a missão - perse · 2018-06-06 · livremente sobre o que chamo de meus acontecimentos, ......

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A Missão ou, vivenciando a perspectiva do fim Wesley W. Cavalheiro 1ª Edição 2012

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A Missão

— ou, vivenciando a perspectiva do fim —

Wesley W. Cavalheiro

1ª Edição

— 2012 —

2 Wesley W Cavalheiro

Copyright © por Wesley W. Cavalheiro, 2012

Todos os direitos reservados e protegidos pela Lei 9.610, de

19/02/1998. É expressamente proibida a reprodução total ou parcial

deste livro, por quaisquer meios (eletrônicos, mecânicos,

fotográficos, gravação e outros), sem prévia autorização, por escrito,

do editor.

Revisão: Beatriz Matos Cavalheiro

______________________________________________

Cavalheiro, Wesley W.

A Missão – ou, vivenciando a perspectiva do fim / Wesley W.

Cavalheiro – Rio de Janeiro : Wesley W. Cavalheiro, 2012.

1. Missão 2. Fim 3. Etapa 4. Escatologia I. Título.

______________________________________________

ISBN: 978-85-913338-3-7

www.EneaLumen.net

1ª Edição

2012

________________________________

Produzido no Brasil

A Missão 3

Dedicatória

Aos inúmeros companheiros e

companheiras desta missão que

se chama vida...,

Aos que a terminaram antes de

mim, nos veremos algum dia e

curtiremos nossa companhia

novamente,

Aos que a terminarão depois de

mim, aguardá-los-ei.

4 Wesley W Cavalheiro

Sumário Dedicatória ..................................................................................................................................................... 3 Prefácio ........................................................................................................................................................... 5 1. A expectativa da chegada ........................................................................................................................... 8

O fim de todas as coisas ........................................................................................................................... 10 A expectativa do paraíso .......................................................................................................................... 12

2. Os preparativos ........................................................................................................................................ 19 O começo .................................................................................................................................................. 20 Os fundamentos ....................................................................................................................................... 23 O futuro .................................................................................................................................................... 23

3. O início ...................................................................................................................................................... 27 A expectativa ............................................................................................................................................ 29 A eternidade ............................................................................................................................................. 29 A esperança .............................................................................................................................................. 35 Fé .............................................................................................................................................................. 40 O anticristo ............................................................................................................................................... 44

4. A viagem ................................................................................................................................................... 51 Medo ........................................................................................................................................................ 51 Raiva ......................................................................................................................................................... 61 Tristeza e alegria ....................................................................................................................................... 70 Amor ......................................................................................................................................................... 84

5. O processo, o fim, e a chegada ................................................................................................................. 96 A menina de Camaragibe ....................................................................................................................... 100 Momentos, fases, etapas, vida, e saga ................................................................................................... 108

Apêndice 1: A bíblia .................................................................................................................................... 113 Apêndice 2: As correntes escatológicas ..................................................................................................... 117

A Missão 5

Prefácio

Vivenciei diversas perspectivas de fim! Fim de

brincadeira, fim de jogo, fim de projeto, fim de viagem,

fim de trabalho, fim do casamento, fim da família, fim da

vida, fim do mundo... não necessariamente nesta ordem.

Este texto não tem a pretensão de ser um ensaio, uma

monografia ou um tratado sobre o que quer que seja. Não

sou filósofo, ou teólogo, muito menos psicólogo ou

neurocientista. Sou um ser humano. Seres humanos são

definidos por, como exposto por Jorge Furtado em seu

curta-metragem ‘Ilha das Flores’, seres mamíferos,

bípedes, com telencéfalo altamente desenvolvido e polegar

opositor, o que lhes permite armazenar informações,

relacioná-las, processá-las e entende-las, com manipulação

de precisão. Nesta qualidade, me permito discorrer

livremente sobre o que chamo de ‘meus acontecimentos’,

sem a preocupação com metodologias científicas ou

filosóficas. Este livro é sobre acontecimentos,

pensamentos, sentimentos e o jeito que encontrei de lidar

com eles, embora faça alusões a uma ou outra ciência ou

corrente teológica.

