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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES A PEDAGOGIA DIALÓGICA: REFLEXÕES SOBRE O PROCESSO EDUCATIVO DE PAULO FREIRE PAULA MARTINELLI DA SILVEIRA MOTTA ORIENTADORA: MARY SUE PEREIRA 24 de Janeiro de 2005

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Page 1: A PEDAGOGIA DIALÓGICA: REFLEXÕES SOBRE O … MARTINELLI DA SILVA MOTTA.pdf · Em 9 de agosto de 1956, Paulo Freire foi nomeado, ao lado de mais oito educadores pernambucanos, membro

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

A PEDAGOGIA DIALÓGICA: REFLEXÕES SOBRE O

PROCESSO EDUCATIVO DE PAULO FREIRE

PAULA MARTINELLI DA SILVEIRA MOTTA

ORIENTADORA: MARY SUE PEREIRA

24 de Janeiro de 2005

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APRESENTAÇÃO

A PEDAGOGIA DIALÓGICA: REFLEXÕES SOBRE O

PROCESSO EDUCATIVO DE PAULO FREIRE

MONOGRAFIA DE CONCLUSÃO DE CURSO APRESENTADA AO CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO DA UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES COMO REQUISITO PARA OBTENÇÃO DO GRAU EM PÓS-GRADUAÇÃO “LATO-SENSU” EM ADMINISTRAÇÃO ESCOLAR.

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METODOLOGIA

Esta monografia é de caráter bibliográfico, cujo objetivo é realizar um

contraponto entre a Educação Dialogada e Educação Bancária conceituando

esses tipos de educação e abordando o conceito de educação bancária que

persiste ainda em nosso sistema educacional.

Esta pesquisa se apóia em uma bibliografia específica e seus

fundamentos.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos os meus amigos da Universidade

pelos momentos felizes que passamos juntos.

À Professora Mary Sue Pereira por sua orientação.

E, naturalmente ao meu marido (pela paciência em

meus estudos), ao meu pai Everson, minha mãe

Regina e meus irmãos Carla e Leonardo.

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EPÍGRAFE A Escola “Escola é...

o lugar onde se faz amigos

não se trata só de prédios, salas, quadros,

programas, horários, conceitos...

Escola é, sobretudo, gente,

Gente que trabalha, que estuda,

Que se alegra, se conhece, se estima.

O diretor é gente,

O coordenador é gente, o professor é gente,

O aluno é gente,

Cada funcionário é gente.

E a escola será cada vez melhor

Na medida em que cada um

se comporte como colega, amigo, irmão.

Nada de “ilha cercada de gente por todos os lados”.

Nada de conviver com as pessoas e depois descobrir

Que não tem amizade a ninguém

Nada de ser como o tijolo que forma a parede,

Indiferente, frio, só.

Importante na escola não é só estudar, não é só trabalhar,

É também criar laços de amizade,

É criar ambiente de camaradagem,

É conviver, é se “amarrar nela!”.

Ora, é lógico...

Numa escola assim vai ser fácil

Estudar, trabalhar, crescer,

Fazer amigos, educar-se,

Ser feliz.” (Paulo Freire )

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RESUMO

A intenção desta pesquisa objetiva um estudo do pensamento de Paulo Freire,

levando em conta, especialmente, uma investigação bibliográfica, que permita a

identificação entre os conceitos do autor sobre “Educação Bancária” e “Educação

Dialogada”. Na “Educação Bancária”, a função do educador seria a de depositar em seus

alunos os conhecimentos que possui, ou seja, somente transferir conhecimentos num

processo avesso ao diálogo. Na “Educação Dialogada” defendida pelo educador Paulo

Freire, a maior preocupação do processo educativo é estimular a concretização do diálogo

entre o educador e o educando, ou seja, “... criar as possibilidades para a sua própria

produção ou a sua construção” (FREIRE, 1997, p.77). Acredito, portanto, que este trabalho

possa vir a ser importante para facilitar as pesquisas com relação aos conceitos aqui

priorizados, permitindo, assim, tanto aos educadores quanto aos gestores da área

pedagógica, a análise, a reflexão e a discussão sobre os aspectos da Educação Dialogada.

Palavras-chave: Educação Bancária, Educação Dialogada.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..................................................................................................

...1

CAPÍTULO I – A VIDA DO

EDUCADOR.............................................................4

CAPÍTULO II – O MÉTODO QUE LEVOU PAULO FREIRE AO

EXÍLIO..........15

CAPÍTULO III – IDENTIFICAÇÃO DA DICOTOMIA ENTRE EDUCAÇÃO

BANCÁRIA E EDUCAÇÃO

DIALOGADA.........................................................22

CAPÍTULO IV – REFLEXOS DO PENSAMENTO DE PAULO FREIRE NA

CONTEMPORANEIDADE.................................................................................

.27

CONCLUSÃO....................................................................................................

.30

BIBLIOGRAFIA.................................................................................................

.31

ÌNDICE...............................................................................................................

.32

FOLHA DE

AVALIAÇÃO...................................................................................33

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INTRODUÇÃO

Esta monografia tem um caráter eminentemente bibliográfico e seu

objetivo principal é realizar um contraponto entre os conceitos de Paulo

Freire sobre “Educação Bancária” e “Educação Dialogada”, fixando este

estudo na identificação dos mesmos e na identificação de tais expressões, a

fim de destacar o aspecto inovador de sua pedagogia crítica.

Paulo Freire se opunha ao que chamava de “Educação Bancária” que

se caracteriza pela presença de um professor depositante e um aluno

depositário da educação; o professor deposita em seus alunos os

conhecimentos que possui.

De acordo com Paulo Freire, o processo educativo vigente seria

rígido, autoritário e avesso ao diálogo com os alunos. E por isso, produziria

professores empenhados em ter alunos dóceis e passivos e em dar aulas

formais e distante da realidade dos estudantes.

Freire identificava aqui a existência de uma educação voltada para a

dominação. O que esta Pedagogia da Dominação tentaria impor,

ideologicamente, seriam os interesses da burguesia. Do outro lado, de

modo excludente, estariam os dominados: operários, camponeses,

assalariados. Para eles, apenas a Pedagogia da Libertação poderia lhes dar

conhecimentos, permitindo reflexões acerca da exploração sofrida,

conscientizando-os de forma a mudar esta situação.

A idéia de uma “Educação Dialogada” defendida por Freire é a

preocupação em pôr em prática o diálogo entre educador e educando,

estimulando o conhecimento da realidade contextual em que se verifica o

processo educativo. Geralmente as escolas não ouvem de seus alunos o

que querem aprender. Freire refere-se ao diálogo não como um simples

método, mas como uma estratégia para “respeitar o saber do aluno” que

chega a escola.

