a inclusão de educando com síndrome de down como inédito...

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MÁRCIA DE FÁTIMA BARBOSA CORRÊA A Inclusão de Educando com Síndrome de Down como Inédito Viável nas Escolas de Cacoal-RO Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso, para obtenção do título de Mestre em Educação, na área de concentração Educação, Cultura e Sociedade. Orientadora Profa. Dra Maria da Anunciação Pinheiro Barros Neta CUIABÁ-MT 2009

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MÁRCIA DE FÁTIMA BARBOSA CORRÊA

A Inclusão de Educando com Síndrome de Down como Inédito Viável nas Escolas de Cacoal-RO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Mato Grosso, para obtenção do título de Mestre em Educação, na área de concentração Educação, Cultura e Sociedade.

Orientadora Profa. Dra Maria da Anunciação Pinheiro Barros Neta

CUIABÁ-MT 2009

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DEDICATÓRIA

A Deus, meu grande pai, que me permitiu

a empreitada em mais uma jornada.

Aos meus pais, Maria Aracy Morais Barbosa e

Anízio Pereira Barbosa Neto, que me lançaram

à vida e me deram a base para seguir adiante.

À Raíssa Caroline Barbosa Corrêa e Mylena

Gabriela Barbosa Corrêa, minhas filhas amadas,

que desde os primeiros instantes das suas vidas me destinam amor, carinho, atenção e apoio.

Ao meu grande amor e companheiro, Edailson de

Alcântara Corrêa, que sempre acreditou em mim

(algumas vezes mais que eu), que muito me auxiliou, deu-me atenção e apoio e que fez com que este trabalho fosse concluído.

Aos meus irmãos Anilton Morais Barbosa e

Leide Daiana Morais Barbosa pelo incentivo. À

minha cunhada Rosemar Maria Corrêa e as

minhas queridas sobrinhas: Beatriz Antonia

Corrêa Marques, Julia Vitória Corrêa Barbosa e

Lívia Catarina Barbosa Mantel pelo carinho

dedicado.

À minha tia Alice Elizabete Arruda Morais que

sempre me incentivou e apoiou na minha vida

escolar e à minha Avó Marciana Francisca de

Arruda Morais que sempre se lembrou de mim

nas suas orações.

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AGRADECIMENTO

Agradeço a todos aqueles, familiares, amigos e professores que contribuíram

de alguma forma para a minha formação, para o desenvolvimento e conclusão deste

trabalho, seja com um sorriso, com um ensinamento, com uma palavra de incentivo,

com a paciência em ouvir minhas angústias e em ler o meu trabalho, com um elogio,

enfim, com algum gesto de carinho. Agradeço de modo especial:

À Professora Doutora Maria da Anunciação Pinheiro Barros Neta pela

compreensão e carinho com que me orientou neste trabalho.

Ao Professor Doutor Luiz Augusto Passos pelo incentivo e apoio.

Ao Professor Doutor Miguel Claudio Moriel Chacon e a Professora Doutora

Sumaya Persona de Carvalho pela grandiosa contribuição.

Às amigas Marta Margarete Bandurka, Jane Aparecida Guimarães, Silvia

Maria Sterring, Fabíola Ruzzante, Janaira Alves de Santana, Marilia Duarte, Edna

Provenzano de Souza pelo apoio e incentivo.

Às colegas de Mestrado Tereza Leones, Graciete Teixeira, Eunice Zandona,

Miriam Botelho, Luci Oliveira, Francisca Teixeira, Edenar pela carinhosa

hospitalidade e pela amizade dispensada.

Aos gestores, funcionários, professores, educandos, mães participantes da

pesquisa, pela atenção dispensada nas entrevistas de pesquisa de campo, de

maneira especial aos educandos com Síndrome de Down.

À equipe da Secretaria de Pós Graduação da UFMT, na pessoa de Mariana e

Luiza.

Enfim, agradeço a todos que estiveram presentes nesse processo de

capacitação profissional e pessoal.

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“A arte da conquista é conquistar as pessoas como elas são, e não querer mudá-las para nos conquistar”

Aline Davila

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RESUMO

O presente trabalho é resultado da Pesquisa em Movimentos Sociais, Política e Educação Popular da Universidade Federal de Mato Grosso. A pesquisa foi realizada em três escolas regulares do município de Cacoal-RO, sendo: uma estadual, uma municipal e uma particular. Realizou-se um estudo qualitativo com abordagem fenomenológica e, a partir das noções de Inclusão, Síndrome de Down e Inédito viável, construiu-se o caminho metodológico, objetivando compreender o processo de inclusão de educandos com Síndrome de Down, com idade, entre 10 e 12 anos, matriculados nos 2º, 3º e 5º ano do Ensino Fundamental em instituições escolares de ensino regular, bem como apontar o inédito viável de Paulo Freire, como uma perspectiva de concretização do sonho possível, a inclusão escolar, a partir das vozes dos participantes da pesquisa: professores, mães e colegas desses educandos. Os resultados obtidos revelaram que há no depoimento das professoras certo desânimo, quando o assunto é a inclusão. Observamos que, de maneira geral, as mesmas entendem a inclusão escolar como uma adaptação arquitetônica, como um processo à parte. Nos depoimentos, constatou-se que as professoras ainda não se vêem capazes de incentivar a mudança de consciência, como agentes transformadores que são. Com atitudes políticas de inclusão, as dificuldades do seu trabalho seriam mais facilmente resolvidas: os limites ultrapassados e os desafios, vencidos. Um outro dado revelado é o destaque que as mães dão ao o papel da escola na vida de seus filhos, em termos de escolarização, instrumentalização e a esperança que têm no desenvolvimento de seus filhos como expectativas futuras. Os depoimentos das mães vêm carregados de preocupações, de dor e de conformação frente ao que pode acontecer com seus filhos, mesmo assim, mostram-se esperançosas frente à garantia do direito de inclusão de seus filhos na escola comum, apesar de saberem que na escola pública o excessivo número de alunos em sala de aula pode comprometer a qualidade do ensino aprendizagem. Evidenciou-se através das observações e posterior registro em notas de campo, que as práticas de interações no cotidiano dos educandos com Síndrome de Down e seus colegas pesquisados são comuns, embora com características particulares. Nos relatos dos colegas dos educandos com Síndrome de Down, pode-se perceber como efeito positivo da inclusão a convivência respeito e valorização do coleguismo em sala de aula. E, negativas são as reações inoportunas que ora seus colegas demonstram para com a turma. Nesses depoimentos, há demonstração de respeito, carinho e o compartilhamento de brigas e afirmação de amizade, o que são comuns à idade. Diante dos dados apresentados, podemos interpretar que a relevância deste estudo está pautada na construção do conhecimento sobre a compreensão do sentido do processo de inclusão de educandos com Síndrome de Down, constituindo-se uma necessidade científica e social, uma vez que oferece subsídios para a caracterização e aperfeiçoamento de processos de inclusão escolar a partir do inédito-viável. A pesquisa mostra que há uma política com proposta inclusiva no Brasil que, embora deficiente, busca orientar o processo de inclusão. E, mesmo que não se constitua o ideal, o inédito viável, com a inclusão como práxis, pode constituir-se um sonho possível.

Palavras-chave: Inclusão. Síndrome de Down. Inédito viável

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ABSTRACT

This work is the result of the Social Movements Research, Politics and Popular Education in the Federal University of Mato Grosso. The research took place in three regular schools in the municipality of Cacoal-RO, one of which was a state, another municipal and besides a private one. It was realized a qualitative study of phenomenological approach, and from the concepts of inclusion, Down‟s Syndrome and Original-viable, built up the methodological path trying to understand the process of inclusion of children with Down's Syndrome, from 10 - 12 years of age, enrolled in second, third and fifth year of elementary school students in educational institutions, as well as the unique original viable by Paulo Freire, in the prospect of realizing the possible dream, including schools, from the voices of the research participants: teachers, mothers of students and colleagues. The results showed that there is evidence of teachers presenting some discouragement, when the subject relates to inclusion. We observed that, in general, they understand the school inclusion as an architectural adaptation as a process apart. In testimony, it was found that the teachers are not yet able to encourage a change in consciousness, as agents are processors. With political attitudes of inclusion, the difficulties of their work would be more easily resolved: the limits and overcome the challenges, overcome. Another highlight is the data revealed that mothers give to the role of schools in the lives of their children in terms of education, instrumentation and hope they have in the development of their children as future expectations. The testimony of the mothers are full of concerns, from pain and conformation opposite to what may happen to their children still show a hope against the guarantee of the right to include their children in school policy, although aware that the school public the excessive number of students in the classroom can compromise the quality of teaching learning. It was evidenced through observations and subsequent record in field notes, that the practices of the daily interactions of students with Down‟s Syndrome and his colleagues surveyed are common, but with particular characteristics. In reports from colleagues of learners with Down‟s Syndrome, you can see how positive effect of inclusion the coexistence of comradeship, and recovery in the classroom. And negative reactions are inappropriate to their colleagues now demonstrate to the class. In these statements, there is demonstration of respect, affection and sharing of fights and affirmation of friendship, which are common with age. Considering the data presented, we can interpret the relevance of this study is based on building knowledge of understanding the meaning of the inclusion of students with Down‟s Syndrome, has become a necessity and social science, since it provides subsidies for characterization and improvement of processes of inclusion from unpublished original-viable. The research shows that there is a policy with inclusive proposal in Brazil that, although weak, guide the search process of inclusion. And even that is not the ideal, the unique feasible, including as praxis, it can be a dream possible. . Keywords: Inclusion. Down's Syndrome. Original viable.

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SUMÁRIO

Introdução............................................................................................................ 12

Capítulo I.............................................................................................................. 16

Do que Estamos Falando? Considerações sobre a História da Deficiência e a

Síndrome de Down................................................................................................

16

As Bases Legais que Norteiam a Inclusão................................................. 32

Capítulo II............................................................................................................. 35

O Inédito Viável em Paulo Freire.......................................................................... 35

Capítulo III............................................................................................................ 43

História da Pesquisa............................................................................................. 43

Metodologia............................................................................................... 45

As escolas ponto de chegada.................................................................... 53

Escola Estadual.............................................................................. 53

Escola Municipal............................................................................. 54

Escola Particular............................................................................. 54

Capítulo IV............................................................................................................ 56

Limites e Desafios do Processo de Inclusão de Educandos com Síndrome de

Down nas Escolas de Cacoal-RO.........................................................................

56

Considerações Finais para o Momento............................................................ 87

Referências Bibliográficas................................................................................. 91

Anexos................................................................................................................. 98

Anexo 1 – Questionário (Perfil censitário) – professoras.................. 99

Anexo 2 - Questionário (Perfil censitário) – mães............................. 100

Anexo 3 – Roteiro de Entrevista com professoras............................ 101

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Anexo 4 – Roteiro de Entrevista com mãe se colegas...................... 102

Apêndices............................................................................................................. 103

Apêndice 1......................................................................................... 104

Apêndice 2.......................................................................................... 106

Apêndice 3.......................................................................................... 109

Apêndice 4.......................................................................................... 111

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ÍNDICE DE QUADROS

Quadro 1 – Destaque de algumas características descritas para os portadores

da Síndrome de Down..........................................................................................

23

Quadro 2 – Definição mais comumente empregada pela Associação

Americana de Deficiência Mental (AAMD)...........................................................

27

Quadro 3 – Descrição do Perfil Censitário das professoras participantes da

pesquisa................................................................................................................

50

Quadro 4 – Descrição do Perfil Censitário das mães participantes da pesquisa 51

Quadro 5 – Descrição do Perfil Censitário dos colegas dos educandos com

Síndrome de Down...............................................................................................

52

Quadro 6 – Descrição dos educandos com Síndrome de Down, matriculados

na sala regular das professoras participantes da pesquisa..................................

53

ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1 – Atividade realizada por Gabriela em sala de aula............................... 84

Figura 2 – Atividade do educando Heros, com ajuda.......................................... 85

Figura 3 – Atividade desenvolvida em sala de aula por Felipe............................ 85

Figura 4 – Atividades de Marina, desenvolvidas em apostila diferenciada........ 86

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LISTA DE SIGLAS E SEUS RESPECTIVOS SIGNIFICADOS

AAMD – Associação Americana de Deficiência Mental

APAE – Associação de Pais e Amigos do Excepcional

CERNIC – Centro de Reabilitação Neurológica Infantil de Cacoal

CF – Constituição Federal

IBC – Instituto Benjamin Constant

INES – Instituto Nacional de Educação de Surdos

LDB – Lei de Diretrizes e Bases da Educação

MEC – Ministério da Educação e Cultura

OMS – Organização Mundial de Saúde

SD – Síndrome de Down

SEESP – Secretaria de Educação Especial

SEDUC – Secretaria do Estado de Educação e Cultura

RO - Rondônia

UFMT – Universidade Federal de Mato Grosso

UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação Ciência e Cultura

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INTRODUÇÃO

É amplo o debate em torno da inclusão, desafio para a educação

contemporânea que se lança dia após dia na prática pedagógica dos educadores.

A Síndrome de Down emerge de um contexto histórico. A sociedade

considerava as pessoas com Síndrome de Down diferentes do padrão de

normalidade, as quais eram excluídas e tipificadas por termos que Sassaki (2002)

considera incorretos, tais como: mongol e mongolóide. Segundo o autor, estes

termos refletem o preconceito racial da comunidade científica do século XIX e as

terminologias enfatizam preconceitos, estigmas e estereótipos.

Contudo, a Síndrome de Down tem sido assunto referendado em matérias

jornalísticas, propagandas, filmes e novelas televisivas, o que demonstra que o

assunto tem sido motivo para discussões no meio social. Não distante, a inclusão

escolar de educandos com Síndrome de Down tem suscitado questionamentos prós

e contras sobre o processo desde os anos 90, bem como a busca pela capacitação

dos professores para praticá-la.

De acordo com o referencial teórico sobre Síndrome de Down, as diferenças

fenotípicas e genotípicas são comuns à síndrome, o que difere particularmente a

pessoa com Síndrome de Down das demais.

Diante da visível diferença e a partir de experiências e observações, a

Síndrome de Down toca educadores de forma muito especial e motiva a busca de

condições teórico-prático-vivenciais para colaborar de forma científica, abrindo

caminhos no intuito de alcançar uma prática que torne mais feliz a inclusão do

educando com Síndrome de Down no contexto escolar de Cacoal.

Nesse sentido, compreender o processo de inclusão de educandos com

Síndrome de Down em instituições escolares de Cacoal-RO, base na prática

inclusiva freireana desenvolvida e no inédito viável, soma-se o desejo, para o

pesquisador e educador de “construir e vivenciar uma sociedade mais justa e

igualitária, na busca de uma cultura de paz”, em consonância com as concepções de

Boff (2006).

Os referenciais teóricos sobre inclusão Síndrome de Down e inédito viável

para interpretar a inclusão do educando com esta característica, propostos por Paulo

Freire, deve-se à crença na utopia de que um mundo melhor é possível, onde todos

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possam tornar-se participantes. Dessa forma, a realidade não está acabada e os

processos são construídos numa sociedade capitalista que promove a exclusão, em

favor de um processo educacional, edificados pelos setores subalternos ou

oprimidos no atual modelo social.

O inédito viável pode transformar as práticas educativas em práticas

significativas, capazes de incluir os aspectos necessários ao processo de quebra de

paradigma e, em consequência, com as formas opressivas que imobilizam desejos,

sonhos e possibilidades. Nessa linha de pensamento, os movimentos sociais, nem

sempre bem estruturados, surgem como consequência de ações não planejadas

que interferem no exercício educativo de integração coletiva. Por ser a inclusão uma

das características marcantes dos movimentos sociais, busca-se evidenciar os

traços identitários desse paradigma educativo que se refere ao respeito, dignidade,

direito e esperança para o enfrentamento dos problemas dos educandos com

Síndrome de Down,

Vários foram os questionamentos sobrevindos da relação Síndrome de Down

– prática educacional - novos caminhos, até a formação de uma interrogativa que

norteasse este trabalho: Como acontece a inclusão escolar de educandos com

Síndrome de Down em escola regular?

Buscando compreender os diferentes processos de inclusão que ora

vivenciava, fiz um curso de especialização em Educação Especial e Infantil, no qual

houve o contato com um melhor embasamento teórico estruturados por filmes, livros,

artigos, bem como a troca de experiências com colegas e professores sobre os

diferentes processos de inclusão e em especial com os educandos com Síndrome

de Down. Naquele contexto, aguçou-me a curiosidade em conhecer instituições que

atendessem pessoas com deficiência. Foi então que me inscrevi em um curso na

Associação de Pais e Amigos do Excepcional - APAE, instituição especializada no

atendimento a crianças, jovens e adultos com diferentes deficiências. Nessa

experiência de capacitação, identifiquei-me com as pessoas com Síndrome de Down

que, a meu ver, apresentavam características peculiares como a capacidade de

socialização e de desenvolvimento escolar.

Frente a essa experiência, busquei respostas a alguns questionamentos que

me inquietavam e que pudessem responder se tal processo realmente era possível,

pois, diante de minha preocupação enquanto educadora, somada à de muitos

colegas também direcionados para a busca de uma prática inclusiva que visasse em

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especial a qualidade de vida do educando com Síndrome de Down, toda essa

preocupação levou-me a uma varredura bibliográfica que me apontasse um suporte

teórico para maior compreensão sobre como fazer a inclusão na escola e, mais

além, como ajudar a que ela se efetive.

O problema investigado possui incursões teóricas, dentre as quais autores

como Freire (1994a, 2003b), Boff (2006), Mantoan (2003), Sassaki (1997), Mazzotta

(1995), Voivodic (2008), Kirk & Gallagher (1996), Edler Carvalho (2004), Mendes

(1995), Pessotti (1984), entre outros.

Frente à fundamentação teórica e à problematização, esta pesquisa tem

como objetivo principal compreender o processo de inclusão de educando com

Síndrome de Down em instituições escolares de Cacoal-RO. Para tanto, foi

necessário identificar aspectos que apontassem os limites e desafios do processo de

inclusão. E, nesse rumo, refletíamos sobre as situações-limite vividas pelo professor

sem a devida formação; sobre o quanto ele tinha que desenvolver em si mesmo o

afeto pelo educando diferente; sobre qual seria a saída teórico-metodológica; sobre

qual seria a saída política.

Longe de estar equacionado, o problema da inclusão no Brasil exige-se

grandes discussões, afinal, o cidadão comum precisa ser incluído com dificuldades

ou não, com deficiência ou não.

Dentre as teorias que defendem a inclusão escolar a todos os educandos sem

exceção, às salas de aula do ensino regular, Paulo Reglus Neves Freire aponta

sobre a possibilidade do processo de inclusão como “inédito viável”, demonstra a

“crença no sonho possível”.

No contexto freireano, o processo de inclusão foi estudado de forma

sistemática e está aqui em uma reflexão dividida em quatro capítulos, dentre os

quais, no primeiro momento, há um apanhado sobre o que é a Síndrome de Down e

como é vista politicamente no Brasil. No segundo capítulo, o referencial teórico do

inédito viável é apresentado. No terceiro capítulo, todo o percurso da metodologia da

pesquisa está descrito, assim como o detalhamento do objeto, inclusão de

educandos com Síndrome de Down. No quarto capítulo, os dados são interpretados

no confronto entre perguntas/respostas das fontes primárias, confrontando-as com

as observações e discussões associadas à base teórica. A investigação foi

desenvolvida por meio de pesquisa fenomenológica e qualitativa. Por se tratar de

uma pesquisa inserida no contexto educacional, foi necessário focar e observar a

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dinâmica interna das situações, atravessar as dificuldades do olhar exterior para

sentir a realidade. E, por fim, uma breve consideração sobre a pesquisa.

A pesquisa mostra que há uma política com proposta inclusiva no Brasil que,

embora deficiente, busca orientar o processo de inclusão. E, mesmo que não se

constitua o ideal, o inédito viável, com a inclusão como práxis, pode constituir-se um

sonho possível.

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CAPÍTULO I

DO QUE ESTAMOS FALANDO?

CONSIDERAÇÕES SOBRE A HISTÓRIA DA DEFICIÊNCIA E DA SÍNDROME DE

DOWN

A palavra deficiência1 origina-se do latim deficientia que significa falta, falha,

carência, imperfeição, defeito, insuficiência. A partir dessa conceituação, pode-se

dizer que a deficiência é algo perceptível, diferente do visto normalmente. É o “outro”

percebido, porque a deficiência, como diz Amaral (1995:112):

[...] jamais passa em „brancas nuvens‟, muito pelo contrário: ameaça, desorganiza, mobiliza. Representa aquilo que foge ao esperado, ao simétrico, ao belo, ao eficiente, ao perfeito... e, assim, como quase tudo que se refere à diferença, provoca a hegemonia do emocional.

Este capítulo traz contribuições de autores como: Sassaki (2005), Mantoan

(2001), Saad (2003), Mazzotta (2005), Voivodic (2004), Schwartzman (1999), Edler

Carvalho (2004), entre outros, para a melhor compreensão do significado de

deficiência e da Síndrome de Down, isto é, seus principais pontos de observação

que representam princípios norteadores para um estudo mais aprofundado.

Kirk e Gallagher (1996) descrevem brilhantemente a história do tratamento

dispensado às pessoas com deficiência, relatando nomenclaturas diferenciadas para

nomear a pessoa com deficiência em cada época da história, o que configura

mudanças e evolução nos conceitos e, até mesmo, na forma de tratamento

destinado às mesmas.

Nesse contexto, os autores apontam progresso, embora lentamente, desde à

época espartana, quando se matavam os bebês deficientes e deformados. Segundo

os mesmos autores, historicamente podem ser reconhecidos quatro estádios de

desenvolvimento das atitudes em relação a essas pessoas, são eles:

Primeiramente, na era pré-cristã, tendia-se a negligenciar e a maltratar os deficientes. Num segundo estádio, com a difusão do cristianismo, passou-se

1 Refere-se a alguns dos significados da palavra deficiência, de acordo com o Dicionário Aurélio da

Língua Portuguesa,, 2ª edição, São Paulo: Editora Nova Fronteira , 2004.

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a protegê-los e compadecer-se deles. Num terceiro período uma educação à parte. Finalmente, na última parte do século XX, observa-se um movimento que tende a aceitar as pessoas deficientes e a integrá-las tanto quanto possível, na sociedade (KIRK E GALLAGHER, 1996: 6).

Dessa forma, é notória a evolução do tratamento dispensado às pessoas com

deficiência na sociedade em geral, bem como a possibilidade de participação das

mesmas no contexto educacional.

De acordo com Mendes (2001), a evolução histórica do conceito de

deficiência permite visualizar a relatividade de uma determinada concepção que

parece sempre estar vinculada a um contexto histórico específico. Nesse sentido, as

concepções, bem como o conhecimento atual não podem em momento algum ser

encarados como dogmas ou verdades absolutas, mas sim como verdades relativas.

Nessa perspectiva, o vocábulo deficiência encontrado na literatura é tão

antigo quanto a humanidade.

Ao longo dos tempos, desde a pré-história até hoje, as pessoas sempre tiveram que decidir qual atitude adotar em relação aos membros mais vulneráveis da comunidade que precisavam de ajuda para obter alimento, abrigo e segurança, como as crianças, os velhos e as pessoas com deficiência (Cartilha – SACI, 2005:26).

A vulnerabilidade e/ou o impedimento apresentado pela pessoa com

deficiência necessita ser considerado não só pela sua impossibilidade, mas pelos

meios (não-acessibilidade) que a sociedade lhe proporciona. Assim, a palavra

deficiência denota uma condição da pessoa resultante de um impedimento, tais

como: lesão no aparelho visual ou auditivo, falta de uma parte do corpo, déficit

intelectual. O termo “impairment” pode ser traduzido como impedimento, limitação,

perda ou anormalidade na estrutura do corpo humano ou em funções fisiológicas

(Sassaki, 2005:9).

Diante da proposição de que há “anormalidade”2, Edler Carvalho (2004:40)

destaca que as comparações feitas entre o Eu e o Outro (quando deficiente),

ocorrem numa dimensão de alteridade comprometida pelo modelo clínico ou pelo

modelo matemático que, segundo a teoria dos conjuntos, organiza e separa os

grupos em função de suas características diferenciadas. A autora enfatiza que a

2 Refere-se ao que é anormal. Diz-se de indivíduo cujo desenvolvimento físico, intelectual ou mental

é defeituoso. De acordo com o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, 2ª edição, São Paulo: Editora Nova Fronteira , 2004.

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diferença encontrada na pessoa com deficiência é tida em dois pólos contrários, o

que se descreve como: deficientes (dessemelhantes, atípicos, anormais) em

contraposição ao outro (ideal, tido como normal).

