a matrix enquanto hipótese metafísica

9
A Matrix enquanto hipótese metafísica David J. Chalmers Universidade do Arizona 1. Cérebros numa cuba O filme Matrix apresenta-nos uma versão de uma velha fábula filosófica: um cérebro numa cuba. Um cérebro sem corpo flutua numa cuba que por sua vez está no laboratório de um cientista . O cientista encontrou maneira do cérebro ser estimulado com o mesmo tipo de inputs que um cérebro normal costuma receber quando está num corpo. Para se conseguir isto, o cérebro na cuba está ligado a uma gigante simulação do mundo. A simulação determina então quais são os inputs que o cérebro recebe. Por sua vez, quando o cérebro produz outputs estes são enviados para a simulação. O estado de funcionamento deste cérebro é igual ao de um cérebro normal, apesar de não estar num corpo. Da perspectiva deste cérebro as coisas são muito semelhantes àquilo que parecem a mim e a si. Mas parece que este cérebro está completamente enganado. Parece que tem crenças falsas sobre tudo. Acredita que tem um corpo, quando afinal não tem. Acredita que está lá fora ao Sol, quando afinal está num laboratório escuro. Acredita que está num determinado sítio, quando, de facto, pode estar noutro completamente diferente. Talvez pense que está em Tucson, quando afinal está na Austrália ou mesmo no espaço sideral. A situação do Neo no início do filme Matrix é similar a esta. Ele pensa que vive numa determinada cidade, pensa que tem cabelo, pensa que vive em 1999, e pensa também que está Sol lá fora. Mas, na realidade, flutua no espaço, não tem cabelo, o ano em que está é aproximadamente 2199, e o seu mundo foi arrasado pela guerra. Há contudo algumas diferenças entre este cenário do Neo e o do cérebro numa cuba exposto inicialme nte: o cérebro do Neo está de facto num corpo, e a simulação é controlada por máquinas e não por um cientista. Mas os detalhes essenciais são bastante idênticos em ambos os casos. Efectivamente, Neo é um cérebro numa cuba. Vamos supor que uma matrix (com "m" minúsculo) é um certo tipo de simulação computacional artificia lmente gerada de um mundo. Deste modo, a Matrix do filme é um possível exemplo de uma matrix. Vamos também supor que alguém está incubado, ou que está dentro de uma matrix, desde que esse alguém tenha um sistema cognitivo que receba inputs de, e envie outputs para, uma matrix. Neste caso, tanto o cérebro de que falávamos no início como o próprio Neo estão incubados. Podemos supor que uma matrix pode simular a [total constituição] física de um mundo, até ao mais ínfimo pormenor, ou partícula , numa sequência espáciotemp oral. (Adiante veremos como esta configuração do mundo pode variar.) Nesta situação, um ser incubado é associado a um corpo  particular simulado . É também estabelec ida uma ligação que permita que sempre que o seu corpo [simulado] receba inputs sensoriais da simulação o sistema cognitivo incubado receba inputs sensoriais do mesmo tipo. Paralelamente, a dita ligação permite que de cada vez que o sistema cognitivo incubado produz outputs estes sejam enviados para os órgãos motores do corpo simulado que está na simulação. Quando se levanta a possibilidade de uma matrix surge imediatamente uma questão. Como posso eu saber que eu não estou numa matrix? Afinal, posso muito bem ser um cérebro numa cuba que tem exactamente a mesma constituição que o meu próprio cérebro; esse cérebro pode estar ligado a uma matrix, e, por isso, pode ter experiências indistinguíveis das que tenho neste momento. Do interior 

Upload: francisco-de-assis

Post on 07-Apr-2018

217 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: A Matrix enquanto hipótese metafísica

8/6/2019 A Matrix enquanto hipótese metafísica

http://slidepdf.com/reader/full/a-matrix-enquanto-hipotese-metafisica 1/9

A Matrix enquanto hipótese metafísica

David J. Chalmers

Universidade do Arizona

1. Cérebros numa cuba

O filme Matrix apresenta-nos uma versão de uma velha fábula filosófica: um cérebro numa cuba.Um cérebro sem corpo flutua numa cuba que por sua vez está no laboratório de um cientista. Ocientista encontrou maneira do cérebro ser estimulado com o mesmo tipo de inputs que um cérebronormal costuma receber quando está num corpo. Para se conseguir isto, o cérebro na cuba estáligado a uma gigante simulação do mundo. A simulação determina então quais são os inputs que océrebro recebe. Por sua vez, quando o cérebro produz outputs estes são enviados para a simulação.O estado de funcionamento deste cérebro é igual ao de um cérebro normal, apesar de não estar numcorpo. Da perspectiva deste cérebro as coisas são muito semelhantes àquilo que parecem a mim e a

si.Mas parece que este cérebro está completamente enganado. Parece que tem crenças falsas sobretudo. Acredita que tem um corpo, quando afinal não tem. Acredita que está lá fora ao Sol, quandoafinal está num laboratório escuro. Acredita que está num determinado sítio, quando, de facto, podeestar noutro completamente diferente. Talvez pense que está em Tucson, quando afinal está naAustrália ou mesmo no espaço sideral.