A primeira virtude do diálogo consiste no

respeito aos educandos, não somente

enquanto indivíduos, mas

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também enquanto

expressões de uma prática social. Não se

trata do espontaneísmo, que deixa os

estudantes entregues a si próprios. O

espontaneísmo, afirma ele, só ajudou até

hoje a direita. A presença do educador não

é apenas uma sombra da presença dos

educandos, pois não se trata de negar a

autoridade que o educador tem e

representa.

(GADOTTI, 1996, p. 84).

A esta proposta, Paulo Freire adicionou uma espécie de trabalho de

alfabetização que alcançou sucesso internacional, em especial, devido à sua

preocupação com o projeto de uma educação verdadeiramente sustentável

e autônoma.

Hoje em dia, as idéias de Paulo Freire estão em grande evidência no

meio educacional, já que as instituições de ensino têm grande interesse na

formação de pessoas que sejam capazes de tomarem decisões e na

necessidade de cada escola em apresentar um projeto pedagógico que

reconheça a cultura local da comunidade que está inserida.

Esta monografia divide-se em quatro capítulos. Inicialmente, realizo

uma pequena biografia da vida de Paulo Freire para que possamos ter

contato com sua infância e com suas idéias sobre alfabetização e a

importância desta herança infantil na concepção de suas idéias.

A proposta do capítulo seguinte, é salientar a formulação do método

de alfabetização de Paulo Freire, que por motivos políticos, o levou ao exílio,

pois os militares brasileiros que tomaram o poder em 1964, consideram que

seu programa de alfabetização era altamente subversivo.

A seguir, realizo a identificação da dicotomia entre educação bancária

e educação dialogada defendida por Freire, buscando elucidar tais

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conceitos, na intenção de esclarecer a contraposição destas formas de

educação.

Acredito que este trabalho monográfico seja interessante tanto para o

gestor das instituições educacionais, porque afinal é deles que partem os

processos de definição das diretrizes básicas e os parâmetros gerais dos

estabelecimentos de ensino, quanto para os professores, que terão a

possibilidade de analisar, refletir e discutir sobre a “Educação Dialogada”.

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Capítulo I

A VIDA DO EDUCADOR

1.1 - Paulo Freire – Uma breve história

No dia 10 de setembro de 1921, nasceu em Recife, no Nordeste

Brasileiro, uma das regiões mais pobres do país - o pernambucano Paulo

Reglus Neves Freire, filho de Joaquim Temístocles Freire e Edeltrudes

Neves Freire, que virá a ser um dos maiores teóricos da educação.

Paulo Freire, teve suas primeiras noções de leitura no chão do quintal

da casa em que nasceu, na Estrada do Encanamento, 724, no bairro da

Casa Amarela, onde sua mãe escrevia palavras com gravetos das

mangueiras.

Freire era o caçula da família e sua mãe escreveu um livro de bebê,

no qual destacava algumas curiosidades de sua personalidade, o “afeto

extraordinário pelo paizinho” e até a sua vaidade, que segundo sua mãe, “...

não passa sem sua água de colônia”.

Com a idade de 10 anos, Paulo Freire foi morar em Jaboatão, distante

de Recife, nas vizinhanças da capital pernambucana.

Quando tinha 13 anos, Paulo Freire perdeu o pai e sofreu ao ver sua

mãe lutar para a sobrevivência da família e o sustento dos filhos. Segundo

Ana Maria Araújo Freire, a relação de Paulo Freire com a cidade de

Jaboatão foi primordial para seu crescimento:

... foi também em Jaboatão que sentiu, aprendeu e

viveu a alegria no jogar futebol e no nadar pelo rio

Jaboatão vendo as mulheres de cócoras, lavando e

“batendo” nas pedras a roupa que lavavam para si,

para a própria família, e para as famílias mais

abastadas. Foi lá também que aprendeu a cantar e

assobiar, coisa que até hoje tanto gosta de fazer, para

se aliviar do cansaço de pensar e das tensões do dia-a-

dia: aprendeu a dialogar na “roda de amigos” e

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aprendeu a tomar para si, com paixão, os estudos das

sintaxes popular e erudita da língua portuguesa.

Assim, Jaboatão foi um espaço-tempo de

aprendizagem, de dificuldades e de alegrias vividas

intensamente, que lhe ensinaram a harmonizar o

equilíbrio entre o ter e o não-ter, o ser e o não-ser, o

poder e o não-poder, o querer e o não-querer. Assim

forjou-se Freire na disciplina da esperança.

(FREIRE, 1992, p.222).

A alfabetização de Paulo Freire foi realizada em sua própria casa por

sua mãe e por seu pai, já sabia ler e escrever quando aos seis anos chegou

à escolinha da professorinha (este termo usado com muito afeto) Eunice na

década de 20. A professora Eunice era uma jovem de 16, 17 anos e

ensinava a Paulo a formar sentenças, que consistia em colocar numa folha

de papel quantas palavras Paulo Freire conhecesse para que, a partir

dessas palavras, começasse a debater com o menino o significado de cada

uma. Eunice nunca demonstrou a preocupação em fazer Paulo decorar as

regras gramaticais.

Esta relação afetuosa entre a professora e o aluno é relatada por

Freire:

Eunice foi professora do Estado, se

aposentou, levou uma vida bem normal.

Depois morreu, em 1977, eu ainda no

exílio. Hoje, a presença dela são

saudades, são lembranças vivas. Me faz

até lembrar daquela música antiga, do

Ataulfo Alves: “Ai que saudade da

professorinha que me ensinou o bê-a-bá .”

(FREIRE, 1994, Revista Nova Escola).

Após a conclusão da escola primária em Jaboatão, Paulo ingressou

no primeiro ano ginasial no Colégio 14 de Julho, no bairro de São José,

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situado na Rua Harmonia, 150, Casa Amarela. Sob a supervisão do

professor de matemática, Luiz Soares, ingressou no Colégio Oswaldo Cruz,

no Recife, completando os sete anos dos estudos secundários. Aos 22

anos, ingressou na Faculdade de Direito de Recife, já que na época não

existia em Pernambuco um curso superior de formação de educador.

Antes de concluir os estudos universitários, em 1944, casou-se com a

professora primária Elza Maia Costa Oliveira, com a qual teve cinco filhos:

Maria Madalena, Maria Cristina, Maria de Fátima, Joaquim e Lutgardes. No

Colégio Oswaldo Cruz, onde completou seus estudos secundários, Paulo

Freire tornou-se professor de Língua Portuguesa.