A partir dessas considerações, a deficiência é utilizada como referência para

o padrão de normalidade, quando se refere aos problemas dos desviantes, a uma

perspectiva de patologia, onde o indivíduo desviante tem sido encarado a partir de

uma perspectiva médica, que se preocupa em diferenciar o “são” do “não-são” ou do

“insano” (Velho, 1979).

Nesse aspecto, são diferenciadas as limitações que as pessoas com

deficiência podem apresentar, contudo a sociedade, ainda assim, cria outras que

lhes causam mais “incapacidade” (ou desvantagem) no desempenho de papéis

sociais. São elas: seus ambientes restritivos; suas políticas discriminatórias e suas

atitudes preconceituosas que rejeitam a minoria e todas as formas de diferenças;

seus discutíveis padrões de normalidade; seus objetos e outros bens inacessíveis do

ponto de vista físico; seus pré-requisitos atingíveis apenas pela maioria

aparentemente homogênea; sua quase total desinformação sobre necessidades

especiais e sobre os direitos das pessoas que têm essas necessidades e suas

práticas discriminatórias em muitos setores da atividade humana (Sassaki, 2003:47).

Diante das incapacidades apresentadas, no dia-a-dia da sociedade e

principalmente das escolas, percebe-se a preocupação no modo como nomear, qual

tratamento utilizar em relação a essas pessoas.

Preocupação irrelevante, porque são inúmeras as terminologias utilizadas

para nomear a pessoa com deficiência. São elas: deficiente, excepcional, criança

atrasada, com deficiência, portador de deficiência, pessoa com necessidades

especiais, com necessidades educativas especiais, alunos especiais. No entanto,

segundo Skliar (1999:21), isso é “apenas um debate sobre melhores e piores

eufemismos para denominar a alteridade” que, para o autor, não pressupõe por si

mesma transformação política, epistemológica e/ou pedagógica. Segundo Jannuzzi

(1992), a mudança na terminologia não garante a não discriminação uma vez que

em pouco tempo a nova terminologia estará carregando as características

discriminatórias da terminologia anterior. Em suma, são significações que reafirmam

a diferenciação entre o ser são ou não são, normal ou anormal, estar no padrão ou

fora dele.

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Jannuzzi (2004:199) registra ainda que é importante lembrar que inclusão não

se faz por decreto. É um processo e como tal leva tempo e implica mudanças

estruturais na cultura, na construção de uma nova postura pedagógica e na vida

social.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) adota uma classificação que

reconhece os seguintes tipos de deficiências como as mais frequentes:

mental e motora (ou física), auditiva, visual e múltipla.

No Brasil, a percepção da deficiência, na educação, apresenta um outro

percurso.

Em Mantoan (2001:59), verifica-se que a história da educação de pessoas

com deficiência no Brasil encontram-se divididas entre três grandes períodos: de

1854 a 1956, marcado por iniciativas de cunho privado; de 1957 a 1993, definido por

ações oficiais de âmbito nacional; de 1993 até o momento, caracterizado pelos

movimentos sociais em defesa da inclusão escolar.

Mazzota (2005:27) relata que, de acordo com experiências que foram

concretizadas na Europa e Estados Unidos da América do Norte, alguns brasileiros,

no século XIX, começaram a organizar serviços para atendimento a cegos, surdos,

deficientes mentais e deficientes físicos, serviços estes realizados por iniciativas

oficiais e privadas, caracterizando, assim, o atendimento educacional aos portadores

de deficiência. São exemplos dessa iniciativa, o Instituto Benjamin Constant (IBC), o

Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), entre outros.

A inclusão da “educação de deficientes”, da “educação dos excepcionais” ou da “educação especial” na política educacional brasileira vem a ocorrer somente no final dos anos cinqüenta e início da década de sessenta do século XX (MAZZOTA, 2005:27).

Diante das considerações apresentadas, o educando com algum tipo de

deficiência foi, no decorrer da história, atendendo suas necessidades de

aprendizagem, isto é, construindo-a arduamente, principalmente no que se refere à

Síndrome de Down, objeto desse estudo. Durante esse percurso, o educando com

Síndrome de Down apropriou-se dos seus direitos de acesso e permanência na

escola, por ser uma questão de direitos humanos conquistados historicamente.

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Síndrome3 origina-se do grego sindrome - “reunião”, “concurso”. O estado

mórbido caracterizado por um conjunto de sinais e sintomas e que pode ser

produzido por mais de uma causa. Conjunto de características ou de sinais

associados a uma condição crítica, suscetível de despertar reações de temor e

insegurança.

O termo Down é sobrenome do médico e estudioso John Langdon Down que

ofereceu grande contribuição ao estudo da síndrome, demonstrando as diferenças

físicas e sua descrição da condição da pessoa com Síndrome de Down e também

distinguindo essa das outras pessoas com deficiência mental.

No decorrer da história biológica e da evolução humana, aconteceram

inúmeras mutações de genes e modificações cromossômicas, inclusive,

aconteceram o desenvolvimento de doenças genéticas e desordens cromossômicas,

como a Síndrome de Down. Pueschel descreve que:

O registro antropológico mais antigo da síndrome de Down deriva das escavações de um crânio saxônio, datado do século VII, apresentando modificações estruturais vistas com freqüência em crianças com síndrome de Down (2003:45).

Essa descrição demonstra o quanto era perceptível a “diferença” apresentada

por uma pessoa com Síndrome Down.

Assim, em 1866, o médico John Longdon Down faz a publicação da obra

“Observations on Etnnic Classifications of Idiots”, onde relata traços característicos

da pessoa com Síndrome de Down. Tais características estavam relacionadas à

“idiotia”4 que por ele foi denominada mongolismo. Esta denominação foi dada porque

ele acreditava que a síndrome representava uma regressão à raça mais primitiva (os

mongóis) por degeneração. Então, Down escreveu:

Trata-se de um representante da grande raça mongólica. Quando se colocam lado a lado é difícil crer que não se trata de filhos dos mesmos pais... Os olhos estão situados obliquamente e as comissuras internas dos mesmos distam entre si mais que o normal. A fenda palpebral é muito estreita...os lábios são grandes, grossos e com pregas transversais... (DOWN, apud PESSOTTI, 1984:143)

3 De acordo com o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa,, 2ª edição, São Paulo: Editora Nova

Fronteira , 2004, 4 O termo “idiotia” era um termo utilizado para qualquer tipo de atraso mental.

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Nesse contexto, vários termos foram usados para referir-se à Síndrome de

Down. Desde que foi descrita, existiam: idiotia mongolóide, imbecilidade mongolóide,

cretinismo furfuráceo, criança mal-acabada, criança inacabada, entre outros.

Schwartzman (2003) relata que, em 1875, Frase e Mitchel publicaram as

primeiras ilustrações médicas sobre a Síndrome de Down e descreveram 62 casos,

bem como o resultado da autópsia de um caso. Eles também foram os primeiros a

relatar a maior ocorrência de Síndrome de Down em filhos de mulheres mais velhas.

A Síndrome de Down foi considerada, em 1932, uma aberração

cromossômica5. Enquanto que em 1934, sugeriam que ela poderia ser uma

trissomia. Já em 1956, aconteceu a descoberta que as células humanas possuíam

46 cromossomos e, em 1959, foi relatada por Lejeune, Turpin e Gautier, a presença

de um cromossomo extra no cromossomo 21, caracterizando a trissomia 21

(Moscati, 1979 apud Saad, 2003: 43).

Dessa forma, a Síndrome de Down é a combinação específica de

características fenotípicas que incluem retardo mental e um fenótipo característico

no corpo todo.

Segundo Pueschel, verificam-se indícios históricos sobre a Síndrome de

Down, contudo não há registros de documentos científicos que comprovem a

existência de pessoas com esta síndrome antes do século XIX. Dessa forma, o autor

nos aponta que:

Há várias razões para isso: em primeiro lugar, havia poucas revistas médicas disponíveis naquela época; em segundo, somente alguns poucos pesquisadores estavam interessados em crianças com problemas genéticos e deficiência mental; em terceiro, outras doenças, como as infecções e a desnutrição predominavam naquela época, ofuscando muitos problemas genéticos e de malformação; e em quarto, até meados do século XIX, somente metade das mães sobreviviam além dos 35 anos de vida (é bem conhecido o aumento de incidência de Síndrome de Down em mães de idade avançada) e muitas crianças certamente nascidas com Síndrome de Down provavelmente morriam na primeira infância (PUESCHEL, 2003:48)

Segundo Schuwartzman (1999:3), as pessoas com Síndrome de Down

resultaram do cruzamento das mulheres mais idosas da tribo dos Olmecas6 com o

5 Aberração Cromossômica é a alteração da estrutura ou do número de cromossomos de um

determinado indivíduo, quando comparado a um cariótipo considerado padrão para uma dada espécie. 6 Tribo que vivia na região conhecida hoje como Golfo do México, entre 1500 a.C até 300 d.C. (SAAD,

2003:41)

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jaguar, por isso eram consideradas ídolos religiosos e eram cultuadas e respeitadas

como semi deuses.

A partir dessa contextualização, é importante verificar as características e

aspectos relevantes da pessoa com Síndrome de Down sob a perspectiva da área

médica e educacional.

A Síndrome de Down é considerada um acidente genético, uma alteração

cromossômica, bem como é a principal causa genética da deficiência mental, de

anomalias múltiplas, fácies característico, fatores associados à trissomia do

cromossomo 21 humano (LIMA e FERRAS, s/n:6).

Giavanoni (1994:13) concorda com o aspecto de que a Síndrome de Down é

um acidente genético e acrescenta ainda a consideração de que isso acontece por

razão biológica que ocorre na primeira divisão celular do zigoto. Nas células do ser

humano, há 46 cromossomos ou 23 pares: 22 dos quais são autossômicos, ou seja,

são determinantes das características do indivíduo e um é determinante do sexo.

As supostas causas do nascimento de uma criança com Síndrome de Down

estão relacionadas a fatores endógenos (ambientais) e exógenos. Dos fatores, os

endógenos são considerados mais importantes e relacionam-se à idade materna.

Mulheres mais velhas apresentam riscos maiores de terem filhos trissômicos, possivelmente devido ao fato do envelhecimento dos óvulos. O mesmo não acontece com os espermatozóides e por esta razão é que não há uma relação direta entre a SD e a crescente idade paterna (VOIVODIC, 2008:40).

Quanto ao fator exógeno, a autora comenta:

Entre os fatores ambientais, é notório o diagnóstico pré-natal, pelos países onde ele é realizado em número significativo. Assim, quanto maior o número de gestações interrompidas após diagnóstico pré-natal, menor será a incidência ao nascimento (VOIVODIC, 2008:40).

De acordo com Saad (2003:29), a Síndrome de Down é caracterizada por

atraso do desenvolvimento físico, funcional e mental. E, somadas a essas

características, acrescentam-se várias alterações fenotípicas determinadas por essa

carga genética. Essas características, segundo Pueschel (2000:1), devem ser

consideradas somente para diagnóstico clínico e não necessitam ser evidenciadas.

Schwartzman (1999:26) descreve algumas das características fenotípicas da

criança com Síndrome de Down:

peso e tamanho de nascimento inferiores ao normal;

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hipotonia (músculos flácidos);

pescoço curto;

língua protusa, isto é, posicionada para fora da boca em virtude da hipotonia;

base nasal achatada;

doenças cardíacas congênitas;

mãos e pés pequenos;

espaço aumentado entre o 1º e o 2º dedo dos pés;

orelhas pequenas, arredondadas e dismórficas, de implantação baixa;

prega da pálpebra superior no canto interno dos olhos como as pessoas da raça amarela – o que deu origem ao nome mongolismo;

prega palmar transversa que consiste numa única linha que atravessa as mãos curtas, de lado a lado.

Quadro 1 - Destaque de algumas características descritas para os portadores da

Síndrome de Down.

Fig. Olhos com prega da pálpebra superior no

canto interno de pessoas da raça amarela.

Fonte: www.brasilescola.com

Fig. Destaque das orelhas pequenas e base

nasal achatada.

Fig. Destacando a língua

grande, protusa e sulcada.

Fig. Mãos e pés pequenos e

espaços aumentado entre o 1º

e o 2º dedos dos pés.

Fig. Prega palmar transversa e

mãos curtas.

Fig.: B, C, D e E - Adaptado de Rodini e Souza (2008) disponível em: http://www.cerebromente.org.

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Tais características são comuns à síndrome, o que difere particularmente a

pessoa com Síndrome de Down das demais. Segundo Saad (2003) e Voivodic

(2008), essas diferenças não interferem no desenvolvimento das pessoas com

Síndrome de Down.

Nesse contexto, os estudos que abordam a Síndrome de Down apontam que

esta pode ser diagnosticada a partir do nascimento, pela presença de uma série de

características, alterações fenotípicas que, se consideradas em conjunto, permitem

a suspeita diagnóstica, no entanto, este diagnóstico só pode ser considerado

definitivo após o estudo cromossômico (cariótipo). Cariótipo corresponde à

identidade genética do ser humano e é através de um exame conhecido como

cariograma que se torna possível obtê-lo, mesmo no feto (VOIVODIC, 2004: 41-42).

É importante relatar que os bebês com Síndrome de Down apresentam muito

sono, têm dificuldades para sugar e deglutir por conta da hipotonia acentuada nesta

fase.

Diante do exposto, pode-se entender que a principal característica da

Síndrome de Down são os sinais físicos que provocam na sociedade reação de

insegurança. E esses sinais físicos são consequências das alterações genéticas

justificadas pela trissomia do cromossomo 21, em que se apresentam três formas:

trissomia simples, translocação e mosaicismo:

Trissomia simples: ocorre a não disjunção do cromosso 21; percebe-se claramente a trissomia, ou seja, o 3º cromossomo extra ao par 21, causando a síndrome. Sua incidência é a mais comum, ocorrendo mais ou menos em 96% dos casos, sendo suas causas discutíveis, já que os pais têm cariótipo normal, e a trissomia se dá por acidente. Translocação: o cromossomo adicional está sobreposto a um cromossomo de outro par, portanto não se trata de uma trissomia livre. A translocação se dá quando um cromossomo do par 21 e o outro, ao qual se agrupou, sofrem uma quebra na sua região central. Há uma união entre os dois braços mais longos e perda dos dois braços mais curtos. Não se notam diferenças clínicas entre as crianças com trissomia simples ou por translocação, e ocorrem em 2% dos casos. Mosaicismo: presença de um percentual de células normais (46 cromossomos) e outro percentual com células trissômicas (47 cromossomos). Ocorre em cerca de 2% dos casos. A causa desta “falha” é, até o momento, desconhecida, mas sabe-se, no entanto, que é pequena a probabilidade de reincidência numa mesma família (VOIVODIC, 2004:40).

Bissoto (2005:81) aponta que, embora haja diferentes formas de

manifestação da trissomia e que estas provocam variações físicas, clínicas e nas

capacidades cognitivas, existem poucos estudos comparativos que possam afirmar

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diferenciações significativas existentes entre os três grupos de portadores de

Síndrome de Down.

No entanto, sabe-se que esses casos de trissomia são pouco expressivos,

pois:

não implicam diferenças no grau de desenvolvimento das pessoas com síndrome de Down, com exceção do mosaicismo que, por não afetar todas as células, tem um menor comprometimento no desenvolvimento global do individuo (WUO, 2005:13).

A pessoa com Síndrome de Down apresenta variada anomalia congênita,

sendo esta suscetível às doenças comuns na infância. Assim, é importante que se

conheçam algumas dessas patologias, por Saad (2003), Pueschel (2003) e Nahas

(2004). De acordo com Pueschel (2003:86):

várias anomalias congênitas podem ser observadas nos neonatos7 com

síndrome de Down, algumas das quais podem representar ameaça à vida, exigindo correção imediata, enquanto outras só se tornarão evidentes nos dias e semanas que se seguirem ao nascimento da criança.

São anomalias congênitas do recém-nascido, da criança, do adolescente e do

adulto com Síndrome de Down: cataratas congênitas; anomalias congênitas do trato

gastroinstestinal; doenças congênitas do coração; infecções (respiratórias, de ouvido

e de pele); desordens convulsivas; apnéia do sono; distúrbios visuais; déficits

auditivos; disfunção da glândula tireóide; anormalidades esqueléticas; desordens

psiquiátricas; doença de Alzheimer. Lembrando que nem todas as pessoas com

Síndrome de Down virão a tê-las e se forem diagnosticadas, são facilmente

controladas e/ou corrigidas.

Sabe-se que o nascimento de uma criança com Síndrome de Down está

relacionado à causas genéticas e a alguns sintomas que aqui estão focados, a

exemplo da deficiência mental.

Os educandos, de modo geral, aprendem de forma diferenciada, alguns com

mais facilidade que outros da mesma idade e que, “consequentemente, têm

dificuldades em se adaptar às demandas sociais” (KIRK e GALLAGHER, 2002:120).

Nesse contexto, houve inúmeras tentativas de profissionais nas áreas de

medicina, psicologia, serviço social e educação, no sentido de ajudar os educandos

considerados mais lentos, no sentido de definir deficiência mental. Fonseca

7 De acordo com o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa,, 2ª edição, São Paulo: Editora Nova

Fronteira , 2004, Neonato refere-se à criança recém-nascida.

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(1995:25) afirma que a pessoa deficiente é a que desvia da média, apresentando

características mentais, aptidões sensoriais, características neuromusculares e

corporais, comportamento emocional, aptidões de comunicação, múltiplas

deficiências diferenciando de uma criança normal, o que justifica requerer a

modificação das práticas educacionais no sentido de desenvolver as suas

capacidades.

O Ministério da Educação e Cultura (MEC) adotou um enfoque

muldimensional para caracterização da deficiência mental, norteado pelo modelo

proposto pela Associação Americana de Deficiência Mental (AAMD)8 em 1992,

incluindo a função intelectual e as habilidades adaptativas, a função psicológico-

emocional, as funções física e etiológica e o contexto ambiental (MEC, 1995). Isto

significa dizer que, para a AAMD, deficiência mental “refere-se a limitações

essenciais no desempenho intelectual da pessoa”. Outra definição para deficiência

mental apontada por Fonseca (1995:43), que está definida pela AAMD, diz que:

deficiência mental é “a condição na qual o cérebro está impedido de atingir um

desenvolvimento adequado, dificultando a aprendizagem do indivíduo”.

Diante das conceituações apresentadas, a definição mais comumente

empregada é a criada pelos principais membros da Associação Americana de

Deficiência Mental (AAMD) que apresentam no quadro 2 (p. 28):

8 Associação Americana de Deficiência Mental, de agora em diante, esta instituição será mencionada

no trabalho apenas pela sigla AAMD.

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Quadro 2 – Definição mais comumente empregada pela Associação América de Deficiência

Mental (AAMD).

Definição

A deficiência mental refere-se ao

funcionamento intelectual geral

significativamente abaixo da média

que coexiste com falhas no comportamento

adaptador

e se manifesta durante o período de

desenvolvimento.

Explicação

Definido como um escore em testes de

inteligência inferior aos obtidos por 97 a 98

por cento das pessoas da mesma idade.

Satisfazer padrões de independência e

responsabilidade social esperados do grupo

etário e cultural (isto é, aprender habilidades

acadêmicas básicas, participar de atividades

apropriadas ao grupo social).

Deve ser observável durante a infância.

Problemas de natureza semelhante em

adultos seriam provavelmente classificados

de doença mental e não de deficiência

mental.

Fonte: Grossmam, 1977 apud Kirk e Gallagher, 2002:121

No entanto, há uma distinção básica entre a atual definição apresentada pela

AAMD e outras que a antecederam, pois o destaque que se dava era no

comportamento adaptador combinado à subnormalidade intelectual (KIRK e

GALLAGHER, 2002:121).

Contudo, sabe-se que na literatura há inúmeros conceitos e como outros,

esta definição tende a ser modificada e aperfeiçoada na medida que mais

experiências e evidências se tornem disponíveis, considerando o contexto histórico.

Assim, considerando a deficiência mental, a pessoa com Síndrome de Down,

em seu desenvolvimento, apresenta alguns atrasos em relação ao padrão

considerado normal, sendo eles mental, físico e funcional. Neste sentido, Voivodic

(2008: 42) aponta que:

[...] os indivíduos portadores de Síndrome de Down, assim como os indivíduos sem alteração cromossômica, apresentam grandes diferenças em seu desenvolvimento, comportamento e personalidade. Porém é evidente que o desenvolvimento de uma pessoa com síndrome de Down apresenta diferenças significativas se comparado ao desenvolvimento considerado normal.

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O comportamento, bem como o desenvolvimento da inteligência do educando

com Síndrome de Down não depende exclusivamente da alteração cromossômica,

mas, também, de todo o restante do potencial genético, assim como das influências

do meio em que a criança vive (SCHWARTZMAN, 1999: 58).

A deficiência mental pode se apresentar na faixa entre leve e moderada na

maioria das pessoas com Síndrome de Down. Dessa forma, segundo Pueschel

(2003:111), “algumas crianças têm função intelectual limítrofe ou na faixa média -

baixa, e somente algumas apresentam deficiência mental severa”.

Diante dos diferentes modos de classificar as pessoas com deficiência

mental, o que inclui os termos leve, médio e severo, os autores Kirk e Gallagher

(2002:123) demonstram os termos que têm significado e implicações educacionais,

descritos como educável, treinável e grave/profundo.

Segundo Kirk e Gallagher (2002:124), o deficiente mental educável

(corresponde ao deficiente mental leve segundo a AAMD) é aquele que não

consegue se beneficiar do programa escolar regular por apresentar um

desenvolvimento subnormal, no entanto, desenvolve-se em três áreas:

educabilidade em assuntos acadêmicos em nível primário e avançado dos graus

elementares; educabilidade em adaptação social até o ponto em que puder

eventualmente progredir na comunidade e a adequação ocupacional a ponto de

poder se sustentar parcial ou totalmente quando adulto.

O deficiente mental treinável (corresponde ao deficiente mental moderado

segundo a AAMD), de acordo com os autores, é aquela criança que tem dificuldade

em aprender as habilidades acadêmicas a qualquer nível funcional; desenvolve

independência total em nível adulto e alcança adequação vocacional suficiente para,

em nível adulto, sustentar-se sem supervisão ou ajuda.

O deficiente mental grave ou profundo (corresponde ao deficiente mental

gravemente retardado na classificação da AAMD), tem deficiências múltiplas que

muitas vezes interferem nos procedimentos de instrução normais.

Mazzota (1982:36) descreve os termos educável, treinável e grave/profundo

de forma mais prática, ou seja, no contexto da educação formal e da aprendizagem

escolar, conforme o grau de comprometimento, da seguinte forma: a) deficientes

mentais educáveis terão “dificuldades de aprendizagem num currículo escolar

comum”; b) deficientes mentais treináveis têm pouca probabilidade de “adquirir

habilidades de leitura, escrita e cálculo correspondentes ao nível de alfabetização”,

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no entanto, Kirk e Gallagher (2002:123) afirmam que eles podem “desenvolver

habilidades de cuidado pessoal como: vestir-se, despir-se, arrumar-se, usar o toalete

e comer, bem como a capacidade de proteger-se de perigos comuns”, de falar e

manter conversas simples, entre outras; c) deficientes mentais dependentes,

custodiais ou grave/profundo apresentam “uma série de comprometimentos

associados à deficiência mental, a ponto de fazer com que apenas serviços

educacionais sejam insuficientes para o seu atendimento”.

Diante das considerações acerca do fenótipo e da deficiência mental, são

atribuídas erroneamente à criança com Síndrome de Down características como:

afetividade, docilidade, amistosidade, bem como teimosia. No entanto, segundo

Voivodic (2008:42), os estudos até então realizados “não confirmam que essas

crianças tenham características comuns de comportamento e personalidade, o que

não permite traçar um perfil identificador do portador da Síndrome de Down”.

Observando os fatores que possibilitam e/ou impossibilitam o

desenvolvimento da pessoa com Síndrome de Down, vale ressaltar que o

desenvolvimento depende de fatores intrínsecos e extrínsecos, teóricos e práticos,

pessoais e coletivos, biológicos e sociais, familiares e escolares.

A educação das pessoas com Síndrome de Down tem sido demonstrada a

partir de pesquisas realizadas. Desta forma, ao se pensar na educação do indivíduo,

no sistema educacional brasileiro, vê-se um quadro de grande complexidade no

ensino, as muitas dificuldades para equacionar uma relação democrática, isto é, de

garantir escola de qualidade para todos (MANTOAN, 2006:23).

O estímulo, o desenvolvimento e as respostas, então, são as condições para

se apreender o sentido da educação na vida da pessoa com Síndrome de Down,

condições estas que devem sobrepor suas limitações, levando em conta apenas as

possibilidades e potencialidades que ela busca alcançar durante sua trajetória

escolar.