A situação do Neo no início do filme Matrix é similar a esta. Ele pensa que vive numa determinadacidade, pensa que tem cabelo, pensa que vive em 1999, e pensa também que está Sol lá fora. Mas,na realidade, flutua no espaço, não tem cabelo, o ano em que está é aproximadamente 2199, e o seu

mundo foi arrasado pela guerra. Há contudo algumas diferenças entre este cenário do Neo e o docérebro numa cuba exposto inicialmente: o cérebro do Neo está de facto num corpo, e a simulação écontrolada por máquinas e não por um cientista. Mas os detalhes essenciais são bastante idênticosem ambos os casos. Efectivamente, Neo é um cérebro numa cuba.

Vamos supor que uma matrix (com "m" minúsculo) é um certo tipo de simulação computacionalartificialmente gerada de um mundo. Deste modo, a Matrix do filme é um possível exemplo de umamatrix. Vamos também supor que alguém está incubado, ou que está dentro de uma matrix, desdeque esse alguém tenha um sistema cognitivo que receba inputs de, e envie outputs para, umamatrix. Neste caso, tanto o cérebro de que falávamos no início como o próprio Neo estão incubados.

Podemos supor que uma matrix pode simular a [total constituição] física de um mundo, até ao maisínfimo pormenor, ou partícula, numa sequência espáciotemporal. (Adiante veremos como estaconfiguração do mundo pode variar.) Nesta situação, um ser incubado é associado a um corpo

 particular simulado. É também estabelecida uma ligação que permita que sempre que o seu corpo[simulado] receba inputs sensoriais da simulação o sistema cognitivo incubado receba inputs

sensoriais do mesmo tipo. Paralelamente, a dita ligação permite que de cada vez que o sistemacognitivo incubado produz outputs estes sejam enviados para os órgãos motores do corpo simuladoque está na simulação.

Quando se levanta a possibilidade de uma matrix surge imediatamente uma questão. Como posso eusaber que eu não estou numa matrix? Afinal, posso muito bem ser um cérebro numa cuba que temexactamente a mesma constituição que o meu próprio cérebro; esse cérebro pode estar ligado a umamatrix, e, por isso, pode ter experiências indistinguíveis das que tenho neste momento. Do interior 

Page 2: A Matrix enquanto hipótese metafísica

8/6/2019 A Matrix enquanto hipótese metafísica

http://slidepdf.com/reader/full/a-matrix-enquanto-hipotese-metafisica 2/9

[da matrix] não há forma segura de afirmar que não sou de facto um cérebro numa cuba. Assim, não podemos saber de certeza se não estamos numa matrix.

Vamos agora chamar à hipótese de que eu estou numa matrix, e sempre estive numa matrix, aHipótese matrix. A Hipótese matrix afirma que eu estou, e sempre estive, incubado. Todavia, istonão é rigorosamente equivalente à hipótese de que eu estou na matrix, porque a matrix [do filme] é

apenas uma versão específica de uma matrix. De momento vou ignorar algumas complicações quesão específicas da matrix apresentada no filme, tal como por exemplo a possibilidade de as pessoas poderem por vezes passar do mundo simulado para o real e inversamente. Colocando estas questõesà parte, podemos pensar na Hipótese matrix como uma maneira de afirmar que eu estou no mesmotipo de situação que pessoas que sempre estiveram numa matrix.

Devemos ponderar Hipótese matrix sériamente, bem como considerá-la uma forte possibilidade. Talcomo Nick Bostrom sugeriu, não está fora de questão que na história do universo haja tecnologiaque permita a certos seres criar simulações computorizadas de mundos. Pode até haver um grandenúmero de tais simulações, por oposição a apenas um mundo real. Se é este o caso, pode muito bemacontecer que haja muitos mais seres que estão numa matrix do que aqueles que não estão. Perante

esta possibilidade, podemos até inferir que é bastante mais provável estarmos numa matrix do quenão estarmos. Independentemente deste raciocínio estar certo ou errado, parece realmente que não

 podemos estar certos que não estamos de facto numa matrix.