De 1954 a 1957, no governo do Presidente Getúlio Vargas, Freire

ocupou o cargo de diretor de Educação e Cultura do SESI, onde teve

contato com a educação de adultos, mais particularmente na área da

alfabetização.

Fundou, nos anos cinqüenta, o Instituto Capibaribe, contando

para isso com a ajuda de outros educadores interessados na educação

escolarizada. Este Instituto de ensino privado ocupa-se, até hoje, com

um ensino de alto nível, formação científica, voltada para uma

consciência verdadeiramente democrática.

Em 9 de agosto de 1956, Paulo Freire foi nomeado, ao lado de mais

oito educadores pernambucanos, membro do Conselho Consultivo de

Educação do Recife pelo então prefeito, o progressista Pelópidas Silveira.

Lecionou a disciplina Filosofia da Educação, na Escola de Serviço

Social, na qual adquiriu suas primeiras experiências como professor de nível

superior.

Pouco tempo depois, em 1959, defendeu a tese “Educação e

Atualidade Brasileira” recebendo o título de Doutor em Filosofia e História da

Educação.

Foi também conferido a Paulo Freire o certificado de Livre Docente da

cadeira de História e Filosofia da Educação da Escola de Belas Artes onde

tomou posse em 23 de abril de 1962.

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Paulo Freire foi escolhido pelo governador do Estado de Pernambuco,

Miguel Arraes, como um dos “Conselheiros Pioneiros” do Conselho Estadual

de Educação de Pernambuco, título este expressivo e que, segundo o

governador, deveria ser usado para homenagear as “pessoas de notório

saber e experiência em matéria de educação e cultura”.

Após a estabilização do Golpe Militar de 1964 foi acusado de

corromper a ordem instituída com suas campanhas de alfabetização (sob

sua coordenação nasceu o Programa Nacional de Alfabetização, que, pelo

“Método Paulo Freire”, alfabetizou cerca de cinco milhões de adultos,

politizando as camadas populares e ao mesmo tempo desafiando-os a

perceber as injustiças) - Freire foi preso e exilou-se primeiro no Chile, onde

viveu de novembro de 1964 a abril de 1969. Além de retomar e desenvolver

suas teses trabalhou, durante cinco anos, em programas de educação de

adultos no Instituto Chileno para a Reforma Agrária (ICIRA), escrevendo ali

sua principal obra: Pedagogia do Oprimido.

Pouco tempo depois, de abril de 1969 a fevereiro de 1970, ministrou

aulas como Professor Convidado na Universidade de Harvard em

Massachussetts. Após esse período, mudou-se para Genebra sendo

Consultor Especial de Educação do Conselho Mundial de Igrejas.

Anos depois, em junho de 1979, Freire recebe seu primeiro

passaporte brasileiro e, ainda sob o clima da anistia, chega ao Brasil em

agosto do mesmo ano, quando foi convidado a ser professor da PUC-SP.

Por parte de pressões de alguns professores e de alunos, tornou-se

também professor da Universidade de Campinas – UNICAMP, onde lecionou

de setembro de 1980 até o final do ano letivo de 1990.

Em outubro de 1986, morre sua primeira esposa, Elza. Dois anos

após a morte de Elza, Freire casa-se no Recife com Ana Maria Araújo Freire;

amigos de infância, Ana Maria reencontra-o no curso de Mestrado da

Pontifica Universidade Católica (PUC).

Participante ativo da vida política brasileira, em 1º de janeiro de 1989,

Freire torna-se Secretário da Educação do Município de São Paulo, no

governo da Prefeita de São Paulo Luíza Erundina de Souza, no partido do

qual foi um dos fundadores: Partido dos Trabalhadores (PT).

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Freire reformou as escolas, preocupando-se com as comunidades

locais e com a reformulação do currículo escolar, adequando-o às crianças

das classes populares, sem deixar de valorizar a capacitação dos

professores em regime de formação permanente. Fez questão de incluir

como agentes educativos da escola vigias, merendeiras, faxineiras,

secretários, diretores, bem como os professores pais, e alunos em total

estado de cooperação. Seu relato sobre o novo posto traduz sua esperança

na concretização de um processo educativo abrangente e eficaz:

Assim que aceitei o convite que me fez a prefeita Luiza

Erundina para assumir a Secretaria de Educação da

cidade de São Paulo pensei em escrever aos

educadores, tão assiduamente quanto possível, cartas

informais que pudessem provocar um diálogo entre nós

sobre questões próprias de nossa atividade educativa.

Não que tivesse em mente substituir com as cartas os

encontros diretos que pretendo realizar com vocês,

mas porque pensava em ter nelas um meio a mais de

viver a comunicação necessária entre nós.

Pensei também que as cartas não deveriam ser

escritas só por mim. Educadoras e educadores outros

seriam convidados a participar desta experiência que

pode constituir-se num momento importante da

formação permanente do educador. O fundamental é

que as cartas não sejam apenas recebidas e lidas, mas

discutidas, estudadas e, sempre que possível

respondidas. (Paulo Reglus Neves Freire, São Paulo,

19 de janeiro de 1989).

Em 1992, afastou-se do cargo de Secretário Municipal de Educação

de São Paulo, porém continuou sendo membro até fins de 1992. Por sua

relevante importância, sua carta de despedida merece ser transcrita:

Todos temos vivido a enorme satisfação de poder estar

construindo, num esforço comum, uma nova proposta

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pedagógica na Secretaria Municipal de Educação. Não

importa que, por nosso compromisso, tenhamos, de

vez em quando, experimentado agonia e sofrimentos.

Estou convencido que as propostas e princípios do PT,

a que a prefeita Luiza Erundina dá carne, estão certos.

Princípios gerais que constituem a política de governo,

de que a política educacional que vimos

implementando é um capítulo. Não estou,

rigorosamente, saindo da Secretaria Municipal de

Educação ou mesmo deixando a companhia de vocês.

Nem tampouco renegando opções políticas e

ideológicas antigas, anteriores mesmo à criação do PT.

Não imaginava sequer que o PT aconteceria, na minha

juventude, mas sentia muita falta de sua existência.

Esperei por mais de quarenta anos que o PT fosse

criado. Não estou deixando a luta, mas mudando,

simplesmente, de frente. A briga continua a mesma.