O educando com Síndrome de Down, assim como os demais indivíduos, tem

direito à educação e esta precisa acontecer em um ambiente comum a todos, onde

possa exercer sua cidadania, construir seus conhecimentos e interagir com o grupo

proporcionando-lhe, sempre que necessário, atendimento educacional

especializado. Nessa perspectiva, Voivodic (2008:60) acredita que:

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A possibilidade de que as crianças com ou sem deficiência possam aprender juntas, em classes heterogêneas, com alunos da mesma faixa etária, foi um passo decisivo para eliminar atitudes segregatórias e discriminatórias.

Dessa forma, neste estudo, considerou-se a educação formal como principal

ponto, cujo objetivo é preparar a criança para uma vida ativa e com qualidade em

sociedade, onde o educando com Síndrome de Down frequenta a escola regular e

participa de todas as atividades propostas. Nesta perspectiva, de acordo com

Fredericks (2003:184), alguns objetivos resumem aquilo que os pais, de forma geral,

almejam para seus filhos: que sejam capazes de interagir com pessoas que não são

portadoras de deficiências, bem como com aqueles que são. E que tenham

verdadeiros amigos nos dois grupos; que sejam capazes de trabalhar nos mesmos

ambientes que aqueles que não apresentam deficiências; que sejam bem-vindos e

participem em eventos e atividades frequentados por pessoas sem deficiência,

sentindo-se confiantes e à vontade; que vivam na moradia de sua escolha conforme

suas possibilidades econômicas; que sejam felizes.

Com isso, podemos inferir que os educandos com Síndrome de Down

podem/devem estar no ensino regular e merecem mais cuidado, intervenção e

cautela em algumas áreas, tais como: percepção, atenção, memória, aspectos

psicomotores, leitura e escrita, lógico-matemática, linguagem, atividades cotidianas,

assim como nos aspectos sociais, afetivos e emocionais, conforme já demonstrado

neste trabalho.

A sequência de desenvolvimento do educando com Síndrome de Down

geralmente é bastante semelhante à de educandos sem a síndrome. As etapas e os

grandes marcos são atingidos, embora em um ritmo mais lento. Sendo assim, deve-

se garantir a esse educando experiências que sejam fundamentais para o seu

desenvolvimento, pois, dentro de suas potencialidades, podem alcançar estágios

muito mais avançados de raciocínio e de desenvolvimento.

Estudos e pesquisas têm ocorrido com intuito de avaliar experiências de

conquistas e de dificuldades de inclusão à educação formal de educandos com

Síndrome de Down. São eles: entrevistas com pais de alunos com deficiência mental

de leve a profunda que estavam sendo educados em classes regulares

(DAVERN,1994); relato de um trabalho de acompanhamento de quatro educandos

com Síndrome de Down, matriculados em escola de ensino regular (LIMA, 1998);

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Projeto Integração, que se caracteriza pelo acompanhamento de educandos normais

e com Síndrome de Down na pré-escola comum e especial (MONTEIRO, 1997); o

estudo sobre a percepção dos educadores em relação à integração escolar do

educando com Síndrome de Down, no Ensino Fundamental (MARTINS, 1997), as

possibilidades de desenvolvimento das potencialidades dos indivíduos com

deficiência mental que apresentam Síndrome de Down, tendo por base a teoria

sócio-histórica vygotskiana (SAAD, 2003) e, por último, o estudo de Voivodic (2008)

que buscou acompanhar um projeto de inclusão de educandos com Síndrome de

Down em classes comuns de escolas regulares, que começou a ser implantado por

um grupo de pais desses educandos.

Diante dos estudos demonstrados, é importante descrever a consideração de

Voivodic (2008:65) em relação às pesquisas já realizadas sobre a inclusão de

educandos com Síndrome de Down. Segundo a autora, as pesquisas realizadas

[...] comprovam que, quando o educando com Síndrome de Down frequenta escolas regulares, tem ganhos significativos não só em seu desenvolvimento social, mas também em seu desenvolvimento cognitivo. Também foi constatado que não houve prejuízo para as crianças que não têm deficiência por estarem na mesma situação com crianças com deficiência mental. Outro ponto ressaltado pelas pesquisas é sobre a importância da mediação para o sucesso do processo de inclusão.

Neste sentido, as bases legais que norteiam a inclusão devem ser

evidenciadas nas práticas cotidianas da educação formal. Ou seja, a inclusão,

paradigma emergente na política educacional vigente, baseia-se não somente em

aceitar a matrícula do aluno com deficiência, mas de garantir sua aprendizagem no

contexto do ensino regular.

A partir de estudos e documentos, chegou-se à conclusão de que a melhor

resposta para o educando com deficiência e para os demais é uma educação que

respeite as características de cada estudante, ofertando alternativas pedagógicas

que atendam às necessidades educacionais de cada um - uma escola que ofereça

um ambiente inclusivo e acolhedor, onde todos possam conviver e aprender com as

diferenças.

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Bases Legais que Norteiam a Inclusão

Os principais documentos norteadores (aspectos jurídicos) que garantem a

inclusão são: a Constituição da República Federativa do Brasil, (BRASIL, 1988); a

Declaração de Salamanca (UNESCO,1994); a Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional, (BRASIL, 1996) e os Parâmetros Curriculares Nacionais –

Adaptações Curriculares (1998).

A Constituição Federal elegeu como fundamentos da República a cidadania e

a dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. II e III) e, como um dos seus objetivos

fundamentais, a promoção do bem de todos sem preconceitos de origem, raça,

sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3º, inc. IV).

Elege ainda como um dos princípios à igualdade para o ensino, a “igualdade

de condições de acesso e permanência na escola” (art. 206, inc. I). No art. 208, V,

versa que o “dever do estado com a educação será efetivado mediante a garantia de

acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística,

segundo a capacidade de cada um”.

Destaca-se da Constituição Federal de 1988, o Art. 205 que diz:

A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (BRASIL, 1988).

Percebe-se neste artigo, o quanto a Constituição Federal é taxativa no que

concerne ao direito à educação – responsabilidade de “todos”, ou seja, todas as

instâncias da sociedade, sem exceções. Reafirma, ainda, a participação do Estado e

da família para o efetivo desenvolvimento dos alunos. É importante salientar que o

Estado deve promover uma educação de qualidade a todos e à família cabe

contribuir para a promoção deste direito a partir da matrícula, frequência do filho à

escola, acompanhamento, fiscalização, avaliação da instituição escolar e a

participação nas atividades sócio-políticas-pedagógicas.

O princípio fundamental subjacente à definição e desenvolvimento das

escolas inclusivas consiste em que:

[...] todos os alunos devem aprender juntos, sempre que possível, independentemente das dificuldades e das diferenças que apresentam. As escolas inclusivas devem reconhecer e satisfazer as necessidades diversas

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dos seus alunos, adaptando-se aos vários estilos e ritmos de aprendizagem, de modo a garantir um bom nível de educação para todos, através de currículos adequados, de uma boa organização escolar, de estratégias pedagógicas, de utilização de recursos e de uma cooperação com toda a comunidade.” (DECLARAÇÃO DE SALAMANCA, 1994: 7).

No Brasil, o MEC, através da Secretaria de Educação Especial (SEESP), tem

buscado implantar programas que desenvolvam a formação de professores com

enfoque para a educação inclusiva no Ensino Superior, o qual partiu da Portaria

n°1793/1994 que recomenda a inclusão da disciplina “Aspectos Ético-Político-

Educacionais da Normalização e Integração da Pessoa Portadora de Necessidades

Especiais”, prioritariamente, nos cursos de Pedagogia, Psicologia e demais

licenciaturas, e a inclusão de conteúdos relativos a essa disciplina em cursos da

área de Saúde, no curso de Serviço Social e nos demais cursos superiores, de

acordo com suas especificidades. Esta portaria também recomenda que se

mantenham e se estendam os cursos adicionais, de graduação e de especialização

nas diversas áreas da Educação Especial.

No que se refere às ações do governo, faz-se necessário descrever os dados

contidos na pesquisa de Chacon (2001), destacando as respostas das universidades

brasileiras à Portaria MEC nº 1.793/1994. Com essa finalidade, o autor analisou as

grades curriculares dos cursos de Pedagogia e Psicologia das Universidades

Federais de todo o Brasil e das estaduais e particulares dos estados de São Paulo e

Mato Grosso, assim como suas respectivas ementas e/ou conteúdos. Esse estudo

revelou que, dos 58 cursos de Pedagogia e Psicologia, apenas 13 apresentaram

alterações na grade curricular, o que significa uma baixa quantidade de cursos, pois

equivale a 22,5% do total de cursos estudados. Com isso, pode-se concluir que, na

realidade, a referida portaria não está sendo cumprida em grande parte das

instituições de Ensino Superior.

Em contraponto, destaca-se a relevância do estudo de Carvalho (2006:91),

que contribui para a implementação da Portaria MEC 1.793/1994. Em sua pesquisa,

a autora objetivou conhecer as representações sociais de professores da rede

pública da baixada cuiabana sobre a inclusão/exclusão de educandos com

deficiência no ensino regular. Tal estudo, evidenciou que as representações dos

alunos-professores se bifurcam: de um lado, eles se dizem incapacitados para um

bom desempenho junto ao aluno com deficiência, mas, por outro lado, essa

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percepção parece decorrer de uma atitude discriminatória proveniente da falta de

discernimento entre diferença e deficiência.

Percebe-se que, embora haja uma política governamental objetivando ações

de inclusão, essas ações ainda não são implementadas na maioria das instituições

de Ensino Superior.

No que concerne à Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº. 9394/96, ela

assegura aos educandos com necessidades especiais currículos, métodos, recursos

educativos e organização específicos, para atender às suas necessidades

específicas. E em seu art. 58, capítulo V, prevê sobre a Educação Especial:

Modalidade de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para pessoas com necessidades educacionais especiais. Assim, ela perpassa transversalmente todos os níveis de ensino desde a educação infantil ao ensino superior. Esta modalidade de educação é considerada como um conjunto de recursos educacionais e de estratégias de apoio que estejam à disposição de todos os alunos, oferecendo diferentes alternativas de atendimento. (BRASIL, 1996).

Assim como o MEC, o Conselho Estadual de Educação de Rondônia dispõe

de diretrizes e normas para a oferta de atendimento à clientela com necessidades

especiais conforme a Lei n. 9.394/96, da Resolução n. 138/99-CEE/RO, Parecer nº

17/2001-CEB/CNE e Resolução n. 02/2001-CEB/CNE, e demais normativas

vigentes, e nessas diretrizes a nomenclatura utilizada para tratar o educando com

deficiência é “necessidades educacionais especiais”.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais - Adaptações Curriculares (BRASIL,

1998), do MEC- fornecem as estratégias para a educação de alunos com

necessidades educacionais especiais.

De acordo com o documento do Ministério Público, intitulado: O acesso de

alunos com deficiência às escolas e classes comuns da rede regular (BRASIL,

2004:7): “apenas estes dispositivos legais bastariam para que ninguém negasse a

qualquer pessoa com deficiência o acesso à mesma sala de aula de crianças ou

adolescentes sem deficiência.”

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CAPÍTULO II

INÉDITO VIÁVEL EM PAULO FREIRE

Para melhor contextualizar este estudo, entende-se ser interessante, num

primeiro momento, compreender o sentido do termo inédito viável e, posteriormente,

interpretar, com base nos dados da pesquisa, os limites e desafios do processo de

inclusão de crianças com Síndrome de Down nas escolas de Cacoal-RO.

A análise desse estudo baseia-se na práxis educativa à luz da concepção de

Paulo Freire que aponta para uma proposta de compreensão entre o modo de

interpretar a realidade e a vida e, consequentemente, a prática que promove essa

compreensão levando a uma “ação transformadora” (FREIRE, 1994:84). O

desvelamento a partir da práxis, entendida como “a síntese entre a teoria-palavra e

ação”. Assim, os propósitos de Freire, que sempre se contrapõem às atitudes de

discriminação e segregação de maneira impetuosa, colabora com os de outros

teóricos no sentido de romper com o paradigma da exclusão, abrindo portas para o

paradigma da inclusão.

Algumas concepções de Freire sobre inclusão, que norteiam este trabalho,

precisam ser clareadas: a historicidade, a inconclusão, a conscientização, o diálogo

e a libertação.

A historicidade tem relação com o saber e com a curiosidade epistemológica.

Mediante a realidade da inclusão, a importância da tarefa do homem proposta por

Freire (2001:40) é pensar enquanto ser histórico, deixando de lado a concepção e a

prática „bancária‟, pois, para este estudioso, o homem “deve fazer parte da história e

não estar representado nela”. Continua dizendo que novos conhecimentos edificam

o ser histórico.

E é nessa óptica que o processo de inclusão precisa se assegurar,ou seja, o

educador deve buscar construir novos conhecimentos a cada dia, instigando

permanentemente a curiosidade em detrimento ao fatalismo citado por Freire. Deve

demonstrar, através de pesquisa sobre a prática, o que pode dar certo, uma vez que

esta busca conscientiza homens e mulheres, a despeito do que a sociedade

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excludente pratica com aquele que é diferente. Nesse caso específico, a pessoa

deficiente, deixando-a à margem da construção do seu conhecimento.

A pessoa que é posta à parte na sociedade (ambientes, escolas, igrejas,

praças, entre outros) e se sente excluída não deve aceitar passivamente o que lhe é

imposto. É fundamental que saiba questionar e enfrentar criticamente as inúmeras

adversidades econômicas, sociais e culturais que fazem parte do seu cotidiano

(FREIRE, 1994:147-148).

Outra concepção de Paulo Freire elencada neste estudo é a inconclusão que

é a sua tese sobre o inacabamento do ser humano que, por meio de suas ações no

mundo, na história, se conquista por luta, por aquisições continuamente realizadas.

A inconclusão pode ser assim descrita nas palavras de FREIRE (1996:64):

É na inconclusão do ser, que se sabe como tal, que se funda a educação como processo permanente. Mulheres e homens se tornaram educáveis na medida em que se reconheceram inacabados.

Apreender-se sobre o que seja verdadeiramente a inclusão é tarefa que

precisa ser experimentada na prática escolar. Daí uma terceira idéia de Freire para

que se busque a compreensão - a conscientização, enfatizada quando diz respeito

ao modo como o ser humano se conscientiza sobre as suas ações de ser e estar no

mundo por meio da sua historicidade e da sua inconclusão. É importante que

homens e mulheres tomem consciência do poder que se tem em estar no mundo e

com o mundo, criando e recriando sua existência, conscientizando-se e participando

com os outros de forma coletiva.

A conscientização está evidentemente ligada à utopia, implica em utopia. Quanto mais conscientizados nos tornamos, mais capacitados estamos para sermos anunciadores e denunciadores, graças ao compromisso de transformação que assumimos (FREIRE, 2003:28).

Ainda como concepção de Paulo Freire, destacamos o diálogo e a libertação

como princípios orientadores para transformar e construir uma educação

humanizadora, coerente com o desafio da libertação humana.

A proposta de uma educação humanista-libertadora em Freire tem no diálogo/dialogicidade uma das categorias centrais de um projeto pedagógico crítico, mas propositivo e esperançoso em relação ao nosso futuro (DICIONÁRIO PAULO FREIRE, 2008: 130).

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Diante desta propositiva, crer no valor do diálogo é o ideal de construção de

caminhos para a prática de inclusão, pois, a partir dele, pode-se estabelecer a

relação teoria-prática na educação de estudantes com deficiência. Esta postura – a

prática dialógica- leva a uma percepção mais aguda do mundo e ao verdadeiro valor

da existência: sociedade como processo em construção, como realidade inacabada

e em constante mudança.

Todas essas concepções se confluem caracterizando o inédito-viável,

categoria freireana para superar situações limites, neste caso, a realidade

pedagógica da inclusão de deficientes com Síndrome Down.

Diante do exposto, escrever sobre a inclusão na perspectiva freireana é uma

tarefa grandiosa, enquanto possibilidade do inédito viável.

O pensamento de Freire propõe a construção de novos caminhos para a

libertação dos oprimidos. Os educandos com deficiência representam uma meta a

superar, para que no futuro se alcance um mundo mais humanizado.

A contribuição de Freire para a pedagogia latino-americana e que podemos

considerar para a perspectiva da inclusão está, segundo Zitkoski (2003), assentada

sob quatro fundamentos básicos para toda e qualquer proposta educacional

comprometida com a humanização da vida em sociedade: a) o fundamento

antropológico que define cada ser humano como um potencial de realização de seu

próprio ser mais, onde a existência humana jamais poderá ser concebida de forma

determinista ou fatalista pelo educador. Nesse sentido, em cada sujeito reside um

potencial de humanização que a aprendizagem e a construção de saberes passam a

ser um estímulo para a superação das situações limites; b) a base epistemológica

dialético-problematizadora que valoriza os diferentes saberes, culturas e sentidos,

na busca de construir uma práxis social emancipatória de toda pessoa, é a

esperança na capacidade dos seres humanos de se educarem coletivamente a partir

do diálogo crítico com a realidade que os cercam; c) o compromisso político do

processo educativo no engajamento com as transformações sócio-culturais

necessárias e urgentes ao processo de humanização do mundo; d) o desafio ético-

humanizador de uma pedagogia voltada para a construção da vida digna e justa

para todos, superando a atual lógica da mercantilização da vida e alienação social.

Com esses fundamentos da pedagogia freireana, pensar em educação

inclusiva requer reflexão sobre as práticas educativas para o engajamento em lutas

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concretas por uma educação humanizadora e empenhada com os diferentes

processos de inclusão social (ZITKOSKI, 2003).

A despeito do vocábulo inédito viável, as idéias centrais que explicam a

categoria são apresentadas por Ana Maria Araújo Freire (2003, nota nº. 1: 205-207),

Na obra, Pedagogia da Esperança, o inédito-viável é compreendido como uma

palavra-ação, práxis, imbuida de uma enorme carga afetiva, cognitiva, política,

epistemológica, ética e ontológica.

Ana Maria Freire explicita, numa segunda obra, o inédito viável como uma

categoria carregada de crenças, valores, sonhos, desejos, aspirações, medos,

ansiedades, vontade e possibilidade de saber, fragilidade e grandezas humanas,

portanto, convergindo com as práticas inclusivas (FREIRE, 2008:231).

Pensando a partir da práxis, a Pedagogia do Oprimido revela dois momentos

distintos que contribuem para a libertação: a pedagogia humanista e a pedagogia

libertadora. Na primeira, entendemos como o momento de desvelamento da

opressão vivenciada pelos oprimidos e o comprometimento dos mesmos com a

práxis transformadora. Na segunda, a pedagogia libertadora deixa de ser do

oprimido e passa a ser dos homens em contínuo processo de libertação (FREIRE,

1994:46-47).

Visando a libertação proposta nos escritos de Freire, a prática inclusiva

compreende a pedagogia humanista e a pedagogia libertadora, como meios para

desvelar a realidade vivenciada pelas pessoas com deficiência, implícitas no

cotidiano escolar.

A educação, aqui entendida como um caminho, não pode ser considerada

apenas como “generosidade” para com a pessoa com deficiência, ela deve ser uma

construção possível para favorecer sua libertação de um emaranhado de

consequências provocadas pela ação de negação que ela sofre que, segundo Freire

(1994:47), “quem inaugura a negação dos homens não são os que tiveram a sua

humanidade negada, mas os que a negam, negando também a sua”.

Negação do “outro” diferente dos padrões estabelecidos pela sociedade infere

dizer que é pelo fato de que “para eles, pessoa humana são apenas eles. Os outros,

estes são „coisas‟. Para eles, há um só direito – o seu direito (...)" (FREIRE, 1994:

45).

Nesse sentido, o processo de inclusão não deve ser concebido pelo simples

ato de o educando com deficiência “estar” na escola, é necessário que ele esteja e

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se “sinta” em todo o processo constituinte da educação escolar. Pensar a inclusão

escolar é garantir a aprendizagem. Nessa perspectiva, Mantoan (1996:05) contribui,

afirmando que:

A aprendizagem como o centro das atividades escolares e o sucesso dos alunos, como meta da escola, independentemente do nível de desempenho a que cada um seja capaz de chegar são condições de base para que se caminha na direção de escolas acolhedoras.

A escola, então, precisa de um projeto de base, ou seja, um pensar-agir com

um novo entendimento das contribuições que o inédito viável pode dar à inclusão do

educando com Síndrome de Down.

O pensar certo é crítico e esperançoso diante do futuro, pois não se fecha diante das condições históricas que nos desumanizam. A visão de mundo que reforça o valor do sonho e da utopia numa perspectiva da história como possibilidade é coerente com a forma de pensar a educação como um caminho para a emancipação dos oprimidos (FREIRE, 2008: 21).

Daí a inserção de uma educação dialógica proposta por Freire (1994, 2000)

que pretende ser libertadora, começando por sua própria coerência metodológica,

para que se desenvolva a educação inclusiva num contexto sócio-histórico-cultural.

Sendo assim, a inclusão conduz para a consolidação de ações que se situam do

ponto de vista do oprimido, como prática libertadora.

Propiciar a expansão da consciência critica dos envolvidos com uma

educação libertadora pode indicar a problemática da práxis pedagógica, provocar

debates a partir da realidade, evidenciada pelos aspectos sociais, políticos, culturais,

jurídicos, entre outros.

As concepções de Freire estão demonstradas em seus escritos e dão

destaque à capacidade ontológica, que é própria do ser humano de “ser mais”, de

superar as “situações-limites” na direção de um “sonho possível” – um inédito viável-

e este sugere ao educador um caminho valioso para a Inclusão.

Entretanto, nessa troca dialógica, não é permitido dar prioridade e/ou recusar

o outro, pois Freire demonstra em suas palavras um enorme e constante respeito ao

outro. “(...) respeita no outro o direito de também julgar certo. Tenta convencer e

converter, e não esmagar o oponente (...)” (FREIRE 2003:58).

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A educação tradicional, historicamente, tem sido pautada na homogeneização

dos educandos. As pessoas com deficiência têm enfrentado dificuldades para

transpor barreiras por não serem iguais às outras. Na escola tradicional, então, a

prática educativa em relação a esses educandos tem exigido um grande esforço dos

mesmos para que consigam alcançar comportamentos sociais controlados, quando,

na verdade, deveria proporcionar a essas pessoas conhecimento suficiente para que

pudessem conduzir sua própria vida.

Diante dessa constatação em relação à escola tradicional, é real que se veja,

ainda hoje, um modelo assistencial e dependente que se revela em perigo, pois,

segundo FREIRE:

[...] o grande perigo do assistencialismo está na violência do seu antidiálogo, que impondo ao homem mutismo e passividade, não lhe oferece condições especiais para o desenvolvimento ou a „abertura‟ de sua consciência que, nas democracias autênticas, há de ser cada vez mais crítica [...] O assistencialismo [...] é uma forma de ação que rouba ao homem condições à consecução de uma das necessidades fundamentais de sua alma - a responsabilidade (1994: 57-58).

O que se defende aqui como inclusão parte da idéia de experiências

significativas, pois surgem da realidade e das necessidades daqueles que as

exercitam; inéditas por se tratar de uma invenção até então inexistente e

emancipadora, considerando o caráter coletivo que motiva tal realização, o que

Freire chama de inédito viável. Na Pedagogia do Oprimido, o termo é concebido por

Freire (1994:107) como o “[...] inédito viável, que não pode ser apreendido no nível

da „consciência real‟ ou efetiva, se concretiza na „ação editanda‟9, cuja viabilidade

antes não era percebida”.

Na perspectiva freireana, o sujeito está em constante busca pela superação

de inúmeros obstáculos apresentados ao longo da trajetória da vida, em prol da

concretização de seus objetivos. E como a realidade é singular a cada pessoa, não

existe uma receita a ser seguida para dar conta da realização de tais entraves, o que

faz com que os indivíduos busquem com criatividade, de maneira individual ou

coletiva, a invenção de alternativas para driblar as imposições do poder

estabelecido, que atinge de forma direta aqueles que se encontram na planta baixa

da pirâmide social.

9 A propósito da „consciência real‟ e „ação editanda‟ ver Paulo Freire, Pedagogia do Oprimido. Rio de

Janeiro, RJ: Paz e Terra, 1974/13 ed,, 1994

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Ana Maria Freire, que escreveu a primeira nota da “Pedagogia da Esperança”

(2003), escreve que o “inédito viável” se configura como uma das categorias mais

importantes trabalhadas por Freire, porque provoca reflexões nos escritos da

“Pedagogia do Oprimido. Pouco estudada, essa categoria encerra nela toda uma

crença no sonho possível e na utopia que virão desde que os que fazem a sua

história assim queiram, esperanças bem práticas de Freire.

