento, e que, ao final, resultam também em

uma redução da qualidade dos materiais e métodos empregados e,

consequentemente, em uma piora global da moradia (VOLOCHKO, 2015. P. 104).

Realidade diferente é vivenciada nos residenciais exclusivos, nos quais o poder de

compra garante aos seus proprietários materialidades muito mais sofisticadas, e todo um

aparato de segurança; câmeras, interfones, cercas elétricas e homens exercendo a segurança

privada.

CONCLUSÃO

Para não concluir, ressalta-se que essa forma de vida, por assim dizer, atraídas pelo

interesse da casa própria (Residenciais Populares), pela segurança (Residenciais Luxuosos)

acaba por isolar “os diferentes”, os que não têm são jogados as margens da cidade, os que

têm se fecham para a cidade em localidades que se assemelham a feudos medievais. Como

consequência os que ficam a margem se endividam cada vez mais, pois falta ocupação, falta

educação, enfim, onde falta oportunidade, sobram dificuldades, a violência impera.

Por esse víeis o problema não é das pessoas em stricto senso e sim do sistema em lato

senso, de acordo com uma totalidade de fatores, representados pelo econômico, também pelo

social, e pela forma de como o espaço é produzido, ao trazer escassez.

Essa escassez é representada não apenas em termos produtivos-materiais, mas também

por todo tipo de barreira que provoca a falta de diálogo entre as partes, o não entendimento do

“diferente”, no momento das generalizações em que se fala que todo pobre é “vagabundo,

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violento e ladrão”, quando o medo tira a paz de andar nas calçadas da cidade, a ameaça da

violência diz que aqueles que têm condições precisam se prevenir, em carros blindados.

Utilizando de um padrão de vida individual que nega o social solidariamente justo.

Pela tão almejada qualidade de vida, pela revalorização do humano, grita-se por um

mundo menos excludente e mais inclusivo. Propondo a ideia da renovação do conhecimento

em busca de um horizonte crítico reflexivo, “desalienante”. Numa busca que pretende a

substituição do pensamento social burocrático e tecnocrata, que trabalha cada vez mais como

pilar responsável pela manutenção do sistema, a serviço do capital. Luta-se por novas formas

de se pensar a sociedade, em especial as cidades brasileiras.

REFERÊNCIAS

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