Onde quer que esteja estarei me empenhando, como

vocês, em favor da escola pública, popular e

democrática. As pessoas gostam e têm o direito de

gostar de coisas diferentes. Gosto de escrever e de

ler. Escrever e ler fazem parte, como momentos

importantes, da minha luta. Coloquei este gosto a

serviço de um certo desenho de sociedade, para cuja

realização venho, com um sem-número de

companheiros e companheiras, participando na medida

de minhas possibilidades. O fundamental neste gosto

de que falo é saber a favor de quê e de quem ele se

exerce. Meu gosto de ler e escrever se dirige a uma

certa utopia que envolve uma certa causa, um certo

tipo de gente nossa. É um gosto que tem que ver com

a criação de uma sociedade menos perversa, menos

discriminatória, menos racista, menos machista que

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esta. Uma sociedade mais aberta, que sirva aos

interesses da sempre desprotegidas e minimizadas

classes populares e não apenas aos interesses dos

ricos, dos afortunados, dos chamados “bem-nascidos”.

Por tudo isso, escrever a crítica, não malvada, mas

lúcida e corajosa das classes dominantes continuará a

ser uma de minhas frentes de briga, tanto quanto vem

sendo para muitos de vocês. Sou leal ao sonho.

Minha ação tem sido coerente com ele. Exigente com

a ética, considero que ler tem a ver com a coerência

com que se vive no mundo, coerência entre o que se

diz e o que se faz. Por isso, não temos críticas a fazer

ao trabalho que se realizo na secretaria nestes dois

anos e meio em que aqui estive como secretário.

Considero que a crítica, quando feita de maneira ética

e competente, faz com que as nossas ações se

aprofundem ou se reorientem. Aprendemos com elas.

Continuem contando comigo na construção de uma

política educacional, de uma escola com outra “cara”,

mais alegre, fraterna e democrática (Síntese da fala de

despedida de Paulo Freire da Secretaria Municipal de

Educação do Município de São Paulo, em maio de

1991).

No dia 2 de maio de 1997, em São Paulo, Paulo Freire faleceu aos

75 anos, vítima de um infarto agudo do miocárdio.

O brasileiro Paulo Freire foi um dos principais se não o maior

educador brasileiro de seu tempo, conhecido e respeitado

internacionalmente por seu desejo de transformação, de luta para superar

relações de opressão, desejando um mundo mais justo e democrático.

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1.2 – Sua produção ao longo da vida

Essa bibliografia apresenta as principais obras de Paulo Freire em

ordem cronológica. Foi elaborada com o objetivo de apresentar a produção

do autor em toda sua trajetória como educador. É resultado da pesquisa

bibliográfica que realizei, tendo como fonte principal o “Instituto Paulo

Freire”.

* “A educação de adultos e as populações marginais. O problema dos

mocambos,“Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Rio de Janeiro,

INEP – MEC, 30 (71): 81-93, jul. /set. 1958.

* Educação e atualidade brasileira. Recife, Universidade Federal do Recife,

1959.

* “Escola primária para o Brasil.“Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos.

Rio de Janeiro, INEP – MEC, 35 (82): 15-23, ab./jun. 1961

* “Conscientização e alfabetização; uma nova visão do processo.“Estudos

Universitários. Revista de Cultura da Universidade do Recife, Recife,4: 5-

23, ab./jun. 1963.

* Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1967.

* “Papel da educação na humanização.” Revista Paz e Terra. Rio de

Janeiro, Paz e Terra, 1971.

* Extensão ou comunicação? Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1971.

* Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1974.

* “Terceiro Mundo e teologia. Carta a um jovem teólogo.” In: Carlos Alberto

Torres. Consciência e história: a práxis educativa de Paulo Freire. São

Paulo, Cortez & Moraes, 1979.

* Educación para el cambio social. Buenos Aires, Tierra Nueva, 1974.

* “La conscientización desmitificada por Freire.” Caracas, SIC –

Centro Camila, 8: 164-6, ab. 1975.

* Diálogo: desescolarización, estruturas, liberaciones, educación. Buenos

Aires, Busqueda – Celadec, 1975. Em co-autoria com Ivan Illich.

* “A alfabetização de adultos: é ela um quefazer neutro?” Educação &

Sociedade. Campinas,1 (1): 64-70, set. 1978.

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* Ação cultural para liberdade e outros escritos. Rio de Janeiro, Paz E Terra,

1976.

* Educação e Mudança. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1981.

* Cartas a Guiné-Bissau. Registros de uma experiência em processo. Rio

de Janeiro, Paz e Terra, 1977.

* Os cristãos e a libertação dos oprimidos. Lisboa, Edições BASE, 1978.

* “Exílio e identidade: a trajetória de dez anos do IDAC.” In: Paulo Freire,

Cladius Ceccon, Miguel e Rosiska Darcy de Oliveira. Vivendo e aprendendo:

experiências do IDAC em educação. São Paulo, Brasiliense, 1980. P. 9-14.

* “Quatro cartas aos animadores de círculos de cultura de São Tomé e

Príncipe. In: Carlos Rodrigues Brandão (org.). A questão política das

educação popular. São Paulo, Brasiliense, 1980. P. 136-95.

* Ideologia e educação: reflexões sobre a não neutralidade da educação.

Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1981. P. 15-9.

* Criando métodos de pesquisa e alternativas: aprendendo a fazer melhor

através da ação.”In: Carlos Rodrigues Brandão (org.). Pesquisa

Participante. São Paulo, Brasiliense, 1981.

* A importância do ato de ler (em três artigos que se completam). São

Paulo, Cortez/Autores Associados, 1982.

* Sobre educação (Diálogos). Rio de Janeiro, Paz e Terra, v.1, 1982.

* “Educação: o sonho possível.”In: Carlos Rodrigues Brandão (org.). O

educador: vida e morte. Rio de Janeiro, Graal, 1982. P. 89-101.

* Paulo Freire ao vivo. São Paulo, Loyola, 198. Em co-autoria com Aldo

Vannucchi e Wlademir dos Santos.

* Sobre educação (Diálogos). Rio de Janeiro, Paz e Terra, v. 2, 1984.

* The politics of educacion: culture, power and liberation. Háddley Mass.,

Bergin & Garvey, 1985.

* “O sentido da avaliação na prática de base.”In: José J. Queiróz (org.). A

educação popular nas comunidades eclesiais de base. São Paulo, Paulinas,

1985. P. 97-101.

* Essa escola chamada vida. São Paulo, Ática, 1985. Em co-autoria com

Frei Betto.

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* Por uma pedagogia da pergunta. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1985. Em

co-autoria com Antonio Faundez.