Sérias consequências parecem seguir-se do que foi dito. Por exemplo, a minha contraparte incubada parece estar a ser massivamente enganada. Pensa que está em Tucson; pensa que está sentada aescrever um artigo; pensa que tem um corpo. Mas, face ao que se disse, todas estas crenças sãofalsas. Da mesma maneira, parece que, se eu estou incubado, as minhas próprias crenças são falsas.Eu não estou realmente sentado a escrever um artigo, e eu posso mesmo não ter um corpo. Assim,se eu não sei que eu não estou realmente incubado, então eu também não sei se estou em Tucson, ouse estou sentado em frente à minha secretária a escrever um artigo, ou sequer se tenho um corpo

A Hipótese matrix ameaça pôr em causa quase tudo aquilo que eu julgo saber. Parece uma Hipótesecéptica: uma hipótese que eu não posso excluir, e uma hipótese que poderia falsificar grande partedas minhas crenças se elas fossem verdadeiras. Quando se nos apresenta uma hipótese céptica destanatureza parece que nenhumas das nossas crenças podem ser consideradas conhecimento genuíno.Claro que as minhas crenças podem eventualmente ser verdadeiras — pois posso ser alguém comsorte e não estar realmente incubado —, mas não posso excluir definitivamente a possibilidade deque elas sejam falsas. A admissão de uma hipótese céptica conduz ao cepticismo no que respeita asessas crenças: eu acredito em certas coisas, mas não as sei realmente.

Resumindo o raciocínio: eu não sei se não estou numa matrix. Se estou numa matrix, então provavelmente não estou em Tucson. Assim, se eu não sei se não estou numa matrix, então tambémnão sei se estou em Tucson. O mesmo se aplica para quase tudo que eu julgo saber acerca do mundoexterior.2. Reconsiderando a possibilidade do incubamento

Esta é a maneira normal de pensarmos o cenário da cuba. Parece que esta visão do problema étambém adoptada pelos criadores do filme matrix. Na caixa do DVD pode ler-se o seguinte:

Percepção: A rotina de todos os dias no mundo é real.

Realidade: O mundo é uma ilusão sofisticada, um embuste forjado por máquinas maximamente poderosas que nos controlam. Whoa!

Page 3: A Matrix enquanto hipótese metafísica

8/6/2019 A Matrix enquanto hipótese metafísica

http://slidepdf.com/reader/full/a-matrix-enquanto-hipotese-metafisica 3/9

Eu penso que esta perspectiva não é inteiramente correcta. Julgo que, mesmo que eu esteja numamatrix, o meu mundo é perfeitamente real. Um cérebro que esteja numa cuba não estácompletamente iludido (desde que tenha estado sempre na cuba). O Neo não tem crençasmassivamente falsas acerca do mundo exterior. Em vez disso, os seres que estão incubados têm

 bastantes crenças correctas acerca do seu mundo. Se for assim, então a Hipótese matrix não é umahipótese céptica, e a sua eventual possibilidade não invalida tudo o que eu penso saber.

Houve filósofos que defenderam este tipo de teoria no passado. George Berkeley, um filósofo doséculo XVIII, defendeu que a aparência é a realidade. (Recordemos as palavras de Morpheus nofilme: "O que é o real? Como defines o real? Se estamos a referir-nos àquilo que podes sentir, ouàquilo que podes cheirar, ou ainda àquilo que podes saborear ou ver, então o real é simplesmenteum conjunto de impulsos eléctricos interpretados pelo teu cérebro.") Se isto está correcto, então omundo percepcionado por seres que estão incubados é um mundo perfeitamente real: eles têm todasas suas percepções correctas, e, assim, o que aparece é a realidade. Desta perspectiva, mesmo seresque estão incubados têm crenças verdadeiras acerca do mundo.

Dei comigo recentemente a adoptar uma conclusão parecida, embora por razões manifestamente

diferentes. Não julgo que a perspectiva segundo a qual o que aparece é a realidade seja plausível, e portanto não apoio o raciocínio de Berkeley. E, até há pouco tempo, parecia-me manifestamenteóbvio que os cérebros em cubas teriam de ter crenças massivamente falsas. Mas agora penso que háuma linha de argumentação que mostra que essa teoria está errada.

Ainda penso que não posso excluir a hipótese de que estou numa matrix. Mas também penso que,mesmo que eu esteja neste momento numa matrix, eu ainda estou em Tucson, na minha secretária, e

 por aí adiante. Deste modo, a hipótese de que estou numa matrix não seria mais uma hipótesecéptica. O mesmo vale para o caso do Neo. No início do filme ele pensa "eu tenho cabelo", e eleestá correcto. E o mesmo vale, claro, para o caso original do cérebro numa cuba. Quando o cérebro

 pensa "eu tenho um corpo", ele está correcto. Quando pensa "estou a andar", está correcto.

Esta perspectiva parece à partida muito contra-intuitiva. Inicialmente, pareceu-me manifestamentecontra-intuitiva. Então vou agora apresentar a linha de argumentação que me convenceu de que estácorrecta.3. A hipótese metafísica

Vou agora argumentar que a hipótese de que estou incubado não é uma hipótese céptica, mas antesuma hipótese metafísica. Ou seja, é uma hipótese sobre a natureza fundamental da realidade.