Nunca falo da utopia como uma impossibilidade que, às vezes, pode dar certo. Menos ainda, jamais falo da utopia como refúgio dos que não atuam ou [como] inalcançável pronúncia de quem apenas devaneia. Falo da utopia, pelo contrário, como necessidade fundamental do ser humano. Faz parte de sua natureza, histórica e socialmente constituindo-se, que homens e mulheres não prescindam em condições normais, do sonho e da utopia (FREIRE, 2003: 85).

As primeiras palavras contidas na “Pedagogia da Esperança” mostram-nos

claramente a convicção de Paulo Freire sobre a necessidade da esperança e do

sonho para a existência humana e a necessária luta para fazê-la melhor. “Não há

mudança sem sonho como sem esperança” (Freire, 2003:91). Daí Freire considerar

que a esperança é uma necessidade ontológica, pois sem um mínimo de esperança,

não se pode sequer começar o embate.

Freire alerta, entretanto, que atribuir à esperança o poder de transformar a

realidade seria um modo excelente de cair na desesperança, pois “enquanto

necessidade ontológica, a esperança precisa da prática para tornar-se concretude

histórica” (1994: 11). Assim, explica a necessidade de uma educação da esperança,

pois, “como programa, a desesperança nos imobiliza e nos faz sucumbir no

fatalismo onde não é possível juntar as forças indispensáveis ao embate recriador

do mundo” (1994: 10).

Esse “inédito viável” é, pois, em última instância, algo que o sonho utópico

sabe que existe, mas que só será conseguido pela práxis libertadora que pode

passar pela teoria da ação dialógica de Freire, na reinvenção de cada ato na ação

mesma da luta e da interpretação de sua humanidade, ou por outras que pretendam

os mesmos fins ou objetivos. Esta é também a analogia de Freire (2000: 119): “O

futuro não nos faz. Nós é que nos refazemos na luta para fazê-lo”.

O “inédito viável”, na perspectiva de Ana Maria Freire, é assim compreendido:

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Uma palavra que traz nela mesma o germe das transformações possíveis voltadas para um futuro mais humano e ético. Uma palavra que carrega no seu âmago, crenças, valores, sonhos, desejos, aspirações, medos, ansiedades, vontades e possibilidade de saber, fragilidade e grandeza humana (FREIRE, 2000: 15).

Assim, no “inédito viável” de Freire, a utopia a ser concretizada via ação educativa

emancipatória, em muito se assemelha com a categoria inclusão, explicitada

detalhadamente por Marques:

Muitas condições sociais têm sido consideradas e tratadas como desviantes, fato que reflete, nas diversas situações, um julgamento social que se requinta na medida em que a sociedade se aprimora tecnologicamente em função de valores e atitudes culturais específicas (MARQUES, 2006: 2).

Em algumas sociedades, ser deficiente representa uma condição de

subalternidade de direitos e de desempenho de funções sociais. É nesse sentido

que se manifestam nas diversas formas de controle, discriminação e opressão,

atitudes contra as quais Paulo Freire sempre se posicionou de forma contundente.

Em outras palavras: “inédito viável” é a possibilidade ainda inédita de ação, é

a futuridade histórica que não pode ocorrer se não for superada a situação-limite,

transformando a realidade com a práxis.

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CAPÍTULO III

HISTÓRIA DA PESQUISA

A busca por qualificação em todas as profissões é uma constante. Para o

educador não é diferente, diante disso começamos a frequentar um curso de

qualificação em nível de especialização. Durante o processo, a aproximação,

especialmente com um adolescente com Síndrome de Down, foi gratificante. Esse

estreitamento possibilitou a percepção do quanto essas pessoas se relacionam e

demonstram determinadas habilidades, que poderiam ser ampliadas em escolas

regulares, uma vez que não era comum a presença de educandos com Síndrome de

Down nestas instituições.

Ao terminar o curso de especialização, surgiu a oportunidade do trabalho em

uma escola pública de Ensino Básico numa sala de apoio pedagógico10, atendendo

a estudantes em horário contrário às aulas da sala regular.

Diante da proposta de inclusão realizada pelo Ministério de Educação e

Cultura (MEC), era perceptível que estava acontecendo a matrícula de educandos

com Síndrome de Down na instituição na qual trabalhava. A partir daí, a curiosidade

em saber (informalmente) dos colegas-professores como era o trabalho com a turma

em que havia os referidos educandos, até porque, através desse trabalho, isso não

era possível, visto que o trabalho era realizado individualmente (professor-

educando).

As dúvidas foram se intensificando no cotidiano da escola, assim como a

busca por possíveis respostas para a curiosidade que crescia e acreditamos que as

possíveis respostas poderiam ser encontradas na investigação científica. Foi quando

surgiu a oportunidade de cursar o Mestrado e, a partir dele, a realização dessa

pesquisa.

10

Por sala de apoio pedagógico, este estudo entende o postulado mediante o atendimento em

horário diferenciado trata-se de uma modalidade de atendimento pedagógico a ser desenvolvida no ensino regular, destinada a alunos com dificuldades de aprendizagem e que não são portadores de deficiência ou de problemas de conduta. (BRASIL, 1994:)

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Nos últimos anos, temos ouvido frequentemente a frase “a inclusão de

estudantes com deficiência nas escolas regulares”. Mas o que entender por

inclusão?

Recorremos nesse primeiro momento a Mantoan (2003) que aponta que a

inclusão prevê a inserção escolar de forma radical, completa e sistemática a todos

os alunos sem exceção, às salas de aula do ensino regular. Neste sentido, a escola

precisa compreender que não é a criança que necessita adaptar-se a ela, mas o

inverso. No que tange à literatura, Ferreira (1998), Omote (2006), Sassaki (1997),

Jannuzzi (1992), colocam que na educação de alunos com deficiência é notória a

segregação e a exclusão sofrida por pessoas com deficiência, fato que vem

preocupando educadores conscientes da importância da formação integral para a

vida de qualquer ser humano.

Neste sentido, Ferreira (1998:7-15) aponta que o alinhamento das propostas

brasileiras com a tendência da chamada escola inclusiva e das necessidades

especiais favorece mais a linha da "educação + escola comum" do que a da

"assistência social + instituição especializada", para a ampla maioria dos alunos

potenciais.

Nessa perspectiva, buscar compreender o processo de inclusão do educando

com Síndrome Down na escola regular, objetivo deste estudo, propicia o encontro

com a proposta do “inédito viável” de Paulo Freire, uma vez que demonstra a

“crença no sonho possível”.

Devemos nos atentar para o fato de que inclusão não se trata de mais um

modismo pedagógico, mas uma realidade urgente, uma postura educacional que

encontra constantes desafios, podendo, com isso, ser comparada a uma utopia.

Entretanto, esse “impossível realizável”11 nos instiga a continuar, a buscar, a

favorecer a consolidação desta nova postura teórica e metodológica para que a

inclusão não atinja somente o contexto escolar, mas principalmente a sociedade,

possibilitando a convivência, a participação, as relações sociais entre todos os

indivíduos.

É nesse contexto que a inclusão vem a ser “algo „percebido‟ e „destacado‟ da

vida cotidiana que, não podendo e não devendo permanecer como tal, passa a ser

11

Pensamento de Freire encontrado nas obras: Pedagogia do Oprimido (2003) e Pedagogia da

Esperança (1994)

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um problema que deve e precisa ser enfrentado, portanto, deve e precisa ser

discutido e superado” (FREIRE, 1992:206).

Inicialmente nossa preocupação era trabalhar com a inclusão em um aspecto

geral. Contudo, dada uma questão temporal, compreendemos ser mais exequível

delimitar sobre a “inclusão do educando com síndrome de Down”.

Diante dessas considerações, é importante salientar que os motivos pelos

quais aconteceu o recorte da “deficiência” a tratar nesse estudo configuraram-se

pelas características aparentes que a pessoa com Síndrome de Down apresenta,

predominante e perceptível “um atributo diferencial visível constituído pelo fenótipo

da própria síndrome e pelos atos que realiza devido a presença da deficiência

mental” (SAAD, 2003:153).

Metodologia

Definido o problema, para verificarmos a dificuldade de fazer a inclusão do

educando com Síndrome de Down na escola de Cacoal, foi necessário demarcar um

caminho que fosse o fio condutor no processo de investigação dessa pesquisa, para

que, à luz da ciência, pudéssemos compreender o problema constituído. Assumido o

rumo, este caminho permitiu um diálogo com professores, mães e colegas dos

educandos com Síndrome de Down de maneira que possibilitou a compreensão da

prática de inclusão percebida por eles na escola, como também, dentre outros

aspectos, a possibilidade e consequência da inclusão, a prática utilizada no

cotidiano da sala de aula, a formação do professor para a prática da inclusão, a

percepção das mães sobre a educação do filho e a dos educandos sobre o colega

com Síndrome de Down.

Inicialmente, foi preciso compreender em que medida a inclusão contribui

para a formação social e escolar a partir da perspectiva dos participantes envolvidos

diretamente nesta análise. Para tanto, elaboramos registros descritivos (notas de

campo) minuciosos do que foi observado, o que se mostrou uma ação enormemente

delicada para a pesquisadora-observadora, frente a um objeto que se relaciona às

emoções e sentimentos humanos, que faz a transmutação do físico para o

emocional, envolvendo todos no seu entorno.

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Material organizado, traçamos um caminho investigativo na perspectiva

qualitativa e fenomenológica. A pesquisa qualitativa, assim entendida, como em

Bogdan e Biklen (1994:47-50):

Na investigação qualitativa a fonte directa de dados é o ambiente natural, constituindo o investigador o instrumento principal; A investigação qualitativa é descritiva; Os investigadores qualitativos interessam-se mais pelo processo do que simplesmente pelos resultados ou produtos; Os investigadores qualitativos tendem a analisar os dados de forma indutiva; O significado é de importância vital na abordagem qualitativa.

E a pesquisa fenomenológica, para melhor descrever as observações

colhidas, pactua conforme Schultz e Schultz (2002: 318), “noção da percepção é

subjetiva”. Esta noção – a da percepção - é antiga e não é exclusiva de Rogers.

“Essa idéia, chamada fenomenologia, argumenta que a única realidade da qual

podemos estar seguros é o nosso próprio mundo de experiências, a nossa

percepção interna da realidade”. Os autores continuam esclarecendo que:

A abordagem fenomenológica na filosofia refere-se a uma descrição imparcial de nossa percepção consciente do mundo, exatamente como ele ocorre, sem nenhuma tentativa de nossa parte de interpretação ou análise. Na visão de Rogers, o ponto de vista mais importante sobre o nosso mundo experiencial é que ele é particular e, dessa forma, pode ser completamente conhecido somente por nós (SCHULTZ E SCHULTZ, 2002: 318).

É importante ressaltar, ainda sobre a perspectiva fenomenológica, que não

existe objeto sem sujeito e sujeito sem objeto, ou seja, “o mundo do sujeito, as suas

experiências cotidianas e os significados atribuídos às mesmas são, portanto, os

núcleos de atenção da fenomenologia” (André, 1998:18), onde não existe, em

momento algum, uma cisão, uma divisão precisa entre objeto e sujeito.

Minayo (2000:18) preconiza que na fenomenologia é preciso penetrar no

universo conceitual dos sujeitos para poder entender como e que tipo de sentido

eles dão aos acontecimentos e às interações sociais da vida diária. É o sentido dado

às experiências que constitui a realidade – a realidade socialmente construída. Daí a

busca da pesquisadora, que tenta compreender o sentido do processo de inclusão

de crianças com Síndrome de Down em instituições escolares, enfatizando, nos

discursos dos professores, pais e colegas a percepção de como se dá a prática de

inclusão escolar para esses atores sociais.

Desta forma, descrever a vivência do outro é, pois, o interesse da pesquisa

fenomenológica. E esta percepção deverá ser de acordo total com sua linguagem,

ou todos os tipos de expressão que o observado tem a demonstrar. E, para captar

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as informações, o pesquisador não é neutro, pela não dicotomia sujeito/objeto.

Conforme orienta Rogers, a experiência do pesquisador é o mais importante, porque

ela valida seus argumentos.

Assim, com as ferramentas adequadas, por meio de observação

participante, entrevistas individuais, abertas/semi-estruturadas; registro de áudio e

questionário semi-aberto principiamos a ler a prática pedagógica denominada

inclusão no ambiente do cotidiano real de trabalho: a escola. Neste espaço, as

situações, os problemas e os acontecimentos advindos da prática estiveram imersos

num contexto, num ambiente “natural”, ou seja, fora de um ambiente organizado

artificialmente. Portanto, foram investigados em toda sua complexidade e

entendemos que “as ações podem ser melhor compreendidas quando são

observadas no seu ambiente habitual de ocorrência” (BOGDAN & BICKLEN, 1994:

48).

A pesquisa teve início com a visita à instituição-escola, especializada em

atendimento à pessoa com deficiência, objetivando a obtenção de informações a

respeito de pessoas com Síndrome de Down. No decorrer da mesma, constatamos

que o Centro de Reabilitação Neurológica Infantil de Cacoal - CERNIC12 realizava

atendimento a 21 (vinte e uma) pessoas com esta síndrome, das quais 8 (oito) eram

bebês, 8 (oito) adultos e 4 (quatro) crianças entre 8 e 10 anos de idade.

No que tange aos 4 (quatro) educandos em idade escolar e freqüentando a

escola regular, constatamos que 1 (um) estava matriculado em escola pública

estadual, 1 (um) em escola pública municipal e 2 (dois) em escola particular.

Sendo assim, os educandos com Síndrome de Down, matriculados nas

referidas instituições de ensino regular, nortearam a efetivação desse estudo. A

partir deles, chegamos aos participantes da pesquisa: professoras, mães e colegas.

Vale ressaltar que, antes do início da coleta de dados, foi solicitado aos

participantes consentimento para realização da mesma e todos foram esclarecidos

sobre o objeto, objetivo e período da pesquisa. Foram descritos aos participantes os

métodos de coleta de dados (observação, questionário e entrevista) e os materiais

(caderno de campo, MP3). Salientamos aos participantes que os dados coletados

seriam utilizados exclusivamente em caráter acadêmico-científico e a desistência em

colaborar com o estudo poderia se dar a qualquer momento.

12

Deste ponto em diante o Centro de Reabilitação Neurológica Infantil de Cacoal passará a ser

tratado por CERNIC

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Os participantes do estudo foram professoras, mães e colegas, assim como

os educandos com Síndrome de Down, cada componente tratado por nome fictício.

Demos início à coleta de dados, identificando as instituições escolares dos

referidos educandos e iniciando a fase de observação, realizada no período normal

de aulas, ressaltando que eram observados as professoras e colegas: a participação

do educando com Síndrome de Down nas atividades escolares na sala de aula; o

atendimento dispensado a ele pela professora e colegas; o ambiente de

aprendizagem; recursos disponibilizados para a facilitação de sua aprendizagem.

Enfim, fatores externos que propiciavam ou não a aprendizagem.

Durante o processo de observação e coleta de dados, as professoras

participantes desta pesquisa receberam um questionário (Anexo 1, p: 98). O objetivo

foi o de demonstrar o perfil censitário dos participantes da pesquisa. Para tanto,

elaboramos o documento nas seguintes categorias: dados pessoais e econômicos,

profissão, número de moradores na residência, experiência profissional, formação

acadêmica, apresentados no Quadro 3 (p.50).

No que se refere às entrevistas com as mães, foram tomados os seguintes

procedimentos: agendamento; apresentação da pesquisa, enfocando objeto e

objetivos; preenchimento do questionário censitário (Anexo 2, p: 99) apresentados

no Quadro 4 (p: 51) e, posteriormente, a entrevista.

Numa segunda fase do processo de coleta de dados, ainda durante o período

de observação, após quatro dias de observação elegemos, por critério de

proximidade com o educando com Síndrome de Down, um dos colegas para

posterior entrevista. Os dados coletados podem ser apreciados no Quadro 5 (p. 52).

Nessa fase do processo, também foram agendadas as entrevistas,

procedimento que se deu em horário proposto pelo participante.

Detalhamos os perfis censitários e contextualizamos, também, as escolas que

compuseram o campo da pesquisa. Os dados foram coletados no segundo semestre

de 2008. Formaram este contexto 12 (doze) pessoas, das quais 4 (quatro) são

professoras, 4 (quatro) mães e 4 (quatro) colegas. Iniciamos por demonstrar o perfil

das professoras participantes da pesquisa.

1. Das participantes-professoras:

Aretha é professora da rede estadual de ensino, pedagoga com habilitação

para trabalhar nas séries inicias, cursou especialização em Educação Ambiental e

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trabalha como professora há 15 anos. É efetiva na Secretaria Estadual de Educação

de Rondônia - SEDUC - com 40 horas semanais. No período correspondente à

coleta de dados, a referida professora lecionava para uma turma composta de 19

(dezenove) educandos, no 2º ano do Ensino Fundamental, turno vespertino. Dentre

seus educandos, apenas um apresentava a deficiência focada neste trabalho.

A Professora Jade leciona há mais de 5 a 10 anos na rede municipal de

ensino. É pedagoga, com especialização em Psicopedagogia. Durante o período de

coleta de dados, relatou cursar especialização em Educação Especial. É concursada

na Secretaria Municipal de Educação e Cultura do município de Cacoal-RO, para

trabalhar 40 horas semanais. A referida educadora chamou bastante atenção, uma

vez que se destaca das demais aqui relacionadas por demonstrar especial interesse

em estar em constante qualificação. Segundo relato próprio, a mesma realiza cursos

de capacitação em feriados, no período noturno e, às vezes, conta com apoio da

escola na qual trabalha para realizá-los até mesmo em horário de trabalho.

A Professora Jade, no período da coleta de dados, lecionava para duas

turmas do 3º ano do Ensino Fundamental, nos turnos matutino e vespertino, com 28

alunos, respectivamente, sendo que, somente na turma do turno matutino, a

professora atendia a três educandos com deficiência: um com Síndrome de Down,

um deficiente auditivo e um deficiente mental.

No que se refere à Professora Helena, constatamos que seu tempo de

trabalho no magistério é de 5 a 10 anos. No período matutino, a referida professora

lecionava numa escola particular; no período vespertino, era inspetora de pátio

numa escola pública. Em relação ao trabalho por ela desenvolvido na instituição

educacional particular, elemento de interesse desta pesquisa, verificamos que

estava lotada numa turma de 3º ano do Ensino Fundamental, composta por 14

alunos, tendo como caso especial um único educando - Síndrome de Down. Nesta

instituição, sua jornada de trabalho era de 20 horas semanais. No que tange à sua

qualificação, é pedagoga, com habilitação para as séries iniciais, curso realizado por

uma instituição de ensino a distância e ainda não tem especialização.

A professora Sâmara é pedagoga, seu tempo de trabalho no magistério é de

5 a 10 anos. Trabalha em escola pública e particular. Na instituição escolar

particular, era professora da turma de 5º ano do Ensino Fundamental com 17 alunos

matriculados cumprindo uma jornada diária 4 horas de trabalho, totalizando 20 horas

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semanais. E para complementar a renda, trabalhava como professora substituta em

uma escola pública. Possui especialização em Visão Interdisciplinar.

No Quadro 3, a demonstração do perfil censitário das professoras

participantes da pesquisa:

Quadro 3 – Descrição do perfil censitário das professoras participantes da

pesquisa.

Participantes

Sexo

Escola

Alunos

Graduação

Rede de Ensino

Especialização

Tempo de magistério

Aretha Fem. Est. 19 Lic. em Pedagogia

Estadual Educação Ambiental

5 a 10 anos

Jade Fem. Mun. 28 Lic. em Pedagogia

Municipal Psicopedagogia 5 a 10 anos

Helena Fem. Part. 14 Lic. em Pedagogia

Particular _ 5 a 10 anos

Sâmara Fem. Part. 17 Lic. em Pedagogia

Particular Visão Interdisciplinar

1 a 5 anos

2. Das participantes mães dos educandos com Síndrome de Down:

No que se refere à coleta de dados com as mães dos educandos, iniciamos

com Ivete, mãe de Gabriela, que possui nível de escolaridade de 1º grau incompleto

e não trabalha fora. Reside em bairro periférico, onde, em geral, moram famílias de

baixa renda. Sua residência é alugada e a família compartilha o mesmo terreno com

outras quatro pequenas casas, o que consideram as chamadas “vilas”. Seu bairro

não possui saneamento básico, apenas coleta de lixo. Quanto ao ambiente interno

de sua moradia, pudemos notar que as acomodações são minúsculas em

comparação ao número de moradores: são apenas um quarto de dormir e uma

cozinha-sala para cinco pessoas, sendo dois adultos (pai e mãe) e três crianças

(com 2, 4 e 10 anos). O banheiro, por sua vez, trata-se de um ambiente de uso

coletivo das pessoas residentes na “vila” e situa-se fora da casa. Numa observação

mais minuciosa do ambiente interno da casa, não encontramos aparelho televisor,

computador ou qualquer outro aparelho tecnológico que promovesse informação

e/ou entretenimento. O único meio de locomoção que a família dispõe é uma

bicicleta. Ivete está gestante do quarto filho. No que tange à renda mensal, podemos

destacar que o pai, trabalhador braçal, recebe aproximadamente R$ 500,00

(quinhentos reais) que são somados a R$ 415,00 (quatrocentos e quinze reais)

referentes à aposentadoria de Gabriela.

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A mãe de Heros, Margarete, não concluiu o 1º grau. Trabalha como

empregada doméstica aproximadamente 12 horas diárias, de segunda a sábado.

Reside também em bairro periférico, com as mesmas características descritas no

caso anterior. Sua residência é alugada, de madeira, mal conservada, composta de

dois quartos, sala, cozinha, área de serviço, banheiro, piso “queimado”. Convivem

no recinto 4 (quatro) pessoas, sendo 1 (um) adulto, e 3 (três) adolescentes, com 10,

12 e 17 anos. A casa é murada e o ambiente é restrito à família. A família possui

uma televisão, único recurso que propicia informação/entretenimento a todos. Como

meio de locomoção, a família dispõe tão somente de uma bicicleta. A renda familiar

é de 2 (dois) salários mínimos, sendo 1 (um) salário proveniente do seu trabalho e o

outro da aposentadoria de Heros.

Aparecida, mãe de Felipe, tem o 2º grau completo e não trabalha fora. A

renda familiar corresponde a 3 (três) salários mínimos, a residência da família é

própria e residem na casa 4 (quatro) pessoas.

A moradia da família de Felipe não pôde ser descrita porque a mãe preferiu

conceder a entrevista na escola, em razão da praticidade de seu tempo.

Cláudia, mãe de Marina, é autônoma, tem o 1º grau completo. Seu horário de

trabalho corresponde a 12 horas diárias. A residência da família é própria, está

situada em bairro centralizado, sendo a casa de alvenaria, em bom estado de

conservação, composta por sala, cozinha, dois banheiros, três quartos, varandas e

quintal. A renda familiar corresponde a 3 (três) salários mínimos e moram na casa 3

(três) pessoas.

Quadro 4 – Descrição do perfil censitário das mães participantes da pesquisa

Mães

Nº de

Moradores na

residência

Grau de

escolaridade

Renda familiar

Profissão

Tipo

Moradia

Ivete

5

1º Grau Incompleto

Até 2 salários mínimos

Do lar

Alugada

Margarete

4

1º Grau

Incompleto

Até 2 salários mínimos

Doméstica

Alugada

Aparecida

4

2º Grau

Completo

Até 3 salários Mínimos

Autônoma

Própria

Claudia

3

2º Grau

Completo

Até 3 salários Mínimos

Do lar

Própria

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3. Das colegas dos educandos com Síndrome de Down. Segue o perfil,

das educandas entrevistadas:

Quadro 5 – Descrição do perfil censitário dos colegas dos educandos com

Síndrome de Down

Alunos

Escola

Idade

Sexo

Sério/Ano Ensino

Fundamental

Turno que frequenta escola regular

Patricia Est. 8 anos F 2º ano Vespertino

Hana Mun. 10 anos F 3º ano Matutino

Marceli Part. 8 anos F 3º ano Matutino

Raiza Part. 9 anos F 5º ano Matutino

Sistematizando algumas considerações, com base nos dados coletados, a

fim de traçar um breve perfil dos colegas participantes da pesquisa, temos: todos os

colegas estão cursando as séries iniciais do Ensino Fundamental (um no segundo

ano, dois do terceiro ano e um no quinto ano); a idades dos colegas estão entre 8 e

10 anos, sendo que dois têm oito anos; um estuda em escola pública estadual, um

em escola pública municipal e dois em escola particular; dois fazem atividades

complementares (aula de judô, flauta); todos são do sexo feminino.