* Pedagogia: diálogo e conflito. São Paulo, Cortez. Em co-autoria com

Moacir Gadotti e Sérgio Guimarães.

* Fazer escola conhecendo a vida. Campinas, SP, Papirus, 1986. Em co-

autoria com Adriano Nogueira e Débora Mazza.

* Aprendendo com a própria história. Rio de Janeiro, Paz e Terra. Em co-

autoria com Sérgio Guimarães.

* A alfabetização como elemento de formação da cidadania. Brasília, maio

de 1987.

* Medo e ousadia: o cotidiano do professor. Rio de Janeiro, Paz e Terra,

1987. Em co-autoria com Ira Shor.

* Literacy: reading the word and the world. Mass., Bergin & Garvey, 1987.

Em co-autoria com Donaldo Macedo.

* Na escola que fazemos...uma relação inter-disciplinar em educação

popular. Petrópolis, Vozes, 1988. Organizado em colaboração com Adriano

Nogueira e Débora Mazza.

* Pedagogia da Autonomia Saberes necessários à prática educativa. São

Paulo: Paz e Terra, 1996.

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1. 3 – Comentários sobre a bibliografia de Paulo Freire

Foi no Chile, na primeira fase do exílio, que Freire escreveu seus dois

livros mais conhecidos: em 1967 – Educação como prática da liberdade, no

qual propõe métodos para que não exista a exclusão social e para que todos

possam exercitar uma consciência crítica da sociedade em que estão

inseridos; e em 1974 – Pedagogia do Oprimido onde Freire enfatiza a

opressão da educação capitalista ( a educação do dominante sobre os

dominados). Esta é considerada como a obra mais importante e mais

extensa de Freire.

Em 1976, foi publicada (versão em português) a obra posterior ao

exílio de Freire no Chile: Ação Cultural para a liberdade. Neste livro, o

educador denuncia a falta de diálogo entre os opositores. Freire refere-se às

relações entre os países do “Primeiro Mundo” e os do “Terceiro Mundo”.

No livro Educação e Mudança, escrito em 1979, Freire aponta

novamente o diálogo com as massas populares como método para conhecê-

las. Segundo Freire (1985, p. 39), “O intelectual precisa saber que sua

capacidade crítica não é superior nem inferior à sensibilidade popular. A

leitura do real requer as duas.”

Além desses livros, Paulo Freire concedeu inúmeras entrevistas a

jornais e revistas do mundo inteiro e publicou artigos periódicos de

Pedagogia, Educação e áreas correlatas.

Segundo Sérgio Haddad (2001), coordenador do Programa de

Educação Popular do Centro Ecumênico de Documentação e Informação -

CEDI - e diretor dos cursos noturnos do Colégio Santa Cruz, em São Paulo,

“Conhecer sua obra é, portanto, um dever imperativo para quem é educador

ou se prepara para vir a sê-lo.”

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Capítulo II “O MÉTODO QUE LEVOU PAULO FREIRE AO

EXÍLIO”.

A escolha deste título, que foi utilizado na obra de Gadotti “Convite à

leitura de Paulo Freire”, 2001, p. 31 tem a intenção de refletir sobre a

repercussão do “Método de Alfabetização” e apontar as conseqüências do

seu afastamento do Brasil por quase dezesseis anos.

Este método de alfabetização de adultos começou a ser utilizado na

cidade de Angicos (RN), em 1962, onde aproximadamente 300

trabalhadores foram alfabetizados em 45 dias.

O então presidente João Goulart e o Ministro da Educação, Paulo

de Tarso C. Santos, convidaram Paulo Freire para reavaliar a

alfabetização de adultos no Brasil.

Em 1964, ocorreu a instalação de cerca de vinte mil “círculos de

cultura” nos quais seus participantes eram estimulados pelo coordenador

de grupo a responderem a questões representando sua realidade,

aprofundando assim, suas leituras de mundo. Segundo Freire, os círculo de

cultura

Não tinham uma programação feita a priori. A

programação vinha de uma consulta aos grupos, quer

dizer: os temas a serem debatidos nos círculos de

cultura, era o grupo que estabelecia. Cabia a nós,

como educadores, com o grupo, tratar a temática que o

grupo propunha. Mas podíamos acrescentar à

temática proposta este ou aquele outro tema que, na

Pedagogia do Oprimido, chamei de “temas de

dobradiça” – assuntos que se inseriam como

fundamentais no corpo inteiro da temática, para melhor

esclarecer ou iluminar a temática sugerida pelo grupo

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popular. Porque acontece o seguinte: é que,

indiscutivelmente, há uma sabedoria popular que se

gera na prática social de que o povo participa, mas, às

vezes, o que está faltando é uma compreensão mais

solidária dos temas que compõem o conjunto desse

saber. [...]

(FREIRE, Paulo, 1984, p.14-5)

Sob esses aspectos, Paulo Freire propunha ao alfabetizador que

saísse a campo observando tudo, misturando-se com pessoas da

comunidade, estreitando laços mais íntimos. O objetivo dessa pesquisa era

anotar as palavras mais usadas pela comunidade

O Método de Alfabetização proposto por Freire pode ser divido em

três etapas:

Etapa de Investigação:

O objetivo desta etapa era pesquisar e anotar as palavras mais

usadas pela comunidade, a fim de utilizá-las para estimular e facilitar a

alfabetização, respeitando a cultura da comunidade local.

Etapa de Tematização:

Nesta etapa nasciam as “palavras” e os “temas geradores” do

método, que deviam representar (codificar) a realidade das pessoas do

lugar.

Assim, por exemplo, para a palavra geradora governo,

podiam ser discutidos os seguintes temas geradores:

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plano político, poder político, o papel do povo na

organização social, participação popular.

(GADOTTI, 2001, p.35).

Etapa de Problematização:

Nesta etapa, pode ser verificado que o objetivo final do Método de

Paulo Freire é a conscientização, permitindo, com isso, a reflexão do homem

e da mulher sobre seu papel na sociedade e a transformação dessa

realidade na qual estão inseridos.