Enquanto a física se preocupa com os processos microscópicos que constituem a realidade

macroscópica, a metafísica preocupa-se com a natureza fundamental da realidade. Uma hipótesemetafísica pode inclusivamente ser uma proposta sobre que realidade subjaz aos fenómenos físicos.Alternativamente, pode até dizer alguma coisa sobre a natureza das nossas mentes, ou até mesmosobre a criação do mundo.

Penso que a Hipótese matrix deve ser vista como uma hipótese metafísica, na qual estão contidos ostrês elementos seguintes: uma proposta sobre a realidade fundamental que está subjacente aos

 processos físicos, uma proposta sobre a natureza das nossas mentes, e uma proposta sobre a criaçãodo mundo.

Em particular, penso que a Hipótese matrix é equivalente a uma versão tripartida da seguinte

Hipótese Metafísica: Primeiro, os processos físicos são fundamentalmente processoscomputacionais. Segundo, os nossos sistemas cognitivos estão separados dos processos físicos,

Page 4: A Matrix enquanto hipótese metafísica

8/6/2019 A Matrix enquanto hipótese metafísica

http://slidepdf.com/reader/full/a-matrix-enquanto-hipotese-metafisica 4/9

embora interajam com esses processos. Terceiro, a realidade física foi criada por seres que estãofora do espaço-tempo físico.

É importante notar que nada nesta hipótese metafísica tem um carácter céptico. Esta hipótesemetafísica sugere quais são os processos que sustentam a nossa realidade normal, mas não defendeque essa realidade não existe. Nos ainda temos corpos, e ainda há cadeiras e mesas: apenas a sua

natureza fundamental é um pouco diferente da forma como pensamos que é. Desta maneira, ahipótese metafísica é análoga a uma qualquer hipótese física, como [por exemplo] a que relativa àmecânica quântica. Ambas as hipóteses, tanto a física como a metafísica, dizem-nos quais os

 processos que constituem as cadeiras. Nenhuma delas defende que não há cadeiras. Em vez disso,ambas dizem que as cadeiras são como são.

Vou apresentar a argumentação introduzindo cada uma das três partes da hipótese metafísica emseparado. Vou sugerir que cada uma delas é coerente, e que não pode ser conclusivamente excluída.Vou também sugerir que nenhuma delas é uma hipótese céptica: pois, mesmo que sejamverdadeiras, as nossas crenças normais continuam a ser correctas. O mesmo é válido para acombinação das três hipóteses. Vou então argumentar que a Hipótese matrix é equivalente à

combinação destas três hipóteses.(1) A Hipótese da Criação

Esta Hipótese diz: O espaço-tempo físico, e todo o seu conteúdo, foram criados por seres que estãofora do espaço-tempo físico.

A Hipótese da Criação

Esta hipótese é conhecida. Muitas pessoas na nossa sociedade acreditam nela, e talvez até umagrande maioria de pessoas em todo o mundo. Se acreditamos que Deus criou o mundo, e seacreditamos que Deus está fora do espaço-tempo físico, então também acreditamos na Hipótese daCriação. Apesar disso, não precisamos de acreditar em Deus para acreditar na Hipótese da Criação.Talvez o nosso mundo tenha sido criado por um ser relativamente normal que está no "universomais próximo acima do nosso", e que esse ser tenha usado a última palavra em tecnologia decriação de mundos disponível nesse universo. Se for o caso, então a Hipótese da Criação éverdadeira.

 Não sei se a Hipótese da Criação é verdadeira. Mas não tenho a certeza de que é falsa. A hipótese éclaramente coerente, e, por isso, não posso conclusivamente exclui-la.

A Hipótese da Criação não é uma hipótese céptica. Mesmo que seja verdadeira, as minhas crenças

habituais continuam verdadeiras. Eu ainda tenho mãos, ainda estou em Tucson, e por aí adiante.Talvez algumas das minhas crenças passem a ser falsas: por exemplo, se eu for ateu, ou se acreditoque a realidade começou com o Big Bang. Contudo, a maioria das minhas crenças habituais sobre omundo exterior conservam-se intactas.(2) A Hipótese ComputacionalA Hipótese Computacional

Esta hipótese diz: Os processos microfísicos que encontramos no espaço-tempo são constituídos por  processos computacionais que lhes estão subjacentes.

A Hipótese Computacional diz-nos que os processos físicos que julgamos constituírem o nível mais

fundamental da realidade afinal podem não o ser. Tal como os processos químicos estão na base de processos biológicos, e tal como processos microfísicos estão na base de processos químicos,também qualquer coisa está subjacente aos processos microfísicos. Por baixo do nível dos quarks,

Page 5: A Matrix enquanto hipótese metafísica

8/6/2019 A Matrix enquanto hipótese metafísica

http://slidepdf.com/reader/full/a-matrix-enquanto-hipotese-metafisica 5/9

electrões e fotões, há ainda mais um nível: o nível dos bits. Estes bits são geridos por um algoritmocomputacional, que, a um nível mais elevado, produz os processos que nós pensamos serem as

 partículas fundamentais, as forças, etc.