Os estudantes com Síndrome de Down são quatro, matriculados nas quatro

primeiras séries do Ensino Fundamental de escolas públicas estaduais e municipais,

bem como de uma escola particular, são eles:

Gabriela tem 10 anos, frequenta o segundo ano do Ensino Fundamental. É o

primeiro ano que frequenta escola regular, sendo a primeira educanda com

Síndrome de Down nesta escola. Vai à escola de segunda à sexta-feira no período

vespertino e frequenta o CERNIC três vezes na semana (segunda, quarta e sexta-

feira). Ainda não consegue escrever seu nome e não está alfabetizada.

Heros está no terceiro ano do Ensino Fundamental, tem 10 anos. Começou a

frequentar o CERNIC aos quatro anos de idade e há dois anos frequenta escola

regular no período matutino. Dois dias da semana vai ao CERNIC no período

vespertino. Reconhece seu nome em atividades cotidianas e algumas letras do

alfabeto.

Felipe tem 10 anos de idade. Há quatro anos está incluso na escola regular, a

partir do pré-escolar. Estuda no período matutino todos os dias da semana na escola

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regular e, terça e quinta-feira no período vespertino, frequenta o CERNIC. Duas

vezes na semana faz aula de flauta. Reconhece todas as letras do alfabeto e

numerais até 10. Escreve seu nome em todas as atividades realizadas em sala de

aula.

Marina tem doze anos de idade, está inclusa em escola regular há seis anos,

na mesma escola. Estuda no período matutino todos os dias da semana e terça e

quinta-feira no período vespertino, frequenta o CERNIC. Realiza atividades

complementares como: balé e natação. Escreve e reconhece seu nome em

atividades cotidianas.

Quadro 6 – Dados referentes aos educandos com Síndrome de Down,

matriculados na sala regular das professoras participantes da pesquisa.

As escolas: ponto de chegada

Denominadas neste estudo respectivamente, estadual, municipal e particular,

as escolas consideradas como “ponto de chegada” desta pesquisa foram escolhidas

por atenderem os educandos com Síndrome de Down referidos anteriormente.

Solicitamos licença para a efetivação da pesquisa, apresentando à equipe

gestora (direção e/ou supervisão) a proposta da mesma, bem como o objeto,

objetivos e métodos. Nesse contexto, fomos atendidos prontamente e apresentados

aos professores que seriam participantes da pesquisa, fator esse que mostrou a

importância do tema e a necessidade de contextualização das instituições escolares.

Escola Estadual : Essa escola encontra-se localizada num bairro na periferia de

Cacoal-RO. Foi criada pela necessidade de atender a comunidade que, até então,

Alunos

Escola

Idade

Sexo

Sério/Ano Ensino

Fundamental

Turno que freqüenta escola regular

Gabriela Est. 10 anos F 2º ano

Vespertino

Heros Mun. 10 anos M

3º ano

Matutino

Felipe Part. 10 anos M 3º ano Matutino

Marina Part. 12 anos F 5º ano

Matutino

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frequentava escolas de bairros vizinhos. A partir de sua criação, oferece à

comunidade Cacoal, Ensino Fundamental de 09 anos com a proposta do Projeto

Caminhar para os 3 primeiros anos (Ciclo Básico de Aprendizagem); Ensino

Fundamental (4ª ao 9ª ano) e a Educação de Jovens e Adultos - Telensino Ensino

Fundamental (6ª à 9ª séries) e Telensino Ensino Médio.

No período em que aconteceu a pesquisa, a escola contava com o número de

457 alunos matriculados nos turnos matutino, vespertino e noturno. Salientamos que

a maior parte dos alunos frequentava o Ensino Fundamental regular e estudava no

período diurno.

Os professores dos anos iniciais (1º ao 5º ano) da escola são concursados e

trabalham 40 horas semanais: 20 horas são destinadas a planejamento e

recuperação paralela. A escola conta, ainda, com uma sala de apoio pedagógico.

Não há recreio, as crianças saem da sala apenas para lanchar, ir ao banheiro e

tomar água, retornando em seguida para a sala, sempre sob a olhar do professor.

Escola Municipal : A escola Municipal está localizada em bairro periférico, distante

da localização da escola estadual, contudo, atende uma clientela de nível social

pouco favorecido. A escola oferece à comunidade de Cacoal desde o Pré-escolar

(nível 1 e 2) até o Ensino Fundamental (5º ano). As turmas são distribuídas nos

turnos matutino e vespertino, perfazendo um total de 993 alunos em 2008. A escola

não conta com sala de recursos13 e nem com profissional para apoiar o professor,

também não disponibiliza recuperação paralela e/ou reforço escolar, pois os

professores não têm horário de planejamento que contemple essas ações. A jornada

de trabalho dos professores corresponde a 40 horas semanais.

Escola Particular: A Escola particular é uma instituição confessional cristã. Toda a

sua filosofia e ação estão ligadas às visões bíblica e cristã de mundo, homem,

sociedade, conhecimento e educação. Esta situa-se no Centro de Cacoal-RO e seus

alunos estão distribuídos no período matutino e vespertino. É de Educação Básica,

com atendimento a alunos desde a Educação Infantil até o Ensino Médio. Conta com

13

Sala de Recursos: As salas de recursos multifuncionais são espaços da escola onde se realiza o

atendimento educacional especializado, especificamente para portadores de necessidades educacionais especiais, por meio do desenvolvimento de estratégias de aprendizagem, centradas em um novo fazer pedagógico que favoreça a construção de conhecimentos pelos alunos, subsidiando-os para que desenvolvam o currículo e participem da vida escolar. (ALVES, 2006:13)

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aulas complementares, como: Educação Religiosa, Educação Física e Inglês e são

ministradas por professores diferenciados, durante o horário normal de aulas.

No período em que aconteceu a pesquisa, a escola contava com o número de

530 alunos, os quais estavam distribuídos no período matutino e vespertino. Esta

escola não oferece aulas de reforço em outro horário e não dispõe de sala de

recursos e/ou de apoio pedagógico. Conta com horário de recreio de 20 minutos,

nos quais os alunos ficam no pátio (todas as turmas do 1º ao 5º ano) com outros

profissionais, enquanto os professores têm o “momento do cafezinho”.

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CAPÍTULO IV

LIMITES E DESAFIOS DO PROCESSO DE INCLUSÃO DE DEFICIENTES COM

SÍNDROME DE DOWN NAS ESCOLAS DE CACOAL-RO

Os limites e desafios do processo de inclusão de educandos com Síndrome

de Down serão demonstrados neste estudo, a partir das vozes dos participantes da

pesquisa: professoras, mães e colegas desses educandos e das observações em

campo. Para tanto, utilizamos um caminho investigativo fundado na pesquisa

qualitativa e fenomenológica, com os seguintes instrumentos: observação,

entrevistas individuais, abertas/semi-estruturadas, registro de áudio e questionário

semi-aberto. Os instrumentos da pesquisa possibilitaram dar vozes aos participantes

na medida em que foram coletados os dados sem que os mesmos fossem

direcionados e/ou induzidos às respostas. Sendo assim, professoras, mães e

colegas dos educandos com Síndrome Down puderam expressar-se de maneira

muito particular as experiências que vivenciaram.

De posse dos dados, foi difícil e instigante a tarefa de interpretá-los, porque,

segundo Bogdan & Biklen (1991:220), é compreensível por termos a nossa frente

todo o material que diligentemente recolhemos e, então, instala-se um sentimento

de vazio quando nos perguntamos: “E agora, o que fazer?”.

No primeiro momento, pensamos em sistematizar os dados, a partir das

escolas (estadual, municipal e particular) por entendermos que os dados seriam

melhor demonstrados e interpretados. Como percebemos que as respostas não se

distinguiam muito umas das outras, resolvemos interpretar os dados com base na

sistematização pelas amostras, a saber: professoras, mães e colegas das três

escolas respectivamente – estadual, municipal e particular - onde os educandos

com Síndrome de Down, em idade escolar estavam matriculados.

É importante relatar, num contexto histórico, que em tempos antigos, nem

mesmo as crianças que tinham o desenvolvimento cognitivo e emocional aptos para

o seu crescimento tinham escola garantida em todos os pontos do país.

Observamos nos relatos bibliográficos que as crianças que apresentassem

qualquer tipo de limitação não tinham acesso à escola e o próprio meio escolar

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rejeitava-as. Paulo Freire (2003:102) relata que o afastamento das crianças é uma

forma de interdição do corpo, o que ele chama de Ideologia da Interdição do Corpo.

Um afastamento que é real, pela ausência notada nas estatísticas e a não menção

do discurso oficial, porque, ao se falar, divulgar uma determinada questão, ela ganha

visibilidade.

Assim, a política educacional ignorou o assunto, para que a própria família

desse conta de seu drama: a interdição do corpo-limitação do espaço; discussão do

tema nas pautas de debates sobre educação; não divulgação de pesquisas se é que

elas aconteceram; negação de vida útil.

Com base nestas observações, Freire (2003:102) faz a seguinte definição em

seu estudo:

Foi essa ideologia que denominei „ideologia da interdição do corpo‟, entendendo-a, pois, como a que „explicando‟ o fenômeno da não ocupação do espaço privilegiado de escola pela inferioridade intrínseca, pela incompetência de quem não os ocupa, camufla, como faz todo discurso ideológico dominante, porque é a voz da classe dominante, as verdadeiras razões das interdições. Essas, as interdições e aquele, o discurso político e econômico da nossa sociedade, pelo modo como ela, sociedade, vem produzindo a sua existência.

Diante de todo o contexto histórico de mudança que vem estruturando no

sistema de educação no Brasil e no mundo, no século XXI, restou às crianças com

Síndrome de Down serem encaminhadas pela família à escola, uma vez estas as

viam como cidadãs e, portanto, brasileiras com todos os direitos, rompendo,

inicialmente pelo amor, a ideologia dominante da interdição do corpo/presença da

criança do meio escolar. Desesperadas e apaixonadas por seus filhos, acreditam e

lançam agora, na escola, suas esperanças.

Neste contexto que ora vivenciamos, temos os professores, geralmente

professoras que, por seu impulso natural de mulher, em sua maioria, amam os

educandos e pensam poder fazer um bom trabalho.

Embora com toda essa expectativa, a maioria possui, no cotidiano escolar,

uma sobrecarga de trabalho e tantas atividades para construírem antes de entrar na

sala de aula. Isso sem falar na vida particular. Desta forma, as profissionais

começam a enxergar que não é tão fácil quanto parecia. Só o amor não constrói

nessa situação. Começam a sentir a necessidade de preparação especial para

desenvolver o trabalho pedagógico, até porque não tiveram na graduação,

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disciplinas e metodologias que norteassem a práxis com o educando com Síndrome

de Down.

Um dos grandes desafios a serem rompidos é o posicionamento que o

professor tem sobre si mesmo e de sua tarefa. Educar não é, afinal, transformar? De

que forma o professor operaria essa transformação, se não percebe, e não teve

condições instrucionais para criar novos métodos, derrubar paradigmas, criar

caminhos a partir da percepção de mundo do educando com Síndrome de Down?

Essas respostas ele teria com o que já aprende no dia-a-dia como educador,

mas são imprescindíveis condições educacionais para fazê-lo. Uma formação

substancial em Filosofia, Psicologia, Antropologia, Metodologia da Ciência, dentre

outros conhecimentos.

Quase completamente enfraquecido nas bases epistemológicas, na rede de

saberes necessários para o educador criar, debate-se repetindo antigas fórmulas e,

o que o prejudica muito, pensando que inclusão é igualdade, homogeneidade ou um

direito que vem por natural do cidadão comum, o que não é tão fácil, conforme a

reflexão de Paulo Freire (2003: 98) sobre a questão da igualdade entre os homens:

Diferentemente dos outros animais que não se tornaram capazes de transformar a vida em existência, nós, enquanto existentes, nos fizemos aptos a nos engajarmos na luta em busca e em defesa da igualdade de possibilidades pelo fato mesmo de, como seres vivos, sermos radicalmente diferentes uns dos outros e umas das outras.

Ponto de vista que também é comungado por François Jacob apud Freire

(2003: 98):

Nós somos todos diferentes e a maneira como se reproduzem os seres

vivos é programada para que o sejamos. É por isso que o homem teve a necessidade, um dia, de fabricar o conceito de igualdade. Se nós fôssemos todos idênticos, como uma população de bactérias, a idéia de igualdade seria perfeitamente inútil.

Mães e professoras, então, acreditam em uma vida mais humanizada para o

educando e, na inclusão, como meio. Crêem, portanto, no sonho. Freire (2003:99),

novamente, dá-nos condição para entender o processo:

O sonho pela humanização, cuja concretização é sempre processo, e sempre devir, passa pela ruptura das amarras reais, concretas, de ordem econômica, política, social, ideológica etc., que nos estão condenando à desumanização. O sonho é assim uma exigência ou uma condição que se

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vem fazendo permanente na história que fazemos e que nos faz e re-faz. Não sendo um a priori da história a natureza humana, que nela se vem constituindo, tem, na vocação referida, uma de suas conotações.

Sonho, no entanto, não basta. Já vimos anteriormente o desafio que

representa transpor os limites epistemológicos que impedem o professor de

transformar. Ele precisa de mais. Necessita de consciência de classe, de participar

sem medo de decisões da política educacional do país. E isso mostra a

complexidade que envolve a inclusão de educandos com Síndrome de Down. Logo

a seguir, Freire endossa essa complexidade:

Homens e mulheres, ao longo da história, vimo-nos tornando animais deveras especiais: inventamos a possibilidade de nos libertar na medida em que nos tornamos capazes de nos perceber como seres inconclusos, limitados, condicionados, históricos. Percebendo, sobretudo, também, que a pura percepção da inconclusão, da limitação, da possibilidade, não basta. É preciso juntar a ela a luta política pela transformação do mundo. A libertação dos indivíduos só ganha profunda significação quando se alcança a transformação da sociedade (FREIRE, 2003:100).

Nos jornais, não é incomum a notícia de mães que aprisionam seus filhos,

porque não têm condições de cuidar deles, principalmente se já são adultos. Essa

situação faz com que a mãe da pessoa anteveja o que o futuro lhe reserva e fica no

limite entre seu próprio eu e o do filho ou filha. Mais ou menos como nos orienta

Paulo Freire (2003:100): “Não sou se você não é, não sou, sobretudo, se proíbo

você de ser.”

A dificuldade da mãe persiste, porque as questões que envolvem a inclusão

não foram ainda bem resolvidas, embora, por lei, as escolas tenham que se abrir

para os educandos. Dentre as questões por resolver estão o espaço físico, direitos

aos quais o educando deveria ter acesso, como saúde especializada, entre outros.

Mesmo que a lei tenha garantido a vaga do educando, as dificuldades se

sucedem e podemos, na análise das relações estabelecidas entre professores e

colegas dos educandos com Síndrome de Down, divisar duas situações: o que

representa um limite e aquilo que deverá ser um desafio, superado ou não, ou seja,

um desafio que pode retornar à situação de limite para a inclusão do educando ou

transposição da barreira. Aparecem no confronto limite e desafio, reações/emoções

envolvidas que deverão ser interpretadas à luz da categoria inédito viável de Paulo

Freire.

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Para tanto, sistematizamos os dados que demonstram os olhares de cada

participante da pesquisa, assim apresentados: questões/respostas das entrevistas,

complementadas com as notas de campo das observações, acompanhadas de

análises.

Inicialmente, as professoras foram questionadas sobre: como se dá e quais

são as práticas de inclusão desenvolvidas em sua escola? Mediante a referida

pergunta, obtivemos as seguintes respostas:

Os trabalhos de inclusão que posso perceber são aqueles desenvolvidos na sala de aula e na da sala de apoio. Na escola como um todo, não percebo a prática de inclusão. As pessoas tentam se envolver, mas... A inclusão pra mim é assim... a gente recebe as crianças em sala e trabalha com elas. (Aretha)

A professora descreve que há trabalho de inclusão em sua escola, uma vez

que o mesmo se dá em sala de aula e sala de apoio. Muito embora o ambiente

educacional não se restrinja somente a esses dois segmentos, notamos em sua fala

que é somente nestas salas que há trabalhos mediados por ações inclusivistas. E

nem todos os envolvidos no contexto escolar contribuem com o processo de

inclusão em sua escola.

Percebemos em sua postura de negação uma marca discursiva de grande

impacto. As reticências ratificam o seu não crédito e arrefecimento da convicção.

Para complementar a análise de seu discurso, nos reportamos às nossas

notas de campo, uma vez que lá registramos que a inclusão na turma dessa

professora não tem se efetivado, pois a educanda com Síndrome de Down apenas

“está na sala de aula”. (Apêndice 1, NC 1, p: 104).

Frente a essa análise apresentamos as considerações de Voivodic (2008:123)

que aponta que apesar da aceitação da criança com deficiência nas escolas, estas

não sabem como conduzir o processo e mostram-se desorientadas. Segundo a

autora “uma das crianças, apesar de já estar na escola há um ano, não estava

incluída no grupo”.

Outra forma de entender a inclusão no contexto escolar está demonstrada na

fala de outra professora descrita a seguir:

Em nossa escola trabalhamos a inclusão em todos os âmbitos: temos rampa, banheiro adaptado. A direção da escola sempre aceitou a inclusão. Se tem apresentação, são todos; se tem atividades, são para todos. Se há

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produção, todos participam. Eu percebo que todos os alunos participam da mesma forma de todo o processo educativo da escola. (Jade)

Observamos, num primeiro momento, que a professora Jade entende a

inclusão escolar, em parte, como uma adaptação arquitetônica, que a escola, ao

receber seus alunos com deficiência e dispor de acessibilidade física, já o incluiu.

Salienta também os aspectos políticos, ao citar a postura da gestora, bem como

enfatiza a preocupação em trabalhar a socialização, envolvendo o educando com

Síndrome de Down tanto quanto qualquer outro aluno.

Um outro olhar sobre a inclusão, podemos notar no discurso da professora

Helena:

Como já diz o nome educação inclusiva, temos que tratar o aluno como se ele fizesse parte mesmo da escola, sem nenhum tipo de discriminação por ser isso ou aquilo [...]. Em sala, assim como na escola, funciona dessa forma: nós os incluímos. Ele participa normalmente. Quando há apresentação na escola, nós fazemos questão que ele participe. Ele adora. Ele quer fazer parte de todas as atividades propostas.

É interessante notar que a professora relata que devemos tratar os alunos

como se fizessem parte da escola. A conjunção “como se” estabelece uma condição

da não realidade de uma situação de inclusão. Ela cometeu, no discurso uma

quebra de coerência interna. Fala de certa obrigatoriedade de algo que naturalmente

deveria ser comum acontecer e que na realidade não acontece.

Diferentemente da resposta da professora Jade, a professora Helena, agora,

põe em ênfase a normalidade da atuação do educando com Síndrome de Down.

Ainda em resposta ao mesmo questionamento acerca do processo de

inclusão na escola e às práticas desenvolvidas, a professora Sâmara, por sua vez,

comenta:

Na verdade, eu tento fazer a minha parte, na minha sala. Mas na escola, como um todo, não sei. (Sâmara)

Percebemos, assim, certa individualidade quando se trata do seu trabalho em

sala, como também o não comprometimento da profissional com o processo na

instituição em que trabalha, além da não segurança no processo do trabalho que

desenvolve, uma vez que ela, diz que “tenta”, e, nesse sentido induz-nos a pensar

que nem sempre consegue. E, também, não tem um processo avaliativo para

mensurar o que faz: “[...] não sei”.

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A partir dos depoimentos das professoras, compreendemos que, quando o

assunto é a inclusão, há uma predominância em afirmar que os educandos estão

prestigiados, quando encarados como iguais.

As afirmações logo abaixo revelam que, embora 3 (três) das 4 (quatro)

professoras entrevistadas apresentem um tempo de magistério entre 5 a 10 anos, ou

seja, perfil com um tempo significativo de formação (Quadro 3: 50), esse exercício,

no entanto, ofereceu pouco subsídio para o trabalho com educandos com Síndrome

de Down, de maneira que as mesmas fazem o que é possível, revelando certa

fragilidade no desempenho do processo. Percebemos nas entrevistas das

professoras a utilização de expressões como: “A inclusão para mim é assim... a

gente recebe as crianças em sala e realiza um trabalho com elas”, “[...] eu tento

fazer a minha parte, na minha sala”. Tais expressões vêm reforçar, acrescentando, a

idéia de inclusão entendida como uma postura assumida única e exclusivamente

pelo professor dentro de sua sala de aula. É relevante notarmos que só resta ao

professor esta alternativa, visto que a escola ainda não assumiu sua postura

mediante o Projeto Político-Pedagógico – PPP, o qual estudamos inicialmente,

quando começamos nossos trabalhos nas escolas, pois “solicitamos a leitura do

Projeto Político-Pedagógico e constatamos que nestes não há ações que

contemplem a inclusão” (Apêndice 1, 2, 3, 4; NC 1, 2, 3, 4, p: 105, 107, 110 e 112).

Ainda com relação às análises do discurso sobre inclusão, utilizamos as notas

de campo para refletirmos sobre o ambiente da sala de aula dos educandos com

Síndrome de Down. Nestas, constatamos que os referidos educandos sempre são

colocados ao lado da mesa das professoras, mesmo quando estão trabalhando em

dupla, situação que não oportuniza interação com os demais colegas, visto que não

estão em lugares diferentes dentro da sala. (Apêndice 1, 2, 3 e 4, NC 1, 2, 3 e 4, p:

105, 107, 110, 112)

Diante desse contexto, entendemos que há uma postura antagônica, vez que,

na tentativa de proteger, o professor isola o educando com Síndrome de Down,

impedindo-o de tornar-se independente como os demais. De maneira geral, as

professoras buscam tomar para si uma responsabilidade que é de todos: assumir as

ações inclusivistas.

A inclusão é um processo, e como tal, não pode estar à parte da prática

pedagógica. Neste sentido Oliveira (2004:195) descreve que: “[...] o olhar dos que

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fazem a escola é para a limitação do indivíduo e não para a estrutura organizacional

e pedagógica da escola”.

A própria compreensão do vocábulo inclusão, leva-nos ao sentido coletivo:

vem do Latim Includere14, verbo transitivo direto; compreender; abranger; conter em

si; envolver, implicar; inserir, intercalar, introduzir, fazer parte, figurar entre outros;

pertencer juntamente com outros. Fatos esses que ainda parecem não estar

internalizados pelas professoras participantes da pesquisa. Embora as mesmas

desenvolvam as práticas, um trabalho responsável, trazendo para si toda

responsabilidade da inclusão, ainda não entendem a abrangência do processo.

Saad (2003:262) corrobora com a interpretação do primeiro filólogo, quando

afirma que a inclusão pode ser concebida como o processo de incorporar o

educando com deficiência na sociedade (escola) como cidadão comum, adaptando-

se a ele e abrindo espaço para seu desenvolvimento.

Sendo assim, o processo de inclusão é um sonho a ser conquistado que,

diante do inédito viável, pode ser alcançado, considerando as práticas, as

interações, a participação da sociedade, a formação profissional e o apoio no que

diz respeito às políticas públicas. E, com certeza, se forem incrementados incentivos

a estudos e pesquisas que demonstrem sucessos e insucessos de práticas

inclusivas, o sonho de um inédito-viável fique palpável na realidade de familiares,

educadores e, principalmente, do educando com Síndrome de Down. Propositiva

percebida em uma das observações na qual registramos a seguinte nota “[...] a

inclusão ocorre de forma sutil e peculiar e vislumbra futuramente acontecer de fato”.

(Apêndice 3, NC, p. 110)

Vimos a fragilidade de trabalhar a inclusão na educação. É uma realidade

concreta, com estratégias que compõem o fazer cotidiano, como vemos nas

respostas à segunda pergunta: Quais as estratégias utilizadas para trabalhar

com o educando com Síndrome de Down?

As professoras descreveram suas estratégias de forma sucinta, enfocando a

prática pedagógica.

A professora Aretha responde da seguinte forma:

14

Refere-se a alguns dos significados da palavra inclusão, de acordo com o Dicionário Aurélio da

Língua Portuguesa, 2ª edição, São Paulo: Editora Nova Fronteira , 2004. .

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Com meu aluno com Síndrome de Down, eu trabalho assim: recorte, colagem, pintura, atividades de ligar. Ou pelo menos, tento trabalhar.

No relato da professora, evidenciamos a descrição da prática pedagógica

empregada no seu trabalho com o educando com Síndrome de Down. Com essa

perspectiva, a professora acredita estar proporcionando o desenvolvimento cognitivo

do educando. De certa forma, ela busca encontrar um caminho para viabilizar o seu

trabalho, muito embora não tenha certeza do sucesso de sua ação.