Para facilitar a compreensão do Método de Alfabetização de Paulo

Freire, iremos utilizar a primeira palavra que foi usada nos anos 60, em

Brasília, que, por ser uma cidade em construção propiciou o emprego de

um vocábulo comum a todos os alfabetizandos, o que possibilitou,

representar “concretamente” as “palavras” e os “temas geradores”. A

palavra escolhida foi TIJOLO:

1º) Apresenta-se a palavra geradora “tijolo” inserida na

representação de uma situação concreta: homens

trabalhando numa construção;

2º) Escreve simplesmente a palavra: TIJOLO;

3º) Escreve-se a mesma palavra com as sílabas

separadas:

TI – JO – LO

4º) Apresenta-se a “família fonêmica” da primeira

sílaba:

TA – TE – TI – TO – TU

5º) Apresenta-se a família fonêmica da segunda sílaba:

JÁ – JE – JI – JO – JU

6º) Apresenta-se a família fonêmica da terceira sílaba:

LA – LE – LI – LO – LU

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7º) Apresentam-se as “famílias fonêmicas” da palavra

que está sendo decodificada:

TA – TE – TI – TO – TU

JA - JE - JI - JO - JU

LA – LE – LI – LO – LU

Este conjunto das “famílias

fonêmicas” da palavra geradora foi

denominado de “ficha de descoberta” pois

ele propicia ao alfabetizando juntar os

“pedaços”, isto é, fazer dessas sílabas

novas combinações fonêmicas que

necessariamente devem formar palavras

da língua portuguesa.

8º) Apresentam-se as vogais:

A – E – I – O – U

(GADOTTI, 1996, p. 39).

A eficácia do “Método de Alfabetização” proposto por Paulo Freire

baseia-se, portanto, na realidade do aluno (alfabetizando), e nas suas

vivências e experiências.

Em relação a um Método de Alfabetização de crianças (apesar de não

ter sido desenvolvido por Freire, mas por Madalena, sua filha), apresenta-se

o mesmo princípio; porém, é preciso ter em consideração que o domínio do

adulto em relação à palavra é muito maior.

Sob esses aspectos, Freire posiciona-se contra as cartilhas, visto que

nas mesmas há uma preocupação muito grande com o processo de

repetição e memorização realizado pelo educador, mas não com o local, a

comunidade, a classe social em que estão inseridas estas crianças.

Paulo Freire, começou nos anos 60 sua experiências sem o uso das

cartilhas. Com o tempo, Freire descobriu que o alfabetizando necessitava

de um material que se adaptasse a sua idéia de trabalho.

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Paulo Freire, elabora então, um material de reforço para auxiliar o

aluno no processo de aprendizagem.

A organização deste material de reforço que permitisse o educando

no processo de aprendizagem, não foi aplicado no Brasil, mas no exílio no

Chile que Freire pôde organizar esse material, enriquecendo-o.

Posteriormente na África surgiu então, os Cadernos de Cultura.

Devido ao Golpe Militar, os trabalhos de alfabetização foram

interrompidos e reprimidos, o que levou Paulo Freire à prisão no dia 16

de junho de 1964, quando dois policiais foram à sua casa solicitando

que os acompanhasse. Freire foi submetido a inúmeros interrogatórios

que deveriam “provar”, sua “ignorância absoluta” (como se houvesse

uma ignorância ou sabedoria absolutas; esta não existe senão em

Deus”), sendo considerado um “subversivo internacional”, um “traidor

de Cristo e do povo brasileiro”.

Um dia, Paulo Freire conversava com um capitão do

presídio que lhe fez um pedido:

-- Professor, o senhor não quer aplicar seu

método para nossos recrutas? Há muitos analfabetos

entre eles e é um serviço que o senhor prestava ao

país enquanto estiver aqui.

-- Mas, capitão, é exatamente por causa do

método que eu estou aqui – respondeu o

educador. (“Folha de São Paulo, 25 de setembro de

1987)”.

Paulo Freire observou, então, que seria muito arriscado ficar no país, e

cansado de ser permanentemente vigiado, respondendo a inúmeras

perguntas e não realizando o que sabia e podia realizar, preferiu optar pelo

exílio, que durou quase dezesseis anos. Exilado no Chile, Freire escreveu

seus dois livros mais conhecidos: Educação como Prática da Liberdade e

Pedagogia do Oprimido.

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No primeiro, Freire apresenta uma coletânea de diversos artigos e

seminários, demonstrando que a Educação deverá influenciar a construção

de uma nova sociedade.

No segundo, Freire critica a educação capitalista, justificando a escolha

do título Pedagogia do Oprimido:

Pedagogia que faça da opressão e de suas

causas objetos da reflexão dos oprimidos, de que

resultará o seu engajamento necessário na luta por sua

libertação, em que esta pedagogia se fará e refará.

(FREIRE, 1974, p. 32).

Paulo Freire defendia que grande parte dos brasileiros e brasileiras

tivessem acesso à leitura: O ato de ler a palavra lendo o mundo, ao

contrário dos métodos de alfabetização até então utilizados, principalmente

no Brasil, nos quais o ato de ler tinha outro significado, visto que em geral

visavam simplesmente à leitura mecânica das letras, sílabas e palavras, e

não à reflexão do que estava implícito.

Gadotti (2001) enfatiza a abordagem de Freire sobre “a politização do

povo brasileiro”, tirando o homem ou mulher da situação de submissão, de

passividade e de imersão. Freire pensava em uma sociedade onde não

existisse exclusão da “leitura do mundo” aos menos privilegiados da

sociedade.

Paulo Freire esteve no exílio por quase dezesseis

anos, exatamente porque compreendeu a educação

dessa maneira e lutou para que um grande número

de brasileiros e brasileiras tivesse acesso a este

bem a ele negado secularmente: o ato de ler a

palavra lendo o mundo. (GADOTTI, 1996, p. 40).

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Este método ainda é utilizado em todo o mundo, sofrendo

algumas adaptações, mas com a mesma intenção e preocupação de

Paulo Freire de inserir o homem ou mulher na sociedade, estimulando-

os e desafiando-os a sair do conformismo de “demitido da vida”,

fazendo-os compreender que também fazem parte de uma cultura. Os

alunos deveriam então ser conscientizados sobre a importância de seu

papel na sociedade.

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Capítulo III “IDENTIFICAÇÃO DA DICOTOMIA ENTRE AS CONCEPÇÕES BANCÁRIA E DIALOGADA”

O objetivo central desta monografia é realizar a dicotomia entre

Educação Bancária e Educação Dialogada, identificando os conceitos dos

mesmos, a fim de destacar o importante papel de Paulo Freire na defesa de

um processo educativo como um ato político, que considera a total

impossibilidade de uma educação apolítica ou neutra.

Analisando a concepção da Educação Bancária, observamos que a

relação entre o educando e os educadores será sempre antidialógica, isto é,

não existe o diálogo neste método.

Esquema do antidiálogo

A

sobre

B = comunicado

Matriz = sem amor, sem humildade, sem esperança, sem fé, acrítica.