Os sentimentos e as ações de uma pessoa, decorrentes da

vivência de uma perspectiva de fim, dependem das

6 Wesley W Cavalheiro

conexões, de toda sorte, estabelecidas até então. Algumas

pessoas, autodenominadas ‘espirituais’, podem vir a

classificar-me como mundano, não-espiritual, ou outro

adjetivo qualquer que me exclua ou marginalize do meio

cristão. Ocorrem duas coisas:

Primeira: depois de passar pelo que já passei, viver o que

já vivi, o rótulo atribuído já não importa tanto; e

Segunda: depois de vivenciar as fronteiras do céu e do

inferno, constato que sou uma só pessoa. Meu corpo,

minha alma, espírito, pensamentos e emoções, constituem

um único ser, indivisível, no qual uma determinada

percepção afeta o ser como um todo. Não há experiência

espiritual que não seja também, de algum modo, mental ou

corpórea. Toda comunicação do divino com uma pessoa se

dá dentro do contexto desta pessoa.

Assim, esta narrativa é o resultado de um conjunto de idas

e vindas, encontros e desencontros, da minha pessoa com

o Senhor, comigo mesmo, e com as pessoas que, de

alguma maneira, fizeram parte da minha jornada, ilustrado

com situações reais por mim vividas em determinada

época de minha vida. Desabrocho meu coração como

forma de ser coerente com o próprio conteúdo: ser um

participante ativo no desfecho do ‘fim de todas as coisas’.

‘O fim de todas as coisas’ me remete a pensar o

significado de ‘todas as coisas’. Esta narrativa ousa um

A Missão 7

livre pensar sobre estas ‘todas as coisas’ e como viver na

expectativa do limiar de seu fim. Naturalmente, os dados e

nomes reais das personagens foram modificados com o

fim de preservar sua privacidade.

8 Wesley W Cavalheiro

1. A expectativa da chegada

Apareceu! Eram cerca de quatro e meia da manhã quando

a luz, a uns quinze graus a bombordo da proa apareceu.

Não era um farol, mas funcionava melhor que um. A luz

um tanto o quanto estrogoscópica que sinalizava uma

antena de televisão no morro do Sumaré no Rio de Janeiro

era vista à noite a quase quarenta milhas em noites de céu

claro. Diferentemente de um farol, que aparece quase que

ao nível do mar, aquela luz já aparecia no alto. Por vezes

era confundida com uma estrela. Agora sim, estávamos

chegando. Aquele era o primeiro sinal. Em mais algumas

horas o navio estaria atracando no porto desejado, no

último porto de uma viagem de mais de três meses. Aos

poucos os demais sinais apareciam. Primeiramente na tela

do radar; depois como vultos na noite que se encerrava;

por fim, vultuosos e impávidos ao sol da manhã: a Ilha

Jorge Grego, a Pedra da Tijuca, o Corcovado, as Ilhas

Tijucas, As Ilhas Cagarras e a Ilha Redonda, o Morro do

Pão de Açúcar, a Ilha Cotunduba, a Lage, a Ponte Rio-

Niterói... Em pouco tempo tudo estaria terminado e

chegaríamos às nossas casas e famílias.

A Missão 9

A sensação era de alívio e satisfação pela missão

cumprida, mas também de ansiedade por rever, abraçar e

beijar quem amávamos. Este dia já era esperado, desejado,

sonhado e, sobretudo, planejado, quando do porto base

saímos há cerca de três meses.

Vivenciar a expectativa do fim ou a expectativa de um

novo começo? Embora ambos estejam diretamente

relacionados, tal como o copo contendo água até a sua

metade e que, dependendo do ponto de vista é considerado

meio vazio ou meio cheio, assim também é a vivência da

expectativa do fim / começo de alguma coisa.

Em geral, a vivência da expectativa do fim se relaciona a

algo negativo, ruim. Deseja-se e espera-se que acabe logo.

Já a vivência da expectativa de um novo começo se

relaciona a algo bom, ao desejo e esperança de uma nova

época de bonança.

Na vida estamos continuamente vivenciando fins e

começos, ou recomeços. São ciclos que, tais como as

estações do ano – primavera, verão, outono, inverno –

tornam o viver dinâmico, sempre diferente, e esperançoso.

Cada estação tem o poder de nos fazer esperar a próxima.