A Hipótese Computacional não é tão vastamente aceite quanto a Hipótese da Criação; mas aindaassim há algumas pessoas que a consideram bastante plausível. Um dos casos mais conhecidos é o

de Ed Fredkin, que defendeu que o universo é no fundo um determinado tipo de computador.Recentemente, Stephen Wolfram adoptou a ideia no seu livro A New Kind of Science, sugerindo aíque, ao nível mais fundamental, a realidade física pode ser um certo tipo de automatismo celular,constituído por bits que interagem entre si, obedecendo a regras simples de funcionamento. E váriosFísicos têm investigado a possibilidade das leis naturais poderem ser formuladascomputacionalmente, ou de poderem ser vistas como uma consequência de certos princípioscomputacionais.

Podemos ficar preocupados com a ideia de que puros bits não sejam afinal o nível mais fundamentalda realidade: um bit é apenas um 0 ou um 1, e a realidade não pode ser feita de zeros e uns. Outalvez um bit seja apenas a "diferença pura" entre dois estados fundamentais, e assim não possa

haver uma realidade feita de diferenças puras. Inversamente, talvez os bits até tenham que ter a suaorigem em estados ainda mais básicos, tais como as voltagens num computador normal.

 Não sei se estas objecções são correctas. Penso que não está completamente fora de questão que possa haver um universo constituído por "bits puros". Mas isso não interessa para o nosso objectivo presente. Podemos até supor que o nível computacional é constituído por um nível ainda maisfundamental, a partir do qual os processos computacionais são implementados. O que interessa éque os processos microfísicos sejam constituídos por processos computacionais, e que estes sejamconstituídos por processos ainda mais fundamentais. Daqui para a frente vou considerar que isto é oque a Hipótese Computacional afirma.

 Não sei se a hipótese computacional está correcta. Mas, mais uma vez, também não sei se é falsa. Ahipótese é coerente, na medida em que é especulativa, e não pode conclusivamente excluída.

A Hipótese computacional não é uma hipótese céptica. Se é verdadeira, ainda há electrões e protões.Desta perspectiva, os electrões e os protões seriam análogos às moléculas: são constituídas por algomais elementar, mas ainda assim existem. Igualmente, mesmo que a Hipótese Computacional sejaverdadeira, continuarão a existir mesas e cadeiras, e a realidade macroscópica continua a ser umfacto; apenas acontece que a sua constituição fundamental é um pouco diferente daquela queestamos habituados a pensar.

Esta situação é a análoga à da Mecânica Quântica ou à da Teoria da Relatividade. Estas teorias podem levar-nos a rever algumas das crenças metafísicas que temos a propósito do mundo exterior; por exemplo, que o mundo é constituído por partículas clássicas ou que o tempo é absoluto. Mas amaior parte das nossas crenças habituais sobre o mundo mantém-se. Da mesma maneira, a nossaaceitação da Hipótese Computacional pode levar-nos a rever algumas das nossas crençasmetafísicas; por exemplo, que os electrões e os protões são partículas fundamentais. Mas, aindaassim, uma grande parte das nossas crenças habituais não é afectada.(3) A Hipótese Mente-Corpo

A Hipótese Mente-Corpo

Esta Hipótese afirma: A minha mente é (e sempre foi) constituída por processos que estão fora doespaço-tempo físico. A minha mente recebe inputs de, e envia os seus outputs para, processos noespaço-tempo físico.

Page 6: A Matrix enquanto hipótese metafísica

8/6/2019 A Matrix enquanto hipótese metafísica

http://slidepdf.com/reader/full/a-matrix-enquanto-hipotese-metafisica 6/9

A Hipótese Mente-Corpo é também bastante conhecida, e largamente aceite. Descartes acreditavaem algo do género: da sua perspectiva, as mentes são coisas não físicas que interagem com osnossos corpos, que são coisas físicas. A Hipótese é menos aceite actualmente do que no tempo deDescartes, mas ainda assim há muitas pessoas que a aceitam.

Independentemente da Hipótese Mente-Corpo ser verdadeira ou não, ela é certamente coerente. Eapesar de a ciência contemporânea sugerir tendencialmente que a Hipótese é falsa, ainda assim não podemos exclui-la conclusivamente.