Relação de “simpatia” rompida.

(Cf. GADOTTI, 2001: 71)

Ao analisar a teoria antidiológica, Freire destaca algumas

características:

1. a necessidade da conquista, que configura um ato

da teoria antidialógica. Os “conteúdos e métodos

da conquista variam historicamente; o que não

varia, enquanto houver elite dominadora, é a ânsia

necrófila de oprimir”;

2. a divisão para a dominação, para manter os

homens em estado de imersão na própria realidade,

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e que consiste em “ilhar os oprimidos, criar e

aprofundar cisões entre eles, através de uma gama

variada de métodos e processos”;

3. a manipulação, que se constitui em mais um

instrumento da conquista: “uma necessidade

imperiosa das elites dominadoras, com o fim de,

através dela, conseguir um tipo inautêntico de

“organização” com que evite o seu contrário, que é

a verdadeira organização das massas populares

emersas e emergindo”.

4. A invasão cultural, que consiste na “penetração

que fazem os invasores no contexto cultural dos

indivíduos, impondo a estes sua visão do mundo,

enquanto lhes freiam a criatividade, inibindo sua

expansão”.(GADOTTI, 2001, p. 71)

O objetivo principal na Educação Bancária é que o educador tem por

tarefa de encher os educandos dos conteúdos de sua narração; conteúdos

estes que são “retalhos da realidade desconectados da totalidade...”

(FREIRE, 1974, p.65).

Ou seja: “... a narração os transforma em vasilhas, em recipientes a

serem enchidos pelo educador. Quanto mais vá “enchendo” os recipientes

com seus “depósitos”, tanto melhor educador será. Quanto mais se deixem

docilmente encher, tanto melhores educandos serão.” (FREIRE, 1974,

p.66).

Nesta concepção, os indivíduos da educação bancária são vistos

como seres passivos, adaptando-se (ou ajustando-se) à realidade imposta.

De acordo com Paulo Freire: “..quanto mais adaptados, para a concepção

bancária, tanto mais educados porque adequados ao mundo.” (FREIRE,

1974, p. 72).

Esta atitude mantém a hierarquia de classes, naturalizando a

passividade e o conformismo.

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Na concepção bancária (burguesa), o educador é o

que sabe e os educandos, os que não sabem; o

educador é o que pensa e os educandos, os pensados;

o educador é o que diz a palavra e os educandos, os

que escutam docilmente; o educador é o que opta e

prescreve sua opção e os educandos, os que seguem

a prescrição; o educador escolhe o conteúdo

programático e os educandos jamais são ouvidos

nessa escolha e se acomodam a ela; o educador

identifica a autoridade funcional, que lhe compete, com

a autoridade do saber, que se antagoniza com a

liberdade dos educandos, pois os educandos devem se

adaptar às determinações do educador; e, finalmente, o

educador é o sujeito do processo, enquanto os

educandos são meros objetos. (GADOTTI, 2001, p.

69)

A Educação Bancária torna-se, portanto, a “cultura do silêncio” na

qual o educador educa e os educandos são educados; o educador sabe e o

educando não; O que ressalta a expressão: “o educador é o que pensa e os

educandos os pensados.”(FREIRE, 1974, p.68).

A finalidade da Educação Bancária é então, manter justamente a

divisão dos que sabem e dos que não sabem negando o diálogo, a

curiosidade, o espírito investigador e a criatividade.

Ao contrário, na Educação Dialogada a relação entre educando e

educadores será sempre uma relação “dialógica-dialética”, ou seja, ambos

aprendem, juntos baseando-se no respeito mútuo, o que permite a

possibilidade de uma análise crítica e reflexiva sobre a realidade, tendo em

vista uma transformação social criativa.

Esquema do Diálogo

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A com B = Comunicação

A com B = Intercomunicação

Relação de “simpatia” entre os pólos, em busca de algo.

(GADOTTI, 2001, p. 70).

Para praticar o diálogo, o educador deve, assim, conscientizar-se de

que não detém o saber sobre todas as coisas, levando em conta que o

analfabeto também possui uma experiência de vida, que não pode ser

desconsiderada no processo educativo.

Freire, “refere-se à categoria diálogo não apenas como método, mas

como estratégia para respeitar o saber do aluno que chega à escola”.

O educador ou a educadora crítica, exigente, coerente,

no exercício de sua reflexão sobre a prática educativa

ou no exercício da própria prática, sempre a entende

em sua totalidade.

Não centra a prática educativa, por exemplo, nem no

conteúdo, nem nos métodos, mas a compreende nas

relações de seus vários componentes, no uso coerente

por parte do educador ou da educadora dos materiais,

dos métodos, das técnicas.

(FREIRE, 1994. p.110).

Desse modo, Paulo Freire relaciona algumas características da

análise da Pedagogia Dialógica: a colaboração, a organização e a síntese

cultural.

Freire destaca ainda, que “ensinar não é transferir conhecimentos, mas

criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção”. Isso

porque a reciprocidade de entendimento entre educador e educando resulta

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num forte componente harmônico que permite uma revelação de aprendizagem

mais ampla e democrática.

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REFLEXO DO PENSAMENTO DE PAULO FREIRE NA

CONTEMPORANEIDADE

O estudo do pensamento de Paulo Freire em nossos dias é o tema

desse capítulo que visa refletir como as idéias de Freire podem ser

relacionados a muitos educadores.

Por exemplo, analisando as idéias do educador francês Célestin

Freinet (1896-1966), encontraremos afinidades com as idéias de Paulo

Freire, pois ambos acreditam no poder do diálogo, na consideração da

realidade do educando, na capacidade do educando em organizar sua

própria aprendizagem e em um método global de alfabetização entre outras

características. Aliás, devemos destacar ainda que houve troca de

correspondência e material pedagógico entre Paulo Freire e a associação

francesa de educadores frenetianos.

Relacionando, também, as idéias de Freire com o psicoterapeuta

americano Carl Rogers observaremos características semelhantes pois

ambos tratam a educação como um processo que não deve estar centrada

no educador e sim no educando, o educando deve ser o dono de sua própria

aprendizagem, o educador não deve preocupar-se em despejar

conhecimentos no aluno e a avaliação não deverá ser um instrumento para

medir a capacidade do educando.

É interessante ressaltar, que mesmo sem indícios que naquela época

Paulo Freire tivesse ouvido sobre o trabalho de Carl Rogers, ou vice-versa,

em 1968 Paulo Freire escreveu Pedagogia do Oprimido (dirigido a

camponeses) e Carl Rogers em 1969 publicou o livro Liberdade para

aprender (dirigido a estudantes).