Apesar de a professora Aretha descrever as estratégias de trabalho utilizadas

com o educando com Síndrome de Down, verificamos, durante a observação, que:

Muito embora a professora busque trabalhar estratégias diferenciadas com atividades de recorte, colagem, entre outras, a mesma não consegue propiciar a aprendizagem da educanda e a relação intra-pares, tendo em vista que as atividades são desenvolvidas individualmente (Apêndice 1, NC 1, p. 105).

Por não conseguir que a turma trabalhe conjuntamente, no mesmo ritmo, tal

professora está diante de um limite a transpor. Essa certamente é uma dificuldade. E

o desafio seria criar uma metodologia para incluir o educando com Síndrome de

Down no grupo escolar.

As estratégias utilizadas pela professora Jade incluem atividades que

funcionam no coletivo “As atividades funcionam no coletivo. Pintura, recreação,

jogos que eles montam, desmontam [...]”. Uma afirmação que contraria a nota de

campo 2: “as atividades durante a observação sempre foram realizadas

individualmente, por todos da turma” (Apêndice 2, NC 2, p. 107).

As professoras Aretha e Jade trabalham com atividades relacionadas à

educação artística. Elas apresentam alguma aptidão que poderia ser um caminho

para se chegar ao inédito que seria viável, uma vez que afirmam a identidade que os

educandos apresentam quando são incentivados à criação e participação.

Faz parte da formação integral de um professor, ou, pelo menos, deveria

fazer, a possibilidade de ele descrever e apreciar arte em várias expressões, uma

vez que ele é um leitor de mundo e obteve formação para ensinar.

Ainda no caminho da criação e participação como viável, a Professora Helena

relata que:

Como ele ainda não consegue ler nem escrever, eu procuro incluí-lo ao máximo nas atividades das outras crianças, naturalmente. E ele participa mais na parte auditiva porque na escrita ele ainda não consegue desenvolver. E trabalho mais com recursos visuais. Ele gosta mais do

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colorido porque chama sua atenção. Utilizo todos os tipos de recursos que a escola dispõe.

A Professora Sâmara por sua vez relata que: Trabalho teatro e música porque vejo que são essas atividades que se aproximam mais da inclusão. Com as apresentações de danças eu tento aproximar o máximo que posso da questão da socialização. Ela participa de tudo, mesmo não sabendo ler nem escrever. (Sâmara)

Nos relatos das duas professoras, percebemos que há convergência de

informações, quando afirmam que os educandos ainda não sabem ler nem escrever

e que por isso, trabalham outras atividades pois, segundo elas, também podem

favorecer a aprendizagem. Isto também é percebido em nossa nota de campo:

“Desta forma, entendemos que a construção do conhecimento do mesmo se dá por

outras habilidades que não a escrita” (Apêndice 3, NC 3, p.109).

Neste contexto, observamos que há certa dicotomia nos depoimentos das

professoras que, embora reconheçam a necessidade de explorar diferentes

linguagens, as mesmas utilizam a educação artística como paliativo e não como

estratégia legítima que proporcione o crescimento cognitivo, uma vez que, adotaram

para Felipe e Marina apostilas diferenciadas das dos colegas, conforme descrito nas

notas de campo 3 e 4 (p. 109-112), ou seja, todo um material direcionado para

alfabetização, centrado na sistematização tradicional do ensino de ler e escrever.

As professoras estão frente a um impasse profissional: sabem que, por meio

da arte, conseguem comunicação; sabem que têm que utilizar a apostila da escola.

Este é um impasse com resposta em Freire.

Paulo Freire (2003:54) reflete sobre o conteúdo a ser ensinado, o ponto

crucial na fala das professoras. Diz que: “Pensar certo – e saber ensinar não é

transferir conhecimento é fundamentalmente pensar certo – é uma postura exigente,

difícil, às vezes penosa, que temos de assumir diante dos outros e com os outros,

em face do mundo e dos fatos, ante nós mesmos.”

A realidade das professoras evidenciada é a mesma vista em Saad

(2003:253):

a escola, apesar da determinação legal para receber alunos com necessidades educacionais específicas, entre os quais se incluem os que possuem Síndrome de Down, não se encontra preparada em termos de recursos humanos (...). Os professores, na maioria das vezes, não se encontram devidamente informados e capacitados para lidar com as diferenças.

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Dessa forma, cremos que não basta só uma lei para que haja a inclusão.

Anterior à vigência da lei, o assunto teria que ser tema de longo debate, condições

deveriam ser criadas, para ajudar o professor que quer fazer o melhor para o

educando.

Nesse sentido, vale apontar que, apesar dos esforços das professoras, ainda

existe o viés da dificuldade de assinalar a importância do uso de materiais

pedagógicos equivalentes. Pelo que vimos, dois dos educandos não possuíam o

mesmo material pedagógico que o restante da turma. Então, como se sentir parte do

grupo diante de um qualificativo que os diferencia dos demais?

Em termos de conteúdos, haveria um rol “inédito viável”? Se cada indivíduo

tido como “normal” é único, o educando com Síndrome de Down teria um rol de

conteúdos “básicos”? Que tipo de professor seria necessário, humanamente

falando? Que “reservas” emocionais ele deveria possuir para se dar além do que já

faz? Quais apoios infra-estruturais deveriam ter ao seu alcance para executar suas

tarefas diárias?

Estas indagações as professoras implicitamente fazem a esta dissertação. Na

nossa concepção, é um começo de construção para o que acreditamos ser o

caminho certo: o inédito-viável.

Em continuidade à entrevista com as professoras, e considerando que a

interação com o meio é uma das prerrogativas para a convivência em sala de aula,

perguntamos a elas: Qual a relação percebida entre o educando com Síndrome

de Down e o grupo escolar (grupo da sala de aula)?

Algumas vezes Gabriela se relaciona com os outros, outras vezes não, mas os alunos gostam dela. (Aretha) Há uma interação na sala, não há discriminação. O Heros tem o lugar na fila. É ordem de tamanho. E ele é bem na frente. Todos andam no mesmo ritmo dele. (Jade) Olha, as crianças têm uma aceitação muito grande para com ela. Ás vezes, ela é um pouco levada e às vezes se aproveita de alguns privilégios, mas as crianças são bem pacientes, tentam negociar, ai quando erra, ela volta atrás, vai no colega, abraça, tenta amenizar. Quando ela percebe que está errada, nós conversamos com ela. Até concordo com as crianças, porque ela tem que ter o mesmo limite que todo mundo. Assim, quando é preciso, a encaminharmos à supervisora, porque ela tem que sentir que tem limite. Comportamento em sala de aula tem que ter. (Sâmara)

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Percebemos que a relação entre o educando com Síndrome de Down e o

grupo escolar está coerente com o postulado em propagandas de TV, folhetins,

outdoors e o que concerne aos aspectos jurídicos expressos na Constituição

Federal, LDB, entre outros, no entanto, nas notas de campo, evidenciamos

(Apêndice 1, 2, 4, NC 1, 2, 4, p: 105, 107, 112) uma outra realidade, que não há

interação no entorno de Gabriela, Heros e Marina. O que percebemos é a realização

de atividades individualizadas, o que não favorece a interação na coletividade para

proporcionar o desenvolvimento de ações inclusivas.

Diante deste contexto, verificamos a necessidade de ações que possam

nortear as ações/reações dos professores como mencionado por Barbosa (2001:20)

que comenta: [...] é preciso auxiliar na construção de algumas crenças para que a

escola possa ocupar o papel de produtora e divulgadora de conhecimentos, onde

professores e alunos possam e se tornam autores de sua aprendizagem. Ou seja,

na escola inclusiva, o ensinar e o aprender constituem-se em processos dinâmicos

nos quais a aprendizagem não fica restrita aos espaços físicos das escolas e nem

nos alunos, como se fossem atores passivos, receptáculos do que lhes transmite

quem ensina (CARVALHO, 2004:114).

Das quatro professoras entrevistadas, houve um relato e observação diferente

no que diz respeito ao relacionamento, é o descrito por Helena:

Há dificuldade de relacionamento entre o aluno com deficiência e o grupo escolar. Dificuldade de relação com o todo. Não é só dentro da sala. A dificuldade que eu percebo é apenas essa. Um ato qualquer por parte dos colegas em relação a ele, o faz achar que está sendo agredido. Mas é porque a mãe ensina. Ela diz assim: “se alguém bater em você, pode bater também que é pra você se defender”. E se algum aluno chegar para a mãe dele e dizer que ele bateu, ela responde: “mas foi porque alguém bateu nele”.

Diante da fala de Helena, percebemos que a professora descreve as

ações/reações de Felipe como violentas, e que estas são incitadas pela mãe.

Contudo, devemos estar atentos que em relação à mãe, incide a questão da

proteção e cuidado.

Embora a relação entre o educando com Síndrome de Down e o grupo

escolar seja descrita pela professora como violenta, em nossas observações

registradas, na sala de aula dessa professora há um ambiente de interação e

cooperativismo no que tange à relação intra-pares. O que acontece são

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desentendimentos comuns à idade, o que não pode relacionar apenas a Felipe

(Apêndice 3, NC 3, p: 110).

Casarin (2003:280), frente ao estereótipo criado pela professora sobre o

educando com Síndrome de Down ser naturalmente violento, diz que “rótulos não

podem ser aplicados a todas as pessoas com Síndrome de Down, pois esses não

são como as características físicas que são comuns à síndrome”.

Diante desse contexto, entendemos que a pessoa de Felipe promove na

professora reflexão sobre a prática, sobre o tratamento dispensado ao seu

educando, bem como instiga os seus limites e seus desafios.

Noutro questionamento proposto às professoras, buscamos saber sobre a

capacitação para o trabalho com a inclusão, a partir da seguinte questão: Há

trabalho de orientação ou formação continuada sobre a inclusão na sua

escola?

Sim, tem trabalho de capacitação para professores. Mas os professores não estão preparados para trabalhar com os alunos e as capacitações que têm não são suficientes. Nós temos cursos mas..., na realidade, não são o suficiente.(Aretha) Sim, o CERNIC nos dá esse apoio. Fazemos reuniões. Os profissionais do CERNIC vêm e orientam todos os professores que têm alunos “especiais”. (Jade) Não. Não temos capacitação. Mas o CERNIC nos auxilia em relação a isso. (Helena) Não. Iniciamos alguns estudos, só uma vez com um professor. É complicado porque a escola está começando agora com inclusão.Tudo é muito novo para nós. O que tentamos fazer é trocar idéias com outros professores. Mas na prática não é nada efetivo, é só troca de idéia mesmo. (Sâmara)

Das quatro professoras, duas relataram terem capacitação e dessas uma

julga não ser suficiente; as outras duas relataram não ter capacitação, no entanto

estas duas, apesar de não terem uma formação específica, demonstram interesse

ao relatar que estão buscando informações de como lidar com este processo de

inclusão. Há ainda, da parte de duas professoras, o relato de apoio do CERNIC o

que indica que a rede não está totalmente desprovida de apoio. Nesse sentido, elas

demonstram que, apesar da formação não atingir o patamar formal, com base em

especialização, pós graduação, existe o apoio informal e várias possibilidades de

formação através do CERNIC.

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Diante dessa realidade, acreditamos que as professoras sabem que é preciso

estudar, capacitar-se. E projetam, para o futuro, a formação para trabalhar com o

educando com Síndrome de Down, isto é, adiam o problema que está presente em

suas vidas e pensam-no em termos de soluções individuais. No entanto, Paulo

Freire, quando fala em ações públicas, prega sempre o coletivo, como na fala logo

abaixo:

[...] educador ou a educadora progressista, ainda quando, às vezes, tenha de falar ao povo, deve ir transformando o ao em com o povo. E isso implica o respeito ao „saber de experiência feito‟ de que sempre falo, somente a partir do qual é possível superá-lo (FREIRE, 2003:27-28).

Freire deixa claro o quanto o educador está distante de incorporar suas

decisões profissionais, no sentido de entender o problema do outro por dentro e, a

partir desta lógica, rever o objeto. Sem incorporar a visão do outro, o educador não

consegue equacionar o seu problema como indicador de caminhos. A solidariedade

é muito mais que partilhar. Neste caso, é uma inter-relação ou inter-dependência,

assistência recíproca entre os membros de um mesmo grupo. Freire ensina que a

heterogeneidade é essencial para o enriquecimento no convívio das pessoas. É a

convivência na diversidade, porque existe o respeito da vivência ímpar do outro.

No discurso das professoras participantes da pesquisa, mesmo as que

disseram que têm capacitação percebemos a falta de perspectiva, pois elas não

acreditam que a situação possa mudar. Freire (2003:32) diz que o conhecimento

crítico não opera por si só a mudança da realidade, mas seria um passo, se elas o

tivessem.

De acordo com Mantoan (2003: 79), os professores em sua maioria entendem

que a formação em serviço poderá auxiliá-los para trabalhar com os educandos com

deficiência e/ou dificuldades de aprendizagem e problemas de indisciplina, ou seja,

acreditam que basta realizar esta formação que irão dar conta de solucionar os

problemas encontrados nas escolas inclusivas e, ter a certificação, convalidaria a

capacidade de ser professor inclusivo.

Entretanto, temos visto que mesmo frente à capacitação formal, muitas das

dificuldades da ação inclusivista estão alicerçadas não em aspectos meramente

teóricos ou de aquisição de conhecimentos e sim do exercício da práxis consciente,

reflexiva e política.

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Diante das ações e reações demonstradas durante a entrevista, foi solicitado

às professoras que comentassem sobre os efeitos positivos e negativos da

inclusão:

Efeitos positivos: A inclusão é boa para todos porque todos aprendem a respeitar, a lidar com a situação do aluno diferente na sala de aula. Cada um diferente do outro, mas só percebem isso quando chega alguém realmente “diferente” entre eles. Os efeitos negativos: Os professores não estão preparados para trabalhar com os alunos e acabam não trabalhando de maneira correta. Esses efeitos negativos podem influenciar no processo de aprendizagem. Penso que se todos se envolvessem no processo de inclusão, seria mais fácil. (Aretha) Há um benefício enorme para a sociedade. Já pensou você ter um filho e ter que deixá-lo preso em um quartinho nos fundos?! Pensa! Não é melhor ele viver livre, conviver, namorar, viver uma vida normal? Não é gratificante? Efeito positivo sem dúvida, para todos, tem uma série de coisa positiva... Efeito negativo: é a não aceitação por parte dos professores. “Não deixe o Heros passar pelo amor de Deus para ele não cair na minha sala. Por favor, não deixe”

15. (Jade)

A inclusão tem efeitos positivos para todos, porque um começa a ver a realidade do outro e os seus limites. Favorece o relacionamento interpessoal, porque um começa a respeitar a realidade do outro, começa, inclusive, a trabalhar o companheirismo, a solidariedade, a boa convivência. Tudo isso eu penso que seja positivo. E faz com que a criança, no caso do portador de Síndrome Down, consiga ver que ela também pode. No caso desse meu aluno em especial, ele sente que pode avançar. Ele percebe que, se o colega da mesma idade consegue, ele também consegue. E quando ele consegue fazer alguma coisa, ele diz: “olha professora, igual o da minha coleguinha!” Efeito Negativo: eu acredito que não existe um efeito negativo, porque penso que a criança só cresce sendo incluída. Não há preconceito em sala. Todos o tratam como se ele fosse normal. E quando digo que vou ajudá-lo, as crianças já perguntam: “por quê?”. (Helena) Efeito positivo: É um aprendizado muito maior para nós professores, escola, aluno. Aqui eu tenho aprendido muito com ela. È praticamente essa questão de aprendizado voltado para a socialização. Os negativos é que eu não me sinto preparada. Eu penso que deveria haver mais investimentos na nossa capacitação para podermos trabalhar com esses alunos. (Sâmara)

Ao serem analisados os relatos das professoras, entendemos que os mesmos

se confluem, ou seja, elas são unânimes em dizer que a inclusão tem efeito positivo

para todos, que há benefícios para a sociedade. No entanto, percebemos que

existem resistências e efeitos cristalizados acerca das receitas prontas em

educação. A inclusão versa sobre o singular, peculiar e a possibilidade de reeditar o

fazer pedagógico. Nesse sentido, apontamos que, apesar das professoras

demonstrarem que estão abertas à ação inclusivista, nem todas acreditam estar

15

Comentário de outros professores para a professora Jade.

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aptas para este exercício. Fato este que também foi apresentado por Voivodic

(2008:115):

[...] a falta de preparo e capacitação dos professores para lidar com a inclusão de crianças com deficiência em suas classes e a falta de um planejamento que tem caracterizado a inclusão em nossas escolas.

Freire (2000: 115) diz que o educador conservador tem um projeto alienante

de imobilização da História. Ele não sabe fazer, aceita a História como fator

determinista, é autoritário, acrítico, sem esperança e carente de sonho. Perde-se,

portanto, como profissional. Freire (2000:114), explica sobre consciência e

inacabamento. E a desesperança é resultado da incompreensão de que, em

educação, nada está pronto, concluído. O educador é processo e essa compreensão

é que lhe dá a possibilidade de acreditar que mudanças são possíveis, embora

difíceis de se concretizar.

As professoras teoricamente sabem que é direito de todos o acesso à escola,

entendem também o que é democracia e que este posicionamento é fator imperativo

para a inclusão na escola, embora não tenham assimilado os conceitos como ação

política.

Paulo Freire (2003:113-4) afirma que a democracia é condição para que haja

a inclusão:

(...) A democratização da escola, principalmente quando, sobre a „rede‟ ou o „sistema‟ de que ela faz parte, temos uma certa ingerência pela alternância de governo nas democracias, faz parte da democratização da sociedade. Em outras palavras, a democratização da escola não é puro epifenômeno, resultado mecânico da transformação da sociedade global, mas fator também de mudança.

Infelizmente, ainda temos que concordar com o que Gomes e Rey (2007:411)

nos ensinam:

A exclusão acentua-se ainda mais quando os alunos são eximidos de seus deveres escolares e não têm um acompanhamento que lhes garanta progresso dentro de seus limites. Isso produz sentidos subjetivos que levam o aluno a vivenciar ansiedade, menos valia e insegurança, verdadeiras barreiras emocionais para o seu desenvolvimento.

Sobretudo evidenciamos que as professoras utilizam em suas aulas

estratégias que podem fazer toda a diferença para a construção da aprendizagem

dos educandos com Síndrome de Down, mas que não estão contempladas no

Projeto Político-Pedagógico. Por isso, enfocamos aqui importância que a escola

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deve dar ao Projeto Político-Pedagógico, ferramenta que indica as ações da prática-

educativa na escola, entre elas a inclusão. Pois de acordo com Veiga ( ):

A escola é o lugar de concepção, realização e avaliação de seu projeto educativo, uma vez que necessita organizar seu trabalho pedagógico com base em seus alunos. Nessa perspectiva, é fundamental que ela assuma suas responsabilidades, sem esperar que as esferas administrativas superiores tomem essa iniciativa, mas que lhe dêem as condições necessárias para levá-la adiante. Para tanto, é importante que se fortaleçam as relações entre escola e sistema de ensino.

O professor, como agente transformador, tem a capacidade de mobilizar,

incentivar a mudança e a quebra de paradigmas. Todavia, diante de tanta

responsabilidade e tão pouco apoio, vem a sentir-se, de certa forma, estático

mediante a realidade.

Nos depoimentos, pudemos constatar que as professoras ainda não se vêem

capazes de incentivar a mudança de consciência, como agentes transformadores

que são. Com atitudes políticas de inclusão, as dificuldades do seu trabalho seriam

mais facilmente resolvidas: os limites ultrapassados e os desafios, vencidos.

Quanto às entrevistas realizadas com as mães, é importante levar em

consideração, os aspectos relacionados ao perfil censitário (Quadro 4, p: 51),

demonstrado que observamos que nenhuma das mães apresentam curso superior e

renda superior a 3 (três) salários mínimos. E 2 (duas) das 4 (quatro) não possuem

casa própria, além de morarem entre 4 (quatro) e 5 (cinco) pessoas na mesma

residência. Quadro demonstrativo de que a Síndrome de Down nos foi apresentada

como constante de um quadro social com muitas limitações, como pouca

escolaridade das mães, dificuldades financeiras, o que nos leva a acreditar em falta

de orientações de saúde e direitos, mas com excedente amor e dedicação.

Nessa perspectiva, as entrevistas realizadas com as mães apontam para a

satisfação das mesmas em matricular seus filhos com Síndrome de Down na escola

comum, pois vêem a perspectiva de que eles possam ser capazes de interagir com

as pessoas e aprender como/com os seus colegas. Assim elas entendem inclusão.

Diante disso, fizemos o seguinte questionamento: Quais são as práticas de

inclusão percebidas na escola do seu filho?

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Ivete, mãe de Gabriela, assim se expressou:

Ela desenvolveu a fala dela. Ela fala bem. Ela gosta de ir à escola, ela já fala muitas coisas, tais como coisa: laranja, amarelo, letras, números, ela aprendeu a falar muitas palavras.

Ivete descreve o desenvolvimento da filha como um avanço. Ao mesmo

tempo que a mãe diz que ela está feliz em ir para a escola, argumenta com uma

expressão utilitária “é para o bem dela” e continua “ela tem que aprender !”. Estas

são afirmações que carregam, no discurso, o desespero, medo do desafio que ela

sabe que sua filha terá que enfrentar. Sabe que seu grande limite está em aprender,

desenvolver a capacidade cognitiva e tem esperança. Vemos que a mãe, sem

condições de fazer críticas ao trabalho pedagógico, atém-se ao resultado na vida

prática de seu filho.

A mãe de Heros, Margarete, apresentou o seguinte comentário:

Ele chega e me entrega o bilhete. Faz isso porque já sabe que a professora mandou entregá-lo a mim. Ele conta tudo o que aconteceu, que aprendeu a falar muitas coisas. Ele está progredindo a cada dia. Ele pega o seu caderninho e fica desenhando o tempo todo: me desenha, desenha todo mundo. Não escreve ainda, mas ele pega o caderno e sai rabiscando, pega livro e diz que está lendo. Ele obedece, atualmente ele está aprendendo as letrinhas, as letra do próprio nome. A diretora disse que ele já conhece. Eu nunca fiz esse teste. Uma vez havia um nome num cartaz, no pátio da escola, no qual estava escrito H-I-R-I-S e o nome dele é HEROS, então ele falou que era dele, falou para todo mundo que o cartão era dele: “é meu!”. [...] mas ele gosta mais de desenhar do que escrever.

A mãe acredita que, com paciência, o filho aprenderá, mas evita o confronto.

Este é o desafio: encarar o fato de que o filho não está aprendendo ou está. Ela adia

verificar o seu progresso. Está engessada pelo medo e presa ao limite de que

aprender é automatizar o alfabeto, é juntar as letras para escrever e ler. É isso que

as mães concebem como o ser alfabetizado. É uma verdade altamente difundida.

Paulo freire propõe quebra de paradigma nessa noção de ser alfabetizado

quando diz:

[...] Para superarmos, de um lado, os sectarismos fundados nas verdades universais e únicas; do outro. As acomodações „pragmáticas‟ aos fatos, como se eles tivessem virado imutáveis, tão ao gosto de posições modernas, os primeiros, e modernistas, as segundas, temos de ser pós-modernamente radicais e utópicos. Progressistas (FREIRE, 2003:51-2).

Ou seja, a consciência política inicialmente de que há diferentes tipos de

alfabetização e que o ser humano aprende a ser independente por vários

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mecanismos de sobrevivência, muito além do alfabeto. Vemos hoje que a escola já

faz uma diferença entre letramento e alfabetização. Letramento é a capacidade que

um cidadão tem de resolver sua vida diária: ler o número do ônibus, ler o nome de

um determinado remédio, desenhar o próprio nome, tudo isso para resolver-se na

vida (Marcuschi, 2002). Já a alfabetização é enfocada por Soares (2003:16) sob

vários pontos, entre eles a “aquisição e apropriação do sistema da escrita, alfabético

e ortográfico”.

O desafio, portanto, seria a mudança total, radical, dessa visão limitadora, de

início pelo próprio professor até chegar a sociedade como um todo.