A Hipótese Mente-Corpo não é uma hipótese céptica. Mesmo que a minha mente esteja fora doespaço-tempo físico, eu continuo a ter um corpo, eu ainda estou em Tucson, e por aí adiante. Nomáximo, a aceitação desta hipótese iria obrigar-nos a rever algumas das nossas crenças metafísicassobre as nossas mentes. As nossas crenças habituais sobre a realidade exterior permanecem emgrande medida intactas.(4) A Hipótese Metafísica

A Hipótese Metafísica

Podemos agora juntar estas hipóteses. Primeiro podemos considerar a Hipótese Combinatória, quecombina as três hipóteses. Essa hipótese diz-nos que o espaço-tempo físico e o seu conteúdo foramcriados por seres que estão fora desse espaço-tempo; diz-nos também que os processos microfísicossão constituídos por processos computacionais, e que as nossas mentes estão fora do espaço-tempomas que interagem com ele.

Tal como no caso das hipóteses tomadas individualmente, a Hipótese Combinatória é coerente, enão pode ser conclusivamente excluída. E também tal como nos casos individuais, a HipóteseCombinatória não é uma hipótese céptica. A aceitação da hipótese poderia levar-nos a rever algumas das nossas crenças, mas deixaria quase todas intactas.

Por fim podemos considerar a Hipótese Metafísica (com um "M" maiúsculo). Tal como a hipótesecombinatória, esta hipótese combina Hipótese da Criação, a Hipótese computacional e a HipóteseMente-Corpo. A hipótese acrescenta também a seguinte tese específica: os processoscomputacionais que constituem o espaço-tempo físico foram gerados pelos criadores com afinalidade de estabelecer uma simulação de um mundo.

(Pode também ser útil pensar na Hipótese Metafísica enquanto hipótese que afirma que os processoscomputacionais que constituem o espaço-tempo fazem parte de um domínio mais alargado, e que os

criadores e o meu sistema cognitivo estão situados nesse domínio. Esta condição não é estritamentenecessária para o que se segue, mas identifica-se melhor com a forma mais comum de pensar aHipótese matrix.)

A Hipótese Metafísica é uma versão um pouco mais específica da Hipótese Combinatória namedida em que especifica algumas relações entre as várias partes desta. Novamente, a HipóteseMetafísica é uma hipótese coerente, e não podemos exclui-la conclusivamente. E novamente, não éuma hipótese céptica. Mesmo que a aceitemos, a maioria das nossas crenças habituais sobre omundo exterior ficarão intactas.4. A Hipótese matrix enquanto Hipótese Metafísica

Recorde-se o que a Hipótese matrix diz: eu tenho (e sempre tive) um sistema cognitivo que recebeinputs de, e envia os seus outputs para, uma simulação de um mundo artificialmente gerada.

Page 7: A Matrix enquanto hipótese metafísica

8/6/2019 A Matrix enquanto hipótese metafísica

http://slidepdf.com/reader/full/a-matrix-enquanto-hipotese-metafisica 7/9

Vou agora argumentar que a Hipótese Metafísica é equivalente à Hipótese Metafísica no seguintesentido: se eu aceito a Hipótese Metafísica, então deveria também aceitar a Hipótese matrix; e seaceito a segunda, deveria também aceitar a primeira. Ou seja, as duas hipóteses implicam-semutuamente, o que significa que se aceito uma delas tenho também que aceitar a outra.

Comecemos pela primeira direcção, que vai da Hipótese Metafísica para a Hipótese matrix. A

Hipótese Mente-Corpo implica que tenho (e sempre tive) um sistema cognitivo isolado que recebeos seus inputs de, e envia os seus outputs para, processos no espaço-tempo físico. Conjuntamentecom a Hipótese Computacional, isto implica que o meu sistema cognitivo recebe os seus inputs de,e envia os seus outputs para, processos computacionais que constituem o espaço-tempo físico. AHipótese da Criação (juntamente com as restantes hipóteses metafísicas) implica que esses

 processos foram artificialmente gerados para simular um mundo. Segue-se que tenho (e sempretive) um sistema cognitivo isolado que recebe os seus inputs de, e envia os seus outputs para, umasimulação computacional do mundo artificialmente gerada. Portanto a Hipótese Metafísica implicaa Hipótese matrix.

A outra direcção está associada de perto com esta. Pondo as coisas informalmente: se aceito a

hipótese matrix, então eu também aceito que o que subjaz à realidade tal como nos aparece ésomente aquilo que a Hipótese Metafísica determina. Há um domínio que contém o meu sistemacognitivo, que interage causalmente com uma simulação computacional do espaço-tempo, que por sua vez foi criada por outros seres que estão nesse domínio. É apenas isto que é necessário para quea Hipótese Metafísica alcance os seus propósitos. Se aceitamos isto, então também temos deeveríamos aceitar a Hipótese da Criação, a Hipótese Computacional e a Hipótese Mente-Corpo,

 bem como as importantes relações que existem entre elas.