Podemos observar que Paulo Freire foi influenciado pelo pensamento

de Jonh Dewey pois existem referências do livro de Dewey Democracia e

educação, publicada no Brasil em 1936, em vários tópicos de sua tese de

concurso para a cadeira de História e Filosofia da Educação da Universidade

de Pernambuco.

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Paulo Freire assim como Anísio Teixeira e Jonh Dewey insistia no

conhecimento da realidade e da vida da comunidade local:

Isso que se chama hoje de pesquisa do meio deveria ser feito pelos educandos também, com a colaboração das suas professoras. Eu não vejo como não se possa ensinar matemática pesquisando o meio. Eu não vejo como não se possa ensinar biologia, ciências naturais, pesquisando o meio.

(GADOTTI, 2001, p. 112-113)

No entanto, há uma diferença entre Jonh Dewey e Paulo Freire, no

que diz respeito a noção de cultura. Para Dewey, ela é simplificada não

havendo envolvimento aos assuntos relativos aos problemas sócio-políticos

e étnico e para Freire, a ação educativa deve estar sempre ligada na cultura

do educando.

Estudos recentes apontam para a semelhança de pontos de vista com

o pensamento do educador russo Lev Vygotsky principalmente na

importância da abordagem na alfabetização.

Em 1917, logo após a Revolução Russa, Vygotsky visitou as zonas

rurais e fazendas, pesquisando diferenças entre as comunidades que

haviam passado por um processo de alfabetização e as que não tinham

experiências educacionais. Constatou perplexo que havia uma grande

diversidade de atitude entre estas comunidades. As pessoas que não

tiveram oportunidade de passar por experiências educacionais tinham

dificuldades em dialogar, em participar de discussões como pessoas críticas

e até em perguntar: “Não posso imaginar sobre o que perguntar ... para

perguntar você tem de ter conhecimentos e nós só sabemos limpar os

campos das ervas daninhas”.

Já os que haviam participado por um processo de alfabetização,

tinham, entretanto muitas perguntas tais como: “Como podemos ter uma

vida melhor? Por que a vida do operário é melhor do que a vida do

camponês?”

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Embora tenham vivido em épocas diferentes a abordagem entre

Paulo Freire e Vygotsky, enfatiza aspectos fundamentais. Paulo Freire

concentra-se na análise da linguagem e de estratégias pedagógicas e

Vygotsky prioriza a importância da dinâmica pedagógica. Ambos

perceberam a necessidade em associar a conquista da palavra à conquista

da história.

Segundo Gadotti (2001, p. 125):

Não há dúvida de que Paulo Freire deu uma

contribuição decisiva à concepção dialética da

educação. A pedagogia oficial autoritária e os teóricos

liberais (tanto os conservadores quanto os

progressistas) combatem suas idéias justamente por

seu caráter emancipatório e dialético. Seja como for,

aceitemos ou não suas idéias pedagógicas, ele

constitui um marco decisivo do pensamento

pedagógico brasileiro e mundial.

Não se pode reduzir a contribuição de Paulo Freire apenas à alfabetização popular de adultos. Sua contribuição ultrapassa seu método, situando-se num âmbito mais amplo da educação e da teoria do conhecimento.

Mesmo considerando as influências distintas em sua concepções,

Paulo Freire conseguiu criar um método educativo original, eficaz e inovador

que, a despeito de ter sido engendrado há décadas continua vivo e atuante

servindo de exemplo para a resolução dos problemas educacionais do nosso

país.

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CONCLUSÃO

O propósito desta dissertação foi realizar a identificação entre a educação bancária

e a educação dialogada, defendida por Paulo Freire, enfatizando a importância da educação

dialogada no processo de ensino/aprendizagem.

Paulo Freire preocupa-se em demonstrar que o homem é um sujeito ativo e não um

mero objeto da história, e que o ensino deve ter a preocupação de ser um ato consciente,

partindo do pressuposto de que aprender é considerar as experiências concretas da

realidade específica de cada indivíduo.

Ao longo do trabalho que foi realizado, a maior preocupação foi a reflexão sobre a

nossa realidade escolar, que está longe de atingir o ideal freireano, uma vez que, na maioria

das escolas, ainda se verifica maciçamente a existência de modelos inspirados na

Educação Bancária,a qual enfatiza - como já observamos - o papel de detentor do saber

pelo educador,um mero transmissor de conteúdos, que deposita nos educandos, seus

conhecimentos, muitas vezes irrelevantes.

Daí a necessidade contemporânea de sempre retomar o pensamento de

Paulo Freire, ressaltando sua idéias na formulação de uma pedagogia dialogada

e reflexiva que torna verdadeiramente possível uma educação crítica e

libertadora.

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BIBLIOGRAFIA ALVES, Magda. Como escrever teses e monografias. Rio de Janeiro: Campus, 2003. FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1974.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança. São Paulo: Paz e Terra, 1994.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1997.

FREIRE, Paulo. A trajetória de Paulo Freire. Disponível em:

<http://www.institutopaulofreire.com.br>. Acesso em: 15 ag. 2003.

FREIRE, Paulo. A voz do biógrafo brasileiro. Disponível em:

<http://www.institutopaulofreire.com.br>. Acesso em: 22 ag. 2003.

GADOTTI, Moacir. Convite à leitura de Paulo Freire. São Paulo: Editora Scipione, 2001.

GADOTTI, Moacir. Paulo Freire. Uma biobibliografia. São Paulo: Cortez Editora, 1996.

MINAYO, Maria Cecília de Souza. Pesquisa Social. Rio de Janeiro: Vozes, 1994.

LAROSA, Marco Antonio e AYRES, Fernando Arduini. Como produzir uma

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ÍNDICE

APRESENTAÇÃO INTRODUÇÃO ...............................................................................................1

CAPÍTULO I – A VIDA DO EDUCADOR 1.1 Paulo Freire – Uma breve história........................................................4

1.2 Sua produção ao longo da vida .........................................................11

1.3 Comentários sobre a bibliografia de Paulo Freire ..............................14

CAPÍTULO II O método que levou Paulo Freire ao exílio ..................................................15

CAPÍTULO III Identificação da dicotomia entre educação bancária e educação dialogada

.......................................................................................................................22

CAPÌTULO IV

Reflexos do pensamento de Paulo Freire na contemporaneidade...............27

CONCLUSÃO...............................................................................................30

BIBLIOGRAFIA ...........................................................................................31

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