Aparecida, a mãe de Felipe, posicionou-se da seguinte maneira:

Ele leva, às vezes, atividades da escola para fazer em casa. Esse ano não sei o que aconteceu: se foi ele ou a professora. Este ano ele não está muito bem na escola, não. No ano passado, ele estava escrevendo, já escrevia bilhetinho. Neste ano, ele parou de escrever e quer mais é fazer rabisco, cobrinha... Desinteressou. Não sei se é porque a matéria está ficando mais difícil. No início eu achava que era a professora, mas ela mudou bastante, conversei bastante com ela. Agora, no final do ano, começou de novo, cobrinha. Não sei se é preguiça, ele sabe escrever todo o ABCD: você escreve alguma coisa e vai ditando as letras, ele escreve tudo. Mas o Felipe, eu não entendo não, às vezes ele sabe, daí a pouco, ele já não sabe. Não sei se é preguiça. Ele é assim: se trouxer um DVD uma coisa assim, ele pára tudo. Daí a pouco, ele assiste o Chaves e DVD evangélico, ele gosta muito daquelas musicas. Se ele estiver interessado naquilo ali, ele vai embora.

Claudia, a mãe de Marina, afirmou:

Hoje ela é diferente, levo- a para o catecismo, para a igreja, para a natação, largo lá. Ela faz a natação tranquila. Eu não me preocupo. Tem ballet, mas eu não fico mais assistindo, eu largo lá, a aula é dela e dos professores. Ela apresentava muito problema de fala, melhorou. Melhorou a parte social dela, a aceitação, agora se mistura com as pessoas, porque ela era muito agarradinha comigo. Ela ganhou aquele espaço, conquistou a escola do zelador ao diretor, muito bom. Ela se desenvolveu, agora mexe, coloca um CD que quer, troca, pula a música, mexe no telefone, sabe achar o nosso número para ligar. Adora dançar, faz parte de peças de teatro, de apresentação, do ballet. Ela faz integralmente cada passo, cada apresentação. Já fez o nome dela.

A educação formal é de suma importância para as crianças em idade escolar,

e isto já foi apreendido pelas mães. No relato de Claudia percebemos que a mesma

já confia no espaço (escolar e social) o qual Marina freqüenta, relatando também a

despeito do seu perceptível avanço no aspecto social e cognitivo. Nesse contexto

Brandão (1986) colabora apontando que:

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(...) a educação existe difusa em todos os mundos sociais, entre as incontáveis práticas dos mistérios do aprender; primeiro, sem classes de alunos, sem livros e sem professores especialistas; mais adiante com escolas, salas, professores e métodos pedagógicos (p.10).

No entanto, de acordo com Voivodic (2008:64) a família das crianças com

Síndrome de Down ainda sofrem a influência dos estigmas, mas têm a expectativa

de que seus filhos tenham oportunidades iguais, sejam aceitos na sociedade e

estejam preparados para uma vida autônoma.

Segundo Oliveira (1996:99),

[...] a escola tem como função básica instrumentalizar os indivíduos para serem, por um lado usuários competentes do sistema de leitura e escrita, isto é, pessoas plenamente alfabetizadas e, por outro lado, capazes de interagir com o conhecimento acumulado pelas diversas disciplinas científicas e com o modo de construir conhecimento que é próprio da ciência.

Nas entrevistas com as mães ficou ressaltado o papel da escola como fonte

alternativa de independência de seus filhos para a vida, o que, aliás, temos

constatado em reunião de pais e professores em que as famílias depositam na

instituição escola (diploma) a confiança para uma vida melhor e mais digna.

A partir dessas respostas, solicitamos às mães que comentassem sobre a

relação percebida entre seu filho e os colegas de sala e/ou da escola. O

discorrer sobre a relação percebida entre seus filhos e colegas não foi tarefa fácil

para as mães, pois o acompanhamento em sala de aula não é realizado com

frequência, até porque, de certa forma, as quatro horas que seus filhos permanecem

na escola ficam sobre o olhar dos profissionais, contudo expressaram suas

percepções:

Em sua sala, todo mundo gosta dela, os professores, todo mundo ajuda. Mas quando ela chega, cria um mundo imaginário começa a conversar com seus alunos, porque ela é a professora. (Ivete) Todo mundo da escola gosta dele porque ninguém o discriminou, nada, todo mundo ficou amiguinho dele lá (na escola). Nem o pai foi lá na escola reclamar de nada. (Margarete)

Ela conquistou os colegas, conquistou todo mundo, ganhou aquele espaço, conquistou a escola do zelador ao diretor, muito bom! (Claudia)

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Ao sistematizarmos as percepções das mães a respeito das interações de

seus filhos com os colegas, entendemos que a convivência por elas percebidas são

evidenciadas por afetividade, conforme o descrito no estudo de Martins (1999) apud

Teixeira e Kubo (2008:76), onde o autor registra que a convivência da turma com o

colega com Síndrome de Down é constituída pela interação, “construção de vínculos

afetivos e a diminuição de preconceitos e estereótipos em relação aos colegas com

a síndrome”.

Outro estudo que colabora com essa afirmação é o de Yazile, Amorim e

Rossetti-Ferreira (2004), que objetivou caracterizar a interação entre pessoas que

participam do processo de inclusão de crianças com paralisia cerebral. A partir de

entrevistas realizadas com pais, professores e profissionais de saúde, os autores

concluíram que as crianças mostraram-se interessadas, curiosas e disponíveis para

a convivência com as colegas com paralisia cerebral, estabelecendo uma relação de

ajuda e cuidado.

Aparecida, a mãe de Felipe, diferente de Ivete, Margarete e Claudia, não

acredita que a interação de seu filho com o grupo seja de afetividade e afirma:

Ele reclama um pouco porque o chamam de doido, mas ele aprendeu muito com os colegas. Eles brincam com ele. (Aparecida)

Aparecida demonstra em seu discurso ser uma pessoa objetiva e mostra

poucos traços de afetividade, porque normalmente, na fala das mães, esperança,

traduzida como preocupação com o futuro, está sempre presente. O pouco afeto

está diretamente ligado à falta de esperança, também não mencionada e/ou

subentendida. A falta de esperança comentada por Paulo Freire (2000:113), que,

aproximando-se do pensamento de Vygotsky, diz que, quando não falamos de

esperança, temos como motivo a falta de liberdade. A mãe não tem opção a não ser

enfrentar a problemática de seu filho com Síndrome de Down. Logicamente que sua

criança com Síndrome de Down é uma preocupação.

No Livro Pedagogia do Oprimido (1994), Paulo Freire comenta que a

concepção e práticas bancárias da educação são as motivadoras de „casos

individuais, dos meros marginalizados, por isso Felipe é chamado de doido. Ele é

um hiato na dita sociedade sã. A ação praticada pela escola encarrega-se de

“assisti-lo”, uma vez que, para ela, ele é uma figura discrepante: “[...] Os oprimidos,

como casos individuais, são patologia da sociedade sã, que precisa, por isto mesmo,

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ajustá-lo a ela, mudando-lhes a mentalidade de homens ineptos e preguiçosos.”

(FREIRE, 1994:69).

Para mudar esse homem, repassa-lhe o conteúdo condicionador, para o

crédito de que ela seja justa e equilibrada.

Diante da propositiva de comentar sobre os efeitos positivos e negativos

da inclusão do educando com Síndrome de Down na escola regular, mães e

colegas demonstraram seus pontos de vista, a partir de suas percepções (mães) e

vivências (colegas).

Efeito positivo da inclusão: Pela fala, pela educação dela que mudou, bastante. Ela obedece, fica quietinha vendo o caderno, olhando, falando. Efeito negativo: Não, efeito negativo não tem. Ela ficou danada mesmo! (Ivete)

Ivete, mãe de Gabriela, comenta de forma sucinta o desenvolvimento da filha,

apontando que estes são efeitos positivos da inclusão e complementa dizendo que

não há efeitos negativos. Segundo a mãe, Gabriela já consegue se concentrar e

perceber situações do cotidiano escolar que são importantes – como ler e escrever.

Efeito positivo eu falo que é bom, ele entrou faz dois anos na escola comum. Não é só porque tem Síndrome de Down que ele não pode fazer alguma coisa. Eles sim são mais inteligentes que até a gente, são muito mais. Tem que colocar (na escola), para ele progredir. Eu acho que não tem efeito negativo. (Margarete)

Margarete, no início do discurso, apresenta uma fala comparativa, isto é, vê

que o filho está atrasado, porque faz a relação com os outros que estão em séries

mais adiantadas para a idade. Mas, no segmento, ela começa a descrever o

processo de desenvolvimento do filho. E, pelo que parece, ele desenvolve bem sua

inteligência interpessoal. É querido. O desafio para os envolvidos seria saber

canalizar esta vocação para as relações interpessoais interferirem em sua

independência pessoal para o fazer, adaptar-se e poder criar situações novas para

seu perfil, ou seja, um trajeto inédito para a sua vida.

De alguma maneira, Heros está em uma situação confortável, porque seu

entorno o ama e amor, para que ele consiga desenvolver o seu máximo, parece ser

o inédito viável.

Claudia, mãe de Marina, apresenta suas opiniões:

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Efeito positivo: desenvolveu a fala, aprendeu a se defender. Hoje não, hoje ela já enfrenta, já sabe se defender, se alguém falar uma besteira para ela, revida. Efeito negativo: são as escolas públicas ainda não estarem preparadas, terem 22-23 alunos, muitos alunos.

Normalmente os depoimentos das mães vêm carregados de preocupações,

dor e conformação frente ao que acontece com seus filhos, no entanto, apresentam-

se esperançosas frente à luta pelos direitos de seus filhos na escola comum, apesar

de a escola pública aceitar um grande número de alunos em sala de aula, o que

prejudica o ensino aprendizagem de todos os alunos. O que vem ao encontro do que

Vygotsky apud Saad (2003) propõe, sobre a escola dever eliminar tudo o que agrava

a deficiência e o atraso.

Com relação às entrevistas realizadas com colegas de Gabriela, Heros, Felipe

e Marina, percebemos que todos os colegas tem idade entre 8 a 10 anos, são do

sexo feminino (Quadro 5, p: 52). Diante desse contexto foram realizadas e

analisadas as respostas do seguinte questionamento: Como é a participação de

seu colega nas atividades escolares?

Ela, pinta, às vezes, se suja. É, porque ela ainda não entende nada. É deficiente. Ela só pinta, tem que ligar as coisas, às vezes a professora fica com raiva e liga as coisas para ela. (Patrícia)

Na fala de Patrícia existe a reprodução de um comportamento socialmente

aceito de deficiência cristalizado e construído, ou seja, a própria colega já espera

pouco de Gabriela na medida em que não acredita em suas potencialidades.

Sabemos que esse discurso é permeado por outras vozes dentro e fora do contexto

escolar.

Patrícia demonstra grande sensibilidade ao perceber a reação da professora,

mesmo que esta fosse ajudar Gabriela. Em condicionamento social compreensivo

para a idade, aceita Gabriela como oprimida e percebe a professora como

dominante, aquele que submete.

Às vezes ele faz a tarefa e às vezes não. Ele bate na cabeça de alguém. Na hora do recreio ele fica lá empurrando os outros. A brincadeira dele é brigar, comer borracha e comer giz. Bom, ele também, faz a tarefa, fica brincando com os brinquedos. A tarefa dele é igual a de todo mundo e a professora atende a todos, inclusive a ele. (Hana)

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Hana, a colega de Heros não explicita dificuldades em relação à inclusão,

entretanto, pudemos verificar que tanto os colegas realizam a mesma atividade que

Heros, quanto o educando participa do contexto de sala de aula. No entanto, tal

participação não denota atuação prazerosa, uma vez que Heros rebela-se e agredi

os demais.

É real o fato de que a inclusão não aconteceu e isto subentendemos haver

algum ressentimento, uma vez que Hana se lembrou da agressão promovida por

Heros. A partir das nossas notas de campo 2, observamos que Heros, após o

recreio, fica nervoso e agitado e acaba perturbando e/ou provocando seus colegas,

batendo na cabeça dos mesmos, mexendo em seus materiais, entre outras atitudes

que prejudicam o andamento da aula (Apêndice 2, NC 2 p: 107). Na realidade,

Heros é o oprimido que demonstra, conforme Freire (2003:57), um corpo/reação do

semivencido.

O Fê tem vez que ele é bagunceiro, fala mal, fica quietinho. Há dia em que faz todas as tarefas, estuda, fica quietinho. E tem outro dia que ele já fala mal, participa, mas tem vez que a gente está na página 31 de Matemática e ele está na página três de Língua Portuguesa. Ele gosta de ficar vendo os desenhos de sua apostila. Na Educação Física, ele gosta de futebol, participa de tudo, ninguém o deixa para fora. A professora explica para ele com carinho, com amor, daí ele entende.Ela coloca na página da apostila para que saiba o alfabeto.(Marceli)

A colega de Felipe expressa seu respeito e amor por ele. Chama-o pelo

apelido (Fê) e afirma que, apesar de diferente, participa e é solicitado pelos outros

alunos da classe. A colega também mostra não entender o universo de Felipe. Não

entende, por exemplo, por que a classe está em Matemática, enquanto Felipe está

no começo da apostila de Língua Portuguesa.

O fato mais importante do depoimento foi a resposta de Marceli sobre seu

colega gostar de ler desenho. Esse fato é ilustrativo do que, em momentos

anteriores, falamos sobre quebra de paradigma. Rever o significado do texto no

contexto de Felipe é saber que texto é um todo significativo que não precisa ser

registrado somente com escrita. Pode haver texto musical, gráfico, cênico, entre

outros.

Às vezes a professora está fazendo conta de matemática. Como todo mundo, ela faz atividade no quadro. Ela a chama para fazer as continhas, às vezes a professora faz contas diferentes mais fáceis para ela, tipo 1+2, a professora faz no dedo para ela contar. Ela conta, faz as atividades, só que, às vezes, ela é muito assim, vamos dizer, preguiçosa,

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não quer muito fazer tarefa. Aí a gente senta com ela, mostra as atividades, então ela faz. Ela participa das apresentações, sabe escrever, é só você ir soletrando -S-A-L-G-A-D-I-N-H-O. Falar com que letra começa. Escrevi para ela com letra palito. Ela foi lá e colocou as atividades que ficam na sua apostila. Às vezes ela tem atividade como de somar, de pintar. Semana passada teve uma tarefinha impressa que era para ela identificar o que tinha na figura, era aniversário da Magali e ela escreveu tudo na lista tudo que tinha: bolo, salgadinho. (Raiza)

A partir da atividade descrita por Raiza, demonstrada na página 86,

verificamos em sua fala que houve sua participação direta, cooperando com sua

colega Marina para o desenvolvimento da mesma.

Registramos em nossa nota de campo 4, a existência de uma apostila

diferenciada para Marina. Todavia, a mesma não apresenta atividades envolvendo

componentes curriculares correspondentes a sua série “ [...] há atividades com

características de conteúdo de alfabetização, como: recorte, colagem, pintura,

associação de palavra a figura, destaque de letras e palavras dentro do texto, entre

outras (Apêndice 4, NC 4, p: 111-112).

Segundo Raiza, a prática de auxiliar Marina é constante. Percebemos em sua

fala um prazer muito grande em ajudar a colega, fato este que observamos quando

relata o que foi realizado na atividade: “[...] para ela identificar o que havia na figura.

Era aniversário da Magali na figura, ela escreveu tudo que tinha na lista: bolo,

salgadinho. Escreveu tudo lá”. A colega também percebeu a tentativa da professora

de envolver a aluna na atividade de Matemática, mesmo sendo uma atividade

diferenciada.

Diante da percepção dos colegas, entendemos que a inclusão está

acontecendo de forma natural para eles. Narram situações envolvendo seus colegas

com Síndrome de Down não focando suas dificuldades e sim seus

desenvolvimentos.

Nesse contexto, analisamos as respostas da seguinte pergunta: Como vocês

(o grupo escolar) se relacionam com seu colega na escola?

Ela brinca conosco, a gente fala Gabriela, aí ela vem, corre atrás da gente, brinca de verdade. Depois queremos sentar e ela não deixa, quer nos bater. A professora manda-a sentar, e ela se senta. (Patrícia)

De acordo com Patrícia, Gabriela se envolve nas brincadeiras como os

colegas de sua idade. Demonstra em alguns momentos certa irritação, o que não

pudemos entender o motivo, causando ressentimento em sua colega. Por trás do

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relato, a reação de Gabriela mostra que a educanda não se adapta a todas as

situações em grupo.

Ele gosta de todo mundo, não bate em ninguém, brinca. A gente entende o que ele fala. Esses dias, eu fiquei ensinando para ele o alfabeto. A gente brinca com ele e o ajuda. (Marceli)

Ela tem uma facilidade para interagir com as pessoas, assim: quando ela está errada, admite. Ela é muito sensível, a gente fala assim: Marina, não pode fazer isso. Olha, seu amiguinho está triste. Às vezes, ela se irrita, mas, no dia seguinte, a gente fica de bem. Ela vai lá à frente, chama todo mundo e pede desculpas. Todo mundo a desculpa e a ajuda na sala. Ajuda assim, eu e as meninas, nós brincamos com ela de: adedanha, fantasma, letras... A Marina faz as letras ABC (Raiza)

Nesses depoimentos, há demonstração de respeito, carinho e o

compartilhamento de brigas e afirmação de amizade, o que são comuns à idade. As

colegas descrevem a forma como ajudam seus colegas no que diz respeito a

aprendizagem. Diante desses relatos, entendemos que a relação entre os colegas é

de respeito e valorização do coleguismo em sala de aula.

Diante da realidade apresentada, analisamos a interação a partir da afirmação

de Hanson et. al. (1998), quando descrevem que a imperatividade de ser recebido é

comum e que as crianças buscam compreender a cultura de seus semelhantes.

Evidenciamos esta afirmação através das observações e posterior registro em notas

de campo, que as práticas de interações no cotidiano dos educandos com Síndrome

de Down e seus colegas pesquisados são comuns, embora com características

particulares.

Nessa direção, Teixeira e Omote (2008:76) contribuem apontando que há

benefícios na inclusão de alunos com necessidades especiais no sistema regular de

ensino, pois beneficia seus colegas de turma tanto no ponto de vista da adequação

ao “sistema escolar” quanto socialmente.

Considerando a inclusão um processo, solicitamos aos colegas dos

educandos com Síndrome de Down que expusessem os efeitos positivos e

negativos da inclusão na sala de aula. Obtivemos as seguintes respostas:

Efeitos positivos ela não atrapalha, acho que é bom (referindo-se a inclusão), porque ela não faz muita bagunça dentro da sala, fica quieta na dela. Efeito negativo: seria bom a Gabriela numa escola que tenha criança igual a ela. É porque, quando a gente vai fazer alguma coisa, ela está sempre lá atrás, porque a prô tem sempre que ficar cuidando dela. (Patrícia)

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No depoimento de Patrícia, fica clara a intenção de proteger a colega com

Síndrome de Down, justificando-a e insistindo sobre ela não atrapalhar, embora diga

que a “pro”, às vezes, tem que ficar com ela. Elas brincam, interagem, mas há um

momento em que a convivência é questionada por Patrícia, que apresenta uma

solução para o fato de não lhe ser dispensada a mesma atenção que a de Gabriela

– a solução seria uma escola onde estivessem matriculados apenas educandos

iguais a sua colega com Síndrome de Down. A colega parece se desculpar por ter

que dizer isso.

Entendemos nesse apontamento, apresentado por Patrícia, que a professora

vem sobrepondo a pessoa de Gabriela a sua pessoa e de seus colegas. Daí sua

indignação.

É muito interessante a reflexão de Paulo Freire (2000:45) sobre Ética, o que

pode explicar a reação violenta da criança com Síndrome de Down. Ele diz que Ética

não é algo abstrato, coisa de escrivaninha. O início da ética está na capacidade de

indignar-se com as injustiças que ocorrem. “Está errada a educação que não

reconhece na justa raiva, na raiva que protesta contra as injustiças, contra a

deslealdade, contra o desamor, contra a exploração e a violência um papel

altamente formador”. Alerta, ao mesmo tempo, que esta raiva não pode transformar-

se em “raivosidade” e daí em “odiosidade”. Uma educação ética é, então, entre

outras coisas, uma educação da indignação. Assim como a esperança mal orientada

ou não orientada pode perder-se, assim também uma indignação não educada pode

ser inconsequente ou, pior, destrutiva.

Efeito negativo: o que não dá certo é que ele fica batendo nos outros. (Hana)

Efeito positivo: A gente gosta de tê-lo na sala. Ele participa, canta. É o nosso colega! (Marceli) Efeito positivo: eu gosto de tê-la na sala. Aprendi que pessoas mesmo assim especiais são iguais a todos, têm o mesmo direito. (Raiza)

As educandas expuseram suas opiniões de forma sucinta, nos possibilitando

entender que a situação de seus colegas com Síndrome de Down em sala de aula

comum tem características tanto positivas quanto negativas. Positivas por

conviverem com uma pessoa diferente e entenderem que seus colegas com

Síndrome de Down tem os mesmos direitos que os seus.

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Identificamos como efeitos negativos para as colegas, as reações que ora

seus colegas demonstram para com a turma.

Diante dos dados apresentados, podemos inferir que a construção do

conhecimento sobre a compreensão do processo de inclusão de educandos com

Síndrome de Down, através da percepção de professores, mães e colegas no

sistema regular de ensino, constitui uma necessidade científica e social, uma vez

que oferece subsídios para a caracterização e aperfeiçoamento de processos de

inclusão escolar a partir do inédito-viável de Paulo Freire. Neste sentido, Marques

(2006:228) afirma que:

Acreditar na transformação do mundo pelos caminhos freireanos, da comunhão, do diálogo, da conscientização e da libertação, é acreditar na capacidade de todos os seres humanos alimentarem juntos o ideal utópico da mudança, no qual a inclusão é, nos nossos dias, um dos maiores de todos os sonhos: uma realidade em que opressores e oprimidos se façam, de fato, livres dos elos aprisionantes do preconceito, da discriminação e da injustiça.

Assim, acreditamos, ser necessário ter esperança e acreditar na realização do

sonho, tornando-o possível.

Desse modo, durante a coleta de dados especialmente as observações,

conforme registro nas notas de campo, foram observadas as participações dos

educandos com Síndrome de Down nas aulas e a realização de suas atividades, das

quais, solicitamos autorização dos educandos, das professoras e das mães para

apresentar essas atividades neste estudo, com um único objetivo: demonstrar a

realização de suas atividades em sala de aula.

As análises dessas atividades são baseadas no grau de escolaridade e idade

(Quadro 4), onde os educandos apresentam entre 10 e 12 anos e estão cursando

entre o 2º e 5º ano.

As atividades desenvolvidas por Gabriela e Heros, durante as observações na

sua maioria foram similares (Fig.: 1, p: 84 ; Fig.: 2, p: 85 ) com representações de

figuras, uso de cores e formas, já mencionadas pelas professoras e colegas, fato

este que pode estar relacionado a possibilidade de prender a atenção dos

educandos por meio de desenhos, cores, recorte e colagem.

Diferentemente de Gabriela e Heros, Felipe, desenvolveu sua atividade (Fig.:

3, p: 85) apoiado pela compreensão da aula expositiva de sua professora, nesta

questionou e apresentou a turma sua construção.

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Na figura 04 (p: 86), atividade desenvolvida por Marina, apresenta certo grau

de complexidade, em função da série e idade da educanda (Quadro 06).

Estas atividades podem ser observadas nas figuras seguir:

Figura 1: Atividade realizada por Gabriela em sala de aula

Na atividade de Gabriela, podemos observar que as cores escolhidas

apresentam perfeita relação com a delicadeza do desenho.

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Figura 2: Atividade do educando Heros com ajuda.

Com relação à atividade de Heros, parece-nos que o texto não-verbal tem a

boa aceitação para o educando. Recortou e colocou as figuras na posição correta,

ou seja, as garrafas, estão com o gargalo para cima.

Figura 3: Atividade desenvolvida em sala de aula por Felipe

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Na Figura 3, atividade desenvolvida por Felipe, está demonstrada a

compreensão do conteúdo ministrado “sobre linhas abertas simples e linhas

fechadas”.

Figura 4: Atividade desenvolvida por Marina, em apostila diferenciada.

Por último, apresentamos a atividade de Marina que se arrisca, utilizando

algumas letras para escrever palavras das quais sua colega “dita”.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS PARA O MOMENTO

A reflexão sobre o tema Inclusão foi um grande desafio, frente a nossa própria

posição política enquanto educadora. Todos sabemos o quanto a classe sofre em

relação a uma política educacional inconstante e realizada com tão pouca ciência.

Pouca ciência exige muita criatividade e, diante do tema presente, muito afeto

e isso foi presenciado no coletivo que envolve os educandos com Síndrome de

Down.

A contemporaneidade do tema aponta para o princípio da discussão, porém a

base freireana foi um caminho seguro que nos auxiliou na descrição das situações,

assim como a orientação para a pesquisa qualitativa e fenomenológica, uma vez que

sentimentos, emoções, o posicionamento do outro são indicativos subjetivos e, por

isso mesmo, terrenos delicados.