Isto pode tornar-se mais claro usando uma imagem. Eis a configuração do mundo segundo aHipótese matrix:

A Hipótese Matrix

Ao nível mais fundamental esta imagem da configuração do mundo é exactamente a mesma que aimagem da Hipótese Metafísica colocada acima. Assim, se aceitamos que o mundo é como aHipótese matrix afirma, então temos de aceitar também que o mundo é como a Hipótese Metafísicaafirma.

Poderíamos colocar algumas objecções. Por exemplo, poderíamos objectar que a Hipótese matriximplica que exista uma simulação computorizada dos processos físicos, mas que (ao contrário daHipótese Metafísica) não implica que os próprios processos físicos existam. Irei discutir esta

objecção na secção 6, e outras objecções na secção 7. Por agora pressuponho que há boas razões para considerar que a Hipótese matrix implica a Hipótese Metafísica, e vice-versa.5. A vida na matrix

Se isto está correcto, segue-se que a Hipótese matrix não é uma hipótese céptica. Se eu aceito isto,eu não devo inferir que o mundo exterior não existe, ou que não tenho um corpo, ou que não hámesas nem cadeiras, ou ainda que não estou em Tucson. Pelo contrário, deveria inferir que o mundofísico é constituído por computações que estão na base do nível microfísico. Ainda há mesas,cadeiras e corpos: estes são fundamentalmente constituídos por bits, e do que quer que seja queconstitui estes bits. Este mundo foi criado por outros seres, mas ainda assim é perfeitamente real. Aminha mente está separada dos processos físicos, e interage com eles. A minha mente pode não ter 

sido criada por esses seres, e pode até não ser feita de bits, mas ainda assim interage com esses bits.

Page 8: A Matrix enquanto hipótese metafísica

8/6/2019 A Matrix enquanto hipótese metafísica

http://slidepdf.com/reader/full/a-matrix-enquanto-hipotese-metafisica 8/9

O resultado disto é um quadro complexo da natureza fundamental da realidade. O quadro é, talvez,estranho e surpreendente; mas é um quadro de um mundo exterior de carne e osso. Se estamosnuma matrix, esta é simplesmente a forma de ser do mundo.

Podemos pensar na Hipótese matrix como um Mito Criacionista da Era Informática. Se isto estácorrecto, então o mundo físico não foi necessariamente criado por deuses. Sustentando o mundo

físico está uma computação imensa, e os criadores criaram o mundo pela implementação dessacomputação. As nossas mentes estão situadas no exterior desta estrutura física, e têm uma naturezaindependente que interage com essa estrutura.

Muitos dos problemas que se levantaram com os mitos criacionistas canónicos colocam-se tambémneste caso. Quando foi o mundo criado? Estritamente falando, o mundo não foi de forma nenhumacriado no interior do nosso tempo. Quando começou a história? Os criadores podem ter iniciado asimulação em 4004 AC (ou em 1999) com o registo fóssil completo, mas teria sido muito mais fácil

 para eles terem iniciado a simulação com o Big Bang e deixarem as coisas correr normalmentedesde esse momento.

(Claro que no filme matrix os criadores são máquinas. Este facto baralha as leituras teológicashabituais sobre o filme. É por vezes defendido que Neo desempenha no filme a figura de Cristo, queMorpheus é [o profeta] João Batista, e que Cypher é Judas Iscariote etc. Mas segundo a leitura quefiz do filme, os deuses da matrix são máquinas. Quem, então, nesta perspectiva, seria a figura deCristo? Claro que só poderia ser o agente Smith! De facto, no primeiro filme, ele é o descendentedos deuses enviado para o mundo para o salvar daqueles que querem destrui-lo. E, no segundofilme, ele até é ressuscitado.)

Muitos dos problemas que se levantaram com a hipótese mente-corpo canónica colocam-se tambémneste caso. Quando é que a nossa mente não-física começa a existir? Isso depende de quando osnovos sistemas cognitivos incubados são inseridos na simulação (talvez no momento da concepçãoda matrix, ou talvez no momento do nascimento). Há vida após a morte? Isso depende do queacontece aos sistemas incubados depois da morte dos seus corpos. Como é que corpo e menteinteragem? Por intermédio de ligações causais que estão fora do espaço-tempo físico.

Mesmo que não estejamos numa matrix, podemos expandir esta linha de raciocínio a outros seresque estejam numa matrix. Se eles descobrirem a sua situação, e venham a aceitar que estão numamatrix, não devem rejeitar as suas crenças habituais sobre o mundo exterior. No máximo, deveriamrever as suas crenças acerca da natureza fundamental do seu mundo: viriam a aceitar que osobjectos exteriores seriam constituídos por bits, e por aí adiante. Estes seres não são massivamenteenganados: a maioria das suas crenças habituais sobre o mundo está correcta.