Às vezes iniciamos uma época da nossa vida já esperando

seu fim e o começo de uma nova época. Às vezes,

queremos que algo nunca acabe. Às vezes, gostaríamos

que nunca começasse. Às vezes, que terminasse o quanto

10 Wesley W Cavalheiro

antes. Temos as mais diversas reações e estas dependem

do estado em que nos encontramos. Entretanto, é

inexorável: “Não há mal que sempre dure e bem que

nunca acabe” dizia minha mãe.

O fim de todas as coisas

Quando tinha cerca de vinte anos de idade vivi

intensamente a perspectiva do ‘fim de todas as coisas’, o

que, naquela época, era indissociável da expressão “a

segunda volta de Cristo”. Era o início dos anos 1970. O

conhecimento e sabedoria que me moviam naquela época

eram completamente influenciados pelo meu círculo de

relacionamentos. Minhas ideias e sentimentos brotavam da

identificação com as ideias e sentimentos de com pessoas

que, de alguma maneira, por algum motivo ou razão,

sintonizavam com minha essência. Assim, vivi

intensamente a ‘minha verdade’, que de minha só tinha o

fato de ter recebido e acolhido o que de ontem recebi.

Neste sentido entendo o que Jesus quis dizer quando falou

que nada tinha que não tivesse recebido1.

Àquela época, a segunda vinda de Cristo significava, para

mim e para tantas outras pessoas, o fim de todas as coisas

tal como existiam, dando início a uma sequencia de

acontecimentos lineares no tempo: o arrebatamento da 1 Bíblia, RA, João 8.28; João 12.49; João 14.10

A Missão 11

igreja, a grande tribulação, o milênio, a última batalha, o

juízo final, a eternidade em novos céus e nova terra. A

segunda vinda estava próxima. Como expressava uma

canção, “os sinais da Sua vinda mais se mostram cada

vez”. Guerras, rumores de guerra, fome, catástrofes

ambientais, degradação moral da sociedade, enfim, uma

lista de fatos, extraída da bíblia, e que fundamentavam a

crença na iminência da Parousia, ou o segundo advento

do Cristo. Existiam outras abordagens para a sequência de

eventos relacionados à segunda vinda de Cristo, mas elas

eram, digamos, irrelevantes diante do que era a ‘minha

verdade’. ‘O fim de todas as coisas’ trazia embutida a

noção de um tempo instantâneo. Tudo iria acontecer

instantaneamente.

Esta crença moldou tudo o que eu fazia, como me

comportava, bem como as atitudes diante das

circunstâncias.

Os mais de trinta anos passados daquela época não

alteraram minha crença na Parousia e agregaram outras

perspectivas ao que então era ‘verdade única’. Passei a

vivenciar a manifestação plena do Cristo de modo

diferente do daquela época. É, mudei!

Há algum tempo me deparei com um texto que fazia

menção a Karl Barth, um teólogo suíço do século passado.

O texto aludia a uma suposta conversa de Karl Barth, onde

12 Wesley W Cavalheiro

o interlocutor perguntou se ele acreditava na segunda

vinda de Cristo. Karl Barth teria respondido que

acreditava em todas as vindas de Jesus, e não apenas na

segunda. Teria dito que Jesus Cristo veio pela primeira

vez na encarnação e, depois, pela segunda vez na

ressurreição, e veio outra vez no Pentecostes, uma quarta

vez na Igreja, que é o seu corpo, e, além dessas, Jesus

Cristo vem toda vez que um pecador se arrepende e se

reconcilia pessoalmente com Ele. Por fim, Jesus viria

consumar o reino de Deus no “fim da história”, mas essa

seria a quinta ou sexta vinda de Jesus.

Seja a história verdade, mentira, ou meia verdade, o fato é

que disparou em mim novas possibilidades de

entendimento da mensagem da bíblia.

Parousia é uma palavra do grego antigo (pəˈruːziə) que

significa presença, chegada, ou visita oficial. Assim, viver

na expectativa da Parousia é muito mais do que viver na

expectativa da segunda vinda de Cristo. É viver na

expectativa da manifestação ímpar do Cristo aqui e agora!