É, conforme constatamos, muito tênue a linha limítrofe entre a aceitação dos

colegas e a rejeição, porque a mesma percepção que vê o ser humano necessitado

de inclusão e dá como resposta o afeto, a compreensão, a comunhão nas

brincadeiras, também sente o desajuste do colega com Síndrome de Down.

Percebem o tratamento diferenciado dispensado para o desenvolvimento das

tarefas, o quanto todos têm que se esforçar para aceitá-lo como diferente: um

diferente que precisa ter limites, que lhe dispensam atenção individualizada,

enquanto toda a classe deve resolver seus próprios problemas. A todos não é dado

o direito de bater, de brincar com brinquedos no momento da aula, de se retirar da

sala a qualquer momento e de realizar a atividade que deseja no momento

desejado.

Nos depoimentos das colegas, há demonstração de respeito, carinho e o

compartilhamento de brigas e afirmação de amizade, o que são comuns à idade. As

colegas descrevem a forma como ajudam seus colegas no que diz respeito a

aprendizagem. Diante dos relatos, entendemos que a relação entre os colegas é de

respeito e valorização do coleguismo em sala de aula.

Evidenciamos estas afirmações através das observações e posterior registro

em notas de campo, que as práticas de interações no cotidiano dos educandos com

Síndrome de Down e seus colegas pesquisados são comuns, embora com

características particulares.

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Em relação ao professor, este, diante da situação-limite, não consegue

promover a inclusão em seu sentido pleno. É um profissional “confesso” de suas

impossibilidades. Está gritando por ajuda! Essa ajuda pode estar na formação

continuada. Para Carvalho (2004:159):

A formação continuada é uma das estratégias que nos permite desalojar o estatuído, substituindo-o por novas teorias e novas práticas alicerçadas em outra leitura de mundo e, principalmente, na crença da infinita riqueza de potencialidades humanas (as nossas e as de nossos alunos)!

Pensamos que o professor é um transformador, orienta o educando crescer

em todos os aspectos e a própria situação do educando é de problemas

multifatoriais, assim como a beleza e crescimento do educando com Síndrome de

Down também tem caminhos múltiplos. Esse professor que confessa “a culpa” no

plano cultural, minimiza a situação da não integração total do educando diferente

pelo afeto, ou seja, no plano humano, porém não é o bastante. O Educando com

Síndrome de Down precisa de ferramentas básicas para sobreviver nessa selva

competitiva em que a sociedade se transformou.

Nos depoimentos das professoras pudemos constatar que elas ainda não se

vêem capazes de incentivar a mudança de consciência, como agentes

transformadores que são. Com atitudes políticas de inclusão, as dificuldades do seu

trabalho seriam mais facilmente resolvidas: os limites ultrapassados e os desafios,

vencidos.

Nessa selva, uma mistura de onça e cordeira frágil, está a mãe do educando

com Síndrome de Down. Avança e recua, tem medo e reage. Quando consegue

entender determinada situação vivida pelo filho, porque está mais no plano

estrutural, ela avança, exige providências, fala com a professora, impõe a matrícula.

O amor, segundo acreditamos, é a fonte energética que a faz superar o medo: do

futuro, do não acesso de seu filho às conquistas consideradas normais das outras

crianças. Ela não percebe que a integração, tendo como meio o esforço coletivo, é o

que possibilita algum alívio na falta de estrutura da escola, na frágil formação

epistemológica dos professores envolvidos, na falta de apoio à família, dentre tantos

outros quesitos. Porém, compactua da idéia de Voivodic (2008:65) que afirma que

para haver a inclusão do educando com Síndrome de Down nas escolas regulares

deve acontecer mudanças “e, às vezes, o uso de recursos especiais, para que essas

crianças tenham atendidas suas necessidades educacionais”.

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As mães enquanto cidadãs que trabalham e pagam seus impostos, lutam por

um futuro melhor e promissor para seu filho e filha com Síndrome de Down.

“Aprovam a idéia de inclusão, esforçam-se por dar a seus filhos oportunidades de

convívio com as outras pessoas da sociedade, desde que eles sejam resguardados

de maiores riscos” (SAAD, 2003:262).

Dessa forma, os depoimentos das mães vêm carregados de preocupações,

dor e conformação frente ao que acontece com seus filhos, no entanto, apresentam-

se esperançosas frente à luta pelos direitos de seus filhos na escola comum, apesar

de a escola pública aceitar um grande número de alunos em sala de aula, o que

prejudica o ensino aprendizagem de todos os alunos. O que vem ao encontro do que

Vygotsky apud Saad (2003) propõe, sobre a escola dever eliminar tudo o que agrava

a deficiência e o atraso.

Paulo Freire (1994-2003), a base teórica de maior contribuição, é o grande

apoio para as discussões que poderão acontecer a partir de agora, porque envolve a

palavra-ação, uma práxis imbuída de uma enorme carga afetiva, cognitiva, política,

epistemológica, ética e ontológica. Representa uma quebra paradigmática na/da

escola.

Tenho, portanto, um início de discussão tão no nascedouro, quanto o

entendimento de que não se faz a inclusão do educando com Síndrome de Down

por decreto, mas é preciso começar... Como lembra Januzzi (2004:199) “é

importante lembrar que inclusão não se faz por decreto. É um processo e como tal

leva tempo e implica mudanças estruturais na cultura, na construção de uma nova

postura pedagógica e na vida social”.

E pensar a inclusão como inconclusão é vivenciar “o conflito entre o ideal e o

real, o já conquistado e as possibilidades futuras” (Gadotti, 2003:47). Visto que:

A inclusão supõe a aceitação da diversidade, do modo de ser de cada um. A inclusão é de natureza político-ideológica. Ninguém está autorizado a afirmar que a diferença seja uma barreira intransponível para a apropriação de instrumentos culturais (SAAD, 2003:261).

Sem a mácula do preconceito, pensar em inclusão significa repensar o

sistema educacional. Propomos então, algumas conquistas: o coletivo precisa ser

ouvido; a categoria inédito viável deve ser compreendida como uma palavra-ação,

bem como a adequação curricular e a acessibilidade devem ser ações contempladas

no Projeto Político-Pedagógico das escolas. Como paradigma emergente no

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contexto social e escolar, a inclusão tem se efetivado apenas pelo convívio de

pessoas com deficiência, matriculadas e frequentando o ensino comum, usufruindo,

assim, de um dos direitos que lhes são conferidos. Emerge devagar, incomoda,

provoca pequenas mudanças e uma delas é a discussão que muitos estudiosos

estão fazendo e esse é apenas um começo.

Nessa perspectiva, a pesquisa mostra que há uma política com proposta

inclusiva no Brasil que, embora deficiente, busca orientar o processo de inclusão. E,

mesmo que não se constitua o ideal, o inédito viável, com a inclusão como práxis,

pode constituir-se um sonho possível.

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Anexos

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Anexo 1 – Questionário (Perfil censitário) - Professoras

1. IDENTIFICAÇÃO 1.1 Sexo: ( ) masculino ( ) feminino 1.2 Tempo de trabalho no magistério ( ) 1 a 5 anos ( ) 5 a 10 anos ( ) 10 a 15 anos ( ) 20 a 25 anos ( ) mais de 25 anos 2. FORMAÇÃO 2.1 - 1º grau Escola em que se formou: 2.2 – 2º grau Escola em que se formou: Habilitação:

2.3 – 3º grau Universidade: Habilitação:

2.4 - Especialização Instituição: Cidade: Estado: Habilitação: 2.5 – Que curso (s) de capacitação participou recentemente?

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Anexo 2 – Questionário (Perfil censitário) - Mães

1- Sexo: ( ) masculino ( ) feminino 2 - Quantas pessoas moram na casa? 3 - Quantos filhos? 4 - Qual a profissão? 5 - Renda familiar: ( ) Até um salário mínimo ( )Até 02 salários mínimos ( ) Até 03 salários mínimos ( ) Até 5 salários mínimos ( ) Até 10 salários mínimos ( ) mais de 10 salários mínimos 6 - Sua moradia é: ( ) Própria ( ) Alugada ( ) Cedida ( ) Outros_________ 7 - Formação: 1º grau ( ) cursando ( ) completo ( ) incompleto 2º grau ( ) cursando ( ) completo ( ) incompleto 3º grau ( ) cursando ( ) completo ( ) incompleto

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Anexo 3 – Roteiro de Entrevista com Professoras (Flexível)

1 – Explique como se dá o processo de inclusão em sua escola.

2 – Quais são as práticas de inclusão desenvolvidas em sua escola?

3 – Quais as estratégias utilizadas para trabalhar com seu aluno com Síndrome de

Down?

4 - Há trabalho de orientação ou formação continuada sobre a inclusão na sua

escola?

5 – Comente a relação percebida entre o aluno com deficiência e o grupo escolar?

6 - Comente sobre os efeitos positivos e negativos da inclusão

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Anexo 4 – Roteiro de Entrevista com Mães e Colegas (Flexível)

1 – Quais são as práticas de inclusão percebidas na escola do seu filho? 2 – Qual a relação percebida entre o seu filho e os colegas de sala e/ou da escola? 3 - Comente sobre os efeitos positivos e negativos da inclusão do seu filho na escola regular

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Apêndices

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APÊNDICE 1 – Notas de Campo (NC)

Notas de Campo 1 Escola 1 – É uma escola Estadual, atende a modalidade de Ensino Fundamental de 09 anos e a Educação de Jovens e Adultos – têm 457 alunos matriculados – Observação realizada no período de 07 a 11/10/2008. Turma: 2º ano do Ensino Fundamental nº de alunos: 19 Inicio: 13h30 às 17h30 Descrição da sala de aula:

A disposição das carteiras em sala é dupla. Um ou outro educando (poucos) senta-se sozinho, Marina é um deles. Descrição das aulas:

As aulas da professora Aretha são em sua maioria expositiva utilizando, às

vezes, o recurso de um televisor e aparelho de DVD com filmes (a escolha da

professora e, às vezes, da turma) para posterior compreensão coletiva e produção

de texto individual.

Todo dia inicia suas aulas com a leitura de uma pequena história e após

comenta sobre o assunto abordado na mesma. Em alguns dias solicitou a reescrita

da história.

No trabalho com Matemática utiliza atividades mimiografadas e com

resoluções de operações matemáticas para serem realizadas no caderno e

posteriormente na lousa, por cada educando.

Procedimentos da docente:

O primeiro procedimento tomado pela professora ao entrar em sala, é

procurar Marina. Então posiciona a carteira de Marina ao lado da parede e distante

das carteiras dos demais colegas. O restante da turma, às vezes, senta-se em

dupla.

A nosso ver os procedimentos adotados pela professora durante as aulas

atendem apenas a alguns alunos, não a todos. Marina, a educanda com Síndrome

de Down, fica afastada do grupo, utiliza seu material e atividades mimiografadas

(desenhos para pintar) diferentes das de seus colegas. Brinca com brinquedos que

os demais colegas não têm acesso, tais como: jogos de encaixe de letras, telefone,

microfone, entre outros.

Diante desse contexto, entendemos que não há interação durante as

atividades pedagógicas, entre docente-colegas-Marina.

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Durante a observação não foram observados trabalhos coletivos (apesar de

sentarem-se em duplas) os trabalhos são realizados regularmente de forma

individual.

Acontecimentos Importantes e/ou Imprevistos

Todos os dias, uma hora antes do horário do lanche, uma colega de Marina

que estuda na escola (em outra turma) e também é vizinha da educanda, vêm até a

sala e a leva ao banheiro. Pensamos ser um “combinado” entre a colega, a

professora e Marina.

Percebemos também que poucos colegas se aproximam de Marina, para

ajudar, solicitar material ou até mesmo pedir algum brinquedo emprestado.

Observações Gerais:

Ao iniciar a pesquisa, fase de observação, solicitamos a leitura do Projeto

Político-Pedagógico - PPP da escola, no qual constatamos que não há ações que

contemplem à inclusão.

Durante a observação das aulas, pudemos perceber que as mesmas não são

planejadas para os diferentes processos de aprendizagens existentes em sala de

aula, tampouco para facilitar a aprendizagem da educanda com Síndrome de Down.

Na turma da Professora Aretha, de um total de 19 educandos, apenas 5 não

estão alfabetizados, dentre eles, Marina. No decorrer da observação não

percebemos nas atividades propostas a Marina, componentes que favoreçam a

alfabetização. No entanto, os outros quatro colegas tinham esses componentes

privilegiados em suas atividades.

Muito embora a professora busque trabalhar estratégias diferenciadas com

atividades de recorte, colagem, entre outras, a mesma não consegue propiciar a

aprendizagem da educanda e a relação intra-pares, tendo em vista que as

atividades são desenvolvidas individualmente.

Outro fator relevante são as constantes faltas que Marina tem. Segundo a

professora, as faltas são justificadas pela saúde debilitada da educanda. Por esse

motivo, a turma e a professora, quase sempre, não estranham a ausência de Marina

nas aulas.

Assim, observamos que a inclusão, neste caso, não tem se efetivado, uma

vez que a aluna apenas está na sala de aula, não participando, contudo, do mesmo

processo educativo proporcionado aos demais colegas.

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APÊNDICE 2 – Notas de Campos (NC)

Notas de Campo 2 Escola 2 – É uma escola Municipal, atende desde o Pré escolar até o 5º ano do Ensino Fundamental – têm 993 alunos matriculados – Observação realizada no período de 14 a 17/10/2008. Turma: 3º ano do Ensino Fundamental nº de alunos: 28 Inicio: 07h20 Término: 11h30

Descrição da sala de aula:

As carteiras em sala de aula são dispostas em filas. O aluno com Síndrome de Down tem sua carteira, no primeiro lugar da fila, bem perto da mesa da professora.

Descrição das aulas:

No primeiro dia de aula da semana de observação, a aula começou com a professora apresentando a pesquisadora e informando que haveria avaliação todos os dias da semana, após o recreio.

A Professora disse também que, nesta semana, antes do recreio iria continuar o trabalho sobre o conteúdo de Sistemas de medidas, haveria produção de textos, atividades nos livros de Geografia, Ciências e História (continuidade do que já estava sendo trabalhado).

Procedimento da docente:

Ao iniciar a aula, a professora solicitou as crianças que pegassem o livro de matemática para realizar a correção das atividades da página 107 do livro.

Ao educando com Síndrome de Down, Heros, a Professora pediu que também pegasse o seu livro. O educando pegou o livro e começou a folhear, a se organizar com o caderno, lápis em cima da mesa. Começou a abrir e fechar a mochila e a observar os colegas.

A professora após correção no quadro da tarefa do dia anterior começou a passar de carteira em carteira, corrigindo os cadernos (não passou na carteira de Heros).

Em alguns momentos a Professora sentou-se ao meu lado para conversar sobre seus alunos, desabafou dizendo que sua turma era muito heterogênea, difícil de trabalhar, muitos com dificuldades de aprendizagem, e ainda um aluno com deficiência auditiva e um com Síndrome de Down.

A professora disse que acredita na inclusão mas, desabafa dizendo que não tem muito apoio dos colegas (que não aceitam a inclusão), da supervisão, orientação e direção. De acordo, com a Professora existe em sua escola apenas a

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preocupação em não negar matricula a alunos com deficiência, no entanto, o apoio não existe. Disse ainda, que se esforça para trabalhar com todas as dificuldades descritas, procura cursos de capacitação, e atualmente esta realizando um curso de especialização em Educação Especial.

Entendemos no desabafo da professora, que ao mesmo tempo que havia motivação havia, também descrédito, desconforto em pensar no futuro da inclusão. Havia em sua fala uma dicotomia entre esperança e desesperança, crédito e descrédito, ânimo e desânimo, mas que mediante a falta de apoio estava ficando apenas a desesperança, o descrédito e o desânimo.

Acontecimentos Importantes e/ou Imprevistos

Todos os dias após o recreio, o educando com Síndrome de Down, é acompanhado por um funcionário da escola, onde o profissional leva o educando para tomar banho e trocar roupa e, só depois dessa prática é que ele retorna a sala de aula.

Percebemos que Heros após o recreio fica muito nervoso e agitado onde, acaba perturbando e/ou provocando seus colegas, batendo na cabeça dos mesmos, mexendo em seus materiais, entre outras atitudes que prejudicaram o andamento da aula.

Diante da prática do “banho” após o recreio, notamos que ao retornar para a sala o educando estava totalmente alheio ao que já esta acontecendo na sala de aula e, demorou para que a professora desse atividade ao aluno.

Na semana de observação em particular, como era semana de avaliação após o retorno de Heros para a sala ele se distrai com brinquedos até o final da aula enquanto que os demais colegas realizavam a avaliação.

Observações Gerais:

Ao iniciar a pesquisa, fase de observação, solicitamos a leitura do Projeto

Político-Pedagógico - PPP da escola, no qual constatamos que não há ações que

contemplem à inclusão.

Nestas observações constatamos que as atividades que a professora propõe

a sua turma são homogêneas, a utilização do livro didático é diária. Suas estratégias

de ensino são: confecção de cartaz, recorte e colagem. As atividades durante a

observação sempre foram realizadas individualmente, por todos da turma.

A professora comunica-se com seu aluno com deficiência auditiva a partir da

língua de sinais, e, às vezes, senta-se ao lado do educando com Síndrome de Down

para auxiliá-lo, enfim constatamos que a professora faz verdadeiro malabarismo

para trabalhar com seus alunos, mas ainda sem sucesso pois, o aluno com

deficiência auditiva e o com Síndrome de Down ficam alheios ao componente

curricular trabalhado com os demais colegas.

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Entendemos que a inclusão de Heros em sua turma não esta ocorrendo pois,

é perceptível a falta de interação do educando com os colegas da sala e nas

atividades propostas, isto é, o mesmo esta em sala mas não esta construindo seus

conhecimentos conforme sua série.

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APÊNDICE 3 – Notas de Campo (NC)

Notas de Campo 3 Escola 3 – É uma escola Particular Confessional Cristã, atende desde a Educação Infantil até o Ensino Médio – têm 530 alunos matriculados – Observação realizada no período de 21 a 25/10/2008. Turma: 3º ano do Ensino Fundamental nº de alunos: 14 Inicio: 07h30 às 11h30 Descrição da sala de aula:

As carteiras da sala são dispostas em dupla. A turma é pequena, daí a

possibilidade das duplas ficarem longe uma da outra.

Descrição das aulas: Na semana das observações a professora trabalhou os componente

curriculares de Artes, Matemática, Religião e Língua Portuguesa na apostila, ou seja

o conteúdos e as atividades eram realizadas na apostila.

Procedimento da docente:

Durante os dias de observação a Professora reclamou receosa das

dificuldades em trabalhar com o educando com Síndrome Down, não em relação

aos conteúdos curriculares mas, sim pela agressividade que o mesmo apresentava

e que, ás vezes, fugia do seu controle. Segundo a Professora esta agressividade,

era entendida por ela como “auto defesa”, estimulada pela mãe.

A Professora disse que a escola é inclusiva e que oferece condições para os

alunos se desenvolverem em todas as áreas e, com essa preocupação, a escola

havia preparado uma apostila com atividades específicas para o educando com

Síndrome de Down, no começo do ano letivo. No entanto, o educando não aceitou

utilizar tal apostila, foi quando a professora diz que a escola chamou a mãe e disse

que o educando gostaria de ter sua apostila igual a dos colegas.

No decorrer das aulas, a Professora sempre solicita que o educando com

Síndrome de Down leia o alfabeto e os numerais de 0 a 9, e quando ele não

consegue a turma o ajuda.

Acontecimentos Importantes e/ou Imprevistos

O educando com Síndrome de Down no terceiro dia de observação apareceu

com uma marca vermelha na nuca, a professora ficou extremamente preocupada e

solicitou a presença da supervisora para relatar e justificar o ocorrido.

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A Professora relata que, quando o educando vai para casa com alguma

marca é certo que no dia seguinte a mãe vem até a escola tirar satisfações sobre tal

marca, por isso, sua preocupação.

Observações Gerais:

Ao iniciar a pesquisa, fase de observação, solicitamos a leitura do Projeto

Político-Pedagógico - PPP da escola, no qual constatamos que não há ações que

contemplem à inclusão.

Durante as aulas percebemos que são sempre direcionadas pela apostila.

São raras as vezes em que a professora utiliza outro tipo de material. No entanto,

ela constantemente desenvolve estratégias de estudo com dinâmica, jogos e

brincadeiras. Com esta prática, a professora consegue “atingir” o educando com

Síndrome de Down, favorecendo sua participação e seu aprendizado. Desta forma,

entendemos que a construção do conhecimento do mesmo se dá por outras

habilidades que não a escrita.

Constatamos também que, muito embora a professora trabalhe o conteúdo

curricular, o educando com Síndrome de Down fica alheio, uma vez que o mesmo

ainda não está alfabetizado. Ao notar que os colegas fazem o registro gráfico do

conteúdo trabalhado e ele o faz através de desenhos, o mesmo se sente diferente

por não saber ler e escrever de forma convencional, como os demais, questionando,

por isso, sua professora e sua mãe.

O ambiente da sala de aula de Felipe é norteado por interação e

cooperativismo. Embora haja alguns desentendimentos entre um ou outro educando,

o que podemos considerar normal por serem crianças de igual idade. O que não

pode relacionar apenas ao Felipe.

Desta forma, entendemos que neste caso a inclusão ocorre de forma sutil e

peculiar e vislumbra futuramente acontecer de fato.

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APÊNDICE 4 – Notas de Campo (NC)

Notas de Campo 4

Escola 3 – É uma escola Particular Confessional Cristã, atende desde a Educação Infantil até o Ensino Médio – tem 530 alunos matriculados – Observação realizada no período de 28/10/2008 a 01/11/2008. Turma: 5º ano do Ensino Fundamental nº de alunos: 17 Inicio: 07h30 às 11h30

Descrição da sala de aula:

As carteiras da turma são dispostas em fila, no entanto a da educanda com

Síndrome de Down “fica junto” a mesa da professora.

Descrição das aulas:

Durante a semana de observação a Professora Samara trabalhou as

disciplinas de Matemática, Religião e Língua Portuguesa, a partir do conteúdo da

apostila.

Procedimento da docente:

O procedimento diário da Professora era o de solicitar a turma que pegasse a apostila da disciplina que seria trabalhada no dia. Em seguida, lia o conteúdo, explicava e solicitava a turma que preenchesse os exercícios das páginas indicadas.

Nesta semana no que se refere ao componente curricular de Língua Portuguesa foi trabalhado ortografia (Ç/SS, G/J, X/CH), produção de texto (a mistura dos contos de fadas), em Matemática (operações de divisão). Em Religião foi trabalhado sobre a Santa Ceia.

Especificamente na aula de Religião, Marina tenta participar o tempo todo, entendemos que a educanda tem conhecimento sobre o assunto que está sendo estudado e quer compartilhar com a turma e com a professora, no entanto se estende muito, falando e se repetindo em sua fala, quando se faz necessário que a professora a interrompa para dar sequencia a aula.

Com relação as outras disciplinas no momento de explicação do conteúdo a educanda com Síndrome de Down demonstra estar alheia ao conteúdo que esta sendo trabalhado e começa a pintar os desenhos que tem em sua apostila (individual).

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Acontecimentos Importantes e/ou Imprevistos

Marina sai o tempo todo da sala de aula para ir a sala do diretor, da supervisora ou para ir ao banheiro.

Nos momentos em que a educanda com Síndrome de Down fica muito agitada e começa a “atrapalhar” a professora e/ou os colegas, a professora solicita a Marina que vá para a sala da supervisora para ter uma conversa séria com a mesma.

Observações Gerais:

Ao iniciar a pesquisa, fase de observação, solicitamos a leitura do Projeto

Político-Pedagógico - PPP da escola, no qual constatamos que não há ações que

contemplem à inclusão.

Ao analisarmos o contexto da sala de aula de Marina entendemos que em

alguns momentos a educanda participa junto com os colegas de atividades pelas

quais demonstra ter afinidade, tais como: textos envolvendo conhecimentos bíblicos,

dinâmicas que envolvam o corpo, como a dança, ginástica, toque, gesto, fisionomia,

música, atenção e concentração, entre outros.

Constatamos também que nesta semana de observação não foram

trabalhados com a educanda componentes curriculares específicos da sua série,

tais como os de seus colegas. E, sim, a utilização de uma apostila da qual a

professora relata foi criada especificamente para Marina, onde há atividades com

características de conteúdo de alfabetização, como: recorte, colagem, pintura,

associação de palavras a figuras, destaque de letra e palavra dentro do texto, entre

outras. Entendemos que estas atividades são proporcionadas a Marina porque a

mesma ainda não esta alfabetizada.

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