Temos de fazer aqui algumas especificações. Podemos ficar preocupados com as crenças sobre asmentes de outras pessoas. Acredito que os meus amigos têm consciência [de si]. Se estou numamatrix, estará isto correcto? No caso da matrix exposta no filme, essas crenças são na sua maioria

 boas. Esta é uma matrix multi-cuba: por cada amigo que percepciono, há um ser incubado narealidade externa, que provavelmente está tão consciente quanto eu. As excepções podem ser serescomo o agente Smith, que não estão incubados, mas são inteiramente computacionais. Esses seressó têm consciência se a computação for suficiente para lhes gerar consciência. Vou manter-meneutro nesta questão específica. Poderíamos rodeá-la desde que se formulasse uma Hipótese matrixque exigisse que todos os seres estivessem incubados. Mas mesmo que não façamos esta exigência,não ficamos muito pior do que o que temos no nosso mundo, onde há um permanente questionar 

sobre se outros seres têm ou não consciência, independentemente de estarmos ou não numa matrix.

Page 9: A Matrix enquanto hipótese metafísica

8/6/2019 A Matrix enquanto hipótese metafísica

http://slidepdf.com/reader/full/a-matrix-enquanto-hipotese-metafisica 9/9

Podemos também preocupar-nos com as crenças sobre o passado distante, bem como sobre o futurolongínquo. Estas não serão ameaçadas desde que a simulação computacional cubra todo o espaço-tempo, desde o Big Bang até ao fim do universo. Isto faz parte da Hipótese Metafísica, e podemosestipular que faz também parte da Hipótese matrix, exigindo que a simulação computacional sejauma simulação de um mundo completo. Pode haver outras simulações que começaram num passadorecente (talvez a matrix do filme seja um destes casos), e pode haver outras que só duram por pouco

tempo. Nestes casos, os seres incubados terão crenças falsas sobre o passado e/ou sobre o futuro dosseus mundos. Mas desde que a simulação cumpra a duração de vida destes seres, é plausível queeles tenham quase todas as suas crenças correctas sobre o estado actual do ambiente onde estão.

Pode haver alguns aspectos sobre os quais os seres que estão numa matrix podem ser enganados.Pode acontecer que os criadores da matrix controlem e interfiram com muito do que acontece nessemundo simulado. (A matrix do filme parece um desses casos, embora não fique bem esclarecidaqual a extensão do controlo dos criadores.) Se é assim, então esses seres podem ter afinal muitomenos controlo sobre o que acontece do que pensam que têm. Mas o mesmo vale para o caso dehaver um deus que interfere num mundo não-matrix. E a Hipótese matrix não implica que oscriadores interfiram no mundo, embora a hipótese em si deixe a possibilidade em aberto. No pior 

cenário, a Hipótese matrix não é mais céptica a esse respeito que a Hipótese da Criação num mundonão-matrix.

Os habitantes de uma matrix também podem ser enganados por serem levados a pensar que a suarealidade é muito mais vasta do que realmente é. Podem pensar que tudo o que existe é o universofísico, quando, de facto, há muito mais no mundo, incluindo seres e objectos que nunca poderãover. Mas, mais uma vez, este tipo de preocupação pode também levantar-se no caso de um mundonão-matrix. Por exemplo, alguns cosmólogos sustentam a ideia de que o nosso universo pode ter asua "origem" num buraco negro situado no "universo mais próximo acima do nosso", bem comoque, na realidade, pode haver uma ramificação de vários universos interligados. Se for verdade,então o mundo é muito maior do que pensamos, e pode haver seres e objectos que nunca poderemosver. Mas, em qualquer dos casos, o mundo que vemos é perfeitamente real. De salientar quenenhuma destas fontes de cepticismo — sobre as mentes dos outros, sobre o passado e o futuro,sobre o nosso controlo sobre o mundo, e sobre o tamanho do mundo — lança dúvidas sobre a nossacrença da realidade do mundo ser aquela que percepcionamos. Nenhuma delas nos leva a duvidar daexistência de objectos exteriores como mesas ou cadeiras, no sentido em que a hipótese doincubamento é suposto fazer. Nenhuma destas preocupações está particularmente agregada aocenário matrix. Podemos levantar dúvidas sobre se outras mentes existem, sobre se o passado e ofuturo existem, e sobre se temos controlo sobre os nossos mundos independentemente de estarmosou não numa matrix. Se isto está correcto, então a Hipótese matrix não levanta as habituais questõescépticas que frequentemente se diz que levanta.

Sugeri que não está fora de questão estarmos realmente numa matrix. Poderíamos até ter pensadoque esta era uma conclusão preocupante. Mas, se estou correcto, não é uma conclusão tão

 preocupante como poderíamos pensar. Mesmo que estejamos nessa matrix, o mundo não deixa por isso de ser tão real como pensamos que é. É apenas um mundo com uma natureza fundamentalsurpreendente.

David J. ChalmersBibliografia