A expectativa do paraíso

A maioria de nós que tripulávamos o Bellatrix gostava de

viajar. Por diferentes motivos. No meu caso, e o de alguns

companheiros, não gostávamos de viajar por viajar, mas

sim do que fazíamos durante a viagem. Tínhamos uma

A Missão 13

missão relevante a cumprir. Nosso trabalho era

diretamente relacionado à preservação de vidas no mar,

preservação do meio ambiente e, de modo amplo, ao

desenvolvimento do País. Trabalhávamos por melhorar as

condições de vida das pessoas, incluindo sua relação com

o planeta – o meio ambiente, promovendo o conhecimento

deste de modo que a interação pudesse ser saudável e

profícua, com ganhos para todos.

O interesse não era totalmente altruísta. Havia os

interesses pessoais também, manifestado nas expectativas

pessoais. Trabalhávamos por nosso futuro e o de nossas

famílias. Aquela viagem e a sua missão constituía uma

etapa de nossas vidas. Ela, em si, não era o fim. Mas o seu

fim era como uma prova da satisfação e do contentamento

maior pelo qual trabalhávamos.

A ideia e o desejo por um paraíso estão implantados na

alma do ser humano, seja qual for seu credo ou cultura. O

paraíso está associado, primeiramente, com a ausência de

condições adversas de vida e, em segundo lugar, com a

existência de condições favoráveis a uma boa qualidade de

vida. Por qualidade de vida entenda-se os aspectos sociais,

políticos e legais. O Paraíso é um porto desejado. Talvez

devesse ser O porto altamente desejado e ansiosamente

esperado, uma vez que, segundo a tradição judaico-cristã,

vai-se rever pessoas amadas, conhecer pessoas que nos

14 Wesley W Cavalheiro

deixaram um legado e, sobretudo, estar com o Senhor em

plenitude.

Desejamos que a vida seja um paraíso. Que seus

momentos sejam momentos que nos deixem plenos de

satisfação. Quando assim não é, ansiamos por mudanças.

Por ocasião da encarnação do Cristo havia a expectativa

da chegada de uma pessoa que iria conduzir a humanidade

a uma nova ordem social. Enéas Tognini em seu livro “O

período interbíblico” descreve como a sociedade da época

do primeiro advento ansiava, esperava e se preparava para

a vinda do Messias. A própria bíblia tem um relato

interessante de magos provenientes do oriente que foram

adorar o novo rei recém-nascido2. Não consegui descobrir

com precisão o significado atribuído à palavra ‘magos’,

mas seja qual for, sabe-se que aquelas pessoas não eram

israelitas; não viviam em Israel; possuíam sinais da vinda

do Rei outros que não os escritos israelitas. Como disse o

salmista, “Os céus proclamam a glória de Deus, e o

firmamento anuncia as obras das suas mãos”3. No Novo

Testamento, Paulo de Tarso, o apóstolo, afirma

“porquanto o que de Deus se pode conhecer é manifesto

entre eles, porque Deus lhes manifestou. Porque os

atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder,

2 Bíblia, RA, Mateus 2.1,2 3 Bíblia, RA, Salmo 19.1

A Missão 15

como também a sua própria divindade, claramente se

reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo

percebidos por meio das coisas que foram criadas”4.

O Prof. Johan Malan escreve que “Todas as grandes

religiões do mundo são caracterizadas por fortes

expectativas messiânicas. Elas esperam por um messias

que porá fim à injustiça na Terra, matará os iníquos,

acabará com o sofrimento, curará divisões por meio de

uma nova unificação e irmandade, e estabelecerá na

Terra uma era de incomparável paz e prosperidade. Em

toda a parte as convicções religiosas são alimentadas por

estas expectativas, convidando assim as pessoas a

garantirem um lugar na utopia futura, vivendo uma vida

de dedicação a princípios religiosos”5.

Atualmente, a expectativa de uma nova ordem mundial

extrapola os aspectos religiosos. Um artigo de Jean-Pierre

Lehmann publicado no jornal Valor Econômico em 06

MAR 2012 intitulado “O planeta que queremos”6 é

curioso. No artigo, o autor, que é professor de política

econômica internacional, sem mencionar aspectos

religiosos, proclama um clamor por mudanças políticas,

sociais, e econômicas radicais, ou seja, um novo mundo.

4 Bíblia, RA, Romanos 1.19-20 5 http://www.bibleguidance.co.za/Portarticles/Expectativas.htm 6 http://www.valor.com.br/opiniao/2556314/o-planeta-que-queremos